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Toda percepção é uma modificação do estado do sujeito cognoscente.

Ao mesmo tempo,
nenhum objeto poderia ser percebido se não estivesse em permanente mudança, se não
sofresse alterações. Nada do que é eterno e imutável pode ser percebido por entes cujo
próprio ser (e cujo modus cognoscendi portanto) é mudança e transitoriedade. O eterno e
imutável só pode ser apreendido intelectualmente, seja como forma vazia, seja por analogia.
Ao mesmo tempo, sabemos que não pode haver mudança sem permanência, e que a
mutabilidade absoluta é uma contradição de termos, a coisa mais impensável do mundo. A
única conclusão possível é que vivemos num fluxo de impressões cambiantes erguido sob uma
base inacessível de realidades eternas. Isto é uma conquista definitiva do platonismo.

O mundo é um fluxo de estados transitórios direta ou indiretamente perceptíveis fundado


numa eternidade imperceptível. O mundo não é uma ilusão, mas é uma tela invertida onde as
aparências do ser, que são reais mas impermanentes, encobrem o ser das aparências, que é
permanente e por isso mesmo parece irreal. Essa inversão ocorre tanto na nossa percepção do
mundo quanto na de nós mesmos. A identidade por baixo dos nossos estados e percepções é
totalmente inacessível ao nosso conhecimento mas ao mesmo tempo nenhum conhecimento
poderia existir sem ela. Por isso é que práticas místicas e ascéticas não levam a parte alguma
se a ação decisiva é nossa e não vem do próprio Deus.

Se não tenho a consciência de que Deus está me transformando num deus, conforme a Sua
promessa explícita, então todos os mandamentos da religião se rebaixam ao nível da
"prudentia carnis" e não passam de um código civil e penal.

Por que raios os padres não falam mais disso?

Por que as maravilhas da vida espiritual, que Jesus prometeu a todos sem exceção, não são
alardeadas do alto dos telhados?

Um pinguinho de nada de consciência do que Deus está fazendo em você liberta você de mais
pecados do que um milhão de sermões moralistas poderiam jamais fazê-lo.

O medíocre não acredita nem no que lhe parece ruim demais, nem no que lhe parece bom
demais. O inferno e o céu só passam a existir para nós quando Deus arranhou um pouco a
casca da nossa ignorância letárgica

O que escrevi outro dia sobre a mutabilidade do objeto requerer um conhecedor também em
mutação já estava em Heráclito, segundo Aristóteles (De Anima, I, 405 a27).

O conhecimento humano do eterno e imutável só é possível por dois meios: pelo


conceito abstrato que o representa negativamente; por mutações introduzidas em nós
pelo próprio eterno e imutável com o intuito de revelar-se de algum modo.

A mutabilidade é a condição da percepção, mas, se tudo mudasse ao mesmo tempo no mesmo


ritmo, não haveria percepção nenhuma. A pedra está em mudança por efeito da erosão, mas a
visão que tenho da pedra é uma mudança rápida e passageira que se opera na meu corpo. A
percepção depende, portanto, da diferença de ritmos e, em última análise, de todo um
sistema de relações de proporção entre os tempos das transformações sofridas pelos vários
seres. Tal é a estrutura RACIONAL, matemática, do cosmos vivente. Não se sabe se era bem a
isso que Heráclito chamava o Logos, mas parece que sim, e nada o impede que nós o façamos
por nossa vez. Tudo muda, exceto o Logos que está por trás da mutações.

Já observei, tempos atrás que, se "não podemos entrar duas vezes no mesmo rio", também
não podemos ler essa frase duas vezes

As águas correm, mas a corrente fica.

Tudo são tempos e ritmos diferentes e articulados.

Se a corrente corresse junto com as suas águas, estas cessariam de correr

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Quando escrevi que os juízos auto-evidentes não têm contraditória unívoca, nunca esperei que
alguém fosse estúpido o bastante para supor que, com isso, eu estivesse afirmando que basta
não ter contraditória unívoca para um juízo ser auto-evidente. Qualquer principiante sabe que
TODOS os juízos EQUÍVOCOS são desprovidos de contraditória unívoca. O tal Pimentel produz
um juízo equívoco -- "A existência de Papai Noel é necessária"-- e, constatando que não tem
contraditória unívoca, acredita ter demolido a minha afirmação sobre os juízos auto-evidentes.
A coisa é de uma estupidez tão descomunal que escapa ao domínio da lógica e entra no campo
das deficiências de inteligência descritas pelo prof. Feuerstein. No Brasil, como eu disse, o
analfabetismo funcional se tornou uma ciência.

Para facilitar um pouco mais: um juízo equívoco não tem contraditória unívoca porque tem
dois ou mais significados. Um juízo auto-evidente não tem contraditória unívoca porque sua
contraditória se contradiz a si mesma e é, portanto, dupla. Só um deficiente mental pode
confundir essas duas situações.

O raciocínio lógico tem em si as razões da sua "validade", mas não da sua cognoscibilidade. O
raciocínio lógico seria impossível sem a percepção intuitiva da igualdade de duas proposições.
Não há "conhecimento racional", só conhecimento intuitivo.

30 compartilhamentosCurtirCurtir · Compartilhar

 228 pessoas curtiram isso.

Olavo de Carvalho Como percebo a unidade de duas proposições num silogismo? É por
outro silogismo, e mais outro e mais outro ainda, ou é por uma intuição imediata da
forma?

há 7 horas · Curtir · 39

Olavo de Carvalho Intuição é: percepção imediata de uma presença.

há 7 horas · Curtir · 41

Olavo de Carvalho Por baixo ou para além da intuição, só existe o "conhecimento por
presença" que a torna possível.

há 7 horas · Curtir · 36

Olavo de Carvalho Em vez de se esforçar para "provar" alguma coisa, o filósofo se


dedica a perceber e expressar depois de aprender a abrir-se à presença.

há 7 horas · Curtir · 44

Olavo de Carvalho Todas as nossas intuições são instantâneas. Só o conhecimento por


presença me informa da continuidade do mundo. A razão pode reforçar as razões de
crer nela, mas não pode "prová-la", já que toda possibilidade de prova se assenta
nessa mesma continuidade.

há 7 horas · Curtir · 34

Olavo de Carvalho "Provar" é coisa de contabilistas e policiais. O filósofo pode


estimular a intuição para que seus ouvintes percebam o que ele percebeu, mas não
provar algo a quem não percebeu nada -- e quem percebeu não precisa de prova.

há 7 horas · Curtir · 48

Olavo de Carvalho Provas só servem para dar validade social a uma crença
esquemática, que simboliza de maneira distante e vaga alguma intuição originária.

há 7 horas · Curtir · 41

Olavo de Carvalho Um filósofo de verdade não faz a mínima questão de que suas
conclusões adquiram validade social -- apenas de que sejam confirmadas por quem
percebeu o que ele percebeu.

há 7 horas · Curtir · 43

Olavo de Carvalho Minha própria continuidade não pode ser percebida como objeto
de meus pensamentos, mas se impõe a mim de maneira avassaladora como condição
"sine qua non" da minha possibilidade de pensar. Que não dizer, então, da
continuidade do Ser como um todo?

há 7 horas · Editado · Curtir · 34

Olavo de Carvalho Pausa para os comerciais: Isso pode ser o tema da próxima aula do
COF.

há 7 horas · Curtir · 32

Olavo de Carvalho Certos idiotas que se imaginam escolásticos me ouvem falar em


"intuicionismo radical" e pensam que é algum tipo de modernismo católico,
bergsonismo, blondelismo ou coisa assim.

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