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CENTRO DE PÓ S-GRADUAÇÃO EM P SICOLOGIA

IN STITUTO SUPERIOR DE E STUDOS E PE SQUISAS P SICOS SOCIAI S


FUNDAÇÃO GETOLIO VARGAS

ANÁLI SE CR1TICA DOS TESTES DE I NTELIG�NCIA


OU APTIDÃO P SICOLÓGICA

POR

ANA LOCIA MULLER VA CUNHA COUTO

D i s s e r t a ç ão s ub me t i d a como requi s ito p a rc i a l p a r a


obten ç ão do g r au d e

�ili STRE EM P SICOLOGIA

Rio de J anei ro, março de 1 9 81


CENT RO DE POS- GRADUAÇÃO EM P S I COLO G I A
INSTITUTO S UPE RIOR D E E STUDO S E P E SQU I SAS P S I CO S SOC IAI S
FUNDAÇÃO GETOLIO VARGA S

/ .'.
"': .....-'

ANÁLI SE C RfT I CA DOS TE STE S DE INTELI G�N C I A


OU APTT DÃO P ST COLO G I CA

ANA LOCIA MULLER VA CUNHA COUTO

FGV/ I SOP/CPGP
P rai a de Bot afogo , 190 - s a l a 11 0 8
Ri o d e J an e i ro - Bras i l
,

Ved�co a Fe4nando
AGRADEC I MENTOS

Para a concretização deste trabalho contei com a co

laboração de muitas pessoas às quais agradeço conjuntamente,na

impossibilidade de a todas nominar.

Gostaria de agradecer especialmente ao Professor

Franco Lo Presti Seminério, orientador desta'dissertação.

AÔ Professor Luiz Felipe Baéta Neves Flores, mestre

� amígo, cujos ensinamentos, criticas e incentivo foram funda­

mentais à elaboração des�e trabaiho, meus agradecimentos.

Agradeço aos colegas, amigos e alunos do Departarne�

to de Filosofia e Psicologia da Universidade Federal Fluminen­

se pelo interesse e apoio constantes.

Aos colegas do Instituto deEstudos Avançados em

Educação, especialmente Mirian Grinspun, Ana Maria Baeta, Ânge

la Valladares e Luiz AntonioCunha meus agradecimentos pela

disponibilidade e gentileza sempre demonstradas.

Agradeço ao ProfessorCláudio Ulpiano e aos colegas

de nosso grupo de estudo pela permanente possibilidade de dis­

cussao e reflexão.

Ao Dr. Oswaldo Costa Rego Filho pela ajuda afetiva

à criação desta monografia, meu in;finito reconhecimento.

As amigasSilvia Josephson e Irene Zaslavsky pre ­

sentes em todos os momentos, minha sincera gratidão.

A meus pais e irmãos agradeço o constante interesse

carinho e dedicação com que me acompanharam.

iv
�o Centro de Pós-Graduação em Psicologia do Institu

to deSeleção eOrientação Profissional da FUndação GetúlioVi3E.

qas que me beneficiou com a concessão de bolsa de estudo no

periodo de agosto de 1976 a dezembro de 1977, meus agradecimen

tos.

ADébora PintoOtoni pelo paciente trabalho datilo-

qrãfico agradeço a consideração e boa vontade sempre demonstra

das.
\

A Marina Cawadias agradeço profundamente sua genti-

leza ao realizar o trabalho de tradução em inglês nesta disser

tação.

v
R ES U MO

Este trabalho tem como objetivo fundamental proce -

der a uma análise teórico-critica dos testes �e inteligência ou

aptidão psicológica, entendidos como instrumentos que fornecem

um tipo de medida "objetiva" do comportamento e que são cons -

truidos obedecendo a normas e critérios definidos pela "Psico-

metria" - ramo da "disciplina psicológica" que se ocupa da

"teoria" e "metodologia" de construção de testes.

A dissertação se compõe de quatro capitulos e uma

conclusão. Nos dois primeiros capitulos examinam-se as catego-

rias teóricas de "prática técnica': e "prática teórica ou cien­

tifica", procu:.;:ando-se demonstrar que os testes de inteligên -

eia se constituem por um processo de construção técnico-ideoló

gico, cujo mecanismo v,isa responder a uma determinação exter -

na - uma "demanda social"- de "adaptação-readaptação" dos indi-

vlduos na ordem social.

No terceiro capitulo busca-se enfocar a "demanda so

eial" dos testes de inteligência pela análise de determinadas

concepçõesldeológicas que colocam a questão da inteligência e

das aptidões como responsáveis pela hierarquização social. Ev!

dencia-se que cumprindo "cientificamente" as funções de sele -


- ,�

cionar, classificar e diferenciar os individuos, os testes sa�

eionam um certo saber sobre a inteligência que tende a reprod�

zir as relações sociais especificas do modo de produçãodas cha

madas sociedades capitalistas.

vi
No quarto capitulo analisam-se as contribuições de

Michel Foucault sobre as práticas de exame(entre as quais. se

incluem os testes psicológicos) enfatizando-se que tais práti

cas emergem historicamente como objetos de saber e efeitos de

poder e se constituem fundamentalmente por essa articulação.


,

Finalmente conclui-se por uma certa impossibilid�

de de se tratar os testes e a inteligência que eles produzem

Unicamente ao nível da distinção ciênCia-ideologia, procu -



rando-se avançar para uma posição em que se torna prioritário

justamente identificar a s articu�ações de poder presentes em

qualquer produção de saber.

-.'..

vii
SUMM A RY

I
,I

This work was written principally to show a


1I
o'
I
theoretic-critical analysis of intelligence tests or

psychological aptitudes as instruments for a "objec tive"

measure of behavior. They are composed following the 11


!I
standards and principIes ruled by "Psychometry" - branch of
I
the Psychology that works with the "theory" and "methodology"
I,
of test construction. I
The dissertation is composed by four chapters and I.
li
li
a conclusion. In the two first chapters the theoretical

cathegories of "technical practice." and "theorical or

scientific practice" are examined, trying to demonstrate

that the intelligence tests are composed by a technical


\
ideological construction process, whose mechanism tries to

respond to an externaI deterrnination - a "social demand "


.
for "adaptation-readaptatioo"of individuaIs in the social

order.

The third chapter focuses the "social demand" of

the intelligence tests throúgh the analysis of determined

ideological conceptions who state that the inteligence and

aptitudes are responsible for the social hierarchization.

It is shown that the tests validate .� certain knowledge of

intelligence that reprocIuce the specifical social relations

of the means of production in the capitalist societies, when

the function of selecting, classifying and diferenciating the

individuaIs are accomplishec.

viii
in the fourth chapter Michel Foucaul�s contributions

are analysed emphas izing t ha t thes e practices r is e h i s torically

as knowledge obj ects and power e ffects con s ti tuting themse lves

fundamenta l ly through this art iculation .

Fina l ly there i s the conclusion o f the impos s ibility

of considering the tests and the intel l igence they produce

solely at the leveI of d i s tinction s cience-ideology . So there

is the tentative to reach a position in which i t is mos t

important exactly to. identify the articulations o f power that

can be found in every knowledge produc tion .


SUMÂ R I O

Agradecimentos ------------------- iv
Resumo --------------------------- vi

Summary viii
.-

INTRODUÇÃO

�. A CATEGORIA DE PRÁTICA T�CNICA - - ---- - --------- -------


005

2. O PROCESSO DE PRODUÇÃO DA NORMALIDADE DA INTELIG�NCIA 01 6

2.1. Sobre a hipótese básica -- --- - ----------------- - - 017


2.2. A construção da escala intervalar de medida -
-- -- 028
2.3. A normalidade pela padronização -- - -
---- --------- 036

3. A "DEMANDA50CIAL" DOS TESTES DE INTELIG�NCIA --------


043

3.1- Inteligência e ideologia burguesa ---


-
-
-
------
-

046
3.2. O papel da educação: aptidões desiguais, oportu
.
19ua1s ---------------------------------- 054
-

·dades
.

n1

3.3. O discurso "científico" da inteligência ----- - --- 059

4. OS TESTES DE INTELIG�NCIA COMO DISPOSITIVOS DE SA BER


E PODER ---------------------------------------------- 077

5. CONCLUSÕES --------- - -
-- -
--- -------------- --------- - -- 1 02

6. BIBLIOGRAFIA -----------------------------
-- - --------- 106
"O que ê a verdad e , portanto ? Um
bata lhão móve l de metáforas , meton ímias, an
tropomorfismo s , en fim , uma s oma de re lações
humanas , que foram enfati z adas poética e
retqricamente , transpostas , enfeitadas , e
que , após longo uso , parec em a um povo s ó­
l idas , canônicas e obrigatór ias : as verda­
de s são i lusõe s , das quais se e s queceu que
o s ão , metáforas que se tornaram gastas e
s em força s en s íve l , mo edas que perderamffiB
e f I qie e agora só entram em consideração�
mo metal , não mai s· corno moedas " .

Niet z s che
INTRODU CÃO
d

Este é um trabalLo que se pretende c rítico . E en-

quanto crí t i co se quer exc ludente, já que em sua forma não �

espaço para as alternativa s . O que se coloca em que stão não é,

nes se sentido, a troca das regras de um jogo que está dado mas

sim, o conhec imento de las, suas articulaçõe s, seus movimentos,

seus usos .

Os testes de inte l igência existem, e s t ão presentes

cnao apenas como uma prática de julgamento, s e l eção, c lassi fica

çao e diferenciação ma s também como peças motri z e s de uma teo­

ria da intel igência humana que postula a exi stênc ia de t raços

ou capacidades mentais básicas, pass íve is de serem med idas por

esses instrurnen�os .

Tentaremos.expl i c itar neste estudo, como a prática,

de caráter eminentemente técnico, sanc iona uma suposta teor ia

cientí fica da inte l igênc ia por um mecanismo em que a formul a -

ção teórica aparece intimamente re lac ionada a a c e itação da d i ­

Íerenciação e hierarqu i z ação dos ind ivíduos e grupos sociais,

como um dado natural, invari ante . A se leção é, a í, tomada c omo

uma necessidade inerente à divisão soc ial que se funda, em ú l -

tima anál ise, nas diferenças individuai s ( onde a inte l igênc i a

t em papel determinante ) .

Os t e stes e a inte l igência que e le s produ z em, nos

interessam aqui enquanto in strumentos chave no interior da Ps i

cologia, assim como fora de la, na med ida em que vão falar o di�

curso socialmente dominante da intel igênc ia . D i sseminando cat�

gorias tais como quociente inte lectual (QI) e aptidão menta l ,

darão um cunho c ie nti fico às concepções do senso comum . A in te


2.

ligência pas sará a ser pensada quanti tat ivamente , numericame�

te , também ao níve l social : trata- se do advento do que pode -

ríamos chamar " a intel igência métrica " .

,.
No interior da d i s c ipl ina ps icológica , um ramo e s-
-
pecifico - a Psicometria - con s tituirá o núc leo dedicado a

pesquisa e à s discussões a propó s i to da quantidade de traços

ou fatore s de inte l igênc ia . E será e la a d i z e r :

o e � tudo d e e a p a e� d a d e � hum a n a� d e nlv e l el e v a d o , �


tã. 6undam e ntalm e nt e m e n o � ad�anta d o , a p e.6aJr. d o g Jr.an
d e n úmeJr.o d e p e.6q u�� a.6 p u b l � e ada.6 , e o g Jr.a u d e d��
v eJr.a ê n e �a.6 entJr.e e� p e e �ali� t a � d e aut o Jr.� d ad e logo 6i
eaJr.a elaJr.o . S e Gu�l 6 oJr.d a e Jr. e d�ta q u e apJr.ox�madam e n�
t e 1 2 0 eapae�dad� � n d e p e n d e n t e.6 e m e n.6uJr.ã.v e �.6 .6 i o ne
e e � � ã.Jr.�a.6 paJr.a de.6eJr. e v eJr. a e a pae�dad e hum a n a , e n�
q uanto V eJr.n o n v eJr.� 6 � ea q u e a � n t el�g ê n ei a g eJr.al ex­
pl�ea m u�to ma�.6 v aJr.ia ç io d o q u e t o d o .6 0.6 o utJr.O .6 6 a
tOJr.e � Jr. e u n�d o .6 em am O . 6 tJr.a� Jr.epJr. e.6 e ntat l v a � , � ej amde
eJr.�an ç a.6 9u d e adulto � , e .6 e C attell a 6 �Jr.m a q u e de
um t e.6t e " eultuJr.am e n t e j U.6to " pod e d eJr.� v aJr. Jr.e.6ult a ­
d o � q u e .6 e j am a ut e ntieam e n t e e o m paJr.ã.v e�.6 , o bt�do�
em n O Jr.t e - am eJr.� e a n o .6 , �talia n o .6 , o u ha b�tant e.6 da
I l ha F O Jr.m o .6a , ( ) . V e v e - .6e e o n elu�Jr. q u e a d e 6 �n� -
. çio o p eJr.a e � o n al e .6at�.6 6 atôJr.�a d e � n t el�g ê n e � a , e m ­
• • •

b OJr.a d e 6 0Jr.m a alg uma �m p o .6.61v el e m pJr.�n elpi o , ainda


nio 6 0 � e o n.6eg u�da . EX�.6t em mu�ta.6 m a n e�Jr.ap de m e -
l ho Jr.aJr. d e 6 �n� ç õ e.6 q u e .6 e a pJr.o x�m a.6.6em d e.6.6 e �d eal ,
m e.6m o a n t e.6 d a v eJr.� 6 � e a ç io d e l e�.6 bã..6�ea.6 d e 6 u n -
e � o nam e nt e e o g n�t�vo , m a.6 a n t e � q u e �.6.60 o e oJr.Jr.a�
d e6� n�çõ e� t e n d em a � eJr. ap e na.6 apJr.o x�m a ç õ e.6 e eg a�
empZJr.Z e a 6 .
. ( Butcher , 1 9 7 2 , p . 3 6 - 7 ) - ( gr i fo no sso) .

Suas c r i t icas ou auto-cr í t icas não impedirão po-

rém , o crescimento e a uti l i zação mac iça do s t e s t e s ainda nos

dias atuais . Segundo Schwebe l l ( 1 9 7 2 ) , nos EEUU, em 1 9 6 6 ,

0.6 ed�t o Jr. e� d e t e.6t e.6 q u e Jr.eg �.6tJr.aJr.am l u eJr.o.6 m a�.6


� u b � ta n eia�.6 v e n d eJr.am t e.6t e.6 ( d e t o d o � 0.6 t � p O .6, nio
a p e na � d e a pt�dão m e ntal ) av al�a d o .6 em v � n t e mil hõ�
d e dôlaJr.e.6. Na med�a d e m e� o dôlaJr. poJr. t e.6t e , ��to
� �g n� 6 � e a q u e m a�.6 d e 133 m �l h õ e.6 d e t e.6t e.6 6 0 Jr.am
v e nd�do.6 paJr.a e.6e o la.6, e o leg � o .6 , u n�v eJr..6�da d e� ag ê n
e �a.6 e om u nitã.Jr.�a.6 e � nd�.6 tJr.�a� num ú n � e o a n o . S o m a�
� e a ��.60 o n eg ô e�o d e cd�to Jr. e.6 e o m l u eJr. o .6 m e noJr. e.6
e 0 .6 pJr.o g Jr.ama.6 d e t e � t e.6 de o Jr.g a n � z a ç õ e.6 n i o l u eJr.a ­
t�va� , e o m o o Edu eat� o nal T e.6t�ng S eJr.v � e el e a q u el e
núm eJr.o � 0 6 Jr. e uma .6u b.6tan e�al � n 6 l a ç ã o . O ETS t e � t o u
1 1 4 3 . 3 7 2 g � na.6�a n o � d o pJr.�m e�Jr.o a n o e o m o PJr.eUm�nMy

3.

Scho!a�tic Aptitud Te�t rTe�te P�elimina� de Educação


Academical e 6 62 . 4 8 5 e� �udan�e� da� � �e� oua��o a
quato�ze (P�og�ama Nacio nal de Te� �e� de O�len�ação J
�udo ��to n o ano let�vo de 1 9 6 5 - 6 6. Cp . 85)

Embora nao pos suindo dados mais recentes , a s sim co-

mo relativos ao Brasil , é pos s ível verificar , sob outro ângulo ,

qu e os testes continuam ocupando papel de fundamental importâ�

cia , haja visto a compo sição curricul ar dos curso s de formação

de psicólogos . A l to percentual das disciplin a s minis tradas tr�

tam direta ou indiretamente dos' testes de inteligência e perso

nalidade . �

A proposta de um e s tudo d e n a tur e z a c rítica sobre

os testes de inteligência decorre principalmente d e s s a config�

ração , cujo equilíbrio pare ce-nos surpreendente . De um l ado os

testes , proliferando-s e , subsidiando uma certa c oncepção de in

teligência ou capacidade mental e acima de tudo , justificando

uma série de práticas � n ível institucional ; de outro , a nega­

çao de sua validade e con sequentemente do crédito que se lhes

possa atribuir enquanto instrumental cientí fico d e medida da

inteligência .

Essa contradição se coloca como pont o d e partida de

nossa análise . I sto é , se não há qualquer garantia quanto aos

fundamentos teóricos dos teste s de inteligência , sua e ficácia

do ponto de vista prático- social é inegável . A que se deve e s-

sa eficácia? O que sustenta e mantém e s s e s instrumentos ainda

que se lhes reconheça tautológicos e r e s tritos? C omo e s trutu -

rar e perpetuar uma teoria da inteligência a partir d e um ins ­

trumental que não atende à s exigências de um conhe cimento teó-

rico mais rigoroso?

Para inve s tigarmos e s s a contradição dirigimos nos sa


4.

aná l i se em dua s vertente s . Uma que chamamos inte rna , onde te�

tamos explorar a que s tão dos fundamentos teór icos inerente sao

processo de cons trução de t e s te s , e specialmente a questão da

norma l idade da inte l igênci a e impl icações (a d i ficu ldade de

ítens , a escala intervalar de med ida , o pro c e s s o de padroni-

zação ) ; a outra , externa , d i z re spei to ao uso social dos t e s -

t e s e d o c onceito de int e l igênc i a que e l e s produz em o u se j a ,

re laciona-se aos " e fe itos " da ticnica dos testes .

� .
Cabe salientar que e s s a d iv i são tem aqui apenas ��

caráter didát ico porque , em verdade , não s e trata de um trab�

lho di stinto . Acredi tamos que ambos o s níve i s de inve s tigação

só podem ser pensados no inter ior de uma prática soc ial ( " u n.i

dade c o m pt e xa da� p�ã�.ica� ex.i� � e n� e � em uma � o c.i e da d e d e� e� ­

m.inada " ). (Althusser , 1 9 7 9 a . p . 144 )

Conforme Kars� ( 1 9 7 4 )

nada � e pa� � a 5 0 �a d a p�ã�.ica � o c.iat : � o d a p�ã�.ica


d.i 6 e� eYl.c.iat, q uatq u e� q u e eta � ej a, .im pt.ic� � emp�e
�o da� a� o u��a� po � q u e n�o hã " 0 �em p o da � e o �.i�' o u
" o � em p o da p o tZ�.ic a " . t e n��o, a p a��.i� d a p�ã�.i c a
� o c.iat qu e e p� e�.i� o c o n � .id e�a� a e� p e c .i 6 .i c .id a d e � e
!a�.i v a a cada p�a�.ica . ( p . 5 1 )

D i to d e outra mane ira , nao s e trata d e ver i f icar ,

do ponto de vista da teoria dos t e s te s , uni camente sua coeren

cia interna , a partinênc ia de seus conce i to s .

A p�ã�.i c a, n o � en�.id o o �d.i n ã�.io d a pat a v�a - a � e a ­


!.idad e ma� e�.iat, � o c.iat, e c o nôm.ic a e .iYl.� �.i�uc.io n at
d a � � e o �.ia� c.i e n�2�.ic a � - n ã o � e � etac.io n a � e n ã o ã
·'u.�.it.iz a ç.ã.o " d a � � e o �.ia.6, � eLL.6 " U.60.6 .6 o c.ia.iJ.1,
' j ama.i.6
� LLa. " pu�a. e � .6 ên c.ia c.i e n�2 6.ica . ( Id em , p . 4 8 )

A demarcação do lugar ocupado pe los t e s t e s no cam­

po social passa pe l a que stão teór ica . No sso ob j et ivo fundame�

tal i enfocar e s sa articulação o que , por outro l ado , define

tambim o a lc ance de ste trabal ho .


5.

CAPITULO I: A CATEGORIA DE PRÂTICA T�CNICA

A preocupação fundamental que se coloca neste capí­

tulo é a distinção entre dois mecanismos de produção de saber:

as práticas técnica e teórica.

Há, no campo da Psicologia, relativo consenso quan-

to ao fato de que os testes de inteligência ou aptidão psicoló

gica são constituídos segurido um processo de natureza técnica.

Encontramos, no entanto, proposições de que essa técnica esta­

ria atrelada à uma teoria de inteligência e que, como tal, te-

ria, no seu interior, um lugar de direito. Nesse sentido, rotu

lar os testes de serem produtos técnicos, por si só, nao traz

nenhuma novidade, uma vez que eles próprios assim se conside -

ramo Na realidade, eles não se propõem outra coisa senão mani-

pular tecnicamente o objeto a que se dirigem.

Ao trazer à tona os conceitos de prática técnica e

prática teórica, temos como objetivo demonstrar que os testes

de inteligência são realmente técnicas mas que, longe de esta-

rem articulados ou localizados no interior de uma teoria vao,

antes, produzir um tipo de saber específico sobre a inteligên-

cia, uma pseudo�teoria, exatamente aquela de que necessitam p�

ra atingir o fim que lhes está determinado.

Eaaa "te04ia" jamaia i out4a eoiaa que a 4e6lexio dea


ae 6im, nio-e4itieado, não eonhe�ido, em aeua meioade
4ealizaç.io, Üto i, um aubp40dutó' da 4e6lexio do 5im
da p4itiea tieniea aob4e oa aeua meioa. Uma "te04ia"
que nio levanta a queatio do 6im de que i aubp4oduto,
pe4maneee p4.Ü,[onei4a deaae 6,[m e daa "4ealldadea" que
lhe 604am impoataa eomo 6im. Taia aio nume40aoa 4amoa
da Paieologia e da Soeiologia, e meamo da Eeonomi� da
PolZtiea, da A4te, ete • (Althusser, op. cito p. 148)
• •

Tal é o caso, tentaremos demonstrar posteriormente, do objeto

de nossa análise.
6.

Julgamos importante colocar n a b a s e d e n os so refe-

rencial teórico a c at egoria de "corte ou ruptura epi s temol ó-

�ica" . Introduz ida por G. Bachelard, ( 19 6 6 ; 1 9 7 2 ; 1 9 7 7 a i 1977b)

essa categor ia tem como fundamento uma noção " de scontinu í s t a "

que procura d i s t inguir o conhecimento comum do conhec imento c i

entíf ico . Em Bachel ard a que stão do corte epi stemológico nao

está porém, apenas, na s eparaçao e n tre c iência e ideologia mas

principalmente na abertura de uma nova forma de s e refletir as

teorias c ientí fica s, forma e s sa que se preocupa em demonstrar

como e onde s e produz em os conceitos que articul am o d is curs o

científ i co .

Atravé s do e s tudo da formação d o s conceitos em c i ­

ências particulares, Bachel ard ( 1 9 6 8 ; 1 9 7 2 ; 1 9 7 7b ) demonstra,

em inúmeros exempl o s, sobretudo no campo da F í s i ca e da QuL�i

ca , a d i s tância e ntre a l e i tura imediata da expe r i ênc ia vivi-

d a , do real da vida cotidi ana, e o proce s s o da produção teóri

c a . Diz Hippolyte ( 19 7 0 ) :

• . Bac h ela�d � em emp�eg a� e � � e� t e�m o � q u e c o n vem


.

pl en am e n t e ã � u a int e n ção , d e� c� ev e u e � � a p�áti ca


t eõ�i c a , q u e c o n h e c e o� o b � tá c ulo� Qu e e n c o nt�a � em
p� e o " ci e ntZ�ico" no q u e � e t o m a p �� uma exp e�ii�
cia im e d iata. Há , a � � im , c o � t e � , � u pt uha� na hi�tõ
�ia � e p e n� a d a d e uma c ii n cia. A . hi� t õ� i a d o 11og �
tic o e uma hi� tõ�ia c a d u c a , a t eo�ia do c a l õ�ico �
p el o c o nt�á�io , e d o pa� � ad o atual. A n o çã o d e ca -
· l o � e � p e cZ1i co e uma noç ão c i e n tZ1i c a. N ã o há dia ­
l ética po� iti v a q u e p e�mita pa� � a� d e uma a o ut�a;
uma e i d e o l õg i c a , 6�ag m e nto d e um � i � t em a d e � e p�e
� enta ç õ e� q u e 1a z pa�t e da e x p e�iincia v i v ida , a
o ut�a e c i e ntZ 6 ic a , m o m ento d e um a e la b o �a ç ão t e õ ­
�ica , t em , � e � e q ui z e� em p� e g a� a pal a v � a q u e G .
B ac h ela�d con � e� v a , um a dialet i c a p�õ p�i a . ( p. 2 0 )

o pensamento f ilosófico bachelard i an o é retomado

sob urna perspectiva marxista por Loui s Althu s s e r ( 1 9 7 8 a; 1978b;

1 9 7 9 a; 1 9 7 9 b ) . Althu s ser propõe que s e pen s e a s relações da

c iênc ia com o real atravé s do conc e i to marxi s ta de " apropri a-


7.

,ção cognitiva". Tal concepção, muito próxima da concepçao de

Bachelard, representa também uma rejeição ãs posições idealJ.s

tas e empiristas que buscam uma adequação entre a ordem do

real e a ordem do conhecimento, cada uma delas evidentemente

definindo de maneira diversa a natureza dessa adequação.

Para Karsz

quem diz apJtopJtiação, diz .te�e ma.teJtiati�.ta �ob,'le a�


�iên�ia�. Te�e an.ti-ideati�.ta, eta nega que o Jteat
exi�.te em 6ul1ção de pel1�amen.to: não �e apJtopJtia �e­
não do que ex,ü.te. úldepende.n.temen.te da apJtopJtiação •

Te�e an.ti-emp-í.Jti�.ta, eta. nega que o conheciment:o �e


encaixe no Jteat: não há apJtopJtiação �em modi�-í.cação
do objet:o apJtopJt-í.ado. (op. cit. , p. 60)

o que se coloca em questão sao os mecanismos pelos

,quais se dá a apropiação cognitiva do real ou os "modos de

produção" do objeto de conhecimento.

Em termos do conjunto ciência-ideologia podemos a­

firmar que a ciência ê' a prática pela qual se produzem conhe­

cimentos tendo como meios d e produção a teoria los conceitos).

Já a ideologia enquanto sistema de representações tem uma fun

çao prático-social e se auto-designa num grupo de noçoes.

A ideotogia aJtt:-í.cuta o "vivido", i�t:o ê:, não a Jteta-


ção Jteat do� homen� com a� �ua� cond-í.çõe� de ex-í.�t:en
cia, ma� a mane-L-'la como (o� home' n� ) v-í.vem a �ua ,'le­
'tação com ai> condiçõe.� de exi�t:ênc-í.a. (Badiou, 1976, p.334)

o "efeito de conhecimento" ê específico da prática

científica (teórica) e implica num processo de transformação

do real. As ideologias produzem diferentemente, um "efeito de

reconhecimento", na medida e.1JI que as condições apresentadas

são re-apresentadas e não conhecidas. Ela opera por um proce�

so de "duplicação", de "repetição" e não de transformação.

Importante frisar que a oposição ciência-ideologia

nao se traduz aqui corno uma desvalorização da ideplogia em ré


8.

lação à ciência , como uma m i s t ificação s e opondo à verdade .

A c.iê nc.ia n ã o ê a v eJtda d e d e um eJtJto q u e .s eJtia a i d eo


l o g ia , ela nã o ê j amai.s .s e u �nv eJt.so , ma.s a tJta n.s 6 o Jt� .
m a ç ã o d o d omZnio i d e o l õ g ic.o em d o mZnio c.i entZ 6 ic.o .
( Kar s z , op . c it . , p . 4 0 )

Althusser ( 1 9 7 8 ) em "Elemento s de auto-critica" cha

ma a atenção para e s se ponto mos trando que a concepçao de cor­

te epi s temo lógico pode condu z i r a um desvio teor i c i s ta nao ap�

nas entre o erro e a verdade mas e ntre "A c iê nc i a " e "A i deolo

gia " i sto é , entre uma categoria geral de ciência e i deo logia .

Contra e s sa pos s i b i l i dade Althusser argumenta preci sando que

suas colocaçõe s anteriores a respe i to do " corte " ou " ruptura "

referiam-s e a uma c iênc ia particular (à ciência marxi sta ) e sua .

pré�hi s tória ideo lógica e n ão entre a c i ência em gera l e a i­

deologia em geral . Não é portanto um a di s tinção abs trata , epi�

temo lógica num sentido genéri co . D i z Althu s se r :

V e 6 at o , toda c.iinc.ia , d e.s d e q u e .s uJtg i u n a hi.stõJtia


da.s t eoJtia.s e .se v eJti 6 ic.ou como c.i ê n cia , 6 a z apaJt e ­
c.eJt .sua p�õp�ia p�e- hi.st õ�ia t e õJti c a , com a �ualua
Jtom p e , como eJtJr.ôn ea , �al.sa , não v eJtda d eiJta · . f �.s.sim
q u e ela a t�ata pJtati c am e n t e : e.s.s e tJtatam e nto e um
m o m e nto d e .sua hi.stõJtia . Ma.s e n contJtam - .s e .s em pJt e �i
lõ.so 6o.s paJta delatiJtaJt conc.l u.s õ e.s e diói ca n t e.s; paJta
6 un dam e ntaJt e.s.sa pJtãti c a Jt ec.oJt� e n t e (Jt etJto.s p e ctival
em uma t eoJtia i d ea li.sta da opo.si ção e ntJte a V eJtda d e
e o EJtJto , e ntJt e o Co n h ec.im e nto e a Ig noJtâ.n cia , e m e.s
m o (com a co n di ç ão d e tomaJt o t eJtmo i d eolog i a em um
.s entido não m aJt xi.staI entJt e a C i ê n cia e a I d eolog ia,
em g eJtal. ( Idem, p . 1 2 3 )

� pre c i so ins i s tir no caráter parti cu l ar quando se

fa la em c iênc ia e ideo logia . Conforme Badiou, " o .s únic.o.s di.s -

c.UJt.so.s c.o n h ec.i do.s c o m o i d eol õ g ic. o .s .sã o - n o n a JtetJt o .s p e c. ç ã o de

uma c.i ê nc.ia " . (op . cit . , p . 3 3 7 ) . Da mesma maneira que a ciên

cia se fa z sobre uma ideolo g ia , reciprocamente e s ta é s empre

ideo logia para uma c iência . E s e uma c iênc ia, como o materia

lismo his tórico , reconhece sua pré-h i s tória como errônea , ela
9.

também pos s ibilita a razao histórica do erro , retirando a s s im

as apropriações do " corte " entre ciência e ideologi a em ter­

mos de uma opo s ição ideali sta .

As ideologias nao sao tratadas por Althusser como

puras ilusões ( "O erro " ) mas s im como materialidade s exi sten -

t e s n o s apare lhos e nas práticas e fundamentadas na luta de

cla s se s . Da me sma maneira Althu s ser ( 1 9 7 9b ) reconhece que o

desenvo lvimento d e uma ciência não é o f im último da ideo lo-

gia , que est� pos su � uma hi stór i a real , lei s própr i a s , artic�

lações e spec i f i c a s que longe de s e constituirem l inearmente

estão antes a s s inaladas por d escontinuidade s e remane j amentos

profundos . O pensamento de Badiou ( 19 6 7 ) torna claro e s s e ú l -

t imo ponto :

a ideologia e uma in&�ância ���edu�lvel da& no�ma -


çõe� � ocia�& que a ciência não ��la d���olve� . ..
Na �eal�dade, a opo��ção c�ência-ldeologia, con��de
�ada como l�mia� do campo de uma di�ciplina nova (o
Ma�e��ali�mo Viale�icol encon��a-�e ela p�õp�ia a1
de�envolv�da, não como con��adição, � imple� , ma� co
m o p�oce� �o. ( p . 3 3 6 )

A ques tão da c iência e da ideologia não é , como se

vê , a exclu� , a negação , poi s a ideologia tanto quanto a c i ê�

cia produz . A que stão e stá em d e f inir a s condiçõe s e o s meca­

n i smos dessa produção .

As condições e s tão re lacionadas ao como se produ-

z em os conceitos humanos na h i s tór ia , seu aparec imento , desen

volvime nto , diver s i f i c ação , rupturas e subversões teóricas i n

teriores à problemát ica e à partilha progr e s s iva que s e i n s -

taura no seu dominio e ntre o s conhecimentos ideológicos e os

conhec imentos cient i f i cos e tc . E s sa hi stória , toma o s conhe c i

mentos pe lo que e l e s são quer se declararem ou não conhecimen


10.

tos , quer s e j am ideológicos ou c i e ntíficos , etc • • • c onsideran-

do-o s como produtos , como fato s , c omo resultado s , "� e.m jama.i�

�e.6le.ti� o nato de. que. e.� � e.� p�o duto � não �ão p�o duto � quai� -

que.�, ma� ju� ta.me.nte. co nhe.cime.nto � ". (Althu s ser , op . cit,p. 65)

o mecani smo e stá por sua ve z , relacionado j ustamen-

te com o " efeito de conhecimento " ( para Marx "modo de apropri�

ção do mundo própr io do conhecimento " ) . Intere s s a n e s se caso

compreender o mec an ismo pe lo qua l o conhecimento cons iderado

"�e.aliza pa�� aque.le. que. o manipula como conhe.cime.nto �ua �un­

ção de. ap�o p�iação co gnitiva do o bje.to �e.al p o � me.io de. �e.u ob

je.to ". ( Idem, p . 7 1 ) Cada um dos d i ferente s modos de apropria-

ção conduz ao mecani smo de produção de seu " efe i to " espe c í f ico .

Ass im o efe ito de conhecimento é produz ido pela prática teóri�

ca , o efeito e stético pe l a prática e s tética , o e f e i to ético pe

la prática ética, etc .

Todo proc e s s o de apropriação do real p e l a " prát i c a

teóri c a " impl ica, como j á v imo s , um pro c e s s o d � tran s formação

des se real . O obj eto sobre o qual se trabalha é um obj eto teó-

rico cuj o modo de exi s tênc i a difere inteiramente do ob j e to real

na medida em que e le é totalmente definido no proce ss o da " prá

tica teóric a " . "A ciincia não � um t�abalho de. ab� t�ação We. e.�

�a.çãoJ ma� um t�abalho na. ab�t�a.ção � e.ndo e.la �e.u me.io como a.
- -
agua e. o me.io d o pe.ix.e.". (Kar s z , op . cit . , p . 61)

A categori a de práti c a em geral é u t i l i z ada por

Althu s ser como

todo p�oce.�� o de. t�an�6o�mação de. uma de.te.�minada ma


tê�ia p�ima dada e.m um p�odu�o de.�e.�minado, t�an� 6o�
mação e.�e.�uada po� um t�abalho humano de.�e.�minado :
utilizando me.io� ("de. p�odução"l de.�e.�mina.do�". ( 1979a,
p . 14 4 )
11.

Esse é o aspe cto comum das d iversas práti ca s havendo também um

aspecto dife rencial - o emprego d e matérias primas , força de

trabalho e mei o s de produção d iver s a s . As prát i c a s d iferenci­

ais distinguem-s e ainda por seus produto s ou e fe i to s . Nes se�

tido o "efeito de conhecimento " é específico da p rática teóri­

ca muito embora as ideologias teór i c a s também produzam um "efei

to de conhecimento ideológico" na medida em que s e auto-desig­

nam como c iências .

Importante a s s in�l ar que o conceito d e prática dife

rencial é pensado como proce ss o que ocorre no s e i o da práti c a

s ocial ("e�paco onde a � p��ca� d ��e�enc�a�� � e ���cu�am de

�4�O e de di4ei�o"). ( Kar s z , op . c i t . p. 4 9 ) . As práticas nao

se excluem mutuamen te, antes , se arti cu l am e se rel acionam ao

mesmo tempo que s e d iferen c iam . I s s o confere as práticas um ca

ráter material e não abs trato nem mecânico . Não há na idéi a de

·prática teór i c a " por exemplo, a c oncepção de uma " teoria pu­

ra" . De fato, e l ementos ideológicos e pol ít i co� intervém nece�

ráriamente na prática teór i c a mas e l a o s tranforma em e l emen -

tos teóricos, e i ss o a caracter i z a . Da mesma maneira há e l emen

tos ideológicos nas práticas técn i ca e pol í t i c a s endo que es­

t e s vao operar em continuidade com t a i s e l emen to s . Mas a s re la

ções de continuidade e descontinuidade s ó podem portanto, ser

pensadas, no interior de r e l ações socia i s determinadas .

Qual seria exatamente o mecan ismo que p ermitiria dis

tinguir a prática teórica das outras práti c a s d iferenc i ai s mais

concretamente, da prática técnica que nos interes s a anal i s ar?

Em l inhas esquemáticas é possível apontar dois cri­

tério s : (Karsz, op . c it . , pas s im )


12 .

19) - Não há c iênc i a s enao na medida em que um obj eto teórico

foi construido , entendendo-se aqui como fundamental a

dis tinção entre obj et o real ( exemplo : "a população real

de uma dada sociedade") e obj eto teórico ("0 conce ito

de população e l aborado por um d i s curso teóri co " ) . A de­

terminação do obj eto teóri c o é fe i to s ob o controle e no

contexto da c iênc i a cons iderada e este contro le obedec e

a regras definida s , univocas e j us t i f icada s .


A ideolog i a teórica, conforme observa Kar sz, também

apre senta um " obj eto " coerente à lógica própr i a da ideo-

logi a , e s tando o e � emento d i ferenc iador no fato de que

e la s

d e � c o n h e c em a� � eg �a� d e c o n � ��u�ão d e � eu o b ­
j e�o e a � ��a n � 6 0 �m a� õ e � q u e aZ � ã o � n�� o d u z � ­
da� , n ã o 4ão c o l o c ada4 c o m o p�o b l em a4 4 e n ã o n a
m e d�da e m q u e e l a j á p� ê - 6�g u�a a � o t ução . A
��g o � , ela n ã o c o l o c a p�o b l em a4 ma� � o l uçõ e4 e
n u n c�ada4 � o b a 6o�ma d e q u e� � õ e� (L 11, 1 051�
Po d e-� e então d� z e� q u e um d o � pa� a d �g m a� � e�õ
��C04 d o � ( p4 e u d o ) p�o b t ema� � d e o l õ g �c o � , ê a
�aut o t o g �a . ( idem, p . 6 5 )

29) - As c iênc ias tem um caráter s i s temático i st o é, e las sao

s is temas de conc e i to s ( e l ementos teór i co s ) articulado s e

hierarqui z ados que s e organ i z am em torno de uma unidade,

a própr ia c iência cons iderada . g a l igação interna entre

e s s e s conc e i tos, sua coerênc ia progre s s iva no interior

da teoria o que garante sua função de conhec imento c ien-

tif i c o .

À d i ferença das ideologias pode - s e d i z e r que a s i s -

t ematic idade d a s teori a s é intern a, enquanto a s ideolo -

gias a procuram no s fenômeno s bru to s . Como a f i rma Ed�

Prado Coe lho , ( l9 6 7 )


1.3 •

• • o c�i�ê�io de ve�dade de uma �eo�ia ê a p�ãti


ca deaaa meama teo�ia� e nio a aplicaçio de�aateo


Jt.ia a o utlLaa pILãtica� dineILentea. E o modo como a:
�eo lLia ae deaenvolve e eatILutuILa� ae aiatematiza
e conaolida. Nio ê o �u.ce�ao o u o nILaca��o da �ua
aplicaçio num campo d o ILeal que a vão julgaIL� ma�
�im o modo como eia o u ae imo biliza e ILepete ou
ae dinamiza e ino va� o m o d o c o m o ela a�i meama ae
pILa�ica. ( p . LVI I )
• .

Cremos que nes te momento podemos retomar a questão

das práticas técnicas e e ntender em que a spectos s eu mecani smo

difere daquel e das práticas teór i ca s .


\
Fundamentalmente o que c aracteriz a um proc e s so téc-

nico , de acordo com Thomas Herbert, ( 19 7 2 ) é o f ato de que e l e

imp lica uma e strutura teleológica externa . Ne s s e sentido a téc

nica tem como função o preenchimento de uma demanda, uma nec e s

sidade que se define fora d e l a , mais e specificamente que se d e

fine no corpo social .

Essa relação de exterioridade conduz em termos de

conhecimento, a um proc e s so radicalmente diferente daquel e e-

xis tente entre uma c iência e os s eu s conhecimento s . Da me sma

man e ira, o lugar da técnica no interior de uma teoria c ienti f i

c a é radicalmente d iferente d o papel " espontâneo " que e l a a s su

me quando se e sgota em si mesma . Trata- s e, neste ú l t imo caso,

de um desvio das práticas técnicas em ciênc ias poi s que, nao

tendo se def inido um obj eto teórico , a técnica opera reprodu -

zindo-o .

Tal mecani smo de produção técnica vai atuar, então ,

�que s tões, por uma s imulação de r espo s tas que , através da

própria técnica, sao ver i fi cadas em seguida . Como diz Herbert

a 'técnica

ae deaenvo lve aa�im "e�pontaneamente" pOIL adequa­


çio pILo g!t.e�aiva de aeua inatILumento� ao "ILeal" i�
14.

�o ê, a � eu campo p�á�ico: � o da �êcnica ê �eali�ta, en


�uan�o p�ov o ca uma �e�p o � �a do "�eal" a �ua� que���e��
E.s�e mecani�mo ou e�ta o pe�aç.ã.o ê de�igt1ada po� H�bVLt
c.om o uma "�ealizaç.ã.o d o �eal" ( idem, p . 12)

Os aparelhos ou i n strumentos técnic o s tem aí, como

função, produ z ir por si mesmos o " rea l " s ob um forma relativa

à técnica considerada . Atuam portanto duplamente como "mode los

-simuladore s " ( produção do " real " a ser ver i f icado ) e como " ins

trumentos-ve r i f icadore s " (veri�icação do " real " pro j etado ) .

ESsa prática s e c ar acter i z a também por uma tautolo-

gia : e la é determinada e nquanto preenchimento de uma demanda

externa ( social ) e é determinante na med ida em que propoe um

conj unto de respostas pos s ívei s que pos sibi l i ta a existênc i a

mesma dessa demanda . ("O moinho a agua p�oduz a � o ciedade ne�

dal, a � o ciedade neudal exige o moinho ã água"). (Idem, p . 1 6 ) .

Enquanto atend imento de uma demanda d o todo social ,

a s práticas técni cas e stão em conti nu idade com o s conteúdos i -

deológicos . Não são , como temos enfocado, def inidas na e s trutu

ra de seus discursos mas no corpo soci al , por opos i ç ão à prá t i

ca teórica que se desenvo lve ao n ível dos s eu s mat e r i a i s con -

ceituais .

I s to s i gn i f ica que a s técnicas ao r e s ponderem à de-

manda o fazem nos termos dos valor e s j á con s t i tu ídos ideologi-

camente . Não se d i s tanc iam deles para cons trui r s eu obj eto, an

tes o constróem numa re lação e s trei ta com e s se s valore s . As

práticas técnicas, n e s se sentido , nao operam qua lquer ruptura

em relação ao conhec imento comum . O (pseudo ) obj eto cons truído

pela técnica é nes se sentido uma " cópi a " , uma dup l icação do

real . Referi ndo- se à Alquimia d i z Herbert :


15 .

Me� m o quando p�etendia agi�, o Alquimi� ta � e colocava


na �ealidade no po nto de vi� ta inte�p�etativo que "diz
o �eal", o ponto que "� emp�e- jâ." nala palLa dizelL o que
é, com o � e o �eal me� m o 6ala� � e. ( op . c ito p . 1 5 )

A1thus ser e speci f ica que a técnica se define por


,.

seus obj etivo s . - " o � e6eito � detelLmina d o � a p�o duzilL em tal o b-

jeto, em tal � ituação " . ( op . c it . , p . 1 4 4 ) . O s me i o s u ti li z a -

dos para atingir t a i s fins dependem dos próprios f i n s . Esses

me ios podem s e r conhecimentos tirados d e fora o u conhec imentos

que a própria prática técnica produz ( a s ideo log ias técnicas ) .

Esses " conhec imentos " sao colocados como teór icos. Diz Altlrusser:

E� � e ponto é capital � e qui� e�m o � identi6icaIL o pelLi-


go ideo lógico mai� ameaçadolL:'a clLiação e o lLeino de
p�eten� a� teo �ia� que nada tem a velL com a velLdadeilLa
teo lLia, e não �ão mai� do que �ubplLodut o � da ativida-
de técnica. A clLença na vilLtude teólLica "e�po ntâ.nea "
de técnica e�tâ. na olLigem de��a ide ologia, que con�ti
tui a e� � ência do Pen� amento Tecno c�â.tico . ( idem , ibidem)

As técnicas que con s t i tuem o corpo das chamadas C i -

ênc�as Humanas e Soc iai s , tem a í , como demons tra Herbert a

função de re sponder a uma demanda soci a l pe l a � e a l i z ação do

"�eal-p� ico lõgico com vi�ta� a uma adaptação ou uma lLeadapta -

ção da� lLelaçõe� �o ciai� a plLâ.tica � o cial glo bal". ( op . c i t

p. 26 ) .

Atendendo às exigênci a s do s i stema de produção que

caracter i z a o modo de produção cap i ta l i sta , as práticas técni-

cas se constituem em poderosos e eficazes e l emen to s de " c ienti

f i c i zação " da ideo log i a dominante . Sem intervir s obre elas , a­

tuam em continu idade , fornecendo- lhe s o re spaldo de p s eudo-teo

rias dirigidas à reprodução e reaf i rmação do s i s tema .


16 .

CAPtTULO II: O PROCESSO DE PRODUCÃO DA NORMALIDADE DA .

INTELIGtNCIA.

Tendo def inido o que entendemos por um proc e s so de

produção técnica, passamo s a veri f icar qua i s a s imp l i c açõe sdes

sa conceituação para o caso e sp e c i fico dos t e s t e s de inte l i gên


l
eia ou apt idão pSi cológica .

Conforme exp l ic itamos , o mec ani smo d a prát ica téc n i

e a funciona bas i camente p o r um a " simul ação - ver i f i c ação do

real " , um proce s so d e " r e a li z ação do real " . E l a vi s a expl icar

o fenômeno pela sua aparência, ta l corno e l e s e apresenta de i -

mediato, sem que haj a nenhum mecani smo de abstração (no sent i -

d o que A l thus ser empresta a o termo ) , s em que ocorra portanto ,

uma trans formação, por me io do trab a lho teóri co, s obre a maté­

ria prima ideológi ca .

t prec i s o fri s ar que , ape s ar de nao haver na práti ­

ca técnica um a produção t eóri c a, i s to é , a con it rução de um ob

j eto de conhec imento, as técn icas se propõem " metodo lóg i cas " ,

i s to é, vi sam sobretudo reprodu z ir e ss e obj eto teór i co . No en-

tanto, "a. JLepJLo dução metôd-i..c. a. do o bjet o de c.o nhec.-i..m ento lexp�

JL-i..menta.ção l ex-i..ge a. pJLodução de��e o bjeto" ( E scobar, 1 9 7 5 , p.

52) e na med ida em que i s so não o corre, o que s e observa não é

propriamente um trabalho de experimentação c i en t í f ica, mas um

1 Ut-i..t-i..za.JLemo� ta.-i..� teJLmo � JLe�eJL-i..ndo-n o � àquete6 -i..n�tJLUmento 6


que �o JLnec.em um t-i..p o de med-i..da. c.on�-i..deJLa.da. " o b jet-i..va. " d o c.om
pOJLta.mento e que �ã.o c.o ntJLuZdo� o bedec.endo a. nOJLma.� e c.JL-i..té�
JL-i..06 de6-i..n-i..d o� peta. P�-i..c. ometJL-i..a., JLa.mo da. d-i..� c.-i..pt-i..na. p � -i.. c. o tõ
g-i..c.a. que �e Oc.upa. da. "teoJL-i..a." e "metodotog-i..a." de c.o n�tJLuçã.o ­
d e te6te6 p6-i..c. otôg-i..C.06.
17 .

mecani smo de "simul ar -responder" técnica e ideologicamente a


necess idades externas . Tai s nec e s s idade s , v imos , defi nem- se p�

las relações sociais de produção .

Podemos loc al i z ar bas i camente como uma s imulação no

processo de con strução dos testes de inteli gênc i a , a h ipótes e


,
da normal idade da inteligênc ia-, espéc ie de núc leo art iculador

sobre o qual se as senta e s sa técnica . Esta s imul aç ão se apre -

senta inte iramente explic itada por um conj unto de prodec imen -
\ .
tos estat í stico - matemáticos que produz irão e s sa normalidad�

pas sando-se em seguida i ver i ficação "experimental" : a di str i -

buição normal d o s re sultados apresentados pelos suj e i tos subme

tidos aos testes .

Di scut iremos a hipótese de normal idade sob doi s ân-

gu1os : um pr ime iro , em que tentaremos demonstrar a inex i s tên -

cia de qualquer fundamento teór ico que j us t i f ique sua formu1a­

çao (embora e l a apele par a ele ) : um segundo , no próximo capít�

lo , que evidenc ia e s s e fundamento j u stamente na demanda social,

no seio de relações soc i a i s e spec í f i cas . D e s s a forma e speramo s

fechar o c írculo que define e ident i f ica os testes de inte 1 i -

gência como uma prática técnica : demanda externa , s imulaç ão do

real , veri ficação do real .

2 . 1 - SOBRE A HIPOTESE BÂS ICA

2 pos s íve l encontrar, de mane ira gera l , nos compên-

IA. hipõ t e6 e d e n o �malidad e da i n t elig ência � u n d am e nt a - 6 e � o b� e


o c o n c eito e� tatI6 t i c o d e di� t�i b u i ção n o �mal - di� t�i buição
c o ntInua de p�o ba b ilida d e 6 , d ed u zIv el d o t e o � em a b i n o m ial de
N ewt o n q u e � e ap� e6 e nta 6 0 b a 60�ma de um a c u� v a 6 umét�ic a ,
em � i n o , tam bém c ham a d a c u� v a n o �m al o u c u � v a d e Gau� � .
18 .

dios de Psicometria , a hipó tese bás ica que norte ia a constru­

ção dos testes de inteligência . Com algumas var iaçõe s retór i -

cas é , ma is ou menos , a mesma formulação :

Quando � e medem at��buto � humano � c o m in� t�umento � de


medida objetivo � que p�o p o �c�onam dado � em e� cala� de
inte�val o � ou de �azão , o � �e�ultad o � �e d�� t�ibuem de
aCOMO"Com a di6t�ibuição no�mal. Ta�� di� t��bu�çõ e� � e ob
tim pa�a ca�acte�ZJticaa �Z� icaa com o a e�tatu�a; pa�
�a va�iáve�a �iaio lêgica� c o m o a tempe�atu�a d o � ae­
�e� humanoa em �epouao e pa�a va��ávei� de execução
com o a 60�ça da mão medida po� meio de um dinamômet�o
.. . Em v�ata de ta�� 6àto � � e p�o pôa uma h�pôte� e �un
damental pa�a a p�át�ca da con� t�ução de teatea, a � i
be� que, ae pudi� � em o a medi� a� di�e�ença� ent�e o � úi
divZdu o � em uma eacaia de �nte�valo a, o bte�Zamo � umi
d�� t�ibuição no�mal d o � e�co�e� �ndiv�dua�� (M agnus son,
1 9 7 2 , p . 2 3- 4 )

Conforme se observa e s sa supos ição e s tá apoiada nu­

ma analog ia à s formas de d i s tr ibuição de certos caracteres fí­

sicos e f i s io lógicos .

A crença na d i str ibuição normal do s caracteres f í s i

cos é oriunda d o s estudo s de Quêtelet e d e sua teori a sobre o

homem médio . D iver sos autore s d i scutem e s s a qu�stão procurando

demonstrar que os caracteres f í s icos ( e spec i a lmente o peso e a

altura ) não s e d i s tribuem conforme a lei de Laplace-Gau s s , con

trariamente ao que s e a f i rma .

C angui lhem ( 1 9 7 8 ) em sua tese " 0 no�mal e o pato lô-

g�co ", procede a uma crí tica às ideias de Quêtelet , report an -

do- se pr inc ipalmente aos trabalhos de Halbwachs .

Após o s e s tudos desenvo lvido s por OUêtelet no campo

da biometria ver i f icando as var iações da e s tatura e l e havia e s

tabelec ido

pa�a um dete�minad o ca�acte� midico em �nd�vZduo de


uma po pulação homo gênea e �ep�e� entada g�a6�camente ,
a exi� tência de um polZgono de 6�equência que ap�e� en
tava um máximo co��e� po ndente ã o�denada max�ma e umi
�imet�ia em �elação ã eaaa o �denada. Sabe-� e que o l�
19.

mi�e do polIg ono é uma �u� v a e é o p�ôp�io Quê�el e�


qu e mo� ��ou q u e o polZgono d e 6 � e q u ê n�ia � e n d e pa�a
um a �u�va �ham ada "�u� v a em � ino " q u e é a �u� v a b i­
nomial ou ainda a �u� v a d e Gau� � . ( Idem , p . 1 2 2 )

Para Canguilhem imp l í c i ta nessa concepç ao e s tá o fa

to de Quête let não reconhecer a ex i st ênci a de outros fatores

que determinem variaçõe s individua i s , além daque las ac identa i s

( flutuações a leatór i a s ) que confirmam a l e i d o acaso . Tai s leis

falam na anulação , por compensação progre s s iva , dos e fe itos pro

duz idos por causas aleatór i a s , i sto é , não s is temáticamente 0-

r ientadas . Os fundamento s da tese de Quêtelet repousam numa ar

gurnentação de ordem me taf í s ica , ontológica :

A p�in�ipal id éia pa�a m im , é 6 a z e� p� e v al e� e� a ve�


dad e e mo� ��a� o q u a n�o o hom em , m e � mo ã � u a � e v ellã ,
e � �ã � u j ei�o ã� lei� d i v i n a � e �om q ue � eg ula�idad e
el e a� �um p� e . A liã� , e � � a � eg ula�idade não é pe�u­
lia� ao hom em : ê uma da� g�a nd e � l ei� d a n a�u�e z a que
� ão pe��inen�e� �an�o a o � a nim ai� q u a n�o a� pla n�a� ,
e �alv e z � e j a e� p a n�o � o q u e não a � e n ham o � � e�o n h e�i
do mai� � edo . ( Quêtelet apud Canguilhe lm , op . c it . ,
p . 124 )

Para Quêtelet a regularidade ontológica tem , a s s im , sua expr e s

são n a estat í s t ica e se repre senta e spec i f i c amente pe lo conce i

t o de méd i a .

Halbwachs , c itado por Cangui lhem ( id em , p . 124- 5 ) ,

afirma que Quêtelet não tinha nenhuma evidênc i a para achar que

a di stribuição da a l tura humana fosse um fenômeno regido pe las

leis do acaso na medida em que tais fenomenos não atendem uma

condição primár ia para e s sa apl icaç ão , i sto é , s erem indepen -

dentes . Para e l e , é insustentável do ponto de v i s ta humano , a

identifi cação de efe itos orgânicos constantes com fenômeno s de

terminados aleatór iamente , j á que o indivíduo humano é j u s ta -

mente o " p� o du�o d e um a u nião q u e o b e d e� e a �od o � o� �ip o � de

p� e��� i c õ e � �on � u e�udinã�ia� e l eg i� la�i v a� d e o�d em m a��im o -


20.

aial". ( idem , ibidem) . Há uma relação de e stre it a d ependência

entre o b iológico e o soci a l no f enómeno da a l tur a , o que por

si só impede uma u t i l ização correta de cálcul o de probabi l id a

-de s .

Também por r e l ação aos aspectos f i s i o lógicos , Can­

guilhem procura mos tr ar a falácia da concepção de normal idade

da d i s tr ibuição . Toma a l ongevidade p ar a a exemp l ic aç ão . Nova

mente aqui é colocada a impos s i b i l idade de s e f alar numa me -

dia global d � longevidade pois que , a vida méd i a e s t á relacio

nada a uma série de f atores tais como , condiçõe s de trabalho ,

higiene , fadiga , doença s ou s e j a , condições soc i a i s a s s im co­


,
mo f i s io lógicas que não podem , em absoluto , ser tomados como

aleatórios uma ve z que e s s e s f ator e s tem l igação com a que s -

tão econômica . " A du..ILa.ç.ão mê.d.ia. da. v.ida. não ê. a. dUILa.ç.ão da. v.i

da. b.iolõg.iea.men�e nOILma.l, ma.� ê., em eelL�o �en�.ido, a. dUILa.ç.ão

de v.ida. � oe.ia.lmen�e nOlLma.t:.iva.". (Idem , p . 1 2 4 )


.

A duração d a vida humana depende dos " n ívei s de v i

da" que esse homem l eva , o que não permite e s t abelecer uma

normalidade no sentido e s t a t í s tico do termo . Admit í - l a ser i a

também admitir o desvi o , o nao - normal por relação a o que e


-

frequente . Ser centenário , nesse c a so , não s er i a a lgo normal

quando se pode d iz er que biologicamente qualquer serhumano p�

de , normalmente , viver cem anos , embora n ão se observe tal f a

t o frequentemente . Aqui Q� traço não é con s i derado normal por

ser frequente , ante s devendo ser frequente por ser norma l .

Cangui lhem toma outros exemplos para trazer a tona

a ,refutação da normal idade dos c aracteres biológicos . Implíci

ta está sempre a idéia d e que a saúde ou a norma l idade nao po

dem se apresentar em conformidade com um ideal externo -"a.�le


21.

�4 p4IL4 o COILpO, b4ch4ILel p4IL4 4 in�eligênci4". ( id em , p. 1 3 1 )

Ass im , a s normas f i s iológicas ou anatômicas d e f i nem não pro ­

priamente uma naturez a humana mas , n a rea l idade , hábitos huma­

nos que e s tão l i gados ao gênero de vida , ao �ível de vida e ao

ritmo de vida .

. C itando Sorre, Cangui lhem chega à r e l a t iv i z ação do

conceito de cons tante f i s io lógic a .

A� c o n��an�e� �i6 iol;g i c a� n�o ��o con��an� e� no � e n


�ido a b�olu�o d o �eILm o . PaILa c a d a �un ç� o e paILa o
conju n�o d e �un ç õ e� há um a m aILg em em q u e e n�ILa em j o
g o a capacidad e d e ad ap�a ç � o �u n cional d o g IL u po ou
da e�p ê ci e . A� c.o n d i ç õ e� id eai� d e� eILminam , a��im, u m a
zona d e p o v o am e n�o e m q u e a u n i�oILmida d e d a� c.aILac.� e
IL1.��i c a� humana� �ILa d u z. n� o a i n êILc.ia d e um d e�eILmi::
ni�mo m a� a e��a bilidad e d e um IL e�ult a d o m a n�ido p O IL
u m e��oIL ç o c.ol e�iv o , i nc.on�c.i e n� e , p O IL em IL ea l . ( Idem,
ibidem )

A cons tante f i s io lógica, para Cangui lhem , expr e s sa

um estado f i s iológico ideal que i n c lu i uma série de condiçõe s,

muitas das qua i s criadas ou trans formadas pe lo próprio homem .


.

Importante observar, em todas as anál i se s desse au-

tor , a preocupaçao em d i s so lver a exi s tênc i a de qualquer con -

cepçao e s senc ial para o s proce ssos biológicos enquanto tomado s

pe lo seu movimento aparente . H á a s s im um remet imento a o que ele

chama o verdadeiro pape l da f i s iolog i a : abandonar a s posturas

que a faz em pas sar por um método prec i so de reg i s tro e vo ltar-

s e para a " normat ividade original da vida " , i sto é , a busca ex

pl icativa do s fenômeno s .

Miche l Tort (1974 ) examina detalhadamente também, o

problema da norma l idade dos caractere s f í s i co s pelas teses de

Quêtelet . Segundo e le,

a l ei�uILa d o � �ex�o� d e Qu ê�ele� ê in��ILuti v a . A pIL e n


d e-�e 41., no�ad am e nt e , e��a c.oi�a e��u p e�a n�e: Qu ê�e
le� jam ai� c.on�eg uiu d em o n��ILaIL e x peILim e n�alm e n t e �ua
22.

lei. Quê�e!e� jamai� c o n� eguiu enc on��a4 n o � na�o �uma


di��4ibuiç.ão que J10��e ve4dadei4amen�e n04ma!. ( p . 9 6 )

Os dados experimentais de Quêtele t , s egundo Tort ,

para e l aborar sua teor i a , foram tomados de mensurações e fe tua-

das por mi l itares durante o período de r ecruta�ento e revi são

dos soldados . Inicialmente ele u ti li z ou e s ta t í s t icas francesas

e posteriormente bel ga s , i t a l i anas e americanas mas , conforme

'l'ort , em nenhum dos casos Quêtelet con s e guiu observar uma di s -

tribuição gaus s i an a .' As curvas encontradas s e apre s entavam , a o

contrário , ass im con f i guradas : e l evada quantidade de baixas aI

turas , e l evada quant idade de a l turas méd i a s e ausênc ia de gran

-des a lturas o que , c ertamente , nada tem de s emelhante à curva

norma l . ( idem , ibidem )

A d i ferença nes sa s observações é j ust i f ic ada por

OUêtelet atravé s dos erros de mensuraçao . Tais e rros serao i-

dent i f ic ados
ora como devido a f raude s , ora a falta de padro-
.
nização nas condições de mensuração (medidas f e i t as a o lho nu

• • • ) . De qualquer forma , como demonstra Tort , ê pos s ível ver i -

:ficar que :

- Quê�e!e� �4aba!hou � ob4e dado � mui�o pouco � egu�o � ,


e� 4e!aç.ão a lei que ele quiz e� �abe!ece4 com p�ec�
/)ao ;

e/)/)e/) dado� não lhe pe�m·i�..i.JLam jamai/) o b � e�va4 uma


di/)�4ibuiç.ão no�ma!.
(idem , p . 9 8 )

Tort enfa t i z a a gravidade das consequênc i a s quando

se tomam as constatações de Quêtelet como finai s : não só se e s

tá e stabelecendo um a l e i e m c ima de hipótes e s e mpiricamente não

controladas mas , também, e s s a l e i é generali z ada para o homem

de maneira integral .

A incon�i� �ência expe�imen�a! da �e o4ia de Quê�e!e�


ê pe�nei�amen�e co nhecida e 4e�omada a in�e4va!o � �e
23.

g ula�e� ( Ha l b wa e h� , G�n� , e�e . ) . Ma� �udo � e pa� � a


eomo � e Hal b wa e h� ou G�n� nada ��v e � � em e � c���o. Po�
qu e ?
( id em , p . 9 9 )

Se por re lação à e statura Quêtelet nao encontra uma

curva de Gaus s também em relaç ão ao peso , para uma dada idade ,

Ruth O ' Brien não consegue ver i f icar a d i s tribuiç ão normal .

Seus e s tudos foram real i z ados nos EEUU com uma amos tra de

1 4 7 0 8 8 menino s e meninas branco s , americanos de 18 e s tados d i -

ferente s e contrar iamente a tese d e Quête let i o s pe sos raramen

te apre sentaram a forma previ sta ( O ' Brien apud Tort , op . cit ,

p . 100 ) 1 •

Autore s franc e s e s (Aubenque e Thionet ) c itados por

Tort , fazem constataçõe s idên t icas com e s tudante s francese� t�

mando inc lus ive urna população da me sma a l tura, o que dá aos r�

sultados ainda maior s ignif icação . ( idem , p . 1 0 0 - 1 0 4 ) . são co-

mentários do autor :

o � p e � o � d e uma po p ulação d e e� tudant e� d � m e� m a �


dad e e d o m e � mo pal� não � e � epa�t em d e um a m a n e� ­
� a g au � � �a na p o � q u e � a t o � e � im po�ta n t e � d e di 6 e 4 e n
ciação ( � e g i o nai� . e lim itie o � . alim e nta� e� , m a�
tam b ém � o ciai� . . l i n t e4 v êm d e m a n ei�a m a� � i v a � o ­
.

b � e e � ta di� t�i b u i çã o . ( idem , ibidem )

O mesmo ocorre com a s a l tura s notadamente no tempo

de Quêtelet em que for t e s fatore s de heterogeneidade interv i -

nham assim , a l imentares , c l imáti co s , sociai s .

Finalmente Tort observa que a curva normal de cer -

tos caractere s biológicos é perfe i tamente pas s íve l de ser ob­

servada, de sde que se preencham dua s condiçõe s :

19 ) quando o s fatores que intervem na d i stribuição

podem ser vi stos como aleatórios, observando-se uma série de

1 'P1tIta. maio�u in60Junaçõu V e4 tabela e gJr..á. 6icoll 4ep!l.oduz.i..doll em To�, 1.1 .


op. cit. , p . 1 0 0 .
24.

pequenas causas , i�dependente s , cuj o s efeitos tendem a s e anu-

lar ;

29 ) quando a observação abarca uma população forte­

mente homogênea exc luindo-s e portanto qualquer f ator pos síve l

de d iferenciação e de heterogeneidade .

I n v e�� am e nt e , toda� a� v e z e� , d i z emo� b em : toda� a�


v e z e� em q u e � e m ed�u a d�� t�i b ui c ão d e uma ca�ac t e ­
��� t�ca biol 5g ica ( p e� o , altu�a e out�o� t�a co� a n -
t�opom i t�ico� ) � o b� e a � ual ag iam � a to� e � d e d i � e� e n
ciação ( d e v ido� ao clim a , ã � e� i d ê n cia , ã idad e , ã
cla� � e � ocial , etc . ) não � e o b � e� vou jam ai � u m a di� ­
t�i buição gau� � ia na.
( idem , p. 9 2 )

Pelo exposto observa-se que nada exi s te que con f i r­

me a lei de Quête let para os caractere s bio- antropométricos. Ob

servam-se di str ibuições normai s de peso e a l tura , �s�o�b��c�e�r�t�a=s

condições, tanto quanto nao s e observam sob outra s condições .

Se a população é fortemente homogênea ( quando ? ) é possível que

se encontre uma normal idade p ara os caractere s biológicos mas

não se encontrará se a população é heterogênea e s e fator e s de

di ferenciação que não se anulam por compensação p rogress iva aí

intervêm .

Exi stem s i tuações em que certos fatores de d i feren-

ciação podem ser enfraquec idos ou neutr a l i z ados por mudanças

externas, favorecendo o aparecimento da curva gaus s i ana . Como

mostra Tort i s so ocorreu com as alturas dos fran c e s e s que , a-

tualmente , têm suas d i ferenças atenuadas pelo fato da escolari

dade obrigatóri a ter impedido o trabalho precoce , fator de fOE

te di ferenc iação, j á que cr i anças de c la s s e s economic arnente mais

baixas iniciavam o trabalho em idade tenra , enquanto as de c l a�

se alta o faz i am geralmente após os 2 0 anos ( sendo que os pri -

meiros no trabalho manual e os segundos , em geral , no trabalho


25.

intelectual • • • ) idem , p. 10 4 - 5 ) . Tal fato nao s ó c onfi rma a

inexi stênci a da norma lidade como demonstra que o fator . soci"al

não é a leatór io

Tanto Cangui lhem quanto Tort i n s i stem no aspecto de

que fatores econômicos , soc i a i s , fami l iare s não podem ser vi s -

tos nem como independentes nem como micro fatore s que cheguem a

fazer da população um conj unto homogêneo. Não há uma aleatori e

dade n e s s e s fatores mas , ante s , um a s i stematic idade que inter-

fere necessar iamente sobre a var i áve l em e studo.

Porém , quando se formul a a h ipóte se de uma d i stri -

buição normal da intel igênc ia parece que não se l eva em conta

nenhum dos argumentos apre sentados . Ao contrári o , de l iberada -

mente , o que se aceita com e ssa h ipóte s e é o fato de que a in­

teligênc ia vari à segundo fatores a leatórios , independente s , de

baixa intensidade e cuj os e fe itos tendem a se anul ar ( não afe-

tando portanto a vari áve l , a nao ser nos l imit � s do e sperado ) .

D i z Tort :

O�a , e & ta� hipõte& e& , & ão d e& m e ntida& po� todo e & t u ­
d o e& tatl & ti�o � ê�io � eali z ado & o b � e um a amo& t�a v á ­
lid a da popula ç ão 6 � a n � e& a . t o � a & o d 4 p e & q ui�a do
l N EV l �om 1 0 0 0 0 0 0 ��ian ç.a� . ( idem , p. 2 3 - 4 )

Tal pesqu isa reali zada com crianças oriundas de c la s s e opera -

r i a e cr ianças f i lhas de c lasse a lta , demonstrou que o QI ( qu�


2
c iente intelectual ) e stá fortemente ligado à origem de c la s s e

l
pe& q ui & a � eali z ada p elo l n& titute National d ' t tu d e & n emog � á p h�
q u e& � u j O & p�im ei�o& � e& ultado& 6 o�am pu b li �ado& no Cah i e� nq
6 4 d e l ' I N EV . A & ta b ela& 6 o�am � ep�od u z ida& e m T O R T . U , op . cit .
p. 2 3 - 2 4 .

2 V e a�o�do �om a � ev i & ão d e 1 9 1 6 do t e & t e S t a n 6 o� d - Bi n et , o


QI ( Quo� i e n t e I nt el e � tual ) , ê a �a z ão e nt� e i d ad e m e ntal e
ida d e ��onolõg i�a m ultipli� a d a po� 1 0 0 ( � em ) . t �on& id e�ado
" no�mal " o indiv lduo q u e ap� e & e nta & ua idad e m e ntal ig ual i
��onol õg i �a , po�ta nto um QI ig ual a 1 0 0 ( � em ) . R e& u lta do& � i
tuado& a baixo ou a � ima d e 1 0 0 l ev am a po�tula ç. ão d e � eta� d a�
m ento ou a � e t e�a ç. ão do d e& e n volvim e nto i ntel e �tual .
26 .

e ao tamanho da famí li a , fatores (e não-mini - f atore s ) que nao

só não se anulam como tendem a se acumul ar.

A� m êd�a� e n con��ada � v a��am d e 9 2 . 6 pa�a o� 6 �l ho �


d e ope�á��o� a 1 1 1 . 5 pa�a a � c��a n ç a � 6 i l ho� de
cla� � e alta . A i n d a a q ui a � m êdia� , � e n d em , como � em
p� e , a an�q uila� a � di � e� e n ça� : e n q u a nto 7 1 % dah
c��a n ça� d e nZv el a lto t em um QI � u p e�io� a I OS,
6 8 , 9 % do� 6 �l ho� d e op e��o� t em um Q I i n 6 e��o� a
7 0 0 . S a b e ndo- � e q u e O h p � i c õlog O h con� id e�am a � n t e
lig ê nc�a no�mal como ig ual a 1 0 0 , iJ to � �g ni 6 i c a dI
z e� q u e a q ua� e totalidad e do� 6 �l hoJ d e op e�á�ioh
�ã o a no�mai� ; o� 6 �l ho� d e ClaJ h e alta o � ão tam b êm
a � ua m a n e i�a , po� ex c e� � o . . . (idem , p . 8 8 - 9 )

As duas d i s tr ibuições encontradas na pesqu i sa sao

bastante d i ferente s e Tor t afi rma que há menos d e uma chance em

mi l de que e s sas duas d i s tr ibuições sej am r e ti r adas ao acaso


1
de uma mesma população homogênea norma1. ( idem , ibidem )

Através da h ipóte se de normalidade a população é ho

mogene i z ada e através de um art if í c i o (os t e s te s ) tenta- se che

gar a e s s a homogene idade . O que s e percebe , no entanto , e que


-

os resultados dos traballxs muitas ve z e s contrad i z em por s i pro


-

prios a hipóte se formulada. I sto não é o bastante nem para re­

futar nem para se procurar uma outra via de pe squ i s a . A hipót�

se de normal idade não é ques tionada . . •

Conforme Tor t , se se demon stra que o QI depende de

um fator máximo de d i ferenc iaç ão que é a c la s s e soc i a l , e se o

QI não pode ser c a 1 =u1ado a não ser que se d i s s o lva e s sa dife-

rença numa hipóte se de homogene idade , e stamos d i ante de um pa-

radoxo . ( idem , ibidem )

Também Anas t a s i (19 6 7 ) f a z r e ferênci a à e studos em

que os resultados " suger em " que a d i s tr ibuição do Q I na popu 1�

çao total apresenta um exce s so de Q I mui to baixos em relação ao

l
f� � a a 6 i�ma ç ão ê 6 eita com b a h e no c á l c ulo d e p�o b a bil� d a d e
� eali z ado p elo auto� .
27.

que se e speraria em uma curva normal .

Em uma p e � q u � � a c u�d ado� am en�e � eal� z ad a , n um a amo� ­


��a q ua� e compl e�a d e c ��a n ç a � na� c �d a du�an�e um p e
�Zodo d e q u a��o a no� , n a c � d a d e d e Ba� h , n a l ng la�e�
�a , a p�opo� ção d e c a � o� com Ql a ba�xo d e 4 5 e�a c e4
ca d e 1 8 v e z e� m a�o� q u e a e � p e�ada em uma d � � �� i b uI
ção no�mal . (p . 4 6 )

A exp l i cação dada pela autora para e s s a constatação

é a de que e s se de svio da normal idade deve provir de doenças

ou cond ições patológ icas que e l evam a proporção relativa de

pes soas infradotada s . I s to, segundo Anasta s i , s e r i a um caso de

fator único que acrescentando- s e aos casos de fatore s múlti

pIos , que se e sperari am por acaso em uma curva norma l , produz i

ria na extremidade baixa d a d i stribu ição um aumento d a propor­

ção e sperada . ( idem , ibidem ) .

Efetivamente s ó lançando mao de cond iç õ e s pato lógi-

cas os ps icólogos construtores de teste admitem um desvio da

normal idade . Esta pré-exi s te e mais uma vez , nao é colocada em

questão . Como afirma ainda Anata s i ,

um d e� v �o ��g n � 6 � ca�� v o d a no�malidad e pod e� ã � n d� c a�


q u e o � e�o d o � e��e é m u��o b a �x o , q u e o p o n�o z e� o é
m u��o e l e v a d o o u q u e c e��a� po� ç õ e� da ampl��u d e de
d � 6� c u l da d e e�tã o i na d e q uadam e n� e c o b e��a� p el o � ��
ap� e� e n�ad o � n a � e � � e . O u pod e� - � e - ã e v i d e n c �a� alg um
6 a�o� � el e�� v o , at é e n�ã o � n�u�pe�to , q u e o p e�a na a ­
mo���a � o b e�tudo. ( idem , p . 4 7 )

Mas nao poderá suger i r que a normal idade nao exi s te • • •

Na real idade , a colocação fundamental do s autore s

não é d i scutir se a hipótese de normal idade é vál ida o u não. Ao

contrár io e l a tem que pairar ac ima de qualquer dúvida poi s e

neces sário que e l a exi sta para que s e pos sam medi r traços p s i ­

cológicos .

R�go�o�a m e n t e 6 al a n do ê �m po� �l v el d et e�m�na� a v e�­


dad ei�a di��� i b u i ç ão d e uma v a��ãv el � e n ão t emo� uma
e� c al a d e unidad e� ig uai� pa�a m ed i - la . Ma� , o� ú n � -
28 .

c o � m êt o d o � di� p o nZv ei� , n o m o m e nt o , pa�a o d e� e nv o l


v im e nto d e u ni.dad e� ig uai� em t e � t e� p � i c o l õg i c o � b(i
� eiam - � e , e l e� p�õp�io � , n o p� e � � up o � t o d e q u e o t4a
ç o � o b inv e� tig a ç ã o e n c o n t�a - � e n o �malm e n t e di� t�i 7
buido ! l ndag a� qual a " v e�dad ei� a " di� t4i b u i ç ã o de
um t�a ç o p�ic o l o g i c o é a � � im , p e l o m en o � a t u alm e nt e ,
uma p e � g u nta d e�p� o v i d a d e � entido . ( idem , p . 4 2 )

As palavras equivocadas , para não d i z e r absurdas, da

autora , deixam c laro que a hipótese de normal idade , longe de

se constituir numa a firmação conj ecturaI repre senta ante s , um

mecani smo de produção s im� lação da r e a li dade s obre a qual e


-

enunc iada a hipóte se . A produção obedece , como bem o a firma

Stevens ( 1 9 7 6 ) , a uma e spéci e de mag i a . F a z - s e uma aproximação

ou uma sucessao de aproximaçõ e s a partir da supos iç ão de urna

distribuição norma l , de modo que quando se meçam os indivíduos

apareça a d i s tribuição suposta . Mas como ainda d i z S teven s ,

e� t e p�o c e dim e nto , o b v iam e nt e , n ã o é m el ho � q u e o p o ,�


tulado g�atuito ( o g 4i � 0 é n o � � o ) q u e o � e�palda , --- e
a q ui t em o � d e 4 e c 0 4 da4 o q u e d i�� e R U 6 6 el a � e6 peito
do a� de lad�ão q u e t em a p o � tula ç ã o . l ( p . 6 8 )

2.2 - A CONSTRUÇÃO DA ESCALA INTERVALAR DE MED I DA

Examinemos como procedem o s construtore s de testes

quando querem e laborar um teste de int e l igência que forneça ure


2
medida a níve l de uma escala intervalar . Ini c i a lmente toma- se

l
Stev en6 � e 6 e� e - 6 e a� c�Ztic a � d e 8 e� t� a n d R U�6 e l ã p 0 6 tula ç ã o
p o u c o c�it e�io�a : " o m ét o d o d e p 0 6 tula�" o q u e q u e� em o � t em
muita6 v antag e n 6 : a6 m e�ma6 q u e t em o � o u b o 6 � e nt e a o â�duo
t�a balho ho n4ado . ( Ru 6 � e l apu d S t ev e � , o p . c it . , p . 42 )

2
T�ata - � e d e um a e� c ala d e m e dida em q u e é p 0 6 6 Zv el c o n h e c e4 a
mag nitu d e d 0 6 i n t e�v a l o � ( di6 t â n c ia6 ) e nt� e 0 6 o bj et o 6 d a e6 -
c ala . C a� a c t e4i z a - 6 e p o � uma u nida d e d e m edida c o m um e c o n 6 -
tante q u e d e6 ig na um núm e4 0 � eal a t o d 0 6 0 6 pa� e6 d e o b j eto�
em um c o n j u nt o o�d e nado . S om e n t e a o nZ v el d a e 6 c ala i n t e 4 v ala4
ê po � � Zv el o p e4a� num e�icam e n t e , �a z ão p o � q u e � e b u � c a a t i n g Z­
lo .

n
29 .

uma amos tra de suj ei tos que deverá ser " su f i c i en temente gran­

de" para ser cons id erada repre sentativa da popul ação , a respe!

to da qua l se fez a supos ição de norma l idade . Na real idade há

um grupo de supo sições sub j acente s a e s sa ou a i nd a , que desem­

bocam nessa : pr ime iro a suposição de que a var iável é contínua,

depois que e l a é uma função monotônica ( cresce ou decre sce numa

única d ireção ) da pos ição no contínuo e f inalmente que e l a se

d i s tribui normalmente . Importante fri sar que , à d iferença de

um trabalho no qual se procura o conhecimento d o obj eto pe l a

via teóric a , aqui , são os próprios psicometr i s ta s que insistem

no caráter pragmático d e s s e s procedimentos . As supo s i ções f e i ­

t a s são , a s s im , sempre j u s t i fi cada s pel a " ne c e s s idade prática".

o fundamental é medir a intel igênc i a para que se pos s a , a par-

tir daí , c la s s i ficar , hierarqui zar e s e lec ionar .

Tendo- se e scolhido a amostra , o passo seguinte con-

s i ste em apresentar a cada um dos suj e i tos uma questão para �

resolvida , diante d a qual a lguns conseguirão resolver e outros


·
nao . A proporção daqueles que puderam resolver o ítem expressa

rá o " grau de d i ficuldade " do ítem . Levando- s e em cons ideração

as suposiçõe s anteriore s , supõe-se também que aquel e s indiví -

duos que acertaram o ítem se encontram loc a l i z ados em pontos

mais altos no " contínuo de d i f ic u ld ade " que aque les que erra-

ram.

As sim , a po s ição dos indivíduo s é f ixada em relação

à posição dos i tens , mas a pos ição dos i tens por sua vez foi dete!,
l
minada pelos e scores dos indivíduos . A pos ição dos i tens e

dos ind ivíduos somente pode determinar-se por rec iproc idade .

I Ven o m �na - � e e� c o �e o núme� o � o �al de �e� p o � �a� c o ��e�a� em


um �e� te de c a p a c � d a d e .
30 .

D i z Magnus son ( l9 7 2 } :

o c o n tI n u o � o b� e o q u al t em o � d et e�m i n a d o a p o � i ç � o
d o It em , t em � i d o d e � c�ito c o m o u m c o n tI n u o d e d i 6 i
c u l d a d e : a p o � i ç � o d o It em em � e t a ç � o � di� t�i b ui �
ç � o hip o t �tica d o � e 6 c o � e � i n d i u i d u a i � d a c a p a c id a ­
d e d e e x e c u ç � o , n O J d � o n I u e l d e di 6 i c u l d a d e d o I �
t e m . P o � t a n t o , t am b im � um c o ntI n u o d e c a p a c id a d e
q u a n d o 6 i x am o � a � p o � i ç � e� d o � i n d i v I d u o � ; a p o � i -
ç � o d o i n di v I d u o � a b� e o c o n t I n u o � e p� e � e n ta . � ua
c a p a c id a d e . E a n ela ç � o e nt� e a c a p a ci d a d e d o i n d i ­
v Id u o e o g � a u d e d i 6 i c u l d a d e d o It em o q u e d et e�m i
na � e o i n d i v I d u o p o d e o u n � o � e � o l u � - l o . S e a p o �7
ç � o d o i n div I d u o n o c o n t I n u o i m ai� alta q u e a p o �7
ç � o d o Z t em � e l e p o d e� � n e� o l v � - l o , p o � im n � o p o d e�
�� � e a � ela ç � o i i n v e� � a . ( p . 2 8 )

Para a compo s i ç ão do t e s t e s a o e sc o lh id o s i te ns

com d i ferente s g raus de d i f icu ldade de f orma a o b t e r - s e uma d i s

tr ibu ição norm a l d o s í t e n s b a s eada na sua d i f icu l dade c r e s cen­

te : baixo percentual de í te n s f & c e i s , a l to percen tua l de i te n s

med i ano s a ba ixo percentual d e i t e n s d i f ic e i s .

Ver i f i c am o s a s s im como e s s a d i f i cu ldade , que f o i de

term inada pelos i nd ividuo s que r e sponderam a o s i ten s � num se-

gundo momento p a s s a a s e r trabalhada c omo u m a spe c t o i n tr i n s e -

c o a o i tem . O mecani smo portanto é s imp l e s : uma v e z que o s i-

tens sao e s c o lh i d o s l evando- s e e m conta o s percentu a i s c i ta -

dos , i sto produ z ir& ( s e tudo der c e r to ) uma d i s t r i b u i ç ão nor -

m a l dos r e s u l tados dos ind ividuos no t e s te g loba l . As s im , t e r -

se-a um grupo ( mu i t o r edu z ido ) do s q u e c o n s e g u i r ão f a z er o t e s

te comp l e to o u qua s e comp l e to , um g r ande g r u p o que f a r & o t e s -

te sem r e s o lver o s i t e n s ma i s d i f ic e i s e u m pequeno g rupo que só

conseguir& f a z er o s i te n s f á c e i s / obtendo- s e as s im a curv a g au�

s i ana .

Os r e sultado s do t e s t e f ornecerão d e s s a mane i r a a

evidênc i a de que ex i s tem s u j e i to s super iore s , méd i o s e i n f r a -

dotado s , cu j o s percentu a i s na popu l a ç ão s e mantém c o n s t a n t e s .


31 .

Ta i s r e s u l tados nada ma i s r epre s e ntam do que o propó s i to in-

t r í n seco de um t e s te d e c l a s s i f ic ar a m esma p e r c entagem d e .pe�

soas numa dada c ategor i a .

P o � e x em pl o , o A�m y A l p h a T e � t u � a d o n a P�im ei�a


G u e��a M u n d i a l 6 0 i c o n 6 t�uZ d o , e nt� e o ut�a6 �a ­
z 5 e6 , p a � a 6 el e c i o na� h o m e n6 p a � a 0 6 p 0 6 t 0 6 de
0 6 i c i ai 6 . 0 6 i t e n 6 d o t e � t e e � t a v am e � c o l hi d o 6 de
tal m o d o q u e a p e na 6 5 % o u m e " o � d e q u al o u e� g � u ­
p o m � d i o 6 0 6 � em c a pa z e6 d e t ehm i n a� a � �� i e in ­
t ei�a n o t em p o 6 i x a d o . 1 6 � O 6 0 i a� � im p o � q u e a p e
na� 5 % · o u m e n o � c a n d i d at o 6 e�am n e c e 6 � ��i o � .
-

( S c hwebe l l , op . c i t , p . 6 7 )

No entanto , a par t i r do momento que s e tomam o s r e s u l tado s (a

pena s 4 , 5 % apr e sentou e score máx imo , c on forme s e p l ane j ou ) co-

mo ind i c adore s de uma i nte l ig ê nc i a · super ior , c he g a - s e , s em dú-

v ida , a uma conc l � s �o e spúr i a .

o mec a n i smo anter iormente d e sc r i to demon s t r a c l ar a -

mente o proce s so de " re a l i z aç � o do r e a l " de q u e n o s f a l a Herbert

e sobre o qua l d i s c or remo s no c a p í tu l o ant e r i o r .

Sabemo s per f e i t amente que o s pr ime i r o s t e s te s de in

t e l igên c i a surg i r am numa tentat iva d e dupl ic aç �o d e cond i ç õ e s

j á dadas : o prob l ema e s t ava e m c hegar a urn a f o rm a e f i ca z de

d i s tingu ir c r ianç a s previamente c o n s iderad a s a tr a sad a s de c r i -

anças cons ideradas norma i s . O t e s t e de Ot i s p a r a C l a s s i f i c a ç ão

Rápida de Apt idão Menta l , (O t i s Quick S c o r i ng Men t a l Abi l i ty

Te s t ) , em seu manu a l de in s truçõ e s d e 1 9 3 9 , d i z o s eg uinte so-

bre a s f in a l idades dos t e s t e s de aptidão mental �

1. Pa�a d i n � d e e n � i n o , d e 6 e o b�i� q ua i� O � a lu n 0 6
q u e � a o b�il h a n t e � e c a p a z e � d e � ea li z a� me­
l h o � t�a b a l h o e � c o la� d o q u e e � t � o 6 a z e n d o ; e
d e � c o bhi� q u ai� 0 6 a l u n o � q u e 6 a O o b t u � o � e p o
d em e � ta� t e nt a n d o tl!.a b a.f.. ha� a l �m d e � u a 6 c a pa -
cida d e 6 .

2. Pa�a 6 Úl � a d m i n i 6 tfwt i v o .6 , Jt e. C'..l a � � i 6 i c aJt o � a ­


lu n 0 6 d e m o d o q u e c a d a 6 �hi e 6 e j a m a i � h o m o g � -
32 .

n ea. e,m a.p:U.. d ã. o m e nta..t e. , p O h.. t a n t o , e. !:J t e j a. ha b J.. .tUa


d a a ph.. o g h.. e d J.. h.. n u m a c a d ê. n c J.. a m aJ.. -6 u n J.. 6 o h..m e. d o q u e
d e o u.th.. O m o d o .

3. Pah.. a 6 J.. n -6 a d m J.. nJ.. -6 th.. a tJ.. v o � , c l a. -6 -6 J.. 6 J.. c ah.. 0 -6 a iu. n o �
e m g h.. U. p 0 6 6 e.p ah.. a d o 6 d e n th.. o d a 6 h.. e-6 p e. c. tJ.. v a -6 ,� ê.h.. J.. e -6,
d e m o d o q u. e. o � a .t u l1 o -6 m a. L� bh.. J.. .t ft a ll t e. 6 .0 u m a ,{. � m a ­
dU.h.. 0 .6 I.> e. p O -6 l.> am b e. n e 6 J.. c J.. a h.. d e u m c UfLh.. l c. u .t o e nh.. J.. -
q u e c.J.. d o e d e m o d o q u e a o ,'\ a iu ll o -6 m a ..i. -6 o b t u -6 o ,'\ o u.
m e n o l.> m ad uh.. o l.> I.> e j a p e � m ..i.t..i.d o ph.. o g h.. e d ..i.h.. n u m a c. a d ê. n
c J.. a m aJ.. -6 .t e n t a
( id em , p . 8 5 )

Certamente que ho j e não encontramos t a l exp l i c i ta -

çao nos d i scur s o s sobre te s t e s de apt id ão , ma s nem por i s so o


.
mecan i smo que mantém e amp l i a o u s o d e t a i s t e s t e s s e mod i f i

cou .

Impor tante ver i f i car que , no exemp l o c i tado , o te s -

t e v i s a a obtenção d e r e s u l tado s d � s t r i bu í d o s normalmente , pa�

tindo de um dado anteriormente j á f ixado : a ex i s tênc i a de i nd i

víduo s l o c a l i z ados d e mane i r a super ior , " méd i a " e i n f er ior na

h i er�rqu i a e sc o l ar . O s t e s t e s r eprodu z em ' e s s a d i s tr i b u i ç ão e

dão a i s so o nome d e i n t e l i g ênc i a . D e s s a forma , s em operar qua!


quer tran s formação sobre o r e a l imed i a to , a n t e s o c op i am , for-

necendo pela técnica a j u s t i f i c at iva nec e s s á r i a para a e l a s s i -

f icação s oc i a l d o s i nd iv í duo s .

Aqu i g o s ta r í amo s de novamente t r a z e r Gaston Bach e l ard

(1972) que , e s tudando a f ormaç ã o d o s conc e i to s no c ampo de c i -

ênc i a s part ic u l a r e s ( F í s i c a e Qu ím i c a ) , c l ar i f ic a o mecani smo

de conhec imento que s e opera quando não há um d i s tanc i amento do

senso comum . Atravé s d a noção de m as s a B a c h e l ard demon s trou o s

d iver s o s níve i s de II matur ação ll do pen s amento c i e n t í f i c o . ETl

sua forma i n ic i a l , o conc e i to de m as s a " c o h..h.. el.> p o n d e a um a ap�!


'
c J.. a ç. ã. o q uantLtatJ.. v a g h.. O I.> l> e -<-h.. a e c. o m o q u e á v J.. d a da h.. e a .t ..i.d a d e " •

(p . 3 0 ) . Aqu i , a ma s s a é conhec id a p e l a v i s ão e e s tá em r e l a -
33.

ç a o d ireta com a nece s s id ad e . A s s im é que ,

pa�a um a ��ia n ç a � v ld a , o 6 � u t o m a i o � � o m e l h o � , a ­
q u el e q u e 6 a l a m a l � c la�am e nt e a o � e u d e � e j o , a q u el e
q u e � o o b j e t o � u b,5 ta n c ia,e. d o d e � e j o . A Il a ç ã o d e m a �
� a c o n c n eti z a o pJt õ p� i o d e ó e j o d e c o m e� . ( id em, ibidem)

T a l noç ao imed i a t a s e r a , p e l a contrad i ç ão , ( o m a i or

nem sempre e o ma i s p e s ado ou ma i s r ic o ) p au l a t in amente inte -

r io r i z ada e apro fundada dando' o r i g em àqu i l o que Bachel ard cha-

ma de " conc e i to-obstáculo " : " e� f- e c o n c ei t o b l o q u. e i a o c o n h e c i -

m e nta , n ã o o � e � u.m e " . ( i d em , i b i dem ) . Num s egundo n ive l e m que

o conce i to de ma s s a é e s tudado , Bache l ard ident i f ic ará o que

e l e chama a " conduta da b a l anç a " . O conce i t o e s tá aqui i n t ima-

mente l i g ado à ut i l i z aç ão d a b a l ança , b e ne f ic i ando- s e portanto

da obj e t iv idade i n s trumenta l . M a s deve - s e o bs ervar que , então ,

o " i n strumento precede a sua t e o r i a " e não ao contr á r i o como a

contece no s " d o m l n i o � v e.Jt d a d e.útam e. nt e. a ti v o � d a c i ê n c ia " : a b a

l a n ç a d a n l � i c. a � " um a t e o � i a Jt e.ali z a da , c o n cJt et i z a d çz.. , d e. e.� ­

.6 ê n c ia Jta c. i o na l " . ( idem , p . 34) .

Bache l ard expl i c a que no n ive l do a n t i g o conc e i to de

mas sa , a b a l anç a é u t i l i z ada sem que s e conheç a a teor i a d a a-

l avanca , apre sentando- s e o conc e i to c omo uma · e sp é c i e de sub s t i

tu�o d e uma exper iênc i a p r im i t iva , s imp l e s e i n f a l ive l . O con-

c e ito , me smo quando func iona " em compo s i ç ão " não é p e n s ado em

compo s i ção : a s s im , no c a so da b a l a n ç a romana em que a c ompàr a -

ç ão dos pe s o s s e f a z por interr.léd i o d e uma funç ã o c ompo s t a do

peso e do br�ço da a l avan ca , e s t a compo s iç ão nao e e fe t ivamen-

te pen sada por quem a u t i l i z a ( idem , p . 3 5 ) . Tal expe r i ênc i a

v i sta , durante ano s , corno fundament a l , repre s e n t a p a r a Bachelard

apenas a u t i l i z aç ão s imp l e s e p o s i t iva d� uma máqU i na comp l exa

cu j o mecani smo e st á s u s tentado por um c o n j unto d e " conc e i t o s


34 .

empírico s " ( ideológíco s ) , s em b a s e teó r i c a m a s pragma t i c amente

e f i c iente s .

A concepçao de ma s s a que d a í emerge corre s ponde a

um pen s amento emp í r ic o , po s i t ivo , imóve l , incon t e s t áve l .

E 6 � c i l imag i n an q u e e � t a e x p eni � n c ia c o n � ti t u a um a
� e 6 e� � n c ia n e c e � 6 a�ia e � u 1 i c i e n t e pana l eg itima�
q u al q u en t e o n ia . P e 6 an � p e n6 a� . P e n 6 a� � p e 6 a � . . . .
Um p e n 6 am e nto em plnic o a � 6 0 c i a d o a um a e x p e � l � n c la
p e n e m ptõ�la , t ã o 6 lm pl e6 , Jt e c e b e e ntã o o n o m e d e p e-n
6 a m e n t o Jt e a .t i 6 ta . ( i d em , p • 3 6 )

Com Newton e s ó e n tão é que o conc e i t o d e ma s s a pa�

s a a as sum i r um a specto " r ac iona l " na med ida em que vai se de-

f in i r num " corpo de noçõe s " (forç a , ac e l er aç ão , ma s s a ) e nao

ma i s corno um e l emento p r im i t ivo de uma exper i ê nc i a d i r e t.a . Es-

te conc e i to repr e s enta um rompimento c om o conce i to produ z ido

pelo pen s amento re a l i sta . D i z Bache l ard :

A n t e 6 d e N ewt o n e 6 t u d a v a - .ó e a m a 6 6 a n o 6 e ti. .ó eJt , c o


m o q u a n tid a d e d a m at ��l a . V e p o i6 d e N ewt o n e .t a e
e6 t u d a d a n u m d e v iJt d 0 6 6 e n � m e n 0 6 , c o m o c o e 6 l c i e h t e
d o d e v l Jl. . ( idem , p . 3 8 )

o conce i to de ma s s a é um d o s mu i trB exempl os que

Bache lard u t i l i z a para chegar à formu lação d aqu i l o que chamou

o " pensamento r a c i on a l " . Fundamen t a lmente e le d e i x a c l aro que ,

enquanto pr edom inou no c ampo d a F í s i ca e da Quím i c a o pen s amen

to r e a l i s t a , o que se obteve foram conhe c imento s l i gados a re�

l id ade sen s íve l , enqu anto o pensamento c ie nt í f i co contempor â -

neo come ç a c o l oc ando a r e a l idade entre parente se s . A s s im , a

" conduta d a b a lanç a " tão pr a t i cada no pa s s ado e s t av a comprome­


_
t ida com o s va l ore s de g r and e z a e r ique z a comer c i a l dominante s

no senso comum . Não hav i a um conce i t o de ma s s a , m a s s im , cor-

pos ma i s ou menos p e s ado s .

O s te s t e s de i n t e l igênc i a , pare c e - no s , s ao i n s tru -


35 .

mentos que , no inter i or da P s i co lo g i a , vão produ z ir um c onc e i to

de i n t e l igênc ia mui t o próx imo do e s t á g i o rea l i s t a de que nQs

f a l ou Bache l ard . Trata- s e s em dGv i da , da " condu t a d o s t e s t e s "

onde , da me sma mane i r a , n ão h á propr i amente uma noção d e i n te l i -

gênc i a ma s , s im , individuos ma i s o u meno s c apa z e s . Ne s s e s e n t ido

é que Tor t ( 197 4 ) chama ao ob � e t o de conhec imento dos testes

- o QI - d e um " ar t e f ato " . Re s s a l tando que n e s s e c a so e s t amo s

d i ante de uma trans formação contr o l ad a do ob j et o , Tor t a s s im

s e re fere a o s t e s te s :

t�a ta - � e , n o e 6 ta d o atual d e uma c i � n c ia , d e um a i n ­


t e� v e n ç � o � el v a g em � o b� e a h ea l i d a d e , a o t ehm o da
q ual é ,(_m p o � � Z v e l d i � ti ng u""<-h o Q u e , n a h ea l i d a d e tMM
6 0 �m a d a , � e l e v a d e um c o n h e c im e n t o o b j et i v o e o qu�
� e l e v a da" i n t e� u en ç � o t é c ni c a .

Ou s e j a ,

n a 6 i n a l d a m e d i d a n a o � e � a b e Q ua l é a paht e , , n a q u i
lo Q U � é m e di d o , d a i n t e��e n ç a o t é c ni c a e d a 6 ph O �
phi e d a d e � d o o b j e t o . (p . 1 2 0 - 1 )

Anas t a s i (1967 ) po s s i b i l i t a que s e v e r i f ique i s to

quando observa :

N o p� o c e� � o d e e l a b o h a ç � o d e um t e� t e , a C Uh v a n O h ­
m a l é t�atada m ai� c o m o ph a b l em a m et o d o l ó g i c o d o Q u e
um 6 a t o em p i � i c am e nt e o b � eh v a d o . S em p� e Q u e � e ob­
t em uma di� t�i b ui ç � o Q u e n � o � e j a n O hmal n o ghupo
d e p a d� a ni z a ç � o , a h e� p o � t a c o � tum eiha é p O h - � e a
tha bal h o pa�a � e v eh o t e� t e . A m ai o hia d o � t e� t e �
t em � i d o , p o i� , d eli b e� a d am e n t e a j u� t a d a p a� a a p� e ­
� e nta� u m a di� t�i b ui ç � o q u e � e apho x i m a a c u� v a n O h
m a l , n a p o p u la ç � o pa�a a Q u a l � e d e� t i n a ( . . . J A c h e�
c e ntam - � e o u eliminam - � e it e n� , o ut� 0 6 m u d a m d e p o �
.� i ç � o d e l1 th o d a e_� c al a , o � " p e � o � " d o � e � C O h e � da�
d i 6 e� e l1 t e � � e 6 p o � ta � � � o alt eha d o � , e 6 a z em - � e ou­
th O � a j u� tam e n t o � � em e l h a l1 t e � a t é q u e b e c o n � ig a a
d e� e j a da a p� o x im a ç � o a n O hm al i d a d e . V i z eh , a � � im ,que
uma d a d a d i � t� i b u i ç ã o é l1 0 hm al p o d ehá � ig n i 6 i cah �im
pl e� m e nt e Q u e o p� o c e� � o d e p a dh o ni z a ç � o d o t e� t i
6 0 i m et i c u l o 6 am e n t e e x e c u t a d o . I l1 v eh� am e l1 t e , d i z e�
q u e uma d a d a d i � t� i b u i ç � o I1 � O é n o �m a l p o d e� á � ig n i
6 i c a.'t a. p e l1 a � q u e a ela b o h a ç aõ d o ;t e� t e ó o i g � o � b e i�
�a o u q u e 6 0 i aplic a d o a um g h u p o p a�a o q u al n�o
e1La a p� o pJtiad o . C p . 4 3 )
36 .

2 . 3 - A NORHALIDADE P ELA PADRON I ZACÃO ,

l
o proce s so de padron i z aç ão repr e s e n ta , p oi s , um no

vo recurso t é c n i c o de aprox imação da norm a l idade d a inte l igê�

cia . Examinaremo s aqui' b a s i c amente aqu e l e s proc e s so s que se

c aracter i z am por " tr a n s formaç õ e s n ã o - l ineare s " ou s e j a , pro-

c e s so s pe l o s qua i s a d i s tr i bu iç ão o r i g i n a l d o s e sc o r e s d o s i n

d ividuos subme t idos a o t e s t e é a l t e r ada de forma a s e obter

uma di s t r i bu i ç ão norma l . T a i s proc e s so s d i f er em d aque l e s em

que as t r an s formaçõ e s e fe tuad a s s ão " l i neare s " ou s e j a , em

que não se a ltera a forma da d i str i bu i ç ão o r i g i n a l . E s ta s , em

bora bas tante u t i l i zadas , são apont.ad a s c omo prob lem á t i c a s

quando não s e obtém , p a r a o s e s cor e s or i g i na i s , uma d i s t r i b u i

ç ão norma l . I s t o porque n a s d i s tr ibu içõe s n ã o - n o rm a i s , o s e s -

c ore s tran s f ormados não tem um s ig n i f i cado tão e x a to como nu-

ma d i s tr ibu i ç ão norma l , o q u e n a tu r a lmente a l t e r a OU i ao me -

no s , dever i a a lterar a i nterpretação do s d ado s .

Já a norma l i z aç ão p e rmi t e uma i n terpr e t aç ão d o s e s -

core s mai s prec i s a . Magnu s so n (l 9 7 2 ) aponta a l guma s d a s r a z õ e s

pe l a s qua i s deve - s e buscar a norma l i z aç ã o :

aI c enta� e x p e c t a ti v a � d en i v a da � d a pó i c o l o g ia di 6�
n e n c. i a f. ;
bJ a ó pn o pn i e d a d e � m at em ã t i c a � d a 6 u n ç ã o d a d i ó t n i -

b u i ç ã o n o nm a l , a c o n v e n i � n c. i a d a ó t a b e f. a ó e6 -
tat Z 6 t i c. a ó d e q u e ó e dió p o e , e t c . e
c. J pn o v a v elm e n t e , e m alg um g nau , a ó atió � a ç ã o d en i ­
v a d a. d e v e f. ig an - � e a um a v el ha t n a d i ç a o (p . 2 8 6 ;
.

g r i fo s no s so s ) .

I
Ph O c. e 6 ó o d e tn a. n � 6 o n m a ç � o d o ó e 6 c. o n e ó b n u t o � ! n �m e h o d e n e ó ­
p O ó tal c. o �n eta 6 o b tid o � m u m t e6 t e l em e � c. o � e6 p a d � ã o i 6 t o �,
e b c. o � e6 q u e f. e v a m e m c. o n 6 i d e n a ç ã o o n e 6 u f. t a d o d e um � ndivZduo
e m c. o m p a n a ç ã o c. o m 0 6 n e � ult a d o 6 o b ti d o 6 p e f. o g h u p O o u am 0 6

tna d e pa d � o n i z a ç ã o .
37 .

� po s s ív e l perceber que a argumentação do autor e s tá toda e l a

centrada n o c aráter pr a gmá t i c o d a que s tão . A norma l i z aç ão fa-

vorece e de c e r t a mane i r a , r e s o lve uma c e r t a q u a n t idade de

prob lemas prát i c o s - porque não i n s i s t i r n e l a ?

As s im é que , a inda quando a o f i n a l d a ap l i c a ç ão do

i n strumento s e encontram d i str ibu i ç õ e s f or tement e a s s imétr i -

c a s tentar - s e - á j us t i f i c ar i s so p e l a precar iedade d o i n s tru -

mento :


� e a � u o � i ç a o tl e um a d i � t� i b u i ç a o n o �m a l � � a z o �
v el , e � em d � v i d a o b t em o � u m a d i � t� i b u i ç a o a � 6 im � -
t�i c a d o � e� c o � e � o � ig i na i � ,

d i z Magnus son
i 6 t o � ig n i 6 i c a q u e o i n � t� um e n t o n a o d� um � e g i � t� o
, v e� d a d e i n o d ab p o � i ç 5 e � � el a tiY a � d 0 6 i n d i v 2 d u 0 6 . E m
tai6 c a 6 0 6 , p o d em o 6 n o nm a l i z an a d i � t n i b u i ç a o a 6 6 i ­
m �t �i c a d o � e 6 c o � e 6 o b t i d o 6 , q u e� d i z e� , m o d i 6 i c a�
a 6 o � m a d a d i � t� i b u i ç a o p an a o b t en u m a d i � t � i b ui ç a o
n o nm a l d o � e 6 c o � e � . ( p . 2 8 l � gr i fo nos s o )

Re s t a saber qua i s o s c r i t é r i o s para s e c o n s iderar

que a supo s ição d e norma l idade e r a z o áve l . Pelo v i s to , e s se s

c r i té r i o s repou s am , e o s autor e s i n s i s tem frequentemente n e s -

s e ponto , sobre a ana l o g i a a o s c ar a c te r e s f í s ic o s e f i s i o lóg�

c o s que se d i str ibuem norma lme n t e . Obs erva- s e aqui uma c ircu-

l ar idade impo s s íve l d e s e romper : f a z - s e a supo s i ção d a norm�

l idade d a inte l igênc i a apo i ada n a supo s iç ão d a norm a l idade dos

atr ibutos f í s ic o s , sus tentando - s e a pr ime i r a pe l a s e gund a , ao

me smo ' tempo que s e nega toda e qua lquer argum e ntação que de-

mon stre a inex i s tênc i a quer de uma quer de outr a . Trata- s e

s e m dfivida , de uma " intervenç ão s e lvagem " d a t é c n i c a para prQ

du z i r a qua lquer c u s to o " ob j eto " d e s e j ado .

A padro n i z aç ã o n o s remete a ma i s a lgum a s que s tõ e s


-

que no s parece n e c e s s ar io d i scutir . Em pr ime i r o lugar a per-


38 .

cebemo s como um proc e s so e s c amoteador d a s heteroge n e idade s e -

xi stente s n a popul a ç ã o amp l a e que , s e l evad a s e m c on s idera­

ç ao , j amai s produ z i r i am uma d i s tr lbu i ç ão norma l . A padron i z a-

ç ao , atravé s do s " grupos de r e fe r ê nc i a " ou " grupo s de nor-


l
ma s " favore c e a ex i s tê nc i a d a norma l idade uma ve z que , e n t ão,

di s tingu irá a s var i áve i s ( não- a l eató r i a s ) p a s s íve i s d e a f etar

a di str ibui ção . P o s s i b i l i t a r á a s s im a e x i s t ên c i a de t anto s

grupos de normas quanto s e l emento s forteme nte d i f er en c i adore s


,

exi s tam . Con f orme An'a s t a s i (1973 } ,

. • p a�a m ui t o � o b j e t i u o � � � o d e � e j � u e i � n o �m a � m u i
.

t o e� p e � Z 6 i � a � . V e � � a m a n e i � a , m e � m o q u a n d o e x i� t e�
n o �m a .ó � e p � e ,� e nt a t i v a.ó p a � a p u p u .t a ç õ e .ó a m p .t a .ó e: úti.t
t e � no�a.-� de .ó U bg�poll , � e p a � a d a 11l e l'l t e d e ,!:' � lL L t a � . l .ó t o
o � o � � e � em p� e . q u e � u bg � u p o ll i d e n ti 6 i c � u e i � a p� e .ó e n
t em � e� u .t ta d o .ó � o n ll i d e� a v e.tm e �t e d i 6 e � � n t e � , n u�
t e � t e d et e �m i l'l a d o . 0 6 .ó u b g � u p o � p o d em .ó e� 6 o �m a d o �
� o m � e.t a ç � o a i d a d e , ô e: � i e e .ó � o .e. a� , t i p o d e � u��Z � u
l o , .ó e x o , � e D i � o g e c g � � 6 i � a , a m b i e n t e u� b a n o o u � u�
�al , n Z u e.t .ó ô � i o - e. � o ll ô m i c o e m u Lt o o u ;t� o � j at o � e � .
O u .ó o d o t e. .ó t e d e. t e�m i n a o t i p o m a i .ó .ó ig H .L j i c at i v o
d e d i 6 e � e n � i a ç � o , a ô .ó im � o m o o 6 a t o d a � I'l o �m a .ó m a i .ó
a d e q ua d a � � e � em g e� a i � o u e .!:' p e c .J_ 6 i � a � . ( p . 1 2 3 )

T a l proced imento aparentemente l ó g i c o , po i s um ind i

víduo deve ser compar ado c om o grupo a que per t e nc e , c arrega ,

no entanto , uma pro funda c on t r ad i ç ão . Senão v e j amo s :

a} como f a lar de uma méd i a ger a l de i nt e l igênc ia se

s e admite que e l a var i a de grupo para grup o ?

b} c omo e s tabe l e c er l im i t e s de norma l idade ( e m ter-

mo s genér i c o s ) s e a norma é r e l a t iv a ao grup o ?

c) e n f im , o q u e d e termina q u e s e d i g a q u e o Q I ( qu�

c i ente inte l e c tua l ) norma l na popul ação é x ou a inda quem re -

so lve qua l dos grupo s deve s e r o grupo de comp a r aç a o por exce

lênc i a ?
l
São M�im deYlom;.nada� a� amo�� .ó o bJte M quai.6 M. e 6 etua o p�O c.eM o d e.
pad�ovu.zaç�o . C omo eúg ê.n�ia 6undameJl.t:a.C. � amo�� d ev em .ó � "�ep�e­
.6 enta.üua.õ " da populaç�o paJi.a a q ua..t .óe d e.óuna o te.óte .
39 .

De dua s há que s e e s c o l her : ou bem s e admi te uma nor

ma l i dade da i n t e l i gênc i a n a popu l aç ão ge r a l ou bem e l a so po-

derá ser adm i t id a p ara c ada grupo e spec í f ic o . S e a s s im for, h�

verá nec e s s i dade , p e l o rac ioc í n i o l ó g ic o , de s e c o n s t ru i r tan

t o s t e s t e s quantos grupos e não de se padron i z ar um me smo t e s te


para di ferentes grupo s . D i z Ana st a s i :

0 0 a � p o p u la ç � e� n O h m a t i v a � d e v em � eh c ui d a d o � am e n
0

t e d e 6 i ni d a � o A � c a h a c t eh I � t i c a,� d e ,� � a � p o p u l a ç � e,�
d e v em ' � eh l e v a d a 6 em c o n ta , a o i n t eh ph e t a h 0 6 h e� u l
ta d o � d e t e 6 t e � o A l �m d i 6 6 o , em m u it o 6 c a 6 0 � , a � n o i
m a � e � p c c. Z n i c a ,�. , b a � e o, d a .s em p o p u l a ç. õ e 6 n O hm a ti v a 6 -
m ai � lim ita d a 6 , .s � o m ai .s � t e i � d o q u e a � n O h m a 6 g e -
haL� o ( idem , p . 1 2 5 )

As normas devem s e r e f e r i r a i nd iv í duo s e nao aos

" homens em gera l " c o n f o rm e a autora . Has este não e r a o seu

pen samento qu ando de fend i a a h ipóte s e d e norma l i dade para a

construção do te s t e • . .

Tornando m a i s c l aro , queremos a f i rmar que o s itens

de um t e s te , como vimo s , são . c l a s s i f i c ad o s e m g r au s de d i f i �

c u ldade cre scente conf o rme l�a amo s t r a i n i c i a l para a f a s e de


l
aná l i s e de i t e n s . De acordo com no s s o rac ioc í n i o ta i s i te n s

ou ainda , t a l te s te , só Doder i a ser ap l i c ad o ne s s e grupo , já

que os i t e n s s e r e f er em à d i f i c u ldade méd i a d e s s e g rupo. No e n


-

t anto , nao e i s so que ocorrE . A d i f i c u ldade do t e s t e , determi


nada por um grupo e spec i f i c o , s e rá c o n s iderada o padrão geral

de d i f icu ldade e a adaptaç ão à s d iver s idade s grup a i s f ic a por

conta das amo s t r a s de padroni z ação . E s t a s s e r ão , porém, s empr e

interpretada s , como r e l a t i v a s a um r e s u l tado méd i o g e n é r i c o .

l
Etapa i n i c ial n a c o n 6 th u ç � O d e um t e � � � ex pehim ental e que
t em p O h 6 i n a l i da d e ph o c e d eh a u m a a n �li� e e 6 t a t I 6 t i c a d06
i t e n 6 v i 6 a n d o � el e c i o n a h o � m e l ho h e � paha a c o m p o � i ç � o d a.
6 0 hma d e 6 i n i ti v a d o t e 6 t e .
40.

Ve j amo s e s t a contrad i ç ão ao n íve l ' e spec í f i c o d o s c a

s o s extremo s : o i n f r a e o super; dota.do . Ambo s s ó podem ser

pensados a s s im , em r e l a ç ã o a uma i n t e l igênc i a méd i a , gera l ,

poi s no i nter ior de s eu própr io grupo j ama i s 'se c on s t i tu i r ão

. .�. .
em d e f i c i ente s ou g ê n i o s gener i c amente f a l ando . Me smo porque

os t e s t e s ter i am sua d i f icu ldade de termi nada em função de c a -

da grupo particular , n ã o h avendo , no c a s o , um e lem e n to ç omum

de compar açao . I s to imped i r i a que s e f i z e s s e qua lquer a f i rma­

ção de c arãter g e r a l como por exemp l o , o fato de que i n d i v í -

duo s de c la s se soc i a l b a ixa tem um Q I s i s tema t i c amente i n f e


- - 1
r ior ao QI med io na popu l a��o .

N e s s e sentido é que querem o s c ombater o p roc e s so de

padron i z ação U'rla vez que seu o b j e t ivo é f a l s ame n t e c o l o c ado .

Os ind ivíduo s nunca s ã o c omparad o s c om seu própr i o grupo , s e�

pre o sao com um protót ipo de i n t e l i gênc i a . N i nguém a c e i t ará

um indivíduo adu l to como norma l s e seu QI for 7 0 , me smo que

e ste tenha s ido o Q I méd i o de seu grupo . Em r e a l i d ad e , existe


2
um Q I norma 1 d e um grupo norma t 1VO
· ·
un1ve r s a1 .

Cer tamente que encontramo s um d i s cur s o c om grande a

pelo j u s t i f icador para o e stabe l ec imento de norm a s e spec í f i -

c a s a cada grupo . E s se d i scur so d i z r e spe i to ao a specto prãt!

co : à s e l eção e c l a s s i f i c a ç ão . D i z Magnu s s on ,

. . . � e d e� e j am o � e m p� e g a� a um i n d i v I d u o c o m o o p e��
� i o , d e v e�lam o � b a � ea� a a v a l i a ç a o d e � u a c a p a c i d a ­
d e em u m a c o m pa�a ç a o c o m o q u e a l ca n ç am o � b o n � o p e
� ã� i o � em uma b a t e�ia d e t e � t e� , e n a o em u m a c o m pa
� a Ç a o c o m o q u e a l c a n ç am o p e �ã� i o � q ua l i 6 i c a d o � . -
( op . c i t . , p . 2 9 1 )
l
" E v i d e l1 t em e l1 t e , t o d o -!J o � o p e.�ã� i o � n a o � a o d e. b ei-!J m a � u m a
g �a n d e p.'t o p o Jt ç a o d e d ê b e i ó e. o p eJt ã Jt i o � l1 . R . Z a z z o c i t a d o
p o � T o � t , M . o p . c it . , p . 3 4

2 So b�e ��a qUe.6�O V eJt pag"tna. 2 6 ( nota. d e. Jtodapê. J do pJt� ente �tudo .
41 .

Como s e percebe o s l im i t e s c on t i nuam s endo prev i a -

mente determi nado s . Quando mu i � o , n a ' s i tuação d e s e l e ç ão po­

de- s e adm i t i r que , para c e r t o t ipo de função ( n ã o qua l i f i c a -

da ) , o níve l de i n te l i gênc i a ace i t o s e j a ma i s' b a i x o que o nor

ma l enquanto para outro s ( ex ecutivo s , funçõe s a l t runente qua l �


;",

f icadas ) e x i g i r - s e-á um a lto n íve l inte l e c tu a l ou s e j a , ac i�a

da inte l i gênc i a cons i der ada norma l . A tabe l a d e padron i z aç ã o

func i onará , po i s , apenas c omo' uma f o rma de s e l e c i onar o s �e-

lhor e s e n t r e o s melhores ou o s m e l ho r e s e n t r e o s fraco s , no

pr ime iro c a s o .

E s t amo s , até o n.omento , f a lando s obre uma prá t i c a l

dea l i s to e , aque l a em que , s e supõe , ex i s tam t abe l a s e spec í -

f i c a s à c ada g rupo . O quadro s e agrava mu i t o qu ando sabemo s

que a prá t i c a dos' t e s te s não s e f a z ab so l u t ament e d e s s a rean e i

ra . O que s e ver i f i ca é a u t i l i z aç ão de tabe l a s de padron i z a -

ção e l aborada s a par t i r de grup o s de r e ferênc i a que nada te�

a ver com os d iver s o s su j e i to s que são pos ter i o rmente ava l i a -

dos . As s im , encontr amo s tabe l a s amer i c ana s , arg e n t i n a s e curo

pé i a s servindo de r e f er ênc i a para a popu l aç ão b r a s i l e i r a . Ccn

t a i s comentár i o s não e s tamo s quer endo d e f e nder a n ec e s s idade

da padron i z ação mas apenas e n fa t i z a r que , nem me smo n o i n t e -


-

rior do proc e d imento ex i s te qua lquer preocupaçao com a a t i t u -

d e r i gor o s a q u e o s p s ic omet r i s t a s dec antam .

De tudo que d i s s emo s sobre o pro c e s s o de padron i z a -

ç ao podemo s re sum i r que :

a) a lóg i c a do proc e s s o (para c ad a grupo ��a norma ) , s e l eva-

da a sério , j ama i s pe rm i t i r i a a p o s tu l aç ão d e ��a h i oéte s e

de d i s tr ibu i ç ão norma l d a i n te l ig ênc i a na popu l aç ão gera l ;


42 .

b) a i nda pe l a lóg i c a do proced imento deve r i amo s ter tantos te.§.

t e s quantos grupo s de r e f er�nc i a e ��o um Gn i c o t e s t e ( cu j a


J

d i f icu ldade é também ú n i c a e gera l ) para vár i o s grupo s ;

c) como decorrênc i a , n�o pod er i am o s e s tabe l e ée r l im i t e s de nor

mal idade nem produ z i r " o gêni o " e " o d e f i c i e n te " j á que nao
... ",

have r i a um termo gera l d e comparação ;

d) a inda , como decorrênci a , ter i amos tantas " in t e l i gênc i a s nOE

ma i s " qu antos t e s t e s e j amai s pod er i amo s u t i l i z a r um me smo

te s te como e l emento de c omparaçao p ara um grupo que apre s e n

t a s s e c arac ter i s t i c a s d i f e r e n te s .

E n f im , para c ada d i f icu ldade um t e s t e e haver i a uma

pro l i feração da " inte l i gente s " , de s tru i ndo - s e a idé i a de que

ex i s te um padráo , a lgo que perm i t a comparar gene r i c amente i n d i

viduo s entre s i , j á que a s d i f e r e n ç a s s ão por d em a i s profund a s

par � i � so . Como ve remos , não é e s te o i n te r e s s e d a P s i c ometr ia.

� prec i so j u s tamente c omparar para que s e po s s a h i erarqu i z ar e,

s em dGvida , todo e s s e proce s s o d e aprox imaç ão t é cn i c a tem sua

j us t i f icação ne s s a nec e s s idade , a i nd a que teo r i c amente f a l ac io

so .
43 .

CAP ITULO I I I : A " DE1'-1ANDA SOCIAL " DOS TESTES DE I NTELIG�NC IA

Thoma s Herbert ( 1 9 7 2 ) em seu e s tudo sob r e a s itua -

ç ao teór i c a d a s " c iê nc i a s " humana s e soc i a i s , e spec i a lmente da

P s icolog i a Soc i a l , demo n s t r a que e l a s apre s e n t am todos o s c a -

ractere s fundament a i s d e uma prát i c a técni c a . A r e spe i to d i s -

so e l e a f i rma :

E � t� b em c l a � o l o g o d e � a 1 d a q u e e l a � � e 6 p o n d em a
uma d em a n da 6 0 c i a l ; u m p 6 i c � l o g o � o c i a l , 6 a l a n d o d e
t�a barTio".6 c. 3 e t uad o ,!l na p � -t. c o l o g ia 6 0 c i a l , e � c � e v e u :
" pu b ..t i c a - � e n u.m d et eJt m úw d o m o m e n t o u m a q u a n t i d a d e
d e o b � a 6 c u j o c o n t e � d o � d e t e� m i n a d o p e l o 6 1ato�e6
m a i 6 d i v e � 6 0 6 ; m a 6 d o p o n t o d e v i6 t a d a u t i ..t i z a ç � o
� o c i a l q u e ê 6 e -t t a , e � .t e 6 ptr.im e i� o � n at o � e6 .�ao mai6
OU:-m e n o ó ,ó em im p o �tâ n c i a . O q u e c o n ta , ê a ad eq ua ­
ç ã o d e6 ta ,ó o b � a 6 ã. .ó " n e c e � � id a d e 6 i d e o ..t � g i c a 6 " d e um
g �u p o 6 0 c ia l o u de um a � o c i e d a d e n u m m o m e n t o dado ;
a6 o b � a 6 m a i 6 a pt a 6 a 6 at i 6 6 a z e� e 6 t a � n e c e � 6 i d a d e 6 1
� � o � e t i d a 6 , a 6 o ut�a é c a em n o e 6 q u e c im e n t o . ( p . 2 3 )

A demanda e s tá l i g ada ao q'...l e Herbert c hama " explor�

ç ao - trans formaç ão da ordem soc i a l " , termo s emp reg ado num se�

t ido que ind i c a um a tentat iva d e r e c o locaç ão d a c atego r i a i-

deológica d e su j e i to como expr e s são sub j e tiva d a ordem :

o � u j e i t o c o m o 0 � ig em e. 6 im a b 6 o lu t o d e � i m e � m o , ê
� em p� e l i \} � e p a�a tr. e o tr. g a ni z atr. a o tr. d em , mM a c o e x. ,ü t � H
c ia d e o u t� a 6 l i b e� d a d e 6 a b � o l u t a 6 6 i x a. a o tr. d em n uma
i n êtr. c ia q ua � e i n 6 ú 1 i t a . ( id em , p . 2 0 - 1 )

O surgimento d a s " c i ênc i a s " humana s e soc i a i s v a i s e dar como

um pro l ongamento , urra c o n t i n u i dade d e s sa s conc e p ç õ e s i d e o ló g i -

c a s , evidenteme nte com uma sobrede term i n a ç ão h i s tó r i c a , e v i -

sará j u s tam e n te d e se nvo lver técn i c a s d e med i d a e d e manobra

d e s s a i nérc i a s o c i a l . Entre e s s a s t é c n i c a s e nc o n tr am- s e , a tí

tulo de exemp l i f i cação , o s que s t ionár i o s d e op i n i ão e de a t i -

tude s , a s e s c a l a s de ava l i a ç ão d e n e c e s s i d a d e s sub j e t iva s , do

n íve l de a s p iraç ão , da tendê nc i a à mudanç a e tc . . .


I
A� i.t a ç. � o ê d e. L e. N Y J . F . L e m a t ê. � i a l i 6/1 1 e. e t l a p � lj c lt o P.. o g i e
l.J o c. -t.a l e " . L a P c. n 6 ê. e , 1 9 6 3 n Q 1 1 2 , 6 2 - 8 2 .
44 .

Herbe r t demon s t r a que o s mod e lo s e o s i n s trume n t o s

u t i l i z ados ne s s as c i ênc i a s ,

t em p o � 6 u n ç � o c o l o c a � a q u e� t� o � e p e titi v a d a a d e ­
q u a ç � o c o n� eg u i d a . o � iit�um e nt o � � � o , e m � i m e� m 0 6,
� e6 p o 6 ta 6 6 im u l a d a 6 , q u e c o l o c a m o � e al p � i c o - � o ci o
l ó g i c o ã: p � o v a , d e uma 6 o �l1J a a i n d a a n éi � � u. i c. a ã: ,� v e-=­
z e � ( t�a b a l h o p o � e n 6 a i o e e�� o , c. o m Da� a v e l ã: m a n e i
�a c o m o E d i 6 0 n i n v e n t o u a j'. �m pa d a e .e é ,t�ic a , p o � e n-=-
6 ai o d e tud o o q u e l h e c a ia n a .6 m � o 6 . ) .( idem , i bidem )

Tomando a s técn i c a s d e i ntervenç ão grupa l , tão ut i -

l i z adas p e l a P s i co lo g i a Soc i a l , o c i t ado autor f o c a l i z a c omo

as c ategor i a s da ideo log i a f i lo s 6 f i c a , apontada s anter i ormen-

te , atuam n e s s a prát i c a . Os " pr i nc íp io s " s e r i am a s s im formu l a

do s :

1 ) A 6 � (l a ç 5 e 6 6 o c i a i 6 , c o n6 t i t u l d a 6 p e l a i n t e� - � e ­
l a ç � o d 0 6 p O l1 t o � 6 u b j eti v o 6 , 6 � O , n a o � i g em , a­
da pta d a 6 a e l a6 m e 6 m a � : é a I da d e d e o u� o m l t i c. a
da o � d em 6 0 c i a l n o 6 eu é t e� � el a c i o l1 al tha n � pa -
� e n t e , d a R a z a o 6 e ita N at u� e z a .

2 ) A l g um a c o i6 a c o m o um a a l i e na ç � o o u u m a q u ed a v em
e nt � o o b 6 c u� e c e� a 6 h ela ç 5 e 6 6 o c i a i 6 , a c � dem 6 e
ó a z o b�ig a ç � o , a Natu� e z a 6 0 c i a l 6 e t o � n a i��a -
c i o n a l , a � a z � o 6 e e v ad e n a N a t u� e z a .

3) t pJt e C i 6 0 e n t a o q u e 0 6 " 6 u j ei t 0 6 c o n c � e:t o 6 " � ea ­


l i z em 0 6 a t o 6 q u e , � e - i n 6 ta u�a n d o a t�a n 6 p a� � n
c i a � el a c i o n a l , e á e t u a� a o a v o lta ã: o �i g e m .
( idem , p . 2 5 )

E s te s e r i a então o núc l eo ar t i c u l ador d a s t é c n i c a s

de intervenç ão soc i a l , cu j o ob j et ivo e m t o d o s o s c a s o s , é a

trans formação em aparênc i a d a ordem s o c ia l , bu s c ando me lhor

re a l i z á- l a .

F i n a lmente Herbert conc lu i , i ntegr ando o s pontos l�

vantado s , que a s " c i ênc i a s soc i a i s " c on s i s tem , n a sua forma

a tual ,

n a a p L L c a ç � o d e u m a t é c ni c a a um a i d e o l o g ia d a 6 � e.
l a ç 5 e 6 6 o c i a i 6 , o c o n j u nt o c o m pl e x o em a pl i c a ç a o­
t e n d o p o � 6 im � e 6 p o n d eh ã: d em a n d a 6 0 c i a l � ea l i z a n
d o o � ea l p 6 i c o - � o c i o l ó 9 i c o c o m v i 6 ta 6 a u m a a d a�
45 .

t a ç � o o u uma � e a d a p t a ç a o d a 5 � e la ç � e s � o c i a i s a p � �
t i c a s o ci a l g l o b a l , c o n 5 i d e � a d a c o m o o i n u a�i a " t e �
s is t em a . ( idem , i b idem )

A s eme l hança do que fa z Herber t com a s " c iênc i a s

s o c i a i s " temo s procur ado i den t i f i c ar no s t e s t e s de i n t e l igên

cia ou apt idão p s i c o l óg i ca , os e l ementos i n d i cadores do meca

n i smo da s prát i c a s técnicas . .

� a s s im que , no c a p í t u l o precedente , t entamo s d�

mons trar por que proce s so s s e cons t i tuem o s t e s t e s da i n t e l�

gência , apontando - o s como i n s trumentos de " s imulaç ão-ver i f i ­

cação " do rea l . Por diver s a s ve z e s d e i xamo s e m evidênc i a que

as suce s s ivas aproximaçõe s e f e tuada s no proc e s s o de cons tru­

ç ã o do s t e s te s para se a lcançar a re a l i z aç ã o do " re a l " , a t en

d i am a uma det e rminação exte rna , a uma " demanda e x terna " . Os

tes tes , ne s s e s e n t i do , a s s im c.omo o s i n s trumento s das c i ên -

c i a s soc i a i s , v i s am a dup l icaç ão do r e a l ta l c omo e l e é " ex-

p l i cado " pe l a i deolo g i a dom inante r e f e r i ndo- s e p o r tanto à de

manda , em termo s de forç a s produt ivas e de r e l aç õ e s sociais

de produç ão d a s o c i e dade cap i �a l i s t a .

D a me sma mane i ra que Herbert co l o c a para a s " c i -

ênc ias s o c i a i s " , podemo s também a f ima r qu e o s t e s t e s de in-

t e l igênc i a s ã o prá t ic a s técn i c a s apl i c adas num c o n j unto i deo

lógico , que r ea s s egura o conj unto da prá t i c a s o c ia l . As

ideo log i a s t é c n i c a s produ z idas pe l a s prá t i c a s t é c n i ca s , em-

bora s ecundá.ri a s , s erão a l imentada s por uma i d e o l o g i a das

r e l açõe s soc i a i s q u e func iona a s s im , como " c imentado r a " daqu�

l a s . Em out r a s pa lavras , queremos d i z e r que a s " te o r ia s " de

inte l igência pro du z i d a s pe l a prá t ica do � t e s t e s , não s ã o pr i2

r i t á r i a s ao todo soc i a l, ma s a i deo l o g i a dom i na n te , c u j a fun-


46.

ç ao é pr imord i a l nó todo c omp lexo , sobre a qua l e s s a s p r á t i -

c a s se apl i c am , c o n s t i t u i a base d aque l a s .

Ne ste capítu l o queremo s en focar a que s tão d a deman-

da soc i a l dos t e s t e s de i n t e l i gênc i a que , a no s so ver , e aqu�


la de s e l e c ionar , c l as s i f i c ar , h ierarqu i z ar e d i f er e nc i a r os

indivíduos c om v i s ta s à manu � enção e reprodução d a s re lações

soc i a i s de produção da soc i edade c a p i ta l i st a . � s obre uma i d e o

logia l i be r a l - burgue s a q u e o s t e s t e s de i n t e l igênc i a s e a-

p l i c am , ao mesmo em que e l a fundamenta uma " te o r i a " s obre a

intel igênc i a ( ou apt idão pS i c o l ó g i ca ) que func i on a por sua ve z

como uma " -tJta l1-6 6 o /tm a ç.ã o .ideo t ô g .i c. a d o " /t e at " Jt e e n c. o n-t /ta d o p e t a

p/t�-t.i c. a -t i c. I1.i � a , 6 o /t n e c. e n d o u m a m e d.i da d e-6 -t e /t eat p/t.im�-t.i v o ,

p a /t um d.i -6 c.. u/t-6 0 q u e o /t ed u z ã. � ua .im ag e m .i d e o t ô g .i c. a " . ( idem ,

p. 14 ) .

3.1 - INTEL IG�NC IA E IDEOLOG IA BURGUESA

Em deta lhado e s tudo ' s obre o apar e c imento h i s tór i c o

d a palavra " aptidão " , Noe l le B i s s e r e t (1979) v e r i f i c a que , d o

século XV , quando surge na l ingua f r anc e s a , ao s éc u l o XV I I I ,

e s s a pa lavr a de s i gna uma r e a l i d ade puramente c o n t i gente , rar�

mente é ut i l i z ada e não s e apr e senta a s so c i ad a a qual quer no-

ç ão de s uper i or idade de c l a s se . Ter apt idão não confere ne ­

nhum t ipo de poder , po i s e s te é c oncebido c omo fruto da vonta

de d ivina : c ada um n a s c e r i co ou m i s er áve l e a s s im permanece i

a pos ição soc i a l não depende de apt id õ e s quer s e j am f í s i c a s ou

ment a i s . ( pa s s i m )

A par t i r da s e gunda me tade do s é c u l o XV I I I , s eu u s o


47 .

pa s s a a ser m a i s comum , j u s t amente quando I embora a nobr e z a con

t i nue a deter o pod e r por d i r e i to d iv ino ,

a q u e l e 6 q u e ela d e 6 p� e z a p o � t e� em um e m p � eg o p a 6 -
6 am a e x e�c. e� um d o m 2 n i o c.Jt e 6 c. e n t e 6 0 b� e a. n atu� e ­
z a : i n v e ntam a m á q u i n a ã: v a p o � , d e6 c. o bJt em a el et�i
c. i d a d e , e x p.t o �am a .� m i n a 6 d e. A n z im e d e C � e u 6 0 t, me­
c. a n i z a m a pJt o d u ç � c t � x t i l e m et a l ��9 ic. a , p� o m o v em­
a c.Jtia ç � o da6 pJtim c.i�a 6 g Jta n d eó e6 c. o la 6 : P o n t .ó et
C ha uJ.. J.. e. e J.. e M i. n e .6 . ( idem , p . 3 4 )

o dom i n i o cre s cente s obre a n atur e z a i mp l ic a a mod�

f icação d a s r e l açõe s do s homens com o mundo , a s ub s t i tuição da

f i gura d ivina como motor dos acontec imentos pe l a concepç ão de

um unive r s o reg ido por l e i s que a c i ênc i a deverá a l c ançar. Tr�

t a - s e do abandono de uma v i s ão " f ix i s ta " b a s e ad a · na ordenação

d ivina para uma v i s ão qu e procura c o locar o homem no continuo

da nature z a .

I . . . J O e,� p 't ç o c. l á ó J.. ú::. o .. C .


. J n éi o e x c. l uia. a p O J.. J.. i ­

bilid a d e d e um d e v i ,'t , m a,!) ' e.6 6 e d e v i� n a da m a i ó 6 a -


z i a d o q u e aJ.. ó e9 u� a Jt um p e� c. uJtJ.. o n a t� b u a d iJ.. c. � et a ­
m e n t e p� e. v ia da J.. v aJt i a ç � e 6 p O � J.. l v ei J.. . A Jt u ptuJta d e J..
t e eJ.. ea ç o p e�mitiu d e 6 c. o b�i� u m a hi J.. t o �i c. i d a d e p � ��
p�ia a v i d a : a d a 6 u a m a nu t e n ç � o n a J.. J.. u a � c. o n di ç � eJ..
d e e x iJ.. t ê n c. i a . ( . . . J A hi6 t o � i c. i d ad e i n t� o d u z iu - ó e. ,
p o Jtta nt o , na n a t uh e. z a - o u a n t e ó n o J.. e� v i v o ; m aJ..
aI e. ela mai J.. d o q u e um a 6 0 �m a p� o v á v el d e J.. u c. e J.. J.. � o ;
c. o nJ.. tit u i c. o m o q u e um m o d o d e 6 e� 6 u n d am e n t a l .
( Foucau l t , 1 9 6 6 , p . 3 6 1 )

E s s a s a l teraçõ e s na f orma d e s e r e p e n sar o homem ar

t i culam- s e com as a l te r a ç õ e s soc i a i s , po l i t i c a s e e c onôm i ca s ,

e s pe c i a lmente a a s cençao d e lli� a c l a s s e soc i a l que , embora de-

tenha o poder econôm i c o , não d i spõe do poder po l i t i co . Essa

c la s s e - a burgue s i a - ao e l imi nar a o rdem d iv i n a , r e i nv i d i c�

rá a ges tão de seu de s t ino . Não ma i s o n a s c imento d e terminando

a pos ição soc i a l mas s in , o mér ito , a c apac idade , o e s forço

pe s s oal .

D i z Bi s seret ( 1979 ) :
48 .

N o m o m e n t o da ' R eu o l u ç � o , O � 5 at o � pa� e c em m e � m o c o n
6 i�ma� a id �ia d e q u e o � h o m e n � , e n � o V e u � o u a ni
tu� e z a , 6 � O m e � m o o � � e n h o � e 6 d a ta� e 6 a d e o �g a ni z �
ç i o � o c ial , P O i6 a o � d em ' e � ta b e l e c ida p e l a n o b � e z a­
em p�o u e i t o p� 6 p� i o p 5 d e 6 e� a l t e � a d a . A L e i t e m o
p o d e� d e 6 u nda� um a n o v a o � d em 6 o c ia l , o 6 e� e c e n d o a
t o d o 6 , 6 em di6 ti n ç � o , a p 0 6 6 i b i li d a d e t e o � i c a d e 6 e
d e 6 e n u o l v e� 6 2 6 i c a , i n t e l e c tu a l e m o � a lm e nt e , pa�a
m ai o � p� o v e i t o d e u m Á 6 0 c i e d a d e q u e , l i v � e d e � ua 6
d e6 ig u a l da d e6 , p o d e�� � eali z a� im e n 6 0 6 p� o g � e6 6 0 6 .
(p . 3 7 )

Ne s se momento , a s i n s t i tu iç õ e s j ur í d i c a s mas também a s e s c o l a

r e s , a educaç ão , pas sar ã o a ocupar pape l fundamen t a l c omo ga­

r antia da s o c i e dade i gua l i t á r i a que s e quer e s tabe l ecer : i-

gualdade de d i re itos e i g u a l dade de oportuni dade s .

Por outro l ado , s e para s e con s t i tu i r como c lasse

po l i t i c ament e ' domi nante f o i nece s s á r i o que a bur gue s i a se an-

cor a s s e em valore s i g u a l itár i o s , o b s e rva- s e que as de s i gua ld�

des subs i s tem , apó s a Revo l u ç ão France s a , como f at o s concre -

tos . De s igua ldades po l it i c a s ( l i mi tação d o d i r e i to de vo to ) , e

conômicas ( c on s agração da prop r i ed ade privada ) e s oc i a i s ( e s c o

l a r e s i nc lus ive ) . A Revo lução s e e f e t ivou pe l a a l i ança d a bur

gue s i a com uma c l a s s e p r o l e tár i a que então de f o rmava e , n e s

s e sentid o , f o i e m nome da " L i berdade , I g u a ldade e Fratern id�

d e " que e s s a a l i ança s e deu . Num s e gundo momento , e n tr etanto ,

para j us t i f i c ar a dominação d a c l a s s e burgue s a f o i nec e s s á -

r i o bu scar uma exp l i cação , o que s e f e z pe l a " id e o l o g i a do me

r i to " , da competênc i a , da aptidão .

Bi s seret (1979 ) evidenc i a c omo a s mod i f i caçõe s no

conceito de " apt idão " r e f l e tem e s sa a l teração nas r e l aç õ e s so

c i ai s .

D e um l a d o , a ra� e c e um a e6 p e c i 6 ic a ç i o d o 6 e nt i d o d e 6
6 a p a .e. a v � a d i z e n d o � e l.l p ei t o ã l.l atiú -i.. d a d e 6 p � �tic a6 áo6
h o m e n .6 ; " di z - 6 e. t �jL u m a g � (U't d e a ptidã o o u n ã o t e� n e
n hu m a a p t i d ã o p a�a a m a t e.m �t i c a , p a�a a p o e 6 ia , p a�i
49 .

a p i nt u/ta e t c. .' '' ( A ba d e F ê/t a u d l . V e o ut/t o , .6 e a apti


dão ê aútdct d e 6 úl i d a c. o m o " t c, H d ê. n c.-t. a na tuJr. a t " , e .6 ta.
e x p/t e � � ã o n ã o t em m ai.6 � eu � e "t i d o i n i c. ia t ; o A b a d e
F ê/t a u d a i t u � t/ta c. o m o p Ji. O V ê Jé b i o : " 0 a Lim e n to u ttJta
pa� 6 a a n a t u/t e z a ; a e d u c. a ç ã o t em m ai6 6 o /t ç a 6 o b /ti
n 5� d o q u e a p /t 5 p/tia n a t u/t e z a - o h� b it o ê um a 6 e -
g u n d a n a t u /t e z a ; t e m ta n t o ( e � � v e z e� m a i � 1 p o d e/t .6 o
b /t e n Ô 6 q u a nt o a � i n c. t i Ha ç õ e� d a n atu/t e z a . ( p . 3 5 ) r

Apt idão não m a i s como dom d iv i no m a s como a l go que todos po s -

suem , em d i f erentes graus , o · que abre a po s s ib i l i d ade para

qualquer ind ivíduo chegar ao topo da h i er arqu i a soc i a l . Aqu i

o intere s s e pe l a s cor r e n t e s pedagó g i c a s , sobretudo a s idéias

de Rous s e au e d e Cond i l lac s e r á ime n s o .

2
A doutrina l i ber a 1 surge portanto em me i o a s lutas

de c la s s e da burgue s i a contra a nobr e z a a tr avés d e pen s adore s

ing l e s e s ( Locke ) e franc e s e s ( Rou s s e au , V o l t a i r e , entre ou-

tros ) e as sume , a par t i r d o s éculo XV I I I , o c a r á te r de i d e o l o

g i a revo luc ionár i a d a c l a s s e bur g u e s � em sua tomada do poder

pol í t i co . A p a r t i r d a i s e r á d i fund i d a p e l o s apare lhos e i n s t i

tuiçõe s soc i a i s por um mec ani smo que tende a man ter e reprod�

z ir a i d é i a de dom inação como um fato n a tur a l , n e c e s sá r i o e

inerente às r e l açõe s soc i a i s . .

o l i ber a l i smo , c omo tod a i d e o l og i à , é ante s d e tudo

um s i s tema de repre sentaç õ e s que se s u s tenta sobre a l guns co�

c e i tos bá s ic o s . D i scut i remo s aque l e s que nos parecem impor ta�

t e s à que s tão dos t e s t e s d e i n t e l i g ê nc i a : o i nd i v i dua l i smo , a

l iberdade , a propr iedade , a i gua l d ad e e a democr ac i a . ( C unha ,

1975 , p . 2 8 ) -.
I
A c. ita ç ã o t e x tu at d a a u t o lt a 6 a z lt e 6 e /t ê. n c.i a 6 a o d i c. i � n�ltio A ­
b a d e F e/t a u d { V i c. ti o n n ai/t e c.ltiti q u � d e t a t a n g u e & /t a n ça i 6 e
1 987 1 .
2
u titi z a/t em 0 6 , a t Itu l o plt e c. �/t i o , O � t e � m o 6 d o u t /t i n a l i b e/ta l ,
i d e o l o g ia li b e/t a l o u l i b e� a l i 6 m o palta i n d i c. a/t u m c. o n j u nt o d e
id e o l o g ia 6 , c. i e n t e6 d e q u e 6 u a6 d i & e /t e n ç a .6 e6 c. a p am a g e n elta ­
lida d e e a btt a ng ê. n c. i a d e t a l t ett m i n c l o g ia .
50 .

o l iber a l i smo surge opondo a o s conc e i t o s de i n i c i a -

t iva soc i a l e contr o l e s oc i a l ? o s conce i t o s de i n i c i a t iva i n-

dividual e contro le i nd ividu a l . Num cer to s e n t i d o a e s s ênc i a


do pens amento l iber a l e s tá , po i s , n a emanc i pação do i n d i v íduo.

Este é v i s to c omo um todo independe nte e autônomo , po s s u idor

de apt idõe s e atributos próp! i o s , dos qua i s dependerá sua a s ­

cen são soc i a l . O pape l da autor i d ade governamenta l e perm i t i r

ao indivíduo amp l o d e s envo lvimento d e s s a s apt idõ e s e atr i bu -

tos o que , ne s s e c a s o , o torna i n d ividua lmente r e spo n s áv e l p�

lo po s s íve l suce s s o ou f r ac a s so soc i a l e por tan t o , p e l o e s t a-

do de r ique z a ou pobre z a a t i ng ido s .

O pr i nc í p i o d e l iberdade s e r e l ac iona d ir e t amente

com a doutrina que n a s c e j u s t amente pregando a e x c l u s ão dos

priv i lé g i o s con feridos ã qua lquer c l a s s e s oc i a l por conta de

nasc imento ou crenç a . N a i d é i a d e l i berdade predom i n a a açao

individual , o i nd iv íduo é aqu e l e que é l ivre p a r a " compr ar

sua l i b erdade " . Trata- s e de l iberdade contr a c tu a l na qual as

par tes contratante s po s suem d i r e i to s i gu a i s p a r a negoc i ar . E

e s sa l iberdade i nd iv idu a l supõe a s d ema i s : e conômic a , educa -

c iona l , re l i g io s a , po l ít i c a .

Para o l i bera l i smo ,

a l i b eh da d e � e lm p � e c o rn o c o n � e q u � n c i a d e u m a hahrn o
n i a e � po n t a n ea e nth e o l n t eh e� � e i n d iv id u a l e o � o ­
clal e c o m o a e c o hh � n c l a d e � eh o i n d i v I d u o o � ni c o
a p t o paha d l � c eh n�h e � ati� n a z eh � e u� � nt eh e � � e�
( id em , _ p . 2 1 - gr i fo n o s s o ) .

Sendo i guai s em d i r e i t o a po s i ç ão d e c ada um na soc i edade s e ­

r á funç ão d e s u a capac idade e e s fo r ç o pe s so a l .

A idé i a de l iberdade , n e s s a doutr i n a , e s tá i n t ima -

mente ar t i c u l ada à d e propr iedad e , e ntendi d a c om o um d i r e i to


51.

natural do ind ivíduo . E s te é l ivre para c o n s ervar o produto

de seu traba lho , a s s im como p a r a d e l e d i spor . Por tanto , tem

p leno d ir e i t o à propr i edade s ob tod a s a s suas f o rma s , mob i l i �

r i a ou imob i l i ár i a . O s pr iv i l é g i o s decorrent e s d o n a s c imento

que as seguravam à nobr e z a a d etenção das r ique z a s s ão c omb a t i

dos e deverão ser subs t i tu íd 9 S p e l o traba l ho e pe l o t a l ento ,

cons iderados os bens supremos do ind ividuo na m e d i d a em que

lhe pos s ib i l i tarão a aqu i s i ç ão d e propr i e d ade s e r ique z a .

A doutr ina l i be r a l tem t ambém como fundamento a i-

gua ldade d e d ire i t o s e n tr e os i n d i viduo s , e sp�c i e de " equiva­

l ente " da igualdade natur a l , j á não ma i s a c e i t a. D i z Cheva l l ier

(1976) :

C o m e 6 e lt o a c l � u � u l a 6 u n dam e n ta l d o c o n t� a t o � o c l a l
i , c o m o � e � a b e , a m e� m a p a � a t o d o � . T o d o � 0 6 c l da -
d éi o .6 6 e. c o m p� o m et c.m 11 6 0 b a � riH)_ 6 nl CI..6 c o n d l ç. Õ Q. 6 - e de­
v em g o z a tL t o d o � o � m e. !.> m o � · dltL elt 0 6 " . Em c o n � e q u ê }1 c l a
n u n c a t em o 6 o b etL a n o o d l� elto d e � o btL e C atLfL eg a� m a l 6
um � � dl t o q u e o uttL o . L o ng e d e d e 6 ttLultL a 19 u a l d a d e l�
tutLa l , o p a c t o & u n d am e n t a l 6 u b6 tltu l , p O tL u m a l Q u a l ­
d a d e m o � a l e l e q Z t lm a , o q u e a n a t utL e z a p u d e tL a � " t� o
du zltL d e d e 6 lg u aldad e � Z6 l c a e "t�e 0 6 h o m e n !.> : e , p o �
d e n d o e l e !.> � etL d e6 ig u al6 e m 6 0 tL ç a o u em g ê n i o , t O fl. -
n am - 6 e t o d 0 6 19 u a l 6 p o .'!. c o n v e n ç ã o e d lfL elt o . ( p . 1 6 5 )

A igua ldade c ontr atua l f ix a , portanto , p e l a l e i , a

exi s tênc i a d e po s s ib i l i dade s , opor tunidades i gu a i s a todos os

c idadão s . Não de strói , por�m , a d e s i gua ldade natur a l d e c apa-

c i d ades e apt idõe s que s ervirão c omo j u s t i f i c ad o r e s d a s d e s i -

gualdades soc i a i s d e f ato . A garant i a d a i gu a l da d e pe l a lei

não imp l i c a po i s a i gualdade mate r i a l e soc ia l , v i s ta c omo urra

impo s i ç ão , um d e s r e sp e i t o à s d i ferença s i n d i v i d u a i s . E l a ape -

nas e stab e l e c e c omo l eg í t im a a l ivre c ompet iç ão e n t r e o s su -

j e itos para a l c ançar d e t ermi nada po s ição , s a n c ionando po i s a

de s igua ldade soc i a l p e l o r econhec imento para l e l o d o r e spe ito

à ind ividua l idade , à l iberdade e à propr i ed a d e .


52 .

Embora nem todo l ib e r a l s e j a democrata , a democra -

c i a con s t i tu i - se em outro fund amento da doutr i n a , onde j us ta-

mente os princ í p i o s ant e r i o r e s d e s embocam .

A d em o c�a c ia l i b e� a l ê o m ét o d o d e 9 0 v e� n o q u e �e
p� o p 5 e a a� � e9 u�a� � c o m u n i d a d e n a c i o n a l q u e todo�
o � i n d i v l d u o � J e a t e n ham � � � e9 �a � d o j o g o d a c o m p e
ti ç ã o p o l ltic a , a � � im c o m o c o m p e t em p e la Jti q u e. z a cL[j,
-
p o n l v el da n a ç ã o . ( C unha , op . c i t o p . 3 3 )

E s tr i tamente f a l ando , a democr ac i a imp l i c a a p a r t i -

c i pação popu lar no gover no , por tanto u m g overno de ma i or i a . A

d i f iculdade r r ât i c a �e s e a l canç ar e s s e t ipo de governo l evou

à concepção do par l amento , onde o povo s e f a z repr e s e n t ar pe-

l o exerc í c io do voto .

A c omb i n � ção e s tru tur a l de s s e s p r i n c í p i o s e funda -

men tal ã compreensão do mecan i smo p e l o qual a i d e o log i a l iber a l

s e impó s num determinado momento h i s tór ico c orno d omi nante. E l a

s e produ z iu n o momento em que uma nova s oc i edade econôm i c a s e

e s t abe l e c i a . Em s e u s fundamentos tr a z ia po i s a i d é i a e m v i r t u .

d e da qua l uma nova c la s s e an s i ava pe l o predom í n i o po l í t i c o .

A postu l a ç ão do E s t ado contratual f o i o i n s t rumen t o b â s i c o des

s a doutr ina .

Importante d e s ta c a r a lgumas contrad i ç õ e s r e l a t ivas .

aos pr inc í p i o s apr e s e n t ados . A pr ime i r a d i � r e s p e i to a uma an

t í t e s e entre a l iberdade e a i gua ldade . Na l i be r d ade

e n c o nt� a - � e o p Jt ed o m l n i o d a a ç ã o i n d i v i d u al q u e � em ­
pJt e d e 6 e n d e u a� d o Jt o � a m e n t e ; n a ig uald a d e e � t � a
i n t eJt v e n ç ã o a u t o Jtit��ia q u e c o n d u z em ú ltim a a n áli­
� e , � Jt e� t� i ç ã o d a p eJt � o n a l i d a d e i n di v i d u a l . ( Laski )
1939 , p . 9)

Corno consequ ênc i a import ante e s t á o f a to que , o l iber a l i smo ,

embora se tenha c o l o c ado c omo univer s a l , s empr e bene f i c i ou a -

penas o grupo s oc i a l p e l o qua l f o i i n s t i tuído . ( idem , i b idem ) .


53 .

Outra contrad i ç ã o que h i s to r i c amente s e tornou cada

ve z mai s evidente , e s tá nos pr inc í p i o s d e l iberdade e propr i�

d ade . D i z La s k i :

Nu n c a p u d e e n t e n d e� - o u n u n c a 6 0 i c a p a z d e a dm i tZ ­
l o pl e nam e nt e - q u e a l i b e� d a d e c o n t� a t u a l j am a i � �
li v � e a t � q u e a� p a� t e � c o n t� a t a n t e� p o � � uam 1 o � ç a �
ig u a i � p a � a n eg o c ia� . E e � t a ig u a l d a d e , p o � Il e c e� � i
d a d e , � um a 6 u n ç a o d e c o n di ç � e � m a t e�ia i � i g u a i � . Õ
i n d i v Z d u o a q u em o li b e�ali� m o t em p� o t eg i d o � a q u e
l e q u e , d e nt� o d e � eu q u ad � o � o c ial , � 6 em p� e ti v ��
pa�a c o m p�a� � ua li b e � d a d e ; p o � �m t em � id o � em p � e u
m a m i n o �ia d a h um a n i d a d e o n ú m eJt o d o � q u e t em 0 6 � e-::
cu�� o � pa�a á a z e� e � � a c o m p�a . P o d e - � e d i z en , e m � u
m a , q u e a id ei� d e li b e�ali� m o e � t� hi � t 5 � i c a m e n t e­
t�a v a d a , e i � t o d e m o d o i n e l u dZ v el , c o m a q u e� ta o da
p� o p�i e da d e . o � 6 i n � a o � q ua i6 6 e � v e , 6 � O 6 em p� e O �
6 i n6 d 0 6 h o m e n 6 q u e 6 e e n c o ntnam n e� 6 a p o � i ç � o .
( idem , p . 1 1 )

Portanto o s ind ivíduos l ivr e s po s tu l ado s pe l o l ib e ra l i smo na-

da mai s s ã o que a b s tr açõe s j á que nun c a f or am a t i ngido s p e l o s

bene f í c i o s d e s s a ideolo g i a . Aque l e s que p o s s u íam a propr ieda-

d e foram o s que c onc eberam s e us pr incIpio s , ne s s e s entido , r e

f lexos d e inter e s s e s de c l a s se .

O pape l atr ibuído à i n te l igênc ia no inter ior da dakri

na libe r a l é da m a i o r impo r t ânc i a . O pr i nc í p i o d e i gua ldade so-

c ial , re inv i d i c ado para e fe i to d e d om i n a ç ã o po l í t i c a e econo-

mica , deve s er mant ido corno v a l o r máx imo porem é f ao me smo te.'Tl

po , incomp a t íve l c om a prõpr i a " d om i n a ç ã o . As c ap ac id ad e s i nd!

vidua i s serão aqui co loc a d a s c omo r e spon s áve i s p e l a ordem e s -

tabe le c i d a : cada um ocupara o lugar que l he c onvém ne s s a or "-

d em ou s e j a , aque l a de acordo c om s u a s qua l idade s d e i n te l i -

gênc i a , mér i t o e re spons ab i l idade i nd ividua l . A inte l igênc i a

l ivre e natu r a l é o e l emento que d i r ige a ação s o c i a l permi -

t i ndo a r e a l i z aç ã o p lena d o s i n d �vidu o s .

E s s a s que s t6es avanç am . D i z B i s s e r e t (1979 ) :


54 .

Em 1 8 3 0 , in-t e.t ig e n-t e ê uma p a .t a v n a. q u e � a z 6 un o n . A


in-t e.tig ê n c.ia , .6 eg u n d o o d i c. i o n â.Jt i o d e L a v e a u x , é
" um a c. enta e q uida d e da a lm a , q u e v ê o v en d a d eino , o
j U.6 to e a e.t e .6 e pJt e n d e. " . Em o uDw .t u g an e.t e -t o n n a
p n e c. i .6 o : " o na , o p e,'t â. .'l i o . . . d i z - .6 e d a q u el e q u e. e x e. n
c. e. uma pn o 6 i.6 .6 � o m e c a n i c. a pana a q u al a i n t e..tig ê n �
c. i a n � o é a b .6 o .t u-tam e. n t e. n e. c. e. .6 .6 â. Jt i a " . A i n -t e. .tig ê n cia.,
a a ptid � o pana o e .6 tu d o d a .6 C i ê n c. i a .6 e. d a .6 Ant e. .6 t O Jt
n am - .6 e. atJti b ut o .6 d a .6 c.nia n ç a .6 d e � amIlia b ung u e. .6 a ;
6 amI.tia e. 6 .6 a q u e n e .6 -tn i n g e. .6 u a.6 dim e. n.6 � e.6 p a n a a .6 .6 e
g unan a o .6 .6 e. U .6 o m â. xim o . d e. .i. ludn u ç � o e .t h e. .6 -tna n .6 mI
-tin p o n i n t e.in o , .6 e. u p a tnim � n io e. c o n � m i c. o . A .6 c. o n o�
-t a ç � e.6 d o t eJtm o .6 a p ti d � o t o n n anam - .6 e e n t � o pn o g n e. .6 -
.6 i v am e n t e a .6 d e. um d a d o illl utâ. v e.l , p e. nm a n e n -t e , h e.n e ­
di-tâ.nio , q u e. d et e. n m i n a o d e.6 -ti n o d e. um i n d i v I d u o ; a
apti d � o p e. Jt d e u o .6 e. ntido d e c. ana c. t enI .6 -ti c. a al e a t 5 -
nia q u e , n o 6. é c u .t o X V I I I , l h e c. o n 6 e.nia a i d éia da
.ti b e.n da d e huma n a e. , a n t e. .6 d o .6 é c u l o X V I I I , a i d éi a
d e. .t i b e.'r. d a d e d i v i n a . ( p . 4 1 ) 1

3 . 2 - O PAPEL DA EDUCAÇÃO : APT I DÕES D E S IGUA I � ,

OPORTUN IDAD E S IGUAI S .

D a me sma man e i r a que a dout r i n a l i ber a l po s tu l a a

exi s tênc i a d e apt idões e c apacidades natur a i s c orno me i o de ex

p l i c ar a s de s i gu a ldade s de f a t o , e l a t ambém atr i b u i à educa -

ç ão e s c o l ar o pape l d e viab i l i z ar a igua ldade d e d i r e i to e de

oportun idade s . A educ ação l iber a l procura p a s s ar a idé i a de

urn a e s co l a neutr a , onde n ã o exi s t em pr iv i l é g i o s de qua lquer na

ture z a . E l a visa d e s e nvo lver em c ad a i nd iv iduo s u a s aptidõe s ,

ta lentos e voc açõe s , i ndependen temente d a c l as s e d e o r i gem

credo , raça ou qua i squer outro c r it é r i o s o c i a l . O m é r i t o i ndi

vidu a l sendo a ba s e da h i e r arqu i a soc i a l encon t r a , na educa -

ç ao , o me io d e s e d e s e nvo lver em p l e n i tude , l evando o indiví­

duo a ocupar sua po s iç ão n a soc i edade .

I
A c. i-ta ç � o -t e x t u a.t d a a u t o na 6 a z n e. 6 en ê n c i a a o d i c i o n â.n i o d e.
L a v e. a u x ( V i c ti o n n ain e .6 lj n o n ym i q u e. d e l a .t a n g u e 6 n a n ç ai.6 e
Pa't .i..6 � 1 8 2 6 I
.
55 .

D iver s o s te6r i c o s l ibera i s d i s tac ando- d e Locke ,

Vo l t a i r e , D iderot , Condo r c e t e (Le p e l l e t i er , e xpr e s s am sua s

idé i a s a re spe i to da educação , o que demo n s t r a a importânc i a

a e l a atribuida n o corpo d a doutr i n a . Tomaremo s a lguns d o s IX>�

tos por e l e s d e fendido s que n o s p a r e c em ma i s r e l ac ionado s a

ques t ão da i n t e l i g�nc i a . (tunha , op . c i t . , p a s s im )

Locke de fend� b a s i c ru� ente uma c onc epç ã o c ontrár i a a


"

das idé i a s inata s . Adm i t e um e s t ado natu r a l d e p e r f e i t a l ibeE

dade e também de i gualdade c o n s ider ando que o homem é " tábu l a

ras a " s endo a s d i ferenç a s e n t r e o s i nd i v i duo s c au s ad a s pe l a

educ aç ão .

o reconhec imento da i guR ldade nao l eva porém, Locke ,

a cons iderar q u e a educ a ç ã o deva s e r un iver s a l p o i s para ele

as di ferenç a s d e c la s se s 5 0 ante r i o r e s ã educaç ã o . Ne s s e s e n -

t ido , á educ ação tem f i n a l i dade s de l im i tada s "a p Jt i O hi " : para

os r i cos , d e s envolver a c apac i da d e p a ra a s s i tu a ç õ e s de mando

e para os pobr e s , de senvo lver a c apac i dade de obe d e c e r . Locke

acred ita que a ordem soc i a l é um dado que a i n s trução não a l -

tera ( idem , pa s s im )

Vo l ta i r e de fendi á aber tamente a d i s c r im i n a ç ã o so-

cial , achando q ue a educaç ão n ã o deve r i a a t i ng i r a p l eb e poi s

" não va l i a a pena " . " A c. a n a i L t e n ã o ê " dig n a " d e e .ó c. .e. a Jt e c. im e n

to " p a Jt a V o .tt a iJt e , ( L a sk i , op . cit o p. 154-5 ) . Cons iderava a

de s i gua ldade de c l a s s e s como n ec e s s á r i a e temia que a i n s tru-

çao popul a r pude s s e ame açar a a s c e nç ã o da burgue s i a .

{ • • 1 A 6 tJta n .ó 6 o Jtm a ç � e .ó q u e p e dia e Jt a m , im .ó u a .ó .t i ­


n ha .ó g e Jt a i .ó , a .ó d a pn 5 .ó p e na b uJt g u e .ó i a . Qu e n i a l i b eJt
d a d e , m a l.> tam b êm q u en i a u m a l i b eJt d a d e c. o m pa t-Z v e l c.onl
a I.> m a i l.> c. o m p l e t a l.> o p o Jt t u H -<.. d a d e. 1.> d e pJt o g fl. e -b .ó o p a.'ta O .ó
h o m e n .ó d e b e n .ó e pn o pn i e d a d e .ó ( . . . 1 S e u .t i b en a l i l.> m o
c o m o p Jt i n c. Z p i o a ti v o e .ó i.ó t �m i c o n ã o 6 0 i a l � m d a .ó
n ec. e ó l.> i da d e. .ó d e .ó .ó a c. .e. a ,� .6 e
• • •( idem , p . 1 5 5 )
56 .

Condorce t , t eve p ape l fundament a l . n a s conc epçoe s s o

bre educação da Franç a pós -Revo lução . � �r gu e s a e n a apr e s enta-


!
çao de um p lano de e n s ino - O P l ano de I n s t ru ç ã o Púb l i c a - on-

de defendia a educ ação gratui t a c omo f o rma d�. s e a l c ançar a i

gua ldade de oportun i dad e s . Achava que o E s t ado não s ó deve a�

segurar o s d i r e i t o s naturai s do s i nd iv í du o s como t ambém atuar

supr imi ndo a s des igua ldade s decorr e n t e s da ordem s o c i a l : a de

r ique z a , de pro f i s s ão e de i n $ trução . As d e s i gu a ldade s n a tu -

rais Condorc e t c o n s i derava impo s s í ve i s de s e rem abo l id a s po-

rém , ac reditava que e l a s podiam ser amen i z ada s na medida em

que se supr imi s s em as soc i a i s .

A educaç ão , n a vi s ão d e Condorc e t , deve t e r uma fu�

çao l ibertadora , a tuando p e l o d e s aparec imen to do d e s po t i smo e

conduz indo o homem ã r e cuperação d e s u a l i berdade natur a l . Cu

nha (19 7 5 ) diz :

S ua e d u c a ç � o em a n c i p a d o � a c o n 6 i 6 t e , e m p�im e i � o l u ­
g a� , em o �g a n i z a � a c ultu�a da� 5 a c u l d a d e 6 i n t el e c ­
tuai6 e m o � ai 6 e a 6 6 eg u�� - l a a t o d 0 6 � a o m e n o � at �
o g � a u em q u e ela � n e c e6 6 5�ia p a�a a i n d e p e n d � n c ia.
S e� i n d e p e n d e n t e � n�o 6 6 , no 6 e ntid o 6 26 i c o , p� o ­
v e� p o � 6 i p� 6 p� i o 6 ua 6 n e c e 6 6 i d a d e6 , m a � t a m b �m 6 e
b a 6 ta� p o lit i c a m e nt e e p o d e� e x e�c e� , p o � 6 i m e 6 m o
[ e 6 em 6 e 6 (t bm e t e� c eg am e n t e li � a z ã o d o � o ut� 0 6 1, 0 6
di� e it o 6 g a� a n ti d 0 6 p o � l e i . A e d u c a ç ã o 6 6 � em a n e i
e a d o �a e dig n a d e u m p o v o l i v h e n a m e d i d a e m q � e dã
a 6 c�ia n ça 6 0 6 c o n h e c im e n t o 6 q u e l h e6 p e�miti� a o 6 e
b a6 ta� em t o d a 6 a � ci�c u n � tã n c ia6 r m at e� i a i 6 , p o l 2 -
t i c a 6 e m O Jt a i 6 1 . ( op . c i t . , p . 4 0 )

Condor c e t co loca a i n s trução c omo o b r i g a ç ão do E s t a

do . Supõe q u e e l a deva s e r abrange n t e , p l ura l i s t a , para que

todo s po s s am d e s frutá - l a . Suas idé i a s são po s t e r iorme n t e torn a

das mai s conc r e t a s através do j á r e f e r ido P l a�o de I n s trução

Púb l i c a , conhec ido como R a p p o fl.t , que e l e e l abora como membro

da As s embl é i a Legi s l a t iva franc e s a . ( idem , p . 4 0 ) . Cabe r e s -

s a l tar n e s s e P l ano a preocupaç ã o , j á e n t ão pre s e n t e , com o En


57 .

s ino técnico que , s e gundo Condorc e t , deve r i a s e r d i ferenc i ado

em vár ios cursos de modo à at�nder à s apt i dõe s n atur a i s dos

indivíduos . Também ver i f i c a - s e o e s tabe l e c imento d e l im i t e s

de tempo em função da s i tu a ç ão e conôm i c a e d a s h ab i l i dade s pe�

soa i s . Con s i dera que , de acordo c om e s sa s d i f e r e nç a s , c ada a-

luno percorrerá graus de i n s trução d iv e r so s .

Pa/ta C o n d o ,'L c.. e.t , q u.at/to g /ta u. .6 d e i n .6 t/t u. ç ã o pa/t e. c.. e.m .6 u.
6 i c.. i e. nt e..6 pa/ta a .6 .6 e g u. /t a /t C .6 ta c.. u.ltu./ta g e. /t a l d e. t o :
d o .6 0 .6 ta l e. n t o .6 e. a p t i d � e. .6 , d O h m a i.6 m o d e..6 t o .6 a o .6
m ai.6 e x c.. e. p c.. i o nai.6 . ( id em , i b i d e m )

As c r i an ç a s pobre s ma s ta l e n t o s a s poderão ir ad i an t e às cus -

t a s do E s tado atrav é s da c on c e s s ão d e bo l s as d e e s tudo .

Lep� l l e t i e r t ambém a p r e s en t a um " P lano Nac iona l de

Educaç ão " em 1 7 9 3 , onde d e f e nd e pontos s eme l ha n t e s como pr in-

c i pa lmente a gratuidade do e n s ino ( dos 5 aos 12 anos ) , a i gual

dade na pr á t i c a de en s i no (me sma s a l imentação ; v e s t imenta, i n�

trução e c u i dado s ) e a obr igator iedade do s p a i s em cumpr i r CCJ.'Tl

o s dire i to s d a s c r i an ç a s matr i c u l ando- a s na e s c o l a . Lepelletier

co loca a i nda como ob j e t ivo s da educação nac i ona l :

6 0 ft ti 6 i c.. aft o c.. o /tp o e. d e. .6 e n v o l v � - l o p o /t m e.i o d e e. x e./t


c.. i o .6 d e g i n � .6 ti c a ; a c.. O .6 tu.ma/t a .6 c.. /t i a n ç a .6 a o t/ta b a �
l h o d a .6 m ã o .6 ; e n d u./t e c.. � - l a.6 c.. o nt/ta t o d a · a e..6 p i c..i e. d e
c.. a n .6 a ç o ; d o b/t� - t a .6 a o j u. g o d e u. m a d i .6 c.. i p l i n a .6 a l u. -
ta/t ; 6 0 ltm alt - l h e. .6 o c.. o /t a ç ã o e o e .6 p Z/tit o p o /t m ei o d e
in.6 t/t u. ç � e.6 � t e.i.6 ; e. dalt c.. o n h e c im c n t o .6 n e c.. c .6 .6 5/ti o .6 a
t o d o c i d a d ã o , .6 c j a q u. a l 6 0 /t a .6 u. a p lt o 6 i.6 .6 ã o ( p/t i n c.. i
palm e n t e. d e o /ti e. l'l t a ç ã o c.. o n c../t e.ta e p ,'L�ti c.. a . ) ( i dem , p. 4 3 )

A par a import ânc i a conc e dida p o r e s s e s t e ô r i c o s a

ques tão da educaç ão , obs erva- s e que a lguns d e f endem uma pos i -

ç ão ma i s e l i t i s t a para a e s c o l a c o n s iderando q u e as d e s i gu a l ­

dade s s ô c i o - e c onômic a s i n ev i tave lmente imp l i c am d i f e r e n ç a s no

tipo de i n s truçãC' de s t inado a c ada c l as s e , e nquanto outros

apresentam uma propos t a não d i scr im i n a t iva , onde t e n t am abran


58 .

ger com a me sma i n s trução , todas a s c l a s s e s soc i a i s d e forma

a garantir a i gua ldade de d i r e i to s e oportun idad e s . Es ta ú l t i


-

ma corrente de pensador e s teve amp l a i n f luênc i a n a s c oncep

ções pedagó g i c a s que con s i deram a e sc o l a c orno i h s trumento e­

qua l i z ador das d e s i gu a ldade s e c o nôm i c a s , perc eb e ndo- s e , ainda

ho j e , a n íve l do s p l ane j amento s e das po l í ti c a s educac i ona i s ,

a presença dos ponto s b á s i c o s por e l e s defendido s .

Sobre a impor tânc ia da e s c o la no e s tado c ap i t a l i s -

ta , Lou i s A l thu s s e r (19 7 0 ) em " Id e o l o g i a e apar e l ho s I d e o l ó g i

cos d e E s tado " , s u s tenta a t e s e de q u e o apare l ho ideo lóg i co

e s co l ar t em pos i ç ão dominante c orno reprodutor d a s r e l a ç õ e s de

produç ão do s i s tema c ap i ta l i s ta . Ante s da R evo l u ç ã o F ranc e s a

e s s e pap e l e r a d e s empenhado pe l a I gr e j a , e n tão o " Apare lho I ­

deo lóg i c o de E s tado n9 1 " (p . 6 0 ) . Apó s a Revo lução , a burgu�

s i a indu s t r i a l d i r ige s e u s a taque s j us tamente ã I gre j a , tra -

vando uma longa luta para s e apoderar das s u a s f un ç õ e s iceo l ó-

g i c a s , a f im de a s s egur ar a hegemoni a po l í t i ca e i deo l ó g i c a n�

c e s sár i a à r eproduç ão d a s r e l a ç õ e s s oc i a i s . A l t hu s s er co l o c a

que o duo Igre j a - Famí l i a , f o i ' s ub s t i tu ído pe l o d u o E s c o l a -

Famí l i a , que e n t ão pas s a a d e s empenhar o pape l d aque l e . ( idem ,

p� 62) .

o c o n j unto do s Apare l hos Ide o l ó g i c o s d e E s tado con-

correm para um me smo r e s u l tado (a � eprodu ç ão das r e l aç õ e s de

exp loração c ap i t a l i stas ) m a s , n e s s e c o n j unto , a e s c o l a d e s en-

vo lverá um trabalho l ento e longo a t i ng indo com pro fund idade

os obj e t i vo s . As cr i anç a s , dur a n t e ano s , aprend e r ã o os c onhe -

c imentos envo lvidos na i d e o l o g i a dom inante ( c i ên C i a Inora l , i n�

trução c ív i c a , f i l o s of i a ) .
59 .

O�a , d i z A l t h u 6 6 e� , � a t� a u � 6 dd a p� e n d i z a g em d e a I
g u n 6 6 a b e.Jt e6 p� â. t i C. 0 6 l �auo� - 6a.úLe J e n u o l u i d o 6 na
i n c. uI c. a ç a o ma6 6 i u a da i d e o l o g ia da c. l a 6 � e d o m i n a nt e,
q u e 6 �O em g Aa n d e p a� t e � e p � o d u z i da6 a6 � eI a ç 5 e� d e
p � o d u ç � o d e uma 6 o �m a ç a o 6 o c. i a l c. a pi t a l i 6 t a , i 6 t o �,
a 6 A el a ç 5 e6 de e x pl o Aa d o 6 c o m e x p l o � a d o � e 6 e de e x ­
p l o �a d o � e6 c. o m e x pl o �ad o 6 . ( idem , p . 6 6 )

E s s e s s abe r e s são t ambém aprend idos n a s f am í l i a s ,

nos quarté i s , n a s igre j a s , nos l ivro s , televisão , f i lmes e

e s tádi os . A e s c o l a , no en tanto , a s sume preponderânc i a quer

p e l a obr i gator i edade que e l a i n s t i tu i que r p e l a própr i a ima-

gem que e l a r e pre s enta : de um lugar neutro , d e s p r ov i do d e i -

deolog i a , cuj a " m i s s ão " e , a n t e s de tudo , l evar o s indiví -

duos ao p leno go z o de s e u s d i r e i to s .

A esco l a , no s i s tema c ap i ta l i s ta , é v i s ta c omo o

e l emento que permi t i rá aos indivíduos d e s e nvo lver suas pote�

c i a l idade s e c hegar ao grau ma i s elevado d e a cordo - com suas

apt idõe s . O fracas so , a de f ic i ênc i a , são c o l o c a d o s como b ar -

reiras d e ordem i n t e l e c tiva que impedem a a s c e ns ao soci al .

Quanto ma i s o E s t ado pos s i b i l i ta o a c e s so a e sc o l a m a i s se

j u s t i f i c a a h ier arqu i a soc i a l . E s ta decorre j á não m a i s de

pr ivi l ég i o s ma s d a c apac idade e e s forço i nd iv i du a l .

3 . 3 - O D I SCURSO " C I ENT I F ÍCO " DA I NTELIGr:NC IA

A ar t i cul ação e n t r e i n t e l i gênc i a e i d e o l o g i a l ib e ­

ral a s s im como o pap e l atr i bu ído ã e s c o l a enquanto equa l i z a-

dora das d i f erenç a s s oc i a i s m e r e c e a l guns c omen tár i o s c r í t i -

c o s que nos parecem fundamen ta i s .

Em p r ime iro lugar , como v imos , a doutr i n a l ib er a l


60 .

supoe que a i n t e l igênc i a , a s aptidõe s mentai s , s ao c ar ac ter í s

t i c a s i nata s , naturai s e hered i t ár i a s . E s ta c r e n ç a que paul a­

t inamente ganha força c om os acontec imentos p ó s -Revo lução Fr�

c e s a tem como garan t i a o d i scur so cons iderado c i e n t í f i c o : a

Biolog i a contempor âne a i n i c i a lmente e a P s i c o log i a em s e guida,

s obretudo por i n f luênc i a da prime i r a , des e nvo lve r ão toda uma

s é r i e de argumentos para cor roborar a i d é i a de uma i n t e l i gên­

cia inata e hereditá r i a . Pode - s e cons tatar teor i c amente que

os te s t e s de >i nte l i gênc i a , ao sur g i r em c omo i n s t rumento s de

medida de s s a carac te r í s t i c a , fun c i onarão e se e n c a i xarão per­

f e itamente nos obj et ivo s da ordem burgue s a . Sem operar , como

demon s tramo s no cap í tu l o l , qua lquer corte com o c onhec imento

vu lgar , inaugurarão a categor i a de Quoc iente I n t e l e c tua l , que

será d i s s emi nada em todos os n íve i s e fará da c on c epção vul -

gar um " conc e i t o c i entí f ic o " , pas s ív e l de s e r qua n t i f i c ado , i

solado , ordenado , c la s s i f i c ado . Se , de Th� l ado , s e fala numa

intel igênc i a hered i t ár i a , de outro , são o s tes t e s aque l e s in�

trumentos que perm i t i r 30 l evar ad i n t e p e s qu i s a s e ver i f i c a ­

çoe s de s sa hereditariedade .

As s im , c r i t i c ar a crença n a her e d i t a r i edade pode


'
ser fe ito sob do i s ângulo s : atr avé s dos i n s trumentos (os pro­

pr ios t e s te s ) que s ervem de b a s e às o b s ervaç õ e s - , p e s qu i s a s

com gêmeos , com f i l ho s l e g í t imo s ver sus f i l hos adot ivos etc­

o que t emos procurado des e nvo lver até o mome n tó i através dos

resul tados d e s s a s me smas pe s qui s a s que , ape s a r de s e r em ten -

denc i o s amente d i r i g i d a s à ob s e rvação da hered i tar i ed ade da in

t e l igênc i a , em muitas s i tuaç õ e s não trouxeram qua l quer · evidên

c i a sobre e l a .

Em r e l ação aos i n s trumentos obs erva- s e ( Anas tas i , l967 ;


61 .

1977 ; B i s s e re t , 19 7 9 ; Bor i ng , 1951 ; Heathe r l 1 9 7 7 ; Nunn a ly

197 0 ) que , em sua or i gem , e l e s e s tão . L gados à uma c e r ta con­


I
..

cepção , ante s de tudo , rac i s ta d a i n te l i gênc i a . G a l ton , s egun

do e s s e s autor e s , f o i um do s pr ime i r o s a se �n te re s s ar pe l a

med ida d a c apac idade ment a l e i n f luenc i ado p e l a s d e s cobertas

de Darwin , tentou ap l i c ar s eu r ac ioc i n i o evo lu c i on i s ta à que�

tão do i n t e l e c to . Preocupava- s e c om a " v i ab i l i d a d e de supl an-

tar o t ipo humano i ne f ic iente . por l inhag e n s me l ho r e s " , sub s t!

tuindo a s e l eção natur a l por uma s e l eção r a c i o n a l apo i ad a em

cr i té r i o s t é c n i co s . F o i e le quem , b a s eado n o s e s tudos de

Que t e l ê t (ver c ap i tu l o I ) , .
i n f e r iu a que s tão d a .
norma l i dade

dos c arac t e r e s menta i s . Medindo a rel ação entre f e nômenos f i -

s i co s e men t a i s a s s im corno e n t r e a s a p t i d5e s d o s p a i s e do s

f i lhos , G a l ton a f irmou t ambém , em sua c é l ebre obra 'Bered i tary

Genius " , o c aráter hered i tá r i o da i n t e l i gênc i a . Achava que a

espé,c ie humana deve r i a s e r ape r f e i ç oada , e s tando l i gado ao s

movimentos eu g ê n i c o s da sua époc a .

Após G a l ton , C a t t e l e B i n e t (Ana s tas i , 19 6 7 ; 1977 ;

K i rby et a l li i , 1 9 7 7 ; Nunna ly , 19 6 7 ) tentarão a c o n s trução de

um ins trumento d e medida d a s c apac idade s , enquanto a c orrente

dos chamado s f a tor i a l i s ta s (Spe arman , Bur t , Vernon , T hu r s t. one,

Gu i l ford , e tc . ) preocupar-· s e - á c om a e s trutura d a i nte l igên -

cia ( Butcher , 1 9 7 2 ; Bur t , 1950; Gu i l ford , 1 9 5 4 ; N ick , 1977

Spearman , 19 2 7 ; Thurstone, 1 9 5 7 ; Ver non , 1 9 5 2 ) . O a specto prag-

mát i co nas duas abordagens s empre pr edolllinou . N o s pr ime i r o s I

expl i c i t amente ; nos s egundos mai s ve l ad ame n t e j á que tentarão

e l aborar uma teor i a d a i n te l i gênc i a humana . E s t a teor i a porém,

não u l tr apas sará a conc epção ideo l ó g i c a de uma . i n t e l i gênc i a n�

tura l , heredi tár i a , que s e man i fe s t a de s i gua lmen te nos s u j e i -


62 .

to s , que s e d i s tr ibu i qe f orma aprox imadamente normal e que

é pas s ível de ser ava l i ad a por � n s trumentos e spec í f i c o s . D i f e

rentes d e s empenhos ne s sa s s i tuaçõe s (de t e s tagem ) , evidenc i a-

rão maiores ou menore s corr e l aç õ e s d emons tr antlo a " ex i s tê ncia "

. .. . .
de f atore s de inte l ig ê n c i a regendo e s se s c ompo r t amentos . Na
;<. , ",

rea l idade , e s s a teor i a nad a ma i s é que a a p l.i c a ç ã o de uma téc

nica e s ta t í s t i c a - a aná l i s e f ator i a l - s obre os r e s u l tado s

dos suj e i tos num t e s te de c apâc i dade menta l .

Butcher ( 1 9 7 2 ) r e sume em a lguns tóp i c o s o que essa

téc n i c a perm i t e s aber a r e sp e i to d a i n te l i gê nc i a :

1 1 S e q u al q u e� h e l e ç io am pla d e ta� e 6 a 6 m e n tai6 e


d a d a a am o 6 t� a � e p� e6 e nt a t i v a d e p e h 6 0 a6 em d e
t e�m i n a d a c ultuha , o p a d� a o d e � ea l i z a ç a o g e� a l ­
m e n t e h e v ela um c o m p o n e n t e c o m um a t o d a 6 a 6 ta� e
6 a6 , o q u e p o d e 6 e� i nt e� p n e t a d o c o m o i n t elig � n�
cia g e�al .,

2} E6 t e 6 at o � g e�al n a o � 6 u 6 i c i e nt e pa�a e x pl i c a�
t o d a 6 u p e � p 0 6 i ç a o n a � ea l i z a ç a o . E n c o nt�am - 6 e a l
g u n 6 6 at o � e 6 c o m u n ll c o m pl em e H t a� e 6 , i n d e p e n d e n �
t e 6 d e i n t elig � n cia g e� a l , e tai6 6 a t o � e 6 p o d em
6 e� i n t e�p�eta d 0 6 c o m o a l g um a 6 c a p a c id a d e6 - p o �
e x em pl o , c a p a c i d a d e v e� b al e c a pa rii d a d e e 6 p a cial .

3} E im p o �t a n t e o e 6 e i t o d a i n t elig � n c i a g e � a l , t a l
c o m o � a v alia d o a pa�ti� d a 6 u p e� p 0 6 i ç a o e nt � e
� ea l i z a ç � e6 , e p o � e l a e x pl i c a da . M uito 6 � e q u e n ­
t em e nt e , a q ua n tid a d e d e v a�ia ç a o em � e a li z a ç a o
q u e p o d e 6 e� at�i b u Z da a i n t e lig � n c ia t em 6 id o
m a i o � d o q u e a q u e � o d e 6 e� at�i b uZda a t o d o � 0 6
o ut� o 6 6 at o � e6 � eu n i d 0 6 .

4} E p 0 6 6 Z v el a nali6 a� um c o n j u n t o � e p � e 6 e nt ati v o de
� e a l i z aç� e 6 m e ntai6 de -6 o �m a q u e 'nao 6 e e n c o nt� e
q u a l q u e� 6 at o � d e i n t e lig � n c ia g e �al , m a 6 i6 6 0
g e�alm e n t e e xig e o em p� eg o d e -6 at o � e/.) q u e , em 6 i
m e 6 m 0 6 , e6 ta o a t � c e�t o p o n t o c o � � e l a c i o n a d 0 6 , e
di6 6 0 � e6 ulta q u e uma a n �li6 e p 0 6 t e� i o � � ev e l a um
6 at o � g e�al o cu l t o .

5 1 M uita6 d e6 c�i ç � e6 d a e 6 t�utu�a d e c a p a c i d a d e 6 h u


m a n a 6 p� o c u�a�am c o n 6 i �m a ç a o at�a v �6 d a t � c n i c�
d e a n�li6 e 6 at o �i a l . Tai6 a n � li 6 e6 , e m b o � a a pa -
� e n t em e n t e m uito d i u e�6 a6 , m u ita6 v e z e6 6 � 0 m a t e
mati c am e nt e e q ui v a l e nt e6 . S e 6 a O � ealm e n t e di 6 e�
� e n t e 6 , i6 6 0 6 e d e v e , g e�alm e n t e , a d i 6 e � e nt e 6 e6
c o l ha 6 do tipo de d a d o h q u e d e v em 6 e4 a n ali6 a d o �
63.

6) Em � i m e� m a , a a "�li� e 6 at c ni a l n a o . p o d e i n d i c a n
a m el h o n im ag e m d a e � tnut una d e c a p a c i da d e a . U m a
e� c o l ha e n tn e imag e n� a t t en ll at ,- v a ·fI d e v e � e n 6 e i ­
t a c om b a .!l e pa i c o l ó g ic al, e H ã o e � tatZ� ti c a ( . . . )
(p. 7 0-1)

A teo r i a h i erárqu i c a d a i nte l i g ê n c i'à que s upoe por-

. .;. . . tanto a e x i s tênc i a de um f a tor comum ( a i n te l i gênc i a gera l ) e


:�:. . -:�

de fatores e s pe c i f ico s , o f a z a par t i r : 19 ) dos r e s ul tados d a s

tare f a s menta i s ; 29) d a aná l i se f a tor i a l de s s e s r e s u l tado s .

Embora o r e spe i to e x i s tente no i n te r i o r da P s i come -

tria quanto ao mê todo de aná l i s e f a tor� a l , que f un c i on a a s s im

como uma e s pê c i e de valor maior no proc e s so de ve r i f i c a ç ão " e�

piric a " da i n t e l i gênc i a , o s própr i o s p s icome tr i s ta s lhe diri-

gem importante s r e s t r i ç õe s . D i z Bu tcher novame n t e :

( . . . ) em b J na m uita6 v e z e 6 a e j a na z o � v e l i n t enp� etan


tai� 6 at c n ea . ea tatZ6 ti c 0 6 c o m o q u alid a d e 6 p 6 i c o l ó g i
c a � 6 u n d a m e ntaia e.l e� n ã o a palL e c e.. m c o m 0 6 tZ:t U l 0 6 eTe
" in t e l .ig ê l1 c .ia " , " c. a p a c i d a d e e fl p a c ia l H e a .6 6 ún pon
d i a nt e . s ã o a p e na6 pn o v a d e c c - v ania ç ã o e n t n e a l g u ­
m a a v ani� v e i� , e i� a o r o d e a en d e v i d o a o ut n a 6 pf!. O ­
P lLi e d a d e 6 em c o m um ; a e , l1um a b a t enia d e t ea t ea , t n ê�
ti v ea a em um S o nm a t o o u aplL e6 e n t a ç ã o c o m u m - p o n e -
x em p l o , a e 6 o a 6 em t e a t ea d e m �l ti p l a · e a c. o l ha - ia a o
p o d enia pn o v o can o a p alL e cim e n t o d e um 6 a t o n c o m um
q u e lig a6 a e e6 6 ea tn êa t ea t e 6 ( . . . 1 B unt , em b o n a � e
j a um g na n d e d e S e n� o n d e m é.t o d o � d e a n á l.ü e. n at o Mal
e um pio n eino d e 6 u a cnia ç ã o , c h eg a a d i z e n q u e " o �
6 a t o n e6 , c o m o tai� , � ã o a p e na6 a b 6 t fLa ç � e6 e 6 t atZ6 ti
c a� , n ã o e n ti d a d e6 c o n c n eta� . A d e c o m p o � i çã o d e um�
n ea li z a ç ã o em t ea te e,m 9 e 6 n ã o d em o n a tna a e x ia ­
t ê n c i a d e u m a " c a p a c i d a de. " g e.nal e u m a c a pa ci d a d e v.,
p e cZ 6 i c a , a a a im c o rn o a d e a cni ç ã o d e um v e n t o com�
n o n o ea t e n ã o a u p � e a c o m b i l1 a ç ã o d e d u a a c o n n e n t ea a e
pana daa d o c é u " . . . Á a a im , a i n t en pn eta ç ã o d e um 6 a -­
t o n ea tatZa ti c o c o m o q ua l i d a d e c o en e n t e a em pn e e x i ­
g e j u a ti 6 i c a ç ã o c u i d a d o a a. . ( idem , p . 4 5 )

Outra res tr i ç ã o impor tante que Butcher c o loca ê o

fato d e que a aná l i s e f a t or i al s ó ana l i s a aque l a s c apac idades

que , de antemão , o c on s trutor do t e s t e cons iderou que o te s te

med i a . D i z e l e :

Qua n d o alg u ém e a c.n e v e , c om o ' o 6 p6 i c ól o g o a c. o a tumam


6 a z en , a n e.6 p e Á.. t o d a " e.ó tJt u tu fL a d e. c a p a c. i d a d e.a n e. -
64 .

v e..t a d a .6 p O fL a nã.ti.6 e. 6 at o lLi a l " , � e.fLia m a i .s e. x at o di ­


Z e.fL , li a e .6 tfLutufLa d a � e a p a ei d a d e � . { u e. 0 .6 p4 i e 5.t o g o .6
j u.tg afLam � u e. d e v e fL i am S e.fL if. e. fL� 6 � e a da.s e q u e. t e .s ta -
fLam atfL a v e. � d e. m �t o d o .6 q u e p e fLm � t e.m fL e. .ó u.tta d o .6 n um �
fLi e o .6 a d e q u a d o .ó . ( i dem , i bi dem )
"

F in a lmente But cher r e s s a l ta que a a ná l i s e f a tor i a l

" : , :" em lugar de uma d e s c r iç ão úni ca da e s trutura de c a pa c i dades a

pre s enta ao contrár io ,

um n �m efLo i n 6 i t1 i t o d e fL e .ó p O .6 t a� m a t em a ti e am e. n t e e. ­
q u� v a l e t1 t e.� . PafLa .ó e .t e. e i on afL um a d e .ta.ó e d� z efL que
" e.6 4 a � a e"� tfL ut ufL a " qy e a i H t e .t i g ê. n e i a g e.fL a .t p O fL e,
x em p.t o , e x pl i e a , em m e d i a 5 0 % d e ê. x i t o e m d et efLm i l1a.
da t a fL e 6 a , e. q u e a e a pa e i d a d e. e� p a e ia.t e x p.t i e a o u.tW.6
2 0 % p fL e e i J am o .6 d e o utfLa.ó .ó u po .ó i ç 5 e .ó , m a t em ãti e a .ó o u
p.ó i e o l 5 g i ea .ó . ( idem , i b idem)

Go s t a r í amo s de i n s i s t i r como a s pecto fundamenta l de

nossa c r í t i c a , o f a to de que a teo� ia come ntada e s tá c e ntrada


...

na " r ea l i z ação " , no d e s empenho , no compor t amento do s u j e i to .

Não importa para e s s a teoria o que produz e s s e compo r t amento

po i s " de antemão , e l e j á é cons i derado como expr e s s ã o de uma

capac idade menta l . Aqui r e to rnamos a o ponto j.n i c ia l : e s s a ca-

pacidade e s tá na ba s e de uma d e s i gua ldade s o c i a l que so e un i

camente a s s im pode ser exp l i cada . A teor i a hi erárqu i c a da in-

t e l igê n c i a não que s t iona e s s a d e s i gua ldade a n te s , c o loca- a c�

mo ponto de p art ida , mede-a � ob s e rva-a e corrobor a sua exis -

tênc i a não ma i s como s oc i a l e s im como p s i c o l ó g i c a .

T anto o s d e f ensor"e s da teo r i a h i er á rqui c a como a-

que l e s q u e s e colocam numa po s i ção n i t i damen t e opera c i on a l

( " i n t e l igência é o q u e o tes te med e " ) , s em p o l em i z ar a exis -

tênc i a d a s capac idades e a pos s ib i l idade de medi- l a , vao , no

entanto , deb a t e r a ques tão da here di tar iedade , e sp e c i a lmente

para demons trá- l a . E ma i s uma ve z o s te s te s s ervi rão de evi -

dênc i a .
65 .

T a l evidênc i a nem s empre se impor � j á que , c omo a-

f irmamos , mui tas p e s qu i s a s ,


ape s ar de , p . ev i ame n te d i rec i onad a s,
,
demons trarão exatamente o c ontrário i s to é , a i n t e l i gênc i a ta l

c omo foi med ida , não é h e r e d i t ár i a , nem c o n s t apte , mas ante s ,

var ia inten s amente ao longo do tempo e em função d a s cond i ç õ e s

soc i a i s .

Miche l Tor t (1974 ) em sua obra " Le Quoc i e n t I n t e l -

l e c tu e l " ver i f i c a r epor tando- s � � s p e s qu i s a s d e s e nvo lvidas por

um grupo de s o c i ó logos e p s i c ó logos de C h i c ago ( Ee l l s , D av i s

Havighur s t , Herr i c k e Ty ler ) que o Q I (quoc i e n t e i n t e l e c tual

e s tá fortemen te corre l ac i onado com a o r i gem de c l a s s e dos pe�

qu i s ados , ou s e j a , c ategor i as soc i a i s m a i s b a i x a s apre s entam

s i s tema t i c amente r e s u l tados mai s b a ixos quando s ubme t i d o s a

testes de int.e l i gênc i a . I s so l evou e s s e s p e s qu i s ador e s a uma de

t a lhada aná l i s e d o s mec a n i smos envo lvidos que pod e r i am exp l i -

c ar e's sas d i f erença s . Tentar am a s s im

i d e nti 6 i � a � a n a tu� e z a da� p � o v a� em q u e a � � � i a " ça�


da bu�g u e� ia � e � a,[am m ef h o � q u e o.. � o ut � a � e p o � q u e ;
I d e nti 6 1 � a � a " a tu� e z a d a � p� o v a � e m q u e a � � �l a n ç a �
d a � c l a� � e� p o p u l a � e � � e � aZam � e t a t i v am e n t e m e l h o -
� e .6 , e p o � q u e . ( i d em , p . 2 8 )

Tendo cons ta tado lime. s ér i e d e f ator e s exp l i ca t ivo s ,


-
o s r e feridos autores c o n s i d er a ram que o s t e s t e s e s tudados s ao

s o c i a lmente d iv i s ór i o s porque f a z em ape l o à conh e c imen to s , s ím

bolos , exper i ê n c i a s e s i tuaçõ e s pouco comuns � s c l a s s e s popu l�

res , razao porque os ins trumentos f avor e c em apen a s a s c r i an ç a s

d e c la s s e s mai s e levadas . Nes se s en t i do s e pus eram a e l aborar

provas " cu l tur a lmente equ iva l e n te s " , " demo c r át i pa s " como diz

Tort . Ainda a s s im , perma n e c e r am a s d i f e r e n ç a s anter iormente oh

servadas .
66 .

'
Cer trunente que mu i t a s exp l i c aç õ e s poder i am s e r d a -

das a e s s a s constataçõe s , entr e a s qua i s a s d e T o r t , que de­

mon s tra a impos s i b i l idade de s e c o n s t r u i r um te s t e que não s e -


."

j a um ins trumento de c la s se , quer porque quem o c o n s trói j a-

'-: ; ':'
mai s con s e gue s e i s entar de s e u s própr i o s pad r õ e s cul tura i s quer

porque , em sua origem m e smo , o t e s te é um e l emento fruto d a i -

deo logia burgue s a . ( i dem , p . 29 ) . Intere s s ante po rem obs e rvar


l
que , a despe i t o de cons iderar que os t e s te s de " cu l ture iree "

s ão pr a t i c ame n te impos s íve i s de s e r em a l c ançado s , o p s i c ó logo

M . Reuch l in u t i l i z ar á os r e su l tados dos traba l ho s dos pesqu i s�

dores de Chic ago , para f a z � � o s s eg u i n t e s comen t á r i o s :

N � o � p o � � l v el , n e� 6 a p e 6 q ui J a , a d o �a� a � e 6 e 6 eg un ­
d o a q ua l a l i g a ç� o c o n 6 �a�ada e n �� e 0 6 6 a t o � e� � 5 -
c i o - e c o n a m � c 0 6 tai6 c o m o a p � o 6 i � 6 � 0 d 0 6 p a i 6 o u o
n l v e l d e c u ltu�a e a i n l elig � n c i a d a 6 c � i a n ç a 6 e 6 ti ­
m a d a p e l o t e� � e , p o d e 6 e� at�i b ul d o a u m a e 6 c o l h a v i
e� ada d a 6 q u e 6 t õ e!> c o l o c a d a 6 11 e f.> 6 ef.> t e6 t e f.> . O n at o áe
q u e e f.> ta l ig a ç� o 6 u b 6 if.> t e , em g � a u 6 di v e�f.> o � , pa4a t o
. d a 6 a .ó p lt O v a6 imag i l1 a da-6 a t é. ag a lta [ al g u m a 6 o S o n an)
p e l o 6 pantid�n i 0 6 c o n v i ct 0 6 1 e6 ta t e6 e J j U6 t i S i c a
pa� e c e , e. 6 ta p O f.. i ç � o . ( Reuch l i n apud Tor . t , op . c i t ,
p. 32) .

Mas as conc lus ões m a i s graves s ão a s que Reuchl i n t ir a , ao a-

f irmar que , provave lmente , os r e su l tados encontrado s , uma vez

que s e a f a s t ar am o s f a to r e s s o c i a i s devem s e r devidos à mec a n i s

mos gené t i co s . Ne s se momento Reuchl in ignora a o r i g em d e c l a s -

s e dos tes tes , d i s torcendo a s impo s s i b i l i dades evidenc i ad a s p�

l a s pesqu i s a s de s e s eparar a ques tã o da i n t e l i gê nc i a d e suas

imp l icações sóc io-econôm i c a s , p ar a tomar os r e s u l tados das pe�

qui s a s como ccrroborado r e s j us tamen t e daqu i l o que e l e s negam ,

ou s e j a , o caráter hered i tár io da c apac i d ade que e s tá s endo a-

val i ada .

I
S ã o· a.6 6 im d e l1 a m ,t l1a d a 6 0 6 t e 6 t e6 11 ú1 á e, p e l1 d e nt e.6 d e.. 6 at o n e6 cul
. tunal.!J " tam b �m c ham a d o !> d e " i nt e. n c u l t u n aL!J " .
67 .

Z a z z o também a f i rmar á :

P o d e - � e � U p O ft e o m � eg u� a n ç a Q u e uma 6 � a n j a i n 6 e4io �
d e � t e m ei o ( o p e ���io l , a q u el a e o n � tituZ da d o � t�a b a
l ha d o � e� � em q uali 6 i e a ç � o e d a m a � 6 a d e o p e���i o � �
.6 e ea�a e t e�i z a p o � i n � u 6 i e i ê l1 ei a � 6 Z� i ea .6 o u m e n:taió
de o �ig em bi o l 5 g i e a , q u e � e� ta o �ig e m 6 e j a h e� e d it�
t.ia o u I1 � O . E v i d e n t em e n t e , t. o d o .6 O é> o p e ltá.lti o é> n �o
.6 �0 d � b ei� , m a � uma g �a n d e p � o po � ç � o d e d � b e i� � 0 -
p e��ltia . N 5 6 n 0 6 p e�g u n tam o 6 � e em e e�t.a6 e.6 t.at.Z6 ti
ea.6 , a i n 6 e�io �ida d e d e n o p elt��i o � n n � o � d e vi da �
p� e.6 e n ça d eé> t.a p o p u l a ç � o ' eo n g e n lta o u h e� e dita ltia -
m e n t e d e 6 ie l e nt. e . ( Z a z zo apud 'l'o r t , op . c i t . , p . 3 5 )

Val e r e s s a l tar que o debate me i o v e� .6 U .6 h e r ed i tar i e

dade , t a l c omo é encam inhado n o i n t e r ior d a P s i c o lo g i a D i feren

c i al apre senta uma cond i ç ão fundamental : e st á c e ntrado n a e x i s

tênc ia em s i da i n t e l i gên c i a ou s e j a , adm i t e uma e s s enc i a l ida-

de para e l a que indepenàe das condi ç õ e s determ i n a n te s . As s im ,


li
pode - s e perceber que o d ebate é a l tamente f a l a c i o s o . O "me i o

de que f a l am os p s i có logo s é a l go con s t i tu ído , c om carac ter í s -

t icas inte rmediár i a s , mixto de amb i ente e hered i tar i edade . O

" me i o operár i o " é de s s a f orma , o me i o c on s t i tu i d o d e suj e itos

com b a i x o Q I . Congeni ta ou here d itar i amente e l e é c on s t i tuido ,

i s so o caracter i z a . Portanto f a lar em m e i o e here d i tariedade si�

n i f ica falar a me sma c o i s a .

Quanto aos e s tudo s r e a l i z ados c om gemeos idênti co s

e não- idênt i c o s , cr i ados j untos e s e?arados ( Bu r t , Je n s e n

Newman , F r e eman e Ho l z inger i n : Ana s tas i , 1967 ; Butcher , 19 7 4

Kirby e t a l lii , 1 9 7 7 ) o b s e rva - s e que , em nenhum dos c a s o s , se

c on s eguiu uma evidênc i a i nconte s tável d a here d i t ar i ed ade dos

carac teres p s i c o l ó g i co s , e sp e c i a lmente d a i n te l i g ê nc i a . Mesmo

quando os r e s u l tados s ão f avor áve i s , o s auto r e s apontam para

o cuidado que se deve ter na sua i nt e rpr e t ação , para as fa-

lhas na s e l e ç ão d a s amos tr a s , para as contr ad l ç õ e s dos dados


68 .

e tc . , demons tr ando , de c e r t a mane i r a , s ua pou c a c r e d ib i l idade .

. Apes ar d i s s o há , do ponto d e v i s ta da P s i c o l o g i a D i f e r e nc i a l � ,

unanimidade em a f irmar que a her e d i t ar i e dade não pode ser d e s ­

cartada j á q u e s e u pap e l é fundamenta l e i negáve l .

Sem dúvida a que stão da heredi t ar iedade é um que s -

tão pol í t ic a . Em r e c ente repor tagem pub l i cada p e l o j orna l " O

G lobo " , o gene t i c i s ta e p ro f e ss 9r M i c h e l Reve l , do I n s t i tuto

We i zmann em I�r a e l a f i rmou :

A o n eg a � � o da a b a b e g e n et i � a a o � o m p o �tam e nt o h um a ­
n o , e x ..tb t e um g �a nd e �..t!;, � o d e t o � n ã - l o a ..t n da m e n o .6
liv � e q u e a n t eb , b u b m et e n d o - o a um d o ut�i n a m e nt o d e.6
t ..t n a d o a ��..tã- l o a imag em d o m ei o - am b i e nt e , t a l � o m�
o d eb e j am a q u el e !;, q u e d et e�m..t n am e b t e m ei o - am bi e nt e .
(Chr i s te n ., 2 3/ 3 /8 0 , p . 1 0 ) .

Ta i s pa l avras r e f l etem , a n t e s que uma preocupaçao c om o r igor

te6r i co , a nec e s s i dade de s e exercer o contro l e p el a detenção

da verdade . Trata- s e de um comhate pe l a h e gemon i a d o s aber , na

medida em que e s te , c ada vez m a i s exp l i c i tament e , repr e s enta �

ma podero s a forma de dom in ação s oc i a l .

Contra o s argumentos da here d i t a r iedade e s t ã o tam­

bém as pes qu i s a s que r eve l am a incon s tânci a do Q I , e s p e c i a lme�

te a r ea l i z ada por Skodak e S ke e l s ( 19 4 9 ) na Univer s id ade de

Io";la (U . S . A . ) e pub l ic ada n o Journa l o f G e ne t i c P sychology (voL

7 5 ) i n t i tul ada : liA n i na l 6 0 ll o w u p b tu d y o n o n e h u n d � e d adopte..6

� h..tld� e n " .

o e s tudo envo lveu

uma a nãlib e do d eb e n v o l v im e n t o m e nt a l d e � � ia n ç a.6 a ­


d o t a da.6 em 6 u n ç ã o d a b � a � a � t e�Zb � i� a .6 b o �iaib e do
n Z v e l ..t n t e l e c t u a l d o .6 pa..t.6 n at u�a..tb e d o .6 pai.6 a d o ti
V O .6 j uma e. x p e�..t ê n c ..ta d e " t e.6 :t e - � e t e .6 t e " p aitti c u l am en
t e �ig o h o b a : ab m e.6 ma.b cJz.ia. n çab 6 o � am a. c o m pa. n h a da.6 au
�a l1 t e q ui n z e a n O b e :t eb ta da. b q ua t� o v e z el.> . (Tor t , op.
c it . , p . 3 8 ) .

As crianças foram co loc adas n a s fam í l i a s adot .ivas ante s dos


69 .

s�is me ses de idade e e s s a adoção imp licava uma mudança de

mei o soc i a l poi s que

a� c a t e g o �ia� 6 ; c i o - p� 0 6 i ! � i o n ai! � o n Z v e l d e ina ­


t�u ç ã o d a p o p u l a ç ã o a d o ti v a e�am , a eg u n d o D a a ut o -
� ea , e em t o d 0 6 0 6 c a& o � , l a�g am e n t e ó u p e � i o � e 6 a
m e dia da.6 6 am llia 6 n a ,tu�ai6 . ( idem , p . 3 9 )

Os autore s con s tataram durante as divers as te s ta

gens ( ao longo dos 1 5 anos , u ti l i z ando o t e s t e S t an ford-B inet )

que :

1 9 J c e� c a d e 7 8 % daó c�ia n çd 6 o bt �m � eó ulta d o .6 d i 6�


� e nt e� naa u �nias t e& t ag e n a ;

2 9 ) n e n huma c�ia l1 ça o ó t ém n em c i n c o n em q u.a;t�o ve­


z e.6 a eg ui d a 6 o m e.6 m o � e6 ulta d o ;

3 g ) a p e naó 1 % o btém o m ea m o e 6 c o � e t!Lêa v e z e6 a eg u.i


da� ;

49 ) 2 2 % o btém d ua6 v e z ea e 6 c O JL e i d ê nt i c o . ( i dem , ibidem )

Por outro lado , os autore s encontram uma . s uper iori-

dade de vinte pontos , após trez e anos de ado ç ão , e n tr e o Q I mé

d i o das c r i anças adotadas e o das mães natur a i s . D i z Tort :

E.6 t e � e6 u l ta d o é ca pital : q u a n d o , n � m g �u p � d e c em
c.!Lia n ç a ó , 3 / 4 c u j o 6 pai6 n atuJLai.6 6 a o o p eJLaJLi o .6 e
o p e�ã�i o .6 n ã o q ua l i 6 i c. a d o 6 , ó ã o c. o l o c a d o .6 em 6 am l -
lia.6 em q u e. 8 7 % d 0 6 paia p' e.�t en c em a o .6 q ua d� o ó .6 u p�
JLi o � e.ó o u m éd io 6 , p.'Lo 1 i6 6 i o n ai.6 li b e�ai.6 , 6 a z e n d ei­
JL 0 6 ou tna b a l h a d o � e. ó Q ua l i 6 i ca d o .6 , c. o n.6 t a t a - ó e , t!L e
z e a n o .6 a p 5.6 .6 ua a d o ç � o , um a di 6 e!L e n ça � e v i n t e po�
t O .6 entfL e o Ql m e d i a d a .!J m ã e.6 n a t unai.6 e o Ql m é dio
daó c.�ia n ça � a d o t a da� . O b ó e� v a - .6 e p o � o ut fL O lado
q u e a .ó c.�ia n ça .6 a d o ta da6 n a .6 c at eg o �i a ó .6 5 c i o p� o -
6i6 6 i o n ai.6 .6 u p efL i oJL e6 d a am o .6 tna , t e n d em a o b t eJL e .6
c O JL e 6 6 u p e�i o JL e .6 em t o d a.ó a 6 i da d e6 . ( id em , ibidemT

Acresce-se a i s so o f ato de que nenhuma das c ri an ç a s cuj a mae


-

natural era déb i l p ermaneceu déb i l após ter s i do adotada por

um casal não débi l .

Pe los resul tados des sa pesqu i s a percebe- s e n i t ida -

mente que a sus tentação da tese de heredi tar iedade dever i a , ao


70 .

ménos , ser co locada em dúv ida . Não é o caso : in \ltncros argumen­

tos l evantar-se-ão para , ao contrário , co locar �m dúvida e s s e s

resultados . Como derrubar argumentos de poder po l o poder dos

argumentos ?

Acreditamos que a i n te l igênc i a hered i t á r i a , os tes­

tes que a medem e as funções soc i a i s que ambos d e s empenham fa ­

zem parte de uma e s trutura de poder que os mantém ac ima de

qualquer suspe ita . Combater a inte l igênc i a e os t e s tes por e s ­

s a art i culação resulta infrutifero uma v e z que , e e s s a mesma es

trutura quem garante , num movimento c i r cular , a e f ic á c i a dos

prime iros enquanto e s tes corroboram , " cienti f i c u.mente " , àque l a.

p ar à a ideologia l iberal burguesa e p ara o con j unto

de disc ipl inas p s i cológ icas que percorrem os me s mos c ami nhos de

la , a des igualdad� natural da intel igênc ia encon t r a s ua compe�

saçao na igua ldade de oportunidades educac ionais . Tais pontos

merecem alguns comentár ios c r i t icos .

o mecani smo s e l e t ivo da e scola cap i tal i s ta pelo qual

ela cumpre s eu pape l reprodutor da força de traba lho e das re­

lações de produção bem corno de r eprodução ide ? lóg ica tem s ido

apontado por d iver sos autore s des tacando- se Bourd ieu e Pass eron,

( 1 9 7 5 ) , Baude lot e Es tab let l1 9 7 l } que s e c entraram espec i f i ca-

mente em descrevê- lo .

A escola "democrática " , obr igatór i a e gratuita, onde

se apagam as � i ferenç as de c l asse , raça ou credo , abrindo cha�

ces de des envo lv imento das "capacidades " para todos os ind ivi ­

duos é , nas aná l i se s des s e s autores , desmi s t i f icada e esmiuça-

. da em suas inúmeras ramif icações de poder . S eu pape l de d i s c r i

minação e exc lusão soc i a l vem ã tona bem corno as formas d e d i s


71.

s imulação des s e pape l .

Bourdi eu e Pas seron ( 19 7 5 ) difCutem a i n fl uênci a que


1
a origem soc ial des empenha no suc e s s o escolar , demons trando a

defas agem entre o capital cul tural das c las s es� popu lares e o

" ethos " do s is t ema de ensino que s e aproxima ou , em certa med i


• ';' 0

:':.'; �;
da , corre sponde ao da c l as s e burgues a .

A cultura veiculada pelo apar elho e sc o l ar é a cul tu


,

ra da c las se dominante e os autores colocam que e s s a veicula -

çao se proce s sa por uma ação pedagÓg ica (AP ) que " ê o bj etiv a -

m e nt e uma v i o l ê n cia h im b ôlica e n q ua n t o im po � i ç ã o , p o � um p o d e�

alLbitlLã.lLio , d e um alL b it�ã.IL i. � : c ultu�al " . (idem , p . 20)

Nes s e proce s s o de impo si ç ão e inculcação a comunica

çao pedagógica , não apenas pela pos iç ão dos parce iros , mas so-

bretudo pe la l inguàgem uti l i z ada tem papel fundamental enquan-

to e lemento de selet ividade .

Ao e leger uma determinada cul tura de um grupo ou de

uma classe como " o " s is t ema s imbó l ico , e s ta e s colha é totalmen

te arbitrár ia pois , como afirmam Bourdieu e P a s seron , sua es-

trutura e funçõe s

n ã o po d em � e� d e du z idaA d e n e n hum p�i n cl p i o u n i v elL -


h al , 61� i c o , b i o l ó g i c o o u e� pilLituat , n ã o e� ta n d o u ­
nida� p O IL n e n h um a e� p e c. l e d e � et a ç. ã o i n t e � n a ã. " n atu
lL e z a da� c. o i� a� " ou a uma " na t u� e z a hum a na " . ( idem ,
p. 23)

A colocaç ão de uma cultura em pos i ção dominante s e deve s em dú


.

vida , ao fato de que e l a expres s a o s intere s s e s natur ais e s im

bólicos da c las s e dominante .

Na formação social capital i s ta a impos i ção de uma

cultura por uma es trutura d e poder tem como função a r eprodu -

çao dessa cul tura atravé s de que s e reproduzem também as rela-


7 2.

çoes de força que a colocam em pos i ç ão domi nant e . A e s co la a­

tua poi s dupl amente , reproduz i ndo o s i stema dos arbi trários cul

turais e , por e s se meio , contr ibuindo para a reproduç ão das

r e l ações soc i a i s de produção . E s sa a tuação é incul c ad a como le

gítima apelando- se para os princípios universais , para a força

das " idé ias verdadeiras " (a virtude das c i ências ) que , aqui, s e

impõem como naturai s .

Es s e processo d e impos ição s e opera evidentemente no

inter ior das i n s t i tuições escolar e s , . por um mecani smo em que ,

de um lado as crianças de c la s s e s popul are s , p e l a defas agem e -

xis tente e ntre sua cultura de origem e o s i s tema cultura l da e s

cola , tenderão aos sucess ivos fracqssos e . consequente exc lusão


.
enquanto , de outro , 'os f i l hos das c lasses dominantes serão be-

neficiados e premiados obtendo o suc e s so e scolar e univer s i tá­

rio que lhes fac i l i tará a manutenção d� sua pos i9 ão soci a l. Tal

s.e leção soc ial além de s er a l tamente e f icaz , é incorporada pe­

los excluídos como l eg i t ima , por um processo de d i s s imulação i'

deológica . E s s e d i s s imulaç ão está j us tamente no fato de que ,

s endo a escola socialmente r econhecida como inst ânc i a legí tima

de transmissão de cultura , não se exp l ic ita a impos ição arb i -

trária do arb i trário cul tural dominante . A autoridade pedagóg i

ca da educação garante a l e g i t imidade dos conhec imentos trans -

mitidos .

As s im , a exc lusão é v i s ta como natur � l s endo exp l i-


.

cada pe la ausênc ia de cond ições também naturais (capac idades ,

hab i lidades , apt idõe s ) , das crianças excluídas , para progredi­

rem . Esse fato é reforç ado t anto mai s porque alguns membros i-

solados das " c las ses de sfavorecidas " conseguem certo ê x i to na


73 .

càrreira e s c o lar . Como d i z Bourdieu ,

l o ng e d e � e4 i n c o m patZ v el c om a 4 e p4 o d u ç ã o d a e � t4 u ­
tU4a d a � 4 ela ç � e� d e claa � e , a m o bili da d e d o � i n d i v Z
d u o a p o d e c o n C 0 4 4 e4 pa4a a c o n � e 4 v a ç ã o d e4 � a� 4 ela �
ç � e� , g a4anti n d o a e 4 t a bilidad e a o cial p ela � el e çã o
c o nt40 lada d e u m n�m e40 limit a d o d e i n d i v Z d u o � , a d e ­
mai� m o di 6 i c a d o � p 0 4 e p e l a a 4 c en4 ã o i n di v id u a l , e
d a n d o 4 ua c 4 e di bilidad e 4 0 cial q u e e n c o nt4a � ua 6 0 4 -
m a 4 eali z ada na i d e o l o g ia e � c o la4 da E� c o la li b e4ta ­
d04a . ( i dem , p . 1 7 6 )

Importante ass inalar que aqu i l o que e s t á s endo cha­

mado de capacidade , hab i l idade e , por que nao , inte l igênc ia ,

não é ma is que o domínio de um certo padrão de comportamento ,

de um c erto s ign i f i cado das p alavras enf im de uma certa desen­

voltura , da compe tênc ia l ingu í s tica e at itudinal própr ios a

uma determinada c la s s e .

( • • 1 A 4 c 4ian ç a 4 d e 0 4ig em m o d e4 ta d e v e m , pa4a ad -


q ui4i4 a ling uag e m univ e44 itã4ia , . v i v e4 um a e x p e4i ê n


cia d e divi4 ã o o u d e 4 e4 i g n a ç ã o pa4 � i v a a o a b a n d o n o­
d e � eu u n i v e�J o cultu4al . . . Em t40 ca , a c o m p et� n cia
ling uZ� tica b u�g u e� a , 6 eitá de d e� e n v o ltu4a , d e a b� ­
t4a ç ã o , d e � et e n ç ã o e d e 6 a cilida d e em 6 ala4 c o m d e�
p4 e n dim e. nto m e.,oS m o 4 o b 4 e. � e.nt,{ m e n t o � , o p e.� o u - � e. . pe.la:
6 amilia�i z a ç ã o , � e.m 4 e. nti4 , e.m ca4 a , dan d o a o � e � t u ­
d a n t e.� o m e.io d e. d o mi na4 c o m pl e.tam e. n t e. a ling uag e.m e.�
c o la4 , a u t o 4i z a n d o ati a alu� � e.� e. a4 c um pl i c i d a d e� ­
c ulti v a d a� . ( Sainsaul ieu , 1 9 7 9 , p . )

E s s a experiência de v i o lênc ia cu l tura l a s s oc i ada aos

demai s mec anismos de reprodução social contr ibui para a manu -

tenção da ordem capita l i s ta e da divi s ão s o c i a l do traba lho

Mas a inter ior i z aç ão , pelos membros das c la s s e s populares , de

suas próprias l imitações faz parte também do pape l de reprodu­

çao s imbó l i c a ( ideológica ) que a e s c o l a desempenh a .

A reprodução da força de traba lho s e opera , no s i s ­

tema educaciona l , pe lo mesmo pro c e s s o de s e l eç ão e exc lusão , a

locando os indivíduos na es trutura ocupac ional não em funç ão de

suas aptidões mas em função daqu i l o que sua �ond ição de c la s s e


74 .

lhes permite ser . A seletividade aqui se torna mai s compl exa

porque e l a decorre não apenas da defas agem cultural de que fa�

lamos corno também de fatores externos sobretudo a necess idade

do trabalho " precoc e " por parte das cr ianças das " c lasses ma i s

des favorecidas " e o fato d e , em gera l , es tas crianças frequenta-

rem escolas de mai s baixa qua � idade . Alia- s e a i s s o o s i s tema

educac ional de a lguns pa í s e s (França , Alemanha e Bras i l entre

outros ) arti culado em do i s s egmentos , o pr imár i o - pro f i s s i o -

nal e o secundário - superior que , como demonstram Baudelot e

Establet , cons titu i urna forma e f ic a z da escola operac iona l i z ar

a distribuição dos ind ivíduos na e s trutura ocupac iona l .

A distribuição e s tá r e l ac i onada à d iv i s ão s o c i a l do

traba lho ( trabalho inte lectual e manual ) mas e l a se r e l ac iona

também com toda urna rede de mecani smos sele tivos que vao da co

locação da mão-de-obra no mercado de trabalho à formação de um

" exérc ito indus tr i a l de reserva " nece s s ár i o às s o c iedades capi

tali stas .

o mecani smo de frac�sso esco lar pe l a defas agem em

re lação ao " ethos " da escola , nos a lunos de "cla,s s e s b aixas " , de

certa maneira os conduz para o s egmento prof i s s io na l i zante , não

por l ivre opção mas pe la sua condição de c l a s s e . O d is curso 0-

ficial j us t i fica o prof i s s i ona l i z ante pe las neces s idades de es

pec i a l i z ação mas , na prát ica , sabe-se que a rede s ecundár i o

superior tem por f ina l idade formar o s quadros d i r igentes e in-

térpretes de ideolog ia burgue sa enquanto a rede primár i a - pro

fissional forma os futuros prol e tár ios subme tendo-os à ideolo­

gia dominante . Esta d ivisão no i nter ior do apare lho esco lar re

lac iona-se po i s , tanto à d ivisão s o c i a l do traba lho , quanto a


..

manutenção das c l as se s com exc lus ão de mob i l id ad e entre e l as .


75 .

Não é à toa que a s práticas de ava l i aç ão , exame e

testagem pre c i s am exi s t ir c omo l e g itimaç ão técni c a d e s s a dis -

tribuição de des igu a l dade s . Pos tu l ando os padrões de norma l ida

de ( que nada mais são que padrões de c lasse ) , e s s as práticas

s erão encarregadas de pos i c i onar , c lass i f icar , d i s tr i buir e

hierarquizar os suj e i tos em termo s de s ua aptidõe s , aprend i z a-

gens , hábi tos e atitude s , no interior da ins t i tu i ç ão e s c o l ar

bem como fora dela . O êxito e ducacional s erá determinad o , em

ultima aná li s e , por tai s práticas que , fundando s aberes sobre


..
o individuo norma l , e s t ab e l e c erão os c r i tér ios de êxito ou fra

casso .

H aver á a idade " normal " ,· o tempo " norma l " para a a-

prendizagem , as aprend i z agens " normais " , a irite l igên c i a " nor -

mai s " enf im , uma psicopedagogia da " norma l idade " para quem o

" desvi o " cons tituirá o " Çlnorma l " . Sus tentada pe las técni cas de

exame que j us tamente permitem medir e f ixar a norma l i dade , es­

sa psicopedagogia cumpr irá su a funç ão ideológ i c a de reprodução

social .

Certamente que e s s a me sma p s i copedago g i a s e encarre

gará de um dis curso j us t i f ic ador para expl icar o fracasso esco

l ar . Tal d i s curso remete à ques tão d as aptidõe s , das d i f iculda

des pessoais e atualmente também à " c arênc i a " econômic o-soc i a l .

Porém , o que permite f al ar em debil idade (natura l ou ambiental) ,

em fracasso , em dJ ficuldade , é a exi s tênc i a de um padr ão de

norma lidade , da pos sibi l idade de quanti f i car , medi r , individua

l i z ar . Não importa mui to que se atribuam as causas à es trutura


'
interna ou externa ao su j ei to . Toda e qualquer atuação será no

s entido de recuperar a norma l idade (vide c onceitos de educação


I

76 .

compens atória , educação pré-e s co lar , etc . ) ou sej a , de recolo­

.car o ind ividuo patológico , desviado ou anormal num padrão ar­

bitrar iamente f ixado .

Tai s a spec to s , que e s tão na origem mesma da ins ti -

tuição escolar e das práticas de testagem , são um pro longamen­

to da função ideológica do s i s tema mai s �plo , c u j a manutenção


.
apoia-se numa prática de dominaç ão e ordenação soc i a l .
77.

CAP1TULO IV : OS TESTES DE INTELIGtNC IA COMO D ISPOS ITIVOS

DE SABER E PODER .

Quando invoc amos a demanda externa das práticas téc

nicas no s e io da e strutura s o c i a l e st amo s nos referindo e speci

fi camente ao fato de que e la s vi sam responder té c n i c amente a


-

manutenção e reprodução das f o rça s produt iva s e r e lações de pro

dução de uma determinada formação soc ia l . Pensamo s ter exp l i c i

tado n a s páginas anterior e s que i s to é fe ito p o r um mecani smo

em que o real ideo l6gico i " rea l i z ado " pela at ividade técnica .

As sim , é na e streita r e l aç ão entre a inte l i gênc i a e a ideo lo -

gia l ibera l como sustentáculos da hierarquia soc i a l que vamos

encontrar o fundamento , (não exp l i c ito é c l aro ) de uma distri-

bui ç ão norma l da intel i gênc i a , hip6te se que , como vimo s , nor -


'
teia a cons trução do s te ste s d e . int e l i gênc ia .

S e , conforme o d i s cutido , os princí p i o s dó l ibera -

l i smo preva lecem , i sto é , se a propriedade , a l iberdade e a i-

gualdade s ão naturais e s e o que determina a pos i ç ão soc i a l s ão

as c arac terísticas individuai s , ' (apt idões e capacidades ) o es-

forço e a re sponsabi l idade p e s soa l , nada ma i s' " natura l " que, no

interior da ordem social exi stam mecani smo s de s e leção e c las-

s i f icação dos indivíduo s . Os testes de intel igênc i a , entre ou-

tras , serao uma das formas " ci enti ficas " de cumprir e s s a fun-

ç ao .

A questão da s e l e ç ão , da hierarqui z aç ã o e di feren -

ciaç ão dos individuos é n ão apenas uma dec orrênc i a c omo também

uma exigênc ia do s i stema c apita l ista . E l a garante a ordenação

do individuo no lugar que lhe convém , assegurando de s s a forma

a manutenção das re laçõe s de dominaç ão .


78 .

As práti c a s de s el eção e c la s s i f icação sao d i s s emi­

nadas pelos Apar e lhos Ideológico s e se const ituem no interior

deles em poderosos mecanismos d e " r e al i z aç ão " da ideol ogia do­

minante . Mas as práticas de s elecionar e d iferenc i ar , como pr�

ticas concretas no interior dos apare lhos e inst ituiçõe s , nao

podem ser vistas apenas como decorrênci a s ou r e f l exos das ne-

c e s sidades i dológicas de uma c la s se para j us t i f icar e manter a

dominação . Na r e a l i dade , e ss a s práticas func ionam como produto

ras de saberes e de novos poder e s , 'ampl amente d i s s eminados , e

' de certa mane ira , inc ontrolávei s por indivíduos ou grupos e spe

cíficos .

Michel Foucaul t (l9 7 7 } tem frequentemente demonstra

do que a G.ominação , '0 poder , não dependem imedi a t ament e nem são

prolongamentos diretos das grandes e struturas j urídico - po l í ­

tico - ideológicas d e uma socie dade embora não s e j am ab soluta-

mente independen te s . Diz e l e :


, .

H�& �o�� eam e n� e o p�o e e� 5 o p et o q uat a b U�9 u e � ia �e


�o� n o u n o d e e o �� e� d o � é e uto X V I I I a eta� � e p o t��iea
m e n� e d o m � n a n� e , a b�i9 0 n - � e a��ã� d a in� �ata ç ã o ' de
um q ua d�o j u�Zdi e o e x ptZ ei� o , e o di � i e a d o , � o �m atm e n ­
� e i9 uatitã�io , e a tnav é� d a o �9 a ni z a ç ã o d e um �e9i
m e d e �ipo pa�tam e n�a� e � e p� e� e n�a�i v o . M a � o d e� úi
v o t v im e nto e a g e n e�ali z a ç ã o d o � di.6 p o .6 i�iv o .6 di.6 ei-::
ptina�e.6 e o n.6 tituZ�am a o u��a v e�� e n� e , o b .6 e u�a , d e�
5 e p�o e e.6 .6 o . Á 6 o �m a j u�Zdiea g e�at q u e 9 a�a ntia um
� i� � ema d e di�eito .6 em p�i n eZ p i o ig ualitã�i o .6 , e�a
� u.6 t e n�ada p o � e.6 .6 e.6 m e e a ni.6 m 0 5 m i ü d o .6 , e o tidia n o .6 e
nZ.6 i e o .6 , p o � to d o � e .6 5 e.6 5 i .6 t em a .6 d e m ie�o p o d e� e.6 -
� e n ei atm e n t e ini9 uatitã�io � e a .6 .6 im ét�i e o .6 q u e e o n.6 -
�i� u em a.6 di.6 eipli na� . E � e , d e um a m a n ei�a ó o �m a l ,
o � e9 im e � e p� e .6 e n�ativ o p e�m i� e q u e di� eta o u i n di� e
�am e nt e , e o � o u � em � e v e z am e nto , a v o n�a d e · d e � o do�
n o�m e a in� �â n eia ó un dam e ntal da � o b e�ania , a .6 di� ei
ptina& d ã o , n a b a .6 e , 9 a�a ntia da � u bmi.6 .6 ã o da.6 ó O�-::
ça.6 e d o .6 e o �p o .6 . Á .6 di.6 ei lina� o�ai.6
e o n.6 tituZ�am o .6 u b.6 o o a.6 � e�
.6 u z e.6 que e .6 e o ���am
tam b ém a.6 di� e iplina.6 . Cp .

Com t a i s palavra s , Foucau l t traz ã tona um de s l oca-

r
79 .

mento e s senc i a l em relaç ão às forma s de pensar o poder . Ou s e -

j a , para e l e , não se trata s impl e smente d e ident i f icar o poder

' às instânc ias da superes trutura e de exp l i c ar a organ i z ação so

cial a partir daí . Em verdade o poder , como tem demonstrado o

citado autor ( 1 9 7 9 a ) , não se exerce unicamente a partir de um

con j unto de ins tituições e apare lho s que garantam a submi s s ão

dos suj eitos em um E s tado determinado ; nem a par t i r de um e l e-

mento ou grupo sobre outro s e cuj o s " e 6 e�to � , po� d e�� v a ç. õ e�

� U c. e� h � va..6 , at�aV e .6 h em o c. o � p o � o c.� a l � n t e��o " . (p . 88) Para

Foucault ,

a a nãl�h e em t e�m O h d e p o d e� n ã o d e v e p O h tula� , c. o m o


da d o .6 �n�c. �a�h , a .6 o b e�a.n�a d o E � tad o , a 6 o �ma da
l ei o u a u Yl. � da d e g lo b a. l de uma. d omina. ç.ã o ; ' e .6 ta.6 .6 ã o
a p e na.6 e , , a. nte.6 d e m a.ih nada , � uah 6 o �ma.6 t e�m i nai.6 .
( idem , ibidem )

Essa repre sentaç ão do poder e s t á pre sa à d imensão do d ire ito ,

e stá marc ada pela . instituição monárquica . Trata- s e de uma con-

c epção mecânica de poder , centrada e ss e n c i a lmente no modelo j �

r ídico , que func ionar ia basicamente p e l a l e i e pe l a interdiç ão,

sendo seus e fe itos definidos c omo obediênc i a . D iante do poder-

lei , o suj e ito , pelo efe ito de " as suj e itamento " , i o que obede

ce .

Foucault (l979a) nos convida a amp l i ar a visua l i z a­

çao dos mecani smo s de poder para alim da repre sentação do di­

reito , da l e i , da l iberdade , do E stado . P o i s se o j ur ídico po-

de servir h i s toricamente para repr e s entar um t i po de poder , ho

j e ele i insu f i c i ente para dar conta do s novos procedimentosde

poder que func ionam

não p el o di� eito , m a .6 p el a t ê c. ni c. a , n ã o p ela l e� m a .6


pela n o �mali z a. ç. ã o , n ã o p e l o c.a.6 tig o m a .6 p el o c. o nt� o ­
l e , e q u e .6 e e x e� c. em e m nZ v ei .6 e 6 o �m a. .6 q u e e xt�a v a
z a.m d o E .6 tado e d e .6 eu.6 ,a.p �� el h o .6 . (p . 8 6 )

r
I

80 .

o poder , segundo o refer ido autor , deve ser pens ado pela de s -
.
continuidade , p e l a mult i p l i c i dade de corre lações de forças que

o constituem , pelas contradições e e stratégias em que s e or i g i

n a e cuj o e sboço se corpor i f i c a nos apare lhos e s tatai s , na for

mulação da l e i , nas hegemonias soc ia i s . Deve s er pensado de

baixo para c ima i sto é , não p� la opo s i ç ão . dicotômica entre do-

minador e dominado , a l go que atrave s s e de alto a baixo , nesse

movimento , a e strutura soc ia l , p o rém como algo que s e exerce

em diversos pontos e de forma móvel e des igua l , c omo r e l ações

imanente s a outros tipos de re lações e ac ima de tudo , como al­

go cuj a função é a l tamente produtora . O poder não é poi s , ape­

nas interdição � negação , d i s s imu lação , exc lus ão s endo antes fo

co de produç ão de sabere s altamente eficazes que permitem , num

j ogo inces s ante , red i s tr ibuir , trocar , a l i nha r e l i gar entre

si as múltiplas c orre lações de forç as que perpas s am o con j unto

do corpo soc ial . (idem , pas s im l

A s prá t i cas d e s e l ec ionar , qua l i f icar , c la s s i f ic ar ,

medir sao , dentro des s e quadro , não propr i amente nece s s idades

de uma ideologia de dominaç ão , formas pelas qu a i s o dire i to s e

exerce ou a inda , mane iras e spe c I fi c a s que permit em aos indiví-

duos se submeterem às exigênc ias do poder g loba l . Não s ão , co-

mo fiz Fouc au lt ( l 9 7 7 ) um " i nfradire ito " mas s im uma e spécie de

"contradireito " . Fazem parte de um � squema técn i c o d i s c ip l inar,


-

de uma modal i dade particular de poder - o poder d i s c i p l inar .

L • l E n q uanto 0 6 6 i6 t ema6 j un Z di e o 6 q uali 6 i e am 0 6 6 U


. .

j eit0 6 d e din eito , 6 eg u n d o n o nm a 6 univ en6 ai6 , a6 di6�


eipli n a6 eana et eni z am , ela6 6 i ó i eam , e6 p e eializ am; di6 -
t�i b u em ao lo ng o d e uma e6 e ala , n e pant em em t o n n o de
um a n O hm a , hi ehahq ui z am 0 6 i n div Z d u o 6 em h el a ç ã o un6
a 0 6 o uth 0 6 , e , l ev a n d o a o limit e , d e6 q uali ó i eam e � n ­
validam . Cp . 1 9 5 )

Nes se sentido é que a d i s c ipl ina é um " contradir e ito " pois que
81 .

ela atua rompendo o s , l imites pos tulados pelo direito , instalan

do uma rede imensa e , ao mesmo tempo , ponti forme , que re força

e amplia o exerc ício dos poder e s .

Essas práticas , por s i sós , sancionam um saber so-

bre o i ndividuo que permitirá o aper feiçoamento cada ve z ma ior

dos mecani smo s de contr o l e sobre o s corpo s . Não um poder cen-

tra I determinando a prática mas s im a prática reco locando , su�

tentando o poder . Foucaul t exp l i'c i ta que o século XVI I I i nven-

tou as técn icas d i s c ip l inar e s e os procedimentos de exame e

que estes produz iram o individuo d i s c ipl inar . D i z e l e :

O i n di v Z d u o é � em d ú v i d a o ã�o m o 6 i c�Z c i o d e um a � e ­
p�e� en�a ç. â: o " id e o lóg i c a " d a � o c.i e dad e ; ma.6 é tam b ém
uma � eali d a d e 6 a b�i c a da p o � e� .6 a � e c n o l o g ia e.6 p e c I 6 i
ca d e p o d e� q u e .s e c hama a " di .s cipli na " . T em o .6 q u·e.
d eixa� d e d e.6 c� e v e� .6 em p� e 0 .6 e 6 ei�o .6 d e p o d e� em
� e�m o .6 n eg a�iv o .6 : e l e " e x c l ui " , " � ep�im e " , " � e c a l c. a " ,
" c e n .6 u�a " , " a b .6 ��a i " , " m a� ca�a " , " e � c o n d e " . N a v e�da
de o p o d e� p�o du z ; e l e p� o d u z �ealida d e , p� o d u z · cam�
p O .6 d e o b j e� o .6 e �i�uai.6 da v e� d a d e , O i n di v I d u o e o
c o n h e c im e n� o q u e d el e .s e p o d e . � e� .6 e o �ig i n am d e.6 .6 a
p� o du ç.â: o . (i dem , p . 1 7 2 )

A d i s tr ibuição dos poderes e . cons equente irradiação

por todo corpo social , empre s ta às pequenas práti cas d i s c ip l i ­

nare s do cotid iano um papel fundamenta l . s ã o e s s a s práticas de

cod i ficar , s eparar , po s ic ionar , que permitem Um s aber s obre o

individuo e o mantém sobre o j ugo do poder . Postas em açao nos

apare lhos e inst ituições u ltrapa s s am , no entanto , e s s e s l imi -

tes , ao produz irem s aberes unanimente aceitos e l e g i t imos . S a-

beres sobre os co�pos , inscr itos nos c orpo s , cons t i tuidores de

novos e múltiplos poder e s : " e.6 � e .6 a b e� e e.6 .6 e c o n.t�o l e c o n.6 �i ­

.tuem o q u e .6 e p o d e�ia c hama� a � e c n o l og i a p o lZ� i c a d o c o � p o " •

( i dem , p . 2 8 )

A ideolog ia l iberal fala o di s cur so da c apac i dade ,


82 .

do mér ito , para j u s t i f icar as d e s i gua ldade s socia i s . As prá t i -

cas discipl inar e s e norma l i zadoras gar.aftem , n ã o p e l a fala, mas


I
pela ação , a submissão dos c orpo s . Não há engano , nem i lusão ;

há formas concretas de agir , de prati car , que pao s e r e s trin

gem ao domínio de urna c la s s e sobre outra , mas e s tão d i s s emi na-


. .-.; .
.�. ; ",:.
das , semeadas no real e i ncorporadas aos indivíduo s .

De maneira ger al Foucault s e . re fere à s d i sc i p l inas

corno técnicas de ordenaç ão das · multipl i c idade s humanas . O po -

der d i s c iplinar deve decompor e s sas multipl i c idades confusa s ern

s ingularidade s para melhor atuar s obre e la s . E o faz pelo uso

de técnicas - . instrumentos ,::; imples : " o o l ha.1L hielLãlLq ui c. o , a.

� a. n ç � o n O lLma.li z a. d o lL a. e � ua. c. o m b i n a. ç � o num p lL o c. e dim e n t o q u e l h e

e e� p e c. Z 6 i c o : o e x a.m e " . (idem , p . iS3 1

Sobre a ' que s tão do " o lhar hierárquico " Fouc au l t vai

demons trar sua man i fe s tação no inte � ior das e s c o la s , dos quar­
.
'
téi s , das fábr icas , dos hospita i s , das prisões pe los proced i -

mentos ma i s sutis que vão da colocação em f i la s , e squadrinha -

mento dos espaços , disposição das mesas até à obs ervação pro -

priamente dita , vigi lânc ia continuamente anotada , e s pe c i f i cada,

detalhada .

O lLg a. niz a. - � e a.� � im , c. o m o um p o d elL m últipl o , a. uto m áti ­


c o e a. n 6 nim o ; p o i� � e e u elLda. d e q u e a. v ig i l a n cia. lL e ­
p o u� a. � o blL e i n di v Z du o � , � eu 6 u n c.i o na.m e nt o i d e uma.
lL e d e d e lL ela.ç õ e � d e a.lto a. b a.ix o , m a. � ta.m b im a. t i um
c elLto po nto d e ba.ix o pa.lLa. c im a. e l a.t elLa.lm e nt e; eh � a.
lL e d e " � u� t e n t a. " o c o n j un t o , e o p elLpa� � a d e e � eito �
d e p o d elL q u e- � e a p ó iam un� � o b lL e o � o utIL O ,.s : 6 i � cai�
p elL p etua.m e n t e 6 i � ca.l i z a d o � . ( idem , p . 1 5 8 )

E se é uma realidade , corno d i z Fouc au l t , que a organ i zação pi­

ramidal da vigilância permite a exi s tênc ia do " c hefe " , é o apa

re lho no seu c on j unto que produz " poder " e d i s tr i bu i os indiví

duos permanente e continuamente nes s e campo . A v i g i lância hie-


83.

rárquic a , increve a hierarquia nos c orpos , e produz todo um s a

ber sobre a hierarquia s o c i al .

A " sanção norma l i z ador a " é um segundo mecanismo que

Foucault aponta como essencial ao poder dis ciplinar . Aqui ma is

uma vez o autor vai investir nao sobre a s penalid ades ampl as ,
-

express as por uma lei gera l , mas s im sobre a s pequenas penal i-

dades , aquelas do tempo (" atrasos , ausência, interrupções de

tarefas " ) , da atividade ( " desatenção , negl igênCi a " ) , do corpo

( " fa l ta de hi giene " , "má apresentação " ) , da s exu a l idade ( n inde

cênci a " ) etc . Todas e l as representam um desvio poi s que se a-

�astam da regra, da norma . A sanção d i s c ip l inar deve f azer pre

valecer a ordem da lei , do regulamento mas também a quela mais

suti l , dos proces sos de aprendiz agem , dos nívei s de apti dão re

queridos para uma atividade , do tempo para exer c itar . Sua fun-

ção é bas i camente corretiva : aval ia-se e pune- se para inserir

na norma . · A avali ação implica uma divi são em graus ou clas s i f i

cações que tem um duplo pape l :

ma� e a� O h d e h v io h , hi e� a� q uiz a� ah q ualida d eh , ah


e o m p e � ê n eiah e ah a ptid õ eh ; m a h � am b �m eah �ig a� e �e
eom p e n h a� . F u n e i o nam e n t o p� n al da o �d en a ç � o e ea�� �
� e� o�dinal da h an ç� o . A dih eipl i n a � e e om p e n h a u ni e a
m en t e p elo j o g o dali p�om o ç õ e h q u e. p e �m it:"em h i e�a� q u7.
ah e lug a�eh ; p u n e � e b aix a n d o e d eg �adan d o . O p � 5 �
p�io h ih � ema d e elah h i n i e a ç � o v a l e e o m o n e e o m p e nh a o u
puni ç� o . (idem, p . 1 6 2 )

t no aparelho escolar que s e veri fica c om transpa -

rência o papel da s anção norma liz adora , pelo j ogo de a locação

dos a lunos em c l as ses a partir d e suas aptidões e c omportamen-

tos . Percebe-se aí o func ionamento do duplo mec an i smc: t=mrlr �

pensar e a partir daí hierarqu i z ar . Es s e dispos i tivo atua pe l o

exercício da pres são permanente vis ando à submis s ão e ao curo -

pr imento uni forme dos deveres ; pe l a norma l i z aç ão, quer i gualar

os individuos ao mode lo da ordem .


i

84 .

Para Foucau l t , a sançao , como ins �rumento do poder

.
discipl inar atua por c inco operações di.tintas :
I
� ela ci o n a� 0 4 ato 4 , 0 4 d e 4 em p e n ho 4 , 0 4 c o mp o� t am e nt 0 4
4 ing ula� e4 a um c o n j u nt o , q u e i a o m e4 m o t em p o cam p o
d e c o m pa�aç � o , e4 pa ç o d e di 6 e� e n ci a ç � 0 e p�in c Z p i 0 4 d e
uma � eg�a a 4 eg ui� . Vi 6 e � e n cia� 0 4 i n d i vZ d u 0 4 e m � ei a
ç � o u n 4 a 0 4 o ut�0 4 e e m 6 u n ç � 0 d e 4 4 a � e g �a d e c o n j u n�
t o - q ue 6 e d e v e n a z e� n un c i o na� c o m o b a4 e m Z n ima , c o
m o m idia a n e4 peita� o u · c o m o o ótim o d e q ue 6 e d e ve
c h ega� p e�t o . M e di� em t e�m o � q ua ntitati v o � e hi e�a�-
ui z a� em t enm o � d e valo� aJ ca a cidade6 , o niv el , a
natun e z a o � �n �v� uo� . a z e� u n c� o na� , at�a v eJ u
4 a m edida " v alo niz a do na " , ti c o a ç � o d e uma c o n 6 o nmi d a -­
d e a � eali z a� . E n 6 im tna ç a� o lim i t e q u e d e 6 i n i�â a
di 6 e� e n ç a em n el a ç � o a t o da� a4 di 6 e � e n ç a� , a 6 � o n t e i
�a e xt e�na do a n o �mal . ( idem , p . 1 6 3 , gri fo n o s so ) -

A produção de normal é f e i ta portanto , segundo o

autor , atravé s dos esquema s d í s c ip1 i nare s . E l e s e e s tabe l ece co

mo medida coercit iva no ens ino a través da educação padrão e da

inst ituição das e s co l a s norma i s ; na s aúde pela h i g i eni z a ç ão e

e s tabe lecimento de norma s gera i s s an i tár ias , na produção pe l a

regu1 :a rlz .a ção dos proces sos e produtos . (idem , pas s im ) .

A norma l i z aç ão leva , de certa forma , à homogene ida­

de mas também i ndividua l i z a , f ixando o s desvio s , os níve i s , a s

diferenças .

C om p� e e n d e - � e q u e o p o d e� da n o �ma 6 u n ci o n e 6 a cilm e n
t e d e nt� o d e um � i� t em a d e ig ualda d e 6 o �ma� p o i � d en
t�o d e uma ho m o g e n eida. d'e q u e ê. a. � eg �a , e l e i n:t� o d uz,
c o m o um im ena.:ti v o útil e n e4 ulta.do d e um a. m e dida t o
� e n e n ça.� ( idem , p . 1 6 4 ,

Finalmente o exame , que nos interes s a tão de perto ,

é co loc ado por Foucau1 t como um ins trumento que j us tamente as-

socia as técnicas de v i g i l ância hierarqui z ante com a s anção nor

mal i z adora . � e l e que permi tirá concretamente a · qua 1 i f icação ,

a c las s i f icação , a ordenação , a norma l i z ação atravé s de um r i ­

tual que o lha , que vig i a , que ava l i a , d iagno stica e pune o u r e
85 .

compensa . Al tamente d ifundido , o exame é uma . técni ca que se faz

presente em diversos campos - med i c i na ,.pedagog


. ia , p s i cologi a ,
I
c iências soc i a i s • • • - e cuj o mecani smo envolve c ompl exas r e l�

ções de poder e saber : formação de saber e exe�c í c io de poder .

• .lo. (
são as técnicas examinatór ias por exemp l o , que per­
;'.:'- ; �:
mitem , segundo Fouc au l t , a con stitu i ç ão do s aber méd i co no s é ­

culo XVI I I pe l a e l e ição d o hos p i t a l em local de exame , d e for-

maçao e aperfeiçoamento méd i"co: Da mesma mane i ra , e l e demon s -


,

tra que a escola enquanto aparelho de " examinar " vai s e c ons t i

tuir em local d e elaboração d a pedagog ia , d e uma pedagogi a com

funç ão c ientí fica e também , po exérc i to , os exame s de inspeç ão

e as manobras permi tirão a con s t i tu ição de uma t á t i c a poderos a

uti l i z ada s obretudo nas guerras napo leSnicas .

C omo mecani smos de poder imp l i c ados na técni ca de

exame queremos des tacar aqu i l o que Jfouc au l t chama " inversão da
,
vis ibil idade do poder " i s to é , o fato de que e le atua pelo an�

nimato , fazendo , no entanto , emerg ir , aque l e s s obre o s quai s

se exerce . " E o 6 at o d e � e� vi� t o � em c e� � a� , d e 6 em p� e p o d e�

� e� v ia to , q u e m a n t im � u j eito o i n d i v Z d u o di� c i p l i n a� " . (idem ,

p . 16 7 ) .

Outro importante mecani smo e s tá no " poder de e s cri-

ta " , na hab i l idade do exame em c o lo car o i ndiv íduo no campo do

cumentário . � a partir dos documentos produ z idos que s er á pos -

s ível d e um lado , a con s t i tu iç ão do indivíduo , d e s c r i ç ão dos

s eus " traço s " s ingular e s , apt idões , t ipo de per sona l i dade ; de

outro , a

c o n6 titui ç ã o d e um 6 i a t em a c o m pa�ati v o q u e p e�mit e a


m e dida d e 6 e n ô m e n o g lo bai6 , a d e 6 cni ç ã o d e g � u po 6 , a
c ana c t eni z a çã o d e 6 at o � c o l eti v o 6 , a e6 tim at i v a d06
d e a v i o 6 d 0 6 i n d i v Z d u o a entn e a Z , 6 u a dia t�i b ui çã o n u
m a " po pula ç ã o " . ( idem , p . 1 6 9 )
l

86 .

Foucau l t des taca na emergênc i a das c iê n c i a s do indi

vIduo , a importân c i a das técn i c ap de extne . s ão e s s a s pequenas

técnicas de descr ição , interrogatór io ; anamne s e , d i z e l e , que

introduzem o indivIduo no campo do s aber , no �i s curso c i e n t í f i

co .

o exame pelos seus processo s , faz de cada indivíduo

um " caso " - obj e to e e fe i to de conhec imento , ob j et o e e f e itode

poder . O caso

i o i n di v Id u o tal c o m o p o d e h e� deh c�it o , m e nh u�ado ,


m edido , c om pa�a d o a o ut� O h e i� � o em � ua pn õ p�ia in ­
di vidualida d e ; e ê tam b im o i n d i v Z d u o q u e t em q u e h e�
tneinado o u n etn ei na d o , t em q u e h en c lah h i 6 i ca d o , n o -

mal i z a d o , e x c luIdo , e t c'. " (idem , p . 1 7 0 )

Por e s s e s mecani smos se r i tua l i z am e s e rea l i z am a s funções d i s

c ipl inares que �on sti tuem um determinado tipó de poder onde a s

di ferenças individua i s são tota lmente impr e s c indíve i s .

-
O exame as sumiu gradat ivamente nas d i s c ipl inas , as

quais se integrou , formas mai s depuradas e vamos encontrá- lo

nes s e s campos exatamente s ob a forma de testes , e n trevi s tas ,


.

e sc a las , que stionários , consul tas . Par a Fouc au l t seu papel é

sempre o de r e t i f icar o s mecanismo s da di s c ip l ina : nas e s c o las,

nas fábri cas , nas pri s õ e s e " nos hos p i tais . D e s s a forma reprodu

z em os esquemas de poder- saber próprios às d i s c ip l inas . ( idem ,

pas s im ) •

Fouc au l t articul a , h i s tor i c amente , a emergênc i a das

técn icas de exame às práti cas penai s , d i s c ipl inare s . No momen-

to em que o supl í c io , a repres são dos c orpos não ma i s atendem ãs

nec e s s i dades de contro l e e pun i ç ão observa-s e uma mudanç a nas

práticas de pun ir e o surgimento de uma " suavi z a ç ão " dessas

prá ticas . A base des s a mudança "não é , como em g er a l s e in ter -


87 .

preta , a evidência de um horror moral ou a introduçã o da huma­

ni zação nos cas t igos . Trata- s e , ante s ,. fe uma bus c a de formas


I
mai s eficazes d� punir e , e speci a lmente , de puni r de ixando in-

tato o corpo do cr iminoso . O corpo não deve ma} s s er d i lacera-

do mas s im d i s c ip l inado , c ontro lado , s ubme tido , ?ara que de l e

s e extra iam todas as forças , para que se j a melhor aprovei tado .

( idem , pas s im ) .
(

E s s a va lor i zação do ' corpo e s tá , por sua ve z , a s s o -

c iada com os proces s o s e conômicos des encadeados pe l a i ndus tr i�

li zação , a mul tipl i cação dos bens e do capita l , o c re s c imento

populaciona l , . o aumento dO -!1�ve l ger a l de vida . A inte l igênc i a

com o s delito s que s e inves tem s obre a propriedade e as r ique­

zas demanda um c ontro l e ma i s exerc ebado mas também mai s inte l i

gente e mai s poupador -

n�o puni� m e n o � , m a & puni� m el h o � ; puni� t al v e z c o m


umd � e v e4ida d e a t e n ua d a , m a � pa4a puni4 c o m ma i � u - '
�iv i4� ali d a d e e n e c e� � id a d e ; i n� e4i4 m ai� p40 6 un da ­
m e nt e n o C 0 4 p O � o cial o p o d e4 d e p u ni4 . ( i dem , p . 76)

Foucault espe c i f i c a que a Re forma Jud i c iá r i a do s e-

culo XVI I I tem corno f inal idade uma nova economia e urna nova tec

nologia do poder de punir . O pacto contratua l , e ntão e s tabe l e-

c ido , formula , em termos de 'principios , e s s a e s tratég i a , na m�

d ida em que d i s tribui pe l o corpo soc i a l o poder d e c a s t igar .

Qua lquer infração aos dire itos s o c i a i s é um cr ime contra toda

a sociedade , contra fi a natur e z a " , o que dá a todos os membros

dessa soci edade o direito de punir . A l e i , e l aborada pela sen-

s ibi l idade do l eg i s l ador ( conforme Rous seau : um homem extraor-

dinário do Es tado , do tado de uma força super ior à humana , "a -

quel e que faz falar aos deuse s " ) expr e s s ará o ans e i o de todo

corpo social . Fixando os l imites e l a permi tirá a par tic ipação


88 .

de todos e cada um na prá t i c a de puni r . A genera l i z aç ão da l e i

exige , porém , urn a individua l i z aç ão d o s crimes e d o s c r iminosos,


,

e aqui começa a s e de l inear o lugar do " d e l iquente " , que sera


-

cons tituído em articulação com a s " c i ências " humanas já no sé-

culo XIX .

o rompimento do contrato s o c i a l traz a conotação de

s elvager ia , trata- s e da cons t i tuição daque l e que e s tá fora da

nature z a : " o c. e.l e.lL a d o , o m o n � tlL o" o l o u c. o talv e. z , o d o e. nt e. e.

l o g o o " an o lLm c.l " " • C i,dem , p . 9 2 } . Percebe-se então a ernergen -

c i a de uma re lação de obj eto a partir das própr i a s táti cas de

poder . Não se trata ainda da ob j et ivação do " de l i nquente " , do

h o m o c.lLiminali� , do " anorma l " propr i amente dito " mas de um es­
'
boço de s s a f igura , por tantq , h'i s tor i c amente c ons t i tuída . Essa

mesma concepçao arti cul a-s e p o i s com o des locame n to do ponto

de apl icação do poder : não ma i s o corpo , mas s im a " na ture z a " ,

à ''- alma '' i a " índole " para recon s t i tui ção do suj e i to de dire i to .

o século XVI I I vê surgir também a p r i s ão , . s e gundo

Foucaul t , c omo o lugar de modi f i cação do comportamento , da al-

ma , " máquina " de transformação dos e s p í r i to s . E s s a tran s form�

ç ao vem acompanhada de uma prática individua l i z an te , de ob ser-

vação cotid iana , abrindo-se , pouco a pouc o , um certo s aber so-

bre os indivíduos . Pos ter iormente à r eforma penal que procura-

va agir sobre as , idéias , s obre as representações , a cons t i tu i -

çao d e um aparelho de penal idade corretiva a g i r á n ã o ma i s so­

b r e a s repres entações mas s obre o s g e s to s , o tempo , o s movime�

tos , o s i lêncio , os hábitos - moldagem do corpo e da a lma ( es ­

ta corno sede d o s háb itos l , e s tabe l e c imento d o suj e i to obedien-

te , submi s s o .
89 .

Em resumo d i z Foucault :

o C. 0 1Lp O q u e ê ll u plic.ia do , a a lm a. c. uja� 1L ep 1L e ll e nta -


ç õ ell ll ã o m a n i p ul a dah , o C. 0 1L p O q u e ê t1L ein a d o ; t em o �
a Z t1Lêll li ê1Li es d e e. l em e n t o ll q u e c. a1La c.te1Li z a m O ll tJt.ê�
dill p o ll iti v o ll q u e ll e d e 6 1L o n tam n a últim a m eta d e do
ll ê c.ulo X V I I I . Nã o p o d e m o ll 1L e d u z Z - l o � n em a t e 0 1Liall ­
d e di1L eito ( ll e b em q u e el e � l h e s ej am pa1Lal el o ll) n em
.i.. d e nti 6 i c. ã. - l o ll a apa.1L e l ho ll o u a. i.nll t.i.. ,t u.i.. ç õ ell ( � e b em
q ue ll e a pó i em ll o b1L e eli t es ) , n em 6 a. z ê - l o � d e1Liva1L d e
e ll c. o l ha.ll m 0 1La..i.. � ( li e b em q u e n el a.� e n c o nt1Lem el.� ll Ull.ll
j Ull t.i.. 6 .i.. c a. ç õ ell l . s ã o m o da.lida.d e� d e a. c o 1L d o c o m ali
q ua.i.. � ll e e x e1L c e o p o d e1L de puni1L . T1Lêll t e c n o l o g iall
de p o d e 1L . ( idem , p . 1 1 6 )

o que Foucau l t denomina " di scipl ina " n ada mai s e


-

que uma mul t ip l i cidade de métodos que atuando sobre o s corpos

permi tirão sua suj e iç ão , sua doc i l i dade , sua obe d iênci � ao mes­

mo t empo que seu tre inamento , ampl iação de forças e capa cida -

des , exploração máxima de sua uti l i dade . Há poi s um duplo rnec�

n i smo no poder dis cipl inar : o e sva z i amento da força polít i c a e

o aumento da força úti l . E s s e s proces sos nao aparec em sub i ta

mente , s ão numerosos , esparsos e vão tomando corpo l entamente .

No sé culo XVI I I é quando assumem um caráter ma i s general i z ado ,

uma forma genérica de dominação . Como j á falamo s , são proces -

sos sut i s , minús culos à s vez e s , inocentes , mas obedec em a uma

espé c i e de coerênc i a que lhes confere a aparência de uma rede

úni c a e complexa . Aparecem ma is l ivremente nas e s co las e nos

quartéis mas penetram também o s hospitai s , as o f i ci nas , as fa- i

míl i as . Sua prática é c ar ac t er i z ada pelo controle-ob servação ,

pela di stribuição , i so lamento , l oca � i z ação , c la s s i f i cação , s e ­

riação . Tais práticas fundam um conj unto de técni c a s , de ins -

trumentos , de dados , que , numa c adei a ininterrupta , produz i rão

saberes espe c i f i cos , deta lha dos , neces sários . ( id em , p a s s im )

Foucault loca l i z a o nas cimento daqu i l o que s e cha­

mou P s icologia C ienti fica , conternporanearnente à c omp l ementação


9D .

do que e l e chama 2' a tessitura carcerária da sociedade"' " �e s e

caracteri z a por sua :função "'exrrrn;'Oamr.:i:1" Segundo ele ., isto


1
_

nao signi fica que as ciências bnrnanas saixam dos cárcer� � ,

sem dúvida, estão arti culadas com ess a lIlOdalidade de poder dis

ciplinar que exi giu a criação de técnicas e proced.llnentos de iE.


;-. . �,
dividuali z aç ão .

O h o m em c o n h ecZv el (.a.lm.a.., i nrUv i du.a. l i d.a. d e , c o n h C -t e n­


cia , c o m p o �tam e nto � a4 a i poa c o im p o �t.a. ) ê o e 6 eito -
o b j eto d e 6 6 e i n v e.5 thn e n t o J1 nalZti c o , e d e h h a d o m i na­
çã o - o b!:. e�va ç.ii o . Cirlem 'l p .. 267 }

A Psicologia Diler�c�al " a Psicometria .. sao ramos

da chamada Psi cologia Ci�tllica que per:mitiIão " de um lado" a

instalação de um sab er s obre as di.:fer€I1ças individuais e de ou

tro a e laboração das técnicas ., dt:>s instrumentos que possibili­

tarão a medida dêSSas di.fer€'Oças .. Através da nedida s erao .fixa

dos padrões de normalidade , d esvi os , limites , ordenações ; s e-

rao avali ados e comparados os SEXOS , as raças , o s gênios , os

" sub-normai s " ; serão identificadas as di.ferenças gerais (tipo-

logias ) e as espe c ificas (traços , .fatores ) ., as hereditária s e

ambienta is . Para se ter uma i déia " Allport especi:fica €In On2e

tipos, o menor número típico de técnicas de avali a ç ã o das di:fe

renças individuais úteis .. são elas :

1. Viag n ô!:. ti c o c o nh tiw cio f111 l e n i!:. i o l õg i c o - i n c lui


m e di da.5 de c o m p l ei ç ã. o cotLp oul , fLZtm o ca.� d Za c o , a
i:.i. v i da d e el e.ttLica.. do cêtLe:b�o ( ffG I " ILç.íiD CÚl..5 Btin -
dala!:. , etc .

2. E !:. tu d o .5 é; õ.c i o - calwJLai.5 - 0 5 Ó ato !:. tLela.. t i v o .5 a


idad e , .5 e x o 7 pilO n-L5 .5iio ., C lIL5 II e ., pap êi5 , e t c. .

3. V o c um e nt 0 5 p e !:. .5 o ai !:. e e5 t u d o .5 d e c.a.5 O - 0 .5 da d o .5


u.t ei.5 p o d em in cl uiJL a ut o b i o g lta 6 ia !:. , c aJLta!:. , d i ã. -
JLio !:. , m em ôJLia.5 , JL etJLat o .5 e.5 cJLito !:. . Em b o JLa .5 u j ei -
t 0 5 a m uita� ll e .5 tlli ç õ e.5 - ê � b v i o q u e tai.5 d o c u -
m e nto!:. n â o � â o p a dJL o n i z a d o .5 , em a b.5 o l ut o , !:. e n d o
pa.6 .6 i"v ei.5 d e m últipl a,!> int eJLpJL eta ç õ e .5 - e .5 .5 e .5 m a ­
t eJLiai.5 ha bilitam - n o .5 � JL eq u e n t em e n t e a a b o JLdaJL o
m un d o pttl.. v a d o da e x p e. JL -<. e n c.1.a d o l.. n d1.v-iduC!. . (gr i f o
nos s o )
91.

4. A ut o - a v alia ç i o - h i m uita� m a n ei�a� d e t o � n a� e�


� e m ét o do mai� � i� t emiti c o , i n ci u i n d o t é c n i c a� �
c o m o o OJA Y ( p e�g u n ta.� " W fto A� e Y o u " ? ( Qu em ê. v o c ª ) ;
e a R epa�ti ç i o Q , em q �e o � uj eito � e pa�t e uma � e ­
�ie d e e n u n c ia. d o � o u d ei c a�a ç 5 e� d e a c o � d o c o m o
g �a u em q u e p e n � a q u e i h e � i o a p i i c i v ei� .

5. A m o � t�ag em d e c o n duta. - é p o � � Zv ei t o �na� a� o b� e�


v a ç 5 e � d o c o m p o �tam e n t o mai5 e x eq u Z v ei� m e di a n t e ;
p o � e x em pi o , a am o � t�ag em d e t em p o , em q u e o que
� e � e g i � t�a é a a ç i o q u e � � u j eito e� ta d e � e m p e
n h a n d o , dig am o � , d e c i n c o e m c i n c o m i n ut o � . P o � v e
z e� , 0 ,6 � uj e it05 5 i o ci o i o c a d o � em " m ini - � i t ua ç 5 e�1T
pian e j ada� pa�a � u5 cita� o c c m p o �tam e n to � e v ei a d o �
A ii p o �t in ciui a � e nt� e vi� ta� n e� ta cat eg o �ia .

6 . Cia� � i 6 i c a ç 5 e� - n e� t e c a� o , um o b� e � v a d o � , u � u ai ­
m e n t e alg u ê. � q ue c o n h e c e b em o � uj ei t o , a v alia - o
n um c e�t o n um e �o d e e � c a.la� , m uita� v e z e� em c o t e ­
j o c o m um a p o p ui a ç i o c o n h e cida l dig am o � , o ut� o � e� -
t u da n t e� pa�a q u em ° cia� � i 6 i c a d o � i e c i o n a l .

7. T e� t e e E � co ia� - e n t�am n e� t e g �u p o o � i n � t�um e n ­


t 0 6 d e ' m e di ç ã o p� i c o i õg i c a mai� �ig o � 0 6 am ent e d e 6i
n i d o � q u e p�o c u�am a v aiia� a i n t eiig � n cia o u ou �
t�a6 q uaiida d e� i n t e i e c t u a.i� , t�a ç o � e di � p o � i ç 5 e�
d a p e�� o naii dad e , c a. p a ci d a d e � , aptl d 5 e� e i n t e� e � -
6 e6 , e t c . A ii6 ta d e t e 6 t e� e e5 caia6 ati ng e, m ui -
ta6 c e n t e na� , e n i o ê e 4 t e o � ug a� pa�a , � e nta� a v- a
iia ç 5 e6 i n di v i d uai� .

8. A niii� e d e p�0 6 u n d i d a d e - a� t é c ni c a� d e� e n v o i v i
d a � pa�a 6 i n 5 t e� a p � u ti c o � , c o m o a i i v � e a� � o cla -
ç ª o , tam b ém p o d em � e� u5 ada� pa4a 6 i n � d e a v aiia -
çao .

9. C o m p o �tam e nto e x p� e � � i v p - i n c i ui , p o � e x em pio, g e�


t 0 6 , p o � t u�a , calig � a 6 ia , d o n d e ê p o � � i v ei o b t e� ai
g uma� in 6 0 �m a ç 5 e� ( err. b o �a m e n 0 5 d o q U.e a 6 iJtm a m o�
g �a 6 0 i o g i� ta� p�o 6 i� 5 i o nai � 1 .

, 10. T é c n i ca6 p�o j etiva� - a n o ç i o d e�,i. v a d e F � e u d e C O l1


� i � t e e� .6 e l1 ciaim e n t e em q 'J. e a. � p e c. t o .6 .6 U b m e�6 0 � da.
p e�� o n a.iid a d e 6 e�a O " p� o j etado � " em �t tZm u i 0 6 n e u ­
t � 0 6 o u am b Zg u o .6 , d 0 5 q uai.6 0 5 b o ��E e6 d e ti nta d e
R O �.6 c h a c h ,6 ã o p� o v a v elm e nt e O � m a. i� 6 am o � o � . ( 06
t e.6 t e4 p� o j etiv o .6 d e R O �5 C h a c. h t � m um a iit e�atu4a
e x t en.6 Z� 6-i.ma e IL e q u eIL em pILo i o ng a d o � c. uIL� O .6 d e a d e .6
,t,'Lam e nt o , m a � o � e u v a i O IL c o n t i n u a a .6 e IL di� c ut Z -:.
v ei l . - E PILo v i v ei q u e tai� t e c ni c a.6 .6 ej am da m a i O IL
utiii d a d e p a IL a aj u daIL a c. o m p ; ctalL o IL etILato d e um
i n d i v Z d uo , � ug eILi n d o p o nt 0 5 q u e d e o utlLO m o do p o d- e
ILiam ,� eIL n eg fig e n c A�a d o 6 .

1 1 . PILo c. e dim e n t o � � i n õpti c 0 6 - Aii p o lLt U.6 a e .6 t e t e ILm o


paILa d e .6 1g n aIL 0 .6 m et o d o 6 d e c o m bi na ç i ci d e i n 6 o ILm a ­
ç 5 e.6 pILo v e n i e nt e5 d e v iILia6 6 o n t e � , a 6 i m d e o bt elL
um q u a dIL o da p e � J o a to tai . ( Kirby e t a 1 1ii , 1 9 7 7 :
p . 50-2 )

92.

A d i zer s i nópticos , pre f er i ríamos ant e s d iz er panóE

ticos , uma das modalidades do poder di s.c �;p li nar de que nos f a l a
I
Foucault . Como d i z e le (1 9 7 7 1 , modalidade importante poi s " aut�

matiz a e d e � i n v in dual i z a o p o d e � l • • . l Há uma m a q uina�i a q u e a� -


,

� e9 u4a a di� � im et4i a � o d e� e q dil fb4io � a di 6 e4 e n ç a " não im p o 4 -


. �.. .

;0 :. tando q u em o 6 a z 6 un c.io na4 . (p . 1 7 8 ) . O ps i có logo , o p edagogo ,

o chefe , o pol i c i a l , os p a i s , o s amigos , todos p odem exercer ex

plÍcita ou anonimamente e s s e po�er .

No caso p ar t i c u l ar dos testes de i n te l i gênc i a , a par

de sua ' construção que , como demonstramos inic i a Lmente , se dá

por um mecani smo de " r ea l i z a,cão " do r e a l imediato , nao podemos

negar a e f i các i a do saber que e le s i nauguram s obre a i n te l i gên-

c i a . E s te s aber inves t irá nos grandes apare l hos e inst i tuições

mas tambêm nas pequ�na s pr áti c as do c o tidiano . P e l a sua inte l i-

gênc i a , o individuo será c l as s i f i c ado na e s c o l a , s e l e ci onado nas

fábricas , diagno s t i c ado nos hospitais p siqu i á tr i c o s , marc ados

nas prisões . Mas a i nt e l i gênc i a será também . ob j e to de aper f e i -

çoamento da raça humana , ponto sobre o qua l f a lar-s e - á a " raça

superior " . A inte l igênci a enquanto obj eto e e fe i t o de s aber e

poder não é uma pura representação ideológi ca , e l a é uma mate

rialidade que se ins c reve nos corpos , nos o lhares , nos ges tos .

Os tes tes e a i n te l igênci a que e l e s produ z em articu

Iam-se com as práticas p edagóg icas e ps iquiátricas e , c omo vi-

mo s , com o surgimento de um certo padrão de normal idade a p artir

do qual serão criadas novas e aperfe içoadas técni c a s de desen -

volvimento ou recup� raçao .

Em função das apt i dões , c omo v imo s , n a s e s colas , os

a lunos serão divididos em norma i s ou d e f i c iente s ' ( " e spec i a i s " )


93 .

e a locados em c la s s e s d iferente s . Entre o s normai s encontrare -

mos subdivi sõe s : os ma i s bem dotados ( " intel igente s " ) e os nor­

ma i s propr i amente ditos i da me sma maneira , os e speci a i s c las s i ­

f i car-se - ão em irrecuperáve i s e com pos s i b i l idades d e aprender .

Para cada idade um padrão , para c ada i ndividuo um contro le . E s ­

timular o cre s c imento , desenvo lver a s " poten c i a l i dade s " m a s tam

bém inser i - lo , educá - lo ou exc luí - lo .

A pedagogia que s e desenvo lve na e s co l a , corno lugar

da ava l iação e do exame , tem grande apoio nas prova s de aprendi

zagem , de rendimento ma s também nos t e s tes de inte l i gênc i a , cu­

jo resultado marcará o indivíduo em todo s eu percurso e s colar •

Só para exemp l i f ic ar , nos d i a s de ho j e , vamos encontrar nas e s ­

colas toda uma s é r i e d e mecani smos des t inado s a i n s e r i r os indi

víduos em seus e spaços s er iais , de acordo com suas apt idões , o

níve l de avanço , a personal idade , a s a t i tudes , o dinhe i ro dos

pai s . O trabalho de Dor i th w. S chne ider (1 9 7 9 ) s obre os " alunos

excepciona i s " real i z ado nas e s c o l as pGbl icas do R i o de Jane iro

" demonstra corno s e produ z e s e de termina o lugar do exc epc ional

à partir da combinação das técnicas de obs ervação , regis tro e

tes tagem . Contrariamente ao que s e pos s a supor , a d i s tribuição

dos " indivíduo s em função de suas c apac idades não é apena s uma

forma de d i s c r iminação s o c i a l ma s também um mecani smo de produção

de saber sobre cada individua l i dade visando o aprove i tamento máx i

mo de suas forças _

A d imensão pos i t iva do poder aqui , nos pare ce e s s e�

c i a l . t: ela quem permitirá toda urna ps ico-pedago g i a do " excep -

c iona l " ( tare fas e exer c í c ios especia i s , prát icas de aceleração

mental , inserção em o f í c ios e spec í f i co s ) . E s s e s aber que nas c e ,


94 .

sem dúvida , de urna prática de poder é que , em c erta medida, sus . -

tentará a legitimidade do excepc ional .A:l" ideolog i a " da inte l i


I

gência fala a exc lusão ; a pedagog ia do exame i n c l u i , des envo l-

ve , di spende e s forç os , sustenta e submete pela � s pe c i f icação .

Por e s s e meio o poder cresce , mul t ip l i c a s eus e fe it o s , faz endo


• .lo- •

::: . �,
com que seu ob j eto se amp l i e , s ubdivida-se e penetre no real .

S chne ider demons tra a importânc i a do " o lhar h i erár-


,

quico " e c la s s i f icador do pro fe s s or na determinação do excep -

c iona l . � e l e quem decidirá se a cr i ança é "madura " para a al-

fabetização ou se " imatur a " devendo aguardar na " f i l a " sua en-

trada para o mundo do conhec?_�en to . E s s a " fi l a " é a " c la s s e de

alfabet i z ação imatura " onde a cr i anç a s er á submet ida a técni -

cas e spec i f i cas de " ac e l eramento " . No s casos duvidosos , a pro-

fes sora pode recorrer a um teste para decidir a "matur idade' da

criança . ( idem , p . 54 )

Cunha , ( 1 9 7 5 ) , c omentando o trabalho , a f i rma que o

" olhar " que c la s s i fica o faz em torno de critér i o s sub j e t ivos :

" a � u.p o .6 ,ta e. v id ê. n c.ia da ima,tu.Jti da d e. e. o � e.u. .e. a d o o c.u..e.,to Jt e.pJt e. ­

� e.n,tado p e. .e. o m o d e..e. o d e. c. o n d u.,ta Jt e. j e.i,ta d o p e..e.a.6 p Jt o 6 e..6 .6 o Jta.6 "

(p . 2 0 9 ) . Perguntamos : por que oculto? Ao que tudo indica e s s e

modelo é expl icito , aberto , a c e i t o unanimente . S e a d e f i c i ên-

c ia é uma produç ão , o que f ixa suas formas , s eus l im i te s , suas

mani festações é um conj unto de dados s obre os quai s nao cabe

uma aná l i s e de oc�l tamento . A prática de s e leção do " a luno ex-

cepcional " é evidente , não d i s s imul ada . Ta l prá t i ca inclui uma

aval i aç ão da inte l i gênc i a mas t ambém da cond�ta -< " agre s s iva

di sper s iva ; apática ; agitada ; t imida ; imp l i c ante ; "vi scos a "

r i à toa ; chora à toa ; ora a legre ora t r i s te ; s empre tri s te ; é

preguiçosa " , etc " ) ; da aparênc i a f I s i c a ( " apre s enta boa nutr i-
95.

Çê;lO , é pál ida , aparenta ter bons háb itos de higiene e tc . " ) ; da

origem fam i l i ar ( " pobre z a ; famí l i a des organi z ada ; i rmãos des a-

. j us tado s ; abandono pel o s pai s ; "doença mental na famí l ia ; alco'O

l ismo de um ou ambos o s pais etc " ) ; do t ipo de r e s idênc ia ( " ca

sa i apartamento ; conj unto res idenc i a l ; fave l a " ) e t c . C Schne ider,

op . c it . , 6 9 - 7 0 ) . Supor a ex i s tênc ia de um dado oculto é tam -

bém supor a exis tênc i a do excepc iona l "verdade iro " ou a exi s

tênc ia de c r i térios corretos para def iní- lo . O excepc ionaL vis

to como um efeito , um produto , s ó exi s te na s uper f í c i e das prá

ticas que o def inem .

Quanto à ava l iação da int e l igênc i a , o t e s te de G i l le,

(Teste de N ível Mental ) , como demon s tra Schneider , é de impor­

tànc ia cap i tal na determinação da " excepc iona lidade " . Sabendo

como tais testes s ão produz i dos , s abemos também a articulação

inte l igênc ia - níve l econômico , . o que fatalmente se refl ete , na

prática , pela art iculação cr iança pobre-a luno excepc ional . Es­

ta porem não é a única . A categor i a de excepci on a l r e lac iona -

se com toda uma forma de comportamento desviante , e aí a arti­

culação cr ianç a ind i s c ip l inada -p luno excepc iona l também é fun­

damenta l . Embora a aná l i se da autora tenha s� centrado em e s co

las que cobrem um e s trato econômico baixo e embora e l a afirme

que , nas e s c o las de níve l mais alto não há excepc iona i s , pref�

r imos d i z er que há apenas uma mudança de rótul o . O desvio é ins

tituc iona l i zado a í também , contrariamente ao que a f i rma a auto

ra ( idem , p . 6 1 ) . E s s e desvio se man i f e s ta pe la " cr i ança c om

prob lema " e a intervenção do ps i có logo , do orientador educac io

nal , tem o mesmo pape l que as c la s s e s s eparadas de a l unos ex -

c epcionais . Julgar que a criança que toma aulas particulare s ou

consulta um ps icana l i s ta , ou faz tratamento logopédico ou ps i-


96 .

comotor nao é e s t i gmat i z ada parece-nos uma forma i nc ompleta de

analisar a ques tão . � pos s íve l que possamos fa lar em n íve i s de


/ · 9 ·
s egregaçao , mas nao podemos deixar de ver i f i c a r o mesmo proce-
_ _

dimento c las s i f i cador , h ierarqu i z ador , individua l i z ante , e spe-


."

c i f icador , daquele traz ido p e l a autora . Lobo ( 1 9 80 ) re força nos

s a visão ao a f i rmar que a s egregação do excepc i ona l e

um 6 e n a m e n o 6 0 eial q u e n ã o 6 e ea�a et e�i z a p o � p e�t en


ee� a uma d e. t e.�múl. ada e la6 6 e 4S o eial' , n e.m e. x el ui o p�õ
p�io e. x e e. p e ei o nal . N a6 e4S e o la� q u e � e. e e. b e.m a l u n o .6 de
v i�i o .6 g �a u.6 e ti p 0 6 d e d e 6 i e i e. n eia ( � u� d o .6 , e e.g o .6 ,
� eta�da d o .6 m e n tai.6 1 e. xi 6 t e di4S e�im i n a ç ã o e. n t� e. e. l e..6 ,
p o � e x em pl o : do 6 u� d o em � e. l a ç ã o ao d e S i e i e. n t e. m e. n -
tal , d o 6 u�do l e v e em � e.l a ç ã o a o p�0 6 un do , em 6 un çã o
d e .6 ua m a i o � di 6 i e ul da d e d e e o m un i e .a çã o e a.6 .6 im po�
dian t e . (p . 1 9 )

' .;: :
Aqui go s tar í amos de evidenc i ar poi s , uma outra arti

culação que nos parece , s empre es téve pre sente da que s tão da

inte l igênci a . � a � ua ar t i cul ação c om a doença men ta l . Inte l i -

gênc ia - hereditariedade - doença mental é um conj unto que ,

h i s toricamente , parec e es tar assoc i �do . E l e ê r e s pen sãvei por

uma práti c a s o c i a l que , mais ou menos d i s cret amente , s empre im

pl icou uma concepção rac i sta da inte l igênc i a e a a c e i tação de

medidas eugênicas para pr eservá- la .

A inte l i gênc i a enquanto e l emento c have nas prã ticas

de diagnóstico c lí n i co , permi t i r á a e laboração de grandes cate

gerias no domí nio do conhec imento p s iquiátr i co .

Segundo Henry Ey (19 6 9 )

0 6 � eta�d o .6 � e. ntai6 ( o u o lig 0 6 � e nia.6 1 .6 ao i n .6 u 6 i ei ­


ê n eia.6 e o n g ê nita.6 ( o u em t o d o ea.6 O d e e o m e ç o m uito
p� eeo e e ) d o d e .6 e. n v o l v im e nto d a i nt e.lig ê n ei a . O p õ em -
6 e ela.6 .6 ieam e n t e ã 6 d em ê n eia.6 , q u e .6 ã o d e t e�io �a -
çõ e.6 d e uma i n t elig ê n ei a q u e 6 e havia d e..6 e � v o l v i d o
n o �malm e. nt e . C p . 6 1 9 )

Os retardados mentais s e caracter i z am , d i z o autor ,


97.

" ap e� a� d e t o da� a� c�Zti c a s d o Ql ( q uo c i e n t e i n t e l e ctual ! , p o �

� eu n Z v e l d e t e�m i n a d o p ela c lZ n i c a e m e dido p e l o � t e� t e� ". ( idem ,

p . 6 2 8 ) . A c la s s i fi c aç ão , em função des s e s c r i té r i os , prop os ta

pel a Direção Geral de Populaç ão (Clas s i f icação Of i ci a l da Fran

ç a ) é a seguinte :

1 ) Os " débe i s l ige iros " , educáve i s , aptos a uma v i -

da autônoma relat iva e a uma adaptação sati s fa tór i a ao traba -

lho . QI entre 0 , 6 5 e 0 , 8 0 .

2) bs " débe i s médios " , s emi-educáve i s ( Q I entre 0 , 50

e 0 , 65 ) que podem a l c ançar uma autonomia par c i a l e um pos to de

traba lho .

3) Os " déb e i s profundos " .(Q I entre 0 , 3 0 e 0 , 5 0 ) , pa,E

c i a lmente educáve i s e podem chegar a uma certa produtividade •

são os " imbec i s " . No níve l dos " re tardados pro fundos " ( Q I infe

rior a 0 , 3 0 ) , os " id io tas " podem adapt ar- se a urna vida coleti-

va mas sao cons i derados improdut ivos . ( idem , p a s s im)

Os fatores e t i o lógicos também são importantes na de

terminação dos retardos menta i s , mas aqui é pre c i s o es tud ar s e

paradamente , d i z Ey , o s r etardos c las s i f i cados se gundo o s fato

res etiológico s , que conduz irão a urna s érie de t ipos b em defi- '

n idos tais corno o mongo l i smo , a s índrome de Bournev i l le etc .

( idem , pas s im )

segund? Ey , i n i c i a lmente o que despertou a atenç ão

foi o aspe c to teratológico dos grandes r e tardos ( id i o ti a , imb�

c i l idade ) mas hoj e , o intere s s e tem s e centrado nas formas rne-

nores ( debi l idade mental ) ,

. em 6 u n ç ã o d e � e u n úm e�o c o n� i d e�ãv el e da� p o � � i bili


da d e� t e�ap � utica� q u e o 6 e � e c em em c e�ta� ' c o n d i ç � e�­
a 6 etiva� , � o ciai� e p e dag õg i c a� . A � c o n di ç � e� de vi-
98 .

da da lJ o c..i.. e da d e m o d eJL n a ( d elJ e n v o l v.i.. m e n t o , evo.fução e pJLO


l o ng a ç ã o da e� c. o laJL.i.. da d e : .i.. n d u � tJL.i.. a l.i.. z a ç ã o e e x p a nlJ ãõ
uJL b a n a , n e c. elJ lJ .i.. d ad e d e um� a d a p t a ç ã o pJL 0 6.i.. 6 lJ .i.. o n al c. a ­
da v e z ma.i..lJ c. o m p l e xa et c. . l t em p O lJ t o em e v.i.. d ê n c..i.. a alJ
e x.i.. g ê n c..i.. a � pJL ãt.i.. c.a� d o pJL o b l ema c. o l o c. a d o p O JL e lJ talJ .i.. n
lJ u 6.i.. c..i.. ê n c..i.. a lJ m e nta.i.. � l .i..g e.i.. JL alJ q u e , em c. eJL t o � c. a� o lJ, .i..�
c.lu� .i.. v e po d em a pJL.i.. m e�JLa v .i.. � t a pa� lJ aJL .i.. n a d v eJLt.i.. da� o u ,
p e l o c. o ntJLãJL.i.. o , � eJL em .i.. nt eJLpJL etadalJ c. o m o elJ t a d o lJ plJ .i.. ­
c. o n euJLót.i.. c. O lJ P O U c. o e v o l ut.i.. v o <s . ( idem , p . 6 2 1 ) .

são e s tas formas m�nore s , c ons ideradas pas s íve i s de

s erem educadas e adaptadas , aCIue las em que se p:::xle detectar com

maior clareza a ação dos mecani smo s de poder- s aber que , dedi -

cando- lhes ma ior " atenção " tentarão , por um proce s s o de repar-

tição , desmembramento e i so l amento cres cente , extrair o máximo

de sua força úti l , ins erindo-os por um me cani smo , s em dúvida es

t i gmat i z ador , ria ordem , na c l a s s e , na produção , no control� Te

remos o s " débe is harmôni co s " ( " d õ c. e.i.. lJ , tJLa b al h a d o JL elJ , apl.i.. c.a -

d O lJ , m et õ d.i.. c. o � , d �� e j o � o � d e t u d o � a z eJL b em , p a JL v o lJ e o b e d� e n -

t elJ , lJ e adaptam h um .i.. l d em e nt e a uma c. o n d� ç ã. o � o c..i.. al .i.. n S e JL.i.. o JL " ) ,

( idem , p . 6 3 2 - 3 , gri fo nosso ) , para quem uma boa orientação pro

f i s s ional permi te um bom prognó s t i c o s o c ia l , de a c o rdo com o

" comprometimento " intel e c tual e a "benignidade " de s eus carac-

teres i e os " débeis des armônicos " que se c l as s if i c am em :

a) " instáve is " , carac ter i z ados por sua ''d istra i b i l idad e '' , inca--

pacidade para a concentração , " turbulência " , ins tab i l idade

no traba lho e na res i dênc i a , dados a fugas , mentiras e " va-

gabundagens " i

b) " emotivos " que " s e parecem com o s ins távei s mas tem um nível

inte lectual superior , sao explos ivos , " temperamentai s " , " e-

xagerados " , o s c i l ando entre a exuber ânc ia exc e s s iva e a ini

bição ;

c) " tontos " também chamados " débe is c amufa ldos " que " tem uma
99 ..

boa capacidade mneumônica e uma :facilidade verbal que enga-

nal' mas que nos testes de manipulação e de raciocinio ver­

bal sao insuficientes além àe apresentarem transtornos do

atCOllIportamento práti co e s ocial " .. (idem � pass im )

Perceb-se claramente nes s a classi:ficação que " na pro

dução do débil menta l , a inteli gência é um :fator pouco claro ,

que s ó pode s er entendido em relação ao cOlIlportamento s ocial �

de , quanto maior a dis ciplina , menor a doença � Para cada tipo-

grau de d ebilidade um saber especi:fic o , técnicas c orretivas es

pecificas , di sposições e legislações especificas ..

Quanto aos critérios para determinar a · deb:il:i dade

mental encontramos em Ey (19 69 ) os seguintes :

a) um critéri o psi cométrico: idade mental compreendida entre 7

e 10 anos segundo a es cala de Binet e Simon (revisão de

Stan:ford de 1937 ) e cuj o QI está s ituado entre fi5 e BO

(Term an-Merill ) . � c ons i d erado um critério indispénsãvel pa

ra a estimação do grau de r etardo .

. b) um critéri o es c ol ar : o débil mental é visto como incapa:z de

acompanhar a e s colaridade das criança s de sua idade :

� eta�do e� c o ia � d e 2 a n o h , h e t em m e n O h d e 9 a n O h ;
d e 3 a n O h � e t em mai� d e q a n O h , c om a c o n d i ç ã o d e
q u e e h h e � eta�d o nã o h e j a d e v i d o a uma i nh U n iciê n­
cia d e eh c o ia:z.ida. d e ( Ki n et e S im o n 1 . ( i dem , p .. 62 6 ) ..

c) um critério s ocial : o débil mental é considerado incapa� de

vido a seu d e �i cit intelectual , de alcançar uma independên�

cia s ocial ' ou e c onômic a .. Tal critério depende de dois fato-

res , segundo Ey : a compl exidade de vida s ocial e a aceita -

ção da coletivi dade . (idem , pass im )

Ma i s uma ve z vem ã tona a intima ass o c i a ção entre

r
100 .

in.te l igênc ia e c ompo'rtamento s o c ia l . O s testes de inte l i gênc i a,

. a des pe i to de s eu pape l impr e s c índlve l , não tem a palavra fi-

nal . Esta , parec e , deverá s e r dada por um certo p adrão d e nor­

malidade que f ixa os comportamento s s o c i a lmente a c e itáve i s nu-

ma determinada idade .

Os autores falam q�e é importante obs ervar a inte l i

gência no conj unto da persona l i dade d o déb i l menta l , sobretudo

em seu aspecto " re l ac iona l " . O débi l é cons iderado " imaturo " a

fetivamente , tendo sua cons c i ên c i a mora l f ixada em um e s tado

" pré-mora l " , o que o l eva ou a uma r e j e i ção to tal do s imper ati

vos morais (mitomani a , roubo , d e l i nquênc i a ) ou a urna submi s s ão

ingênua e cega ;

Aqui vemos j á a articulaç ão entre i nte l igência - do

ença mental- crimina l idade s e del ineando . Os tes � e s surgem as­

s im no interior das pr 1 s 6 e s para falar a del inquênc i � " c ienti­

ficamente " . O homem de l inquente , " un idade bi ográ f i c a " , · núc leo

de " per i culos idade " , representante de um t ipo de " anoma l i a ", de

ve ser conhe c i do , ava l i ado , med i do , d i agnos t i c ado , tratado .

(Foucaul t , 1 7 7 , pas s im ) .

Deb i l idade mental e del inquên c i a s ao a spec tos c las-

s i ficamente admit idos como extremamente r e l a c ionado s . Segundo

os autores , em gera l , os déb e i s apr e s entam um comportamento an

t i s social (roubos , fugas , pro s t i tuição ) que pode condu z i r a

reaç6es homic � das ou suic idas . A deb i l idade mental pode a i s er

loca l i z ada pe l a " pobre z a do móve l , ausênc ia de precauç6es em

sua execução etc . . . •


" Também s e observa , conforme Ey , que o dé­

bil muitas ve z e s é apenas o exe cutor dóc i l de uma g a ng , vitima

de seu c aráter suge s t ionável e ainda , c om mais freguenc ia , re-

B I B L I OTE CA
fUj�D;'ÇAo , - J _ I O VARGAS
1

101 .

corre ao a lcoo l i smo por imitação , ind i s c ip linar idade ou ocios i


. !if
dade .

P ercebe-se que o déb i l mental relac iona- s e a uma fbr


,"

ma de del inquência que importa d i s c r iminar não apenas para es-

tabelecer o de svio e segregar , mas para desenvolver um t i po de


. �.

�:'.;�.

c onhec imento que permi ta , no inter ior das i ns t i tu i ções, extrair

de s eu corpo , as poss ib i l idades útei s , trans formar s ua " a lma " ,


,
e contro lar ince s s antemente por uma v i g i l ância r íg ida e espe c í

fica . V imos e s s e mec an i smo presente tanto n a prá t i ca e s c olar pe

lo e s tabe l e c imento do excepciona l , quanto na prática méd i c a pe

10 e stabe lec imento do déb i l menta l , quanto na prát ica pena l pe

lo es tabelec imento do del inquente . Em todos os c a s o s e s sas f i -

guras s a o fabri cadas como obj etos d e s aber para q u e s obre e las

se exerça o poder de punir , de dis c ipl i nar , de o rgan i zar e nor

ma l i zar . ' S em nenhuma exterior idade , o s t e s te s de i n te ligência

se constituem e ganham sua eficácia nes s as inter se c ç õe s , que

de finem seu lugar e sua prática . Prática qUe tem s e caracter i -

z ado , ante s d e tudo , como pudemo s ver , pe lo aumento d a e f i c á -

c i a produtiva dos conj unto s humanos , individua l i z ados e c l as s i

ficados entre outros , por ta�s d i spos i t ivos de pod er - s aber .


10 2 .

CONCLUSÕES

Quando i n i c iamos nos s o traba lho tínhamos como f i na-

l idade precípua demons trar o mecani smo ideo lóg ! c o p e l o qua l o­

peram os tes tes de inte l i gênc i a . I s to o rientou os três pr ime i­

ros capítulos , onde def i n imós um r e fe renc i a l teór i c o espe c í f i -

co e a partir da í , traba lhamos o proce s s o d e cons trução técni­

ca dos tes tes bem como as articulações de s s a téc n i ca e do s a­

ber por ela produz ido , com as concepçoes ideo lógicas dominan -

tes num momento h i s tórico prec i s o .

1\ medida que fO:'a6 s des envo lvendo nos s a aná l i s e , e

s obretudo a par tir da l e i tura das obras de Mi che l Fouc aul t , es

pec i a lmente 'Vi g i ar e Pun il:"' e " Hi s tória da S exua l idade" , sent imos

necess idade de amp l iar nos s o e squema inic i a l e t raba lhar os te�

tes e a inte l i gência que e l e s produz.em não apenas como e lemen-

tos que se loca l i z am no interior de uma ideo log i a , mas também

como práti cas a l tamente podero s as , cuj os l fmi tes e s capam ao do

mínio de c la s s e s ou grupo s e spec í f i cos . D e s sa forma , se d i s s e-

minam em múl t ip las ins tânci a s , s e art i c u l am com i númeras ou-

tras práticas , inaugurando novos s aberes e novos poderes que

impl icam , sem dúvida , grandes e s tratégias de dominação mas tam

bém uma rede de "micro-poderes " , s uti s , ineperc eptive i s , ingê -

nuos , mas capa z e s de sustentar as grandes hegemonias po l í t i cas .

Certamente que não e s távamos fe chados para isso .

Althusser , que orientou nossas referên c i a s inic ia i s, s empre col�

cou que o f im ú l t imo do conhe c imento i deo lógico " não é o conhe-

cimento cienti f ico . S egundo Al thusser (1 9 7 9 b ) devemos renunci-

ar a toda teleologia da r a z ão e tentar conceber � s re lações de


103 .

um resul tado com as suas cond ições corno urna relação de " produ-

ção" e nao de " expre s são " s implesmente . � pre c i s o penetrar na


.'

lóg ica das cond ições de produção dos saberes nem s empre c laras

e transparentes . Re ferindo-se nes s e sent ido ao s t raba lhos de

Foucaul t , Al thusser expl i c i ta que s em dúvida , é des concertante

o transformar- se

d e� a a 6 0 nm a ç � 0 c ultunal c o m p l e x a q u e n eu n e em t o n n o
d e um t enmo a o bn e d et enmi n a d o - " lo u c una " - n o � a é c u
lo a X V I I e X V I I I , um 6 em n �m en o d a pn�tic a� e i d eo�
l o g iaa ' m édi caa , j unZdica� , n elig i o � a� , m o nai6 e p o ­
liti ca� n um a c o m bina ç� o , c u j a� di� p o � i ç 5 e� i n t enna�
e 6 e nti d � v aniam · em 5 un ç� 0 d a m ud a n ç a d e l ug a n e d o
papel d e � 6 e6 t enm 0 6 , n o c o nt ex t o m ai6 g enal da� ea ­
tnut una� e c o n ô m i ca� , p o l It i c a� , j unZdica� e i d e o l ô ­
g i c aa , d a é p o c a ; c o m o a q u e d. e v em 0 6 tam b ém a F o u cault,
ao d em o n 6 tnan q u e c o n j un t o d e c o n di ç 5 e� apan e n t em e n
t e h e t en o g ê n ea� c o n .� pin o u d e �at o , a p c a b o d e um tã:
b o ni0 6 0 " tn a b al h o p o ,� itiv o " , pana a pno d u ç ã o di� � o
q u e n o � pan e e e � pn ô pnia e v i d ê n eia : a o ba e n v a ç � o d o
do ent e p elo " o l han " d a m e di c i na clZ n i c a . ( p . 4 7 )

Obs ervamos que o s tes tes de inte l igênc ia s ao cons t i

tuídos por um pro c e s s o d e " s imul ação - ver i f i cação " d o real

imediato ; que e l e s reproduz em . a ordem s o c i a l e q u e o saber s o - ,

b r e a inte l i gência que e le s d i s s eminaram tende a e ncob r ir as

di ferença s sociai s que e s tã o na o ri gem me sma des s a p roduç ão. No

entanto queremos d � ixar c laro que i sto não nos l eva a conc luir

pe l a exi s tênc ia de um saber s obre a inte l i gênc i a que nao sej a


'
ideológico . Admi t ir i s so , s er i a também admitir a exi s tênc i a de

uma int e l igência em s i , de uma e s s ên c i a da inte l i gênc i a , algo

cuj a origem pré-eX i s ta à hi s tór i a . Na rea l i dade a inte l igênc i a

é , para nós , um di spos i tivo h i s tor icamente cons t i tuldo pelas

prát icas de poder ; e la é um e f e ito de poder , e sua mate r i a l ida

de enquanto tal vem a s s e gurada por e s s a prá t i c a .

As s im como avançamos a c on cepção de poder , abrimos

também a que s tão da inte l i gênci a para múl t i p l a s frentes , o que

r ,
104 .

fa z dela um saber incorporado e loca l i z ado em mui to s l ugares •

. Pensamo- la nos grande s apare lh�s e ins t i tu iç õ e s ma s também nas

práticas cotidiana s , nos pequenos precdimentos que , a cada mo­

mento , c la s s i f i cam , hierarqu i z am , individual i z am � D i s tr ibuir a

intel igênc ia s o c ialmente é também admi tir s ua ins c r i ç ão em to­

dos os níve i s , ao níve l das. r epre sentações s im , mas também ao

nível dos corpos , dos ge s to s , dos o lhares .

Nos s o trab a l ho nos mos trou que o s te s t e s de inte l i­

gência sao técnicas que res pondem a uma demanda s o c i a l de " a­

daptação-readaptação " dos indivíduos na ordem e s t ab el e c idai que

e l e s s ão ins trumentos que permi tem , pelo se u cará ter técnico ,

justif icar uma " certa ideologia que co loca a ques tão da inte l i­

gência e da s apt idões como responsáve i s pe la hierarqui z ação s o

cial i mas também que e l e s , longe d e con s t i tuirem domín io ex ­

clus ivo de uma c l a s s e que os ut i l i za como e l ementos d e d i s s imu

lação da determinação e conômica nas rel ações s o c i a i s , con s ti -

tuem-se antes , numa prá t i ca que surge , at inge e s e d i s semina em

i númeras direçõe s . Nas c ida de uma moda lidade e s pe c í f i ca de po­

der - 6 poder dis c ipl inar de que nos fa la Foucault - e s s a prá­

ti ca , articulada com outras que se agrupam num c o n j unto com

função " examinatór i a " , permi tirão a inauguração de s aberes so­

bre o indivíduo , sua " pers ona l idade " , sua " con s c iênc i a " , sua

" intel igênc i a " sua " a lma " . Em todos os lugares a inte l i gência

s erá medida , c la�s i f i cada , diagnos ti cada , ordenada : nas e s co -

las , nos hospitais , nas f áb r i cas , nas pri sões , mas também no

s e io da sociedade como um todo , na famí l ia , nas r e lações , pela

hereditariedade , pe la raça , pelo corpo �

Eviden teme nte , não tivemos como ob j e t ivo , nem po-


105 .

der íamos , ver i f i car a intel i gênc i a em s uas inúme r a s articula -

ções . Da mesma forma a , tra tamos como um obj e to con s tituído s em

tentar loca l i z ar exatamente a s condições h i s tóric as dessa �on�


tituição : a partir de que momento a i nte l igênci a e n trou na or­

dem do d i s curs o c ientí f ico e porque . Sentimos entretanto que

i s s o é neces sário para expl icar inúmeros pontos que nos pare -

c em obs curos na " hi s tóri a da inte l igênc i a " , sobretudo o apare­

c imento de outros dis curso s s obr� e l a , no intér ior da d i s c ipl i

na ps ico lóg ica•.

Como aspecto fundamenta l gostaríamo s , f i n a lmente, de

des tacar a importância que perceb emos no d e s locamento que

Foucaul t nos induz iu a pensar : os te stes e espec i a lmente a in­

tel igênc ia não em termos Uni camente da opos ição c iênc i a - ide�

logia mas como uma prá t i ca de produç ão de "verdade " , fa lada

sentida , vivida , enquanto ta l . E s s a "verdade " , v i s ta como um

ob j eto e efe ito de poder , des trói a pos s ib i l idade de s e pensar

os tes tes e a inte l i gênc i a fora de s s e s l i ame s . Des trói também

a pos s ib i l i dade de se cons ide rar que e s s a "verdade " pertence a

um grupo ou a um e l emento po i s como "verdade " , e l a e s tá em to­

dos os pontos , em todos os lugare s , em todos os pens amentos de

forma , s em dúvida , d i ferente , des igua l , des contínua . Mesmo sob

a forma da "mentira " , do " erro " , da " i lusão " é o me smo ob j e to

que a í e stá , supondo o s eu l ado "verdade iro " , " ci e n t í f i co " .

, -
106 .

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Hembro da Com i s são Examinadora

I S P enna
s s ão Exami nadora

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