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Caratê • Caraté
[br] [pt]
Grafia
Kanji 空手
Hiragana からて
Rōmaji Karate
Informações gerais
Escopo Aprimoramento corporal, para
funcionar como arma
Técnica(s) principal(is) • Atemi waza
• Nage waza
• Tai sabaki
• Kihon
• Kumite
• Kata
Origem
País Ryukyu
Cidade Naha
Shuri
Tomari
Influência
Antecedente(s) Tegumi
Te
Chuan fa
Representação
Sítio oficial Federação Mundial de Caratê
Caraté ou karaté (português europeu) ou caratê (português brasileiro) (em japonês: 空手;
transl.: karate, AFI: [kɑʀɑtə])[1][2] ou caratê-dô (空手道, transl. karate-dō
AFI: [kɑʀɑtədɵ])[a] é uma arte marcial japonesa desenvolvida a partir da arte marcial
indígena de Okinawa sob influência da arte da guerra chinesa (chuan fa),[b] das lutas
tradicionais japonesas (koryu) e das disciplinas guerreiras japonesas (budō).[3]
Grosso modo, afirma-se que a evolução desta arte marcial aconteceu orientada por
renomados mestres, resultando no caratê moderno, cujo trinômio básico de aprendizado
divide-se em: kihon (técnicas básicas), kata (sequência de técnicas, simulando luta com
várias aplicações práticas) e kumite (enfrentamento propriamente dito, que pode ser
mero simulacro ou dar-se de maneira esportiva ou competitiva ou mais próxima da
realidade). Esse processo evolutivo também mostra que a modalidade surgida como se
fosse uma única raiz acabou por se dividir em três partes e, por fim, tornou-se uma
miríade de diversas variações sobre um mesmo tema. [6]
O estágio da transição entre os séculos XX e XXI revela que a maioria das escolas de
caratê tem dado ênfase à evolução do condicionamento físico, desenvolvendo
velocidade, flexibilidade e capacidade aeróbica para participação de competições de
esporte de combate, ficando relegada àquelas poucas escolas tradicionalistas a prática de
exercícios mais rigorosos, que visam o desenvolvimento da resistência dos membros, e
de provas de quebramento de tábuas de madeira, tijolo ou gelo. De um modo simples,
há duas correntes maiores: uma, tendente a preservar os caracteres marcial e filosófico
do caratê; e outra, que pretende firmar os aspectos esportivo e lúdico. [7]
Índice
• 1História
o 1.1Antecedentes
▪ 1.1.1Mundo
▪ 1.1.2Japão
o 1.2Arte das mãos oquinauenses
o 1.3Arte das mãos vazias
o 1.4Caminho das mãos vazias
o 1.5Atualidades
▪ 1.5.1Olimpíadas
o 1.6Em África
o 1.7No Brasil
o 1.8Em Portugal
• 2Estilos
• 3Ética e filosofia
o 3.1Dojo kun
o 3.2Tode jukun
o 3.3Niju kun
• 4Técnicas
o 4.1Currículo
o 4.2Didática
▪ 4.2.1Kihon
▪ 4.2.2Kata
▪ 4.2.3Kumite
• 5Graduação
• 6Competição
• 7Vocabulário
• 8Notas
• 9Referências
• 10Ver também
• 11Ligações externas
Naturalmente, seguindo uma linha evolutiva mais ou menos uniforme, tal como
aconteceu com a agricultura, a pesca, a música e outras atividades, as artes marciais
desenvolveram-se como disciplina, surgindo mestres e aprendizes. Isso, por exemplo,
pode ser demonstrado pela existência das falanges gregas, modelo que se impôs por
certo tempo, até ser superado pelas coortes romanas, e assim anterior e sucessivamente.
Da Grécia, vem outro exemplo de desenvolvimento das artes marciais como disciplina.
As cidades-estados (ou polis) disputavam a supremacia sobre as demais, pelo que
apareceram os períodos ateniense, espartano, tebano etc. Dentro de tais circunstâncias,
somente em Esparta as disciplinas militares tiveram relevo, eis que naquele ambiente foi
dado destaque ao desenvolvimento físico, para fazer frente aos embates e os cidadãos
espartanos (esparciatas) treinavam de maneira forte tanto a luta armada como a
desarmada.
Caminhando já na Ásia, onde se acredita ser o berço das artes marciais modernas, sabe-
se que o exército de Alexandre Magno enfrentou guerreiros de várias origens, como de
China e Índia. É impossível creditar o desenvolvimento das artes marciais asiáticas ao
contacto com o gregos, pois logicamente existiam já naquelas paragens suas próprias
disciplinas, tanto é que se deu enfrentamento entre exércitos e não de um exército e
pessoas desarmadas. Infere-se ter havido certamente a troca de conhecimentos, o que
era inevitável, após a estabilização das relações. De qualquer forma, havia na Índia uma
forma de luta chamada de vajramushti, a qual parecer ter sido transmitida a outros
países ou mesmo comunidades, no processo de trocas culturais na Ásia. [10][11]
Posto que se diga tratar mais de especulações, diante da lacuna documental e de que,
mesmo existindo algum documento, se tratam de coletâneas de relatos, lendas ou
anedotas, de facto, as artes marciais passaram a ter caracteres mais formais quando um
monge budista indiano chamado Bodhidharma — o primeiro grande mestre —, por
volta do ano 520 EC, no fito de empreender uma longa jornada em busca de iluminação
espiritual, viajou desde a Índia até a China. O monge ficava onde lhe dessem abrigo, em
templos ou casas, e aproveitava para evangelizar de acordo com sua doutrina. [12]
Sua jornada o teria levado até o Templo Shaolin e, quando Bodhidharma viu as
condições físicas precárias em que se encontravam os monges daquele sítio, exortou-os
no sentido que a pessoa deveria evoluir por completo, desenvolvendo o lado espiritual
mas sem esquecer do físico, pelo que instruiu todos na prática de exercícios. [13]
A prática dos exercícios evoluiu para um sistema de defesa pessoal, até com o uso de
armas e outros instrumentos, fazendo surgir uma reputação de que os monges lutadores
seriam experts em diversas modalidades e formas de combate, pelo que se difundiu por
toda a China. Os monges de Shaolin não se isolaram apenas na China e levaram seus
conhecimentos religiosos, filosóficos e marciais para outros recantos, entre estes o
Japão.
Essa peculiaridade, de existir uma classe nobre guerreira, impingiu à nascente arte do
caratê um carácter subalterno, de exórdio, pois se desenvolveu precipuamente nas
camadas mais pobres da população, que sobreviviam de atividades agrícolas e de pesca,
haja vista que as classes de guerreiros, tal e qual sucedia em China e Japão, não
difundiam suas disciplinas de combate fora de seu estreito círculo. De qualquer modo, a
classe guerreira (mormente, os peichin) acabou por se render às técnicas de luta
desarmada.[17][18]
O que viria a ser o jiu-jítsu surgiu para capacitar o samurai para a luta desarmada mas
usando armadura, pelo que não era racional utilizar ostensivamente de pontapés e socos
mas mais projeções e estrangulamentos. Por seu turno, o que se desenvolveu em
Ryukyu visava justamente ao combate desarmado, que se poderia dar em qualquer sítio
sem que os contendores estivessem a usar dum trajo específico, pero poderia coincidir
de se enfrentar guerreiros com armadura, pelo que socos e pontapés eram mais
interessantes, isso aliado ao condicionamento de mãos e pés para serem instrumentos de
ataques fulminantes.[19]
A independência do reino de Ryukyu sofreu duro golpe quando, em 1609, o clã samurai
de Satsuma, com aprovação do imperador do Japão, subjugou o arquipélago. Por
ocasião da invasão, os samurais encontraram pouco ou nenhum revide, porque, dadas as
circunstâncias, el-Rei declarou que a vida é o mais importante tesouro e recomendou
que a população das ilhas não revidasse à agressão estrangeira. Oquinaua passou a ser
um estado tributário de Japão e China, mas, contrário ao cenário anterior, com
predomínio nipônico, que expôs a cultura local e influenciou sobremaneira o
desenvolvimento das artes marciais, sob os valores da classe guerreira. Naquele
momento, o clã Satsuma introduziu sua própria disciplina, o jigen-ryu.[20]
Antes das influências sínica e nipônica, já existia uma espécie de luta desarmada e
nativa de Oquinaua, que era praticada abertamente, chamada de mutô, cujo embate
começava com empurrões muito parecidos com os de sumô, depois, seguindo-se com
apliacação de golpes de arremesso e torção. [21] Vencia aquele que derrubasse ou
submetesse o adversário.[22] Era uma prática cujo fito mor era recreativo, mas que,
segundo alguns autores e mestres, teria sido a semente do caratê, que foi então
paulatinamente sendo moldado e modificado sob a influências do boxe sino-
meridional.[23][24]
Em meados do século XVII, uma arte marcial oquinauense[c] sem armas já era
estabelecida, sendo conhecida por "tê" (手 ou ティー, em japonês: te, em oquinauense:
ti).[25] Também é referida como mão de Oquinaua (沖縄手, em japonês: Okinawa-te, em
oquinauense: Uchinaadi), quando surge a figura de Matsu Higa, renomado mestre de te
e kobudo e também experto em chuan fa, que teria aprendido com mestres chineses. [26]
Mas já nesse tempo, a arte marcial já vinha evoluindo em três formas distintas,
radicadas nas três cidades que as nomearam, Naha-te, Tomari-te e Shuri-te.
Acredita-se que Sensei Higa tenha sido, dentro de seu estilo próprio, o primeiro a
estabelecer um conjunto formal de técnicas e chamá-lo de te.[26]
Destacaram-se mais os estilos de Shuri, por ser a capital, e de Naha, por ser cidade
portuária e mais importante entreposto comercial. Entretanto, posto que tivesse menor
relevo no cenário da época, por ser mormente uma cidade de trabalhadores, pescadores
e campesinos, Tomari, devido a exatamente suas características, desenvolveu o estilo
peculiar e muitas vezes erradamente confundido com o estilo de Shuri. Ademais, em
que pese cada um das cidades ter seu estilo, elas compartilhavam informações e
praticantes.[27]
Com mestre Takahara[d], já por influência japonesa, o te vem a receber os três princípios
que culminariam com a transformação da técnica numa disciplina muito maior já na
transição do século XIX para o século XX.
Ainda no século XVII, o te sofria fortes influências desde a China. Mestre Sakukawa,
por sugestão de Peichin Takahara, foi aprender com o chinês Kushanku — mestre de
chuan fa — e, depois, diretamente no continente. Tais características não passaram
despercebidas e calharam em que a arte marcial passou a se chamar Tode ou Todi (唐手
ou トゥデ, mão chinesa)[e], ou ainda Toshukuken (徒手空拳) e Toshu-jitsu (徒手術).[29]
Enquanto isso, em Tomari, seu estilo adquiria uma característica mais acrobática. [17] Os
principais expoentes da região foram os mestres Karyu Uku e Kishin Teryua, que
deixariam por legado a Kosaku Matsumora. Em Naha, o te evoluia numa direção
diversa, com movimento de extrema contração, golpes de curto alcance e
condicionamento do corpo para absorção de golpes, tudo conjugado a técnicas de
respiração (ibuki).[30][31]
Anko Itosu
No fim do século XIX, o caratê ainda era marcado de modo forte por quem o ensinava,
não havia, posto que houvesse similitudes entre as técnicas, um padrão, o que
dificultava sua maior aceitação fora de círculos restritos, porque era praticado e
ensinado num rígido esquema de mestre/aluno.[33]
Nesse meio tempo, sem olvidar altercações sínicas, o cenário político mudou porquanto
da anexação final de Ryukyu, em 1875, por parte do Japão, fazendo com que o provecto
reino se transmutasse na província de Oquinaua.[34] Todavia, o que poderia ser o fim
tornou-se uma oportunidade, pois terminou com o isolamento da população do
arquipélago, incorporados de vez à população nipônica. E coube a Anko Itosu, um
discípulo de Matsumura e secretário do rei de Oquinaua, usar de sua influência para
tentar disseminar a arte marcial.
O mestre via o te não somente como arte marcial mas, principalmente, como uma forma
de desenvolver caráter, disciplina e físico das crianças. Ainda assim, o mestre julgava
que os métodos utilizados até a época não eram práticos: o te era ensinado basicamente
por intermédio do treino repetitivo dos kata. Então, Itosu simplificou o treino a unidades
fundamentais, os kihons, que são as técnicas compreendidas em si mesmas, um soco,
uma esquiva, uma base, e, além, compilou a série de kata Pinan com técnicas mais
simples e que passariam a formar o currículo introdutório. A mudança resultou na
diminuição, supressão em alguns casos, de táticas de luta, mas reforçou o caráter
esportivo, para benefício da saúde: deu-se relevo a postura, mobilidade, flexibilidade,
tensão, respiração e relaxamento.
Em 1900, aconteceu uma grande emigração amostra do caratê aos ocidentais, quando o
Havaí tinha sido anexado pelos EE.UU. havia aproximadamente dois anos.
Como resultado de seu progresso, Anko Itosu crê ser possível exportar o caratê para o
resto do Japão e, em começos do século XX, passa a empreender esforços para tanto,
mas não consegue lograr sucesso.
Paralelos a esses eventos, outro influente mestre, Kanryo Higashionna, promovia por si
outras mudanças. Ele desenvolvia um estilo peculiar que mesclava técnicas suaves,
evasivas e defensivas (como esquivas e projeções), e menos as rígidas, e tinha como
discípulos Chojun Miyagi e Kenwa Mabuni. A exemplo de Itosu, Higashionna
conseguiu fomentar os valores neles que levaram até as mudanças futuras que tornariam
o caratê mais aceitável.[5]
Em que pesem a evolução que arte estava experimentando e havendo a fama de ser um
estilo de luta eficaz, fama essa que já havia muito corria pelo Japão, ainda era pouco
conhecida. Não se sabia realmente muito essa luta que matou muitas pessoas, sobre suas
características, fora os praticantes oquinauenses e alguns poucos fora desse círculo
ainda pequeno e cerrado. Em 1965 o caratê foi proibido no Brasil por que ele ja matou
duas pessoas que estavam lutando: Francisco de Oliveira dos Santos e Maria Fernanda
dos Campos[37]
Certa altura, por volta de 1906 chegou a Oquinaua uma praticante de jujutsu (ou de
judô, segundo algumas fontes) que desafiou a todos da ilha a medir forças com ele, para
provar que seu estilo de jiu-jítsu era superior aos do Japão e da região. No dia aprazado,
posto que fosse já provecto (na casa dos setenta anos), no meio de vários lutadores, o
mestre Itosu não quis deixar sem resposta o convite e foi ter com o desafiante, que
interpelou o mestre, dizendo "que honra haveria de ganhar de um idoso?", mas
aquiesceu ao embate, por respeito ao nobre ancião. A luta foi decidida com apenas um
golpe.[38]
Marcante e decisivo, entretanto, foi um desafio que mestre Choki Motobu protagonizou.
Chegou ao Japão um navio russo, conduzindo um lutador de sambo (Jon Kirter), com
porte físico avantajado (quase 2m de altura) e capaz de cravar um prego na madeira
co'as mãos. O fito daquele lutador era divulgar sua modalidade de luta e, para tanto,
além das demonstrações públicas, que envolviam proezas, como enrolar uma barra de
ferro nos braços e quebramentos, foi lançado um desafio a todo o país.
A nova correu até Oquinaua, sendo o desafio aceito pelos irmão Motobu, descendentes
da casa real e notórios expertos em artes marciais, além do caratê, kobudo e gotende.
Dirigiram-se eles até o Japão. No dia da luta, tudo certo o embate foi decidido com
apenas um golpe na região do plexo solar. A vitória foi considerada tão surpreendente
que criou alvoroço e despertou de vez o interesse pelo caratê. [39]
Kenwa Mabuni
A divulgação não aconteceu sem resistência. A despeito de vários pedidos para a não
exibição de vários mestres que não viam com bons olhos o movimento, Funakoshi
levou o caratê até o sistema público de ensino, com a ajuda de seu mestre Anko Itosu e,
em pouco tempo, a arte marcial já fazia parte do currículo escolar como disciplina
física/esportiva, dando um impulso extraordinária, com o caratê sendo praticado em
vários sítios e sendo bastante apreciado e valorizado localmente.
Entre 1902 e 1915, sensei Funakoshi viajou com seus melhores alunos por toda
Oquinaua realizando demonstrações públicas de caratê e calhou de o inspetor de
Educação do conselho, Shintaro Ogawa, estava particularmente interessado no processo
seletivo para ingresso nas forças armadas, preocupado em obter um bom grupo,
composto por jovens de boa índoles (valores) e boa compleição. Ogawa ficou
impressionado, que escreveu ao continente dando as novas. [33]
O mestre sabia que haveria de surgir enorme oposição, haja vista que naquele período
da história das relações entre Japão e China não era dos melhores. Ainda era muito
recente a lembrança da Primeira Guerra Sino-Japonesa (1894–1895). E até o fim da
Segunda Guerra Mundial e da Segunda Guerra Sino-Japonesa, com a rendição do Japão
perante os Aliados, ocorreram vários incidentes belicosos. [41]
Tais circunstâncias levavam à conclusão de que uma arte marcial de origem chinesa
seria certamente repudiada, pelo que a mudança da arte para o karate-dō (空手道,
caminho das mãos vazias), isto é, com o acréscimo do sufixo "dō", como se deu com
muitas das artes marciais praticadas no Japão. A partícula do significa caminho, palavra
que é análoga ao familiar conceito de tao.[42] Daí que o caratê deixou de ser encarado
apenas em seu aspecto técnico, ou jutsu, para serem realçados o filosófico e o físico
(educacional).
Por outro lado, o caratê beneficiou-se de uma perspectiva que existia, a de que a luta
nativa de Oquinaua, aí incluso o seu kobudo (manipulação de armas), era simplesmente
uma forma de jujutsu ou koryu. Assim se pensava porque tanto os vários estilos de
jujutsu (takenouchi-ryu, daito-ryu etc.) japoneses quanto o oquinauense valiam-se das
mesmas formas técnicas (luta desarmada, principalmente), diferenciando-se apenas no
foco e no treinamento, ou seja, nada de estranho, se comparado à tradição samurai.
Denominava-se o caratê de tejutsu, o que reforçava esse aspecto.[43]
Entrementes, a proposição de Mestre Itosu, pela escrita do nome da arte marcial como
kara-te-dō foi objecto de debate em 1936, e mestres na época acordaram que seria a
melhor escolha, o que reflectira a unidade do caratê e sua originalidade, posto que
houvesse sofrido diversas influências de fora. [6][44]
Devido aos esforços de Funakoshi o caratê passou a ser ensinado nas universidades de
Shoka, Takushoku, Waseda e Faculdade de Medicina.
Jigoro Kano
Depois que Funakoshi demonstrou o caratê, outros mestres de Oquinaua seguiram pela
mesma trilha e se foram, no fito de conseguir novos alunos e divulgar ainda mais. Um
daqueles mestres era Kenwa Mabuni, que se fixou em Osaca e, no ano de 1931, criou a
Dai-Nihon Karate-do Kai, para dar apoio a seu estilo, que foi registrado, primeiro como
Hanko-ryu, e, depois, Shito-ryu.[46]
Entrementes, somente durante a década de 1930 foi que a Associação Japonesa de Artes
Marciais, Butoku-kai, reconheceu oficialmente o caratê como arte marcial nipônica e
requereu que todas as escolas fizessem registro na entidade, exigindo para esse registro
que cada uma delas indicasse os nomes de seus estilos.[47]
Em maio de 1949, alguns discípulos de Funakoshi criaram uma associação cujo escopo
principal seria a promoção do caratê. O nome dado foi Nihon Karate Kyokai (日本 空手
協会, (Japan Karate Association - JKA, Associação Japonesa de Caratê), e o primeiro
presidente foi Saigo Kichinosuke, membro da Câmara Alta do Japão, neto de Saigo
Takamori, um dos maiores heróis do Japão Meiji.[48]
Durante a Segunda Guerra Mundial, o caratê tornou-se popular na Coreia do Sul sob os
nomes tangsudo ou kongsudo quando a pratica do taekwondo foi proibida pelos
japoneses após sua invasão.
Após a Segunda Guerra Mundial, o mestre Funakoshi com seus alunos conseguiram que
o Ministério da Educação classificasse o caratê como educação física e não como arte
marcial, tornando possível seu ensino, durante a ocupação do Japão. Depois dos Estados
Unidos o caratê foi difundido pela Europa e o mundo.[49]
Posto que mestre Funakoshi pregasse que o caratê era uma arte marcial única, que as
variações nas formas, nos estilos, deviam-se precipuamente às idiossincrasias e que
jamais denominou sua linhagem de estilo, ainda durante sua existência e persistindo até
os dias atuais, o que sucedeu foi uma proliferação de estilos, escolas e linhagens
diferentes.
A grande variedade de estilos e escolas, se por um lado facilita essa disseminação, por
outro, causou enormes dissensões e cisões entre entidades e representantes. Muitas
vezes, o que motivou a cisão foram disputas políticas e/ou ideológicas.[50]
O COI estabelece dois parâmetros para a aceitação de um esporte como olímpico: ser
praticado em muitos países (membros) e ser representado por uma entidade
mundialmente reconhecida. Em 2016, o Comitê Olímpico Internacional - COI aprovou
o Caratê como modalidade olímpica para os jogos Jogos Olímpicos de Tóquio em
2020.[51]
A forma esportiva de caratê foi-se introduzindo em África por volta da década de 1940.
Formalmente, na África do Sul a modalidade foi iniciada no começo dos anos 1950 por
instrutores, como Len Barnes, Richard Salmon, James Rousseau, Stan Schmidt e outros.
Em Angola, processo semelhante se deu. E com o tempo algumas entidades foram
sendo criadas e se afiliando a outras, de cunho internacional. [52][53]
Da mesma forma como sucedeu com outras artes marciais japonesas, o caratê foi
introduzido no Brasil com a chegada de imigrantes japoneses no começo do século XX.
Mas somente no ano de 1956, o sensei Mitsuke Harada (Shotokan) instala o primeiro
dojô em São Paulo.[54] A esse exemplo seguiram os mestres Juichi Sagara (Shotokan),
em 1957; Seichi Akamine (Goju-ryu), em 1958; Koji Takamatsu (Wado-ryu); Takeo
Suzuki (Wado-ryu); Michizo Buyo (Wado-ryu); Yoshihide Shinzato (Shorin-ryu);
Takeda, Kimura e Fábio Sensei (Bushi Ryu), em 1992; Akio Yokoyama (Kenyu-ryu),
em 1965.[55]
Em Portugal, a arte marcial foi introduzida entre os anos de 1962 e 1964, quando se
reuniu um grupo de pessoas que praticam a modalidade na Academia de Budo, em
Lisboa. Foi com este grupo que se organizou e entabulou os primeiros contactos com as
entidades internacionais da modalidade. Na década de 1970, verifica-se a criação das
primeiras entidades associativas nacionais representativas de alguns estilos. [57][58] Em
1980, foi fundada a Associação Portuguesa de Karate-Do (Shotokai)[1], cuja génese se
reporta a uma parte importante do núcleo inicial dos praticantes da Academia de Budo.
Até 1985, a CDAM (Comissão Directiva das Artes Marciais), presidida pelo
Comandante Fiadeiro e sob a égide e supervisão do Ministério da Defesa Nacional,
integrava e regulamentava todas as Artes Marciais.
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Demonstração de Karate Heian Godan
Há, contudo, muitos outros estilos, como maior ou menor renome, como Shindo jinen
ryu, Seiwakai, Shudokan, Toon-ryu, Chito-ryu, Kenyu-ryu, Isshin-ryu,kudo etc. Há
ainda alguns estilos que nada mais são do que visões mais tradicionalistas ou ortodoxas
de um estilo, como é o caso do Shotokai, que propala estar verdadeiramente conectado à
escola criada pelo mestre Funakoshi; aqueles que são uma visão particular e/ou
moderna, como o Gosoku-ryu, que é uma recopilação baseada no Shotokan; ou estilos
que são compilações de outros estilos.
Em termos de artes marciais, há que se notar que a palavra "escola" não tem o mesmo
sentido empregado no uso comum. O caratê é uma arte marcial que se subdivide em
diversos estilos, o Shorin-ryu sendo um dos mais antigos entre eles. Cada estilo,
identificados geralmente pela partícula ryu (流, ryũ?, fluxo), é uma forma distinta de se
praticar uma determinada arte marcial. Nesse sentido, membros de estilos diferentes
terão nomes diferentes para golpes semelhantes, kata e kihon próprios, diferentes
progressões de faixa, ou nível, e até mesmo metodologias de ensino variadas. O que une
os diferentes estilos é a consciência de que são como galhos de uma mesma árvore, no
caso a arte marcial em questão. [61]
As escolas, kan (館? edifício, casa), por sua vez, são visões particulares de um
determinado estilo. Muitas vezes elas se originam como tributos a mestres muito
graduados e, algumas vezes, acabam se transformando em estilos propriamente ditos,
como foi o caso do estilo Shotokan, que deve ser mais corretamente chamado de
Shotokan-ryu (uma vez que Shotokan seria a Escola de Shoto e Shotokan-ryu seria o
Estilo da Escola de Shoto). Uma "escola", nesta cércea, não é, portanto, um local de
aprendizado de técnica, mas um conjunto de ideias dentro de um estilo. [62]
Outra subdivisão pode se dar com o surgimento de uma linhagem, marcada com a
adição do sufixo ha (派? facção, escola, seita), que, semelhante às escolas, imprimem
uma visão particular de um estilo ou de uma escola. Nessa leva, existem as linhagens,
por exemplo, Hayashi-ha, Motobu-ha e Inoue-ha, do estilo Shito-ryu; Goju-kai e
Seigokan, do estilo Goju-ryu; ou Shobayashi-ryu, Matsubayashi-ryu e Kobayashi-ryu,
do estilo Shorin-ryu.[62]
Nota-se, portanto, que não existe um padrão ou uma norma para definir os nomes dos
estilos e suas respectivas ramificações. E divergências de entendimento são
naturalmente esperadas, pelo que variações de uma mesma forma não seria algo insólito
e nem as pessoas terem por desiderato trilhar caminhos distintos, porém dever-se-ia
restar cônscio da origem comum. [63]
Os mestres tradicionais pensavam que qualquer arte marcial deveria ser assemelhada a
um flúmen, isto é, fluente e flexível. De outro modo, uma arte marcial deveria ser o
resultado dum constante processo de aprimoramento individual, pelo qual o budoca
adaptar-se-ia conforme os conhecimentos adquiridos e nunca seria idêntica, posto que
duas pessoas praticassem a mesma, por igual período e com um só mestre, pois as
pessoas não são iguais. Assim sendo, não haveria razão para existirem diversos
estilos.[64]
Esse carácter mais abrangente do caratê é bem visível pela partícula "dō" (道) de seu
nome. Tais princípios, posto que a grande mudança filosófica ocorrida nas artes
marciais japonesas possa ser localizada na transição do século XIX para o século XX,
possuem suas raízes fincadas bem mais no passado.
• Ijo (径) pode ser expresso em atitudes pró-ativas em favor de terceiros. Também
se diz que a forma ijo respousa na compaixão, humildade e no recato.
• Fo (则, princípio) é o compromisso, isto é, a dedicação que alguém tem para
com algo; no caso, o afinco com que um carateca treina os conhecimentos
ensinados, a seriedade e devoção que nutre, além, para com seu mestre e
colegas.
• Katsu (奉, observância) reflete-se no conhecimento, na compreensão que a arte
marcial possui, mas compreendida nos mínimos detalhes e em que momentos,
da vida ou de um enfrentamento real, farão sentido.
O conceito do caminho evolutivo que é a prática do caratê pode ser achado em todas as
artes marciais japonesas, tratando-se uma leitura japonesa do tao. Como caminho, por
conseguinte, deve ser interpretado de forma bem abrangente, para a compreensão de um
ciclo de vida. De outra forma, uma vez que o ciclo da vida é já um caminho pré-
determinado, um sistema no qual todas as formas e seres estão inter-relacionados,
mister haver a consciência de que existe uma relação de interdependência de todas as
coisas e situações: o aprendizado não seria mérito pessoal mas o resultado da relação
voluntária do praticante com o ambiente e com todos os seres. [66]
Samurai
Nesta cércea, o caratê se insere como uma das disciplinas do Bushido, o código de ética
do guerreiro. Assim, o caratê é muito mais do que uma forma de luta (o "dō" rejeita esta
visão limitada), é um modo de vida. Os mestres prolataram um conceito, o que de nesta
arte marcial, além de não existir atitude agressiva, em caso de embate, nunca o carateca
faria o primeiro movimento:
“
空手に先手無し
Karate ni sente nashi
No caratê não há primeiro movimento (ataque) ”
Sob duas ópticas capitais e pragmáticas, ressai o escopo pacífico da modalidade.
Primeiro, caso se enfrentem dois caratecas, nenhum deles tomará atitude ofensiva, pelo
que o combate nunca existirá. Depois, caso o enfrentamento se desse contra alguém que
não é um carateca, com a atitude pacífica ou desestimularia o ataque ou, se esse existir,
poder-se-ia usar da energia despendida pelo contendor para resolver a demanda. Trata-
se destarte de uma abordagem complementar à do shinbu.[67]
A par dos princípios básicos elencados e tendo em foco o Bushido, o mestre Kanga
Sakukawa elaborou um código, o Dojo kun, para servir de norte à prática do caratê. [68]
Tal código é composto por cinco regras:
“
1. Esforçar-se para a formação do caráter.
2. Fidelidade para com o verdadeiro caminho da razão.
3. Criar o intuito do esforço.
4. Respeito acima de tudo.
5. Conter o espírito de agressão.
”
Tode jukun[editar | editar código-fonte]
Sensei Anko Itosu, quando se dirigiu aos administradores japoneses, no fito de divulgar
o caratê por todo o Japão, referiu-se à sua arte marcial em forma de princípios que
poderiam ser facilmente compreendidos. Assim, tal conjunto de princípios ficou
conhecido como Tode jukun, ou os Dez Princípios do Tode.[69]
“
1. O caratê não é praticado apenas para o benefício individual, pode
ser usado para proteger sua família e seu mestre.
2. O propósito do caratê é tornar os músculos e ossos duros como
rochas e usar as mãos e pernas como lanças.
3. O caratê não pode ser aprendido rapidamente.
4. Em caratê, treinamento das mãos e dos pés é importante.
5. Quando praticar as bases do caratê certifique-se de manter as
costas eretas.
6. Pratique cada uma das técnicas do caratê repetidamente.
7. Vós deveis decidir se o caratê é para saúde ou para auxiliar nos
deveres. ”
8. Quando treinar, faça como se estivesse no campo de batalha.
9. Se se usar excessivamente sua força no treinamento de caratê
isso irá causar a perda de energia.
10. [...] O caratê auxilia no desenvolvimento de ossos e músculos.
Ajuda tanto na digestão quanto na circulação.
“
1. ...o caratê deve iniciar com saudação e terminar com saudação.
2. No caratê, não existe atitude ofensiva.
3. O caratê é um apoio da justiça.
4. Conheça a si próprio antes de julgar os outros.
5. O espírito é mais importante do que a técnica.
6. Evitar o descontrole do equilíbrio mental.
7. Os infortúnios são causados pela negligência.
8. O caratê não se limita apenas à academia.
9. O aprendizado do caratê deve ser perseguido durante toda a vida.
10. O caratê dará frutos quando associado à vida cotidiana.
11. O caratê é como água quente. Se não receber calor
constantemente, esfria.
12. Não pense em vencer, pense em não ser vencido.
13. Mude de atitude conforme o adversário.
14. A luta depende de como se usam os pontos fracos e fortes.
15. Imagine que os membros de seus adversários são como espadas.
16. Para cada homem que sai do seu portão, existem milhões de
adversários.
17. No início, os movimentos são artificiais, mas, com a evolução,
tornam-se naturais.
18. O treino das técnicas deve ser de acordo com o movimento
correto (forma original), mas na aplicação torna-se diferente
(livre).
19. Não se esqueça de aplicar corretamente.
20. Estudar, praticar e aperfeiçoar-se sempre.
”
Técnicas[editar | editar código-fonte]
Ver artigo principal: Técnicas do caratê
Currículo[editar | editar código-fonte]
O repertório técnico do caratê está dividido, de modo básico, em dois grandes grupos go
waza (剛 技, técnicas rígidas?) e ju waza (柔技, técnicas suaves?), que compreendem
respectivamente os golpes de impacto e os de controle. Sendo que isso não tem
nenhuma relação com estilo ou mesmo a denominação deste, são dois aspectos
presentes em qualquer sodalício ou modo de se ensinar/aprender a modalidade. [70]
Quadro sinóptico
Ju waza Go waza
Te waza
Soku waza
Koky Ate waza
Torite Tai sabaki
u Atemi waza
Hoj
o Ker Tsu Uch Atam
Nag Tac i ki i a
Katam Uke Ashi Uke und
e hi Tameshiw waz waz waz waza
Ibuki e waz saba mi o
waz waz ari a a a
waza a ki waza
a a
Kogeki waza
Tate waza
Kansetsu waza
Ne waza
Mestre Itosu possuía um projecto pessoal, que era de introduzir a arte marcial de
Oquinaua em seu sistema de ensino público. Antes dele, grosso modo, quando se dizia
que o mestre tinha transmitido todo o seu conhecimento, significava que ele tinha
ensinado todos os kata que sabia, aí inseridos todos os aspectos. Não se praticava a luta
— kumite — porque o entendimento da época era que o caratê (como disciplina de
combate) era mortal e, portanto, insuscetível de ser praticado em luta, posto que
combinada. Ou, quando era praticado, as lutas eram uma parte mínima dos
exercícios.[27]
Como a modalidade é, antes de tudo, uma arte marcial, exige-se de seu adepto que
pratique os exercícios com dedicação e empenho similares a estar num campo de
batalha: a mente deve estar focada no exercício, de molde a absorver o
movimento/conceito na sua inteireza. Essa atitude é, em verdade, esperada do carateca
perante quaisquer situações do cotidiano, eis que o caratê é concebido como uma
disciplina marcial ética (budo).
Essa ideia foi paulatinamente sendo cambiada. Ainda assim, as escolas tradicionais
transmitem a arte marcial precipuamente com base no aprendizado do kata.
Acontece, porém, que o modelo de ensino fulcrado nos kata não se mostra eficaz
quando se trata de promover o ensino do caratê a crianças, como notou mestre Anko
Itosu ainda no século XIX.[75] Foi então que ele particionou os kata nas técnicas
fundamentais e criou os kihon do caratê, adoptando um modelo mais próximo ao
conceito do dõ/tao, que também resta presente nalgumas artes marciais, como o aiquidô.
Da mesma forma, compreendeu-se que a simulação da luta (que o kata pretende ser)
deveria ser praticada, pois já coloca o carateca em situação de enfrentamento e o
prepara de modo mais eficaz. Destarte foi que surgiu o trinômio em que o caratê
hodierno se lastreia.
Kihon (基本?) significa "fundação" ou "fonte" e, nesta lógica, quer dar sustento ao
desenvolvimento do caratê de forma perene e propedêutica. Um kihon é uma técnica
básica, um soco, uma defesa, uma postura, que é repetida pelo praticante diversas vezes.
O escopo é tornar o movimento tão natural que, quando for executado num kata ou num
kumite, não haverá dificuldades e o aprendizado fluirá.
O estudo na forma de fundamentos consegue transmitir ao aluno a forma básica,
incumbindo ao professor conseguir transmitir não somente o movimento em si mas toda
a filosofia e os conceitos que estão por detrás, porque de outra forma a essência do
caratê inexoravelmente será esquecida, deixando de ser "dô" para ser "jitsu". Noutras
palavras, técnica pela técnica, num movimento contrário ao deixado pelos mestres.
Kata (型?) significa "forma" ou "modelo". Um kata pretende ser uma luta simulada,
formatada para que o carateca consiga praticar sozinho; são movimentos coreografados
que visam dar desenvoltura frente a situações reais de enfrentamento, contra um ou
vários adversários imaginários. A prática do kata foi introduzida desde cedo no caratê,
quando a influência de mestres chineses se fez peremptória, desde quando se tratava de
luta tipicamente de Oquinaua (Okinawa-te). Todavia, com a crescente influência dos
estilos oriundos da China, a prática fixou-se de vez.[28][29]
Kumite (組み手 ou 组手? mãos dadas) representa uma luta, um combate. Seu nome,
sendo traduzido como o encontro das mãos, pretende fazer memento ao lutador que o
embate dar-se-á, pelo menos nos primeiros momentos, em condições de igualdade. Por
conseguinte, deve haver respeito.
Por outro lado, a prática do kumite como parte do treinamento, além de promover a
adaptação do praticante a situações de combate, tem como fito precípuo a promoção do
companheirismo, do compartilhamento de informações, da ajuda mútua.
Ademais, quando o caratê passou pelas mudanças filosóficas que o transformaram em
caratê-dô, impregnou-se da ideia de que o carateca que evolui sozinho praticamente não
evolui, pois não se forma completamente, com respeito a outrem e à coletividade. E
isso, num hipotético combate, fatalmente contribuiria de modo nefasto para um
insucesso.
O mestre Choki Motobu dizia que as técnicas aprendidas tornar-se-iam «vazias» caso
não fossem postas em prática.
Os mestres de caratê não usavam nenhum padrão para identificar o nível de cada
apedeuta, de modo prosaico identificavam particularmente quem estava mais ou menos
avançado nos conhecimentos. Paulatinamente, passou-se, de um jeito ou de outro, a se
utilizar do sistema menkyo (vigente ainda nas escolas tradicionalistas) para certificar o
grau de conhecimentos de um praticante, basicamente destacando-se três níveis:
Inicialmente, em alguns casos (distinguir entre homens e mulheres ou níveis mais altos)
os cintos de algodão cru usados não eram tingidos de modo uniforme, mas para se
diferenciarem das outras artes marciais, havia a cor do grau ladeada por tingimento das
bordas em cor distinta. Esse modelou não vigeu por muito tempo (alguns estilos ainda
usam), passando a ser igual ao do judô. Por outro lado, posto que se almejasse
estabelecer um modelo único (a ideia original), cada estilo/escola passou a estabelecer
seus próprios graus e sequência de cores. Nesse mesmo espírito, alguns possuem cores
diferentes para designar os graus mais elevados, por exemplo, com o cinto coral
(vermelho e branco intercalados).[77]
O sistema atual que rege a maioria das artes marciais usando kyu ("classe") e dan
("grau"), foi criado pelo fundador do judô. Kano era um educador e conhecia as
pessoas, sabendo que são muitos os que necessitam de estímulos imediatamente depois
de haver começado a praticar artes marciais. A ansiedade desse tipo de praticante não
pode ser saciada por objetivos em longo prazo.
Na classificação de orientada por cores, o termo kyu significa classe, sendo que essa
classificação é em ordem decrescente. Na classificação de mestres (com cinturão ou
faixa pretos), dan significa grau, sendo a primeira faixa preta a de primeiro dan; a
subsequente, o segundo dan; e assim por diante em ordem crescente. Em um plano
simbólico, o branco representa a pureza do principiante, e o preto se refere aos
conhecimentos apurados durante anos de treinamento.
Desde que foi estabelecido e aceito o sistema de níveis coloridos, a graduação do caratê
assemelhou-se muito ao seriamento escolar, num paradigma no qual os alunos galgam
graus ascendentes (e mais complexos) até que obtenham o de mestre. No exame, são
procedidos testes com diferentes características e exigências, de acordo com o grau de
conhecimentos exigidos para o nível imediatamente anterior, ou seja, o aluno obtém a
próxima graduação, se conseguir demonstrar que aprendeu a todo o conhecimento
correspondente ao grau que ocupa e pretende superar; em tese, somente quando o aluno
aprendeu tudo de um estágio é que está pronto para prosseguir no caminho do caratê.
Habitualmente, também se exige certo período de tempo entre um exame e outro.[79]
Não existe competição no caratê tradicional, mas com o câmbio pelo qual passou a
modalidade, de disciplina marcial pura para esporte e meio de desenvolvimento físico,
paulatinamente algumas entidades passaram a promover torneios, cujo fito era
promover o intercâmbio e a amizade.
Outros, contudo, sempre alertaram para a alta letalidade de alguns golpes, como
sucedeu num desafio em que o oponente faleceu depois de um golpe desferido pelo
mestre Choki Motobu. Deste modo, naturalmente foram surgindo regras probitivas e
foram sendo adoptadas proteções aos esportistas, dependendo do sexo, da idade etc.,
como colete para o peito e capacetes. Além deste aspecto pragmático, as entidades
pretendem fazer com que suas afiliadas promovam também o lado filosófico do caratê,
do respeito para com os colegas e demais praticantes da modalidade. [80]
Além da crítica sobre o perigos dos golpes, mestres ainda argumentam que as
competições fazem o caratê perder sua essência, como esporte e como arte marcial, eis
que, derivado das próprias normas de proteção aos lutadores, as entidades vêm
limitando o acervo de golpes que se podem utilizar, na verdade, acenando com um
repertório estreito do qual não se pode desviar, sob pena de desclassificação ou não
marcação de pontos. Mas tais técnicas são deveras eficazes num embate real. Os
mestres tradicionalistas dizem que o praticante pode sair-se muito bem na competição,
mas, como essa não admite contacto maior nem controle verdadeiro das técnicas, ele
não terá um ataque potente nem resistirá a contra-ataques certeiros.[81]
Enfim, estão em choque duas abordagens diferentes do caratê: uns com visão
tradicional, entendendo que se trata de uma arte marcial, cujo objectivo é o
aperfeiçoamento, do corpo, do intelecto, da personalidade etc.; outros, com a visão
desportiva, enxergando o caratê como mais uma modalidade.
Na competição de kata, pontos são concedidos por cinco juízes, de acordo com a
qualidade do desempenho do atleta, de maneira análoga à ginástica olímpica. São
critérios fundamentais para uma boa performance a correta execução dos movimentos e
a interpretação pessoal do kata através da variação de velocidade dos movimentos
(bunkai). Quando o kata é executado em grupo (usualmente, de três atletas), também é
importante a sincronização dos movimentos entre os componentes do grupo.
No kumite, dois oponentes (ou duas equipes de lutadores) enfrentam-se por um tempo,
que pode variar de dois a cinco minutos. Pontos são concedidos tanto pela técnica
quanto pela área do corpo em que os golpes são desferidos. As técnicas permitidas e os
pontos permissíveis de serem atacados variam de estilo para estilo. Além disso, o kumite
pode ser de semi-contato (como no estilo Shotokan), ou de contato direto (como no
estilo Kyokushin).
Há, ainda, confederações que utilizam tabela de pontuação semelhante a esta. Por
exemplo, a Confederação Brasileira de Karate-do Interestilos (CBKI), bem como as
entidades filiadas à mesma, utilizam wazari (meio ponto - ○), para golpes chudan
(altura do tronco); e ippon (um ponto - ●), para golpes jodan (altura da cabeça), ou
indefensáveis. Nesse sistema de luta, o combate termina quando o tempo expira ou
quando um dos dois oponentes atinge três pontos (sanbon), daí o nome do sistema de
disputa ser Shobu Sanbon (disputa por três pontos). Uma variação desse sistema é o
Shobu Ippon (disputa por um ponto), onde vence aquele que conseguir um ippon ou
dois wazari. Há, ainda, outra variação: Shobu Nihon (disputa por dois pontos), na qual
vence aquele que obtiver dois ippon's ou quatro waza-ari's, mas esta última forma de
disputa é mais utilizada para competições infantis. [85]