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CONTENIDO

ACESSO EM DESALINHO: O CASO DOS JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS DO ESTADO DO


RIO DE JANEIRO - O FUNDAMENTAL É A JUSTIÇA ........................................................ 14
Tauã Lima Verdan Rangel
Luciane Mara Correa Gomes
1 INTRODUÇÃO ........................................................................................................................................... 15
2 A ESTRUTURA DO PROJETO CONCILIAÇÃO PRÉ PROCESSUAL E SUA CONCEPÇÃO
TEÓRICA COMO DIREITO FUNDAMENTAL ........................................................................................ 16
3 POR UM ACESSO INFORMATIZADO E EFICAZ ................................................................................ 17
4 ASPECTOS ESTRUTURAIS DOS JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS E OS MUTIRÕES DE
CONCILIAÇÃO ............................................................................................................................................. 19
5 CONCLUSÃO ............................................................................................................................................. 23

AFIRMAÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS PELO VIÉS TRABALHISTA:


ESSENCIALIDADE DO PROTECIONISMO JURÍDICO-LABORAL EM CRISES
ECONÔMICAS. .................................................................................................................... 25
Ana Maria Pires Barbosa dos Reis
Bruno Prisinzano Pereira Creado
Raíssa Stegemann dos Reis Rocha
1 CONSIDERAÇÕES HISTÓRICAS SOBRE O DIREITO DO TRABALHO ......................................... 26
2 MODERNIDADE ECONÔMICA-SOCIAL E DIREITO DO TRABALHO ..........................................29
3 ESSENCIALIDADE DO DIREITO DO TRABALHO: ECONOMIA, CRISES E PROTEÇÃO
JURÍDICA ....................................................................................................................................................... 32
5 CONCLUSÃO ............................................................................................................................................. 34

A ATUALIDADE HISTÓRICA DO CASAMENTO HOMOAFETIVO E SUA


REGULAMENTAÇÃO JURÍDICA NO MUNDO CONTEMPORÂNEO. ............................. 37
Lucas Santos de Almeida
Ana Maria Viola de Sousa
1 INTRODUÇÃO ........................................................................................................................................... 37
2 CASAMENTO HOMOAFETIVO: LINEAMENTOS INTERDISCIPLINARES E PROPEDÊUTICOS
......................................................................................................................................................................... 38
3 REGULAMENTAÇÃO JURÍDICA DO CASAMENTO HOMOAFETIVO ........................................... 42
4 CASAMENTO HOMOAFETIVO: UM DIREITO HUMANO .............................................................. 46
5 CONCLUSÃO ............................................................................................................................................. 48

1
DIREITOS HUMANOS E CINEMA: NOVA METODOLOGIA DO ENSINO JURÍDICO .... 53
Ana Maria Viola de Sousa
Lucas Santos de Almeida
1 INTRODUÇÃO ........................................................................................................................................... 53
2 O ENSINO JURÍDICO E DIREITOS HUMANOS ................................................................................. 54
3 ABORDAGEM METODOLÓGICA .......................................................................................................... 57
4 O CINEMA COMO ESTRATÉGIA DIDÁTICA ..................................................................................... 60
5 CONCLUSÕES ........................................................................................................................................... 61

PENSANDO A EDUCAÇÃO SOCIOAMBIENTAL E O DIREITO HUMANO AO


DESENVOLVIMENTO PELA PROSPECTIVA DA COMPLEXIDADE DE EDGAR MORIN65
Regina Vera Villas Bôas
Grasiele Augusta Ferreira Nascimento
I - NOTAS INTRODUTÓRIAS: PENSAMENTO COMPLEXO, SOCIEDADE GLOBALIZADA E
EDUCAÇÃO SOCIOAMBIENTAL ............................................................................................................ 66
II - DIREITO HUMANO AO DESENVOLVIMENTO E A COMPLEXIDADE ..................................... 68
III NOTAS CONCLUSIVAS: DESENVOLVIMENTO HUMANO SUSTENTÁVEL, EDUCAÇÃO
AMBIENTAL E TRANSDISCIPLINARIDADE .......................................................................................... 71

O DIREITO HUMANO À ALIMENTAÇÃO ADEQUADA ................................................... 77


Regina Vera Villas Bôas
Durcelania da Silva Soares
INTRODUÇÃO .............................................................................................................................................. 78
1 A POBREZA E A FOME VIOLANDO DIREITOS HUMANOS ............................................................ 79
2 DESAFIOS PARA GARANTIR A EFETIVAÇÃO DO DIREITO HUMANO À ALIMENTAÇÃO
ADEQUADA (DHAA) .................................................................................................................................. 83
3 DIREITO FUNDAMENTAL SOCIAL À ALIMENTAÇÃO NO MUNDO GLOBALIZADO: (IN)
EFETIVIDADE DE UMA ALIMENTAÇÃO ADEQUADA....................................................................... 86
CONCLUSÃO ................................................................................................................................................ 87

UMA REFLEXÃO SOBRE JUSTIÇA AMBIENTAL NO BRASIL DO SÉCULO XXI: A


PARTIR DO CONCEITO TOMASIANO DE JUSTIÇA ......................................................... 91
Lino Rampazzo
Patrícia Nunes Lima Bianchi
INTRODUÇÃO .............................................................................................................................................. 91
1 A COLOCAÇÃO DOS TEMAS DO DIREITO E DA JUSTIÇA NA SUMA TEOLÓGICA .................92
2 A RELAÇÃO ENTRE O DIREITO E A JUSTIÇA ................................................................................... 93

2
3 A ESSÊNCIA DA JUSTIÇA .......................................................................................................................95
4 JUSTIÇA AMBIENTAL: ASPECTOS RELEVANTES ............................................................................ 97
5 O CONCEITO DE JUSTIÇA TOMASIANO E A JUSTIÇA AMBIENTAL ....................................... 100
CONSIDERAÇÕES FINAIS ....................................................................................................................... 102

A EFETIVIDADE DO DIREITO SOCIAL À MORADIA RELACIONADO AO BEM ESTAR


DO INDIVÍDUO NO CONTEXTO AMBIENTAL URBANO ............................................. 105
Daniele da Conceição Matos Alves
Jorge Luiz Oliveira dos Santos
1 INTRODUÇÃO .........................................................................................................................................106
2 CONCEITOS DE MORADIA DIGNA ....................................................................................................106
3 DIREITO À MORADIA E DIREITO AO MEIO AMBIENTE URBANO ........................................... 110
4 TEORIA DOS SISTEMAS DE LUHMANN ........................................................................................... 111
5 SOCIEDADE DE RISCO .......................................................................................................................... 113
6 EFICÁCIA VERTICAL E HORIZONTAL DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS ................................ 114
7 CONCLUSÃO ............................................................................................................................................115

OS PRINCÍPIOS DO ESTADO DE DIREITO E SUA REPERCUSSÃO NA ESFERA


AMBIENTAL PELA TEORIA DO AGIR COMUNICATIVO DE HABERMAS .................... 117
Fábia de Oliveira Rodrigues Maruco
INTRODUÇÃO. ............................................................................................................................................118
A RELAÇÃO INTERNA ENTRE DIREITO E POLÍTICA. ...................................................................... 119
O PODER COMUNICATIVO E A FORMAÇÃO LEGÍTIMA DO DIREITO. ...................................... 120
CONCLUSÃO ............................................................................................................................................... 131

LECIONANDO O DIREITO: ENSINAR A SER HUMANO ................................................. 133


Luciane Mara Correa Gomes
Carmen Caroline Ferreira do Carmo Nader
1. INTRODUÇÃO ........................................................................................................................................ 134
2. TRANSFORMAR PARA RESGATAR .................................................................................................... 135
3. MECANISMOS DE EFETIVAÇÃO O ENSINO DE DIREITOS HUMANOS .................................. 137
4. CIDADANIA FRATERNIZADA ............................................................................................................. 137
5. CONCLUSÃO .......................................................................................................................................... 140

JUDICIAL: ANÁLISE DE CORRELAÇÕES NO ÂMBITO DO SISTEMA


INTERAMERICANO DE DIREITOS HUMANOS ............................................................... 142

3
Fabrício Muraro Novais
Muriel Amaral Jacob
INTRODUÇÃO ............................................................................................................................................ 142
1 SEPARAÇÃO DE PODERES E FUNÇÕES DO ESTADO: DISCRICIONARIEDADE E
NORMATIVIDADE ..................................................................................................................................... 144
2 OMISSÃO INCONSTITUCIONAL DO PODER PÚBLICO E ATIVISMO JUDICIAL ................... 147
3 ACESSO A
NEOCONSTITUCIONALISMO ............................................................................................................... 149
CONCLUSÃO .............................................................................................................................................. 152

A EDUCAÇÃO CONGLOBANTE COMO PROPOSTA DE REALINHO DA CONSCIÊNCIA


SOCIAL E COMUNITÁRIA................................................................................................. 156
Ivan Martins Motta
Leonardo Rodrigues Coelho Monteiro
INTRODUÇÃO ............................................................................................................................................ 156
O ENTE SOCIAL, SEUS VALORES MORAIS E A CONSCIÊNCIA SOCIAL. .................................... 157
A FAMÍLIA E O BERÇO DA CONSCIÊNCIA MORAL ......................................................................... 159
AS LIMITAÇÕES DA LIBERDADE E AS RELAÇÕES EXTERNAS DE PRIVAÇÃO DAS
CAPACIDADES ...........................................................................................................................................160
A ORIENTAÇÃO SOCIAL DA EDUCAÇÃO INFORMAL ..................................................................... 163
CONCLUSÃO .............................................................................................................................................. 164

ACESSO À JUSTIÇA ATRAVÉS DA MEDIAÇÃO: UMA REALIDADE POSSÍVEL ............ 167


Adriane de Oliveira Ningeliski
Laura Jane Ribeiro Both
1 INTRODUÇÃO ......................................................................................................................................... 168
2 DO ACESSO À JUSTIÇA ........................................................................................................................ 168
3 MEDIAÇÃO: UMA PROPOSTA DE ACESSO À JUSTIÇA ................................................................. 171
4 CONCLUSÃO ........................................................................................................................................... 174

OS DIREITOS HUMANOS E A PROMOÇÃO DA JUSTIÇA .............................................. 177


Pedro Alves da Cruz
Rodolfo Anderson Bueno de Aquino
1 DIREITOS FUNDAMENTAIS ................................................................................................................ 178
2 DIREITOS HUMANOS ........................................................................................................................... 186
3 PROMOÇÃO DA JUSTIÇA .................................................................................................................... 187
CONCLUSÃO .............................................................................................................................................. 188
4
A ERRADICAÇÃO DO TRABALHO INFANTIL POR MEIO DA EXPANSÃO DAS
CAPACIDADES PESSOAIS ................................................................................................ 190
José Alberto Barbosa Junior
Rodolfo Anderson Bueno de Aquino
INTRODUÇÃO ............................................................................................................................................ 191
1 O TRABALHO HUMANO: CONCEITO, PRODUTO DA ATIVIDADE HUMANA COLETIVA ... 192
2 DEMOCRACIA E DESENVOLVIMENTO HUMANO: LEGITIMIDADE E LIBERDADE
SUBSTANCIAIS .......................................................................................................................................... 194
DESENVOLVIMENTO COMO LIBERDADE: EXPANSÃO DAS CAPACIDADES ............................ 194
3 A PROTEÇÃO LEGAL INTERNACIONAL DO TRABALHO INFANTIL ......................................... 198

A INVISIBILIDADE PERANTE OS MORADORES EM SITUAÇÃO DE RUA. .................. 207


Maria Clara do Nascimento
INTRODUÇÃO ............................................................................................................................................207
1 INTERDISCIPLINARIDADE. ................................................................................................................ 208
2 DIREITOS HUMANOS E OUTROS RAMOS AFETOS AOS DIREITOS DOS MORADORES EM
SITUAÇÃO DE RUA. ................................................................................................................................. 209
3 AS POLITICAS SOCIAIS PÚBLICAS..................................................................................................... 211
4 MOVIMENTO NACIONAL DA POPULAÇÃO DE RUA. ................................................................... 213
CONSIDERAÇÕES FINAIS ....................................................................................................................... 214

O DIREITO AO ESQUECIMENTO: A NECESSIDADE E A IMPORTÂNCIA DE UMA


DISCUSSÃO ACADÊMICA. ................................................................................................ 217
Gabriel Monteiro de Oliveira
Renan Pontes
Prof. Dra. Patrícia Nunes Lima Bianchi
1. INTRODUÇÃO ........................................................................................................................................ 218
2. Direito ao Esquecimento: noções GERAIS ........................................................................................... 218
3. CONFLITO ENTRE O DIREITO À PRIVACIDADE E O DIREITO AO ACESO À INFORMAÇÃO
...................................................................................................................................................................... 220
4. A IMPORTÂNCIA DE UMA POSTURA ESTATAL ............................................................................ 223
5. A NECESSIDADE DE UM DEBATE ACADÊMICO INTERNACIONAL......................................... 225
6. CONCLUSÃO .......................................................................................................................................... 225

O PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA COMO MANDADO DE


OTIMIZAÇÃO DOS INSTRUMENTOS AMBIENTAIS DE INCENTIVO À PROTEÇÃO. 228
Daniele Alves Moraes

5
Thais Bernardes Maganhini
1.MANDADO DE OTIMIZAÇÃO PRINCÍPIO DA DIGNIDDE DA PESSOA HUMANA ..............229
2. MEIO AMBIENTE COMO DIREITO FUNDAMENTAL .................................................................. 234
3. DA INTERVENÇÃO DO ESTADO NA ORDEM ECONOMICA AMBIENTAL .............................. 236
CONCLUSÃO .............................................................................................................................................. 237

EDUCAÇÃO E DIREITOS HUMANOS: A PERCEPÇÃO DE PROFESSORES


UNIVERSITÁRIOS DA ÁREA DE EDUCAÇÃO .................................................................. 241
Sonia Maria Ferreira Koehler
Jéssica de Sousa Villela
Alessandra Campos Silva de Carvalho
INTRODUÇÃO ............................................................................................................................................ 242
EDUCAÇÃO EM DIREITOS HUMANOS, A EDUCAÇÃO EMANCIPADORA. ................................ 243
JUSTIÇA E O COMPROMISSO COM A EDUCAÇÃO SOCIAL .......................................................... 245
ABORDAGEM METODOLÓGICA ........................................................................................................... 248
O INSTRUMENTO DE PESQUISA E O MÉTODO DE ANÁLISE ...................................................... 249
CONSIDERAÇÕES FINAIS ....................................................................................................................... 258

PROGRAMA MINHA CASA MINHA VIDA: UMA POLÍTICA SOCIAL PÚBLICA EM PROL
DOS DIREITOS HUMANOS .............................................................................................. 262
Drielly Faria Vasques
Luísa Claudia Faria dos Santos
INTRODUÇÃO ............................................................................................................................................ 262
A EFETIVAÇÃO DOS DIREITOS SOCIAIS COMO DIREITOS FUNDAMENTAIS E DIREITOS
HUMANOS .................................................................................................................................................. 263
O DIREITO À MORADIA E SUA INSERÇÃO NO DIREITO CONSTITUCIONAL BRASILEIRO .. 267
POLÍTICAS SOCIAIS PÚBLICAS: UMA GARANTIA DE IGUALDADE REAL? ...............................270
CONSIDERAÇÕES FINAIS ....................................................................................................................... 275

ALIENAÇÃO PARENTAL: BREVE ANÁLISE À LUZ DA GARANTIA DOS DIREITOS


FUNDAMENTAIS DAS CRIANÇAS E ADOLESCENTES .................................................. 279
Luiza Helena Lellis Andrade de Sá Sodero Toledo
Bruna Maria Florenzano e Moreno
INTRODUÇÃO ............................................................................................................................................ 279
1. PRINCIPAIS INSTRUMENTOS DE PROTEÇÃO DOS DIREITOS DAS CRIANÇAS E
ADOLESCENTES AO LONGO DA HISTÓRIA ..................................................................................... 280
2. O ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE ....................................................................... 281

6
3. ALIENAÇÃO PARENTAL E A VIOLAÇÃO DOS DIREITOS DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES
....................................................................................................................................................................... 283
CONCLUSÃO ............................................................................................................................................. 286

AS LIMITAÇÕES DA INTERVENÇÃO HUMANITÁRIA .................................................. 289


Andréia da Cruz Costa
Marina de Oliveira Silva
INTRODUÇÃO ........................................................................................................................................... 289
ORIGEM E CONCEITO DA INTERVENÇÃO HUMANITÁRIA ......................................................... 290
PROBLEMÁTICA DA INTERVENÇÃO HUMANITÁRIA E RESPONSABILIDADES ...................... 291
EM SUA OBRA, GISELE RICOBOM, EXPÕE: ....................................................................................... 291
AINDA A RESPEITO DE RESPONSABILIDADE, JUBILUT, DISPÕE: ..............................................292
DIREITOS HUMANOS E INTERVENÇÃO HUMANITÁRIA ............................................................... 292
A RESPEITO DISTO, PAULO BONAVIDES DISCORRE: .................................................................... 294
NÃO OBSTANTE, EM SUA OBRA, LILIANA LYRA JUBILUT, APONTA: ........................................ 294
AS LIMITAÇÕES DA INTERVENÇÃO HUMANITÁRIA ...................................................................... 294
CONCLUSÃO ............................................................................................................................................. 296

A INCLUSÃO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA NA SOCIEDADE .................................. 298


Vitor Hugo Cornetti Pereira
INTRODUÇÃO ........................................................................................................................................... 298
A PESSOA COM DEFICIÊNCIA.............................................................................................................. 298
CONCLUSÃO ............................................................................................................................................. 302

CARTILHA SOBRE ELEIÇÕES E O DESPERTAR PARA A CIDADANIA ......................... 304


Roberto Bastos de Oliveira Júnior
Fátima Medeiros
INTRODUÇÃO ........................................................................................................................................... 305
1. UMA SÉRIE DE CARTILHAS DE DIREITOS HUMANOS .............................................................. 306
2. CARTILHA SOBRE ELEIÇÕES............................................................................................................ 308
3. UM PROJETO EXTENSIONISTA DIFERENCIADO ........................................................................ 309
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................................................... 311

A POBREZA E O TRABALHO INFANTIL: A FACE PERVERSA DA RELAÇÃO DE


CONSUMO NO BRASIL ENVOLVENDO A INFÂNCIA POBRE ....................................... 314
Grasiele Augusta Ferreira Nascimento

7
Daisy Rafaela da Silva
INTRODUÇÃO ............................................................................................................................................ 314
O CONSUMO E A POBREZA ................................................................................................................... 318
O TRABALHO INFANTIL COM VISTAS AO PERTENCIMENTO NA SOCIEDADE
CONSUMIDORA ........................................................................................................................................ 318
DADOS ESTATÍSTICOS DO TRABALHO INFANTIL NA SOCIEDADE BRASILEIRA .................. 320
CONSIDERAÇÕES FINAIS ....................................................................................................................... 321

EDUCAÇÃO EM DIREITOS HUMANOS E O PROTAGONISMO DO JOVEM NA AÇÃO E


EXTENSÃO COMUNITÁRIA ..............................................................................................323
Maria Aparecida Alkimin
Fátima Medeiros
1 INTRODUÇÃO ......................................................................................................................................... 324
2 EDUCAÇÃO E ESCOLA PARA A FORMAÇÃO INTEGRAL ............................................................. 324
3 EDUCAÇÃO EM DIREITOS HUMANOS ............................................................................................ 326
3.1 O DIREITO FUNDAMENTAL À EDUCAÇÃO ................................................................................. 328
3.2 EDUCAÇÃO EM DIREITOS HUMANOS PARA O DESENVOLVIMENTO PESSOAL E PARA O
PROGRESSO DA SOCIEDADE ................................................................................................................ 329
4 CIDADANIA E PARTICIPAÇÃO: O PROTAGONISMO DO JOVEM NA EXTENSÃO E AÇÃO
COMUNITÁRIA ......................................................................................................................................... 330
4.1 JUVENTUDE E PARTICIPAÇÃO CIDADÃ: O PROTAGONISMO DO JOVEM ......................... 330
4.2 ATIVIDADES DE EXTENSÃO E AÇÃO COMUNITÁRIA: ARTICULAÇÃO ENTRE ENSINO,
PESQUISA E EXTENSÃO .......................................................................................................................... 332

JUSTIÇA COMUTATIVA E DISTRIBUTIVA NO PENSAMENTO DE SANTO TOMÁS .. 336


José Marcos Miné Vanzella
Lino Rampazzo
INTRODUÇÃO ............................................................................................................................................ 336
1 O ESQUEMA DA SUMA TEOLÓGICA ................................................................................................. 337
2 QUESTÃO 61: DAS PARTES SUBJETIVAS DA JUSTIÇA.................................................................. 338
ORA AS AÇÕES PRINCIPAIS SÃO MESMO DISTINTAS ENQUANTO DISTRIBUIÇÃO E
COMUTAÇÃO ............................................................................................................................................ 341
3 QUESTÃO 62: DA RESTITUIÇÃO ........................................................................................................ 343
CONCLUSÃO ............................................................................................................................................. 350

ATO INFRACIONAL E MEDIDAS SOCIOEDUCATIVAS: ANÁLISE À LUZ DOS DIREITOS


HUMANOS, DA PROTEÇÃO INTEGRAL E DO MELHOR INTERESSE DO
ADOLESCENTE INFRATOR .............................................................................................. 353

8
Maria Aparecida Alkimin
Felipe Marcatte de Sousa
INTRODUÇÃO ............................................................................................................................................ 354
1 DIREITOS HUMANOS INFANTO-JUVENIS E O SISTEMA DE PROTEÇÃO ............................... 355
3 ATO INFRACIONAL E MEDIDAS SOCIOEDUCATIVAS ................................................................ 360
4 ATO INFRACIONAL E A MEDIAÇÃO COMO FORMA DE SOLUÇÃO DO CONFLITO
ENVOLVENDO ADOLESCENTE EM CONFLITO COM A LEI .......................................................... 364
CONCLUSÃO ..............................................................................................................................................368

A NECESSÁRIA INTERFACE ENTRE OS DIREITOS HUMANOS E O


DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL ............................................................................. 371
Isabela Maria Marques Thebaldi
1 A NECESSÁRIA INTERFACE ENTRE OS DIREITOS HUMANOS E AMBIENTAIS ..................... 372
2 A CRISE AMBIENTAL ............................................................................................................................ 373
3 O PAPEL DO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL ...................................................................... 374
CONSIDERAÇÕES FINAIS ...................................................................................................................... 380

DERECHO COLECTIVO AL CONOCIMIENTO TRADICIONAL DE COMUNIDADES


INDÍGENAS Y DE COMUNIDADES LOCALES: DIVISIÓN EQUITATIVA Y JUSTA DE
LOS BENEFICIOS .............................................................................................................. 382
Sergio Peña Neira
INTRODUCCIÓN ....................................................................................................................................... 382

INDÍGENAS ................................................................................................................................................. 383


LA PROTECCIÓN INTERNACIONAL Y SU PROYECCIÓN ................................................................ 384
EL CASO CHILENO ................................................................................................................................... 387

DIREITOS HUMANOS E POLÍTICAS SOCIAIS PÚBLICAS NA ÓTICA DO DOCENTE DO


CURSO DE GRADUAÇÃO EM DIREITO: UM ESTUDO DE CASO.................................. 396
Milena Zampieri Sellmann
Paulo Sérgio Araújo Tavares
INTRODUÇÃO ........................................................................................................................................... 396
MÉTODO .................................................................................................................................................... 396
DESENVOLVIMENTO ............................................................................................................................... 397
CONSIDERAÇÕES FINAIS ....................................................................................................................... 414

EL ENFRENTAMIENTO A LA VIOLENCIA CONTRA LA MUJER COMO UNA FORMA


DE GARANTÍA DE LOS DERECHOS HUMANOS Y FUNDAMENTALES ........................ 417
9
Ilana Driele Mendes da Cunha Lima
INTRODUCCIÓN ....................................................................................................................................... 417
1 ESTADÍSTICAS DE VIOLENCIA CONTRA LA MUJER EN BRASIL Y ESPAÑA ........................... 419
2 ASPECTOS CONSTITUCIONALES EN EL ENFRENTAMIENTO A LA VIOLENCIA CONTRA LA
MUJER EN BRASIL Y EN ESPAÑA .......................................................................................................... 423
3 APUNTES DE ESPECIALISTAS ............................................................................................................ 426
4 CONSIDERACIONES FINALES ............................................................................................................ 428
5 ANEXOS .................................................................................................................................................... 429

EXECUÇÃO PROVISÓRIA DA PENA E POSSÍVEL LIMITE DA INTERPRETAÇÃO


CONSTITUCIONAL ............................................................................................................ 437
Alexandro Conceição dos Santos
INTRODUÇÃO ............................................................................................................................................ 437
ESTADO E PENA: CONSIDERAÇÕES GERAIS .................................................................................... 438
DEVIDO PROCESSO LEGAL, DIREITO DE PUNIR E EXECUÇÃO DA PENA ................................ 439
EXECUÇÃO PROVISÓRIA E PRINCÍPIO DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA ................................ 441
POSICIONAMENTOS FAVORÁVEIS À DECISÃO DO SUPREMO ................................................... 443
POSICIONAMENTOS CONTRÁRIOS À DECISÃO DO SUPREMO .................................................. 444
CONCLUSÃO .............................................................................................................................................. 448

CIDADANIA E DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA: COMO VALORES FUNDAMENTAIS


PARA O COMBATE À INTOLERÂNCIA À LUZ DOS DIREITOS INTERNACIONAL,
BRASILEIRO E CHILENO. ................................................................................................. 452
Jaime Meira do Nascimento Junior
Gabriel Alves da Silva Júnior
INTRODUÇÃO ............................................................................................................................................ 452
1.EVOLUÇÃO HISTÓRICA DOS DIREITOS HUMANOS .................................................................... 454
2. CIDADANIA E INTOLERÂNCIA .......................................................................................................... 458
4.CONCLUSÃO ........................................................................................................................................... 464

EL DESARROLLO SOSTENIBLE EN EL ENTRECRUZAMIENTO ENTRE EL DERECHO


AL MEDIO AMBIENTE Y EL DERECHO AL DESARROLLO ........................................... 468
Gonzalo Aguilar Cavallo
INTRODUCCIÓN .......................................................................................................................................468
1. DESARROLLO SOSTENIBLE ...............................................................................................................470
2. DESARROLLO Y DERECHOS HUMANOS ........................................................................................ 476
CONCLUSIÓN ........................................................................................................................................... 490

10
SEQUESTRO INTERNACIONAL: UMA ANÁLISE NO CONTEXTO BRASILEIRO.......... 491
Icaro Reinaldo Teixeira
INTRODUÇÃO ............................................................................................................................................ 491
1. A PROBLEMÁTICA DO SEQUESTRO INTERNACIONAL NO BRASIL ........................................ 492
2. CONVENÇÃO DE HAIA DE 1980 ........................................................................................................ 493
3. OUTRAS CONVENÇÕES INTERNACIONAIS QUE VISAM PROTEÇÃO DA CRIANÇA ...........495
4. ASSENTO CONSTITUCIONAL BRASILEIRO .................................................................................. 496
5. ATUAÇÕES E PROCEDIMENTOS CONVENÇÃO DE HAIA 1980 ............................................ 498
6. PROCESSOS JUDICIAIS ....................................................................................................................... 501
7. ALIENAÇÃO PARENTAL ..................................................................................................................... 502
CONCLUSÃO ............................................................................................................................................. 504

O PRINCÍPIO DA VEDAÇÃO AO RETROCESSO EM MATÉRIA AMBIENTAL COMO


REFLEXO DA PROTEÇÃO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA .............................. 507
Jaime Meira do Nascimento Junior
Daisy Rafaela da Silva
1. MEIO AMBIENTE: ASPECTOS JURÍDICOS .................................................................................... 508
2. A PROPOSTA DE EMENDA CONSTITUCIONAL 65/2012 (PEC 65/2012) ............................... 513
3. ANÁLISE .................................................................................................................................................. 515
CONCLUSÃO .............................................................................................................................................. 517

O ENSINO JURÍDICO E DIREITOS HUMANOS ............................................................... 521


Jaqueline Rodrigues
INTRODUÇÃO ............................................................................................................................................ 522
2.1 O RUMO ATUAL DO ENSINO JURÍDICO: PROBLEMATIZANDO O EXCESSO DE
RACIONALISMO E DA TÉCNICA ...........................................................................................................526
2.2 O PENSAR COMPLEXO E TRANSDISCIPLINAR NA EDUCAÇÃO: EDUCAR PARA A
COMPREENSÃO HUMANA ..................................................................................................................... 531
2.3 A HUMANIDADE NO SAGRADO COMO TERCEIRO TERMO INCLUÍDO: A REALIDADE
QUE NOS UNE ........................................................................................................................................... 532

CONSTRUINDO CIDADES RESILIENTES: A EFETIVAÇÃO DE DIREITOS HUMANOS E


A REDUÇÃO DO RISCO DE DESASTRES NA REGIÃO METROPOLITANA DO VALE DO
PARAÍBA, SÃO PAULO, BRASIL. ...................................................................................... 539
João Carlos Valentim Veiga Junior
INTRODUÇÃO ............................................................................................................................................ 541
2 NAÇÕES UNIDAS E A REDUÇÃO DE RISCOS: UM BREVE ESCORÇO HISTÓRICO ............... 542

11
3 CONSTRUINDO CIDADES RESILIENTES ......................................................................................... 544
CONSIDERAÇÕES FINAIS ....................................................................................................................... 549

LA FUNCIÓN SOCIAL DEL TRABAJO Y PROTECCIÓN DE LOS TRABAJADORES ...... 553


Juan Carlos Fernández Hermosilla
LA FUNCIÓN SOCIAL DEL TRABAJO ................................................................................................... 553
PROTECCIÓN DE LOS TRABAJADORES .............................................................................................. 555

O DIREITO À ISENÇÃO DE IPVA AOS PROPRIETÁRIOS PORTADORES DE


DEFICIÊNCIA INAPTOS A DIRIGIR FACE AO PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA
HUMANA. .......................................................................................................................... 559
Milena Zampieri Sellmann
Paulo Sérgio Araújo Tavares
INTRODUÇÃO: ......................................................................................................................................... 560
1 O IMPOSTO SOBRE A PROPRIEDADE DE VEÍCULOS AUTOMOTORES (IPVA). ................... 561
2 ISENÇÃO TRIBUTÁRIA. ........................................................................................................................ 562
2.1 ISENÇÃO DE IPVA PARA PORTADORES DE DEFICIÊNCIA ....................................................... 564
3 PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. .................................................................... 566
CONCLUSÃO .............................................................................................................................................. 571

LA PRESENCIA DEL DISCURSO RELIGIOSO EN LOS ESPACIOS PÚBLICOS Y EN EL


ESTADO, ENTRE LO SECULAR Y LO NEUTRO DE HABERMAS Y TAYLOR ................. 574
José Marcos Miné Vanzella
Pablo Jiménez Serrano
INTRODUCCIÓN ....................................................................................................................................... 575
1 LA CUESTIÓN DEL ESTADO Y LA NEUTRALIDAD EN EL PENSAMIENTO DE TAYLOR ....... 576
2 LA CUESTIÓN DEL ESTADO EN EL PENSAMIENTO DE JÜRGEN HABERMAS ...................... 578

DEMOCRACIA LIBERAL ......................................................................................................................... 580


4 LA DIFERENCIA ENTRE LA RAZÓN EN LA TRADICIÓN RELIGIOSA Y LA RAZÓN SECULAR
....................................................................................................................................................................... 583
5 RELIGIOSIDAD VERSUS PATRIOTISMO COMO VALOR PRIMARIO: EL CASO DE CUBA .... 584
Conclusión ................................................................................................................................................... 590

DIREITOS E GARANTIAS PROCESSUAIS PENAIS: BREVES COMPARAÇÕES ENTRE AS


NORMAS INTERNAS BRASILEIRAS E A CONVENÇÃO AMERICANA SOBRE DIREITOS
HUMANOS ......................................................................................................................... 592
Priscila da Silva Aleixo
12
Aline Marques Marino
INTRODUÇÃO ............................................................................................................................................592
CONTEXTUALIZAÇÃO ............................................................................................................................. 594
SEMELHANÇAS .........................................................................................................................................595
DIFERENÇAS ............................................................................................................................................. 596
O PRINCÍPIO DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA ................................................................................ 597
ALGUMAS CONSIDERAÇÕES SOBRE A AUDIÊNCIA DE CUSTÓDIA ...........................................601
CONSIDERAÇÕES FINAIS ...................................................................................................................... 602

A UTILIZAÇÃO DE INSTRUMENTOS DE TUTELA COLETIVA PARA A EFETIVAÇÃO DE


POLÍTICAS PÚBLICAS EM PROL DOS DIREITOS E DAS GARANTIAS FUNDAMENTAIS
............................................................................................................................................ 604
Priscila da Silva Aleixo
Aline Marques Marino
INTRODUÇÃO ........................................................................................................................................... 604
BREVES CONSIDERAÇÕES CONCEITUAIS SOBRE OS DIREITOS TRANSINDIVIDUAIS ........ 605
AS POLÍTICAS PÚBLICAS E O PODER PÚBLICO ............................................................................. 606
AS POLÍTICAS PÚBLICAS E OS INSTRUMENTOS DE TUTELA COLETIVA ............................... 609
MANDADO DE SEGURANÇA COLETIVO............................................................................................ 609
AÇÃO CIVIL PÚBLICA ............................................................................................................................. 609
CONSIDERAÇÕES FINAIS .......................................................................................................................610

SISTEMA PRISIONAL BRASILEIRO: UMA VISÃO DA VIOLÊNCIA ................................ 613


Ivani Gardin
INTRODUÇÃO ............................................................................................................................................ 613
A INTERDISCIPLINARIDADE PARA UMA RELAÇÃO ENTRE A SOCIOLOGIA E O DIREITO
FRENTE A VIOLÊNCIA ............................................................................................................................. 613
FUNDAMENTOS TEÓRICOS DA VIOLÊNCIA SUBJETIVA, OBJETIVA E SIMBÓLICA ............... 614
FORMAS DE VIOLÊNCIA QUE PODEM SER IDENTIFICADAS NAS PRISÕES BRASILEIRAS .. 616
A VIOLÊNCIA INVISÍVEL NAS PRISOES ............................................................................................... 619
DIREITOS HUMANOS DIANTE DA VIOLÊNCIA NAS PRISÕES ..................................................... 620
CONSIDERAÇÕES FINAIS ....................................................................................................................... 623

13
ACESSO EM DESALINHO: O CASO DOS JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS DO ESTADO DO
RIO DE JANEIRO - O FUNDAMENTAL É A JUSTIÇA
1

Resumo:
A busca por meios processuais que efetivem a prestação jurisdicional célere encontra hoje, no
Brasil, entraves a assegurar a justiça da decisão, tendo em vista que os juizados especiais
cíveis, em especial, os do Estado do Rio de Janeiro, encontram-se assoberbados de demandas e
a solução posta para reorganizar a efetividade deste direito fundamental é a realização de
mutirões de conciliação. No entanto, a pesquisa se consolida na problemática de não ser a
política pública do Núcleo Permanente de Mediação e Conciliação o método mais seguro a
possibilitar este acesso à justiça. Os objetivos tramitam nos entraves a obter a prestação
jurisdicional; bem como identificar que o Poder Judiciário ao entregar uma decisão tardia está
a romper com esta garantia fundamental e avaliar os critérios que a dinâmica dos mutirões
possam oferecer como solução final ao conflito. A pesquisa é qualitativa pelo método
bibliográfico, com referencial teórico em Santos, Warat e Greco.
Palavras-chave: Direito fundamental. Acesso à justiça. Inovação institucional.
Abstract
The search for procedural means to effect a speedy judicial review in Brazil today is impeded
in ensuring the fairness of the decision, since special civil courts, especially those in the State
of Rio de Janeiro, are overwhelmed by Demands and the solution posed to reorganize the
effectiveness of this fundamental right is the accomplishment of conciliation efforts. However,
the research consolidates in the problematic of not being the public policy of the Permanent
Nucleus of Mediation and Conciliation the more secure method to allow this access to justice.
The objectives deal with the obstacles to obtaining legal services; As well as to identify that the
Judiciary in delivering a late decision is breaking with this fundamental guarantee and
evaluating the criteria that the dynamics of the mutirões can offer as a final solution to the
conflict. The research is qualitative by the bibliographic method, with theoretical reference in
Santos, Warat and Greco.

1
Bolsista CAPES. Doutorando vinculado ao Programa de Pós-Graduação em Sociologia e Direito da Universidade
Federal Fluminense. Mestre em Ciências Jurídicas e Sociais pelo Programa de Pós-Graduação em Sociologia e
Direito da Universidade Federal Fluminense. Especialista em Práticas Processuais Processo Civil, Processo Penal
e Processo do Trabalho pelo Centro Universitário São Camilo. Professor na Faculdade Metropolitana São Carlos
Bom Jesus do Itabapoana e na Multivix Unidade Cachoeiro de Itapemirim-ES. Endereço Eletrônico:
taua_verdan2@hotmail.com. Acesso currículo Plataforma Lattes http://lattes.cnpq.br/8802878793841195
2
Mestre em Direito Público e Evolução Social pela Universidade Estácio de Sá. Bacharel em Ciências Jurídicas e
Ciências Sociais pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. Professora no Centro Universitário Augusto Motta.
Endereço eletronico: lucianemara@uol.com.br . Acesso currículo Plataforma Lattes:
http://lattes.cnpq.br/7142619530244859

14
Keywords: Fundamental Right. Access to justice. Institutional innovation.
1 INTRODUÇÃO
Com o advento da conscientização das sociedades acerca de seus direitos, garantias e
liberdades, o Poder Judiciário deparou-se com indivíduos mais ativos no que se refere a busca
pelos direitos e os meios processuais para constituí-los. Todavia, ante este movimento, não
houve a adequada preparação do campo judiciário a recepcionar o volume de demandas,
decorrente de litígios de baixa complexidade, advindos das dinâmicas de conscientização da
população dos direitos conquistados, com isto denotando desigualdade no acesso à justiça. Em
uma tentativa de suprimir os efeitos desta morosidade, para atender àquelas ações, criou-se o
juizado especial cível como inovação que surtiu resultados por algum tempo. No entanto, a
partir do último quinquênio, com o constante crescimento do número de demandas
pendentes, firmando-se o entendimento de que são aquelas sem a entrega da prestação
jurisdicional ou o bem da vida pretendido, retomando a posição anterior, onde o acesso é para
aqueles que podem esperar o lapso temporal que vier a transcorrer, que pode apontar a
violação de direito fundamental.
É possível indicar que o grupo mais afetado pelo funcionamento precário dos juizados
especiais cíveis é a camada de menor poder aquisitivo, uma vez que a inexigibilidade de
recolhimento das custas processuais atrai aqueles que não possuem recursos financeiros para
arcar com o custo de uma demanda judicial que litigam em face de serviços públicos e
instituições financeiras. A problemática desta pesquisa atravessa o âmbito da legislação, vez
que pretende diagnosticar a necessidade de uma reforma na gestão dos tribunais, no que diz
respeito à estrutura dos juizados especiais cíveis, como meio de reduzir suas taxas de
congestionamento, delimitado o estudo ao Estado do Rio de Janeiro, uma vez que o volume de
demandas impede a circulação dos processos no âmbito dos cartórios e serventias.
Com isto, o objetivo geral é identificar as causas que culminam na morosidade nas demandas
julgadas pelos juizados especiais cíveis. Pontuando especificamente em observar as causas que
podem contribuir para a demora na obtenção da prestação jurisdicional; identificar a demora
como violação ao direito fundamental de acesso ao judiciário e avaliar a eficiência dos
mutirões de conciliação organizados para reduzir o tempo de duração entre a distribuição do
processo e o seu término, buscando maior celeridade no termo do litígio, através de método
alternativo de resolução de conflito.
A pesquisa será bibliográfica, tomando como norte Boaventura de Sousa Santos e Luis Alberto
Warat para analisar a organização do Poder Judiciário, o suporte estrutural e de recursos
humanos e as possibilidades de reforma para comportar um quantitativo expressivo de
demandas sem que se tornem indefinidas quanto à sua solução, através da avaliação das
estatísticas apresentadas pelo Tribunal fluminense do acervo de processos pendentes e dos
resultados dos mutirões de conciliação realizados.

15
2 A ESTRUTURA DO PROJETO CONCILIAÇÃO PRÉ PROCESSUAL E SUA CONCEPÇÃO
TEÓRICA COMO DIREITO FUNDAMENTAL
O acesso à prestação jurisdicional, com a sua elevação a condição de direito fundamental na
Constituição de 1988, tem sido recorrentemente objeto de estudo em virtude da larga distância
entre a sua eficiência e a situação presentada nos tribunais brasileiros. Importante recordar
que a grande parte das reformas processuais do último quarto do século passado não
conseguiu conferir ao Poder Judiciário uma zona de conforto para decidir e solucionar
conflitos entre os indivíduos, num prazo mínimo, suficiente a satisfazer aquela necessidade do
indivíduo alcançar o bem da vida no menor lapso temporal. Sob a chancela de ter sido o
grande responsável pelo assoberbamento dos tribunais. A demanda sob a pecha de ser de
massa, passa a ser um ponto fora da curva, que aqui cabe nominar como a falta de condições
igualitárias para o seu acesso. É provável que Piero Calamandrei (2004, p. 27), como já
pronunciado em um ciclo de palestras conferidas na Universidade de Pádua, já tivesse a
certeza do direito e a igualdade dos cidadãos perante a lei, antes eram conquistas preciosas,
hoje, estão cada vez mais em perigo em face ao conjunto falível do campo judiciário.
Julgar que a demanda de massa é a culpada pela demora na entrega da prestação jurisdicional
é desconsiderar que no curso da sociedade, o alargamento das práticas comerciais e
reconhecimento de direito coletivos, além de direitos novos oriundos das relações sociais. É
importante identificar que no conceito de acesso à justiça, compreendido como garantia de
direito formal do indivíduo, engloba obter do Estado os meios para recompor a violação deles
direitos. Com o desenvolvimento da sociedade, a partir do século passado, houve a ampliação
dos direitos já mencionados.
Possibilitar e facilitar o acesso à justiça foi e tem sido uma preocupação e uma construção
constante nas sociedades modernas, principalmente após o reconhecimento da sua posição de
direito fundamental e de direitos humanos. Objeto de estudo de Mauro Cappelletti e Bryant
Garth, do acesso à justiça se extraem três vertentes para alcance deste acesso com igualdade de
armas: o acesso pela coletivização de direitos; a construção de métodos alternativos para
decidir causas judiciais e a instrumentalização do acesso a quem não possua condições
técnicas e financeiras para a litigância.
A pesquisa busca, nos mecanismos alternativos, as vantagens de conciliação, evidenciando
seus elaboradores, dois eixos fundamentais o custo do litígio e a sobrecarga dos tribunais.
Apontando que a satisfação das partes envolvidas se operacionaliza quando a parte pode
alcançar celeremente o resultado da demanda (CAPPELLETTI, GARTH, 1988, p. 84). Mais uma
vez, os pesquisadores apontam que a essência da conciliação é a redução do congestionamento
do judiciário, carece de certificar que os resultados efetivamente são de êxito, apontando
assim que a conciliação não foi instituída para ser a táboa de salvação para o problema do
excesso de processos, mas sim um caminho para a entrega célere da resposta por iniciativa dos
próprios agentes sociais.

16
Boaventura de Souza Santos apontou diversas saídas para a sobrecarga dos tribunais, desde
que haja relação direta com o tempo nos processos. Para o autor, além de ser variável em cada
país, deve ainda causar naquele que busca o tribunal para resolver seu problema o sentimento
de desconfiança na eficácia da justiça, bem como tentativas que passam pela informalização da
justiça, reapetrechamento dos tribunais com recursos humanos e infraestruturas,
automatização, novas tecnologias de comunicação e informação, criação de tribunais especiais
para a pequena litigação de massa, reformas processuais (2007, 26).
Neste ponto, cumpre apontar que a morosidade é prejudicial não só para as partes
interessadas, como também para a qualidade no funcionamento dos tribunais e, por
consequência, não é cabal aceitar que em nome de eliminar a sobrecarga de trabalho, o
excesso de burocracia, o positivismo e o legalismo, sejam adotadas condutas que vão gerar
efeitos nefastos ao jurisdicionado e que não traduzam em justiça cidadã, tão somente terá uma
justiça mais rápida. É plausível considerar que a conciliação possa assumir, como método ágil,
informal e célere, a posição de meio de solução de litígio capaz de resolver um número cada
vez maior de demandas, podendo haver ainda, a redução de custos com a sua realização
virtual, hipóteses que serão avaliadas no item que se segue.
3 POR UM ACESSO INFORMATIZADO E EFICAZ
Manter o exercício da satisfação da pretensão a ser recebido do Estado através de uma decisão
capaz de reparar a violação ao seu direito é uma prestação bastante complexa para o indivíduo
que recorre à jurisdição com esta finalidade. Seja qualitativa, seja quantitativa, o que
compromete ao recepcionar o volume de ações às novas exigências constitucionais e
processuais o resultado prático, acarretando para o Poder Judiciário, conseqüências danosas,
afetando a funcionalidade da máquina judiciária, sob pena de sofrer mudanças
desintegradoras. Esta posição é assumida por Aurélio Wander Bastos (2001, p. 122) ao fazer a
abordagem da estrutura interna da Administração da Justiça, sintetizando que cabe a máquina
administrativa do Judiciário efetuar levantamentos, promover aprendizados e adaptar aos
novos padrões de comportamento, alterando aqueles que interfiram na sua avaria.
Assim, o Estado necessariamente necessita identificar dinâmicas que cumpram esta garantia
fundamental, o Poder Judiciário, por seu turno, vem recebendo um volume cada vez maior de
demandas. E possível apontar que o Estado confere a garantia processual, o campo judiciário
efetua o recebimento e faz o regular desenvolvimento destas ações, mesmo sem possuir em
sua estrutura maios de atender a sobrecarga de processos distribuídos e pendentes o
tratamento adequado.
Não é forçoso assegurar que dentre os diversos movimentos havidos, a reforma da legislação
processual tem sido a preocupação mais pontual, uma vez que o cidadão pretende receber de
forma proporcional a razoável duração do processo espalhada como obter o objeto do processo
no menor tempo possível. Não obstante seu conceito aberto, é a partir da jurisprudência da
Corte Europeia de Direitos Humanos, que se encontra os critérios identificadores do que se

17
pode chamar de razoável: a complexidade da causa; o comportamento das partes e o
comportamento do juiz na condução do processo3, são os principais aspectos do que se é a
razoabilidade de tempo para processar, julgar e satisfazer o indivíduo.
Como constituir um método que, além de tornar mais célere e mais eficiente, não deixará de
preservar a proteção constitucional das garantias processuais fundamentais. É oportuno
apontar que deve ainda haver o fomento da participatividade dos agentes envolvidos no
processo, prática amplamente divulgada na comunidade globalizada como uma necessidade a
ser concretizada como signo da democracia. Humberto Dalla Bernardina de Pinho (2015, p.57)
sinaliza que tanto o direito material quanto o direito processual não podem deixar de atender
aos anseios sociais, sem perder sua essência, pois o acesso à justiça está compreendido na
ordem civil constitucional com o fim de assegurar a devida proteção as grandes carências e
necessidades da sociedade de massa. Então, a colaboração das partes no resultado do processo
deve ser vista como um princípio processual e como componente da participação democrática
do indivíduo no conflito social.
Para que se possa construir um método que confira aos cidadãos a eficiência e a solução mais
rápida para o conflito, é importante assegurar que este acesso atenderá à ordem jurídica justa.
Paulo Cesar Pinheiro Carneiro (2007, p. 58), em pesquisa institucional realizada pela
Universidade do Estado do Rio de Janeiro e a Universidade Estácio de Sá, verbalizou que
devem ser construídas dinâmicas que protejam os quatro princípios que devem estar contidos
no desenho institucional da decisão proferida pelo campo judiciário: a acessabilidade, a
operosidade, a utilidade e a proporcionalidade. É necessário compreender a acessibilidade
como a etapa que assegure a qualquer cidadão o instrumento eficaz para estar em juízo e ainda
que opte por outro que não seja excluída a prestação jurisdicional. Por operosidade, a atuação
ética daqueles que atuam no campo judiciário; a utilidade com o fim de promover a entrega do
bem da vida almejado de forma rápida sem sacrifícios exorbitantes ao vencido e a
proporcionalidade que privilegia o interesse mais precioso e que satisfaça a uma gama maior
de pessoas.
Promover a conciliação é conceber que adotar este método pode corresponder a atingir a
satisfação do indivíduo por instrumentos e meios processuais corretos que priorizem a atitude
conciliatória antes da intervenção estatal no conflito social. Todavia, uma cautela deve ser
perseguida é quanto a possibilidade de utilizar o instituto com o fim de transformá-lo em um
pretexto para retardar o andamento ou a solução, devendo ser seguida a risca a orientação de
Leonardo Greco (2015, p.24):
O uso dos meios alternativos é desejável, mas deve ter como pano de fundo uma justiça estatal
eficiente e confiável, para que a escolha dos cidadãos entre uma ou outra via se dê em busca do
meio que mais bem tutele os interesses em jogo e para que aquele que optarem pelos

3
Corte Europeia de Direitos Humanos. Caso Neumeister VS Áustria, 1968. MARINONI, Luiz Guilherme. Arenhart
Sergio Cruz. Mitidiero, Daniel. O novo processo civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015, 172.

18
primeiros se sintam seguros de que a justiça estatal estará sempre de portas abertas para coibir
os abusos ou erros manifestos que ocorrerem na sua atuação.
A legislação processual civil brasileira introduziu mudanças em março de 2016, através da
vigência da Lei Federal n. 13.105, a dinâmica da conciliação pré-processual com o objetivo de
reduzir o tempo de tramitação do processo, a partir da inserção dos institutos como fases
consoante o artigo 334. Segundo o artigo, a conciliação será vigida pelos princípios da
independência, da imparcialidade, da autonomia da vontade, da confidencialidade, da
oralidade, da informalidade e da decisão informada. É sustentável apontar que em que pese
todo debate acadêmico, ao lançar a autonomia de vontade das partes, como parte do fenômeno
processual democrático, está parcialmente comprometida, a partir do momento em que a eles,
em caso de absenteísmo, é considerado ato atentatório à dignidade da justiça sancionado com
multa de ate dois por cento da vantagem econômica pretendida ou do valor da causa. Não
obstante, compelir o indivíduo a tomar parte de uma etapa processual que deveria ser
facultativo e que passa a ser compulsória por força de lei, foge ao bom senso.
Desta forma, se o objetivo da conciliação é obter como resultado a ponderação do bem jurídico
pretendido pelos interessados, deve-se considerar que não se pode imputar o encargo sob pena
de se tornar apenas uma fase processual, que culminará na procrastinação do processo. Não
obstante a esta evidência aqui apontada, o Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro
introduziu o Centro Permanente de Conciliação dos Juizados Especiais Cíveis, tópico do item
que se segue.
4 ASPECTOS ESTRUTURAIS DOS JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS E OS MUTIRÕES DE
CONCILIAÇÃO
No Brasil, as relações advindas do consumo em massa passaram a ser regradas pelo Código de
Defesa do Consumidor, instrumento de vanguarda e inspirador de outros marcos legislativos, a
partir de 1990, veio a introduzir conceitos como direitos difusos e coletivos, inversão do ônus
da prova para a parte hipossuficiente, proteção efetiva ao consumidor e criação de juizados
especiais de pequenas causa de varas especializadas para a solução de litígios de consumo.
Desta forma, o consumidor, como elo mais frágil da cadeia de consumo, passou a dispor do
acesso à justiça através dos juizados especiais de pequenas causas.
Estes juizados que haviam sido criados pela Lei Federal 7.244, de 7 de novembro de 1984,
vieram a ser substituídos, pela Lei Federal n. 9.099 de 26 de setembro de 1995, pelos juizados
especiais cíveis. A hipótese trazida pela pesquisa realizada por Paulo Cesar Pinheiro Carneiro
de acesso à justiça através dos juizados especiais cíveis, onde o indivíduo passou a ter a sua
disposição, meios de credibilidade numa justiça mais próxima do homem mediano, ainda que
houvesse necessidades de introduzir mudanças destinadas ao alargamento desta
acessibilidade.
Não deve deixar de considerar que garantir o acesso à justiça é essencialmente principiológico
e que se trata de meio para concretizar direitos fundamentais em seara processual. Quase

19
vinte anos após a sua criação, os juizados especiais cíveis sofrem com o número de ações cada
vez mais volumosos em relação a movimentação processual e cartorária. Para fazer uma
reflexão acerca do quantitativo de processos distribuídos no Juizado Especial Cível do
Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, nos últimos doze meses, foram,
aproximadamente, quinhentos mil processos. Se por uma via está o acesso à prestação
jurisdicional mais inserido na cultura do brasileiro, tornado possível com a estrutura
simplificada do rito dos juizados especiais cíveis.
Os números despontam que o maior litigante é o Estado ou seus delegatários em quaisquer
pólos das ações. Tornando assim, impactante a realidade traduzida em números ante a falsa
ideia de litigantes compulsivos ou que existe um efeito cascata que atravanca a marcha
processual e de desenvolvimento regular das ações como é trazido para conhecimento da
comunidade em geral Vítimas do próprio sucesso, os juizados especiais levam hoje mais tempo
para julgar do que quando foram criados. Só os juizados especiais cíveis receberam, em 2009,
mais de 525 mil processos.
Alguns juízes realizaram mais de 3 mil audiências no período e, mesmo assim, os juizados
julgaram mais processos do que receberam, com mais de 550 mil sentenças. Muitas discussões
são repetitivas que não retira a sua importância frente ao cidadão. Para lidar com isso, o juiz
titular do 4o Juizado Especial Cível do Rio decidiu de uma só vez 163 ações, apresentadas por
815 garis contra a Rede Bandeirantes de TV, devido a uma declaração de um apresentador da
emissora que foi ao ar inadvertidamente. A estratégica tem sido adotada de igual forma por
outros juízes, a fim de dar contra da quantidade de processo, porém este ainda não é o meio
mais eficaz para resolver o volume de ações já distribuídas. E não só pelos julgadores, já que
ações com petições idênticas também chegam ao Judiciário tanto em primeiro como em
segunda instância. Em matéria de consumo, há sempre o risco do efeito cascata, oriundo de
decisões que reconhecem direitos de consumidores lesados de fato geram uma demanda, que,
algumas vezes, não decorre de dano efetivo.
Os juizados especiais cíveis outrora pensados para uma justiça mais célere, hoje, não têm
condições de serem tão otimizados, já que pensar o ingresso anual de quase meio milhão de
ações distribuídas para pouco mais de 110 juizados especiais cíveis instalados em todo o Estado
do Rio de Janeiro. A página eletrônica do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro
aponta que no período de um ano, entre outubro de 2013 a setembro de 2014, foram
distribuídas em todo Estado 479.086 (quatrocentos e setenta e nove mil e oitenta e seis) ações
nos Juizados Especiais Cíveis.
Extrai-se da página do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, o levantamento do
quantitativo feito em 2008 e mantido até o ano de 2014, instalados Juizados Especiais Cíveis da
Capital: 27; Juizados Especiais Criminais da Capital: 14; Juizados Especiais Cíveis do Interior:
38; Juizados Especiais Da Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher e Especiais
Criminais do Interior: 11; Juizados Especiais Adjuntos nas Comarcas de 1a e 2a entrância, num
total de Adjuntos Cíveis: 55 e Adjuntos Criminais: 39.
20
Por este mero demonstrativo já aponta que a hipótese trazida no bojo do Projeto de Florença
se desviou do seu objetivo aqui nesta Unidade Federativa, De acordo com o relatório do
Projeto de Florença, indica-se que os problemas decorrentes das sociedades contemporâneas
precisam ser superados através de uma ruptura nas instituições jurídicas para tornar efetivos
os direitos do cidadão comum. Esta transformação necessita ser pautada em mudanças no
estudo e ensino do processo civil como mecanismo de atingir o acesso efetivo à justiça, através
técnicas destinadas a servir funções sociais que o sistema judiciário ainda não está inquinado a
superar. Com este relatório encaminhou-se diretrizes adotadas no sentido de garantir
igualdade de armas as partes antagônicas, enfatiza-se neste artigo as causas que envolvem
somas relativamente pequenas, capazes de serem submetidas aos juizados especiais cíveis.
O problema diagnosticado pelo acúmulo de processos nos juizados é reconhecido pelo próprio
Poder Judiciário fluminense. Verifica-se no anuário da justiça que alguns juízes realizaram
mais de três mil audiências no ano de 2009, vindo a julgar mais processos do que receberam.
Aponta-se que há demandas repetitivas, o que tem sido feito é também julgar de forma
repetitiva para que possa dar conta do fluxo de processos, como se este fosse o caminho ideal.
Noutro giro, a solução aferida pelo Tribunal para tornar ágil o trâmite processual é a criação
de faixas reversíveis, a exemplo do que se dá na engenharia de trânsito, com a implementação
de mutirões de serventuários, para minimizar o quantitativo de processos paralisados pelo
reduzido número de servidores. De acordo com os dados obtidos do Judiciário Fluminense em
números, no que tange a pessoal, o Tribunal Fluminense dispõe de 31 magistrados em Turmas
Recursais e 96 em Juizados Especiais, havendo 26.978 servidores para atender a todo complexo
do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, sem menção ao número de servidores
lotados nos Juizados Especiais Cíveis, mas indica-se que não é um número suficiente a
satisfazer a rotina dos cartórios.
Um grupo de auxiliares e juízes se consolidam em deixar de fazer o atendimento de partes,
estagiários e advogados em um dia específico da semana para agilizar as atividades internas.
Em outro meio, a falta de serventuários é minimizada pela contratação de estagiários,
estudantes dos cursos jurídicos com o desvio da função de aprendizado, criando assim a
desvirtuação da função social do acadêmico em fase de desenvolvimento profissional. A
solução para o volume de demandas tem sido pensada pelo Poder Judiciário com a
implementação de termos de cooperação técnica e mutirões de conciliação onde todos estão
determinados a apagar pequenos focos do incêndio como meio de suprimir do volume de
demandas de empresas de telefonia e bancos no âmbito dos juizados especiais cíveis.
Esta posição foi pautada a partir dos dados colhidos de Primeira Instância que informa ter
sido, a partir de abril do corrente ano, assinado pela nova administração do Tribunal
Fluminense dois termos de cooperação técnica, com o objetivo de dar maior celeridade e
efetividade aos trâmites processuais na Justiça fluminense: Juiz na Comarca e Citação
Eletrônica. De acordo com o editorial, em se tratando de condutas adotadas no âmbito dos
Juizados Especiais Cíveis, são organizados pelo Centro Permanente de Conciliação mutirões,
21
que apresentaram índices satisfatórios. Num deles atendeu-se 274 processos de quatro
empresas, com 89,8% dos casos chegaram a um acordo. Em outro mutirão realizado com
bancos e empresas de telefonia, envolvendo o quantitativo de 386 processos, o índice de 84%
de acordos.
Noutro viés, pergunta que não quer calar, se a norma jurídica já prevê a fiscalização de
serviços do Estado pelo Estado, há paradigma para realizar sanções pelo descumprimento das
condutas a serem adotadas na prestação do serviço e refere à lei a hipótese de condenação
pecuniária, sob a forma de meio de coerção, aplicá-las não seria mais eficiente da parte do
Poder Executivo do que suportar o Poder Judiciário um manancial de ações de consumo de
massa, onde é visível a falha na prestação de serviços.
No meio das já pautadas características do acesso à justiça, percebe-se claramente que não é só
o consumidor que sofre com os transtornos decorrentes do serviço mal feito ou mal prestado,
mas também o Estado com a ausência no exercício do múnus, que tornam uma ação para
pacificação de um conflito social simples num tormento para a parte que menos recursos
possui, a exemplo do homem comum.
Apesar das aparências nefastas, os juizados especiais cíveis ainda são meios eficazes de
atendimento da parcela da sociedade que procura o Estado no intuito de dirimir um conflito
de simples conflituosidade. Com uma estrutura procedimental mais singularizada poderá
atingir o resultado pretendido num espaço de tempo razoável, mas ainda não tem a capacidade
de trazer dentro do mesmo ano o resultado prático pretendido para as partes envolvidas.
Esta posição é assumida a partir dos dados obtidos na estatística realizada pelo
DGJUR/DEIGE/DICOL, departamentos do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, em
janeiro de 2011, perceptível através dos índices apresentados, onde há remanescente no acervo
da primeira instância dos juizados especiais cíveis, pois no ano de 2009, foram distribuídos
501.875 processos e julgados 551.847; já no ano de 2010, os números apontam para 456.422
processos distribuídos e 580.591 julgados. Desta forma, ainda há um déficit, pois neste mesmo
ano, foram distribuídos 528.543 com julgamento de 631.070. Neste aspecto o que importa
afirmar é que o acervo ainda não está contemplados, mas que o problema precisa ser
enfrentado sob pena de trazer uma desvirtuação dos juizados especiais cíveis.
É fato reconhecido que os juizados especiais levam mais tempo para julgar do que quando
foram instituídos, o que demanda paciência e perseverança e não são compatíveis com a
duração razoável do processo, direito fundamental garantido pela Constituição da República.
Aqui importante trazer a consideração o posicionamento de Aurélio Wander Bastos a despeito
da importância do Poder Judiciário no contexto social e sua necessidade de abertura às novas
violações que reclamam a proteção legal:

limites e programas as suas reformulações, tendo em vista as suas tradicionais competências,


os efeitos residuais dos fatos sociais novos, os fatos consuetudinários que necessitem de

22
proteção legal, as próprias relações sociais juridicamente desprezadas, o envolvimento judicial
nos conflitos em processo de complexificação e, especialmente, o seu papel nos conflitos de

O Conselho Nacional de Justiça promove todo o ano o dia nacional de conciliação onde todos
os Tribunais do país se mobilizam para ocorrência de audiência visando à solução de conflitos
levados a eles, tal iniciativa ocorre desde 2006 e vem todos os anos ultrapassando a marca de
40% de acordos efetuados, são processos que normalmente levariam anos para sua solução,
entretanto com a conciliação e os mutirões faz com que o cenário mude. Vê-se, por este
prisma que, unindo a forma alternativa de solução de conflitos com a aplicação do mesmo, o
cidadão e a justiça brasileira ganham em muito,com a solução do problema do cidadão, porém
para desobstruir os tribunais, atualmente com pilhas e pilhas de processos a serem julgados, é
necessária a adoção de políticas públicas destinadas a diminuir o impacto do assoberbamento
da máquina judiciária.
5 CONCLUSÃO
As contingências para a obtenção de uma prestação jurisdicional efetiva cruzam fronteiras que
demandam muito mais que recursos materiais e estruturais para a sua concretização, motivo
determinante para que o Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro instalasse métodos de
solução alternativa de conflitos, a realidade os juizados especiais cíveis, com a finalidade de
entregar uma prestação jurisdicional efetiva com o custo de recursos menos elevado possível.
Buscar a diminuição dos obstáculos ao acesso à justiça é um dos fatores que levaram o
Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro a implementar o Centro Permanente de
Conciliação que, através do Projeto de Conciliação Pré Processual, busca melhorar a redução
de custos, facilitando ainda aqueles litigantes de baixo nível econômico e educacional, que
também prejudica os autores individuais, já que, por este canal, outras formas de assistência
jurídica são viabilizadas aos jurisdicionados.
Se pensar o debate da Justiça como meio de pacificação social, demarcar o termo é considerar
que se tratada de uma virtude de dar a cada um, o direito que lhe pertence, inserindo nesta
perspectiva de entregar a Justiça, com a redução não só de custos ambientais, mas também de
acessibilidade aos indivíduos ao desenvolvimento da prestação.
O fenômeno dos mutirões de conciliação busca reduzir o volume de demandas que são
distribuídas em face de fornecedores de serviços públicos e instituições financeiras e
bancárias. Num afã de obter um acordo como meio de extinguir o processo com a
homologação da conciliação realizada. Tem-se um outra via, a frustração do indivíduo com a
realização de grandes pregões, os direitos são mitigados face a necessidade de encurtamento
do tempo para realizar a composição, assim como a extinção do processo caso a parte autora
não compareça por uma intimação que não foi recebida a tempo. É o dilema da quantificação
das decisões em face da qualidade da prestação judiciária. É possível represar a frustração da
23
da pesquisa.
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24
AFIRMAÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS PELO VIÉS TRABALHISTA:
ESSENCIALIDADE DO PROTECIONISMO JURÍDICO-LABORAL EM CRISES
ECONÔMICAS.
4

RESUMO
O ponto referencial desse artigo é o caráter protecionista dos Direitos Trabalhistas como
instrumento indispensável de proteção e ratificação dos Direitos Humanos frente as crises
econômicas. Tal problema de pesquisa revela-se necessário à medida em que os reflexos
negativos dos impactos econômicos tornam-se justificativa política para medidas que
suprimem Direitos trabalhistas e, consequentemente, Direitos Humanos à exemplo, o pacote
de medidas de austeridade na Grécia e as reformas trabalhista e previdenciária em voga no
Brasil. Para tanto, a pesquisa decorre através de análise doutrinária, bem como pontuais
considerações empíricas, estruturando-se na investigação de três pilares interligados entre si,
quais sejam, uma breve abordagem histórica do Direito do Trabalho como força sócio-política
antagônica aos abusos do sistema capitalista liberal, a contextualização desses direitos diante
das transformações sociais e econômicas advindas da revolução técnica-científica e a forma
como os Direitos trabalhistas não apenas englobam como também ratificam os Direitos
Humanos ao fazerem prevalecer seu caráter protecionista sobre as crises econômicas e seus
reflexos.
PALAVRAS-CHAVE: Direito do Trabalho; Direitos Humanos; Crises econômicas; Antagonismo
jurídico-laboral.
RESUMEN
El punto de referencia de este artículo es el carácter proteccionista de los derechos laborales
como un instrumento indispensable de la ratificación y la protección de los Derechos
Humanos en tempos de crisis económicas. Este problema de investigación es necessário en la
medida en que los efectos negativos de los impactos económicos se convierten en justificación
política de medidas que suprimen los derechos laborales y, por tanto, los Derechos Humanos
por ejemplo, el paquete de medidas de austeridad en Grecia y las reformas laborales y de
seguridade social en boga en Brasil. Para tanto, la investigación se produce através de análisis
de doctrinas, así como consideraciones empíricas especificas, estructurando en la

4
Bacharelanda em Direito do Centro Universitário Salesiano de São Paulo (UNISAL-Lorena). Estagiária do Tribunal
de Justiça de São Paulo (TJ/SP) pela comarca de Guaratinguetá/SP.
5
Mestre em Direitos sociais, econômicos e culturais pelo Centro Universitário Salesiano de São Paulo (UNISAL-
Lorena). Coordenador da Graduação em Direito e do Ensino à Distância UNISAL-Lorena.
6
Advogada. Bacharel em Direito pelo Centro Universitário Salesiano de São Paulo (UNISAL-Lorena).

25
investigación de tres pilares interconectados mutuamente, que son, un breve enfoque
histórico de Derecho laboral como fuerza sociopolítica antagónica al abuso del sistema liberal
capitalista, la contextualización de estes derechos en la cara de las transformaciones sociales y
económicas resultantes de la revolución técnico-científica y como los Derechos laborales no
sólo incluye sino también ratifica los Derechos Humanos cuando prevalece su carácter
proteccionista sobre la crisis económicas.
PALABRAS-CLAVE: Derecho del Trabajo; Derechos Humanos; Crisis económicas;
1 CONSIDERAÇÕES HISTÓRICAS SOBRE O DIREITO DO TRABALHO
A caracterização do Direito do Trabalho se dá, sobretudo, por ser ele um produto histórico-
social consagrado mundialmente e nos mais variados instrumentos jurídicos, como também
pelos Direitos Humanos e pela própria sociedade, alçando-o ao patamar de Direito Social que
se desenvolve e se adapta em consonância com as demandas mercadológicas, econômicas e
sociais. Sem embargo, a compreensão integral deste ramo jurídico exige um escorço histórico
que apresente a evolução do Direito Trabalhista em âmbito nacional e internacional.
Remontando aos séculos XVIII e XIX, a ausência de garantias robustas de direitos dos
trabalhadores era flagrante, ressaltada por um quadro econômico desfavorável e profundas
desigualdades sociais: é com essa base histórica, contudo, que as mudanças significativas
viriam, catalisadas pelas insurreições sociais que ansiavam melhores condições e maior
resguardo estatal e legal.
As condições de trabalho a que o proletário era submetido retratam verdadeira condição de
indignidade, em que o valor axiológico e fático do ser humano enquanto sujeito de direitos e
dignidade era ignorado.
As jornadas de trabalho eram incessantes, com números de horas tão superiores ao aceitável
que reduziam o trabalhador a mera mão-de-obra condicionada à precariedade de condições de
higiene, saúde, alimentação, repouso e lazer. Não obstante as jornadas extremamente
exigentes, era comum a exploração desumana da mão-de-obra de mulheres, gestantes,
crianças e idosos, por serem estes uma mão-de-obra irrisória em custos à época, gerando
remunerações pífias e demais condições degradantes (NASCIMENTO, 2010).
Ainda nesse sentido, os salários eram tão ínfimos que não permitiam a ascensão social, de
modo que aqueles que não dispunham de recursos financeiros tendiam a quedar-se na mesma
situação de miserabilidade por toda sua vida e de suas gerações vindouras, desaguando em um
inevitável ciclo de desigualdade social e separação da sociedade por classes.
É nesse contexto do ápice da exploração abusiva do trabalho humano que se desenrolou o
primeiro marco a ser abordado, qual seja, a Revolução Industrial, iniciada no século XVIII na
Inglaterra.
Tal Revolução pautou-se na modernização das técnicas de trabalho, incitando a substituição da
mão-de-obra artesã humana pelas máquinas desenvolvidas, que aceleravam a produção das
26
mercadorias e diminuíam custos, fazendo com que a demanda aumentasse e, por
consequência, os lucros também. Desse modo, não é por acaso que essa fase é intitulada como
revolução, posto que ensejou notável transformação social, comercial e trabalhista (BARROS,
2016).
A esse respeito, imprescindível é mencionar que os trabalhadores, diante das novas condições
inauguradas, se organizaram com o escopo de reivindicar melhores condições de trabalho,
exercendo tal prerrogativa por meio de protestos e clamores em tom de revolta
oportunidade em que diversos direitos políticos, trabalhistas, sociais e humanos foram
conquistados em seus favores.
Com a associação dos operários, inauguraram-se as chamadas trade unions ou sindicatos,
organizações de trabalhadores que, dotadas de força ante as reivindicações bem sucedidas,
negociavam com os empregadores condições mais favoráveis de trabalho, ao passo que o
capitalismo exercia grande impacto sobre o mercado de consumo e, diretamente, sobre o
trabalhador assalariado. Ressalte-se aqui a importância dessa percepção de união, posto que
organizados em sindicatos os empregados conseguiam força bastante para contrapor-se ao
poderio empregatício.
Ademais, a inserção dos sindicatos na sociedade trouxe a consideração dos direitos da
coletividade, permitindo a regulamentação de categorias profissionais e fortalecendo
movimentos de oposição e resistência por condições mais protetivas à integridade física, moral
e jurídica de seus direitos.
A revolução industrial, portanto, demarca o momento em que o Direito do Trabalho estrutura-
se como categoria específica, representando o principal instrumento vinculante do
trabalhador à cadeia produtiva (DELGADO, 2016).
Por fim, necessário é delinear os contornos de outro notório marco histórico para o Direito do
que assolou os Estados Unidos da América em
1929 e que repercutiu nas relações de trabalho mundialmente.
Após a Primeira Guerra Mundial, compreendida entre 1914 e 1918, a economia americana
cresceu disparadamente, desenvolvendo-se as grandes potências industriais e mercantis.
Não foi somente a produção tecnológica que prosperou, mas também a oferta de crédito aos
compradores dos produtos demandados, culminando em um giro enorme de capital que atraiu
os investidores a depositar seu dinheiro e suas expectativas no mercado norte-americano.
Diante da grande quantidade de crédito emitido e da ausência de valor real com a produção, a
Bolsa de Valores entrou em colapso gerando um desemprego que atingiu milhares de
trabalhadores, a falência de grandes empresas e a desvalorização da economia em âmbito
mundial.

27
Como solução do deslinde, a economia foi remanejada e restabelecida, voltando a economia
norte-americana ao patamar de uma das maiores potências mundiais, o que perdura até a
atualidade.
Posto isto, evidencia-se que o Direito do Trabalho é disciplina dotada de flexibilidade, na
medida em que tenha se adaptado e se reerguido em períodos de crises e total relapso às
condições humanas de trabalho, com o escopo de alinhar as demandas de mercado à qualidade
de vida e de trabalho dos sujeitos que participam dessa longa cadeia de direitos e obrigações
denominada relação de trabalho.
Com o escopo de coibir e penalizar os abusos surgidos no seio das relações empregatícias, o
Direito do Trabalho mantém-se como instituto que se reinventa e acompanha as
transformações sociais, sendo soberano e garantido fundamentalmente pelos Estados.
1.1 Transcorrer histórico e transformações jus laborais: a lapidação do Direito Trabalhista a
partir da crise do petróleo
Uma das fases do Direito do Trabalho mais marcantes e importantes ao desenrolar do Direito
do Trabalho moderno é a da crise do petróleo, iniciada nas décadas de 1970 e 1980, e que
permanece vigente na atualidade.
Desde a descoberta do petróleo em 1859 esse produto foi consumido abundante e
desenfreadamente pela sociedade, sendo que somente na década de 1970 constatou-se que, se
tratando de combustível fóssil formado em decorrência da decomposição de materiais
orgânicos, era fonte esgotável: nesse momento o preço do produto foi elevado, pois admitiu-se
a possibilidade de perda dessa fonte de riqueza comercializada em larga escala.
Diante de tal oscilação, instalou-se um cenário de crise e de conflitos estabelecidos entre a
produção e a elevação do valor do produto, o que surtiu reflexos desastrosos na economia
mundial.
No Brasil a crise perdura até a atualidade, estagnando os índices de desenvolvimento
econômico, impedindo a geração de novos empregos e retirando dos trabalhadores, ainda que
parcialmente, suas atividades já conquistadas (MONTORO FILHO et al., 2011).
Com o advento da tecnologia, especialmente considerando a introdução e a predominância da
internet em todas as relações estabelecidas, os inconvenientes referentes ao tempo e ao espaço
foram superados, tendo em vista a constante conexão virtual que aproxima pessoas, altera as
relações empregatícias, substitui mão-de-obra, globaliza as relações e reforça a cultura
capitalista (DELGADO, 2016).
Na sociedade contemporânea, as relações empregatícias adquirem novas características e
novas possibilidades de desenvolvimento. Existe um treino constante para que se produza
roboticamente em larga escala, recrutando não mais pessoas, e, sim, máquinas que já há muito
substituíram a atividade humana.

28
Por óbvio que a implementação da alta tecnologia como fator determinante e constituidor de
novas relações de emprego tem seus desdobramentos no processo do trabalho: o mercado de
trabalho foi alterado, a crescente instabilidade da economia e das finanças do Estado atordoa e
incute na sociedade o temor que se traduz nos índices alarmantes e cada vez maiores de
desemprego, que se deve, um pouco, à automatização da tecnologia. A esse respeito, considera-
se o caos social fundado no capitalismo contemporâneo.
Em âmbito internacional também houve exposição a esses problemas econômicos decorrentes
dessa frente sistemática, ensejando a diminuição dos empregos dada a produção em larga
escala utilizando cada vez menos mão-de-obra, em uma relação de produtividade crescente
versus trabalho decrescente (NASCIMENTO, 2010).
Infere-se, portanto, que a sistemática trabalhista e jurídica mais atual se consubstancia num
impasse fundado entre as vantagens tecnológicas trazidas com a modernização e a crise
econômico-política também vivenciada em razão dela. A própria Constituição Federal
instituiu preceitos que ressaltam a igualdade social e democrática, remetendo aos momentos
opressores e autoritários vivenciados no país para ressaltar a importância da modernização
das normas e, consequentemente, das relações de trabalho (DELGADO, 2016).
Sem embargo, deve-se partir da premissa de que toda evolução pressupõe contrapartidas, e a
nova sistemática trabalhista voltada ao capitalismo revestiu de transformação as relações
estabelecidas no ambiente de trabalho.
2 MODERNIDADE ECONÔMICA-SOCIAL E DIREITO DO TRABALHO
A tríade composta pelos fatores econômico, social e laboral não apenas ensejou o surgimento
do Direito do Trabalho no século XIX, quando a Europa perecia em desigualdades sociais e
econômicas tão flagrantes que tornou-se necessária uma intervenção estatal por intermédio de
legislados imperativos e irrenunciáveis pelas partes (BARROS, 2016), mas também demarcou
de forma mais clara a dinâmica de interação entre tais fatores, que coexistem em uma
coadjuvação recíproca.
Destarte, a própria análise da evolução do trabalho e, posteriormente, da construção da ordem
legal trabalhista, torna flagrante que as concepções de trabalho e relação de emprego sempre
estiveram intimamente ligadas ao momento histórico vivido: do escravismo, primeira
manifestação de trabalho humano (não abarcada pelo Direito do Trabalho em razão da
ausência de liberdade subjetiva do indivíduo), até as mais modernas e atuais teses legais da
área, todas as concepções e tratamentos dispensados ao labor humano perpassaram a natureza
e peculiaridades inerentes a cada sociedade e ao momento histórico por elas vivido
(DELGADO, 2016).
Tal correlação de fatores é aferível em diversos contextos, como nas sociedades primitivas, em
que a essência bélica e dominadora desaguava na predominância do escravismo; na idade
média, cuja realidade social e econômica fomentaram a servidão como sistema predominante
de organização do trabalho agrário europeu; na idade moderna, em que a solidificação do
29
sistema capitalista somado ao agravo das desigualdades sociais e inércia estatal trouxeram a
exploração abusiva do trabalho humano, gerando reivindicações propícias ao surgimento do
Direito do Trabalho e do movimento sindicalista; na contemporaneidade, em que o progresso
de diversas ciências abarca novas modalidades de emprego e dita a rítmica empregatícia e
mercadológica.
Assim, a constante evolução do corpo social e da economia impôs ao Direito do Trabalho a
necessidade de adaptar-se constante e rapidamente as demandas que surgiam (DELGADO,
2016).
Nesse sentido, a modernidade econômica-social impactou sobremaneira o direito trabalhista
por diversos fatores.
Sob um dos prismas, havia as novas concepções abarcadas pela estruturação de uma ordem
legal voltada ao trabalho, como a relação de emprego (determinando a sujeição estritamente
objetiva ao empregador e não mais vinculação pessoal, típica do escravagismo), a titularidade
de direitos relativos ao labor, a preocupação em inserir dignamente o ser humano na cadeia
produtiva por meio do trabalho resguardado e hígido, e mesmo discussões sobre a importância
da junção dos trabalhadores para alcançar paridade de poder com o empregador em
negociações e reivindicações, conceito consubstanciado pelo sindicalismo.
Em outra instância, havia a revolução tecnológica e suas implicações, como robotização de
parte do processo produtivo, criação de novos postos de trabalho, o fenômeno da globalização,
evolução dos setores econômicos (em especial o secundário), grande volume de informações
mais acessíveis, novo processamento e organização de dados e a informatização (DELGADO,
2015).
É óbvio, portanto, que a nova configuração mundial de prevalência do capitalismo e ascensão
da tecnologia afetaram a ordem trabalhista, obrigando uma releitura dessa estruturação legal.
2.1 Tecnologia e globalização: o despontar das novas relações laborais
Uma transição em especial, porém, modificou de maneira profunda e irreversível toda
sistemática socioeconômica, afetando sobremaneira as formas de trabalho: a terceira
revolução tecnológica, de meados da década de 70.
Tal qual disposto nas lições do jurisfilósofo brasileiro Miguel Reale em sua Teoria
Tridimensional do Direito (segundo a qual o Direito origina-se da conjugação harmônica dos
aspectos fático, axiológico e normativo), os adventos tecnológicos e de mercado foram
rapidamente absorvidos pelo corpo social e incorporados as legislações diversas, em uma clara
dinâmica tridimensionalista de fato, valor social do fato e norma.
O progresso do campo científico, destacado em áreas como aeronáutica, telecomunicações,
biotecnologia, eletrônica e microeletrônica, afetaram diretamente os setores econômicos, em
especial o secundário e o terciário, trazendo novas tecnologias, processos fabris mais

30
robotizados e eficientes, oferta de novos produtos e serviços, expansão na tecnologia de
processamento de dados.
Além disso, desponta no final do século XX o processo de globalização, consubstanciado pela
criação de elo íntimo entre sistemas regionais, nacionais ou comunitário, transcendendo
limites fronteiriços regionais ou nacionais em uma dinâmica de demarcação de um parâmetro
mercadológico de globo terrestre (DELGADO, 2015).
Não obstante, esse avançar do paradigma técnico-produtivo surte efeitos em toda economia,
visto que intensifica o uso do capital e a produtividade do trabalho (POCHMANN, 1999).
A produtividade tende a crescer na medida em que aplica-se maior utilização de capital ou
meios de trabalho mais desenvolvidos tecnologicamente, o que, consequentemente, impõe ao
empregado treinar-se no uso dessas tecnologias que agora integram em definitivo seu
ambiente de trabalho. Além disso, uma crescente linha de oferta de postos de trabalho facilita
a mobilidade ocupacional dos empregados em busca de melhores condições laborais
(MONTORO FILHO et al., 2011).
As relações de emprego, como elos basilares de inserção digna do ser humano na cadeia
produtiva capitalista que são, de imediato também foram afetadas pelas novidades advindas
dessa terceira revolução: nesse contexto, o Direito do Trabalho, antes acostumado ao
tradicional sistema empregatício, deparava-se, agora, com uma nova realidade mercadológica
a qual teria que se adaptar.
2.2 Contraponto entre modernidade e trabalho: a precarização das condições trabalhistas
Os novos paradigmas representaram uma profunda mudança social e econômica, basicamente
inaugurando uma nova ordem mundial e uma nova fase do sistema capitalista que beneficiaria
a humanidade com adventos tecnológicos, modernização de processos, criação de novos
postos de trabalho, profissionalização da mão-de-obra, dentre outros.
Contudo, não obstante tais melhorias, o sistema capitalista tem por finalidade principal o
alcance do lucro e, sendo este o escopo principal, raramente considera os fatores humanos e
sociais agregados e usados nos processos produtivos como prova a própria estruturação do
Direito do Trabalho, nascido das lutas e reivindicações de trabalhadores frente aos abusos e
más condições a que eram submetidos.
Em um primeiro momento, a robotização de postos antes ocupados por humanos desemprega
parte da população, que, excluída da cadeia produtiva pelo não emprego de sua mão-de-obra,
dificilmente subsistirá em condições humanamente dignas. É nessa dinâmica, inclusive, que
ganha força a tese da integral robotização dos postos de trabalhos mais tarde contestada pela
realidade mercadológica, que apontava para a robotização de postos de trabalho manuais em
detrimento do crescimento daqueles que exigem maior aptidão intelectual (GODINHO, 2015).
A evolução dos meios de comunicação, como rádio e TV, também perfazem uma conectividade
imensa, posteriormente ampliada pela informática e telefonia em um contexto no qual a
31
pessoa está sempre conectada e, por consequência, acessível. Nesse ínterim, a conectividade
não apenas congloba novas modalidades de emprego (como o teletrabalho), mas também
sujeita o empregado a uma ligação direta com seu emprego que, não raramente, macula sua
intimidade, lazer e descanso.
Há que se considerar também a incessante cobrança do mercado pela adequação do
empregado às variadas formas de produção criadas para a maximização do lucro. Os
empregados precisam constantemente adequar-
devendo ter um baixo grau na escala RM (resistência à mudança) sob pena de serem excluídos
do mercado (DALLEGRAVE NETO, 2000), e, consequentemente, integrarem a massa alheia à
cadeia produtiva com baixas condições de subsistência.
No mais, sendo o capitalismo um sistema cíclico de crises e ascensões, quando há no mercado
alta oferta de mão-obra, levando à queda da taxa de salário, os empregados que não possuem
forma diversa de mercadoria para ofertar acabam ampliando a capacidade da sua força
produtiva, nem sempre de forma positiva por vezes cumprindo jornadas de trabalho mais
extensas, por vezes aceitando menores remunerações ou negligenciando boas condições de
exercício do trabalho (PAIVA; CUNHA, 2008).
Embora inconteste as benesses provenientes de tais mudanças, a essência do sistema
financeiro capitalista permaneceu sendo a busca do lucro em detrimento dos demais fatores
agregados à cadeia produtiva, agravando mazelas sociais e humanas que o Direito do Trabalho
prontamente dignificou-se, e ainda tenta, erradicar.
3 ESSENCIALIDADE DO DIREITO DO TRABALHO: ECONOMIA, CRISES E PROTEÇÃO
JURÍDICA
Conquanto o epíteto Direito do Trabalho esteja vastamente presente no cotidiano, tal
nomenclatura, por si só, não desvela a ampla gama axiológica por ela abarcada.
À priori deve-se retomar que o Direito do Trabalho, conquanto diga respeito à uma
estruturação jurídica, tem por cerne o labor humano, seus valores e implicações: nisto reside a
identificação da ciência trabalhista com a antropologia e mesmo a sociologia, motivo pelo qual
não há definição de trabalho como finalidade em si mesmo, desconexo de contextos sociais e
coletivos (MORAES FILHO, 2014).
Neste sentido, socialmente o direito do trabalho assume, portanto, característica de proteção à
possibilidade do indivíduo participar da produção de todos em troca da remuneração devida e
proporcional ao seu próprio esforço (MORAES FILHO, 2014). É pelo trabalho que o indivíduo
integra dignamente a cadeia produtiva social, girando capital pela produção, distribuição ou
aprimoramento de bens e serviços ofertados à grande massa consumidora, consequentemente,
aquecendo e mantendo a economia.
Macroeconomicamente, o valor social do trabalho apreende-se dos índices de
empregabilidade, geração de postos de trabalho, níveis de desemprego, renda e poder

32
aquisitivo, fatores expressivos da realidade social de um país e que afetam diretamente a
economia.
A própria produção de bens e serviços finalizados, resultado direto do trabalho dos atores
sociais, é periodicamente somada em um determinado lapso temporal para quantificar a
atividade econômica de uma região, ou seja, o produto interno bruto (PIB) gerado. Ademais, a
própria remuneração aferida pelo empregado integra a cadeia produtiva porque deste sustento
proverá os bens e serviços que atendem a si mesmo, familiares e próximos, dos itens
necessários aos supérfluos.
Já sob o prisma individual, o trabalho está intimamente ligado à subsistência do indivíduo e
sua realização pessoal por meio da valoração do trabalho.
É um prolongamento da própria personalidade do sujeito, que conecta-se à produção social
através da sua própria parcela de trabalho; sendo atividade predominante da vivência humana
e também expressão própria do esforço humano, tanto pode o trabalho realizar pessoalmente
o indivíduo quanto frustrá-lo.
É no emprego que o ser humano desprende a maior parte de seu tempo, privando-se do
convívio social, familiar e mesmo de seu lazer.
Tais fatores evidenciam a importância da proteção jurídica laboral, pois se o trabalho depende
de uma boa premissa econômica para que emerjam novos postos de emprego e melhores
condições de empregabilidade, tampouco a economia desenvolve-se plenamente sem os frutos
do trabalho.
Operar o Direito trabalhista é tratar de aspectos muito mais complexos e profundos que
apenas a estruturação legal de uma disciplina: é lidar com os anseios e as inspirações humanas,
as perspectivas de melhoria de vida pelo esforço próprio, a inserção digna de uma pessoa em
uma cadeia produtiva focada quase que exclusivamente em lucros, sendo que o direito
trabalhista torna-se verdadeiro óbice à exploração desregrada e cruel da mão-de-obra
(BARROS, 2016).
Não obstante, o fato do trabalho ser substrato existencial humano envolve ainda a dignidade
da pessoa humana, suas condições de saúde e também ascensão social.
Trabalho é uma forma de alienação do próprio tempo em detrimento da lucratividade do
sistema e do empregador. É, inquestionavelmente, vínculo direto com a própria dignidade da
pessoa, vez que pelos frutos do trabalho afere-se condições de existência minimamente
aceitáveis, vez que enobrece o indivíduo pela ligação dignificante deste ao sistema produtivo
sem que a pessoa necessite recorrer à criminalidade marginalizante e punitiva.
Ademais, desprender tempo ao labor é abnegar-se do convívio social e familiar, do descanso,
do lazer; é também dispor da própria energia e saúde, em uma permuta inegável de troca da
vida humana no processo produtivo.

33
É, por fim, instrumento legítimo de efetivação dos Direitos Humanos, vez que o trabalho
possibilita acesso à moradia, educação, saúde, vestimentas, e tantos outros itens, sejam básicos
ou supérfluos, conglobados pelo conceito de existência humana digna.
5 CONCLUSÃO
É mister que a economia e o trabalho estão intimamente ligados em diversos aspectos, em uma
verdadeira relação de interdependência. Se o trabalho necessita de uma economia equilibrada
para propagar-se em melhores condições, também a economia necessita do labor humano para
a geração de renda, capital, bens e serviços.
Não obstante, as experiências históricas são abundantes em demonstrar que a exploração da
mão-de-obra majoritariamente advinha de métodos abusivos e injustos, surgindo a
necessidade de acompanhamento e regularização da mesma.
Eis, então, que o Direito do Trabalho surge como força antagônica aos abusos e péssimas
condições vivenciadas pelos trabalhadores, por isso mesmo sendo sistemicamente atacado em
suas acepções: mais por representar uma forte e imperiosa barreira à despreocupada e cruel
exploração desordenada da mão-de-obra do que por realmente macular processos
econômicos.
Natural, portanto, que a ciência jurídico-laboral sofra ataques sistêmicos e seja
constantemente incompreendida e questionada. Nasceu das muitas lutas e reivindicações de
trabalhadores mal remunerados, humilhados, submetidos a condições degradantes,
mutilados, eletrocutados, acidentados, trabalhando em locais insalubres ou perigosos, idosos
que não puderam desfrutar a velhice em sossego, crianças que não puderam ter sua própria
infância, jovens sem perspectivas e ambições, trabalhadores em condições análogas ao
escravagismo.
Nasceu, enfim, para promover Justiça Social, já muito polêmica e desde a tenra uma
sonhadora da dignidade pelo trabalho decente e hígido, afinal, subvertendo a ordem do lucro
em primeiro lugar pela valorização do ser humano e do seu trabalho.
Para muito além dos fatores econômicos que permeiam as discussões sobre a redução de
direitos, há de se considerar que, acima de tudo, o trabalho nada mais é do que a
comercialização da vida humana, a alienação de nosso tempo, saúde e energia, motivos pelos
quais o Direito do Trabalho não pode sujeitar-se à atender prontamente toda e qualquer
demanda econômica, em especial quando isso represente a supressão ou modificação radical
de direitos.
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35
Silva, J. A. (2016). Curso de Direito Constitucional Positivo (39a. ed.). São Paulo: Malheiros.

36
A ATUALIDADE HISTÓRICA DO CASAMENTO HOMOAFETIVO E SUA
REGULAMENTAÇÃO JURÍDICA NO MUNDO CONTEMPORÂNEO.
7

RESUMO: O presente trabalho insere-se na temática dos direitos humanos, vislumbrando,


como núcleo de toda a reflexão, a atualidade histórico-mundial do casamento homoafetivo.
Delinear-se-á uma abordagem propedêutica e histórica, inclusive de tratamento filosófico,
para, então, atingir a problemática pontual da dogmática jurídica, escrutando-se o direito
comparado Brasil-Chile. Tem-se, como base teórica, não só autores clássicos do direito das
minorias, mas, outrossim, pensadores de outras áreas do saber humano, a fim de enriquecer o
estudo, estabelecendo-se um diálogo entre diferentes disciplinas. Em deslinde, será verificado
que o casamento homoafetivo compõe uma conquista de direitos por parte de um grupo social
que, por muitos séculos, e devido a complexos fatores, padeceu das mais diversas perseguições
e violações à sua dignidade humana.
PALAVRAS-CHAVE: direitos humanos; casamento homoafetivo; regulamentação jurídica;
direito comparado; mundo contemporâneo.
ABSTRACT: The present work is part of the human rights theme, as a reflection of the
historical-global relevance of same-sex marriage. A propaedeutic and historical approach,
including by philosophical treatment, will be devised in order to reach the problematic point
of juridical dogmatics, scrutinizing Brasil-Chile comparative law. It has as theoretical base not
only classic authors of the law of minorities, but also thinkers of other areas of human
knowledge, in order to enrich the study, establishing a dialogue between different disciplines.
In demarcation, it will be verified that the same-sex marriage composes a conquest of rights by
a social group that, for many centuries, and due to complex factors, suffered from the most
diverse persecutions and violations to its human dignity.
KEYWORDS: Human Rights; Same-sex Marriage; Legal Regulation; Comparative Law;
Contemporary World.
1 INTRODUÇÃO
O presente trabalho, calcado em estudos que ultrapassam a mera dogmática jurídica, encontra
notável supedâneo em esclarecimentos propedêuticos e interdisciplinares, os quais acabam
por preparar o desenvolvimento da temática, conferindo-lhe maior amplitude e prospecção.

7
Mestrando em Direito, pelo UNISAL. Graduado em Direito, pela UNIVAP. Advogado em São José dos Campos, São
Paulo, Brasil. E-mail: lucas.s.almeida@uol.com.br
8
Pós-doutora em Democracia e Direitos Humanos, pela Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra,
Portugal. Doutora e Mestre em Direito das Relações Sociais, pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.
Professora e pesquisadora nos cursos de graduação em Direito da UNIP e da UNIVAP. Professora e pesquisadora na
graduação e no curso de mestrado em Direito do UNISAL. Advogada em São José dos Campos, São Paulo, Brasil. E-
mail: amvds@uol.com.br

37
A união ou o casamento homoafetivo, tal como concebido atualmente, é um fenômeno
historicamente recente, e decorre de lutas dos homossexuais, e também de todo o movimento
LGBT (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Transexuais e Travestis), por visibilidade e respeito, vezes
entrelaçando-se com a luta por direitos e reconhecimento de outras minorias, igualmente
sufocadas pelas incongruências do status quo.
Recorrer-se-á a esclarecimentos históricos, doutrinário-religiosos e também jusfilosóficos, a
fim de atingir o núcleo duro da dogmática jurídica, delineando-se considerações pontuais
acerca da regulamentação jurídica do casamento homoafetivo no mundo hodierno; e, a fim de
ilustrá-la, serão reproduzidos dispositivos legais, tanto do Brasil quanto do Chile, na esperança
de que o direito comparado corrobore a total compreensão do tema proposto.
2 CASAMENTO HOMOAFETIVO: LINEAMENTOS INTERDISCIPLINARES E
PROPEDÊUTICOS
Para que o casamento homoafetivo seja compreendido de modo global e oniabrangente, faz-se
imperiosa a consideração quanto à propedêutica, ou seja, quanto aos indispensáveis estudos
preliminares e preparatórios, os quais, além de fornecer fundamentos às análises vindouras,
guardam consigo relevantes encontros com outras searas do conhecimento humano.
Assim, apresenta-se no presente item o escorço histórico correspondente à trajetória
percorrida pelos homossexuais e, logo a seguir, considerações doutrinário-religiosas a respeito
da aludida minoria, a fim de balizar a melhor compreensão do tema proposto.
Entretanto, devido à vastidão dos dados históricos e das orientações religiosas existentes, serão
selecionadas somente informações estritamente fundamentais e indispensáveis para o salutar
desenvolvimento do estudo, conforme abaixo exposto.
2.1 ESCORÇO HISTÓRICO
Homossexuais sempre existiram, em todos os tempos e em todas as culturas, do ocidente ao
oriente, e práticas homossexuais podem ser encontradas não só entre seres humanos, mas,
inclusive, no meio animal. Eis uma constatação9 técnica, objetiva e histórica.
Entretanto, muito além da apreciação empírica, e, no que pese a aludida naturalidade 10 de tal
orientação sexual, o deletério fenômeno da invisibilidade por muito tempo lançou suas

9
Em acórdão do Supremo Tribunal Federal na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 4277/DF, que reconheceu a
união homoafetiva no Brasil, tomou- orientação e não uma
opção sexual. Já é de curso corrente na comunidade científica a percepção também relatada pelos diversos amici
curiae de que a homossexualidade não constitui doença, desvio ou distúrbio mental, mas uma característica da
personalida
Inconstitucionalidade nº 4277/DF. Requerente: Procuradoria-Geral da República. Relator: Min. Ayres Britto.
Brasília, j. 05 maio 2011a. Disponível em: <
http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=628635>. Acesso em: 15 fev. 2017.
10
Sigmund Freud, inquirido por uma mãe aflita pela homossexualidade de seu filho, respondeu-lhe que a
classificada como uma doença; nós a
38
sombras sobre essa minoria, considerando-

heteronormatividade (HARDT, NEGRI, 2016, p. 357).


A hierarquia e a opressão de gênero são muito antigas, arraigadas nos costumes, e remontam
aos primórdios das comunidades primitivas de seres humanos, quando a civilização ainda dava
seus primeiros passos. As consequências de sua prática afetam não apenas homossexuais, mas
inclusive mulheres, crianças e adolescentes.
Por tal razão, salutar rememorar os ensinamentos de Friedrich Engels (2006), o qual, em seu
notório estudo antropológico e filosófico a respeito do surgimento da família, da propriedade
privada e do Estado, esclareceu que, no início, os agrupamentos humanos eram notadamente
matriarcais, nos quais as mulheres11 desfrutavam de ampla autonomia frente aos homens,
desempenhando, inclusive, funções de liderança familiar e social.
Entretanto, com o surgimento da monogamia, o matriarcado deu lugar ao patriarcado,
coincidindo com o desenvolvimento do primeiro antagonismo de classes na história humana
(ENGELS, 2006). Posteriormente, adveio, então, o pater familiae, figura masculina guarida de
autoridade absoluta (SOUSA, 2011, p. 176), marcando por muito tempo a concepção de família.
Em suma, Engels12 elucida que:
O primeiro antagonismo de classes que apareceu na história coincide com o desenvolvimento
do antagonismo entre o homem e a mulher na monogamia; e a primeira opressão de classes,
com a opressão do sexo feminino pelo masculino. A monogamia foi um grande progresso
histórico, mas, ao mesmo tempo, iniciou, juntamente com a escravidão e as riquezas privadas,
aquele período, que dura até nossos dias, no qual cada progresso é simultaneamente um
retrocesso relativo, e o bem-estar e o desenvolvimento de uns se verificam às custas da dor e
da repressão de outros. (ENGELS, 2006, p. 68).
No que pese o avanço da heteronormatividade e da opressão de gênero concomitantemente ao
processo civilizatório, é relevante notar que na Grécia Helenística (323 a 31 a.C), período em
que os gregos desfrutavam o ápice de seu desenvolvimento econômico, cultural e político, era

Denise Bottmann. 2. ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2012, p. 610.
11
Nesse sentido, há, também, a vetusta mater semper certa est, pater autem incertus
ilustrar o destaque conferido à mulher e a tensão simbólica que envolve a figura paterna. Cf. DINIZ, Maria Helena.
Curso de Direito Civil Brasileiro: Direito de Família. 30. ed. São Paulo: Saraiva, 2015, v. 5, p. 567; QUINET, Antonio.
Édipo ao pé da letra: fragmentos de tragédia e psicanálise. São Paulo: Zahar, 2015.
12
No original, lê-
development of the antagonism between man and woman in monoghamian marriage, and the first class oppresion
with that of the female sex by the male. Monogamy was a great historical advance, but at the same time it
inaugurated, along with slavery private wealth, that epoch, surviving this day, in wich every advance is likewise a
relative regression, in wich, the well-being and development of some are attained through the misery and
els 1882-89. Translated by Barrie
Selman et al. London: Lawrence & Wishart, 2010, v. 26, p. 173 -174.

39
muito comum a prática de relações sexuais entre pessoas do mesmo sexo, algo que perpassava
significativos segmentos da população (HALPERIN, 1990).
Em Atenas, a pederastia (paederasty) era uma prática reconhecida como honrosa e decente,
inexistindo, inclusive, qualquer pena que coibisse ou punisse tal comportamento.
A pederastia não correspondia a uma prática sexual entre duas pessoas do mesmo gênero,
pura e simplesmente, tal como se costuma concebê-la atualmente. De modo contrário, ela era
uma prática sexual específica, de relevância social e moral, realizada entre o adulto-mestre e o
jovem-aprendiz, tendo este entre doze e dezoito anos de idade, e desprovida de qualquer amor
entre as partes. Grosso modo, compunha uma iniciação do adolescente que dava seus
primeiros passos na vida pública, tornando-se cidadão ateniense (HALPERIN, 1990, p. 55 - 57).
Entretanto, o adulto-mestre era, em verdade, um homem comum, casado com uma mulher,
com a qual matinha relações heterossexuais, cumprindo somente sua função social com o
ritual de iniciação da juventude.
Com as invasões sofridas pelas cidades-estado gregas, bem como muitos outros fatores
registrados pelos historiadores, a pederastia, assim como outros relevantes elementos
culturais e sociais daquele povo, foi aos poucos arrefecendo, mesclando-se com novas culturas.
Exceto tal período da história ocidental, olvidando-se peculiaridades esparsas de tribos e
comunidades autóctones, a prática homossexual sempre esteve ofuscada pelo preconceito e
pela recriminação.
Tais considerações de caráter histórico-antropológico só servem para reforçar o fato do direito
in casu, o direito de família - estar sempre entrelaçado e emaranhado com outras dimensões
da socialidade humana, as quais delimitam sua natureza, mediante interações dinâmicas e
vezes conflitivas (ALVES, 2010).
Conforme observado, e também melhor desenvolvido de outra forma no tópico subsequente,
constata-se que própria aversão ou preconceito em relação aos homossexuais é um fenômeno
instável, prendendo-se a uma série de fatores externos e contingentes, não obstante ter
composto uma força avassaladora na maior parte da história, perdurando, ainda hoje, em
vários países (SOUSA, 2015).
2.2 POSICIONAMENTO RELIGIOSO FACE AOS HOMOSSEXUAIS
Devido à vasta pluralidade de religiões e seitas existentes ao redor do mundo, no presente
artigo são eleitas somente duas religiões, inclusive de grande prospecção histórico-mundial e
robusta abrangência populacional e política, que são, nomeadamente: o cristianismo em sua
vertente católica e o islamismo, a fim de melhor compreender a postura eminentemente
religiosa face os direitos humanos fundamentais da minoria em apreço.

40
Padre Alberto Hurtado (2009, p. 29), eminente clérigo chileno, quando questionado a quem

con sus fracasos, con s


O Catecismo da Igreja Católica13 dedica tópico especial para tratar da temática dos

2357 a 2359.
A despeito de tecer uma série de críticas e observações reprovadoras, o documento oficial
apresenta, em deslinde, uma postura de respeito e acolhimento aos homossexuais, algo
extremamente clarividente no § 2358, abaixo reproduzido:
[Homens e mulheres homossexuais] devem ser acolhidos com respeito, compaixão e
delicadeza. Evitar-se-á, em relação a eles, qualquer sinal de discriminação injusta. Estas
pessoas são chamadas a realizar na sua vida a vontade de Deus e, se forem cristãs, a unir ao
sacrifício da cruz do Senhor as dificuldades que podem encontrar devido à sua condição. (grifo
nosso).14
No parágrafo subsequente, o Catecismo sublinha o imperativo da castidade na vida das
pessoas homossexuais, a saber:
2359. As pessoas homossexuais são chamadas à castidade. Pelas virtudes do autodomínio,
educadoras da liberdade interior, e, às vezes, pelo apoio duma amizade desinteressada, pela
oração e pela graça sacramental, podem e devem aproximar-se, gradual e resolutamente, da
perfeição cristã.15
Nesse sentido, Rampazzo (2014, p. 222) menci
-se de suas imperfeições

Imprescindível comentar que, recentemente, a Igreja tem recorrido cada vez mais a uma
postura acolhedora e completamente respeitosa em relação aos homossexuais.

No § 2357 há o reconhecimento, por parte do Catecismo da Igreja Católica, da presença de práticas homossexuais
13

em infindáveis culturas e ao longo da história, comentando-

<http://www.vatican.va/archive/cathechism_po/index_new/p3s2cap2_2196-2557_po.html>. Acesso em 14 fev. 2017.


14
CATECISMO DA IGREJA CATÓLICA. Disponível em:
<http://www.vatican.va/archive/cathechism_po/index_new/p3s2cap2_2196-2557_po.html>. Acesso em 14 fev. 2017.
15
Ibidem.

41
Aliás, o Papa Francisco16, representante máximo da Igreja Católica Apostólica Romana,
confessou que a Igreja deve pedir perdão aos homossexuais e demais minorias por ter-lhes
relegado à marginalização durante séculos.
Já quanto ao islamismo, têm-se os estudos doutrinários de Youssef Al-Karadhawi (2014, p. 191),
notória autoridade muçulmana em jurisprudência islâmica, segundo o qual a prática sexual

obstante inexistir consenso a respeito das punições17 que devem ser aplicadas aos envolvidos
em tais atos libidinosos, recomenda-se as penas mais severas.
Ayaan Hirsi Ali (2015), refugiada da Somália e professora na Universidade de Harvard,
menciona que o islã não é um todo homogêneo, existindo grandes agrupamentos de devotos
moderados, respeitadores do multiculturalismo e do direito das minorias, no que pese a força
avassaladora daqueles que compõem uma corrente fundamentalista e intolerante.
Sendo uma das três religiões monoteístas do mundo, o islamismo compartilha com o judaísmo
e com o cristianismo de consideráveis semelhanças históricas e doutrinárias, recorrendo a
relatos comuns tanto à Torá, quanto à Bíblia. Para tanto, ao apreciar a temática da
homoafetividade, os islâmicos mencionam o d

-KARADHAWI, 2014, p. 191).


Conforme soberbamente conhecido, e, inclusive, salientado pelos islâmicos, apenas Lot e sua
família desfrutaram da oportunidade de fugir da cidade profanada e voluptuosa, tendo sido
vedado, definitivamente, olhar para trás enquanto os castigos divinos eram aplicados aos
pecadores (AL-KARADHAWI, 2014).
Entretanto, a esposa de Lot, num rompante de curiosidade, mirou seu olhar para trás, sendo
imediatamente castigada. Fulminada, tornou-se uma estátua de sal.
Por sua vez, José Saramago (2009, p. 97), em seu último livro publicado em vida, teceu
comentários

3 REGULAMENTAÇÃO JURÍDICA DO CASAMENTO HOMOAFETIVO

16
Cf. GAYS merecem o pedido de perdão da Igreja Católica, diz papa Francisco. Folha de S. Paulo. 27 jun. 2016.
Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/mundo/2016/06/1786082-gays-merecem-pedido-de-perdao-da-
igreja-catolica-diz-papa-francisco.shtml>. Acesso em 22 fev. 2017.
17
Youssef Al-Karadhawi sugere a pena de morte, escusando-
castigos possam parecer cruéis, eles têm sido sugeridos para manter a pureza da sociedade islâmica e para mantê-la
a salvo d -KARADHAWI, Dr. Youssef. O lícito e o ilícito no islam. Trad. de Samir El
Hayek. [s.l]: [s.n], 2014, p. 192.

42
A regulamentação jurídica da união ou do casamento homoafetivo no mundo contemporâneo
é vasta, estendendo-se por muitos países, sob a égide de sistemáticas e dinâmicas diferentes
umas das outras sob as quais reverberam questões políticas, culturais e também religiosas.
Por tal razão, foram selecionados somente dois países da América do Sul, a fim de ilustrar a
temática sub examine.
3.1 BRASIL
Em fevereiro de 1985, o Conselho Federal de Medicina do Brasil deixou de considerar a
homossexualidade como doença, tendo a Organização Mundial de Saúde (OMS), somente em
17 de maio de 1990, retirado a homossexualidade da lista internacional de patologias, quando
foi, então, estabelecido o Dia Internacional contra a Homofobia (SOUSA; CAPUCHO, 2014).
Não obstante a mudança de postura por parte das organizações voltadas à saúde, apenas em
maio de 2011 o Supremo Tribunal Federal18, nos autos da Ação Declaratória de
Inconstitucionalidade 4.277 DF e da Ação Declaratória de Preceito Fundamental 132 RJ,
reconheceu a constitucionalidade da união estável homoafetiva, afastando-se qualquer
interpretação do artigo 1723 do Código Civil que alijasse pessoas do mesmo sexo em
constituírem entidade familiar19.
No mesmo ano, em outubro, o Superior Tribunal de Justiça prolatou decisão nos autos do
Recurso Especial nº 1.183.378 RS, na qual apresentou consonância à ADI 4277/DF e à ADPF
132/RJ, havendo sido elaborada a seguinte ementa:
DIREITO DE FAMÍLIA. CASAMENTO CIVIL ENTRE PESSOAS DO MESMO SEXO
(HOMOAFETIVO). INTERPRETAÇAO DOS ARTS. 1.514, 1.521, 1.523, 1.535 e 1.565 DO CÓDIGO
CIVIL DE 2002. INEXISTÊNCIA DE VEDAÇAO EXPRESSA A QUE SE HABILITEM PARA O
CASAMENTO PESSOAS DO MESMO SEXO. VEDAÇAO IMPLÍCITA
CONSTITUCIONALMENTE INACEITÁVEL. ORIENTAÇAO PRINCIPIOLÓGICA
CONFERIDA PELO STF NO JULGAMENTO DA ADPF N. 132/RJ E DA ADI N. 4.277/DF. (STJ
Recurso Especial nº 1.183.378/RS, Relator: Min. Luis Felipe Salmão, j. 25 out. 2011b). 20

18
Conferir mais em: <http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=178931>. Acesso em 14
fev. 2017.
19

estável e do casamento homoafetivos seria uma Emenda Constitucional, sob a afirmativa de que as decisões do STF
prolatadas na ADI 4277 e na ADPF 132 e a Resolução do CNJ nº 175/2013 ferem a hierarquia de normas. Cf. DINIZ,
Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: Direito de Família. 30. ed. São Paulo: Saraiva, 2015, v. 5, p. 69.
20
Disponível em:
<https://jurisprudencia.s3.amazonaws.com/STJ/IT/RESP_1183378_RS_1330972067974.pdf?Signature=uG522giztGFE
6DM5dphqBiwCfKw%3D&Expires=1487172521&AWSAccessKeyId=AKIAIPM2XEMZACAXCMBA&response-
content-type=application/pdf&x-amz-meta-md5-hash=6614bce5618ad15c0806d4ac79e931ac>. Acesso em 15 fev.
2017.

43
Já em 2013, sobreveio a Resolução do Conselho Nacional de Justiça nº 175/201321 que, ao seu
turno, vedou às aut

22
, não haveria razão para excluir de
sua abrangência uniões de pessoas do mesmo sexo.
Válido, ainda, mencionar que, recentemente, o Projeto de Lei do Senado nº 612/201123, de
autoria da Senadora Marta Suplicy, que propõe a alteração dos artigos 1.723 e 1.726 do Código
Civil, a fim de permitir o reconhecimento legal da união estável entre pessoas do mesmo sexo,
foi aprovado pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania. Aguarda, agora, votação em
turno suplementar, ocasião em que haverá decisão terminativa. Feito isso, provavelmente
passará à análise da Câmara dos Deputados.
O aludido Projeto de Lei sucedeu o antigo Projeto de Lei nº 1.151 de 1995, igualmente proposto
por Marta Suplicy, que também ambicionava disciplinar a união civil entre pessoas do mesmo
sexo (DINIZ, 2015, p. 416), tendo, entretanto, sido atravancado e suspenso pelas disputadas
político-legislativas daqueles anos.
Por oportuno, cabe rememorar, ainda, que desde a Instrução Normativa nº 11/2006 do
Instituto Nacional do Seguro Social, as uniões homoafetivas têm proteção da indigitada
autarquia, já que o artigo 30 daquela I.N. dispõe que o companheiro homossexual de segurado
da Previdência Social desfruta de proteção previdenciário-assistencial, constando do rol de
dependentes desde que comprovados os requisitos legais para tanto, verbi gratia, vida comum
e dependência econômica (DINIZ, 2015, p. 416).
Evidentemente, no Brasil foi o ativismo judicial que auxiliou a salvaguarda dos direitos dos
homossexuais, bem como dos demais integrantes da sigla LGBT (Lésbicas, Gays, Bissexuais,
Transexuais e Travestis)24, em detrimento da incúria e do conservadorismo do Poder

21
Disponível em: <http://www.cnj.jus.br/images/imprensa/resolu%C3%A7%C3%A3o_n_175.pdf>. Acesso em 14 fev.
2017.
22
Disponível em: <http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=628635>. Acesso em 15
fev. 2017.
23
Disponível em: <https://www25.senado.leg.br/web/atividade/materias/-/materia/102589>. Acesso em 22 fev. 2017.
24
No Brasil, é utilizado, desde 2008, quando da I Conferência Nacional de Direitos Humanos e Cidadania, a sigla
LGBT (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Transexuais e Travestis), sucedendo a outrora recorrida sigla GLS (Gays, Lésbicas
e Simpatizantes). No plano internacional, recentemente tem-se recorrido à sigla LGBTQIA (Lésbicas, Gays,
Bissexuais, Transexuais, Queer, Intersexuais e Assexuais), ampliando seu espectro e apresentando outras
distinções. Cf. SOUSA, Ana Maria Viola de; CAPUCHO, Ana Maria C. Castro. Direitos Humanos: questões atuais
sobre a violência contra LGBTTT. In: ______; NASCIMENTO, Grasiele Augusta Ferreira; ZUÑIGA, Noé Lópes.
Direitos Humanos e Minorias. Lorena: UNISAL, 2014. Disponível em:
<http://www.lo.unisal.br/direito/semidi2014/publicacoes/livro4/Ana%20Maria%20Carvalho%20Castro%20Capuch
o%20e%20Ana%20Maria%20Viola%20de%20Sousa.pdf>. Acesso em 27 fev. 2017; SCHULMAN, Michael. Generation
LGBTQIA. The New York Times. 9 jan. 2013. Fashion & Style.Disponível em:
<http://www.nytimes.com/2013/01/10/fashion/generation-lgbtqia.html>. Acesso em 27 fev. 2017.

44
Legislativo, demasiado vinculado às forças da heteronormatividade, seja por razões religiosas e
culturais, seja por razões eminentemente políticas.
3.2 CHILE
No Chile, a Ley nº 20.830 de 2015 reconheceu e regulamentou a união civil homoafetiva
(acuerdo de unión civil), já delimitando em seu artículo 1º a natureza do aludido instituto
jurídico, que acaba por ser um contrato de direito de família, a saber:
Artículo 1°- El acuerdo de unión civil es un contrato celebrado entre dos personas que
comparten un hogar, con el propósito de regular los efectos jurídicos derivados de su vida
afectiva en común, de carácter estable y permanente. Los contrayentes se denominarán
convivientes civiles y serán considerados parientes para los efectos previstos en el artículo 4225
del Código Civil.
Su celebración conferirá el estado civil de conviviente civil. El término de este acuerdo
restituirá a los contrayentes el estado civil que tenían antes de celebrar este contrato, salvo en
la situación prevista en la letra c) del artículo 26.26
A indigitada lei também menciona os procedimentos burocráticos para a celebração do
acuerdo de unión civil, que deverá ocorrer perante um oficial do Servicio de Registro Civil e
Identificación, respeitando-se sua correspondente jurisdição. No original, lê-se:
Artículo 5°- El acuerdo de unión civil se celebrará en el Servicio de Registro Civil e
Identificación, ante cualquier oficial, quien levantará acta de todo lo obrado, la que será
firmada por él y por los contrayentes. La celebración podrá efectuarse en el local de su oficina
o en el lugar que señalaren los contrayentes, siempre que se hallare ubicado dentro de su
territorio jurisdiccional.27
Em outubro daquele ano, houve a primeira união homoafetiva, muito festejada pelos
movimentos e instituições de defesa dos direitos humanos, conforme registrado pelo jornal El
País Brasil. In verbis:
Seis meses depois da promulgação da lei pela presidenta Michelle Bachelet, o Chile começou
nesta quinta-feira a realizar seus primeiros acordos de uniões civis, que regula juridicamente
as uniões de casais homossexuais e heterossexuais que não estão casados [...] Considerado um

25
A título informativo, informa-se que o artículo 42 del Código Civil ey
dispone que se oiga a los parientes de una persona, se entenderán comprendidos en esa denominación el cónyuge
de ésta y sus consanguíneos de uno y otro sexo, mayores de edad. A falta de consanguíneos en suficiente número
serán oídos los afines. Serán referidos los descendientes y ascendientes a los colaterales, y entre éstos los de más
cercano parentesco. Los parientes serán citados, y comparecerán a ser oídos, verbalmente, en la forma prescrita por
ESO NACIONAL DE CHILE. Disponível em:
<https://www.leychile.cl/Navegar?idNorma=172986>. Acesso em 01 mar. 2017.
26
BIBLIOTECA DEL CONGRESO NACIONAL DE CHILE. Disponível em:
<https://www.leychile.cl/Navegar?idNorma=1075210&idParte=0>. Acesso em 13 fev. 2017.
27
Ibidem.

45
país tradicional, com uma forte influência da Igreja Católica em 2004 teve sua primeira lei de
divórcio e o aborto ainda é punido em todas as circunstâncias , o Chile conseguiu aprovar o
Acordo de união civil por causa da conscientização social que realizaram os movimentos
defensores dos direitos das minorias sexuais. O Movimento de Integração e Liberação
Homossexual (Movilh) lembrou que houve 35 marchas, 72 protestos, 20 campanhas, seis
projetos de lei e 11 anos de espera antes da aprovação do AUC.28
Entretanto, antes mesmo do Estado chileno reconhecer a união civil homoafetiva, há, desde
2012, figuras legais que coíbem as práticas discriminatórias contra uma série de pessoas,
dentre elas, os integrantes do amálgama LGBT.
É o caso da Ley nº 20.609 de 2012 (Ley antidiscriminación), que, ao seu turno, tem como
que permita restablecer eficazmente el imperio

O artículo 2º dispõe:
[...] se entiende por discriminación arbitraria toda distinción, exclusión o restricción que
carezca de justificación razonable, efectuada por agentes del Estado o particulares, y que cause
privación, perturbación o amenaza en el ejercicio legítimo de los derechos fundamentales
establecidos en la Constitución Política de la República o en los tratados internacionales sobre
derechos humanos ratificados por Chile y que se encuentren vigentes, en particular cuando se
funden en motivos tales como la raza o etnia, la nacionalidad, la situación socioeconómica, el
idioma, la ideología u opinión política, la religión o creencia, la sindicación o participación en
organizaciones gremiales o la falta de ellas, el sexo, la orientación sexual, la identidad de
género, el estado civil, la edad, la filiación, la apariencia personal y la enfermedad o
discapacidad. (grifo nosso).29
Sendo assim, relevante é o desiderato apresentado pela Ley antidiscriminación, e, outrossim,
clarividente é a constatação de que a união homoafetiva chilena ainda não pode ser
considerada como equivalente ao casamento, e nem mesmo como instituto semelhante a uma
união estável do ordenamento jurídico brasileiro, pois configura mero negócio jurídico do
cosmos do direito de família. Entretanto, mesmo assim, deve ser vislumbrada como um avanço
jurídico a favor da minoria em apreço.
4 CASAMENTO HOMOAFETIVO: UM DIREITO HUMANO
A dignidade da pessoa humana é consagrada já pelo artigo 1º, inciso III, da Constituição da
República Federativa do Brasil, sendo que, em complemento, tem-se o artigo 3º, inciso IV,

28
Cf. MONTES, Rocío. Chile realiza as primeiras uniões civis de casais homossexuais. El País. 23 out. 2015.
Internacional. Disponível em: < http://brasil.elpais.com/brasil/2015/10/22/internacional/1445535590_295707.html>.
Acesso em 13 fev. 2017.
29
BIBLIOTECA DEL CONGRESO NACIONAL DE CHILE. Disponível em: <
http://www.cdh.uchile.cl/media/seminarios_talleres/Ley_no_discriminacion_Chile.pdf>. Acesso em 13 fev. 2017.

46
preconceitos de origem, raça,

menção do artigo 4º da Carta Magna, que, em seu inciso II, dita que a República é regida pelo
princípio da prevalência dos direitos humanos30.
Se realizado for o mais simples cotejo entre os esclarecimentos jusfilosóficos e doutrinários
atrelados à dignidade humana e a sistemática dos direitos fundamentais brasileiros,
consubstanciados na Constituição da República, verificar-se-á que a concretização do
casamento homoafetivo é um direito humano.
O sociólogo polonês Zygmunt Bauman (2004, p. 104 - 105), com destacada lucidez, tece
comentários esclarecedores a respeito da dignidade humana, os quais merecem ser
reproduzidos. Em suas próprias palavras:

Não é apenas que a vida digna e o respeito devido à humanidade de cada ser humano se
combinem num valor supremo que não pode ser superado ou compensado por nenhum
volume ou quantidade de outros valores, mas que todos os outros valores só são valores na
medida em que sirvam à dignidade humana e promovam a sua causa.
De outra banda, Jürgen Habermas, filósofo e sociólogo alemão, ensina que o sentido de
dignidade humana é atualizado com o desenrolar do tempo histórico, fazendo com que sejam
aprofundados os direitos humanos fundamentais já assegurados, bem como construídos novos
direitos que também exigem efetivação (HABERMAS, 2012).
Michael Hardt e Antonio Negri31 (2016, p. 13), em seu estudo crítico a respeito do mundo
precisa de força para se impor aos poderes
dominantes e desmantelar suas instituições corruptas, para só então poder criar um novo
mundo de bem-
Em outras palavras, percebe- - seguindo,
inclusive, os dizeres do mandamento cristão -
(BAUMAN, 2004, p. 103).
-se mister desmanchar o
inatacável véu de igualdade formal criado pelos donos do poder, segundo os quais inexistem
- 358).

30
Cf. BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil (1988). Disponível em: <
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em 27 fev. 2017.
31
Michael Hardt e Antonio Negri elucidam que tanto a hierarquia de gênero, quanto a hierarquia racial precisam

HARDT, Michael; NEGRI, Antonio. Bem-estar Comum. Trad. de Clóvis Marques. Rio de Janeiro: Record, 2016, p.
367.

47
Trabalhadores, mulheres, LGBT, crianças, adolescentes, idosos, deficientes, indígenas e negros,
todos padecem das insuportáveis mazelas de uma sociedade de classes, tremendamente
desigual, dividida entre exploradores e explorados, opressores e oprimidos, privilegiados e
marginalizados.
Em um mundo onde foi proclamado que as diferenças de classe, gênero e raça foram
superadas, torna-
os grupos vulneráveis, os quais, por óbvio, compõem a maioria populacional (HARDT; NEGRI,
2016, p. 358).
Ora, homofobia32 e heteronormatividade caminham juntas, e, assim, precisam ser abertamente
combatidas. Só desse modo a instituição do casamento poderá concretizar um ambiente
igualitário, aberto e livre de hierarquias opressoras (HARDT; NEGRI, 2016).
Curioso registrar, uma vez mais e de modo específico, que a própria família costuma ser um
locus privilegiado que acaba por perpetuar a hierarquia de gênero, a heteronormatividade e a
constante violência contra homossexuais, algo recentemente confirmado pela Associação SOS-
Homophobie, da França (DUPONT, 2017).
Segundo a SOS-Homophobie, 15% dos testemunhos de vítimas que sofreram homofobia,
praticada em 2016, na França, estão adstritos ao âmbito cotidiano da vida familiar, consistindo
não só em violência física, mas também em perseguição moral e chantagens diversas para que
o indivíduo homossexual se torne heterossexual (DUPONT, 2017).
Afinal, de maneira geral, a estrutura mesma da família contemporânea que encontra no
casamento sustentáculo fundamental - ainda é fortemente pautada em uma visão violenta e
excludente do amor, da diversidade, da liberdade e da harmonia entre pessoas diferentes e
irrepetíveis (HARDT; NEGRI, 2016).
Por oportuno, valioso mencionar, ainda, que a temática sub examine não se resume apenas a
uma questão de tomada de consciência algo que soaria demasiado singelo e leviano -, mas,
sim, de combate tenaz, de reestruturação das instituições sociais, maculadas por uma série de
fatores políticos, econômicos e mesmo culturais.
5 CONCLUSÃO
O presente trabalho contemplou a temática do casamento homoafetivo mediante a coleta de
contribuições propedêuticas e especialmente interdisciplinares, percorrendo desde

32

Ana Maria C. Castro. Direitos Humanos: questões atuais sobre a violência contra LGBT. In: SOUSA, Ana Maria
Viola de; NASCIMENTO, Grasiele Augusta Ferreira; ZUÑIGA, Noé Lópes. Direitos Humanos e Minorias. Lorena:
UNISAL, 2014. Disponível em:
<http://www.lo.unisal.br/direito/semidi2014/publicacoes/livro4/Ana%20Maria%20Carvalho%20Castro%20Capuch
o%20e%20Ana%20Maria%20Viola%20de%20Sousa.pdf>. Acesso em 27 fev. 2017.

48
lineamentos históricos e religiosos até a questão pontual da regulamentação jurídica no
mundo hodierno.
A fim de ilustrar a aludida regulamentação jurídica, recorreu-se ao direito comparado,
trazendo o exemplo da legislação chilena em paralelo ao direito brasileiro.
Vislumbrou-se que o casamento homoafetivo é uma conquista histórica de uma minoria que
por muitos séculos permaneceu perseguida, ou ao menos invisível, obnubilada pela sombra do
preconceito e da intolerância, desprovida de qualquer respeito por sua dignidade humana.
O casamento ou a união homoafetiva, imbricado em toda complexidade e detalhamentos
técnicos inerentes aos ordenamentos jurídicos hodiernos, acaba por ser um fenômeno jurídico
razoavelmente recente, remontando, quando muito, ao início da década de noventa, a partir de
quando os homossexuais - e também todo o movimento LGBT - passaram a desfrutar de maior
visibilidade na sociedade contemporânea.
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2014.
ALI, Ayaan Hirsi. Herege: por que o islã precisa de uma reforma imediata. Trad. de Laura
Teixeira Motta e Jussara Simões. São Paulo: Companhia das Letras, 2015.
ALVES, Alaôr Caffé. Dialética e Direito: linguagem, sentido e realidade. Barueri: Manole, 2010.
BAUMAN, Zygmunt. Amor líquido: sobre a fragilidade dos laços humanos. Trad. de Carlos
Alberto Medeiros. Rio de Janeiro: Zahar, 2004.
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil (1988). Disponível em: <
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 27 fev. 2017.

______. Supremo Tribunal Federal. Ação Direita de Inconstitucionalidade nº 4277/DF.


Requerente: Procuradoria-Geral da República. Relator: Min. Ayres Britto. Brasília, j. 05 maio
2011a. Disponível em: <
http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=628635>. Acesso em: 15
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______. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 1.183.378/RS. Recorrente: K.R.O e
L.P. Recorrido: Ministério Público do Estado do Rio Grande do Sul. Relator: Min. Luis Felipe
Salmão. Brasília, j. 25 out. 2011b. Disponível em: <
https://jurisprudencia.s3.amazonaws.com/STJ/IT/RESP_1183378_RS_1330972067974.pdf?Sign
ature=uG522giztGFE6DM5dphqBiwCfKw%3D&Expires=1487172521&AWSAccessKeyId=AKIAI
PM2XEMZACAXCMBA&response-content-type=application/pdf&x-amz-meta-md5-
hash=6614bce5618ad15c0806d4ac79e931ac>. Acesso em: 15 fev. 2017.

49
______. Projeto de Lei do Senado nº 612 de 2011c. Altera os arts. 1.723 e 1.726 do Código Civil,
para permitir o reconhecimento legal da união estável entre pessoas do mesmo sexo.
Disponível em: <https://www25.senado.leg.br/web/atividade/materias/-/materia/102589>.
Acesso em: 22 fev. 2017.
______. Resolução do Conselho Nacional de Justiça nº 175, de 14 de maio de 2013. Dispõe sobre
a habilitação, celebração de casamento civil, ou de conversão de união estável em casamento,
entre pessoas de mesmo sexo. Disponível em: <
http://www.cnj.jus.br/images/imprensa/resolu%C3%A7%C3%A3o_n_175.pdf>. Acesso em: 22
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CATECISMO DA IGREJA CATÓLICA. Disponível em:
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CHILE. Decreto com fuerza de Ley 1, de 30 de mayo de 2000. Fija texto refundido, coordinado
y sistematizado del Codigo Civil; de la Ley nº4.808, sobre registro civil, de la Ley nº17.344, que
autoriza cambio de nombres y apellidos, de la Ley nº 16.618, Ley de menores, de la Ley nº
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impuesto a las herencias, asignaciones y donaciones. Biblioteca del Congreso Nacional de
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50
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Acesso em: 27 fev. 2017.

51
SUPREMO reconhece união homoafetiva. Notícias STF. 05 maio 2011. Disponível em:
<http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=178931>. Acesso em: 14
fev. 2017.

52
DIREITOS HUMANOS E CINEMA: NOVA METODOLOGIA DO ENSINO JURÍDICO
33

34

RESUMO: No ensino jurídico, um dos principais desafios é o estabelecimento de uma conexão


entre a teoria legislativa e doutrinária com a prática profissional aos futuros aplicadores do
direito. Como metodologia do ensino jurídico, propomos o cinema como um método didático
intraclasse, na qual mediante o exercício de análise, de interpretação, de questionamentos e
reflexões, permitirá aos alunos estabelecer, de maneira versátil, habilidades e competências
para o exercício da função jurídica, enriquecendo, notadamente, sua compreensão acerca da
emblemática temática dos direitos humanos.
PALAVRAS-CHAVE: Ensino Jurídico; Metodologia; Cinema; Direitos Humanos
ABSTRACT: In law's education, one of the main challenges is the establishment of a
connection between the legislative and doctrinal theory with the professional practice to the
future applicators of the law. As a methodology of legal education, we propose cinema as an
intraclass didactic method in which, through the exercise of analysis, interpretation,
questioning and reflection, students will be able to establish, in a versatile way, skills and
competences for the exercise of the legal function, becoming notably enricher their
understanding of the emblematic human right theme.
KEYWORDS: Legal Education; Methodology; Cinema; Human Rights.
1 INTRODUÇÃO
O ensino jurídico no Brasil tem sido muito criticado pelo uso de metodologias tradicionais de
conteúdo exclusivamente técnico. Comumente, os recém-formados deparam com algumas
dificuldades gerando insegurança no exercício de sua profissão.
Essa situação, aliada à constante evolução da sociedade em todos os aspectos, exige das
Instituições de Ensino, novas metodologias e orientações.
As denominadas Metodologias Ativas, embora inicialmente tenham sido objeto de aplicação
nas áreas médicas e de saúde, estudos mais recentes indicam-nas também às demais áreas,
demonstrando maiores preocupações com os formandos que irão trilhar sua atuação
profissional na complexa vida em sociedade.

33
Pós-doutora em Democracia e Direitos Humanos, pela Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra,
Portugal. Doutora e Mestre em Direito das Relações Sociais, pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.
Professora e pesquisadora nos cursos de graduação em Direito da UNIP e da UNIVAP. Professora e pesquisadora na
graduação e no Curso de Mestrado em Direito da UNISAL. Advogada em São José dos Campos, São Paulo, Brasil. E-
mail: amvds@uol.com.br
34
Mestrando em Direito, pela UNISAL. Graduado em Direito pela UNIVAP, Advogado em São José dos Campos, São
Paulo, Brasil. E-mail: lucas.s.almeida@uol.com.br

53
Assim como em outras áreas do conhecimento, o ensino jurídico não pode ficar alheia à
renovação metodológica. Isto porque o sistema de ensino jurídico exige que se forme
profissionais não apenas com extremo saber técnico e legal, mas também com aguçada
capacidade para transformar a realidade, estruturando e reestruturando conceitos, adequando
a hermenêutica para aplicação justa e correta do Direito.
Nesse caminho, o presente trabalho tem como objetivo refletir sobre a influência dos Direitos
Humanos e das novas metodologias, utilizando como ferramenta didática o cinema para
cumprir a missão do ensino jurídico, através de pesquisa, inovação e criatividade, constituir-se
na força imprescindível para construção de uma sociedade inclusiva, egressando profissionais
com uma formação integral e comprometidos com a realização dos Direitos Humanos.
2 O ENSINO JURÍDICO E DIREITOS HUMANOS
O ensino jurídico tem sido pautado, em termos genéricos, por metodologias de caráter
exclusivamente técnico, com transmissão de conhecimentos acabados e imutáveis. Essas
metodologias revelam-se tradicionalmente como meios de condicionar o pensamento do aluno
impondo um conjunto de saberes prontos, direcionando suas interpretações jurídicas a um
ponto de vista fixo e limitado.
Essas atuações provocavam, muitas vezes, insatisfação nos alunos pela desconexão entre o
conhecimento adquirido e a atuação prática, pela ausência de significado entre teoria e vida
prática, pela incoerência entre seus estudos e a profissão, além de gerar insegurança no
exercício profissional na sociedade.
Era, portanto, necessário, repensar o ensino jurídico. Era preciso buscar o sentido da
educação: não apenas como transmissão de conhecimento dos mais velhos aos mais jovens,
mas como um processo que fortalecesse e integrasse o indivíduo na sociedade, que tivesse
capacidade de interferir no meio em que vive, objetivando melhor qualidade de vida, que
exercitasse a solidariedade, que incorporasse valores de respeito à diversidade e à tolerância,
que lutasse pela redução das desigualdades. E isto só seria conseguido, se houvesse uma
educação orientada pelos Direitos Humanos.
Embora a evocação dos Direitos Humanos na educação inicialmente proposta tenha sido uma
tendência estritamente pedagógica no que se refere à formação permanente dos educadores
(PARRA, 2012, p. 150), aos poucos, o processo educativo à luz das diretrizes humanísticas,
assumia mudança sociopolítica e se orientava para a construção não apenas de uma cultura de
direitos humanos, mas abarcava também a dimensão social, envolvendo metodologias que
propunham diálogos de cordialidade entre educando e educadores (VIOLA, 2010, p. 25).
No Brasil, o Programa Nacional de Direitos Humanos adotou a inclusão da "educação e cultura
em Direitos Humanos", como um dos eixos temáticos, explicando que
[...] a educação e a cultura em Direitos Humanos visam à formação de nova mentalidade
coletiva para o exercício da solidariedade, do respeito às diversidades e da tolerância. Como

54
processo sistemático e multidimensional que orienta a formação do sujeito de direitos, seu
objetivo é combater o preconceito, a discriminação e a violência, promovendo a adoção de
novos valores de liberdade, justiça e igualdade. (BRASIL, 2010).
No que tange ao sistema de ensino jurídico, Linhares (2009, p. 69) afirma que há uma luta
interna entre a transmissão de cultura conservadora e uma nova tarefa revolucionária da
educação, de modo que ambas as forças são consideradas "horizontes opostos em direção aos
quais a educação tenta caminhar, mantendo a tensão, o conflito e a dialética entre o velho e o
novo". Isso porque o sistema de ensino jurídico exige, não apenas um saber, ou seja, a
reprodução do conhecimento já existente e consolidado, mas também o fazer, ou seja, a
capacidade de transformar a realidade, estruturando e reestruturando constantemente os
conceitos, adequando a hermenêutica para aplicação correta e justa do Direito.
O documento produzido pela UNESCO - Declaração Mundial Sobre o Ensino Superior no
Século XXI: Visão e Ação35 - em 1998, já enumerava no artigo 1º, a missão e as funções do
ensino superior, que serão as seguintes:
a) educar e formar pessoas altamente qualificadas, cidadãs e cidadãos responsáveis, capazes de
atender às necessidades de todos os aspectos da atividade humana, oferecendo-lhes
qualificações relevantes, incluindo capacitações profissionais nas quais sejam combinados
conhecimentos teóricos e práticos de alto nível mediante cursos e programas que se adaptem
constantemente às necessidades presentes e futuras da sociedade;
b) prover um espaço aberto de oportunidades para o ensino superior e para a aprendizagem
permanente, oferecendo uma ampla gama de opções e a possibilidade de alguns pontos
flexíveis de ingresso e conclusão dentro do sistema, assim como oportunidades de realização
individual e mobilidade social, de modo a educar para a cidadania e a participação plena na
sociedade com abertura para o mundo, visando construir capacidades endógenas e consolidar
os direitos humanos, o desenvolvimento sustentável, a democracia e a paz em um contexto de
justiça;
c) promover, gerar e difundir conhecimentos por meio da pesquisa e, como parte de sua
atividade de extensão à comunidade, oferecer assessorias relevantes para ajudar as sociedades
em seu desenvolvimento cultural, social e econômico, promovendo e desenvolvendo a
pesquisa científica e tecnológica, assim como os estudos acadêmicos nas ciências sociais e
humanas, e a atividade criativa nas artes;
d) contribuir para a compreensão, interpretação, preservação, reforço, fomento e difusão das
culturas nacionais e regionais, internacionais e históricas, em um contexto de pluralismo e
diversidade cultural;

35
O texto da Declaração Mundial Sobre o Ensino Superior no Século XXI: Visão e Ação está disponível na biblioteca
virtual da USP, em www.direitoshumanos.usp.br>acervo. Acesso em 20 fev. 2017.

55
e) contribuir na proteção e consolidação dos valores da sociedade, formando a juventude de
acordo com os valores nos quais se baseia a cidadania democrática, e proporcionando
perspectivas críticas e independentes a fim de colaborar no debate sobre as opções
estratégicas e no fortalecimento de perspectivas humanistas;
f) contribuir para o desenvolvimento e melhoria da educação em todos os níveis, em particular
por meio da capacitação de pessoal docente.
A UNESCO, no Comunicado de 2009 oriundo da Conferência Mundial de Educação Superior
ocorrido em Paris naquela data, reconhecia que a educação superior, avançando na pesquisa,
inovação e criatividade, se constituía na "força maior na construção de uma sociedade
inclusiva e de conhecimento diversificado", estabelecendo, dentre as responsabilidades sociais,
[...] o dever de aumentar o foco interdisciplinar e promover pensamento crítico de forma a
contribuir para o desenvolvimento sustentável, a paz, o bem estar e a realização dos Direitos
Humanos. (UNESCO, 2009).
Desse modo, os alunos não buscam no ensino superior, apenas instrução e técnicas de
pesquisa, mas, a formação integral do ser humano, assim como o estudante de Direito não
deve estar adstrito apenas aos termos da lei, senão também comprometido com a
complexidade da vida em sociedade.
Num cenário de constantes transformações que alteram a realidade nos âmbitos social,
econômico, tecnológico, científico, político, filosófico, cultural, o ensino jurídico não pode
estar afastado dos acontecimentos fáticos. E mais, como afirma Linhares (2009, p. 250), o
próprio docente da área jurídica se vê desafiado para compreender o que se passa ao seu redor,
com a emergência de novas necessidades exigindo dele a reformulação de instrumentos
capazes de satisfazer esses novos direitos.
No Brasil, as diretrizes nacionais para o curso de Direito estão evidenciadas na Resolução
CNE/CES nº 9/2004, incluindo como elemento estrutural do projeto pedagógico, diferentes
"modos de integração entre teoria e prática" (art. 2º, § 1º, inc.V) significando que o aluno deve
consolidar os conhecimentos teóricos e aplicá-los na prática consubstanciado principalmente
nas atividades desenvolvidas no Estágio Supervisionado, o Trabalho de Curso e Atividades
Complementares (BRASIL, 2004).
A preocupação com a formação do aluno de Direito também vem estampado nas disposições
do art. 3º da Resolução CNE/CES 9/2004:
Art. 3º - O curso de graduação em Direito deverá assegurar, no perfil do graduando, sólida
formação geral, humanística e axiológica, capacidade de análise, domínio de conceitos e da
terminologia jurídica, adequada argumentação, interpretação e valorização dos fenômenos
jurídicos e sociais, aliada a uma postura reflexiva e de visão crítica que fomente a capacidade e
a aptidão para a aprendizagem autônoma e dinâmica, indispensável ao exercício da Ciência do
Direito, da prestação da justiça e do desenvolvimento da cidadania. (BRASIL, 2004).

56
Para que o aluno tenha efetivamente este perfil será necessário que ele obtenha orientações de
uma aproximação disciplinar, identificado nas relações interdisciplinares, transdisciplinares e
multidisciplinares com outras áreas do saber. Com todo esse cabedal de instrumentos o
operador do Direito pode aproximar-se do seu objetivo com espírito aberto e flexível,
devidamente capacitado para compreender as rápidas e constantes mudanças sociais,
interpretando as normas com espírito crítico, reflexivo e responsável (LINHARES, 2009, p.
342).
Embora existam obstáculos e desafios para o ensino jurídico, é essencial não perder de vista o
compromisso de considerar a educação, à luz dos Direitos Humanos, um processo capaz de
construir a emancipação de todos os seres humanos, direcionando-lhes os rumos para trilhar o
caminho do exercício pleno da cidadania, permitindo uma existência digna e autônoma.
3 ABORDAGEM METODOLÓGICA
Na avaliação de Mercado (2016, p. 266) as práticas jurídicas preconizadas pelas diretrizes do
curso de Direito continuam sendo adotadas com uma abordagem de ensino tradicional,
geralmente associada às aulas expositivas, monólogas e cansativas.
A constante evolução tecnológica influenciando todo o modo de vida da sociedade, exige que
os profissionais universitários tenham uma formação com novas capacidades, competências e
habilidades para lidar com as transformações.
Com vistas a essa necessidade as Instituições de Ensino Superior intensificaram estudos e
discussões na busca por uma melhor metodologia, atribuindo um novo enfoque, valorizando o
aluno como protagonista do seu próprio aprendizado.
Essas metodologias ficaram conhecidas como Metodologias Ativas. Estudos realizados por
March (2006, p.42) demonstram que não existe um método melhor que outro de forma
absoluta, porém destaca algumas características. Por exemplo, para a aquisição de
conhecimento e compreensão da informação, qualquer método é adequado; já para
desenvolver o pensamento crítico, analítico e criativo, os métodos centrados nos alunos são
mais eficientes, concluindo o autor que, muitas vezes, os resultados dependem muito mais do
esforço, quantidade e qualidade do trabalho pessoal do aluno do que do método em si.
Existem diversos tipos de metodologias identificadas genericamente como ativas. O elemento
que assim as caracteriza é o foco que confere maior autonomia aos estudantes. Desenvolvem-
se sob práticas pedagógicas éticas, críticas, reflexivas e transformadoras (MITRE et al. 2008, p.
2.134).
March (2006, pp 45-50) descreve diversas metodologias, por exemplo: aprendizagem
cooperativo, aprendizagem orientado a projetos, contrato de aprendizagem, aprendizagem
baseado em problemas, estudos de casos e simulação e jogo, todas passíveis de serem
utilizadas com grandes chances de se obter resultados desejados.

57
A aprendizagem cooperativa é a técnica em que os alunos trabalham e são avaliados segundo a
produtividade do grupo, devendo ser determinas claramente as tarefas e as responsabilidades
de cada integrante, requerendo dos alunos a interdependência positiva, interação pessoal,
habilidades para trabalho em grupo.
A aprendizagem orientada a projetos pressupõe a existência de um projeto ou programa de
intervenção profissional, em torno do qual se articulam todas as atividades formativas. O
professor atua como tutor e orientador, permitindo o trabalho multidisciplinar; o aluno é o
protagonista, desenvolve prática de gestão de atividades e aprende a se autoavaliar.
No contrato de aprendizagem o professor desenvolve um trabalho autônomo, exclusivo,
mediante um acordo entre aluno e professor. Permite atenção individualizada do aluno por
parte do professor, que também responde pela definição dos objetivos, da sequência e
supervisão dos estudos. O aluno trabalha sozinho.
A aprendizagem baseada em problemas, é a estratégia, através da qual, os alunos aprendem a
partir de um problema, podendo ser individual ou coletivo. Descrito e delimitado o problema,
devem os alunos buscar a informação para compreendê-lo, refletir e propor a melhor solução.
O professor faz o papel de supervisor, assessor, tutor que gerencia e facilita o processo de
aprendizagem. Aos alunos cabe buscar informações necessárias, investigar, analisar, sintetizar,
trabalhando o aspecto individual e coletivo, desenvolvendo habilidades cognitivas e de
socialização, mantendo uma atitude positiva ante os problemas.
O estudo de casos é uma técnica na qual os alunos analisam situações de concepção
experimental. O professor apresenta um caso real e completo. Os alunos realizam pesquisas
permitindo a discussão e a análise do tema, propõe hipóteses que, ao final, poderão ser
comprovadas ou refutadas. Geralmente é bastante motivador.
A técnica de simulação e jogo é uma prática bastante útil no ambiente escolar, onde os alunos
ainda não estão totalmente preparados para enfrentar problemas reais. São utilizadas
situações inventadas. O professor dirige a situação e estabelece a dinâmica da atividade. Os
alunos experimentam novas ideias e se tornam ativos. Eles são estimulados a valorizar as
descobertas através da criatividade e interpretações, utilizando da própria experiência. É
considerada uma aprendizagem agradável.
Tem-se ainda a técnica do portfólio reflexivo que se constitui numa atividade na qual o
estudante documenta, registra e estrutura as ações, as tarefas e a própria aprendizagem por
meio de um discurso crítico e reflexivo, elaborado de forma contínua, avaliando a atividade
educacional vivenciada; tem como fundamento o intercâmbio de informações (COTTA,
COSTA & MENDONÇA , 2013, p. 1.849). Pode se constituir também numa coletânea de
impressos, registros, memórias, subjetividades, destacando opiniões, vivências, dúvidas,
análises críticas dos temas, práticas, relatos de dificuldades e sentimentos dos estudantes; é um
mecanismo de aprendizagem que utiliza a construção pelo próprio aluno, permitindo o

58
respeito à individualidade, o limite e a especificidade de cada ator, favorecendo o diálogo e
uma aprendizagem significativa (CARDOSO, OLIVEIRA, COSTA & ROZENDO, 2015, p. 444).
Para Mitre et al. (2008, p. 2.135) embora a graduação dure poucos anos, a atividade profissional
para o qual o aluno vai ingressar permanece por vários anos. Nesse espaço os conhecimentos
vão se inovando e as competências vão se modificando, exigindo do profissional "aprender a
aprender", ou seja, estar em constante processo de aprendizagem. Razão pela qual deve ser
pensada numa metodologia progressiva, que implique formar profissionais capacitados mas
flexíveis para intervir com sucesso nos "contextos de incertezas e complexidades".
Mas, adverte March (2006, p. 43), não basta apenas eleger uma determinada metodologia; é
necessário que os próprios docentes estejam preparados para refletir sobre o que fazer, como
fazer e qual resultado se deseja obter para que a estratégia escolhida seja eficiente, podendo,
sempre que necessário mudar os instrumentos utilizados; ter em mente que nas Metodologias
Ativas o aluno é responsável pelo seu próprio aprendizado, que busca, seleciona, analisa e
avalia as informações, assumindo papel mais ativo na construção de seu próprio
conhecimento.
Morán (2015, p. 22) analisa que a metodologia ativa pode trilhar quaisquer caminhos, o
importante é que os projetos estejam ligados à vida dos alunos e às suas motivações. Sua
implementação porém, explica este autor, exige adaptação à realidade de cada instituição seja
em termos físicos, humanos ou técnicos.
De uma forma genérica pode-se afirmar que na denominada Metodologia Ativa, qualquer que
seja o tipo utilizado, deve ser capaz de:
- desenvolver a capacidade intelectual e profissional dos alunos, principalmente a de reflexão,
análise, síntese, arrazoabilidade, avaliação;
- desenvolver destreza de comunicação, principalmente saber escutar, perguntar, defender
uma postura e responder à parte contrária;
- desenvolver valores e atitudes, como a autoestima, autoconfiança e responsabilidade;
- desenvolver capacidade de trabalho em equipe, como o planejamento, organização,
distribuição de tarefas, supervisão;
- desenvolver prática reflexiva, avaliar seus êxitos e fracassos, aprender com erros e planejar a
aprendizagem futura;
- aprimorar técnicas de pesquisa, elaborar hipóteses, sugerir propostas e soluções;
- apreender o enfoque integral, apresentando soluções criativas aos casos ou problemas
apresentados.
- saber colaborar com outras pessoas, mas ao mesmo tempo personalizar individualmente seu
próprio percurso de aprendizado;

59
- favorecer a participação ativa do aluno, de modo autônomo e independente, através da
observação, experimentação, criação e execução, de forma a aprendizagem se tornar
significativa.
Ao professor cabe a tarefa de direcionar, supervisionar, controlar, estimular, valorizar, atuar
como curador, tutor, orientador que cuide, estimule e inspire os alunos a agir.
É conveniente, afirma Morán (2015, p. 25) que o docente adote, equilibradamente, atividades
que desenvolvam competências individuais e coletivas, utilizando nos processos a inter, a
trans e a multidisciplinaridade.
4 O CINEMA COMO ESTRATÉGIA DIDÁTICA
As ferramentas e estratégias para o professor dinamizar o processo de ensino-aprendizagem
nas metodologias ativas são incontáveis. Numa sociedade extremamente digital e midiática,
como a que se apresenta atualmente, Mercado (2016, p. 264-265) sugere a utilização da TIC -
Tecnologia da Informação e Comunicação, a qual se configura como interface de produtos
interativos, multimídia, com incorporação de textos, narrativas, imagens, animações, filmes,
vídeo, som; um programa aberto e permanente, acessível e sem limitação geográfica, podendo-
se valer de toda a potencialidade da internet e recursos online nos seus próprios
computadores.
Dentre essas ferramentas, no presente trabalho escolheu-se o cinema. O cinema, assim
considerado uma produção cinematográfica, reconhecido como "sétima arte", foi sempre
apreciado como arte e entretenimento. O cinema há muito tempo tem contribuído para o
ensino de conteúdos didáticos em várias disciplinas escolares. Caparrós-Lera & Rosa (2013, p.
191) sintetizam que o uso do cinema na escola remonta à época da Primeira Guerra Mundial,
na Europa; no Brasil, tem-se notícia que se iniciou nos anos 1920, com os denominados "filmes
educativos". Desde então o cinema como instrumento didático tem sido difundido nas diversas
áreas de estudo e em diferentes níveis de ensino.
Do ponto de vista pedagógico, Martins (2014, p. 39), faz uma clara distinção entre ferramenta e
estratégia de ensino: o cinema utilizado como ferramenta de ensino, atua como auxiliar para
explicar um determinado tema ou lição. Tem como objetivo o uso meramente exemplificativo
ou ilustrativo. Já o cinema utilizado como estratégia de ensino é admitido em sua
substancialidade, ou seja, deve ser apreciada a película como um todo. Tem como objetivo
levar o aluno a pensar, sentir e refletir, o que implica numa participação ativa do aluno e do
professor.
O cinema como estratégia no ensino jurídico, explica a autora, implica algumas limitações. A
grande dificuldade se encontra no "esforço de contextualização" na qual há grande risco de a
representação dar margem a correlações distorcidas levando também a ignorar aspectos não
jurídicos (MARTINS, 2014, p. 43). E, como resultado do esforço de contextualização, poderá
provocar, não só a perda do foco da disciplina, como trazer risco de fragmentação se a
disciplina não dispuser de um período contínuo de tempo para preparação e execução da
60
atividade, além de lidar também com a questão da conveniência do uso em uma única
disciplina ou de um ciclo extracurricular (MARTINS, 2014, p. 44).
Tendo em mente essas limitações, ambas as formas poderão ser utilizadas, sugerindo uma
posição híbrida: ora como ferramenta, ora como estratégia (MARTINS, 2014, p.53),
dependendo dos objetivos a serem alcançados.
De todo modo, o cinema na educação pode assumir diversas funções (CASTRO, 2016, p. 446-
447):
(a) investigativa - em que os casos hipotéticos retratados no cinema permitem abordar
conceitos, discutir processos, auxilia na elaboração de hipóteses, estimulam pesquisas que se
convertem em informações úteis para a formação do aluno;
(b) interpretativa - como vertente criativa, o cinema incentiva a exploração reflexiva, podendo
o aluno aproveitar as potencialidades para analisar e constituir seu próprio ponto de vista, na
medida em que o leva a questionar e a demonstrar pensamento divergente.
(c) o cinema pode assumir também um papel de agente, na medida em que transmite
conceitos e valores vigentes no momento que retrata a película. Isto permite construir a
história, através da pesquisa para compreender o mundo em que vive o aluno. (CAPARRÓS-
LERA & ROSA, 2013, p. 199).
Sem dúvida, assistir a um filme, é momento de diversão, relaxamento e lazer; embora tenha
sido produzido como forma de entretenimento, a sua utilização no ambiente educacional traz
muitos benefícios: constitui uma inovação prática, facilita o processo ensino-aprendizagem, é
mais atraente para o aluno, promove aprendizagens significativas, estimula pesquisa,
desenvolve sentido crítico sobre temas e problemas, contextualiza o tema do ponto de vista
jurídico, desenvolve capacidade de reflexão, enriquece a capacidade argumentativa, permite
abstração fazendo conexão entre a ficção e a vida real, facilita o debate para um direito
comparado, promove uma visão multicultural promovendo o respeito pela diversidade, entre
tantos outros.
No cinema o direito se mostra em seu contexto social. Normalmente, a produção artística,
embora não retrate efetivamente um problema jurídico, traz em sua narrativa várias
dimensões sociais complexas que se entrelaçam na trama do filme. Este ponto de vista
holístico amplia a visão sobre o conjunto da realidade, levando o aluno à compreensão dos
significados inseridos na própria cultura, transcendendo as dicotomias conhecido-
desconhecido, realidade-ficção, verossimilhança-ilusão, presente-passado e futuro,
aprofundando o campo da visibilidade (SOUSA & NASCIMENTO, 2011, p. 122).
5 CONCLUSÕES
A aplicação das Metodologias Ativas no sistema de ensino jurídico embora indique ser uma
produção positiva, é necessário observar a implicação de algumas variáveis como o contexto,

61
os recursos disponíveis, as características dos alunos, os objetivos, o momento da intervenção,
entre outras.
Por ser uma metodologia é composta de regras o que exige passos para a sua implantação,
critérios e planejamento, portanto. Adiciona-se ainda a existência de diversos tipos, de modo
que a implantação de um, em especial, não significa método excelente, único e exclusivo, pois,
pode não lograr os objetivos esperados.
O importante a concluir é que a Metodologia Ativa propõe a participação ativa do aluno, cuja
responsabilidade pelo aprendizado depende diretamente de sua atividade, tornando-se,
portanto, um desafio para o estudante, de quem se espera alto grau de maturidade, e que seja
capaz de permanecer aprendendo, se inovando, se modificando em constante processo de
aprendizagem significativa.
A utilização do cinema como instrumento de ensino favorece uma visão mais completa da
prática jurídica, pois promove a capacidade de fazer uma transposição dos fatos narrados e
expressos no filme para os fatos convencionais da vida real, reconhecendo as consequências
reais dos efeitos das disposições jurídicas, como fruto de pesquisa, análise, crítica, reflexão,
buscando a argumentação e a fundamentação, sempre à luz das orientações dos Direitos
Humanos.
Ao professor cabe conscientizar-se de seu novo papel, não mais como o cátedra dominador,
mas como orientador, assessor, apoiador e incentivador para fortalecer a autonomia e a
independência do aluno.
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63
64
PENSANDO A EDUCAÇÃO SOCIOAMBIENTAL E O DIREITO HUMANO AO
DESENVOLVIMENTO PELA PROSPECTIVA DA COMPLEXIDADE DE EDGAR MORIN
36

37

Nos dias certos, nos dias exteriores da minha vida,


Nos dias de perfeita lucidez natural,
Sinto sem sentir que sinto,
Vejo sem saber que vejo,
E nunca o Universo é tão real como então,
Nunca o Universo está (não é perto ou longe de mim,
mas) tão sublimemente não-meu.38
Resumo
O trabalho reflexiona sobre o direito humano à educação socioambiental pela prospectiva da
complexidade, divulgada por Edgar Morin, indagando sobre referida realidade que, quando
afrontada, desperta valores da essência humana, trazendo à baila, mudanças de
comportamentos que desembocam atitudes proativas do homem em prol da sociedade, do
meio ambiente e do homem. Valores da essência humana, como é o caso da misericórdia e da
caridade, corroboram a construção da equidade dulcificadora, despertada pela hermenêutica
jurisdicional e celebrada pelo Papa Francisco ao invocar a Ecologia Integral na Encíclica
-natureza e do equilíbrio
ecológico.

36
Pós-Doutora em Democracia e Direitos Humanos pela Universidade de Coimbra - Ius Gentium Conimbrigae.
Graduada, Mestre em Direito das Relações Sociais e Bi-Doutora em Direito Privado e em Direitos Difusos e
Coletivos, todos pela PUC/SP. Professora e pesquisadora nos Programas de Graduação e Pós-Graduação da PUC/SP
e do Mestrado em Direito do UNISAL-
Membro das Comissões de
Direito Civil e da Pessoa com Deficiência da OAB/SP. Avaliadora do INEPE. E-mail: regvboas@terra.com.br -
http://lattes.cnpq.br/4695452665454054

Pós-Doutora em Democracia e Direitos Humanos pela Universidade de Coimbra - Ius Gentium Conimbrigae.
37

Mestre e Doutora em Direito das Relações Sociais pela PUC/SP. Professora e pesquisadora no Programa de
Mestrado em Direito do UNISAL-Lorena (SP). Diretora operacional do UNISAL. Líder do Grupo de Pesquisa

(UNESCO/UNISAL).Professora da FEG/UNESP. Membro da Academia de Letras de Lorena.


38
Fernando Pessoa. Poemas Escolhidos de Alberto Caeiro. Publicado em Portugal por Assírio & Alvim. 1ª Edição.
Porto Editora: Junho 2013, p.118. E-mail: contato@grasielenascimento.com.br -
http://lattes.cnpq.br/6018912730948860

65
Mergulhando no mundo da cultura e da educação socioambiental, reflexiona sobre padrões de
crenças, costumes e comportamentos sociais, deduzindo que a evolução intelectual, moral e
civilizatória é transmitida entre gerações pela linguagem, invisível e naturalmente, afirmando
a relação existente entre a cultura e o modo de vida, pensamento e ação humana.
Vale- preender que os
vícios, virtudes e conhecimentos acumulados por culturas comunitárias distintas, se
manifestam nas populações de nações que possuem regras político-econômico-jurídico-
ambientais distintas, e que, quando mantêm contato, propiciam o desenvolvimento de regras e
comportamentos comuns, arraigando à essência humana valores oriundos de condutas

ura massiva influencia o


desenvolvimento da consciência coletiva, e provoca o reencontro do caráter da cultura
folclórica, que alimenta mentes humanas pelas danças, jogos, filmes e novelas, propiciando a
universalização dos conteúdos das culturas, muitas vezes, manipuladoras.
Trazendo referidas lições à década atual, que enfrenta degradações de todas as ordens, nos
âmbitos social e ambiental, influenciando sobremaneira as culturas contemporâneas, diz-se
que é imperioso o exercício de um agir reflexivo, que concretize no sistema educacional a
obrigatoriedade do ensino socioambiental, capaz de afastar o cidadão da exploração massiva
do hiperconsumo e da participação na degradação do meio ambiente, ambos promovendo a
degeneração dos valores da essência humana, ao mesmo tempo em que influenciam culturas.

-07) é trazido aos estudos para mostrar que as carências do


pensamento redutor podem e devem ser superadas, integrando-se ambos os pensamentos - o
simples e o complexo -, facilitando o reencontro do homem (social) com a natureza, o que deve
ser observado a partir de olhar amplo, atento, articulado, abrangente das diversas e distintas
dimensões do conhecimento, tendo a certeza de ele (conhecimento) é incerto e incompleto. A
educação socioambiental pode propiciar esse ensino-aprendizado, unindo e articulando

(ind
necessidade da proteção aos direitos humanos, considerado em todas as suas dimensões, além
de lembrar o direito humano ao desenvolvimento, que reforça a necessidade de a sociedade
contemporânea compreender e praticar a pluri, a multi, a trans e interdisciplinaridade na
efetivação dos direitos humanos fundamentais, entre os quais o direito humano ao
desenvolvimento.
I - NOTAS INTRODUTÓRIAS: PENSAMENTO COMPLEXO, SOCIEDADE GLOBALIZADA E
EDUCAÇÃO SOCIOAMBIENTAL
Pela prospectiva da complexidade, pensada e divulgada por meio da doutrina de Edgar Morin,
torna-se necessário trazer-se à baila reflexões sobre o direito humano à educação

66
socioambiental, recordando que a realidade social e ambiental vivida pelo homem
contemporâneo é conturbadora e afronta, muitas vezes, valores já consagrados e arraigados na
essência humana, durante a trajetória da sua existência.
Existem valores que devem ser preservados na essência do homem. A misericórdia, a gratidão,
a compaixão e a bondade, entre outros, compreendidos a partir da aproximação e do
envolvimento do homem com o seu semelhante (o outro), são valores que implicam condutas
edificadoras da equidade dulcificadora, revelada pela hermenêutica jurídica, a qual deve ser
reproduzida nos âmbitos social, econômico, político, ético, jurídico, ambiental e educacional,
entre tantos outros, na busca da continuidade da humanidade.
Referidos valores essenciais que vêm sendo celebrados por muitos humanistas, notadamente
por pensadores do Direito, atualmente, estão sendo exaltados com muito entusiasmo pelo

O incrível jesuíta argentino, Papa Francisco, atualmente personagem maior do Estado Católico
Vaticano, conclama a harmonia simbiótica que deve pautar a integração entre o homem e a
sociedade com a natureza, viabilizada pela proteção e manutenção do equilíbrio ecológico,
mantenedor de todos os sistemas ecológicos, necessários à vida, humana ou não.
Entendimento melhor, desse contexto, requer um mergulho no mundo da cultura, da natureza
e da educação socioambiental, perquirindo-se sobre o significado de cada destes planos e
conceitos que envolvem referidas realidades. Requer trazer-se à apreciação, questões
cotidianas relevantes, relacionadas aos padrões das crenças, costumes e comportamentos dos
homens e dos distintos grupos sociais, buscando entender a respeito da evolução intelectual,
moral e civilizatória pelas quais eles passam.
Lembra-se que os valores agregados à consciência individual e/ou coletiva são transmitidos
aos homens e aos seus grupos, de maneira natural e invisível, estando a cultura relacionada aos
modos de vida, cognição e ação, transmitidos pelos homens às futuras gerações, o que se dá
por meio da linguagem.

cultura como vetores relevantes a serem considerados nas reflexões que envolvem a sociedade
globalizada. Esta se manifesta por nações integradas, de culturas comunitárias distintas, e que
buscam, pelo menos em tese, agregar regras políticas, econômicas, jurídicas e ambientais,
conforme necessidades e interesses dos grupos que dela participam. Reforça que a evolução, a
assimilação e a transmissão dos valores essenciais do homem, que se formam a partir da
repetição de comportamentos - que podem ser violentos e/ou virtuosos -, integram a cultura
dos homens e dos grupos de homens, chegando às gerações futuras, esquadrinhando sobre a
influência da cultura massiva, na formação e desenvolvimento da consciência social coletiva.
Extrai-se, também, que a sociedade massiva apresenta características marcantes, recordando o
reencontro do caráter da cultura folclórica nas danças e jogos, em razão da presença viva
67
destas tradições, que aguçam os sentidos humanos (audição e visão, notadamente), fazendo
com que referidas culturas se apropriem e universalizem os conteúdos dos folclores. Exemplo
disso são os filmes que retratam o antigo oeste americano, influenciando tantas outras
culturas, e manipulando sociedades. Perscruta que, somente um agir reflexivo, pode libertar
essa sociedade de referida manipulação, o que deve ser feito, por meio da efetivação de plano
envolvente de ensino-aprendizado de educação socioambiental, capaz de retirar o cidadão da
massa ignorante e vulnerável à ânsia exploratória do consumo e da degradação do meio
ambiente, inclusive cultural. (MORIN, 1977, pp. 54 e 62)
O pensamento complexo de que se vale Morin, para orientar seus principais estudos, supera as
privações do pensamento redutor, integrando o pensamento simples ao complexo,
propagando o conhecimento simbiótico entre o homem e a realidade natural, trazendo à
memória que a complexidade brota da fenda existente no pensamento simplificador, que
ignora resultados truncados, olha a realidade a partir de um só prisma. E mais: pretende o
pensamento complexo articular os campos disciplinares que se desdobram do pensamento
simplificador, porque ele - pensamento complexo - é inter, trans e multidimensional, na
medida em que abarca diferentes realidades e compreende que o conhecimento é incompleto
e incerto39.
Para tanto, imperiosa a efetivação de uma educação socioambiental, que promova um ensino-
aprendizado, que integre as diferentes realidades disciplinares, tendo norte na integração do

de uma educação para os


direitos humanos, que consiga ensinar a todos os valores humanos e ambientais relevantes,
contidos nestes direitos, de tal maneira que todos possam compreender as dimensões dos
direitos humanos fundamentais, a exemplo do direito ao desenvolvimento humano ao
desenvolvimento, que reforça a necessidade de a sociedade contemporânea se abrir para abrir
a sua visão para os estudos interdisciplinares.
II - DIREITO HUMANO AO DESENVOLVIMENTO E A COMPLEXIDADE
A Declaração sobre o Direito ao Desenvolvimento das Nações Unidas de 1986 inclui a

multidisciplinar, de forma a incluir a diversidade da realidade econômica e social dos países


integrados por fa
novos contornos ao direito ao desenvolvimento, notadamente nos âmbitos econômico,
cultural, social e político. A grande contribuição da Declaração de 1986 foi de trazer à tona as
mais diversas perspectivas contempladas pelo direito ao desenvolvimento social, político e
econômico, os quais repercutem nos demais âmbitos: cultural, ambiental, invadindo a esfera
dos direitos humanos e centralizando o homem como sujeito de direitos.

39
MORIN, idem, op. cit.pp.06 e 07.

68
Observa-

Estados, dá lugar ao Direito Humano ao Desenvolvimento (DHD), incentivando e priorizando


o direito preocupado com o indivíduo, o ser humano, identificando - nas dimensões individual
e coletiva - o sujeito do processo de desenvolvimento, indo além do desenvolvimento somente
econômico, na medida em que passa a se preocupar com outras realidades. (DELGADO, 2001,
passim).

não contempla somente realidades, indicadores e níveis de crescimento econômico, já que

E continua Sen, afirmando que na perspectiva da relação desenvolvimento-liberdade, o direito


ao desenvolvimento revela sua vulnerabilidade quando se encontra dissociado dos planos
econômico, social, político, cultural e civil, cultural, entre outros, na medida em que uma
vulnerabilidade pode desencadear outras vulnerabilidades, que se manifestam nos demais
âmbitos, revelando que a negação de uma liberdade implica a negação de outras liberdades.
Entende o autor que as liberdades se completam e não podem ser retiradas do indivíduo, para
que a plenitude do direito humano ao
desenvolvimento consiste na eliminação de privações de liberdade que limitam as escolhas e

10).
Importante a lembrança de que no mundo pós-moderno muitos sofrem privações de suas

associadas a saber ler e fazer cálculos aritméticos, ter participação política e liberdade de
e
-se afirmar, a partir dos ensinamentos de
em especial, no
que condiz ao direito à autodeterminação, no sentido individual e coletivo do indivíduo, para o

unicamente econômica, e abordando as dificuldades carreadas pela globalização, de maneira

rovérsia é a desigualdade no equilíbrio geral dos

somente considerar se os pobres ganham algo com a globalização, mas saber se, nela,
participam com equidade de oportunidades (SEN, 2010, p.32).

69
Pois bem: os estudos e lições de Amartya Sen apontam as dificuldades do homem,
notadamente, do homem pobre (de baixa ou nenhuma renda), em enfrentar as dificuldades
reservadas pelo do mundo globalizado. A desigualdade na distribuição das riquezas (e rendas)
é enorme, gerando desconforto e injustiça entre os homens de grande poder aquisitivo e o de
pequeno ou nenhum poder aquisitivo (o homem pobre), havendo imperiosa necessidade de se
reformar instituições e sistemas de controle sociais, em especial os que se referem à destruição
de rendas, havendo carência na oferta de oportunidades aos mais pobres (de baixa ou
nenhuma renda).
O pensamento de Amartya Sen revela a necessidade de se pensar o direito ao
desenvolvimento, pela prospectiva inter, trans, pluri e multidisciplinar, em que as variadas
realidades que circundam o homem e o meio ambiente se comuniquem, de maneira
integrativa, impondo a proteção, manutenção, tutela e efetivação dos direitos humanos,
notadamente, dos direitos humanos fundamentais, envolventes das dimensões social, coletiva
e difusa, em proveito da existência do indivíduo, notadamente do miserável, pobre e
desprotegido, cujos âmbitos frequentados estejam aquém de referidas proteções.
Nesse sentido, a doutrina do pensamento complexo, apresentada por Morin, perpassa os
caminhos divulgados por Amartya Sen, ao se reportar ao direito ao desenvolvimento, que
considera na sua formação, culturas e individualidades que precisam ser respeitadas, neste
processo de desenvolvimento, lembrando que o caráter universal e definidor da globalização
explica, entre outros, os conceitos de indivíduo, coletivo, costumes e culturas.
Tudo isso, selecionando meta-pontos que são considerados pela doutrina do pensamento
complexo, como vetores relevantes e, muitas vezes, imprescindíveis, no plano da
transversalidade, na medida em que dão o norte e auxiliam a compreensão, distinção e
fundamentação das realidades, as quais transpassam os direitos humanos, desafiando a
participação social, contributiva da distribuição do desenvolvimento, e que se mostra
necessária à doação das ideias sobre o desenvolvimento, consistente no procedimento de
ampliação das liberdades concretas usufruídas pelas pessoas, consideradas como protagonistas
das transformações mundial e das realidades da vida.
No plano internacional consagrado pela resolução n°41/128 da Assembleia Geral das Nações
Unidas, de 04.12.86 - manifestação jurídico normativa, reconhecida como Declaração sobre o
Direito Humano ao Desenvolvimento, restou reconhecida a relevância da participação dos
povos para o Desenvolvimento, reforçando-se a ideia do Direito Humano ao Desenvolvimento,
conforme disposto nos artigos 1º e 2º, que destacam: a) ser o direito ao desenvolvimento, um
direito humano inalienável, em razão de estarem, os povos e a pessoa humana, habilitados à
participação de amplo desenvolvimento, dele desfrutando, e reconhecendo que os direitos
humanos e as liberdades fundamentais são concretizados, plenamente; b) ser a pessoa humana
sujeito central do desenvolvimento, e participante ativa e beneficiária do direito ao
desenvolvimento; b) serem os humanos responsáveis pelo desenvolvimento, individual e
coletivo, considerado o respeito aos direitos humanos e às liberdades fundamentais, além dos
70
deveres, junto à comunidade, os quais, sozinhos, podem assegurar a realização livre e
completa do ser humano, promovendo e protegendo uma ordem política, social e econômica
apropriada ao desenvolvimento; c) os Estados têm o direito e o dever de formular políticas
nacionais adequadas ao desenvolvimento, que busquem o constante aprimoramento do bem-
estar da população e dos indivíduos, com base em sua participação ativa, livre e significativa
no desenvolvimento e na distribuição equitativa dos benefícios daí resultantes.
Apesar de o direito ao desenvolvimento humano sustentável estar previsto em documentos
históricos, requeridos documentos, por si só, não criam melhores condições de vida e bem-
estar aos indivíduos, apesar do reconhecimento da sua importância, com base nas lutas sociais,
que almejam a transformação, envolvente das mudanças, que consideram a pluralidade e
multiculturalidade das sociedades, a partir da transformação e do controle social.
III NOTAS CONCLUSIVAS: DESENVOLVIMENTO HUMANO SUSTENTÁVEL,
EDUCAÇÃO AMBIENTAL E TRANSDISCIPLINARIDADE
Não é suficiente à compreensão humana que o objetivo principal do desenvolvimento social,
econômico, jurídico, cultural e ambiental, entre outros seja somente a busca de ações
participativas para construí-lo, em conjunto com o Estado, sendo necessária a participação do
desenvolvimento humano sustentável, à plena realização do desenvolvimento pleno.
Necessário, também, que a pessoa humana se sinta empoderada e emancipada para poder
participar efetivamente da transformação, criação e manutenção do desenvolvimento humano
sustentável, entendendo-se que o desenvolvimento sustentável requer a participação ativa na
sociedade, a qual exige que os beneficiários deste desenvolvimento sejam, também, indutores
e construtores deste.
A participação social no desenvolvimento humano sustentável mostra-se muito importante,
quando enfrenta o contexto de uma sociedade plural e multicultural, lembrando que no
contraponto das múltiplas maneiras de viver e de ver o mundo, está um espaço globalizado,
orientado por valores do consumismo universal e do capitalismo, que tendem a querer reduzir
o desenvolvimento humano sustentável ao espectro econômico, colocando à apreciação, a
exclusão social e a miséria, notadamente.
Trazendo as lições de Edgar Morin no contexto do desenvolvimento humano sustentável,
aprecia-se, em primeiro lugar, o âmbito em que se realiza a interdisciplinaridade, lembrando,
que no plano educativo, se reúnem componentes curriculares de determinadas áreas de
conhecimento (cursos), interagindo em plataformas de diferentes complexidades, a partir de
perspectivas interdisciplinares, multidisciplinares, pluridisciplinares e transdisciplinares.
Farias e Sonaglio (2013, p. 72-80) conceitua o vocábulo: transdisciplinaridade como sendo
uma proposta relativamente recente no campo epistemológico e representa um nível de
integração disciplinar além da interdisciplinaridade. A importância deste novo método de
análise da problemática, a transdiciplinaridade, pode ser constatada por meio da

71
recomendação instituída pela UNESCO (1998) em sua conferência mundial para o ensino
superior. Jean Piaget afirmou, em 1970, durante um congresso sobre interdisciplinaridade, que
aquela etapa deveria ser sucedida por uma etapa transdisciplinar. A visão transdisciplinar é
deliberadamente aberta, na medida em que ela ultrapassa o domínio das ciências exatas pelo
seu diálogo e a sua reconciliação não somente com as ciências humanas, mas também com a
arte, a literatura, a poesia e a experiência interior
Veja-se, então, que o método interdisciplinar tanto autoriza a prática pedagógica na discussão
e reflexão crítica dos temas abordados em determinados currículos de cursos, propiciando
reflexões contemporâneas sobre as reformas educacionais, assim como, permite diálogos entre
as realidades da vida e as esferas dos saberes, das quais participam as pessoas, em proveito dos
seres, humanos ou não, tendo em vista que o amplo âmbito do meio ambiente deve aqui ser
considerado.
Invoca-se, por exemplo, no plano educacional, a Resolução CNE/CSE nº 9/2009, que instituiu
diretrizes curriculares do curso de graduação em Direito, as quais devem ser observadas e
incluídas no projeto pedagógico do curso de Direito pelas IES. Entre referidas diretrizes,
destaca-se o estabelecimento de eixos de formação geral, fundamental e a prática do bacharel,
com destaque para os eixos fundamental, profissionalizante e prático, relacionados os
conteúdos respectivos, não restritos ao âmbito dogmático, e que devem ser estudados de
maneira sistemática e contextualizada com as transformações sociais, econômicas, políticas e
culturais nacionais internacionais (BISSOLI FILHO, 2012, p. 32).
O Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais e o Sistema Nacional de Avaliação
da Educação Superior (INEP/SINAES, 2012) esclarece sobre a importância da
interdisciplinaridade, lembrando que ela proporciona uma estratégia de abordagem do
conhecimento, que se realiza entre duas ou mais disciplinas ou unidades curriculares, as quais
são oferecidas, de maneira simultânea, facilitando a análise de seus conteúdos, de maneira a
serem pensados com maior abrangência, favorecendo, com isso, uma visão crítica e reflexiva.
Edgar Morin, entende que o conhecimento é melhor compreendido e transmitido a partir de
visão transdisciplinar que promove os saberes, a partir da transversalidade e do
comprometimento com a prática humanista das disciplinas ensinadas nos cursos.
A vigente Constituição da República Federativa do Brasil dispõe no texto do artigo 206, que o
ensino será ministrado baseado nos princípios da igualdade de condições para o acesso e
permanência na escola; da liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento,
a arte e o saber; do pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas, e coexistência de
instituições públicas e privadas de ensino, entre outros.
Observa-se, do texto constitucional, que referidos princípios norteadores do ensino pretendem
garantir ensino-aprendizagem compatível com a contemporaneidade, permitindo a busca de
padrão de qualidade e de reflexões que viabilizem a efetivação do sistema educacional, a partir

72
da construção, transmissão e renovação constante do conhecimento, que coloque em
destaque, entre os personagens do âmbito educacional, notadamente o aluno e o professor.
Edgar Morin, em entrevista concedida ao Programa Roda Viva, na TV Cultura/SP, em 18.12.00,
afirma que todo pensamento é uma construção e reconstrução do saber, que percebe e admite
falhas e imperfeições. Nesse sentido, alimentar a reforma do pensamento exige a não
fragmentação do mesmo, com a finalidade de se ganhar um maior conhecimento da
humanidade.
Saber o que existe no entorno do homem e do meio ambiente é compreender a existência
simbiótica de ambos - homem e meio ambiente -, que se revela harmoniosa, exigindo do
homem um agir reflexivo, em prol da vida, da saúde, da alimentação adequada, da educação
ambiental, do combate: à desnutrição, à pobreza, à miséria e ao desrespeito ao meio ambiente
ecologicamente equilibrado, em proveito das presentes e futuras gerações.
No contexto, conhecer os problemas humanos, que invocam a problemática ambiental, de fato,
é um desafio que invoca as diferentes esferas dos saberes, unindo conhecimentos das ciências,
tecnologias e políticas públicas, conhecendo e expandindo as variadas culturas, em respeito às
diversidades.
Trazer o pensamento de Edgar Morin no contexto das lições do presente artigo, que procura
refletir sobre a cultura, a educação socioambiental, os direitos humanos, notadamente o
direito humano ao desenvolvimento, tudo realizado pela prospectiva da complexidade, requer
ir além das disciplinas; requer pensar na reforma do pensamento, a partir da compreensão da
transversalidade, que se utiliza do pensamento organizador que religa as realidades humanas,
selecionando meta-pontos de vista, que reúnem conhecimentos e aproxima as ciências da
humanidade, a partir de uma ética que produz um ensino-aprendizagem, concretizando o
direito fundamental à educação socioambiental, que valoriza o direito ao desenvolvimento
humano, resgatando valores da essência humana, respeitando os ecossistemas.
A transversalidade adotada vai além das disciplinas porque as atravessa, valendo-se de meta-
pontos, que sustentam à construção dos saberes e reforçam as reflexões humanizadas.
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76
O DIREITO HUMANO À ALIMENTAÇÃO ADEQUADA
40

41

Resumo
O artigo reflexiona sobre o direto que todo homem tem à alimentação adequada, abordando a
sua relação com a fome, a pobreza e a alimentação inapropriada, revelando questões
relevantes sobre a fome no Brasil e as maneiras existentes de se assegurar e garantir a
efetividade do direito à alimentação, adotando-se políticas públicas voltadas à alimentação
adequada, a partir de abordagem à Segurança Alimentar e Nutricional (SAN). Observa que
todo homem tem direito a um conjunto (mínimo) de direitos humanos, consagrados por
diversos ordenamentos jurídicos como direitos fundamentais, os quais devem ser respeitados
pelos demais, estando presente entre referidos direitos, o direito social à alimentação.
Inadmissível que nesta era contemporânea, milhões de pessoas, vivam, ainda, miseravelmente,
sem desfrutar uma alimentação, minimamente adequada às sobrevivências (o mínimo
existencial). O estudo constata que o cenário mundial, infelizmente, é dividido entre os ricos e
os pobres, estando estes privados de muitos dos seus direitos fundamentais, entre os quais,
notadamente, o direito social à alimentação. Diante do modelo social e econômico nacional,
principalmente com relação à ausência de programas e de política pública relacionada ao
abastecimento alimentar, um grande desafio nacional a ser enfrentado se refere à
concretização do acesso ao direito humano à alimentação adequada, saudável e sustentável, o
qual invoca a Lei nº 11.346/2006, que ao criar o Sistema Nacional de Segurança Alimentar e
Nutricional (SISAN) objetiva assegurar à população carente, referido direito humano à
adequada alimentação. O estudo mostra que, nos últimos anos, ocorreram avanços sociais no
Brasil (e no mundo), relacionados ao combate à fome e à pobreza, mas que, ainda estão muito
distantes de consolidar a superação da fome e da miséria, no país (e no mundo). Conclui que
há muito, ainda, a ser fazer no tocante ao acesso à alimentação, e que uma sociedade baseada

40
Pós-Doutora em Democracia e Direitos Humanos pela Universidade de Coimbra - Ius Gentium Conimbrigae.
Graduada, Mestre em Direito das Relações Sociais e Bi-Doutora em Direito Privado e em Direitos Difusos e
Coletivos, todos pela PUC/SP. Professora e pesquisadora nos Programas de Graduação e Pós-Graduação da PUC/SP
e do UNISAL/Lorena. Coordenadora do Projeto de Pesquisas "Direito, Complexidade e risco" e do Projeto
"Fundamentos e efetividade da tutela dos Direitos", integrante Projeto "Direito Minerário", todos da PUC/SP.
Professora e Pesquisadora no Programa de Mestrado em Concretização dos Direitos Sociais, Difusos e Coletivos do
UNISAL-Lorena (SP), integrando do Grupo de Pesquisas Minorias, discriminação e efetividade de direitos e do
Observatório de Violência nas Escolas (UNESCO/UNISAL). Membro das Comissões de Direito Civil e da Pessoa
com Deficiência da OAB/SP. Avaliadora do INEPE. E-mail: regvboas@terra.com.br -
http://lattes.cnpq.br/4695452665454054
Mestranda em Direito pelo Centro Universitário Salesiano de São Paulo. E-mail: durcelana@hotmail.com
41

http://lattes.cnpq.br/1543810316645867

77
caminhos à uma nova e mais justa civilização.
Palavras-chave: Direito Humano; Fome; Alimentação Adequada. Justiça Social
Resumen: El artículo reflexiona sobre el derecho que todo hombre tiene a una alimentación
adecuada, dirigiéndose a su relación con el hambre, la pobreza y la dieta inadecuada,
revelando preguntas relevantes sobre el hambre en Brasil y las formas existentes para asegurar
y garantizar la eficacia el derecho a la alimentación, la adopción de políticas públicas a una
alimentación adecuada, a partir enfoque de la seguridad alimentaria y nutricional (SAN). Se
señala que toda persona tiene derecho a un conjunto (mínimo) de los derechos humanos
consagrados en los diferentes sistemas legales como los derechos fundamentales que deben ser
respetados por los demás, estando presente entre esos derechos, el derecho social a la
alimentación. Inaceptable que en esta era contemporánea, millones de personas viven, incluso
miserablemente, sin disfrutar de una alimentación, mínimamente adecuado para la
supervivencia (el mínimo existencial). El estudio revela que el escenario global, por desgracia,
se divide entre los ricos y los pobres, y éstos se ven privados de muchos de sus derechos
fundamentales, incluyendo, en particular, el derecho social a la alimentación. Antes de que el
modelo económico y social nacional, en particular en cuanto a la ausencia de programas y
políticas públicas relacionadas con el suministro de alimentos, un reto nacional importante
que se plantea se refiere a la ejecución del acceso al derecho humano a una alimentación
adecuada, sana y sostenible, que invoca la ley N ° 11.346 / 2006 para crear el Sistema Nacional
de Seguridad alimentaria y nutricional (SISAN) tiene por objeto garantizar a la población
necesitada, dijo derecho humano a una alimentación adecuada. El estudio muestra que en los
últimos años, ha habido progreso social en Brasil (y el mundo), en relación con la lucha contra
el hambre y la pobreza, pero son todavía muy lejos de la consolidación de la superación del
hambre y la pobreza en el país (y en el mundo). Se llega a la conclusión de que todavía hay
mucho por hacer en cuanto al acceso a la alimentación, y una sociedad basada en la justicia
social debe proporcionar a cada uno, el acceso al "pan de cada día", elogiando el camino a una
nueva y más justa la civilización.
Palabras clave: derecho humano; el hambre; Una alimentación adecuada. justicia social
INTRODUÇÃO
Este estudo aborda o Direito Humano à Alimentação Adequada (DHAA), considerado um
direito fundamental, internacionalmente, assegurado a todos os indivíduos, reconhecido,
desde 1948, na Declaração Universal dos Direitos do Homem.
Aborda a questão da pobreza, contudo, a pobreza aqui discutida é a pobreza extrema, aquela
que mata, pois nesse caso o cidadão não tem acesso ao mínimo existencial. Grande parte da
população mundial se encontra dentro dessa faixa de pobreza e isso acontece por não lhe ser
garantido o direito econômico, a falta de trabalho para adquirir o mínimo para seu sustento.

78
Alguns até tem um rendimento, contudo, esses rendimentos não são suficientes para que se
possa adquirir uma alimentação adequada.
Neste contexto temos no mundo mais de um bilhão de pessoas em situação de insegurança
alimentar, principalmente nos chamados países em desenvolvimento, segundo a Organização
das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura, FAO).42 Essa mesma FAO afirma que
vivemos em um planeta que tem potencial para alimentar o dobro da sua população, e mesmo
assim, muitos morrem de fome, ou doenças ligada a alimentação inadequada.
Diante desse cenário mundial o Brasil assumiu o compromisso de garantir de forma prioritária
as questões referentes ao direito à alimentação, acrescentando-o na Constituição Federal
dentre os direitos sociais ali assegurados, e, também, através da Lei nº 11.346, de 15 de setembro
de 2006, a chamada Lei Orgânica da Segurança Alimentar e Nutricional, criando o Sistema
Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (SISAN).
É bom ressaltar que a Segurança Alimentar e Nutricional (SAN) de que trata a lei acima,
consiste na disponibilização de alimentos bem como o acesso dos indivíduos a essa
alimentação e que seja de qualidade e quantidade suficiente para a ingestão dos nutrientes
para a nutrição humana.
Ainda há muito a se fazer nessa seara, pois diante do modelo social e econômico nacional,
principalmente com relação à ausência de programas e de política pública relacionada ao
abastecimento alimentar, um grande desafio nacional a ser enfrentado, diz respeito à
concretização do acesso ao direito humano à alimentação adequada, saudável e sustentável.
Hoje, o Brasil é referência no tocante às políticas públicas de combate à fome. O Programa
Fome Zero busca garantir a inclusão social e a conquista da cidadania da população mais
exposta à fome.
Muitos esforços estão sendo realizados para garantir o DHAA, existindo, porém, uma grande
insegurança alimentar no país, o que impõe a necessidade de uma revolução cultural da
sociedade e do Estado à efetividade dos direitos humanos.
1 A POBREZA E A FOME VIOLANDO DIREITOS HUMANOS
O artigo 3º III, da CF/88 estabelece como objetivos fundamentais da República a erradicação
da pobreza, da marginalização e a redução das desigualdades sociais. Tem-se, no Brasil, a
Constituição da Repúblic
voltada à proteção dos direitos sociais, entre outros, selecionado para a presente pesquisa, o
direito à alimentação, que conclama a problemática da pobreza.
De início, discute-se a respeito do conceito de pobreza. É certo que a pobreza não é um
fenômeno fácil de ser conceituado, podendo ser apreciada por vários prismas, entre outros o
do biológico, do médico, do político, do sociólogo, do economista, considerada situação de que,

42
Disponível em: <http://www.fao.org/news/story/es/item/20694/icode>.

79
para a maioria das pessoas, a pobreza está relacionada diretamente ao fator econômico, sendo,
pois, medida com base nos rendimentos, a partir de fundamentos que levam em conta,
unicamente análises econômicas.
Ocorre que o interesse atual é a pobreza, com a visão de violação dos direitos humanos, e a
partir de uma vida digna. Não se pode falar em dignidade da pessoa humana quando milhões
de pessoas vivem em condições indignas por causa da pobreza. A definição de pobreza ora
esperada é aquela que está em desacordo com os direitos sociais, econômicos e,
principalmente, aquela que ofende aos direitos humanos e não unicamente aos que estão
relacionados aos padrões econômicos.
No sentido de violação dos direitos da pessoa humana, (Grove 2006, p. 52) destaca-se que:
... la pobreza es una privación o violación de los derechos humanos económicos, junto con
violaciones asociadas de derechos humanos sociales, culturales, civiles y políticos
interdependientes e nterrelacionados. Esta definición de la pobreza basada en los derechos
humanos implica reconocer la dignidad y el valor de cada ser humano y el derecho por igual de
todas las personas a gozar de sus derechos humanos inherentes e indivisibles. El aceptar la no
discriminación y la igualdad, que son el centro de los derechos humanos, incluye el
compromiso con la igualdad sustantiva o de hecho (igualdad de circunstancias básicas, así
como de los resultados) además de una igualdad formal o de derecho (igualdad ante la ley, en
potencia, a pesar de las enormes desigualdades estructurales). Los derechos humanos surgen
ante la interrogante de cuáles son los requisitos para llevar una vida digna.
Amartya Sen analisa a influência da situação da pobreza como um fator de desnivelamento
social e de redução do potencial de capacidades básicas dos indivíduos, e não somente como
expressão de baixa renda, ou ainda, de renda inferior ao patamar pré-estabelecido, fontes que
são vinculadas à situação de pobreza, esta considerada em razão das questões econômicas,
sociais e ambientais, tudo isso considerado e em conformidade com o conceito rawlsiano de
bens primários, conforme expõe o autor, a seguir.
(...) pessoas diferentes podem ter oportunidades completamente diferentes para converter a
renda em outros bens primários... a relação entre os recursos e a pobreza é variável e
profundamente dependente das características das respectivas pessoas e do ambiente em que
vivem tanto natural como social. (...) vários tipos de contingências que resultam em
variações na conversão da renda (SEN, 2010, p. 289).
Na visão de Sonia Rocha a pobreza pode ser vista de duas maneiras: a pobreza absoluta
intimamente ligada às questões de sobrevivência física do ser humano, quando não se atende
as suas necessidades básicas (mínimas) da vida e a pobreza relativa definida por ela como

(Rocha, 2011, p. 11), assim, na pobreza relativa o mínimo vital para a sobrevivência do ser
humano já lhe é assegurado.

80
Ainda, analisando-se o fenômeno pobreza, tem-se a concepção de Tauã Lima Verdan Rangel
que a conceitua unindo o campo econômico e social, e sob o prisma da dignidade da pessoa
humana, assim afirmando
(...) a pobreza baseia-se na acepção de necessidades fundamentais, estando em debate
várias dimensões inerentes à noção de recursos, abarcando rendimentos, bens de
capital, benefícios em espécie associados ao trabalho. Nesta perspectiva, pode-se
considerar como pobre aquele que não tem o que comer, é analfabeto, não tem
moradia, vive em condição precária de higiene, ou seja, não tem acesso a condições
mínimas de uma existência digna. (Rangel, 2015, p.80/81)
Então, de maneira geral, tem-se a pobreza como uma situação econômica e social
caracterizada pela falta daquilo que é necessário à subsistência de um ser humano,
encontrando-se muitos conceitos de pobreza, ao qual se junta a fome.
A pobreza não pode ser considerada apenas como um problema social, vai muito além disso,
ela é a negação dos direitos humanos aos mais pobres, lembrando que os direitos humanos
devem ficar indignados com essa humilhação, porque violam a dignidade humana.
Nesse sentido, afirma Habermas que o direito humano surge após a constatação da opressão,
da humilhação, da violação da dignidade humana, que é considerada fonte moral dos direitos
humanos. (Habermas, 2012, p.11)
Quando se afirma ser a pobreza uma violação dos direitos humanos, constata-se que os
direitos dos mais pobres estão limitados, ficando eles, privados dos bens necessários à
sobrevivência, entre os quais se encontra, notadamente, a alimentação. Esta deveria ser
assegurada a todos, resguardando a dignidade de cada um.
A ausência de alimentação retira a dignidade do ser, promove a pobreza e a degradação do ser
humano, motivando conflitos sociais, razões pelas quais ela deve ser combatida, sempre. A
erradicação da pobreza é dever do Estado e direito assegurado a todo cidadão.
Não há dúvidas de que, em qualquer parte do mundo, a pobreza é entendida como ausência ou
a privação de uma necessidade básica do ser humano, oscilando, muitas vezes, quanto à
intensidade desta privação. A falta de rendimentos impede que o indivíduo se alimente e,
sendo a alimentação, a primeira condição básica à sua sobrevivência, caso não efetivada,
poderá ocasionar o seu estado de indigência e, também, a sua morte.

universal e mata milhões de pessoas.


Na década de 40, Josué de Castro constata pelas suas investigações, que existe um grande
número de pessoas passando fome no Brasil, e no mundo. Tanto é verdade que, naquela época,
já se desenhava o mapa da fome no Brasil e a geografia da fome no mundo. Quase oitenta anos
Castro (1984) ensina que o direito

81
à alimentação é o primeiro dos direitos humanos e, talvez, o mais essencial deles, pois sem os
nutrientes vitais básicos, o ser humano não pode, literalmente, ser humano (CASTRO, 1984).
Hoje, o cenário nacional e do mundo é bem parecido com o cenário dos anos 40 e, conforme
pesquisa de 2013, do IBGE, em cada quatro lares brasileiros um vive em algum grau de
insegurança alimentar, significando que sete bilhões e duzentos bilhões de pessoas convivem
com a fome no Brasil. O Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF, 2017) lança alerta
de que um milhão e quatrocentas mil crianças, enfrentam o risco de morrer de fome, em
quatro países: Iêmen, Nigéria, Somália e Sudão do Sul, este último declarando, oficialmente,
-se que o acesso à
alimentação (incluída a água) é considerado um direito humano básico, porque da alimentação
depende a sobrevivência do homem, implicando a sua falta, violação grave aos direitos
humanos.
A fome está sempre relacionada às desigualdades sociais, em qualquer lugar do mundo. O
enfraquecimento da fome, enfraquecendo as desigualdades sociais, requer imperiosa prática
da equidade, por parte do Estado, o qual deve desenvolver políticas públicas voltadas à
satisfação de necessidades dos mais carentes. O Estado deve facilitar, nesse sentido, uma
melhor distribuição de rendas e um maior acesso de todos aos bens e serviços públicos, dando
celeridade às inclusões sociais.
A redução das desigualdades sociais, meta estabelecida pelo artigo 3º da vigente Constituição
da República Federativa do Brasil, só poderá ser alcançada concretizando-se direitos sociais,
entre eles, o direito à alimentação adequada que é prioritário e de todos os seres humanos,
corrobora o combate à fome, e reduz o número de vítimas desta fatalidade, que é mundial.
O direito de se ter, todos os dias, o alimento adequado sobre a mesa, é de todo ser humano. E,
veja-se, é um direito do homem, e não, somente, um ato de caridade esperado por ele. O
Estado e qualquer ser humano deve sempre prestar a caridade, ofertando alimentos a quem
estiver deles desprovido, porém, cada homem, antes de se dizer satisfeito com a alimentação
recebida, de maneira caridosa, deve sim, cobrar do Estado a efetividade desta prestação,
porque a alimentação adequada é dever do Estado perante os homens do seu povo.
Alimentar-se de maneira adequada propicia o enfrentamento do estado da fome, corrobora a
realização da dignidade de cada ser, estando ele alimentado, e reduz as desigualdades sociais,
caminhando sempre na direção da concretização do princípio da solidariedade.
Deseja-
frente, afastando-se tabus antigos que, no lugar de auxiliarem no combate à fome, de um lado,
propiciam um afastamento de todos da problemática, um sentimento de repulsa e de
distanciamento e, de outro lado, corroboram a vergonha, a baixa-estima e a indignidade
daquele que sente fome. O combate à fome é uma luta de toda a sociedade, que busca a
concretização da igualdade social, razão pela qual ela deve ser denunciada, sempre.

82
2 DESAFIOS PARA GARANTIR A EFETIVAÇÃO DO DIREITO HUMANO À ALIMENTAÇÃO
ADEQUADA (DHAA)
O pensador alemão Bertolt Brechet43 uma boa posição social, falar

O pensador, ao criticar situações da vida burguesa, se vale da comida, reforçando a


importância e a prioridade da alimentação à vida saudável. A alimentação adequada está
inserida no rol dos direitos sociais (artigo 6º da CF), todos conquistados, ao longo dos séculos,
pelos movimentos sociais, passando a ser reconhecidos na esfera internacional, por meio de
documentos importantes, entre outros, a Declaração Universal dos Direitos do Homem (1948);
o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (1966), e as Diretrizes
Voluntárias da FAO/ONU (2002).
Alexandre de Moraes, assim conceitua os direitos sociais
(...) são direitos fundamentais do homem, caracterizando-se como verdadeiras
liberdades positivas, de observância obrigatória em um Estado Social de Direito, tendo
por finalidade a melhoria das condições de vida aos hipossuficientes, visando à
concretização da igualdade social, sendo consagrados como fundamentos do Estado
Democrático, pelo art. 1º, IV, da Constituição Federal. (Moraes, 2002, p. 202).

República Federativa do Brasil, no dia 04 de fevereiro de 2010, pela Emenda Constitucional nº


64. Sua tramitação no Congresso Nacional durou em torno de sete anos com a PEC nº 47/2003.
Os atores sociais que militam na política de segurança alimentar compreenderam a
importância de se acrescentar a alimentação, no rol meramente exemplificativo dos direitos
elencados no caput do artigo 6º. E ao atribuir status constitucional ao direito à alimentação,
apreendido como direito social, o Estado assume o dever de alimentar adequadamente e
prioritariamente o seu povo.
Lembra-se que o artigo 1º da Lei nº 11.346/06 dispõe ser dever do Estado assegurar o Direito
Humano à Alimentação Adequada. Referida Lei Orgânica de Segurança Alimentar e
Nutricional - LOSAN - nº 11.346/06 - foi sancionada em 15 de setembro de 2006, criando o
Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (SISAN), o qual se refere à
disponibilização de alimentos e ao acesso dos indivíduos à alimentação, que deve ser de
qualidade e suficiente quantidade à ingestão de nutrientes, de maneira a nutrir o indivíduo, já

Bertolt Brechet é um pensador alemão, nascido em Augsburg (Alemanha), em 1898, importantíssimo personagem
43

do teatro, do século XX, e autor de inúmeros poemas críticos da arte e da vida burguesa, corroídas pela Primeira
Grande Guerra. Deixa o seu país (1933), com a ascensão de Hitler, exilando-se na Dinamarca e, após, nos Estados
Unidos da América, onde sobrevive realizando trabalhos para Hollywood. Volta à Alemanha em 1948, após residir
na Suíça, falecendo em Berlim, em 1956. Disponível em: < http://lionel-fischer.blogspot.com.br/2013/04/bertolt-
brecht-reflexoes-e-poemas-muito.html >. Acesso em: 12 abr. 2017.

83
que a alimentação que nutre cada indivíduo, não pode ser considerada alimentação, mas sim,
um ato de atulhar o estômago.
Nessa esteira, o Direito Humano à Alimentação Adequada e Segurança Alimentar e
Nutricional, pode ser conceituado como
(...) realização do direito de todos ao acesso regular e permanente a alimentos de
qualidade, em quantidade suficiente, sem comprometer o acesso a outras necessidades
essenciais, tendo como base práticas alimentares promotoras da saúde, que respeitem
a diversidade cultural e que seja social, econômica e ambientalmente sustentáveis.
(GAMBA e MONTAL, 2009; p.44).
O direito à alimentação saudável e adequada é derivado do próprio direito à vida. É um direito
humano e fundamental à existência humana, porque é indispensável à sobrevivência do
homem, garantindo a sua dignidade e liberdade, além da igualdade entre todos os homens. O
direito à vida é considerado, por muitos, como o mais fundamental de todos os direitos
humanos, na medida em que, por ele, todos os outros direitos fundamentais podem ser
realizados.
As políticas públicas devem corroborar a concretização do direito humano à alimentação
adequada, melhorando as condições de insegurança alimentar enfrentada por todos os
indivíduos.
Contemporaneamente, as políticas públicas nacionais de combate à fome, colocam o Brasil em

Alimentar e Nutricional (SAN), ao buscar a inclusão social e a conquista da cidadania da


população, que se encontra exposta à fome.
Na década de 90, o sociólogo Hebert de Souza, Betinho44, fica conhecido como símbolo da

popul
número de 32 milhões de brasileiros vivia na linha abaixo da pobreza, índice de pobreza este,
considerado como um dos maiores enfrentados pelo Brasil, e que acaba ensejando o programa

45

objetiva garantir a segurança alimentar da população brasileira, assegurando cidadania às


populações vulneráveis à fome. Projeto ambicioso, propõe medidas que objetivam combater a
fome, criando modelo de desenvolvimento que, no lugar de descartar pobres e miseráveis, os
congrega, o que ocorre em todas as esferas sociais (federal, estadual e municipal). É

44
Disponível em: <http://quemdisse.com.br/frase/quem-tem-fome-tem-pressa/13555/ Acesso em > 14 abr.2017.
45
Disponível em: <http://quemdisse.com.br/frase/quem-tem-fome-tem-pressa/13555/ Acesso em > 14 abr.2017.

84
coordenado pelo Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS), que
desenvolve mais de trinta programas complementares, os quais se dividem em quatro eixos
articulados de acesso: aos alimentos, ao fortalecimento da agricultura, à geração de renda, e à
articulação, mobilização e controle social.
Nesse sentido, o eixo nº 1 que cuida do acesso aos alimentos, contém os programas e ações de
transferência de renda, alimentação e nutrição, além do acesso à informação e educação. O
eixo nº 2, que versa sobre fortalecimento da agricultura, busca o desenvolvimento de ações
específicas na agricultura familiar, promovendo a geração de renda no campo, e o aumento da
produção de alimentos para o consumo. O eixo nº 3, que trata da geração de renda, discorre
sobre o incentivo à economia solidária e desenvolve ações de qualificação da população de
baixa renda, corroborando a sua inserção no mercado de trabalho. O eixo nº 4 cuida da
articulação, mobilização e controle social, estimulando a sociedade a firmar parcerias com o
governo federal, realizando campanhas de combate à fome e de incentivo à segurança
alimentar e nutricional.
O combate à efetivação do Direito Humano à Alimentação Adequada (DHAA) enfrenta
inúmeros desafios, lembrando que a população brasileira tem o direito de exigir do Estado a
prestação deste direito humano, cujo cumprimento tem sido negligenciado por grande parte
da população brasileira.
E a pergunta que se faz: a quem cabe a fiscalização do cumprimento desta prestação pelo
Estado? Cabe a todos e a cada um da população, cabe às organizações da sociedade civil,
envolvidas de maneira direta com a defesa destes direitos, cabe às entidades estatais, que
exercem esta função social de fiscalização e defesa destes direitos. Afinal, está-se diante de um
interesse e direito coletivo e difuso, que pertence a todos, e deve ser protegido e fiscalizado por
todos.
Necessária uma consciência humanizada para se entender o significado dos direitos humanos,
e no que consiste o desrespeito a eles, consciência esta que deve existir por parte de todos:
detentores destes direitos, representantes da população junto ao Estado, incluídas as
organizações da sociedade civil, além do próprio Estado, por meio dos órgãos encarregados
desta defesa.
Necessária a confiança do povo em seus governantes e representantes, os quais devem estar
comprometidos com a população, atentos às problemáticas sociais, fazendo com que os
direitos humanos conquistados sejam garantidos e concretizados para todos e,
prioritariamente, para os mais carentes e menos afortunados, que enfrentam situações de
miserabilidade, sentindo fome, frio e desesperança.
Ainda, desafiando a proteção do Direito Humano à Alimentação Adequada (DHAA), faz-se
necessário o fortalecido das relações internacionais entabuladas entre o Brasil e países, as
quais objetivam o fortalecimento destes direitos humanos, relativamente à alimentação
adequada e à soberania alimentar. O Brasil encara desigualdades socioeconômicas, étnico-

85
raciais e de gênero, bem como enfrenta situações lamentáveis que envolvem a saúde, a
alimentação e a nutrição, além do difícil acesso às políticas públicas do SAN.
Considera-se essencial a promoção e a erradicação da pobreza extrema e da insegurança
alimentar moderada e grave, que ocorre em todo o território nacional. A desestabilidade é
percebida em diversos âmbitos, entre os quais se alerta para a qualidade e quantidade
suficiente de água a ser consumida diariamente. Muitas famílias enfrentam situações de
insegurança hídrica relacionada à produção de alimentos da agricultura familiar, pesca e
aquicultura, entre outros. O robustecimento das políticas relacionadas à reforma agrária
acontece pelo acesso à terra realizando o reconhecimento, a demarcação e a regularização das
terras ou territórios indígenas, quilombolas e demais povos e comunidades tradicionais. E, a
implementação da Política Nacional de Abastecimento Alimentar (PNAA) reforça o acesso
regular e permanente, que propicia a alimentação adequada e saudável.
3 DIREITO FUNDAMENTAL SOCIAL À ALIMENTAÇÃO NO MUNDO GLOBALIZADO: (IN)
EFETIVIDADE DE UMA ALIMENTAÇÃO ADEQUADA
O cenário mundial contemporâneo mantém nítida a divisão entre os ricos e os pobres, estes
últimos desprotegidos e privados dos seus direitos fundamentais, entre os quais, notadamente,
o direito social fundamental à alimentação.
No Brasil, a vigente Constituição da República Federativa do Brasil insere os direitos sociais,
em seu texto, o que, toda
sociais não conseguem ser concretizados, imediatamente, a todos do povo, o que implica não
possuírem referidos direitos, o status de direito fundamental autoaplicável, eis que Estado
coloca inúmeras restrições à efetividade destes direitos. Veja-se, entre outros, o programa

vinculados à uma escola, ou seja, devem os menores estarem estudando para que a família
tenha direito à referida bolsa. Ocorre, porém, que o Estado, muitas vezes, não consegue
garantir a matrícula dos menores, devido à falta de escolas, na região.
Relativamente ao direito à alimentação, a situação não é muito diferente da situação
relacionada à bolsa família e a dependência do vínculo escolar dos menores. É certo que os
governantes do Brasil têm sinalizado para acabar com a fome e a pobreza extrema no país, no
entanto, esses mesmos governantes, não conseguem garantir o empoderamento da população
pobre e carente, porque entre outras situações que retiram esta força das pessoas, o
desemprego, que é uma realidade gritante e crescente no país, impede a conquista desta
condição de empoderamento.
A efetivação do Direito Humano à Alimentação Adequada (DHAA) é necessária, devendo a
segurança alimentar e nutricional serem respeitadas e concretizadas como fatores de
equilíbrio das políticas e do desenvolvimento de uma nação, de um país.
Nessa esteira, Amartya Sen (2000, p. 189) afirma que

86
Uma pessoa pode ser forçada a passar fome mesmo havendo abundância de alimentos ao seu
redor, se ela perder o seu potencial para comprar alimentos no mercado, devido a uma perda
de renda (por exemplo, em consequência de desemprego ou de um colapso no mercado dos
produtos que essa pessoa produz e vende para se sustentar). Por outro lado, mesmo quando
um estoque de alimentos declina acentuadamente em um país ou região, todos podem ser
salvos da fome com uma divisão melhor dos alimentos disponíveis (por exemplo, criando-se
emprego e renda adicionais para as potenciais vítimas da fome).
Sen revela que a fome enfrentada pelos mais carentes pode se dar, entre outros fatores, pela
perda da renda, em razão do desemprego ou, também, pela diminuição súbita ou derrocada do
mercado relacionado ao produto produzido ou vendido por aquele transformado em vítima da
fome. Afirma ser possível a realização de uma divisão dos alimentos disponíveis, adotando-se
medidas sociais como a de se criar empregos extras para as vítimas potenciais da fome.
Tendo em vista que a globalização aumenta as desigualdades sociais, alijando pessoas da
sociedade, primando pela integração do mundo em um só mercado econômico, sendo que, ao
integralizar, potencializa o poder econômico dos países mais fortes, enfraquecendo os países
de economia mais fraca, reflete-se sobre a possibilidade (ou não) de estes países - de economia
mais fraca - conseguirem assegurar o mínimo existencial para a sua população, o mesmo
sucedendo no Brasil.
Apesar de o Brasil possuir programas sociais excelentes, conforme já revelado, a efetividade
dos mesmos, não ocorre com a mesma frequência, descumprindo expectativas anunciadas,
conforme se extrai das comunidades que acomodam os mais empobrecidos.
Constata-se que falta a educação, e que quando ela acontece, muitas vezes, não é inclusiva,
faltando saneamento básico, em decorrência da ausência de saúde, além de que faltam
empregos para a população, a qual, sem renda, não consegue adquirir alimentação adequada,
considerada a alimentação como um direito humano, que deveria ser garantido pelo Estado,
mas que não o é, de maneira efetiva. Verifica-se, também, que ocorre um descaso dos políticos
em relação às demandas da sociedade, a qual empobrecida ao extremo, ainda hoje, não tem o
que comer e, muitas vezes, não possuem nem o teto para morarem e/ou morrerem.
E, por fim, contemporaneamente ocorre um visível esvaziamento dos programas de
transferência de renda, inclusão social e acesso aos serviços públicos, lembrando-se que sem
inclusão social, não se efetiva a alimentação adequada, que reclama ausência da fome e
qualidade da dieta, objetivando garantir a todos uma competente segurança alimentar.
CONCLUSÃO
Os estudos reportam o intérprete concluir que, de alguma maneira, as políticas de erradicação
da fome e da pobreza extrema, vêm apresentando alguma falha na sua concretização,
necessitando de uma revisão no que toca à inclusão social, pois, do contrário não se teria a
estimativa do Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF, 2017) de 1,4 milhão de

87
crianças, correndo o risco de morrer de fome, em quatro países: Iêmen, Nigéria, Somália e
Sudão do Sul, somente no ano de 2017.
Um dos grandes desafios enfrentado pelos atores sociais que militam na política de segurança
alimentar f
artigo 6º da vigente Constituição da República Federativa do Brasil. Atingido referido desafio,
o Estado Brasileiro assume de forma prioritária o compromisso com a erradicação da pobreza
extrema e da insegurança alimentar com a efetivação do Direito Humano à Alimentação
Adequada (DHAA).
São evidentes os avanços e as conquistas no que se refere ao Direito Humano à Alimentação
Adequada (DHAA), contudo a segurança alimentar ainda caminha lentamente, iniciando os
seus primeiros passos, em relação ao Estado brasileiro. A realização efetiva do Direito Humano
à Alimentação Adequada e da segurança alimentar e nutricional, no contexto da soberania
alimentar, implica uma série de desafios a serem encarados pelo Estado e pela população
brasileira, no mundo. Necessário ressaltar que grande parte da população desconhece os seus
direitos fundamentais, e ainda, observam a questão alimentar como uma caridade, produzida
pelo Estado, não como uma garantia de direitos, faltando a referidas pessoas, informações
sobre seus direitos humanos e, consequentemente, desconhecimento das políticas públicas
ligadas à segurança alimentar. Não se conhecendo, não se há de cobrar do poder público o
cumprimento e a efetivação destes direitos.
A erradicação da pobreza extrema é o maior desafio a ser enfrentando por todos os
governantes no mundo na efetivação do Direito Humano à Alimentação Adequada.
ls, faz constar no prefácio
uma reflexão que merece destaque ao afirmar que o que move as pessoas, com muita sensatez,
não é a compreensão de que o mundo é privado de uma justiça completa coisa que poucos
esperam mas que à volta das pessoas, existem injustiças, notadamente, claras e remediáveis,
para serem eliminadas (Sen, 2011, p.9).
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90
UMA REFLEXÃO SOBRE JUSTIÇA AMBIENTAL NO BRASIL DO SÉCULO XXI: A
PARTIR DO CONCEITO TOMASIANO DE JUSTIÇA
46

47

conceito
de justiça desenvolvido particularmente na Suma Teológica de Santo Tomás de Aquino. A
reflexão procura, antes de tudo, situar as questões 57 e 58 da segunda seção da Segunda Parte

ampla de toda a Suma. Os artigos especificamente considerados dessas questões dizem


respeito à relação entre Direito e Justiça e à essência da Justiça, definida como hábito de uma
vontade reta, perpétua e constante com o objetivo de dar a cada um o que lhe é devido,
ressaltando-se a característica da alteridade, pois a justiça é sempre relativa a outrem. A
retomada deste tema volta-se, nesse trabalho, à problemática específica da Justiça Ambiental
no Brasil, cuja noção implica um direito ao meio ambiente seguro e ecologicamente
equilibrado, tal qual o previsto no caput do art. 225 da Constituição Federal de 1988,
visualizado de forma sistêmica, sob os aspectos políticos, sociais, culturais e econômicos.
Assim, a realização de uma verdadeira Justiça Ambiental no Brasil ensejaria um meio
ambiente ecologicamente equilibrado, que possa ser democraticamente usufruído, e que, ao
mesmo tempo, haja o respeito às identidades e à dignidade das comunidades e dos cidadãos.
Nesses termos, o conceito de Justiça tomasiano vai ao encontro dessa temática, e por meio da
ideia, sobretudo de alteridade, traz um contributo relevante e atual para a questão.
Palavras-chave: Direito; Justiça; Pensamento Tomasiano; Justiça Ambiental.
INTRODUÇÃO
O tema da justiça está situado no contexto da filosofia política, social e no âmbito do Direito.
Trata-se de uma categoria com definições oriundas da Antiguidade e que acompanharam o
processo civilizatório até os dias de hoje. Trata-se, portanto, de um tema que pode ser refletido
em várias áreas e diferentes contextos, inclusive no que concerne a problemas que envolvem a
relação entre o homem e o seu meio, e as consequências que podem advir dessa relação.
O estudo objetiva analisar a temática da justiça ambiental, a partir do conceito de justiça
desenvolvido particularmente na Suma Teológica de Santo Tomás de Aquino, enquanto
essência da justiça, definida como hábito de uma vontade reta, perpétua e constante com o

46
Doutor em Teologia pela Pontificia Università Lateranense (Roma). Pós-Doutor em Democracia e Direitos
Humanos pela Universidade de Coimbra. Professor e Pesquisador no Programa de Mestrado em Direito do Centro
Unisal U.E. de Lorena (SP). E-mail: lino.rampazzo@uol.com.br
47
Doutora em Direito pela Universidade Federal de Santa CatarinaUFSC. Pós-Doutoranda em Direito pela
Universidade de São Paulo USP. Professora e Pesquisadora no Programa de Mestrado em Direito do Centro Unisal
U.E. de Lorena (SP). E-mail: patricianbianchi@gmail.com

91
objetivo de dar a cada um o que lhe é devido, ressaltando-se a característica da alteridade, já
que a justiça é sempre relativa a outrem.
Atualmente enfrenta-se um momento crise, o que demanda uma reflexão a respeito da forma
como a Humanidade vem se relacionando com o mundo natural. Não se pode negar o quanto a
problemática ambiental afeta a vida dos indivíduos, e, por isso, faz-se também importante uma
investigação no sentido de se entender as diferenças apresentadas na distribuição dos riscos e
danos ambientais.
A pesquisa volta-se à problemática específica da Justiça Ambiental no Brasil, cuja noção
implica um direito ao meio ambiente seguro e ecologicamente equilibrado, tal qual o previsto
no caput do art. 225 da Constituição Federal de 1988, visualizado de forma sistêmica, sob os
aspectos políticos, sociais, culturais e econômicos.
O estudo parte da ideia de realização de uma justiça ambiental que ensejaria um meio
ambiente ecologicamente equilibrado, que possa ser democraticamente usufruído, e que, ao
mesmo tempo, haja o respeito às identidades e à dignidade das comunidades e dos cidadãos.
Nesses termos, o conceito de justiça tomasiano vai ao encontro dessa temática, e por meio da
ideia alteridade, traria um contributo relevante e atual para a questão.
Assim, será abordado, no subitem 1, o tema a colocação dos temas do Direito e da Justiça na
Suma Teológica. No subitem 2, tratar-se-á da relação entre o Direito e a Justiça, além de, no
subitem 3, a Essência da Justiça, todos tendo-se em vista os trabalhos de São Tomás sobre o
assunto.
No subitem 4, tratar-se-á do tema justiça ambiental em seus aspectos mais relevantes, tendo-
se em vista o presente estudo e, ao final, far-se-á uma relação entre o conceito de justiça
tomasiano e a justiça ambiental. Para tanto, utilizar-se-á o método indutivo como método de
abordagem, com base em pesquisa bibliográfica e documental.
Ressalta-

Humanos organizado em Santiago (Chile) pela Universidad Católica Silva Henríquez. Parte-se,
pois, da teoria de Justiça, desenvolvida por Santo Tomás para aplicá-la na área especificamente
ambiental dos Direitos Humanos.
1 A COLOCAÇÃO DOS TEMAS DO DIREITO E DA JUSTIÇA NA SUMA TEOLÓGICA
A questão 57 da segunda parte da Segunda Parte da Suma de Santo Tomás, que é considerada
sua obra principal, leva por título: De Iure, Sobre o Direito. Antes, porém, de indicar os artigos
em que a questão se divide, Santo Tomás mostra como este tema específico está inserido na
divisão da Suma Teológica.
A estrutura dessa obra é articulada em três Partes. A Primeira Parte (questões 1-119),
dogmática, sobre Deus em si mesmo, sobre o mistério da Trindade e sobre a atividade criadora

92
de Deus (anjos, seres corpóreos, homem). Na Segunda Parte, moral, Santo Tomás considera o
homem, impelido pela Graça, na sua aspiração de conhecer e amar a Deus para ser feliz no
tempo e na eternidade. Esta Parte, por sua vez, está subdividida em mais duas seções: a
primeira seção da Secunda (prima secundae I-II: questões 1-114), e a secunda seção da Secunda
(secunda secundae II-II: questões 1-189).Primeiro (I-II), ele apresenta os princípios teológicos
do agir moral, estudando como, na liberdade de escolha humana para praticar o bem,
integram-se a razão, a vontade e as paixões, às quais se acrescenta a força que dá a Graça de
Deus, bem como a ajuda que é oferecida também pela lei moral. Analisam-se, aí,
especificamente os seguintes temas: o fim último, os atos humanos, as paixões, as virtudes, os
vícios e os pecados; a lei, a graça.
Sobre este fundamento, Santo Tomás delineia a fisionomia do homem que vive segundo o
Espírito e que se torna, assim, um ícone de Deus (II-II). Aqui, ele estuda as três virtudes
teologais - fé, esperança e caridade -, seguidas do agudo exame de mais de cinquenta virtudes
morais, organizadas em torno das quatro virtudes cardeais - prudência, justiça, temperança e
fortaleza. Termina, então, com a reflexão sobre as diferentes vocações na Igreja.
Na terceira Parte da Suma (questões 1-90), novamente dogmática, Santo Tomás estuda o
Mistério de Cristo por meio do qual se pode alcançar novamente a Deus Pai. Nesta seção,
escreve páginas sobre o Mistério da Encarnação e da Paixão de Jesus e sobre os sete
sacramentos (TORREL, 2003).
Vê-se, pois, que a questão do Direito está inserida na temática mais ampla da Justiça; ou, em
outros termos, o Direito é considerado como que uma expressão da Justiça. De fato, a questão
57, Sobre o Direito, começa, desde seu

2 A RELAÇÃO ENTRE O DIREITO E A JUSTIÇA


Como foi acima afirmado, a questão 57 leva por título: De Iure, Sobre o Direito; e começa,

nossa, quando corresponde,


segundo certa igualdade, a uma ação de outro; assim, a paga da recompensa devida por um

Ele continua, depois, comparando a Justiça às outras virtudes, no que diz respeito ao ato
virtuoso. A retidão, nas outras virtudes, leva em conta o modo como o ato é praticado pelo
agente. Mas a retidão, na Justiça, diz respeito ao ato em si, independentemente do modo como

certamente

93
Na resposta às objeções, Santo Tomás esclarece que os termos podem ter vários significados.

passou a

qual conhecemos o justo; ulteriormente para significar o lugar onde se aplica o Direito: neste
-se

A afirmação de Santo Tomás fica mais clara se for considerada a língua latina na qual ele

ius (Direito) foi empregada


primeiramente para significar a coisa justa Aliás, isso fica ainda mais claro lendo o

Vê-se, pois, que ius (Direito) e iustitia (Justiça), começam com as mesmas letras. E, para
confirmar isso, lê-

(em latim iustari).


Pode-se, neste sentido, considerar a procedência mais remota do termo ius: trata-se da raiz
sânscrita yu, que continha a ideia de vínculo, obrigação; ou da raiz yoh, de onde provêm os
termos latinos iurare e iuramentum: quer dizer, jurar e juramento, fórmula religiosa que tem
valor de lei, com a ideia de sagrado, pois procede da divindade. No fundo, ius não vem de
iustum, nem de iustitia, mas o contrário (CAMELLO, 2002, p. 239).
Santo Tomás, pois, faz questão de distinguir sempre, para evitar a confusão dos possíveis
significados dos termos. é habitual serem os nomes desviados de sua primeira origem

às vezes,
Em suma, a Justiça é aquela virtude que regula as relações com os outros, à diferença das
outras virtudes. Por isso, o ato em si, independentemente da intenção do agente tem que ser
objeto da Justiça. Entende-se, pois, que o
Direito, por um lado, está subordinado à Justiça; e, por outro, é distinto dela ao ponto que

Como foi visto acima, é no tratado da justiça que se encontra o estudo de Santo Tomás sobre o

doutrina do direito de Santo Tomás nesta parte da Suma denominada tratado das leis (I- IIae,

94
O fato dele discutir a teoria do direito fora do tratado das leis evita a interpretação de que o
direito (ius) significa tão somente a lei (lex).
A esta altura pergunta-se qual seria a contribuição original de Santo Tomás na sua reflexão
sobre o direito. Pode-se dizer que ele demarcou, na questão, estes aspectos fundamentais: a
intrínseca relação entre ética e direito, pois este é considerado como objeto da justiça; e o
desfazimento do recorrente equívoco de muitos, até hoje, em circunscrever, confinar e
confundir direi -se no pressuposto de que o homem
comum, que nunca leu uma lei sequer, tem plena consciência da justiça, ou injustiça de seu
comportamento, graças à natural aptidão para apreendê-
2006, p. 349).
3 A ESSÊNCIA DA JUSTIÇA

apresenta dividida em doze artigos, dos quais vão ser considerados os dois primeiros: 1º o que é
a justiça; 2º se a justiça é sempre relativa a outrem.
O problema levantado no primeiro artigo é logo especificado nestes termos: Se foi
convenientemente definida pelo jurisperitos a justiça como a vontade constante e perpétua de
dar a cada um o que lhe pertence. A definição citada é trazida do primeiro livro do Digesto.
Santo Tomás responde que tal definição é apropriada se for entendida devidamente. E
raciocina da maneira seguinte: toda virtude é um hábito, do qual provêm os atos bons. Por isso
a virtude vai ser definida por um ato bom, conforme o específico de cada virtude. Mas o
específico da justiça diz respeito aos atos relativos a outrem. Neste sentido diz-se
corretamente que a justiça consiste em dar a cada um o que lhe pertence. Mas, para que o ato
seja virtuoso, é necessário que seja voluntário, estável e firme. A esse respeito, ele cita
Aristóteles, para quem o ato de virtude exige três condições: que o sujeito o pratique da
maneira consciente, com livre escolha para um fim devido; e de maneira constante. Mas a
primeira destas condições está incluída na segunda, pois, sempre segundo Aristóteles, o que
fazemos por ignorância é involuntário. Por isso, para definir a justiça, primeiro enuncia-se a
vontade. Em seguida, a constância e a perpetuidade designam a estabilidade de tal ato. Conclui
aceitando esta definição de justiça no sentido que o hábito é especificado pelo ato. Retoma,
pois a mesma definição, colocando antes o termo hábito. Aliás, ele diz que a forma devida de
tal definição seria a seguinte: a justiça é um hábito pelo qual, com vontade constante e
perpétua, atribuímos a cada um o que lhe pertence.
Na resposta às objeções ele especifica que está falando não de uma vontade qualquer, mas de
uma vontade reta, pois a justiça é um hábito pelo qual agimos e queremos com retidão.
Em seguida, quanto à perpetuidade, ele especifica que não é suficiente praticar a justiça por
algum tempo, pois até pessoas injustas de vez em quando praticam atos justos. Não basta
querermos observar a justiça por algum tempo [...] é preciso que tenhamos a vontade perpétua
de observar sempre a justiça.
95
Percebe-se claramente a referência à concepção de virtude, que se encontra em Aristóteles,
citado cinco vezes neste artigo. Neste sentido, para ter o bem não é suficiente conhecê-lo pelo
saber, como queria Sócrates, mas precisa praticá-lo: e não apenas uma vez, mas repetidas
vezes, com uma sucessão de atos até formar um hábito (MONDIN, 2003).
Logo em seguida explica os adjetivos perpétua e constante. O primeiro se refere ao propósito
perpétuo de observar a justiça. E o segundo ao firme perseverar em tal propósito.
Distingue, depois, a justiça praticada pelo juiz daquela praticada pelos súditos; no primeiro
caso, mandando e dirigindo; e no segundo, a modo de execução.
Em suma, a justiça se define como hábito de uma vontade reta, perpétua e constante com o
objetivo de dar a cada um o que lhe pertence.
Para a questão levantada no segundo artigo, Se a justiça é sempre relativa a outrem, Santo

que podem agir diversamente. Mas os atos humanos p

quem fere, através das mãos.

existam agentes diversos: por exemplo, a razão, o irascível e o concupiscível. Neste sentido
apenas metaforicamente pode-se afirmar que existe justiça, no mesmo homem, quando a

pôr
Foi nessa perspectiva de alteridade humana, como componente imprescindível da justiça

é aquela razão pela qual se mantém a sociedade dos homens entre si e também a comunidade

-se apenas o agente; e na

ma pessoa. Isso significa que,

aristotélica, ocupando posição de destaque no referido sistema, mas também marcou toda a
reflexão ético-jurídica da civilização ocidental (VAZ, 1999, p. 124). E não foi por outra razão que

96
Santo Tomás de Aquino incluiu a justiça entre as chamadas virtudes cardeais, as quais
estabelecem as necessárias e significativas articulações das ações virtuosas.
O tema da justiça tornou-se tão emblemático, no mundo ocidental, que ela acabou focalizada
como sendo, historicamente, a referência nuclear para as reflexões desenvolvidas a respeito da
alteridade, que caracteriza as relações pessoais.
Desse modo, tem-se afirmado que a questão da justiça, no mundo ocidental, conduziu a se
pensar em uma forma de razão holística e harmonizadora, que se constituiu em uma instância

coletivamente, parece conferir ao direito, ao poder e à liberdade um significado existencial,

Agora pode-se perguntar como a Justiça se refere à alteridade na temática ambiental.

4 JUSTIÇA AMBIENTAL: ASPECTOS RELEVANTES

-se em 1982, numa demanda promovida por uma comunidade de


afro-americanos de Afton, Estado da Carolina do Norte - EUA, contra a instalação de um aterro
de alta toxidade e alto risco para aquela comunidade. Estudos realizados na época
demonstraram que 75% de aterros formados por resíduos tóxicos estavam localizados em
locais onde havia a predominância de afro-americanos, embora tais comunidades
representassem apenas 20% da população da região. Na época já se alegava a distribuição
desigual dos riscos ambientais nos Estados Unidos, onde as comunidades negras eram mais
vulneráveis (BAGGIO, 2014, p. 106).
Esse representou um marco das reivindicações por justiça ambiental. Foi na década de oitenta
que o chamado Movimento de Justiça Ambiental constituiu-se nos Estados Unidos, numa luta
que agregou a defesa de questões de cunho social, ambiental, territorial, com a luta pelos
direitos civis. Aquele movimento consolidou-se como uma rede multicultural e multirracial
nacional, e, posteriormente, internacional, envolvendo grupos comunitários, entidades de
direitos civis, organizações de trabalhadores, igrejas e intelectuais, todos contra o chamado
racismo ambiental (ACSELRAD et al., 2009, p. 23).
Destaca-se que, naquela época, o pensamento hegemônico considerava democrática a
distribuição dos riscos ambientais. A ideia era de que problemas ambientais giravam em torno
de temas como escassez e desperdício, num contexto em que o mercado se apresentava como
entidade reguladora das questões ambientais.
O movimento em favor de justiça ambiental no Brasil obteve destaque após o Seminário
Internacional Justiça Ambiental e Cidadania, realizado em 2001, no Rio de Janeiro. No âmbito
desse evento foi criada a Rede Brasileira de Justiça Ambiental, com o propósito de reverter os
quadros de injustiças ambientais no país. A Rede Brasileira de Justiça Ambiental definiu
97
econômico e social, destinam a maior carga dos danos ambientais do desenvolvimento às
populações de baixa renda, aos grupos raciais discriminados, aos povos étnicos tradicionais,

Assim, com o advento do movimento por justiça ambiental, houve uma redefinição da questão
ambiental, incorporando-se ao tema também as lutas por justiça social. Nesses termos, a noção
de justiça ambiental estaria atrelada à ideia do direito a um meio ambiente seguro, salutar e
equitativo, onde a definição de meio ambiente seja alargada, abrangendo suas dimensões
ecológicas, físicas construídas, sociais, políticas, estéticas e econômicas (ACSELRAD et al.,
2009, p. 16).
Importante esclarecer que a desigualdade ambiental pode se manifestar tanto sob a forma de
proteção ambiental desigual, como pelo acesso desigual aos recursos ambientais. A proteção
desigual dá-se com relação à não implementação de políticas públicas ambientais, causando-se
riscos, intencionais ou não, normalmente para a população mais vulnerável e carente. Nesses
termos, Acselrad (2009, p. 73) destaca que
Se há diferença nos graus de exposição das populações aos males ambientais, isso não decorre
de nenhuma condição natural, determinação geográfica ou casualidade histórica, mas de
processos sociais e políticos que distribuem de forma desigual a proteção ambiental.
Nesse sentido a pobreza resultaria de processos sociais de aviltação de terras, de capital
cultural e de tradicionais meios que suportam as condições de existência, de disciplinamento
de corpos e mentalidades, além da exploração da força de trabalho para a produção de bens e
riquezas que são apropriados por outrem. Esse sistema apresentar-se-ia como um dos motores
centrais da produção da desigualdade social (ACSELRAD et al., 2009, p. 76).
Normalmente as causas da desigualdade na proteção ambiental são atribuídas: ao mercado,
como por exemplo, por meio de empresas poluidoras que se locomovem e instalam-se com
certa facilidade em países em desenvolvimento; por ações ou omissões políticas, como as
omissões políticas governamentais na instalação de grandes empreendimentos poluidores; à
desinformação, já que os riscos e perigos são geralmente ocultados, causando-se, com isso, um
retrocesso aos direitos mínimos, sobretudo aqueles ligados ao exercício da cidadania, o acesso
ao poder público e ao Poder Judiciário; à corrupção endereçada ao poder público local e às
populações, normalmente de baixa renda, com o propósito de se evitar ações ou críticas que
eventualmente possam ser pertinentes em razão de instalação de empresa ou
empreendimento que cause importante impacto ambiental.
A sociedade contemporânea pode ser caracterizada como uma sociedade pós-moderna, de
risco, uma sociedade globalizada. O modelo societário atual trouxe algumas benesses, porém
criou muitos problemas complexos e dentre eles a concentração de riquezas e a manutenção
ou aprofundamento das desigualdades tanto sócio-econômicas, quanto no que se refere à
sujeição aos riscos ambientais, e ao acesso aos bens ambientais.

98
Nesse ponto - apesar de entender que a globalização significa bem mais que o neoliberalismo,
e que a globalização neoliberal não representa a única de realização possível, definindo-a como

promovidas no universo econômico das políticas neoliberais - Bello Filho (2006, p. 83-85)
-lo, é a
globalização neoliberal ou globalismo. Os efeitos deletérios da globalização é que devem ser
atacados para perm
O fato é que, no Brasil, as políticas públicas implementadas nas últimas décadas não foram
capazes de diminuir sensivelmente as desigualdades sociais, o que levou ou manteve, no
mínimo, a prosperidade de uns e a miséria de outros, pela simples falta de condições de
desenvolvimento pessoal e/ou oportunidades. Isso porque a globalização econômica é
considerada essencialmente desigual, e se desenvolve em benefício de poucos.
Baggio (2014, p. 277) des
determinante para o estabelecimento de novas relações éticas e culturais que romperam com a
A autora afirma que dentre as transformações
encontra-se um diferente olhar valorativo dos seres humanos em relação à natureza. Assim, se
num primeiro momento houve o acúmulo de riquezas, num segundo - em razão da sociedade
de consumo e da exploração desordenada dessa natureza - veio a crise ambiental e todos as
nefastas conseqüências que a caracterizam.
Com o Estado Liberal houve a perspectiva de uma justiça distributiva, como possível solução
para as mazelas sociais e econômicas pós Revoluções Industriais. Veio, então, o Estado Social,
com perfil intervencionista, e, ainda assim, não cumpriu as promessas da modernidade.
O sistema capitalista produziu debates sobre a justiça na modernidade. Esses debates têm
como centralidade a concentração da riqueza e o aumento das desigualdades sociais, o
desequilíbrio e os riscos ambientais, que obscurecem a ideia de igualdade, tão defendida no
período das revoluções burguesas.
Importa destacar que, segundo Acselrad et al., a apropriação social do mundo material
representa processos de diferenciação social dos indivíduos, a partir das estruturas desiguais
de distribuição, acesso, posse e controle de territórios ou de fontes, fluxos e, inclusive,
estoques de recursos materiais. Estas práticas, segundo o autor, são historicamente
constituídas, gerando-se dinâmicas de reprodução dos diferentes tipos de sociedades, com seus
respectivos padrões de desigualdade. Para Acselrad et al (2009, p. 15-16), as técnicas
[...] são condicionadas pelas formas sociais e culturais, ou seja, pelas opções de sociedade e
pelos modelos culturais prevalecentes. Aquilo que as sociedades fazem com seu meio material
não se resume a satisfazer carências e superar restrições materiais, mas consiste também em
projetar no mundo diferentes significados - construir paisagens, democratizar ou segregar
espaços, padronizar ou diversificar territórios sociais etc.

99
Do acordo com o autor, em torno da ideia de sustentabilidade, abre-se a luta entre os que
pretendem alterar ou reforçar a distribuição de poder tanto sobre mercados como sobre
mecanismos de acesso a recursos do meio material, apresentando-se como portadores da nova
eficiência ampliada - a da utilização sustentável dos recursos. Assim, a noção de
sustentabilidade poderia trazer para a agenda pública sentidos extra-econômicos que
acionariam categorias como justiça, democratização e diversidade cultural (ACSELRAD et al.,
2009, p. 16)
O direito ao desenvolvimento foi inscrito na Declaração Universal dos Direitos Humanos de
1948. Contudo, o Brasil está longe da consecução daquele desenvolvimento proposto, tendo-se
em vista as profundas desigualdades em todos os âmbitos, vivenciadas no país. O rumo do
nosso desenvolvimento precisa ser reorientado, a fim de se promover, sobretudo, a inclusão
social e a sustentabilidade ecológica, além da manutenção de uma economia capaz de prover
às necessidades mínimas da população, conferindo-se, com isso, condições mínimas para o
desenvolvimento humano. Nesses termos, Sachs (2009, p. 15) afirma que:
O Brasil tem todas as condições para se tomar um laboratório desse desenvolvimento
incluclente e sustentável, valendo-se da sua extraordinária dotação de recursos naturais: a
maior biodiversidade do mundo, a maior floresta tropical em pé, recursos hídricos
abundantes, com a exceção do Polígono das Secas, climas variados e propícios à produção de
biomassas. Essas vantagens comparativas naturais poderão ser potencializadas pela pesquisa e
pela organização social adequada aos processos de produção.
Por fim, a existência de um direito a um desenvolvimento sustentável e o estabelecimento da
chamada justiça ambiental envolvem uma complexidade tão importante quanto à justiça em
qualquer âmbito que ela se faça necessária, já que aqueles dependem de políticas públicas
comprometidas com critérios de sustentabilidade, e com a visão de meio ambiente
(ecologicamente equilibrado) estabelecida como norma no art. 225 da Constituição Federal de
1988.
5 O CONCEITO DE JUSTIÇA TOMASIANO E A JUSTIÇA AMBIENTAL
Viu-se anteriormente que para Santo Tomás a justiça apresenta-se como uma virtude que
regula as relações com os outros, ao contrário das outras virtudes que se circunscreveriam ao
ser individual. Santo Tomás demarcou a intrínseca relação entre ética e direito, e este é
considerado por ele como objeto da justiça.
A desigualdade de exposição das comunidades aos danos ambientais, além da desigualdade de
acesso aos bens ambientais, não decorre de nenhuma condição natural, mas de políticas
públicas e sistemas sociais e políticos que distribuem de forma desigual a proteção ambiental,
assegurando um meio ambiente mais ou menos salutar, conforme a estratificação social em
que o indivíduo ou a comunidade se apresenta.
A justiça relaciona-se constantemente com as questões sociais, econômicas, políticas,
ambientais entre outras. A justiça está inserta no mundo contemporâneo e as discussões sobre
100
ela normalmente giram em torno tanto sobre o seu significado, quanto pela sua ausência ou
presença nas relações humanas.

como um hábito, não sendo essa algo nato ou natural ao ser humano, mas fruto de constante
exercício. Aristóteles (1999, p. 1134 a) divide as ciências em ciências teóricas, ciências práticas
e ciências produtivas. Para ele, a investigação da ética, o conhecimento do justo e do injusto,
do bom e do mau, apresenta-se como um argumento para que a ação humana se converta
numa ação socialmente justa, o que, conforme ele, se insere no âmbito das ciências práticas.
Hoje vivencia-se uma desarmonia da relação homem-natureza, um desequilíbrio que
aprofunda desigualdades, que desintegra e destrói. Daí a importância da revitalização de
valores essenciais como a justiça na sociedade e no Direito, a fim de se reverter a crise ética e
ecológica da contemporaneidade.
Atualmente, observa-se um esvaziamento ético, um afastamento da virtude justiça, já que o

difere do ser humano enquanto ser isolado do mundo e dos demais seres, revelando a miopia
capital acerca da sua condição de dependente do mundo que o circunda, exacerbando sua
ignorância para justificar a sua ganância, numa sociedade com fortes características
individualistas.
O homem pós-moderno é complexo, assim como a sociedade onde ele habita. Hoje se vivencia
uma separação entre o ético e o legal. A sociedade pós-moderna é marcada pela globalização
em vários níveis e setores, pelo antropocentrismo técnico-científico e pela falta de
compromisso com a ética decente: o que se revela, muitas vezes, como algo natural, como a
corrupção, ou qualquer outra forma de causar prejuízo ou banalizar o Outro.
Rocha
Modernidade, e se agrava ideologicamente com o advento do projeto político dos Estados de
Direito pós-modernos. O autor afirma que
A melhor saída, a única saída razoável e profícua, é o resgate do dever-ser como ética, tanto
mais necessário quanto a estética jurídica se debruça em reflexões hermenêuticas de condutas,
em um tempo virtual pós-fato. No fundo, esta saída sociojurídica aponta para uma relação e
um viver a política de forma crítica, contudo, extremamente ética. (ROCHA, 2011, p. 181)
Tal realidade, construída e definida por processos históricos, poderia ser reinventada ou
reconstruída por meio de lutas simbólicas, nos mais diversos âmbitos, seja social, político,
acadêmico, entre outros. Rocha (2011, p. 162) ainda argumenta que é possível reconhecer a
mutabilidade de qualquer valor social em sua construção material histórica na luta pela
sobrevivência humana coletiva. O autor entende que essa mudança está atrelada à consciência
da convivência do grupo e a sua capacidade de criar novas condições para tal, o que pressupõe
o respeito à condição humana, e ao Outro como parâmetro do Ser.

101
No âmbito do conceito de justiça tomasiano, a justiça diz respeito aos atos relativos a outrem.
Neste sentido diz-se que a justiça consiste em dar a cada um o que lhe pertence. Santo Tomás
diz que a justiça pode ser conceituada como um hábito pelo qual, com vontade constante e
perpétua, atribuímos a cada um o que lhe pertence. Desse modo, o ideal de justiça, sob o
enfoque ambiental, não pode ser apenas um compromisso, mas um comportamento cotidiano
que qualifique, com dignidade, a relação entre humanos e o mundo natural, no sentido da
preservação e do respeito aos ciclos naturais, como expressão máxima da sustentabilidade e
sua perspectiva intergeracional.
Isso vai ao encontro da ideia de Santo Tomás quando ele trata da perpetuidade que caracteriza
a justiça. Ele especifica que não é suficiente praticar a justiça por algum tempo, pois até
pessoas injustas de vez em quando praticam atos justos. Não basta querermos observar a
justiça por algum tempo [...] é preciso que tenhamos a vontade perpétua de observar sempre a
justiça. Em suma, a justiça se define como hábito de uma vontade reta, perpétua e constante
com o objetivo de dar a cada um o que lhe pertence.
Nesse diapasão, a justiça ambiental seria concretizada por meio do agir humano ético, que
respeite o mundo natural e seus ciclos regenerativos, além de se cultivas o respeito pelo outro,
necessariamente como um hábito de uma vontade reta, perpétua e constante.
Por fim, se a justiça é sempre relativa a outrem, deve-se reforçar a necessidade de uma justiça

aristotélica, e que Santo Tomás de Aquino incluiu entre as intituladas virtudes cardeais, por
serem consideradas necessárias e significativas articulações das ações virtuosas.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Analisou-se a temática da justiça ambiental, a partir do conceito de justiça desenvolvido na
Suma Teológica de Santo Tomás de Aquino, no sentido de se situar as questões 57 e 58 da

Suma.
Nesses termos, a essência da justiça foi definida como hábito de uma vontade reta, perpétua e
constante com o objetivo de dar a cada um o que lhe é devido, ressaltando-se a característica
da alteridade, pois a justiça é sempre relativa a outrem.
A injustiça ambiental é um fenômeno de imposição desproporcional dos danos e problemas
ambientais às populações menos dotadas de recursos financeiros, políticos e informacionais.
Apesar de todos estarem abstratamente sujeitos aos riscos, na realidade os efeitos dos danos
ambientais atingem indivíduos, grupos ou países de forma desigual, em razão de que são as
comunidades vulneráveis que vivem em áreas de risco; encostas de morros etc., e

102
normalmente possuem menor articulação e força para reivindicar seu direito por justiça
ambiental.
A justiça ambiental no Brasil, cuja noção implica um direito ao meio ambiente seguro e
ecologicamente equilibrado, tal qual o previsto no caput do art. 225 da Constituição Federal de
1988, deverá ser visualizada de forma sistêmica, alargada, sob os aspectos políticos, sociais,
culturais e econômicos.
Por fim, a realização de uma verdadeira justiça ambiental no Brasil ensejaria um meio
ambiente ecologicamente equilibrado, que possa ser democraticamente usufruído, e que, ao
mesmo tempo, haja o respeito às identidades e à dignidade das comunidades e dos cidadãos.
Nesses termos, o conceito de justiça tomasiano vai ao encontro dessa temática, e por meio da
ideia, sobretudo de alteridade, da necessidade do resgate da capacidade de se colocar no lugar
do outro, com consideração num contexto dialógico. Isso certamente traria um importante
contributo para a solução dos atuais problemas de injustiça ambiental no país.
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104
A EFETIVIDADE DO DIREITO SOCIAL À MORADIA RELACIONADO AO BEM ESTAR
DO INDIVÍDUO NO CONTEXTO AMBIENTAL URBANO
48

49

Resumo
Este artigo destina-se a fazer uma avaliação sobre a efetividade do Direito Fundamental à
Moradia, levando em consideração quais seriam as características intrínsecas a este direito
social, sem as quais haveria prejuízo à esta garantia aqui tratada. O campo de delimitação
estabeleceu-se como o meio ambiente urbano e as típicas problemáticas à ele inerente, como a
poluição e a precariedade de serviços públicos essenciais. Entendendo o direito como
comunicações de elementos entre si, abordar-se-á a teoria de Luhmann e, além disso, situar-
se-á o contexto dentro da contemporaneidade, na qual se vislumbra uma sociedade de risco à
qual o Direito há de se incorporar. E, como o direito à moradia é de categoria fundamental, a
subordinação tanto do Estado como dos particulares também é ponto relevante para, em fim,
buscar-se caminhos que contribuam para o aperfeiçoamento da salvaguarda dessa proteção.
Abstract
This article is intended to make a study on the effectiveness of the Fundamental Right to
Housing, taking into consideration what would be the characteristics intrinsic to this social
right, without which there would be damage to this guarantee. The field of delimitation is the
urban environment and the typical problems inherent to it, such as pollution and the
precariousness of essential public services. Understanding the law as a communication of
elements between them, Luhmann's theory will be approached and, in addition, the context
will be situated within contemporaneity, in which society is at risk and the law has to consider
this. And since the right to housing is fundamental, the subordination of both the State and
private individuals is also a relevant point in order to search for ways that contribute to the
improvement of the safeguard of this protection.
Palavras-chave: Direito à moradia. Bem estar. Meio ambiente.
Sumário: 1. Introdução; 2. Conceitos de moradia digna; 3. Direito à moradia e direito ao meio
ambiente urbano; 4. Teoria dos sistemas de Luhmann; 5. Sociedade de risco; 6. Eficácia vertical
e horizontal dos direitos fundamentais; 7. Conclusão; 8. Referências.

Advogada, Especialista em Direito Processual e em Construções Sustentáveis. Mestranda em Direitos


48

Fundamentais junto ao Programa de Pós-Graduação em Direitos Fundamentais (PPGDF) da Universidade da


Amazônia (UNAMA). E-mail: conceicaoalvesadvocacia@gmail.com
Doutor em Ciências Sociais (Antropologia) pelo Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais (PPGCS) da
49

Universidade Federal do Pará (UFPA). Atualmente exerce atividade docente, como Professor Titular Pós-Stricto
Senso I, junto ao Programa de Pós-Graduação em Direitos Fundamentais (PPGDF) da Universidade da Amazônia
(UNAMA). E-mail: jorgeluiz_dossantos@hotmail.com

105
1 INTRODUÇÃO
Este trabalho tem como objetivo examinar o direito à moradia sob o enfoque de sua
efetividade, levando em conta o meio ambiente das cidades. Pelos estudos prévios, parte-se da
hipótese de que este direito social tem tido a sua aplicação comprometida por diversos
agentes, os quais impedem que as pessoas possam gozar do direito fundamental, mesmo
quando ele aparentemente se encontra já plenamente assegurado.
O método de pesquisa deste artigo parte de uma natureza hipotético-dedutiva, com fim
exploratório e um procedimento bibliográfico.
A pretensão é identificar, no que diz respeito ao direito à moradia, como o prejuízo ao bem
estar do indivíduo poderia representar também um comprometimento ao próprio direito
social em questão. Busca-se avaliar o quanto os danos ocasionados ao meio ambiente urbano
são da mesma forma prejudiciais à efetividade da moradia.
Como justificativa, fundamenta-se no contínuo, acelerado e desregrado crescimento das
cidades, o qual acaba por se ver acompanhado por um rastro de degradação ambiental, e, por
consequência, os efeitos dessa problemática extrapolam o âmbito do direito fundamental ao
meio ambiente saudável, comprometendo igualmente o bem estar do ser humano que não
obtém a garantia de uma moradia digna.
A complexidade da questão se dá pela multidisciplinaridade da matéria, pelo mixórdia de
conceitos e ausência de efetivas iniciativas de solução.
2 CONCEITOS DE MORADIA DIGNA
Uma inicial dificuldade no estudo desse tema é o desvirtuamento por algumas esferas de poder
econômico e político ou mesmo o desconhecimento pela sociedade civil de o que efetivamente
constituiria a definição de moradia.
Diz a Constituição do Brasil: "São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o
trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à
maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição." (grifo
nosso. CONSTITUIÇÃO.ART. 6º. 198850) Esse texto não é o original, mas já acrescentado
claramente a expressão moradia trazida pela 26/2000 além de outras mudanças das emendas
64/2010 e a 90/ 2015.
E quando se passa a usar este termo (moradia), que já se encontre subentendida a
característica de suprimento da dignidade humana que ele deve possuir, conforme o
entendimento dos organismos internacionais e respectivos documentos por eles produzidos.
Tais como:

50
BRASIL. Constituição (1988). Até Emenda Constitucional 95 de 15.12.2016 publicada no DOU dia 16.12.2016.
Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.
htm> Consultado em: 14.05.2017. Art. 6º.

106
A Declaração Universal dos Direitos do Homem (ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS,
1948)51, de 1948, e ratificada pelo Brasil52 no mesmo ano, já cuidava do direito à moradia (apesar
de que o termo usado fosse habitação), registrando no seu artigo 25.1 que toda pessoa tem
direito a um padrão de vida capaz de assegurar a si e à sua família saúde, bem-estar, habitação
entre outros direitos.
Em 1966 houve o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos (ORGANIZAÇÃO DAS
NAÇÕES UNIDAS, 1992)53, ratificado pelo Brasil em 1992. Neste, é quando se faz por primeira
vez o registro do termo "moradia", no artigo 11 que diz que "Os Estados Partes do presente
Pacto reconhecem o direito de toda pessoa a um nível de vida adequando para si próprio e sua
família, inclusive à alimentação, vestimenta e moradia adequadas".
Quando um país se torna signatário do documento, passa a ter ligação com os termos nele
contidos, havendo a necessidade de o Estado prover esta tutela da moradia, entendendo este
como um direito humano.
Um termo produzido em campo internacional interamericano foi a Convenção Americana de
direitos Humanos, ou também chamada de Pacto de San José da Costa Rica (ORGANIZAÇÃO
DOS ESTADOS AMERICANOS, 1992)54. Nela se assegura de forma enumerada direitos civis e
políticos, inclusive o direito à moradia sob a expressão direito "residir".
Outro documento que merece destaque é o Pacto Internacional dos direitos Civis e Políticos
(ASSEMBLÉIA GERAL DAS NAÇÕES UNIDAS, 1966)55 no qual a expressão que tratada é
"domicílio", no art. 17. Em 1968 teve a Convenção Internacional sobre a Eliminação de Todas as
Formas de Discriminação Racial (NAÇÕES UNIDAS, 1968) 56, onde aparece a menção ao
direito à habitação (Artigo V, e, III, Direito à habitação). No ano de 1989, houve publicação da

51
ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. Declaração Universal dos Direitos Humanos, adotada em 10 de
dezembro de 1948.
52
A Declaração Americana dos Direitos e Deveres do homem de abril de 1948 (artigo XI: direito à habitação)
antecede a própria Declaração Universal dos Direitos do Homem, de 12 de 1948, mas o Brasil não é signatário desta
primeira.
53
ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais,
adotado em 16 de setembro de 1966. Ratificado pelo Brasil pelo Decreto No 591, De 6 De Julho De 1992.

54
ORGANIZAÇÃO DOS ESTADOS AMERICANOS. Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de São
José da Costa Rica), adotada em 22 de novembro de 1969. Promulgada pelo Brasil através do Decreto No 678, De 6
De Novembro De 1992.
55
ASSEMBLÉIA GERAL DAS NAÇÕES UNIDAS. Pacto internacional sobre direitos civis e políticos. XXI Sessão,
1966
NAÇÕES UNIDAS. Convenção Internacional Sobre A Eliminação De Todas As Formas De Discriminação Racial.
56

Nova York. 1968.

107
resolução da Convenção Sobre Direitos da Criança (ASSEMBLEIA GERAL DAS NAÇÕES
UNIDAS, 1989)57 e expressão utilizada neste caso foi "lar".
Importante evento internacional foi o ocorrido na América Latina, na cidade do Rio de Janeiro
- Brasil em 1992. Foi a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o
Desenvolvimento, mais conhecida como Rio 92, na qual foi elaborada a Agenda 21, onde é
possível ler no capítulo 7, item 7.6 (MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE, 1992) 58:
O acesso a habitação segura e saudável é essencial para o bem-estar físico, psicológico, social e
econômico das pessoas, devendo ser parte fundamental das atividades nacionais e
internacionais. O direito a habitação adequada enquanto direito humano fundamental está
consagrado na Declaração Universal dos Direitos Humanos e no Pacto Internacional dos
Direitos Econômicos, Sociais e Culturais...
Em 1996 ocorreu o Habitat II em Istambul, cujo objetivo é a proteção do direito à moradia.
Esse encontro é realizado a cada 20 anos, e, em outubro de 2016, ocorreu uma outra edição na
capital do Equador, a cidade de Quito. Este foi o Habitat III, no qual foi elaborada uma agenda
propositiva de melhor qualidade de vida para as pessoas nas cidades.
Conforme o entendimento elaborado pela Conferência Habitat (HABITAT III, 2016) 59, uma
moradia digna perpassaria em assegurar salubridade aos seus habitantes, condições de vida
minimamente atendidas de serviços essenciais como água, saneamento básico e energia. Além
disso, elementos do entorno também se fazem relevantes para a efetividade esse direito, tais
como a segurança, o transporte coletivo e coleta de lixo, incluindo ainda serviços públicos
urbanos, como o fornecimento de saúde e educação.
É também nesse sentido que NOVELINO (2011)60 afirma que a plena garantia deste direito
exige o atendimento de mínimas dimensões da habitação, condições de higiene, de conforto e
com capacidade de preservar a privacidade e também a intimidade dos seus moradores.
Para corroborar com a afirmação de ligação do direito à moradia com o bem estar (em vez de
cuidar do assunto meramente como uma questão patrimonial), cite-se SOUZA (2008)61 para
quem a moradia é direito da personalidade, e, como uma modalidade de direito fundamental,

57
ASSEMBLEIA GERAL DAS NAÇÕES UNIDAS, Convenção Sobre Direitos da Criança 1989
58
MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE. Agenda 21. 1992. Disponível em < http://www.mma.gov.br/res
ponsabilidade-socioambiental/agenda-21/agenda-21-global> acessado em 21 fev 2017. Cap. 7. pág. 02.
HABITAT III. TERCEIRA CONFERÊNCIA DAS NAÇÕES UNIDAS SOBRE MORADIA E DESENVOLVIMENTO
59

URBANO SUSTENTÁVEL. QUITO. 2016


60
NOVELINO, Marcelo. Direito Constitucional. 5. ed. São Paulo: Editora Método, 2011. 927 p.
61
SOUZA, Sérgio Iglesias Nunes de. Direito à moradia e de habitação: análise comparativa e suas implicações
teóricas e práticas com os direitos da personalidade . 2. ed. Rev, atual. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, 2008.

108
consistiria em bem irrenunciável da pessoa natural. Esse direito social consistiria então em um
pressuposto essencial para a vida humana.
É possível notar que a moradia está compreendida como um direito humano protegido pelos
documentos internacionais, dentro de critérios de universalidade e indivisibilidade.
Da mesma forma, as conceituações doutrinárias também seguem o mesmo percurso protetivo
do ser humano, no que diz respeito à sua habitação.
Tratando-se do Estado Brasileiro, a tutela dessa modalidade de direitos humanos foi sendo
elaborada com a apreensão desses conceitos internacionalmente reconhecidos, com uma
busca legislativa de aproximação do entendimento desses tratados, resultando no texto da
Constituição de 1988, onde foram incluídos muitos dos valores de justiça e ética, fornecendo
ao sistema jurídico brasileiro os fundamentos da construção do Estado. Há se dizer, porém,
que o direito à moradia não emergiu de forma expressa no texto constitucional de 1988, mas
apenas através da emenda 26/2000.
Além da previsão constitucional de salvaguarda desse direito, em se tratando de legislação
brasileira, é possível destacar a LEI n.º 11.445, (2007)62 que trata de saneamento básico e aborda
princípios que relacionam este serviço à qualidade de morada humana, como se pode ver:
Art. 2o Os serviços públicos de saneamento básico serão prestados com base nos seguintes
princípios fundamentais:
I - universalização do acesso;
II - integralidade, compreendida como o conjunto de todas as atividades e componentes de
cada um dos diversos serviços de saneamento básico, propiciando à população o acesso na
conformidade de suas necessidades e maximizando a eficácia das ações e resultados;
III - abastecimento de água, esgotamento sanitário, limpeza urbana e manejo dos resíduos
sólidos realizados de formas adequadas à saúde pública e à proteção do meio ambiente;
IV - disponibilidade, em todas as áreas urbanas, de serviços de drenagem e manejo das águas
pluviais, limpeza e fiscalização preventiva das respectivas redes, adequados à saúde pública e à
segurança da vida e do patrimônio público e privado;
V - adoção de métodos, técnicas e processos que considerem as peculiaridades locais e
regionais;
VI - articulação com as políticas de desenvolvimento urbano e regional, de habitação, de
combate à pobreza e de sua erradicação, de proteção ambiental, de promoção da saúde e

62
BRASIL. Lei 11.445 de 5 de janeiro de 2007. Estabelece diretrizes nacionais para o saneamento básico. Recuperado
de http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2007/lei/l11445.htm

109
outras de relevante interesse social voltadas para a melhoria da qualidade de vida, para as
quais o saneamento básico seja fator determinante;
VII - eficiência e sustentabilidade econômica;
(...) (grifo nosso)
Outra LEI de relevância é n.º 10.257 (2001)63, o Estatuto da Cidade, que ao indicar as
características da política urbana a ser adota, diz:
Art. 2º. A política urbana tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções
sociais da cidade e da propriedade urbana, mediante as seguintes diretrizes gerais:
I garantia do direito a cidades sustentáveis, entendido como o direito à terra urbana, à
moradia, ao saneamento ambiental, à infra-estrutura urbana, ao transporte e aos serviços
públicos, ao trabalho e ao lazer, para as presentes e futuras gerações;
(...)
3 DIREITO À MORADIA E DIREITO AO MEIO AMBIENTE URBANO
O presente estudo, ao abordar o direito ambiental, não o faz aqui com o usual enfoque de
fauna e flora, mas em um viéis urbanístico, colocando o homem como partícipe desse meio
ambiente citadino e suscetível a influir com seus atos ou ser atingido pelo entorno.
É possível que em determinados momentos o direito urbanístico e o ambiental surjam como
figuras antagônicas como se o desenvolvimento do primeiro fosse impedido pelo segundo, ou
como se a vida das cidades fosse uma total ameaça ao meio ambiente.
Assim não deveria ser. Afinal, as premissas de cada qual desses conteúdos leva a uma
conciliação entre esses direitos fundamentais, onde, de um lado, não se pretende ver meio
ambiente estático, mas tratado com sustentabilidade. Da mesma forma, o ambiente urbano há
de seguir normas protetivas, inclusive frente aos atores desse locus.
Nesse sentido, DIAS (2010) publica sobre a necessidade de certos tipos de gestão para melhor a
vida urbana:
Desenvolvimento urbano com qualidade de vida nada mais visa do que compatibilizar
interesses individuais e sociais. A coexistência de interesses públicos e privados é condição
sine qua non para o gerenciamento da questão urbana, que há de ser calcada no bem-estar
social e na qualidade de vida para todos os habitantes. [...] A proteção do meio ambiente e a

63
BRASIL. Lei 10.257 de 2001. Regulamenta os artigos 182 e 183 da Constituição Federal, estabelece diretrizes gerais
da política urbana. Recuperado de http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/LEIS_2001
/L10257.htm

110
qualidade de vida são valores que devem ser justificados e compreendidos por todos os ramos
do Direito. 64
O crescimento acelerado e não planejado das cidades, tem, contudo, elaborado uma situação
inóspita, não assegurando sequer às necessidades humanas básicas, surgindo contínuas
deficiências e conflitos.
A salvaguarda do meio ambiente está alocada em um panorama jurídico de difícil
enfrentamento posto se tratar de uma proteção muitas vezes dimensionada para o futuro, cuja
concretização precisa de uma gestão solidária e responsável
As funções básicas a serem cumpridas pela responsabilidade civil no campo ambiental seriam
a compensação das vítimas; retribuição; minimização dos custos administrativos; prevenção
de acidentes.65
E a responsabilidade civil nesses casos é objetiva e, para ser instaurada, depende da existência
do dano, de uma conduta e de uma relação de causa e consequência entre eles. Inclusive o
Estado pode ser sujeito passivo em demanda reparatória de direito ambiental, (art. 37, §6º da
CF).
4 TEORIA DOS SISTEMAS DE LUHMANN
Dentro dessa complexidade, cita-se a Teoria dos Sistemas de LUHMANN 66, através da qual ele
identifica o paradoxo de que as novas soluções que advém para conter os problemas
existentes, acabam por trazer, por si próprias novos problemas e desafios.
Uma das primeiras grandes questões sobre a Teoria dos Sistemas de Luhmann, que poderia ser
útil ao entendimento do problema estudado neste trabalho, seria a circunstância de cada
universo de sistema se formar a partir do meio em que se encontra com outros sistemas. Ou
seja, determinado sistema não tem como reconhecer nem a si próprio se não for levando em
conta o que é o outro ao seu redor, se não de acordo com aquilo que se configura como uma
complexidade "não sua".
TRINDADE (2008)67 afirma, a partir de sua leitura da teoria dos sistemas, que a síntese de cada
sistema se forma partir do meio dos outros sistemas. Esse entendimento provoca um

64
DIAS, Daniella Maria dos Santos. O direito à moradia digna e a eficácia dos direitos fundamentais sociais. Revista
do Ministério Público do Estado do Pará. Ano V, v. 1, p. 65-76, 2010. P 74.
65
BENJAMIN. Antonio Herman V. A Responsabilidade Civil pelo Dano Ambiental no Direito Brasileiro e as lições
do Direito Comparado. Recuperado de http://bdjur.stj.jus.br/jspui/bitstream/2011/8632/A_Re
sponsabilidade_Civil.pdf
66
LUHMANN. Niklas. [Die Moral der Gesellschaft] La moral de la sociedad. Trad. Goethe-Institut. Colección Título
Estructuras Y Procesos. Serie Ciencias Sociales. Madrid: Editora Trotta, SA, 2013.

67
TRINDADE, André Fernando dos Reis. Para entender Luhmann: e o direito como sistema autopoiético. Porto
Alegre. Livraria do Advogado Editora, 2008. 120 p. 20

111
rompimento epistemológico, quando o método racionalista clássico de estilo analítico passa a
ser insuficiente pois a busca de uma centralização do conhecimento em frações lineares não
soluciona a complexidade e interdependência sistêmica.
Hodiernamente, enfrentar o tema da pluralidade da sociedade é inevitável, o que não se
consegue através de método analítico, com seu foco no objeto, conjunto e aspecto disjuntivo,
sendo mais apropriado o método sistêmico com seu cerne no projeto ou processo, no sistema e
meio conjuntivo.
Luhmann visualiza na teoria dos sistemas aplicada às ciências sociais uma necessidade de
estudo da realidade, indicando como essencial a apreciação dos sistemas em suas
características e funções para, após, aplicar esses resultados a circunstâncias práticas. Em
razão dessa forma de construção da metodologia, foi até mesmo criticado como um pensador
anti-humanista.
Ressalte-se também que, na linha desse pensamento, há de se mencionar a característica de
conversão do rumo da ciência daquele trajeto de análise das partes constitutivas de um todo,
para um novo modelo de observação das relações deste todo. O outro ponto a destacar seria a
chance de alterar o centro de observação entre os mais variados escalonamentos hierárquicos,
sem que isso extinga a cientificidade do seu processo de verificabilidade, a partir de então
sendo entendido como um todo orgânico interdependente.
Segundo TRINDADE (2008)68, quando de sua leitura de Luhmann, o sistema tem como agente
principal a comunicação. O homem, neste caso, não poderia ser considerado como elemento
formador do sistema social. O que produziria o sistema social seriam as comunicações.
Ressalte-se que o autor das comunicações é o indivíduo, o qual não fica afastado do processo,
mas a proposta é apenas de mudança de eixo central no conceito, querendo demonstrar que a
simples união de sujeitos não cria sociedade mas sim a sua interação mediante comunicação.
Esses sistemas de Luhmann, são desenvolvidos e chegam a etapa da autopoiese69.
Ao se utilizar a teoria social de acordo com a concepção autopoiética70, ocorre uma mudança
no paradigma. A inclusão das ciências sociais nas modalidades de postulado autopoiético

68
Idem. p. 34.
69
Essa nomenclatura autopoiese advém da junção dos termos: auto, que se refere ao próprio objeto e poiese, que diz
respeito à produção/criação. Expressão usada inicialmente pelos biólogos chilenos Humberto Maturana e Francisco
Varela para designar os elementos característicos de um sistema vivo em sua estrutura, como explica Reis Trindade
(TRINDADE, André Fernando dos Reis. Para entender Luhmann: e o direito como sistema autopoiético. Porto
Alegre. Livraria do Advogado Editora, 2008. 120 p., pág 71)
70
Conforme Teubner a autopoiese seria "A autonomia e constância de uma determinada organização das relações e
hoje elementos constitutivos deste mesmo sistema, organização essa que é auto-referencial no sentido de que sua
ordem interna é gerada a partir da interação dos seus próprios elementos e auto-reprodutiva no sentido de que tais
elementos são produzidos a partir dessa mesma rede de interação circular e recursiva." (TEUBNET, Gunther. O
Direito como sistema autopoiético. Trad. José Engrácia Antunes. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1993, p. 3.)

112
sugere a abertura de uma série de novas possibilidades, podendo-se dizer que os sistemas
sociais consistiriam em sistemas autopoiéticos, agindo de forma fechada em seu interior e que,
ao mesmo tempo, seriam abertos às entradas e pressões do entorno, com o qual estabelece
comunicação.
As causas ou efeitos são, neste caso, de difícil separação pois o modelo autopoiético circular
torna impossível falar dessas depurações, pois o que se dá em um sistema advém da sua
própria organização interna e, também, pelas influências e movimentos vindos do entorno.
O conhecimento humano não pode ser desconectado do meio ao qual o homem está inserido,
mas este sofre mudanças de acordo com o meio, assim como também produz influência neste.
Com isso, a circunstância à qual se pode chegar quando se avalia o direito à moradia inserido
no contexto do meio ambiente urbano é de que, no conteúdo jurídico, essas esferas do direito
interagem e são visíveis as intercomunicações típicas do que Luhmann define como sociedade.
De acordo com a teoria, é possível identificar o quanto a qualidade e efetividade do direito
social a uma digna moradia fica ligado, ou mesmo se poderia dizer, condicionado a um meio
ambiente saudável e de desenvolvimento auto-sustentável.
É a partir dessa presença humana, em que as ações e omissões se desencadeiam para as demais
camadas do entorno, que não se pode mais crer em um Direito estanque, mas sim em um
complexo normativo mais amplo que leve em conta as características da sociedade
contemporânea, e seus riscos intrinsecamente iminentes.
5 SOCIEDADE DE RISCO
LEITE e AYALA (2010)71 afirmam que o desenvolvimento sustentável ainda aguarda por se
comprovar eficiente, trazendo incertezas para a atual sociedade. E tal circunstância se daria
como BECH (1992)72 afirma em Risck society toward a new modernity, indicando que se está a
viver agora não em uma sociedade industrial, mas uma sociedade de risco e nessa transição se
encontram as dificuldades de se ter um instrumental jurídico ainda incapaz de absorver as
novas realidades e também alerta para a situação perigosa advinda da ciência e do
conhecimento.
CANOTILHO (1996)73 lembra o efeito irradiante dos atos das autoridades nas sociedades de
risco, quando os instrumentos jurídicos atuais se mostram insatisfatórios diante da
complexidade de tantos interesses contrapostos.

71
LEITE, José Rubens Morato; AYALA, Patryck de Araújo. Dano ambiental: do individual ao coletivo
extrapatrimonial. 3 ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010
72
BECK, Ultrich. Risk society toward a new modernity. London: Sage, 1992. p. 2-8
73
CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Privativismo, associativismo e publicisismo na justiça administrativa do
ambiente. Revista de legislação e jurisprudência. Coimbra, v. 128, n. 3857, p. 233, dez. 1995/1996

113
A sociedade de risco é a fase da modernidade, na qual começa a se materializar ameaças
latentes até então produzias pelo modelo econômico da sociedade industrial. Depois de
esgotado o modelo de produção e cuja característica marcante se torna exatamente o risco
permanente de desastres e catástrofes. Isso pode acontecer a qualquer tempo dada as
condições de existência desse modelo, com capitalismo predatório, uso desenfreado do bem
ambiental e elevação demográfica.74
Apesar das mudanças, a estrutura jurídica de soluções permaneceu a mesma, e há consciência
de que os riscos existem, mas, apesar disso, não são implantadas medidas de contensão, o que
dá origem ao chamado fenômeno da irresponsabilidade organizada.75
6 EFICÁCIA VERTICAL E HORIZONTAL DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS
A responsabilização do Estado no cumprimento e proteção dos direitos fundamentais é
entendida como uma operação "vertical" do direito, como que afirmando o sentido de
superioridade do Estado e sua ação frente aos cidadãos. A questão é que o pensamento atual é
de que os particulares entre si também devem honrar uma responsabilidade pela eficácia dos
direitos fundamentais entre si, daí o uso da expressão de "horizontalidade" (porque estariam
no mesmo nível).
Apenas efetuando um ajuste terminológico, observa-se que a afirmação de que os particulares
têm um igualitário patamar de negociação entre si é algo idealizado, irreal pois acaba que uma
das partes sempre detém mais influência, seja econômica, seja política, ou outra. Assim,
indica-se como expressão mais adequada apenas "eficácia dos direitos fundamentais entre os
particulares".
No Brasil, a teoria adotada tanto pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) como no Supremo
Tribunal Federal (STF) foi a Eficácia imediata e direta, surgida na Alemanha, baseada em uma
construção teórica de que os direitos privados não têm permissão de estabelecer relações
contrárias que sigam em oposição aos direitos fundamentais e à Constituição, ou seja, a
Supremacia da Constituição e dos direitos fundamentais são o norte a guiar os direitos nas
relações privadas também.
Esta teoria não tem a pretensão de extinguir a autonomia da vontade, mas indicar que o
exercício desse atributo deve ser feito nos ditames do direito, não só sob as normas
positivadas, mas principalmente em situações que envolvem direitos fundamentais.
No constitucionalismo no mundo contemporâneo, a pretensão é um maior distanciamento do
plano liberal de supremacia do contrato privado (pacta sunt servanda), que representa a
liberdade de as partes contratarem e se obrigarem de acordo com suas vontades. Afinal a
presunção de que as pessoas estariam contratando em pé de igualdade não é verdadeira,

74
Idem LEITE e AYALA. p. 113
75
BECK, Ulrich. A ciência é causa dos principais problemas da sociedade industrial. Recuperado de
www.sj.univali.br/agenda21/contribuicoes-externas/ciencia-e-causa-dos-principais-problemas.html

114
conduzindo à uma necessidade de se impor o princípio da dignidade da pessoa humana com a
aplicação dos direitos fundamentais a todos.
Desta forma, não só o estado tem a responsabilidade de promover a eficácia do direito à
moradia, como também os particulares ficam condicionados a respeitar essa garantia
constitucional dos demais membros da sociedade. Não que ele se obrigue de forma direta
prestacional, não há obrigação76 de se promover a melhoria da saúde, do bem estar ou acesso à
moradia de outrem, mas, por outro lado, as obrigações de não provocar máculas a este direito
são absolutamente impositivas. Isso tudo em razão do respeito ao princípio da dignidade da
pessoa humana, à função social da propriedade e também à ditames positivados no direito
Civil como as normas do direito de vizinhança.
7 CONCLUSÃO
Neste artigo, de acordo com a conceituação de moradia apontada por juristas, e também pelos
tratados de organismos internacionais, foi possível perceber que a eficácia desse direito
humano não é plena. Isso se dá em decorrência de esta garantia fundamental ter como
requisito a dignidade, que, por sua vez, abrange a saúde, serviços essenciais de água, esgoto,
eletricidade, além de privacidade, segurança, dentre outros.
Em se tratando de meio ambiente urbano, identifica-se que a inter-relação entre os atores
sociais pode implicar em danos à efetiva proteção da moradia, tanto no que diz respeito à ação
ou omissão do poder público, como por condutas de particulares, os quais também tem, por si,
a responsabilidade de estar em obediência aos direitos fundamentais.
Essa relação havida entre o direito público e o privado, as diferentes matérias que são tratadas
quando se fala de moradia levam à percepção de que, como afirma Luhmann, um determinado
sistema (no caso, o da moradia) só reconhece a si próprio se levat em conta o que há ao seu
redor (segurança, transporte...). O contexto dessa realidade do direito à moradia nos centros
urbanos brasileiros há de considerar que trata-se de uma sociedade de risco.
Nesse sentido, a eficácia dos direitos fundamentais dá-se vertical e horizontalmente, ou seja,
tanto a partir do Estado com o cidadão, como nas relações entre particulares.
Depreende-se assim que a efetividade do direito à moradia não está preservada e, como uma
proposta de melhoria desse quadro, indica-se a adoção de políticas públicas concretas, as quais
considerem o aspecto amplo em que esse direito social está inserido; assim como a maior
responsabilização dos particulares que ocasionam danos aos demais.
Referências

76
Com exceção de alguns casos específicos como por exemplo o previsto no art. 227 da CF mencionando o poder
familiar com a responsabilidade de promoção da saúde de pais para com filhos e vice e versa.

115
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OS PRINCÍPIOS DO ESTADO DE DIREITO E SUA REPERCUSSÃO NA ESFERA
AMBIENTAL PELA TEORIA DO AGIR COMUNICATIVO DE HABERMAS
77

RESUMO
A sociedade moderna atingiu tamanha complexidade que vem exigindo cada vez mais
respostas de complexidades proporcionais. O direito não é um sistema fechado, muito menos a
Constituição Federal, mesmo sendo ela uma Constituição rígida, ou seja, difícil de ser
modificada, ela acaba por receber novas possíveis transformações que possam vir da
sociedade, principalmente no que diz respeito a um Meio Ambiente ecologicamente
equilibrado para as futuras gerações. Tecer-se-á neste artigo algumas considerações baseadas
em estudos bibliográficos para averiguar a aplicação dos Princípios do Estado de Direito e a
sua repercussão na esfera ambiental através da visão da teoria do agir comunicativo de
Habermas, o estudo comparativo da legislação nacional, proporcionando aplicações práticas,
promovendo oportunidades de pesquisas visando a participação popular na tomada de
decisões que digam respeito ao bem-estar coletivo.
PALAVRAS-CHAVE: Estado de Direito; Direito Ambiental; Teoria do Agir Comunicativo;
Habermas.
ABSTRACT
Modern society has reached such complexity that it is increasingly demanding answers of
proportional complexities. The law is not a closed system, much less the Federal Constitution,
even though it is a rigid Constitution, that is, difficult to be modified, it ends up receiving new
possible transformations that may come from society, especially with regard to a Medium
Ecologically balanced environment for future generations. Some considerations based on
bibliographic studies will be used to ascertain the application of the Principles of the Rule of
Law and its repercussion in the environmental sphere through the view of the Habermas
theory of communicative action, the comparative study of the national legislation, providing
applications Practices, promoting research opportunities aiming at popular participation in

77
Mestranda em Direito pelo CentroUniversitário Salesiano de São Paulo U.E. Lorena. e-mail:
fabiamaruco@hotmail.com

117
decision-making regarding collective well-being. Modern society has reached such complexity
that it is increasingly demanding answers of proportional complexities. The law is not a closed
system, much less the Federal Constitution, even though it is a rigid Constitution, that is,
difficult to be modified, it ends up receiving new possible transformations that may come from
society, especially with regard to a Medium Ecologically balanced environment for future
generations. Some considerations based on bibliographic studies will be used to ascertain the
application of the Principles of the Rule of Law and its repercussion in the environmental
sphere through the view of the Habermas theory of communicative action, the comparative
study of the national legislation, providing applications Practices, promoting research
opportunities aiming at popular participation in decision-making regarding collective well-
being.
KEY-WORDS: Rule of law; Environmental Rights; Theory of Communicative Action;
Habermas
INTRODUÇÃO.
Na ótica de sua função estabilizadora de expectativas, o direito apresenta-se como um sistema
de direitos. Os direitos subjetivos só podem ser estatuídos e impostos através de organismos
que tornam decisões que passam a ser obrigatórias para a coletividade. E vice-versa, tais
decisões devem a sua obrigatoriedade coletiva à forma jurídica da qual se revestem. Esse nexo
interno do direito com o poder político reflete-se nas implicações objetivas e jurídicas do
direito subjetivo.
A teoria do agir comunicativo propugnada por HABERMAS apresenta condições de
possibilidade à construção de uma nova cultura política que possibilite uma maior inclusão e
um maior engajamento dos cidadãos no processo de organização e de tomada de decisões da
sociedade. Entretanto, tal construção pressupõe a participação dos cidadãos na produção de
um discurso orientado para o entendimento, e pressupõe, sobretudo, um Estado efetivamente
democrático, em que os direitos fundamentais e a democracia entrem em um inseparável
contexto.
A sociedade moderna atingiu tamanha complexidade que vem exigindo cada vez mais
respostas de complexidades proporcionais. O direito não é um sistema fechado, muito menos a
Constituição Federal, mesmo sendo ela uma Constituição rígida, ou seja, difícil de ser
modificada, ela acaba por receber novas possíveis transformações que possam vir da
sociedade. É sabido que o direito haverá de passar por profundas transformações, bem como a
sociedade. Porém, terá de ter em mente os ideais que a sociedade já tenha legitimado como
indispensáveis para um Estado saudável e sustentável. O princípio da dignidade da pessoa
humana é a grande diretriz do direito moderno, tendo em vista o seu objeto central que é a
vida humana, mas não só quanto indivíduo, mas sim como cidadão igualmente visto pela lei.
Toda e qualquer modificação no direito deve seguir os parâmetros morais, tendo sempre como
norte o direito ambiental como direito fundamental e o princípio da dignidade da pessoa

118
humana, sendo este o alicerce central de um direito justo e próspero. Veremos a seguir a
repercussão dos Princípios de Direito e sua repercussão na esfera ambiental na visão
Habermasiana.
A RELAÇÃO INTERNA ENTRE DIREITO E POLÍTICA.
A razão deveria substituir a fonte sagrada do direito, que estava secando. O direito racional,
que ficara preso ao encanto dogmático da construção tradicional de um poder de dominação
autorizado por um direito superpositivo, não conseguiu sobrepujar a ideia de um antagonismo
primordial entre direito e poder. A implosão da abóbada do direito sagrado deixou para trás as
ruínas de duas colunas, a saber: a do direito instaurado politicamente e a do poder utilizável
instrumentalmente; impunha-se a busca de um substituto racional para o direito sagrado, que
se autorizava por si mesmo, capaz de recolocar a verdadeira autoridade nas mãos do legislador
político, entendido como um detentor do poder.
Mesmo que ela não seja mais do que a pequena força motivadora que está presente nos bons
argumentos, pode-se afirmar que o uso público de liberdades comunicativas é, sob este
aspecto, um gerador de potenciais de poder. Isso pode ser ilustrado através do modelo das
tomadas de posição em termos de sim/não em relação à oferta de um simples ato de fala. A
convicção comum entre falante e ouvinte, que é produzida ou simplesmente reforçada através
do reconhecimento intersubjetivo de uma pretensão de validade, significa a aceitação tácita de
obrigações relevantes para ação; nesta medida, ela cria uma nova realidade social.
Tal poder comunicativo só pode formar-se em esferas públicas, surgindo de estruturas da
intersubjetividade intacta de uma comunicação não deformada. Ele surge em lugares onde há
uma formação da opinião e da vontade, a qual, junto com a liberdade comunicativa que

produtividade de um "modo de pensar mais amplo". Este tem por característica "que cada um
atém o seu juízo ao juízo de outros possíveis, e
No Estado Democrático de Direito, o poder político se diferencia, como mostrará HABERMAS,
em poder comunicativo e poder administrativo.
A análise se dá mostrando a tensão entre facticidade e validade, imanente ao próprio direito.
HABERMAS mostrou essa tensão inicialmente na dimensão da validade jurídica, como tensão
entre a positividade e a legitimidade do direito, e dentro do sistema dos direitos, como tensão
entre a autonomia pública e privada. Com a ideia de Estado de Direito, a perspectiva se amplia.
Dos direitos passamos para uma dominação organizada em forma de direito, cujo exercício
tem de estar ligado ao direito legítimo. Com a aplicação reflexiva do direito ao poder político
que o direito pressupõe, desloca-se a tensão entre facticidade e validade para outra dimensão:
essa tensão retorna ao poder político constituído em termos de Estado de Direito. A
dominação política se apoia em um potencial de ameaça e sanção, que vem coberto através de
meios de violência aquartelados; mas, simultaneamente, vem autorizada pelo direito legítimo.

119
O entrelaçamento entre o direito e o poder político caracteriza a passagem das sociedades
organizadas por parentesco para as primeiras sociedades organizadas estatalmente, que
originariam os impérios antigos com suas culturas superiores.
Antes de entrar nos princípios do Estado de direito, HABERMAS mostra as condições nas
quais pode se formar o poder comunicativo. Para isso, partirá da lógica das distintas questões
pelas quais vem determinada a estrutura da formação da opinião e da vontade de um
legislador democrático.
O PODER COMUNICATIVO E A FORMAÇÃO LEGÍTIMA DO DIREITO.
O principio do discurso, segundo HABERMAS, tem inicialmente o sentido cognitivo de filtrar
contribuições e temas, argumentos e informações, de tal modo que os resultados obtidos por
este caminho têm a seu favor a suposição da aceitabilidade racional: o procedimento
democrático deve fundamentar a legitimidade do direito. Entretanto, o caráter discursivo da
formação da opinião e da vontade na esfera pública política e nas corporações parlamentares
implica, igualmente, o sentido prático de produzir relações de entendimento, as quais são
O poder
comunicativo de convicções comuns só pode surgir de estruturas da intersubjetividade
intacta. E esse cruzamento entre normalização discursiva do direito e formação comunicativa
do poder é possível, em última instância, porque no agir comunicativo os argumentos também
formam motivos.
Tal cruzamento se faz necessário, porque comunidades concretas que desejam regular sua
convivência com os meios do direito não conseguem separar as questões de regulamentação
de expectativas de comportamento das questões referentes à colocação de fins comuns, o que
seria possível numa comunidade idealizada de pessoas moralmente responsáveis. As questões
políticas distinguem-se das morais.
No caso de conflitos de ação, quando se impõem determinados problemas que precisam ser
enfrentados cooperativamente ou solucionados consensualmente, uma coletividade é
confrontada com a pergunta: "o que devemos fazer?" O tratamento racional dessas questões
exige uma formação da opinião e da vontade que leva a resoluções fundamentadas sobre a
persecução de fins coletivos e sobre a regulamentação normativa da convivência. No primeiro
caso, a coletividade se compreende como um quase sujeito capaz de agir teleologicamente; no
segundo, como uma comunidade de indivíduos que se entendem sobre o comportamento que
eles podem esperar legitimamente uns dos outros.
Até agora consideramos processos de uma formação política racional da vontade sob dois
aspectos. Em primeiro lugar, as deliberações servem para a ponderação e o discernimento de
fins coletivos, bem como para a construção e a escolha de estratégias de ação apropriadas à
obtenção desses fins; em segundo lugar, o horizonte de orientações axiológicas, no qual' se
colocam essas tarefas de escolha e de realização de fins, pode ser introduzido no processo da
formação racional da vontade pelo caminho de um auto entendimento que se apropria de

120
tradições. Em discursos pragmáticos, nós examinamos se as estratégias de ação são adequadas
a um fim, pressupondo que nós sabemos o que queremos. Em discursos ético-políticos, nós nos
certificamos de uma configuração de valores sob o pressuposto de que nós ainda não sabemos
o que queremos realmente. Em discursos desse tipo, é possível fundamentar programas, na
medida em que eles são adequados e, num sentido amplo, bons para nós. No entanto, uma boa
fundamentação precisa levar em conta outro aspecto - o da justiça. Antes de querer ou aceitar
um programa, é preciso saber se a prática correspondente é igualmente boa para todos. Com
isso desloca-se, mais uma vez, o sentido da pergunta: "o que devemos fazer?".
O princípio da universalização obriga os participantes do discurso a examinar normas
controversas, servindo-se de casos particulares previsivelmente típicos, para descobrir se elas
poderiam encontrar o assentimento refletido de todos os atingidos. Para superar esse teste as
regras morais têm que assumir uma versão geral, completamente descontextualizada; por isso,
elas só podem encontrar uma aplicação descontextualizada naquelas situações standart, cujo
componente "se" já foi levado em conta preliminarmente. Como, porém, nos discursos de
fundamentação, não se pode levar em conta todas as possíveis constelações de casos singulares
futuros, a aplicação da norma exige um esclarecimento argumentativo sui generis, sem
semelhança com nenhum outro.
Em tais discursos de aplicação, a imparcialidade do juízo não é garantida através de um novo
princípio de universalização, e sim através de um princípio da adequação. Habermas retoma
essa proposta de Klaus Günther, quando tratar da análise da prática da decisão judicial.
A fundamentação depende, em primeira linha, de uma interpretação correta situação da
descrição adequada do problema que se tem pela frente, da influencia de informações
relevantes e confiáveis, da elaboração correta dessas informações, etc. Nesse primeiro estágio
da formação da opinião e da vontade, torna-se necessário um certo saber especializado, que é
naturalmente falível e raras vezes neutro do ponto de vista valorativo, sendo, portanto,
controverso.
Em caso ideal, e esse é o nosso ponto de partida, as decisões são tomadas no nível em que a
controvérsia deve ser prosseguida com argumentos. O modo como se decide depende do
aspecto sob o qual a matéria a ser regulamentada e acessível a um esclarecimento posterior.
Entretanto, em sociedades complexas e até mesmo sob condições ideais, nem sempre
alternativas estarão abertas, especialmente quando se constata que todas as regulamentações
tocam de várias maneiras diferentes interesses, sem que se possa fundamentar um interesse
universalizável ou a primazia inequívoca de um determinado valor. Nesses casos, resta a
alternativa de negociações que exigem evidentemente a disposição cooperativa de partidos
que agem voltados ao sucesso.
Negociações naturais ou não reguladas apontam para compromissos aceitáveis pelos
participantes sob três condições. Tais compromissos preveem um arranjo que é: a) vantajoso

121
para todos; b) que exclui pingentes que se retiram da cooperação; c) exclui explorados que
investem na cooperação mais do que ganham com ela.
Processos de negociação são adequados para situações nas quais não é possível neutralizar as
relações de poder, como é pressuposto nos discursos racionais. Os compromissos obtidos em
tais negociações contêm um acordo que equilibra interesses conflitantes. Enquanto um acordo
racionalmente motivado se apoia em argumentos que convencem da mesma maneira todos os
partidos, um compromisso pode ser aceito por diferentes partidos por razões diferentes, É
verdade que a corrente discursiva de uma formação racional da vontade romperia com o elo
de um tal compromisso, caso o principio do discurso não pudesse valer, ao menos
indiretamente, em tais negociações.
Os princípios do Estado de Direito e a lógica da divisão de poderes
No princípio da soberania popular, segundo o qual todo o poder do Estado vem do povo, o
direito subjetivo à participação, com igualdade de chances, na formação democrática da
vontade, vem ao encontro da possibilidade jurídico-objetiva de uma prática institucionalizada
de autodeterminação dos cidadãos. Esse princípio forma a charneira entre o sistema dos
direitos e a construção de um Estado de direito. Interpretado pela teoria do discurso (a), o
princípio da soberania popular implica: (b) o princípio da ampla garantia legal do indivíduo,
proporcionada através de uma justiça independente; (c) os princípios da legalidade da
administração e do controle judicial e parlamentar da administração; (d) o principio da
separação entre o Estado e sociedade, que visa impedir que o poder social se transformasse em
poder administrativo, sem passar antes pelo filtro da formação comunicativa do poder.
Em primeiro lugar, a diferença lógica e argumentativa entre fundamentação e aplicação de
normas reflete-se nas formas comunicativas de discursos de fundamentação e de aplicação,
que precisam ser institucionalizados juridicamente, de diferentes maneiras.
O poder social tanto pode possibilitar como restringir a formação do poder comunicativo. No
primeiro caso, há condições materiais necessárias para uma assunção autônoma de liberdades
comunicativas ou de ação, formalmente iguais. Em negociações políticas, por exemplo, os
partidos envolvidos têm que conseguir credibilidade para suas promessas ou ameaças através
do poder social. No segundo caso, a disposição sobre o poder social abre a chance de
influenciar no processo político, o qual consegue precedência para interesses próprios, para
além do espaço dos direitos de igualdade dos cidadãos. Através deste modo interventor,
empresas, organizações e associações conseguem, por exemplo, transformar o seu poder social
em político, seja diretamente, através da influência na administração, ou indiretamente,
através de intervenções e manobras na esfera pública política".
Os princípios do Estado de direito, desenvolvidos se juntam numa arquitetônica construída
sobre a seguinte ideia: a organização do Estado de direito deve servir, em última instância, à
auto-organização política autônoma de uma comunidade, a qual se constituiu, com o auxílio
do sistema de direitos, como uma associação de membros livres e iguais do direito. As

122
instituições do Estado de direito devem garantir um exercício, efetivo da autonomia política de
cidadãos socialmente autônomos para que o poder comunicativo de uma vontade formada
racionalmente possa surgir, encontrar expressão em programas legais, circular em toda a
sociedade através da aplicação racional, da administrativa de programas legais e desenvolver
sua força de integração social - através da estabilização de expectativas e da realização de fins
coletivos.
Devido ao seu elevado grau de racionalidade, a prática da decisão judicial constitui o caso mais
bem analisado de uma interligação entre dois tipos de procedimento, ou seja, entre o
procedimento jurídico institucionalizado e um processo de argumentação que se subtrai, em
sua estrutura interna, à institucionalização jurídica. Neste cruzamento de procedimentos, se
revela que o universo do direito pode abrir-se, a partir de dentro, para argumentações, através
das quais argumentos pragmáticos, éticos e morais têm acesso à linguagem do direito, sem
suspender, de um lado, o jogo da argumentação e sem detonar, de outro lado, o código jurídico.
A clássica divisão de poderes é explicada através de uma diferenciação das funções do Estado:
enquanto o legislativo fundamenta e vota programas gerais e a justiça soluciona conflitos de
ação, apoiando-se nessa base legal, a administração é responsável pela implementação de leis
que necessitam de execução. Ao decidir autoritariamente no caso particular que é direito e o
que não é, a justiça elabora o direito vigente sob o ponto de vista normativo da estabilização
das expectativas de comportamento. A realização administrativa elabora o conteúdo
teleológico do direito vigente, na medida em que este confere forma de lei a políticas e dirige a
realização administrativa de fins coletivos. Sob pontos de vista da lógica da argumentação, os
discursos jurídicos servem para a aplicação de normas, ao passo que a racionalidade da
atividade administrativa é assegurada através de discursos pragmáticos.
Pois na perspectiva da teoria do poder, a lógica da divisão dos poderes só faz sentido se a
separação funcional garantir, ao mesmo tempo, a primazia da legislação democrática e a retro
ligação do poder administrativo ao comunicativo. Para que os cidadãos politicamente
autônomos possam ser considerados autores do direito, ao qual estão submetidos enquanto
sujeitos privados, necessário que o direito legitimamente estatuído por eles determine a
direção da circulação do poder político.
Se o direito deve ser normativamente fonte de legitimação e não simples meio fático da
organização do poder, então o poder administrativo tem que ser retro ligado ao poder
produzido comunicativamente. Essa retro ligação do poder administrativo teleológico ao
poder comunicativo, que produz o direito, pode realizar-se através de uma divisão funcional
dos poderes, porque a tarefa do Estado de direito democrático consiste, não apenas em
distribuir equilibradamente o poder político, mas também em despi-lo de suas formas de
violência através da racionalização. A domesticação jurídica do poder político natural não
pode, no entanto, ser entendida como disciplina de um poder contingente da vontade,
incontrolável em sua substância.

123
Por esta razão, o conceito de lei constitui o elemento básico nas construções do Estado de
direito burguês. Quando se entende a lei como uma norma geral que obtém validade através
do assentimento da representação popular num procedimento caracterizado pela discussão e
ela esfera pública, nela se unem dois momentos: o do poder de uma vontade formada
intersubjetivamente e o da razão do processo legitimador.
O direito a proteção ambiental como integrante indubitável do grupo de direitos fundamentais
A questão ambiental ganha espaço na sociedade dia após dia e a discussão sobre a proteção ao
meio ambiente não é recente. Vivenciamos a perspectiva de um desenvolvimento sustentável
que satisfaça todas as necessidades do presente sem comprometer a capacidade de gerações
futuras através do uso racional dos recursos naturais em especial o uso fontes de energia

iniciada com a Lei 6.938/81, à medida que reconheceu o direito ao um meio ambiente
ecologicamente equilibrado como direito fundamental da pessoa humana. Dá a ele a natureza

corresponsabilidade ao Poder Público e do cidadão pela sua defesa e preservação.


O Século XX retratou mudanças expressivas determinadas pelas atividades humanas, viu
multiplicarem as cidades de forma nunca antes ocorrida anteriormente, em número, tamanho
da população e áreas ocupadas, e complexidade dos impactos sobre os locais aonde elas vieram
se assentar.
Vivemos em um período de intensos contrastes, no concernente ao desenvolvimento
econômico-político-social da humanidade. Ao mesmo tempo em que a economia mundial se
aprimora para além da industrial e a sociedade se deslumbra com as habilidades de nossa
civilização para as grandiosas descobertas técnico-científicas, paradoxalmente nos
distanciamos, cada vez mais, da intimidade com o planeta onde vivemos.
Nossa civilização luta, incessantemente, para gerar e comercializar riquezas. Na luta por esses
objetivos, emerge um ambiente em constante desintegração dos recursos naturais e do próprio
humano, correndo o risco de gerar um mundo artificial. Nossas ações e omissões referentes ao
meio ambiente estão destruindo o planeta, colocando em risco a existência da própria
civilização. Embora o contraste entre nossa civilização e à dos nossos ancestrais seja quase
abissal, no condizente com o uso e desenvolvimento da tecnologia, por exemplo, temos, na
realidade, muito em comum: dependemos, também, totalmente, dos sistemas e recursos
naturais da Terra para o nosso sustento. Infelizmente, a expansão da economia global, na
forma em que está estruturada, tem subjugado nossos ecossistemas. Isso pode ser comprovado
diante das inúmeras questões ambientais globais emergentes, tais como o desaparecimento de
espécies vegetais e animais, o encolhimento das florestas, o aquecimento da temperatura do
planeta, a erosão dos solos, a produção avassaladora de lixo doméstico e tóxico, a poluição e a

124
escassez da água, a extinção da própria espécie humana em razão de sua face econômica
perversa.
Diante da presente realidade há de repensar a teoria jurídica tradicional, enfatizando a
urgência de uma reflexão inter e transdisciplinar e relacionando as ciências sócio humanas e
jurídicas em busca do bem comum.
A proteção ao meio ambiente como um princípio básico de nosso sistema jurídico posiciona o
direito a proteção ambiental como integrante indubitável do grupo de direitos fundamentais,
vincula ao princípio da dignidade da pessoa humana e ao próprio conceito de cidadania, em
uma ordem genuinamente democrática.
Tal vinculação ocorre, não somente pela inserção sistemática do meio ambiente no âmbito dos
direitos fundamentais, mas principalmente, por ser o Estado Democrático de Direito a
garantia, a promoção e a efetivação desses direitos.
A necessidade da participação popular na preservação do meio ambiente.
Partindo da análise interpretativa do disposto no artigo 225, da Constituição Federal, a
proteção do meio ambiente, para além de um direito fundamental do homem, é um dever
fundamental.
A fórmula empregada para balizar e justificar os deveres fundamentais em nossa Constituição
e, essencialmente, endossar àqueles relacionados à proteção do meio ambiente, tem como
linha mestra a proposta de uma vida digna e justa, do ponto de vista individual e coletivo, e
assumindo o pressuposto de que o meio ambiente necessita ser tutelado por diversos ramos do
Direito, emerge a necessidade de construção de uma esfera de deveres associadas ou não aos
direitos fundamentais.
Esses deveres fundamentais norteiam o ethos de obtenção de uma vida digna, solidária, com
liberdade e igualdade. Nesses termos, o dever fundamental à proteção do meio ambiente é um
dever associado ao direito fundamental de usufruir o meio ambiente saudável .
Assim, intrinsecamente vinculado ao direito de proteção ambiental existe um dever
fundamental caracterizado pela obrigação incumbida ao Estado e a cada um dos indivíduos
partícipes de nossa sociedade em manter um ambiente saudável, sadio e equilibrado, seja por
intermédio de cuidados básicos para com o meio seja através de grandes participações
populares na luta pela não destruição do habitat natural.
Os deveres fundamentais de cunho ambiental se filiam a classificação dos deveres
fundamentais de cunho sócio-econômico-cultural, estando associados e exprimindo,
sobretudo, a responsabilização dos indivíduos na conservação e na promoção de uma dada
sociedade. Dessa forma, o dever fundamental de defesa do meio ambiente pode ser classificado
como um dever fundamental de cunho positivo e negativo, uma vez que impõe ao indivíduo
um comportamento de defesa, ora através de uma ação, ora através de uma abstenção,

125
caracterizando uma dupla função deste dever fundamental de defesa ambiental diretamente
aplicável.
A participação popular, com o intuito de conservação do meio ambiente, está inserida em um
quadro mais amplo da participação diante dos interesses difusos e coletivos da sociedade. A
determinação da proteção ao meio ambiente sadio e equilibrado por meio da teoria dos
direitos fundamentais e estabelecendo que esses direitos provoca a existência de um dever
fundamental, faz com a comunidade participe da proteção seja em razão da existência de um
nível de consciência moral elevado, seja pela imposição jurídica da norma, quando da
efetivação dos deveres fundamentais.
O papel da sociedade civil e da esfera pública no cenário político se atualiza por intermédio de
um efetivo exercício da democracia no que concerne à defesa dos interesses difusos do
cidadão. Em especial, a defesa do meio ambiente constitui-se em parte deste processo; para a
produção de um corpo legislativo que corresponda aos anseios da comunidade que, de alguma
maneira direta ou indiretamente, imediata ou remotamente se relaciona com este meio
ambiente.
Os direitos fundamentais, portanto, são o resultado da positivação constitucional de
determinados valores básicos que, ao lado de nossos princípios fundamentais, formam o
núcleo basilar de nossa estrutura constitucional democrática. E é a partir deste ponto de vista
que iremos abordar a vinculação dos direitos fundamentais à ideia específica de exercício da
democracia, de uma democracia constitucional .
Segundo SARLET , os direitos fundamentais podem ser considerados ao mesmo tempo um
pressuposto, uma garantia e um instrumento do princípio democrático da autodeterminação
dos povos, por intermédio de cada indivíduo. Estas concepções tornar-se-ão concretas a partir
do reconhecimento de direitos como o direito de igualdade e de um espaço de liberdade real,
por meio do direito de participação.
A liberdade de participação política do cidadão, atuando como sujeito ativo e intervencionista
nos processos decisórios em virtude da incorporação das efetivas atribuições inerentes à
soberania, constitui ingrediente indispensável às demais liberdades protegidas pelos direitos
fundamentais .
SARLET ressalta que os direitos fundamentais exercem função decisiva em um e,
principalmente, no nosso regime democrático, haja vista agir como um garantidor dos direitos
das minorias ante aos eventuais desvios de poder praticados pela maioria detentora do poder;
salienta-se, portanto, a efetiva liberdade de participação.
Como representante basilar, o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado
desenvolve uma nova forma de cidadania. Por ser este direito, um direito essencial à qualidade
de vida, amplia o próprio conteúdo dos direitos humanos e o próprio conceito de cidadania.
Por intermédio dele e devido a ele, todos têm direito a um meio ambiente sadio.

126
A concepção de deveres fundamentais, por sua vez, insere-se na procura por espaços de
moderação, de correção ou de superação de direitos não contemplados nos espaços sociais,
prevendo ações e a participação dos indivíduos, se o que se busca, realmente, é o
desenvolvimento sustentável alicerçado pela promoção da democracia.
Esse processo de democratização, que inclui as dimensões de participação, de solidariedade,
de liberdade, de igualdade, radica nas condições defendidas por HABERMAS que pressupõem:
(I) o envolvimento e o interesse de todos e de cada um; (II) a não-coação; (III) a factibilidade da
expressão e das condições de fazer-se entender; (IV) a possibilidade de que todos possam se
expressar e ser ouvidos; (V) a alternativa de colocar em dúvida de condição de legitimidade
qualquer fato, experiência ou norma que não se mostre socialmente legítima, embora possa ser
legal.
HABERMAS questiona o papel do indivíduo e da sociedade na preservação do meio ambiente.
Qual é o papel das esferas públicas de discussão, quais são os objetivos que esperamos ver
alcançados? Quais os processos a serem continuamente estimulados para manter o processo
dessa democracia radical em sua concretude? Como entender a verdade em sua factibilidade,
legitimidade e historicidade? Como analisar o direito do Direito nas condições, não de uma
verdade, mas de verdades que necessitam ser legitimadas em função de uma legalidade que
seja socialmente justa e individual e veraz?
É nossa obrigação como indivíduo e como sociedade civil organizada, manter o Meio
Ambiente saudável. O entendimento de saudável, no entanto, sofre das questões de significado
e de processos de sentido. HABERMAS entende esta questão pela relação entre interesses e
usos do conhecimento. Assim, essa própria sociedade que deveria protegê-lo, viola-lo,
desrespeitando regras, aproveitando-se de lacunas ou de falta de fiscalização, ou mesmo da
necessidade de reconstrução do direito individual e social .
O uso de espaços de esfera pública serve para conscientizar e, muito mais que conscientizar,
fazer com que a população se assuma em uma posição ativa, atuante, veja-se como parte do
problema e da solução. Os espaços de esfera pública têm como objetivo alcançar a verdade, a
veracidade e a justiça, por intermédio da legitimidade . Normas e direitos oriundos dos
questionamentos propiciados pelo uso dos espaços de esfera pública ao lado da interpretação
sistemática destas normas, cria o melhor direito de proteção ao meio ambiente ou uma forma
de pô-lo em prática mediante uma correta aplicação.
A importância dos espaços para discussão alicerçam-se no poder comunicativo realçado por
Habermas valendo-se da Ética do Discurso, na qual se pressupõe o questionamento de um fato,
no caso a proteção ao meio ambiente, no que diz com a sua verdade, autenticidade, e justiça.
Desta forma, não sendo legítimos os atos em suas manifestações, seja como fatos, como
experiência, ou seja como expressão de regras, estes podem ser negociados, superados ou
suprimidos, sendo reinstaurados em novas bases.

127
A preocupação com o meio ambiente é decorrente de alteração dos processos de formação de
opinião, alterações que alcançam uma maior preocupação com o público, com o universal em
sua processualidade e busca permanente, com o que é de todos. O Direito Ambiental
encontrou reflexo nos espaços de esfera pública, por se fazer necessária uma discussão
coerente e atual, preocupada e eficaz quanto à posição da sociedade civil organizada perante as
evidentes degradações ambientais.
Por estar apoiada em Direitos Fundamentais, a esfera fornece as primeiras referências acerca
de sua estrutura social. A liberdade de opinião e de reunião, bem como o direito de fundar
sociedades e associações, define o espaço para constituição de grupos, instituindo o espaço
para organizações livres que interferem na formação da opinião pública. O sistema político
passa assim a obrigar-se ou a isto é instado, a ser sensível a influências da opinião pública,
conectar-se com a esfera pública e com a sociedade civil, por meio da atividade eleitoral e da
manifestação ordenada dos cidadãos.
No concernente às barreiras e estruturas de poder que surgem no interior da esfera pública,
salienta que os conceitos da esfera pública política e da sociedade civil introduzidos não
representam apenas postulados normativos, pois têm referências empíricas. Em sociedades
complexas, a esfera pública forma uma estrutura intermediária que faz a mediação entre o
sistema político, de um lado, e os setores privados do mundo da vida e sistemas de ação
especializados em termos de funções, de outro lado. A esfera pública representa uma rede
supercomplexa que se ramifica especialmente num sem número de arenas internacionais,
nacionais, regionais, culturais, dentre outras. Em suma, no interior da esfera pública geral,
definida por intermédio de sua relação com o sistema político, as fronteiras não são rígidas em
princípio.
Quando dispõe sobre a superação das barreiras em situações críticas, Habermas retoma a
questão central, que consiste em descobrir o sujeito capaz de colocar os temas na ordem do dia
e de determinar a orientação do fluxo de comunicação. As estruturas comunicacionais da
esfera pública estão muito ligadas aos domínios da vida privada, fazendo com que a sociedade
civil possua uma sensibilidade maior para os novos problemas, conseguindo captá-los e
identificá-los antes que os centros da política.
A comunidade de comunicação instaura-se quando algum dos três mundos (mundo objetivo,
mundo subjetivo e mundo social) , ou todos eles, considera ilegítimo ou algum ato de fala de
um deles podendo vir a ser tematizado em um ambiente de debate e de busca de reconstruções
e restaurações de outros ordenamentos em novas bases, mais verdadeiras, mais justas e
verazes para cada um e para todos.
As discussões na esfera pública formalizam o alicerce intersubjetivo da comunicação,
caracterizando-se em um processo dialógico, no qual não se faz uso da coação. Assim, quando
uma norma não atende a cada um e a todos e essa comunidade decide que ela é ilegítima,
mesmo que esteja instituída no ordenamento jurídico, pode-se propor a sua transformação.

128
Cabe salientar, ainda, a importância dos espaços de esfera pública para o uso da comunidade
de comunicação no concernente a um desenvolvimento moral e de engajamento social do
cidadão nas questões ligadas à proteção e ao desenvolvimento de um meio ambiente saudável
e seguro.
A participação da sociedade nas questões vinculadas à proteção do meio ambiente está
vinculada ao direito fundamental de participação na organização e no procedimento.
Neste sentido, em destaque, encontram-se as organizações não governamentais (ONGs), que
por intermédio de discussões e tematizações públicas de temas ecológicos, com o uso de uma
linguagem pragmática, em todo o mundo conseguiram atrair a atenção dos governantes e da
sociedade civil organizada para o perigo do desenvolvimento insustentável.
Com o decorrer do tempo um número maior de entidades ligadas ao, assim denominado,
terceiro setor influenciam as discussões e as polêmicas acerca do que se dispõe sobre o meio
ambiente, especialmente em termos de políticas ambientais. Servindo-se da comunicação
empregada no mundo da vida, no mundo dos cidadãos, por intermédio da produção de bens
públicos as ONGs conseguiram trazer para o cerne das discussões o desenvolvimento
sustentável da economia e do meio ambiente, com o intuito de fazer permanecer a
biodiversidade do meio no qual estamos inseridos.
Cada vez mais estas organizações são as responsáveis pela elaboração de leis de proteção
ambiental e de conscientização do Poder Judiciário, tanto por influência deste quanto da
atividade ímpar praticada pelos membros do Ministério Público. A omissão participativa da
coletividade e dos órgãos do Poder Público poderá resultar em um prejuízo incalculável que
será suportado por toda a humanidade, haja vista a natureza difusa do direito fundamental à
proteção ambiental.
FIORILLO alerta que o fato de a administração desse bem ficar sob a custódia do Poder
Público não elide o dever do povo de atuar na conservação e preservação do direito do qual é
titular.
HABERMAS salienta os seguintes pontos com a finalidade de elucidar a compreensão da
constituição: sistema político, especializado na produção de decisão; política, responsável por
problemas que atingem a sociedade como um todo; e, além disso, as decisões que envolvem a
coletividade têm que ser vista como a concretização de direitos.
O referido autor sustenta que essa prática é perenizada nas formas de organização do Estado
democrático, perfectibilizado pela Constituição. HABERMAS afirma que, toda a constituição
histórica desenvolve uma dupla relação: como documento histórico e projeto de sociedade
justa. Para tanto, apresenta a síntese dos elementos a serem levados em conta pelo sistema
jurídico, dispondo que a reconstrução desses direitos revelou que os direitos fundamentais e
os princípios do Estado de Direito explicitam apenas o sentido performativo da auto
constituição de uma comunidade de parceiros do direito, livres e iguais.

129
O controle do cidadão sobre o aparato estatal torna-se cada vez mais atuante e capaz de
imprimir uma nova dinâmica à própria democracia representativa. Desta forma, o controle
popular caracteriza-se como instrumento que possibilita a participação direta dos
administrados no Poder Público.
Com relação à participação popular na preservação do meio ambiente, destaca-se o Princípio
10 da Declaração do Rio de Janeiro
do meio ambiente é assegurando a participação de todos os cidadãos interessados no seu nível

É dever do Poder Público e da Coletividade defender e preservar o meio ambiente para as


presentes e futuras gerações, sendo assegurado ao cidadão a possibilidade do cidadão de
participar de políticas públicas através: do plebiscito (esfera legislativa), do direito de
informação, de petição, estudo prévio de impacto ambiental (esfera administrativa) e de ação
civil pública, ação popular, mandado de segurança coletivo, mandado de injunção, ação civil
de responsabilidade por improbidade administrativa e ação direta de inconstitucionalidade
(esfera judicial).

como instrumentos de Deus, no cuidado da criação, cada um a partir de sua cultura,

Assim, mediante um processo de justiça dinâmica, na qual, especialmente, uma lei não mais
atende à sociedade como um todo, quando passa a ser questionada quanto à sua legitimidade,
pode vir a ser revogada ou reformulada. Esses questionamentos são oriundos de discussões, de
atos de fala do cidadão comum, do leigo, não só do técnico.
A comunidade de comunicação torna-se viva dentro dos espaços de esfera pública, onde
organizações não governamentais discutem e tentam solucionar problemas ligados ao
interesse comum que, por ventura, não forem os mesmos interesses do Estado dominante.
As organizações não governamentais vão surgir quando a sociedade, representada pelo
conjunto de seus cidadãos, no mundo da vida, conflitar com os interesses do Estado político-
econômico dominante, buscando mais moralidade no agir e mais consciência ao desenvolver
tecnicamente a sociedade em conjunto com o meio ambiente. A função do poder
comunicativo, da comunidade de comunicação consubstancia-se no efetivo uso da democracia
nos espaços de esfera pública, nos quais se poderão realizar discussões acerca da proteção ao
meio ambiente, das leis ambientais, do desenvolvimento do capital, da exploração das forças
naturais.
O Estado de Direito demanda organização do Poder Público constituído conforme preceitos do
direito, mas só será legítimo quando o direito for legitimamente instituído, de modo que a
Administração Pública deverá regenerar-se a cada passo a partir do poder comunicativo.

130
Não há outro caminho de enfrentar as marcantes divisões sociais da sociedade, buscando
superar a cidadania de baixa intensidade, senão conferindo prioridade aos mecanismos
participantes que buscam garantir o sistema de direitos fundamentais assegurados pela
Constituição.
CONCLUSÃO
O direito apresenta-se como um sistema de direitos e só pode ser estatuído e imposto através
de organismos que tornam decisões que passam a ser obrigatórias para a coletividade.
O ponto central de reflexão do autor reside na reconstrução de partes do direito racional
clássico através da teoria do discurso. Para explicar a interação social, HABERMAS substitui a
razão prática pela razão comunicativa, e através da ética do discurso busca entender e
fundamentar uma comunicação da qual possa emergir uma razão partilhada pelos sujeitos.
A teoria propugnada por HABERMAS apresenta, pois, condições de possibilidade à construção
de uma nova cultura política que possibilite uma maior inclusão e um maior engajamento dos
cidadãos no processo de organização e de tomada de decisões da sociedade. Entretanto, tal
construção pressupõe a participação dos cidadãos na produção de um discurso orientado para
o entendimento, e pressupõe, sobretudo, um Estado efetivamente democrático, em que os
direitos fundamentais e a democracia entrem em um inseparável contexto. A proteção ao meio
ambiente é um princípio básico de nosso sistema jurídico, posicionando o direito a proteção
ambiental como integrante indubitável do grupo de direitos fundamentais, vinculado ao
princípio da dignidade da pessoa humana e ao próprio conceito de cidadania, em uma ordem
genuinamente democrática.
Vinculado ao direito de proteção ambiental existe um dever fundamental. Esse dever
fundamental caracteriza-se pela obrigação incumbida ao Estado e a cada um dos indivíduos
partícipes de nossa sociedade em manter um ambiente saudável, sadio e equilibrado, seja por
intermédio de cuidados básicos para com o meio seja através de grandes participações
populares na luta pela não destruição do habitat natural.
Em razão da existência do referido direito/dever de proteção ao meio ambiente, se faz
necessária uma maior e mais efetiva participação da população, utilizando os espaços públicos
constituídos para a concretização da discussão, através de um eficaz Estado Democrático, uma
vez que o direito ao ambiente de cada um é também um dever de cidadania na defesa do
ambiente.
Podemos afirmar, assim, que a participação popular constitui ainda um dos elementos do
Estado democrático e social de Direito, pois todos os direitos sociais integram a estrutura
essencial para uma saudável qualidade de vida, que é um dos pontos nucleares da tutela
ambiental, segundo FIORILO. E, para que se concretizem as ações participativa e consciente, é
imperativo desenvolvam-se, de forma paralela e intercomunicativa, a informação e a educação
ambiental. Somente será possível um desenvolvimento sustentável do planeta quando houver
o interesse de todos ou pelo menos de grande parte dos cidadãos do mundo, pois é o homem,
131
como instituição social, que desperta para o interesse de preservar o meio em que vive. A
responsabilidade por adequar, criticar e até mesmo aprimorar estas normas, recai, de certa
forma, sobre a própria população a elas submetida, uma vez que só o realmente envolvido
poderá julgar determinada norma ou regra como válida, legítima, certa ou errada na análise
historiada e circunstanciada a um tempo e a um espaço. Tal merece ainda maior relevo no que
diz com a proteção ambiental, já que em jogo está a vida de todos e a responsabilidade
solidária de todos.
Por fim, há necessidade de estabelecer metas eficazes de transformação de nosso Estado em
um Estado Constitucional Ecológico, com fulcro em um direito/dever fundamental de
proteção ao meio ambiente com a efetiva participação da comunidade em razão da prática de
uma democracia participativa. E, ainda, se o povo não possui garantidos os direitos
fundamentais, ele não terá capacidade de exercício de direito.
Referências.
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988> Disponível em:
www.planaldo.gov.br. Acesso em: 10 nov. 2016.
BRASIL. Lei nº 6.938/81. Disponível em: www.planalto.gov.br. Acesso em: 10.nov.2016.
FIORILLO, Celso A. P. Curso de Direito Ambiental Brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2000.
FRANCISCO, Papa. Laudato Sì. - Louvado sejas: sobre o cuidado da casa comum, São Paulo:
Paulus; Loyola, 2015. Disponível em:
<http://w2.vatican.va/content/francesco/pt/encyclicals/documents/papa-
francesco_20150524_enciclica-laudato-si.html>. Acesso em: 20 abr. 2017.
HABERMAS, Jürgen. A soberania popular como procedimento: um conceito normativo de
espaço público. Novos Estudos CEBRAP, São Paulo, n.º 26, p.107-113. mar. 1990,
_______. Direito e Democracia: entre facticidade e validade . Tradução de Flávio Beno
Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1997.
SARLET, Ingo Wolfgang. A Eficácia dos Direitos Fundamentais. Porto Alegre: Livraria do
Advogado, 1998.
_______. Dignidade da Pessoa Humana e Direitos Fundamentais na Constituição Federal de
1988. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001.
SILVA, Dayse Rafaela da. Direito Social e Patrimônio Cultural. Campinas: Alínea, 2016.

132
LECIONANDO O DIREITO: ENSINAR A SER HUMANO
78

79

Resumo
As barbáries vivenciadas pela humanidade no século passado deram origem a legítima
preocupação de proteção humanitária a todos os indíviduos, assegurando não só direitos
individuais, como também liberdades coletivas e garantias para a sua efetivação. O Brasil tem
se preocupado também com a inserção da disciplina Direitos Humanos nos cursos superiores,
não obstante os esforços, os cursos de Direito não têm buscado alternativas às disciplinas
programáticas que moldam o acadêmico ao perfil velho e decadente de uma justiça belicista,
carecendo de oxigenação às molduras inseridas pelas legislações modernas inspiradas em
modelos democráticos de alternidade e fraternidade. A partir dessa necessidade, busca-se,
nesta pesquisa, o ponto medianeiro entre o pragmatismo e a dialética, pelas mãos de
Boaventura de Souza Santos, Eligio Resta e Luis Alberto Warat, enfatizando que a decadência
de modelos combativos está sendo superada por moldes alternativos que primam pelos
Direitos Humanos e introduzem no meio ambiente do trabalho profissionais pensadores.
Palavras-chave: Ensino jurídico. Multidisciplinaridade. Direito Fraterno.
Abstract
The barbarities experienced by humanity in the last century gave rise to the concern of
humanitarian protection for all individuals, ensuring not only individual rights, but also
collective liberties and guarantees for their realization. Brazil has also been concerned with
the insertion of the discipline Human Rights in the higher courses, despite the efforts, Law
courses have not sought alternatives to the programmatic disciplines that shape the academic
to the old and decadent profile of warlike justice. Lacking oxygenation to the frames inserted
by the modern legislations inspired by democratic models of alternation and fraternity. From
the point of view of necessity, we seek in this research the mediating point between
pragmatism and dialectics, by the hands of Boaventura de Souza Santos, Eligio Resta and Luis
Alberto Warat, emphasizing that the decadence of combative models is being overcome by
alternative molds Which emphasize human rights and introduce professional thinkers into the
work environment.

78
Mestre em Direito Público e Evolução Social pela Universidade Estácio de Sá. Bacharel em Ciências Jurídicas e
Ciências Sociais pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. Professora no Centro Universitário Augusto Motta.
Endereço eletrônico: lucianemara@uol.com.br. Acesso currículo Plataforma Lattes:
http://lattes.cnpq.br/7142619530244859.
79
Mestranda em Direitos Humanos pela Universidade Católica de Petrópolis (RJ). Bacharel em Direito pela
Universidade Iguaçu. Advogada. Professora na Universidade Iguaçu. Endereço eletrônico:
carmencaroline@gmail.com.

133
Keywords: Legal education. Multidisciplinarity. Fraternal Right.
1. INTRODUÇÃO
A sociedade presenciou durante a Segunda Guerra Mundial práticas que evidenciaram a
coisificação da vida e a banalização do mal, em condutas que vilipediaram os ideais iluministas
da liberdade, igualdade e fraternidade como a segregação de indivíduos, por indivíduos que se
viam como superiores e legitimados pelo ordenamento jurídico. A partir desta solução
aplicada a vida do ser humano, a usurpação patrimonial e o desrespeito à personalidade, é que
a comunidade internacional preocupou-se em forjar a expressão dignidade da pessoa humana,
como a satisfação de uma parcela das condições mínimas de uma existência pautada em
direitos universais e igualitários.
Diante deste quadro, a aprovação, em dezembro de 1948, pela Assembleia das Nações Unidas,
da Declaração Universal dos Direitos do Homem, reafirmou direitos individuais, outrora
expressados na Delcaração de Independência dos Estados Unidos, de 1776, na Declaração dos
Direitos do Homem e do Cidadão e na Revolução Francesa, para consignar que todo homem,
apesar de suas variáveis biológicas, socioeconômicas, psicológicas e culturais, deve ter
resguardada a sua identidade enquanto pessoa humana. Sendo assim, a partir do
reconhecimento da dignidade, da justiça social e dos direitos humanos, é possível refletir que
as constituições modernas delinearam a liberdade, como fonte de um novo começo. Esta
promoção deve ter como ponto de partida, o ensino dos Direitos Humanos, política pública
que sustenta a difusão dos conceitos e dos valores que comportam a efetivação em uma
sociedade das condições mínimas de tratamento dispensada ao indivíduo.
O Brasil a partir da Constituição de 1988, atribuiu a um rol de direitos, o adjetivo fundamental,
como sinônimo também de liberdade, evidenciando parâmetros mínimos para a vivência
digna em sociedade, tratando ainda, de igual forma, os mecanismos para a sua efetivação. No
entanto, o Direito atravessa a celeuma da construção de uma sociedade mais justa sem deixar
de garantir o desenvolvimento econômico que avoluma as desigualdades sociais,
vulnerabilidade, insegurança e incerteza.
Neste universo de novos direitos, reivindicações e ajustes, o sistema de justiça perpassa por
uma gama de reformas, que apontam para a transformação do judiciário através do ensino
jurídico. Não obstante a formação de profissionais de outras áreas do conhecimento, no Brasil
não se capacita o acadêmico nem o operador para casos complexos, questões de igualdade e
respeito a diferenças, enfim, aspirações que levam ao desenvolvimento pleno da personalidade
humana.
Noutro giro, a parcela mínima de conhecimento adquirido e absorvido pelo operador do
Direito capaz de apontar o direito fundamental num conflito, como àquele inerente à sua
condição humana, torna-se dominado pela cultura combativa, evidenciado nos modelos
replicados e tradicionais das escolas. A multidisciplinaridade contribui para uma formação

134
profissional mais humanística, sem deixar de conjugar as exigências feitas pelo poder público e
parte da comunidade acadêmica.
O problema está presente no desenvolvimento de competências, inserindo de forma
rudimentar a disciplina de Direitos Humanos sem consolidar estruturas mínimas que,
enveredam a sua concretização, como tratar o contato dos acadêmicos com o Direito Fraterno
e práticas de mediação e negociação de conflitos.
O objetivo da pesquisa é evidenciar dinâmicas que venham a romper com o modelo vencido-
vencedor e o clássico conceito de cidadania que está inserto nas legislações e políticas
públicas, para contribuir efetivamente com a formação humanizada, estabelecendo a distinção
entre ser homem e ter humanidade. No trabalho, busca-se especificamente estabelecer as
linhas mestras do Direito Fraterno, como conteúdo de Direitos Humanos; incorporar o ensino
das formas alternativas de resolução de conflitos e compreender o ensino de Direitos
Humanos e de Direito Fraterno, modo defensor da dignidade da pessoa humana advindo de
seu caráter harmônico.
A base teórica do trabalho bibliográfico funda-se em Elígio Resta, Luis Alberto Warat e
Boaventura Souza Santos, observando os resultados de algumas instituições de ensino superior
que desenvolvem timidamente o que se propõe, limitando-se territorialmente ao Estado do Rio
de Janeiro.
2. TRANSFORMAR PARA RESGATAR
Diante da proposta de inserir a disciplina de Diretos Humanos como meio de conscientizar os
profissionais oriundos dos saberes das Ciências Sociais Aplicadas, é partindo da idéia de
construir a formação por caminhos humanísticos que as instituições e ensino superior lançam
na matriz curricular disciplinas que envolvam os direitos humanos para consolidar os
princípios da liberdade, fraternidade e igualdade nos diversos campos da sociedade. Não
obstante, de acordo com a posição do Ministério da Educação e Cultura do Brasil, não é tão
simplificado adotar conceitos mínimos de cidadania, direitos fundamentais, ações afirmativas,
tratados e convenções internacionais.
Só isto não basta para orientar a instrução do acadêmico, que não incorpora o debate nos
bancos escolares, muito menos tem a amplitude da disciplina. É possível apontar que uma
parcela considerável da sociedade tem a equivocada visão que os direitos humanos têm como
destinatário os encarcerados. Não só, mas também, pois falar de direitos humanos é abordar a
proteção legal do ser humano, do direito do homem a não ter e de não sofrer restrições por
qualquer fator genético, ideológico ou biológico.
Deve-se recorrer, com o intuito de não se repetirem outros genocídios como na Alemanha,
Polônia, Sérvia, Ruanda ou Sarajevo, a implementação de técnicas destinadas a compreender
os valores da ética, da justiça e da igualdade entre povos, uma vez que a leitura dos tratados e
das convenções internacionais se restringem a afirmar o dogma de que os indivíduos são iguais
e não pode haver qualquer tratamento no sentido de distinguí-los pejorativamente. Neste
135
sentido, destaca-se a visão deturpada de que o Brasil, ao assumir a questão de cotas para
minorias étnicas, está sendo paternalista, mas não existe qualquer construção de justificativa
para estabelecer que o processo de colonização do Brasil eliminou a liberdade dos silvícolas,
bem como a destruição de grupos, aldeias e culturas. No caso dos afro descendentes, é
oportuno destacar que não se retrata a ausência de integração socioeconômica na extinção do
trabalho escravo. Tais relatos servem somente à guisa de exemplificação no tratamento das
ações afirmativas e a abordagem dos direitos humanos.
Deve-se considerar que ao lecionar a disciplina, tanto a instituição de ensino superior, quanto
o profissional docente, devem estar comprometidos com os seus conteúdos programáticos,
que servem a estruturação de técnicas e avaliações. Porém não podem se limitar a isto, pois o
recorte feito é que o ser humano necessita de parcelas mínimas e essenciais de manutenção,
preservação e proteção da vida, uma vez que o Estado assumiu a posição de garantidor.
Importante ainda considerar que o papel dos Direitos Humanos é a internalização do
reconhecimento pelos Estados daquilo que foi convencionado no âmbito internacional como
também a sua recepção pelos jurisdicionados.
Isto também implica em reconhecer que o fato do indivíduo ser mero portador do direito
posto na lei não surte o efetivo resultado prático quando o mesmo se identifica como
destinatário do direito. Esta conexão, quando realizada extramuros, deságua em ações de
inclusão democrática, afirmação feita a partir da análise de Boaventura de Souza Santos (2007,
p.63).
A hipótese vem contrastar que a disciplina de direitos humanos é elemento suplementar para
as carreiras, uma vez que, as instituições e ensino superior e os acadêmicos estão mais
inclinados a atingir as expectativas do mercado, ou seja, formar profissionais que cumpram
metas, elaborem projetos, resolvam os conflitos, o que culmina na falta de interesses dos
alunos (SANTOS, 2007, p. 62). Numa via reflexiva, algumas bancas de concursos públicos,
como no caso do curso do Direito, ao promoverem a inserção como requisito de aprovação,
tem melhora a sua condição como disciplina eletiva. Destaque merecido por se tratar de um
processo de educação intercultural, interdisciplinar e de responsabilidade cidadã.
Um salto humanitário se produz quando no ensino da disciplina efetivamente há a
investigação das legislações voltadas a assegurar direitos individuais e coletivos; a promoção
de liberdades públicas de natureza civil, política, econômica e social a todos
indiscriminadamente e o estudo dos mecanismos de obter as prerrogativas junto aos três
poderes seja na ausência do Estado, seja na sua aquiescência. Importante fazer o estudo por
situações do cotidiano da comunidade; observar os documentos elaborados pelos Tribunais e
cortes internacionais, bem como identificar as política públicas implementada para suprir a
deficiências na atuação estatal. Desta forma, é pela busca de uma cidadania fraterna onde o
indivíduo se coloca no lugar do ouro, sabendo ouvi-lo e, por este meio, reafirmar os ideais da
Revolução Francesa, do que se ocupa a próxima parte do trabalho.

136
3. MECANISMOS DE EFETIVAÇÃO O ENSINO DE DIREITOS HUMANOS
4. CIDADANIA FRATERNIZADA
A ruptura ao modelo hermeticamente fechado de concretização dos Direitos Humanos em
âmbito interno é o primeiro passo a contradizer o modelo tradicional de dizer o Direito, que
também apresenta o paradigma exigido pelo mercado. Os bancos da academia recepcionam
timidamente sob signo da cidadania. No entanto, o método apresentado por Eligio Resta
(2004), é o Direito Fraterno, com campo de estudo na necessidade universalista de respeito aos
direitos humanos, que vai se contrapondo ao egoísmo ou pelos poderes informais que à sua
sombra governam e decidem.
É de conhecimento universal que os ideais da Revolução Francesa, que receberam maior
destaque no século passado, foram a liberdade e a igualdade, em especial, em decorrência das
atrocidades cometidas. Posto em segundo plano, o principio da fraternidade passa a ocupar o
seu lugar, no contexto social, sob o ponto de vista do tratamento humanitário, sem deixar de
permear os dispositivos de etérea solidariedade entre as nações e de eminente desenho de
direito internacional. A consolidação da fraternidade, na seara do Direito é um novo caminhar
e como princípio a nortear as relações e dispositivos legais, é capaz de inaugurar uma nova
oportunidade no tratamento de conflitos (RESTA, 2004, p. 09-12).
Dessa forma, é pontual estabelecer a vinculação entre direito e fraternidade, por que além de
ser uma tentativa de valorizar uma possibilidade diferente, recoloca em destaque um modelo
de regra da comunidade política: onde não há vencedor, mas um possível. Destarte, é um
trecho do direito vivo que não deve ser analisado sempre como o direito vencedor. Ora, por

conjuntamente, mas não pro


Em decorrência disso, é decisivamente não violento, ou seja, capaz de não se apropriar da
caracterizadora violência pertencente ao querer combater. Em arremate, Humberto Dalla
Bernardina de Pinho e Michele Paumgartten (s.d.) evidenciam que um dos pilares mais
relevantes do Direito Fraterno encontra consolidação sob o alicerce de uma sociedade
humana, retratando um Direito não violento, despido da beligerância e dos enfrentamentos
desnecessários, buscando, doutro viés, a inclusão e a ruptura do binômio ganhador-
perdedor/amigo-inimigo, convenção arraigada do processo judicial tradicional. Nesta linha, o
que deve pautar tais debates é a existência do mio dialogal, onde os indivíduos em conflito
necessitam antes de decidir como se tratam, preservar a relação existente.
3.2 INTEGRAÇÃO PELO DIÁLOGO
Independentemente de qual seja a natureza do direito violado, é oportuno isolar o conflito e
lhe atribuir o tratamento adequado para solucionar os pontos de colisão. Nesta linha de
raciocínio, aponta-se que o conflito é comum ao ser humano e quando esta problemática
transborda a solução por intervenção estatal, é importante enfatizar que a sua composição
137
pela justiça tradicional, para as quais o egresso da faculdade de Direito é moldado para atuar
nos eixos demanda, custo financeiro, capital humano e entraves socioeconômicos.
Assim, nos Estados Unidos da América, na década de 1980 desenvolveu-
-Hakin (1997,
Apud, AMARAL, 2009, p.61), sendo originada das Alternative Dispute Resolution (ADR), como
opção aquela justiça tradicional centrada na figura do juiz. Esta alternância possibilita o
diálogo e promove a aptidão das partes em encontrar soluções consensuais para a resolução de
conflitos buscando substituir o - -
que o método tradicional privilegia o litígio, onde há a dicção do direito para uma das partes,
enquanto os meios alternativos preconizam o diálogo, para se chegar ao ponto onde todos os
envolvidos ganham por ajustar as controvérsias.
O artigo, por restrições metodológicas, toma o princípio da dignidade humana em seu sentido
mais amplo, pois tem na liberdade o seu núcleo central, apresentado como o principio da
autonomia das partes para decidirem a controvérsia. É preciso apontar que o exercício desta
liberdade somente será exercido de forma satisfativa se as partes forem educadas a dialogar e a
conhecer estes mecanismos, trazendo a solução efetiva de seus conflitos.
A mediação tem por finalidade a solução do conflito e, principalmente, a preservação da
relação amigável entre as partes, conservando os laços, garantindo a autonomia e, quiçá,
prevenindo litígios futuros. Indivíduos autônomos e conscientes de seus direitos e deveres têm
menor tendência ao litígio, em especial, aqueles chamados na expressão norte-americana de
frivolous lawsuit, ou, processos judiciais inúteis, considerados assim os que servem apenas
para abarrotar o judiciário.
A considerar que no caso das violações de direitos humanos, o poder judiciário interno não é
capaz de efetuar uma resposta célere e a resolução das celeumas precisa ser cada vez mais
rápida, o que as torna massificadas, insatisfatórias e pouco efetivas, não cabendo espaço para a
análise do caso concreto e significação da norma. Segundo Vasconcelos (2015, p.45):
O direito não se confunde com a norma textual, nem pode ser conquistado por meio de
processo puramente lógico de subsunção do fato a esse texto, pela via de conclusão silogística.
Daí por que, especialmente no direito constitucional, os pontos de vista da concretização
devem frequentemente ser deduzidos do texto normativo, mas a aplicação, de modo decisivo,
vai além do texto normativo, mas não vai além da norma, em seu âmbito material, na
significação obtida a partir do caso particular.
Deve-se aqui apontar que, a Comissão Internacional de Direitos Humanos aplica os meios de
solução amigável entre os Estados membros e aqueles que foram vítimas de violações
humanitárias, o que singulariza o atendimento das suas necessidades, objetivando a condução
das partes à solução do problema, utilizando técnicas de negociação, das quais os cursos de
Direito não têm se ocupado de preparar o acadêmico, evidenciando a cultura mercadológica
de formas combatentes, talvez por aspectos institucionais do Poder Judiciário brasileiro, onde

138
o custo de uma demanda é elevado, mas não o suficiente para desestimular a propositura de
uma ação.
Desta forma, é possível avaliar que algumas instituições de ensino superior estão formando
profissionais capazes de agir e atuar como mediador, reafirmando que faz parte de suas
habilidades a sensibilidade às nuances do sentimento humano, da mesma medida com que lida
com prazos e metas estabelecidos pelos Tribunais do Estados. Para tanto, insere conteúdos
multidisciplinares capacitantes para atuar ante a complexidade de sentimentos e ações
humanas, que devem ser levadas em conta quando da realização de uma mediação. Neste
sentido, para avaliar a formação profissional reporta-se a Luis Alberto Warat que analisa a
formação dos operadores de Direito em oposição a construção humanística.
[...] Os homens da ciência têm verdades, respostas prontas. Você é irrelevante, sua pergunta
não interessa; ela também é irrelevante. As respostas prontas estão na relação entre o real e os
discursos. [...] Os homens da ciência geralmente se escondem detrás dos discursos de verdade
para desperdiçar suas vidas. São verdades que têm cheiro de morte. (WARAT, 2001, p. 20).
Observa-se que a formação do mediador portanto, necessita de um processo de educação
participativa, como afirma Warat (2004, p.195):
"parte da idéia de que tenho que assumir e resolver, sair a procurar tudo aquilo que eu não sei.
A educação participativa me transforma em um procurador, um buscador, um bandeirante de
territórios desconhecidos, que descobrimos por nós mesmos. Com a educação Participativa
procuramos perder a fé nas crenças que nos foram impostas, nas crenças que se confundem
com o conhecimento, que em nome da verdade, não se pode ter divergências. Falo das crenças
que nos impuseram para adestrar-nos no fundamentalismo das crenças, das crenças às quais
nunca podemos ser infiéis, as crenças que nos castigam (nos destroem) se nos descobrem
infiéis a elas. Aprender, e isso um mestre tem que ajudar a descobrir, é perder a fé, ser infiéis
ao fundamentalismo de certas crenças. [...] A educação participativa procura que nós
adquiramos a responsabilidade de produzir nossa própria crença, ajudar-nos nós mesmos
(com a menor cota de ajuda terceirizada) a subtrair de qualquer outro com pretensões de
dominador, o poder de produzir-nos as crenças.
Seguindo os argumentos acima apontados, a inserção de disciplinas destinadas a colaborar
com a efetivação de Direitos Humanos deve trilhar por introduzir temas multidisciplinares,
como também habilitar o egresso ao exercício de técnicas que comungam garantias
processuais de um processo eficiente, como também destinado a assegurar os princípios
corolários dos documentos que alicerçaram as constituições hodiernas. É necessário ponderar
que as disciplinas integrantes do complexo pragmático do curso não serão excluídas, ante as
exigências formuladas pelo próprio Ministério da Educação no Brasil, contudo, integralizar o
Direito Fraterno e as disciplinas das Ciências Sociais Aplicadas e Ciências Humanas. Quiçá,
buscará oportunizar a consciência de que há uma ausência, socialmente produzida, da qual

139
Boaventura de Souza Santos (2002, p. 246) nomina sociologia das ausências e, poderá chegar a
perspectiva de ser e de compreender o Direito e pontualmente os Direitos Humanos.
5. CONCLUSÃO
Após a vivência de condições onde o ser reduzido a coisa diferenciado por sua origem, por sua
orientação sexual, seu gene, a sociedade global decidiu atribuir parâmetros mínimos ao
conceito de vida humana e moldando ano após ano a proteção aos Direitos Humanos.
Com a leitura de ser o direito do homem de ser humano, o Estado, preocupado com a
condução das relações, decidiu regulamentar a inserção das disciplinas de Direitos Humanos
nos cursos superiores, em especial nos cursos de ciências sociais aplicadas, com o objetivo de
orientar os bacharéis acerca das cotas mínima para uma vida justa na ordem social.
Num parâmetro, o agir foi no sentido de elaborar conteúdos programáticos impregnados de
conceitos, doutrinadores e tratados internacionais, dissociados de uma leitura mais
aprofundada das ações afirmativas, uma vez que, em grande parte das ações, os indivíduos
apenas conhecem e quando isto acontece que são portadores de direitos, alguns nominados
fundamentais.
Infere apontar que o abismo entre a efetivação e letra da lei evidencia sociedades de
modernidade tardia e que estiveram sob a precariedade de direitos essenciais ao viver bem.
Neste mesmo conector, a importância dos Direitos Humanos indica não existir na formação
dos egressos dos cursos de Direito uma matriz estrutura a compreender e preservar o
tratamento da fraternidade, ideal tão importante como o da liberdade e o da igualdade,
matrizes do pensamento moderno e fundante dos direitos humanos.
Idéia difundida por Eligio Gesta, tem como objeto a solidariedade, necessária entre as nações e
primordial para a vida em sociedade, uma vez que busca romper com a visão individualista e
adentrar ao campo da coletividade. Todavia, não mesmo vital, é a difusão do diálogo como
método de aferir uma acomodação do conflito entre as partes, afastado da forma velha e
decadente que é a cultura belicista.
A implementação de disciplinas que habilitam o acadêmico deve ser uma realidade, vez que a
codificação processual civil brasileira e os demais instrumentos reguladores trafegam no
sentido de composição de conflitos pelo diálogo, a exemplo da conciliação e da mediação no
âmbito interno e da solução amigável de conflitos na Comissão Interamericana de Direitos
Humanos. Neste sentido, a reforma no ensino do Direito caminha no sentido de ensinar a ser
humano.
REFERÊNCIAS:
AMARAL, Márcia Terezinha Gomes. O Direito de Acesso à Justiça e a Mediação . Rio de
Janeiro: Lumem Juris, 2009.

140
ARENDT, Hanna. Origens do totalitarismo. Trad. Roberto Raposo. São Paulo: Companhia das
Letras. 1989.
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GHISLENI, Ana Carolina; SPENGLER, Fabiana Marion. Mediação de conflitos a partir do
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Disponível em http://www.humbertodalla.pro.br/artigos.htm. Acesso em 13 de março de 2016.
RESTA, Elígio. O Direito Fraterno. VIAL, Sandra Regina Martini (trad.). Santa Cruz do Sul:
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justiça. Tradução de Hiltomar Martins Oliveira. Belo Horizonte: Líder, 2004.
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SANTOS, Boaventura de Souza. Pela mão de Alice. São Paulo: Cortez, 1985.
_______. Para uma revolução democrática da justiça. 3ª edicao revista e ampliada. São Paulo:
Cortez, 2007.
_______. Para uma sociologia das ausências e uma sociologia das emergências. Revista crítica
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SPENGLER, Fabiana Marion. Uma nova abordagem dos conflitos sócios jurídicos por meio do
direito fraterno. Monografia (Graduação em Direito) - Direito em Debate, 2006.
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WARAT, Luis Alberto. O ofício do mediador. Florianópolis: Habitus, 2001.
______. Surfando na pororoca: o ofício do mediador. Vol. III. Florianópolis: Fundação Boiteux,
2004.

141
JUDICIAL: ANÁLISE DE CORRELAÇÕES NO ÂMBITO DO SISTEMA
INTERAMERICANO DE DIREITOS HUMANOS
80

81

Resumo
Num contexto de crise do sistema de democracia representativa e de crescimento de
demandas sociais por efetivação de direitos fundamentais, disciplinados na Constituição
brasileira de 1988, exsurge uma questão central à consolidação do Estado Democrático de
Direito: quais são os limites de atuação dos poderes constituídos na defesa e implementação
dos comandos constitucionais de direitos humanos. Ocorre que, em razão da omissão
inconstitucional dos Poderes Legislativo e Executivo no mister de implementação de políticas

direitos da pessoa humana, verifica- nâmica da separação de

poderes do juiz, em verdade. Nesse cenário, forçoso convir que as expectativas de realização
ente, na loteria do protagonismo do Poder
Judiciário, o que, frise-se, oferece condições para - ou potencializa - o risco de ativismo
judicial. Não se trata, contudo, de um processo afeto exclusivamente à Corte brasileira, haja

Interamericano de Direitos Humanos e dos Estados das Américas que a integram, inclusive no
Tribunal Constitucional do Chile. Não obstante a possibilidade de análise pontual com o
decote das particularidades processuais e substanciais de uma ou outra decisão isolada,
depreende-se que o Supremo Tribunal Federal se encontra num ambiente sociojurídico de

disciplinados (positivados) na Carta da República. Trata-se de um estudo descritivo e


funcional, realizado por meio de pesquisa bibliográfica e análise de jurisprudência, estudo de
caso e a metodologia de análise de decisões.
Palavras-chave: Neoconstitucionalismo. Constitucionalização do direito. Pós-positivismo.

INTRODUÇÃO

80
Doutor em Direito Constitucional pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Professor Adjunto da
Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul. (fabriciomuraro@uol.com.br).
Doutoranda em Filosofia do Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Bolsista Capes. Professora
81

convocada na Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul. (murieljacob@hotmail.com).

142
Como cediço, é a partir da segunda metade do século XX, precipuamente, que exsurge a
necessidade de fundamentar e consolidar o paradigma do Estado de Direito contemporâneo.
Nesse sentido, são lançadas as premissas de um novo discurso jurídico que, divergindo
substancialmente do paradigma do positivismo, operacionaliza-se por meio de argumentos
construídos em valores ético-políticos.
Com efeito, vislumbra-se que esse novo discurso jurídico apresenta viés preponderantemente
pós-positivista, haja vista que vem pautado em concepção normativo-principiológica cuja
finalidade confessada é aproximar o direito da moral.
Em verdade, o fenômeno do neoconstitucionalismo floresce, de acordo com os teóricos que
admitem a sua existência, por óbvio-, como movimento de implementação e sustentação do
Estado Democrático de Direito, concepção de Estado esta que desponta na Europa continental
no pós segunda guerra mundial em razão da confluência dos ideários do constitucionalismo e
do princípio democrático, propugnando a constitucionalização do direito como processo de
subordinação total das leis a uma Constituição rígida transformadora.
Nesse contexto, depreende-se que para o reconhecimento da força normativa dos direitos
humanos fundamentais bem como à consolidação de instituições e processos democráticos em
tempos de pós-ditaduras e autoritarismos, fez-se mister a deflagração desse novo discurso
jurídico que inexoravelmente relativizasse a cultura da codificação para cravar suas bases
teóricas numa cultura da argumentação jurídica, ou seja, a teoria da argumentação
promoveria o encaminhamento da teoria da interpretação para a instância da aplicação do
direito em termos de ponderação de princípios82.
Não é por acaso, portanto, que hodiernamente se observa a absorção bastante sutil da teoria da
interpretação pela teoria da argumentação jurídica, fato que se pode comprovar, a título de
exemplificação, pela indicação de leitura obrigatória na academia jurídica das teorias de
Robert Alexy (2008) e Ronald Dworkin (2002), como também pelo protagonismo, inclusive
midiático, dos órgãos com atribuição de produção de decisões, estejam eles integrados na
estrutura do Poder Judiciário ou da Administração Pública, ou ainda no âmbito da Arbitragem
privada.
Feitas essas considerações iniciais, passa-se à análise de aspecto da realidade jurídica brasileira
pós Constituição de 1988 relativa à efetivação de direitos fundamentais e o reconhecimento de

Judiciário brasileiro, num cenário neoconstitucionalista e de desenvolvimento-construção da


teoria da argumentação jurídica marcada pela ausência de padrão decisório em ponderações
de princípios a indiciar ativismo judicial.

Nesse sentido, são as reflexões de Tércio Sampaio Ferraz Junior quanto ao tema da Hermenêutica e Intepretação
82

do Direito em tempos de protagonismo dos órgãos de decisão-aplicação-julgamento.

143
1 SEPARAÇÃO DE PODERES E FUNÇÕES DO ESTADO: DISCRICIONARIEDADE E
NORMATIVIDADE
Em certa medida, não há como negar ao advento, ainda que tardio, da Constituição Brasileira
de 1988 a função-responsabilidade pelo desenvolvimento de um novo direito constitucional
nacional, com consequências importantes no modo de se compreender a atuação dos Poderes
Públicos constituídos a partir de releitura contextualizada do princípio da separação de
poderes. Ademais, a Carta da República apresenta repertório de princípios que exigem
adequada interpretação reveladora e concretizante de seu conteúdo imperativo, sem a qual
não será possível verificar a abertura do sistema jurídico ao ideário de justiça pela via do
processo de constitucionalização do direito.
No Brasil, nesse ambiente neoconstitucional verificou-se que o crescimento de demandas
sociais por efetivação de direitos fundamentais contemplados na Constituição de 1988, - e pelo
reconheciment
sistema de democracia representativa, dentre outras razões, promovem o deslocamento das
atenções, antes focadas nos Poderes Executivo e Legislativo, para, precipuamente, o Poder
Judiciário e outros órgãos administrativos importantes de produção de decisões (v.g.: o
Conselho Administrativo de Defesa Econômica CADE).
Nesse sentido, discorrendo sobre o processo de constitucionalização do direito, Barroso o
explica enfatizando o
decorrente, in verbis:
Fruto desse processo, a constitucionalização do direito importa na irradiação dos valores
abrigados nos princípios e regras da Constituição por todo o ordenamento jurídico,
notadamente por via da jurisdição constitucional, em seus diferentes níveis [grifos nossos].
Dela resulta a aplicabilidade direta da Constituição a diversas situações, a
inconstitucionalidade das normas incompatíveis com a Carta Constitucional e, sobretudo, a
interpretação das normas infraconstitucionais conforme a Constituição, circunstância que irá
conformar-lhes o sentido e o alcance. A constitucionalização, o aumento da demanda por
justiça por parte da sociedade brasileira e a ascensão institucional do Poder Judiciário
provocaram, no Brasil, uma intensa judicialização das relações políticas e sociais. (Barroso,
2007, p. 249).
Com efeito, antes de qualquer outra consideração acerca do atual e reconhecido protagonismo
no Brasil do Poder Judiciário é imperioso tecer apontamento relacionado à consagrada
separação de poderes.
Não restam dúvidas de que os poderes constituídos têm sua autoridade derivada

enfraquecer o poder do Estado, complementando a função limitadora exercida pela


Constituição, que impôs a separação de poderes como um dos dogmas do Estado moderno,

144
chegando-
(Dallari, 2005, pp. 219-220).
Não obstante a consagração desse novel princípio de divisão de funções já na ocasião da
Declaração de Direitos da Virgínia, de 1776, e da Declaração dos Direitos do Homem e do
Cidadão, aprovada na França em 1789, fato é que o sistema de separação de poderes vem
sofrendo duras críticas quanto à sua indispensabilidade e adequação prática frente às sempre
novas demandas impostas ao Estado de hoje.
Dentre essas críticas, Dallari esclarece que:
A primeira crítica feita ao sistema de separação de poderes é no sentido de que ele é
meramente formalista, jamais tendo sido praticado. A análise do comportamento dos órgãos
do Estado, mesmo onde a Constituição consagra enfaticamente a separação dos poderes,
demonstra que sempre houve uma intensa interpenetração[grifo nosso].Ou o órgão de um dos
poderes pratica atos que, a rigor, seriam de outro, ou se verifica a influência de fatores
extralegais, fazendo com que algum dos poderes predomine sobre os demais, guardando-se
apenas a aparência de separação. (Dallari, 2005, p. 220).
De toda sorte, com esteio nos fundamentos da crítica acima referida, força é convir que o
aumento de demandas postas ao Poder Judiciário para a garantia e tutela de direitos não se
apresenta, de per si, como indicativo de suposta violação à separação de poderes ou de
funcionamento anômalo do aparato estatal, ainda mais quando esse suposto protagonismo
judicial é levado a efeito em tempos de neoconstitucionalismo.
Sem resquícios de dúvida, o certo é que há certa crença no dogma da separação de poderes
como alicerce inabalável da democracia, de sorte que a proclamação desse princípio pela
Constituição apresenta-se como cláusula imutável e imune ao poder de reforma, de modo que
essa simbologia não pode se prestar tão somente à manutenção de aparência de
funcionamento desvinculada de qualquer correspondência à prática dos comportamentos
estatais. No sentido desta assertiva, apresentam-se, a título de exemplo, pronunciamentos do
estrições
impostas ao exercício das competências constitucionais conferidas ao Poder Executivo,
incluída a definição de políticas públicas, importam em contrariedade ao princípio da
Ação Direta de Inconstitucionalidade4.102, rel.
min. Cármen Lúcia, j. 30-10-2014, P, DJE de 10-2-2015.; Vide Recurso Extraordinário 436.996
AgR, rel. min. Celso de Mello, j. 22-11-2005, 2ª T, DJ de 3-2-2006); e inconstitucional a
criação, por Constituição estadual, de órgão de controle administrativo do Poder Judiciário do
qual participem representantes de Súmula 649, 2003).
Com efeito, já que consagrado o princípio da separação de poderes, é preciso insistir na
definição das características inerentes, - -, das funções-atribuições
de cada um dos poderes constituídos sem a qual não se faz possível compreender sob qual
forma e em que espaço cada órgão pode e deve atuar, sempre nos limites da Constituição.

145
Nesse sentido, para melhor compreensão da temática em tela, Vieira (2002, p. 229) apresenta
buições constitucionais e os demais

Basicamente o que deveria caracterizar o processo decisório judicial [grifo nosso] é sua
submissão aos seguintes critérios: 1) tomar decisões com base em decisões anteriores que lhe
foram pré-ordenadas pelos Poderes representativos, portanto, seguir a normatividade (que é
composta por regras e princípios) e não outros critérios extraconstitucionais ou legais, como a
comumente invocada comoção popular ou a pretensa eficiência econômica, pois não tem
legitimidade democrática para fazer este tipo de escolha; 2) plena obediência ao princípio do
devido processo legal, que permita um procedimento justo, fair, onde as partes possam, com
igual peso e espaço, apresentar seus argumentos; 3) o imperativo da imparcialidade do juiz
[grifo nosso], que decorre do princípio da igualdade, do igual respeito e consideração com que
todos devem ser tratados; 4) a decisão deve ser a decorrência mais correta, mais bem
justificada, desse procedimento que busca a realização da justiça. (Vieira, 2002, p. 229).
Como se depreende, não cabe ao Poder Judiciário render-
as da
normatividade, dando azo à pura subjetividade do julgador que, não raro e no limite, pode
beirar a prática de arbitrariedade.
Não se pode olvidar que o princípio da inafastabilidade da jurisdição não é salvo-conduto para
sempre estará vinculado à razão (à racionalidade) de modo que
não se pode admitir a preponderância de sua vontade (sua pura subjetividade). As decisões
levadas a efeito pelo Poder Judiciário, na trama dessa divisão de poderes, devem sempre
exteriorizar fundamentos racionais que indiquem a observância de padrão na formulação do
ato decisório, sob pena de mácula da ilegitimidade.
Ainda quanto aos contornos de atuação dos demais poderes, Vieira (2002) esclarece, nos
termos seguintes:
O Legislativo e o Executivo, por sua vez, estão submetidos a uma outra ordem de critérios: 1)
embora também submetidos à Constituição, a atuação desses Poderes encontra-se imersa num
âmbito de maior discricionariedade. Ao Legislativo é dado, inclusive, o poder de alterar as
regras do jogo; portanto, a latitude de sua ação é, necessariamente, mais ampla. Isso é natural,
na medida em que sua função é fazer escolhas a respeito dos melhores meios, os mais
eficientes, para ordenar a sociedade, exercendo a função de representar a vontade dos
eleitores. Para tomar decisões em face novas circunstâncias é que são escolhidos. Se os
legisladores e executivos tivessem uma atividade absolutamente vinculada, a democracia
perderia completamente o seu sentido. O que lhes é vedado fazer é tomar decisões
expressamente contrárias à meta-norma da democracia, que é a Constituição; 2) a regra da
maioria, a luta entre grupos para alcançar a maioria, que inclui barganhas e compromissos, e
não a igualdade das partes, é o que define a decisão a ser tomada; 3) o Executivo (não a

146
Administração) e o Legislativo não são, portanto, imparciais, mas representam facções,
ideologias, classes ou partidos vitoriosos no pleito democrático [grifos nossos]; 4) logo, sua
decisões vincularão a coletividade como uma decorrência de um processo político, vencido
por quem mais poder alcançou. (Vieira, 2002, p. 229).
Interessante consignar que Vieira reconhece a legitimidade do Poder Legislativo para alterar
as regras do jogo, desde que produza atos normativos nos limites da Constituição. Nesse

discricionária e parcial do Legislativo é decorrência natural do processo político democrático


de representação de segmentos plurais da sociedade brasileira, não representando qualquer
anormalidade sistêmica capaz de colocar em xeque a higidez do Estado Democrático de
Direito.
Ademais, é relevante rememorar que a Constituição de 1988 veda proposta de emenda
tendente a abolir direitos e garantais individuais, de modo que o Legislativo, a contrario sensu,
não encontraria óbice à ampliação do rol de direitos fundamentais pelo reconhecimento de
-se sustentar que existem
determinados limites de normatividade aos quais o julgador está adstrito que podem ser
alterados pelo legislador no exercício da função legislativa na representação popular.
2 OMISSÃO INCONSTITUCIONAL DO PODER PÚBLICO E ATIVISMO JUDICIAL
A Constituição brasileira de 1998, tal qual as Constituições contemporâneas, não se limitou às
regras clássicas do constitucionalismo dos séculos XVIII e XIX. Como cediço, a Carta da
República é fruto de um processo político que se originou dos trabalhos de Assembleia
Nacional Constituinte instalad
Maior consolidou amplo rol de liberdades públicas e assumiu compromissos de ordem social,
econômica, cultural e ambiental, fixando metas e tarefas a serem perseguidas pelo Estado com
o objetivo de alcançar, por meio de mudanças estruturais da sociedade, um estágio mais
avançado de desenvolvimento social. Nesse sentido, não se apresenta como mero documento
jurídico de organização do governo e de limitação ao poder do Estado, mas também como
Constituição dirigente que retira sua legitimidade da busca de realização de justiça econômica
e social que idealiza e projeta ao futuro.

legislador (a Constituição) pode, através de antecipação espiritual, conformar a evolução da

dos direitos de prestação positiva consagrados, as Constituições dirigentes impõem ao


legislador e ao governante um rol de metas, diretrizes e programas que devem ser
implementados ao longo do tempo histórico, - em razão da existência de certa medida de
discricionariedade -, possibilitando assim o efetivo gozo e fruição dos direitos prestigiados.
Com efeito, como se depreende, a efetivação de muitos dos direitos acima referidos exige a
atuação positiva do Legislativo e Executivo que, malgrado e não rara as vezes, queda-se inerte

147
em estado de omissão flagrantemente inconstitucional. Não há se olvidar que a sanção eficaz
cabível aos governantes e legisladores indolentes que entregam a imperatividade da

particulares é aquela aplicada por meio das urnas. O banimento da vida pública por meio do
processo eleitoral democrático é a pena justa aos maus políticos.
Ocorre que o Brasil, como tantos outros Estados da américa latina, é um Estado de democracia
tardia e em processo de consolidação de suas instituições democráticas. As mazelas de seu
sistema político-eleitoral corrompido e ineficiente abrem chagas e dilaceram todo o tecido
social. O déficit de representatividade política dos mandatários do poder implica direta e
necessariamente na não efetivação de normas constitucionais consagradoras de certos e

de discussão parlamentar porque normalmente são temas (v.g., aborto; união homoafetiva;
descriminalização do porte de drogas; eutanásia etc.) que abrem amplo e sensível debate
público a exigir posicionamento político do mandatário a questão posta e isto pode custar a
perda de eleitores contrário à posição defendida.
Para Barroso (2009), existe uma face positiva e um aspecto negativo do ativismo judicial, in
verbis:
O fenômeno tem uma face positiva: o Judiciário está atendendo a demandas da sociedade que
não puderam ser satisfeitas pelo parlamento, em temas como greve no serviço público,
eliminação do nepotismo ou regras eleitorais. O aspecto negativo é que ele exibe as
dificuldades enfrentadas pelo Poder Legislativo e isso não se passa apenas no Brasil na
atual quadra histórica. A adiada reforma política é uma necessidade dramática do país, para
fomentar autenticidade partidária, estimular vocações e reaproximar a classe política da
sociedade civil. Decisões ativistas devem ser eventuais, em momentos históricos
determinados. Mas não há democracia sólida sem atividade política intensa e saudável, nem
tampouco sem Congresso atuante e investido de credibilidade. Um exemplo de como a agenda
do país deslocou-se do Legislativo para o Judiciário: as audiências públicas e o julgamento
acerca das pesquisas com células-tronco embrionárias, pelo Supremo Tribunal Federal,
tiveram muito mais visibilidade e debate público do que o processo legislativo que resultou na
elaboração da lei. (Barroso, 2009, p. 9).
Assim é que, nesse cenário de ampla omissão inconstitucional dos Poderes Legislativo e
Executivo, seja pelo descumprimento do mister de implementação de programas efetivadores
de direitos consagrados na Constituição, seja pelo não desempenho da função legislativa, -de
debate de questões sensíveis -, no exercício de representação popular, as demandas sociais por
efetivação de direitos não atendidas acabam ingressando no Poder Judiciário pela via
individual ou coletiva, dando ensejo ao que se aqui denomina de judicialização ou

148
Não há se negar que a aplicação do princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional (art.
5o., XXXV, Constituição da República Federativa do Brasil, 1988)levado a efeito num cenário
de omissão constitucional dos Poderes Públicos antes de representar eficiente funcionamento
do sistema de freios e contrapesos, revela indisfarçável risco ao próprio Estado Democrático
de Direito, seja pela exaustão e falência do Poder Judiciário pela carga de processos recebidos,
seja pela eventual perpetração de ativismo judicial. Certo é que a verificação de desequilíbrio

pode levar à hipertrofia da função jurisdicional e ao arbítrio do julgador.


3 ACESSO A
NEOCONSTITUCIONALISMO
Não se pretende aqui apresentar um conceito jurídico fechado daquilo que se convencionou

mormente, numa ou noutra categoria de direitos já consagrada pelas teorias dos direitos
fundamentais (ou direitos fundamentais humanos83). Nada obstante, é preciso consignar que a
ômenos
sociojurídicos:
(i.) o problema das vaguezas e ambiguidades dos textos jurídicos que enseja discussões acerca

constitucional, mas que é reconhecido socialmente; (b) direitos reconhecidos pela via da
abertura interpretativa de cláusulas gerais, princípios implícitos e expressos, e pelo resultado
da solução conferida às denomina das colisões de normas constitucionais;
(ii.) a concepção de universalidade dos direitos da pessoa humana promove uma expansão de

seja, por processo de integração ou diálogo entre Tribunais ou Cortes Constitucionais que
redunda no uso de referências estrangeiras nas decisões do Supremo Tribunal Federal; (b) em

Tribunal Federal com reforço de fundamento lastreado em decisões de Tribunais


supranacionais, ou seja, decisões de órgãos de sistema regional de justiça internacional
influenciam as decisões dos Tribunais ou Cortes nacionais-domésticas;
(iii.) a ampliação ou extensão d

verifica-se também a existência de direitos de titularidade indefinida ou indeterminada, como


no caso dos interesses difusos.

83
Também a definição de questão terminológica acerca de eventuais distinções entre direitos fundamentais,
direitos humanos, direitos da pessoa humana, direitos humanos fundamentais etc. não interferem no
desenvolvimento das ideias e em suas conclusões.

149
A partir dos aspectos acima colacionados, observe-se, por oportuno, que o reconhecimento ou

fundamentação complexa, haja vista que tais direitos se originam em processos de casos

padronização decisória.
Como já salientado nas linhas introdutórias, com o advento do neoconstitucionalismo (ou
constitucionalismo contemporâneo), o direito constitucional do segundo pós-guerra reafirma
a força normativa (e a expande) da Constituição com o fundamento-propósito de afastar a
indiferença do direito às injustiças sociais. Para tanto, a partir de teorias críticas ao
positivismo (teorias pós-positivistas), introduzem- -

normativa dos princípios é levada a efeito sob o manto metodológico da ponderação, de modo
que se apresenta para as teorias pós-positivistas o enfrentamento da difícil questão do controle
da discricionariedade judicial.

Ferraz Junior esclarece que a identificação do próprio direito (questão da validade e eficácia) e
de seus sentidos (questão das classificações dicotômicas) para aplicá-lo corretamente tornam-
se um dado entre outros, ou seja, tornam-se argumentos ao lado de outros empregados na
atividade de (interpretação) aplicação do direito denominada de ponderação de princípios. 84
Nesse contexto, aplicar o direito ou descobrir o verdadeiro sentido da norma resvala
sutilmente na ideia da prevalência do argumento mais forte, mas isto não pode significar, por
razões de segurança jurídica, que a tomada de decisão não tenha observado critérios objetivos,
abrindo espaço para a mera subjetividade do julgador.
A título de provocação reflexiva, Eros Roberto Grau (2005), quando ainda ministro do
Supremo Tribunal Federal, questionava a origem do poder que lhe fora conferido na
investidura do cargo para decidir a partir de uma suposta ponderação de princípios, que, não
obstante parecer um exercício de equilíbrio, representava na verdade um trabalho
discricionário se é que, no limite, não chegava a ser arbitrário.
Em crítica à subjetividade do julgador, Abboud (2011) adverte que:
... a função jurisdicional ganha força e legitimidade, não com o aumento inconsequente de suas
decisões dotadas de efeito vinculante, como tem acontecido no Brasil, mas, sim, por meio de
fundamentação constitucional rigorosa de suas decisões[grifo nosso]. Essa é a verdadeira fonte
de legitimidade das decisões do Judiciário, que não podem mais se basear em meras
convicções pessoais de seus julgadores [grifo nosso], mas em critérios racionais imputáveis e
contidos no próprio texto constitucional. (Abboud, 2011, p. 445).

84
Conferência sobre Hermenêutica e Argumentação proferida na EmagisTRF4 em 2013.

150
Segundo Streck (2011), a doutrina brasileira operou três recepções equivocadas: 1) dos
postulados da jurisprudência dos valores; 2) da ponderação alexyana; 3) do ativismo judicial
norte-americano. De toda sorte, assistindo ou não razão a Streck, o fato é que o cenário de
incertezas e insegurança jurídica acima descrito coloca em evidência a premente necessidade
de um Poder Legislativo brasileiro que exerça atividade política intensa e saudável, e que
desfrute de credibilidade frente à sociedade civil para debater e disciplinar questões de alta
complexidade que marcam o estágio atual de desenvolvimento da sociedade nacional.
Malgrado, enquanto a realidade se mostra diferente e se aguarda uma ampla reforma política
para o fortalecimento do Poder Legislativo e do sistema democrático brasileiros, as
tadas, - mesmo
porque não haverá outra opção doméstica -, na atuação ou protagonismo do Poder Judiciário.
O que se espera nessas circunstâncias é que o Supremo Tribunal Federal possa decidir, - é uma
referência, ao menos -, inspirado na sabedoria do juiz Hércules, figura criada, como cediço, por
Dworkin (2002) na tentativa de descobrir padrões para regular a aplicação do direito em
tempos de neoconstitucionalismo e de desenvolvimento de teorias de argumentação jurídica.
Não há olvidar, contudo, que, diante da pouca produtividade dos Poderes Públicos, mormente,
a omissão inconstitucional do Legislativo no enfrentamento de questões relevantes e
complexas à sociedade brasileira, multiplicam-se demandas sociais pleiteando o

jurisdicional, sendo inegável que esse estado de coisas fomenta à hipertrofia funcional do
Poder Judiciário e potencializa oportunidades políticas para o ativismo judicial.
Quanto ao ativismo judicial, discorda-se de Barroso (2009, pp.9-10) quando afirma que

que não admite eventualidades:


...o ativismo é pernicioso para o Estado Democrático de Direito não podendo, portanto,
diferenciar-se entre o bom e o mau ativismo. Ativismo é toda decisão judicial que se
fundamenta em convicções pessoais, senso de justiça do intérprete em detrimento da
legalidade vigente legalidade aqui entendida como legitimidade do sistema jurídico [grifos
nossos], e não como mero positivismo escrito ou subsunção do fato ao texto normativo.... Em
suma, ativismo, em termos brasileiros, deve ser considerado o pronunciamento judicial que
substitui a legalidade vigente pelas convicções. Daí nossa crítica à discricionariedade judicial,
uma vez que é por meio dela que, atualmente, legitima-se a utilização das convicções pessoais
do julgador em vez das fontes normativas. (Abboud, 2014, p. 421).
Nesse ponto, consigne-se que o Supremo Tribunal Federal (STF), guardião da Constituição de
1988, imerso nesse contexto de protagonismo do Poder Judiciário brasileiro, firmou alguns
entendimentos em decisões prolatadas em casos difíceis, precipuamente, no âmbito do
controle concreto e abstrato de constitucionalidade, que renderam muitas críticas da doutrina

151
jurídica nacional quanto à legitimidade das razões de decidir adotadas. A ausência de padrão
de racionalidade consubstanciado na indicação de quais critérios objetivos teriam sido levados
em conta em cada caso no ato de decidir e julgar fortaleceu as críticas centradas no argumento

A título de ilustração, faz-se referência àquelas decisões que reconheceram a


constitucionalidade da exigência de fidelidade partidária (Mandado de Segurança 26602,
Relator Min. Eros Grau, Tribunal Pleno, j. 04/10/2007, DJe-197), da união homoafetiva
(Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 132, Relator Min. Ayres Britto,
Tribunal Pleno, j. 05/05/2011, DJe-198), do aborto de feto anencefálico (Arguição de
Descumprimento de Preceito Fundamental 54, Relator Min. Marco Aurélio, Tribunal Pleno, j.
12/04/2012, acórdão eletrônico p. DJe-080) e de pesquisas realizadas com células-tronco
embrionárias (Ação Direta de Inconstitucionalidade 3510, Relator Min. Ayres Britto, Tribunal
Pleno, j. 29/05/2008, DJe-096). Anote-se aqui que as críticas formuladas pela doutrina não se

os aspectos formais e substanciais do processo estatal ilegítimo pelo qual formam


reconhecidos.
Não obstante a possibilidade de análise pontual para o decote das particularidades processuais
e substanciais dos julgados indiciados acima, depreende-se, em linhas gerais, que o Supremo
Tribunal Federal se encontra num ambiente sociojurídico de florescimento contínuo de

por incertezas e imprecisões do novo paradigma da cultura da argumentação jurídica.


As imperfeições do sistema devem ser corrigidas. A busca por um Direito Constitucional

no horizonte
à soberania de cada Estado Nacional, mas à inteira comunidade internacional. (Carducci,
2003, p. 58).
É certo, contudo, que não se trata de uma deformidade estrutural-institucional que graça

em ambientes de democracia tardia também se faz sentir no âmbito das Cortes de outros
Estados nacionais e que ecoam no sistema de justiça da Corte Interamericana de Direitos
Humanos, dentre outros, daí ser de relevância ímpar o diálogo entre Cortes nacionais e de
Justiça Internacional.
CONCLUSÃO

152
Nos termos propostos pelo neoconstitucionalismo e por concepções pós-positivistas, o
processo de constitucionalização do direito apresenta-se como condição indispensável à
efetivação do Estado Democrático de Direito, enquanto representação do Estado de Justiça.
A crise do sistema de democracia representativa no Brasil, dentre outras razões afetas à
ineficiência estatal, não raramente promove o deslocamento de debates políticos sobre
questões relevantes à sociedade brasileira da esfera do Poder Legislativo ao âmbito de atuação
jurisdicional do Poder Judiciário, em especial para o Supremo Tribunal Federal, seu órgão de
cúpula e guardião da Constituição.
Em tempos de neoconstitucionalismo, a adoção do novo paradigma da argumentação jurídica

ponderação de princípios que, se realizada no exercício da jurisdição constitucional,


oportuniza ampliação excessiva da discricionariedade do julgador e o risco de ativismo
judicial.
-se,
hodiernamente, à atuação jurisdicional do Supremo Tribunal Federal (STF), quando do
julgamento de casos (hard cases) de fundamental relevância à harmonia entre grupos e
segmentos plurais da sociedade brasileira. Todavia, frente as dificuldades enfrentadas pela
cultura da argumentação jurídica em definir padrões decisórios, os métodos e parâmetros
utilizados pelo STF no julgamento dos casos referidos não desfrutam de legitimidade
democrática porque indiciam a tomada de decisões políticas lastreadas em convicções
meramente pessoais, portanto, de subjetividade extremada.
Não obstante a especificidade da problematização apresentada e dos argumentos
desenvolvidos, é preciso refletir de forma ampla e desapaixonada sobre os reais avanços e
retrocessos que atingiram a ciência jurídica brasileira quando do enfrentamento da questão da
mudança de eixo do sistema jurídico da lei para a Constituição proposta pelo paradigma
neoconstitucionalista e da nova argumentação jurídica.
ondição de realização da
dignidade humana e, portanto, trabalho contínuo; é obra sempre por acabar. Mas é preciso um
cuidado: o reconhecimento de novos direitos fundamentais por meio da prática de ativismo
judicial pode representar certo retrocesso à construção e consolidação do Estado Democrático
de Direito. É que o tempo de concessão de direitos pela mera vontade ou capricho dos
soberanos é página virada na história da humanidade.
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153
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155
A EDUCAÇÃO CONGLOBANTE COMO PROPOSTA DE REALINHO DA CONSCIÊNCIA
SOCIAL E COMUNITÁRIA
85

86

RESUMO:
Este artigo analisa sob o prisma da sociologia jurídica e da filosofia aspectos e justificativas
pelos quais entendemos deve a educação ser repensada para edificação do ser humano,
estruturação de sua consciência moral e social com relação à sua comunidade, alinhando estas
aos anseios sociais para o aperfeiçoamento da comunidade global e concretização do direito
social à educação.
Palavras-chave: Educação. Direito social. Sociedade. Comunidade global. Consciência moral e
social.
SUMÁRIO
Introdução. 1. O ente social, seus valores morais e a consciência social. 2. A família e o berço da
consciência moral. 3. As limitações da liberdade e as relações externas de privação das
capacidades. 4. A orientação social da educação informal. Conclusão.
INTRODUÇÃO
O homem diferencia-se dos demais animais que caminha nesta terra por diversos motivos,
mas a racionalidade fez dele a criatura dominante do planeta. A capacidade do homem em
projetar-se no tempo, de maneira imaginativa, planejando seus próximos passos e seu
crescimento é o que faz dele um ser realmente especial.
Com estes aspectos em mente, devemos ainda pensar como o homem galgou alcançar o topo
da cadeia alimentar. O homem alcançou sua supremacia por sua capacidade diferenciada de
racionalização do mundo, mas também por ter em algum momento notado que, unido a
outros, era mais forte e surgiram os primeiros esboços da sociedade de homens, seres
gregários que são.
É da natureza humana associar-se a outros, aos seus iguais, mas também de transmitir o
conhecimento que possui, refletindo por seus erros e acertos, a fim de perpetuar a espécie e
aprimorar a sociedade a que pertence.

85
Graduado, mestre e doutor em Direito Penal pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, ex-Vice-
Presidente e membro do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais, IBCCRIM, professor de Direito Penal da
Universidade São Judas Tadeu, USJT. i.motta@terra.com.br
Mestrando em Direito pelo Centro Universitário Salesiano de São Paulo. Especialista em Docência do Ensino
86

Superior pela Universidade Iguaçu. Graduado em Direito pela Universidade Iguaçu. Professor de Direito Penal e
Processo Penal na Associação Brasileira de Ensino Universitário UNIABEU. pcleomonteiro@gmail.com

156
Vivemos claramente em uma época de conturbada realidade social e política, onde os valores
sociais e humanos, morais e coletivos, são subvertidos a fim de atender aos interesses de
determinados extratos da sociedade, ao interesse de uma minoria ou ao interesse de
instituições e sistemas que têm ambições próprias e, não necessariamente, ao bem-estar das
pessoas e a qualidade de vida destas em sociedade.
O interesse dessas minorias em propagar a ignorância entre os integrantes da sociedade,
adoecendo a comunidade e induzindo a coletividade a uma espécie de alucinação, restando
manipulada, usada, abusada, não conseguindo libertar-se ou impor suas posições e
necessidades. Isto é algo que, apesar de natural em razão do equilíbrio que o sistema moderno
exige, deve ser revisto para que esse entrelace de interesses necessários possa ser harmônico e
menos nocivo aos envolvidos no sistema.
A chave para libertação da sociedade e do povo desta doença manipuladora, e a retomada da
evolução social dos indivíduos e da comunidade, é certamente a retomada da reflexão e da
transmissão sincera dos conhecimentos e dos costumes. A solução reside no refletir sobre a
EDUCAÇÃO, num sentido amplo da palavra.
Objetivamos analisar os aspectos do pensar o homem em sociedade e suas relações
interpessoais, o desenvolvimento deste e o refletir filosófico sobre a posições deste e as
mazelas que afligem o indivíduo diminuindo suas liberdades e limitando suas capacidades,
estudar quais são os aspectos de vulnerabilização do cidadão que, enfraquecido, fragiliza por
via de consequência a sociedade a qual pertence.
Refletir sobre a necessidade de se pensar a pobreza e o interesse em se manter o cidadão
ignorante para manipular as massas em prol de uma ânsia exploratória e crônica é nosso foco
primário. Entender que a educação ampla é a ferramenta primária de defesa da sociedade e
que a valorização das múltiplas culturas é vital ao desenvolvimento do homem é entender que
educação é bem mais do que obter conhecimentos técnicos. Na verdade, são caminhos que
precisamos trilhar para que possamos tentar discutir uma proposta de cura para a doença
alienatória que assola a atual sociedade.
O ENTE SOCIAL, SEUS VALORES MORAIS E A CONSCIÊNCIA SOCIAL.
Partimos da reflexão sobre o significado do homem e o como ele se conecta com os seus pares

comunga desses valores com seus iguais, a fim de naturalmente proteger-se e evoluir.
Imaginemos o homem primitivo que, de maneira isolada, busca atender a suas necessidades
primárias como alimentar-se, abrigar-se, manter-se vivo, etc. A partir destas necessidades o
homem cria uma consciência instintiva e individual do bem.
É certo que cada qual terá uma consciência circunstancial do que é bom, do que é prazeroso,
dado os seus interesses e habilidades individuais. Nesse sentido, Rawls nos ensina no capítulo

157
dados seus interesses, habilidades e circunstâncias. Apenas na medida em que uma
semelhança de condições o permite é que podemos fazer uma abstração a partir da situação

Cada ponto de vista individual deve ser levado em consideração. Se pararmos para pensar que,
em linhas primárias, as pessoas encontram em seus conceitos individuais diversas interseções
entre as suas concepções pessoais de bem.
Se imaginarmos o valor que essas pessoas dão às suas concepções de bem e à aplicabilidade
que idealizam desses valores com as pessoas que com eles convivem, vislumbramos conceitos
pessoais do bem, aplicados aos dos demais indivíduos, além de observamos como deveria ser a
vida em sociedade e, também, como estes racionalizam a sociedade como uma comunidade
ideal, ou seja, como projeção de sua concepção intuitiva de bem, formando assim um conceito
primário de consciência moral.
Mas não podemos nos deter neste aspecto relativo da moral, pois a este turno analisamos um
conceito de bem, aplicado por uma pessoa à uma comunidade, sem que se leve em
consideração as outras muitas consciências morais, aplicadas por cada qual, à sociedade que se
imagina ideal. A imposição de uma consciência moral única poderia conduzir (e a experiência
histórica sinaliza, neste sentido) a uma repressão dominadora, que conduz e impõe mazelas
indesejadas à sociedade.
Neste sentido, a construção da sociedade deve levar em consideração um amálgama das
diversas consciências morais dos indivíduos, que desejam participar da comunidade que
constroem (ou a qual pertencem), sendo necessário acrescentar à esta fórmula: o tom da
tolerância, a negociação das posições e a sujeição dos interesses particulares específicos e
conceitos individuais do bem e do moralmente justo para a congregação de valores individuais
convergentes, que determinarão o que é socialmente valoroso, desvendando-se assim uma
consciência social, um sentir coletivo de bem que, não necessariamente, vai coadunar-se em
todos os seus aspectos com os sentires individuais, sujeitando-se estes àqueles já que são
intrínsecos, direta ou indiretamente, uns nos outros.
O Professor norte-
certa? que
como mais elevado objetivo moral, a maximização da felicidade e que a maximização da

verdade, a produção de prazer ou felicidade e o afastamento da dor ou sofrimento. (SANDEL,


2016, P 48).
Assim, Jeremy Bentham demonstra que o prazer e a dor orientam a nossa consciência moral e
que todos os valores em que nos fiamos para determinar o que é certo ou errado advém da
aproximação do prazer ou de felicidade e do afastamento da dor e do sofrimento.

158
A consciência social buscará assim atrair felicidade e afastar o sofrimento naturalmente
daqueles que a compõe, mas não na forma de uma equação matemática como sugere Bentham.
Devemos levar na verdade em consideração um amálgama de valores morais amplamente
reconhecidos pelas

A FAMÍLIA E O BERÇO DA CONSCIÊNCIA MORAL.


O ser humano da atualidade vive num mundo moderno e globalizado, de consumismo
exacerbado e de necessidades cada vez mais amplas e de difícil alcance. Muitos são os fatores
que orientam o ente social neste sentido, suas expectativas, seus anseios, a necessidade de
saúde, alimentação, vestuário, etc., mas todos esses conceitos são retransmitidos mesmo que
de maneira despercebida quando do início do primeiro convívio social que conhecemos, a vida
em família.
O ser humano passa a ser educado sem perceber. Observa; ouve; imita; repete, tudo de
maneira não planejada, intuitiva, nesse sentido ensina o professor Jimenez Serrano:
nimos a educação informal como aquele processo não planejado e espontâneo que se
desenvolve longe da escola, mas que repercute, de fato, na formação do ser humano. A nosso
ver, a educação informal se desenvolve no seio familiar e no meio social em que a criança

Na verdade, o indivíduo já nasce inserido em uma sociedade que gira em um ciclo de anseios e
se sente ensinado pelas informações que apreende no seio de sua família, entretanto os
conceitos de bem que lhes são primeiramente apresentados e podem estar contaminados (e
infelizmente estão) pelo que anteriormente denominamos como uma contaminação alienante.
Se a orientação moral primária do homem parte da família, estamos diante e uma espécie de
retroalimentação que é feita a partir das interseções encontradas na reunião de pessoas que
compõem esta microssociedade parental, numa tentativa de passar ao novo membro daquela
família os valores que todos que a compõem concordam serem acertados e aplicáveis aquela
pequena comunidade familiar, excetuando-se os valores discordantes, evoluindo assim o novo
membro daquela nova geração, que por suas concepções melhoradas tenderá a evoluir a
família em si, já que sua consciência moral será o reflexo de uma consciência social
aprimorada, que por conseguinte se reunirá com as consciências aperfeiçoadas dos demais
membros da nova geração, evoluindo para uma nova consciência moral aperfeiçoada.
Assim como as famílias são as sociedades, só que constituídas de grupos maiores, grupos
religiosos, grupos étnicos, grupos culturais, artísticos, profissionais, políticos e os mais
diversos possíveis. Numa sociedade ideal, o agir comunicativo entre os membros do grupo,
com uma reflexão aberta dos conceitos morais de seus membros, pautada em tolerância e
sinceridade, tenderia a evoluir a consciência social destes grupos e da sociedade como um
todo.

159
Mas as sociedades não são perfeitas e nem só do agir comunicativo se estabelecem as relações.
Bem como não são perfeitas as sociedades, também as famílias não são perfeitas, os diversos
grupos familiares tendem a ter núcleos de membros mais influentes, seja pelo poder de
persuasão dentro do grupo, seja pelo potencial econômico ou até mesmo pela capacidade de
congregar (solidarizar) as vontades entre os membros.
Os valores individuais de alguns membros tendem a sobressair sobre os de outros e até mesmo
uma disputa pela aprovação de outros membros dentro da família pode ocorrer. Barganhas e
negociações são comuns no modelo familiar, o pai dá o presente, mas mãe defere mais
liberdade, ao ensejo, guardemos a palavra liberdade para uma importante reflexão que
faremos a diante.
Os pequenos exemplos dados acima que inocentemente ocorrem no seio de qualquer família
ilustra uma disputa pela aprovação que legitima o poder parental sobre o filho. O filho não
pode se dizer subjugado por adotar um comportamento que aceita e adota por vontade
própria, uma vontade própria dirigida, induzida, mas ainda assim não obrigada e sim
negociada. Mas negociada a troco da manipulação, da troca de interesse por liberdade ou por
recursos (econômicos). A educação informal moral sinaliza ao ente social em construção que
esta negociação de seus valores morais é premissa válida de comportamento.
A educação informal obtida no seio da família é a bússola primária que norteia os rumos que a
sociedade do futuro adotará. Uma consciência moral deficiente congregada só poderá carrear
a uma consciência social deturpada, alheia às preocupações e facilmente vulnerável a
manipulações de todo o tipo.
O questionamento sobre o qual nos debruçamos neste ponto reside em identificar tais
vulnerabilidades e o real berço destas fraquezas para que possamos imaginar meios para se
pensar propostas de defesa da consciência moral primária a fim de afastar o ente social da
corrupção moral que corrói os alicerces da sociedade.
AS LIMITAÇÕES DA LIBERDADE E AS RELAÇÕES EXTERNAS DE PRIVAÇÃO DAS
CAPACIDADES.
Quando imaginamos nossa própria vida e curso de nossa pequena história enquanto seres
humanos, geralmente, nos vemos como seres livres, que podem tomar decisões por si só, de
escolher livremente, de ir e vir, fazer ou deixar de fazer e isso faz com que cresçamos
imaginando que tudo é possível.
O espectro de nossas liberdades nos projeta no mundo social e, como dito anteriormente, por
sua natureza gregária o ser humano quando nasce já começa a participar da microssociedade
familiar. Nesta microssociedade, valores são partilhados entre seus componentes, valores que
vão influenciar esta escolha livre ou que até mesmo vão tornar esta escolha, digamos, não tão
livre.

160
As matrizes familiares estabelecem uma expectativa de comportamental que vai limitar nossa
liberdade, seja pelo que é esperado de nós, seja para não atingir a esfera da liberdade de
outrem ou até mesmo pelo simples temor de uma reprimenda por outros membros da família.
De mesma sorte orientam-se as liberdades num contexto social mais amplo. As matrizes as
quais nos filiamos, nossa família, religião, cultura, etc., vão influenciar a abrangência e a
direção da liberdade que possuímos e exercemos. O filósofo e Nobel de economia Amartya Sen

livre da nossa vontade, fazendo com que identifiquemos dois aspectos que tornam valiosa a

exemplo do professor Sen:

atividade. Se ele consegue fazer exatamente o que


situação possível, alguns bandidos fortemente armados interrompem o sossego de Kim, tiram-
no a força de sua casa e o jogam em uma grande valeta. Essa situação terrível e repulsiva pode

Kim, ordenando que ele não saia de casa, ameaçando-o de punição severa caso viole essa

No exemplo podemos ver claramente que a esfera da liberdade de Kim sofreu influência do

oportunidade de fazê-lo, podendo ainda desistir de ficar em casa a qualquer tempo e


livremente dirigir-se a qualquer lugar, sendo livre em oportunidade e em processo (de escolha
de ficar em casa).
-se, mas o processo pelo qual isso se
deu nada teve a ver com a liberdade de Kim, o processo de escolha de Kim sofreu a ação de
fatores externos sobre os quais este não teria qualquer influência. Na verdade Kim até poderia
mudar de ideia e sair de casa, mas para isso teria que aceitar a hipótese de ser submetido a
severa punição decorrente da variação de seu processo pessoal de escolha frente as, digamos,
imposição sociais.

oportunidade de ficar onde quiser e pelos meios que entender melhores. A influência de
questões periféricas e externas sobre sua liberdade é contundente, não restam escolhas a Kim
num primeiro momento.

sobre o exemplo do mestre Amartya Sen pois, mesma jogado em uma valeta pelos bandidos,
precisará Kim avaliar os aspectos de suas oportunidades e os aspectos dos processos de
escolha pelos quais vai decidir como atuar exercendo a expressão de sua liberdade. Liberdade
limitada, vilipendiada, violada, mas ainda assim alguma liberdade, como por exemplo, a de pôr
a cabeça para fora da lama, a de poder rastejar para local menos imundo, etc.

161
Tudo isto em prol de melhorar o seu bem-estar ou de pelo menos tornar sua vida mais
suportável, consideradas as condições precárias as quais possa estar submetido. Tudo isso dar-
se-á diante das capacidades que possuir de exercício de sua liberdade e a direção que sua
liberdade naturalmente toma no sentido dos valores que possui. Ainda nesse sentido ensina
ções de funcionamentos

(AMARTYA SEN, 2011. p. 267).


As capacidades assim limitam-se por imposições de natureza diferenciada, que variam de
acordo com questões pessoais, sociais e do próprio ambiente, do mundo em si, Amartya Sen
identifica quatro variações que agregarão desiquilíbrio ou distinções entre as potenciais
capacidades dos indivíduos, sendo estas: 1. As heterogeneidades pessoais; 2. As diversidades no
ambiente físico; 3. As variações no clima social e 4. As diferenças nas perspectivas relacionais.
Quanto as heterogeneidades pessoais, não se sobressaem maiores duvidas, simplesmente as
pessoas são diferentes, mais ou menos hábeis a determinadas realizações, questões
relacionadas à idade, o gênero, a saúde, educação, etc., exercem nítida e indiscutível influência
sobre as oportunidades e processos de escolha que os entes sociais terão para realizar seus
anseios. Questões relacionadas a propensão a doenças, disfunções, deficiências, etc., atraem
logicamente uma gama de desvantagens específicas que, por conseguinte, vão limitar as
capacidades de conversão de recursos em bem-estar por esses entes.
As diversidades de ambiente físico influenciam de mesma sorte, positiva e negativamente, as
capacidades, lugares com melhores situações climáticas que propiciam a agricultura ou com
alguma incidência de catástrofes naturais, que atraem sucessivos prejuízos. Aquele cidadão
que pertence a uma comunidade situada em local com solo e clima propícios à agricultura, por
exemplo, terá privilégios com uma conversão mais eficientes de seus recursos, agregando
valor ao seu objetivo final, neste caso a produção.
Por outro turno, o ente inserido em uma comunidade que atravessa rotineiramente períodos
de enchentes, por exemplo, dependerá de mais recursos econômicos ou prestação continuada
de serviços públicos assistenciais, as suas capacidades se limitarão, por evidente, em razão das
intempéries ambientais.
Existem ainda as chamadas diferenças de perspectivas relacionais, onde o padrão de
comportamento entre os sócio indivíduos atrairá vantagens e desvantagens na perspectiva das
capacidades. Ter maior desenvoltura para falar em público e lidar com situação interpessoais
certamente fara aumentar o poder de conversão daquele indivíduo através da persuasão, por
exemplo, na outra ponta da balança minimamente encontraremos o persuadido, que saboreou
as desvantagens de ser persuadido.
O clima social também é fator sinalizado pelo ilustre escritor Amartya Sen como variável que
influi nas capacidades dos indivíduos e das sociedades. Uma sociedade de diminuta violência
ou onde a saúde pública é satisfatória, encontrará mais lastro para sua evolução e será

162
evidentemente menos conflituosa. É como se estivéssemos diante do solo fértil comentado
acima, quando ilustramos a variável relacionada ao ambiente físico, mas tratando-se agora de
um solo fértil social.
Em contrapartida, e infelizmente a realidade brasileira tem se desenvolvido neste sentido,
quando o clima social é ruim se torna expressão de uma realidade eivada de precariedades, os
aspectos de oportunidades e processos de escolha tornam-se mais truncados. Lembremos da
estória do Kim que depois de jogado na vala, não encontra amparo para de lá sair, ou
imaginemos ainda que lá ele tenha adquirido uma doença qualquer e que a estrutura de saúde
não o atenda, teremos um desamparo institucional por um lado e uma possível
desestabilização das relações comunitárias pois o desamparo de um membro da comunidade é
desamparo da sociedade como um todo.
A falência da educação no sentido mais amplo da palavra, da educação informal à educação
formal e especializada, a nosso modestíssimo sentir, faz com que a sociedade como um todo se
desestruture, a solidariedade social desejada se enfraquece, das fontes de variação da
conversão de renda ou recursos pessoais em bem-estar, é a educação a variável mais
significativa, tudo mais surge da educação, os parâmetros e valores da sociedade e das várias
comunidades que compõe esta dependem de uma educação para o bem, com valores morais
inseridos num contexto edificador do ente como membro da sociedade e que reflita uma
consciência social vinculada a uma solidariedade comunitária que será a grande mediadora
entre os sistemas que hoje, em prol de seus interesses, não se refreiam ao alienar as
capacidades dos sócio indivíduos.
A ORIENTAÇÃO SOCIAL DA EDUCAÇÃO INFORMAL.
A reflexão social sobre os parâmetros educacionais é certamente um tema delicado a se
abordar. Como vimos anteriormente, a sociedade é composta por vários grupos comunitários
que se reúnem e comungam de valores específicos que, eventualmente, demonstrar-se-ão
conflituosos com os valores de outros grupos, tão legítimos quanto, e que compõem com um
primeiro grupo a mesma sociedade que deseja idealmente evoluir em conjunto.
Essa relação que se espera de equilíbrio entre as microcomunidades pressupõe, em primeiro
lugar, uma tolerância entre elas que permita o convívio social, um sistema de concessões que
equilibre as relações entre as microcomunidades que comporão a sociedade lato sensu.
Teoricamente este equilíbrio entre as coletividades representativas de determinados extratos
sociais deveria atrair o equilíbrio de relações interpessoais entre os membros de grupos
distintos, entretanto, toda esta engenharia social somente seria efetiva se entre os envolvidos
de desenvolvesse uma relação comunicativa de maneira plena no sentido da estabilização de
uma solidariedade social.
Ensina Vanzella, ao citar Habermas, no artigo publica

163
corroborar sua afirmação:
santes e falantes podem tomar posição em relação a qualquer pensamento

Um agir comunicativo, sincero e construtivo é fundamental para edificação de uma


comunidade dotada de solidariedade social. Entretanto, uma comunidade não se constrói
somente de ideais e consolidação das vontades. Uma comunidade é mais que isso e depende da
geração de capital para equilibrar a balança das diferenças e variações sociais entre seus
extratos culturais e microssociedades. A sociedade precisa estruturar-se na forma de Estado e
suas múltiplas camadas devem ser representadas. Representações estas que devem ser
legitimadas pelos próprios membros da sociedade e que como refletimos anteriormente,
possuem valores pessoais morais que podem estar contaminados.
Essa contaminação moral das lideranças e representatividades tem a tendência de tecer uma
rede no sentido oposto ao idealizado na construção da sociedade, de fazer valer seus interesses
sobre os da coletividade, da ânsia pelo poder fomentada pela voracidade do capital e com isso
leva os que deveriam representar a consciência social e primar pela solidariedade social a
alienar seus legitimadores com intuito de perpetuação no poder para que possam servir-se e
servir ao capital.
Todo o engendramento lógico deturpante tem como origem uma doença primária que fica
estagnada, incubada, silenciosa até que a oportunidade maliciosa venha à tona, a corrupção
moral individual e primária.
Nesta esteira, somente a educação conglobante, que idealmente amalgamasse a educação
informal e sociocultural para o bem de maneira integralizadora com a educação formal,
respeitando as diferenças, mas ressaltando valores da consciência social aos envolvidos no
processo poderia afastar dos entes sociais a corrupção moral. Se os conceitos particulares do
bem e do justo constroem e edificam a sociedade idealmente, elevando seus membros
teoricamente mais aptos a representantes do todo, quando estes estiverem contaminados pela
corrupção moral, o todo que lhes foi confiado, contaminado também o será.
CONCLUSÃO
Buscamos analisar no presente trabalho a dinâmica das relações pessoais que alicerçam a
formação das comunidades e microssociedades e como estas microssociedades ligam-se
formando um todo maior e mais abrangente, a sociedade lato sensu.
Verificamos que as orientações humanas primárias fomentam uma concepção pessoal do bem
que, por via de consequência, dá subsídio para que o ente social estruture sua consciência
moral que reside no modo como o sócio indivíduo acredita que seu conceito do bem deveria
ser aplicado à sociedade.

164
Entendemos como a reunião das consciências morais individuais, de maneira tolerante e
sincera, dotadas do agir comunicativo, constroem um senso comum, conjunto e racional, de
valores que se entrelaçam formando a consciência moral.
Visualizamos a sociedade mais abrangente se erguer desta reunião de consciências sociais
derivadas das microssociedades oriundas dos diversos grupos comunitários e representativos.
Seguindo-se as reflexões, observamos o papel central da educação nesta dinâmica, da
orientação informal intuitiva e espontânea, passando pela educação informal de valores sociais
e culturais até a educação formal e especializada que, conglobadas, constroem o caráter e os
valores morais do ente social que, mais tarde, mostrando-se mais envolvido com a realização
dos com os valores integrados que constituem a consciência social, será eventualmente
legitimado para representar essas vontades amalgamadas e primar pela solidariedade social.
Destas observações depreendemos que apesar de toda a estrutura socializante negociada e
comunicativa, quando os valores morais são corrompidos, toda a sociedade estará à mercê
desta mazela representada por um desvio de valores e a sombra do mal da alienação social
estará sempre à espreita para adoecer a comunidade estruturada.
Concluímos que uma possível solução pode ser mais simples e de maior abrangência do que
podemos imaginar, colocar a educação conglobante como fator de estruturação da sociedade e
de diminuição (com pretensões a extinção) da corrupção moral pode ser uma proposta real
para repensar as relações interpessoais dos entes sociais de modo a estruturar um novo nível
de evolução das consciências sociais consolidando uma nova interação de solidariedade social.
REFERÊNCIAS:
HABERMAS, Jürgen. A nova obscuridade: pequenos escritos políticos V. Trad. Luiz Repa. São
Paulo. Ed. UNESP, 2015.
_____. Direito e democracia: entre facticidade e validade. Vol. 1. Trad. Flávio Beno
Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1997.
RAWLS, John. Uma teoria de justiça. Trad. Almiro Piseta e Lenita M. R. Esteves. São Paulo.
Martins Fontes, 2000. 1ª Ed. 2ª tiragem.
RODRIGUES, Marta M. Assumpção. Políticas Públicas. São Paulo: PubliFolha, 2015.
SANDEL, Michael J. Justiça O que é fazer a coisa certa. Trad. de Heloisa Matias e Maria Alice
Máximo. 20. Ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2016.
SEN, Amartya. A ideia de justiça. São Paulo: Companhia das letras, 2015.
SERRANO, Pablo Jiménez. O direito à educação: fundamentos, dimensões e perspectivas da
educação moderna. Rio de Janeiro: Jurismestre, 2015.
_____, Pablo Jimenez. Filosofia do direito. São Paulo: Alínea, 2014.

165
VANZELLA, José Marcos Miné (org.). A dialética entre valores e forma jurídica. São Paulo.
Alínea, 2015.

166
ACESSO À JUSTIÇA ATRAVÉS DA MEDIAÇÃO: UMA REALIDADE POSSÍVEL
87

88

RESUMO
A crise na oferta da justiça enfrentada em muitos países nos dias de hoje, faz com que as
sociedades se preocupem cada vez mais com o tema, ou melhor, com a efetividade do direito
fundamental ao acesso à justiça, positivado na Declaração Universal dos Direitos do Homem e
do Cidadão de 1948, portanto, reconhecidamente um direito humano. Essa efetividade significa
a possibilidade de encontrar elementos que garantam justiça para além do texto normativo.
Nessa esteira, aparecem o meios alternativos de solução de conflitos, hoje, melhor
denominados como meios adequados de tratamento de conflitos, dentre os quais se destaca a
mediação que é uma forma autocompositiva, baseando-se no empoderamento das partes para
juntas solucionarem as suas divergências de forma consensual. A presente pesquisa utiliza-se
do método dialético na busca da demonstração que a mediação pode dar efetividade ao acesso
à justiça no Brasil.
RESUMEN
La crisis en la oferta de la justicia enfrentada en muchos países en los días de hoy, hace que las
sociedades se preocupen cada vez más con el tema, o mejor, con la efectividad del derecho
fundamental al acceso a la justicia, positivado en la Declaración Universal de los Derechos del,
El hombre y el ciudadano de 1948, por lo tanto, reconocidamente un derecho humano. Esta
efectividad significa la posibilidad de encontrar elementos que garanticen justicia más allá del
texto normativo. En esta estera, aparecen los medios alternativos de solución de conflictos,
hoy, mejor denominados como medios adecuados de tratamiento de conflictos, entre los
cuales se destaca la mediación que es una forma autocompositiva, basándose en el
empoderamiento de las partes para juntas solucionar sus divergencias De forma consensuada.
La presente investigación se utiliza del método dialéctico en la búsqueda de la demostración
que la mediación puede dar efectividad al acceso a la justicia en Brasil.
PALAVRAS-CHAVE:
Acesso à justiça; efetividade; mediação, direito fundamental; direitos humanos.
PALABRAS- CLAVE:
Acceso a la justicia; De la efectividad; Mediación, derecho fundamental; derechos humanos.

87
Mestre em Direitos Fundamentais e Democracia pelo Centro Universitário Unibrasil. Professora do Curso de
Direito da Universidade do Contestado Campus Canoinhas/SC e Mafra/SC, servidora do Tribunal de Justiça de
Santa Catarina, e-mail: adrianeoliveira2501@gmail.com
Doutora em Educação Professora/Pesquisadora do Programa de Mestrado em Direito do Centro Universitário
88

UniBrasil em Curitiba/PR, e-mail: laura.both@unibrasil.com.br

167
1 INTRODUÇÃO
O acesso à justiça, como direito fundamental que é, está na pauta da agenda mundial como
sendo uma preocupação antiga, uma vez que há décadas discute-se quais seriam as melhores
formas para seu auxílio, ampliação e efetivação.
Dessa forma, verificada a crise geral instalada na oferta da justiça, muito se tem estudado
sobre o assunto, na busca de alternativas e/ou formas de que haja uma aproximação concreta
dos cidadãos.
A previsão formal do direito fundamental (humano) do acesso à justiça ocorre em muitas
sociedades, porém, o maior desafio consubstancia-se em estabelecer meios de sua efetivação
na prática, para além da conformação escrita no texto normativo. A busca de alternativas é
incessante, muitas soluções foram criadas e estão sendo criadas, no entanto, a descoberta da
prática ideal se tornou uma proposta desafiadora. Assim, nasce o objeto presente estudo, que
busca verificar, a partir de uma discussão dialética, se a mediação pode preencher essa lacuna
de efetividade.
Tal prática, resgatada do passado, vem para ofertar alternativas à decisão adjudicada por meio
da resolução não adversarial dos conflitos, com a construção mútua da solução das
divergências e a partir disso, possivelmente proporcionando acesso à justiça.
Sendo assim, o presente trabalho primeiramente faz uma incursão conceitual de justiça e de
acesso à justiça juntamente com notas sobre a crise de efetividade instalada no contexto
brasileiro.
Já num segundo momento, a pesquisa retrata a mediação como forma adequada, consensual e
autocompositiva de resolução de conflitos com vistas a buscar dentro do instituto a possível
resposta para a problemática enfrentada: acesso à justiça a partir da mediação, uma realidade
possível.
2 DO ACESSO À JUSTIÇA
A grande maravilha da justiça no mundo contemporâneo é dar a Ela o verdadeiro sentido, de
virtude mestra, não meramente formal, mas sim na prática (Fraser, 2014). Assim, o grande
desafio é que para além do reconhecimento formal dos direitos, eles tenham efetividade.
(Sadek, 2009).
Nessa toada, é oportuno dizer que a justiça do ponto de vista de uma revolução democrática da
justiça, não deve ser somente rápida, mas acima de tudo deve ser uma justiça cidadã (Santos,
2007), apta a atender a todos indiscriminadamente.
O conceito de justiça é bastante amplo, e pode ser definido como um fim social da mesma
forma que a igualdade, ou a liberdade, ou a democracia, ou o bem-estar. Ainda sim, a melhor
coisa é considerá-la como uma noção ética fundamental e não determinada (Santos, 2007).

168
Justiça - Conformidade com o direito, o preceito legal. Equilíbrio perfeito que estabelecem a
moral e a razão entre o direito e o dever. Poder de julgar, de aplicar os dispositivos legais. A
e e perpétua de dar a cada um

Apesar de alguns doutrinadores definirem a Justiça como sinônimo de Poder Judiciário, não se
pode limitar a conceituação a essa terminologia, até porque com a crise instalada no âmago do
Poder Judiciário, acesso à justiça seria algo extremamente relativizado. As situações próprias
da vida e das instituições de cada povo, determinam as reações do sentimento de justiça dos
Estados e das pessoas (Ihering, 2014), dando sentido e concretude a Ela, variando de povo para
povo conforme suas crenças.
A justiça é a primeira virtude das instituições sociais, como a verdade o é dos sistemas de
pensamento. Embora elegante e econômica, uma teoria deve ser rejeitada ou revisada se não é
verdadeira; da mesma forma leis e instituições, por mais eficientes e bem organizadas que
sejam, devem ser reformadas ou abolidas se são injustas (Rawls, 2000, pp. 03-04).

solução pacífica dos conflitos, à prestação jurisdicional, é um ideal fundamental do Estado de

Assim, no fim primeiro do direito está a pacificação social, para a qual há a existência de um
ambiente de paz, que quando negativa gera as condições para o estabelecimento da justiça (paz
positiva), sendo que sem aquela, não existe essa; sem essa, aquela não se mantém (Maliska,
2013).
O acesso à justiça, previsto no art. 5º, XXXV e LXXIV, Constituição Federal de 1988 deve
compor o mínimo existencial, porque na sua falta, os indivíduos não teriam meios de garantir
seus direitos. Ou seja, sem quem faça as devidas garantias, (um Poder Judiciário não só
acessível e estruturado, mas com ações que possam tutelar os direitos violados), o rol de
direitos previstos na Constituição seria uma mera quimera (Fonte, 2013).
Destarte, o acesso à justiça não é apenas um direito social fundamental, que dia após dia tem
alcançado destaque, mas também o ponto central e de aprofundamento dos objetivos e
métodos da atual ciência jurídica (Cappelletti & Garth, 2002).
Assim, quando o assunto é acesso à Justiça, o objetivo direto é torná-lo efetivo, dada sua
importância como um dos principais e fundamentais direitos do cidadão, garantindo sim o
direito e não somente a propositura da ação (Silva, 2005). Nesse sentido, a Constituição
Federal de 1988 foi o maior ganho da democracia na história do Brasil, e quis prever que todos
indistintamente tivessem condições de acessar o judiciário, com extensa garantia de que
nenhum direito sob ameaça fosse excluído de seu pálio.

sil, 1988),

169
remontando uma previsão já elencada na Declaração Universal dos Direitos Humanos, declara
que o acesso à justiça é um requisito fundamental, talvez o mais básico dos direitos humanos
nos sistemas jurídicos modernos e igualitários, pretendendo garantir antes de só proclamá-los
como direito de todos (Cappelletti & Garth, 2002).
No entanto, apesar de seu caráter ufanista, o inc. XXXV do art. 5º da Carta Magna de 1988, não
marca o jurisdicionado como seu precípuo destinatário, e sim o legislador; também não
garante que sempre sejam examinados no mérito os históricos de danos temidos ou sofridos;
lembra-se, ainda, que a solução do conflito levado aos Tribunais depende do atendimento das
condições de admissibilidade da ação. O processo que lhe serve de instrumento deve atender
aos pressupostos de existência e validade, pois não atendidos esses elementos a lesão ou
ameaça ao direito, não terão guarida no judiciário (Mancuso, 2011).
Esse fato demonstra a fragilidade da aplicação do princípio, bem como as inúmeras variantes
que podem ser atreladas a sua garantia e aplicação, evidenciando o fato de que o acesso à
Justiça é, muitas vezes, deveras inaplicável.

O conceito de acesso à justiça não pode mais se manter atrelado a antigas e defasadas acepções
que hoje se podem dizer ufanistas e irrealistas atreladas à vetusta ideia de monopólio da
justiça estatal, à sua vez assentado numa perspectiva excessivamente elástica de
universalidade/ubiquidade da jurisdição e, também aderente a uma leitura desmesurada da
facilitação do acesso, dando como resultado que o direito de ação acabasse praticamente
convertido em dever de ação, assim insuflando a contenciosidade ao interno da sociedade e
desestimulando a busca por outros meios, auto e heterocompositivos (Mancuso, 2011, p. 24).
O efetivo acesso à justiça vem cada vez mais sendo aceito como um direito social básico nas
modernas sociedades. Todavia, o conceito de efetividade ainda é abstrato (efetividade
perfeita), posto que no contexto de um dado direito substantivo poderia ser demonstrada
como a plena igualdade de condições, ou seja, a plena certeza de que a condução final do
processo dependerá somente de méritos jurídicos em relação às partes divergentes, e que nada
estranho ao Direito possa interferir na relação processual (Cappelletti & Garth, 1988).
Algo mais fundamental do que a liberdade e a justiça, que são os direitos do cidadão, está em
jogo quando deixa de ser natural que um homem pertença a uma comunidade em que nasceu,
e quando o não pertencer a ela não é um ato da sua livre escolha, ou quando está numa
situação em que, a não ser que cometa um crime, receberá um tratamento independente do
que ele faça ou deixe de fazer. Esse extremo, e nada mais, é a situação dos que são privados de
seus direitos humanos. São privados não de seu direito à liberdade, mas do direito à ação; não
do direito de pensarem o que quiserem, mas do direito de opinarem. Privilégios (em alguns
casos), injustiças (na maioria das vezes) bênçãos ou ruínas lhes serão dados ao sabor do acaso e
sem qualquer relação com o que fazem, fizeram ou venham a fazer (Arendt, 1998, p. 330).

170
O acesso à justiça equaciona diretamente as relações entre processo civil e justiça social, entre
igualdade jurídico-formal e desigualdade socioeconômica, pois na seara da justiça civil, muito
mais do que no da justiça penal, pode-se falar de procura real ou potencial por justiça. Isto se
deve ao fato de que quando forem determinadas as suas características internas e medido o
seu âmbito em termos quantitativos, é possível compará-la com a oferta da justiça produzida
pelo Estado (Santos, 1994).
Os direitos só se realizam se for real a possibilidade de reclamá-los perante tribunais
imparciais e independentes. Em outras palavras, o direito de acesso à justiça é o direito sem o
qual nenhum dos demais se concretiza. Assim, a questão do acesso à justiça é primordial para
a efetivação de direitos. Consequentemente, qualquer impedimento no direito de acesso à
justiça provoca limitações ou mesmo impossibilita a efetivação da cidadania (Sadek, 2009, p.
173).
Portanto, o princípio fundamental do acesso à justiça vem estampado no rol de direitos
fundamentais extremamente básicos, o qual não pode ser submetido a falácias ou propostas
vazias ou aparentes, em razão de sua grande importância no mundo do direito e relevância
social, pois não há segurança jurídica se as pessoas não conseguem garantir direitos que lhes
forem ameaçados ou lesados.
3 MEDIAÇÃO: UMA PROPOSTA DE ACESSO À JUSTIÇA
Hoje, já se fala não só acesso ao Poder Judiciário, mas acesso à ordem jurídica justa, fazendo
parte do rol de direitos primeiros, fundamentais, humano em sua essência.
Urge a necessidade de aplicação de meios que possam mudar essa realidade de desesperança e
descrença. Como resposta, surgiram sistemas como a mediação e a conciliação, nos quais se
percebe um processo construtivo da decisão, de titularidade das partes (Warat, 1999).
Diversos autores afirmam que as origens da Mediação de Conflitos remontam a tempos
antigos. Confúcio, em sua época, em 700 A.C., já pregava que a melhor forma de resolução de
questões conflituosas entre as pessoas era pela utilização da mediação. É sabido que o
confucionismo sustentava que a ordem social ideal se fundamentava na observância de regras
morais entre os homens e que os conflitos deveriam ser resolvidos fora dos Tribunais, por um
processo em que o compromisso é a palavra-chave. Ao mesmo tempo defendia que a harmonia
entre as pessoas só seria alcançada quando houvesse respeito às individualidades, que é um
dos principais sustentáculos da mediação de conflitos.
Convém ressaltar que a partir da década de setenta no século passado, experiências empíricas
passaram a ser observadas e estudadas pela Escola de Direito da Universidade de Harvard, no
âmbito de seu projeto de Negociação. Foi dado início, com isso, ao processo histórico de tornar
a mediação de conflitos uma teoria, com a estruturação de mecanismos e técnicas de
comunicação para a sua institucionalização como Método de resolução de conflitos voltado
para os tempos atuais. Objetivo à época foi o de atender à realidade pós-moderna, oferecendo

171
uma roupagem teórica calcada na prática dos dias atuais. Nasceu, assim, o primeiro modelo de
mediação, um dos mais conhecidos no mundo (Braga Neto, 2014, p. 22).
Na palavra mediação há um problema semântico que leva à necessidade de redefinição do
espaço com o qual a tradição circunscreve o paradigma medio, mediare, mediazione,
semântica negligenciada sem culpa, mas que necessita significação adequada. Para isso, a
definição aristotélica serve perfeitamente, quando retrata a palavra medium ou mesòtes como
a medida do agir, não o meio justo, mas a medida justa de estar no meio. Ainda no caminho do
o valor medial
entre dois extremos, uma operação graças a qual se somam os extremos e se produz um valor.
Isto é, a média soma os extremos e os divide, repartindo exatamente em dois, efetuando
justiças distributivas paradoxais de forma salomônica (Resta, 2014).
A aposta feita pelo Ocidente na resposta adjudicada tem sido ineficaz, surgindo nesse contexto
a cultura da mediação como reencontro da cultura da solidariedade, esquecida pelo Ocidente,
porém inerente à própria vida (Fagundez, 2006).
A mediação tem como núcleo conceitual, independente das variações ideológicas acerca de
seu conteúdo, basicamente elementos como o de processo voluntário; mediador como terceira
parte desinteressada; mediador sem poder de decisão; solução talhada pelas partes em conflito
(Prudente, 2012).
Na maioria das vezes as pessoas envolvidas em uma disputa têm às mãos vários meios para
responder ao conflito ou resolvê-lo (Moore, 1995). Resta saber se essa escolha será satisfatória
e efetiva, uma vez que os meios colocados à disposição do cidadão muitas vezes são
inacessíveis ou ineficazes.
A mediação tem um caráter metabólico, porque vive no mesmo ambiente onde conflitos se
produzem e por esse motivo deve estar entre os conflitantes e não separada, alheia as partes
(Resta, 2014).
Pois, a parte ao buscar este meio de solução de conflitos, nega o encaminhamento das decisões
de sua vida, assumindo inconscientemente as rédeas do seu caminho e a solução de seus
problemas, revela-se, nisso, uma mudança de posição da figura passiva que tudo espera do
Estado, para a de cidadão, ator do próprio processo de transformação, construindo uma efetiva
cidadania quando desvia a solução do conflito da esfera pública estatal e passa tal decisão para
as partes envolvidas, proporcionando a conscientização do indivíduo de seu papel, não só
diante de sua vida, mas da sociedade à qual pertence (Sales, 2008).
O uso de meios complementares de resolução de conflitos auxilia o Poder Judiciário no
desenvolvimento de sua função constitucional e possibilita principalmente o atingimento dos
escopos da participação e da pacificação. Com efeito, o emprego de meios complementares de
solução de conflitos no âmbito do Poder Judiciário agrega participação popular na
administração da justiça, ajuda a obter a pacificação social e tem finalidade pedagógica, vez

172
que contribui para que os cidadãos decidam a respeito das questões em que estão envolvidos e
assumam a responsabilidade por essas decisões (Demarchi, 2007, p. 34).
Dessa mudança de postura e papel, floresce uma consciência transformadora, que não se
limita a somente aceitar as outras formas de resolução de conflitos, mas tem a convicção de
que as respostas devem ser satisfatórias, desde a sua implementação (Warat, 1999).
É a verdadeira assunção dos atos praticados e dos compromissos assumidos pelas partes
envolvidas no conflito, que se reflete maior e melhor interação social e exercício da cidadania
(Demarchi, 2007).
A colaboração da mediação, enquanto meio democrático, participativo e inclusivo na
resolução de conflitos para a cidadania e para a dignidade humana, está na relação entre as
características de sua prática, quais sejam: a inclusão, valorização do ser humano, respeito ao
outro, resgate de valores éticos, com os efeitos naqueles que procuram esse meio, a
preservação das relações sócio-afetivas, pacificação social, estimulando a conscientização das
pessoas acerca de suas potencialidades como ser humano e como cidadão (Sales, 2008).
Assim, a mediação pelas suas peculiaridades difere dos outros mecanismos de solução de
conflitos, mostrando-se eficaz no resgate da dignidade humana, o que se revela o primeiro
passo para a realização da verdadeira transformação social que garantirá tratamento digno e
justo para todos (Sales, 2008).
A mediação tem a capacidade de acordar o sentimento de cidadania naqueles que a procuram,
ao proporcionar a percepção de que todos são capazes de encontrar as soluções mais
adequadas. Isso implica no resgate da consciência de seu papel como ator social, podendo ser o
primeiro passo no caminho que conduzirá à discussão de valores, questionamentos sobre
atitudes adotadas e, consequentemente, à luta pela efetivação de direitos constitucionalmente
garantidos. Destacam-se dentre as contribuições da mediação para a cidadania as questões do
acesso à justiça, a inclusão social, e o resgate da dignidade humana (Sales, 2008).
O melhoramento do acesso à justiça é a primeira resposta à demanda da cidadania, tendo
como essência os direitos individuais subjetivação dos direitos, resultando num ideal de
amplitude de inserção social, garantindo a preservação da identidade, respeitando o princípio
constitucional da proteção à dignidade da pessoa humana (Barbosa, 2015).
O ponto de partida para a quebra de paradigmas das inovações legislativas que aumentaram o
sistemas de resolução de conflitos colocados à disposição da população, iniciou-se com a
Resolução 125 de 2010 do Conselho Nacional de Justiça (Nunes, 2016).
A preocupação com a crise que assola o acesso à Justiça e ao Poder Judiciário atinge todos os
setores do país. Assim, o Conselho Nacional de Justiça CNJ, nascido com a emenda 45/2004,
definiu por resolução a Política Judiciária Nacional de Tratamento Adequado dos Conflitos de
Interesses, a conhecida Resolução 125 de 2010, com o intuito de reduzir o congestionamento

173
dos tribunais; reduzir a excessiva judicialização de conflitos disseminando a cultura de
pacificação (Bacellar, 2012)
É relevante pontuar que as desigualdades socioeconômicas no Brasil, estão dentre as mais
elevadas nos países do Terceiro Mundo, promovendo uma grande distância entre os mais ricos
e os mais pobres, revelando a face perversa da sociedade brasileira, apontando graves
problemas, particularmente no que diz respeito à inclusão social (Sadek, 2009).
Parece sonho, mas ainda resta um fio de esperança de que num futuro próximo, a mediação
funcione como forma de verdadeiro acesso à justiça e não de acesso do judiciário, a expensas
de garantir e dar respostas concretas à sociedade, rumo à democratização do acesso à justiça,
princípio basilar do Estado Democrático de direito (Morais, 2012).
Sendo assim, a mediação através da novel legislação que a regulamenta vem na tentativa de
efetivação de direitos, proporcionando acesso à justiça a quem busca a tutela jurisdicional.
4 CONCLUSÃO
O presente estudo possibilitou a identificação e reconhecimento da crise de efetividade do
direito fundamental do acesso à justiça e do Poder Judiciário, com vistas à percepção de que
mudanças de paradigmas são necessários e urgentes. Surge nesse contexto o instituto da
mediação como proposta de uma nova cultura, a da paz.
A partir da utilização da mediação a solução do conflito passa a ser encontrada através da
autocomposição, ou seja, por meio do consenso que cria entre as partes um ambiente propício
para a solução rápida, eficaz e concreta dos conflitos.
A mediação, hoje institucionalizada, vem para garantir efetividade ao acesso à justiça, uma vez
que as partes deixam de esperar que um terceiro imparcial resolva seus problemas, para
solucionar por si mesmas as divergências apresentadas. Portanto, quando age diretamente
com o conflito e com as partes, a mediação cria uma sintonia capaz de resolver a discussão e
instalar o sentimento de justiça no coração das entes conflitantes. É não mais precisar da
resposta adjudicada, é sim construir uma resposta através do diálogo.
Dessa forma, diante de tudo o que foi exposto é possível extrair que a mediação proporciona,
sim, acesso à justiça porque lhe dá efetividade e concretude, transformando os conflitantes em
juízes de sua própria desavença e certamente construtores da paz.

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176
OS DIREITOS HUMANOS E A PROMOÇÃO DA JUSTIÇA
89

90

RESUMO
Este artigo se propõe a analisar os direitos humanos como pressupostos principiológicos de
promoção da vida humana e redução da desigualdade, por meio de uma pesquisa bibliográfica
e documental. Acredita-se que, assim como o homem evoluiu, as desigualdades também
evoluíram e o Direito tende a acompanhar o desenvolvimento da sociedade e, por conseguinte,
por meio de um direito positivado, tende a frear o desenvolvimento dessas desigualdades,
promovendo a justiça. Nesse sentido, a Declaração Universal dos Direitos Humanos cria uma
base sólida de promoção dos direitos fundamentais dos seres humanos, em um universo social
dividido pelas discriminações raciais, econômicas, religiosas e sociais. Neste cenário de
evolução social, particularmente no cenário latino-americano, a aplicabilidade dos Direitos
Humanos exerce papel fundamental na formação do Estado Democrático e da consciência
social e nacional da criação de políticas públicas voltadas à garantia do direito à vida, à
liberdade, à igualdade, à segurança e a emancipação integral da pessoa.
Palavras-chave: Direitos Fundamentais. Desigualdades. Direitos Humanos. Justiça.
RESUMEN
Este artículo tiene como objetivo analizar los derechos humanos como principiologicos
supuestos promoción de la vida humana y la reducción de la desigualdad, a través de una
investigación bibliográfica y documental. Se cree que a medida que el hombre evolucionó, las
desigualdades también han evolucionado y la ley tiende a seguir el desarrollo de la sociedad y
por lo tanto a través de un derecho de positivado, tiende a ralentizar el desarrollo de estas
desigualdades, la promoción de la justicia. En este sentido, la Declaración Universal de los
Derechos Humanos crea una base sólida para la promoción de los derechos fundamentales de
los seres humanos en un mundo social dividido por la discriminación racial, económica,
religiosa y social. En este escenario de desarrollo social, en particular en el escenario
latinoamericano, la aplicabilidad de los derechos humanos juega un papel fundamental en la
formación de un estado democrático y la conciencia social y nacional de la creación de
políticas públicas para garantizar el derecho a la vida, la libertad, la igualdad, la seguridad y la
plena emancipación de la persona.

Graduando em Direito, aluno do 4º. ano do curso de Direito do Centro Universitário Salesiano de São Paulo /
89

UNISAL U.E. de Lorena/SP. E-mail: cruz_pedro97@yahoo.com.br


90
Advogado. Mestre em Direitos Sociais, Difusos e Coletivos pelo Centro Universitário Salesiano de São Paulo
UNISAL/SP. Especialista em Direito Empresarial. Professor do Curso de Direito no Centro UNISAL/SP.
Coordenador e Professor do Curso de Administração da Faculdade Canção Nova FCN/SP. E-mail:
rodolfoabueno@gmail.com

177
Palabras clave: Derechos fundamentales. Las desigualdades. Derechos humanos. Justicia.
INTRODUÇÃO
O ser humano vive no espaço social, em contrato com o outro, influenciando e sendo
influenciado pela sociedade. O ordenamento jurídico regula as relações humanas, com a
finalidade oferecer proteção e segurança para uma vida em que possa ser exercida de maneira
efetiva com pela dignidade humana, característica inerente ao existir e ao agir da pessoa.
Como reflexo do ordenamento jurídico, e originário da dinâmica sociocultural, fonte dialética
de formação do direito e da sociedade, surgem a preocupação com os direitos do homem.
A problematização da questão dos direitos humanos como elementos fundantes, necessários à
promoção da vida humana e à redução da desigualdade é em tese o que dá suporte e
estruturação da sociedade, formada por pessoas conscientes que gozam de autonomia dentro
de sua liberdade dentro de espaços iguais, ao mesmo tempo que diferentes, na medida da
desigualdade de cada ser humano.
O artigo, fiel a sua problemática proposta, com metodologia de pesquisa bibliográfica e
documental, aborda num primeiro momento a compreensão da formação dos direitos
fundamentais. Após, discute a respeito do processo de formação dos direitos humanos, e em
caráter de epílogo discute a promoção da justiça como consequência da efetivação dos direitos
fundamentais a todos os seres humanos, na proporção de suas necessidades específicas e
humanas.
1 DIREITOS FUNDAMENTAIS
Em um contexto político, social, econômico e cultural-religioso, surge o texto Constitucional.
Não apenas as constituições, assim como todos os outros textos legais são frutos deste
ambiente multifacetado e pluralista.
Neste contexto o Estado Democrático e Constitucional de Direito:
Caracteriza-se pela supremacia da Constituição, que informa e conforma todo o ordenamento
jurídico, tanto no âmbito público, como no privado. A supremacia da Constituição, por sua
vez, assenta dois fundamentais pilares de sustentação: a rigidez constitucional e a correlata
Justiça Constitucional. A primeira consiste na imposição de restrições e de procedimento mais
dificultoso do que aquele empregado no processo legislativo ordinário para a reforma da
Constituição (...). A segunda, caracteriza-se como jurisdição incumbida de elevada finalidade
de defesa e aplicação da Constituição e, para além disso da implementação dos princípios e do
programa Constitucionais. (SARLET; VIANNA, 2013, p. 97-98)
E dentro do texto Constitucional, algumas disposições são consideradas como de Direitos
Fundamentais, como pilares de sustentação de todo o ordenamento social.
Quanto ao ambiente histórico-social para a formação e construção do conceito de Direitos
Fundamentais cabe destacar o estudo de Jimenez Serrano (2005, p. 103) onde esclarece que as

178
primeiras declarações de direito parecem ter tido como fonte as ideias do homem abstrato do
jusnaturalismo antigo. No entanto foi a partir de século XIII que formalmente se formulou as
bases para uma doutrina acerca dos direitos naturais e consequentemente fundamentais.
Somente a partir do século XVIII, com a intersecção de três figuras basilares de todo o
ordenamento jurídico, qual seja o Estado, o Indivíduo e o Texto Normativo regulador da
relação entre Estado

fundamentais (DIMOULIS; MARTINS, 2011, p. 24; JIMENEZ SERRANO, 2005, p. 104).


Dentro dos ideais de Liberdade, Fraternidade e Igualdade, em meio a inúmeras desigualdades

Bill of Rights, ou Declaração de Direitos. No mundo europeu no ano de 1789 foi redigida na
Fra
os direitos à liberdade e à propriedade ressalvados os casos de utilidade pública, como se
aponta a seguir na transcrição dos artigos 1º e 17.
Art.1.º Os homens nascem e são livres e iguais em direitos. As distinções sociais só podem
fundamentar-se na utilidade comum.
Art. 17.º Como a propriedade é um direito inviolável e sagrado, ninguém dela pode ser privado,
a não ser quando a necessidade pública legalmente comprovada o exigir e sob condição de
justa e prévia indenização.

declarações norte-americanas e confia muito mais na intervencionista do legislador enquanto


representante do
O olhar atento às massas para a manutenção da estabilidade social passou a ser respirada pelo
mundo.

referidas Declarações de Direitos tinha por motor filosófico as ideias iluministas que

27).
Na esteira do constitucionalismo europeu, ainda que em outro continente, a primeira
Constituição que garantiu uma lista de direitos sociais foi a Constituição do México,
promulgada em 1917.

de agosto de 1919, a Constituição da primeira república alemã, conhecida como Constituição

179
No mesmo período do fim do Imperialismo Alemão, que culminou com a promulgação da
Constituição apontada anteriormente, surge na Alemanha uma forte classe de operários que
passam a organizar-se em sindicatos e partidos políticos.
Essa formação da classe operária com força organizativa irá ver em Hitler uma solução para a
convalescência do orgulho e sentimento de soberania, feridos com o final da Primeira Guerra
Mundial.
A República de Weimar durou apenas quatorze anos em meio a grande instabilidade política
de uma sociedade alemã que não conseguiu robustecer o vínculo ou compromisso social
firmado entre a burguesia e as demais forças sociopolíticas existentes à época.
-se um período de violações sistemáticas dos direitos fundamentais como política
-31). O mundo passa a
respirar ares de horror e de total destruição e aniquilação dos direitos fundamentais da
humanidade. Com o fim da segunda grande Guerra o mundo vê-se atônito, perplexo diante de
tamanha barbárie, e saliente-se, amparada pela legalidade imposta pelo positivismo
kelseniano.
No entendimento de Jimenez Serrano (2005, p. 105) a proteção ao ser humano ganharia um
reconhecimento nacional e internacional, sendo objeto de importantes documentos, a saber: a

Unidas que criaria a Comissão de Direitos, em 10 de Dezembro de 1948; a Declaração


Americana dos Direitos e dos Deveres do Homem, aprovada na IX Conferência Internacional
Interoamericana de Bogotá (1948); o Pacto Internacional relativo aos direitos econômicos,
Convenção

Interoamericana sobre Direitos Humanos, em novembro de 1969; a o Pacto Internacional dos


direitos civis e políticos de 3 de janeiro de 1976; a Declaração Universal dos Direitos dos Povos,
conhecida como a declaração de Argel datada de 1977, pelos dirigentes do Movimento de
Libertação Nacional e dos Estados.

individuais, a liberdade, a segurança, o bem-


a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, conhecida como constituição
dirigente, traz uma carta de valores, tendo como pressuposto a garantia dos direitos
fundamentais, sistematiza esse direitos fundamentais em várias partes do texto constitucional,
como já apontado no início deste artigo, com base em princípios morais e legais, contribuindo
sem preconceitos, fundada na
harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das

A necessidade de direitos para a proteção juntamente com a evolução histórica da sociedade


traz o contorno dos significados dos direitos fundamentais.

180
Para Perez-Luño (2007, p. 43 apud BENACCHIO et al., 2012):
Os direitos fundamentais são fruto de dupla convergência: (i) o encontro da tradição filosófica
humanista representada pelo iusnaturalismo de orientação democrática, com as técnicas de
positivação e proteção das liberdades pelo movimento constitucionalista do Estado de Direito
e; (ii) a mediação entre a liberdade individual e o sistema de caráter econômico, cultural e
coletivos a cuja satisfação e tutela se dirigem os direitos sociais.
Dimitri Dimoulis e Leonardo Martins (2011, p. 49) traz um conceito esclarecedor ao lado de
outros nobres juristas, a saber:
Direitos fundamentais são direitos público-subjetivos de pessoas (físicas ou jurídicas),
contidos em dispositivos constitucionais e, portanto, que encerram caráter normativo
supremo dentro do Estado, tendo como finalidade limitar o exercício do poder estatal em face
da liberdade individual. Esta definição permite uma primeira orientação na matéria ao indicar
alguns elementos básicos, a saber: (a) os sujeitos da relação criada pelos direitos fundamentais
(pessoa vs. Estado); (b) a finalidade desses direitos (limitação do poder estatal para preservar a
liberdade individual); (c) sua posição no sistema jurídico, definida pela supremacia
constitucional ou fundamentalidade formal.

norma que garante esse direito. (...) Direitos fundamentais e normas de direitos fundamentais

Alexy esclarece que:


Normas de direitos fundamentais são aquelas normas que são expressas por disposições de
direitos fundamentais; e disposições de direitos fundamentais são os enunciados presentes no
texto da Constituição alemã (...) o que apresenta dois problemas, consistente na pressuposição
da existência de um critério que permita dividir os enunciados da Constituição alemã entre
aqueles que expressam normas de direitos fundamentais e aqueles que não expressam, já que
nem todos os enunciados da Constituição Alemã expressam direitos fundamentais. O segundo
problema consiste em saber se, de fato, aos direitos fundamentais da Constituição alemã
pertencem somente aquelas normas expressas diretamente por enunciados da própria
Constituição alemã. (ALEXY, 2012, p. 65)
José Afonso da Silva (2013) defende que os direitos fundamentais consistem nas prerrogativas
e instituições existentes no mundo jurídico para garantir a convivência digna, livre e igual das
pessoas.

Acha-se a indicação de que se trata de situações jurídicas sem as quais a pessoa humana não se
realiza, não convive e, às vezes, nem mesmo sobrevive; fundamentais do homem no sentido de
que todos por igual devem ser, não apenas formalmente reconhecidos, mas concreta e
materialmente efetivados. (SILVA, 2013, p. 182).
181
os
Quanto à finalidade, os direitos fundamentais possuem a obrigação de oferecer às pessoas

co

-58).
O conceito de direito fundamental há muito se distanciou daquele conceito tradicional
daquele conceito tradicional no qual o Estado tinha somente obrigações negativas, de
abstenção frente às liberdades individuais, sendo que hodiernamente, até mais
frequentemente do que a figura da abstenção, verifica-se a imposição de obrigações positivas
ao Poder Público para a implementação desses direitos, já que constituem a sustentação e a
própria razão de existir do Estado Social de Direito. (GAIO; GAIO, 2011, p. 304).
O Poder Público se encontra vinculado umbilicalmente à Constituição e aos Direitos
Fundamentais, sendo que a atuação do Estado só se encontra justificada por ações que
racionalmente não afetem e não lesionem os direitos fundamentais.
O Estado intervenc
modelo jurídico de conformação da vida econômica e social e funcionalização crescente da

No tocante à classificação desses direitos constitucionais Joaquim José Gomes Canotilho (apud
RESENDE, 2007, p. 244) preleciona que hoje os autores adotam o conceito de dimensões dos
direitos fundamentais ao invés de realizar o uso de gerações, para não dar a ideia de
substituição de um direito fundamental pelo outro, visto que todos coexistem no ordenamento
jurídico.
Para Romita (2007) a palavra geração também é equivocada, pois transmite a ideia de que a
conquista de uma fase anularia a anterior. Nesse sentido o autor sugere a utilização do termo
família.
Bulos (2011, p. 518) entende que melhor seria o uso da palavra geração, uma vez que

De fato, as dimensões, ou gerações no sentido de dimensões, nascem dentro de uma evolução


sociocultural do Estado e uma não suprime a outra, sendo que todas são cumulativas e
concomitantes, não possuindo grau de importância diferenciado, apenas origem em dados
socioculturais diferenciados e construídos no espaço humano para garantir-lhe segurança no

chamados direitos fundamentais de primeira geração em especial a liberdade, que seriam

182
RLET, 2011, p. 58 apud BENACCHIO et
al., 2012, p. 70).
A primeira geração, séculos XVII a XIX, inaugura-se com o florescimento dos direitos e
garantias individuais clássicos, os quais encontravam-se na limitação do poder estatal seu
embasamento. Abrange os direitos referidos nas revoluções americana e francesa. Nessa fase
prestigiavam-

locomoção, à expressão, à religião, à associação, etc. (BULOS, 2014, p. 289).


Desta maneira, limita-se a atuação estatal devendo para tanto agir dentro dos limites do texto
legal, sendo que para os particulares estava liberada a realização de qualquer atividade desde
que não se enquadrasse nas proibições previstas no ordenamento jurídico.

oponíveis ao Estado, traduzem-se como faculdades ou atributos da pessoa e ostentam uma


subj
Ocorre que o paradigma liberal, ao incentivar o individualismo, por isso mesmo estava
incentivando uma característica não sustentável, que colocaria fim ao Estado Liberal.
O individualism
exploração dos trabalhadores por quem detinha o poder econômico, ferindo a dignidade

democrático, ao Estado Social de Direito, ou Estado do Bem-Estar Social, ou ainda Estado

Tal formatação social nos traz a emersão dos direitos fundamentais de segunda dimensão,
onde ser observam os direitos de liberdades sociais, como os direitos sociais, como o direito à
saúde, o direito à previdência social, assistência social, à educação e ao meio ambiente sadio
(SILVA, 2013).
Assim se expressa Bulos:
A segunda geração, advinda logo após a Primeira Grande Guerra, compreende os direitos
sociais, econômicos e culturais, os quais visam assegurar o bem estar e a igualdade impondo ao

homem. Aqui encontramos os direitos relacionados ao trabalho, ao seguro social, à


subsistência digna do homem, ao amparo à doença e à velhice. (BULOS, 2014, p. 289).
Ressalte-se que segundo Bonavides (2011, p. 567) nos direitos fundamentais de segunda

Nos direitos de terceira e quarta dimensão tem-se que são titulares não os indivíduos, mas sim
os grupos humanos, como família, povo, nação, coletividade regionais ou étnicas e a própria
humanidade (LAFER, 1988, p. 131 apud RESENDE, 2007, p. 249).

183
Como ensina Sarmento (apud BENACCHIO et al., 2012, p. 72) quando ao surgimento do Estado
pós-social, tem- -se por
uma série de instituições intermed -
social caminha em direção a um denominador comum entre os direitos sociais e os direitos
individuais.
Por este pensamento erigem-se os denominados direitos fundamentais de terceira dimensão,
os quais Paulo Bonavides (2011) entende como o direito à paz, direito ao meio ambiente
ecologicamente equilibrado, essencial à sadia qualidade de vida, o direito de comunicação e o
direito de propriedade sobre o patrimônio comum da humanidade.
Assim, de maneira célebre, ensina Bonavides:
Com efeito, um novo polo de alforria do homem se acrescenta historicamente aos da liberdade
e da igualdade. Dotados de altíssimo teor de humanismo e universalidade, os direitos de
terceira geração tendem a cristalizar-se no fim do século XX enquanto direitos que não se
destinam a proteção dos interesses de um indivíduo, de um grupo ou de um determinado
Estado. Tem primeiro por destinatários o gênero humano mesmo, num momento expressivo
de sua afirmação como valor supremo em termos de existencialidade concreta. (BONAVIDES,
2011, p. 569).
Quanto aos direitos fundamentais de quarta dimensão trata-se de direitos fundamentais que
surgiram no processo de universalização no campo institucional, sendo entendido como o
direito à democraci
a concretização da sociedade aberta do futuro, em sua dimensão de máxima universalidade,
para o qual parece o mundo inclinar-
(BONAVIDES, 2011, p. 571).
Quanto à concretização dos direitos Bonavides expõe o seguinte:
Daqui se pode, assim, partir para a asserção de que os direitos da segunda, da terceira e da
quarta gerações não se interpretam, concretizam-se. É na esteira dessa concretização que
reside o futuro da globalização política, o seu princípio de legitimidade, a força incorporadora
de seus valores de libertação. (...) A nova universalidade dos direitos fundamentais os coloca
assim, desde o princípio, num grau mais alto de juridicidade, concretude, positividade e
eficácia. (BONAVIDES, 2011, p. 573)
Em entendimento diferenciado Bulos (2011) desloca os direitos fundamentais à democracia, à
e

sucessão de filhos gerados por inseminação artificial, clonagens, dentre outros acontecimentos
-521).

184
-a da terceira geração dos direitos fundamentais (BONAVIDES,
2011, p. 579; BULOS, 2011, p. 520).

mandamento insc
BONAVIDES, 2011, p. 592).
-se, assim, a paz ao
a concretização da associação da
justiça com a democracia e a união do Direito com a liberdade (BONAVIDES, 2011, p. 582).
No mundo globalizado na unipolaridade, das economias desnacionalizadas e das soberanias
relativizadas e dos poderes constitucionais desrespeitados, ou ficamos com a força do Direito
ou com o direito da força. Não há mais alternativa. A primeira nos liberta; o segundo nos
escraviza; uma é a liberdade; o outro o cárcere; aquela é Rui Barbosa em Haia, este é Bush em
Washington e Guantánamo; ali se advogam a Constituição e a soberania; aqui se canonizam a
força e o arbítrio, a maldade e a capitulação. (BONAVIDES, 2011, p. 592)
Nesse sentido Bulos (2011, p. 520) juridicamente poetiza:
Onde não há paz, não há amor; onde não há paz, não predomina a retidão no coração; onde
não há paz, não há verdade; onde não há paz, não há Deus. Deus está em tudo, embora nem
todos os homens alguns dos quais artífices dos poderes constitucionais dos Estados estejam
Nele, e, por isso, sofrem. Mas, se há beleza no caráter, reinará harmonia no lar. Havendo
harmonia no lar, haverá ordem nas nações. Se reina ordem nas nações, haverá paz no mundo.
E por fim, coroando o tópico faz-se referência a Isaías, Capítulo 32, Versículo 17, onde dispõe
justiça será a paz, e a obra da justiça consistirá na tranquilidade e na segurança

Implementando as dimensões, gerações, ou família ter-se-ia um mundo da vida apto para o


exercício da dignidade da pessoa humana, inerente à existência do homem.
Realçando as origens ideológicas sobre as quais deita raízes o texto Constitucional, Sarmento
ensina que:
Torna-se frequente a eclosão de conflitos entre as normas da Lei Fundamental, máxime em
países que, como o Brasil, adotaram constituições compromissárias. Estas são cartas nas quais
o processo constituinte não se desenvolveu sob o signo do consenso, traduzindo, ao revés, a
síntese dialética de concepções e ideais políticos diversificados. Assim, tais constituições
acabam abrigando normas derivadas de matrizes ideológicas antagônicas, que ao incidir sobre
os casos concretos, podem indicar soluções diametralmente opostas. (SARMENTO, 2001, p.
36).

185
De fato a harmonia perante as divergências que surgem no processo de interpretação e
aplicação do texto fundamental encontra sua fonte unificadora no próprio texto.
Nesse diapasão Sarmento afirmar que:
Inobstante é certo que a Lei Fundamental constitui uma unidade. O princípio da unidade da
Constituição, encarecido pela Corte Suprema alemã como o cânone mais importante da
hermenêutica constitucional, impõe ao intérprete a tarefa, nem sempre trivial, de buscar a
harmonia entre os ditames da Lei Maior, solucionando as situações de tensão que tendem a se
deflagrar em seu seio. (SARMENTO, 2001, p. 37).
2 DIREITOS HUMANOS
Os direitos fundamentais de todas as gerações, para poderem ser efetivados, precisam de um
novo suporte moral e, concomitantemente, não prescindem de uma nova epistheme jurídica
para que o Estado tenha como atuar de forma interventiva, efetivando os preceitos
fundamentais e constituindo a ação.
Nessa nova epistheme é o momento de repensar a matriz positivista do direito, com a

parâmetro ético voltado para a interdependência homem-natureza e a efetivação dos direitos

No tocante à associação dos direitos fundamentais aos direitos humanos interessante destacar
que de acordo com Pérez-Luño (2005, p. 27) é possível distinguir três tipos de definições de
direitos humanos:
a)Tautológicas, que no aportan ningún elemento nuevo que permita caracterizar tales
derechos (...); b) Formales, que no especifican el contenido de estos derechos, limitando-se a
alguna indicación sobre su estatuto deseado o propuesto. Del tipo de: los derechos del hombre
son aquellos que pertencen o deben pertencer a todos los hombres, y de los que ningún
hombre puede ser privado; c) Teleológicas, en las que se apela a ciertos valores últimos,
susceptibles de diversas interpretaciones: Los derechos del hombre son aquellos
imprescindibles para el perfeccionamiento de la persona humana, para el progresso social, o
para el desarollo de la civilización.
No entendimento de Gorczevski e Dias (2013, p. 284) os direitos humanos são entendidos como
normas jurídicas superiores, uma vez que são direitos inerentes ao ser humano, fazendo parte

fundamentais, porque sem eles o homem não é capaz de existir, de se desenvolver e de

Enquanto direitos do homem, os direitos fundamentais existem desde sempre, quando da


criação do homem enquanto ser pensante e atuante no universo social onde está inserido.

186
Nesse sentido, a Declaração Universal dos Direitos Humanos cria uma base sólida de
promoção dos direitos fundamentais, consagrados na nossa Carta Constitucional.
3 PROMOÇÃO DA JUSTIÇA
O direito apresenta-se assim como ciência capaz de dialogar com a sociedade e oferecer uma
solução que promova o bem de todos no mundo da vida, com base na promoção dos direitos
humanos, a partir da efetivação dos direitos fundamentais.
A garantia da proteção a esses direitos fundamentais inerentes ao ser humano foi sendo
construída gradativamente dentro de um processo de evolução e emancipação humano-sociais
em face de interesses particulares e individualistas.
A desigualdade reside exatamente nos interesses particulares e individualistas, que objetiva
dar mais a quem já tem tudo e por consequência, dar menos a quem não tem nada.
No

discutir o significado de igualdade para se alcançar a justiça, a saber, a distinção entre


igualdade formal e material.

Salienta Nunes Junior (2017, p. 827) que a desigualdade formal, em um país de enorme

Dizer que todos devem lutar com suas armas é injusto, quando as armas são de calibres tão

Ao contrário do que disposto acima, a igualdade pretendida pelo Estado será a igualdade
formal, que irá tratar cada pessoa na medida de sua desigualdade, de acordo com as suas

de
827). Desta forma, tratando os desiguais de maneira desigual, ou seja, dar mais a quem tem
menos e menos a quem tem mais, a igualdade se constrói de maneira concreta.
A promoção da justiça irá ocorrer justamente na medida em que houver uma inversão da
lógica da desigualdade e consequente consciência social da urgente necessidade de
emancipação da pessoa, de maneira equânime, objetivando o bem de todos no mundo da vida.
A moral e a ética postas sempre em função dos interesses particulares do homem de modo
arrogante deve, ao contrário, articular-se em função da pessoa humana, dotada de direitos
fundamentais e humanos, dentro de uma coletividade relacional, interdependente e vinculado
ao outro.

187
Nesse aspecto deve-se afastar o antropocentrismo predatório dos processos de tomada de
decisões, deslocando os processos de escolha para um ambiente mais solidário com tudo e com
- (CATSMAN; SIMIONATO FILHO,
2010, p. 45).
Dessa maneira a pessoa humana deve voltar-se para si e perceber-se no contato relacional com
o outro, promovendo um ambiente discursivo que levem à concretização dos direitos
humanos fundamentais e que contribua para o exercício da indelével característica do existir
da vida humana, qual seja a realização de sua dignidade e a promoção da justiça.
CONCLUSÃO
Toda a estrutura de normas, princípios, regras e direitos é estabelecida com a única finalidade
de melhoria da vida humana e efetivação da justiça.
Programar mecanismos que auxiliem na formação e amarração de uma estrutura social sadia
ao ser humano, juntamente com outras influências, quais sejam sociais, culturais, afetivas e
religiosas, é atividade precípua do Direito.
Nesse sentido os direitos humanos se irradiam dos direitos fundamentais, sejam eles
individuais ou coletivos, em suas diversas dimensões, dentro de uma evolução sociocultural do
Estado, sendo que todas as dimensões são cumulativas e concomitantes, não possuindo grau de
importância diferenciado, tendo o único condão de manter os pressupostos elementares de
uma vida humana na liberdade e na dignidade humana.
A promoção da justiça, a redução da desigualdade e a proteção da vida humana passam
necessariamente por uma sólida base de promoção dos direitos humanos fundamentais, de
onde se originará uma consciência social de emancipação da pessoa de modo a oferecer
soluções que suscitem o bem de todos no mundo da vida.
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2013.

189
A ERRADICAÇÃO DO TRABALHO INFANTIL POR MEIO DA EXPANSÃO DAS
CAPACIDADES PESSOAIS
91

92

RESUMO
Esta pesquisa procura questionar a respeito do trabalho infantil como fenômeno social que
está diretamente relacionado às condições econômicas do Estado e familiar, estrutura positiva
e questões de ordem cultural. Diante deste objetivo, por meio de uma pesquisa bibliográfica e
documental, com base em fontes primárias e secundárias de pesquisa, aborda-se, de forma
crítica, a falta participação efetiva do Estado, por meio das políticas públicas, no controle da
desigualdade social, processo este desencadeador do trabalho infantil, expondo os menores em
condições inadequadas e, muitas vezes, em atividades perigosas, o que leva à perda da infância
e reduz a oportunidade de uma boa educação, frente à ausência de escolha. Diante a
desigualdade social implantada, grande parte dos pequeninos cidadãos torna-se excluída,
ficando fora da rede de relacionamentos que leva ao desenvolvimento integral do ser humano.
Sentem-se, portanto, obrigados a utilizar das próprias armas em busca da sobrevivência,
fazendo uso de sua força infantil de trabalho. Em tempos de modernidade líquida, busca-se ao
máximo o derretimento dos sólidos, o que inclui a transformação das instituições protetivas
dos cidadãos em verdadeiras ruínas, de forma a quebrar as barreiras impeditivas da livre
circulação e do domínio econômico. O entendimento explanado por Amartya Sen, na obra

trazendo à tona a hipótese que para que haja a erradicação do trabalho infantil se faz
necessário refazer o sistema estatal implantado, através do desenvolvimento como liberdade,
pela afirmação das capacidades íntimas e pessoais como direito social fundamental,
implementando políticas públicas e oportunizando direitos, liberdades civis e políticas.
Palavras-chave: Trabalho Infantil. Erradicação. Políticas Públicas. Desenvolvimento Pessoal e
Social. Liberdade. Direito Fundamental.
Abstract
This research seeks to question about child labor as a social phenomenon that is directly
related to the economic conditions of the State and family, positive structure and cultural
issues. In view of this objective, a bibliographical and documentary research, based on
primary and secondary sources of research, critically addresses the lack of effective

91
Advogado. Mestre em Concretização dos Direitos Sociais, Difusos e Coletivos no Centro Universitário
Salesiano/SP. Pós-graduado em Direito Público. Técnico em Segurança do Trabalho. Professor do Curso de Direito e
da Pós-Graduação do Centro Universitário Salesiano de Lorena/SP junior.advogado@gmail.com
92
Advogado. Mestre em Direitos Difusos e Coletivos pelo Centro Universitário Salesiano de São Paulo/SP. Professor
do Curso de Direito do Centro UNISAL/SP. Professor e Coordenador de Curso da Faculdade Canção Nova
FCN/SP. rodolfoabueno@gmail.com

190
participation of the State, through public politics, in the control of social inequality. This
process is the trigger for child labor, exposing minors in inadequate conditions and often in
dangerous activities, which leads to the loss of childhood and reduces the opportunity for a
good education, faced with the lack of choice. Faced with the social inequality implanted, most
of the small citizens become excluded, being outside the network of relationships that leads to
the integral development of the human being. They feel obliged to use their own weapons for
survival, using their child labor power. In times of liquid modernity, we seek to the maximum
the melting of solids, which includes transforming the citizens' protective institutions into real
ruins, in order to break down barriers that impede free circulation and economic dominance.
The understanding explained by Amartya Sen in the book "Development as Freedom" is
confronted with the issue of child labor, bringing to the fore the hypothesis that for the
eradication of child labor it is necessary to redo the state system implanted through
development As freedom, by affirming personal and personal capacities as a fundamental
social law, implementing public policies and giving rights, civil liberties, law, and politics.
Key-words: child labor. eradication. public politics. Development personal and social.
fundamental law.
INTRODUÇÃO
Em tempos de modernidade líquida, busca-se ao máximo o derretimento dos sólidos, o que
inclui a transformação das instituições protetivas dos cidadãos em verdadeiras ruínas, de
forma a quebrar as barreiras impeditivas da livre circulação e do domínio econômico.
Neste cenário de liquefação, típico de um mundo pós-moderno, em que a balança demonstra
claro desequilíbrio a favor da liberdade, em detrimento da segurança, refletindo diretamente
nos princípios basilares do Direito, principalmente, Direito do Trabalho, fazendo com que as
instituições protetivas do trabalhador fiquem à mercê do crescimento econômico. Em meio a
estas mudanças, onde a economia se torna agressiva e manipuladora, há o interesse por parte
dos empregadores de afastar ao máximo a intromissão Estatal nas relações comerciais,
inclusive no tocante aos seus direitos fundamentais, os quais se enquadram como custo do
produto final produzido.
No presente trabalho se discutirá o trabalho infantil como fenômeno social que está
diretamente relacionado às condições econômicas da família, estrutura positiva e questões de
ordem cultural. Abordará, de forma crítica, a repercussão social negativa da exploração das
crianças obrigadas a trabalhar em condições inadequadas e muitas vezes em atividades
perigosas, o que leva à perda da infância e reduz a oportunidade de uma boa educação. Diante
a ausência de condições econômicas necessárias ao sustento básico, famílias contam com o
trabalho infantil na luta pela sobrevivência, na busca de liberdade. Evidente que tais práticas
incidem negativamente na edificação de valores e na reprodução de um modo de exclusão
social, pois, as crianças trabalhadoras,mesmo com oportunidade para estudar, têm o

191
aprendizado prejudicado, em razão da redução do tempo de estudo, bem como a perda de
direitos presentes e futuros.
Será identificado que o problema do trabalho infantil está atrelado diretamente à questão da
liberdade de escolha, em que as crianças se encontram privadas na exploração de sua mão de
obra, por meio de famílias desfavorecidas ou culturas empresariais e estatais impostas.
Esta pesquisa investigará o conceito de liberdade concebido nas obras de Amartya Sen
economista indiano que se consagrou ao receber o Prêmio Nobel em 1998, com sua abordagem
acerca do processo de desenvolvimento de liberdades substanciais principalmente do livro

Será identificado que o aumento das capacidades, a concessão de oportunidades de escolha


tem que ser objetivo fim das organizações estatais, sob pena dos direitos fundamentais
constitucionais não se efetivarem e o crescimento da pobreza, das desigualdades, das
privações sejam constantes. Quando as pessoas deixam de ter liberdades, sejam elas políticas,
econômicas, sociais, a condução para o desenvolvimento é restrita, ineficaz. A busca pela
sobrevivência ultrapassa a liberdade do indivíduo que vem a ser explorado e que se sujeita em
razão de sua necessidade.
Ao final, concluir-se-á que o combate do trabalho infantil está totalmente ligado ao processo de
desenvolvimento que o Estado deverá implantar para que a liberdade possa brotar. A
erradicação do trabalho infantil está atrelada diretamente ao desenvolvimento das
capacidades humanas, como direito social fundamental. Não há como esperar que o ser
humano identifique esta característica, se a ele falta meios de sobrevivência, onde o trabalho
está atrelado à necessidade. Quando há satisfação de necessidades essenciais, minimização do
grau de pobreza, desenvolvimento de habilidades, é possível identificar um crescimento ao
encontro de liberdades substantivas. Enquanto não reconhecer o processo de desenvolvimento
como primordial para o alcance da liberdade humana, as grades da prisão estarão pintadas
com cores de liberdade.
1 O TRABALHO HUMANO: CONCEITO, PRODUTO DA ATIVIDADE HUMANA COLETIVA
O vocábulo trabalho provém de uma raiz que indica algo penoso ao homem, em linguagem
cotidiana tem inúmeros significados. Algumas vezes lembra dor, sofrimento, e outras vezes
designa operação humana de transformação da matéria (SANTOS E FILHO, 1997).
Observando a mitologia bíblica, temos que o trabalho foi concedido àquele que desobedeceu a
ordem:
E a Adão [Deus] disse: Porquanto deste ouvidos à voz de tua mulher, e comeste da árvore de
que te ordenei, dizendo: Não comerás dela, maldita é a terra por causa de ti; com dor comerás
dela todos os dias da tua vida. Espinhos, e cardos também te produzirá; e comerás a erva do
campo. Do suor do teu rosto comerás do teu pão, até que te tornes à terra; porque dela foste
tomado; porquanto és pó e em pó te tornarás (Gênesis, 3:17-19).

192
odificando-a
-de-troca do
trabalho, e no acúmulo do trabalho a mercadoria.
No transcorrer da história, o trabalho inspira o Cristianismo, através do valor-trabalho,
sacramentando, posteriormente, no Renascimento, incorporando o trabalho como algo
presente na essência humana.
Considerando em sua mais ampla acepção, o trabalho pode ser concebido como o exercício da
atividade humana, quaisquer que sejam a esfera e a forma sob as quais essa atividade seja
exercida. Muitos autores, ao conceituá-lo, enfatizam o fato de que também os animais, a seu
modo, o realizam, mas o trabalho animal, como o das formigas ou das abelhas, é produto de
comportamentos instintivos, enquanto o que caracteriza o trabalho humano é a adaptação a
situações imprevistas e a fabricação de instrumentos, bem como o fato de ele ser consciente e
proposital, na medida em que o resultado do processo existe previamente na imaginação do
trabalhador.
Diante desta perspectiva, a evolução econômica do trabalho se torna um importante
instrumento para identificação e solução de diversos problemas sociais relacionados com os
processos de ordem coletiva, como formação de empregos e quantificação de salários. Assim,
havendo problemas econômicos, toda a sociedade é afetada.
1.1 RAÍZES DO TRABALHO INFANTIL
Quando se pensa em história, o passado logo vem à mente. Será que o passado seria a própria
história?
A transformação é a essência da história e somente o ser humano pode executar tal tarefa.
Para tanto, pode-se afirmar que o homem é o objeto da história, isto é, o estudo da história
concentra-se no ser humano e a sucessão temporal de seus atos (CASTRO, 2010).
Fazendo um paralelo entre a história com o Direito, não há dúvida de sua real importância,
principalmente quando se tem em conta a percepção da normatividade extraída de um
determinado contexto definido como experiência pretérita que conscientiza e liberta o
presente (WOLKMER, 2009).
Como afirmava Bobbio, quanto aos direitos da pessoa humana,
por mais fundamentais que sejam, são direitos históricos, [...] nascidos em certas
circunstâncias, caracterizados por lutas em defesas de novas liberdades contra velhos poderes,
e nascidos de modo gradual, não todos de uma vez e nem de uma ve
2004, p. 5).
A partir dos primeiros traços de trabalho infantil, traduzidos nas literaturas pertencentes às
ciências sociais aplicadas, é que se buscará apresentar, de forma pormenorizada, a situação da
193
criança e do adolescente no decorrer da história laboral até a criação do sistema pós-moderno
de proteção integral, presentes em nossa Constituição Federal.
Mas não é só pela escravidão que os menores trabalhavam na civilização romana, pois também
haviam os menores que eram inseridos nas atribuições de seus pais, com o objetivo de
obterem conhecimento e aprendizagem.
Na antiguidade, as organizações sociais das civilizações possuíam características semelhantes
em diversos países do oriente ou ocidente, sendo o trabalho de aprendizagem notadamente
comuns aos processos de escravismos, em geral constituídos de prisioneiros de guerras e
combates entre grupos ou tribos93.
Podemos observar, portanto, que era inexistente a proteção contra o trabalho infantil, ainda
mais levando-se em conta o silogismo simples de que sendo a escrava uma propriedade de seus
senhores, do mesmo modo seriam os seus filhos, para, tão logo atingissem a força e idade
necessárias, fossem incluídos no mesmo direito de utilizar sua mão de obra escrava/infantil.
Com o enfraquecimento do regime feudal, sucedeu o fenômeno do corporativismo, definido na
Idade Média, especialmente centrado em características do trabalho livre e artesanal urbano.
Esses aprendizes encontravam-se na base da pirâmide tripartida das corporações de ofício,
onde deveriam possuir boa conduta, assiduidade ao trabalho e obediência ao seu mestre, que,
por sua vez, tinha o dever de ensinar-lhe o ofício, respondendo por uma educação moral,
podendo impor-lhe castigos corporais.
A utilização da mão de obra infantil nos campos e nos antigos feudos, com a presença de
menores como serviçais de senhores do campo, ainda se fazia presente em pleno século XVII,
durante o mesmo período em que as Corporações de Ofício funcionavam em franca evolução.
No que tange ao trabalho infantil e juvenil em atividades independentes, nas quais crianças e
adolescentes figuravam como verdadeiros empregados, exercendo funções intimamente
ligadas a aspectos econômicos, é salutar reportarmos aos séculos XVIII e XIX, quando iniciou-
se a Revolução Industrial.
2 DEMOCRACIA E DESENVOLVIMENTO HUMANO: LEGITIMIDADE E LIBERDADE
SUBSTANCIAIS
DESENVOLVIMENTO COMO LIBERDADE: EXPANSÃO DAS CAPACIDADES

4
Para compreender um pouco mais a história da escravidão afeita ao trabalho da criança, esclarece-
antiguidade remota, travados os combates, integrantes dos grupos ou tribos subjugados eram mortos. Era a forma
encontrada pelos vencedores de livrar-se do que consideravam estorvo. Depois, convenceu-se o homem de que, em
exterminar os inimigos, era mais vantajoso mantê-los cativos, utilizando sua força de trabalho. Nascia a escravidão.
Os mais poderosos logo começaram a vender, trocar ou alugar escravos que sobejavam. Não havia normas jurídicas
e

194
As liberdades humanas são expandidas a partir do desenvolvimento pessoal. A partir dos
conceitos elaborados pelo economista indiano, Amartya Sen (2010), este conceitua o
desenvolvimento como liberdade. Vejamos:
Se a liberdade é o que o desenvolvimento promove, então existe um argumento fundamental
em favor da concentração nesse objetivo abrangente, e não em algum meio específico ou em
alguma lista de instrumentos especialmente escolhida. Ver o desenvolvimento como expansão
de liberdades substantivas dirige a atenção para os fins que o tornam importante, em vez de
restringi-la a alguns meios que, inter alia, desempenham um papel relevante no processo
(2010, p.16).
Interessante observar que o conceito de liberdade é um notório tema de discussão na teoria e
história política das últimas duas décadas. Silva (2008) afirma que a principal justificativa
deste debate vem da crítica dos teóricos neorrepublicanos à concepção de liberdade da linha
dominante do pensamento liberal contemporâneo. Vejamos:
Há algo de profundamente contestável, sugerem os neorrepublicanos, numa compreensão da
liberdade que atenta exclusivamente para a ausência de impedimentos à realização das
escolhas por parte dos agentes individuais. A entronização do individualismo atomista de
parte da tradição liberal anglófona dos últimos dois séculos teria resultado numa filosofia
política e num ideal de liberdade refratários à aceitação da ideia de bem comum e,
consequentemente, inibidores da disposição dos cidadãos para o cumprimento de deveres
sociais indispensáveis à boa ordem republicana (SILVA, 2008, p. 151-152).
Mesmo que Amartya Sen correlacione sobre alguns dos temas dessa discussão, seu objetivo
não é simplesmente analisar o conceito de liberdade, mas suas implicações e efeitos em
relação ao desenvolvimento.
No entendimento de Amartya Sen, Aristóteles já dava indícios em sua preocupação,
associando a economia aos fins humanos, porque mesmo a economia sendo o estudo da
riqueza, esta deveria estar interligada a outros estudos, como a filosofia, política e ética, assim
queza

p. 28). As razões que temos para acumular riqueza estão na sua serventia como possibilidade
de termos mais liberdade e assim levar o tipo de vida que temos razão para valorizar.
Como bem salientado por Amartya Sen (2010), a utilidade da riqueza está nas coisas que ela
nos permite fazer as liberdades substantivas que ela nos ajuda a obter. O desenvolvimento
tem de estar relacionado, sobretudo, com a melhora da vida que levamos e das liberdades que
desfrutamos. Mais liberdade nos dá mais oportunidade de buscar nossos objetivos tudo
aquilo que valorizamos. Ela ajuda, por exemplo, em nossa aptidão para decidir viver como
gostaríamos e para promover os fins que quisermos fazer avançar. Esse aspecto da liberdade
está relacionado com nossa destreza para realizar o que valorizamos, não importando qual é o
processo através do qual essa realização acontece. Após, podemos atribuir importância ao

195
próprio processo de escolha, onde entra a questão do trabalho infantil. O objetivo da liberdade
é termos certeza de que não estamos sendo forçados a algo por causa de restrições impostas
por outros (SEN, 2010).
O aumento das capacidades, a concessão de oportunidades de escolha tem que ser objetivo fim
das organizações estatais, sob pena dos direitos fundamentais constitucionais não se
efetivarem e o crescimento da pobreza, das desigualdades, das privações sejam constantes.
Nas afirmações de John Rawls, o sistema legislativo tem muita importância na formação da
liberdade justa e equilibrada:
Na condição de delegados numa convenção constituinte, ou como membros de uma
legislatura, as partes devem decidir como especificar as diversas liberdades para produzir o
melhor sistema global de liberdade. Devem observar a distinção entre regulamentação e
restrição, mas, em muitos pontos, terão de equilibrar uma liberdade fundamental em relação a
outra; por exemplo, a liberdade de expressão em relação ao direito a um julgamento justo. O
melhor arranjo das diversas liberdades depende da totalidade das limitações às quais estão
sujeitas. (RAWLS, 2008, p. 249)
As organizações têm um papel primordial no desenvolvimento com liberdade, onde a
participação mercadológica, estatal, política, educacional são cruciais na interligação do
processo. A cultura social deixa claro o seu valor, sendo fundamental questionar as normas
comuns que influenciam os costumes locais, tais como igualdade, natalidade, meio ambiente,
ou seja, valores que devem ser criticados ao ponto de trazer a tona a importância da liberdade
em cada aspecto.
A promoção de uma sociedade igualitária, sem preconceitos, na busca constante pelo combate
à desigualdade social, priorizando a educação, a saúde, o saneamento básico, a segurança
jurídica e patrimonial, devem fazer parte da cultura de um povo e do objetivo Estatal. Ao
conceder Bolsa Família não estou concedendo oportunidades, mas apenas minimizando a
miserabilidade, pois não há trabalhos e projetos paralelos que oportunizem o desenvolvimento
das capacidades humanas, apenas a concessão de um mísero sustento alimentar. Este é apenas
um primeiro passo, mas não deve ser o único, sob pena de ser ineficiente e inalcançável o
objetivo de desenvolvimento como liberdade.
Partindo deste pressuposto, as políticas públicas devem ser recriadas buscando aplicar o
processo de isonomia, concedendo oportunidades aos menos favorecidos, a fim de libertá-los
do ciclo de exploração, de busca por satisfação de necessidades. Quando oportunizo o
desenvolvimento das capacidades humanas, juntamente com estrutura básica para todos, tais
como educação, saúde, saneamento, segurança jurídica e patrimonial, efetivamente estou
buscando liberdades substantivas, oportunizando escolhas. O aumento de redes faz com que as
relações se fortifiquem e o desenvolvimento econômico amadureça, consequentemente, a
busca pelo trabalho infantil não terá sentido, estando fora do contexto de desenvolvimento
como liberdade.

196
2.2 LIBERDADE DE ESCOLHA NO TRABALHO INFANTIL
Há uma grande diferença entre fazer algo e ser livre para fazê-lo.

predomínio do tempo sobre os espaços, ocupados, estes últimos, por apenas simples
momentos. Vivemos em uma sociedade pós-moderna, em que nada tem duração eterna, sendo

Sobre o tema, Daisy Rafaela da Silva, com grande precisão, ressalta que esta modernidade
liquida resume- -se em um tempo de exaustão, de perda do sentido
da vida, de perda do sentido do pertencimento e de perdas de interesses, da fuga fácil e da
pe
Sob este prisma de derretimento de sólidos e de liquefação, a modernidade líquida caracteriza-
se pela flexibilização, redução, e, até mesmo, extinção das instituições que seriam hábeis a
garantir segurança e proteção ao cidadão, entendidas como sólidos, as quais, conforme

estão mortas e ainda vivas, uma vez que não desempenham mais funções efetivas, apesar de
ainda
O problema do trabalho infantil está atrelado diretamente à questão da liberdade de escolha,
em que as crianças se encontram privadas na exploração de sua mão de obra, por meio de
famílias desfavorecidas ou culturas empresariais e estatais impostas.
Diante a ausência de condições econômicas necessárias ao sustento básico, famílias contam
com o trabalho infantil na luta pela sobrevivência. Por outro lado, famílias identificam o
trabalho infantil como fator educativo, edificador de valores. Porém, ao inserirem o trabalho
no menor, estão retirando o seu direito e dever de brincar, de explorar o mundo infantil, de
estudar e estruturar internamente conceitos de formação, onde os reflexos negativos são
nefastos, seja em curto prazo, com enormes possibilidades de acidentes laborais e, a médio e
longo prazo, com ausência de estrutura educacional e formação básica necessária.
Ao analisarmos o processo de inserção social desenvolvido pelo Estado, nos deparamos
fortemente com a sua contribuição na prática do trabalho infantil.
Por esta razão, o desenvolvimento requer que se removam as principais formas de privação de
liberdade, tais como carência de oportunidades econômicas, pobreza, ausência de saúde
adequada, fatores estes de primordial importância para a erradicação do trabalho infantil.
Apesar de muitos acreditarem que o trabalho infantil edifica valores, os autores desta prática
estão longe das condições básicas de sustento. A busca pelo trabalho infantil está mais ligada
ao fator econômico que ao desenvolvimento educacional do menor.

197
Reconhecer que o objetivo das políticas públicas exerce um papel fundamental no
desenvolvimento das capacidades humanas, é crucial para que a liberdade se faça presente e o
trabalho infantil seja gradualmente erradicado.
De acordo com as observações feitas até aqui, é possível identificar que no mundo
contemporâneo grande parte da população sofre privações de liberdades, devido à falta de
políticas públicas de inserção social efetivas, vivendo em busca da satisfação de necessidades.
A simples concessão de Bolsa Família não é suficiente para a expansão das capacidades, visto
ausência de trabalhos paralelos para tanto. O desenvolvimento das capacidades elementares
vão além da simples concessão de condições para um alimento básico, incluindo o combate à
subnutrição, à morte prematura, saber ler e escrever. Dessa forma, afirma Amartya Sen:
As liberdades substantivas incluem capacidades elementares como, por exemplo, ter
condições de evitar privações como a fome, a subnutrição, a morbidez evitável a morte
prematura, bem como as liberdades associadas a saber ler e fazer cálculos aritméticos, ter
participação política e liberdade de expressão etc. (SEN, 2010.p.55).
Por esta razão, a eliminação de privações de liberdades é constitutiva ao desenvolvimento,

que o tornam importante, em vez de restringi-la a alguns dos meios que, interalia,
16).
3 A PROTEÇÃO LEGAL INTERNACIONAL DO TRABALHO INFANTIL
O Direito Internacional do Trabalho é apenas um ramo do Direito Internacional que objetiva
tratar especificamente dos trabalhadores.
Em 1919, por força do Tratado de Versalhes, foi criada a Organização Internacional do
Trabalho (OIT), firmado com a Alemanha, onde o Brasil foi um dos vinte e nove participantes.
No preâmbulo da Constituição da OIT, há a ideia de que o direito internacional do trabalho é
justificado por meio de aspectos sociais, assegurando bases sólidas para a paz universal,
humanitários, garantindo condições dignas de trabalho e econômico, onde a alta concorrência
dificulta a melhoria das condições sociais internas. Vejamos:
Considerando que a Sociedade das Nações tem por fim estabelecer a paz universal e que tal
paz só pode ser fundada sobre a justiça social;
Considerando que existem condições de trabalho que implicam para grande número de
indivíduos miséria e privações, o que gera tal descontentamento que a paz e a harmonia
universais entram em perigo, e considerando que é urgente melhorar essas condições: por
exemplo, no que se refere à regulamentação das horas de trabalho, a fixação de uma duração
máxima do dia e da semana de trabalho, o recrutamento da mão de obra, a luta contra a
paralisação do trabalho, a garantia de um salário que assegure condições de existência
convenientes, a proteção dos trabalhadores contra as doenças graves ou profissionais e os
acidentes do trabalho, a proteção das crianças, dos adolescentes e das mulheres, as pensões de
198
velhice e de invalidez, a defesa dos interesses dos trabalhadores empregados no estrangeiro, a
afirmação do princípio da liberdade sindical, a organização do ensino profissional e técnico, e
outras medidas análogas;
Considerando que a não adoção por qualquer nação de um regime de trabalho realmente
humano cria obstáculos aos esforços das outras nações desejosas de melhorar a sorte dos
trabalhadores nos seus próprios territórios (RIBEIRO; MAURILLO, 1919, p.348-349). 94
A recomendação destina-se apenas a sugerir normas que podem ser adotadas no direito
nacional, por qualquer das fontes formais do Direito do Trabalho, tendo em vista que o assunto
tratado não permite a imediata adoção de uma convenção.
Atualmente, a OIT conta com 175 (cento e setenta e cinco) países-membros, cujos os
representantes reúnem-se anualmente em Genebra, na Suíça. Essas reuniões são denominadas
de Conferências Internacionais do Trabalho. Todas as deliberações das Conferências chamam-
se Convenções e influenciam as legislações trabalhistas de todos os países.Além das
Convenções, a OIT produz recomendações, cujo conteúdo é mais extenso e detalhado sobre o
tema.
Essa preocupação máxima legislativa cinge em torno de três importantes argumentos, de
cunho notoriamente liberal, sendo a pobreza dos pais que necessitavam dos valores obtidos
mediante o pagamento de seus filhos; a interferência no pátrio poder. Aos pais, cabia decidir
sobre o trabalho de seus filhos e sobretudo, a elevação do preço da mão de obra, diminuindo as
vantagens na concorrência internacional.
Desde a sua criação e até os dias atuais, a OIT adotou, entre convenções e recomendações,
dezessete normas sobre a idade mínima, para o início de trabalho do menor.
Os instrumentos normativos da OIT mostram que a comunidade internacional atribuiu
grande importância a questão do trabalho infantil, visto que são inúmeros temas envolvendo
essa proteção, dentre os quais: trabalho noturno, idade mínima, obrigatoriedade de exames
médicos admissionais e periódicos, peso máximo a ser transportado, escolas técnicas, férias,
entre outros.
Visando implementar seus objetivos, o IPEC procura realizar parcerias e convênios ou alianças
com Organizações de empregadores, de trabalhadores ou mesmo com instituições
educacionais, enfim, procurar por todos os meios, buscar elementos para proteger a criança
contra a exploração do trabalho infantil.
3.1 OUTRAS NORMAS INTERNACIONAIS DE PROTEÇÃO AO TRABALHO INFANTIL
A proteção internacional do trabalho infantil perpassou especialmente pela criação da Liga das
Nações, da Organização das Nações Unidas e pelas Organização Internacional do Trabalho,

94

199
sendo esta última responsável por editar normas versando o trabalho como gênero e o
trabalho infantil como espécie.
Diante o estreitamento de laços entre os países membros, integrantes das Organização das
Nações Unidas (ONU) e Organização Internacional do Trabalho (OIT), sendo o Brasil
integrante de ambas, em dezembro de 1948, foi aprovada a Declaração Universal dos Direitos
Humanos, com a finalidade de proteger os direitos humanos universais, indivisíveis e
independentes, voltados para a dignidade da pessoa humana.
Ao introduzir a concepção contemporânea de direitos humanos, particularmente no tocante
ao artigo XXII, já se enunciava que:
Toda pessoa tem direito ao trabalho, à livre escolha de emprego, a condições justas e
favoráveis de trabalho e à proteção contra o desemprego; direito a igual remuneração por igual
trabalho; direito a uma remuneração justa e satisfatória, que lhe assegurasse uma existência
digna95; direito ao repouso e lazer, inclusive à limitação razoável de horas de trabalho e a férias
remuneradas periódicas96 (ONU, 2011).
A Declaração Universal dos Direitos Humanos, instituída em 1948, constituiu um marco para a
elaboração de normas direcionadas à tutela dos direitos humanos em âmbito doméstico e
internacional, aqui notadamente o Direito do Trabalho e a proteção contra o trabalho infantil,
também considerado fundamento da dignidade da pessoa humana.
Para se ter uma ideia da preocupação com o trabalho infantil, o artigo 32 da Declaração
Universal dos Direitos Humanos determina a responsabilidade dos Estados-membros
protegida contra a exploração econômica e contra o
desempenho de qualquer trabalho que possa ser perigoso ou interferir em educação, ou que

fixação de uma ou mais idades mínimas para admissão nos empregos, horários e condições de
emprego, bem como estabelecimento de penalidades ao seu não cumprimento (ONU, 2011c).
Diante todas essas principais normas de caráter internacional, algumas ratificadas pelos
Estados e outras não; algumas convencionando, outras somente sugerindo o seu cumprimento;
e, algumas, no afã de promover o esforço de construir mecanismos jurídicos de proteção à
infância, outras desconstruindo a própria história tutelar desses indivíduos, resulta evidente
que são instrumentos pertencentes a vários campos do saber, instituindo normas para que os
Estados signatários realizem efetivamente os direitos nelas insculpidos.
Conclusão
Incialmente, sob o prisma das ideias de Zygmunt Bauman, pode-se concluir que vivemos em
um tempo de modernidade líquida, em que o poder econômico busca, ao máximo, o

95
Art. 23, da Declaração dos Direitos Humanos
96
Art. 24, da Declaração dos Direitos Humanos

200
derretimentos dos sólidos, mormente das instituições protetivas dos cidadãos, no intuito de
quebrar as barreiras impeditivas da livre circulação e do domínio econômico. Neste cenário,
há um predomínio do tempo sobre os espaços, ocupados, estes últimos, por apenas simples
momentos. Vivemos em uma sociedade pós-moderna, em que nada tem duração eterna, sendo

No atual cenário, a globalização incentivou, fortaleceu a liquefação das relações, refletindo


diretamente nos princípios basilares do Direito, principalmente, Direito do Trabalho, fazendo
com que as instituições protetivas do trabalhador fiquem à mercê do crescimento econômico.
Nesta seara, o Direito do Trabalho e seus princípios são importantes instrumentos protetivos e
de garantida da segurança jurídica dos trabalhadores, porém vem passando por turbulências
ao tentarem liberar a negociação de direitos clássicos, fundamentais, seguros, por meio de
interesses econômicos.
Outrossim, temos que cada vez mais o Estado vem autorizando o avanço da flexibilização do
Direito do Trabalho, em razão da ausência da sua própria implementação de políticas públicas
de incentivos econômicos, que viabilizem a relação laboral, conjuntamente com as normas
existentes. Portanto, a flexibilização pode ser considerada uma saída do Estado para a redução
das taxas de desemprego, mas às expensas do trabalhador, sendo que, na verdade, se houvesse
uma participação mais efetiva estatal, a flexibilização não teria espaço.
O que podemos constatar na história é que o trabalho das crianças sempre esteve atrelado à
situação econômica de um país e do grupo familiar inseridos. Conseguimos identificar que a
dificuldade econômica tem sido a principal responsável pela exploração de que são vítimas os
menores, desde a primeira infância e nas mais variadas épocas da humanidade.
Vejamos que a proteção à infância obriga que o Estado desenvolva ações governamentais no
sentido de reduzir as causas do trabalho infantil, dentre as quais os altos índices de
concentração de renda e desigualdade social, o número significativo de famílias em condições
de pobreza que tem o trabalho infantil como fonte auxiliar ou primordial de renda, o uso
tradicional da mão de obra infantil na agricultura familiar, doméstico, que permanecem
elevados.
Como apresentado no decorrer de todo o trabalho, a grande parte da incidência de trabalho
infantil não se dá exclusivamente por abuso dos empregadores. As razões se aglutinam num
possível ciclo de consequências. Constata-se a inserção da criança no labor precoce como um
intento da família em dar-lhe condições de inverter um quadro social já amargado pela
geração que lhe pôs em vida, e, também, como uma forma de trazer mais um contribuinte

convívio.
É plenamente identificável que o Estado tem um papel primordial na erradicação do trabalho
infantil, pois quanto maior a ausência estatal nas políticas públicas de enfrentamento da
201
desigualdade social, maior será a participação infantil no mercado de trabalho, em razão da
busca pela sobrevivência através da mão de obra barata ou, até mesmo, sem custo. Sem contar
a crença familiar que o trabalho edifica valores no menor.
Em razão das precárias condições socioeconômicas, é facilmente observada a forma como as
famílias de classes sociais mais baixas tem a percepção sobre os inúmeros percalços que a
sociedade demonstra e a maneira como ela procura agir para minimizar os problemas sociais.
O trabalho deixa de ser visto como algo idealizado para dar lugar ao meio de sobrevivência, à
satisfação de necessidades básicas.
O desenvolvimento do trabalho infantil em situação de exploração, violência, privação de
liberdade ou degradação, traz consequências nefastas que vão além do desgaste físico, visto
que perdem momentos de riso espontâneo, ficando presas nas dores de seu corpo e de sua
alma.
A dignidade da pessoa humana, somada à segurança jurídica, deve ser o alicerce de qualquer
avanço econômico, visto trazem equilíbrio e crescimento das partes envolvidas no processo,
onde podemos dizer que o desenvolvimento vem sendo feito com liberdade. Isto porque a
importância da ética diminuiu com o progresso da economia moderna, na qual as análises
normativas não levam em consideração a influência ética no comportamento humano.
Há várias formas do Estado agir no intuito de alterar a realidade de seu povo, trazendo um
desenvolvimento maduro, com minimização das desigualdades sociais. A maior delas é deixá-
lo participar de sua formação legislativa, ou seja, oportunizar liberdades políticas, civis e
sociais. Quando verificamos a participação do cidadão, através do chamado processo
discursivo (teoria do agir comunicativo) percebemos se tratar de condicionantes factíveis de
uma sociedade livre, estando, pois, configurado o princípio democrático de elaboração do
direito, o que no pensamento insuperável de Habermas, seria o necessário para legitimar um
direito positivo. A Democracia somente seria efetivada com o respeito à autonomia pública e
privada de cada indivíduo, de cada cidadão.
A promoção de uma sociedade igualitária, sem preconceitos, na busca constante pelo combate
à desigualdade social, priorizando a educação, a saúde, o saneamento básico, a segurança
jurídica e patrimonial, devem fazer parte da cultura de um povo e do objetivo Estatal.
O problema do trabalho infantil está atrelado diretamente à questão da liberdade de escolha,
em que as crianças se encontram privadas na exploração de sua mão de obra, por meio de
famílias desfavorecidas ou culturas empresariais e estatais impostas. De acordo com as ideias
de Amartya Sen,as piores violações da norma contra o trabalho infantil provêm da escravidão
em que na prática vivem as crianças e famílias desfavorecidas e do fato delas serem forçadas a
um emprego que as explora (em vez de serem livres e frequentar a escola).
Diante da ausência de condições econômicas necessárias ao sustento básico, famílias contam
com o trabalho infantil na luta pela sobrevivência. Por outro lado, famílias identificam o
trabalho infantil como fator educativo, edificador de valores. Porém, fica claro que ao
202
inserirem o trabalho no menor, estão retirando o seu direito e dever de brincar, de explorar o
mundo infantil, de estudar e estruturar internamente conceitos de formação, onde os reflexos
negativos são nefastos, seja em curto prazo, com enormes possibilidades de acidentes laborais
e, a médio e longo prazo, com ausência de estrutura educacional e formação básica necessária.
É plenamente identificável que os excluídos da sociedade, por meio de uma cultura em que o
desenvolvimento não é realizado com liberdade, utilizam do recurso mais próximo para
minimizar os impactos negativos que sentem, onde o ciclo de exploração e exclusão se
mantém. Há exclusão, pois não estão inseridos nas políticas públicas de inclusão social e há
exploração quando utilizam, desenfreadamente, a mão de obra infantil. Sob o prisma das
afirmações de Boltanski e Chiapello, excluído é aquele cujos elos de ligação com os outros
foram rompidos, o que o levou a ser rejeitado para as margens da rede, onde os seres perdem a
visibilidade, a necessidade e quase a existência. O indivíduo perde a sua conexão, não estando

Entretanto, Amartya Sen deixa claro em suas ideias que a abordagem não ética da economia
tem seu valor, porém ele gostaria de mostrar que a economia, como ela emergiu, pode tornar-
se mais produtiva se der uma atenção maior e mais explicita às considerações éticas que
moldam o comportamento e o juízo humano.
O desenvolvimento requer que se removam as principais formas de privação de liberdade, tais
como carência de oportunidades econômicas, pobreza, ausência de saúde adequada, fatores
estes de primordial importância para a erradicação do trabalho infantil. Apesar de muitos
acreditarem que o trabalho infantil edifica valores, os autores desta prática estão longe das
condições básicas de sustento. A busca pelo trabalho infantil está mais ligada ao fator
econômico que ao desenvolvimento educacional do menor.
É preciso que se oportunize às crianças a possibilidade de viver sua infância, seu momento,
garantindo-lhes um crescimento saudável. Faz necessário criar políticas públicas que
permitam o acesso à novas oportunidades de vida, com educação e lazer, afastando-as da
restrita e penosa dicotomia entre o trabalho e a marginalidade.
Partindo deste pressuposto, as políticas públicas devem ser recriadas buscando aplicar o
processo de isonomia, concedendo oportunidades aos menos favorecidos, a fim de libertá-los
do ciclo de exploração, de busca por satisfação de necessidades. O aumento de redes faz com
que as relações se fortifiquem e o desenvolvimento econômico amadureça, consequentemente,
a busca pelo trabalho infantil não terá sentido, estando fora do contexto de desenvolvimento
como liberdade.
Conclui-se, portanto, que ainda há possibilidade de reverter este jogo, com o claro intuito de
que o desenvolvimento seja com liberdade, com equilíbrio nas relações e respeito aos limites.
O fortalecimento das redes humanas e dos órgãos de representação, através da
conscientização é o caminho para a revalorização do Direito do Trabalho, dos seus Princípios,
em detrimento ao crescimento econômico unilateral desenfreado.

203
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206
A INVISIBILIDADE PERANTE OS MORADORES EM SITUAÇÃO DE RUA.
97

Resumo
O artigo terá como problema de pesquisa as questões afetas às Politicas Sociais Públicas
defendidas pelos Direitos Humanos para a população moradora em situação de rua. Trata-se
de pesquisa bibliográfica, de natureza qualitativa, que visa expor o problema e contribuir para
a construção de soluções. Os Direitos humanos com seus tradados, suas ferramentas de
fiscalização e força normativa em nosso ordenamento jurídico é o melhor aliado daquele que
perante todos é invisível. Ao final espera-se contribuir para o enriquecimento do debate acerca
das Politicas Sociais Públicas voltadas à essa população, bem como demonstrar a
indissociabilidade de uma política moral, humana e ética efetivas.
Palavras-chave: Direitos humanos. Politicas Públicas. Moradores em Situação de Rua.
Invisibilidade.
Abstract
The article will have as a research problem the issues related to Public Social Policies defended
by Human Rights for the homeless population. It is a bibliographical research, of qualitative
nature, that aims to expose the problem and contribute to the construction of solutions.
Human rights with its traditions, its tools of control and normative force in our legal system is
the best ally of the one who before all is invisible. In the end, it is hoped to contribute to the
enrichment of the debate about the Public Social Policies directed to this population, as well as
to demonstrate the indissociability of an effective moral, human and ethical policy.
Keywords: Human rights. Public policy. Residents in the Situation of Street. Invisibility.
INTRODUÇÃO
e praças da

buscará apontar durante o desenvolvimento as politicas sociais públicas envolvendo


moradores em situação de rua. Tais Politicas objetivam retomar o ser cidadão de cada pessoa
que se encontra à margem da sorte e da sociedade.
São incontáveis os desafios enfrentados por aqueles que fazem as estrelas por seu teto,
contudo o, maior entre eles, é o fato de se tornarem invisíveis perante toda a sociedade. Tem-
se por moradores de rua:
Grupo populacional heterogêneo, mas que possui, em comum, a pobreza extrema, os vínculos
familiares interrompidos ou fragilizados e a inexistência de moradia convencional regular, em
função do que as pessoas que o constituem procuram os logradouros públicos (ruas, praças,

97
Graduanda em Direito pelo Centro Universitário Salesiano de São Paulo UNISAL U.E. de Lorena/SP.

207
jardins, canteiros, marquises e baixos de viadutos), as áreas degradadas (dos prédios e
abandonados, ruínas, cemitérios e carcaças de veículos) como espaço de moradia e sustento,
por contingência temporária ou de forma permanente, podendo utilizar albergues para

p.136).
Comumente, também faz-se necessário o conceito de moradia, a partir do tema abordado que
trata daqueles que não há possuem. A moradia é um espaço físico e social, já abordado por F.

garante a inviolabilidade, art. 5°, inciso XI, propiciando uma correspondência entre a
estabilid

A partir dessas definições construiremos um trabalho que tratará das questões destes
conceitos acrescida das politicas sociais públicas defendidas pelos Direitos humanos.
Identificada pelo Movimento Nacional da População de Rua como O.S, já há cinco anos nas
ruas, uma moradora das ruas de Belo Horizonte contradiz a constituição ao nos contar, na

A prática muito se difere da teoria. Por isso o Estado através dos Direitos
Humanos tem a necessidade de intervim e realizar politicas que diminuam o sofrimento de
tais sentimentos presentes nas pessoas que se encontram em tal situação.
A ênfase no Movimento Nacional da População de Rua objetiva a educação que se constrói
dentro da academia universitária afinal a educação é que nos move, e ser movimento é não
estar parado (MPMG, 2010).
1 INTERDISCIPLINARIDADE.
A invisibilidade significa saber que não há percepção alguma sobre você. Ao tratar de um
grupo de pessoas como os moradores em situação de rua não há como não abordar o tema
invisibilidade. A literatura, psicologia e principalmente o direito, mas especificadamente os
Direitos Humanos, são ciências que amparam e produzem sobre o tema. A habitual
convivência social vem se mostrando cada vez mais indiferente e a indiferença esta associada a
insensibilidade, ao desapego e à frieza, características que não combinam com a condição
social que nós, seres humanos, vivemos que faz com que nos relacionemos contra outras
pessoas.
Para se concretizar os direitos e garantias previstas na Constituição da República Federativa
do Brasil de 1988, são necessárias as politicas públicas, que abordem os direitos sociais. Os
Direitos Humanos com os tratados98, convenções, pactos, conferências99, enfim, com a

98
O tratado é um acordo formal: ele se exprime, com precisão, em determinado momento histórico, e seu teor tem
contornos bem definidos. (REZEK 1998, p. 55).

208
amplitude que este possui consegue dar voz àqueles a quem esse dom foi suprimido, dar
publicidade a quem no cotidiano não é visto.
São necessários acordos firmados entre nações para ter força e fazer acontecer na vida de
quem realmente precisa. Os direitos humanos conseguem ir além do tecnicismo do direito
tradicional, consegue enxergar o humano que existe em cada pessoa e entende que o direito
serve à sociedade. A literatura por sua vez sempre alertou dos males, das ruinas, das misérias
da sociedade. Os sentimentos mais sórdidos, aqueles quais todos tentam esconder, são
revelados por ela. Também as mazelas e as misérias a qual todos tentam tornar invisíveis são
por ela desvendada.
Graciliano Ramos em Vidas Secas, Jorge Amado em Capitães de Areia, Aluísio Azevedo em O
Cort
brasileira durante a época em que seus livros foram publicados. Hoje ambos são considerados
obras primas, por tratarem da miséria social, e mesmo décadas depois, seus problemas são
atuais em nossa sociedade.
A mesma invisibilidade dos peregrinos do sertão (RAMOS, 1998), das crianças maltrapilhas
abandonadas à sorte no porto baiano (AMADO, 2009), tal como a comparação com animais
das famílias do subúrbio carioca (AZEVEDO, 2005), só foram retratadas por escritores que
tiveram a sensibilidade de enxergar os invisíveis.

que ficou conhecido nacionalmente. O bicho, escrito em 1948, retrata o problema que

lizar
Não era um gato, Não era um rato. O bicho, meu Deus, era um homem. (BANDEIRA, 2014, p.)
Inúmeros são os motivos que levam uma pessoa a se tornar um morador em situação de rua. A
interdisciplinaridade se faz necessária para constatar, documentar e o mais importante, agir
em favor desta minoria, neste trabalho tratando dos moradores em situação de rua. Essa
interdisciplinaridade resulta da soma de forças com um mesmo objetivo. Não somos bons em
todas as áreas, precisamos uns dos outros. Assim como uma ciência consegue enxergar a outra,
há necessidade também, de um ver o outro, colocando um fim na indiferença que acarreta a
invisibilidade. Que como já citado anteriormente traz inúmeros prejuízos para o ser humano.
2 DIREITOS HUMANOS E OUTROS RAMOS AFETOS AOS DIREITOS DOS MORADORES
EM SITUAÇÃO DE RUA.

99
A análise da experiência convencional brasileira ilustra, quase que à exaustão, as variantes terminológicas de
tratado, concebíveis, compromisso, constituição, contrato, convenção, convênio, declaração, estatuto, memorando,
pacto, protocolo e regulamento (REZEK 1998, p. 55).

209
A ausência ou a insuficiência dos direitos sociais, como, educação, trabalho, saúde, moradia,
alimentação, bem como a existência de circunstâncias sociais que prejudiquem o acesso a
esses direitos e à vida digna, criam sérios obstáculos ao exercício de todos os outros direitos
humanos. Para que não haja violação dos direitos humanos é necessária a adoção de medidas
concretas, planejadas e bem definidas para a realização desses direitos.
Para muitos os direitos humanos são a positivação daquilo que nasce com o indivíduo dos
direitos naturais, que são necessário à sobrevivência. Nas palavras de Hans Kelsen:
Mas, sendo assim, o único a priori admissível é um a priori não estático- como o das categorias
kantianas- mas essencialmente dinâmico: constituído pelas intenções espirituais que estão na
origem da inventiva humana e << cuja unidade viva>>, no dizer de BOIREL, <<forma o Ego
transcendental autêntico>>Aderimos, pois, ao ponto de vista do que alguns chamam
um<<transcendentalismo aberto>>, elemento motor e constituinte de uma <<aprendizagem>>
no decurso da qual ele próprio evoluciona e se redefine. (KELSEN, 2010, p.23).
No texto acima citado o transcendentalismo dos direitos encontra se inerte a todo e a qualquer
ser humano. É algo que se positiva para concretizar aquilo que o nosso próprio ser já considera
como direito, como forma de alcançar a justiça. Kelsen trabalha muito bem, a importância da
técnica dentro do direito, contudo afirma ele, haver direitos transcendentais que mesmo se
não fossem positivados saberíamos de sua existência.
Com base na história, durante a segunda guerra mundial, todos os direitos, aos quais falamos
acima, foram suprimidos. A politica nazista de extermínio perpetrada na Europa e que
culminou na morte de seis milhões de judeus (ROSSIGNOLI, 2013), fez com que a Organização
das Nações Unidas (ONU), tomasse medidas para assegurar e tornar indisponíveis aqueles
direitos fundamentais, principalmente o direito à vida.
Ao passar dos anos a Constituição Federal Brasileira de 1988 como tantas outras adotaram
uma forma de assegurar não apenas a sobrevivência, mas também o direito de viver a vida com
dignidade. Tudo isso derivado dos direitos assegurados a qualquer ser humano.
O Direito pertence à área das humanas, é necessário então ver o ser humano em cada caso,
analisar com particularidade cada um, envolvendo mais que legitimidade, mas também as
emoções e tudo o que possa ser acrescido a um ser humano.
2.1 A SUPREMACIA DOS DIREITOS SOCIAIS.
O artigo 6° da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 elenca de forma genérica
os direitos sociais, vale ressaltar, que este artigo não corresponde a um rol taxativo e sim
exemplificativo. Todos os demais direitos adquiridos por tratados que ampliem as garantias e
o a proteção ao ser humano devem então ser recepcionado pela constituição. O direito a
moradia, educação, alimentação, segurança, saúde são necessário a todos e são garantidos pela
constituição Federal Brasileira de 1988, sendo assim todas as demais leis, como a sociedade,
deve obedecer e toma-los como base para o seu desenvolvimento.

210
Os direitos sociais, como direitos de segunda dimensão, convém relembrar, são aqueles que
exigem do Poder Público uma atenuação positiva, uma forma atuante de Estado na
implementação da igualdade social dos hipossuficientes. São, por esse exato motivo,
conhecidos também como direitos a prestação, ou direitos prestacionais (TAVARES,
2011.p.837).
Infelizmente não é assim que acontece, pois se assim o fosse não haveria uma população com
números elevados em situação de rua. O ministério do Desenvolvimento Social e combate à
Fome da prefeitura de Belo Horizonte, realizou uma pesquisa pela PUC-Minas, INSEA e
Fórum da População de Rua, no seu 2° Censo da População de Rua e Pesquisa Qualitativa, e

de opção,
pois a própria constituição assegura a moradia e o viver com qualidade.
Para serem aprovados os tratados internacionais que versem sobre direitos humanos, com
força normativa de emenda constitucional, os tratados precisam passar, segundo o artigo 5°,
paragrafo 3° da Constituição Federal da República Federativa do Brasil de 1988, por um
quórum de aprovação de três quintos em dois turnos em cada casa do Congresso Nacional
Brasileiro. Essa aprovação tem como finalidade dotar o Brasil de seriedade na seara
internacional e, ainda, na interna (TAVARES, 2009).
Existe a supremacia formal para uma lei se tornar constitucional, mas na realidade, por vezes,
essa mesma supremacia não possui aplicabilidade para as minorias que não encontram nela a
opção contrária as ruas.
3 AS POLITICAS SOCIAIS PÚBLICAS.
A função maior do Estado é proporcionar o bem comum. E para alcançar frutos em diversos
campos o governo utiliza-se das politicas públicas. Sem elas as leis não possuem aplicabilidade
para quem realmente necessita de seus direitos fundamentais garantidos.
Ao faze um retrocesso na história percebe-se, por analogia, o quanto uma lei feita para ajudar
a população, sem sua devida politica pública, acaba não se concretizando com os resultados
pretendidos.
Exemplo histórico disso foi que no dia 13 de maio de 1888, a então Princesa Isabel sancionou a
lei imperial n°3.353 , conhecida como Lei Aurea. Uma lei que aboliu de vez o sistema
escravocrata brasileiro. Essa lei foi um grande passo para o desenvolvimento de suas
liberdades individuais e públicas.
Contudo, existem relatos de ex- escravos que preferiam voltar a servir seus senhores, até então

morar, quando se têm direitos e a quem recorrer em busca da sobrevivência. A lei tinha o
intuito de torná-los livre, mas os deixou a margem da sociedade. Inicia-se então a formação
das comunidades nos subúrbios das cidades grandes, a formação daquilo que hoje é chamado

211
iedade (WWP, 2009). Eram libertos das senzalas direitos para as ruas, sem
comida, sem saber como iriam fazer para garantir sua própria sobrevivência e de seus

aceitava o fato de ter que pagar salários àqueles que até pouco tempo faziam parte de sua
propriedade, com isso contratavam imigrantes e submetiam os negros, agora libertos, à
margem da sorte.
A suprema Constituição prevê moradia, saúde, educação a todos sem extinção, prevê ainda
que perante a lei que todos são iguais (artigo 5º). São palavras encantadoras, todavia, por si só,
não conseguem consolar aquele que sofre.
Para ter direito a concorrer à uma vaga de emprego é necessário um endereço, com um
número identificando a residência, geralmente os locais públicos onde essa parcela da
sociedade vive, não o possui. O governo utiliza das politicas públicas como força de suas mãos,
que materializam aquilo que foi de forma excelente escrita em nossa constituição.

3.1 O QUE É PRECISO PARA CONSTRUIR UMA POLITICA PÚBLICA?


O Estado nas esferas: federal. Estadual e municipal deve coordenar, gerir e programar a
politica pública. Ela deve ser destinada aos interesses de uma coletividade, a qual participa da
elaboração, gestão e controle dessas politica. O Estado deve garantir o financiamento regular
para que seja concretizado. Deve estar regulamentada em lei para que os cidadãos possam
reclamar seus direitos.
As principais etapas da construção de uma Politica Publica, são: (MNPR, 2010, p.22):
1) Identificação do Problema Social e dos Direitos. Pessoas vivendo nas ruas significa a violação
de vários direitos, que exigem formas especificas de ação do Estado.
2) Inserção na Agenda Politica. Identificado o problema, ele deve entrar na pauta de debate e
ação do Estado.
3) Definição das ações. O Estado e os beneficiários da política negociam os serviços
necessários, os princípios e diretrizes, os programas públicos e o financiamento regular.
4) Aprovação legal. É o processo de definição das leis necessárias à politica pública, o que exige
muita negociação com o Executivo e o Legislativo.
5) Implementação. É preciso definir estratégias para garantir a politica.
perfeiçoamento, como
os feitos pelos conselhos ou comitês de acompanhamento.
Segundo as palavras de Samuel Rodrigues, representante do Movimento Nacional da
População de Rua/MG e membro do Conselho Nacional da Assistência Social:

212
Veem em nós apenas objetos, uma espécie de coisa que está ali e que pode ser removida a
qualquer momento para um lado e para outro... por vezes somos alvos de projetos, tratados
como se fôssemos uma ponte ou uma obra qualquer que precisa de licitação, aprovação, entre
outras burocracias (MPMG, 2010, p.25)
3.2 MECANISMOS DE EFETIVAÇÃO DAS POLITICAS PÚBLICAS.
A função de uma politica publica é concretizar um direito. Garantir aos cidadãos a reprodução
da sua vida material, isto é, que todos possam comer se vestir, tenha moradia, estudar, entre
tantas outras garantias fundamentais. Dessa maneira, têm o objetivo de gerar segurança e
bem- estar à pessoa e à sua família. Toda pessoa que está em situação de rua é um cidadão!
Portanto, seus direitos e obrigações estão estabelecidos na Constituição Federal de 1988,
independente da cor, raça, religião, condição social ou econômica (MNPR, 2010, p.11).
4 MOVIMENTO NACIONAL DA POPULAÇÃO DE RUA.
Este movimento é um coletivo de pessoas com interesses comuns, que lutam contra a violação
de seus direitos econômicos, sociais, civis e culturais. É um sujeito coletivo histórico politico.
O Movimento Nacional da População de Rua (MNPR) possui princípios que orientam sua
organização e prática politicas. São eles: democracia, valorização do coletivo, solidariedade,
ética e o trabalho de base. Diante de tantas violações de direitos, o MNPR destaca as seguintes
bandeiras de luta: Resgate da cidadania por meio da informação aos cidadãos que se
encontram em situação de rua.
Muito já se conquistou, mas ainda há muita luta pela frente. A Politica Nacional para a
População em Situação de Rua foi instituída em dezembro de 2009 pelo decreto presidencial
n°7053, durante encontro do então presidente Luiz Inácio Lula da Silva com a população de
rua. Instituiu também o Comitê Inter setorial de Acompanhamento e Monitoramento dessas
politicas.
Como dito nos capítulo anteriores deste trabalho, uma politica para ser realizada é preciso o
projeto estar regulamentado por lei. Por isso usamos a frase muito já se conquistou. Um
primeiro passo já foi dado através do decreto, porém ainda há muito que se conquistar, afinal
decreto não tem a mesma força de lei, não produz os mesmos efeitos, pois seus meios de
criação são diferentes.
4.1 SER MOVIMENTO É NÃO ESTAR PARADO.
Em 2005, no I Encontro Nacional sobre População em Situação de Rua, foram reunidos
representantes do governo municipal, pessoas nessa situação, e membros do Ministério do
Desenvolvimento Social e combate a Fome (MDS), para tratar dos desafios que tal politica
enfrentaria e desenvolver estratégias, para que juntos pudessem traçar o melhor destino para
o Movimento. No ano seguinte foi criado pelo presidente da república um Grupo de Trabalho
Interministerial (GTI), com representantes de seis ministérios, da Secretária Especial de
Direitos Humanos e sociedade civil, com o intuito de abrir um amplo processo de estudo e
elaboração de propostas com a participação social na definição do conteúdo da politica. Em

213
2009, realizou-se o II Encontro Nacional com o objetivo de discutir e consolidar a Politica
Nacional.
Sem pressão essa politica não sairá do papel, e só se consegue um movimento com capacidade
de pressionar quando possui adeptos a ele, e mais, é necessário que todos conheçam seus
utar por uma sociedade melhor, onde a justiça seja aplicada
com equidade e chegue a todos. Todos os indivíduos são constituídos de dignidade. O passo
necessário após a criação de uma política pública é pressionar até que se torne lei, em
especifico a politica trazida nesse trabalho.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A citação da qual trataremos agora explica nas palavras daquele que vive a realidade
apresentada e discutida neste trabalho, de forma que após toda cientificidade das informações
trazidas para este artigo, a comprovação se dá pelo relato:
É o que eu acho que eu faço parte de outra sociedade. Você faz parte de uma, eu faço parte de
outra. Porque agora você vai sair daqui, você vai deitar no seu colchãozinho. Não vai? Não vai
tomar o seu banhinho? Eu não vou p
Água gelada. Certo? Você vive, eu vegeto. Eu estou tentando e é o que acontece com todo
mundo, você tenta se manter vivo. [...] Agora, já, já você vai sair daqui, não vai? Eu vou deitar
ali. Eu faço parte da cidadania? Não, eu sou um número a mais. Eu sou um zero à esquerda.
Porque eu acho que nem no IBGE eu estou passando. Então, é triste. É a realidade, mas é triste.
(MDS, 2005, p.91).
O intuito deste trabalho foi realizar u
citada acima por um de seus cidadãos. As regras dessa sociedade são diferentes, mas assim o
são pela falta de comprometimento das efetivações das leis e politicas governamentais.
Contudo, o que pudemos aferir é que o pior sentimento da população que se encontra em
situação de rua, não são os medos, nem os desconfortos, mas a falta de visibilidade. Uma
sociedade capitalista mais que vender produtos vende a imagem, e a ideia de que o individuo
para ter sucesso e ser feliz precisa ser visto e prestigiado. A propaganda se pauta nessa
premissa. Roupas, emprego, casa, tudo o que se busca de material durante a vida, gira em
ada
um pode realizar dentro de si. Somente assim pode existir uma chama de esperança acesa
àqueles que deixaram de viver e buscam apenas sobreviver junto da sociedade.
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214
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215
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realizados nas cidades de Belo Horizonte (2005), Porto Alegre (2007), Recife (2005) e São
Paulo (2009).

216
O DIREITO AO ESQUECIMENTO: A NECESSIDADE E A IMPORTÂNCIA DE UMA
DISCUSSÃO ACADÊMICA.
100

101

102

Resumo
O Direito ao Esquecimento é, em síntese, o direito a ter informações sobre si esquecidas. O
objetivo do presente estudo é, num mundo cada vez mais interconectado, abrir uma discussão
sobre o Direito ao Esquecimento, para se debater a possibilidade de supressão de conteúdos
sobre pessoas que assim o desejarem. Este direito deve ser resguardado pelos Estados, mas sua
efetivação tem sido relegada às empresas particulares, o que pode causar prejuízos. A União
Europeia considerou o Direito ao Esquecimento um direito à dignidade da pessoa humana, o
que suscita um conflito entre este, em especial o direito à privacidade, e o direito ao acesso à
informação. No Brasil também se discutiu este tópico judicial e extrajudicialmente. A
discussão do Direito ao Esquecimento na internet ainda é uma novidade, mas seu estudo vem
aumentando. O problema central, apesar destes esforços iniciais, reside no fato de existirem
servidores espalhados por diversos países, cada qual com sua legislação. Por isso a importância
de uma discussão internacional sobre o tema, para que sejam delimitados objetivos, exceções e
obrigações relacionadas ao Direito ao Esquecimento em todo o mundo.
Abstract

The objective of the present study is, in an extremely interconnected world, to discuss about
the Right to be Forgotten, debating the possibility of suppressing contents about people that

often left only to private companies to decide upon, which may cause harm. The European
Union considered the Right to be Forgotten a right to the dignity of the human being, which
gives rise to a conflict between it, particularly the right to privacy, and the right of access to
information. In Brazil, this right has also been discussed both judicially and extra judicially.

increased lately. The main problem is that, despite the initial efforts, there are servers spread
acro
the matter internationally, in order to find mutual grounds in objectives, exceptions and
obligations related to the Right to be Forgotten all around the world.

100
Graduando em Direito pelo Centro UNISAL U. E.: Lorena-SP. E-mail: baiel18@gmail.com
101
Graduando em Direito pelo Centro UNISAL U.E.: Lorena-SP.E-mail: renan9088@hotmail.com
Doutora em Direito pela UFSC. Professora e Pesquisadora no Programa de Mestrado em Direito do Centro
102

Unisal U.E. de Lorena (SP). E-mail: patricianbianchi@gmail.com

217
1. INTRODUÇÃO
As novas mídias trouxeram avanço, evolução e diminuíram fronteiras. A internet, em especial,
quebrou paradigmas e praticamente eliminou qualquer espécie de distância. Atualmente é
praticamente impossível um acontecimento não ser noticiado para o mundo inteiro.
Aparelhos celulares tornaram-se máquinas de distribuição de conteúdo ao vivo, canais
pessoais online movimentam milhões de dólares e influenciam milhares de pessoas, as notícias
são consumidas através de uma tela e são compartilhadas em velocidades surpreendentes. Esta
é a cara do mundo digital.
Entretanto, como seres sociais que somos, o surgimento e avanço da internet trouxe consigo
mais do que apenas benesses, fomos invadidos também por diversas situações não tão
positivas. Hackers, roubo de dados pessoais, invasões de sistemas e, principalmente para o que
discutimos aqui, veiculação de notícias falsas ou irrelevantes, as quais são quase impossíveis
de combater e perpetuam-se na rede digital como ervas daninhas em terrenos abandonados.
É daí que surge o instituto conhecido como Direito ao Esquecimento, que significa ver

A internet, contudo, não faz disso uma tarefa fácil e, para piorar, este não é um direito que
pode ou deve ser absoluto, uma vez que é direito inerente a qualquer sociedade o de
informar-se, tanto quanto é direito de um indivíduo a sua privacidade.

ser a postura do direito em relação a novos institutos jurídicos que surgem mais rápido do que
os legisladores são capazes de trabalhar?
No presente artigo procura-se debater a importância do Direito ao Esquecimento e de uma
tutela jurídica sobre o tema, bem como a necessidade de que esta discussão alcance um
cenário global, e não apenas local, dado que a rede mundial de computadores ignorou toda e
qualquer limitação geográfica. Utilizando-se, para isso, de uma análise das legislações,
jurisprudências e estudos acadêmicos existentes sobre o tema.
2. Direito ao Esquecimento: noções GERAIS
O Direito ao Esquecimento consiste em uma pessoa ter fatos vexaminosos ligados a si

mais necessária para o restante da sociedade. Tal direito se faz através da não veiculação
destes fatos novamente pela mídia ou da desindexação de notícias antigas de buscadores, como

rápida da informação cria também outra adversidade: a armazenagem de forma duradoura,


103
. Isto é, o armazenamento em
um caráter quase perpétuo propiciado pela internet faz com que as informações não sejam tão

103
PINHEIRO, Patricia Peck. Direito Digital. 6 ed. rev., atual e ampl. São Paulo: Saraiva, 2016. p. 490.

218
facil -se disponíveis por um período de
tempo quase indefinido e cada vez mais acessível a quem quer que seja, tendo em vista a
globalização veloz do acesso à internet e ao conhecimento crescente das pessoas em lidar com
a ferramenta.
O Direito ao Esquecimento gera, ainda, outro debate acerca do acesso à informação. Tem-se,
desta forma, direitos contrapostos, se por um lado deve-se preservar o direito à privacidade e,
consequentemente, à dignidade, por outro não se pode ignorar o direito de acesso à
informação e à liberdade de expressão por parte dos cidadãos. A União Europeia recentemente
decidiu a respeito do Direito ao Esquecimento, aceitando-o como um direito dos cidadãos à
privacidade quando informações existente
104

inclusive, o papel que a pessoa sobre qual a informação trata tem para o público em geral se é
uma pessoa de interesse público ou não, como políticos e afins , a fim de verificar se trata-se

Outro questionamento que se levanta ao se debater a respeito deste direito é a quem recai a

esta incumbência a serviços particulares, como o Google, muito menos parece seguro
depender única e exclusivamente de uma empresa particular para tal tarefa. Atualmente, na
União Europeia105, esta função tem sido delegada às empresas particulares em detrimento de
órgãos públicos, ainda que esses estejam sujeitos à uma análise posterior pelo Poder Público, o
que tem gerado certo receio a respeito da idoneidade e do interesse, bem como na
concentração excessiva de decisões a respeito de informações pessoais de cidadãos, que uma
organização particular terá ao lidar com os pedidos de Direito ao Esquecimento.
Ademais, mais um problema que advém diz respeito ao caráter cíclico das informações, até
quando uma informação deverá ser esquecida? Indefinidamente? Ou deverá haver um outro
lapso temporal que poderá remover esta informação do rol de informações a serem
esquecidas? Porque se, por exemplo, uma informação a respeito de determinada pessoa que,
até aquele momento, não fazia parte da vida pública, mas posteriormente passa a fazer, seja
por iniciar participação na vida política ou por qualquer outro motivo, foi esquecida, não
significa que esta informação seja irrelevante ad eternum, uma vez que este inicio de
participação na vida pública pode fazer com que esta mesma informação passe a ser relevante
para a sociedade ainda mais do que o direito desta pessoa à privacidade, devendo, assim, ser

104
Disponível em:
<http://ec.europa.eu/justice/data-protection/files/factsheets/factsheet_data_protection_en.pdf>.
105
Ibidem.

219
reindexada e mantida ao alcance, para acesso dos cidadãos. Como regular uma situação como
esta? Deveria haver um novo lapso temporal em que uma reanalise deveria ser feita?106.
Todos estes questionamentos tornam evidente a necessidade de uma discussão acadêmica, que
deve ser feita, inclusive, a nível global, dado o caráter internacional da internet. Parece claro
que os Estados devem preocupar-se com o tema, mas ao mesmo tempo é necessário um
-se à pessoa interessada em
ter sua privacidade preservada, ao invocar o Direito ao Esquecimento, sujeitar-se a um
extenuante procedimento judicial para ver seu desejo satisfeito.
Se, por um lado, o Direito ao Esquecimento na internet é dificultoso dado o caráter cíclico
que as informações têm na rede mundial de computadores, por exemplo com o retorno de
uma informação antiga após certo período como se fosse recente (em especial o caso das
correntes ou dos boatos relacionados a diversos assuntos) por outro, sua garantia parece
coerente com o direito à privacidade, à intimidade e à dignidade da pessoa humana.
Contudo, o direito à informação e à liberdade de expressão, do outro lado da balança, não
podem ser ignorados e também devem ser sopesados quando se discute o direito de um
individuo ao esquecimento. Em uma situação clara de conflito de direitos fundamentais como
esta, será que realmente é sensato delegar a função de analisar e decidir às empresas
particulares? Se sim, deve haver alguma limitação? E, se não, até que ponto os Estados devem
se envolver e de que forma devem fazê-lo?
São estas as questões a serem tratadas a seguir.
3. CONFLITO ENTRE O DIREITO À PRIVACIDADE E O DIREITO AO ACESO À
INFORMAÇÃO
A colisão de normas fundamentais é matéria de intenso debate e difícil decisão, no ramo
teórico beira a impossibilidade de uma conclusão unânime. Embora alguns se sobressaiam aos
demais, como o direito à vida, sem o qual, por obviedade, não se poderia exercer nenhum
outro direito, outros podem variar de valoração de caso a caso, não sendo coerente ou sequer
adequado definir um valor específico a um ou a outro.
Sobre o tema, Gilmar Mendes e Paulo -se em colisão entre
direitos fundamentais quando se identifica conflito decorrente do exercício de direitos
107
, os autores continuam, em relação à uma possível
hierarquização de direitos fundamentais:
Questão embaraçosa refere-se ao direito ou bem que há de prevalecer no caso de colisão
autêntica. Formulada de maneira explícita: quais seriam as possibilidades de solução em caso

106
Blog Harvard, 2014. Righting the right to be forgotten. Disponível em:
<http://blogs.harvard.edu/futureoftheinternet/2014/07/14/righting-the-right-to-be-forgotten/>.
MENDES, Gilmar Ferreira, BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional. 8 ed. rev. e atual.
107

São Paulo: Saraiva, 2013. p. 235.

220
de conflito entre a liberdade de opinião e de comunicação ou a liberdade de expressão artística
(CF, art. 5º, IX)108 e o direito à inviolabilidade da intimidade, da vida privada, da honra e da
imagem (CF, art. 5º, X)? (...)
É possível que uma das fórmulas alvitradas para a solução de eventual conflito passe pela
tentativa de estabelecimento de uma hierarquia entre direitos fundamentais.
Embora não se possa negar que a unidade da Constituição não repugna a identificação de
normas de diferentes pesos numa determinada ordem constitucional, é certo que a fixação de
rigorosa hierarquia entre diferentes direitos acabaria por desnaturá-los por completo,
desfigurando, também, a Constituição como complexo normativo unitário e harmônico. Uma
valoração hierárquica diferenciada de direitos individuais somente é admissível em casos
especialíssimos.109
Assim, percebe-se que a tarefa de definir, em relação ao Direito ao Esquecimento, qual direito
fundamental se sobressai, se o direito à privacidade ou à liberdade de expressão e de
informação, não é somente árduo, mas, também, perigoso.
Não se faz possível e sequer coerente definir de maneira pétrea qual princípio fundamental
seria superior, por esta razão, acertadamente, a Comissão Europeia deixou claro que a situação
-se o que se sobressai naquela situação específica.
Se decidíssemos qual é superior em uma discussão teórica, estar-se-ia sob o risco de atirar ao
esquecimento informações relevantíssimas à população, ou, em contrapartida, de escancarar
indefinidamente erros que não prejudicam mais ninguém além do agente que os cometeu.
Apenas o caso concreto pode nos dar qual direito se sobressai e qual deve ser resguardado em
detrimento do outro, razão pela qual, embora discutamos o tema sob um ponto de vista
teórico, jamais poderemos nos afastar do debate prático que o direito nos proporciona.
Esta é a razão, inclusive, pela qual se traz exemplos a este debate, a fim de lastrear a
ponderação quando diante de casos práticos de conflito entre os direitos em comento. Ou seja,
como já se mencionou, se se tem entre os polos da relação, elevado interesse público, como
quando se tratar de pessoa pública, seja político ou alguém envolvido com diversas pessoas, o
direito à privacidade deste individuo possivelmente terá valor menor em relevância do que o
direito à informação da sociedade. Contudo, mesmo isso não é absoluto, afinal, quando se está
diante de uma pessoa pública que quer ver uma informação sobre imagens íntimas suas que
vieram à público quando era mais jovem, não haveria qualquer sentido em preponderarmos o
direito à informação no presente caso. Qual a relevância desta informação à sociedade?
Nenhuma. Agora, qual a relevância de protegermos a privacidade desta pessoa, ainda que
pública, nesta situação? Completa.
É exatamente este, inclusive, o entendimento da Suprema Corte brasileira:

108
Trata-se aqui da Constituição Federal Brasileira.
109
MENDES, Gilmar Ferreira, BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. ob. cit. p. 237.

221
No que se refere à tensão entre a liberdade de expressão e de crítica e o direito à honra e à
intimidade, existe, no Supremo Tribunal Federal, precedente que reconhece a possibilidade de
diferenciações, consideradas as diferentes situações desempenhadas pelos eventuais
envolvidos. Assim, admite-se, tal como na jurisprudência de outros países, que se estabeleçam
critérios diversos para a aferição de possível lesão à honra tendo em vista a maior ou a menor
exposição pública das pessoas.110
Ou seja, como já citado, nem o direito à privacidade, no excerto melhor exposto como direito à
honra, é supremo, nem o direito à liberdade de acesso à informação o é. Ambos devem ser
analisados à luz situações concretas, capazes de demonstrar qual prevalecerá sobre o outro em
virtude tanto da exposição pública das pessoas do caso, como da informação ali discutida. A
obra citada traz, ainda, citação ao julgado no Habeas Corpus nº 78.426:
Crime contra a honra e a vida política. É certo que, ao decidir-se pela militância política, o
homem público aceita a inevitável ampliação do que a doutrina italiana costuma chamar a
zona di iluminabilità, resignando-se a uma maior exposição de sua vida e de sua personalidade
aos comentários e à valoração do público, em particular, dos seus adversários; mas a tolerância
com a liberdade de crítica ao homem público há de ser menor, quando, ainda que situado no
campo da vida pública, do militante político, o libelo do adversário ultrapasse a linha dos
juízos desprimorosos para a imputação de fatos mais ou menos concretos, sobretudo se
invadem ou tangenciam a esfera da criminalidade: por isso, em tese, pode caracterizar o delito
contra a honra (...).111
Toma-se a liberdade, em relação ao julgado citado, de inserirmos a possibilidade do Direito ao
Esquecimento. Por tratar-se de decisão antiga, de 1999, o termo e a discussão deste direito não
estavam em voga, mas entende-se plenamente possível e plausível sua anexação a este direito
à honra mencionado, uma vez que similares na espécie.
O Ministro Gilmar Mendes e Paulo Gustavo Branco, seguem, em análise da citada decisão,
versando que:
Vê-se aqui que também o Supremo Tribunal Federal define tópicos (topoi) que hão de balizar o
complexo de ponderação, fixando-se que os homens públicos estão submetidos a exposição de
sua vida e de sua personalidade e, por conseguinte, estão obrigados a tolerar críticas que, para
o homem comum, poderiam significar uma séria lesão à honra. Todavia, essa orientação,
segundo o Supremo Tribunal Federal, não outorga ao crítico um bill de indenidade,
especialmente quando imputa a alguém a prática de atos concretos que resvalam para o
âmbito da criminalidade.
(...)

110
MENDES, Gilmar Ferreira, BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. ob. cit. p. 249.
111
HC 78.426, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, julgado em 06 de março de 1999, 1ª Turma, DJ de 7 de maio de 1999.

222
De ver-se, portanto, que a solução para a colisão entre direitos fundamentais dar-se-á à luz da
situação concreta trazida ao Tribunal.112
Assim, evidente que há necessidade de análise concreta para eventual ponderação entre os
direitos conflitantes. Sendo, por isso, impossível falar-se em hierarquização em sentido teórico
destes princípios.
Destarte, retoma-se questionamentos já trazidos anteriormente, mas que agora, com maior
sustentação, passamos a realizar, uma vez que apenas a presença de casos práticos nos
permitiria indagar qual direito sobressai em relação a outro, até que ponto os Estados devem
se envolver, ou se abster, e de que forma devem fazê-lo? Será que é mesmo sensato e correto
deixar toda esta análise à iniciativa privada?
4. A IMPORTÂNCIA DE UMA POSTURA ESTATAL
Ante o que já foi apresentado, e questionado, acredita-se que os Estados devem sim tomar uma
posição, sem, contudo, impor-se de maneira excessiva que possa limitar o avanço e as
liberdades que advieram com a internet. Ou seja, deve haver uma parceria entre as empresas
particulares e o Poder Público no que se refere ao tratamento do Direito ao Esquecimento.
Globalmente tem avançado a tutela jurídica sobre o tema, em especial na Europa, que decidiu
sobre o assunto em 2012. Entretanto, dada a velocidade que a internet possui, os avanços dos
Estados encontram-se lentos no tratamento do assunto, sendo que muitos não possuem
qualquer legislação sobre ele.
No Brasil a primeira orientação jurídica sobre o Direito ao Esquecimento veio com o
idade da

fundamentando no artigo 11 do Código Civil Brasileiro, e sustentando a seguinte justificativa:


Os danos provocados pelas novas tecnologias de informação vêm-se acumulando nos dias
atuais. O direito ao esquecimento tem sua origem histórica no campo das condenações
criminais. Surge como parcela importante do direito do ex-detento ressocialização. Não
atribui a ninguém o direito de apagar fatos ou reescrever a própria história, mas apenas
assegura a possibilidade de discutir o uso que dado aos fatos pretéritos, mais
especificamente o modo e a finalidade com que são lembrados.113
No restante do mundo, em igual forma, o Direito ao Esquecimento ainda não possui um
tratamento em evidência. São poucos os países que já legislaram sobre o assunto, restando, em
geral, apenas decisões dos tribunais sobre o tema, uma vez que a provocação com casos
concretos é mais comum, dado que a velocidade de transformação da sociedade é
imensamente superior à legislativa.

112
MENDES, Gilmar Ferreira, BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. ob. cit. p. 249-250.
113
Justificativa do Enunciado 531 da VI Jornada de Direito Civil do Conselho da Justiça Federal Brasileira.

223
Como exemplo podemos citar o Chile, no qual o Direito ao Esquecimento surge, também como
no Brasil, como um direito de ex-detentos à ressocialização. Não se fala, ainda, em Direito ao
Esquecimento no aspecto digital, ou de uma forma mais ampla, estendendo-se às situações
mais cotidianas. Apesar de existirem esparsas e raras legislações sobre o tema.
A Europa é, como já mencionado, o principal cenário do debate, mas mesmo lá existem países
que ainda não se mobilizaram para discutir e legislar acerca do assunto.
Apesar de existir quem acuse o Direito ao Esquecimento como uma forma de censura 114,
acredita-se ser importante uma definição legislativa sobre o tema, a fim de se evitar eventuais
abusos e contradições. Inclusive a fim de evitar que seja usado como forma de censura,
cerceando o acesso da população à informações imprescindíveis ao debate democrático. Neste
sentido, Patricia Peck Pinheiro assevera:

em plena era da informação, um dos direitos do indivíduo seria o de justamente deixar com
que um determinado fato ficasse no passado! Isso porque, em casos excepcionais, este
ociedade.115
A atuação estatal possui, ainda, relevante importância quando verifica-se que, atualmente, a
maior parte da análise sobre os pedidos de Direito ao Esquecimento são direcionados às
empresas privadas, como o Google, sendo que o procedimento para apuração do caso e a
decisão de remoção ou não do conteúdo acabam competindo única e exclusivamente a estas
empresas, sem qualquer participação estatal. Isto é perigoso e passível de gerar imensa
instabilidade. Pense-se, por exemplo, uma situação em que o Google decida remover um
conteúdo que era considerado relevante à população, mas, por interesses particulares desta
empresa, percebeu-se melhor a sua desindexação do buscador.
Há visível prejuízo à sociedade que, aliado à ausência de verificação estatal, possivelmente não
será descoberto. Quando verifica-se o inverso, ou seja, a negação do Direito ao Esquecimento
por parte da empresa particular, há, ao menos, a possibilidade de nos socorrermos ao
judiciário, o que poderia sanar eventual arbitrariedade lesiva ao indivíduo. Contudo, como
exposto, o mesmo não se pode dizer da informação desindexada indevidamente, que pode,
muitas vezes, sequer ser percebida, tornando-
indevida.
É por esta razão que acreditamos relevante e imprescindível uma atuação estatal, legislando
sobre o tema e atuando diretamente em sua execução, a fim de evitar censuras e
arbitrariedades indevidas. Ressaltamos, porém, que esta atuação governamental não deve, em

114
Folha de São Paulo. Reportagem publicada originalmente em 07 de agosto de 2016. Disponível em
<http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2016/08/1799831-direito-ao-esquecimento-nao-existe-e-e-usado-para-
censura-afirma-advogada.shtml>.
115
PINHEIRO, Patricia Peck. ob. cit. p. 493.

224
hipótese alguma, ser feita de forma a burocratizar excessivamente o instituto, sob pena de
contribuir à não aplicação do direito, e não o contrário, que é o que se busca. A internet é uma
ferramenta ágil e assim deve ser mantida, razão pela qual ao buscarmos uma atuação estatal,
esta deve acompanhar essa agilidade da vida online, e não o contrário.
5. A NECESSIDADE DE UM DEBATE ACADÊMICO INTERNACIONAL
O Direito ao Esquecimento na internet é um debate extremamente atual, o ramo de Direito
Digital é inovador, a rede mundial de computadores tem crescido em estonteante velocidade,
por esta razão acreditamos que a academia precisa se debruçar sobre o assunto e discuti-lo.

tornar um tópico que será estudado e analisado perante os novos conceitos e problemáticas
116

Mas não basta apenas um estudo sobre o tema, é necessário que este seja internacional. O
Direito Digital enquadra-se como um direito difuso e coletivo, como tal, por si só, já ensejaria
um debate menos local. Contudo, quando se trata de internet, este debate toma proporções
ainda maiores e deve ser internacional. Não é incomum acessarmos sites que se encontram
hospedados em diversos locais do mundo. Operações em defesa de Direitos Autorais, por
exemplo, já foram deflagradas nos Estados Unidos em parceria com os mais diversos países, a
fim de derrubar sites que compartilhassem conteúdo de maneira ilegal hospedados em locais
que não erram territórios norte-americanos. Entre os quais destacamos o ocorrido em 2012,
quando o FBI, em parceria com o governo da Nova Zelândia e da Austrália, derrubou um
portal de compartilhamento de mídias denominado Megaupload117.
Além da hospedagem, diversos serviços também são de diversos locais do mundo, alguns sem
qualquer representação no país em que estão atuando. É o caso do WhatsApp, que embora seja
atualmente de propriedade do Facebook, não possui representação no Brasil, mas, ainda assim,
é o serviço de mensagens instantâneas mais utilizado no país. Fato que, inclusive, gerou
imenso debate quando o serviço foi temporariamente bloqueado em terras brasileiras.
Por estas razões, o debate acerca do Direito ao Esquecimento, e do Direito Digital como um
todo, não podem se limitar a países específicos, devendo ser discutidos em âmbito global, a fim
de que acordos internacionais sejam firmados e os países possam comunicar-se de maneira
adequado no tratamento ao tema. Com o fito, inclusive, de evitar que tratamentos desiguais
sejam dados ao assunto, uma vez que a noção de privacidade e de acesso à informação podem
variar de local para local, o que muitas vezes ocorre, se verificarmos que na China, por
exemplo, diversos serviços e sites são bloqueados.
6. CONCLUSÃO

116
PINHEIRO, Patricia Peck. ob. cit. p. 492.
117
Tecnoblog. Megaupload é desativado depois de operação do FBI. Disponível em
<https://tecnoblog.net/88862/megaupload-desativado-fbi/>.

225
A internet é um retrato da liberdade, da agilidade e da colaboração. Serviços como o
Wikipedia, onde milhões de pessoas podem colaborar para trazer informações das mais
diversas a todos os internautas, são a prova viva destes três institutos. Ele é um retrato da
internet, embora seja bastante criticado para uso em meios acadêmicos, a revolução que este
serviço trouxe é inegável e ilustra muito bem o que representa a rede mundial de
computadores.
Mas excesso de liberdade e agilidade também geram problemas. Muitas pessoas, valendo-se de

discursos de ódio, mas também notícias falsas. Pior é quando a própria imprensa propaga estas
notícias falsas. Ou quando, ainda que verídicas, as informações ali veiculadas tornam-se
irrelevantes ou insignificantes, continuando, entretanto, a assombrar as pessoas sobre a qual
falam.
O Direito ao Esquecimento na internet surge como uma ferramenta para evitar estas
arbitrariedades e essa eternização de informações. Mas não podem ser geridos dando
possibilidades à outras arbitrariedades. É preciso que os Estados se movimentem e tutelem
este direito, colocando restrições e parâmetros a serem adotados quando de sua utilização.
O Direito ao Esquecimento não pode ser absoluto, pois acarreta conflito de normas
fundamentais, a privacidade e a liberdade de expressão e de informação. É somente diante de
casos concretos que somos capazes de sopesar os institutos e verificar qual deve superar o
outro. Mas é inegável que os governos não podem se manter inertes e esperar que apenas o
judiciário ou empresas particulares cuidem da efetivação do direito a ser esquecido. Este
não deve ser um papel exclusivo do judiciário ou de empresas particulares. O direito é mais do
que decisões jurídicas, ele é uma ferramenta de pacificação social e não pode ser relegado ao
campo do ativismo, sujeito a arbitrariedades, que por sua vez geram insegurança. É por esta
razão que leis são necessárias, discussões acadêmicas são necessárias e regulamentações são
necessárias.
Entendemos, ainda, que o Estado precisa entender o seu papel, mas não pode, com isso, querer
que a internet o acompanhe, ou seja, não pode burocratizar e tornar lento o processo. É
preciso que ocorra o contrário e ele torne-se mais célere, a fim de acompanhar e tutelar de
maneira adequada o mundo digital em toda sua integralidade e peculiaridades.
Por fim, a internet destruiu as barreiras físicas, as limitações geográficas e as fronteiras
artificiais. Unindo o mundo como uma grande e única massa. É possível morar em um país

por si só, demonstra a importância de que o debate acerca da internet e do direito digital,
como um todo, bem como do Direito ao Esquecimento, em particular, devam ser globais,
internacionais, pois só assim será possível tutelar de maneira adequada tanto um, quanto o
outro.

226
A sociedade humana passou, e passará, certamente, por diversas revoluções em sua história. É
inegável que a internet é uma delas. Mas é preciso cuidado e especial atenção, a fim de que
esta revolução não seja atrasada ou prejudicada pela ineficiência e lentidão de Estados, ao
mesmo tempo em que estes não podem se manter omissos e ignorar seu papel e importância
em lidar com os temas que esta revolução trazem, a fim de guiar os cidadãos sob sua guarda de
maneira ideal durante esta mudança gigantesca de paradigma.
Referências bibliográficas
MENDES, Gilmar Ferreira, BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional. 8
ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2013.
PINHEIRO, Patricia Peck. Direito Digital. 6 ed. rev., atual e ampl. São Paulo: Saraiva, 2016.
Blog Harvard, 2014. Disponível em:
<http://blogs.harvard.edu/futureoftheinternet/2014/07/14/righting-the-right-to-be-forgotten/>.

<http://ec.europa.eu/justice/data-
protection/files/factsheets/factsheet_data_protection_en.pdf>.
Folha de São Paulo. Reportagem publicada originalmente em 07 de agosto de 2016. Disponível
em <http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2016/08/1799831-direito-ao-esquecimento-nao-
existe-e-e-usado-para-censura-afirma-advogada.shtml>.
Tecnoblog. Disponível em <https://tecnoblog.net/88862/megaupload-desativado-fbi/>.
Wikipedia. Disponível em <https://www.wikipedia.org>.

227
O PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA COMO MANDADO DE
OTIMIZAÇÃO DOS INSTRUMENTOS AMBIENTAIS DE INCENTIVO À PROTEÇÃO.
118

119

Resumo
Os direitos humanos estão sendo discutido de todas as formas para encontrar um ponto de
equilíbrio entre o desenvolvimento e sua aplicação na efetividade de uma sadia qualidade de
vida. A dignidade da pessoa humana é verificada, primordialmente, a partir de uma
necessidade extremada de vislumbrar-se garantida a estabilidade socioambiental, portanto,
nas intervenções públicas. Revela-se, dessa forma, como um segmento que orienta na
interpretação e efetiva aplicação dos demais direitos e garantias fundamentais das políticas
públicas ambientais. Assim, a dignidade da pessoa humana é efetivamente, uma qualidade
inerente ao próprio ser humano, sendo, portanto, irrenunciável e indisponível. Entretanto,
necessário se faz resguardar o meio ambiente para que tenha se vida com dignidade. Existem
princípios mestres, balizadores de todo ordenamento ambiental, procurando harmonicamente
sua aplicação de forma autônoma e independe. Apesar de ser bem novo o ramo ambiental em
relação ao ramo jurídico, o Direito Ambiental já conta com princípios específicos que o
diferenciam dos demais ramos do Direito. O princípio do desenvolvimento sustentável emerge
na teoria tridimensional, nacional e internacional, com a finalidade a compatibilização do
desenvolvimento econômico, social e do meio ambiente, sendo uma das tarefas mais difíceis,
para que se mantenha o meio ambiente para a sobrevivência humana. A intervenção do Estado
na simbiose do Direito Econômico com Direito Ambiental é feita por meio das políticas
públicas que asseguram o planejamento e a organização para alcançar suas finalidades, como
uma qualidade de vida a toda sociedade e seu desenvolvimento econômico sustentável. O
universo dos direitos humanos, e se associa de modo adequado ao contexto mais amplo das
relações entre os direitos humanos, a democracia e o desenvolvimento sustentável. Assim, não
se implanta uma política ambiental que não tenha como finalidade o desenvolvimento
sustentável que contempla os aspectos sociais, ambientais e econômicos, financeiros e
ideológicos. Todos os aspectos são orientados e interpretados à luz do princípio da dignidade
humana. A pesquisa se deu pelo método dedutivo, correspondendo à extração discursiva do
conhecimento a partir de premissas gerais aplicáveis a hipóteses concretas. Logo em seguida

Graduada em Direito pela Universidade Federal de Uberlândia, especialização em Direito Processual Penal
118

Constitucional pela Escola Paulista de Magistratura, Mestre em Direitos Coletivos e Função Social do Direito pela
Universidade de Ribeirão Preto, doutora em Direitos Coletivos pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.
(Endereço eletrônico: damoraes@hotmail.com)
Professora da Universidade Federal de Rondônia - Unir- Doutora em Direito pela PUC-SP Mestre em Direito
119

Econômico pela Universidade de Marília. Especialista em Direito Ambiental pela Universidade Cândido Mendes.
Membro do Grupo de Pesquisa Cejam/ Unir. (Endereço eletrônico: tbmaga2@yahoo.com.br)

228
foi utilizado o método indutivo, para que, com base em fatos particulares, fossem formuladas
as conclusões gerais.
Palavras-chave: Princípio da dignidade da pessoa humana; desenvolvimento sustentável,
instrumentos ambientais.
1.MANDADO DE OTIMIZAÇÃO PRINCÍPIO DA DIGNIDDE DA PESSOA HUMANA
As transformações sociais ocorridas nas sociedades atingem diretamente o Direito, isto é,
quaisquer mudanças de comportamento, de pensamento influenciam o mundo jurídico.
Tratar de um assunto tão relevante, como o é os direitos humanos, não é tarefa fácil, tendo em
vista suas inúmeras implicações no cotidiano das pessoas, além de que os direitos humanos se
relacionam de forma direita com a dignidade da pessoa humana.
A Declaração Universal dos Direitos Humanos, adotada e, proclamada pela resolução 217 A
(III) da Assembléia Geral da Organização das Nações Unidas, de 10 de dezembro de 1948,
protege e asseguram direitos a todos os seres humanos, sem distinção de qualquer espécie, seja
de raça, cor, sexo, língua, religião, opinião política ou de outra natureza, origem nacional ou
social, riqueza, nascimento, ou qualquer outra condição, em face de que o reconhecimento da
dignidade inerente a todos os membros da família humana e dos seus direitos iguais e
inalienáveis é o fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo.
Assim, pode-se considerar o princípio da dignidade da pessoa humana, como um
metaprincípio; estes como modais deônticos, dentro da Constituição Federal brasileira.
Mudanças no âmbito da estrutura do Estado, dos modelos econômicos liberais, sociais e
neoliberais contribuíram decisivamente para a busca de um desenvolvimento econômico que
visasse de forma mínima à preservação do princípio da dignidade da pessoa humana.
Desse modo, foram criadas ideologias de intervenção do Estado, visando a preservação dos
princípios constitucionais econômicos e ambientais, em busca de efetivar-se o Estado
Democrático de Direito e a República Federativa do Brasil.
Tendo em vista a busca pelo crescimento econômico de modelo capitalista não
intervencionista, gerou-se um desenfreado aumento da degradação ambiental, isto é, pregou-
se uma economia que visava somente o lucro, mesmo que de forma canibalesca, esquecendo-
se de preservar os direitos sociais dos indivíduos, bem como o meio em que os seres humanos
se desenvolvem.
A Constituição da República Federativa do Brasil estabelece, nos Arts. 3º e 4º os objetivos
fundamentais da ordem constitucional, sendo eles:
Art. 3º. Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:
I- construir uma sociedade livre, justa e solidária;
II garantir o desenvolvimento nacional;

229
III erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais;
IV promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer
outras formas de discriminação.
Art. 4º. A República Federativa do Brasil buscará a integração econômica, política, social e
cultural dos povos da América Latina, visando à formação de uma comunidade latino-
americana de nações. 120
Veja-se que a República brasileira objetiva a construção de uma sociedade livre, justa, solidária
e igualitária, pois com a igualdade conseguirá obter a erradicação da pobreza e a redução das
desigualdades sociais, além de conseguir a promoção do bem para todos. E, ao alcançar esses
pontos conseguirá obter uma dignidade plena para todos os indivíduos.
A Constituição da República do Brasil trouxe, como valor fundante, o princípio da dignidade
da pessoa humana, sendo, portanto, princípio regulador de toda a ordem jurídica.
A Constituição brasileira apresenta os direitos e garantias individuais no artigo 5º,
demonstrando que são direitos auto-aplicáveis, constituindo-se em cláusulas pétreas121. A
Carta Política brasileira está baseada na soberania, na dignidade da pessoa humana, nos
valores sociais do trabalho, na livre iniciativa e no pluralismo político, sob um Estado
Democrático de Direito. (art. 1º - I a V) Preceitua também, no que se refere às relações
internacionais, ao princípio da integração econômica, política, social e cultural entre os povos
da América Latina (Art. 4º - Parágrafo Único)
A Constituição brasileira enuncia que os direitos e garantias, nela protegidos não excluem
outros provenientes de tratados internacionais de que o Brasil seja parte, e que as normas
definidoras desses direitos e garantias fundamentais têm efeito direto.
O princípio da dignidade da pessoa humana encontra-se assentado em vários artigos, no
decorrer de todo Texto Constitucional, demonstrando que o Poder Constituinte, voltado para
os valores trazidos do seio da sociedade, já que afinal, o legislador representa o povo, por meio
do sufrágio universal, interagindo com essa sociedade, contribui para a constante manutenção
do sistema jurídico, aberto e sempre pronto para receber os valores sociais, transformando-os
em regras e princípios.
A dignidade da pessoa humana é verificada, primordialmente, a partir de uma necessidade
extremada de vislumbrar-se garantida a estabilidade social e a confiabilidade, portanto, nas
instituições públicas. Revela-se, dessa forma, como um segmento que orienta na interpretação
e efetiva aplicação dos demais direitos e garantias fundamentais.

120
BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil, 1988.
O artigo 60, parágrafo 4º da Constituição Federal enaltece, entre outros dispositivos, que os direitos e garantias
121

constitucionais não podem ser alterados por Emenda Constitucional.

230
A dignidade da pessoa humana é uma qualidade intrínseca e inerente do ser humano, sendo,
portanto, irrenunciável e inalienável, na medida em que constitui elemento que qualifica a
própria pessoa humana. Sendo assim, não há como a pessoa se desfazer dessa qualidade, em
face de ser a mesma a ela intrínseca.
Ingo Wolfgang Sarlet também se filia ao entendimento que a dignidade seja inerente ao ser
humano, dissociado, portanto, das ocorrências externas.
Além disso, como já visto, não se deve olvidar que a dignidade independe das circunstâncias
concretas, sendo algo inerente a toda e qualquer pessoa humana, de sorte que todos mesmo o
maior dos criminosos são iguais em dignidade. Aliás, não é outro o entendimento que subjaz

nascem livres e ig
agir uns para com os outros em espírito e fraternidade122. (grifo do autor).
Há, ainda, o entendimento de que a dignidade da pessoa humana não seja considerada
somente como algo inerente à ela, em face da existência de um sentido cultural, por ser
decorrência do trabalho de diversas gerações, sendo assim, pertencente à humanidade como
um todo. Em face desse entendimento, a dignidade da pessoa humana passa a ser
simultaneamente o limite e a obrigação dos Estados.
Em relação à dignidade, pode-se afirmar que é algo que pertence a cada um, não podendo,
portanto ser transferido, ser doado etc., pois se assim o fosse deixaria de existir, não havendo,
desse modo, qualquer limite a ser respeitado. Além disso, como obrigação tem-se que ao
Estado somente é permitido seguir, desde que não desrespeite o princípio da dignidade da
pessoa humana.
Outro ponto de destaque, é que a dignidade da pessoa humana, deve ser averiguada, de forma
concreta, dentro do contexto social em que o indivíduo está inserido, posto que este não vive
isolado, como traz Rizzato Nunes:
[...] acontece que nenhum indivíduo é isolado. Ele nasce, cresce e vive no meio social. E aí,
nesse contexto, sua dignidade ganha ou como veremos, tem o direito de ganhar um
acréscimo de dignidade. Ele nasce com integridade física e psíquica, mas chega um momento
de seu desenvolvimento que seu pensamento tem de ser respeitado, suas ações e seu
comportamento isto é, sua liberdade -, sua imagem, sua intimidade, sua consciência
religiosa, científica, espiritual etc., tudo compõe sua dignidade123.
Vicente Greco Filho eleva a dignidade; o valor da pessoa humana, como fundamento do
próprio Direito, apontando a importância do conteúdo valorativo
as consagrações constitucionais dos direitos individuais supõem a existência de alguns direitos
básicos da pessoa humana, os quais pairam, inclusive acima do Estado, porquanto este tem

122
SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais. Porto Alegre: Advogado, 1998, p.104.
123
NUNES, Rizzato. O Princípio constitucional da dignidade da pessoa humana. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 49.

231
como um de seus fins principais a garant
talvez cronologicamente coincida com o homem e a sociedade, mas não pode ser entendido
senão em função da realização de valores, no centro dos quais se encontra o valor da pessoa
124
, até porque a ordem jurídica não teria sentido algum se não tivesse como
finalidade a realização dos referidos valores.
Assim, a dignidade da pessoa humana é efetivamente, uma qualidade inerente ao próprio ser
humano, sendo, portanto, irrenunciável e indisponível. A Constituição Federal, ao trazer este
princípio como fundamento da República o eleva à categoria de meta-princípio; de vértice
constitucional, que não pode, portanto ser infringido. A universalização da dignidade leva a
todos os indivíduos (sem distinção), a garantia de que deverão receber de todos (inclusive do
próprio Estado), o tratamento condizente com a sua qualidade de ser humano, já que todos
são, segundo o Texto Constitucional, iguais perante a lei.
A dignidade deve ser considerada em sua universalidade, pois todos são iguais em direito
(como se verifica da Declaração Universal dos Direitos Humanos) não devendo deixar de levar

ação humana pelo fato de sermos os mesmo, isto é, humanos, sem que ninguém seja
125

Para, que se possa compreender, efetivamente e, facilmente, o que seriam os direitos humanos,
é suficiente mencionar que tais direitos correspondem a necessidades essenciais da pessoa
humana. Trata-se daquelas necessidades que são iguais para todas as pessoas e que, portanto,
devem ser atendidas para que a pessoa possa viver com dignidade. Dessa maneira, tem-se
como exemplo principal, que a vida é um direito humano fundamental, porque sem ela a
pessoa não existe. E, por tal fato, a preservação da vida é uma necessidade de todos as seres
humanos. É claro, todavia, que a vida não é o único direito fundamental, podendo citar, ainda,
outras necessidades essenciais (para que a pessoa viva com dignidade), como a alimentação, a
saúde, a moradia, a educação, por exemplo. 126
Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery, ao comentarem o referido Art. 1º, no
tocante à dignidade da pessoa humana, apontam que este princípio é fundamento axiológico
do próprio Direito, sendo primordial a proteção do ser humano, o qual é sujeito e, nunca
objeto de Direito. Trazem, como embasamento para a análise, trechos de outros autores, como
do Papa João Paulo II; tendo apontado que:
Os valores fundamentais encartados na estrutura político-jurídica da Carta Magna, refletem-se
em princípios gerais de direito quando informam seus elementos e privilegiam a realidade

124
GRECO FILHO, Vicente. Direito processual civil brasileiro. 17. ed., atual., São Paulo: Saraiva, 2003, p. 16.
125
ARENDT, Hannah. A condição humana. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2002, p. 16.
126
O que são Direitos humanos? Direitos Humanos: Noção e significado. disponível em:
<http://www.ceut.com.br/mandacaru/O%20QUE%20SAO%20DIREITOS%20HUMANOS%20%20Dalmo%20Dallari
.doc> Acesso em: 02.08.2006.

232
fundamental do fenômeno jurídico que é a consideração primordial e fundamental de que o
homem é sujeito de direito e, nunca, objeto de direito. Esse reconhecimento principiológico se
alicerça em valor fundamental para o exercício de qualquer elaboração jurídica; está no cerne
daquilo que a Ciência do Direito experimentou de mais especial; está naquilo que o
conhecimento jus-filosófico buscou com mais entusiasmo e vitalidade: é a mais importante
consideração jus-filosófica do conhecimento científico do Direito. É o fundamento axiológico
do Direito; é a razão de ser da proteção fundamental da pessoa e, por conseguinte, da
humanidade do ser e da responsabilidade que cada homem tem pelo outro (João Paulo II,
Evangelium Vitae, Edições Paulinas, 1995, p. 22). Por isso se diz que a justiça como valor é o
núcleo central da axiologia jurídica (Antonio Hernandes Gil, Conceptos Jurídicos
Fundamentales, Obras Completas, v. I, Madrid, Escalpa Calpe, 1987, p. 44) e a marca desse
valor fundamental de justiça o homem, princípio de razão de todo o Direito.127 (grifo do autor)
Ressaltam, ainda, referidos autores que o princípio da dignidade da pessoa humana é o
princípio fundamental do Direito, sendo o mais importante; o primeiro. Esse princípio é a
razão de ser do próprio Direito, sendo que se bastaria para organizar de forma estruturada
todo o ordenamento jurídico. Além disso, ao se comprometer com a dignidade da pessoa
humana, o Estado brasileiro se compromete também, com a vida e com a liberdade de todo
ser.
Isso se justifica porque os direitos humanos se desdobram na sua conceituação e magnitude,
como se verifica com os direitos individuais, sociais, coletivos e difusos; e, primordialmente, se

de governo, ideologias e teorias econômicas. Situam- 128

Assim, é papel do Estado, como um todo, orientar-se de modo a preservar a dignidade do


indivíduo, assim como, a dar condições para que a dignidade possa ser efetivada. A dignidade
encontra-se emoldurada pelo senso de justiça, devendo, portanto, ser sempre adotada pelo
operador do direito.
José Afonso da Silva pondera que a dignidade da pessoa humana encontra-se arraigada no seio
da sociedade, sendo que, portanto, não se trata de uma criação constitucional. A Constituição
busca os valores da sociedade e os eleva ao patamar constitucional, tornando-os aqui neste
caso o princípio da dignidade da pessoa humana valores que servirão de vetor para a mesma
sociedade e para o Estado, como um todo, ou seja, valores absolutos que não permitem a
flexibilização dos mesmos.

127
NERY JUNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria Andrade. Constituição Federal comentada e legislação constitucional:
De acordo com as recentes Emendas Constitucionais. atual. até 10.04.2006, São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006,
p. 118.
GARCIA, Maria. Limites da ciência: a dignidade da pessoa humana
128
a ética da responsabilidade. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2004, p. 140.

233
[...] a dignidade da pessoa humana, não é uma criação constitucional, pois ela é um desses
conceitos a priori, um dado preexistente a toda experiência especulativa, tal como a própria
pessoa humana. A Constituição, reconhecendo a sua existência e a sua eminência,
transformou-a num valor supremo da ordem jurídica, quando a declara como um dos
fundamentos da República Federativa do Brasil constituída num Estado Democrático de
Direito.
[...] Em conclusão, a dignidade pessoa humana constitui um valor que atrai a realidade dos
direitos fundamentais do homem, em todas as suas dimensões, e, como, a democracia é o
único regime político capaz de propiciar a efetividade desses direitos, o que signica dignificar o
homem, é ela que se revela como o seu valor supremo, o valor que a dimensiona e a humaniza.
129
(grifo do autor).

A constitucionalização da dignidade da pessoa humana e a elevação deste princípio a


fundamento da própria República, impedem a degradação do homem, na hipótese de sua
conversão em mero objeto do Estado, sendo que referido princípio trouxe conseqüências
importantes: o reconhecimento da igualdade entre os homens; a consagração da autonomia
dos indivíduos; a observância e proteção de seus direitos inalienáveis e a necessidade de ação
para garantia de condições mínimas de vida, a fim de que essa vida possa ser vivida de forma
-se abusos e lesões aos direitos, que, caso venham a ocorrer, deverão ser
130

Depreende-se, portanto, que somente haverá a observância da dignidade da pessoa humana, se


forem asseguradas condições mínimas para uma existência digna, de forma que a intimidade e
a identidade do indivíduo não sejam objeto de ingerências indevidas, bem como haja a
garantia da igualdade, indistintamente para todos. Isso porque a igualdade e a dignidade
devem andar lado a lado, embasando os direitos humanos.
2. MEIO AMBIENTE COMO DIREITO FUNDAMENTAL
O reconhecimento do direito a um meio ambiente saudável é uma necessidade do próprio
direito à sobrevivência humana, uma vez que, na inexistência de condições ambientais
satisfatórias, e sem os recursos naturais produzidos pelo meio, torna-se impossível a
manutenção da vida humana na Terra.
Além disso, segundo os critérios substanciais de vida e liberdade, para o gozo dos direitos
humanos é necessário não apenas estar vivo, mas dispor de condições dignas de vida num

SILVA, José Afonso da. A dignidade da pessoa humana como valor supremo da Democracia, in, Revista de Direito
129

Administrativo, São Paulo: Revista dos Tribunais, n.212, abr/jun. 1998, p. 91.
130
COELHO, Lilian Dias. O processo como instrumento de efetividade do princípio da dignidade humana: acesso à
justiça e duração razoável do processo. in DELGADO, Ana Paula; CUNHA, Maria Lourdes da. Estudos de Direitos
humanos: Ensaios interdiciplinares. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006, p. 65.

234
ambiente saudável. A implementação do meio ambiente equilibrado faz-se, portanto,
imprescindível para o gozo dos demais direitos humanos.
A Declaração de Estocolmo, em 1972, que foi o marco inicial do Direito Ambiental, reconheceu
o meio ambiente ecologicamente equilibrado como um direito fundamental entre os direitos
sociais do homem, com sua característica de direitos a serem realizados e não perturbados.
José Afonso da Silva descreve que:
O que é importante escrevemos de outra feita é que se tenha a consciência de que o direito
à vida, como matriz de todos os demais direitos fundamentais do Homem, é que há de orientar
todas as formas de atuação no campo da tutela do meio ambiente. [...] a tutela da qualidade do
meio ambiente é instrumental no sentido de que, através dela, o que se protege é um valor
maior: qualidade de vida. 131
Já a Lei n.º 6.938/1981, que instituiu a Política Nacional do Meio Ambiente, foi a primeira a
tratar de tal matéria no ordenamento pátrio. Todavia, a referida lei ficou esquecida até o
advento da Constituição Federal de 1988, que trouxe em seu âmago dispositivos ambientais.
A Constituição Federal de 1988 estabeleceu em seu Título VIII, Capítulo VI, Art. 225, que

e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de


defendê-lo e preservá-
criando a existência de um meio ambiente ecologicamente equilibrado, estabeleceu-se
parâmetros constitucionais, ou seja, critérios fundamentais destinados à sua aplicação como
direito fundamental, e incumbindo ao Poder Público dar-lhe efetividade através da vedação às
práticas que coloquem em risco a ecologia.
O art. 225 da Constituição Federal traz expressamente dentro do capítulo destinado aos
direitos sociais, a importância do meio ambiente ecologicamente equilibrado para as presentes
e futuras gerações. Mesmo que o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado não
esteja previsto no rol dos direitos fundamentais, ele não perde sua característica fundamental,
pois está relacionado com a vida humana. Além disso, ganhou maior proporção quando foi
reconhecido pelo Supremo Tribunal Federal como direito de terceira geração, que abrange a
todos sem distinção.
O direito fundamental ao meio ambiente saudável mostra com clareza a superação dos ideais
individualistas, característica da sociedade contemporânea, a qual passou a ser expressamente
consagrada na Constituição Federal de inúmeros países, dando margem ao desenvolvimento
do que se denomina Estados Ambientais, representados pelo modelo estatal pós-social, que
toma realmente por fundamento a busca do desenvolvimento sustentável.
A relação homem com seu meio ambiente foi sempre uma termodependência, pois primeiro
era a natureza quem atormentava os primeiros seres humanos, agora são os cidadãos que

SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 13. ed. São Paulo: Malheiros, 1997, p. 67.
131

235
destroem o meio ambiente. Devido ao fato de os limites ambientais estarem sendo
ultrapassados, o meio ambiente começou a dar sua resposta a esta agressão, como por
exemplo, as tempestades ácidas, terremotos e furacões como o Katrina e o Tsunami. Desta
forma, muitas famílias perderam seus lares, seus pertences e até a vida de entes queridos com
estas tragédias ambientais.
Insta salientar que é de fundamental importância a Amazônia para o planeta. Mas não
podemos esquecer que a educação ambiental deve ser priorizada principalmente no âmbito
municipal, em virtude de ser o local onde o homem nasce e adoece, ou seja, é o lugar
primordial para que o ser humano busque uma melhor qualidade de vida, compatibilizando-se
com o seu necessário desenvolvimento econômico.
Assim, o Estado deve, juntamente com a sociedade, implementar políticas públicas que
possam desenvolver o meio ambiente juntamente com a economia, de modo que ocorra a
melhoria na qualidade de vida dos cidadãos, respeitando assim o fundamento contido no art.
1º, III, da Constituição Federal.
3. DA INTERVENÇÃO DO ESTADO NA ORDEM ECONOMICA AMBIENTAL
Inserido no Art. 170, inciso VI, da Constituição Federal, o princípio da defesa do meio
ambiente está protegido também no Art. 225 da Constituição Federal e na Lei 6.938/81, que

tem por objetivo a preservação, a melhoria e recuperação da qualidade ambiental propícia à


vida, visando assegurar, no País, condições de desenvolvimento sócio econômico, aos
132
A defesa do meio
ambiente é um dos meios mais importantes para resguardar a qualidade de vida do ser
humano, garantindo o princípio da dignidade da pessoa humana. Não podemos esquecer que
para o crescimento da qualidade de vida é necessária a compatibilização do desenvolvimento
econômico e o meio ambiente; desta conjunção nasceu o desenvolvimento sustentável.
O legislador ao instituir o Art. 170, inciso VI, da Constituição Federal, buscou proteger o
desenvolvimento econômico saudável, isto é, um desenvolvimento que não pode, a qualquer
custo, degradar o meio ambiente para alcançar o lucro, mas sim encontrar um ponto de
equilíbrio entre o desenvolvimento econômico e o meio ambiente.
O princípio da defesa do meio ambiente não pode ser caracterizado como absoluto, em
detrimento a outros princípios fundamentais como o da livre iniciativa e o desenvolvimento
econômico. Portanto, deverá ocorrer uma harmonização de princípios, conforme foi
explanado no item do princípio constitucional da ordem econômica, para buscar um
desenvolvimento econômico equilibrado com o meio ambiente, gerando qualidade de vida
para futuras gerações.

132
Lei 6.938/81 que dispõe sobre Política Nacional do Meio Ambiente.

236
Assim, a defesa do meio ambiente proporciona uma mudança de paradigma na atividade
econômica. Caso contrário, não existirão mais recursos naturais para o desenvolvimento
econômico acontecer.
A defesa do meio ambiente impõe uma modificação do modo de desenvolvimento da atividade
econômica, como esta tem ocorrido na ideologia dominante. A economia de mercado agora a
lei da oferta e da procura e cuja lucratividade está associada a mais consumo e a mais
produção, oculta a inverídica pressuposição de uma inesgotabilidade dos recursos naturais
[...]. Os recursos da natureza e a própria natureza não devem ser visto apenas como fonte de
lucro, mas sim como fonte de onde toda a vida brota.133
Desta forma, os agentes econômicos deveriam investir cada vez mais em estudos de

de suas empresas, para conciliarem as limitações dos recursos naturais e


134

o crescimento econômico.
Ademais, o Estado pode intervir na ordem econômica quando esta for utilizada de forma
contrária aos interesses ambientais, através de repressão ou incentivos no desenvolvimento
econômico - ambiental.
Desta forma, foi necessária a intervenção do Estado para regular e normatizar os efeitos de
uma economia desenfreada, utilizando-se para tanto, da intervenção direta e indireta do
Estado, através da economia, para induzir ações voltadas às políticas públicas de proteção ao
meio ambiente e aos direitos sociais.

CONCLUSÃO
A toda a ação decorrente do Estado deve ser avaliada, de acordo com o princípio da dignidade
humana, sob pena de ser declarada inconstitucional, sendo que cada pessoa deve ser
considerada como um fim em si mesma para que possam ambos, indivíduo e Estado
conviverem pacificamente.
O princípio da dignidade da pessoa humana é inerente ao ser humano e meio ambiente
saudável é uma necessidade do próprio direito à sobrevivência humana, uma vez que, na
inexistência de condições ambientais satisfatórias, e sem os recursos naturais produzidos pelo
meio, torna-se impossível a manutenção da vida humana na terra.
O desenvolvimento sustentável se faz necessário, uma vez que o homem inserido no meio
ambiente deve preservá-lo para sobreviver no tempo. Assim, obedecendo preceitos
constitucionais, o meio ambiente deve ser preservado para as presentes e futuras gerações

PETTER, LAFAYETE JOSUÉ. Princípios Constitucionais da Ordem Econômica. O significado e o alcance do art.
133

170 da Constituição Federal, São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005, p.244.
134
DERANI, Cristiane. Direito Ambiental Econômico. 2ed. São Paulo: Max Limonad, 2001, p. 237.

237
Assim, o meio ambiente constitui um direito fundamental, que deve ser prioridade de todos os
Estado na busca do desenvolvimento sustentável. Para a busca desse direito fundamental,
importante é a análise da aplicabilidade dos princípios constitucionais ambientais,
principalmente a base e o mandado de otimização que é o princípio da dignidade da pessoa
humana.
Desta forma, a intervenção do estado, por meio de políticas pública deve estar baseada nos
princípios da dignidade da pessoa humana e da defesa do meio, bem como nos princípios
fundamentais como o da livre iniciativa e o desenvolvimento econômico. Portanto, deverá
ocorrer uma harmonização de princípios, para buscar um desenvolvimento econômico
equilibrado com o meio ambiente, gerando qualidade de vida para presentes e futuras
gerações.
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240
EDUCAÇÃO E DIREITOS HUMANOS: A PERCEPÇÃO DE PROFESSORES
UNIVERSITÁRIOS DA ÁREA DE EDUCAÇÃO
135

136

137

Resumo
Este artigo busca compreender a percepção de professores universitários de cursos de
licenciatura sobre Direitos Humanos e Justiça Escolar no âmbito educacional, identificando se
há consonância com a Educação em Direitos Humanos. Trata-se de um recorte da pesquisa

pesquisa configura-se como survey, descritiva e exploratória, corte transversal, a amostra e os


dados foram coletados em um momento específico almejando a compreensão através da
análise quantiqualitativa. O instrumento aplicado foi um questionário composto por questões
abertas que visavam conhecer a percepção dos participantes sobre Direitos Humanos, Justiça
e Convivência Escolar. Participaram da pesquisa 27 professores equivalentes a uma
porcentagem de 64,3% do total da amostra de 42 professores que lecionam nos Cursos de
Licenciaturas do UNISAL/Lorena. A análise dos resultados evidencia que os professores
afirmam trabalhar conteúdos pertinentes aos Direitos Humanos utilizando materiais didáticos
e trabalhos em grupos. Poucos professores indicam a prática de estágio como um campo de
reflexão onde os alunos são estimulados a pensar sobre seu papel social, a categorização das
respostas dadas pelos professores e a análise também demonstrou que parte dos professores

manifestaram dificuldade para elucidar de que maneira acontece a prática em sala de aula.

Palavras-chave: Direitos Humanos; Educação e Direitos Humanos; Direitos Humanos e


Percepção do Professor; Observatório de Violências nas Escolas UNISAL, Lorena.

135
Doutora em Psicologia Escolar e do Desenvolvimento Humano: Instituto de Psicologia da USP IPUSP.
Professora Titular do UNISAL Lorena. Coordenadora do Observatório de Violências nas Escolas. Líder do grupo
de estudos do Observatório de Violências nas Escolas. Leitora da Cátedra UNESCO de Juventude, Educação e
Sociedade. E-mail: soniakoehler@hotmail.com.
Doutoranda em Psicologia: Programa Psicologia Escolar e do Desenvolvimento Humano da Universidade de São
136

Paulo USP; Psicóloga Clínica. Professora e Supervisora do curso de Psicologia e do curso de Pedagogia do Centro
Universitário Salesiano de São Paulo, UNISAL/Lorena. Vice-líder do grupo de estudos do Observatório de
Violências nas Escolas. E-mail: jessica.sousasv@gmail.com.
137
Graduanda em Psicologia no Centro Universitário Salesiano de São Paulo UNISAL/Lorena. Bolsista do
Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica PIBIC -CNPq. Membro do grupo de estudos do
Observatório de Violências nas Escolas UNISAL/Lorena. E-mail: alessandra.carvalho19@gmail.com.

241
Introdução
Este estudo é parte de uma pesquisa vinculada ao Observatório de Violências nas Escolas do
ão em Direitos Humanos: investigação da percepção de

UNISAL /Lorena/SP. Essa pesquisa é um desdobramento de um estudo anterior intitulado

e último anos do Centro Universitário Salesiano da Unidade de Lorena, dos seguintes cursos:
Administração, Ciências da Computação, Direito, Pedagogia, Psicologia (Licenciatura),
Matemática, Filosofia, História e Psicologia (Formação de psicólogo). Foi publicada em 2016

Ivar César Oliveira de Vasconcelos.


Por serem inerentes a todo ser humano, os Direitos Humanos devem ser promovidos em todos
os âmbitos da educação, de forma transversal, ou seja, não podem ficar a cargo de uma
disciplina específica, mas devem ser intrínsecos a todas elas, por meio de temas e atitudes dos
professores que corroborem para a construção de uma sociedade que vise o empoderamento
da cidadania e da justiça. Por exemplo, Rocha (in Castro 1999) expõe que o direito à vida não é

Dessa forma, uma Educação em Direitos Humanos não busca somente saber ou informar
sobre os direitos, mas compreender a real dimensão desse direito, especialmente
correlacionado aos direitos e acesso à educação de qualidade, liberdade e dignidade dentro da
conjuntura escolar, para usufruir a plenitude desse poderio com autoridade e sabedoria
visando a construção da cultura de paz.
Araújo (in Castro 1999) expõe de forma resumida os princípios centrais que regem a moderna
Lei de Direitos Humanos:
Todo ser humano tem certos direitos que lhe são inerentes. Tais direitos podem ser
enumerados ou deduzidos; não são conquistados nem adquiridos, mas são inerentes a todas as
pessoas, em virtude apenas de sua humanidade. Os direitos básicos de todo cidadão são
irrevogáveis ou alienáveis, isto é, tais direitos nunca podem ser anulados nem negados por
partes externas nem pelos próprios indivíduos envolvidos. Os conflitos entre os direitos
humanos devem ser resolvidos de acordo com leis e procedimentos justos e imparciais.
(Araújo in Castro 1999, p. 79).

242
A escola, nesse panorama, tem a missão de favorecer uma educação que auxilia na efetivação
desses direitos básicos, assim como conceber oportunidades para que seus integrantes tenham
conhecimento desses direitos e como acessa-los.
Diante desse quadro, torna-se relevante conhecer a percepção dos professores universitários

reconhecem, nas suas práticas, a abordagem de questões relativas aos Direitos Humanos na
sua área de docência.
EDUCAÇÃO EM DIREITOS HUMANOS, A EDUCAÇÃO EMANCIPADORA.
A educação que proporcione uma conscientização para a prevenção de violações dos Direitos
Humanos, os direitos inerentes ao ser humano, e que colabore com a reflexão de que cada
pessoa é responsável para a construção de uma sociedade mais justa, mais democrática, pauta-
se na ideia de que cada indivíduo tem o dever de conhecer seus direitos e lutar por eles e, da
mesma forma, reconhecer e defender o direito do outro. Essa descrição ilustra uma das
perspectivas da Educação em Direitos Humanos.
O ambiente escolar é um espaço propício de socialização, interação e prática da cidadania.
Conforme orienta Delors (1998), a educação para a cidadania não se trata de ensinar preceitos
ou códigos rígidos, como uma espécie de doutrinação, trata-se de fazer da escola um modelo de
prática democrática que leve as crianças e demais atores envolvidos no contexto educacional a
compreender, a partir de questões atuais e cotidianas, quais são os seus direitos e deveres.
Da mesma forma, Freire (2002) aponta que a prática educativa não deve se limitar à

Portanto, tanto o professor quanto o aluno desempenham um papel ativo e problematizador


no cotidiano escolar fundamentado pela Educação em Direitos Humanos.
Quando um professor se relaciona com seus alunos com uma postura de igualdade e respeito,
considerando a cultura e as demais variáveis do contexto em que estes estão inseridos,
demonstra, a partir de seu exemplo e suas atitudes, o respeito à dignidade e à autonomia de
seus alunos.
É na compreensão do outro que se conhece melhor a si mesmo, é no contexto social que
desenvolvemos a socialização, logo, a educação tem responsabilidade na construção de um
mundo mais solidário e responsável, como ressalta o Plano Nacional da Educação em Direitos
Humanos (Brasil, 2007), é fundamental:
Destacar o papel estratégico da educação em direitos humanos para o fortalecimento do
Estado Democrático de Direito; estimular a reflexão, o estudo e a pesquisa voltados para a
educação em direitos humanos; incentivar a criação e o fortalecimento de instituições e
organizações nacionais, estaduais e municipais na perspectiva da educação em direitos
humanos. (Brasil, 2007, p. 26-27).

243
A problemática atual é conhecer o que são Direitos Humanos e garantir a sua efetivação, isto é,
trata-se de saber o que são e como efetuá-los de forma eficaz, buscando uma coerência,
portanto, entre o que se pensa, fala e faz. Conforme ressalta Paulo Freire (2002):
O papel do educador é não apenas ensinar os conteúdos, mas também ensinar a pensar certo,
ou seja, ser um professor crítico e não apenas um profissional mecanicamente memorizador.
... O intelectual memorizador, que lê horas a fio, domesticando-se ao texto, temeroso de
arriscar-se, fala de suas leituras quase como se estivesse recitando-as de memória não
percebe, quando realmente existe, nenhuma relação entre o que leu e o que vem ocorrendo no
seu país, na sua cidade, no seu bairro. Repete o lido com precisão mas raramente ensaia algo
pessoal. Fala bonito de dialética mas pensa mecanicistamente. Pensa errado. É como se os
livros todos a cuja leitura dedica tempo farto nada devessem ter com a realidade de seu
mundo. A realidade com quem eles têm que ver é a realidade idealizada de uma escola que vai
virando cada vez mais um dado aí, desconectado do concreto. (Freire, 2002, p. 29-30).

Quando a educação se dedica a propiciar um ambiente consciente e ativo, auxiliando no

refletir e questionar o que há no seu entorno.


Assim, a educação que instiga e problematiza as questões coletivas e democráticas, favorece o
desenvolvimento autônomo dos indivíduos, que, dessa maneira, aprendem a falar por si.
Delors (1998) descreve essa modalidade de educação da seguinte forma:
A educação não pode contentar-se em reunir as pessoas, fazendo-as aderir a valores comuns
forjados no passado. Deve, também, responder à questão: viver juntos, com que finalidades,
para fazer o quê? e dar a cada um, ao longo de toda a vida, a capacidade de participar,
ativamente, num projeto de sociedade. O sistema educativo tem, pois, por missão explícita ou
implícita, preparar cada um para este papel social. Nas sociedades complexas atuais, a
participação em projetos comuns ultrapassa em muito a ordem do político em sentido estrito.
É de fato no dia-a-dia, na sua atividade profissional, cultural, associativa, de consumidor, que
cada membro da coletividade deve assumir as suas responsabilidades em relação aos outros.
Há, pois, que preparar cada pessoa para esta participação, mostrando-lhe os seus direitos e
deveres, mas também desenvolvendo as suas competências sociais e estimulando o trabalho
em equipe na escola. (Delors 1998, p.60).
De fato, a educação tem o compromisso de educar além do conteúdo formal, também para a
prática da cidadania e democracia, segundo o Plano Nacional da Educação em Direitos
Humanos (Brasil, 2007):
Não é apenas na escola que se produz e reproduz o conhecimento, mas é nela que esse saber
aparece sistematizado e codificado. Ela é um espaço social privilegiado onde se definem a ação
institucional pedagógica e a prática e vivência dos direitos humanos. Nas sociedades
244
contemporâneas, a escola é local de estruturação de concepções de mundo e de consciência
social, de circulação e de consolidação de valores, de promoção da diversidade cultural, da
formação para a cidadania, de constituição de sujeitos sociais e de desenvolvimento de
práticas pedagógicas. (Brasil, 2007, p. 31).
Desta forma, é necessário considerar o desenvolvimento centrado no ser humano, na
interação com o meio, abrangendo o aluno, todo contexto escolar e a sociedade com suas
singularidades de valores culturais, auxiliando a promoção de uma cultura ética e de paz .
Assim, a partir da concepção ampliada da educação, que se fundamenta na formação integral
do educando, a partir do respeito aos Direitos Humanos, acreditamos que se faz urgente
repensar os sistemas e modelos educacionais desde a formação do professor.
Faz-se, portanto, necessário, compromisso com uma educação emancipadora, que agregue a
formação a uma prática pedagógica comprometida com o enfrentamento de qualquer tipo de
violação de Direitos Humanos, que penetre todas as práticas sociais e seja eficaz em propagar e
vivenciar os direitos inerentes a todas as pessoas, os Direitos Humanos.
JUSTIÇA E O COMPROMISSO COM A EDUCAÇÃO SOCIAL
A Educação em Direitos Humanos tem o intuito de contribuir para a construção de uma
sociedade mais democrata e justa, dessa forma promover a construção de culturas de paz. De
forma intrínseca aos direitos está a palavra justiça e o próprio significado da palavra a priori é
um desafio.
O Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa (Ferreira, 2009, p. 1165) define a palavra justiça da

faculda -se que o indivíduo


entende e percebe como justo e injusto conforme suas próprias vivências e conforme as
normas implícitas da cultura que está inserido, sem que exista algo explícito que determine

lei de caráter legislativo e regras jurídicas.


A vida em sociedade e em comunidade implica na necessidade de se organizar as relações, e a
justiça, enquanto valor e enquanto direito, auxilia na função de preservar a harmonia social
segundo as regras da própria sociedade que a determinou e construiu. Barbosa (1984) afirma

alcançamos certo discernimento das coisas, e possuindo um mínimo de capacidade intelectual,


desenvolvemos um senso de justiça e que de acordo com a nossa razão este senso nos induz a
julgar as coisas como justas e injustas.

245
E como aflorar o senso de justiça e saber julgar as coisas como justas e injustas? Suponha-se
que existe uma escola, que está inserida e atenda alunos de uma comunidade em condições de
vulnerabilidade, entre elas, falta saneamento básico, água potável, não tem asfalto e a coleta de
lixo está irregular, concomitante a isso, é ano de eleição. Durante uma aula para uma turma do
último ano do ensino médio, um professor ao recolher os trabalhos que havia solicitado,
percebe que um aluno não entregou e justificou-se afirmando que não fizera o trabalho porque
não tinha água em sua casa. Frente a essa situação, o professor considera útil elaborar uma
aula em que os alunos pudessem expor suas dificuldades enquanto comunidade e, em equipes,
pensar estratégias de solução alicerçados nos seus direitos e deveres e enquanto indivíduos de
uma sociedade democrática.
A escola é uma instituição que pode reproduzir condições de justiça ou injustiça, pode
colaborar com a estruturação de situações que favoreçam uma relação social investida de
poder que possibilite aos seus integrantes a percepção de que a justiça não está associada
apenas ao poder legislativo, mas é uma ação intrínseca às relações em comunidade.
O relacionamento social e a justiça estão interligados quando a mesma é comparada à
igualdade de tratamento e respeito mútuo entre as pessoas.
A justiça não se reduz à justiça legal ou penal, que configura o caráter legislativo, não obstante
agrega valores que transcendem a regras, instituições e órgãos; é um conceito que envolve o
convívio interpessoal, a relação social com respeito às regras sociais e morais, facilitando o
contato harmonioso embasado no respeito mútuo de forma igualitária. Em concordância com

como as pessoas vivem e não meramente à natureza das instituições que a (Werle,
2011, p.154).
Segundo Barbosa (1984), a justiça possui dois aspectos principais: valores (éticos, culturais e
morais) e dos direitos, que por sua vez compreende os sistemas sociais e as instituições;
direitos individuais; ordem jurídica da sociedade (as leis internas); ordem internacional (leis
internacionais e as relações entre diferentes nações). A justiça social envolve características
formais e informais, que destacam o papel primeiro de justiça, como finalidade de ordem
social. Segundo Barbosa (1984):
Falar de justiça social significa falar de vários aspectos da justiça, formais e não formais. ...
Significa falar de que maneira o sistema político e as circunstâncias socioeconômicas
determinam as expectativas de vida de cada um, qual o espaço que as pessoas tem para se
organizar e se articular na sociedade. ... a ideia de justiça social tangencia a ideia de igualdade,
mas não se reduz a ela, nem com ela pode ser confundida. Ademais, conforme mencionamos
anteriormente, a ideia de igualdade, por si só, não expressa a ideia de justiça, apesar de alguns
estudiosos do assunto sistematicamente reduzi-la á ideia de justiça igualitária. (Barbosa, 1984,
p.26-29).

246
A justiça social compreende todos os indivíduos de forma igual entre si em relação a direitos e
deveres em distintas áreas do aspecto da vida social, que estão relacionados à direitos
considerados básicos como saúde, educação, justiça, trabalho e manifestação cultural. A
justiça está intrinsicamente relacionada aos valores da sociedade, que permeia todas as formas
de relações entre seus semelhantes com o intuito de minimizar as diferenças sociais e
favorecer o desenvolvimento digno e justo que cada pessoa tem direito simplesmente por
existir.
Rodrigues (2016) pontua que:
A justiça social parte do preceito de que, para que se alcance um ponto em que a convivência
social torne-
começaram a vida social em desvantagem. É desse princípio que partem ações como a
instituição de um salário-mínimo, o seguro-desemprego, cotas raciais e as demais ações de
seguridade social. (Rodrigues, 2016).
A desigualdade social, alicerçada em situações como falta de saneamento básico, dificuldade de
acesso à escola e à saúde pública, falta de moradias dignas e segurança pública eficiente, está
entre os campos de atuação da justiça social, que visa favorecer medidas protetivas e
preventivas em diferentes áreas com o intuito de possibilitar a construção de uma sociedade
com características que vise à equidade e amplo acesso à justiça, seja ela social, jurídica, cívica
ou moral.
É importante destacar que a justiça não pode ser encarada como fenômeno isolado e
fragmentado, mas como um exercício que se dá através da democracia indissociável com a
liberdade. De acordo com Werle (2011), a justiça não é um fenômeno meramente teórico, mas
uma atitude que desperta para uma postura reflexiva e ativa, no exercício público, na prática
política. É uma tarefa que tem de ser levada adiante pelas próprias pessoas na vida social e no
exercício da razão pública, num debate crítico, reflexivo, aberto e ininterrupto sobre como
lidar com as exigências conflitantes entre o possível e o desejável.
Logo, nota-se que a escola, enquanto um meio de socialização, tem uma parcela significativa
de responsabilidade em relação a conhecer e educar com fundamentos alicerçados nos direitos
fundamentais de todo ser humano, torna-se um instrumento para a prática do exercício da
cidadania que corrobore em construir uma sociedade concentrada na formação plena do
indivíduo e que propague valores nos âmbitos técnicos, sociais e morais.
Assim, a escola de qualidade social será compreendida e efetivada coletivamente como espaço
de garantia de direitos via diálogo com a diversidade cultural, incluindo a igualdade e

quando a diferença os inferioriza, e o direito a serem diferentes quando a igualdade os

O exercício de uma cidadania empoderada corrobora com a construção de uma sociedade que

247
elaboradas em consonância com as necessidades da população, que sejam cumpridas por todos
(Barbosa, 1984, p.100).
Empoderar o indivíduo compreende um movimento que propicie a autonomia em relação aos
seus direitos e deveres sociais, que o mobilize de forma ativa no exercício de sua cidadania,
concedendo poder para o fortalecimento da democracia.

ABORDAGEM METODOLÓGICA
O presente estudo baseia-se no método de pesquisa survey com corte transversal, descritiva,
pois a amostra foi escolhida e os dados foram coletados em um momento específico, via

informações sobre características, ações ou opiniões de determinado grupo de pessoas, ... por
meio de um instrumento de pesquisa, normalmente um questio
Moscarola, 2000, p.105), aplicado ao público-alvo escolhido.
Ainda conforme Freitas at al. (2000), a amostragem é caracterizada como não probabilística,
obtida a partir do critério por conveniência, em que os participantes são escolhidos por
estarem disponíveis.
Participaram da pesquisa 27 professores do ensino superior dos Cursos de Licenciaturas de
uma universidade do interior do Estado de São Paulo, equivalente a uma porcentagem de
64,3% do total da amostra de 42 professores na instituição (tabela 1), sendo que 3 professores
optaram por não responder ao questionário: um alegou não se sentir preparado e dois
consideraram como um teste a aplicação do instrumento e, sendo assim, optaram por não se
submeterem à pesquisa.
Tabela 1- Amostra de Professores do Ensino Superior de Licenciaturas.
Primeiro semestre de 2016
Cursos Professores
Femininos Masculinos

Psicologia
3*** 1*
Licenciatura

Pedagogia 13***** 7****


Matemática 5** 4***
História 5**** 12*****
Filosofia 4** 9****

248
Nota. Fonte: Informações cedidas pela instituição, nas coordenações de Psicologia, Pedagogia,
Matemática, História e Filosofia.
*Professor que também leciona em outros cursos de graduação.
**Do total, 1 professor também leciona em outros cursos de graduação.
*** Do total, 2 professores também lecionam em outros cursos de graduação.
**** Do total, 3 professores também lecionam em outros cursos de graduação.
***** Do total, 6 professores também lecionam em outros cursos de graduação.
Observação: Os asteriscos indicam quando um mesmo professor leciona em outros cursos de
graduação, licenciatura ou bacharelado.
O INSTRUMENTO DE PESQUISA E O MÉTODO DE ANÁLISE
O instrumento de coleta de dados foi estruturado em duas partes. A primeira é composta por
questões que visam à caracterização dos participantes: formação, idade, sexo, cor, religião e
um espaço próprio para a declaração das disciplinas que o professor ministra. Todas as
questões são abertas, os participantes preencheram conforme sua percepção.
A segunda parte do instrumento é constituída por um questionário com nove questões, que
visam conhecer a percepção dos participantes sobre Direitos Humanos, Justiça e Convivência
Escolar. Para tanto, é dividido em quatro grupos de perguntas. O primeiro grupo, I-

O segundo grupo é nomeado II-


vo
O terceiro grupo, chamado III-

escola?
Por fim, o quarto e último grupo, chamado IV- Projeto Pedagógico

s questões relativas à

instrução de, em caso afirmativo, identificar a forma de abordagem do tema.


Para o presente estudo, foi feito um recorte e utilizamos as questões do terceiro e quarto
grupos, destacados novamente a seguir:
Grupo III-

grupo IV-
249
à

Para a análise das respostas dos participantes, utilizamos a técnica da análise de conteúdo, que
prevê três fases fundamentais: 1) Pré-análise, exploração do material; 2) Tratamento dos
resultados e 3) Inferência e interpretação.
As emissões foram analisadas de forma a detectar valores, crenças, opiniões e atitudes segundo
a técnica de análise de conteúdo de Bardin (1977). Conforme a perspectiva do autor, consiste
em uma técnica metodológica que se pode aplicar em discursos diversos e a todas as formas de
comunicação, seja qual for a natureza do seu suporte.
Mensagens obscuras que exigem uma interpretação, mensagens com um duplo sentido cuja
significação profunda só pode surgir depois de uma observação cuidadosa ou de uma intuição
carismática. Por detrás do discurso aparente, geralmente simbólico e polissêmico, esconde-se
um sentido que convém desvendar. (Bardin, 1977, p. 66).
Os temas que se repetem com muita frequência "se recortam do texto em unidades
comparáveis de categorização para análise temática e de modalidades de codificação para o

por unidades temáticas que são agrupadas conforme o mesmo significado. A análise das
categorias encontradas deve fornecer subsídios para sugerirmos e/ou elaborarmos estratégias
de ação durante a formação de futuros professores.
Resultados
A caracterização da amostra demonstra que um percentual de 48,2% de professores é do sexo
feminino e 51,8% do sexo masculino. A idade dos participantes varia entre 29 e 71 anos, sendo
que 60% têm mais de 45 anos. (Cf. tabela 2).
Tabela 2- Amostra de Professores Participantes do Ensino Superior de Licenciaturas.

Sexo Total (%) Participantes (%)


Masculino 59,5 51,8
Feminino 40,5 48,2
Base 42 27
Nota. Fonte: Dados organizados pelas autoras.
No que tange à religião, 88,9% dos participantes afirmam ser católicos e 11,1% não
responderam a questão.
Em relação ao item formação: 18,5% declaram ter doutorado, 63% mestrado, 11,1% pós-
graduação e 7,4% declaram ter concluido a graduação.

250
No que diz respeito à cor 92,6% participantes consideram-se brancos, apenas 3,7% mulatos e
3,7% consideram-se pretos. Diante desse quadro, o número de professores negros faz-nos
refletir sobre o porquê dessa pequena amostragem e sobre as variáveis que favorecem essa
diferença entre o número de docentes brancos e negros, visto que no Brasil a maioria da
população se declara negra (http://www.brasil.gov.br/educacao/2012/07/censo-2010-mostra-
as-diferencas-entre-caracteristicas-gerais-da-populacao-brasileira, recuperado em 31, maio,
2017) conforme os dados divulgados pelo governo federal no portal de educação.

para exemplificar as categorias, a partir das respostas dos participantes (Cf. Tabela 3):
Tabela 3-

Categorias Número total Porcentage


de Emissões m
I. Equidade. 17 54,84%
II. Relações e Regras Sociais. 6 19,35%
III. Prática do Bem Comum. 4 12,90%
IV. Ordem Jurídica 3 9,68%
V. Cultural 1 3,23%
Base 31 100%
Nota. Fonte: Dados organizados pelas autoras.
Observação: Encontramos o número total de 31 emissões, dentre os 27 participantes, pois
algumas respostas foram subdivididas nas categorias demonstradas na tabela.

Aurélio da Língua Portuguesa (Ferreira, 2009


reconhecer igualmente o direito de cada um, é um conjunto de princípios imutáveis de justiça
que induzem o juiz a um critério de moderação e de igualdade, ainda que em detrimento do
direito objetivo, é também um sentimento de justiça avesso a um critério de julgamento ou
tratamento rigoroso e estritamente legal. Foram selecionados três exemplos que representam

humano precisa respeitar o outro e ser respeitado em todos os quesitos sociais; econômicos,

eito à
igualdade de todos os cidadãos, podemos dizer que justiça é a particularidade do que é

251
-se a 19,35% das emissões dos participantes.
Percebe-se a relação da palavra justiça aos temas ligados à justiça e regras que visem o bem
comum, pré-estabelecidas socialmente, com a intenção de preservar a harmonia social em

exatamente, quando em sociedade estabelece regras em que as pessoas convivem e usufruem

conjunto de decisões, normas e princípios considerados razoáveis de acordo com um


determinado grupo social

justiça se relaciona com a vida em sociedade que visa o coletivo, o exercício da cidadania que

a virtude de faze e praticar o bem. Não há justiça sem a dimensão coletiva do bem-

referência que regulamenta a vida em sociedade em relação ao caráter legislativo, justiça legal
eber o que se tem direito, pelo trabalho realizado, é ser

raça, cre

relações sociais, do meio cultural, envolve valores éticos e morais e que pode passar por
algumas transformações atada as transições e mudanças que a sociedade atravessou e/ou

A maioria, 54,84% dos participantes considerou a pa


direitos de todos, pela igualdade de tratamento, isto é, sem qualquer tipo de distinção.
Observa-se, de modo geral, que a percepção em relação à justiça como algo que envolve uma
relação em que os indivíduos convivem e desfrutam dos mesmos direitos e deveres, o que pode

o intento de preservar e garantir a ordem e harmonia social com a finalidade do bem comum.
A Educação em Direitos Humanos consiste em contribuir para a criação de uma sociedade
mais democrata e justa socialmente, para a construção de culturas de paz, promovendo o
respeito entre as pessoas e suas diferenças. Nessa perspectiva, indaga-se: será que a justiça, em
relação à legislação, é concebida como um fator protetivo, ou como assinala Araújo (in Castro
rdade, uma

252
É necessário que exista uma juntura do pensamento e das teorias à ação, ao comportamento
em sociedade, que transcenda a ordem jurídica e as regras já pré-estabelecidas, que revele uma
justiça não como algo abstraído e distante da vida em sociedade, mas seja um exercício de
cidadania, associada aos valores da sociedade que compreende todas as pessoas.
Leis que assegurem os direitos fundamentais do ser humano são necessárias para promover
uma justiça com a índole orientada para o social e com o intuito de minimizar as injustiças
coletivas, de modo a empoderar a pessoa humana.

Elegemos de uma (1) a três (3) emissões para explanar as categorias, a partir das respostas dos
participantes (Cf. Tabela 4):
Tabela 4-

Categorias Número total Porcentage


de Emissões m
I. Igualdade de Tratamento. 14 50%
II. Regras e Normas. 6 21,43%
III. Escola que atenda a todos. 3 10,71%
IV. Papel da Escola 2 7,14%
V. Garantia de Educação e Cidadania. 2 7,14%
VI. Qualidade de Vida. 1 3,58%
Base 28 100%
Nota. Fonte: Dados organizados pelas autoras.
Observação: Encontramos o número total de 28 emissões, dentre os 27 participantes, pois
algumas respostas foram subdivididas nas categorias demonstradas na tabela.

importância que os participante atribuem ao tratamento igual e em conformidade com a lei,


que pode estar associada ao caráter legislativo ou senso de moral que rege aquela comunidade.

do ser humano. Pra que possa haver possibilidades de se pratica


escola é tratar todos iguais e ensinar para os alunos que devem tratar todos da mesma

253
É importante refletir em

une enqua
direito a ser iguais quando a diferença nos inferioriza; temos o direito a ser diferentes quando

A justiça no âmbito escolar está intimamente associada à igualdade de tratamento e


oportunidades, e que, educar para o pleno exercício da cidadania é o papel que a escola deve
desempenhar, em um cenário que atenda a todos, organizado e regulado na lei e na ordem.

justiça pode estar conectada ao estabelecimento de regras, leis, preceitos, um parâmetro que
indica a necessidade de que algum tipo de ordem seja estabelecido.
as no sentido de educar para as normas e leis de

eno espaço que reflete a sociedade, (deve) a justiça e ou injustiça,


presentes entre as pessoas, deve garantir regras para que haja o desenvolvimento de justiça.

pontuam a necessidade de

por pessoas com direitos iguais, contudo, diferentes em sua constituição enquanto

todos os alunos, independente, de qualquer distinção uma educação de qualidade baseado no

mesmas coisas, vendo tal ambiente como um espaço de afirmação das disciplinas, porém que

atribuição da prática da justiça na escola é uma conduta intrínseca do contexto escolar e que
fortalece a forma
escola é justa quando cumpre seu papel de formadora, educadora. Quando seus professores
ensinam de verdade e formam bons cidadãos. Quando os estudantes aprendem. Não se trata
de atender
ou ação desenvolvido por professor/alunos/Direção onde pudesse fortalecer o cumprimento
de medidas sócio-

o campo escolar como um agente que proporciona a garantia para o acesso a educação e
dicados no item

254
escola é o espaço de convívio das relações entre as pessoas, a justiça enquanto um pressuposto

instrumento que auxilie o acesso a melhores


ensino e aprendizagem deve fazer parte de um projeto para a melhoria de qualidade de vida

gorias encontradas contribuíram para uma visão mais ampla sobre a


percepção dos professores voltados para a justiça no âmbito escolar e a Educação em Direitos
Humanos. Os participantes parecem compreender que a justiça é alicerçada numa relação que
envolve igualdade de tratamento, relações pautadas em regras e normas, e que cada pessoa
têm direitos e deveres com o intuito de favorecer a construção de uma relação consolidada que
vise o bem comum.
Na comunidade escolar os temas referentes à Justiça e Educação em Direitos Humanos devem
ser experenciados de forma crítica, proporcionando reflexão e conscientização sobre os
direitos humanos, com questões atuais e que façam parte da realidade dos componentes
inseridos no contexto educacional. Nesse sentido, vai além dos professores e alunos, pois os
temas destacados agregam também todos os outros funcionários da escola, membros da
administração escolar, os inspetores escolares, o pessoal dos setores administrativo, os
funcionários encarregados do planejamento da educação no âmbito dos governos locais e
nacionais, os pais e a comunidade.
Nesse cenário a escola desempenha um papel importante por ser um local que o ensino em
relação a justiça necessita estar fundamentado com a sua prática, ou seja, a interação social no
ambiente escolar pode proporcionar uma oportunidade para desenvolver a empatia e o
respeito mútuo, troca conhecimentos e ampliar o senso de moral. É na relação com o outro
que se desenvolve a socialização com o diferente, que evolui a empatia e humanização.
Projeto Pedagógico de

o (5) categorias,

Selecionamos de duas (2) a três (3) emissões para exemplificar as categorias, a partir das
respostas dos participantes (Cf. Tabela 5):
Tabela 5-
que ministra são tratadas questões relativas a Justiça? ( )sim ( )não. Em caso afirmativo

Categorias Número total Porcentage

255
de Emissões m
I. Emissões que não responderam a questão. 8 29,63%
II. Diálogo e Debate. 8 29,63%
III. Disciplina específica e/ou fundamentação teórica. 5 18,52%
IV. Material didático. 4 14,81%
V. Projetos e práticas de estágios. 2 7,41%
Base 27 100%
Fonte: Dados organizados pelas autoras.
das respostas não
informaram o que foi solicitado na questão. Isto é, não esclareceu como acontece na prática o
exercício do conteúdo em sala de aula. Sim, quando uma avalição do professor em

participantes trabalham a temática da justiça através do dialogo e estimulam o debate em sala


nas
discussõe
que precisa aparecer em todas as disciplinas. Procuro fazer leituras do cotidiano da sociedade
estudo de caso debates.
Todos fundamentados por teóricos que tratam do tema: justiça social, democracia e

participantes afirmaram trabalhar o conceito de justiça em uma disciplina específica e com


Com relação a justiça essa é tratada nas disciplinas de
Políticas Públicas e Profissão docente de formar mais consistente em vários tópicos das
disciplinas Com relação a justiça essa é tratada nas disciplinas de Políticas Públicas e Profissão
estudo
de caso debates. Todos fundamentados por teóricos que tratam do tema: justiça social,
democracia e
moral, na perspectiva das virtudes cardeais, como uma vertente racional para a prática da

stão anterior, 14,81% dos participantes


afirmam que trabalham assuntos relacionados a Justiça através dos materiais didáticos, vídeos,
Em textos que são trabalhados em sala, em vídeos. No
dia a dia das aulas.Com o di
estudo de caso

256
participantes parecem compreender que a prática de estágio é uma experiência para colocar
em prática temas elaborados em sala e a teoria sobre a justiça, dessa forma, refletir de forma
No processo
de realização do estágio, os licenciando refletem sobre a prática pedagógica e a postura do
futuro professor, ou seja, sobre as práticas justas ou injustas p/a o desenvolvimento humano e

de justiça e indico livro


É possível observar que parte dos participantes, o equivalente à 29,63%, apresentaram
dificuldade para demonstrar como se dá na prática, na sua experiência docente, a aplicação
conseguiu explanar

comtemplada em sala de aula de forma dialógica e é estimulado o debate e reflexão sobre o


tema, como afirmam 29,63% dos participantes.
Diante dessa perspectiva, faz-se necessário pensar sobre ações e estratégias que proporcionem
uma reflexão no campo do ensino que instiguem ações mais eficazes para a elaboração de
metodologias que trabalhem, de forma ética e prática, a temática da Educação em Direitos
Humanos e Justiça pautada na qualidade social, uma vez que:
Nessa perspectiva, a escola de qualidade social não se fecha em si mesma, ou na relação
professor/aluno/conhecimento, mas considera os contextos em que vivem seus sujeitos, suas
necessidades e suas expectativas em relação à educação. Não fica alheia às discussões políticas,
sociais e econômicas que a circundam e que nela incidem. Aproveita todos seus espaços com a
finalidade de promover vivências e aprendizagens significativas. Assim, entende-se que, para a
instituição escolar ter qualidade social, precisa estar fundamentada e organizada de forma a
contemplar os diferentes aspectos que constituem aquilo que, em determinado contexto, está
sendo entendido como qualidade pelo conjunto de sujeitos. (Eyng, 2014, p. 204).
Com efeito, é importante que a escola favoreça a construção de uma vida em sociedade
democrática e justa, com pessoas que exerçam a colaboração entre si, que auxilie a formação
de sujeitos empáticos e que saibam conviver com as diferenças, como detalha Oliveira,
Caminha, Iraquitan & Freitas (2010):
... a escola pode ser um lugar de experiências compartilhadas na perspectiva da convivência
digna e justa. A educação pode oferecer oportunidades significativas para os educandos,
contribuindo na formação de sujeitos que primem por condutas cooperativas, justas e
respeitosas. Almejamos que o leitor contemple o nosso desejo de que a escola seja um espaço
indispensável na construção de um mundo social mais igualitário e tolerante, renegando

257
discursos utópicos que fazem do presente da sociedade um futuro perdido. (Oliveira at al.
2010, p. 269).
O papel da escola deve ser auxiliar a construção de uma sociedade mais ética, solidária e justa.
É necessário propagar uma educação moral no âmbito da escola, uma formação que vise além
do caráter profissional, e que, ao entrar em contato com o aspecto sociocultural de cada
sujeito, consiga dialogar com as diferenças, fortalecer vínculos interpessoais numa formação
que propicie condutas embasadas em valores éticos e morais.
Justiça e cidadania são duas condições da pessoa humana intimamente relacionadas entre si e
cuja existência é indissociável. Essa conjuntura expõe o grau de relevância e responsabilidade
que a educação possui e, diante desse horizonte, aponta a necessidade da formação cidadã,
alicerçada na liberdade e responsabilidade em relação aos direitos e deveres de cada sujeito
em relação à prática política e o exercício público.
Emerge, assim, a necessidade de refletirmos em relação à verdadeira missão da escola, sobre
qual o intuito de sua existência enquanto instituição e o seu papel na promoção da justiça,
concebida em suas múltiplas facetas. A escola, considerando a comunidade que a cerca, deve
se orientar para favorecer relações justas e uma educação na cidadania, processos que se
fundamentam desde uma postura de empatia e acolhida de seus integrantes, até a ascensão da
pessoa humana para pensar e atuar na sociedade a qual pertence.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
É comumente verbalizada a crença de que a educação é o futuro da nação. E qual é o papel do
professor e de todo sistema educacional diante dessa afirmação? Será que estão realmente
preparados para tal exercício? O que motiva a prática da docência? E qual a finalidade em
relação do exercício docente?
A análise dos resultados da pesquisa indica que todos os professores afirmam trabalhar
conteúdos pertinentes aos Direitos Humanos por meio de métodos e materiais didáticos e
trabalhos em grupos em que os alunos são estimulados a refletir sobre seu papel social. No
entanto, a análise das emissões categorizadas demonstrou que a maioria dos professores não

bem como as estratégias para sua efetivação na sua área de docência.


O professor é um agente que está em contato direto com os alunos e desempenha, nesse
contexto, um indiscutível papel na formação integral do educando, assim, é necessário que
tenha uma formação humana, de modo a considerar e respeitar a dignidade de seus educandos
e, além disso, que saiba como trabalhar em sala de aula conteúdos alicerçados nos Direitos
Humanos, favorecendo uma formação crítica e responsável de seus alunos.
Em concordânci

sensível da humanidade, surge como um arco-íris que traz esperança após uma tempestade.

258
A Declaração prega a liberdade, defende o direito, clama por justiça, exige ética, propõe saídas,
pede compreensão, manifesta-se pelo amor, elenca sentimentos nobres- solidariedade, união,
fraternidade. Enfim, se seguida, reside na Declaração Universal dos Direitos Humanos um
sério e suficiente caminho para a real transformação da dura realidade em que vivemos. (Silva
in Castro 1999, p. 312).
Como fazer valer todos esses direitos, se a sociedade ainda se manifesta com tamanha
desigualdade social? Como sonhar com um mundo em que a paz não seja uma utopia, mas algo
concreto e tangível, se o olhar contempla competitividade e consumismo desenfreado, quando

O artigo XXV, afirma que temos o direito a um padrão de vida que assegure o bem-estar, a
alimentação, habitação, cuidados médicos e segurança, mas, como pontua Silva (in Castro
1999), se temos esse direito, a quem compete o dever?
Nesse contexto, desponta um novo horizonte, ainda que discretamente, e traz a esperança da
vida, do real significado do existir enquanto homem, enquanto indivíduo, que não jaz no
esquecimento de seus direitos, mas que prevalece em batalhar por cada um deles. A esperança
contida nos sonhos de infância pode ressurgir como a força de vontade presente na juventude
e nas experiências de vida em múltiplos âmbitos, como uma luta de todos e para todos, que se
fundamentará na reflexão estimulada em cada indivíduo sobre o real papel da escola e do
professor, que orientam e fazem a mediação do conhecimento não somente para a esfera
profissional, mas também para a vida.
Assim, a Educação em Direitos Humanos configura-se como uma das alternativas para a
constituição de espaços nos quais os conflitos devem ser solucionados por estratégias que
possibilitem o intercâmbio de saberes, vivências e ideias entre os atores do espaço escolar em
compromisso com a qualidade social.
Nesse sentido, a universidade tem como compromisso ofertar ao universitário uma formação
técnica e, ao mesmo tempo, humana, comprometida com o ser humano, sensível à dignidade e
a democratização nas relações sociais, bem como fomentar o desenvolvimento interpessoal de
seus alunos, os futuros profissionais da Educação. A universidade necessita refletir sobre
questões pertinentes a formação ampla, o que irá contribuir para a propagação de uma cultura
de paz na qual a convivência escolar permita o respeito não só às diferenças, mas aos direitos
de toda a comunidade escolar. Por fim, sugere-se que futuros projetos de intervenção no
Ensino Superior contemplem o desenvolvimento das relações interpessoais dos universitários,
sensibilizando-os para uma atuação docente pautada na justiça e na promoção da vida em sua
plenitude.
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261
PROGRAMA MINHA CASA MINHA VIDA: UMA POLÍTICA SOCIAL PÚBLICA EM PROL
DOS DIREITOS HUMANOS

138

Resumo: O presente artigo faz uma perquirição sobre o prisma da eficácia de políticas públicas
na efetivação dos direitos sociais, destacando-se o direito à moradia. Por meio do Direito,
ilustrado em suas fontes como os tratados e convenções internacionais de Direitos Humanos, e
levando em consideração as limitações do ordenamento jurídico pátrio, analisou-se como as
políticas sociais são fundamentais para a realização dos DIREITOS HUMANOS, NO QUE
TANGE AOS DIREITOS ECONÔMICOS, SOCIAIS E CULTURAIS, ALÉM DE examinar como
são aplicados os recursos destinados ao Programa Minha Casa Minha Vida para que seja
realizada a efetivação de direitos, como o de moradia, de forma concreta.
Palavras-chave: Direitos Sociais. Políticas Sociais Públicas. Moradia. Direitos Humanos.
INTRODUÇÃO
Os direitos sociais surgem como garantia para aqueles que são considerados os
hipossuficientes e a igualdade formal, àquela cuja não enxerga as diferenças, propiciada com a
primeira dimensão dos direitos humanos, já não é mais suficiente para atingir tais pessoas.
Desde então, surge à necessidade de por em prática esses direitos de extrema importância,
mas agora com base numa igualdade que trata os desiguais na medida da sua desigualdade, que
é a igualdade real. Em contrapartida, as promoções de políticas sociais públicas tornam-se
cada vez mais difíceis, já que muito se questiona a respeito da natureza jurídica dos direitos
sociais, tratando-os como normas de princípio programático e condicionando ao legislador
ordinário o dever de complementação para que a norma constitucional seja de fato aplicada.
Dessa forma, o Estado Brasileiro, como um ente social, busca trazer a efetividade desses
direitos, por meio das políticas sociais públicas. Para tanto, criou o Programa Minha Casa
Minha Vida, permitindo o acesso à casa própria por famílias que não possuíam condição,
garantindo que o direito à moradia, como um direito humano, pudesse vir a se concretizar.
No entanto, a dependência dos direitos sociais para com o legislador tornou a efetividade desse
programa um tanto quanto tardia, visto que o programa só passou a ser implementado em
2009, mesmo após 21 anos da Constituição Federal de 1988 e 17 anos após do Pacto
Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, promulgado em 1992, consagrar
o direito à moradia em seu texto. Com isso, torna-se importante a pesquisa documental e
bibliográfica acerca do tema, com o intuito de analisar como os direitos sociais, aqui o direito à
moradia, são entendidos e tratados pelo ordenamento interno e internacional. Compete
também verificar como a aplicabilidade do Programa Minha Casa Minha Vida, vem se

Graduandas em Direito pelo Centro Universitário Salesiano de São Paulo - Unisal


138
U.E. de Lorena (SP). E-mails:
dryfariav@gmail.com; luisaclaudiafsantos@hotmail.com.

262
desenvolvendo desde sua implantação até os dias de hoje, bem como seus reflexos na
sociedade.
A efetivação dos Direitos Sociais como Direitos Fundamentais e Direitos Humanos
Muitos dos direitos do homem139 foram conquistados através de lutas e movimentos históricos,
sendo considerados como grande triunfo àquela época, porém tais direitos estão longe de se
esgotarem. Atualmente, a cada direito e/ou garantia novo conquistado, mais uma luta é
vencida. Como José Afonso da Silva expõe:
...cada passo da Humanidade importa na conquista de novos direitos. Mais que conquista, o
reconhecimento desses direitos caracteriza-se como reconquista de algo que, em termos
primitivos, se perdeu, quando a sociedade se dividira entre proprietários e não proprietários
(2014, p.151).
A doutrina moderna apresenta uma divisão meramente didática sobre Direitos Humanos em
dimensões, tendo o objetivo de simplificar o estudo, delineando os momentos históricos que
foram criados e também seu conteúdo material. Essa proposta é atribuída a Karel Vasak 140, que
inspirado nos princípios da Revolução Francesa141, determinou as três primeiras dimensões:
Liberdade, Igualdade e Fraternidade. Paulo Bonavides (apud MAZZUOLI, 2015, p.53) se refere
ainda a uma quarta dimensão, onde estariam presentes, os direitos de Solidariedade. Sabemos
que todas as dimensões complementam-se para formarem as principais garantias da pessoa
humana (MAZZUOLI, 2015). Porém, para nosso estudo, daremos ênfase aos direitos de
igualdade ou direitos de segunda geração, conhecidos também como direitos econômicos,
sociais e culturais.
Segundo Mazzuoli (2015), tal geração iniciou-se no século XX, sendo introduzida após o
constitucionalismo no Estado Social142, atribuindo esses direitos a todo e qualquer ser humano.
Cabe ressaltar que tais direitos foram designados como programáticos, em virtude de não
possuírem as mesmas garantias de concretização e proteção dos direitos de primeira geração
ou de liberdade, ou seja, os direitos civis e políticos. Estes últimos foram instituídos em um
período onde se acreditava no ideal de Estado mínimo e só se fazia o suficiente para garantir a
liberdade do indivíduo contra o abuso do próprio Estado, em contraposição ao regime

139
-se de uma expressão jusnaturalista que conota a série de direitos naturais, (ou seja, ainda não positivados)

140
Karel Vasak é um jurista tcheco que contribuiu para a elaboração da Declaração Universal dos Direitos
Humanos. Ficou conhecido por criar a Teoria das Gerações de Direitos Humanos, que teve por base, o lema da
Revolução Francesa (DIÓGENES JÚNIOR, [20--]).
141
Movimento histórico, social e político ocorrido na França que buscou romper com o regime absolutista, baseado

ocidental, pois a formação de uma Assembleia Constituinte deu origem a um dos mais importantes documentos da
história: Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão (FABER, [20--]a).
Modelo de Estado voltado à satisfação das necessidades individuais e coletivas dos cidadãos (NOVELINO, 2012, p.
142

43-44).

263
absolutista. Foi durante a Revolução Industrial143 que surgiram os movimentos reivindicatórios
dos operários anos mais tarde, devido aos grandes problemas sociais e econômicos, como a
desigualdade. Estabeleceram-se então os Direitos Sociais e uma nova concepção de Estado de
Bem Estar Social144.
Garantidos como direitos fundamentais no plano interno e como direitos humanos no plano
externo, os direitos sociais tem destaque na doutrina, sendo consolidados como direitos
fundamentais do homem, e com isso vêm ganhando cada vez mais notoriedade através da
efetivação das políticas sociais públicas. Como se sabe, esses direitos não são exclusivamente
questões de plano interno e passaram a ser interesse de toda a comunidade internacional.
Inicia-se este estudo então, pela definição de direitos sociais no âmbito interno.
Sempre tratando de direitos que visam trazer algum benefício para a sociedade, sua efetivação
tem fundamento constitucional. Logo, seus alicerces estão nos princípios gerais do Direito
para que sejam cumpridos, sempre se empenhando na busca pela justiça. Neste sentido, Uadi
Bulos (2015) disserta:
Direitos sociais são as liberdades públicas que tutelam os menos favorecidos, proporcionando-
lhes condições de vida mais decentes e condignas com o primado da igualdade real.
Funcionam como lídimas prestações positivas, de segunda geração, vertidas em normas de
cunho constitucional, cuja observância é obrigatória pelos Poderes Públicos. Tais prestações
qualificam-se como positivas porque revelam um fazer por parte dos órgãos do Estado, que
têm a incumbência de realizar serviços para concretizar os direitos sociais (BULOS, 2015,
p.809, grifo nosso).
De forma ainda mais clara, José Afonso da Silva conceitua direitos sociais como:
[...] prestações positivas proporcionadas pelo Estado direta ou indiretamente, enunciadas em
normas constitucionais, que possibilitam melhores condições de vida aos mais fracos, direitos
que tendem a realizar a igualização de situações sociais desiguais. São, portanto, direitos que
se ligam ao direito de igualdade. Valem como pressupostos do gozo dos direitos individuais na
medida em que criam condições materiais mais propícias ao auferimento da igualdade real, o
que, por sua vez, proporciona condição mais compatível com o exercício efetivo da liberdade
(SILVA, 2014, p. 288-289, grifo nosso).

143
A Revolução Industrial teve início na Inglaterra do século XVIII, onde houve a transição dos mecanismos de
produção. Passou-se a utilizar máquinas, que geram mais lucro e menos despesas ao patronato. Devido às condições
sub-humanas em que se encontravam os trabalhadores, neste momento histórico, surgiram os movimentos
reivindicatório dos trabalhadores, que foram decisivos para o surgimento do Estado de Bem-Estar Social (FABER,
[20--]b).
A doutrina não faz diferença entre o Estado Social e o Estado de Bem Estar Social, conhecido também como
144

Welfore State (NOVELINO, 2012, p. 43-44).

264
No plano interno, a Constituição Federal de 1988 assegura tais direitos em diversas partes do
seu texto. Ganha maior destaque, o artigo 6º que determina:
São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o
lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos
desamparados, na forma desta Constituição.
Tais direitos têm disposições específicas ao longo do conteúdo dogmático de nosso texto
Constitucional, o que traz ao legislador a obrigação de dar efetividade a estes princípios
programáticos.
Scaff; Romboli; Revenga (2010) afirmam que este extenso rol de direitos sociais nos leva à
constatação de que estes direitos não possuem um núcleo jurídico unitário, mas heterogêneo,

Sua finalidade, portanto, é de assegurar a igualdade real.


No âmbito internacional, em 1945 com o advento da Carta das Nações Unidas, os direitos
humanos e liberdades fundamentais para todos foram internacionalizados e passaram a ter a
proteção universal merecida, baseado na cooperação internacional.145 Embora, a Carta não
tenha precisamente definido o conteúdo dos direitos humanos, mais tarde o Conselho
Econômico e Social da Organização das Nações Unidas (ONU) criou a Comissão de Direitos
Humanos, com o objetivo de corrigir essa fragilidade. Em 1948, foi proclamada a Declaração
Universal dos Direitos Humanos, que elencou diversos direitos humanos e liberdades
fundamentais inerentes a toda pessoa humana. Foi neste diploma legal que os direitos sociais,
bem como econômicos e culturais, passaram a ser reconhecidos (artigos. 16, inc. 3; 22 ao 28).
Em seu artigo 22ª dispõe:
Toda a pessoa, como membro da sociedade, tem direito à segurança social; e pode
legitimamente exigir a satisfação dos direitos econômicos, sociais e culturais indispensáveis,
graças ao esforço nacional e à cooperação internacional, de harmonia com a organização e os
recursos de cada país.
A Declaração uniu o discurso liberal do valor à liberdade ao discurso social do valor a
igualdade, pós um período de preocupações com estes direitos e garantias. Esta contemplou os
direitos mínimos a serem garantidos pelos Estados, mas sem trazer em seu texto os
instrumentos e meios necessários para a fiscalização, bem como para que se pudessem
vindicar mais tarde os direitos assegurados. Com isso, procurou-se firmar pactos e convenções
internacionais com a finalidade de dar operatividade técnica aos direitos nela previstos.
Dentre os quais o Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (PIDESC)
aprovado pela Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas, em Nova York, em 16 de
dezembro de 1966 (MAZZUOLI, 2015, p.98). É neste pacto que direitos como ao trabalho, à

145
Seu art. 55 dispõe que a ONU "promoverá o respeito universal aos direitos humanos e às liberdades fundamentais
de todos, sem fazer distinção por motivos de raça, sexo, idioma ou religião, e a efetividade de tais direitos e
liberdades" (BRASIL, 1945).

265
educação, à saúde, à previdência, à moradia, à cultura, e outros vêm muito mais detalhados,
elaborados e aperfeiçoados, além dos novos direitos incorporados em seu texto. O Brasil foi
um dos países que o aprovou e promulgou, através do Decreto Legislativo n.º 226, de 112 de
dezembro de 1991 e do Decreto n.º 591, de 06 de julho de 1992, respectivamente.
Há também que se falar dos Sistemas Regionais de proteção aos direitos humanos: o Europeu,
o Interamericano e o Africano, cada qual com suas características e especificidades próprias. O
Brasil se encontra no Sistema Interamericano, sendo um dos Estados-membros da
Organização dos Estados Americanos (OEA) que tem por instrumento a Convenção
Americana de Direitos Humanos, também conhecido como Pacto de San José da Costa Rica,
celebrado em 1969. Esse pacto possui função de proteção complementar ao direito interno de
cada Estado-parte, ou seja, cada Estado possui competência primária para proteger e amparar
toda e qualquer pessoa dentro de sua jurisdição, mas que nos casos da falta de proteção e/ou
preservação ou até mesmo violação de direitos e garantias previstos na Convenção, por parte
de um indivíduo ou do Estado, o sistema interamericano pode vir a atuar de modo coadjuvante
para isso, após já ter dado a chance do Estado de agir (MAZZUOLI, 2015, p.98).
É em seu artigo 26, que a Convenção traz expressamente a proteção aos Direitos Sociais:
Os Estados Partes comprometem-se a adotar providências, tanto no âmbito interno como
mediante cooperação internacional, especialmente econômica e técnica, a fim de conseguir
progressivamente a plena efetividade dos direitos que decorrem das normas econômicas,
sociais e sobre educação, ciência e cultura, constantes da Carta da Organização dos Estados
Americanos, reformada pelo Protocolo de Buenos Aires, na medida dos recursos disponíveis,
por via legislativa ou por outros meios apropriados.
O Estado fica então, obrigado a desenvolver os direitos sociais. Porém, a Convenção prevê
genericamente quais seriam esses direitos de cunho econômico, social e cultural. Dessa forma,
para a garantia de tais direitos foi adotado um Protocolo Adicional à Convenção Americana ou
Protocolo de San Salvador de 1988, entretanto, a pouca adesão ao protocolo revelou a
dificuldade de tratar de matéria de direitos econômicos, sociais e culturais dentro de cada país.
Para Canotilho (2003), os direitos econômicos, sociais e culturais estão estritamente ligados
aos pressupostos dos direitos fundamentais. Esses pressupostos consideram uma
multiplicidade de fatores, ou seja, capacidade econômica do Estado, clima espiritual da
sociedade, estilo de vida, criatividade cultural, distribuição de bens, nível de ensino,
desenvolvimento econômico, entre outros. Porém, quando se trata de direitos sociais, estes
três últimos tem grande importância para sua efetividade.
Essa dificuldade de realização plena desses direitos está relacionada com ao fato de que tais
garantias pressupõem a existência de recursos financeiros para sua efetivação, o que se sabe
que não está ao alcance de todos os Estados, ou então simplesmente não é bem administrado.
Logo, pode-se afirmar que:

266
Os direitos sociais gozam de um nível de proteção menor que os direitos civis e políticos, e isto
estaria justificado porque os juízes não podem determinar a atuação do poder político
(legislativo e executivo), os únicos capazes de comprometer recursos para a satisfação das
prestações socia
(SCAFF; ROMBOLI; REVENGA , 2010, p.73).
É por esse motivo, que esses direitos têm a imputação de caráter programático, devido à
forma com que estão conjecturados no conteúdo dogmático146 das Constituições. Tais direitos
não geram compromisso ou dever vinculante algum a cargo do poder legislativo ou até mesmo
do poder executivo e, como consequência, sua implementação também não é imperativa. No
Brasil há divergências que José Afonso da Silva explica:
A eficácia e aplicabilidade das normas que contêm os direitos fundamentais dependem muito
de seu enunciado, pois se trata de assunto que está em função do Direito positivo. A
Constituição é expressa sobre o assunto, quando estatui que as normas definidoras dos direitos
e garantias fundamentais têm aplicação imediata. Mas certo é que isso não resolve todas as
questões, porque a Constituição mesma faz depender de legislação ulterior a aplicabilidade de
algumas normas definidoras de direitos sociais, enquadrados de direitos fundamentais. Por
regra, as normas que consubstanciam os direitos fundamentais democráticos e individuais são
de eficácia contida e aplicabilidade imediata, enquanto as que definem os direitos econômicos
e sociais tendem a sê-lo também na Constituição vigente, mas algumas, especialmente as que
mencionam uma lei integradora, são de eficácia limitada, de princípios programáticos e de
aplicabilidade indireta, mas são tão jurídicas como as outras e exercem relevante função,
porque, quanto mais se aperfeiçoam e adquirem eficácia mais ampla, mais se tornam garantias
de democracia e do efetivo exercício dos demais direitos fundamentais (2014, p.182, grifo
nosso).
A grande questão é: como garantir esses direitos? Sua efetivação está diretamente ligada com a
disponibilidade econômica de um país e seu serviço público. Em outras palavras, está
subordinada à elaboração de políticas sociais, sendo esta a única garantia que a sociedade
possui para a consumação de seus direitos, tal como o direito a moradia. É importante
ressaltar, que estando estes direitos inseridos no artigo 6º da Constituição, não se pode
considerar como se de menor expressão fosse do que os elencados no artigo 5º, pois sua
relevância da mesma forma é qualificada como imprescindível, irrenunciável, inviolável,
universal e, sobretudo, dotada de efetividade (VIANA, 2000, apud NOLASCO, 2008, p.33).
O Direito à Moradia e sua inserção no Direito Constitucional Brasileiro
Desde a Declaração Universal dos Direitos Humanos, os direitos econômicos, sociais e
culturais, dentre eles o direito à moradia, aparecem expressamente em seu texto. Foi a partir

146
O conteúdo dogmático das constituições é elaborado a partir dos dogmas ou ideias fundamentais da teoria
política e do direito que eram imperantes à época com que esta é promulgada (PAULO; ALEXANDRINO, 2011).

267
do artigo 25, item 1, da Declaração147 que este direito passou a ser objeto de reconhecimento
expresso em diversos documentos, como no Comitê de Direitos Econômicos, Sociais e
Culturais das Nações Unidas, que em sua Observação Geral nº 4, pronuncia-se sobre o Direito
a uma habitação condigna:
O direito a uma moradia adequada significa dispor de um lugar onde se possa asilar, caso o
deseje, com espaço adequado, segurança, iluminação, ventilação, infraestrutura básica, uma
situação adequada em relação ao trabalho e o acesso aos serviços básicos, todos a um custo
razoável." (apud, PANSIERI,2012, p.22, grifo nosso).
O direito à moradia traduz a necessidade primária do homem, um direito natural do indivíduo,
condição indispensável para uma vida digna e para a proteção de outros direitos como à vida, à
saúde e à liberdade (NOLASCO, 2008). Trata-se este de um direito erga omnes148 que está
intimamente ligado com o princípio da dignidade da pessoa humana, considerado basilar para
todo e qualquer preceito e por isso explícito na Constituição Federal de 1988 como
fundamento da República Federativa do Brasil.149. Como demonstrado em diversas doutrinas
constitucionais, para que se dê ensejo a esse princípio o Estado fica obrigado a criar condições
para seu o pleno exercício e gozo, e sendo o direito à moradia um lugar íntimo de
sobrevivência e subsistência humana, fica claro o vínculo de dependência entre todos os
direitos. É por essa razão que a Comissão da Organização das Nações Unidas (ONU) aponta
diretrizes e elementos básicos para a efetividade de ambos os direitos:
I) Segurança jurídica para a posse, independentemente de sua natureza e origem; II)
Disponibilidade de infraestrutura básica para a garantia da saúde, segurança, conforto e
nutrição dos titulares do Direito (acesso à água potável, energia para preparo da alimentação,
iluminação, saneamento básico, etc.) III) As despesas com a manutenção da moradia não
podem comprometer a satisfação de outras necessidades básicas; IV) A moradia deve oferecer
condições efetivas de habitabilidade, notadamente assegurado a segurança física aos seus
ocupantes; V) Acesso em condições razoáveis à moradia, especialmente para os portadores de
deficiência; VI) A moradia e o modo de sua construção devem respeitar e expressar a
identidade e diversidade cultural da população (apud, PANSIERI, 2012, p.27).
Como o Comitê de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais das Nações Unidas em sua
Observação Geral nº 3 expressa, existe um núcleo mínimo obrigatório que o Estado deve

147

família a saúde e o bem-estar, principalmente quanto à alimentação, ao vestuário, ao alojamento, à assistência


médica e ainda quanto aos serviços sociais necessários, e tem direito à segurança no desemprego, na doença, na
invalidez, na viuvez, na velhice ou noutros casos de perda de meios de subsistência por circunstâncias
8).
148

Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito
149

Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: III - a dignidade da pessoa
humana (BRASIL, 1988).

268
cumprir com relação a este direito e que a existência de um número significativo de pessoas
privadas a esse direito básico à moradia reflete o descumprimento do Estado com suas
obrigações assumidas nos termos do Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e
Culturais, no qual seu artigo 2º, item 1, assegura esse dever (WLASIC, 2011).
Na doutrina brasileira, o direito à moradia é pouco explorado, já que existem divergências
sobre sua aplicabilidade. Ao que parece, tal direito é inserido no rol de garantias e direitos
fundamentais, devido à estruturação do texto constitucional, juntamente com artigo 6º,
inserido no Título II da Constituição Federal de 1988. Neste sentido, in foro domestico, o
direito à moradia ganha significação e conteúdo, dado por José Afonso da Silva:
O direito à moradia significa ocupar um lugar como residência; ocupar uma casa, apartamento
encontramos a ideia básica da habitualidade no
permanecer ocupando uma edificação, o que sobressai com sua correlação com o residir e o
habitar, com a mesma conotação de permanecer ocupando um lugar permanentemente. O
direito à moradia não é necessariamente direito à casa própria. Quer-se que se garanta a todos
um teto onde se abrigue com sua família de modo permanente, segundo a própria etimologia

obtenção da casa própria pode ser um complemento indispensável para a efetivação do direito
à moradia (SILVA, 2014, p.318, grifo nosso).
Como sustentáculo do Estado Social, a efetividade dos direitos sociais torna-se prioridade,
devido ao compromisso que foi celebrado com seu povo. No texto constitucional, o direito à
moradia foi introduzido no rol dos direitos sociais através da Emenda Constitucional Nº 26 de
14/02/2000 que alterou seu artigo 6º. Destarte, José Afonso da Silva explica que:
O direito à moradia já era reconhecido como uma expressão dos direitos sociais por força
mesmo do disposto no art.23, IX, segundo o qual é da competência comum da União, Estados,

condições habitacionai -dever do Poder Público


que implicava a contrapartida do direito correspondente a tantos quantos necessitem de uma
habitação. Essa contrapartida é o direito à moradia que agora a EC-26 de 14.2.2000, explicitou
no art.6º (SILVA, 2014, p.318).
Por essa razão, pode-se afirmar que quando um direito possui eficácia subordinada aos
investimentos públicos, estes não são contemplados integralmente, sendo realizados de acordo
com as possibilidades econômicas de cada Estado. Surge então, de forma condicionante à
realização desses direitos sociais a chamada Reserva do Possível, ou seja, a promoção desses
direitos sociais está submetida ao nível de desenvolvimento econômico, social, cultural e
científico do país. É por este motivo que se diz que os Direitos Sociais são de satisfação
progressiva. Porém, isto não significa que tais garantias só existirão de acordo com os recursos

269
disponibilizados pela administração, mas sim no que nossa carta constitucional determina
como o mínimo, além da impossibilidade do retrocesso social150 (PANSIERI, 2012).
Em comparação às duas primeiras dimensões dos direitos humanos, e seus efetivos custos
gerados para o Estado, J.J. Gomes Canotilho questiona:
Quais são, no fundo, os argumentos para reduzir os direitos sociais a uma garantia
constitucional platónica? Em primeiro lugar, os custos dos direitos sociais. Os direitos de
liberdade não custam, em geral, muito dinheiro, podendo ser garantidos a todos os cidadãos
sem se sobrecarregarem os cofres públicos. Os direitos sociais, pelo contrário, pressupõe
grandes disponibilidades financeiras por parte do Estado. Por isso, rapidamente se aderiu à
construção dogmática da reserva do possível para traduzir a ideia de que os direitos sociais só
existem quando e enquanto existir dinheiro nos cofres públicos (2003, p.481).
O professor português ainda completa esta reflexão com outra lição tratando a respeito do
caráter subjetivo dos direitos sociais e sua relação com o Estado:
Os direitos sociais são compreendidos como autênticos direitos subjectivos inerentes ao
espaço existencial do cidadão, independentemente da sua justicialidade e exequibilidade
imediatas. [...] Nem o Estado nem terceiros podem agredir posições jurídicas reentrantes no
âmbito de proteção destes direitos (CANOTILHO, 2003, p. 476).
Não obstante, cabe ressaltar, que o Estado nunca foi o único e maior inimigo das liberdades e
dos direitos fundamentais em geral. A falta de cumprimento desses direitos se dá também
devido à globalização econômica, privatizações, aumento no nível de exclusão e, além disso, o
aumento do poder exercido pelas grandes corporações sejam elas internas ou transnacionais
(SARLET, 2011).
Políticas Sociais Públicas: Uma garantia de igualdade real?
O direito à moradia, como todas as garantias fundamentais, necessita de uma atuação positiva
do Estado para obter plena efetividade. É por essa razão que os instrumentos de maior alcance
prático são as políticas sociais públicas, que se tornaram imprescindíveis para o
desenvolvimento de toda a nação, requerendo sempre grandes esforços do poder político, e
concomitantemente do poder social.
Antonia Teresinha de Oliveira (2005) conceitua políticas públicas como programas e ações
desenvolvidos pelo Estado em cooperação com outras pessoas físicas ou jurídicas, que visem à
preservação da vida humana, a promoção educacional, política, cultural e social que tenha por
fim a promoção da dignidade da pessoa humana em todos os níveis, bem como a promoção do
grupo social, da educação individual e coletiva, da promoção do meio ambiente sadio, da saúde
e da moradia, sem prejuízos de outros para a persecução de finalidades específicas, definidas e
expressas como valores, objetivos, programas e ações essenciais do Estado.

Princípio que impede o Estado de atentar contra os direitos sociais de seus cidadãos, seja de forma que retroceda
150

ou suprima-os (PANSIERI, 2012).

270
As políticas sociais públicas são de fato consideradas instrumentos que atuam em prol da
realização de uma igualdade real. Robert Alexy (2011), explica que o Tribunal Constitucional

igual dev
suficientes para a permissibilidade do tratamento desigual. Neste sentido, o estudo de caso
tornou-se essencial para a aplicação desta máxima, que é o nosso ideal de justiça. Na visão
aristotélica, a justiça é um meio-termo, que ao contrário de outras virtudes, só possui um
único oposto em seus dois extremos, a injustiça. Para melhor entendimento do conceito de
Justiça, a concepção de Aristóteles é pertinente:
A justiça é uma disposição segundo a qual o homem justo é definido como aquele que está apto
a realizar, por escolha deliberada, o que é justo, e quando se trata de efetuar uma divisão, seja
entre ele mesmo e outra pessoa, seja entre duas outras pessoas, não é homem para atribuir a si
mesmo, no bem desejado, uma parte maior para si e uma menor ao seu próximo (ou inverso,
se trata do que não convém), mas dá a cada um a parte proporcionalmente igual e que lhe
convém, e age da mesma maneira quando a partilha se faz entre terceiros. A injustiça, por
outro lado, tem igual relação ao que é injusto, e consiste em um excesso ou uma deficiência
desproporcional do que é vantajoso ou prejudicial (2015, p.137).
Adstrito ao ideal modelo de Estado de Bem-Estar Social introduziu-se esse conceito de
igualdade real, onde a proteção aos hipossuficiente se tornou mais do que necessárias e
procurou-se garantir a todos o acesso aos direitos e garantias fundamentais. Em outras
palavras, a real operacionalização da igualdade, diferentemente daquela noção meramente

profundos, mantidos em nome da liberdade, e a impossibilidade prática de acesso aos bens


produzidos pela sociedade tornavam impossíveis, para muitos, o próprio exercício dos direitos

sobre a sociedade para o estabelecimento de políticas públicas que venham a efetivar os


valores postos na Constituição Federal de 1988, tendo estes como objetivos a serem atingidos
(SCAFF; ROMBOLI; REVENGA; 2010). Tais valores, muitas vezes, carecem da concretização
devida, pois como Elaine Behring explica:
O que existiu ao longo desses últimos anos, na verdade, foi um crescimento vegetativo e
insuficiente do investimento do Estado em políticas públicas fundamentais com o que o
governo procurou assentar seu compromisso com o social enquanto a crise fiscal é
aprofundada por custos com um setor parasitário (2008, p. 280).
Retorna-se, mais uma vez, à questão da atuação estatal na efetivação dos direitos. Além da
questão financeira, há também problemas em regulamentação normativa, visto que a
Constituição advém de um Poder Constituinte Originário, emanado pelo povo e, por ser um
poder de fato, também é ilimitado já que não tem nenhum vínculo com o ordenamento
jurídico anterior, tendo a faculdade de criar quaisquer direitos. Assim que os direitos são
promulgados, o incumbido de dar complementação às normas é o legislador ordinário, quem
271
na maioria das vezes deixa de cumprir com seu dever de ação, omitindo-se. Sobre este
sucedido, Canotilho disserta que:
Uma das maiores dificuldades surgidas na determinação dos elementos constitutivos dos
direitos fundamentais é esta: os direitos sociais só existem quando as leis e as políticas sociais
os garantirem. Por outras palavras: é o legislador ordinário que cria e determina o conteúdo de
um direito social (2003, p.480-481, grifo nosso).
O grande problema inerente às políticas sociais públicas, é que elas entram em um cenário
caracterizado por discursos ideológicos, sendo consideradas como paternalistas, geradoras de
desequilíbrio, com custo excessivo do trabalho e acessadas através do mercado. Logo, deixam
de ser um meio de realização dos direitos sociais e aos poucos podemos perceber que o Estado
vai deixando de se responsabilizar e de atuar minimamente para os trabalhadores. Deve-se
ainda considerar que a degradação dos serviços públicos e o corte com os gastos voltados aos
direitos sociais acarreta uma privatização desses tipos de serviços, ou seja, políticas sociais
públicas são transformadas apenas em negócios e o Estado deixa de proporcionar condições
materiais para o pleno exercício da cidadania, só permitindo o desenvolvimento integral da
pessoa humana exclusivamente àqueles que possuem situação financeira elevada. Logo, aquele
(Estado) que deveria trabalhar para diminuir as desigualdades sociais acaba por aumentá-las
(BEHRING, 2008).
ão dos direitos programáticos?
No estudo sobre a classificação das constituições, surge na doutrina moderna um novo sentido
de Constituição, a chamada Constituição Dirigente. Este modelo pretende dirigir a ação
governamental do Estado, significando, então, que o texto constitucional seria uma lei
material, que tem por finalidade preordenar os programas a serem realizados, com objetivos e
princípios de transformação econômica e social (BULOS, 2015).
A respeito desta concepção, Canotilho (2003) critica a forma com que essas normas de caráter
programático são promulgadas, para assumirem um papel de mera pressão política. A seguir, o
entendimento do autor:
As normas consagradoras de direitos sociais, económicos e culturais são, segundo alguns
autores, normas programáticas. As constituições condensam, nestas normas programáticas,
princípios definidores dos fins do Estado, de conteúdo eminentemente social (cfr. artigo 9º). A
relevância delas seria essencialmente política, pois servem apenas para pressão política sobre
os órgãos competentes. Todavia, sob o ponto de vista jurídico, a introdução de direitos sociais
nas vestes de programas constitucionais, teria também algum relevo. Por um lado, através das
normas programáticas pode obter-se o fundamento constitucional da regulamentação das
prestações sociais e, por outro lado, as normas programáticas, transportando princípios
conformadores e dinamizadores da Constituição, são susceptíveis de ser trazidas no momento
de concretização (2003, p.474 475, grifo nosso).

272
Tendo como base as garantias constitucionais já tratadas anteriormente, o Governo Federal
deu inicio no ano de 2009, ao programa nacional de habitação Minha Casa Minha Vida, que
tem o escopo de garantir a população de baixa renda o acesso à casa própria. Entretanto, no
início de 2017 o Governo Federal anunciou novas regras ao programa que não era alterado
desde 2015. Hoje, o financiamento pelo programa tornou-se mais abrangente, com relação ao
enquadramento por faixa de renda, e também mais flexível, com o fim de trazer um resultado
imediato e um número maior de acesso de brasileiros ao programa habitacional, conforme
anúncio do Portal Planalto151.
Para conseguir o financiamento pelo programa é necessário cumprir uma série de requisitos,
dentre elas, se encaixar na renda estipulada. Para isso são divididas nas chamadas faixas: a
Faixa 1 são as destinadas a famílias com uma renda bruta mensal de até R$1,8mil, podendo,
portanto, receberem benefícios de financiamento, sendo eles custeados em até 90% no valor
do imóvel pelo programa; Faixa 1,5, criada agora, são para as famílias de renda bruta mensal de
até R$2,6 mil, possuindo uma taxa de juros de até 5%; Faixa 2 se destina a família com renda
bruta mensal de até R$4 mil, no qual o juros varia de 5,5% até 7%; Faixa 3 são para as famílias
com renda bruta mensal de até R$9 mil, variando também o juros entre 8,16% e 9,16%. Se
analisados com o valor custeado antes, o Governo calculou cerca de 7,69% de reajuste e os
juros aplicados ainda assim continuam menores do que os de mercado152.
Subdivide-se o programa em mais duas outras modalidades, sendo uma voltada para a
habitação urbana e a outra para a habitação rural. O financiamento é feito pelas agências da
Caixa Econômica Federal e pelo Banco do Brasil, no qual o próprio imóvel é dado como
garantia, não estando este sujeito a nenhum tipo de alienação enquanto o financiamento não
for quitado. Entretanto, caso haja o descumprimento de alguma cláusula contratual isso pode
acarretar a perda do imóvel.
É importante ressaltar que com essas novas mudanças o Governo Federal também inseriu
novas prioridades ao programa, estipulando em seu artigo 3º, inciso III, IV e V, para àquelas
famílias residentes em áreas de riscos, insalubres, que tenham sido desabrigadas ou que
perderam a moradia em razão de infortúnios como alagamentos, enchentes, transbordamentos
e outros, também para as famílias com mulheres responsáveis pela unidade familiar e famílias
de que façam parte pessoas com deficiência (BRASIL, 2009).
Além de atender os limites de renda, os beneficiários do programa não podem: possuir imóveis
ou ter outro tipo de financiamento de imóvel residencial; ter recebido beneficio de outro
programa habitacional do governo federal; estarem cadastrados no Sistema Integrado de

As regras para enquadramento por faixa de renda sofreram alterações, e se tornaram mais amplas. O Governo
151

Federal tem como meta entregar 610 mil unidades no ano de 2017. (BRASIL, 2017a). Disponível em:
<http://www2.planalto.gov.br/acompanhe-planalto/noticias/2017/02/entenda-as-novas-regras-do-minha-casa-
minha-vida> Acesso em: 02 mar. 2017.
152
Dados coletados do site da Caixa Econômica Federal. (BRASIL, 2017) Disponível em:
<http://www20.caixa.gov.br/Paginas/Noticias/Noticia/Default.aspx?newsID=4550>. Acesso em: 2 mar. 2017.

273
Administração de Carteiras Imobiliárias e/ou Cadastro Nacional de Mutuários; e ter débitos
com o Governo Federal153.
O programa é assistido pela Secretaria Nacional de Habitação que é responsável por
instrumentos para a implementação da Política Nacional de Habitação, que tem como
principal objetivo promover a universalização do acesso à moradia. Sua previsão legal é dada
pela Lei nº11. 977 de 07 de Julho de 2009, que dispõe sobre suas diretrizes e bases. O próprio
diploma legal autolimita sua efetividade ao que diz respeito ao orçamento da União, e aos
poderes do Executivo de dar efetividade a esta política pública. Tais condições, como já visto
anteriormente, estão atreladas à Reserva do Possível:
Art. 2o Para a implementação do PMCMV154, a União, observada a disponibilidade
orçamentária e financeira: I - concederá subvenção econômica ao beneficiário pessoa física no
ato da contratação de financiamento habitacional; II participará do Fundo de Arrendamento
Residencial (FAR), mediante integralização de cotas e transferirá recursos ao Fundo de
Desenvolvimento Social (FDS) [...] (grifo nosso).
Art. 8o Caberá ao Poder Executivo a regulamentação do PNHU155, especialmente em relação:
à distribuição regional dos recursos e à fixação dos critérios complementares de
distribuição desses recursos; III aos valores e limites máximos de subvenção; IV ao
estabelecimento dos critérios adicionais de priorização da concessão da subvenção econômica;
e V ao estabelecimento das condições operacionais para pagamento e controle da subvenção
econômica.
Já que a realização das normas programáticas depende da ação do legislador ordinário, pode-se
afirmar que, neste caso, ele cumpriu com sua função. O problema acerca da promoção de
todas as políticas públicas, como foi abordado, realmente é a disponibilização de verbas pelo
Executivo, que, ao menos para o direito à moradia, cumpre com a função na medida do
possível.
Os resultados do programa são bastante expressivos. Efetivamente, esta política pública
garantiu, segundo dados fornecidos pelo Governo Federal, cerca de 2,4 milhões de unidades
habitacionais entregues em todo o país, que tiveram um investimento de R$270 bilhões, desde
o seu início no ano de 2009, que transformou a vida de 9,2 milhões de pessoas (BRASIL, 2015).
Esse programa gerou reflexos positivos à população brasileira, já que sua maior parte está
submersa em suas mazelas sociais. O fato de conseguir obter uma casa própria e ter uma
habitação digna é, de fato, o início da realização dos direitos humanos, ou seja, de tirá-los do
papel e torná-los realidade.

153
Estas restrições podem ser encontradas no site do Ministério das Cidades (BRASIL, 2016). Disponível em:
<http://www.cidades.gov.br/habitacao-cidades/programa-minha-casa-minha-vida-pmcmv>. Acesso em: 02 mar.
2017.
154
Programa Minha Casa Minha Vida.
155
Programa Nacional de Habitação Urbana.

274
Considerações Finais
A ciência do Direito busca como primórdio a dignidade da pessoa humana, que independente
de sua nacionalidade, crença, sexo, opinião política ou qualquer outra natureza, tem a
capacidade de gozar de direitos e liberdades previstos na Declaração Universal de Direitos
Humanos156. Tais direitos não têm somente previsão expressa em âmbito internacional, mas
também na Constituição Federal de 1988, reforçando seu caráter obrigatório.
Infelizmente, ainda há um probl
comunidade internacional de possuir maior tolerância para a violação de direitos econômicos,
sociais e culturais em relação aos direitos civis e políticos. Por essa razão, a luta para sua
aplicabilidade e acionabilidade ainda é tão árdua. Com isso, para a concretização desses
direitos, tidos como objetivo num Estado de Bem-Estar Social, torna-se de extrema
importância um conhecimento mais aprofundado e um juízo de valor mais disseminado sobre
os direitos e os instrumentos que viabilizam esses direitos.
O fato é que, como já mencionado, para que estes direitos sejam invocados,
independentemente de sua natureza, sendo direitos de primeira, de segunda, ou qualquer
outra dimensão, seu cumprimento, ainda sim, deveria ser obrigatório dentro do ordenamento
jurídico brasileiro, podendo ser acionados a qualquer momento, sem exceção. Para isso, um
meio de facilitação da efetividade dos direitos são as políticas sociais públicas, que exigem uma
ação positiva do Estado, que proporciona ao povo a realização de direitos básicos, como o
direito à moradia digna.
Ter um lugar para habitar e neste permanecer para que suas necessidades sejam satisfeitas
trata-se de algo fundamental à condição humana, o que o programa Minha Casa Minha Vida
pretende executar com tal propósito, levando ao mais carente a possibilidade da realização,
não só de um direito, mas sim de um sonho de vida, um passo que o Brasil está tentando
alcançar, mesmo em tempos de crise. Todavia, ainda há muito que se conquistar para que seu
cumprimento seja pleno, sendo que um dos caminhos pode ser atribuir maior efetividade á
direitos de tamanha importância na sociedade, como os direitos sociais.
Referências
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ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. Tradução de Luciano Ferreira de Souza. São Paulo: Martin
Claret, 2015.

156
Art. 1º da Declaração Universal dos Direitos Humanos - Todo ser humano tem capacidade para gozar os direitos e
as liberdades estabelecidos nesta Declaração, sem distinção de qualquer espécie, seja de raça, cor, sexo, idioma,
religião, opinião política ou de outra natureza, origem nacional ou social, riqueza, nascimento, ou qualquer outra
condição (DECLARAÇÃO Universal dos Direitos Humanos, 1948).

275
AULA nº 244. 2011. Disponível em:
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qual faz parte integrante o anexo Estatuto da Corte Internacional de Justiça, assinada em São
Francisco, a 26 de junho de 1945, por ocasião da Conferência de Organização Internacional das
Nações Unidas. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1930-
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278
ALIENAÇÃO PARENTAL: BREVE ANÁLISE À LUZ DA GARANTIA DOS DIREITOS
FUNDAMENTAIS DAS CRIANÇAS E ADOLESCENTES
157

158

RESUMO: O presente trabalho cuida de fazer análise da alienação parental à luz da violação
dos direitos humanos fundamentais das crianças e dos adolescentes. Para tanto, inicia com
breve digressão histórica acerca dos direitos das crianças e adolescentes, faz breve abordagem
do Estatuto da Criança e do Adolescente e culmina no tratamento brasileiro da alienação
parental, sem deixar de fazer menção à Síndrome de Alienação Parental, que ocasiona
consequências graves à formação psicológica da criança ou adolescente.
PALAVRAS-CHAVE: Alienação; Direitos Fundamentais; Crianças; Adolescentes; Família.
ABSTRACT: This work is going to do analysis of parental alienation in the light of the violation
of fundamental human rights of children and adolescents. Therefore, start with a brief
historical digression about the rights of children and adolescents, does soon approach the
Statute of Children and Adolescents and culminates in Brazilian treatment of parental
alienation, while making mention of Parental Alienation Syndrome, which causes serious
consequences to the psychological training of the child or adolescent.
KEYWORDS: Alienation; Human Rights; Children; Adolescents; Family.
INTRODUÇÃO
Direitos Humanos são garantias inerentes à existência da pessoa humana, tidos como
verdadeiros por todos os Estados e positivados por instrumentos de Direito Internacional
Público. No entanto, tais direitos, em decorrência de questões instrumentais, no plano
internacional não alcançam toda a sua eficiência (garantia de uma ação processual em juízo,
por exemplo), vez que necessitam de guarida constitucional para se tornarem direitos
fundamentais (positivados), adquirindo, assim, sua necessária eficácia, e se tornando

os torna mais importantes que os demais direitos, recebendo, por isso, maior proteção.
Crianças e adolescentes são sujeitos de Direitos Humanos, em decorrência de sua
incompletude física e mental, já que se encontram em desenvolvimento. Dessa forma, a

157
Mestre em Direitos Sociais e Cidadania (2008), pós-graduada em Direito Público (2005) e graduada em Direito
(2003). É professora dos cursos de graduação e pós-graduação em Direito do Centro Universitário Salesiano de São
Paulo Lorena/SP e membro do IBDFAM (desde 2008). E-mail: sasodero@uol.com.br

158
Acadêmica de Direito (7º semestre) do Centro Universitário Salesiano de São Paulo Lorena/SP. E-mail:
florenzanobm@hotmail.com

279
Constituição Federal de 1988 faz menção a direitos fundamentais garantidos a crianças e
adolescentes, em seus artigos 226 e 227, que devem ser respeitados e efetivados pela família,
pela sociedade e pelo Estado, para que os menores possam ter o mínimo de dignidade.
Ocorre, no entanto, que constantemente estes pequenos sujeitos de proteção especial têm suas
garantias não efetivadas e afligidas por situações fáticas que podem vir a prejudicar de forma
veemente sua formação psíquica e emocional, principalmente no seio de sua própria família,
grande responsável por garantir ao menor seus principais direitos, tendo em vista que este é
possuidor, mas não plenamente capaz para exercê-los, o que se visualiza em hipóteses de
alienação parental, que irão requerer intervenção estatal no ambiente familiar, para que se
resgatem os direitos fundamentais violados e a convivência saudável.
Assim, o presente trabalho tem o objetivo de analisar de que forma a alienação parental viola
os direitos humanos de crianças e adolescentes.
A explanação do tema se iniciará com os principais instrumentos de proteção dos direitos das
crianças e adolescentes, seja no âmbito internacional, seja no âmbito nacional, ao longo dos
anos. Em um segundo momento, abordar-se-á os principais princípios em prol de crianças e
adolescentes trazidos no bojo do Estatuto da Criança e Adolescente (ECA) e, ao final, analisar-
se-á a alienação parental e as violações dos direitos de crianças e adolescentes.
Para tanto, utilizar-se-á os métodos dedutivos e bibliográficos na realização deste artigo.
1. PRINCIPAIS INSTRUMENTOS DE PROTEÇÃO DOS DIREITOS DAS CRIANÇAS E
ADOLESCENTES AO LONGO DA HISTÓRIA
Embora crianç
conceituação e proteção especial foi sendo criada ao longo da história, de acordo com os
costumes de cada sociedade. Foi apenas a partir da Idade Contemporânea que houve um
avanço na consolidação de políticas públicas de proteção social para estes, seja em âmbito
internacional, como nacional.
A primeira manifestação dos direitos infanto-juvenis ocorreu em 1919, com a criação do
Comitê de Proteção da Infância, que consolidou no Direito Internacional as obrigações
coletivas em relação às crianças, o que fez com que o reconhecimento da titularidade de
proteção dessa população deixasse de ser exclusivamente de posse do Estado. (ROBERTI
JUNIOR, 2012)
Em 1959 surgiu a Declaração dos Direitos da Criança, que recomendou que os Estados filiados
devessem ter suas próprias legislações em defesa dos direitos das crianças e da juventude.

precisa de proteção e cuidados especiais, inclusive proteção legal apropriada, antes e depois do

e no da sociedade, os direitos e liberdades enunciados na Declaração, e apelando aos pais e às

280
organizações voluntárias, às autoridade locais e aos Governos Nacionais que reconheçam tais
direitos e se empenhem pela sua observância perante medidas legislativas e de outra natureza.
Ao fim da Segunda Guerra Mundial, criou-se, pela Organização das Nações Unidas, o Fundo
Internacional de Emergência das Nações Unidas para a Infância UNICEF, com o objetivo de
"promover os direitos e melhorar a vida de todas as crianças, em todas as situações". (UNICEF,
2016)
No entanto, observa-se que o grande marco de proteção dos direitos das crianças e
adolescentes ocorreu com a Convenção Internacional relativa aos Direitos das Crianças, em
1989, documento elaborado por membros de diversos países, que tinha como objetivo
implantar o desenvolvimento harmônico da personalidade de suas crianças, no âmbito interno
de cada país membro, para modificação de suas políticas internas, favorecendo seu
crescimento em um ambiente familiar sadio, para que se tornassem aptos a viver em sociedade
e ser educados conforme os princípios instituídos na Carta das Nações Unidas. Entre os
princípios instituídos na convenção se encontram o Reconhecimento de Direitos
Fundamentais (sintetizados em sobrevivência, desenvolvimento, participação e proteção),
Proteção Integral da Criança, que passou a orientar os Estados-partes que ratificaram a
Convenção na definição de suas políticas básicas de proteção à população infanto-juvenil,
Prioridade Imediata para a Infância, que deve ser entendida em âmbito universal e o Princípio
do Melhor Interesse da Criança, pelo qual deve ser sempre considerado o melhor interesse do
menor, em decorrência de sua condição especial de pessoa em desenvolvimento. Além de
estipular como criança todo ser humano menor de dezoito anos.
Deve-se ressaltar que à época da promulgação da referida Convenção, o Brasil, como
signatário, já havia introduzido na Constituição Federal de 1988 dispositivos pertinentes à
efetiva proteção das crianças e adolescentes, em seus artigos 226 a 230, ampliando essas
responsabilidades à família, à sociedade e ao Estado, bem como no Estatuto da Criança e do
Adolescente (Lei nº 8.096/90), além de o país ter ratificado inúmeros tratados internacionais
de proteção aos menores.
2. O ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE
O Estatuto da Criança e do Adolescente, Lei nº 8.096 de 13 de julho de 1990, é o responsável
pela positivação e efetivação do disposto na Carta Magna de 1988. Considera em seu artigo 2º,

entre
possível que se elenque a existência de princípios cruciais para a proteção dos menores no
país, que garantem seu melhor interesse e buscam protegê-los ao longo de seu
desenvolvimento.
Indubitavelmente, o principal deles é o princípio da dignidade da pessoa humana (artigo 1º, III,
CF), embasador de todos os demais direitos existentes, responsável pela garantia de
vra derivada do latim dignitas, em

281
regra se entende a qualidade moral, que, possuída por uma pessoa serve de base ao próprio

Destaca-se, também, o Princípio da Proteção Integral, que rompe com a ideia de que crianças e
adolescentes sejam simples objetos de intervenção no mundo adulto, colocando-os como
titulares de direitos comuns a toda e qualquer pessoa, bem como direitos especiais decorrentes
da condição peculiar de pessoas em processo de desenvolvimento (CURY e outros, 2002, p.
238), necessitando de proteção diferenciada, especializada e integral, que encontra previsão
legal nos artigos 1º e 3º do mencionado Estatuto, além do artigo 6º da Constituição Federal,
que determina a proteção da infância como um direito social.
Observa-se, também, o Princípio da Prioridade Absoluta, previsto in verbis no artigo 4º do

público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde,
à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao

O Princípio do Melhor Interesse do Menor, tem sua origem no instituto do direito anglo-
saxônico do parens patrie, no qual o Estado assumia a responsabilidade pelos indivíduos
considerados juridicamente limitados, sendo oficializado pelo sistema jurídico inglês em 1836.
Como princípio geral, não se encontra expresso na Constituição ou no ECA, sustentando a
doutrina especializada ser ele inerente ao Princípio da Proteção Integral. Gustavo Tepedino
reconhece sua consagração pelo artigo 6º do ECA, ao privilegiar a condição peculiar da criança
e do adolescente como pessoas em desenvolvimento (TEPEDINO, 2008). Tal princípio, no
entanto, esta inserto na Convenção Internacional dos Direitos da Criança e do Adolescente,
que estabelece, literalmente, que "todas as medidas relativas às crianças, tomadas por
instituições de bem-estar social públicas ou privadas, tribunais, autoridades administrativas ou
órgãos legislativos, terão como consideração primordial os interesses superiores da criança".
Além de ser previsto como um dos princípios que regem a aplicação de medidas específicas de
proteção a crianças e adolescentes no artigo 100, I, ECA.
Neste sentido,
o que norteia a análise é o interesse da criança e do adolescente, que, segundo Eduardo de
Oliveira Leite, pode ser assim avaliado: É o juiz, a quem compete examinar cada situação de
fato, que determina, a partir da consideração de elementos objetivos e subjetivos, qual é o

e a repetição de certos acórdãos permitem precisar algumas tendências: o desenvolvimento


físico e moral da criança, a qualidade de suas relações afetivas e sua inserção no grupo social

situação jurídica de pais e mães separados e dos filhos na ruptura da vida conjugal. 2.ed. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 2003, p. 198/199). (AI n. 800.567 6, rel. Des. Vilma Régio Ramos
de Rezende, j. 23.11.2011)

282
Por fim, há que se ressaltar o Direito à Convivência Familiar e Comunitária, uma vez que as
crianças e adolescentes têm direito de crescer em ambiente familiar em que a felicidade, o
amor e a compreensão se façam presentes, como dispõe o Princípio 6 da Declaração dos
o completo e harmonioso de sua
personalidade, a criança precisa de amor e compreensão. Criar-se-á, sempre que possível, aos
cuidados e sob a responsabilidade dos pais e, em qualquer hipótese, num ambiente de afeto e

Assim, é possível afirmar que as crianças e os adolescentes, seja através de tratados e


convenções internacionais dos quais o Brasil é signatário, seja através de instrumentos que
fazem parte do ordenamento jurídico nacional, encontram-se protegidos por inúmero direitos
e garantias que lhes devem ser assegurados, exigindo, assim, do Estado, da família, e de toda a
sociedade uma atuação em prol destes.
3. ALIENAÇÃO PARENTAL E A VIOLAÇÃO DOS DIREITOS DE CRIANÇAS E
ADOLESCENTES
No século passado, na vigência do Código Civil de 1916, viveu-se em uma sociedade com
conceitos firmados sobre a união indissolúvel, representada pelo casamento, sobre o qual a
religião exerceu grande influência, e os papeis dos membros da entidade familiar se norteavam
por ela.
No entanto, no século XXI, com as constantes modificações nos formatos familiares, com o
afrouxamento das bases religiosas, a independência e maior valorização da mulher na
sociedade e na família, com a valorização da autonomia da vontade das partes em detrimento
da interferência estatal nas relações familiares, a dissolução do vínculo conjugal se tornou
simples e rápida, através dos institutos jurídicos da separação e do divórcio, que se tornaram
cada vez mais recorrentes - em decorrência da banalização dos sentimentos, da intolerância
nos relacionamentos humanos, cada vez mais galgados na superficialidade que a vida moderno
acaba impondo e que fatalmente leva à inversão de valores e à insubsistência da relação -
principalmente com a edição da Lei nº 6.515/77 (Lei do Divórcio), culminando na maior
ocorrência de fenômenos, como a alienação parental, decorrentes das dificuldades que possam
vir a emergir do término da relação e que fazem dos filhos os alvos das condutas dos pais (em
sua maioria, daqueles que detém a chamada guarda unilateral), pois transforam-se em
instrumentos, brinquedinhos, fantoches nas mãos alienador, que os manipula ao seu bel prazer
em detrimento do outro cônjuge.
De acordo com Maria Berenice Dias,
muitas vezes, quando da ruptura da vida conjugal, um dos cônjuges não consegue elaborar
adequadamente o luto da separação e o sentimento de rejeição, de traição, o que faz surgir um
desejo de vingança: desencadeia um processo de destruição, de desmoralização, de descrédito
do ex parceiro. O filho é utilizado como instrumento da agressividade é induzido a afastar-se

283
de quem ama e de quem também a ama. Isso gera contradição de sentimentos e destruição do
vínculo entre ambos. (DIAS apud TRINDADE, 2010, p. 178)
Observa-se com as atitudes do genitor alienador um exercício arbitrário do poder familiar, que
foge de um dos seus principais objetivos: o desenvolvimento sadio e adequado do menor por
meio de uma adequada formação, tanto do ponto de vista da educação formal obtida na escola
como, também da formação humana obtida em todos os grupos sociais que a criança ou
adolescente participa, notadamente do seio familiar. (FIGUEIREDO; ALEXANDRIDIS, 2011, p.
12 e 14), além de corroborar no descumprimento do dever fundamental de afeto que os pais
devem ter para com os filhos.
Assim, o termo cunhado na década de 80 pelo psiquiatra americano Richard Gardner
corresponde a uma maldade discreta, que confunde sentimento de amor e cuidados parentais
(JARDIM-ROCHA, 2009), com influências negativas sobre a opinião da prole em relação a seu
genitor, afastando-o deste, com o intuito de destruir os vínculos afetivos existentes entre estes.
Segundo Gardner, a síndrome resulta da programação da criança, por parte de um dos pais,
para rejeitar e odiar o outro genitor, somada à contribuição da própria criança ao difamar,
desrespeitar e importunar um dos pais, contando sempre com o apoio do outro genitor. A
ra
completa amnésia com relação às experiências positivas vividas anteriormente com o genitor

Marcos Duarte afirma que se deve compreender a Síndrome da Alienação Parental como uma
patologia jurídica caracterizada pelo exercício abusivo do direito de guarda. A vítima maior é a
criança ou adolescente que passa a ser também carrasco de quem ama, vivendo uma
contradição de sentimentos até chegar ao rompimento do vínculo de afeto. Através da
distorção da realidade (processo de morte inventada ou implantação de falsas memórias), o
filho percebe um dos pais totalmente bom e perfeito (alienador) e o outro totalmente mau
(DUARTE, 2009).
No entanto, é preciso que se diferencie a alienação parental e a Síndrome da Alienação

filho de um dos genitores, provocado pelo outro, via de regra, o titular da custódia. A
síndrome, por seu turno, diz respeito às sequelas emocionais e comportamentais de que vem a

2011, p. 43).
Diante de sua grande ocorrência, o legislador passou a se preocupar com a ausência de
legislação específica que regulamentasse o tema, deixando crianças e adolescentes
desguarnecidas perante a ocorrência da alienação, que muitas vezes passava despercebida pelo
Poder Judiciário. Assim, em 2010, foi sancionada a Lei nº 12.318, que considera tal conduta
sicológica da criança ou do adolescente promovida
ou induzida por um dos genitores, pelos avós ou pelos que tenham a criança ou adolescente

284
sob a sua autoridade, guarda ou vigilância para que repudie genitor ou que cause prejuízo ao
estabelecimento ou à ma
da referida lei.
A Lei de Alienação Parental traz, ainda, em seu bojo um rol exemplificativo das maneiras
utilizadas para alienar uma criança:
I- realizar campanha de desqualificação da conduta do genitor no exercício da paternidade ou
maternidade; II- dificultar o exercício da autoridade parental; III- dificultar contato de criança
ou adolescente com genitor; IV- dificultar o exercício do direito regulamentado de convivência
familiar; V- omitir deliberadamente a genitor informações pessoais relevantes sobre a criança
ou adolescente, inclusive escolares, médicas e alterações de endereço; VI- apresentar falsa
denúncia contra genitor, contra familiares deste ou contra avós, para obstar ou dificultar a
convivência deles com a criança ou adolescente; VII- mudar o domicílio para local distante,
sem justificativa, visando a dificultar a convivência da criança ou adolescente com o outro
genitor, com familiares deste ou com avós. (Artigo 2º, Lei de Alienação Parental),
além de caracterizar os envolvidos, bem como apresenta medidas a serem tomadas pelo
Judiciário ao verificar sua existência, entre outros aspectos.
Diante da previsão legal dos direitos anteriormente explicitados, não é crível que uma criança
ou adolescente que sofra alienação parental seja capaz de ter um ambiente familiar, um
desenvolvimento físico e mental, bem como convivência familiar saudáveis, o que nos remete
a uma verdadeira violação de direitos fundamentais, pois, como dispõe o artigo 3º da Lei
12.318/10, de modo literal:
A prática de ato de alienação parental fere direito fundamental da criança ou do adolescente
de convivência familiar saudável, prejudica a realização de afeto nas relações com genitor e
com o grupo familiar, constitui abuso moral contra a criança ou o adolescente e
descumprimento dos deveres inerentes à autoridade parental ou decorrentes de tutela ou
guarda,
o que pode acarretar em danos na estrutura emocional do infante, uma vez que o genitor
alienador se esquece de sua principal função em relação ao alienado: respeitar e promover o
relacionamento dele com o filho e incentivar a convivência do dois.
Assim, é impossível afirmar que sua dignidade está sendo considerada, que ele esteja tendo o
devido respeito de seus genitores, ou que estejam privilegiando seu melhor interesse. Desse
modo, cita-se a seguinte ementa:
APELAÇÃO CÍVEL. MÃE FALECIDA. GUARDA DISPUTADA PELO PAI E AVÓS MATERNOS.
SÍNDROME DA ALIENAÇÃO PARENTAL DESENCADEADA PELOS AVÓS. DEFERIMENTO
DA GUARDA AO PAI.

285
1. Não merece reparos a sentença que, após o falecimento da mãe, deferiu a guarda da criança
ao pai, que demonstra reunir todas as condições necessárias para proporcionar à filha um
ambiente familiar com amor e limites, necessários ao seu saudável crescimento.
2. A tentativa de invalidar a figura paterna, geradora da síndrome de alienação parental, só
milita em desfavor da criança e pode ensejar, caso persista, suspensão das visitas aos avós, a
ser postulada em processo próprio. NEGARAM PROVIMENTO. UNÂNIME. (Tribunal de
Justiça do Estado do Rio Grande do Sul. Apelação Cível nº 70017390972, 7ª Câmara Cível,
Relator Des. Luiz Felipe Brasil Santos, em 13 de junho de 2007)
Concomitantemente a isso, caberá ao Estado, como agente responsável por efetivar direitos,
intervir no ambiente familiar, com o intuito de diminuir e possivelmente exterminar tais
práticas que ocasionam consequências devastadores na vida dos alvos, quais sejam os menores
e os genitores alienados.
Dessa forma, a Lei de Alienação Parental traz a possibilidade de o juiz determinar diversas
sanções, cumuladas ou não, desde uma advertência ou aplicação de multa, até a suspensão da
autoridade parental, com o intuito de proteger a integridade desses indivíduos. Além disso,
diante da vulnerabilidade da criança e do adolescente, no referido contexto, torna-se
desnecessária a efetiva comprovação da alienação parental, pois os meros indícios já são
passíveis de aplicação das sanções estabelecidas pelo legislador, admitindo prova em contrário
pelo princípio da ampla defesa.
Neste diapasão preleciona Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho:
[...]Em uma primeira análise, poder-se-ia até argumentar que tal previsão meramente
indiciária afrontaria o sistema constitucional de ampla defesa, mas, em verdade, tal raciocínio
não procede, pois o que se tem em mira é, em primeiro plano, a perspectiva de defesa da
própria criança ou adolescente, vítima indefesa dessa grave forma de programação mental, em
um contexto familiar que, em geral, dificulta sobremaneira a reconstrução fática da prova em
juiz. (2014, p. 617)
Reforce-

de Alienação Parental (SAP), entendida como o conjunto de sintomas de perturbação mental


que inevitavelmente atingem o filho influenciado pela conduta do alienador (GROENINGA
apud OLIVEIRA, 2015). De se notar, pois, a evidente violação a direito humano fundamental do
menor, nesses casos.
CONCLUSÃO
Percebe-se, em termos de evolução da proteção dos direitos das crianças e dos adolescentes,
que a consolidação dos direitos dessa camada da população só ocorreu mesmo na Idade
Contemporânea. A Convenção Internacional relativa aos Direitos das Crianças, de 1989, no
plano internacional, e a CF de 1988, bem como o ECA, de 1990, no âmbito interno, vieram

286
garantir a proteção integral de crianças e adolescentes, resguardando fundamentalmente sua
dignidade. Deve-se zelar incansavelmente pelo melhor interesse do menor, o que
necessariamente passa pelo direito que lhe é assegurado a uma saudável convivência familiar e
comunitária.
No que tange às relações no seio da família, o desfazimento de relacionamentos conjugais e
convivenciais é realidade que não se pode negar. Consequência bastante comum do fim de
casamentos e uniões estáveis de que nasceram filhos é a alienação parental. Originalmente
estudada por profissionais da área médica, a alienação parental é, hoje, realidade
inexoravelmente jurídica. No Brasil é, inclusive, regulada por lei própria. Cuida-se, como se
viu ao longo do texto, da conduta de um genitor que implanta no filho menor falsas memórias
a respeito do outro dos pais, ocasionando, em muitos casos, doença de ordem psíquica, a
chamada Síndrome de Alienação Parental, que acarreta consequências que vão desde a queda
no rendimento escolar até deficiências em sua personalidade, prejudicando o menor inclusive
no convívio social, mesmo quando chega à fase adulta, desprezando de modo nítido o melhor
interesse da crianças ou adolescente que nesta relação é tratado como verdadeiro objeto.
O comportamento do genitor que afasta o outro do convívio com o filho comum representa
ofensa direta a todos os princípios de proteção à criança e ao adolescente que
internacionalmente e internamente se quer tutelar. A alienação parental é violação grave a
direito humano fundamental da criança e do adolescente que, por essa razão, deve ser
veementemente combatida em nosso seio social.
REFERÊNCIAS
BRASIL. Constituição (1988). Constituição [da] República Federativa do Brasil. Brasília, DF:
Senado Federal.
______. Lei nº 12318, de 26 de agosto de 2010. Dispõe sobre a alienação parental e altera o
art. 236 da Lei n.8.069, de 13 de julho de 1990.
______. Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990. Dispõe sobre o estatuto da criança e do
adolescente e dá outras providências.
CONVENÇÃO SOBRE OS DIREITOS DAS CRIANÇAS DE 1989. Disponível em:
<http://www.direitoshumanos.usp.br/index.php/Crian%C3%A7a/convencao-sobre-os-
direitos-da-crianca.html>. Acesso em 17 maio 2016.
CURY, Munir; GARRIDO, Paulo Afonso; MARÇURA, Jurandir Norberto. Estatuto da Criança e
do Adolescente Anotado. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, p. 238.
DECLARAÇÃO DOS DIREITOS DA CRIANÇA DE 1959. Disponível em:<
http://www.direitoshumanos.usp.br/index.php/Crian%C3%A7a/declaracao-dos-direitos-da-
crianca.html>. Acesso em 17 maio 2016.

287
DUARTE, Marcos. Alienação Parental: a morte inventada por mentes perigosas. Disponível
em: < http://pailegal.net/guarda-compartilhada/622>. Acesso em: 10 ago. 2016.
DUQUE, Bruna Lyra; LEITE, Letícia Durval. A alienação parental sob a perspectiva do dever
fundamental do afeto e a psicologia. p. 293
FIGUEIREDO, Fábio Vieira; ALEXANDRIDIS, Georgio. Alienação Parental. São Paulo: Saraiva,
2011.
GAGLIANO; Pablo Stolze; PAMPLONA, Rodolfo Filho. Novo Curso de Direito Civil: As famílias
em perspectiva constitucional. v. 6. São Paulo: Saraiva, 2014.
JARDIM-ROCHA, Mônica. Síndrome de Alienação Parental: a mais grave forma de abuso
emocional. In: Paulo, Beatrice M. (Coord.). Psicologia na prática jurídica: a criança em foco.
Rio de Janeiro: Impetus, 2009. p. 39-45.
JUNIOR, João Paulo Roberti. Evolução Jurídica do Direito da Criança e do Adolescente no
Brasil. Revista da Unifebe (Online) 2012; 10(jan/jun):105-122 Artigo Original. Disponível em:
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PEREIRA, Rodrigo da Cunha (org.). Tratado de Direito das Famílias. Belo Horizonte: IBDFAM,
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PONTIN, Ana Paula Dutra. A Alienação Parental sob a ótica jurídica: uma grave consequência
da dissolução do vínculo conjugal. p.285
SILVA, Plácido e. Vocabulário Jurídico. Vol. II; São Paulo: Forense, 1967, p. 526.
SOUSA, Analicia Martins. Síndrome da Alienação Parental: um novo tema nos juízos de
família. São Paulo: CORTEZ Editora, 2010, p.99.
TEPEDINO, Gustavo. A Tutela Constitucional da Criança e do Adolescente: Projeções Civis e
Estatutárias. In: SARMENTO, Daniel. IKAWA, Daniela.
TRINDADE, Jorge. Manual de Psicologia Jurídica Para Operadores do Direito. 4ª ed. verificada,
atualizada e ampliada. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2010, p. 178.
UNICEF. 2016. Disponível em:<http://www.unicef.org/about/>. Acesso em 17 maio 2016.

288
AS LIMITAÇÕES DA INTERVENÇÃO HUMANITÁRIA

159

RESUMO
O presente artigo tem por objetivo analisar os aspectos da intervenção humanitária que se
contrapõe a soberania estatal, levando, por derradeiro, a ideia de ineficácia e impotência dos
Direitos Humanos, em um cenário internacional de anomia de humanidade. Para isso,
investiga-se o Direito Internacional e os Direitos Humanos como diretrizes necessárias para se
justificar a intervenção humanitária, que é a ação coercitiva de proteger vidas humanas, de um
grupo internacional sobre outro. Não obstante, muito se tem observado do grande conflito
entre so
como um de seus princípios basilares a não intervenção. Entrementes há que se destacar a
necessidade da intervenção, visando a proteção dos Direitos Humanos, que, por obviedade,
trata-se de valor norteador do Direito Internacional, cabendo a este a responsabilidade de
proteger.
Palavras-chave: Direitos Humanos. Soberania Estatal. Intervenção Humanitária.
This article aims to analyze the aspects of humanitarian intervention that opposes state
sovereignty, leading ultimately to the idea of ineffectiveness and impotence of Human Rights,
in an international scenario of anomie of humanity. For this, international law and human
rights are investigated as necessary guidelines to justify humanitarian intervention, which is
the coercive action of protecting human lives, from one international group over another.
Nevertheless, much has been observed of the great conflict between state sovereignty and
humanitarian intervention, since the "Peace of Westphalia" has delegated as one of its basic
principles non-intervention. In the meantime, it is necessary to emphasize the need for
intervention, aiming at the protection of human rights, which is, in fact, a guiding value of
international law, and it is the responsibility of the latter to protect.
Keywords: Human Rights. State Sovereignty. Humanitarian intervention.
INTRODUÇÃO
A intervenção humanitária exsurge nos cenários de conflitos, sendo a não intervenção um dos
princípios basilares da ordem internacional desde a Paz de Westphalia, expressa,
posteriormente, pela Carta da Organização das Nações Unidas ONU , vez que a intervenção
tropeça constantemente na Soberania Estatal.

Graduandas em Direito pelo Centro Universitário Salesiano de São Paulo - Unisal U.E. de Lorena/SP. Centro
159

Universitário Salesiano de São Paulo/Lorena (UNISAL) Brasil. E-mails: andreiaccruzz@gmail.com e


marina.oliv96@gmail.com

289
A intervenção é observada de maneira negativa no cenário internacional, vez que a sua
aplicação atribui, ao Estado alvo, a imagem de incompetência, além do título de Estado falido,
ou seja, um Governo que detém pouco controle sobre seu território e seu povo.
Não obstante, a não intervenção, como princípio, se contrapõe à Responsabilidade de Proteger
dos Estados, o que atinge diretamente os Direitos Humanos, que deveriam, por sua vez, limitar
o exercício da autodeterminação.
Outro ponto constantemente questionado acerca da intervenção é a violação ao princípio da
legalidade, sendo este extremamente controverso, tendo em vista a abordagem da legalidade
diante da inércia dos Estados perante os crimes contra humanidade, já que o bem social não se
mostra relevante, de maneira que sua não observância seria capaz de dar vazão à Intervenção
Humanitária.
Origem e Conceito da Intervenção Humanitária
A intervenção humanitária teve sua origem teórica baseada na Guerra Justa, característica da
Idade Média, a qual reconhecia o uso da força para a proteção de inocentes. (RICOBOM,
2010)160
Tal característica pode, claramente, ser observada nos casos de intervenção humanitária, vez

A respeito disto, Gisele Ricobom, explica:


nternacionais pela Carta das Nações Unidas e a
crescente proteção das normas internacionais de direitos humanos provocou uma reação
161

A origem, de fato, da intervenção humanitária se deu no século XIX, tendo como primeira
ocorrência uma intervenção coletiva, em 1827, realizada pela França, Grã-Bretanha e Rússia,
favorecendo a nacionalidade grega. (RICOBOM, 2010)162
A Paz de Westphalia, por sua vez, trouxe consigo o princípio da não intervenção, como forma
de manutenção da paz (JUBILUT, 2010)163. Bem como a Declaração Universal dos Direitos
Humanos não explicitou nenhuma maneira coercitiva para o cumprimento do disposto na

RICOBOM, Gisele. 2010, Intervenção Humanitária: a guerra em nome dos direitos humanos, Belo Horizonte, Ed.
160

Fórum, p. 39.
161
Idem 1.
RICOBOM, Gisele. 2010, Intervenção Humanitária: a guerra em nome dos direitos humanos, Belo Horizonte, Ed.
162

Fórum, p. 109.
163
JUBILUT, Liliana Lyra. 2010, Não Intervenção e Legitimidade Internacional, São Paulo, Ed. Saraiva, p. 21.

290
mesma, restando, assim, infundada a intervenção em nome destes, o que foi fortemente
defendido durante a Guerra Fria. (RICOBOM, 2010)164
Poderia, então, a intervenção humanitária ser conceituada como a guerra em nome dos
direitos humanos, principalmente se observada a sua origem teórica.
PROBLEMÁTICA DA INTERVENÇÃO HUMANITÁRIA E RESPONSABILIDADES
A intervenção é um fenômeno pouco recorrente, dadas suas características pouco atrativas ao

científica da intervenção deveria identificar os elementos básicos desse fenômeno e entende-lo


165

Baseado na ideia de identificação de elementos, VINCENT (1973), mencionado por JUBILUT


(2010), aponta seis elementos da intervenção, sendo estes o agente da intervenção, o alvo da
intervenção, a tipificação dos atos envolvidos, os tipos de intervenção, o objetivo e o contexto
da intervenção.166
Ao se tratar de Intervenção Humanitária, entende-se que este tipo de intervenção será
mediante o uso de meios coercitivos, de maneira já citada no presente trabalho. O que nos faz
regressar à ideia de guerra em nome dos Direitos Humanos, à legitimação do combate em
razão do bem comum. Contudo, a ideia de intervenção, mesmo que em defesa dos Direitos
Humanos, atenta contra a manutenção da paz internacional.
A Intervenção Humanitária por vias militares, segundo JUBILUT, dentre todas, pode ser
considerada a mais controversa, principalmente se analisarmos o disposto na Carta da ONU,
que defende com veemência o não uso da força, além da não previsão da autorização de
combate em nome dos Direitos Humanos, o que remete à legalidade e legitimidade do ato. 167
Diante disto, os questionamentos passaram a ser voltados à Responsabilidade de Proteger, que,
de certa forma, prioriza os Direitos Humanos, colocando-o acima da não intervenção.
EM SUA OBRA, GISELE RICOBOM, EXPÕE:
é a relativização da soberania em nome da universalidade dos
168

direitos humanos, que permitiria a intervenção, inclusive armada, da ONU e mesmo de forma
un 169

RICOBOM, Gisele. 2010, Intervenção Humanitária: a guerra em nome dos direitos humanos, Belo Horizonte, Ed.
164

Fórum, p. 110.
165
JUBILUT, Liliana Lyra. 2010, Não Intervenção e Legitimidade Internacional, São Paulo, Ed. Saraiva, p. 32.
166
JUBILUT, Liliana Lyra. 2010, Não Intervenção e Legitimidade Internacional, São Paulo, Ed. Saraiva, p. 32.
167
JUBILUT, Liliana Lyra. 2010, Não Intervenção e Legitimidade Internacional, São Paulo, Ed. Saraiva, p. 155/160.
168
R2P de 2001, feita pela CIISE.
RICOBOM, Gisele. 2010, Intervenção Humanitária: a guerra em nome dos direitos humanos, Belo Horizonte, Ed.
169

Fórum, p. 335.

291
Não obstante, Liliana Lyra Jubilut, discorre a respeito da doutrina da responsabilidade de
proteger, destacando a responsabilidade de proteger proposta pela ICISS170, a qual traça como
objetivo o estabelecimento de diretrizes para o uso da força, com a finalidade de proteger vidas
humanas e direitos humanos, por meio da promoção de duas alterações na retórica das
intervenções humanitárias, sendo elas, o conceito de soberania, passando do conceito de
direito absoluto, para o conceito de responsabilidade, bem como a alteração da dicotomia
entre direitos e deveres, não sendo mais a intervenção humanitária feita com base no direito
de ingerência, mas sim baseada na responsabilidade de proteger.171
AINDA A RESPEITO DE RESPONSABILIDADE, JUBILUT, DISPÕE:

outra vantagem: ele traz consigo o reconhecimento de que a responsabilidade primária é do


Estado e que somente caso haja falha ou falta de vontade do Estado de exercer esse papel é que
172

Nesta senda, percebe-se a tentativa de tornar mais atrativa a ideia da Responsabilidade de


Proteger, viabilizando possíveis intervenções humanitárias, baseadas, ainda, em outras
vertentes as quais se ramificam desta responsabilidade, sendo elas a Responsabilidade de
Prevenir, Reagir e Reconstruir ou Reparar.
A Responsabilidade de Prevenir nada mais é do que a precaução, o empenho em evitar
possíveis conflitos. Segundo JUBILUT
173

A Responsabilidade de Reagir, por sua vez, nos remete, mais uma vez, à intervenção
humanitária, onde é viabilizada a interferência para dirimir conflitos, com respaldo na
proteção dos Direitos Humanos.
A Responsabilidade de Proteger, de acordo com JUBILUT, trata da obrigação de construção da
paz, com intuito de evitar novos conflitos, esforços de justiça e reconciliação, bem como o
desenvolvimento.174
DIREITOS HUMANOS E INTERVENÇÃO HUMANITÁRIA

170
International Commission on Interventio and State Sovereignty.
171
JUBILUT, Liliana Lyra. 2010, Não Intervenção e Legitimidade Internacional, São Paulo, Ed. Saraiva, p. 161/162.
172
JUBILUT, Liliana Lyra. 2010, Não Intervenção e Legitimidade Internacional, São Paulo, Ed. Saraiva, p. 162.
173
JUBILUT, Liliana Lyra. 2010, Não Intervenção e Legitimidade Internacional, São Paulo, Ed. Saraiva, p. 163.
174
JUBILUT, Liliana Lyra. 2010, Não Intervenção e Legitimidade Internacional, São Paulo, Ed. Saraiva, p. 164.

292
Muito tem se falado sobre Direitos Humanos e sua preservação. Entretanto, além disto,
observa-se nos cenários Nacional e principalmente Internacional a sua violação, ocasionando a
sensação de anomia de leis e de anomia de humanidade, abrindo as portas, por conseguinte, a
temida Intervenção Humanitária.
Não obstante, há ainda um grande confronto de entendimentos doutrinários com o intuito de
se justificar o uso da força como meio de assegurar a promoção dos Direitos Humanos. O que
vem sendo muito criticado no cenário Internacional é como as operações bélicas que podem
causar mortes e vítimas gravemente feridas podem ser um meio congruente para assegurar
sua promoção, afinal é totalmente contrário a ele.
A Declaração Universal de Direitos Humanos, proclamada em 1948 pela ONU dispõe em seu

de razão e de consciência, devem agir uns p


repelindo assim o uso da força, vez que prevê que deve o homem agir com o espírito de
fraternidade.
Outrossim, em 1986 a Conte Internacional de Justiça proclamou que a Intervenção
Humanitária também compreende sanções econômicas e com efeitos coercitivos e não

175

Todavia, tenta-se encontrar uma justificativa ética na teoria da Guerra Justa (Jus ad Bellum, ou
seja, direito à Guerra) para se explicar a Intervenção Humanitária, levando em consideração o
Princípio da Proporcionalidade, que deve considerar os direitos violados como consequência
do uso da força e da operação bélica para garantir os direitos fundamentais entre determinada
população e aqueles que estão de fato assegurados por sua consumação, vez que o
supramencionado uso da força é a condição sine qua non para acabar com a maculação dos
Direitos Humanos.

Outro ponto relevante é que a Intervenção Humanitária, por sua vez, é autorizada somente em
casos extremos, quais sejam de graves violações aos Direitos Humanos, pois reina no cenário
Internacional o Princípio da Não-Intervenção, edificado pela Carta da ONU, que tutela a
autodeterminação dos Estados, ou seja, a Soberania Estatal.

Ademais, em se tratando de Intervenção Humanitária, o objeto tutelado é a vida humana, logo


se concretiza sua importância em um cenário de grave violação aos direitos humanos. Não

deixando assim extensiva sua interpretação. Alguns autores entendem que tal expressão

175
FIERKE, Karin. 2005, Diplomatic Interventions Conflict and Change in a Globalizing World. Nova York:
Palgrave Macmillian.

293
equivalha aos casos de Genocídio, vez que há a maciça violação aos Direitos em tela e trata-se
de típico caso de crime contra a humanidade, e que talvez, seja o mais grave deles.
Soberania como Limite da Intervenção

política internacional e o direito trava uma luta inglória tentando reprimi- 176

A intervenção enfrenta diversos tipos de limitações, o que impede, por muitas vezes, que a
mesma ocorra, ainda que necessária. Uma das principais limitações encontrada pela
intervenção é a soberania, que se sobrepõe à necessidade de intervir.

177

A obra de Paulo Bonavides traz o conceito de Soberania dividida em dois polos, sendo estes a
Soberania Interna que nada mais é do que o poder exercido pelo estado sobre sua população e
território, assim como a superioridade do poder político frente aos demais poderes sociais, e a
Soberania Externa, conceituada como manifestação independente de um Estado Perante
outros Estados (Ciência Política, 2000).
Diante disto, a não intervenção passou a ser um instrumento de manutenção de paz. Vez que
em decorrência da intervenção de um Estado em outro, a soberania deste segundo estaria
sendo violada, desta maneira, o direito internacional se mantém restringido ante tal limitador,
visando a não ocorrência de novos conflitos.
A RESPEITO DISTO, PAULO BONAVIDES DISCORRE:
conciliar a noção de soberania do Estado com a ordem
internacional, de modo que a ênfase na soberania do Estado implica sacrifício maior ou menor
do ordenamento internacional e, vice-versa, a ênfase neste se faz com restrições de grau
variável aos limites 178

NÃO OBSTANTE, EM SUA OBRA, LILIANA LYRA JUBILUT, APONTA:

intervenção. E todo Estado, juridicamente entendido como soberano, estaria protegido, desta
179

AS LIMITAÇÕES DA INTERVENÇÃO HUMANITÁRIA

176
JUBILUT, Liliana Lyra. 2010 Não Intervenção e Legitimidade Internacional, São Paulo, Ed. Saraiva, p. 31.
REZEK, José Francisco. 2014, Direito Internacional Público: Curso Elementar, 15 ed., São Paulo, Ed. Saraiva. P.
177

266.
BONAVIDES, Paulo. 2000, Ciência Política. 10ª ed. (revista atualizada), 9ª triagem, São Paulo, Ed. Malheiros, p.
178

156
179
JUBILUT, Liliana Lyra. 2010, Não Intervenção e Legitimidade Internacional, São Paulo, Ed. Saraiva, p. 33.

294
A Intervenção Humanitária, como já mencionado neste trabalho, só é autorizada em casos
extremos, pois tem como objetivo legítimo pôr fim à Crise Humanitária.
No entanto, há casos em que se justificam a Intervenção como primeiro dos recursos a serem
tomados e não o último para a resolução dos conflitos que desrespeitam os Direitos Humanos,
onde se mensuram a proporção e a gravidade da Crise Humanitária e a velocidade em que ela
se alastra no Estado-Alvo.
Nos deparamos então com algo controverso, que vem a ser a Legalidade da Intervenção
Humanitária. Seria, portanto, a Intervenção Humanitária um meio legal de preservação dos
Direitos
deverão evitar em suas relações internacionais a ameaça ou o uso da força contra a integridade
territorial ou a dependência política de qualquer Estado, ou qualquer outra ação incompatível

expressa.
Entrementes, outro fator limitante a intervenção é o momento do agir, pois como dito
anteriormente, existem casos em que não há outra saída para solucionar os conflitos se não
através do uso da força, que é previsto, mas entendido, em regra, como último recurso a ser
adotado para resguardar os Direitos Humanos, recurso este de que podem valer-se os Estados
intervenientes em casos extremos. Assim, não há o entendimento pacificado acerca do
momento da Intervenção.
Alguns Estados, para que não sejam alvo da Intervenção, preferem ocultar e omitir a situação
que realmente se encontram e muitas vezes, resistir a intervenção, pois ficariam, assim,
submissos ao Estado Interventor, perdendo então grande parte de sua Soberania. Aí nos
deparamos com outra problemática, que é inclusive objeto de debate doutrinário, pois há a
discussão se é necessário o consentimento ou não do Estado-Alvo para a Intervenção. A maior
parte da doutrina e juristas entendem que não é necessário o consentimento, afinal é isso a que
a difere das operações de manutenção da paz.
Trata-se de uma discussão muito sensata, afinal estamos diante de algo realmente
contraditório. Surge então a indagação. Qual a justificativa para que os Estados se mantenham
omissos e inertes diante da agressão aos Direitos Humanos e da ocorrência dos crimes e
atentados contra a Humanidade?
A problemática gira em torno do título que se dá aos Estados-Alvos da Intervenção
Humanitária, Estados Falidos, ou seja, um Estado que não detém o controle sobre o seu
território, e que em função disso, seu status de Soberano na esfera Internacional é reduzido a
quase nada. Assim, se mantêm em estado de inércia até o momento em que não exista outra
solução se não a Intervenção, embora isso não seja uma justificativa plausível, o que gera
grande reprovação no cenário internacional, levando a ideia de ineficácia e ineficiência dos
Direitos Humanos.
295
CONCLUSÃO
Diante de todo o exposto, entende-se que a intervenção humanitária, apesar de seu caráter

que a responsabilidade de proteger se sobressaia a qualquer outra característica impeditiva, de


maneira a resguardar vidas humanas, bem como os direitos humanos.
A intervenção, apesar de seu caráter repressivo, protege àqueles que sofrem com as guerras e
conflitos, mantendo-os a salvo de graves violações. Contudo, não há que se confundir
intervenção humanitária com intervenção política, tendo em vista que a intervenção
humanitária não possui ou não deveria possuir como objetivo o firmamento de alianças ou
a obtenção de bens econômicos, mas sim a proteção do ser humano.
Neste toar, percebe-se indispensável que a comunidade internacional intervenha diante da
crise de um Estado que se encontre em condições de anomia de humanidade, ainda que não se
utilize da força para isto, e sim de outros tipos de sanções.
Ainda nesta direção, existem outros meios, intermediários e eficientes, para a preservação dos
direitos humanos, que não pela guerra, mesmo que esta seja entendida como guerra justa.
Como mencionado neste trabalho, toda e qualquer interferência nos assuntos domésticos
sejam elas sanções econômicas ou com conteúdo coercitivo dos Estados Ingerentes com a
finalidade exclusiva de resguardar e assegurar a promoção desses direitos devem ser
esgotadas, para que então os Estados interventores valham-se do uso da força.
Por fim, vale ressaltar que a Responsabilidade de Proteger deve ser meio efetivo de ação, para
expurgar do cenário Internacional e Humanitário a sensação de inércia dos órgãos
competentes para a manutenção da paz, como também dos Estados que os compõe, levando
por consequência a certeza de eficácia do direito internacional e direitos humanos e os
traduzindo em sua essência, quais sejam a segurança contraposta ao medo e a paz
sobressaindo a guerra.
Referências Bibliográficas
RICOBOM, Gisele. 2010, Intervenção Humanitária: a guerra em nome dos direitos humanos,
Belo Horizonte, Ed. Fórum;
JUBILUT, Liliana Lyra. 2010, Não Intervenção e Legitimidade Internacional, São Paulo, Ed.
Saraiva;
FIERKE, Karin. 2005, Diplomatic Interventions Conflict and Change in a Globalizing World.
Nova York: Palgrave Macmillian;
REZEK, José Francisco. 2014, Direito Internacional Público: Curso Elementar, 15 ed., São Paulo,
Ed. Saraiva.;
BONAVIDES, Paulo. 2000, Ciência Política. 10ª ed. (revista atualizada), 9ª triagem, São Paulo,
Ed. Malheiros;

296
Declaração Internacional dos Direitos Humanos;
Carta das Nações Unidas.

297
A INCLUSÃO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA NA SOCIEDADE
180

Resumo
O artigo trata de um assunto de grande repercussão na sociedade, no dia 03 de dezembro é
comemorado o Dia Internacional das Pessoas com Deficiência, essa data comemorativa foi
instituída pelas Nações Unidas desde 1998, promovendo o bem estar social para estas pessoas
tenham acesso a uma vida politica, social e cultural, tento como intuito aumentar a
consciência da população, onde parte dela é preconceituosa, onde o estado e ONG´S têm
realizado projetos e campanhas para a maior inclusão e ressocialização possível do mesmo,
Palavras-chaves: sociedade, pessoa com deficiência, inclusão, estada e direita.
INTRODUÇÃO
O tema abordado e de extrema importância para qualquer sociedade existente pois trata da
pessoa com deficiência , assunto esse que vem chamando bastante atenção da população
devido ao descaso do estado para com essas pessoas que necessitam de cuidados especiais,
atualmente existem leis que as protegem e até mesmo um estatuto para mostrar as obrigações
do estado para com eles, entretanto nem sempre isso ocorre, devido a falta de planejamento e
verba do estado, acontece que muitas das vezes a pessoa que necessita de um cuidado especial
acaba recorrendo ao poder judiciário.
A PESSOA COM DEFICIÊNCIA
As pessoas com deficiência necessitam de cuidados especiais por terem dificuldades em
realizar certas atividades, tendo algumas limitações como descrito no art 2 da l LEI Nº 13.146,
DE 6 DE JULHO DE 2015. (Estatuto da Pessoa com Deficiência).
Art. 2o Considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de
natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais
barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de
condições com as demais pessoas. [1]
Dados do último Censo indicam que 23,92% da população brasileira possui algum tipo de
deficiência, este censo foi realizado em 2010. As pessoas com deficiência enfrentam uma serie
de problemas e preconceitos perante a sociedade, que não se modificou desde seus primórdios
onde segundo CHAUÍ;
Historicamente, as pessoas que apresentam diferenças muito acentuadas em relação à maioria
das pessoas constituem-se alvo das mais diversas estratégias de violência simbólica. Um dos
segmentos populacionais reiteradamente colocados nessa posição tem sido o composto de

180
Centro Universitário Salesiano Unisal, Direito.

298
pessoas com deficiências físicas, mentais, sensoriais ou múltiplas, além daquelas que
apresentam outros transtornos de desenvolvimento. [...](Chauí e col., 1985, p. 11).[2]
Seus direitos garantidos por lei
Desde então ocorreram certas mudanças positivas para essa parte da população, que era
deixado de lado, umas de suas maiores mudanças no Brasil foi a criação do estatuto da pessoa
com deficiência que garante por lei direitos essências e básicos para o mesmo, como esta
escrito no art 1 LEI Nº 13.146, DE 6 DE JULHO DE 2015. (Estatuto da Pessoa com Deficiência).
Art. 1o É instituída a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Estatuto da Pessoa
com Deficiência), destinada a assegurar e a promover, em condições de igualdade, o exercício
dos direitos e das liberdades fundamentais por pessoa com deficiência, visando à sua inclusão
social e cidadania.[3]
Conforme a LEI Nº 13.146, DE 6 DE JULHO DE 2015,diz que a pessoa com deficiência deverá
ter acesso a todos os meios de saúde, educação e tratamentos e no caso da pessoa com
deficiência auditiva ou pessoa com dificuldade na fala existe a Língua Brasileira de Sinais
(Libras), porém a população não demonstra interesse de querer aprender libras , além do que a
linguagem de sinais não e obrigatória nas escolas , dificultando assim a comunicação entre as
pessoas, entretanto vem surgindo ONG´s com a intenção de tratamentos especializados, que
vem modificando aos poucos o cenário atual das pessoas com deficiência.
Estes direitos são recentes, deveria destinar uma verba maior para essa área ampliando a
fiscalização e investindo em profissionais especializados para mudança do cenário em que
encontramos hoje.
libras
A Língua Brasileira de Sinais (Libras) é a forma de comunicação utilizada pelas as pessoas com
deficiência auditiva ou na fala, sendo a única forma dessas pessoas conseguirem interagir e
socializar perante a sociedade, entretanto um de seus maiores problemas que poucas pessoas
se interessam em aprender libras, fazendo com que a pessoa com deficiência se sinta um
estrangeiro dentro dos seus próprios país, pois não consegue se comunicar e interagir perante
a sociedade.
As Libras, no entanto, foram institucionalizadas como forma de expressão dos surdos
brasileiros, pela Lei de Libras (BRASIL, 2002). Dessa forma, torna-se a forma oficial que os
surdos utilizam para a comunicação. Assegurado por lei, o direito do surdo de ser atendido na
forma natural de expressão, ou seja, em Libras, em diversos serviços públicos.
Todavia são poucos os profissionais e professores que estudaram libras, não tendo mão de obra
o suficiente para a demanda de pessoas com essa necessidade, pois não obrigatório dentro das
escolas o ensino da língua Brasileira de sinais (Libras) o que dificulta a socialização caso haja
um aluno com deficiência auditiva na sala.

299
Ao chegar a faculdade esse tema se torna mais importante, pois a uma necessidade maior em
estudar esse tema havendo vários artigos e teses sobre o assunto.
Como diz Milton Shintaku publicado no IBICT O interesse em Libras por várias disciplinas
revela a complexidade do tema, que apesar de ser uma língua, possui ramificações. Essa
característica permite estudos em várias disciplinas, dos estudos específicos sobre os aspetos
gramaticais da língua aos estudos do uso da língua em diferentes contextos.
4-educação
No Brasil a pessoa com deficiência é protegida por lei especial, porém, não protege todos seus
direitos como vemos acontecer nas escolas públicas Brasileiras, onde não há estrutura, nem
profissionais especializadas para acolher essas pessoas o que acaba sendo muito prejudicial
para o aprendizado e desenvolvimento deles. Onde quem tem condições acaba migrando para
rede particular de ensino, entretanto são poucos os que têm condições de pagar, o que
acontece e que muitos acabam não conseguindo uma vaga ficando em sua residência, e por
necessitarem de cuidados especiais a maior parte dos seus responsáveis deixam de trabalhar
para que possa cuidar dos seus filhos, o que gera um prejuízo pra renda familiar.
A situação de inclusão do aluno com deficiência na classe comum nem sempre é a que se
deseja. Em profícua discussão sobre o papel da escola e os sentidos de integração e inclusão,

como uma situação em que é imprescindível uma compreensão do aluno com deficiência, de
modo que ele possa ser integrado, ou seja, passe a pertencer à escola e fazer (382 Saúde Soc.
São Paulo, v.20, n.2, p.377-
observação, não se pode ignorar que a escola, embora detenha capital importância na vida da
sociedade, é apenas uma dentre várias outras instituições sociais e, como tal, impregnadas dos
seus valores culturais. Nesse mesmo sentido, Mazzotta (2003, p. 13),
A inclusão no Brasil vem andando a passos lentos, por conta do governo que não destina uma
verba maior a essas pessoas e não qualifica seus funcionários ou não tem funcionários o
suficiente para a capacidade de atender e priorizar os deficientes, porem por conta do
preconceito social para com essas pessoas, acabam impedindo à melhoria de serviços
prestados a pessoa com deficiência.
Art. 27. A educação constitui direito da pessoa com deficiência, assegurados sistema
educacional inclusivo em todos os níveis e aprendizado ao longo de toda a vida, de forma a
alcançar o máximo desenvolvimento possível de seus talentos e habilidades físicas, sensoriais,
intelectuais e sociais, segundo suas características, interesses e necessidades de aprendizagem.
Parágrafo único. É dever do Estado, da família, da comunidade escolar e da sociedade
assegurar educação de qualidade à pessoa com deficiência, colocando-a à salvo de toda forma
de violência, negligência e discriminação.

300
O estatuto da pessoa com deficiência também garante que as escolas particulares tenham as
mesmas obrigações que a publica.
6- Precedentes Históricos
O conceito de pessoa com deficiência teve diversos tratamentos ao longo da história da
humanidade. Aliás, não se trata a priori do conceito abstrato, mas de como a pessoa com
deficiência é encarada e incluída dentro da realidade social. A perspectiva com a qual era
entendida a deficiência e as causas de sua existência influenciam diretamente a aceitação e
participação destas pessoas na sociedade. Da miscelânea destes conceitos biológicos, físicos,
morais e até metafísicos, brotou o conceito jurídico que ora se procura desvelar. Flávia
Piovesan delimita quatro estágios na construção dos direitos humanos da pessoa com
deficiência [4]. Num primeiro estágio de total intolerância tais pessoas eram consideradas
impuras, castigadas pelos deuses.
referência à eliminação de crianças nascidas com deformidades, seja por abandono seja
atirando-as da cadeia montanhosa de Tygetos na Grécia. Famosa foi a cidade grega de Esparta,
onde no reinado de Leônidas, os guerreiros deveriam ser perfeitos para defender suas
fronteiras, sendo sumariamente executadas as crianças nascidas com qualquer tipo de
deficiência.[5]
O segundo estágio foi o da invisibilidade. As pessoas eram colocadas em guetos, separadas do
resto da humanidade. Como exemplo desta fase tem-se os relatos bíblicos dos leprosos,
considerados impuros e segregados por toda a sociedade. Convém salientar a importância da
doutrina cristã, principalmente do novo testamento. Com a descrição dos milagres e curas a
pessoa deficiente foi trazida para o centro das atenções. Os preceitos do amor ao próximo, do
acolhimento e da universalidade dos direitos humanos foram importantes passos para dar
novo enforque a pessoa com deficiência na sociedade.
O terceiro estágio, talvez o mais vivenciado no Brasil, foi o assistencialismo. Essencialmente
marcado pelos avanços da medicina e a tentativa de curar qualquer limitação. O indivíduo
seria o portador de uma enfermidade, e deveria receber a ajuda assistencial por parte da
sociedade, enquanto não sobreviesse a cura para a sua doença.
A fase que ora se apresenta tem foco nos direitos humanos e na inclusão da pessoa com
deficiência de maneira plena em todas as searas sociais. Quem deve ser tratada agora, em que
pese a extrema importância da continuidade das pesquisas cientificas que visam minorar
limitações, é a sociedade.
A doença, na expressão pejorativa da palavra, não está mais centrada na pessoa, mas sim na
sociedade que tem profundas dificuldades de lidar com as diferenças, com qualquer pessoa que
destoe dos padrões vigentes.
No liame desta realidade surgiram mediante ampla discussão em que fizeram parte ativa as
próprias pessoas com deficiência [6], a Convenção sobre os direitos das Pessoas com
Deficiência da ONU.
301
7- APAE Associação dos Pais e Amigos dos Excepcionais
As APAES surgiram a mais de 60 anos, e é consideradas umas das maiores instituições sem fins
lucrativos do Brasil, criados por um grupo de pais que há anos atrás não tinham escolas para
seus filhos com necessidades especiais, presente em quase todos estados do país, com mais de
20 mil alunos, com profissionais qualificados para atender essa rede.
Como gestores, nosso olhar tem a clareza da gama de legislação existente, bem como que o
Brasil, no menor espaço de tempo, aderiu à Convenção da ONU.
É fundamental que a reunião do poder público com os Conselhos (Municipais, Estaduais e da
União) esteja fortalecida, objetivando a mudança de valores e, acima de tudo, respeitando o
cidadão com deficiência intelectual e múltipla.
Buscamos a cidadania através de respeito, promovendo e articulando ações de Defesa dos
Direitos das Pessoas com Deficiência, representando o Movimento perante os organismos
nacionais e internacionais para melhoria da qualidade dos serviços prestados pelas APAES, na
perspectiva da inclusão social dos seus usuários.
Palavras Aracy Maria da Silva Lêdo cartilha publicada pela APAESno dia 11/21/16[7]
CONCLUSÃO
O numero de pessoas com deficiência vem aumentando cada vez mais em todo o mundo, o
estado e a sociedade devem estar preparados para atender pelo menos suas necessidades
básicas, sendo necessário um alto conhecimento das técnicas utilizadas para auxiliar a pessoa
com deficiência seja ela qual for (visual, auditiva, intelectual, mental ou física), necessitando
de incentivos financeiros do estado para a realização de cursos especializados na área, onde
atualmente quase não há pessoas preparadas para atende-las corretamente , acontecendo isso
na escola , hospitais entre outros.
Referencias bibliográficas
[1]Art 2 da LEI Nº 13.146, DE 6 DE JULHO DE 2015. (Estatuto da Pessoa com Deficiência)
.[2] CHAUÍ, M. et al. Política cultural. 2. ed. Porto Alegre: Mercado Aberto, 1985.
[3] Art 1 da LEI Nº 13.146, DE 6 DE JULHO DE 2015. (Estatuto da Pessoa com Deficiência)
[4] PIOVESAN, Flávia. Direitos Humanos e o Direito Constitucional Internacional. São Paulo:
Saraiva, 2010, p.223-224.
[5] GUGEL, Maria Aparecida. Pessoas com Deficiência e o Direito ao Trabalho. Florianópolis:
Obra Jurídica, 2007, p.47.
[6] Em palestra proferida em 18/12/2009 na sede da Federação das Indústrias do Estado do
Ceará,

302
* Trabalho publicado nos Anais do XIX Encontro Nacional do CONPEDI realizado em
Fortaleza - CE nos dias 09, 10, 11 e 12 de Junho de 2010 8842
Palavras Aracy Maria da Silva Lêdo cartilha publicada pela APAESno dia 11/21/16[7]

303
CARTILHA SOBRE ELEIÇÕES E O DESPERTAR PARA A CIDADANIA
181

182

Resumo:
A extensão universitária é instrumento importante em relação às contribuições que a
universidade pode oferecer à comunidade, sendo necessário possibilitar ao aluno a prática do
que é aprendido em sala de aula, dando vida a distintos projetos. O contato entre os discentes e
a sociedade beneficia a todos, principalmente para aquele que está aprendendo. Tendo este
objetivo como norteador de suas ações o UNISAL Centro Universitário Salesiano de São
Paulo - UE Lorena, através de seu programa de Mestrado em Direito, do Centro de Extensão
Universitária e Ação Comunitária P. Carlos Leôncio da Silva e do Núcleo de Direitos
Humanos, em parceria com o Movimento Lorena pela VIDA, desenvolvem ações
diferenciadas, destinadas a conscientização sobre temas importantes para a sociedade, através
da criação de Cartilhas relacionadas à temática dos Direitos Humanos e de atuação junto a
entidades representativas da comunidade.
O presente artigo apresenta a edição especial da série Cartilha de Direitos Humanos: Eleições,
lançada em agosto de 2016 e desenvolvida com o propósito de resgatar o sentido da
participação cívica, informando aos eleitores sobre o processo eleitoral brasileiro,
principalmente para os Jovens e adolescentes, de forma a valorizar o voto consciente,
favorecer o despertar para a participação na vida do país, defender a ética na política e a
transparência no exercício da função pública, posturas fundamentais para a formação da
cidadania. O projeto foi realizado com base em pesquisa teórica sobre Eleições, debate aberto
ao público e a distribuição do material junto aos jovens, principalmente.
O projeto cumpriu com seu objetivo ao difundir a informação sobre o processo eleitoral
brasileiro e as formas de participação da sociedade, fundamentalmente para os adolescentes e
jovens. A Cartilha foi distribuída no mês de setembro, em evento institucional do Unisal que
reuniu cerca de 2.100 jovens do Vale do Paraíba, Litoral Norte, Sul de Minas e Sul Fluminense,
todos com idade para votar.
Sabemos que a mudança de comportamento só acontece em longo prazo, que só será
alcançada através da educação, que o voto consciente deve ser entendido como um
instrumento, não apenas ocasional para eleger políticos e gestores públicos, mas sim evitar o

Mestre em Direito, Especialista em Direito Público, Secretário de Cultura e Turismo, Juventude do Município de
181

Lorena-SP.
Especialista em Gestão Universitária, Coordenadora de Pós-Graduação Lato-Sensu e do Centro de Extensão
182

Padre Carlos Leôncio da Silva no UNISAL - Lorena-SP.

304
uso indevido de recursos públicos e descasos com a sociedade, fatos que desencorajam os
eleitores, principalmente os mais jovens e os afastam do exercício do direito de voto.
Palavras-chave: Cartilha; Eleições; Conscientização; Cidadania.
Resumen:
La extensión universitaria es un instrumento importante en relación a las contribuciones que
la universidad puede ofrecer a la comunidad, siendo necesario posibilitar al alumno la práctica
de lo aprendido en el aula, dando vida a distintos proyectos. El contacto entre los discentes y la
sociedad beneficia a todos, principalmente para el que está aprendiendo. Con este objetivo
como orientador de sus acciones el UNISAL - Centro Universitario Salesiano de São Paulo - UE
Lorena, a través de su programa de Maestría en Derecho, del Centro de Extensión
Universitaria y Acción Comunitaria P. Carlos Leôncio da Silva y del Núcleo de Derechos
Humanos, en asociación con el Movimiento Lorena por la VIDA, desarrollan acciones
diferenciadas, destinadas a concientización sobre temas importantes para la sociedad, a través
de la creación de Cartillas relacionadas a la temática de los Derechos Humanos y de actuación
junto a entidades representativas de la comunidad.
Este artículo presenta la edición especial de la serie Cartilla de Derechos Humanos: Elecciones,
lanzada en agosto de 2016 y desarrollada con el propósito de rescatar el sentido de la
participación cívica, informando a los electores sobre el proceso electoral brasileño,
principalmente para los jóvenes y adolescentes, con el fin de valorar el voto consciente,
favorecer el despertar para la participación en la vida del país, defender la ética en la política y
la transparencia en el ejercicio de la función pública, posturas fundamentales para la
formación de la ciudadanía. El proyecto se realizó sobre la base de la investigación teórica
sobre las elecciones, el debate abierto al público y la distribución del material junto a los
jóvenes, principalmente.
El proyecto cumplió con su objetivo al difundir la información sobre el proceso electoral
brasileño y las formas de participación de la sociedad, fundamentalmente para los
adolescentes y jóvenes. La Cartilla fue distribuida en el mes de septiembre, en un evento
institucional del Unisal que reunió a cerca de 2.100 jóvenes del Valle del Paraíba, Litoral Norte,
Sur de Minas y Sur Fluminense, todos con edad para votar.
Sabemos que el cambio de comportamiento sólo ocurre a largo plazo, que sólo se alcanzará a
través de la educación, que el voto consciente debe ser entendido como un instrumento, no
sólo ocasional para elegir políticos y gestores públicos, sino evitar el uso indebido de recursos
públicos Y descasos con la sociedad, hechos que desalientan a los electores, principalmente los
más jóvenes y los alejan del ejercicio del derecho de voto.
Palabras clave: Cartilla; Elecciones; Concientización; Ciudadanía.
INTRODUÇÃO

305
O Movimento Lorena pela VIDA nasceu com o intuito de contribuir para o efetivo
cumprimento do ECA Estatuto da Criança e do Adolescente. Há alguns anos, foi firmada feliz
parceria com o Programa de Mestrado em Direito, o Núcleo de Direitos Humanos e do Centro
de Extensão Universitária e Ação Comunitária P. Carlos Leôncio da Silva do UNISAL Centro
Universitário Salesiano de São Paulo Unidade Lorena Campus São Joaquim, e a Prefeitura
Municipal de Lorena, especialmente, para elaboração de Cartilhas de Direitos Humanos e
realização de ações diferenciadas de conscientização, promotoras da paz.
Em 2015, celebrando os 200 anos do nascimento de Dom Bosco183, grande homem, líder
positivo, que dedicou a sua vida em prol das crianças e dos jovens, os citados parceiros
lançaram, em Lorena/SP, vale destacar, o quinto volume da série de Cartilhas de Direitos
Humanos com o tema Bullying, visando auxiliar na prevenção, na formação de uma sociedade
pacífica, respeitosa, livre da violência.
A qualidade do trabalho e o pioneirismo das ações do grupo de parceiros do Vale do Paraíba,
diante da nova legislação vigente, que tem a intenção de prevenir a intimidação sistemática em
nosso país, ganharam destaque no Brasil e, até, internacionalmente.
Em 2016, por conta do ano eleitoral, uma edição especial na série de Cartilhas foi produzida,
justamente, para favorecer o despertar para a participação, sobretudo, os jovens.
Com o presente artigo, desejamos partilhar com os leitores valiosa experiência, contribuindo,
efetivamente, para o despertar da cidadania
1. UMA SÉRIE DE CARTILHAS DE DIREITOS HUMANOS
O primeiro volume da série de Cartilhas foi lançado no dia 21 de junho de 2013, durante o
Fórum Municipal de Políticas sobre Drogas, realizado no Centro Educacional Carlos Eugênio

outubro de 2013, no Centro Universitário Salesiano de São Paulo, Unidade de Lorena/SP,


contando com a presença de alunos do Programa de Informática para a Idade Ativa do
UNISAL e de participantes do JORI Jogos Regionais dos Idosos.

com a presença dos membros do Conselho Municipal de Direitos da Pessoa com Deficiência de
Lorena, da APAE e demais entidades, do no dia 11 de dezembro de 2013.

março de 2014, durante a realização do Arena Show e do Simpósio Ambiental da Canção Nova.

NASCIMENTO, G. A. F.; ALKIMIN, M. A. (Org.); SILVA, D. R. (Org.). Direitos Humanos e Juventude: estudos em
183

homenagem ao bicentenário de Dom Bosco. 1. ed. Curitiba: CRV, 2016. v. 1. 190p .

306
Juventude: Proteção à Juventude na Sociedade Contemporânea, em 30 de outubro de 2015; um
projeto pioneiro que visa reforçar a intervenção social da instituição de ensino superior com
os parceiros junto à comunidade, buscando contribuir para a proteção integral e efetivação
dos direitos humanos e fundamentais da criança e do jovem, em especial, a convivência
comunitária e promoção da paz.
O Movimento Lorena pela VIDA tem por objetivo promover a educação para crianças e
adolescentes, a respeito de temas importantes para a sua formação, tais como: prevenção do
uso de álcool e drogas, cidadania, direitos e deveres. Anualmente, realiza um Concurso de
Poesia e Ilustração Apelativa para alunos do ensino fundamental e ensino médio e como
prêmio aos autores dos melhores trabalhos oferece uma bicicleta. São 4 campeões: 2 do ensino
fundamental e 2 do ensino médio.
A referida iniciativa que nasceu em Lorena, atualmente, é nacional. Em 2017, o Movimento
Lorena pela VIDA está comemorando 10 anos e os trabalhos campeões deverão ser

semestre de 2017.
Todos os participantes do Concurso, hoje, denominado VALE VIVER, ainda, concorrem a um
brinde especial e as escolas dos alunos campeões recebem um kit de livros.
Todos os volumes das Cartilhas de Direitos Humanos estão gratuitamente disponibilizados na
internet no endereço do UNISAL184. Nele, o trabalho do Movimento Lorena pela VIDA,
também, está destacado.
Para comemorar cinco anos do Movimento pela VIDA, vale registrar, foi idealizado e realizado
o Passeio Ciclístico pela VIDA, no último domingo do mês de maio, em Lorena. Por conta do
sucesso do referido evento, ele passou a fazer parte do calendário de eventos da cidade,
sempre, no último domingo do mês de maio.
Todos os anos, o regulamento do Concurso de Poesia e Ilustração Apelativa VALE VIVER é,
oficialmente, lançado no Passeio Ciclístico pela VIDA. Ainda, nos últimos anos, as Cartilhas de
Direitos Humanos foram, nele, divulgadas e alguns exemplares distribuídos.
O SESI Serviço Social da Indústria de São Paulo, em 2016, participou do Passeio Ciclístico
pela VIDA com uma LIVROCICLETA e ganhou o prêmio na categoria criatividade. Na
oportunidade, alguns exemplares da série de Cartilhas de Direitos Humanos e outros livros
foram distribuídos, gratuitamente, para os participantes do referido evento que foi iniciado no
5º BIL Batalhão de Infantaria Leve e encerrado no CSU Centro Social Urbano em
Lorena/SP.

184
http://unisal.br/extensao1/direitos-humanos

307
O mais novo participante, o mais idoso participante, o mais animado participante, a família
com o maior número de participantes e a entidade com maior número de participantes,
também, recebem uma singela premiação.
2. CARTILHA SOBRE ELEIÇÕES
A Cartilha sobre Eleições surge por conta do ano eleitoral. O desejo dos parceiros é favorecer o
despertar para a cidadania, especialmente, ajudar os mais jovens.
Para a sua elaboração foram consultados diversos atores envolvidos no dia-a-dia da instituição
e o resultado final foi uma cartilha que integrou vários programas, departamentos, núcleos,
ação comunitária, alunos, ex-alunos e professores do UNISAL Lorena.
Consideramos que a informação seria a nossa principal ferramenta junto a população sobre
temas intimamente ligados ao nosso momento político, tais como as questões eleitorais, o
combate à corrupção e para a prática da cidadania.
A elaboração do material, em formato impresso e online , contemplou, de forma didática o

que a participação dos Professores, alunos e ex-alunos das diferentes áreas, se desse através de
relatos para orientar os leitores a serem bons eleitores, cidadãos autônomos e conscientes,
com informações que objetivaram ampliar a conscientização do voto, a formação de novos
eleitores e reforçar o papel de cada um na sociedade.
Quais as condições para ser candidato? Quem deve votar? Como denunciar uma
irregularidade? É preciso apresentar o título de eleitor para votar? Título de eleitor tem prazo
de validade? Como funciona a entrega de santinhos? No dia da eleição é proibido o consumo
de álcool? É possível prisão no dia da eleição? O que fazer quando não for possível votar
(ausência do voto)? Quais são as consequências para quem não justificar? Quais votos não são
válidos e não são computados na apuração?
Temas relevantes, também, foram abortados na referida Cartilha. A ilustrar, a corrupção e a
herança política, a legislação a favor do bom gestor, gestão logística e de pessoas na vida
pública, a conscientização política e o papel dos educadores.
A Cartilha, sem dúvida, é um diferenciado instrumento no processo de educação para a
cidadania e o seu conteúdo foi preparado, justamente, visando contribuir para que todos,
cidadãos, efetivamente, colaborem na construção de um mundo melhor, com destaque, sim,
para a importância do voto, todavia, reforçando a necessidade das ações cotidianas,
participação, cidadania, na construção de um mundo justo e fraterno.
Importante destacar, entre os temas relevantes e atuais tratados na Cartilha está o
impeachment, previsto no artigo 85 e seguintes da Constituição Federal de 1988, com
procedimentos previstos na Lei 1.079/50. No cometimento de crimes de responsabilidade,
autoridades poderão sofrer o impeachment. Inclusive, o artigo 14 da referida Lei estabelece que

308
é permitido a qualquer cidadão denunciar o Presidente da República ou Ministro de Estado,
por crime de responsabilidade, perante a Câmara dos Deputados.
No caso do Presidente da República, havendo o afastamento definitivo, o Vice-Presidente
deverá assumir o cargo, o que, recentemente, acontecera em nosso país.
Ainda, a cartilha foi desenvolvida considerando como deve ser a atuação dos gestores públicos
frente aos Poderes e quais as punições quando do descumprimento de regras básicas, previstas
na legislação brasileira, quando do exercício do cargo ou função pública.
Para o Lançamento da Cartilha, foram desenvolvidas estratégias, tais como:
Debate Público
No dia 19 de agosto de 2016, às 19:00 horas, o Unisal promoveu um debate público abordando
diversos temas ligados a eleições. Estiveram presentes como parceiros do evento, cerca de 430
pessoas, entre Alunos e Ex-Alunos do UNISAL de diversos Cursos de Graduação, das áreas de
educação, comunicação, direito, gestão, Mestrado em Direito, Cartório Eleitoral, Tribunal de
Justiça de São Paulo, SEMESP (Sindicato das Mantenedoras do Ensino Superior) público
externo representado por membros da sociedade civil (Associações de Moradores de Bairro,
Movimento Lorena pela Vida, Conselho Municipal de Juventude, IEV (Instituto de Estudos
Valeparaibanos), Professores e Colaboradores do UNISAL. e da sociedade local.
O público presente pode interagir com os palestrantes que discutiram temas como: A herança
política e os reflexos no cenário atual do Brasil; A coberta da imprensa nas eleições; O
posicionamento do Tribunal Regional Eleitoral; A igreja na formação de eleitores; A
responsabilidade civil e administrativa do gestor público. Após o encerramento do debate se
procedeu ao lançamento oficial da cartilha.
Divulgação e distribuição:
Foram utilizadas várias formas de distribuir e divulgar a cartilha, destacando-se além da
-
tradicional evento do UNISAL com milhares estudantes do ensino médio O evento foi
utilizado para conscientizar os jovens acerca de seu importante papel na sociedade, mas,
também, na eleição. As cartilhas foram distribuídas e a receptividade foi bastante positiva,
sendo nesta ocasião distribuídos mais de 1.000 exemplares.
3. UM PROJETO EXTENSIONISTA DIFERENCIADO
Para entender o papel da extensão na formação do profissional do século XXI é necessário
lembrar que a extensão surgiu, em 1871, inicialmente na Universidade de Cambridge, na
Inglaterra, e depois em Oxford, na forma de cursos de atualização e aperfeiçoamento para
trabalhadores e outros segmentos populares.

309
Estes cursos não tinham como objetivo suprir carências de formação profissional de seus
alunos, senão que se voltavam para temas históricos, literários, filosóficos e científicos de
interesse geral.
Esta experiência espalhou-se por todo o continente europeu e para os Estados Unidos, que, no

ades
agrícolas.
No Brasil, as atividades de extensão aparecem dentre os objetivos das instituições de ensino
superior, na legislação para o ensino superior, desde 1931, deixando claras as várias dimensões
da universidade, não apenas a produção de conhecimento, a capacitação técnica, científica e
profissional de seus alunos.
São consideradas responsabilidades das Universidades, através da Extensão, de forma mais
geral, a preservação e difusão do patrimônio cultural da humanidade, a promoção e o
desenvolvimento do bem-estar físico, espiritual e social, a promoção e a garantia dos valores
éticos, democráticos, de igualdade de direitos e de participação, o respeito à pessoa e à
sustentabilidade das intervenções no ambiente.
Assim, o papel da Extensão é o de romper as barreiras da sala de aula, sair do ambiente
fechado da Universidade, possibilitar a troca de informações provenientes da sociedade. Os
conteúdos abordados passam a ser multi, inter e transdisciplinar, pois o grande desafio da
extensão é repensar a relação do ensino e da pesquisa às necessidades sociais, estabelecer as
contribuições da extensão para o aprofundamento da cidadania e para a transformação efetiva
da sociedade, pois a teoria e a prática quando pensadas conjuntamente possibilitam o pensar e
interpretar, o agir e o modificar a realidade.
Tendo estas premissas como norteadoras de suas ações o UNISAL Centro Universitário
Salesiano de São Paulo - UE Lorena, através de seu programa de Mestrado em Direito, do
Centro de Extensão Universitária e Ação Comunitária P. Carlos Leôncio da Silva e do Núcleo
de Direitos Humanos, em parceria com o Movimento Lorena pela VIDA, desenvolvem ações
diferenciadas, destinadas a conscientização sobre temas importantes para a sociedade, através
da criação de Cartilhas relacionadas à temática dos Direitos Humanos e de atuação junto a
entidades representativas da comunidade.
O presente artigo apresenta a edição especial da série Cartilha de Direitos Humanos: Eleições,
lançada em agosto de 2016 e desenvolvida com o propósito de resgatar o sentido da
participação cívica, informando aos eleitores sobre o processo eleitoral brasileiro,
principalmente, aos jovens e adolescente, de forma a valorizar o voto consciente, favorecer o
despertar para a participação na vida do país, defender a ética na política e a transparência no
exercício da função pública, posturas fundamentais para a formação da cidadania. O projeto
foi realizado com base em pesquisa teórica sobre Eleições, debate aberto ao público e a
distribuição da Cartilha.

310
Para entender a importância da elaboração de uma cartilha especial sobre as eleições, no
cenário politico atual, é importante lembrar que:
As eleições no Brasil são realizadas em anos pares, a cada dois anos, alternando a escolha dos
cargos eletivos, divididos em dois grupos:
Eleições Gerais nas quais são escolhidos os representantes para os cargos de Presidente da
República (e vice), Senador, Deputado Federal, Governador (e vice) e Deputado Estadual.
Eleições Municipais nas quais são escolhidos Prefeitos (e vices) e Vereadores. A eleição
sempre ocorre no primeiro domingo do mês de outubro. Caso haja segundo turno, este sempre
será realizado no último domingo do mesmo mês.
Este momento tem que ser entendido com grande responsabilidade, pois todos brasileiros, em
condições de votar, se tornam iguais: independente de sexo, raça, condição financeira, nível de
escolaridade ou grupo social - o voto tem o mesmo peso nas urnas.
O voto, somente após a constituição de 1988, passou a ser um direito de todos os cidadãos no
país, que dentro das normas legais, passaram a ter a prerrogativa de escolher seus
representantes.
Tais fatos, que marcam a nossa história recente, fazem com que o direito do cidadão escolher
de forma livre seus representantes por meio do voto, ganhe ainda mais importância. Neste
sentido, o voto é uma conquista. Um exercício de cidadania que caracteriza as sociedades
democráticas.
Assim, o projeto cumpriu com seu objetivo ao difundir a informação sobre o processo eleitoral
brasileiro e as formas de participação da sociedade, fundamentalmente, para os adolescentes e
jovens. A Cartilha foi distribuída no mês de setembro, em evento institucional do UNISAL que
reuniu cerca de 2.100 estudantes do Vale do Paraíba, Litoral Norte, Sul de Minas e Sul
Fluminense, todos com idade para votar.
Sabemos que a mudança de comportamento só acontece em longo prazo, que só será
alcançada através da educação, que o voto consciente deve ser entendido como um
instrumento, não apenas ocasional para eleger políticos e gestores públicos, mas sim evitar o
uso indevido de recursos públicos e descasos com a sociedade, fatos que desencorajam os
eleitores, principalmente os mais jovens e os afastam do exercício do direito de voto.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O projeto Cartilha sobre Eleições, desenvolvido no Município de Lorena/SP, cumpriu com as
etapas pré-estabelecidas alcançando objetivos como a difusão do conhecimento, despertando
para a cidadania. Foram distribuídas 1500 cartilhas impressas e disponibilizado o acesso
através do meio digital.

311
A Instituição de Ensino Superior através de suas ações e projetos de extensão, em parceria
com o Movimento Lorena pela VIDA, além de proporcionar aos seus discentes, docentes e
técnicos, meios para a prática e promoção da cidadania, desempenha um papel fundamental
para a edificação de novos paradigmas no município, na região e no país.
Desta forma, temos um diferenciado projeto extensionista em Lorena favorecendo a
socialização, o respeito, os valores éticos, principalmente, um projeto este que prioriza o voto
consciente, favorece o despertar para a participação na vida do país, defende a ética na política
e a transparência no exercício da função pública, posturas fundamentais para a formação da
cidadania e que. estimula à participação no Brasil.
Para a comunidade acadêmica foi mais uma excelente oportunidade para o fomento a
discussão da temática, assim como para os leitores, especialmente para muitos jovens, que as
vésperas de importante processo eleitoral no país, ainda não tinham refletido sobre
profundamente sobre o assunto.
Sabemos que a mudança de comportamento só acontece em longo prazo, que só será
alcançada através da educação, que o voto consciente deve ser entendido como um
instrumento, não apenas ocasional para eleger políticos e gestores públicos, mas sim evitar o
uso indevido de recursos públicos e descasos com a sociedade, fatos que desencorajam os
eleitores, principalmente os mais jovens e os afastam do exercício do direito de voto.
Por fim vale ressaltar que a referida Cartilha, desde o lançamento, está disponível na internet
185
, gratuitamente, e pode ser utilizada por qualquer interessado, inclusive para ações de
conscientização em escolas e demais instituições que tenham interesse, assim como os agentes
do projeto na construção de um país cada vez mais cidadão, comprometido com a defesa dos
valores éticos afim de que a população não sofra injustamente.
BIBLIOGRAFIA
NASCIMENTO, G. A. F.; ALKIMIN, M. A. (Org.); SILVA, D. R. (Org.). Direitos Humanos e
Juventude: estudos em homenagem ao bicentenário de Dom Bosco. 1. ed. Curitiba: CRV, 2016.
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Federal: de 4 de maio de 2000.
_______, Lei Complementar Federal nº 64/90 (Lei das Inelegibilidades), Distrito Federal: de 18
de maio de 1990.

185
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312
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processo de julgamento). Distrito Federal: de 10 de abril de 1950.
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Junho de 1992;
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1997.
________, Resolução TSE n.º 23.450/2015, sobre o Calendário Eleitoral em 2016, Distrito
Federal: de 10 de novembro de 2015.
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VIANA Lucena ESMERALDO, Elmana. Processo Eleitoral - Sistematização Das Ações
Eleitorais, 3ª Ed. Leme: Ed. J. H. Mizuno, 2016.

313
A POBREZA E O TRABALHO INFANTIL: A FACE PERVERSA DA RELAÇÃO DE
CONSUMO NO BRASIL ENVOLVENDO A INFÂNCIA POBRE
186

187

Resumo
O presente trabalho é fruto de estudos desenvolvidos no Programa de Mestrado em Direito do
Centro UNISAL, Lorena, São Paulo, Brasil. As autoras apresentam e analisam, sob a ótica dos
Direitos Sociais, Direitos Humanos, as questões que envolvem a infância e a pobreza na
sociedade de consumo. A criança, é pessoa em desenvolvimento biopsicossocial, que é alvo da
publicidade de produtos e serviços, causando uma demanda pelo consumo. A situação se torna
mais delicada no trato da criança pobre e o estímulo ao consumo a que está exposta, o que
culmina, em sua maioria das vezes, na busca por afazeres que deem retorno monetário a fim
de que se possa concretizar o desejo do produto ou serviço a ser consumido, e no caso, o
trabalho infantil e até mesmo a sua submissão às condições análogas a escravo. Constata-se
que o consumo ou o hiperconsumo é estimulado principalmente junto a crianças e
adolescentes, entretanto, como a maioria da população está, socioeconomicamente na pobreza
ou miséria, e cria-se a necessidade de consumo de produtos supérfluos em detrimento dos
mais urgentes e necessários para que se tenha condições de vida digna. Realizou-se revisão
bibliográfica e documental, para demonstrar, discutir e apresentar a fragilidade da infância
exposta a uma miríade de estímulos para o consumo e a busca pela concretização dos desejos
de bens de consumo, com a submissão ao trabalho escravo ou não. A revisão documental,
bibliográfica nas áreas do Direito, Sociologia, Economia e Psicologia busca-se apresentar a face
perversa da sociedade do consumo, tendo como vítimas as crianças pobres.
Palavras-chave: Pobreza; trabalho infantil; relação de consumo.
INTRODUÇÃO

Pós-Doutora em Democracia e Direitos Humanos pela Universidade de Coimbra - Ius Gentium Conimbrigae.
186

Mestre e Doutora em Direito das Relações Sociais pela PUC/SP. Professora e pesquisadora no Programa de
Mestrado em Direito do Centro Universitário Salesiano de São Paulo (UNISAL). Diretora operacional do UNISAL.

Observatório de Violência nas Escolas (UNESCO/UNISAL).Professora da FEG/UNESP. Membro da Academia de


Letras de Lorena.
187
Doutora em Direito. Mestre em Direitos Difusos e Coletivos. Professora do Programa de Mestrado em Direito do
Centro Universitário Salesiano de São Paulo (UNISAL) e nos Cursos de Graduação e Pós-Graduação. Professora
Doutora III da EEL USP. Pesquisadora dos Grupos de Estudos "Ética e Meio Ambiente", "Direito das Minorias,
discriminação e efetividade de direitos" e do Observatório de Violências nas Escolas (UNESCO/UNISAL).
Coordenadora do Núcleo de Estudos de Direitos Humanos do UNISAL. Líder do Grupo de Pesquisa "Direitos
Humanos" (UNISAL/CNPq).

314
O presente artigo envolve a infância e a pobreza na sociedade de consumo. Num contexto em
que a pobreza e a miséria estão aumentando em razão da crise social, econômica e política
brasileira, a criança é a pessoa mais vulnerável.
A infância é roubada, pois várias crianças se veem envoltas ao trabalho, muitas vezes em
condições análogas à escravidão e embora existam normas no âmbito interno e internacional,
cada vez mais, o consumo tem aguçado as crianças, vulneráveis, terem o desejo por bens e
serviços, sem que sejam necessários.
A criança como alvo da publicidade: normas jurídicas de proteção
A Constituição Federal de 1988, traz em seu artigo 5º, inciso XXXII, que o Estado brasileiro
promoverá a defesa do consumidor. O Código de Defesa do Consumidor de 1990, inovou
quando de seu advento na ordem jurídica brasileira, quando reconheceu o consumidor como
hipossuficiente na relação de consumo com fornecedores de produtos e serviços. A tutela
consumerista, traz em seu bojo, princípios para a tutela de todo e quaisquer consumidor, como
se constata com o artigo a seguir:
Art. 4 A Política Nacional das Relações de Consumo tem por objetivo o atendimento das
necessidades dos consumidores, o respeito à sua dignidade, saúde e segurança, a proteção de
seus interesses econômicos, a melhoria da sua qualidade de vida, bem como a transparência e
harmonia das relações de consumo, atendidos os seguintes princípios: I reconhecimento da
vulnerabilidade do consumidor no mercado de consumo; II ação governamental no sentido
de proteger efetivamente o consumidor: a) por iniciativa direta; b) por incentivos à criação e
desenvolvimento de associações representativas; c) pela presença do Estado no mercado de
consumo; d) pela garantia dos produtos e serviços com padrões adequados de qualidade,
segurança, durabilidade e desempenho. III harmonização dos interesses dos participantes
das relações de consumo e compatibilização da proteção do consumidor com a necessidade de
desenvolvimento econômico e tecnológico, de modo a viabilizar os princípios nos quais se
funda a ordem econômica (art. 170, da Constituição Federal), sempre com base na boa-fé e
equilíbrio nas relações entre consumidores e fornecedores; IV educação e informação de
fornecedores e consumidores, quanto aos seus direitos e deveres, com vistas à melhoria do
mercado de consumo; V incentivo à criação pelos fornecedores de meios eficientes de
controle de qualidade e segurança de produtos e serviços, assim como de mecanismos
alternativos de solução de conflitos de consumo; VI coibição e repressão eficientes de todos
os abusos praticados no mercado de consumo, inclusive a concorrência desleal e utilização
indevida de inventos e criações industriais das marcas e nomes comerciais e signos distintivos,
que possam causar prejuízos aos consumidores; VII racionalização e melhoria dos serviços
públicos; VIII estudo constante das modificações do mercado de consumo. (grifo nosso)
Também o Código de Defesa do Consumidor, no seu artigo 37 traz a seguinte redação:
Art. 37. É proibida toda publicidade enganosa ou abusiva.

315
(...) § 2 É - abusiva, dentre outras, a publicidade discriminatória de qualquer natureza, a que
incite a violência, explore o medo ou a superstição, se aproveite da deficiência de julgamento e
experiência da criança, desrespeita valores ambientais, ou que seja capaz de induzir o
consumidor a se comportar de forma prejudicial ou perigosa à sua saúde ou segurança.`
Art. 39. É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas
abusivas:
(...)IV prevalecer-se da fraqueza ou ignorância do consumidor, tendo em vista
sua idade, saúde, conhecimento ou condição social, para impingir-lhe seus produtos
ou serviços; (grifo nosso)
E ainda, o Decreto n. 2181 de 18 de março de 1997, trata do tema no artigo que segue:
Art. 14. É enganosa qualquer modalidade de informação ou comunicação de caráter
publicitário inteira ou parcialmente falsa, ou, por qualquer outro modo, mesmo por omissão,
capaz de induzir a erro o consumidor a respeito da natureza, características,
qualidade, quantidade, propriedade, origem, preço e de quaisquer outros dados sobre
produtos ou serviços.
§ 2 É abusiva, entre outras, a publicidade discriminatória de qualquer natureza, que incite à
violência, explore o medo ou a superstição, se aproveite da deficiência de julgamento e da
inexperiência da criança, desrespeite valores ambientais, seja capaz de induzir o consumidor a
se comportar de forma prejudicial ou perigosa à sua saúde ou segurança, ou que viole normas
legais ou regulamentares de controle da publicidade. (grifo nosso )
No que se refere Código Brasileiro de Auto-Regulamentação Publicitária, dispõe em o anúncio
dirigido à criança e ao jovem:
a) dar-se-á sempre atenção especial às características psicológicas da audiência-alvo; b)
respeitar-se- á especialmente a ingenuidade e a credulidade, a inexperiência e o sentimento de
lealdade dos menores;
c) não se ofenderá moralmente o menor;
d) não se admitirá que o anúncio torne implícita uma inferioridade do menor, caso este não
consuma o produto oferecido; e. não se permitirá que a influência do menor, estimulada pelo
anúncio, leve-o a constranger seus responsáveis ou importunar terceiros, ou o arraste a uma
posição socialmente condenável;
f) o uso de menores em anúncios obedecerá sempre a cuidados especiais que evitem distorções
psicológicas nos modelos e impeçam a promoção de comportamentos socialmente
condenáveis;

316
g) qualquer situação publicitária que envolva a presença de menores deve ter a segurança
como primeira preocupação e as boas maneiras como segunda preocupação.(grifo nosso)
Artigo 37 - Os esforços de pais, educadores, autoridades e da comunidade devem encontrar na
publicidade fator coadjuvante na formação de cidadãos responsáveis e consumidores
conscientes. Diante de tal perspectiva, nenhum anúncio dirigirá apelo imperativo de consumo
diretamente à criança. E mais:
I Os anúncios deverão refletir cuidados especiais em relação a segurança e às boas maneiras
e, ainda, abster-se de:
- desmerecer valores sociais positivos, tais como, dentre outros, amizade, urbanidade,
honestidade, justiça, generosidade e respeito a pessoas, animais e ao meio ambiente;
- provocar deliberadamente qualquer tipo de discriminação, em particular daqueles que, por
qualquer motivo, não sejam consumidores do produto;
- associar crianças e adolescentes a situações incompatíveis com sua condição, sejam elas
ilegais, perigosas ou socialmente condenáveis;
impor a noção de que o consumo do produto proporcione superioridade ou, na sua falta, a
inferioridade;
- provocar situações de constrangimento aos pais ou responsáveis, ou molestar terceiros, com
o propósito de impingir o consumo;
- empregar crianças e adolescentes como modelos para vocalizar apelo direto, recomendação
ou sugestão de uso ou consumo, admitida, entretanto, a participação deles nas demonstrações
pertinentes de serviço ou produto;
- utilizar formato jornalístico, a fim de evitar que anúncio seja confundido com notícia;
- apregoar que produto destinado ao consumo por crianças e adolescentes contenha
características peculiares que, em verdade, são encontradas em todos os similares;
-utilizar situações de pressão psicológica ou violência que sejam capazes de infundir medo.
II - Quando os produtos forem destinados ao consumo por crianças e adolescentes seus
anúncios deverão:
-procurar contribuir para o desenvolvimento positivo das relações entre pais e filhos, alunos e
professores, e demais relacionamentos que envolvam o público-alvo;
- respeitar a dignidade, ingenuidade, credulidade, inexperiência e o sentimento de lealdade do
público-alvo;
-dar atenção especial às características psicológicas do público-alvo, presumida sua menor
capacidade de discernimento;

317
- obedecer a cuidados tais que evitem eventuais distorções psicológicas nos modelos
publicitários e no público-alvo;
- abster-se de estimular comportamentos socialmente condenáveis.
(...)
O CONSUMO E A POBREZA
A pobreza, viola a dignidade da pessoa humana, na medida em que impossibilita a inserção do
cidadão na sociedade de consumo, não dá condições de liberdade para que possa querer,
desejar, ser e ter, ou não. Estar na linha da pobreza significa estar impedido de ser livre.188189
A sociedade de consumo discrimina, coisifica as pessoas pobres e miseráveis.
eram

demais. Até um tempo atrás, desejava-se ter algo que o vizinho comprou, era bom ter, era útil,
agora, nesta sociedade capitalista, neoliberal, pós-moderna e midiática. Há uma miríade de
produtos e serviços, e milhares de pessoas ávidas por consumir, com a vontade muito maior
que a necessidade, com o fim de serem reconhecidos. (SILVA, 2014). Isto não é diferente no
que se refere às crianças.
O TRABALHO INFANTIL COM VISTAS AO PERTENCIMENTO NA SOCIEDADE
CONSUMIDORA
A criança é pessoa em desenvolvimento biopsicossocial, em razão disso torna-se vulnerável ao
mercado voraz de bens e serviços. Assim, o consumismo, de acordo com Sabrina Duran, é o
obra infantil e adolescente no Brasil, como se depreende da
afirmação que segue:
A necessidade de um prato de comida já não é o único motivo a forçar crianças e adolescentes
ao trabalho precoce e degradante. Na sociedade do consumo exacerbado e da publicidade
ostensiva, outros itens pesam nas suas listas de urgências: celulares, tênis de marca e
videogames são alguns deles. A pressão social para a aquisição desses produtos é tão grande
que estes deixam de ser somente o bem conquistado e tornam-se os próprio
(Repórter Brasil, 2017)
O trabalho infantil não se relaciona diretamente com a fome, pobreza ou miséria, e sim devido
aos impulsos para o consumo, neste sentido, prossegue Sabrina Duran:
Eles veem os colegas com celular e procuram trabalho. Muitos jovens são autônomos:
compram computador, fazem cópias piratas de CDs e vão vender na rua para ganhar R$ 300,

188

189
-
Alínea, de 2014.

318
R$ 400 por mês. Hoje não são somente os pais que colocam os filhos para trabalhar. O
consumismo atrai muita criança e adolescente. (Repórter Brasil, 2017)
Para Luiz Henrique Ramos Lopes, chefe da Divisão de Fiscalização do Trabalho Infantil do
Ministério do Trabalho e Emprego, desde a divulgação do Censo de 2010 constata-se que o
za ou miséria extrema. As causas do
trabalho infantil são múltiplas, sendo o objeto deste artigo, a pobreza, miséria e o consumo,
embora existam outras concausas.
A exposição ao consumo dá-se em sua maior parte no meio ambiente urbano, onde há maior
exposição do público infantil e adolescente aos desejos do consumo, eles tornam-se, segundo
Luiz Henrique Ramos Lopes (REPORTER BRASIL, 2017):

ao apelo das propagandas,


[Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios] mostram que na faixa etária de 5 a 9 anos o
trabalho é muito mais rural do que urbano. De 10 a 14, o urbano começa a se sobrepor. De 15 a
17 anos o traba
De acordo com o Ministério do Trabalho e Emprego, as atividades em que são exploradas a
mão de obra de crianças e adolescentes mais comum, são atividades em feiras livres,
comércios ambulantes, borracharias, lava-jatos e oficinas mecânicas.

4o da Convenção 182 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) que trata da proibição


das piores formas de trabalho infantil e ação imediata para sua eliminação, aprovada pelo
Decreto Legislativo no 178, de 14 de dezembro de 1999, nas quais incluem-se as atividades
supramencionadas na lista de Piores Formas de Trabalho Infantil (Lista TIP).
Para Paula Moreira Neves, auditora fiscal do MTE que coordena o Projeto de Combate ao
Trabalho Infantil em Pernambuco, afirma que o consumismo, hoje, é um dos grandes desafios

trabalhar pela família ou são cooptados por terceiros nas ruas, mas muitos trabalham porque
querem comprar bens que os pais não têm condições de lhes dar. Já que a maioria desses pais
começou a trabalhar na infância, eles permitem e até estimulam que seus filhos façam o
BRASIL, 2017)
As crianças são expostas a graves riscos ao desempenharem as atividades contidas na Lista
TIP. São expostas a diversas violências, ao uso de drogas, bebidas alcóolicas, tráfico de pessoas,
aliciamento sexual, quando estão desenvolvendoatividades como ambulantes, nas vias
públicas, além de estarem expostas as questões ambientais, como a radiação solar, chuva, frio,
aos riscos de acidentes de trânsito e atropelamento (REPÓRTER BRASIL, 2017).
Em atividades como borracharias e lava rápido, além do esforço físico incompatível com sua
compleição física, são expostos a produtos químicos, antioxidantes, plastificantes e calor, ao

319
constante contato com solventes, neurotóxicos, névoas ácidas e alcalinas. (REPÓRTER
BRASIL, 2017).
Por sua vez, aos que s

lordoses e outras doenças músculo-

trabalho precoce ocasiona aos seus filhos, como a dificuldade de aprender, a defasagem e a
evasão escolar, os danos físicos ao corpo ainda em desenvolvimento e os dano
alerta Paula. (REPORTER BRASIL, 2017)
Sabe-
se trata de alguém devidamente constituído, que facilitaria a fiscalização e autuação por parte
do Ministério do Trabalho, em sua grande maioria são crianças e adolescentes que
acompanham seus pais.
Para Paula Neves, a utilização de praias e outros logradouros públicos para o comércio deve
ser regulamentada e fiscalizada pelo poder público municipal a fim de prevenir e coibir o uso

Outras medidas importantes são a busca dessas crianças em situação de trabalho e sua
inclusão em programas sociais e a realização de campanhas junto ao público em geral,

produtos e serviços das mãos de crianças e adolescentes que trabalham sob sol escaldante,

finaliza.
DADOS ESTATÍSTICOS DO TRABALHO INFANTIL NA SOCIEDADE BRASILEIRA
Os dados estatísticos do trabalho infantil no Brasil são realmente alarmantes.
De acordo o estudo realizado pelo Fórum Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho
Infantil (FNPETI), o Brasil vivenciou no ano de 2014 um aumento significativo de trabalho
infantil, correspondendo a um acréscimo de 4,5%, envolvendo crianças e adolescentes na faixa
etária entre 5 e 17 anos. A maior parte das
crianças e adolescentes ocupados está na faixa etária de 16 e 17 anos (57,8%).(OLIVEIRA, 2016).
Outros dados divulgados pelo IBGE e pela Fundação Abrinq, no último mês de abril de 2017,
apontam um total de 2,6 milhões de crianças e adolescentes, na faixa etária entre 5 e 17 anos,
trabalhando no Brasil, correspondendo a um aumento, em relação aos anos de 2014 e 2015, de
8,5 mil crianças de 5 a 9 anos e redução de 659 mil crianças e adolescentes, entre 10 e 17 anos
de idade. (MEIRELLES, 2017).

320
0 a 14 anos, equivalente a 40,2% da população brasileira nessa faixa etária, vivem em

É interessante observar que, embora a faixa etária mais envolvida no trabalho infantil seja a
autorizada pela legislação nacional, o trabalho infantil infelizmente é a realidade de crianças
de pouca idade, as quais ingressam no mercado por problemas de diversas ordens, inclusive
pela necessidade de consumo, conforme já relatamos anteriormente.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
No Brasil existem políticas públicas para a erradicação do Trabalho Infantil. Com este
trabalho, buscou-se provocar maiores reflexões acerca da relação, tão pouco abordada na seara
jurídica, entre pobreza, consumo e trabalho infantil.
Embora existam milhares de pessoas pobres no Brasil, há políticas de complementação de
renda, que impede, por vezes, que a miséria se instale. Vive-se numa sociedade capitalista, com
sistema neoliberal, num mundo globalizado, e cada vez mais, diante da conectividade que liga
tudo a todos, tratar da proteção da criança e sua educação para o consumo consciente, torna-
se um trabalho hercúleo.
Tratar das questões sociais não impedirá a criação de anseios, desejos e sonhos de consumo
em pessoas, na mais tenra idade. Há normas jurídicas que versam, proíbem e regulam, no
entanto, há as inter-relações pessoais, de forma que o consumidor sente-se pertencente a
determinado grupo, ao adquirir produto ou serviço.
A cultura do consumo é avassaladora, e as crianças são vítimas deste universo. O trabalho
infantil é um efeito colateral desta sociedade do (hiper) consumo, onde o que se aufere,
perdendo sua infância, e tão fugaz, que gera um circulo vicioso de desejo, satisfação,
descontentamento, desejo...enfim, é um ciclo infinito.
A criança consumidora, pobre ou miserável, tende a romper, inclusive laços familiares, no
contato com um mundo perverso que a alista nas fileiras dos consumidores mirins miseráveis.
Com isso, as portas das violações, violências múltiplas também se abrem diante de seres tão
vulneráveis social, físico e psicologicamente.
As ações do Ministério Público do Trabalho no Brasil são festejadas, mas a cada dia, o
problema social e econômico que assolou o país, mergulhado na corrupção e desvio de verbas
públicas, coloca em xeque, as ações preventivas e punitivas no país.
Por isso, fez-se a relação entre trabalho infantil e pobreza, num país com desigualdades
abissais, os fornecedores de produtos e serviços enredam pessoas hipervulneráveis no
perverso e cíclico hiperconsumo.
Referências

321
DURAN, Sabrina. REPÓRTER BRAS
cidades. Disponível em: http://meiainfancia.reporterbrasil.org.br/consumismo-o-aliciador-de-
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SILVA, Daisy Rafaela. O Consumo na Pós-Modernidade: Os efeitos nas classes D & E.
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SUCUPIRA, Fernanda. REPÓRTER BRASIL. A naturalização do Trabalho Infantil: por que
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gravidade desta forma de exploração. Disponível em:
http://meiainfancia.reporterbrasil.org.br/a-naturalizacao-do-trabalho-infantil/. Acesso em 25
de abril de 2017.

322
EDUCAÇÃO EM DIREITOS HUMANOS E O PROTAGONISMO DO JOVEM NA AÇÃO E
EXTENSÃO COMUNITÁRIA
190

191

Resumo
O presente artigo busca demonstrar que o processo educativo para a formação integral e para
o despertar da responsabilidade social deve abandonar o método da educação bancária e
estática para o modelo de educação libertadora onde se conduza ao protagonismo do educando
no processo educativo. Esse finalidade somente se atinge através de uma educação centrada
nos Direitos Humanos e que forma a pessoa humana na sua integralidade, inclusive, conduz à
formação da consciência cidadã, espírito de paz, comportamento ético e agir solidário,
proporcionando a transformação da sociedade e de seus valores. Nesse viés, o estudo também
aborda a relevância da indissociabilidade do tripé ensino, pesquisa e extensão, destacando que
uma das finalidades da educação em direitos humanos é o agir concreto e em prol da sociedade
através das atividades de extensão comunitária.
Palavras-chave: Juventude. Educação em Direitos Humanos. Direito Fundamental.
Protagonismo
Resumen
El presente artículo busca demostrar que el proceso educativo para la formación integral y
para el despertar de la responsabilidad social debe abandonar el método de la educación
bancaria y estática para el modelo de educación liberadora donde se conduzca al protagonismo
del educando en el proceso educativo. Este propósito sólo se alcanza a través de una educación
centrada en los Derechos Humanos y que forma la persona humana en su integralidad,
incluso, conduce a la formación de la conciencia ciudadana, espíritu de paz, comportamiento
ético y actuar solidario, proporcionando la transformación de la sociedad y de sus Los valores.
En este sentido, el estudio también aborda la relevancia de la indisociación del trípode

Pós-Doutora em Democracia e Direitos Humanos pela Universidade de Coimbra/Ius Gentium Conimbrigae,


190

Doutora em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (2002), Doutora em Direito das Relações
Sociais pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, Pós-Graduada em Direito Processual Civil pelo Centro
Universitário Salesiano de São Paulo, Coordenadora e Pesquisadora do Programa de Mestrado em Direito do
Centro Universitário Salesiano de São Paulo, Professora do Curso de Direito do Centro Universitário Salesiano de
São Paulo, Professora membro do Conselho Editorial da Revista Direito & Paz do Centro Universitário Salesiano de
São Paulo, Professora integrante do Observatório de Violência nas Escolas do UNISAL que integra o corpo de
cooperação técnico, científico e cultural, compondo a Cátedra da UNESCO de Juventude, Educação e Sociedade,
com sede na Universidade Católica de Brasília. Membro do Comitê de Ética e Pesquisa (CEP) do Centro
Universitário Salesiano de São Paulo. E-mail: maalkimin@terra.com.br

Especialista em Gestão Universitária.Coordenadora de Pós-Graduação Lato-Sensu e da Extensão Universitária no


191

UNISAL Lorena-SP. E-mail: fatima.mederios@lo.unisal.br

323
enseñanza, investigación y extensión, destacando que una de las finalidades de la educación en
derechos humanos es el actuar concreto y en pro de la sociedad a través de las actividades de
extensión comunitaria.
Palabras clave: Juventud. Educación en Derechos Humanos. Derecho Fundamental.
Protagonismo
1 INTRODUÇÃO
A educação, muito mais que um processo de transmissão e apreensão de conhecimentos,
saberes e experiências, deve visar a formação integral da criança, do adolescente e do jovem,
que devem ser educados com espírito de paz, dignidade, tolerância, liberdade, igualdade e
solidariedade, preparando-os para uma vida independente na sociedade, respeitosa e calcada
em valores éticos e humanos, onde se conduz o jovem para a assunção de responsabilidade
social e comunitária .
Essa cultura de valores éticos e humanos é a base da educação em direitos humanos que visa
despertar a consciência cidadã e participativa, permitindo ações individuais e coletivas na
defesa dos direitos humanos e na promoção da paz. A Constituição Federal de 1988 e a Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB, Lei n. 9.394/96) exaltam a educação plena e em
prol do bem-
exercício da cidadania e qualificação para o
A educação em Direitos Humanos requer, na expressão de Paulo Freire, uma pedagogia
humanista e libertadora (1983, p. 30), capaz de despertar a consciência reflexiva e participativa
do jovem, protagonista na transformação social e na construção de uma sociedade justa,
fraternidade e solidária.
Nesse sentido, o presente artigo pretende demonstrar que as escolas e as instituições de
ensino superior exercem um papel relevante na formação cidadã e participativa do jovem em
ações e atividades de extensão que visem a sua formação integral e que busquem proporcionar
à comunidade ações educativas voltadas para práticas humanas e solidárias.
A ação e extensão comunitária levam o jovem ao desenvolvimento e prática do protagonismo,
sendo um dos viés da atividade de extensão uma proximidade coma comunidade, sendo uma
abertura para participação democrática da sociedade, além de ser a melhor maneira de
conjugar a teoria e prática na atividade de ensino e de pesquisa, permitindo ao educando
construir sua liberdade e autonomia, por meio de participação criativa e construtiva para uma
sociedade democrática e solidária.
2 EDUCAÇÃO E ESCOLA PARA A FORMAÇÃO INTEGRAL
A educação corresponde a um processo contínuo de formação e de edificação da pessoa
humana, sendo certo que o Homem, a partir do seu nascimento já ingressa no processo
educativo para que se desenvolva e se adapte ao meio em que vive, ou seja, busque a
socialização.
324
O aprendizado é decorrente da educação, contudo, o aprendizado pode ocorrer de forma
unilateral e individualmente, ao passo que a educação, em regra, corresponde a uma
interferência de terceiro, como é o caso da educação da criança e do adolescente que sofrem
interferência do adulto no processo educativo, ou até mesmo o adulto que recebe a
interferência do detentor do conhecimento e da experiência.
Dessa forma, a educação integra esse processo humano, onde gerações adultas, dotadas de
conhecimentos nas mais variadas áreas do saber influenciam o processo de formação e
socialização da pessoa. (Durkheim, 1955)
educação é a ação exercida pelas gerações adultas sobre as
gerações que não se encontram ainda preparadas para a vida social; tem por objeto suscitar e
desenvolver, na criança, certo número de estados físicos, intelectuais e morais, reclamados
pela sociedade política no seu conjunto e pelo meio especial a que a criança, particularmente,

desenvolvimento pleno das crianças e jovens, sendo a escola, ao lado da família, o espaço de
integração social e de socialização para a formação cidadã e efetivo exercício da cidadania.
Sem dúvidas, a família é importante para a formação pessoal e individual da criança e do
jovem, entretanto, é na escola que está depositada a importância da socialização e respeito ao
próximo, a convivência com as diferenças e com as adversidades, pois na escola também se
aprende regras de convivência em grupo, enfim, aprende a ser, ver, sentir e entender o sentido
da igualdade e das diferenças.
A escola é parte integrante do processo de educação, ela tem por objetivo a construção,
elaboração, apreensão e formulação de conhecimentos que convergem para a formação da
pessoa humana, não se limita à apreensão dos conteúdos cognitivos, uma vez que envolve
valores, comportamentos e atitudes.
Lembrando Durkheim (1955), a educação tem a finalidade de levar o homem à socialização no
meio em que vive, recorrendo esse filósofo à observação histórica para concluir que cada
sociedade, considerada num momento determinado de seu desenvolvimento, tem um sistema
de educação que se impõe aos indivíduos.
Dessa forma, destaca a importância da escola no caminho que leva ao desenvolvimento
humano mais harmonioso e com formação plena para o enfrentamento das questões sociais,
tais como pobreza, exclusão social, marginalização, intolerâncias e opressões.
A escola contribui, sobremaneira, para a formação do ser humano, pois é o espaço onde todos
pensam, refletem, interagem, transmitem e adquirem experiências e conhecimentos.
A escola constitui espaço que deve integrar o dia-a-dia da criança e do adolescente, seres em
peculiar condição de desenvolvimento físico, mental e moral, nela eles buscam reproduzir
sonhos, criar utopias, estabelecer vivências, esperanças e expectativas para o futuro, aceitam e
325
encaram desafios, mitigam valores, tomam atitudes, enfim, exercem aquilo que é inerente a
todo cidadão, ou seja, a cidadania.
dania credencia o cidadão a atuar na vida efetiva do
Estado como partícipe da sociedade política. O cidadão passa a ser pessoa integrada na vida
estatal. A cidadania transforma o individuo em elemento integrante do Estado, na medida em
que o legitima como
(p. 243)
A escola contemporânea, muito além de ser um local de transferência de saberes, deve
fornecer condições para o enfrentamento da vida adulta de forma equilibrada, tanto sobre o
aspecto pessoal, como social, familiar e profissional, e, assim sendo, tem que ter por finalidade
primordial a formação cidadã para o pleno exercício dos direitos civis e políticos e a
convivência na solidariedade, na tolerância, na responsabilidade social e para a paz
A escola, entretanto, não é o único ambiente para construção e apreensão do conhecimento e
reconhecimento dos objetos ou saberes, a sociedade moderna e globalizada, decorrente da
telemática e da robótica, permite o acesso às informações e conhecimentos longe do ambiente
escolar.
Sem dúvida, depois da família, a escola continua sendo um espaço de interação grupal e social,
educacional e vocacional, cultural, de apreensão e aprendizado como forma de formação
intelectual e de preparação para o futuro, onde se aprende e exerce a cidadania, bem como
onde se busca desenvolver o espírito de solidariedade, cooperação e a conduta ética nas
relações com o próximo, cujo desenvolvimento tem início na convivência familiar.
3 EDUCAÇÃO EM DIREITOS HUMANOS
A Educação, embora positivada e reconhecida como direito fundamental e social do cidadão,
certamente, antes de assumir o status de direito fundamental e social, traz em sua essência a
natureza de direito humano natural, pois não obstante a sua positivação e assunção de direito
fundamental, inalienável e universalmente garantido, não se destaca da condição humana.
Na prática, a educação se constitui como sendo um processo contínuo de ação, transmissão,
capacitação, reprodução, aprendizado, apreensão e exteriorização de conhecimentos,
experiências, sentimentos, pensamentos, caracterizando-se como um fenômeno capaz de
formar, transformar, desenvolver, aprimorar habilidades pessoais e interpessoais e que leva o
homem a reconhecer-se como pessoa humana, titular de direitos universalmente garantidos, e
em condições de usufruí-los.
Portanto, pode-se afirmar que o acesso à educação, ou seja, o direito humano à educação é
inalienável e indissociável da condição humana.
A educação em direitos humanos tem origem e fundamento no preâmbulo da Declaração
Universal dos Direitos Humanos de 1948 que assim proclamou: A presente Declaração
Universal dos Direitos do Homem como o ideal comum a ser atingido por todos os povos e
326
todas as nações, com o objetivo de que cada indivíduo e cada órgão da sociedade, tendo
sempre em mente essa Declaração, se esforcem, através do ensino e da educação, por
promover o respeito a esses direitos e liberdades (n.g.), e pela adoção de medidas progressivas
de caráter nacional e internacional, por assegurar o seu reconhecimento e a sua observância
universal e efetiva, tanto entre os povos dos próprios Estados-Membros quanto entre os povos
dos territórios sob sua jurisdição. (ONU, 1948)
No mesmo sentido a Convenção sobre os Direitos da Criança, em seu art. 29 proclamou que a

humanos e às liberdades fundamentais, bem como aos princípios consagrados na Carta das

Para Silva (2010) a educação em d


multidimensional que orienta a formação dos sujeitos de direitos, articulando várias
dimensões, como a apreensão de conhecimentos sobre Direitos Humanos; a afirmação de
valores, atitudes e práticas que expressam uma cultura de Direitos Humanos; a afirmação de
uma consciência cidadã; o desenvolvimento de processos metodológicos participativos; e o
fortalecimento de práticas individuais e sociais que gerem ações e instrumentos em favor da
promoção e da
Os valores educacionais, dentre eles, a tolerância, a paz, a solidariedade, integram o preâmbulo

estar plenamente preparada para uma vida independente na sociedade e deve ser educada de
acordo com os ideais proclamados na Carta das Nações Unidas, especialmente com espírito de

Direitos da Criança, 1989).


Nesse contexto, imprescindível rever a prática pedagógica e adotar como prática a educação
em Direitos Humanos, cuja pedagogia humanitária vem sendo concretizada através do Plano
Nacional de Educação em Direitos Humanos, que visa orientar e definir diretrizes para a
elaboração de Políticas e Planos de Ação voltados à efetivação da Educação em Direitos
Humanos, com ênfase nos valores humanos.
A educação em Direitos Humanos deve ter por base os valores humanos elementares para o
bem-viver em sociedade, cujos valores, dentre outros, abrangem a tolerância e a solidariedade,
elementos essenciais para a paz na sociedade.
Afastando-se do modelo de educação bancária de Paulo Freire e da educação receptiva de
Piaget, que torna o aprendizado estático e meramente reprodutivo de conteúdo, a educação
em direitos humanos é praticada nos moldes da educação libertadora, ou seja, aquela que
educa para integralização da pessoa, com assunção de habilidades pessoais, profissionais,
comprometimento com o social, portanto, assunção de responsabilidade social.
A educação em direitos humanos ensina obediência às normas de bem-viver e às normativas
que regem a conduta social e, em especial, em observância e obediências aos direitos humanos,
327
a educação deve ser holística, ou seja, é dirigida para todos, seja sob o aspecto formal ou
informal; edificadora, ou seja, despertar para a consciência social que requer uma educação
em e para a cidadania e para os direitos humanos, onde o educando além de receptor se torna
o protagonista do processo, tornando o processo educacional um espaço democrático e do
despertar par a cidadania plena.
O comportamento violento é aprendido e exercido nas relações interpessoais, entretanto, há
maneiras de ensinar o contrário, ou seja, comportamento não violento, ensinando a lidar com
frustrações e com a raiva, ensinando habilidades para controle dos conflitos interpessoais e

tolerância e solidariedade ensin


3.1 O DIREITO FUNDAMENTAL À EDUCAÇÃO
De acordo com a ordem jurídica constitucional, o direito à educação é um direito fundamental
e social de todo cidadão (art. 6º. da Constituição Federal de 1988), entretanto, como está ligado
ao pleno desenvolvimento da criança e do adolescente, é um direito fundamental especial
dessas pessoas em peculiar condição de desenvolvimento(art. 3º. Do Estatuto da Criança e do
Adolescente- ECA-Lei n. 8069/90), sendo que no art. 205 da CF/88 foram fixados, em linhas
gerais, os princípios relativos à educação, onde consta que a educação é direito de todos e
dever do Estado e da família, devendo ser promovida e incentivada com a colaboração da
sociedade.
Nesse viés, a educação é um direito público subjetivo e de acesso universal, e como tal, impõe
para o Estado ações positivas no sentido de garantir e promover o acesso à educação, em todos
os níveis, possibilitando o pleno desenvolvimento e a preparação para a cidadania, além da
qualificação para o trabalho. (arts. 205 e 208 da CF/88)
O ECA, norma infraconstitucional que regulamenta o art. 227 da CF (que aborda os direitos
humanos e fundamentais infanto-juvenis), em seu artigo 4º., caput, assegura à criança e ao
adolescente, com absoluta prioridade, a efetivação, por parte da família, da sociedade e do
Estado, dos direito fundamentais referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao
esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e a
convivência familiar e comunitária.
Os direitos fundamentais são os direitos humanos reconhecidos e positivados pelo Estado,
tidos como direitos supranacionais, lembrando que são direitos anteriores ao próprio Estado,
integram, portanto, a categoria dos direitos naturais e que passaram a integrar a esfera jurídica
de todo cidadão (adulto, criança e adolescente), estando ligados à dignidade humana e à
limitação do poder, impondo, portanto, ao Estado o dever positivo de observância e de ação
visando estabelecer condições mínimas de vida e desenvolvimento da personalidade humana.

328
normas jurídicas, intimamente ligadas à ideia de dignidade da pessoa humana e de limitação
do poder; positivadas no plano constitucional de determinado Estado Democrático de Direito,

(p. 20).
Denota-se que o direito fundamental da criança e do adolescente à educação é um direito
subjetivo público (art. 208,CF), inerente ao ser humano, portanto, indissociável de sua
dignidade humana, onde o homem pela simples condição humana é titular de direitos

(Marmelstein, 2011, p. 18), portanto, os direitos fundamentais são não apenas extensão dos
consagrados Direitos Humanos, como também representa a sua plena efetivação.
Pode-se, afirmar, nesse sentido, que o direito à educação tem sua base no direito estatal que
tratou da positivação dos direitos e garantias fundamentais do cidadão no intuito de garantir
uma vida digna, embora haja responsabilidade solidária do Estado, da família e da sociedade
(arts.205 e 227 da CF) no que tange ao atendimento e ao acesso ao ensino fundamental que
deve ser destinado à criança e ao adolescente.
3.2 EDUCAÇÃO EM DIREITOS HUMANOS PARA O DESENVOLVIMENTO PESSOAL E
PARA O PROGRESSO DA SOCIEDADE
A educação é um processo que potencializa o desenvolvimento humano e, nesse sentido, a
educação formal e não-formal, familiar e escolar, constituem componente elementar para a
socialização, convivência social e assunção de responsabilidade social.
A educação, em todas as suas dimensões, é o antídoto para se construir uma sociedade onde
impere a cultura da paz e sem violências, sendo certo que o ideal de paz, ética e solidariedade
só se atinge por meio da educação em direitos humanos, que constitui o instrumento para se
educar para um meio ambiente escolar sadio, onde prevaleçam práticas éticas e solidárias que
busquem estabelecer o equilíbrio na vida pessoal, social, familiar, no trabalho.
A educação em direitos humanos representa a negação das violências e da criminalidade que
contaminam o cotidiano da convivência das pessoas, além de trilhar pela ética da vida, sendo a
educação em direitos humanos o caminho para o despertar da consciência individual e
coletiva que conduz ao bem-comum e à justiça social.
A educação da juventude e sua preparação para uma formação plena e integral, conscientes da
sua condição de sujeitos e protagonistas no exercício da cidadania e na fruição dos direitos e
garantias individuais, com pleno desenvolvimento da personalidade e pleno amadurecimento
humano e cristão, exige uma educação baseada em Direitos Humanos, consagrados pela Carta
das Nações Unidas (DUDH de 1945, ONU).
A formação centrada nos Direitos Humanos é o único caminho para a defesa, promoção e
realização dos direitos fundamentais, pois a realização e concretização de direitos
fundamentais é elementar para a existência humana, sendo certo que a proteção integral à

329
população infanto-juvenil somente será efetiva se houver conhecimento, reconhecimento dos
direitos humanos para a efetivação do pleno exercício dos direitos fundamentais que integram

A educação em Direitos Humanos e para a cidadania requer uma escola democratizante,


comprometida com a capacitação dos indivíduos para serem autores e atores do projeto da
sociedade em que vivem, com o ensino que busca a aceitação, tolerância e respeito ao
próximo, tanto no aspecto da liberdade como em relação a outros direitos individuais, ensina a
lutar na defesa dos direitos sociais e dos valores
culturais e ambientais, a combater preconceitos e injustiças sociais. Somente assim atingir-se-
á o ideal da educação e da escola na formação cidadã.
De acordo com o artigo 1º. da LDB (Lei de Diretrizes e Base da Educação, Lei n. 9394 de 20 de
dezembro de 1996), a educação abrange os processos formativos que se desenvolvem na vida
familiar, na convivência humana, no trabalho, nas instituições de ensino e pesquisa, nos
movimentos sociais e organizações da sociedade civil e nas manifestações culturais.
Como atores sociais protagonistas da educação em Direito Humanos encontram-se as crianças
e os adolescentes, seres em situação peculiar de desenvolvimento e que dependem da
educação para o desenvolvimento e formação plena, sendo certo que esta engloba a formação
cidadã e em Direitos Humanos.
A educação em direitos humanos não envolve apenas transmissão de saberes e aprendizado
que são recepcionados e reproduzidos pelos educando, envolve o diálogo, a cooperação, a
solidariedade e atitudes de respeito e consideração à dignidade humana na dimensão
individual e coletiva, permitindo uma visão do mundo e sua compreensão com base nos
valores que devem nortear o convívio pacífico e harmônico.

4 CIDADANIA E PARTICIPAÇÃO: O PROTAGONISMO DO JOVEM NA EXTENSÃO E AÇÃO


COMUNITÁRIA
A educação visa conduzir para autonomia e autodeterminação, cuja autonomia, segundo Paulo
Freire (1983, p. 38 ), integra a pedagogia humanista e libertadora, que ao tornar o homem

seada na
formação cidadã e em direitos humanos que levam à formação plena e o despertar para a
responsabilidade social.
4.1 JUVENTUDE E PARTICIPAÇÃO CIDADÃ: O PROTAGONISMO DO JOVEM
Sem dúvida o pleno gozo do direito à educação reflete em pleno gozo e exercício de outros
direitos, tais como profissionalização, trabalho, saúde, renda, cidadania e participação política
e em movimentos sociais etc.

330
A educação do jovem calcada no conhecimento e apreensão de valores ligados à cidadania e
aos Direitos humanos, torna-o aberto para autodescoberta e para assumir seu protagonismo
no processo de transformação da sociedade.

autonomia, através da geração de espaços e situações propiciadoras da sua participação


criativa, construtiva e solidária na solução de problemas reais, como já dissemos, na escola, na

Portanto, o foco deve ser o estabelecimento de políticas públicas que visem a educação para a
cidadania, com foco na educação que aprofunde a reflexão do presente e que estabeleça plano
de ação para o futuro.
Para o empoderamento do jovem que levará ao reconhecimento do seu papel da sociedade e
suas responsabilidades no presente e no futuro, para que possam atuar como agentes sociais
conscientes, o processo educativo calcado na articulação ensino, pesquisa e extensão deve
abranger, através da formação dos currículos e estabelecimento de ações práticas e reais, a
formação plena sob o aspecto intelectual, do conhecimento, da sensibilidade e que desperte o
protagonismo com habilidades necessárias para atuação humana, solidária e fraterna na
sociedade.
O Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8069/90), nos moldes da Convenção
Internacional dos Direitos da Criança (ONU, 1989), de caráter democrático e participativo,
reconhece a criança e o adolescente, como sujeitos de direitos, garantindo-lhes autonomia
participativa nos processos que lhes digam respeito.
No mesmo sentido, o Estatuto da Juventude garante autonomia e liberdade para o jovem
participar do processo democrático, contribuindo para a construção de uma nação livre,
solidária e fraterna, com inclusão em todos os níveis, revelando o protagonismo da juventude.
De acordo com a legislação brasileira, considera-se criança até os 12 anos incompletos,
adolescente até os 18 anos incompletos e jovem dos 15 aos 29 anos de idade. (ECA, art. 2º.)
Diante da necessidade de formação da consciência cidadã e do despertar para o protagonismo,
a educação superior tem a finalidade de formar o profissional e o cidadão consciente do seu
papel na sociedade e capaz de assumir responsabilidade social, cuja responsabilidade é
refletida através de atividades de extensão e à serviço da comunidade.
Dispõe o artigo 43 da LDB que o ensino superior deve: VI - estimular o conhecimento dos
problemas do mundo presente, em particular os nacionais e regionais, prestar serviços
especializados à comunidade e estabelecer com esta uma relação de reciprocidade; VII -
promover a extensão, aberta à participação da população, visando à difusão das conquistas e
benefícios resultantes da criação cultural e da pesquisa científica e tecnológica geradas na
instituição.

331
4.2 ATIVIDADES DE EXTENSÃO E AÇÃO COMUNITÁRIA: ARTICULAÇÃO ENTRE ENSINO,
PESQUISA E EXTENSÃO
No âmbito da educação universitária, notadamente, devem ser cumpridas as políticas
educacionais que visem a integração da juventude com a sociedade e, nesse sentido, é
importante a indissociabilidade e a articulação entre ensino, pesquisa e extensão, devendo os
currículos constituírem um processo aberto para inserção de temas transversais e da
interdisciplinaridade que possam reverter em ações práticas e de benefício paro o educando
em processo de formação integral e com responsabilidade social e para a sociedade.

problemas da vida cotidiana, possibilitando ao aluno a construção de conhecimentos


significativos , por meio do desenvolvimento de habilidades intelectuais, atitudes, formas de

O art. 2º. da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei n. 9394/96) reafirma o que
está previsto na CF/88 quanto a finalidade das práticas educativas: garantir o pleno
desenvolvimento do educando, seu preparo para o exercício da cidadania e a sua qualificação

A participação cidadã e proativa do jovem ocorre no sistema político e social, sendo a


atividade de extensão um processo de amadurecimento e desperta a consciência da sua
responsabilidade para com a sociedade, cuja atuação junto à sociedade completa e promove a
educação integral e contínua, logo, a educação cidadã completa o ciclo de formação científica,
profissional, humana e cristã.
Na verdade, a extensão é uma forma de exercício da autonomia e do protagonismo e, como um
processo educativo vincula o Ensino, a Pesquisa e a Extensão, tornando-os indissociáveis e
possibilitando uma ação transformadora entre a Universidade e a Sociedade.
No Fórum Nacional de Educação que ocorre todos os anos, a extensão é debatida como um
instrumento educativo que permite ao educando conjugar a teoria e prática, tornando-se um
trabalho interdisciplinar que leva a uma visão integrada do social, permitindo a formação de
uma práxis do conhecimento acadêmico, revertendo-o para a sociedade.
A extensão também é sinônimo de democratização da atividade educativa, que conduz à
autonomia dos universitários e que são protagonistas da transformação, através do trabalho
social, coletivo, cooperativo que reverte para a sociedade em forma de ações concretas e que
permitem uma política universitária onde se busque reduzir e combater a exclusão.
A extensão permite levar o aprendizado teórico para o meio social, contribuindo para a
formação humana diante do enfrentamento das questões sociais. Segundo Goulart(2004), a
extensão deve ser vista como um processo do ensino e não como um simples acontecimento
fora da sala de aula, em que os estudantes vão à comunidade para prestar serviços. Dessa
forma, as atividades de extensão poderão incluir todos os estudantes, operando inclusive, em

332
consonância com o ensino e com a pesquisa, de forma que elas sejam também atividades
produtoras de conhecimento.
O princípio da indissociabilidade entre Ensino, Pesquisa e Extensão está inserido no seu artigo
-científica, administrativa e de
gestão financeira e patrimonial, e obedecerão ao princípio de indissociabilidade entre ensino,

A extensão é o caminho para a qualidade da produção acadêmica e para permitir o diálogo


constante entre Universidade e sociedade, bem como com as demandas sociais, e isso torna
importante e necessária a indissociabilidade entre o Ensino, a Pesquisa e a Extensão,
humanizando o ensino e formando cidadãos participativos e com responsabilidade social.
Para Goulart (2004), considerando-se o conceito de extensão universitária, bem como o
conceito de indissociabilidade, integração, interação dialógica e interdisciplinaridade as ações
de extensão podem ser classificadas como: a) Programas, Projetos e Atividades de socialização
de conhecimentos; b) Cursos de Extensão; c) Participação em Conselhos, Eventos Acadêmicos
abertos à comunidade externa: Congressos, Simpósios, Seminários, Colóquios, Semanas de
Curso e atividades afins; d) Promoções de Arte, Cultura, Esporte e Lazer com envolvimento da
comunidade externa; e) Prestação de Serviços, Consultorias e Assessorias, Extensão
Tecnológica, Estágios Obrigatórios; f) Clínicas Escola; g) Práticas de Atuação Profissional
Curriculares; h) Disciplinas que incluem práticas com comunidades externas; i) Projetos de
Pesquisa, Trabalhos de Conclusão de Curso, Monografias, Dissertações e Teses com
metodologias e práticas de intervenção social junto a comunidades externas.
A prática da atividade de extensão e ações comunitárias é a representatividade da Educação
Social, que se caracteriza como sendo uma forma de educação integral do individuo que é
preparado para a convivência com seus semelhantes, possibilitando a superação ou redução
dos conflitos e a compreensão do outro por meio do diálogo construtivo e da paz social.
(Extensão, 2017).
De acordo com a filosofia salesiana, a Extensão é uma forma de mediação entre a Instituição e
o mundo e que possibilita o diálogo entre a sociedade, envolvendo os movimentos populares,
entidades não-governamentais, o mercado, envolvendo o mercado que produz, compra e
vende, absorve estagiários, egressos etc , e o Estado, envolvendo a política, sistema jurídico,
políticas públicas e até mesmo a regulação do ensino superior. (Extensão, 2017).
A atividade de Extensão e de Ação comunitária contribui para o desenvolvimento social do
individuo, remetendo-o para as questões e problemas sociais, otimizando o processo de
socialização e de intervenção nas questões sociais, tais como pobreza, exclusão, discriminação
etc.
Conclusão

333
Concluindo, denota-se que o processo ensino-aprendizagem está muito além do espaço
fechado das salas de aula, o aprendizado, além de contínuo, multi e interdisciplinar deve visar
ações e medidas centradas nos valores humanos e nas necessidades sociais.
Para esse desiderato, é elementar uma educação calcada nos direitos humanos, pois aprender,
apreender e transformar a sociedade exige do educando, em qualquer nível de ensino-
aprendizado, que conheça e que pratique direitos humanos, pois somente assim agirá com
consciência cidadã e espírito fraterno.
No ambiente universitário há necessidade de se vincular ao tripé do processo de ensino, qual
seja, o ensino, a pesquisa e a extensão comunitária, pois o universitário somente será
autônomo no processo de ensino e protagonista na sociedade em que vive, quando converter
seu aprendizado em prol da sociedade, realizando as diversas atividades de extensão,
notadamente aquela atividade que reverte em benefício social para a comunidade.
Referências
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democrática. Salvador: Fundação Odebrecht.
Durkheim, E. (1955). Educação e Sociologia. 4ª. edição. Trad. Lourenço Filho. São Paulo:
Melhoramentos.
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Paulo: Companhia Editora Nacional.
Extensão, (2017). Disponível em: http://unisal.br/extensao-acao-comunitaria-e-
pastoral/#sthash.9qzRRxfG.dpuf. Acesso em: 20 maio 2017.
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paz. 2a. ed rev. e ampl. Campinas, SP: Verus Editora.
Freire, P. (1983). Educação e Mudança. Trad. Moacir Gadotti e Lilian Lopes Martin.
6.ed.Coleção Educação e Mudança.Vol. 1, Rio de Janeiro: Paz e Terra.
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Goulart, A. T. (2004). A importância da pesquisa e da extensão na formação do estudante
universitário e no desenvolvimento de sua visão crítica. Horizonte; Revista do Núcleo de
Estudos em Teologia da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, Belo Horizonte, v. 2,
n. n.4, p. 60-73.
Guimarães, S. (2012). Ser jovem no Brasil: trajetórias juvenis no campo e na cidade.Campinas-
SP: Editora Línea.
Silva, A. M.M.; Tavares, C. (Orgs.)(2010). Políticas e fundamentos da educação em direitos
humanos. São Paulo: Cortez.

334
Siqueira Júnior, P. H.; Oliveira, M. A. M. (2009). Direitos Humanos e Cidadania. 2ª. ed .rev. e
atual. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais.

335
JUSTIÇA COMUTATIVA E DISTRIBUTIVA NO PENSAMENTO DE SANTO TOMÁS
192

193

Resumo
Este estudo objetiva refletir sobre a justiça explorando, mediante uma metodologia de análise
e rememoração filosófica, a temática das duas espécies da justiça, a saber, a justiça comutativa
e distributiva, desenvolvida na Suma Teológica de Santo Tomás, a partir de uma visão mais
ampla de toda a Suma. Isso é tratado nos artigos das questões 61 e 62 da segunda seção da
Segunda Parte da obra de S. Tomás. Na questão 61 ele afirma que a justiça comutativa diz
respeito às relações recíprocas entre pessoas particulares, enquanto que a justiça distributiva
se refere às relações entre a comunidade e as pessoas particulares. Para a primeira há uma
igualdade quantitativa, e para a segunda uma igualdade proporcional. Em ambas a justiça
versa sobre certas operações externas que consistem no uso de certos bens exteriores: coisas
ou pessoas ou ainda obras. Mais especificamente, na justiça comutativa, ele distingue entre
comutações involuntárias e voluntárias. Na questão 62, que trata da restituição, S. Tomás
afirma que a mesma é um ato de justiça comutativa, necessária para a salvação. No caso da
culpa, o remédio está na pena, que deve ser infligida pelo juiz. Existe a obrigação de restituir
aquilo em que outrem foi danificado, conforme a condição das pessoas e dos negócios,
devolvendo o que foi recebido. De fato, quem tem mais do que aquilo que lhe pertence, deve
privar-se disso e dá-lo a quem tem falta, conforme a razão formal da justiça comutativa. E todo
aquele que é causa de uma apropriação injusta está obrigado a restituir. Pretende-se, assim, a
partir de um autor clássico, analisar o tema da Justiça que marcou toda a reflexão etico-
jurídica da civilização ocidental, podendo apontar caminhos a serem trilhados para que a
justiça seja vivenciada e a injustiça seja evitada, nas relações recíprocas entre pessoas
particulares, como também nas relações entre a comunidade e as pessoas particulares.
Palavras-chave: Justiça comutativa; Justiça Distributiva; Restituição; Santo Tomás.
INTRODUÇÃO

o da Justiça da Suma
Teológica, que é considerada sua obra principal. A escolha se justifica, seja pela articulação do

Doutor em Filosofia pela Universidade Gama Filho (Rio de Janeiro). Professor e Pesquisador no Programa de
192

Mestrado em Direito do Centro Unisal U.E. de Lorena (SP). E-mail: enimine@gmail.com.


Doutor em Teologia pela Pontificia Università Lateranense (Roma). Pós-Doutor em Democracia e Direitos
193

Humanos pela Universidade de Coimbra. Professor e Pesquisador no Programa de Mestrado em Direito do Centro
Unisal U.E. de Lorena (SP). E-mail: lino.rampazzo@uol.com.br.

336
econômica de economia global, na qual não podem ser esquecidas todas as exigências da
Justiça. Será apresentado, a seguir, o esquema geral da Suma Teológica para poder entender
melhor onde estão colocadas as questões sucessivamente analisadas. Depois haverá a análise
das duas questões que irão considerar, antes, as duas espécies de justiça, indicadas no título; e,
sucessivamente, a questão da restituição ligada especificamente à modalidade da justiça
comutativa. A metodologia utilizada terá como referência principal o texto mesmo da Suma,
com a sucessiva contribuição de doutrinadores da área especificamente jusfilosófica.

1 O ESQUEMA DA SUMA TEOLÓGICA


Para entender melhor as questões 61 e 62, da segunda seção da Segunda Parte da Suma

apresenta-se o esquema geral da obra.


A Suma Teológica é articulada em três Partes. A Primeira Parte (questões 1-119), dogmática,
sobre Deus em si mesmo, sobre o mistério da Trindade e sobre a atividade criadora de Deus
(anjos, seres corpóreos, homem).
Na Segunda Parte, moral, Sâo Tomás considera o homem, impelido pela Graça, na sua
aspiração de conhecer e amar a Deus para ser feliz no tempo e na eternidade. Esta Parte, por
sua vez, está subdividida em mais duas seções: a primeira seção da Segunda Parte (prima
secundae I-II: questões 1-114),) e a secunda seção da Segunda Parte (secunda secundae II-II:
questões 1-189).
Primeiro (I-II), ele apresenta os princípios teológicos do agir moral, estudando como, na
liberdade de escolha humana para praticar o bem, integram-se a razão, a vontade e as paixões,
às quais se acrescenta a força que dá a Graça de Deus, bem como a ajuda que é oferecida
também pela lei moral. Analisam-se, aí, especificamente os seguintes temas: o fim último, os
atos humanos, as paixões, as virtudes, os vícios e os pecados; a lei, a graça.
Sobre este fundamento, São Tomás delineia a fisionomia do homem que vive segundo o
Espírito e que se torna, assim, um ícone de Deus (II-II). Aqui, ele estuda as três virtudes
teologais - fé, esperança e caridade -, seguidas do agudo exame de mais de cinquenta virtudes
morais, organizadas em torno das quatro virtudes cardeais - prudência, justiça, fortaleza e
temperança. Termina, então, com a reflexão sobre as diferentes vocações na Igreja.
Na terceira Parte da Suma (questões 1-90), novamente dogmática, São Tomás estuda o
Mistério de Cristo por meio do qual se pode alcançar novamente a Deus Pai. Nesta seção, ele
escreve páginas sobre o Mistério da Encarnação e da Paixão de Jesus e sobre os sete
sacramentos (Torrel, 2003).
As questões apresentadas neste estudo se encontram na seção que trata da virtude da justiça.

337
2 QUESTÃO 61: DAS PARTES SUBJETIVAS DA JUSTIÇA
As divisões da justiça que constam no prólogo da questão 61 referem-se à justiça particular.
Anteriormente São Tomás havia dividido a justiça em geral, que está presente em todo ato
virtuoso, e particular. Alguns entendem que a justiça geral formaria uma trilogia com a justiça

possíveis neste campo: das partes com o todo justiça geral , do todo com as partes
distributiva-, e das partes entre si ez, 1999, p. 499). Outros, porém
consideram que a justiça geral é para São Tomás uma virtude própria. 194
Para dar prosseguimento à temática das duas espécies de justiças, a saber, justiça comutativa e
distributiva, inicia-se a abordagem da questão 61 situada na segunda seção da Segunda Parte da
Suma Teológica de São Tomás. Esta questão está dividida em quatro artigos, os quais
correspondem à unidade de leitura da Suma Teológica.
É importante lembrar que cada artigo possui uma estrutura dialética própria do estilo da obra,
dividida nas seguintes partes: a) questão dialética, b) objeções, c) argumento em sentido
contrário, d) solução ou resposta de São Tomás, e) respostas às objeções, f) resposta aos
argumentos em contrário. O artigo tem início com uma questão dialética, a qual aponta para
dois sentidos opostos de possíveis respostas. Nem sempre se trata de uma questão
genuinamente dialética, no sentido de estar efetivamente em disputa na academia da época,
pois algumas vezes, como no caso da questão 61, trata-se apenas de uma forma didática de
ensinamento de uma questão que já se encontra pacificada na academia. Ainda fazendo parte
da questão dialética e da sua problematização vem uma resposta provisória, a qual faz uma
provocação, em geral no sentido inverso ao que São Tomas tomará, abrindo a parte chamada
-lhes
força a ponto de parecerem verdadeiros. Segue então um argumento em contrário. Tal
procedimento instaura o movimento dialético de oposição e instiga o leitor a procurar por si
mesmo os erros das objeções que parecem verdadeiras e suficientes, mas que não o são. Segue
então o ensinamento do próprio São Tomás, sua solução ou resposta à questão na qual em
geral desenvolve distinções que lhe permitem contestar as objeções e eventualmente corrigir
também os argumentos em contrário. Na sequência ele procede na maior parte das vezes à
refutação das objeções e por fim corrige quando necessário os argumentos em contrário. Do
exposto fica evidente que, para conhecer a posição de Tomás sobre cada questão, é necessária
uma leitura na íntegra do artigo. A leitura da resposta pode privar do exercício mesmo da
dialética e levar a uma resposta acolhida dogmaticamente sem a devida reflexão (Bird, 2005).
Com referência ao título da questão 62, o mesmo São Tomás, no prólogo, explica que as partes
subjetivas são as espécies da justiça, isto é, a justiça distributiva e a comutativa. A questão está
dividida em quatro artigos, que são considerados, a seguir.

Para aprofundamento recomenda-se: URDÁNOZ, Teófilo. Introducción al tratado de la justicia. En: SANTO
194

TOMAS DE AQUINO. Suma Teológica: VIII. Madrid: BAC, 1956, p. 417ss. y 451ss.

338
a em duas partes, a

afirmar a inconveniência de dividir a justiça particular em duas partes.


Os dois primeiros argumentos apresentam como injustiça o próprio ato da distribuição. No

comum da multidão; quer por se exaurirem assim as riquezas comuns, quer por causar a
ambém alega que, além de
exaurir as riquezas, aqueles que recebem ficam querendo mais. Por isso a distribuição dos
bens comuns seria nociva à sociedade e não poderia ser expressão de justiça. O segundo
ibuição não se dá a cada um o que lhe
pertence mas, cada um entra a apropriar-se do que era comum. Logo, nisso não consiste a
Como se observa ambos os argumentos atacam como injusto
o ato de distribuição, por conseguinte negam que pode existir uma justiça distributiva.
O terceiro e o quarto argumentos não negam a distribuição, mas a retiram da justiça

distributiva se aplica só aos bens comuns, como diz Aristóteles. Ora, a esses bens comuns
dizem respeito à justiça legal. Logo, a justiça distributiva não é espécie da justiça particular,

O quinto argumento afirma que, por consistir em dar algo a alguém ou a muitos, as espécies de
justiça não são diversas. Este argumento nega a distinção entre justiça comutativa e
distributiva.
Apontando dialeticamente para o sentido contrário São Tomás usa um argumento de
troduz duas partes na justiça e diz que uma dirige

Só então empreende sua solução aproveitando da distinção de Aristóteles nos seguintes


termos:
Como já dissemos, a justiça particular se ordena a uma pessoa privada, que está para a
comunidade como a parte, para o todo. Ora, as partes são susceptíveis de dupla relação. Uma,
entre si, a que se assemelham às relações das pessoas particulares entre si. E, esta relação é
dirigida pela justiça comutativa, que regula os atos entre duas pessoas particulares. - Outra é a
relação entre o todo e as partes, à qual é comparável à relação entre o comum e o particular. E
essas relações as dirige a justiça distributiva, que distribui os bens comuns proporcionalmente.
Por onde, duas são as espécies de justiça: a distributiva e a comutativa. (Aquino, 1980, n. 5071).
Após distinguir a dupla relação às quais são susceptíveis as partes, especificando a justiça
enquanto relação entre si dirigida pela justiça comutativa e a relação com o todo dirigida pela
justiça distributiva, responde às objeções. Quanto às duas primeiras que atacavam a
339
Entendendo que o que é do todo

existência de uma justiça distributiva, contra os que a detratavam. Quanto à terceira e quarta
objeções, argumenta que, embora a distribuição pertença ao governo, a justiça também

pertence ordenar os bens dos particulares para o bem comum. Ao contrário, à justiça

1980, n. 5071). Assim, distingue claramente porque a justiça distributiva pertence à justiça
particular em função da sua finalidade. Por fim responde à quinta objeção distinguindo entre a

O que irá distinguir


com clareza no artigo seguinte.

a mediedade é considerada do mesm


1980, n. 5072). Seguem três argumentos que serão contrariados por Tomás de Aquino. O
primeiro procura derivar a consideração igual da mediedade do fato de pertencerem seja a
justiça distributiva, como a comutativa à justiça particular. O segundo argumenta apela para a
mediação racional da virtude moral supondo-a igual. O terceiro argumento afirma que a
justiça atende a dignidade humana tanto na justiça distributiva, quanto na justiça comutativa.
Daí

justiça distributiva considera-se a mediedade conforme uma proporção geométrica; na

Tomás passa então para a solução: e sua resposta específica se baseia no que está colocado na
afirmação de Aristóteles. Tomás lembra que na justiça distributiva a pessoa privada recebe
uma parte do todo que lhe é devida. Mas aí entra a distinção começando pelo critério da
justiça distributiva:
Por onde, a justiça distributiva dá tanto mais aos particulares, do bem comum, quanto maior
for a importância que cada um tiver na comunidade. Essa importância, numa comunidade
aristocrática, se funda na virtude; na oligárquia, nas riquezas; na democrática, na liberdade; e
em outras, tem outros fundamentos. Portanto, na justiça distributiva não se considera a
mediedade levando em conta a igualdade entre uma coisa e outra mas sim, a proporção entre
as coisas e as pessoas. (Aquino, 1980, n. 5072).
Fica claro que, conforme o critério de valor das sociedades, as pessoas que são mais
valorizadas recebem mais. Porém isso é feito mediante uma proporção geométrica onde se
considera a igualdade proporcional.
340
Segue então, a distinção do critério da justiça comutativa, onde uma pessoa dà algo a uma

como se pode verificar, é quantificada através do dinheiro.


Tomás então responde às objeções, lembrando, na primeira objeção, que na justiça considera-

5072). Quanto à segunda objeção, mostra que a igualdade é fundada numa proporção
geométrica para a justiça distributiva; e, para a comutativa, baseia-se numa proporção
aritmética. Quanto à terceira objeção que fundamentou a justiça na dignidade humana,
finaliza por

Aqui, como antes, não há resposta ao argumento em contrário porque este é desenvolvido e
detalhado na resposta.

Neste artigo também constam três argumentos nas objeções: o primeiro alega que a
diversidade material acarreta a da virtude e se as justiças distributiva e comutativa têm
matéria diversa não poderiam estar na mesma virtude da justiça. O segundo argumenta que
dinheiro, honra e bens susceptíveis são repartidos tanto na justiça distributiva como na
comutativa, por isso as matérias não são diversas. O terceiro argumento apresenta ser

que
5073). Com essa afirmação volta-se a reflexão para a outra possibilidade da questão dialética,
onde o autor desenvolve sua solução.
Então responde Tomás: primeiro e
externas, a saber, a distribuição e a comutação, que consistem no uso de certos bens exteriores
-
de uma e outra justiça as coisas de que nos aproveitamos por nossas ações, a mesma é a
matéria da justiça distributiva e da comutativa. O que parece fazer acatar as objeções, mas
logo mostra sua insuficiência a partir do argumento de considerar na matéria das justiças
propriamente:

obras, então elas têm matérias diferentes. Pois, a justiça distributiva regula as distribuições, ao
passo que a comutativa regula as comutações que podem ter lugar entre duas pessoas.
(Aquino, 1980, n. 5073).
ORA AS AÇÕES PRINCIPAIS SÃO MESMO DISTINTAS ENQUANTO DISTRIBUIÇÃO E
COMUTAÇÃO.

341
quando nos aproveitamos da coisa, ou ação de outrem contra a sua vontade. O que se dá, umas

n. 5073). Exemplifica essas ações, em relação à coisa, à pessoa, ou a outra chegada a ela, no
furto, no assassinato, no encarceramento e no açoite. Ainda falando da dignidade da pessoa,
recorda, entre outros: o falso testemunho, o adultério e a sedução do escravo do outro. Por
o transferimos

de muitos modos: como no caso da


compra e venda. Quando, concedendo apenas o uso da coisa, impondo a obrigação da
restituição, pode ter lugar o comodato e o usufruto. Lembra também o aluguel e a empreitada,
Ora, em todas essas ações quer voluntárias,
quer involuntárias, considera-se a mediedade do mesmo modo, levando em conta a igualdade
Com isso pode concluir que todas essas ações
pertencem à mesma espécie da justiça comutativa.
Sem ater-se a detalhes, considera claras as respostas às objeções com base no exposto.

E a provocação: parece que o justo é


absolutamente o mesmo que a reciprocidade de ação.

divino é retribuir a cada um conforme o seu ato, diz a Escritura: Com o juízo com que
julgardes sereis julgados; e com a medida com que medirdes vos medirão também a vós. Logo,

segundo retoma elementos afirmados nos artigos anteriores:


Cada espécie de justiça atribui uma coisa a alguém, fundada numa certa igualdade. A justiça
distributiva o faz, levando em conta a dignidade da pessoa, dignidade que parece fundar-se,
sobretudo, nas obras com que serviu à comunidade. A comutativa, considerada a coisa em que
foi danificada. (Aquino, 1980, n. 5074).

Conclui, então, que o justo é absolutamente o mesmo que reciprocidade na ação. No terceiro
argumento lembra que quem fez uma injustiça involuntariamente sofre menos, porém lembra
rio, enquanto dependentes de nós, não alteram a mediedade da
justiça, que é uma mediedade real, e não pessoal. Logo, parece que o justo é absolutamente o
Porém em contrário usa apenas
um argument
A solução de Tomás inicia-

342
-se a expressão reciprocidade de ação para significar que quem causou um dano a
outro deve também sofrê-lo no que é seu. E esse dano justo está igualmente contido na lei,
quando diz: Se alguém furtar um boi ou uma ovelha, e os matar ou vender, restituirá cinco bois
por um boi e quatro ovelhas por uma ovelha. (Aquino, 1980, n. 5074).
Lembra, além disso, que a reciprocidade de ação é empregada também nas comutações
voluntárias. Porém, por outro lado, mostra que, quando alguém comete uma injustiça contra
uma pessoa de maior dignidade, maior é a ação cometida que a recompensa recebida, se esta
fosse especificamente a mesma que aquela. E, portanto, quem fere o chefe não só recebe uma
retribuição idêntica, mas, é punido muito mais gravemente. Sua punição consiste em restituir
mais, porqu
igualar, nas comutações, a compensação à ação, de um modo proporcionado; para o que se
0, n.
5074). O que não se dá na justiça distributiva que atende à proporcionalidade entre as coisas e
as pessoas.
Tomás finaliza o artigo respondendo às objeções começando, na primeira, com o seguinte

alguém recebeu e o que prestou, mas, ao que outro recebeu, conforme a situação de uma e
ção afirma que na ação injusta voluntária o dano é maior
e, por isso, é considerado mais grave.
Quanto às partes subjetivas da justiça se esclarece a partir destes quatro artigos que se divide
convenientemente a justiça particular em suas partes, sendo uma distributiva e a outra
comutativa.
Em suma, nestes quatro artigos são estudadas as partes subjetivas da justiça: distributiva e
comutativa. A justiça distributiva é considerada como reguladora das relações do todo com as
partes; e a justiça comutativa como reguladora das partes entre si. A mediedade é apreciada de
modo diverso pela justiça distributiva e comutativa, sendo proporcional na primeira e
aritmética na segunda. A matéria das referidas justiças é diversa em sua referência às matérias
principais da comutação e da distribuição. E, por fim, o justo não é absolutamente o mesmo
que a reciprocidade de ação, a qual se aplica corretamente às relações de comutação, mas não
às relações de distribuição.
3 QUESTÃO 62: DA RESTITUIÇÃO
Agora passa-se para o t
questão anterior, diz respeito à justiça comutativa. A questão 62 se apresenta dividida em oito
artigos: 1º Se a restituição é um ato de justiça comutativa; 2º Se é necessário, para a salvação,
fazer-se a restituição do que foi tirado injustamente a outrem; 3º Se basta restituir
simplesmente o que foi injustamente tirado a outrem; 4º Se devemos restituir o que não
tiramos injustamente a outrem; 5º Se devemos sempre restituir àquele de quem recebemos

343
alguma coisa; 6º Se quem se apoderou da coisa alheia está sempre obrigado a restituí-la; 7º Se
quem não tomou o alheio está obrigado a restituir; 8º Se estamos obrigados a restituir
imediatamente ou se, ao invés, podemos licitamente diferir a restituição.

r vontade deste, como no mútuo

A primeira objeção do artigo mostrava uma certa semelhança entre a restituição e a doação
pois ambas podem ser realizadas com coisas não devidas. Na resposta Tomás esclarece que
pode haver tal semelhança, quando alguém foi, no passado, o dono de algo que não é mais seu.
E, recebendo isso novamente, vai ter, propriamente falando, uma doação e não uma
restituição.
A segunda objeção parte da afirmação segundo a qual não seria possível restituir coisas

primeiro lugar diz respeito a coisas exteriores que podem passar da propriedade de um para a
de o
coisas exteriores, pois indica também ações ou paixões relativas à reverência ou à injúria das
quais alguém é objeto, a restituição diz respeito igualmente para aquelas coisas cujo efeito

homens, como quando alguém, em consequência de uma expressão oprobriosa, fica sendo um

A terceira objeção parte de fato que se pode subtrair a coisa de outrem, não só na comutação,
mas também na distribuição: por isso, a restituição não deveria ser considerada como ato de
uma determinada parte da justiça, seja ela comutativa, ou distributiva. Na resposta, Tomás
especifica que a restituição acontece entre uma coisa e outra, de tal maneira que precisa
devolver tanto mais quanto foi o menos que recebeu: e isso pertence à justiça comutativa.
No segundo artigo, partindo do princípio segundo o qual a observância da justiça é uma
necessidade para a salvação, ele conclui afirmando que o ato da restituição é necessário para a
salvação, devido ao fato que está sendo devolvido o que foi injustamente tirado. Percebe-se,
nisso, a preocupação especificamente teológica da afirmação.
A primeira objeção do artigo parte do fato que, às vezes, é impossível restituir o que foi tirado
injustamente a outrem, por exemplo, quando alguém foi privado de um membro ou da vida.
Por isso, parece não ser necessário para a salvação restituir o que foi tirado injustamente de
outra pessoa. Tomás responde que, quando não é possível dar uma compensação equivalente,
basta recompensar o que é possível. E apresenta o exemplo de quem mutilou uma pessoa: ele
nte ou por alguma honra consideradas as condições de ambas

344
A segunda objeção parte daquela situação em que a restituição seria um pecado, por exemplo,
quando é divulgada a verdade, tirando a boa reputação de alguém. Tomás, responde
mostrando que há três maneiras de privar alguém da sua boa reputação. Primeiro, divulgando
a verdade justamente, por exemplo, quando se revela o crime de alguém, observada a ordem
devida. Neste caso
afirmando o falso, e de maneira injusta. Em tal situação precisa confessar a mentira. Em
terceiro lugar, divulgando a verdade, mas injustamente, como quando esta divulgação não
respeita a
se não pudermos reparar a boa reputação, devemos de outra maneira dar à vítima uma

A terceira objeção parte do fato que é impossível que aquilo que aconteceu se torne como algo
não acontecido. E, no caso em que uma pessoa perdeu a honra por causa de uma ofensa
injusta, não é possível fazer tal restituição. Ele responde que, apesar disso, é possível reparar o
uição da dignidade da pessoa ofendida na opinião dos outros,
testemunhando-
Na quarta e última objeção, ele coloca a questão da prebenda, quer dizer, a do rendimento de
um eclesiástico, por um determinado cargo. Haveria, então, o dever da restituição, quando
alguém impede que uma prebenda seja concedida a uma determinada pessoa? Tomás
responde mostrando que isso pode acontecer de muitos modos, justos ou injustos. Seria justo
quando se procura indicar para um cargo eclesiástico uma pessoa mais digna. E, neste caso,
não há a obrigação de restituir ou de recompensar. Mas seria injusto, quando se impedisse de
dar tal prebenda a uma pessoa digna, movidos por ódio, ou por vingança. E no caso em que
alguém impedir a concessão da prebenda para quem a merece, aconselhando que não seja
conferida, antes que seja estabelecida a atribuição, existe a obrigação de alguma compensação

Mas não há a obrigação de recompensar por igualdade, porque a prebenda ainda


não foi atribuída e podia não o ser, por muitos impedimentos. Mas, se estava estabelecido que
a prebenda fosse concedida a alguém e, sem motivo justo, agiu-se para que esta doação fosse

O terceiro artigo considera dois casos distintos. O primeiro, quando há uma desigualdade real
que, às vezes, não implica injustiça, como no caso do mútuo. O segundo, quando há injustiça,
que poderia coexistir com a igualdade real: por exemplo, quando alguém tenta roubar, sem
conseguir. No primeiro caso, então, é suficiente a restituição, que restabelece a igualdade. Mas,
no segundo caso, quando se aplica a violência, o remédio está na pena, que deve ser infligida
pelo juiz. Portanto, enquanto o juiz não condenar, ninguém está obrigado a restituir mais do
que tomou; mas, depois da condenação, há a obrigação de cumprir a pena.
A primeira objeção citava um versículo do livro da Bíblia (Êx 22,1) que obriga a restituir, o
quádruplo, ou o quíntuplo, no caso de furto de animais; e questionava se o mesmo critério
345
podia ser aplicado para a restituição. Na resposta ele esclarece que tal preceito era uma norma
a ser aplacada pelo juiz, ante da vinda de Cristo; mas que a lei humana podia estabelecer uma
disposição idêntica ou semelhante.
A segunda objeção lembrava a atitude de Zaqueu (Lucas 19,8) que, arrependido, manifestava
sua intenção de pagar quadruplicado quem ele tinha defraudado. E Tomás responde dizendo
que Zaqueu, dessa maneira, manifestava a sua intenção de praticar uma obra superrogatória.
A terceira objeção fala da decisão do juiz que toma de quem rouba mais do que roubou. E ele
responde que isso vale somente depois da condenação: e se justifica pelo fato que o juiz quer
que o condenado se emende.
O quarto artigo questiona se devemos restituir o que não tiramos injustamente a outrem.
Tomás responde dizendo que quem danifica a outrem chega a privá-lo daquilo em que o
danificou. Logo precisa restituir de uma maneira correspondente ao dano provocado. Mas,
uma pessoa pode ser danificada de dois modos. Quando é privada do que possui atualmente.
Neste caso é necessário reparar por uma compensação igual. Apresenta, sobre isso, o exemplo
de alguém que danificou a outrem derrubando-lhe a casa. Em tal situação há a obrigação de
pagar tanto quanto a casa valia. Mas é diferente a circunstância em que se impede de
conseguir o que estava alcançando. Mas ter algo virtualmente, ou potencialmente, é menos
que tê-la em ato. Neste caso a restituição é um dever, mas proporcionalmente menor à da
situação anteriormente apresentada.
A primeira objeção apresenta o exemplo de quem desenterrou as sementes, danificando,
assim, a colheita futura e questiona se ele precisa restituir o correspondente a esta colheita. E a
segunda objeção apresenta o caso de quem retém o dinheiro do credor, além do tempo

1980, n. 5078). Tomás responde, ao mesmo tempo, às duas objeções mostrando que a colheita
está só em potência e não em ato; e
o lucro em ato, mas, só em potência. E uma e outra podem não vir a realizar-
1980, n. 5078).

não foi tirado de outra pessoa. Ele responde esclarecendo que Deus exige somente o bem que
Ele mesmo semeou em nós; e que a frase citada queria apenas ressaltar a atitude do preguiçoso
que não quis frutificar os dons de Deus.
O quinto artigo questiona se devemos sempre restituir àquele de quem recebemos alguma
coisa. Na resposta, Tomás lembra que a restituição produz a igualdade da justiça comutativa,
que consiste na igualdade das coisas. Mas essa igualdade entre as coisas não seria possível se
aquele que possui em quantidade menor do que lhe pertence não recebesse a correspondente

346
compensação. E, para efetivar tal compensação, é necessário restituir ao legítimo proprietário
o que dele foi recebido.
A primeira objeção faz referência à situação na qual haveria um dano com a restituição: por
exemplo, restituindo para um louco a espada que ele deu em depósito. Na resposta Tomás,
antes de tudo coloca um princípio, a sabe

restituição deve ser feita, ou a outros. Mas quem detém uma coisa alheia não pode apropriar-
se dela, mas guardá-la para restitui-la no tempo oportuno, ou entrega-la para outros que a
possam conservar melhor.
A segunda objeção põe a questão da simonia, quer dizer, da venda das funções eclesiásticas.
Por exemplo, dar dinheiro para ser nomeado bispo. Tomás responde que, quando há uma
doação ilícita e contrária à lei, não se deve fazer a restituição; mas, como aquele que recebeu
fez isso contra a lei, não pode conservar a coisa para si, mas devolvê-la em obras de piedade.
Lembra uma outra situação: a da prostituta que
pode conservar o que lhe foi dado, mas está obrigada a restituir se recebeu algo a mais,

Na terceira objeção apresenta a situação em que é impossível restituir, ou porque o


destinatário da restituição morreu, ou habita distante, ou é desconhecido. Ele responde que,
no caso do desconhecido, antes precisa procurar onde ele se encontra; e, se não se conseguir
dando esmolas pela sua salvação, quer esteja morto, quer

herdeiro. E se ele estiver muito distante, precisa enviar


grande E se isso não for possível, deve-se
depositar num lugar seguro para que se conserve: e procurar informá-lo disso.
Na quarta objeção questiona se precisa recompensar mais aqueles dos quais recebemos maior
benefício, como é o caso dos pais, ou de outros benfeitores. Tomás responde positivamente,
mas lembra que o benfeitor não pode ser recompensado com o bem alheio, exceto o caso de
extrema necessidade, particularmente para socorrer um pai.
Na quinta objeção coloca o problema de um prelado que injustamente subtraiu à Igreja. Ele
responde apresentando, nisso, três possíveis situações. A de um bispo que se apodera do que
pertence ao capítulo dos cônegos. Neste caso deve restituir ao capítulo. Outra situação:
transferindo os bens da Igreja para parentes ou amigos. Aqui também deve restituir à Igreja. E,
por último, quando o prelado só tem a intenção de subtrair os bens da Igreja. A restituição,
neste caso, consiste em renunciar a tal propósito.
O sexto artigo se pergunta se quem se apoderou da coisa alheia está sempre obrigado a
restituí-la. Na resposta percebe-se a preocupação de Tomás com as devidas distinções. Ele
considera que precisa levar em conta a coisa mesma de que se apoderou e o ato do
apoderamento. C -la

347
E isso corresponde à justiça
comutativa. Quanto ao ato do apoderamento, pode haver três situações diferentes. A primeira
corresponde a um ato injusto, que vai contra a vontade do dono da coisa, como no caso do
furto e do roubo. Neste caso a restituição é obrigatória, seja considerando a coisa em si mesma,
como a injustiça do ato, mesmo quando a coisa não estiver mais com ele. E, além disso, deve
ser punido por causa da injustiça cometida. Uma segunda situação corresponde àquela do
mútuo, que foi recebido com o consentimento do dono. Neste caso também há a obrigação da
restituição, considerando seja a coisa em si, como o ato de tê-la recebido, mesmo que a tenha
perdido. A terceira situação é aquela do depósito. Quem o recebeu está obrigado a restituí-lo,
exceto o caso em que, sem sua culpa, a coisa depositada lhe foi subtraída.
Na primeira objeção lembra que, às vezes, quem tira uma coisa de outra pessoa não a
conserva porque foi parar nas mãos de um outro. Ele responde que está obrigado à restituição
tanto o que tirou a coisa por causa da ação injusta que cometeu, como o que a detém,
considerando- , 1980, n. 5080).
Na segunda objeção lembra que ninguém está obrigado a revelar o próprio crime: mas há o
risco que isso aconteça quando o autor do furto faz a restituição. Tomás responde que se, por
um lado, o homem não está obrigado a revelar seu próprio crime, deve fazer isso diante de
Deus; e o confessor pode fazer a restituição do bem alheio.
Na terceira objeção coloca-se a situação em que muitos subtraíram uma coisa e um só a
restituiu em sua integridade. Na resposta Tomás afirma que, quando um já fez a suficiente
restituição, os outros não são obrigados a fazê-la, mas devem dar uma compensação a quem
restituiu.
O sétimo artigo questiona se quem não tomou o alheio esteja obrigado a restituir. Na resposta,
antes de tudo ele coloca o seguinte princípio: Todo aquele que é causa de uma apropriação
injusta está obrigado a restituir . Depois ele distingue entre quem tomou o alheio diretamente
-se do
Aqui também pode

-
Pense-se, por exemplo, na receptação. Terceiro, quanto aos bens roubados, pois recebendo
uma parte destes bens há certa participação desta má ação.

devendo impedi-lo, quer porque deixamos de dar uma ordem ou um conselho que impediria o
furto ou o roubo, quer porque retiramos o nosso auxílio, com que poderíamos obstá-lo, quer

consentimento, do auxílio,
devendo obstá-

348
É interessante, a esse respeito o exemplo apresentado, a saber, o das autoridades que recebem

por culpa deles, aumentam os ladrões na sociedade.

ou a lisonja, ou outro modo semelhante de proceder, é cau


n. 5081).
Na primeira objeção ele questiona se deva ser punido apenas quem tomou o alheio. Ele
responde que peca também aquele que foi causa do pecado, aconselhando, mandando, ou de
qualquer outro modo.
Na segunda objeção ele coloca, mais uma vez, a situação dos cúmplices. Uma eventual
restituição que obrigasse a todos eles iriam aumentar os bens da vítima. Além disso, alguns
cumplices, às vezes, não conseguem tirar os bens de outra pessoa, apesar de terem tentado.
Tomás responde dizendo que o autor principal do ato ilícito está obrigado principalmente a
restituir: e os outros, de maneira secundária: mas todos devem restituir a coisa da qual se
apoderaram ilicitamente. Caso não tenham conseguido este apoderamento não têm a
obrigação da restituição.
A terceira objeção coloca a difícil situação de quem, denunciando um ladrão, ou resistindo-lhe,
corre perigo de vida. Tomás responde esclarecendo que somente as autoridades têm esta

(Aquino, 1980, n. 5081): e, diferentemente dos outros cidadãos, elas são mais protegidas.
No último artigo questiona-se se estamos obrigados a restituir imediatamente ou se, ao invés,
podemos licitamente diferir a restituição. S. Tomás responde afirmando que, da mesma forma
-se do alheio é pecado contra a justiça, assim também o é detê-
aquele que detém uma coisa contra a vontade do seu dono impede-o de usá-la e, assim, comete
uma injustiça

Na primeira objeção colocava-se o princípio segundo o qual os preceitos afirmativos não


obrigam em todos os momentos: e a necessidade de restituir provém de um preceito
afirmativo. Na resposta Tomás esclarece que este preceito é afirmativo apenas na forma, mas
no conteúdo é negativo, pois proíbe reter o bem dos outros.
A segunda objeção parte do fato que, às vezes, é impossível restituir imediatamente. E Tomás
responde que, diante de tal impossibilidade, precisa pedir, ou por si mesmo, ou por outra
pessoa, ou a remissão, ou uma dilação: a remissão quando for absolutamente impossível
restituir; e a dilação, quando não é restituir imediatamente.
A terceira objeção parte do fato que a restituição é um ato da virtude da justiça. Mas a virtude,
para ser praticada, precisa de tempo. Tomás responde esclarecendo que, pela delação no

349
restituir, há uma detenção injusta. Por isso é necessário que seja determinado o tempo para
restitui imediatamente.
CONCLUSÃO
"A Restituição", foi
apresentado todo o esquema da Suma Teológica para uma melhor compreensão dos temas
tratados. Viu-se que a Suma trata de Deus (Iª Parte), do Homem (IIª Parte) e de Cristo (IIIª
Parte). A Segunda Parte, que é especificamente moral, por sua vez, está subdividida em duas
seções: na primeira seção, analisam-se os temas do fim último, dos atos humanos, das paixões,
das virtudes, dos vícios e dos pecados, da lei e da graça. E, na segunda, estudam-se as virtudes
teologais (fé, esperança e caridade) e mais de cinquenta virtudes morais, organizadas em torno
das quatro virtudes cardeais: prudência, justiça, fortaleza e temperança.As duas questões
analisadas estão inseridas na temática mais ampla da Justiça.
Quanto às partes da Justiça, a Suma considera a justiça comutativa e a justiça distributiva. A
primeira regula os atos entre duas pessoas particulares; e a segunda se refere à relação entre o
todo e as partes, a qual é comparável à relação entre o comum e o particular, distribuindo os
bens comuns proporcionalmente. Esta dá tanto mais aos particulares, do bem comum, quanto
maior for a importância que cada um tiver na comunidade. Nas comutações, porém, uma
pessoa dá uma coisa a uma outra pessoa em troca daquilo que recebeu desta última, como é o
caso sobretudo da compra e venda.
A justiça distributiva, então, regula as distribuições, ao passo que a comutativa regula as
comutações que podem ter lugar entre duas pessoas. E dessas comutações, umas são
involuntárias e outras voluntárias. Como exemplo das involuntárias foram consideradas as
seguintes: fraude, furto, envenenamento, assassinato, mutilação, adultério, sedução do escravo
de outra pessoa, falso testemunho, detração, injúria. E, quanto às voluntárias: doação, compra
e venda, aluguel, empreitada, depósito.
A justiça comutativa, por sua natureza, exige uma recompensa baseada na igualdade. Mas isso
não se dá na justiça distributiva, que não atende à igualdade proporcional entre as coisas, mas,
sim, à proporcionalidade entre as coisas e as pessoas.
Analisou-se, em seguida, a temática da restituição. Esta é considerada como pertencente à
justiça comutativa: e toda justiça é necessária para a salvação. A restituição restabelece a
igualdade. E, caso tenha havido um ato de violência, além da restituição, o culpado está sujeito
a uma pena a ser infligida pelo juiz. Existe, então, a obrigação à restituição daquilo em que
alguém foi danificado: e o destinatário da restituição é o legítimo proprietário.
Quanto à coisa, quem dela se apossou está obrigado a restituí-la enquanto a tiver em seu
poder. E, no caso especifico de um crime, como ninguém está obrigado a revelar o próprio
crime, a restituição deve ser feita através de uma outra pessoa, particularmente o padre
confessor.

350
Todo aquele que é causa de uma apropriação injusta está obrigado a restituir. O que pode dar-
se direta e indiretamente. Diretamente: mandando, aconselhando, consentindo expressamente
e elogiando alguém como hábil em se apoderar da coisa alheia; ou de qualquer modo prestando
auxílio a quem rouba. Indiretamente, quando, podendo e devendo, não se impede a
desapropriação injusta.
E, numa última consideração, todos estão obrigados a restituir, se o puderem, ou pedir uma
dilação a quem pode permitir o uso da coisa.
Na comparação entre as duas questões, ressalta-se que Tomás dedicou apena quatro artigos na
apresentação das duas espécies de justiça, e bem oito artigos ao falar da restituição: o que
aponta para a necessidade de uma vivência ética, que nem sempre é percebida na sua
profundidade.
Enfim, a virtude da justiça marcou toda a reflexão ético-jurídica da civilização ocidental e se
tornou um tema emblemático, inclusive no campo dos Direitos Humanos, ao qual confere um
especial significado: e a análise do pensamento deste autor clássico até hoje indica caminhos a
serem trilhados para que a justiça seja vivenciada e a injustiça seja evitada, particularmente
nas importantes expressões da justiça comutativa e distributiva e no dever da restituição.
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Prado Galvão. São Paulo: Martins Fontes, 2007.
______. Filosofia do Direito: definição e fins do direito. Tradução de Márcia Valéria Martinez
de Aguiar. São Paulo: Martins Fontes, 2003.

352
ATO INFRACIONAL E MEDIDAS SOCIOEDUCATIVAS: ANÁLISE À LUZ DOS DIREITOS
HUMANOS, DA PROTEÇÃO INTEGRAL E DO MELHOR INTERESSE DO
ADOLESCENTE INFRATOR
195

196

Resumo
O presente estudo traz à lume a temática do direito penal juvenil no que se refere à prática do
ato infracional e à aplicação das medidas socioeducativas, previstas no âmbito do direito
interno do Brasil, e sob o prisma da normativa internacional que estabeleceu um sistema
internacional de Proteção Especial e de acordo com o Melhor Interesse da criança e do
adolescente, cujo sistema internacional está previsto na Convenção sobre os Direitos da
Criança, que regula um autêntico tratado de Direitos Humanos infanto-juvenis, além de estar
previsto em outros documentos da ONU (Regras de Beijing e Diretrizes de Riad), bem como
sob o prisma da Constituição Federal de 1988 que incorporou a Doutrina da Proteção Integral e
a Doutrina da Prioridade Absoluta, além da legislação infraconstitucional que estabelece, no
âmbito interno, o sistema de proteção ao adolescente infrator, cujo sistema é composto pelo
Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA, Lei n. 8069/90) e pela Lei do SINASE (Sistema
Nacional de Atendimento Socioeducativo, Lei n. 12.594/2012), cuja conjugação das duas leis
resulta na aplicação de medidas socioeducativas ao adolescente/jovem infrator, diante da sua
condição de sujeito de direitos e deveres, cujas medidas são sujeitas à execução conforme as
diretrizes do SINASE que preconiza o direito penal mínimo e a adoção de técnica de mediação
através da justiça restaurativa como forma de reconhecimento espontâneo da culpabilidade e
solução democrática e participativa do conflito envolvendo o adolescente infrator,
possibilitando que seja educado para a paz e reinserido na sociedade sem eventuais traumas
gerado pela intervenção Estatal com imposição de penalidades.
Palavras-chave: Adolescente infrator. Medidas socioeducativas. Direitos humanos. SINASE

195
Pós-Doutora em Democracia e Direitos Humanos pela Universidade de Coimbra/Ius Gentium Conimbrigae,
Doutora em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (2002), Doutora em Direito das Relações
Sociais pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, Pós-Graduada em Direito Processual Civil pelo Centro
Universitário Salesiano de São Paulo, Coordenadora e Pesquisadora do Programa de Mestrado em Direito do
Centro Universitário Salesiano de São Paulo, Professora do Curso de Direito do Centro Universitário Salesiano de
São Paulo, Professora membro do Conselho Editorial da Revista Direito & Paz do Centro Universitário Salesiano de
São Paulo, Professora integrante do Observatório de Violência nas Escolas do UNISAL que integra o corpo de
cooperação técnico, científico e cultural, compondo a Cátedra da UNESCO de Juventude, Educação e Sociedade,
com sede na Universidade Católica de Brasília. Membro do Comitê de Ética e Pesquisa (CEP) do Centro
Universitário Salesiano de São Paulo. E-mail: maalkimin@terra.com.br

196
Mestrando em Direito : Concretização dos Direitos Sociais, Difusos e Coletivo - UNISAL , Lorena/SP, Pós-
Graduação em Direito Constitucional pela Damásio Educacional. Graduado em Direito pela Universidade do Vale
do Paraíba. Advogado. E-mail: marquette.jur@gmail.com

353
Resumen
El presente estudio trae a la luz la temática del derecho penal juvenil en lo que se refiere a la
práctica del acto infraccional y la aplicación de las medidas socioeducativas previstas en el
ámbito del Derecho interno de Brasil y de acuerdo con el prisma de la normativa internacional
que estableció un sistema internacional de Protección especial y de acuerdo con el mejor
interés del niño y del adolescente, cuyo sistema internacional está previsto en la Convención
sobre los Derechos del niño, que regula un auténtico tratado de Derechos Humanos infanto-
juveniles, además de estar previsto en otros documentos de la ONU (" Reglas de Beijing y
Directrices de Riad), así como de acuerdo con el prisma de la Constitución Federal de 1988 que
incorporó la Doctrina de la Protección Integral y la Doctrina de la Prioridad Absoluta, además
de la legislación infraconstitucional que establece, en el ámbito interno, el sistema de
protección al adolescente infractor, cuyo sistema está compuesto por el Estatuto del Niño y del
Adolescente (ECA, Ley nº 8069/90), la Ley del SINASE (Sistema Nacional de Atención
Socioeducativa, Ley n. 12.594 / 2012), cuya conjugación de las dos leyes resulta en la aplicación
de medidas socioeducativas al adolescente / joven infractor, ante su condición de sujeto de
derechos y deberes, cuyas medidas están sujetas a la ejecución conforme a las directrices del
SINASE que preconiza el derecho penal mínimo y la adopción de técnica de mediación a
través de la justicia restaurativa como forma de reconocimiento espontáneo de la culpabilidad
y solución democrática y participativa del conflicto involucrando al adolescente infractor,
posibilitando que sea educado para la paz y reinserido en la sociedad sin eventuales traumas
generado por la intervención Estatal con imposición de penalidades.
Palabras clave: Adolescente infractor. Medidas socioeducativas. Derechos humanos. SINASE
INTRODUÇÃO
Do processo de construção e de reconstrução dos Direitos Humanos, nasceram os Direitos
Humanos infanto-juvenis inseridos na Convenção sobre os Direitos da Criança (ONU, 1989), e
que passaram a integrar, na expressão de Bobbio (2004), o ramo da especificação de direitos
humanos, justamente por envolver minorias material, física e psicologicamente em status
inferior e em condição de vulnerabilidade, como é o caso da criança e do adolescente.
Nesse viés, a Constituição Brasileira, em seu artigo 227, regulamentado pelo ECA (Estatuto da
Criança e do Adolescente, Lei n. 8069/90) incorporou os direitos humanos infanto-juvenis
com sustentáculo no princípio da Proteção Integral que, na verdade, espelha o Princípio do
Melhor Interesse e da Proteção Especial e Cuidado Especial consagrados pela Convenção
sobre os Direitos da Criança. Nesse sentido, demonstrar-se-á com a presente pesquisa que o
adolescente que comete um ato infracional (conduta definida como crime ou contravenção
penal no Código Penal Brasileiro), goza de um sistema de garantias especiais, sendo-lhes
aplicadas as medidas socioeducativas, de caráter punitivo, educativo, restaurativa e de
formação integral , conforme disciplinado pelo ECA e pela Lei 12.594/2012 (SINASE-Sistema
Nacional de Atendimento Socioeducativo).

354
O trabalho, através do método dedutivo e que abrange a pesquisa bibliográfica envolvendo o
direito interno e o direito internacional, além das normativas internas e internacionais,
demonstra, também, que o Brasil, através do SINASE, busca atender as Regras Mínimas das
Nações Unidas para Administração da Justiça de Menores (Regras de Beijing, 1985) e as Regras
das Nações Unidas para a Proteção dos Jovens Privados de Liberdade (Diretrizes de Riad,
1990).
Esses documentos internacionais que retratam o sistema de justiça penal juvenil e a prevenção
da delinquência juvenil, também consolidam, conforme será demonstrado, o Sistema de
Proteção Integral e de acordo como Melhor Interesse, pontuando-se que as medidas
socioeducativas representam uma evolução do sistema penal infanto-juvenil que passou do
modelo da indiferença e do modelo tutelar para o modelo garantista, o qual imputa
responsabilidades ao adolescente, pois considerado na nova ordem jurídica como sujeito de
direitos, implicando adoção de medidas educativas e restaurativas, visando a reinserção social
e a possibilidade de desenvolvimento sadio e humano.
1 DIREITOS HUMANOS INFANTO-JUVENIS E O SISTEMA DE PROTEÇÃO
Ao longo da evolução histórica da infância denota-se que, desde a Idade Média até o início do
Século XVII, a fase da infância e a fase do início da adolescência eram consideradas como fase
da imperfeição, como fases insignificantes e indiferentes na vida do homem, sendo certo que a
na infância e adolescência de uma pessoa não se reconheci a personalidade de pessoa humana,
tão menos a condição de sujeitos de direitos. (Ariés, 1981, p. 57)
A criança nesse momento histórico era equiparada a um animalzinho de estimação, sem
vontade própria, como se fosse um brinquedo do adulto; não tinha representação válida no
seio da família, tão menos era considerada como sujeito de direitos. Na evolução histórica
também teve a fase em que a criança era equiparada ao um adulto, contudo, em miniatura
(Ariés, 1981, p. 80).
Somente a partir do final do Século XVII a infância foi sendo reconhecida pela família, embora
ainda ignorada pela sociedade, que passou a estabelecer relações de afetividade em torno da
criança, passando a família a destinar cuidado especial à infância.
John Locke e Rousseau foram os primeiros a atribuir o reconhecimento jurídico e social à
infância, sendo que ambos reconhecem as crianças como seres humanos semelhantes aos
adultos, cuja diferença reside na idade que torna a criança menos capacitada e com
inteligência inferiorizada por falta de desenvolvimento.(Alkimin, 2016, p. 14)
O Século XIX representa o marco na evolução histórica da infância, pois ascendeu o
movimento em prol dos direitos da criança, que na ordem jurídica é titular de direitos
humanos, contudo, de caráter especial, e certo que em razão da sua peculiar condição de
desenvolvimento físico, psíquico, moral, social e espiritual. O Século XX despontou como o
Século do nascimento e reconhecimento dos Direitos Humanos Infanto-Juvenis que foram
inseridos nas Declarações e Convenções da ONU (Organização das Nações Unidas).
355
Os Direitos Humanos infanto-juvenis surgiram num momento histórico muito importante,
pois a criança se sujeitava ao tratamento degradante, desrespeitoso, com igualdade de
condições ao adulto, pois sofria as diversas formas de violência, em especial, condições de
trabalho degradantes e desumanas, comprometendo a sua formação física, psíquica e moral.
O Brasil ratificou a Convenção sobre os Direitos da Criança da ONU (1989) e inseriu na CF/88
os direitos humanos da criança e do adolescente no art. 227 sob o manto da proteção integral e
da prioridade absoluta, cujos direitos estão regulados no ECA (Estatuto da Criança e do
Adolescente, Lei 8069/90) , sendo que o documento internacional considera criança até os 18
anos e o ECA, artigo 2º., considera criança até 12 anos incompletos e adolescente até 18 anos
incompletos. Ao artigo 227 da CF e ao ECA foi acrescentado o conceito de jovem ( dos 15 aos 29
anos de idade), cujos direitos estão regulados no Estatuto da Juventude (Lei n. 12.852/2013) que
caminha pari passu com o ECA.
1.1SISTEMA INTERNACIONAL DE PROTEÇÃO À CRIANÇA, AO ADOLESCENTE E AO
JOVEM

Os Direitos Humanos da criança e do adolescente, tal como os direitos humanos da população


em geral, constituem um construído histórico cuja criação condiz com a necessidade humana
de exercer e dispor de direitos fundamentais à condição humana, contudo, há categorias de
pessoas que em razão de determinação da condição especial, como é o caso da criança e
adolescente que estão em processo de formação e de desenvolvimento físico, psíquico, moral,
social etc, e, em face disso, necessitam de um sistema especial de proteção, dando-se ensejo,
assim, ao ramo de especificação de direitos (Bobbio, 2004), tratando-se os direitos humanos
infanto-juvenis como ramo da especificação de direitos humanos.
Em matéria de infância e juventude há vários documentos internacionais que ditam as regras
do sistema internacional de proteção, cujo sistema internacional é regido pela ONU, tanto por
meio de instrumentos legislativos (Tratados, Convenções), como por meio de órgãos
fiscalizadores, de monitoramento e para cumprimento das disposições traçadas nos
documentos que reproduzem os direitos humanos.
Essas regras de conteúdo declarativo e impositivo ditam direitos humanos de caráter geral,
universal e indissociáveis da condição humana, que uma vez incorporados na ordem jurídica
constitucional assumem a condição de normas positivas constitucionais que regulam direitos

internacionais uma natureza especial e diferenciada, qual seja, a natureza de norma

Disso decorre o direito subjetivo de exigir o dever de prestação em face do Estado, cujo dever
de cumprimento das normas que ditam direitos fundamentais e que espelham na ordem
jurídica autênticos direitos humanos, também abrange a família e a sociedade, conforme a
trilogia do sistema de proteção integral (art. 227, CF/88).

356
Criança e o adolescente em razão da peculiar condição de desenvolvimento são titulares de
direitos fundamentais gerais (artigo 5º.) e especiais previstos na ordem jurídica internacional e
no ECA, instrumento normativo que dita regras de proteção e atendimento à criança e ao
adolescente, tratando-se, conforme asseverado alhures, de ramo de especificação de direitos
humanos, e certo que em razão das especificidades e peculiaridades da condição pessoal,
social, moral e espiritual dessa parcela da população.
O primeiro instrumento internacional de proteção à infância e juventude foi Declaração
Internacional dos Direitos da Criança (ONU, 1959) que, na verdade, foi inspirada na
Declaração de Genebra de 1924. A Declaração de 1959 está assentada em princípios de proteção
e cuidados especiais para com a infância, sendo o instrumento viga-mestra de todo o sistema
de proteção integral, dispondo que em razão da peculiar condição de pessoa em
desenvolvimento, e em razão da sua imaturidade física e mental, necessita de proteção e
cuidados especiais. Contudo, esse documento tem o caráter meramente declarativo de direitos
e de proteção, sem o caráte
estabelecidos na Declaração são considerados como princípios programáticos ou de natureza
moral, que não representam obrigações para os Estados, propondo apena, sugestões, de que os
Estados po
O documento internacional que concretizou o sistema de proteção internacional aos direitos
humanos infanto-juvenis e com inserção de mandamentos e mecanismos de promoção desses
direitos, e certo que em razão do seu caráter cogente e de função fiscalizadora em relação aos
países ratificantes, foi a Convenção sobre os Direitos da Criança de 1989 (ONU) que
despontou, paralelamente à proteção especial e ao cuidado especial com a infância, o
paradigma do melhor ou superior interesse da criança, assim considerada a pessoa até 18 anos.
(Cf. Preâmbulo da Convenção sobre os Direitos da Criança)
Nesse viés, a Convenção sobre os Direitos da Criança é o marco do reconhecimento da criança
como sujeito de direito e, diferentemente dos outros documentos de proteção, tem o caráter
mandamento, impositivo, ou seja, impõe aos países ratificantes que cumpram as normas de
proteção internacional inseridas nesse documento da ONU, obrigando-os a prestarem contas
de suas atividades no que diz respeito ao sistema de proteção infanto-juvenil para a
comunidade internacional e isso em razão da natureza coercitiva da Convenção, que também
impõe a adoção de mecanismos de controle do cumprimento das obrigações insertas no
documento(Liberati, 2012, p. 33), cujas obrigações condizem aos direitos humanos e
fundamentais dessa parcela vulnerável da população.
Há outros documentos internacionais ditam o sistema de proteção, tanto no que se refere aos
direitos sociais, políticos e econômicos e no que diz respeito ao sistema de proteção em relação
ao adolescente/jovem infrator, dispondo de um sistema de justiça penal diferenciado e de
acordo com o sistema de proteção integral e melhor interesse. Dentre os documentos de
proteção, destacam-se:

357
-O Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais de 1966, que prevê
proteção à família, considerando núcleo natural e fundamental da sociedade(arts. 23 e 24) e de
forma específica no art. 10, n.3, estabelece a proteção específica à população infantil dispondo
-se adotar medidas especiais de proteção e assistência em prol de todas as crianças e

-A Convenção Americana de Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica, 1969),
também ratificada pelo Brasil em 1992, reforça todo o sistema internacional de defesa e de
proteção aos direitos humanos e prevê a base do sistema de proteção infanto-juvenil,
e proteção que sua

-As Regras Mínimas das Nações Unidas para a Administração da Justiça Juvenil (Regras de
Beijyng) que regulam princípios elementares de proteção aos direito fundamentais do
adolescente infrator, dispondo sobre a administração da Justiça da Infância e da Juventude.
-As Diretrizes das Nações Unidas pra a prevenção da delinquência juvenil (Diretrizes de Riad),
cendo regras mínimas de proteção
-regional.
Esses documentos internacionais que congregam o sistema de proteção no âmbito
internacional impulsionaram no Brasil as mobilizações em prol da concretização no âmbito
interno dos direitos da criança e do adolescente, proporcionando intenso movimento social
em prol do reconhecimento dos direitos humanos da criança e do adolescente, cuja
Constituição Federal de 1988 cumpriu esse desiderato.
1.2SISTEMA INTERNO DE PROTEÇÃO À CRIANÇA, AO ADOLESCENTE E AO JOVEM
No âmbito interno, o Brasil adotou a Doutrina da Proteção Integral que é o marco dos sistema
interno da proteção e de disciplina dos direitos fundamentais que seguem materializados no
artigo 227 da CF/88, com o seguinte teor: É dever da família, da sociedade e do Estado
assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à
saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao
respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda
forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.
O artigo 227 da CF foi regulamentado no plano infraconstitucional pelo Estatuto da Criança e
do Adolescente (ECA, Lei 8069/90) e passou a regular os direitos humanos infanto-juvenis
materializando-se sob o manto dos direitos e garantias fundamentais, que seguem norteados
pelo princípio da proteção integral que, na verdade, representa o princípio da proteção
especial e do cuidado especial e de acordo com o melhor interesse da criança, consagrados não
apenas na Convenção sobre os Direitos da Criança, como também nos demais documentos
internacionais que integram o sistema de proteção infanto-juvenil.
O ECA, além de disciplinar os direitos fundamentais, impondo proteção e promoção sob a
responsabilidade da família, sociedade e Estado, prevê também políticas públicas, privadas e
358
sociais de atendimento e proteção à criança e aos adolescentes em situação de risco ou de
perigo, sem prejuízo do reconhecimento da condição de sujeitos de direitos e também de
deveres com a responsabilização de caráter penal pelo ato infracional praticado, cuja
responsabilidade deve se pautar na proteção integral e no melhor interesse.
Além do ECA há outras normas esparsas que integram o sistema de proteção integral à criança
e ao adolescente, como é o caso da Lei da Palmada (Lei n. 13.010/2014), a Lei do SINASE
(Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo, Lei n. 12594/2012), cujas normas atentam à
condição de pessoas em peculiar condição de desenvolvimento e que necessitam da proteção
especial por parte da família, da sociedade e do Estado.
Os princípios que norteiam os direitos infanto-juvenis: proteção integral, melhor interesse e
prioridade absoluta
Os princípios correspondem a mandamentos de otimização da norma escrita e reguladora da
conduta, cuja finalidade é proibir, permitir ou tolerar certas condutas, sendo que a finalidade
dos princípios, seg
Os princípios convivem entre si,
buscam estabelecer uma harmonia, ao passo que em relação à regra ou norma escrita, duas
normas não coexistem, uma exclui a outra e, nesse, os princípios que embasam os Direitos
Humanos infanto-juvenis (proteção especial e integral, melhor interesse e prioridade absoluta)
convivem e se harmonizam entre si.
2.1 PROTEÇÃO INTEGRAL, MELHOR INTERESSE E PRIORIDADE ABSOLUTA
Os princípios da proteção integral e do melhor interesse estão incorporados nos documentos
internacionais que compõem o sistema de proteção e foram consagrados pelo art. 227 da CF,
regulamentado pelo ECA (Lei n. 8069/90), constituindo-se em sustentáculo do sistema interno
e externo de proteção à infância.
Os princípios da proteção integral e da prioridade absoluta foram incorporados pelo artigo 227
da CF, regulamentado pelo ECA, sob a inspiração dos documentos internacionais de proteção
à infância e juventude, destacando-se a Declaração de Genebra de 1924, que exaltaram o

nça de 1959, destaca


que a criança, em decorrência de sua imaturidade física e mental, precisa de proteção e
cuidados especiais, inclusive proteção legal apropriada, antes e depois do nascimento, VISTO
que a necessidade de tal proteção foi enunciada na Declaração dos Direitos da Criança em
Genebra, de 1924, e reconhecida na Declaração Universal dos Direitos Humanos e nos
estatutos das agências especializadas e organizações internacionais interessadas no bem-estar
da criança, VISTO que a humanidade deve à criança o melhor de seus esforços,(...).
A Convenção sobre os Direitos da Criança de 1989 compilou toda a normativa internacional de
proteção à infância e exaltou o princípio da proteção especial e cuidado especial, bem como o
do melhor interesse, cujo instrumento internacional adotou o aspecto da imperatividade para

359
dispor acerca dos direitos fundamentais infanto-juvenis e, concomitantemente, exigir dos
Estados-Partes ações e medidas sociais, administrativas, políticas, jurídicas e legislativas que
visem efetivar o sistema de proteção traçado pela normativa internacional.

universalismo, no sentido de que toda e qualquer criança, de qualquer parte do mundo, tem
reconhecida a proteção especial, da qual decorrem os direitos fundamentais gerais e especiais,
considerados sustentáculos da dignidade humana ( p. 70).
Importante ressaltar que o artigo 227 da CF encerra todo o sistema de proteção integral, de
cujo dispositivo se abstrai o aspecto principiológico em torno da doutrina da proteção integral,
da proteção especial, do melhor interesse e da prioridade absoluta, contudo,
trata-se de uma norma de conteúdo declarativo e impositivo, à medida que impõe à família, à
sociedade e ao Estado a adoção de medidas que visem a proteção, a promoção e a
concretização dos direitos fundamentais infanto-juvenis, objetivando o pleno e sadio
desenvolvimento da capacidade física, psíquica, moral, espiritual e social da criança e do
adolescente.
A doutrina da proteção integral consagrada pelo artigo 227 da CF, regulamentado pelo ECA,
rompeu com o paradigma menorista inserido no revogado Código de Menores (Lei n.
6.697/79) que classificava o menor como carente, abandonado e infrator (delinquente), cujas

A doutrina da Situação Irregular era de caráter assistencialista para o menor abandonado e


punitivo para o delinquente, portanto, não se reconhecia a condição das crianças e
adolescentes como sendo sujeitos de direitos fundamentais, ou seja, com autonomia na ordem
jurídica e na participação do processo de construção de direitos humanos e fundamentais, que
os torna protagonistas dos seus direitos, inclusive deveres (cf. responsabilidade pela prática do
ato infracional).
O ECA ao regulamentar o artigo 227 da CF, inseriu no seu artigo 4º. o princípio da Prioridade
os
Direitos da Criança.
Por absoluta prioridade ou melhor interesse deve-se entender que a criança e o adolescente
devem ter seus direitos fundamentais garantidos em primeira ordem, ou seja, o Poder Público
deve fazer a reserva necessária para garantir creche, educação, saúde, moradia etc, tendo-se
em conta que o tratamento diferenciado não implica violação ao princípio da igualdade e certo
porque se está a tratar de especificação de direitos em razão da peculiar condição de
desenvolvimento físico, psíquico, moral, espiritual, que requer por parte de todos os agentes
públicos, membros da sociedade e da família a destinação de um cuidado especial.
3 ATO INFRACIONAL E MEDIDAS SOCIOEDUCATIVAS

360
O problema da violência associada à criminalidade afeta a vida das pessoas em escala
incomensurável, possuindo causas e consequências das mais diversas. Sua ocorrência atinge
todos os segmentos, todas as instituições, sendo muitas vezes banalizadas ou ignoradas.
No que diz respeito às crianças e aos adolescentes, o problema se torna ainda maior quando
eles são identificados como agentes de atos ilícitos.
O Ministério do Desenvolvimento Social juntamente com a Secretaria Nacional de Assistência
social afirmam que no contexto social, econômico, político e cultural brasileiro, os
adolescentes que cometem atos infracionais têm, em geral, seus direitos violados: baixa
escolaridade, trabalho infantil, fragilidade do vínculo familiar ou vivem em situação de
vulnerabilidade social, o que faz com que se criem estereótipos tornando-os incompreendidos
nas suas peculiaridades perante a sociedade. Neutralizar essa situação é dever de todos:
Estado, família, a comunidade e o próprio adolescente.
3.1 CONCEITO E CARACTERÍSTICAS DO ATO INFRACIONAL
Conceitua-se como ato infracional a conduta descrita como crime ou contravenção penal
praticada por crianças ou adolescentes (art. 103, ECA). No entendimento de Moraes e Ramos
(2013) há que se estabelecer clara distinção entre ato infracional e indisciplina, cujos atos
indistintamente muitas vezes são considerados ilícitos penais (p. 967). Explica este autor que
por indisciplina deve ser compreendida a falta de obediências às regras regimentais das
instituições. É possível que um ato de indisciplina possa também ser considerado ato
infracional, mas pode ocorrer também outros atos indisciplinares que não correspondam a
atos infracionais.
O ato infracional, assim considerado pela legislação, será somente aquele que se enquadrar
como crime ou contravenção penal, portanto, para sua caracterização é preciso que a ação do
infrator esteja previamente disciplinada na legislação penal em vigor. Na realidade, o que
diferencia crime de ato infracional é a idade cronológica do agente, considerando, no caso de
criança ou adolescente a condição peculiar de pessoa em desenvolvimento, o que lhe garante
abrandamento no trato, porém suficientemente consistente para sua correção.
De acordo com o ECA, o ato infracional é tratado de forma diferenciada, quando o agente que
o pratica é criança ou adolescente: se criança, ou seja, pessoa entre zero e doze anos
incompletos aplicam-se, de forma isolada ou cumulativamente, as medidas de proteção
previstas no art. 101; se adolescente, ou seja, pessoa entre doze e dezoito anos, aplicam-se as
medidas socioeducativas, podendo ser cumpridas excepcionalmente entre dezoito e vinte e
um anos, quando o ato foi praticado antes dos dezoito anos de idade.
Assim, se a criança é o agente do ato infracional, pode ter cabimento o seu encaminhamento
aos pais ou responsáveis, mediante termo de responsabilidade; orientação, apoio e
acompanhamento temporários; matrícula e frequência obrigatória em estabelecimento oficial
de auxílio à família, à criança e ao adolescente; requisição de tratamento médico, psicológico
ou psiquiátrico em regime hospitalar ou ambulatorial; inclusão em programa oficial ou

361
comunitário de auxílio, orientação e tratamento a alcoólatras e toxicômanos; acolhimento em
entidade institucional, e colocação em família substituta. Já no caso dos adolescentes, estes
sujeitam-se ainda à advertência; obrigação de reparar o dano; prestação de serviços à
comunidade; liberdade assistida; inserção em regime de semiliberdade; internação em
estabelecimento educacional e qualquer uma das medidas previstas no art. 101, inc. I a VI (art.
112, ECA).
Ishida (2011) esclarece que há dois conceitos de crime: (i) como fato típico e antijurídico; (ii)
como fato típico, antijurídico e culpável. Nitidamente aplicável à lei infantojuvenil o primeiro
conceito, pela presunção absoluta da incapacidade de entendimento e determinação pelo
critério biológico (p. 217). Aliás o próprio ECA estabelece no art. 104 que os menores de 18 anos
são penalmente inimputáveis, cuja inimputabilidade penal do menor de 18 anos é uma garantia
constitucional e fundamental (art. 228 da CF).
3.2 EVOLUÇÃO DA RESPONSABILIDADE PENAL JUVENIL NO DIREITO BRASILEIRO
A sequência histórica do Direito Penal Juvenil é um processo dinâmico, moldado conforme a
evolução das ideias e ideais sociais vigentes em cada época. Os doutrinadores costumam
dividi-la em três etapas principais:
a) A primeira, da Doutrina Indiferenciada, que vai desde a antiguidade até o início do século
XX. Ishida (2011, p. 216) ensina que a pena tinha caráter retributivo e os menores infratores
entre 7 (sete) e 18 (dezoito) anos tinham direito apenas a uma redução de um terço da pena
aplicável aos adultos. Amarante (2010, p. 497) aduz que ainda no Império, com o advento do
Código Criminal de 1830, militava aos menores a presunção juris tantum da
irresponsabilidade, podendo ser responsabilizado apenas se houvesse prova de seu
discernimento.
Villas-Bôas (2012) acrescenta que essa doutrina retratava o pensamento da Escola Clássica do
Direito Penal, sem distinção no tratamento do menor em relação ao adulto, avaliando-se
apenas o grau de discernimento e a consciência daquele. A pena a ser aplicada era uma forma
de considerar como retribuição ao mal causado (p. 14).
b) A segunda, da Doutrina da Situação Irregular, que compreende o período desde a evolução
da vida Republicana até o advento do ECA (Ishida, 2011, p. 216),. Villas-Bôas (2012), denomina
esse período de "fase tutelar". Tem como característica a inimputabilidade penal ao menor de
18 anos, porém a mentalidade já vinha se modificando, aceitando a tese de tratamento
diferenciado em razão da idade (p. 17) .
Contudo, afirma Leite (2005) com o advento do Código Mello Mattos (Código de Menores) o
sistema de imputabilidade tinha caráter assistencialista, protecionista e controlador, exigindo
firme controle por mecanismo de tutela, guarda, reforma e reeducação (p. 10). Villas-Bôas
(2012), aduz que a Doutrina da Tutela foi identificada por concentrar nas mãos do Juiz a
autoridade para aplicar o que for melhor aos menores, considerando que o Judiciário estava
"revestido por um paternalismo terapêutico" (p. 18-19). Nessa Doutrina confundia-se o

362
delinquente do abandonado tratando ambos como menores em situação irregular (Amarante,
2010, p. 500).
c) A terceira, da Doutrina da Proteção Integral, que se inicia a partir da vigência do Estatuto da
Criança e do Adolescente. Tem como fundamentos essenciais o reconhecimento do
adolescente como sujeito de direito, em situação especial de pessoa em desenvolvimento e a
aplicação do princípio do melhor interesse (Ishida, 2011, p. 216). Leite (2005) acrescenta que
essa doutrina já estava prevista na Constituição Federal de 1988, inspirada pela Convenção das
Nações Unidas sobre Direitos da Criança (p.11).
Villas-Bôas (2012) afirma que é uma doutrina que se aproxima da Escola Funcionalista
Racional-Teleológica, na qual mudou-se a visão do caráter retributivo da pena para o aspecto
preventivo sob o enfoque dialético (p. 20).
3.3 MEDIDAS SOCIOEDUCATIVAS: ATO SANCIONADOR-EDUCATIVO
O ECA estabelece dualidade das medidas: uma denominada medidas de proteção e que tem
caráter não-punitivo e é dirigido a menores de 12 anos de idade (art. 101, ECA), e outra,
denominada medida socioeducativa, de caráter punitivo-educativo aplicável a jovens de 12 a 18
anos (art. 112, ECA).
Riezo (2015) comenta que a intenção do legislador ao propor essas medidas, foi a de proteger
(por exemplo, com o fortalecimento das relações familiares), prevenir e recuperar (por
exemplo, com serviços de acompanhamento, auxílio e orientação) jovens infratores.
Os doutrinadores vislumbram nas medidas socioeducativas, duas características: o
sancionatório e o pedagógico (p. 486).
O caráter sancionatório decorre do fato de que quem comete um ato deve ser por ele
responsabilizado. Moraes e Ramos (2013) afirmam que é uma resposta à sociedade pela lesão
decorrente da conduta infracional praticada (p. 998). As sanções podem ter diversas naturezas:
restauradoras, indenizatórias, coatoras ou punitivas; as três primeiras no sentido de reparação
das consequências; a última deriva exclusivamente do descumprimento de um preceito legal
(Villas-Bôas,2012, p. 29).
A sanção vista como punição não visa reparação, mas possui finalidades de salvaguardar a
confiança na ordem jurídica, de intimidação para evitar novas práticas ilícitas ou
ressocialização do agente infrator (Villas-Bôas,2012, p. 31), razão pela qual, as medidas
socioeducativas têm natureza tipicamente sancionatória.
Os infratores, ainda que jovens devem ser responsabilizados pelos atos que os praticarem,
aplicando-se lhes as medidas de forma impositiva pelo Juiz (independe da vontade do infrator),
com o objetivo de inibir a reincidência, sob o princípio da justa proporção.
Embora reconhecido o caráter sancionador, as medidas socioeducativas possuem também seu
valor pedagógico, principalmente nos programas de atendimento socioeducativos que
garantem aos adolescentes o atendimento de suas necessidades. Assim, é possível analisar a

363
dimensão pedagógica, por exemplo, nas garantias processuais as quais defendem o
fortalecimento do vínculo familiar ou ainda a afirmação do aspecto educativo, sob o princípio
da proteção integral que prevê a promoção do desenvolvimento do jovem como pessoa e
cidadão, como forma de socialização.
As medidas socioeducativas sob o prisma pedagógico visam a integração do infrator no seio da
sociedade com enfoque na reconstrução dos significados de participação no contexto social,
cultural e econômico.
As disposições dos medidas socioeducativas do ECA, porém, foram alvo de críticas, já que,
como observa Ishida (2011) a sua execução não se encontra disciplinado, cuja ação era como
um "prolongamento da atuação do juiz" tal qual uma "atividade jurisdicional", podendo gerar
dúvidas e injustiças (p.247).
Novas luzes foram lançadas, porém, sobre essas medidas com a edição da Lei 12.594/2012,
conhecida como Lei SINASE. Esta legislação trouxe, por exemplo, no art. 1ª, § 2º como
objetivos da medida socioeducativa: a responsabilização do adolescente incentivando sua
reparação; a integração social do adolescente e a garantia de seus direitos individuais e sociais;
e a desaprovação da conduta infracional reduzindo a reincidência.
Frasseto (2012) analisam que essa nova legislação tem o adolescente como foco principal da
medida e com a criação de um sistema de atendimento individualizado tem o propósito de
respeitar o indivíduo em sua singularidade (p.46). As disposições dessa lei propõe a
modernização da gestão socioeducativa, criando sistemas, definindo responsabilidades, não
apenas do Estado, mas com colaboração do próprio socioeducando e seus familiares, através
do direito de participação.
A previsão de ações específicas a serem desenvolvidas em face de cada um dos adolescentes,
por meio do Plano Individual de Atendimento (PIA), permitirá acompanhamento eficaz
visando uma resposta adequada ao caso concreto.
Há ainda, conforme analisa Frasseto (2012), a intencionalidade na lei de redução da
intervenção judicial, incentivando novas metodologias de solução de conflitos como a
autocomposição e práticas restaurativas (art. 35) (p. 48/49).
Espera-se eficaz desenvolvimento dos programas e ações previstas na legislação a fim de
alcançar os objetivos propostos, possibilitando aos socioeducandos sua inclusão social e
reconstruir sua história envolta em relações humanas de convívio mais justas e se transformar
num cidadão ativo e participante para a melhoria de sua vida e a de sua comunidade.
4 ATO INFRACIONAL E A MEDIAÇÃO COMO FORMA DE SOLUÇÃO DO CONFLITO
ENVOLVENDO ADOLESCENTE EM CONFLITO COM A LEI
Na verdade, antes de se discutir a questão da redução da maioridade penal juvenil no Brasil,
urge buscar a plena efetivação da proteção integral e do pleno exercício dos direitos
fundamentais infanto-juvenis, dentre esses direitos fundamentais a adoção de um sistema
364
penal juvenil compatível com a peculiar condição de pessoas em desenvolvimento e, de acordo
com a proteção integral e melhor interesse, a intervenção punitiva deve ser mínima, devendo-
se buscar um processo de ressocialização calcado na educação, tornando-se a mediação uma
prática restabelecedora do equilíbrio social e de viés educativo e formativo.
O adolescente infrator em razão da sua condição de sujeito de direito e titular de direitos e
garantias fundamentais padece de medidas punitivas, pois assume responsabilidades em caso
de cometimento de infração, inclusive se sujeita à privação da liberdade no caso de aplicação
da medida socioeducativa de internação, cuja medida é a mais severa, conforme amplamente
abordado no parágrafo anterior.
Como dito em outra passagem, a CF/88 e o ECA promoveram um novo tratamento jurídico
para o menor, seja abandonado, seja em situação de risco ou de perigo ou seja na condição de
perturbador da ordem pela prática de ato infracional, e, assim sendo, o Brasil adotou a
mudança de paradigma, inclusive em matéria de tratamento penal, deixando de considerar o
menor delinquente e em situação irregular que necessitava o assistencialismo precário do
Estado, conforme o sistema subsidiado pelo revogado Código de Menores.
Diante do reconhecimento, declaração e disciplina legal dos direitos humanos infanto-juvenis,
adotou-se um novo padrão de reconhecimento do menor em conflito com a lei, assumindo a
condição de sujeito de direitos e de deveres, em especial, dever de respeito a ordem jurídica e
ao próximo, tornando-se responsável, contudo, com as limitações da sua condição de pessoa
em desenvolvimento, vislumbrando que o sistema antigo, do Código de Menores revogado,
não se coaduna com o espírito da proteção integral e de acordo com o sistema internacional de
proteção que vige, atualmente.
De acordo com o sistema de responsabilidade penal juvenil previsto pelo ECA, diante de ato
infracional praticado por adolescente (maior de 12 anos), a autoridade judiciária aplicará uma
das medidas socioeducativas previstas no art. 112 do ECA, anteriormente referidas, sendo certo
que a medida mais severa é a de internação, cuja medida é o último recurso a ser adotado,
conforme se verifica pela normativa internacional, em especial, as Regras Mínimas das Nações
Unidas para a Administração da Justiça Juvenil (Regras Mínimas de Beijing, ONU, 1985), as
quais anunciam princípios básicos para a proteção de direitos individuais e fundamentais do
jovem infrator, representando, na verdade, condições mínimas as quais devem se sujeitar o
menor/jovem infrator de países signatários.
Conforme esclarece Liberati, as Regras de Beijing estabelecem que a privação da liberdade do
adolescente infrator deve ser o último recurso a ser utilizado, buscando aplicar as medidas em
meio aberto e sempre de cunho educativo (2012, p. 26). E continua afirmando, caso seja

cumpridas em recintos distintos dos reservados aos adultos, onde os jovens possam receber
cuidados, proteção e toda a assistência social, educacional, profissional, psicológica, médica

365
Até 2012 o ECA continha uma lacuna sobre o procedimento para aplicação da medida
socioeducativa, em especial, a de internação, contudo, a Lei n. 12.594 de 18/01/2012 criou o
SINASE (Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo), conforme já mencionado alhures,
que corresponde a um conjunto ordenado de princípios, regras e critérios que envolvem a
execução de medidas socioeducativas, com o estabelecimento de integração entre os Sistemas
de atendimento dos Estados e dos Municípios, com os seus respectivos planos, políticas e
programas específicos de atendimento a adolescente em situação de conflito com a lei.
A medida socioeducativa tem muito mais o caráter coercitivo e punitivo do que educativo
(Shecaira,2015, p. 189), contudo, o SINASE tem como objetivo cumprir as disposições previstas
nas Regras Mínimas de Beijing, bem como as Diretrizes de Riad (Diretrizes das Nações Unidas
para a Prevenção da Delinquência Juvenil, ONU, 1989).
Essa normativa em matéria de execução da medida socioeducativa busca a prevenção da
delinquência juvenil, a aplicação de medidas punitivas de acordo com o melhor interesse e a
proteção especial e integral, buscando, antes de tudo, atribuir o caráter educativo à medida
socioeducativa de internação, priorizando a adoção da mediação sob a forma de justiça
restaurativa no âmbito da execução da medida socioeducativa, ou seja, uma forma de atender
os ditames da proteção integral e do melhor interesse, consagrados pela CF/88, ECA e
documentos internacionais e buscando outros meios de solução que não seja a imputação de
medidas de caráter penal.
A justiça restaurativa é um conjunto ordenado e sistêmico de princípios, técnicas e atividades
próprias utilizadas para solução de conflitos onde tenha ocorrido dano, tratando-se de
estratégia eficaz de envolvimento participativo e empoderamento de adolescentes, bem como
de suas famílias e comunidades participantes desse modo de justiça que visa a resolução de
situações de conflito, bem como de promoção de direitos.
Trata-se de uma modalidade de mediação de conflito onde as partes envolvidas no conflito
(adolescente e vítima) podem buscar concretizar seus interesses, gerando alternativas
negociando-as, visando selar um compromisso com o acordo de mediação (justiça
restaurativa).
Nesse caso, é necessária a participação da vítima, do ofensor, das famílias envolvidas no fato
danoso, de representantes da comunidade onde ocorreu esse fato danoso e do facilitador
restaurativo. (Justiça Restaurativa, Tribunal de Justiça de São Paulo).
A excepcionalidade da aplicação da medida restritiva de liberdade, por si só, revela uma
prática restaurativa sendo que o art. 35, inciso III da Lei n. 12594/2012 prioriza a prática da
justiça restaurativa como forma de reparar o erro, educar para a paz e, ao mesmo tempo,
promover a reinserção social sem as mazelas das penas mais severas traduzidas em forma de
medidas socioeducativas.
A Lei do SINASE assume a característica bivalente, pois está vinculada tanto ao direito penal
juvenil como ao sistema de mediação com a prática da justiça restaurativa, exaltando a
366
condição do adolescente infrator de sujeito de direitos e deveres, mas ao mesmo tempo
estabelecendo uma política de atendimento e acolhimento para ser educado a compreender o
caráter do ato infracional, as consequências geradas e a possibilidade de reparar o erro e
prejuízo sem necessidade de qualquer medida socioeducativa, sendo uma forma de solução do
conflito, contudo, a depender da vontade da vítima do ato infracional cometido.
A justiça restaurativa se insere no âmbito da mediação penal que, por sua vez, se caracteriza
como um processo de negociação extrajudicial entre as partes em conflito, com a intervenção
de um mediador, neutro e imparcial, que possibilitará a comunicação entre as partes, com
técnicas próprias de mediação, atendendo aos interesses de ambas as partes através de
alternativas negociadas, resultando em acordo de mediação.
Conforme destaca Teresa L. Albuquerque e Sousa Robalo (2012), os princípios do direito penal
não serão afetados como recurso à mediação penal, contudo, não se vincula às consequências
do crime, tanto que não resultará em qualquer aplicação de sanção penal, mas um eventual
acordo entre as partes( p. 135)
Quanto ao aspecto retribucionista da pena privativa da liberdade, como bem pondera Olivert

restablecimiento de la situación originaria, la cual puede conseguirse a través de la reparación


y conciliación. (p. 36-37)
A voluntariedade das partes envolvidas é pressuposto elementar para se aplicar a justiça
restaurativa ou mediação, sob pena de caracterizar uma ação forçada e o perdão não-
espontâneo; deverá o encontro entre as partes ser benéfico para a vítima, enquanto a
participação voluntária do autor do ato infracional implica o reconhecimento da culpabilidade.

alternativa que puede permitir la desjudicialización en supuestos menos graves conseguiendo


uma solución al conflito entre víctima y autor, acudiendo a la vía penal cuando esa resolución
extrajudicial no sea posible o cuando por las características del hecho y del autor sea

Conforme se verifica pela Lei do SINASE, que abrange a execução das medidas
socioeducativas, a adoção da prática restaurativa como medida de ressocialização e educação
do menor infrator constitui-se um princípio que fundamenta todo o processo de execução da
medida socioeducativa, e neste sentido dispõe o artigo 35 e inciso III da Lei do SINASE, que a

que sejam restaurativas e, sempre que possível, atendam às necessidades


Não paira dúvida de que a proposta da justiça restaurativa é efetivar o princípio da
intervenção mínima e da subsidiariedade, consagrados pelos documentos internacionais
referentes à justiça penal juvenil, sendo um dos caminhos para a ressocialização do menor
infrator, além de possibilitar a reparação do dano causado à vítima e à sociedade.

367
O Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo está imbuído dessa perspectiva, segundo
a qual as medidas socioeducativas aplicadas aos menores infratores devem se orientar para a
ressocialização, com observância aos princípios de direitos humanos e adoção de medidas
compatíveis para a reparação do dano causado pelo ato infracional, com a intervenção da
família e da comunidade, facilitando, da melhor forma, a ressocialização.
A mediação e aplicação da Justiça Restaurativa representa um modelo democratização do
sistema penal juvenil, com o despertar para o protagonismo e responsabilidade social do
jovem infrator, tornado uma maneira de se atribuir eficácia ao sistema jurídico e de justiça
infanto-juvenil para o enfrentamento da violência envolvendo os jovens, pois além de garantir
aos cidadãos, em especial, as vítimas do ato infracional o exercício das garantias
constitucionais, busca promover a ressocialização dos infratores, com a responsabilidade de
reparar as vítimas e a comunidade dos prejuízos gerados pela conduta infracional.
A Justiça restaurativa, na verdade, representa uma justiça penal mais democrática, que
concede aos cidadãos a oportunidade de solucionarem os seus conflitos, cuja solução sempre
foi delegada ao Estado, e também é um mecanismo de aproximação e diálogo entre os
envolvidos que poderá gerar solução sem traumas gerados pela intervenção do Estado, sendo
importante ressaltar, no entanto,
penal, ao que se apresenta somente como um modelo auxiliar, que inspira complementar o seu
(ACERVO DIGITAL, 2017)
Dessa forma, o caráter excepcional da intervenção judicial e da imposição de medidas, abrindo
espaço para criação de mecanismos destinados à mediação de conflitos, como é a proposta da
Justiça Restaurativa, torna-se uma via de mão dupla, pois visa atender interesse do autor, mas
também pode atender aos interesses e até mesmo as necessidades das vítimas.
CONCLUSÃO
Em sede de conclusão, pode-se afirmar que o sistema legal de proteção aos direitos humanos
do adolescente infrator evoluiu desde a década de 70 quando surgiu o Código de Menores que
reconhecia a delinquência juvenil como uma situação irregular a demandar intervenção
repressiva por parte do Estado, tornando o adolescente objeto de proteção do Estado, para um
sistema de reconhecimento dos direitos fundamentais dessas pessoas em peculiar condição de
desenvolvimento.
No âmbito das garantias processuais e de execução das medidas socioeducativas previstas no
ECA, esse instrumento estabeleceu um sistema de justiça penal infantil baseado na proteção
integral e no melhor interesse, demandando proteção protetiva por parte do Estado, sem
prejudicar o exercício de direitos e garantias fundamentais especiais, diante da especificação
dos direitos infanto-juvenis.
E a Lei do SINASE visa suprir a lacuna do ECA em matéria de execução das medidas
socioeducativas, garantido também a redução da intervenção punitiva do Estado para buscar
soluções amigáveis dos conflitos gerados pelo adolescente/jovem infrator, tal como é o caso da
368
inserção da Justiça Restaurativa, levando ao verdadeiro sentido do aspecto educativo da pena e
possibilitando a assunção de responsabilidade social por parte do adolescente infrator, com
uma reinserção consciente do seu compromisso com a sociedade e com o dever de conduzir-se
eticamente.
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370
A NECESSÁRIA INTERFACE ENTRE OS DIREITOS HUMANOS E O
DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL
197

RESUMO
O presente trabalho busca analisar a relação existente entre os direitos humanos, o direito ao
desenvolvimento e a sustentabilidade, buscando estabelecer uma relação basilar e de interesse
global. Seu principal escopo consiste em apurar se o modelo de desenvolvimento aplicado
majoritariamente pelas nações é compatível com a necessária defesa do meio ambiente e a
proteção dos direitos humanos. Assim, busca-se examinar o problema relativo ao uso
desenfreado dos recursos naturais para a satisfação dos interesses econômicos, que visam
apenas o lucro rápido e desprezam os temas relacionados ao meio ambiente, direitos sociais e
humanos. O modelo de desenvolvimento adotado mundialmente não considerou o desgaste
ambiental.Após a Revolução Industrial, a maneira como a sociedade utilizava os recursos
naturais tornou-se preocupante, pois considerava-se que qualquer tipo de preservação
ambiental era totalmente antagônico ao crescimento industrial e ao desenvolvimento

finalmente começou-se a superar a crença de que a tecnologia e a industrialização poderiam


ser conquistadas a qualquer custo, o meio ambiente sofreu e ainda sofre com diversas
consequências dessa exploração desenfreada. Com o intuito de efetivar o desenvolvimento
sustentável em 1987 foi criadaa Comissão Mundial Sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento
(CMMAD). Esta almejava propor metas e objetivos através de uma agenda global de
mudanças, harmonizando os princípios dos direitos humanos, com os princípios da proteção
ambiental. O principal desafio da Comissão foi conciliar a preservação ambiental com o
desenvolvimento econômico, uma das faces do desenvolvimento sustentável, conceituando
esse como desenvolvimento que satisfaz às necessidades do presente sem comprometer a
possibilidade de as gerações futuras satisfazerem as suas próprias necessidades. Assim, para
que haja a proteção da dignidade da pessoa humana e seus direitos sociais e humanos sejam
respeitados é essencial a mudança de paradigma global de exploração econômica e a busca por
um desenvolvimento sustentável que assegurará a sobrevivência da espécie humana e a
existência dos demais direitos de uma forma mais efetiva.
RESUMEN
Este estudio tiene como objetivo examinar la relación entre los derechos humanos, el derecho
al desarrollo y la sostenibilidad, buscando establecer una relación básica y de interés global. Su
principal objetivo es determinar si el modelo de desarrollo aplicado mayormente por las

197
Doutoranda e Mestre em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais/Brasil.
Professora Universitária da Faculdade UNA Betim e Contagem/MG.
E-mail: isabelathebaldi@gmail.com

371
naciones es compatible con la necesaria defensa del medio ambiente y protección de los
derechos humanos. De tal manera, se procura examinar el problema del uso desenfrenado de
los recursos naturales para la satisfacción de los intereses económicos, que buscan únicamente
el beneficio rápido y desprecian las cuestiones relacionadas con el medio ambiente, los
derechos sociales y humanos. El modelo de desarrollo adoptado en todo el mundo no tuvo en
cuenta el desgaste del medio ambiente. Después de la Revolución Industrial, la forma en que la
sociedad utilizaba los recursos naturales se ha vuelto preocupante, ya que se consideraba que
cualquier tipo de preservación del medio ambiente era totalmente antagónica al crecimiento
industrial y el desarrollo económico. Así, hasta que la "cuestión ambiental" surgiese después de
la segunda mitad del siglo XX, cuando finalmente se comenzó a superar la creencia de que la
tecnología y la industrialización se podían ganar a cualquier precio, el medio ambiente sufrió y
todavía sufre con las diversas consecuencias de esta explotación desenfrenada. Con el fin de
lograr un desarrollo sostenible, en 1987 se creó la Comisión Mundial sobre el Medio Ambiente
y el Desarrollo (CMMAD). Esta anhelaba proponer metas y objetivos a través de un programa
global para el cambio, armonizando los principios de los derechos humanos y los principios de
la protección del medio ambiente. El principal reto para la Comisión fue conciliar la
conservación del medio ambiente con el desarrollo económico, una de las facetas del
desarrollo sostenible, el conceptualizado como el desarrollo que satisface las necesidades del
presente sin comprometer la capacidad de las generaciones futuras para satisficieren sus
propias necesidades. Entonces, para que haya la protección de la dignidad humana y para que
sus derechos sociales y humanos sean respetados, es esencial el cambio de paradigma global de
la explotación económica y la búsqueda de un desarrollo sostenible que garantice la
supervivencia de la especie humana y la existencia de los otros derechos de una manera más
eficaz.
1 A NECESSÁRIA INTERFACE ENTRE OS DIREITOS HUMANOS E AMBIENTAIS
As Organizações das Nações Unidas definem direitos humanos como uma categoria de direitos
intimamente relacionados a essência humana, independentemente de qualquer diferenciação
por cor, raça ou credo. Nesse cenário, de maneira geral estão incluídos os direitos à vida,
dignidade humana, acesso à saúde entre outros. A necessidade de proteção ambiental também
deve ser incluída nesse contexto, pois sem a sua consecução é impossível garantir o acesso à
uma vida digna.
Os direitos humanos possuem um forte caráter histórico, pois decorrem de circunstâncias
históricas inerentes as revoluções europeias do Séc. XVII. Assim, existe uma divisão entre os
direitos humanos em gerações, sendo a proteção ao meio ambiente inserida na terceira
geração de direitos humanos.
O Supremo Tribunal Federal brasileiro já se manifestou sobre o tema no julgamento do
Recurso Extraordinário nº 134.297-SP, de relatoria do Ministro Celso de Mello, onde o mesmo
declarou ser o direito ao meio ambiente equilibrado, a consagração constitucional de um típico
direito de terceira geração.
372
Assim, como será demonstrado a seguir, a proteção ambiental está intimamente relacionada a
proteção à dignidade da pessoa humana, logo, a proteção dos direitos humanos. Sendo dever
dos Estados que se comprometem a respeitar os Direito Humanos, tutelarem de igual forma a
proteção ambiental.
2 A CRISE AMBIENTAL
A crise ecológica não é novidade, todos sabem que a forma de produção e exploração da
natureza vem tomando proporções insustentáveis que, se mantidas, ocasionarão desastres
naturais cada vez maiores, podendo culminar na falta de recursos naturais e até mesmo de
alimentos para uma população que cresce exponencialmente.
Tanto o modelo econômico adotado no Estado Liberal e no Estado Social implicaram em
graves consequências ao meio ambiente pois, enquanto o primeiro constituiu suas bases na
Revolução Industrial, ou seja, intensificação da emissão de dióxido de carbono e
desmatamento exacerbado, o Estado Social ignorou completamente as questões ambientais,
buscando o crescimento a todo custo, para provar que esse modelo econômico voltado para o
social seria superior àquele em todos os sentidos. Melnik(2009) relata que após a abertura do
território que pertenceu a União Soviética, a degradação ambiental de todo o território
ocupado pelos soviéticos era exorbitante, pois não havia nenhum tipo de preocupação com o
meio ambiente e muito menos com a proteção da propriedade, pois o soviético não tinha esse
sentimento de pertencimento com a coisa, que o fizesse cuidar do bem.
Apesar de o desgaste ambiental ser uma verdade indiscutível, algumas teorias econômicas
ainda trabalham com a ideia de que os recursos naturais são infinitos e que a exploração
ambiental deve continuar sob pena de enfraquecer o mercado econômico, o que acarretaria
tragédias sociais maiores dos que as tragédias ambientais.
Apesar de atualmente existir uma consciência um pouco maior sobre a condição finita dos
recursos naturais e as limitações do planeta terra. Todavia, tal consciência alcançou pouca
relevância em termos práticos, não afetando, por exemplo, as teorias econômicas mundiais,
que não consideram o fator meio ambiente como um elemento da equação econômica e,
quando muito, o consideram como um custo que deve ser superado em razão das leis de
proteção ambiental.
Se tudo a nossa volta e nós mesmos vivemos da natureza e dela dependemos para respirar e
viver, isso significa dizer que existe uma estreita relação entre os agentes econômicos
(consumidores, trabalhadores, governo, produtores, investidores, etc.), os seus sistemas
econômicos (agricultura, indústria, serviços) e a natureza. Posto isso, por que razão as teorias
tradicionais só estudaram e estudam as leis econômicas de conceitos como investimentos
privados, gastos governamentais, crescimento do PIB (Produto Interno Bruto), juros, inflação,
etc.? É como se tudo a nossa volta brotasse do nada e não fosse produzido com os recursos da
natureza. (PENTEADO, 2008, p.17)

373
Em que pese a grande degradação ambiental ocasionada pelo modelo de exploração
econômico, existem teorias que almejam amenizar os efeitos do colapso ambiental. A teoria da
ecoeconomia, apesar de relativamente recente, possui diretrizes importantes para o atual
cenário que vivenciamos, sendo que as suas principais preposições são as seguintes: que os
recursos naturais são finitos e que não se pode continuar acreditando em teorias econômicas
de ideologia otimista que pregam um crescimento econômico eterno, prometendo padrões de
consumo insustentáveis. Estes são postulados fundamentais para a adoção de uma nova
postura social, ambiental e econômica.
3 O PAPEL DO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL
O modelo de desenvolvimento adotado no Brasil, assim como a grande maioria dos países, não
considerou o desgaste ambiental, por haver uma presunção que os recursos naturais estariam
disponíveis para o uso infinitamente.
A forma como o ser humano se relacionou com o meio ambiente ao longo da história ocorreu
de maneiras diferentes, porém a humanidade sempre necessitou e necessitará do meio
ambiente para a sua sobrevivência. Após a Revolução Industrial, a forma como a sociedade
utilizava os recursos naturais tornou-se preocupante, pois considerava-se que qualquer tipo de
preservação ambiental era totalmente antagônico ao crescimento industrial e ao

século XX, quando finalmente começou-se a superar a crença de que a tecnologia e a


industrialização poderiam ser conquistadas a qualquer custo, o meio ambiente sofreu e ainda
sofre com diversas consequências dessa exploração desenfreada.
No final do século XX começaram a surgir os primeiros alertas de que a globalização, a
produção em massa, a agricultura, a exploração do petróleo, a urbanização e a agricultura
extensiva estavam atingindo patamares de esgotamento ambientais, que em pouco tempo
seriam insustentáveis. Penteado (2008) relata que nunca como agora a natureza teve tão
pouco tempo para se restaurar, pois o uso dos recursos naturais está em um ritmo tão elevado
que é impossível a natureza absorvê-los. Em razão desse uso desenfreado, a maior parte dos
desastres ambientais relatados nos últimos anos ocorreu em consequência desses limites
ambientais que não foram observados, não sendo simplesmente desastres naturais.
Desastres naturais estão aumentando. Munich Re, uma das maiores seguradoras do mundo,
divulgou que ocorreram três vezes mais catástrofes naturais durante os anos 90 do que nos
anos 60. Perdas econômicas aumentaram oito vezes. Prejuízos cobertos por seguros
multiplicaram-se quinze vezes. Embora a classificação da Munich Re não distinga entre
catástrofes causadas pela natureza e pela ação humana, grande parte do aumento parece ser
devido a catástrofes (incluindo tempestades, secas e incêndios florestais) agravadas ou
causadas por atividades humanas. (BROWN, 2003, p. 19).
Nesse cenário, o economista Hugo Penteado questiona:

374
Todos os bens e serviços da economia a nossa volta vieram da natureza. Estes bens estão sendo
produzidos em equilíbrio com os recursos da natureza? O descarte do nosso lixo está sendo
biodegradável na velocidade de sua acumulação? Há consciência com relação à necessidade de
preservar os recursos da natureza que são utilizados diariamente? Os ecossistemas onde
atuamos estão se mantendo equilibrados com a nossa presença? Os recursos naturais dos
quais dependemos para viver são todos eles infinitos? Os governos estão adotando políticas
públicas que privilegiam as atividades mais sustentáveis do ponto de vista socioambiental? A

cuidando para que não faltem condições naturais para a sobrevivência humana da Terra num
futuro próximo, pode desistir desse pensamento. (PENTEADO, 2008, p.21)
Baracho (2000) afirma que, na modernidade, a natureza foi um elemento a ser conhecido,
dominado e explorado, sendo reduzido a instrumental para a realização das finalidades
humanas, sendo que essa relação perdurou por muito tempo, quando finalmente iniciou-se o
movimento de consciência ambiental.
A consciência da crise ambiental se consolida entre as décadas 60 e 70, com a crise do
petróleo, momento em que a comunidade científica demonstra necessidade de discutir a
forma que ocorrerá o desenvolvimento, pois os danos que este estava gerando sobre a natureza
poderiam ser maiores do que os benefícios implementados pelo crescimento econômico.
No final da década de 60 surge o Clube de Roma, um grupo de debates composto por
estudiosos, políticos, biólogos, físicos e até mesmo artistas que estavam preocupados com o
futuro do planeta, caso os índices de degradação ambiental continuassem crescendo
exponencialmente. Nesse debate, surgem as primeiras concepções de desenvolvimento
sustentável e os participantes saem das discussões com o objetivo de buscar conscientizar os
líderes mundiais da necessidade de tratar das condições humanas para o futuro. Dentre os
principais problemas identificados pelo Clube de Roma, pode-se destacar: a industrialização
acelerada, a escassez de alimentos, o elevado crescimento demográfico, o esgotamento dos
recursos não renováveis, a deterioração ambiental e por fim, a pressão popular sobre o meio
ambiente.
Como consequência dos trabalhos iniciados pelo Clube de Roma em 1972, ocorreu em
Estocolmo, a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano, que discutiu os
pontos elencados pelo Clube.
A Conferência foi resultado da percepção das nações ricas e industrializadas da degradação
ambiental causada pelo seu modelo de crescimento econômico e progressiva escassez de
recursos naturais. Nesse evento, alguns países chegaram a propor uma política de crescimento
zero, visando salvar o que não havia sido destruído. Todavia, o resultado final dessa política,
seria desastroso:os ricos continuariam sempre ricos e os pobres condenados a permanecer
sempre e irremediavelmente pobres. (MILARÉ, 2007, p.56)

375
Nessa conferência foi redigido o primeiro relatório significativo sobre os impactos ambientais
do desenvolvimento econômico. A pesquisa intitulada The Limits to Growth analisava
situações do contexto da época e relatava que seria possível conciliar o progresso econômico e
limites ecológicos, mas já citava o consumo desenfreado como um dos entraves à proteção
ambiental:
Existem recursos suficientes para permitir que o desenvolvimento econômico das 7 bilhões de
pessoas esperadas até o ano 2000 para um padrão razoavelmente alto de vida? Mais uma vez,
a resposta deve ser condicionada. Depende de como as principais sociedades que consomem
recursos lidarão com algumas decisões importantes pela frente. Elas podem continuar a
aumentar o consumo de recursos de acordo com o padrão atual. Elas podem aprender a
recuperar e reciclar materiais descartados. Elas poderiam desenvolver novos projetos para
aumentar a durabilidade dos produtos feitos a partir de recursos escassos. Elas podem
incentivar padrões sociais e econômicos que satisfaçam as necessidades de uma pessoa ao
mesmo tempo minimizando, ao invés de maximizar, as substâncias insubstituíveis que ele
possui e dispersa.198 (MEADOWS et al., 1972, p. 67/68)(tradução nossa).
É sugerido ainda que houvesse uma troca de liberdades em nome de um planeta sustentável,
como por exemplo a troca da liberdade pela escolha do número de filhos por um planeta sem
poluição:
Um estado de equilíbrio não seria livre de pressões; uma vez que nenhuma sociedade pode ser
livre de pressões. Equilíbrio exigiria uma negociação de certas liberdades humanas, tais como
a produção de um número ilimitado de crianças ou consumir quantidades descontroladas de
recursos, para outras liberdades, como o alívio da poluição, da aglomeração e da ameaça de
colapso do sistema mundial. É possível que novas liberdades possam também surgir -
educação, lazer para a criatividade e inventividade, e, mais importante de tudo, a liberdade da
fome e da pobreza apreciadas atualmente por uma pequena fração de pessoas do mundo.199
(MEADOWS et al., 1972, p.179/180)(tradução nossa).

198
Are there enough resources to allow the economic development of the 7 billion people expected by the year 2000
to a reasonably high standard of living? Once again the answer must be a conditional one. It depends on how the
major resource-consuming societies handle some important decisions ahead. They might continue to increase
resource consumption according to the present pattern. They might learn to reclaim and recycle discarded
materials. They might develop new designs to increase the durability of products made from scarce resources. They
might·encourage social and economic patterns that would satisfy the needs of a person while minimizing, rather
than maximizing, the irreplaceable substances he possesses and disperses.(MEADOWS et al., 1972, p.
67/68)(traduçãonossa).

199
An equilibrium state would not be free of pressures; since no society can be free of pressures. Equilibrium would
require trading certain human freedoms, such as producing unlimited numbers of children or consuming
uncontrolled amounts of resources, for other freedoms, such as relief from pollution and crowding and the threat of
collapse of the world system. It is possible that new freedoms might also arise-universal and unlimited education,
leisure for creativity and inventiveness, and, most important of all, the freedom from hunger and poverty enjoyed
by such a small fraction of the world's people today. (MEADOWS et al.,1972, p.179/180)

376
O documento conclui que é impossível ditar o passo a passo para o alcance de um estado
sustentável de equilíbrio global, mas a mudança do estado de crescimento constante para o de
equilíbrio deve ocorrer, pois o modelo de crescimento observado em 1972 já era considerado
insustentável segundo os critérios ambientais.
Edis Milaré (2007) explica que nesse cenário mundial, o Brasil, que vivenciava o auge do
regime militar, não adotou uma postura de proteção ambiental, ao contrário, pregava o
crescimento a qualquer custo, mesmo que tivesse desgastes ambientais irreversíveis. Esse
posicionamento apenas começou a ser alterado com a edição da Lei de Política Nacional do
Meio Ambiente, Lei nº 6.938/1981, que reconheceu o meio ambiente como bem jurídico
autônomo, o que foi posteriormente reafirmado pela Constituição da República de 1988.
Após a Conferência de Estocolmo, muitos países se organizaram para criar agências que
cuidassem das questões ambientais, buscando, inclusive, dados que balizassem a real situação
do planeta. Apesar do esforço de algumas nações, isso não foi suficiente sequer para coibir o
desgaste ambiental.
Pouco mais de uma década após a Conferência de Estocolmo, foi criada a Comissão Mundial
Sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (CMMAD). Esta objetivava propor metas e objetivos
através de uma agenda global de mudanças, tendo como principal desafio conciliar a
preservação ambiental com o desenvolvimento econômico, uma das faces do desenvolvimento
sustentável. O tema foi abordado principalmente em 1987, em um dos principais documentos
redigidos pela CMMAD, o Rel

necessidades do presente sem comprometer a possibilidade de as gerações futuras


satisfazerem as suas próprias necessidades.
Outra importante reunião realizada com projeção internacional foi a Conferência das Nações
Unidas sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento, também conhecida como RIO 92, que,
através da Agenda 21,adotou a preocupação com o desenvolvimento ambiental e o estabeleceu
como meta a ser buscada e respeitado por todos os países, preparando o mundo para os
desafios do Século XXI.
Sobre a relevância da Agenda 21, Edson Milaré destaca:
A agenda 21 resultou de relatório, experiência e posicionamentos anteriores das Nações Unidas
(tais são, por exemplo, o Relatório Dag Hamarskjold eo
Relatório Brundtland, conhecido como Nosso Futuro Comum), enriquecidos por documentos
e posições das ONGs do Meio Ambiente. Se, de um lado, é um texto de diretrizes, por vezes
normativo, de cunho otimista e com uma abrangência até então pouco vista em textos
congêneres, de outro lado ressente-se de generalidades o que não é de se estranhar em um
documento tão amplo e consensual, dirigido a todos os povos, governos e nações.

377
Nela são tratadas, em grandes grupos temáticos, questões relativas ao desenvolvimento
econômico-social e suas dimensões, à conservação e administração de recursos para o
desenvolvimento, ao papel dos grandes grupos sociais que atuam nesse processo. São
apontados, enfim, meios de implementação de planos, programas e projetos que visem ao
desenvolvimento sustentável, ressaltando-se sempre os aspectos ligados aos recursos naturais
e à qualidade ambiental. Aliás, pode-se dizer que a Agenda 21 é a Cartilha básica do
desenvolvimento sustentável. (MILARÉ, 2007, p.89/90)
Da mesma forma que as Conferências anteriores, a RIO 92 também demonstra quais são os
principais desafios e, mais uma vez, busca encontrar uma forma de gerenciar os recursos
naturais sem que haja prejuízo ao modelo econômico vigente.
Após a RIO 92, em 2002, ocorreu a Cúpula de Johannesburgo. Embora fosse uma excelente
oportunidade para avançar em termos de compromissos ambientais, em razão do lobby de
diversos setores industriais, principalmente o petrolífero norte-americano, esta não surtiu
efeitos significativos, tendo como um dos principais embates as mudanças climáticas ocorridas
pelo desequilíbrio ecossistêmico.
Nesse contexto, observa-se que o desenvolvimento sustentável já está inserido nas agendas
internacionais e é tema frequente nas pautas de discussão de todo o mundo. Porém, não
apenas a sua face ambiental deve ser considerada, como também as dimensões econômicas e
sociais.
Guilhermo Folodori (2002) critica o desenvolvimento sustentável, principalmente no que se
refere à sustentabilidade social, uma vez que entende que esta não é utilizada para fins
autênticos.
O grande desafio do desenvolvimento sustentável é conciliar as necessidades do mercado com
a proteção ambiental e ao mesmo tempo respeitar a proteção das relações de consumo,
propriedade, livre concorrência e os direitos das futuras gerações. A proteção do meio
ambiente deve ser lida como parte integrante do projeto do desenvolvimento, não podendo ser
considerada apenas de forma isolada, como se constasse apenas como um ponto por obrigação
social, devem existir atitudes que busquem o seu real implemento, mas esta conciliação é
justamente a grande dificuldade.
Na legislação brasileira pode-se dizer que o principal alicerce normativo na busca da proteção
ambiental surgiu com a Constituição da República de 1988. Os avanços obtidos pela
Constituição nesta matéria vão ao encontro das necessidades atuais frente ao eminente e
iminente colapso ambiental, sendo essencial conciliar o desenvolvimento econômico com a
proteção ambiental, uma vez que já se observa que esta preservação não é apenas uma opção.
Trata-se de questão vital para o futuro da humanidade. Esta conjugação de interesses é a base
do desenvolvimento sustentável.
A CR, apesar de não dispor a respeito do conceito de desenvolvimento sustentável, incorpora-
o em seu art. 225, ao elencar o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado como um
378
bem de uso comum do povo, sendo dever do poder público e da coletividade defendê-lo para as
presentes e futuras gerações.
Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum
do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o
dever de defendê-lo e preservá- lo para as presentes e futuras gerações.
§ 1º - Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público:
I - preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais e prover o manejo ecológico das
espécies e ecossistemas;
II - preservar a diversidade e a integridade do patrimônio genético do País e fiscalizar as
entidades dedicadas à pesquisa e manipulação de material genético;
III - definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus componentes a
serem especialmente protegidos, sendo a alteração e a supressão permitidas somente através
de lei, vedada qualquer utilização que comprometa a integridade dos atributos que justifiquem
sua proteção;
IV - exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de
significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará
publicidade;
V - controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos e substâncias
que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente;
VI - promover a educação ambiental em todos os níveis de ensino e a conscientização pública
para a preservação do meio ambiente;
VII - proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua
função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade.
(...) (BRASIL, 1988)(grifo nosso).
Ressalta-se que o artigo 170, VI, da Constituição da República eleva a condição de princípio a
defesa do meio ambiente, inclusive prevendo tratamento diferenciado conforme o impacto
ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração e prestação. Determina-
se, ainda, que todas as atividades econômicas no Brasil estão subordinadas às regras do direito
ambiental, almejando sempre a proteção do meio ambiente, fato que consolida a presença do
desenvolvimento sustentável no ordenamento jurídico brasileiro.
Outra importante consequência ocasionada por todos esses movimentos e conferências de
preocupação ambiental é justamente a criação da consciência ambiental. André Trigueiro
(2008) observa que até mesmo as escolas aderiram, em maior ou menor grau, alguns
ensinamentos sobre a temática, porém, ainda é necessário que seja trabalhado não apenas o
meio ambiente como valor, mas também o ato de consumo, a consciência do consumidor, para

379
que o indivíduo entenda como as suas atitudes individuais impactam no meio ambiente como
um todo.
Assim, a busca pelo desenvolvimento sustentável, ultrapassa a preservação ambiental e seu
aspecto social, uma vez que não há como desassociá-los das abordagens econômicas, que
influenciam de maneira incomensurável na interferência do homem no meio ambiente.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A necessidade de implementação de políticas que busquem a eficiência da proteção ambiental
é uma verdade indiscutível, mas a grande questão é encontrar a forma para a implementação
dessas políticas, pois constantemente entram em conflitos aspectos econômicos e ambientais,
sendo o primeiro na maioria das vezes vitorioso.
A proteção ambiental guarda relevante proximidade com a dimensão social, pois uma
realidade sustentável implica com que os cidadãos mantenham o mínimo necessário para o
exercício de uma vida digna, como por exemplo acesso à água potável, saúde, moradia digna
entre outros critérios. É possível conciliar que a utilização de recursos naturais e energéticos
não sejam prejudiciais aos outros enquanto beneficiam poucos.
Assim, para que haja a proteção da dignidade da pessoa humana e seus direitos sociais e
humanos sejam respeitados é salutar a mudança de paradigma global de exploração
econômica e a busca por um desenvolvimento sustentável que assegurará a sobrevivência da
espécie humana e a existência dos demais direitos de uma forma mais efetiva.
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381
DERECHO COLECTIVO AL CONOCIMIENTO TRADICIONAL DE COMUNIDADES
INDÍGENAS Y DE COMUNIDADES LOCALES: DIVISIÓN EQUITATIVA Y JUSTA DE
LOS BENEFICIOS
200

Resumen
El artículo 8 letra
derecho colectivo de comunidades indígenas y locales al conocimiento tradicional sino al
beneficio proveniente del mismo. Esta ponencia busca lograr definir ese derecho, su
proyección dentro del derecho internacional, su proyección dentro del derecho comparado de
Brasil, Unión Europea y Alemania e Inglaterra por medio del Protocolo de Nagoya, la
Regulación (EU) 511/2014 y leyes nacionales alemanas e inglesas. El título colectivo a derechos
no es desconocido en el Derecho internacional, ni Derechos humanos ni en la Teoría del
Derecho. El problema, sin embargo, radica en la determinación del sujeto y su carácter
internacional (Comunidades indígenas y locales) como un posible sujeto del Derecho
internacional o nacional. Asimismo, la definición del tipo de derechos a que nos enfrentamos,
tanto de las comunidades al Estado como de las comunidades a otros Estados merece un
análisis no sólo desde la perspectiva de los derechos difusos sino desde la perspectiva de los
derechos definidos por el Ordenamiento Jurídico internacional. A mayor abundamiento los

derechos de las comunidades sobre este tipo de conocimiento. Lo anterior permite observar
un nuevo tipo de derecho humano de posible carácter difuso en relación a sus titulares pero
perfectamente definido en su estructura.
Introducción
La Convención sobre Diversidad Biológica fue considerada como un primer tratado
internacional expresión del Derecho sostenible al reunir la conservación, uso sustentable y
utilización de la diversidad biológica y genética con los desarrollos biotecnológicos y su
transporte así como la protección del conocimiento sobre tales recursos biológicos y
genéticos201.

200
Profesor Asociado de Derecho internacional y Filosofía del Derecho en la Universidad Bernardo O´Higgins,
Escuela de Derecho. Doctor en Derecho, Universidad Internacional de Andalucía, DEA, UNIA, MA, U of
Amsterdam, Diploma, U of Heidelberg, Diploma Hague Academy of International Law. Miembro de la Línea de

La biodiversidad es fuente de las medicinas y drogas y esto es por milenios, Spice, John, Biodiversity, a begginer´s
201

guide, Oxford, Oneworld, 2006, p. 98.

382
respecto 202

de la conservación de la diversidad sino de la protección de los derechos del Ser humano, a


saber:
a.- Derecho a la protección jurídica del conocimiento tradicional
b.- Derecho a la protección jurídica a la división de los beneficios de dicho conocimiento
c.- Derecho a la protección jurídica a una división de los beneficios de dicho conocimiento que
en dicha división se efectúe la misma de manera justa y equitativa.203
Algunos creen, de manera desproporcionada en mi opinión, que las razones de la protección
del conocimiento tradicional se encontrarían en la sentencia Diamond v Chakrabarty.204
Desafortunadamente, eso no ocurre así. El fundamento mira no sólo al aporte a la
conservación de especies por los pueblos indígenas, comunidades indígenas y comunidades
locales (una versión diferente de generación de conocimiento que puede ser de origen no
indígena) sino a los derechos que acompaña la generación de ese conocimiento (como de
cualquier otro conocimiento).205 Si además auxilia a la preservación de estos recursos, a la
determinación de la forma de tratamiento o manejo de los mismos, concluye en una ventaja
para quienes creemos en la conservación. El conocimiento en sí no es gratuito porque además
de los tratos de confianza y del trabajo en red206

En primer lugar entes colectivos han sido reconocidos por el Derecho internacional desde

Justicia Internacional y la Corte Internacional de Justicia. Asimismo, el Estado, otro ente


colectivo no sólo es reconocido sino debidamente considerado uno de los sujetos de Derecho
internacional público. El Derecho internacional público reconoce en el citado artículo 8 letra

ente colectivo del cual no nos ocuparemos aquí.

202
Naciones Unidas, Convención sobre Diversidad Biológica, Nueva York, Secretaría de la Convención sobre
Diversidad Biológica, 1992, Preámbulo.
203

etencia
Curci,
Jonhatan, The protection of biodiversity and Traditional Knowledge in International Law of Intellectual Property
Rights, Cambridge, Cambridge University Press, 2010. Otros me han indicado que en Chile se ha alegado, más
cercano al problema, el derecho de autor, Millaleo, Salvador, Conversación en la Facultad de Derecho de la
Universidad de Chile, Santiago, 2017.
204
Curci Johnatan, op. cit., p. 4.
205
-
206
Orellana, Miguel, Educar es gobernar, Santiago de Chile, Orijkh Editores, p. 51 y pp. 91-111.

383
Es necesario señalar que en lo que se refiere a conservación los posteriores reconocimientos a
través de textos jurídicos internacionales o de propuestas internacionales jurídicas resultan
innecesarias. Basta con el reconocimiento indicado.
Respecto de los Derechos indígenas es posible indicar que cuatro han sido los que se han
planteado como propios de este ente colectivo, a saber, Derecho al territorio, derecho a la
cultura, derecho al etnodesarrollo y derecho a la libre determinación.207
Esto resulta complementado, como es lógico, por las normas jurídicas internacionales
reguladoras de los Derechos humanos, por su calidad de Seres humanos, así como otras
normas jurídicas en calidad de entes colectivos. La diferencia se encuentra en la titularidad y
en el ejercicio de dichos derechos, como individuos o como entes colectivos de una
determinada etnia. Esto no es menor, siempre resulta fundamental que se tenga clara la
adscripción hacia dicha protección jurídica.
La protección internacional y su proyección
La protección jurídica internacional a la equidad y justicia en la división de los beneficios o
ganancias del conocimiento tradicional se ha proyectado a ámbitos diferentes. En el Derecho
fundamento, no sin crítica, de un

internacional la decisión correspondiente del Pacto Andino ha desarrollado seminalmente esta


protección jurídica internacional
Desde la perspectiva de su protección jurídica internacional es posible, desde el ámbito
supranacional, referirse a las normas jurídicas europeas, principal aunque no exclusivamente
a la decisión 511/2014. Al día de hoy es la principal norma jurídica desarrollada como
consecuencia de la Convención sobre Diversidad Biológica y del Protocolo de Nagoya donde se
defiende este conocimiento. Esta forma de protección jurídica debe desarrollarse respecto de
las personas naturales de manera diferente según sea la aplicación, como veremos.
Desde el punto de vista nacional, a su vez, es posible indicar que existen países que han
desarrollado la Convención de Diversidad Biológica de la forma y manera que se indicarán. Así
es posible señalar a Alemania, Inglaterra, Francia y España, en Europa, así como la India y
Brasil en otros continentes. Sus situaciones son diferentes desde el punto de vista jurídico
internacional. De una parte empresas nacionales pertenecientes al Estado o privadas y
personas naturales o incluso entes públicos, son quienes deben respetar las obligaciones
internacionales así como otros son los que tienen derechos conferidos por la convención, el
protocolo e inclusive leyes nacionales a extranjeros, en su calidad de entes. Lamentablemente
en Chile, el proceso de generación de protección jurídica a los recursos genéticos y al
conocimiento tradicional ha llevado otros derroteros. Esto nos lleva a afirmar que la

207
Ariza Santamaría, Rosembert, Armonización entre Justicia Ordinaria y Justicia con

Konrad Adenauer Stiftung, Quito-La Paz, 2007, p. 18.

384
formulación de protección es inexistente por la vía legislativa interna dejando la misma en un
ico, una ausencia de regulación, con la excepción de la Convención sobre
Diversidad Biológica pero carente de aplicación jurisprudencial y la existencia de una serie de
sentencias que no aplican la misma por desconocimiento o lo que es peor aplicación
incorrecta de otras normas jurídicas. En muchos casos se sigue aplicando, sobre un bien
sometido a la soberanía del Estado de Chile (recursos genéticos de animales plantas y
microorganismos) o a la propiedad privada.
Es necesario acentuar el constante asalto a la normatividad y a las normas jurídicas que
autores consideran, probablemente de buena fe, que se desarrolla en materia de conocimiento
tradicional y de recursos genéticos. El que una norma jurídica nacional expresamente no
indique la obligación de dividir equitativamente los beneficios no significa que dicha
obligación jurídica y legal no se aplique en el ordenamiento jurídico nacional y se aplique el
derecho privado a través de contratos. 208 El ordenamiento jurídico nacional no contiene
compartimentos estancos y deberá efectuarse un análisis completo y probablemente complejo
de las normas jurídicas aplicables a un supuesto de hecho, la titularidad o la transferencia o el
uso sin autorización del conocimiento tradicional e inclusive, la incorporación en algún
registro público para proteger tal conocimiento pero por personas que no han contribuido a su
generación. Esta forma de conocimiento tiene diversas normas jurídicas aplicables. Esto es
una cuestión propia de cualquier ordenamiento jurídico en un Estado de Derecho.209
En cuanto a la regulación nacional en una breve exposición la ley de implementación bajo el
Protocolo de Nagoya y de transposición de la regulación 511/2014 de Alemania indica que
rso genético (secuencia genética
de animal, planta o microorganismo) de manera ilícita . Es decir, el conocimiento tradicional
210

es protegido externamente por el ordenamiento en la medida en que se relacione con el

especiales cuando se protege al recurso genético y luego el conocimiento tradicional

genéticos y una referencia al protocolo mencionado.


En Francia el tratamiento es inorgánico, cuestión extraña a un ordenamiento jurídico como el

208
Meyer, Hartmut, Key elements of ABS Frameworks: EU, France, Germany, Denmark, Addis Ababa, The ABS
capacity development initiative, 2015.
209
Raz, Joseph, Between authority and interpretation, Oxford, Oxford University Press, 2009, p. 209
210
Grabiensky, Katja, et al, The relevance of traditional knowledge to intellectual property law, AIPPI, Zurich,
2012.Federal Republic of Germany, Statement of the Federal Republic of Germany on Cultural Rights and
Intellectual Property,
http://www.ohchr.org/Documents/Issues/CulturalRights/ConsultationIntelectualproperty/Germany.pdf,
Bundesrepublik Deutschland, Gesetz zur Umsetzung der Verpflichtungen nach dem Nagoya Protokoll, zur
Durchführung der Verordnung (EU) Nr. 511/2014 und zur Änderung des Pantentgesetzes sowie zur Änderung des
Umweltauditsgesetzes, Berlin, 2015.

385
211
En
la sección t
de vista interno, es decir, la regulación jurídica nacional expresa y determinada (no sólo por
212
de la norma jurídica o
213

de investigación que implican conocimiento tradicional asociado a los recursos genéticos y el


desarrollo de un producto elaborado por medio de conocimiento tradicional. No explicaremos
los supuestos por no ser objeto del texto y normalmente se confunde, por ignorancia, con otros
temas como los organismos genéticamente modificados. Lo que llama poderosamente la
atención es la ausencia de tipificación y sanción a la utilización ilícita de dicho conocimiento
desde un Estado signatario del protocolo a otro, inclusive en la Unión Europea.

innovaciones y prácticas de las poblaciones locales ligados al patrimonio natural y la


biodiversidad, desarrollados desde la experiencia y adaptadas a la cultura y el medio ambiente
214
Asimismo, en un juego de
concorda
órgano competente podrá adoptar una de las siguientes medidas, prohibición de uso
(temporal), suspensión de actividades específicas de investigación y comercialización.215 A su

Estado proveedor puede significar la pérdida total o parcial del financiamiento de


investigación.216
En Inglaterra, a su vez, es posible encontrar dos leyes, una, aplicadora directa del protocolo217,
otra, de la regulación europea. Nos detendremos en la primera. Esta ley regula al conocimiento
218
y el de indígenas y comunidades

República Francesa, Loi no 2016 1087 pour la reconquéte de la biodiversite, de la nature et des paysages, Version
211

consolidée au 21 mai 2017, Paris, 2017, articulo 37, República Francesa, Code de l´environment, Paris, 2017, article L
412-3 y ss.
212
Kelsen, Hans, Teoría Pura del Derecho, UNAM, México, 1982, p. 316.
213
Peña, Sergio, Razonamiento jurídico, Olejnik, Córdoba, 2017 (en preparación).
España, Ley 42/2007, de 13 de diciembre, del Patrimonio Natural y
214

núm. 299, de 14 de diciembre de 2007, versión consolidada de 22 de septiembre de 2015, Madrid 2015.
215
España, Real Decreto 124/2017, de 24 de febrero, relativo al acceso a los recursos genéticos procedentes de taxones
silvestres y al control de la utilización, Madrid, BOE, 2017, art. 15.
216
Ibidem, art. 14.1.d, Hay que agregar que se sanciona, además, por la ley española 42/2007.
Reino Unido, The Nagoya Protocol (Compliance) Regulations 2015, 2015 No. 821 Environmental Protection,
217

London, 2015.
218
Ibidem, article 2 número 3.

386
locales.219 Esto genera tres opciones no contempladas originariamente en la Convención sobre
Diversidad Biológica aunque desarrollada en interpretaciones antojadizas posteriores, basta

desarrollado por medio de conocimiento tradicional debe cumplir cierto requisitos220 e


inclusive se le puede dar una noticia de detención en la venta de estos productos221 la cual
puede ser reclamada222
El caso chileno
En el caso chileno la única regulación es la Convención sobre Diversidad Biológica y los
recursos genéticos se tranzan por contratos. Existe alguna referencia a los derechos colectivos
a través de la jurisprudencia.
La referencia a la Convención sobre Diversidad Biológica y su obligatoriedad al Estado la
jurisprudencia la ha recogido aunque no la ha resaltado en toda su extensión, inclusive en la

la biodiversidad sino como justificación de otros aspectos poco importantes al problema


jurídico. En la especie, se destruyó un espacio indígena y su protección fue garantizada por
medio de alusiones a equidad intergeneracional, conocimiento medicinal indígena y
conocimiento tradicional, además de referencias a artículos y referencias inconducentes en el
razonamiento, bastaba con una referencia a los derechos garantizados por la constitución y las
normas jurídicas chilenas al respecto, en la especie, quizás, la Convención sobre Diversidad
Biológica, pero en la misma se habla de conservación de hábitats y no de lugares sagrados. La
referencia al conocimiento tradicional puede ser importante para entender que existe
reconocimiento jurídico a los derechos indígenas, como el de al conocimiento tradicional y la
división equitativa de las ganancias provenientes de dicho conocimiento, sin embargo, es
inconducente fundamentar un lugar sagrado en el conocimiento tradicional. Sin embargo, es
interesante reproducir la sentencia:

de medio ambiente en una forma más extensa de la que originalmente se consideró. En este
sentido, esta Corte asume que el derecho a vivir en un medio ambiente libre de contaminación
debe considerarse en forma amplia, como lo ha expuesto entre otros de manera más precisa el
profesor Humberto Nogueira y no sólo por los fundamentos dados por dicho autor, sino
porque el fenómeno social denominado Derecho, es una creación realizada por el hombre y
para el hombre. Para que sea un instrumento para alcanzar objetivos que permitan crear las

219
Ibidem, article 2 número 4.
220

221

222

387
condiciones de desarrollo material y espiritual más altas posibles, en definitiva obtener el bien
común y una mejor calidad de vida. Si no hay un medio ambiente adecuado para vivir, resulta
ilusorio que el hombre sea digno en libertad e igualdad y pueda disfrutar el pleno goce y
ejercicio de sus derechos. Además, debe ser considerado en forma amplia y holística, por los
deberes que impone el artículo 19 N° 8 al Estado. Esto es velar para que no sea afectado y
tutelar la preservación de la naturaleza, puesto que al no tutelarla ni preservarla el medio
ambiente, sin duda, puede verse afectado vulnerando esta garantía. Si no se admite una
concepción amplia, no se divisa cómo el Estado puede cumplir sus deberes Constitucionales
indicados. En todo caso, no existe en el medio ambiente un grupo, o persona aislada, un
elemento vivo o inerte que no esté relacionado con su entorno. El medio ambiente
parafraseando al Biólogo Humberto Maturana (quien se refería al Lenguaje) es el todo.
SEXTO: Que en la perspectiva anterior y en una revisión de la legislación internacional sobre
el medio ambiente, podemos indicar que el Estado de Chile ha suscrito más de 20 tratados
internacionales que cita el profesor Nogueira en la obra anteriormente indicada, que
naturalmente permiten precisar el derecho en cuestión. A su vez existen otros acuerdos
internacionales, como es, la Declaración de la Conferencia de Naciones Unidas sobre el medio
ambiente o declaración de Estocolmo de 1972. En su considerando tercero señala que la
capacidad del hombre para transformar todo lo que le rodea, debe ser usada con
discernimiento a fin de llevar a todos los pueblos los beneficios del desarrollo y ofrecerles la
oportunidad de ennoblecer su existencia. Aplicado errónea e imprudentemente, puede causar
daños incalculables al ser humano y su medio. En la declaración final expone que el hombre
tiene derecho a la libertad y a la igualdad y al disfrute de las condiciones de vida adecuadas en
un medio de calidad que le permita llevar una vida digna y gozar de bienestar y, además, tiene
la solemne obligación de proteger y mejorar el medio para generaciones presentes y futuras.
Por su lado, esta declaración fue confirmada por la de Río de Janeiro de 1992 y proclama entre
otros principios que los seres humanos constituyen el centro de las preocupaciones
relacionadas con el desarrollo sostenible; tienen derecho a vida saludable y productiva en
armonía con la naturaleza; el derecho al desarrollo debe ejercerse en forma tal que responda
equitativamente a las necesidades de desarrollo y ambientales de la generaciones presentes y
futuras. En esta misma línea el Convenio sobre la Diversidad Biológica publicado en el diario
oficial 6 de mayo de 1995, en su preámbulo, indica que las partes contratantes están
conscientes del valor intrínseco de la diversidad biológica y de los valores ecológicos,
genéticos, sociales, económicos, científicos, educativos, culturales, recreativos y estéticos de la
diversidad biológica y sus componentes. Conscientes asimismo de la importancia de la
diversidad biológica para la evolución y para el mantenimiento de los sistemas necesarios para
la vida de la biosfera, afirmando que la conservación de la diversidad biológica es de interés
común de toda la Humanidad. Igualmente observan que es vital prever, prevenir y atacar en su
fuente las causas de reducción o pérdida de la diversidad biológica. Del mismo modo, se
reconoce la estrecha y tradicional dependencia de muchas comunidades locales y poblaciones
indígenas que tienen sistemas de vida tradicionales basados en los recursos biológicos. En el

388
artículo 2, indica que la Diversidad biológica es la variabilidad de organismos vivos de
cualquier fuente, incluidos, entre otras cosas, los ecosistemas terrestres y marinos y otros
ecosistemas acuáticos y los complejos ecológicos de los que forman parte; Por ecosistema se
entiende un complejo dinámico de comunidades vegetales, animales y de microorganismos y
su medio no viviente que interactúan como una unidad funcional. Por Hábitat, es el lugar o
tipo de ambiente en el que existen naturalmente un organismo o población. En el artículo 8
dentro de las obligaciones de cada Estado, se indica: letra a) Se establecerá un sistema de áreas
protegidas o áreas donde haya que tomar medidas especiales para conservar la diversidad
biológica; letra d) Promoverá la protección de ecosistemas y hábitats naturales y el
mantenimiento de poblaciones viables de especies en entornos naturales; letra e) Promoverá
un desarrollo ambientalmente adecuado y sostenible en zonas adyacentes a áreas protegidas,
con miras a aumentar la protección de esas zonas; letra j) cada país con arreglo a su legislación
nacional, respetará, preservará y mantendrá los conocimientos, las innovaciones y las
prácticas de las comunidades indígenas y locales que entrañen estilos tradicionales de vida
pertinentes para la conservación y la utilización sostenible de la diversidad biológica y
promoverá su aplicación más amplia, con la aprobación y la participación de quienes posean
esos conocimientos, innovaciones y prácticas, y fomentará que los beneficios derivados de la
utilización de esos conocimientos, innovaciones y prácticas se compartan equitativamente.
Finalmente, la Resolución 61-295 de 2 de octubre de 2007 de la Asamblea General de Naciones
Unidas, que en su artículo 29 destaca el derecho a la conservación y protección del medio
ambiente. Asimismo, la Declaración sobre los Derechos de los Pueblos Indígenas, de la misma
Asamblea citada de 13 de septiembre de 2007, en cuanto los pueblos indígenas tienen derecho
a la conservación y protección del medio ambiente. De esta forma, de lo expuesto en el
concierto del Derecho Internacional, de manera consensuada y oficial existe acuerdo desde
1972 al menos, de la protección del medio ambiente en una concepción amplia. Y también es
un tema pacífico la promoción y fomento para dicha protección que deben asumir los Estados
y en especial con las comunidades indígenas.
SEPTIMO: Que en materia de legislación nacional en relación al tema en estudio podemos ver
lo siguiente: a) Ley de Bosques Decreto ley Nº 656 de 1925 (Decreto Supremo 4.363 de junio de
1931). En sus artículos 2 y 5 ya en esa época estipulaba y estipula normas para la protección de
los terrenos de aptitud preferentemente forestal y para los bosques naturales y artificiales y
prohibiciones para corta de árboles y arbustos. Todo lo que queda sujeto a los planes de
manejo aprobados por la Corporación Nacional Forestal. b) Decreto ley Nº 2.565 de 3 de abril
de 1979 que sustituye Decreto Ley 701 de 1974. En su artículo 1 señala que esta ley tiene por
objeto regular la actividad forestal en suelos de aptitud preferentemente forestal y en suelos
degradados e incentivar la forestación, en especial, por parte de los pequeños propietarios
forestales y aquella necesaria para la prevención de la
degradación, protección y recuperación de los suelos del territorio nacional. Y su reglamento
explica el plan de manejo a que debe sujetarse el bosque nativo. c) Ley 20.283 de 30 de julio de
2008 sobre recuperación del bosque nativo y fomento forestal. Artículo 1 dispone que esta ley

389
tiene como objetivo la protección, la recuperación y el mejoramiento de los bosques nativos,
con el fin de asegurar la sustentabilidad forestal y la política ambiental. En su título III
denominado de las normas de protección ambiental, artículo 15, expresa que la corta de
bosques nativos deberá ser realizada de acuerdo a las normas que se establecen en este título
sin perjuicio de aquellas establecidas en la ley 19.300, con los objetivos de resguardar la
calidad de las aguas, evitar deterioro de los suelos y la conservación de diversidad biológica.
d).-Ley 19.300 de 9 de marzo de 1994 sobre bases generales del medio ambiente. Destacar en
este respecto los siguientes artículos: 1. El derecho a vivir en un medio ambiente libre de
contaminación, la protección del medio ambiente, la preservación de la naturaleza y la
conservación del patrimonio ambiental se regulan por dicha ley, sin perjuicio de lo establecido
en otras normas legales. 2 letra a) Biodiversidad o diversidad biológica. La variabilidad de los
organismos vivos, que forman parte de todos los ecosistemas terrestres y acuáticos. Incluye la
diversidad dentro de una misma especie, entre especies y entre ecosistemas. Letra b)
Conservación del Patrimonio ambiental. El uso y aprovechamiento racional o la reparación, en
su caso, de los componentes del medio ambiente, especialmente aquellos propios del país, que
sean únicos, escasos o representativos con el objeto de asegurar su permanencia y su
capacidad de regeneración. Letra e) Daño ambiental. Toda pérdida, disminución, detrimento o
menoscabo significativo inferido al medio ambiente o a uno más de sus componentes. Letra g)
Desarrollo sustentable. El proceso de mejoramiento sostenido y equitativo de la calidad de
vida de las personas, fundado en medidas apropiadas de conservación y protección del medio
ambiente, de manera de no comprometer las expectativas de las generaciones futuras. Letra ll)
medio ambiente ya citada en el motivo cuarto por Humberto Nogueira. e) Ley 19.253 (ley
indígena) de 5 de octubre de 1993. En su artículo 1 explicita que el Estado reconoce que los
indígenas de Chile son los descendientes de las agrupaciones humanas que existen en el
territorio nacional desde tiempos precolombinos, que conservan manifestaciones étnicas y
culturales propias siendo para ellos la tierra el fundamento principal de su existencia y
cultura. Reconoce como Etnia a la Mapuche. En su inciso 3º, agrega que es deber de la
sociedad en general y del Estado respetar, proteger y promover el desarrollo de los indígenas,
sus culturas, sus familias, adoptando las medidas adecuadas para tales fines y proteger las
tierras indígenas, velar por su adecuada explotación, por su equilibrio ecológico y propender a
su ampliación. Artículo 7. El Estado reconoce el derecho de los indígenas a mantener y
desarrollar sus propias manifestaciones culturales. El Estado tiene el deber de promover las
culturas indígenas, las que forman parte del patrimonio de la Nación chilena. Finalmente, el
artículo 28 del mismo cuerpo legal expresa que el reconocimiento, respeto y protección de las
culturas e idiomas indígenas contemplará la protección del patrimonio cultural e histórico
indígena. f).- Convenio 169 sobre Pueblos Indígenas y Tribales en Países Independientes,
adoptado el 27 de junio de 1989 por la Conferencia General de la Organización Internacional
del Trabajo, en su Septuagésima Sexta Reunión, promulgado por el Decreto Supremo Nº 236
de 14/10/2008 del Ministerio de Relaciones Exteriores, Publicado en el Diario Oficial de fecha
14 octubre 2008, que entra en vigencia en nuestra patria el 15 de Septiembre de 2009 sobre

390
Pueblos indígenas y Tribales en países independientes (de la organización internacional del
Trabajo). Así el artículo 4 Nº 1 dispone que se deberán adoptar las medidas especiales que se
precisen para salvaguardar las personas, las instituciones, los bienes, el trabajo, las culturas y
el medio ambiente de los pueblos interesados. Artículo 5. Deberá reconocerse y protegerse los
valores y prácticas sociales, culturales, religiosas y espirituales propias de dichos pueblos. En
el mismo sentido el artículo 8. Luego el artículo 13. Los gobiernos deberán respetar la
importancia especial que para las culturas y valores espirituales de los pueblos interesados
reviste su relación con las tierras o territorios, o con ambos, según los casos, que ocupan o
utilizan de alguna u otra manera y en particular. Nº 2. Que la utilización del término tierras
deberá incluir el concepto de territorios, lo que cubre la totalidad del hábitat de las regiones
que los pueblos interesados ocupan o utilizan de alguna u otra manera. g).- Se debe también
considerar el artículo 2 de la "Convención Internacional sobre la Eliminación de Todas las
Formas de Discriminación Racial ", promulgada en Chile por D.S. N° 747, de 26 de Octubre de
1971, publicada en el Diario Oficial el 12 de Noviembre de 1971, de acuerdo a la cual los Estados
Partes tomarán, cuando las circunstancias lo aconsejen, medidas especiales y concretas, en las
esferas social, económica, cultural y en otras esferas, para asegurar el adecuado
desenvolvimiento y protección de ciertos grupos raciales o de personas pertenecientes a estos
grupos, con el fin de garantizar en condiciones de igualdad el pleno disfrute por dichas
personas de los derechos humanos y de las libertades fundamentales. Esas medidas en ningún
caso podrán tener como consecuencia el mantenimiento de derechos desiguales o separados
para los diversos grupos raciales después de alcanzados los objetivos para los cuales se
tomaron. h).- El artículo 4 Nº 16 del Decreto Ley N° 2.763 de 1979, modificado por ley N° 19.937,
Ley Orgánica del Sector Salud, que establece que cabe al Ministerio de Salud el formular
políticas que permitan incorporar un enfoque de salud intercultural en los programas de salud
en aquellas comunas con alta concentración indígena. i).- El artículo 21 del Decreto N° 135 de
2004, del Ministerio de Salud, que contiene el Reglamento Orgánico del Ministerio de Salud
que establece que es función de éste formular políticas que permitan incorporar un enfoque de
salud intercultural en los programas de salud, permitiendo y favoreciendo la colaboración y
complementariedad entre la atención de salud que otorga el Sistema y la que provee la
medicina indígena, que permita a las personas, en aquellas comunas con alta concentración
indígena, obtener resolución integral y oportuna de sus necesidades de salud en su contexto
cultural. " j).- Con todo, esta exigencia estaba ya consagrada en la ley 19.253 y en el Convenio
sobre la Diversidad Biológica, y en la Convención Internacional sobre la Eliminación de Todas
las Formas de Discriminación Racial, por lo que la exigencia a todos los órganos del Estado,
entre los que obviamente se incluyen los entes jurisdiccionales, de dar protección contra la
violación de los derechos de las etnias originarias, es plenamente vigente en nuestra patria. l).-
Las Resolución Exenta Nº 261 del 28 de Abril del 2006 del MINSAL que aprueba la Norma
General Administrativa Nº 16 sobre Interculturalidad en Salud. Ella tiene rango obligatorio
para todo el Sector de Salud Pública, incluyendo a los Municipios, quienes de acuerdo al
Estatuto de Atención Primaria deben respetar las normas técnicas del MINSAL.

391
Particularmente importante son los fundamentos 5º y 6º de la normativa cuando señalan: a.-)
El Estado de Chile, de conformidad con las normas legales vigentes y tratados internacionales
promulgados como ley de la República, se encuentra en el deber de respetar, reconocer y
proteger los sistemas de salud de las culturas indígenas y b.-) El Ministerio de Salud en el
marco de los acuerdos adoptados en relación al Informe de la Comisión Verdad Histórica y
Nuevo Trato con los Pueblos Indígenas y de la Política de Nuevo Trato, asumió el compromiso
de efectuar el reconocimiento expreso de la validez de los sistemas de salud de los pueblos
indígenas de Chile. De lo expuesto en materia de legislación nacional, se desprende lo mismo
que en el derecho internacional una protección y conservación por parte del derecho del
medio ambiente y en el caso que nos ocupa, del respeto, protección cuidado y desarrollo de los
pueblos indígenas en todas sus manifestaciones, en especial, el respeto por su cultura, por el
desarrollo de su medicina ancestral, como se aprecia nítidamente en las normas del Ministerio
223

Luego agrega:
Roberto Contreras, citando a varios autores,
indica que los Sistemas de Salud no formales (Cultural, Etnomédico, Tradicional, Medicina
Antropológica, etc.) son "sistemas terapéuticos adaptados a ámbitos y contextos
socioculturales y geográficos concretos que responden a las necesidades de salud de los grupos
" (Alfonso Julio, Aparicio Mena). El mismo autor Contreras, indica que el Dr. Marcos Meeroff,
define que la medicina antropológica considera al enfermo en sus facetas somática, psíquica y
sociocultural, es decir, una medicina holística que considera los tres aspectos del proceso
mórbido; enfermedad, padecimiento y predicamento. Se indica que la respuesta sanitaria de
los Pueblos Indígenas a sus problemas de salud, debe ser abordada como un sistema, es que
podemos definir a estos, como un conjunto articulado de representaciones y conocimientos
con las que cada pueblo vive la salud, la enfermedad, la vida y la muerte de la persona, lo que
determina sus formas de prevenir y fortalecer los factores protectores y disminuir los
agresores para mantener el equilibrio, prolongar la vida y asegurar la trascendencia.
Finalmente, el mismo autor, indica que la UNESCO asimismo ha señalado que la medicina
tradicional indígena forma parte del patrimonio cultural intangib 224

Se reconoce la ausencia de relación con el problema jurídico expuesto por la recurrente. Sólo
sirve para fundamentar que:

jurisprudencia, derecho nacional e internacional, es nítido cómo se ha configurado conciencia


sobre la protección del medio ambiente y, además, se ha legislado en sostener una concepción

Linconao Huircapan, Francisca c/ Sociedad Palermo Ltda. - Corte de Apelaciones de Temuco - 16-sep-2009,
223

considerandos quinto a séptimo.


224
Ibidem, considerando octavo.

392
amplia del medio ambiente. Y especial atención deben tener los Estados en la protección y
pr 225

Este razonamiento puede ser de interés espacios marítimos de conservación o derivados de la


cultura pero carece de sentido la referencia al conocimiento, hay lugares sagrados que no

Conclusión
La protección del conocimiento tradicional parece insuficiente no sólo por la falta de
antecedentes sobre el tema mismo sino porque, aun más complejo, no se consideran los
derechos de manera expresa en las diversas normas jurídicas estudiadas aunque un examen
detenido puede llegar a concluir que hay una protección jurídica basada en la sanción sobre la
negación de tales derechos.
Si un sujeto extrajera un texto donde conste un experimento de alto valor, supongamos, la
generación de un nuevo programa de computación, que fuere para el uso comercial y lo
incluyera en un registro público a su nombre, procedería que se le persiguiera jurídicamente.
Este ejemplo es analógicamente igual a lo que se persigue y sanciona hoy día. Resulta crucial
desde el derecho y particularmente el derecho internacional producto de la Convención sobre
Diversidad Biológica y las obligaciones y derechos internacionales nacidos del artículo 8 letra

Derecho. Lo que resulta más complejo, algunas normas jurídicas nacionales protegen de
dicha protección no tiene
protección colectiva por el derecho ni en su esfera o ámbito estático, normas jurídicas, ni
esfera o ámbito dinámico, interpretación y aplicación. Al menos en Chile la relación de la
protección no se entronca al problema de los derechos colectivos, en la jurisprudencia, sino
como un elemento tangencial en la protección de lugares sagrados, que, como se indicó, carece
de dicha relación, es decir, lugar sagrado, derecho colectivo, conocimiento tradicional. Nadie
podría decir que en un lugar sagrado como la basílica de San Pedro, en Roma, los derechos
colectivos se relacionaran al conocimiento tradicional. Tal razonamiento, además de falaz, es
erróneo. Es posible mencionar el esfuerzo europeo como un ejemplo de cumplir con la
Convención sobre Diversidad Biológica y el Protocolo de Nagoya, sin embargo, queda la
necesidad de estudiar las diferencias con las mismas, las creaciones propias de cada regulación
jurídica nacional donde se entienden de manera diferente las diversas obligaciones allí
contenidas. No es un obviedad que es necesario efectuar mayor investigación sobre las
interpretaciones legislativas y administrativas nacionales además de las propias de la
jurisprudencia.
Bibliografía

225
Ibidem, considerando noveno.

393
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395
DIREITOS HUMANOS E POLÍTICAS SOCIAIS PÚBLICAS NA ÓTICA DO DOCENTE DO
CURSO DE GRADUAÇÃO EM DIREITO: UM ESTUDO DE CASO
226

227

INTRODUÇÃO
O presente artigo tem como problema de pesquisa a percepção dos docentes dos cursos de
graduação em Direito em relação às Políticas Sociais Públicas.
Investigou-se a percepção dos docentes dos cursos de graduação em Direito de duas
universidades da Região Metropolitana do Vale do Paraíba e Litoral Norte, em relação às
Políticas Sociais Públicas. Esses cursos, que são oferecidos em importante região do país,
apresentam tradição e qualidade, tendo formado várias gerações de profissionais da área
jurídica.
O desenvolvimento da pesquisa ensejou o conhecimento das experiências identificadas por
meio da análise documental e de entrevistas com os participantes pesquisados.
Cabe esclarecer que o artigo tem como pressuposto teórico a Teoria Social Crítica de Marx,
método importante para compreensão da realidade social, pois, a partir de um processo
crítico, visa captar o movimento histórico e suas inerentes contradições, desvelando a
realidade pela constante interação entre o todo e as partes que o compõem.
MÉTODO
Inicialmente, é importante destacar que a metodologia se traduz num processo investigativo
que busca atingir o conhecimento sobre o objeto ou participante da pesquisa. Assim, o método
científico é condição obrigatória para a existência e evolução da ciência.

Doutora, Mestre e Especialista em Direito pela PUC-SP e especialista em Gestão Universitária pelo Centro
226

Universitário Salesiano de São Paulo U. E. de Campinas


Professora nos cursos de graduação e pós-graduação (especialização e mestrado) do Centro Universitário Salesiano
de São Paulo U.E. de Lorena.
Professora do Damásio Educacional e da Faculdade de Direito Damásio de Jesus.
Advogada milenasellmann@hotmail.com
Mestre em Desenvolvimento Humano, Formação, Políticas e Práticas Sociais e especialista em Direito
227

Empresarial, Direito Penal Econômico e Europeu e em Formação de Professores para a Educação Superior Jurídica.
Professor do Curso de Graduação em Direito do UNISAL/Lorena.
Coordenador Adjunto do Programa de Pós-graduação em Direito Público com ênfase em Gestão Pública da
Universidade de Taubaté/SP.
Procurador do Município e Consultor Jurídico - psatavares@hotmail.com

396
O método é o caminho a ser percorrido pelo pesquisador, empregando as técnicas adequadas
para atingir os objetivos traçados. Assim, para alcançar os objetivos da pesquisa, a metodologia
adotada foi a da História Oral.
A História Oral permite ressaltar, não só a diferença, mas também a igualdade existente entre
os participantes. Com essa metodologia, apreendem-se diversas possibilidades de ser, viver,
conhecer, organizar e lutar, presentes na cultura de determinado povo. Nesta pesquisa, os
participantes escolhidos foram três professores de duas universidades da Região
Metropolitana do Vale do Paraíba e Litoral Norte, que lecionam as disciplinas de Direito
Constitucional, Direito Previdenciário e Direito Administrativo, uma vez que guardam relação
direta com a Política Social Pública.
Para a escolha dos Municípios, definiu-se como critério a representatividade econômica e
populacional, bem como a proximidade das cidades, o que facilitou o acesso pelo pesquisador,
já que estava próximo das realidades dos participantes, bem como o fato de os mesmos serem
graduados em Direito em tradicionais e reconhecidos cursos da região.
Os dados obtidos com as entrevistas foram analisados por meio da técnica da triangulação,
adequada para a interpretação qualitativa das narrativas orais. Tal técnica envolveu o seguinte
procedimento: num primeiro momento, os dados coletados durante as entrevistas, seguidos
pelo estabelecimento de um diálogo entre esse material e pesquisador, que aborda os temas
conexos e, ao final, a reflexão estabelecida pelo pesquisador.
O Projeto de Pesquisa foi submetido à Plataforma Brasil e, aprovado pelo Comitê de Ética em
Pesquisa da Universidade de Taubaté (UNITAU), sob o CEP/UNITAU nº. 744.001.
DESENVOLVIMENTO
Os participantes narram suas experiências sobre a docência em Direito e em que aspectos essa
formação favorece o conhecimento acerca das Políticas Sociais Públicas.
Cabe ressaltar que as visões apresentadas por eles explicitam uma forma de ver o mundo a
partir dos lugares que ocupam na sociedade, como juízes, procuradores, advogados e docentes.
Na maioria das vezes, senão na totalidade, as Políticas Sociais Públicas partem dessa posição
por eles ocupada, o que acaba resultando em programas e ações pensados de cima para baixo,
ou seja, a partir de uma visão burguesa, que não consegue apontar as necessidades e aspirações
daqueles que se encontram na base da pirâmide social (TAVARES, 2015).
Corroborando a afirmação acima, Raymundo Faoro (1973, apud CHAUI, 2001, p. 42), ensina
que, desde a colonização brasileira, a realidade é pensada e criada pelos mandatários, ou seja,

decretos, alvarás e ordens régias. A terra inculta e selvagem [...] recebe a forma do alto e de

Por outro lado, a cultura do patrimonialismo, ainda arraigada na sociedade brasileira, acaba
por interferir na compreensão acerca do direito e da cidadania, o que, talvez, dificulte que as
397
Políticas Sociais Públicas sejam concebidas a partir da visão de mundo, aspirações, demandas e
necessidades daqueles que realmente são seus destinatários.
Ora, a formulação das Políticas Sociais Públicas é marcada pela estrutura hierárquica do
espaço social brasileiro fortemente verticalizado em todos os seus aspectos, com relações
intersubjetivas entre um sujeito que manda e outro que obedece, o que fortalece a relação
mando-obediência. O outro, subordinado à política pensada por quem detém o poder, não é
reconhecido como sujeito de direitos. As relações entre os iguais se dão na base da
cumplicidade, enquanto as relações entre os desiguais fundam-se no clientelismo, no favor, na
tutela (CHAUI, 2001).
No Brasil, aliada a essa estrutura social hierarquizada, tem-se a política neoliberal
implementada desde os anos de 1990. Fundada na acumulação do capital, na desestruturação
da força de trabalho e na privatização do lucro, ela reforçou o sucateamento dos direitos
sociais e, consequentemente, das Políticas Sociais Públicas, bem como favoreceu os privilégios
da classe burguesa.
Nesse sentido, entendem-se Políticas Sociais Públicas e cidadania na perspectiva da
democracia participativa, do engajamento da população, por meio de organizações
representativas, fóruns, audiências públicas, iniciativa na propositura de projetos legislativos,
na formulação das políticas e no controle das ações em todos os níveis. Essa participação
popular é decisiva para a democratização da participação e dos direitos de cidadania.
Além disso, as narrativas comprovam que o discurso dos participantes não coaduna com a
realidade da docência no curso de graduação em Direito, uma vez que, apesar de perceberem o
significado e a importância das Políticas Sociais Públicas, eles não transcendem tais conceitos
a atitudes concretas. Assim, o discurso não se transforma necessariamente em ações, no que
tange o ensino das Políticas Sociais Públicas e práticas docentes (TAVARES, 2015).
E aí cabe uma questão: o que motiva o docente a aplicar o que sabe e o que deve ensinar? Para
responder a essa questão, entende-se que o primeiro passo seja a modificação na forma de
pensar. É preciso, antes de tudo, abandonar a visão de mundo individualista, positiva, que não
dialoga com o outro, que não percebe as contradições, e pensar coletivamente, percebendo as
diferenças e necessidades dos demais atores sociais.
Destarte, é imprescindível compreender as práticas de cada um desses profissionais no mundo
do Direito, considerando suas especificidades e o histórico de sua inserção na docência do
curso de graduação em Direito.
Compreensão acerca das Políticas Sociais Públicas
O participante 1, que narra suas considerações a respeito das Políticas Sociais Públicas, é
docente há nove anos e também atua como Advogado. Observou-se, na sua narrativa, resgate
de aspectos históricos para analisar a Política Social Pública no Brasil contemporâneo. Ele cita,
por exemplo, as influências das Revoluções Francesa e Americana como marcos importantes

398
nas lutas dos trabalhadores, bem como as conquistas jurídico-legais que trouxeram,
explicitando que esses dois movimentos revolucionários tomaram caminhos distintos.
Conforme Pereira (2009, p. 23), o marco histórico e institucional pelo qual se pode pensar a
Política Social Pública é o
mercado que, ao contrário do modelo liberal que o antecedeu, fortaleceu e expandiu o setor

Nesse sentido, as Políticas Sociais Públicas e o Welfare State seriam a mesma coisa, ou seja,
fenômenos equivalentes que buscavam uma ampla conquista de direitos, em contraposição
aos conflitos sociais decorrentes da industrialização.
Em contraposição a essa visão, autores como Ramesh Mishra (1991, apud PEREIRA, 2009, p.
26), entendem que o Welfare State, diferentemente das Políticas Sociais Públicas, tem uma
conotação histórica e normativa específica, derivada da dinâmica capitalista que surgiu, a
partir da Segunda Guerra Mundial, como um fenômeno do século XX. As Políticas Sociais
Públicas, por sua vez, nasceram no século XIX, para regular um tipo de relação entre o Estado
e a sociedade, antes inexistente, relação essa marcada por conflitos de interesses e conquistas
de classes. Dessa forma, as Políticas Sociais Públicas têm caráter e escopo genéricos, podendo
estar presentes em qualquer ação que abranja intervenção do Estado (PEREIRA, 2009).
Apresentando diferentes versões analíticas acerca da origem do próprio Welfare State, a
mesma autora (2009, p. 29) analisa, por exemplo, a influência de Thomas Henry Marshall228
(1963), segundo o qual o Welfare State nasceu de um longo processo que se iniciou no último
quarto do século XIX. Esse processo encarnou a excepcional experiência britânica de
Seguridade Social em plena Segunda Guerra Mundial, constituindo-se, portanto, juntamente
com as Políticas Sociais Públicas, num fenômeno exclusivamente britânico.
A autora também analisa outros pensadores, como Derek Fraser (1984), Peter Flora e Arnold
Heidenheimer (1987). Os dois últimos afirmam que as velhas Leis dos Pobres não constituíam
uma Política Social Pública de certa época, sob a ingerência de Estados absolutistas, mas o
prelúdio do Welfare State (PEREIRA, 2009). Segundo Pereira (2009, p. 26), para Flora e
Heidenheimer o crescimento do Welfare State constituiu uma resposta a dois fatos históricos,
quais sejam: a formação de Estados nacionais e sua transformação em democracias de massa
depois da Revolução Francesa e o desenvolvimento do capitalismo, que se converteu no modo
de produção dominante depois da Revolução Industrial.
Com posição contrária, Pereira (2009, p. 24-25) cita Wedderburn (1990), segundo o qual o
Welfare State é comum a todas as sociedades capitalistas, guardadas as suas peculiaridades em

228
Thomas Humprey Marshall (1893-1981), sociólogo britânico conhecido principalmente por seus ensaios, entre os
quais se destaca "Cidadania e Classe Social", publicado em 1950, a partir de uma conferência proferida no ano
anterior. O autor analisou o desenvolvimento da cidadania tomando como base os direitos civis, seguidos dos
direitos políticos e dos direitos sociais, nos séculos XVIII, XIX e XX, respectivamente. Introduziu o conceito de
direitos sociais, sustentando que a cidadania só é plena se dotada de todos os três tipos de direito, e essa condição
está ligada à classe social. Ver. Outhwaire; Bottomore (1996).

399
termos de tamanho, idade, cobertura, objetivos, resultados, direção política e impactos sociais.
Nesse sentido, em meio à polêmica suscitada pelos autores, a autora explica que o
desenvolvimento do capitalismo rumo à industrialização, o surgimento dos Estados Nacionais
e sua transformação em democracias de massa, depois da Revolução Francesa, são
considerados os fundamentos da aparição do Welfare State no século XIX (PEREIRA, 2009).
Assim, todos esses elementos serviram de base a um novo perfil de Estado e de Política Social
Pública, distinto do padrão autoritário e paternalista até então existente, resultando numa
nova lógica de exploração, a qual dividiu a sociedade em burguesia e proletariado.
Deve-se deixar claro que a Política Social Pública sempre lidará com interesses opostos, uma
vez que resulta da pressão simultânea de atores diferentes sobre o Estado.
Assim, a Política Social Pública, como ensina Pereira (2009), não leva invariavelmente à
melhoria das condições humanas, que requerem um contínuo controle da sociedade sobre os
atos e ações do governo e do capital, uma vez que este último tem privatizado cada vez mais as
Políticas Sociais Públicas.
Dessa forma, a coexistência dos modelos a que o participante 1 se refere, dando origem a uma
espécie de Welfare State, atrela-se, em muitos casos, a uma visão de que as Políticas Sociais
Públicas levarão ao bem-estar. Por que essa visão atrela origem das Políticas Sociais Públicas
ao nascimento do Welfare State é o que se precisa responder.
Com a crescente industrialização e a possibilidade de convergência entre progresso técnico,
democratização e bem-estar institucionalizado previsto em lei, o Welfare State tornou-se um
divisor de águas entre um sistema de proteção arcaico, pré-industrial e carente de riquezas, e
outro, moderno, industrial e próspero. Outro fator de influência para o Welfare State foi a
Revolução Francesa, de 1789, com as bandeiras de liberdade, igualdade e fraternidade, que
serviram de estratégia para a extensão dos direitos civis, políticos, econômicos, sociais e
culturais (PEREIRA, 2009).
Nesse passo, o avanço das forças produtivas, embalado pela industrialização e pelo aumento
do poder político dos trabalhadores, propiciou um conjunto de fatores econômicos, sociais,
culturais e políticos favoráveis a um novo conceito de proteção social. Avesso ao paternalismo,
esse novo conceito associava bem-estar à cidadania, o que foi visto como o início do Welfare
State (PEREIRA, 2009).
Conforme ensina Saes (2000), a compreensão de cidadania requer uma análise em duas
etapas. Primeiramente, é preciso esclarecer cidadania em geral, ou seja, na totalidade de seus
aspectos em uma sociedade capitalista. Em um segundo momento, é preciso esmiuçar a
cidadania política, um dos aspectos da cidadania na sociedade capitalista. Segundo o
mencionado autor, é de T. H. Marshall a definição corrente de cidadania, que consiste na
participação integral do cidadão na comunidade política. Para esse conceito o que interessa
são os diferentes modos pelos quais é possível, teoricamente, efetivar a participação dos
cidadãos na comunidade política. Prosseguindo a análise do conceito de Marshall, Saes (2000)
400
esclarece que, segundo aquele autor, o Estado reconhece a todos os indivíduos direitos e
deveres, classificando os direitos em: civis (aqueles que concretizam a liberdade individual,
como os direitos à livre movimentação e ao livre pensamento, à celebração de contratos e à
aquisição ou manutenção da propriedade, bem como o direito de acesso aos instrumentos
necessários à defesa de todos os direitos anteriores); políticos (aqueles que compõem, no seu
conjunto, a prerrogativa de participar do poder político, prerrogativa essa que envolve, tanto a
possibilidade de alguém se tornar membro do governo, quanto a possibilidade de alguém
escolher o governo); e, sociais (prerrogativa de acesso a um mínimo de bem-estar e segurança
materiais, o que pode ser interpretado como o acesso de todos os indivíduos ao nível mais
elementar de participação no padrão de civilização vigente).
Saes (2000), com base em Jean-
-se aos direitos civis, sem os quais a
relação entre o capital e o trabalho assalariado, formalizada como livre acordo de vontades
individuais, não pode se implantar, se reproduzir e se expandir. Já a segunda corresponde aos
direitos políticos e sociais. Essa evolução da cidadania resulta da eventual capacidade das lutas
populares de impor às classes dominantes um compromisso sobre novos direitos.
Assim, um novo conceito de cidadania civil consiste na corporificação dos direitos civis, como,
por exemplo, a liberdade de ir e vir, de adquirir ou dispor de seus bens, de celebrar todo e
qualquer tipo de contrato, entre outros. A corporificação significa, não apenas a previsão legal,
mas também a efetivação desses direitos pelos agentes do Estado. O exercício concreto desses
direitos civis pode ser aperfeiçoado, numa sociedade capitalista, por meio de assistência
judiciária aos pobres e da independência dos membros do Poder Judiciário diante das pressões
econômicas e políticas dos membros da classe capitalista (SAES, 2000).
Por fim, cabe esclarecer o conceito de cidadania política. Para isso, a seguinte questão se
impõe: o Estado capitalista democrático é capaz de efetivá-la? O primeiro obstáculo para isso é
a ausência de um concreto controle sobre os governantes, em que pese o voto direto, secreto,
periódico e universal. A inexistência desse controle efetivo pela maioria da sociedade explica o
descompromisso dos governantes em relação às promessas de campanha. Outro obstáculo que
se coloca é a redução do alcance político dos resultados do processo eleitoral, que tem o fim de
determinar a composição dos órgãos de representação política. Destarte, a cidadania política é
de difícil concretização numa sociedade capitalista, que evolui sempre na direção de uma
crescente concentração e centralização do capital. A efetivação da participação política da
maioria dos cidadãos implica a superação do modelo capitalista de sociedade (SAES, 2000).
O último fato essencial para a formação do Welfare State foi a constituição do Estado
Moderno, circunscrito territorialmente, com poder coercitivo e soberano perante indivíduos e
grupos sob sua jurisdição, e a outros Estados também soberanos. A prevalência do Estado
Moderno instituiu a quebra das práticas patrimonialistas, e os governos passaram a ser vistos e
a funcionar como autoridade pública, sofrendo vários tipos de pressões, como aquelas
relacionadas às Políticas Sociais Públicas como direito do cidadão e dever do Estado.
401
Como se viu até agora, é ponto quase consensual, a importância do século XIX para a formação
do Welfare State e de suas Políticas Sociais Públicas. A possibilidade de universalização dos
direitos de primeira dimensão (civis e políticos) e a proteção dos direitos de segunda dimensão
(econômicos, sociais e culturais) formaram a base para suposição de que, tanto o Welfare
State, como as Políticas Sociais Públicas, se originaram no século XIX.
A questão que se coloca como essencial é definir o limite de cidadania necessária para um país
capitalista ter/ser ou não um Estado de Bem-estar Social, visto que, se adotado o conceito de
cidadania plena, há que se admitir que não houve, nos séculos XIX e XX, nenhum Estado de
Bem-estar Social. Então, quais elementos fazem um Estado capitalista ser de bem-estar?
A grande dificuldade em identificar os elementos que tornam um Estado capitalista em Estado
de Bem-estar Social está no fato de o Welfare State não ser uma instituição unívoca, já que as
prioridades políticas e os instrumentos utilizados pelos diversos países para prover bem-estar
aos cidadãos são extremamente variáveis (PEREIRA, 2009).
Alguns autores atribuem a origem do Welfare State aos planos bismarckianos de seguro social;
outros elegem sua origem à redução da jornada de trabalho conquistada pelos ingleses; há os
que atribuem seu surgimento ao New Deal (Nova Política), plano este aplicado para combater
os efeitos da Grande Depressão econômica nos Estados Unidos; e, por fim, os que visualizam
sua aparição com o modelo sueco, adotado também para combater a Crise de 1929, dirigido
por concepções socialdemocratas, sendo progressista do ponto de vista social.
Assim, Estados Unidos e Suécia apresentaram respostas distintas às questões econômicas e
sociais colocadas aos seus respectivos Welfare States, associadas aos dois principais grupos: o
capital e o trabalho (PEREIRA, 2009).
Nos Estados Unidos, o New Deal foi incapaz de responder às demandas e necessidades geradas
pela Grande Depressão, pois, ao não adotar uma série de medidas, acentuou a desigualdade
social e o parco bem-estar social dos menos favorecidos economicamente. A Suécia, por sua
vez, na década de 1930 promoveu uma expressiva mudança social e política.
Tudo isso deixa claras as diferenças entre as Políticas Sociais Públicas e o Welfare State que,
apesar de terem se comunicado num momento específico da história (1945-1975), não são a
mesma coisa.
No Brasil, houve uma aparente falta de sincronia com os processos internacionais. No
contexto internacional, particularmente após a Segunda Guerra Mundial, desencadeava-se a
reação burguesa, com a consolidação do chamado Estado Social e com a luta por melhores
condições de vida e por uma situação mais digna de trabalho. Aqui, sob o regime da ditadura
militar pós 1964, vivia-
Brasileiro. Nessa época, houve uma expansão da Política Social Pública brasileira, conduzida
de forma tecnocrática e conservadora, e pautada por uma relação de singular expansão dos
direitos econômicos, sociais e culturais, em meio à restrição dos direitos civis e políticos.

402
Com forte institucionalização da previdência, da saúde e da assistência social, a ditadura
também impulsionou uma política nacional de habitação balizada por uma estratégia
keynesiana de impulsionar a economia por meio do incremento da construção civil na
realização de moradias populares. Também desenvolveu fundos de indenização aos
trabalhadores, que constituíram uma espécie de poupança compulsória para o financiamento
da política habitacional.
Todavia, em 1974 começam a aparecer os primeiros indícios de esgotamento do projeto
tecnocrático e modernizador-conservador da ditadura, em razão dos impactos da economia
internacional. Os anos 1980, por sua vez, são conhecidos como uma década perdida
economicamente, em que pesem as vitórias democráticas em função das lutas sociais e da
promulgação da Constituição Federal de 1988.
Com a primeira disputa presidencial direta, em 1989, houve uma renovação das esperanças,
apesar de as propostas dos candidatos Lula e Collor, que chegaram ao segundo turno,
demonstrarem as tensões entre as classes sociais e segmentos de classe no decorrer dos anos
1980. Venceram as classes dominantes, com a vitória de Collor.
Nos anos 1990, o Brasil vivenciou um verdadeiro desmonte e destruição, numa espécie de
reformatação do Estado para adaptação passiva à lógica do capital. Por exemplo, a entrega de
grande parte do patrimônio público ao capital estrangeiro e a intensificação das privatizações
das empresas governamentais.
A reforma administrativa e previdenciária promovida com influências diretas do capital teve
insignificante impacto na capacidade de implementação eficiente de Políticas Sociais Públicas,
já que foi promovida uma tendência à desresponsabilização por essas políticas, acompanhada
do desprezo pelo padrão constitucional de seguridade social. A reforma previdenciária
realizada pela Emenda Constitucional nº. 20/1998 marcou o caminho inverso do registrado
pelo texto originário da Constituição Federal de 1988, que previa a ampliação e generalização a
um número maior de trabalhadores.
Nesse sentido, deve-se buscar um equilíbrio entre esses dois modelos, francês e americano,
estabelecendo uma espécie de Estado de Bem-estar Social que reuniria os aspectos positivos e
negativos de ambos os modelos. No Brasil (e aí é possível citar a reforma do Estado
implementada especialmente a partir dos anos 1990), existe uma completa submissão das
Políticas Sociais Públicas à orientação macroeconômica do ajuste fiscal, com uma redução do
custo do Estado em Políticas Sociais Públicas essenciais, ao passo que a crise fiscal foi
aprofundada, sustentada pelas altas taxas de juros, instalando-se um verdadeiro Estado
mínimo, aos mais necessitados, e um Estado máximo ao capital.
O participante 2, formado em Direito há 14 anos, Juiz Federal e professor de Direito há cinco
anos, ao abordar as Políticas Sociais Públicas restringiu-se aos aspectos previdenciário e de
saúde pública, que estão diretamente relacionados ao seu dia a dia na magistratura.

403
O ponto de partida na análise desta narrativa foi compreender a relação estabelecida entre
Estado e Saúde, uma vez que é em decorrência de questões relacionadas à saúde, na maioria
das vezes, que o cidadão recorre ao Instituto Nacional do Seguro Social INSS. Por isso,
percorre-se a trajetória do direito à saúde a partir do Estado Moderno até a conjuntura mais
recente e aos desafios que dessa perspectiva se colocam ao Brasil por meio do Sistema Único
de Saúde SUS.
É com o surgimento do Estado Moderno que a saúde passa a ser tratada como uma questão de
Estado, sendo uma das vertentes das Políticas Sociais Públicas.
Conforme Elias (2004), esse processo é caracterizado pela passagem, de uma lógica territorial
(fundada no feudo e nas relações sociais dele decorrentes), para uma lógica material (marcada
pela formação das categorias profissionais dissociadas do território), dominante a partir do
século XIX. A Política Social Pública transforma-se no sistema de intermediação entre o global
(todo) e o setorial (as categorias profissionais), figurando como um instrumento do Estado
para minorar os conflitos sociais gerados pelo confronto entre as duas lógicas.
Assim, as Políticas Sociais Públicas promovem a regulação entre Estado, economia e
sociedade. Por sua vez, os pressupostos teóricos do Estado, no tocante à área social, estão
focados na reprodução da força de trabalho, e a Política Social Pública atua como um regulador
das relações entre os trabalhadores e o capital, tendo as políticas de saúde, como as do SUS,
essa mesma natureza (ELIAS, 2004).
Dessa forma, a concepção da relação entre Estado e saúde no Estado Moderno reside na
regulação estatal da saúde para a nova ordem social e econômica emergente, focada na
reprodução da força de trabalho, expressando as contradições entre o global e o setorial.
No Brasil, a intervenção do Estado na saúde remonta ao período colonial, especificamente ao
início do século XIX, mas se sobressai a partir do período republicano. Nas intervenções
coletivas na área da saúde, destacam-se as sanitário-urbanas efetivadas no início do século XX
nas cidades dos principais portos brasileiros (Rio de Janeiro e Santos) e as campanhas de
erradicação da febre amarela, gerando uma insurgência da população que ficou conhecida
como a Revolta da Vacina (ELIAS, 2004).
Nas intervenções individuais à saúde, destaca-se a assistência médica, tendo como origem a
Lei Elói Chaves, de 1923, que fixou marcos regulatórios para as aposentadorias, pensões e
assistência médica. Essa Política Social Pública nasceu atrelada ao mundo do trabalho,
submetida à lógica setorial corporativa, mas não foi capaz de atender a todos os trabalhadores,
aplicando-se apenas aos dos setores ferroviários e portuários (ELIAS, 2004).
Dessa forma, a assistência médica previdenciária nasce já mercantilizada sob a forma de
seguro, condicionada a um desconto obrigatório. O ápice desse modelo focado na lógica
setorial tem seu apogeu nos anos 1930 e 1940, com a estruturação dos Institutos de
Aposentadorias e Pensões - IAPs, bem como com a extensão desse modelo aos servidores
públicos por meio dos sistemas fechados de previdências nas diversas esferas governamentais.
404
Como exemplos, temos o Instituto de Previdência e Assistência dos Servidores do Estado -
IPASE e o Instituto de Assistência Médica ao Servidor Público Estadual - IAMSPE (ELIAS,
2004). Com o encerramento do ciclo de industrialização nos anos 1980, ganha força a
consolidação do setor privado na saúde. Ademais, é nesse período histórico, do fim da ditadura
militar e de indefinição do modelo econômico do Estado, que se tem a previsão, na
Constituição Federal, de uma importante Política Social Pública de saúde: a noção de
seguridade social.
Promulgada a Constituição Federal de 1988, pela primeira vez houve uma seção específica
disciplinando o Direito à Saúde, verdadeiro direito fundamental do cidadão e essencial à
efetivação da dignidade da pessoa humana. Com esse importante marco, há um deslocamento
do conceito de seguro social vigente desde os anos 1920, para o de seguridade social,
semelhante ao ocorrido no Estado de Bem Estar Social. Nesse passo, exigiu-se do Estado uma
redefinição das Políticas Sociais Públicas, por exigir a desmercantilização da saúde, em
contraposição à tendência mundial da área da saúde, de se firmar como fonte de acumulação
de capital.
Por outro lado, a contrarreforma do Estado orquestrada pelo Consenso de Washington
resultou num violento desfinanciamento das Políticas Sociais Públicas, principalmente as de
saúde. No final da década de 1990, os postulados do neoliberalismo acabam por tornar turva a
linha divisória entre o Estado e o capital, com a implantação das chamadas parcerias público-
privadas, verdadeiras sociedades entre o Estado e o mercado. O resultado foi a promulgação de
diversas leis regulamentando tal desmantelamento, por exemplo, a Lei das Organizações
Sociais, das Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público e das Parcerias Público-
Privadas.
O SUS, uma Política Social Pública na área da saúde, já nasce completamente sitiado pelas
contrarreformas implementadas pelo Estado, acossado pela agenda neoliberal adotada, pelo
acolhimento da mercantilização da saúde, com a regulamentação do sistema privado de saúde,
pela ótica do cidadão à margem do SUS, pela adoção de parâmetros permeados pela noção de
custo/benefício e pela insuficiência de recursos financeiros para efetivar as disposições
constitucionais. Somam-se a isso os problemas tradicionais do Estado brasileiro, o
patrimonialismo, as desigualdades sociais, a ineficiência da máquina pública, entre outros.
Nas palavras de Elias (2004), o advento de uma consciência sanitária universal e cidadã é
essencial para o pleno desenvolvimento do SUS, fundado em bases sociais sólidas e não
imposto pelo Estado. Tal consciência também será imprescindível para o fortalecimento da
relação Estado/sociedade visando ao direito à saúde como universal. Superado o
desenvolvimento do direito à saúde no Brasil, passa-se a refletir se a atual conformação da
Seguridade Social brasileira permite direcioná-la à universalização. A legislação pertinente à

Nacional da Previdência Social CNPS, e considera,

405
também, o alcance do direito à previdência e à assistência social aos socialmente
desprotegidos.
Nesse contexto, a força de trabalho, na sociedade capitalista, adquiriu a condição de
mercadoria, e o capital, um apropriador, não do trabalhador, mas de sua força de trabalho,
visto que esta, em razão da oferta e da procura, é constantemente desvalorizada, forçando
parte dos trabalhadores a cair na miséria. Diferentemente de outras mercadorias, a força de
trabalho não pode ser cumulada, sendo o trabalhador obrigado a vendê-la diariamente, para
garantir à sua reprodução social. Está sujeito à vontade do capital em comprá-la ou não, o que
o deixa tão preso e vulnerável a apenas conseguir o mínimo para sua subsistência.
A mercantilização da força de trabalho e o risco de ficar desamparado na velhice, no
desemprego e na doença escancaram outra contradição do capital, já que essas consequências,
se levadas às últimas instâncias, gerariam, não só a destruição do trabalhador, mas também a
do próprio capital. Dessa forma, proteger a força de trabalho interessa, não só ao trabalhador,
mas também ao capital (CARIAGA; FREITAS, 2014).
Todavia, essa proteção deve restringir-se ao mínimo possível, já que não interessa ao capital
que o trabalhador encontre proteção total no Estado, uma vez que isso retiraria do capital a
liberdade de sujeitar os trabalhadores aos seus ditames. Em razão disso, forte é o ideal liberal
de que o indivíduo deve ser capaz de se manter pelo próprio trabalho, sem ajuda do Estado, já
que esse amparo poderia levá-lo ao ócio, à preguiça, desestimulando o trabalho. É importante
destacar que essa visão liberal pautou o pensamento político, econômico e social da Revolução
Francesa.
Seguridade Social, nas palavras de Boschetti (2001), não se confunde com o Welfare State,
sendo constituída pelos seguros, auxílios e assistência pautados por princípios contributivos e
não contributivos, que se impõem conforme maior ou menor incidência das forças
econômicas, sociais e culturais.
Com isso, as Políticas Sociais Públicas implementadas no fim do século XIX e consolidadas
com o Estado Social foram concebidas com a falsa ideia de que a seguridade social deveria ser
abolida ou garantida apenas àqueles incapazes de manter sua própria sobrevivência, já que
propagava o ócio, a preguiça e desestimulava o trabalho (BOSCHETTI, 2001).
Essas ideias influenciaram a seguridade social brasileira, uma vez que os direitos sociais não
são dádivas do Estado, mas direitos conquistados pelos trabalhadores.
No Brasil, a seguridade social fundou-se em dois modelos de Políticas Sociais Públicas: o
modelo bismarkiano e o modelo bevedidgiano (CARIAGA; FREITAS, 2014). A Constituição
Federal de 1988, ao estabelecer a seguridade social brasileira, consistente num conjunto
integrado de ações do Estado e da sociedade, pautada no tripé saúde, assistência social e
previdência, adotou, tanto os fundamentos da Lógica Contributiva da Seguridade Social (que
orienta os princípios da Previdência Social), quanto os da Lógica não Contributiva da
Previdência Social (que orienta os princípios da Saúde e da Assistência Social). Assim, é o peso
406
de cada uma dessas lógicas que determinará se o direito à seguridade social será universal ou
seletivo, pois, se ambas regerem tal direito concomitantemente, a proteção do trabalhador
estará, num primeiro momento, no mercado de trabalho, participando dele, seguido pela
família, tradicional forma de amparo, e, subsidiariamente, será suportado pela sociedade, por
meio da atuação estatal (CARIAGA; FREITAS, 2014).
Objetivando definir o alcance do direito à previdência social e à assistência social aos
indivíduos, o Conselho Nacional da Previdência Social, na Resolução nº. 1.241/2004, definiu a
metodologia de cálculo da cobertura previdenciária, adotando os conceitos de população
socialmente protegida e desprotegida. A relevância de tal conceituação reside na possibilidade
de mensuração da população socialmente protegida e desprotegida, o que indica a concepção
de seguridade social adotada no Brasil.
O Ministério da Previdência Social - MPS, por sua vez, utiliza como indicadores de cobertura
social o recebimento da Renda Mensal Vitalícia - RMV e o Benefício de Prestação Continuada
BPC. Aqueles que não estão abarcados pela cobertura da previdência social, ou que não
recebem o RMV ou BPC, são considerados socialmente desprotegidos (CARIAGA; FREITAS,
2014).
Assim, depreende-se, dos conceitos acima expostos, que no Brasil a concepção de seguridade
social relaciona-se, num primeiro aspecto, à renda. Num segundo aspecto, relaciona-se à
pecúnia, que deve ser temporária e possibilitadora da reprodução social do indivíduo. Num
terceiro aspecto, não se limita à prestação de serviços sociais e socioassistenciais (CARIAGA;
FREITAS, 2014).
Segundo estudo de Cariaga e Freitas (2014), a seguridade social no Brasil, com base nos
conceitos de socialmente protegidos e desprotegidos, não efetiva o princípio da universalidade,
já que 25,08 milhões de brasileiros ainda estão socialmente desprotegidos, o que corresponde a
29,3% do total da população ocupada. Essa desproteção reflete o tratamento dado pelo INSS
aos indivíduos.
Retomando os ensinamentos de Boschetti e Behring (2014), a seguridade social no Brasil foi
concebida a partir da ideia do pleno emprego, o que por si só inviabiliza sua universalização.
Em primeiro lugar, em razão do padrão de desenvolvimento do trabalho implementado; em
segundo lugar, em decorrência da precarização dos direitos trabalhistas e do padrão de
proteção social, em nítido benefício aos interesses do capital; e, em terceiro, devido à ausência
de sincronia da formação da proteção social brasileira com os demais processos
internacionais.
Ademais, a própria legislação da seguridade social e a sua forma de aplicação excluem os
socialmente desprotegidos, tornando impossível sua universalização. A universalização da
seguridade social requer a indissociabilidade e complementaridade entre a previdência, a
assistência social, políticas econômicas e sociais, e alterações na distribuição e redistribuição

407
da riqueza produzida, nas quais o trabalho e a garantia de reprodução social dos indivíduos
sejam considerados verdadeiros direitos de cidadania (CARIAGA; FREITAS, 2014).
Outro ponto que merece destaque é a crescente judicialização das Políticas Sociais Públicas,
diante do déficit de efetividade dos direitos fundamentais no Brasil e da crise do Estado Social.
Os direitos de segunda dimensão (econômicos, sociais e culturais) nascem como uma reação à
crise ética e de eficiência do liberalismo, devido ao vácuo da abstenção estatal perante os
cidadãos. Com o surgimento do Estado Social, os direitos sociais adquiriram status
constitucional e exigiram uma postura ativa do Estado, para sua realização. No entanto, o
Estado Social não tem conseguido efetivá-los, devido à falta de oferta de direitos sociais, o que
acarreta uma judicialização das Políticas Sociais Públicas. Estamos diante de um ativismo
judicial que impõe ao Poder Público a realização das Políticas Sociais Públicas.
O ponto de partida desse ativismo judicial deu-se com a ascensão do constitucionalismo social.
Dentre as diversas concepções, a maioria deles aborda o tema de acordo com as gerações de
direitos consagradas.
O constitucionalismo social nasce em contraposição às injustiças e desigualdades sociais
decorrentes da exploração dos indivíduos pelo capital, buscando a igualdade material com a
efetivação dos direitos econômicos, sociais e culturais que, por sua vez, garantem o pleno gozo
dos direitos civis e políticos. A partir desse momento, impõe-se ao Estado uma postura ativa na
realização igualitária de prestações sociais.
Ademais, a Constituição Federal de 1988 determinou os objetivos sociais a serem atingidos
pelo Estado por meio das normas programáticas, o que demonstra preocupação, desde a sua
gênese, com a efetiva capacidade de transformação da realidade social.
No entanto, apesar de se objetivar a transformação da realidade social, paira atualmente uma
crise de efetividade dos direitos econômicos, sociais e culturais, esbarrando: na falta de
concretização dos pressupostos materiais do Estado Social, como provisões financeiras
garantidas por sistema fiscal eficiente; na estrutura da despesa pública orientada para o
financiamento dos direitos e investimentos produtivos que os assegurem; no orçamento
público equilibrado; e, na taxa de crescimento do rendimento nacional de valor médio ou
elevado (FERNANDES, 2011).
A falta desses pressupostos do Estado Social, aliada à elevada demanda pela efetivação dos
direitos econômicos, sociais e culturais, origina um processo de judicialização das Políticas
Sociais Públicas, levando o Poder Judiciário a invadir a esfera de comando e decisão do Poder
Executivo. Embora esse ativismo judicial seja legítimo para garantir limites mínimos de
atuação do Poder Executivo, acaba por violar a separação entre os Poderes.
A crítica ao caráter programático das normas relativas aos direitos sociais comporta na
doutrina posições divergentes, umas favoráveis a uma aplicação diferida, após a concretização
dos direitos civis e políticos, e outras que conferem aplicabilidade imediata.

408
Esse ativismo judicial nas Políticas Sociais Públicas tem-se constituído num fator de tensão
institucional entre os Poderes Públicos, até porque o Poder Judiciário não é dotado de critérios
técnicos compatíveis com o controle judicial das Políticas Sociais Públicas.
Conforme ensina Fernandes (2011), existem alguns parâmetros para atuação do Poder
Judiciário na efetivação das Políticas Sociais Públicas. O primeiro deles é o político-
institucional, ou seja, a necessidade de estabelecimento de um diálogo entre o Poder Executivo
e o Poder Judiciário, a fim de que este conheça os reais limites daquele, bem como as
prioridades na gestão dos recursos públicos relacionados às Políticas Sociais Públicas. O
segundo parâmetro é o processual, relativo à utilização de processos coletivos e ao respeito da
competência de cada ente para fornecimento de determinada prestação social.
O terceiro e último parâmetro é o material, que prega a necessidade de o Poder Judiciário
observar a hipossuficiência das partes e as opções técnicas e políticas do Poder Executivo.
Diante do acima exposto, não se pode negar o déficit de efetividade na concretização dos
direitos econômicos, sociais e culturais no Brasil.
O último participante selecionado para este artigo é formado em Direito há 26 anos,
Procurador do Município e professor de Direito há 15 anos. Verificou-se o bom entendimento
do participante em relação às contradições das Políticas Sociais Públicas, o qual destacou que
essas contradições da sociedade capitalista, materializada na produção coletiva de riqueza e na
sua apropriação privada, estão na base da desigualdade social e do nascimento das Políticas
Sociais Públicas.
Oliveira (2008) ensina que as Políticas Sociais Públicas para o liberalismo objetivam a
correção dos efeitos maléficos advindos do crescimento do capital por meio da redistribuição
da riqueza e da redução das desigualdades sociais. Ocorre que elas são insuficientes para
melhorar a qualidade de vida dos trabalhadores, já que o Estado apenas implementa aquelas
que são aceitáveis para o capital.
Em razão das limitações do mercado em satisfazer as condições mínimas de uma existência
digna da classe trabalhadora, as Políticas Sociais Públicas foram surgindo como importante
instrumento para atendimento dessas necessidades. O New Deal, por exemplo, visava
reorganizar o aspecto econômico por meio da intervenção estatal na economia, controlando o
mercado financeiro, combatendo o desemprego e estimulando o aumento da produção e da
renda.
Todavia, as Políticas Sociais Públicas não nasceram apenas para minorar a degradação das
condições de vida dos trabalhadores, mas também como alternativa do próprio capital para
combater a crise do final dos anos 1920. Nas palavras de Oliveira (2008), o Welfare State foi
uma maneira que o Estado encontrou para impulsionar suas funções econômicas e sociais.
Nessa perspectiva abordada pelo participante 3 e corroborada pela autora supracitada, as
Políticas Sociais Públicas atendem, de um lado, às necessidades da classe trabalhadora e, de

409
outro lado, os interesses do capital, por meio de subsídios à produção, criação de setores
estatais produtivos, financiamento de pesquisas, entre outras ações.
Como asseverado por Oliveira (2008), o Welfare State foi um espaço de lutas de classes,

outro, do terreno indevassável de seus direitos, a partir dos quais se estruturam as relações
08, p. 111).
No final do século XX (1970), o Welfare State começa a não mais atender os interesses do
capital, ensejando o retorno de ideias liberais. Oliveira (2008) defende que o discurso de crise
do Welfare State atrela-se à diminuição do fundo público no financiamento do capital.
No caso brasileiro, não se verificou a presença do Welfare State, já que a proteção social, até o
advento da Constituição Federal de 1988, era prevista apenas em leis pontuais e destinada aos
trabalhadores inseridos formalmente no mercado de trabalho. Às pessoas que se encontravam
fora do mercado de trabalho restava apenas a assistência social, dotada de um viés
paternalista.
É importante lembrar que no Brasil os direitos sociais foram historicamente negados,
ocorrendo sua positivação apenas com a Constituição Federal de 1988. A relação social e
política conservadora presentes nas Políticas Sociais Públicas é inerente à própria cultura
política brasileira.
Nessa perspectiva, a sociedade brasileira é caracterizada por relações que privilegiam o favor,
o clientelismo, o paternalismo e a privatização do público, o que comprova a necessidade de
superação dessa cultura do patrimonialismo.
Outra visão acerca dessa questão reside nas características da sociedade brasileira apontadas
por
fundadas em contratos pessoais; profundas desigualdades sociais e econômicas; [...] uma

A característica das relações sociais hierárquicas demonstra a não observância dos princípios
da isonomia formal-jurídica e da isonomia material-social, uma vez que as relações são
baseadas entre superiores mandantes e inferiores obedientes, traços de uma sociedade
escravista, como a nossa (OLIVEIRA, 2008).
Por sua vez, a característica das relações sociais e políticas fundadas em contratos pessoais,
presente na formação da sociedade brasileira, demonstra como o capital, com todo seu poderio
econômico, alia-se ao Poder Público para realização de seus objetivos, por meio de relações
baseadas no favor, no clientelismo e na tutela, deixando para segundo plano os interesses dos
menos favorecidos.
A polarização entre carência e privilégio, por sua vez, tem como origem, além da concentração
de riqueza, a diminuição do Estado na tutela dos interesses sociais e um aumento da

410
direitos não se instituem e não há condições para a e
(OLIVEIRA, 2008, p. 124).
Por fim, a característica da indistinção do público e do privado remonta à colonização
brasileira, uma vez que, àquela época, a Coroa doava terras públicas aos particulares visando
benefícios pessoais, e não o bem público. Havia e ainda há uma verdadeira predominância dos
interesses privados em detrimento dos interesses públicos. Assim, apesar das contradições
inerentes às Políticas Sociais Públicas, bem como das características clientelistas e
distanciadas do interesse público, ainda presentes nas relações entre o Estado, o mercado e a
sociedade, é preciso caminhar para a conquista legal de direitos, refutando todas as condutas
tendentes a retardar a realização das conquistas histórico-legais previstas na Constituição
Federal de 1988.
Quanto à questão da universalidade das Políticas Sociais Públicas no contexto contemporâneo,
é necessário abordar a focalização que vem sendo dada ao tema. De que a desigualdade social é
um dos maiores dramas vivenciados pela população, não há dúvidas. No entanto, o que chama
atenção é o tratamento dispensado ao problema, que elege a pobreza como o único dado para a
atuação estatal nas Políticas Sociais Públicas. A desigualdade social é questão histórica no
Brasil, estando presente até mesmo nos momentos de grande expansão econômica, e está
relacionada, não apenas à pobreza, mas também ao mercado, à moeda, às normas jurídicas,
motivo pelo qual as Políticas Sociais Públicas não podem ser ancoradas unicamente na questão
da pobreza (DELGADO; THEODORO, 2003).
Se o objetivo é a eliminação e/ou redução da desigualdade social, é preciso que a atuação
estatal seja mais ampla, por meio de Políticas Sociais Públicas integrantes de um projeto
nacional que não foque apenas a questão da pobreza, mas todos os elementos relacionados à
efetivação dos direitos e garantias fundamentais estabelecidos pela Constituição Federal.
Conforme os ensinamentos de Delgado e Theodoro (2003), o foco apenas na questão da
pobreza expõe a fragilidade do argumento focalista, ou seja, a focalização permite alguns
questionamentos: se os recursos destinados às Políticas Sociais Públicas são suficientes; se
deve haver uma focalização na questão da pobreza; se as Políticas Sociais Públicas devem ser
restringidas a apenas uma análise técnica, afastando a questão política; e, se as Políticas Sociais
Públicas devem ser instrumentos subsidiários do Estado, sem interferir nas relações de
mercado, o qual deve ser livre.
O neoliberalismo adotado no início dos anos 1990, visando à redução de recursos públicos
investidos em Políticas Sociais Públicas e objetivando o uso desse dinheiro para o pagamento
dos juros da dívida pública e para socorros emergenciais aos grandes empresários, inseriu na
sociedade o discurso de que os recursos atuais são suficientes, bastando que sejam utilizados
de maneira focalizada e eficiente. Dessa forma, é imperioso reforçar a centralidade dos
programas universais e da manutenção e ampliação das Políticas Sociais Públicas, inclusive na
seara da saúde, da previdência, da assistência, do trabalho, entre outras. Impende destacar

411
que, a partir da Constituição Federal de 1988, às Políticas Sociais Públicas foi dado o atributo
da universalização, com o fim de extirpar a pobreza e de efetivar os direitos e garantias
fundamentais da população mais pobre. Nesse passo, a Política Social Pública requer um
aumento substancial de recursos públicos para que os direitos econômicos, sociais e culturais
sejam preservados, bem como estendidos à população ainda não contemplada, já que o
discurso fácil dos recursos suficientes e mal aplicados atende apenas aos interesses de um
Estado mínimo, em detrimento de um Estado Social de Direito (DELGADO; THEODORO,
2003).
A focalização dos programas sociais na pobreza traz como pressuposto a miséria como
condição de acesso aos direitos, uma vez que tais pessoas, incapazes de se inserirem no
mercado de trabalho, dependeriam exclusivamente do Estado para sobreviver. Nessa
perspectiva, em vez de agir como um instrumento de transformação social, combatendo as
desigualdades geradas e/ou aprofundadas pelo capitalismo, a Política Social Pública
funcionaria apenas como uma gestão da pobreza.
Outro ponto indicado pelos autores supracitados que deve ser combatido é a associação das
Políticas Sociais Públicas apenas como uma questão técnica, afastando-a do campo político.
Isso apenas realçaria o atual mecanismo distributivo, já que contraporia os grupos de pobres
desprotegidos aos grupos daqueles pouco menos pobres, excluindo mais pessoas ainda, da
proteção social. A exclusão de pessoas pouco protegidas em favorecimento aos totalmente
desprotegidos poderia levar os primeiros a integrar o grupo dos segundos, o que aprofundaria
a desigualdade social brasileira.
A visão neoliberal de que o Estado deve agir apenas de forma subsidiária, complementar ao
mercado, impede a universalização das Políticas Sociais Públicas. Isso porque o mercado não
deve ser imune à ação regulatória do Estado, seja no campo econômico, seja em relação às
Políticas Sociais Públicas, já que a ausência de mecanismos estatais de controle efetivos levam
à reprodução de distorções e iniquidades sociais, privilegiando o capital em detrimento da
população hipossuficiente (DELGADO; THEODORO, 2003).
Todos esses argumentos demonstram que a universalização das Políticas Sociais Públicas
requer uma perspectiva inclusiva, e não apenas uma focalização na questão da pobreza. Não se
despreza a importância das Políticas Sociais Públicas de transferência de renda para os
extremamente pobres, mas o objetivo central dessas políticas deve ser a redução e/ou extinção
das desigualdades sociais em seus diversos níveis, de forma a garantir a todos os cidadãos, sem
qualquer exclusão, a efetivação dos direitos econômicos, sociais e culturais, com a
consequente realização da dignidade da pessoa humana.
Para que o objetivo da universalização não se perca, é preciso pautar todas as ações relativas às
Políticas Sociais Públicas nas perspectivas universalistas e inclusivas estabelecidas na
Constituição Federal de 1988.

412
Destaque-se que as ideias neoliberais implementadas com as contrarreformas do Estado no
Brasil na década de 1990 não podem, por meio da redução de custos, comprometer o objetivo
constitucional de inclusão social. Uma Política Social Pública inclusiva e universal não se
restringe apenas ao aperfeiçoamento da eficiência administrativa, mas requer, principalmente,
um regime fiscal e tributário apto a arcar com os custos de uma política distributiva e de
desenvolvimento (DELGADO; THEODORO, 2003).
Destarte, a Política Social Pública não pode, exclusivamente, responsabilizar-se pela efetiva
diminuição da pobreza, já que isso envolve um novo arranjo social, com um projeto de país
distributivo, inclusivo e focado no desenvolvimento social, com um sistema tributário e fiscal
que proteja os mais necessitados, e não apenas os interesses do mercado. Deve-se objetivar a
implantação de um sistema de proteção social no qual as Políticas Sociais Públicas sejam
apenas mais um elemento para a construção de uma sociedade livre, justa, solidária e
equânime.
A narrativa do participante 3 da pesquisa explicita como as Políticas Sociais Públicas estão
afetas ao Estado Moderno e como o persistente estado de crise envolve o Estado, as Políticas
Sociais Públicas e a cidadania.
Para a superação das desigualdades sociais e do persistente estado de crise no Brasil, tanto a
democracia quanto os direitos de primeira e segunda dimensão são importantes
condicionantes para entender e propor alternativas.
Em que pese o capitalismo estar presente em todo o mundo, as consequências advindas de
suas crises dependem muito da ação estatal de cada país. Assim, o desafio social é o de
transformar a produção em um mecanismo de geração de riquezas para todos. Com esse
objetivo de transformação social, é preciso que a cidadania seja realizada na sua plenitude, e
não apenas fundada na teoria marhalliana, que é centrada somente na liberdade de mercado,
numa igualdade jurídico-formal, ficando a fraternidade relegada à retórica institucional. É
preciso que a cidadania seja entendida como resultado de um processo histórico-estrutural,
que seja comprometida com a superação das necessidades humanas, que seja exercida por
meio de atuação conjunta do Estado, da sociedade e do mercado, ampliando a democracia
representativa. A cidadania deve ter seu conteúdo associado aos direitos civis, políticos,
econômicos, sociais e culturais, objetivando a realização da dignidade da pessoa humana
(AMORIM, 2010).
A cidadania imposta pelo Estado Liberal resulta na fragmentação das identidades coletivas em
demandas individuais, refletindo numa intervenção social que não considera as condições
históricas e estruturais do cidadão. No Brasil, a intervenção social esvaziada e fragmentada se
dá no Terceiro Setor, resultando no enfraquecimento dos movimentos sociais e na expansão
dessas organizações (AMORIM, 2010).
Com a intervenção privada mais presente na vida pública, a cidadania e a democracia acabam
sendo limitadas pela apropriação privada da riqueza a um caráter formal de liberdade e

413
igualdade, uma vez que os cidadãos são empurrados pelo capital a uma crescente desigualdade
econômica, social e cultural.
A cidadania e a democracia não se efetivam apenas com o direito de voto, mas também com a
realização da igualdade material, verdadeiro pressuposto para os direitos civis e políticos. A
participação popular é decisiva no desenvolvimento de um capitalismo apto a realizar os
direitos sociais.
É preciso criar condições para que a democracia e a cidadania se concretizem, para possibilitar
a transformação social. É com a ampliação da participação social nas decisões nacionais que os
cidadãos terão sua liberdade ampliada, com garantia de efetivação de suas necessidades
básicas. É preciso que aja uma socialização, não apenas dos prejuízos, mas também da riqueza

efetiva, é necessário que tanto as necessidades sociais básicas sejam supridas, quanto à vida
(AMORIM, 2010, p. 99).
No Brasil, assim como nos demais países do mundo, uma avalanche conservadora vem
buscando soluções para conter a crise do capital por meio do esvaziamento da proteção social
e da apropriação do fundo público pelo mercado. Com a apropriação crescente do fundo
público pelo capital, os direitos sociais acabam não sendo materializados pelas Políticas Sociais
Públicas, o que agrava ainda mais o processo histórico de desigualdade social.
Para efetivar o esvaziamento da proteção social e a apropriação privada do fundo público, os
defensores dessa visão conservadora estabelecem dois principais mecanismos para superar o
estado de crise do capital: o superávit primário e a desvinculação das receitas do Estado. Essa
tensão entre os interesses do mercado e os objetivos das Políticas Sociais Públicas pode ser
demonstrada em quatro dimensões: a primeira refere-se à associação entre proteção social e
inserção social, já que o aumento do desemprego, a precarização da renda e a redução no
consumo das famílias levam a perdas na proteção social coletiva; a segunda é relativa ao valor
da força de trabalho, já que o aumento do desemprego leva a um achatamento dos salários, em
razão do excesso de mão de obra disponível; a terceira dimensão aborda a preferência estatal
pelas Políticas Sociais Públicas focalizadoras, em detrimento daquelas de caráter universal; e, a
quarta dimensão diz respeito aos mecanismos de desvinculação de receitas do Estado, que
passam a ser destinadas para finalidades diversas daquelas previstas na Constituição Federal
de 1988 (AMORIM, 2010).
Nesse sentido, o estabelecimento de uma cidadania e de uma democracia fundadas na
realização dos direitos constitucionais civis, políticos, econômicos, sociais, culturais e de
fraternidade, para superação do constante estado de crise do capital e das tensões dele
resultantes entre a sociedade e o Estado, requer que a concentração de riquezas e a
socialização dos prejuízos sejam combatidas, bem como o condicionamento das Políticas
Sociais Públicas aos interesses econômicos.
CONSIDERAÇÕES FINAIS

414
A construção de um debate teórico em torno da percepção dos docentes do curso de graduação
em Direito em relação às Políticas Sociais Públicas certamente contribuirá para esclarecer
quem são, o que pensam e o que querem para o futuro do país, emergindo a necessidade de se
discutirem os rumos dos cursos de graduação em Direito e sua capacidade de assegurar ao
futuro profissional uma postura reflexiva e visão crítica para a prestação da justiça e do
desenvolvimento da cidadania.
Conforme evidenciaram os resultados, no Brasil há uma completa submissão das Políticas
Sociais Públicas à orientação macroeconômica do ajuste fiscal, com redução do custo do
Estado nessas políticas essenciais, ao passo que a crise fiscal foi aprofundada, sustentada pelas
altas taxas de juros. Assim, instalou-se um verdadeiro Estado mínimo aos mais necessitados, e
um Estado máximo ao capital. Evidenciou-se, ainda, a visão liberal do Estado frente às Políticas
Sociais Públicas e sua importância na Constituição Federal de 1988, uma vez que no Brasil
esses direitos foram historicamente negados.
Impende destacar que não há como negar que a tutela e a efetivação dos Direitos Sociais são
condições para a existência da vida humana digna. Desde a garantia do exercício dos direitos
civis e políticos, assegurando um tratamento isonômico pelo Estado, passando pela satisfação
mínima das necessidades existenciais, abrangendo os direitos econômicos, sociais e culturais,
e protegendo as liberdades de pensamento, de expressão, de crença, dentre outras. Essas
situações relacionam-se intrinsecamente com um (ou mais) direito fundamental.
REFERÊNCIAS
AMORIM, A. A. O persistente estado de crise: nexos entre Estado, política social e cidadania
no Brasil. In: BEHRING, E. R.; BOSCHETTI, I.; MIOTO, R. C. T.; SANTOS, S. M. M. (Org.).
Capitalismo em crise: política social e direitos. São Paulo: Cortez, 2010, p. 86-105. 309p.
BEHRING, E. R. Brasil em contrarreforma: desestruturação do Estado e perda de direitos. 2 ed.
São Paulo: Cortez, 2013.
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416
EL ENFRENTAMIENTO A LA VIOLENCIA CONTRA LA MUJER COMO UNA FORMA
DE GARANTÍA DE LOS DERECHOS HUMANOS Y FUNDAMENTALES: UNA ANÁLISIS
DE LAS LEYES DE BRASIL Y DE ESPAÑA
229

INTRODUCCIÓN
La violencia contra las mujeres se constituye como una de las principales formas de violación
de los derechos humanos, según la Política Nacional de Enfrentamiento a la Violencia contra
las mujeres, y conforme está dispuesto en el art. 6 de la Ley 11.340 / 06. Lo que hace que la
discusión temática de gran relevancia tanto en el ámbito académico, como jurídico y social.
El presente trabajo se justifica por ser de fundamental importancia el continuo estudio y
reflexión jurídica y social acerca de la efectividad de los derechos humanos y la garantía de los
derechos fundamentales. En vista de que, incluso con el surgimiento de dispositivos legales,
tanto Brasil y España, siguen teniendo datos estadísticos preocupantes de acuerdo con las
recomendaciones del CEDAW para ambos países, especialmente en lo que se refiere a la
violencia contra la mujer.
La insistente ocurrencia de la violencia contra la mujer carece de continuo estudio, a fin de
garantizar el pleno desarrollo individual y social y su plena e igualitaria participación en todas
las esferas de la vida. El desarrollo no sólo de la mujer, sino de toda la comunidad que está
inserta, siendo indispensable en este proceso de desarrollo, la eliminación de cualquier forma
de violencia.
Sabiendo que, como quedó evidente en la Convención Interamericana de Belém do Pará para
prevenir, castigar y erradicar la violencia contra la mujer, el respeto irrestricto a los derechos
humanos se consagró en las declaraciones de Derechos Humanos, y que la violencia contra la
mujer corresponde a una de las mujeres Formas de violación de los derechos humanos y
libertades fundamentales, que limita total o parcialmente la observancia, goce y ejercicio de
tales derechos y libertades por las mujeres, y que esta violencia "constituye ofensa contra la
dignidad humana y es manifestación de las relaciones de poder históricamente desiguales
Entre mujeres y hombres ".
Es sabido que esta violación de derechos perpetrada a través de las diversas formas de
violencia contra la mujer, no es un problema de orden sólo nacional, ya que puede ser
verificada en diversos países del mundo. Lo que demuestra ser un problema de carácter
internacional, por lo tanto para obtener mejores resultados, se hace necesario su estudio de
forma comparada, a fin de identificar semejanzas en las formas de tratamiento de esa violencia
por parte de las naciones, y así, a través de los cuestionamientos planteados y la reflexión

229
Graduando em Direito na Faculdade Maurício de Nassau de Campina Grande, e pós-graduando em Direito Penal,
Processo Penal e Segurança Pública pela Faculdade Integrada de Patos Paraíba Brasil.
i_cunhalima@yahoo.com.br

417
sugerida, se puedan encontrar soluciones adecuadas a cada tipo de violencia,
independientemente de la nacionalidad. Resaltando que cada nación tiene sus peculiaridades,
sin embargo se pueden verificar similitudes y diferencias a partir de un estudio comparativo,
que podrán ser utilizadas y profundizadas posteriormente por otros países que no son el foco
principal de este estudio.
Sabiendo que en diversos países del mundo la práctica de la violencia contra la mujer, la
supresión y la anulación de sus derechos es una práctica común. Por ejemplo, muchas niñas
tienen que abandonar los estudios para casarse. Según la ONU, si no se hace nada, el número
de mujeres y niñas casadas durante la infancia podría llegar a mil millones en 2030. (ONU,
2016)
Más de 700 millones de mujeres en el mundo se casaron cuando aún eran niños, según Unicef.
La institución organizó en Londres una conferencia sobre la lucha contra los matrimonios
forzosos y la mutilación genital femenina, la conferencia, "Girl Summit 2014", organizada por el
primer ministro británico, David Cameron, y es la primera de este tipo, según el Fondo de las
Naciones Unidas Naciones Unidas para la Infancia, Unicef. Además del hecho de que en todo
el mundo, más de 130 millones de niñas sufrieron algún tipo de mutilación genital y cerca de
700 millones se vieron casadas cuando eran todavía muy jóvenes. (ONU, 2014)
A pesar de las peculiaridades observadas en el enfrentamiento a la violencia contra la mujer a
nivel nacional, se pueden observar algunas semejanzas existentes en las legislaciones de Brasil
y España, sobre todo en lo que se refiere a las leyes específicas para el enfrentamiento a la
violencia contra la mujer.
Además de la similitud entre las legislaciones española y brasileña, la importancia del estudio
comparado de sus dispositivos legales se evidencia por ser ambas leyes, referenciadas
mundialmente como dos de los mejores instrumentos del mundo de combate a la violencia
contra la mujer. Las citadas leyes, se estudiaron en sus aspectos más genéricos tales como
interpretación, aplicación, ejecución, y en lo que ambos países consideran más relevantes,
trayendo cuestiones de mayor discusión doctrinal y jurisprudencial sólo a modo de
ejemplificación, con el fin de abrir espacio para Una futura profundización.
En cambio, los países estudiados presentan datos estadísticos que contradicen la eficacia de
sus leyes, ofreciendo otros dispositivos legales en el intento de ofrecer una solución al
problema, como en el caso de Brasil, que recientemente promulgó la Ley nº 13.104, de 9 de
marzo de 2015 Que estableció el Feminicidio como circunstancia calificadora del crimen de
homicidio previsto en el artículo 121 del Código Penal de 1940, además de incluirlo en el rol de
los crímenes hediondos de la Ley nº 8.072, de 25 de julio de 1990.
A través de la investigación realizada que culminó en el presente trabajo, se verificó la
insistente permanencia en la ocurrencia de casos de violencia contra la mujer, especialmente
en Brasil, que se aleja alarmantemente de España en el ranking de países con mayores índices
de violencia contra la mujer, Mientras que España con tasa de homicidios contra las mujeres

418
de 0,5 por 100 mil habitantes ocupa la 60ª en el ranking de 83 países, y Brasil, que posee
legislaciones específicas similares a la española, ocupa una quinta posición, evidenciando que
los índices locales Superan en gran medida los encontrados en la mayoría de los países del
mundo con su tasa de 4,8 homicidios por 100 mil mujeres, en un grupo de 83 países con datos
homogéneos proporcionados por la Organización Mundial de la Salud.
Las semejanzas entre las legislaciones presentadas en el presente trabajo aliadas a las
discrepantes diferencias estadísticas, demuestran sobre todo la necesidad de un mayor aparato
dirigido al enfrentamiento a la violencia contra la mujer. El presente estudio buscó apuntar
posibles instrumentos que unidos a las legislaciones podrán componer de forma más incisiva
este todo ese aparato.
Resaltando que la discusión de la temática se vuelve indispensable cuando se busca el
desarrollo de un país. Dado que la violencia contra la mujer es una cuestión de salud pública
que interfiere directamente en el desarrollo socioeconómico del país, teniendo en cuenta que
la violencia contra la mujer compromete cerca del 1,8% del PIB con pérdida de productividad
en países como la Tailandia por ejemplo, es decir, el país pierde o deja de adquirir casi el dos
por ciento de su PIB por no invertir seriamente en el combate a la violencia contra la mujer.
Las legislaciones de forma aislada no consiguen producir el resultado esperado, pues el
problema de violencia contra la mujer desde su génesis tiene influencia en diversos ámbitos de
la sociedad. El tratamiento de la violencia contra la mujer no se limita a la ocurrencia de uno u
otro caso, pero la violencia tiene su origen en factores sociales relevantes. La violencia en sí
misma, es la que carece de mayor análisis, ya que las agresiones son meros reflejos de un
problema social de dimensión mucho mayor.
El presente estudio tuvo como objetivo principal levantar las discusiones sobre el tema, bajo
una óptica diferenciada, de forma comparada entre Brasil y España. Que teniendo como base
todo lo que fue construido a lo largo de los años con respecto a los derechos humanos y
fundamentales, que las naciones no pueden omitirse ante la percepción de la ocurrencia de
innumerables formas de violación de derechos considerados los mínimos para una vida con
dignidad.
El estudio resalta la diferenciación de los conceptos de derechos humanos y fundamentales,
enfatizando la importancia histórica de ambos instrumentos. Además de exponer de forma
sucinta los hitos históricos de los derechos de las mujeres, y cómo fueron concebidos.
1 ESTADÍSTICAS DE VIOLENCIA CONTRA LA MUJER EN BRASIL Y ESPAÑA
El Mapa de la Violencia contra la Mujer, 2015, que utilizó las bases de datos de mortalidad de la
OMS (Organización Mundial de la Salud) utilizando los últimos datos disponibles entre 2010 y
2013, muestra que la evolución de las tasas de homicidio de mujeres (por 100 mil) en Brasil
entre 2003 y 2013, hubo un significativo aumento de 3,9 en 2007, a 4,8 en 2013. Teniendo una
baja en 2007 (3, 9) año posterior a la creación de la ley 10.340, analizando de 2003 (4,4) a 2013
(4,8). (WAISELFISZ, 2015, p. 12)
419
Brasil ocupa un poco recomendable 5ª posición en el ranking que ordena a los países por la
tasa de muertes de mujeres por cada 100 mil habitantes, según el Mapa de la Violencia,
evidenciando que los índices locales exceden, en mucho, los encontrados en la mayoría de los
países del mundo, Con una tasa de 4,8 homicidios por 100 mil mujeres, en un grupo de 83
países con datos homogéneos, proporcionados por la Organización Mundial de la Salud. 48
veces más homicidios femeninos que el Reino Unido (75ª, 0,1); 24 veces más homicidios
femeninos que Irlanda (73, 0,2) o Dinamarca (72, 0,2); 16 veces más homicidios femeninos que
Japón (71ª, 0,3) o Escocia (68ª, 0,3), como se puede observar en el Gráfico 2 (ver anexos).
(WAISELFISZ, 2015)
España con tasa de homicidios de mujeres de 0,5 por 100 mil habitantes, ocupa la 60ª en el
ranking de los 83 países, donde Brasil, como mencionamos ocupa la quinta posición.
(WAISELFISZ, 2015) Considerando que ambos países tienen legislaciones específicas
similares, y que ambas legislaciones son consideradas dos de los mayores instrumentos de
combate a la violencia contra las mujeres del mundo, demuestra una discrepante diferencia
que puede haber sido evidenciada por diversos factores sociales.
En cuanto a la tasa de Brasil por 100 mil habitantes de homicidios de mujeres, llega a ser
superior las tasas de homicidios por arma de fuego en países considerados en constante
conflicto, tales como Jordania 1,4 (Homicidios por arma de fuego en el país En el caso de los
homicidios contra la mujer en el año 2010), Brasil (Homicidios contra mujeres en 2010) e
Israel 1,0 (Homicidios por arma de fuego en 2011), Brasil 4,6 (Homicidios contra mujeres en
2011), los datos suministrados alertan a una importante información: Hay más homicidios de
mujeres en Brasil, que el total de homicidios por arma de fuego en países en guerra, según
datos del World Health Organization Statistical Information System (WHOSIS), contenidos en
el Mapa de la Violencia 2016, como se expone en los Gráficos 1 y 2 (ver anexos). (WAISELFISZ,
2016)
En 2015, la violencia de género en España dejó 48 mujeres muertas y 42 niños y adolescentes
huérfanos, según Reyes Ricón, redactora del diario El País (RICÓN, 2015)
Como se verifica en los datos de la Consejería de Igualdad y Políticas Sociales, Dirección
General de Violencia de Género de Andalucía, en 2016 ese número bajó a 44 víctimas,
conforme fácilmente se verifica en la Tabla 1 (ver anexos). Siendo que de esas 44 víctimas en el
año 2016, 19 eran extranjeras y 25 españolas; El 50% de esas muertes ocurrieron durante la
relación afectiva y el 50% al término; 30 víctimas conviven con los agresores y 14 no tenía
convivencia, la edad de mayor riesgo corresponde a un rango de 31-50 años con 24 de las
víctimas confirmadas, de acuerdo con los datos del Ministerio de Sanidad, Servicios Sociales e
Igualdad. (ANDALUCIA, 2016)
Reyes Rincón, informó que en el año 2015 más de 123.725 mujeres denunciaron sufrir algún
tipo de violencia de género, resaltando que algunas, ya habían denunciado por más de una vez,
lo que elevaría el número de denuncias a 129.123, según Observatorio contra la Violencia
Doméstica y de Género del Consejo General del Poder Judicial (CGPJ).
420
Los datos confirman el discreto pero constante aumento en el número de denuncias por
violencia de género que ya se reflejaba en los últimos informes trimestrales del Observatorio.
En el saldo anual, las denuncias se han incrementado un 1,9% respecto a 2014, cuando la media
de denuncias diarias fue de 347. Los datos confirman también un aumento en el número de
condenas a maltratadores impuestas por los jueces y en el de órdenes de protección
concedidas. (RICÓN, 2016)
Los crecientes aumentos en las denuncias de las víctimas no representan un aumento en la
ocurrencia de ese tipo de violencia. Sin embargo, demuestra que las víctimas están
reaccionando positivamente en relación a las legislaciones de combate a la violencia contra la
mujer en España, que depende de las denuncias o intervención policial para responsabilizar a
los agresores. Como señala la presidenta del Observatorio contra la Violencia Doméstica y de
Género, Mª Ángeles Carmona:
El incremento de denuncias y de solicitudes de órdenes de protección evidencia que la mujer
víctima ya no se resigna al silencio de otras épocas y que decide poner los hechos en
conocimiento de las instituciones del Estado. El aumento también de las condenas a los
maltratadores, de las órdenes de protección otorgadas y, muy especialmente, de las medidas
civiles de protección a los menores, creo que habla bien a las claras de unas acertadas reformas
legales y de una mayor implicación y formación del personal judicial. (RICÓN apud
CARMONA, 2016)
En unas 129.000 denuncias, cerca del 70% eran mujeres españolas, el 68,8% de las denuncias
fueron realizadas por las propias víctimas, cerca del 15,5% de intervención directa de la policía,
el 2,4% de las denuncias por familiares y el 2% Servicios asistenciales. Al ver el gráfico 3 y 4 (ver
anexos), se pueden observar las tasas del número de víctimas por comunidades españolas.
Alrededor del 12% de las mujeres que llegan a los juicios, se sienten obligadas a utilizar el
derecho de "dispensa de obligación legal de declarar", por sentirse presionada por la familia o
el agresor, ya que en muchos casos el testimonio de la víctima es la única prueba del delito230,
los juicios no pueden seguir con las denuncias, y sin denuncia no se activa el mecanismo de
protección a las víctimas, en 2015, unas 15.321 víctimas utilizaron tal derecho, en el año 2014, el
14% de las víctimas en torno a 15.721. (RICON, 2016) Sin embargo, el art. 416. 1º LECrim, Ley de
enjuiciamiento criminal, y art. 24 de la Constitución española, prevé que se debe continuar la
denuncia incluso sin la aceptación / declaración de la víctima, mediante otras pruebas, para no
dar margen a la impunidad.

230
En España, el crimen y el delito son diferentes, en Brasil son sinónimos. En España, Delito se define como
cualquier acto intencional o negligente que está en contra de las disposiciones de la ley. Es una ofensa voluntaria o
involuntaria contra la otra parte, que se convierte en el "afectado". Un delito no es simplemente el plano moral;
Pero también jurídica. Sin embargo, la palabra crimen sólo se utiliza en casos en que el acto ilegal es más grave;
Como asesinato. Además, usando este término se da mayor énfasis es en el aspecto de la intención del acto criminal;
Es decir, se sugiere que actuó contrario a la ley con intención de cometer tal acto, de forma voluntaria y con la
intención de hacer mal, y no simplemente por descuido o accidente.

421
Cerca de 100 personas extranjeras de diferentes nacionalidades y españolas fueron
entrevistadas en la ciudad de Salamanca en España. La ciudad conocida por albergar jóvenes
estudiantes de diversos países del mundo fue el lugar elegido para realizar la mayor parte de la
investigación, teniendo en cuenta que la mayoría de las personas entrevistadas conocían y
citaban a otras ciudades en sus testimonios acerca de sus experiencias acerca de la violencia
contra la mujer.
Las entrevistas se realizaron con hombres y mujeres, que respondieron preguntas del tipo si
habían sufrido algún tipo de violencia, para las mujeres; O si habían tenido conocimiento o
presenciado la ocurrencia de casos de violencia contra la mujer, para los hombres, conforme
resultados expuestos en los Tabla 2 y en el Gráfico 5 (ver anexos).
De las 100 personas entrevistadas, 80 optar por el género femenino, sólo 20 optaron por el
género masculino. De las 80 mujeres consultadas el 35% afirmaron haber sufrido algún tipo de
violencia, apenas 10 describieron sus experiencias. El 35% informó de que no había sufrido
ningún tipo de violencia pero informaron de haber presenciado a otras mujeres siendo
víctimas, como se muestra en el gráfico 5.
En los relatos obtenidos, se observó que el tipo de violencia más frecuente fue el de
connotación sexual, asedios, persecución en la calle, etc.
Según las entrevistadas TI y JC, las personas en Salamanca no temían a asaltos, robos o hurtos,
los hombres caminaban libremente sin ningún temor, pero los residentes informaron que las
mujeres no deberían andar desatendida durante la noche, no por robos más a causa de los
incontables violaciones, El crimen de robo no es común en Salamanca, sin embargo, tantos
extranjeros y los habitantes aconsejaban a los nuevos visitantes, mientras que las mujeres no
salían por la noche solas porque las violaciones eran recurrentes.
Se consultó a 20 hombres, que eran en la mayoría de la nacionalidad brasileña, y poseían de 20
a 50 años. Siendo 02 estadounidenses y cuatro chinos. Sólo el 20% (04 brasileños),
respondieron positivamente la cuestión si presenciaron alguna mujer sufrir violencia durante
su permanencia en España. Ninguno de los entrevistados quiso describir cómo fue la violencia
presenciada.
De acuerdo con el Instituto Nacional de Estadística los números de violencia doméstica y de
género corroboran con los datos obtenidos a través de la investigación, consecuentemente con
las informaciones prestadas por los entrevistados. Como se verifica en la Tabla 3 (ver anexos),
y según el INE, que desarrolla dichas estadísticas de la siguiente forma:
La Estadística de violencia doméstica y violencia de género se obtiene a partir de la
explotación estadística del Registro central para la protección de las víctimas de la violencia
doméstica y de género. Esta estadística se realiza por el INE en virtud de un acuerdo de
colaboración suscrito con el Ministerio de Justicia, organismo titular de dicho Registro. Se
presenta por separado la información correspondiente a violencia de género y a violencia
doméstica. Los resultados se refieren a los asuntos (con medidas cautelares dictadas) inscritos
422
en el Registro durante el año de referencia. A partir de 2015 se publica también información
sobre las sentencias firmes dictadas en el año de referencia, que corresponden a asuntos que
fueron inscritos en el Registro de ese año o de años anteriores. La información se difunde a
nivel nacional y autonómico. Se ofrecen resultados sobre víctimas y personas denunciadas,
analizando sus características sociodemográficas, y también sobre infracciones penales
imputadas y medidas cautelares dictadas. (INE, 2015)
El relato de los profesores con respecto a la violencia contra la mujer, resalta la importancia
del estudio del tema dentro de las universidades, ya que dos mujeres de los seis profesores
entrevistados respondieron "sí" al cuestionario para la pregunta si ya habrían sido víctimas de
violencia dentro de las dependencias de la universidad que enseñan. En las descripciones de la
violencia sufrida, una de ellas respondió que había sido asediada algunas veces, incluso, por
parte de un alumno brasileño.
Se entrevistó a cuatro profesores y dos profesoras, mientras que el 33,3% afirmó haber sufrido
algún tipo de violencia, y el 16% afirmó que habían practicado violencia. Los hombres
entrevistados afirmaron nunca haber presenciado a ninguna mujer sufrir violencia durante su
estancia en España.
2 ASPECTOS CONSTITUCIONALES EN EL ENFRENTAMIENTO A LA VIOLENCIA CONTRA
LA MUJER EN BRASIL Y EN ESPAÑA
No se puede olvidar los períodos anteriores a las legislaciones, pues esos períodos de la historia
anteriores a la independencia de Brasil, en razón de su legado histórico, cultural y religioso
oriundo de la colonización brasileña, ejerció y aún ejerce gran influencia en la manera como la
sociedad se organizó y se organiza hasta nuestros días, por lo tanto, influenció en la forma en
que el país trata la cuestión de la mujer.
De inmediato, podemos concluir que la colonización de Portugal, como fue en el caso de Brasil,
tuvo discrepantes diferencias con respecto a la forma que colonizar de España. En
consecuencia, el país experimentó un período colonial que demostró poca preocupación con el
lado educativo en la colonia. Las instituciones educativas de nivel en Brasil eran pocas, las
primeras surgieron apenas en 1808, con la llegada de Don Juan VI.
Brasil experimentó el régimen esclavócrata durante siglos, en ese contexto la mujer esclava
sufría aún más atentados a su dignidad humana. "Las esclavas tenían como función primordial
en la sociedad los servicios domésticos, la lactancia de los hijos de las mujeres blancas y
satisfacer sexualmente a sus señores" (OLIVEIRA, 2011).
La Constitución otorgada de 1824 delimitó a quien tendría derecho a votar y de ser votado,
todos los hombres de 25 años o más que tuvieran ingresos mínimos de 100 mil-reyes, la
mayoría recibía ese valor. El voto era obligatorio. Las mujeres no votaban ni los esclavos,
naturalmente, porque ni siquiera eran considerados ciudadanos, pero los analfabetos podían
votar. (OLIVEIRA apud Carvalho, 2001). En 1881, la renta mínima pasó a 200 mil-réis y hubo la
prohibición del voto del analfabeto.

423
En la Constitución de 1891, no promovió avances significativos en relación a la mujer, ni para
efectivamente conceder la debida condición de ciudadanas con el derecho al sufragio. Sólo
eliminó las exigencias de ingreso mínimo, y mantuvo vedación expresa a los derechos políticos
de los analfabetos, mendigos, soldados y religiosos; La mujer ni siquiera fue citada en esa
Constitución acerca de cualesquiera derechos. El tamaño era el descaso con las mujeres,
"consideradas seres inferiores, o niños, que las Constituciones latinoamericanas del siglo XIX
ni siquiera prohibían el voto femenino, pues el título de ciudadano era solamente dado a los
hombres." (OLIVEIRA apud TELES, 2010)
Algunas constituciones no eran tan obvias en la prohibición del sufragio, que algunas mujeres
resolvieron pedir judicialmente el derecho al voto, ya que no había prohibición expresa. Las
peticiones fueron negadas, basándose en el entendimiento de que la palabra "ciudadanos" sólo
afectaba a los ciudadanos varones, y la respuesta del Estado fue promulgar constituciones que
expresamente prohibiesen a la mujer votar.
Si la mujer no era ni siquiera considerada ciudadana, ¿cómo podría ser sujeto de derechos y
merecedora de protección? Sobre la base de la idea que orbitaba en torno a la sociedad de la
época en que la mujer era mero objeto del hombre (padre o esposo), el deber de cuidado estaba
atado sólo a la protección que éste daba sus cosas. Protegía, cuando lo hacía, de terceros. Pero,
¿Cuando la violencia ocurría partiendo de aquellos que deberían proveer la protección y no de
los terceros?
Sólo en 1988, con la Constitución que traducía el anhelo exacerbado de libertad de la
población, después de 25 años de dictadura militar, en que varios derechos sociales fueron
relegados, que efectivamente puede observarse cambios legislativos dirigidos a la cuestión de
la mujer. En las constituciones anteriores, se obtuvieron avances en relación a los derechos
políticos y laborales. En 1934 y de 1937 las constituciones contenían expresa vedación de
diferencias salariales en razón de género. En la constitución de 1934, el voto femenino fue
insertado con ayuda de Carlota Pereira Queirós, siendo obligatorio sólo para aquellas que
ejercían función pública remunerada, en 1937, otorgada por el presidente Getúlio Vargas, trajo
los derechos políticos de las mujeres al voto, sin restricción. En 1962 se creó el Estatuto de la
Mujer casada, que concedió a la mujer, entre otros derechos, el importante trato igualitario
durante el matrimonio y después de él, pues la mujer no necesitaría más autorización del
marido para trabajar y recibir herencia, pudiendo requerir la custodia De los hijos en caso de
separación. (OLIVEIRA, 2011)
Sin embargo, sólo la Constitución de 88 trajo los importantes e incisivos dispositivos legales,
que traer más resultados, "Todos son iguales ante la ley", y "Hombre y mujer son iguales en
derechos y obligaciones, en los términos de la Constitución y" La ley castiga Cualquier
discriminación atentatoria de los derechos y libertades fundamentales "," los derechos y
deberes referentes a la sociedad conyugal son ejercidos igualmente por el hombre y la mujer".
Anteriormente, la isonomía no era tratada de forma realmente igualitaria, trataba sólo de la

424
igualdad de trato ante la ley, pero con relación a la cuestión femenina, eran considerados
precarios para su emancipación y no cohibían las diversas formas de discriminación.
La ley 11.340 de 2006, instituida con el fin de cohibir la violencia doméstica y familiar contra la
mujer, en sus disposiciones preliminares, artículo 1 de dicha ley evidencia, desde luego, su
fundamentación en el art. 226, §8º, "El Estado asegurará la asistencia a la familia en la persona
de cada uno de los que la integran, creando mecanismos para cohibir la violencia en el marco
de sus relaciones." El mencionado artículo, de la Constitución brasileña vigente de 1988. Que
así dispone: En la magna carta brasileña trae la previsión legal que apunta a la especial
protección de la familia, ya que es la base de la sociedad, como se expresa en el dispositivo
constitucional.
Así como en el art. 226, §4º, la Constitución afirma que se entiende como familia, también, la
comunidad formada por cualquiera de los padres y de sus descendientes, teniendo aplicación
práctica en la legislación 11.340 / 06, ya que la ley pretende cohibir la violencia doméstica y
familiar contra la mujer, esa violencia Puede ser practicada por cualquier miembro de la
comunidad familiar.
En ambos países, se discute ampliamente la constitucionalidad de las leyes de lucha contra la
violencia contra la mujer. Con respecto al trato igualitario a los hombres y mujeres ante la ley,
asegurado en la constitución brasileña de 1988, en el art. 5º, I, en el título II correspondiente a
los Derechos y Garantías Fundamentales, la ley en comento y todo el aparato estatal como las
políticas públicas y los mecanismos creados para cohibir la violencia contra la mujer,
dispuestos en la legislación infraconstitucional, apuntan a la búsqueda por esa igualdad
expresada en la constitución, sin embargo, no sólo la igualdad formal, sino también la igualdad
material, la igualdad que existe en el plano concreto y no sólo en los dispositivos
constitucionales como en el caso de la igualdad formal.
La ley busca esencialmente obtener esa igualdad prevista en la constitución como un derecho
fundamental, sin embargo nuestra sociedad aún no posee esa igualdad de derechos para
hombres y mujeres efectivamente, y aún está lejos de poseer, con base en los datos estadísticos
de violencia contra la mujer, Además de la proliferación de discursos que apuntan a la
supresión de derechos para legitimar esa violencia, además de barrer las formas de cohibición,
basados en argumentos frágiles de que los hombres y mujeres constitucionalmente deben
tener trato igualitario ante la ley, y que la 11.340 / 06 ponga El hombre en situación de supuesta
desigualdad. Pero esto se evidencia por el hecho de que la mayoría de los casos de violencia
contra la mujer en el ámbito doméstico y familiar es por agresores varones. A pesar de que la
ley claramente protege a la mujer, de cualquiera que sea la violencia en la esfera familiar,
abriendo espacio para otros miembros del grupo familiar, incluso para los casos de los más
diferentes arreglos familiares e independiente de orientación sexual.
La igualdad formal está plenamente adquirida, por ambas naciones, como se ha descrito
anteriormente. Sin embargo, la igualdad material sigue siendo utópica. Pues, según afirma

425
Patricia Cuenca Gómez, en la práctica las mujeres encuentran muchas dificultades que les
impiden gozar efectivamente y definitivamente condiciones de igualdad de los derechos
formales consagrados y fundamentados en las constituciones, esto porque la realidad social
históricamente soportada viene colocando a la mujer en situación de desventaja, que se
traduce en una menor participación de la mujer en cuestiones políticas, en el poder, y por lo
tanto en posiciones de toma de decisiones. (GÓMEZ, 2008)
Como se puede fácilmente comprobar los ejemplos comparativos en la Tabla 4 (ver anexos), la
constitución española vigente, así como la brasileña, poseen diversos derechos fundamentales
que confiere la igualdad formal en el trato legal a las mujeres.
Por ejemplo, el artículo 14 de la Constitución de España de 1978, que reconoce el principio de
igualdad ante la ley a hombres y mujeres, sólo por ser ciudadanos del país, "Los españoles son
iguales ante la ley, sin que el gobierno prevalezca alguna fracción Por razón de nacimiento,
raza, sexo, religión, opinión o cualquier otra persona la circunstancia personal lo social".
(ESPAÑA, 1978)
En el artículo 9, inciso 2, prevé la igualdad material, atribuido al Estado el deber de promover
las condiciones para facilitar y permitir la libertad e igualdad del individuo y de eliminar
obstáculos que impidan o dificulten la plena participación de todos los ciudadanos en la vida
social, económica, cultural y política. (ESPAÑA, 1948)
El derecho de ambos cónyuges de contraer matrimonio en plena igualdad jurídica está
previsto en el artículo 32, es importante resaltar la importancia de este instituto, ya que el
ámbito doméstico y conyugal, además de ser el lugar más propicio para el desarrollo de
prácticas de discriminación como Los actos de violencia contra la mujer, fue en épocas no tan
lejanas, uno de los ámbitos donde la mujer más sufrió supresión de derechos, como
casamientos forzados, limitación de bienes, incapacidad civil (siendo conferidos al marido los
derechos civiles de la mujer), entre otros.
En el ámbito constitucional, se pueden observar muchas similitudes entre las constituciones
vigentes en los países, la brasileña de 1988 y la española de 1978. Siendo ellas, las legitimadoras
de las legislaciones específicas en el enfrentamiento a la violencia contra la mujer, y que
consagran los derechos humanos que Las leyes procuran asegurar, ya que los países son
signatarios de los mismos convenios y tratados internacionales y fundamentan en sus
constituciones esos derechos.
3 APUNTES DE ESPECIALISTAS
Según datos del último anuario del Ministerio del Interior, el 6% de los presos en España
cumplen pena por violencia de género. Son 3.938. (RICÓN, 2015) Ante ello, a pesar de los
avances legislativos, algo más debe ser propuesto y realizado.
Miguel Lorente, ex delegado del Gobierno de España para la Violencia de Género, tiene el
mismo pensamiento en defensa de la educación como una respuesta y solución eficaz para la
violencia derivada de la desigualdad y discriminación de género. Según él, se tiene que trabajar

426
con la mentalidad de las personas, sobre todo de los hombres, en el sentido de romper con
estereotipos y buscar construir una mentalidad volcada a la igualdad de todos los seres
humanos.
Hay que trabajar en la causa de la violencia, que son los hombres maltratadores. Con
educación, para romper estereotipos y esa construcción cultural que les impele a actuar para
preservar lo que ellos consideran que debe ser la conducta femenina. Debemos inculcar que la
mujer no es una cosa y que tiene los mismos derechos. Por otra parte, hay que concienciar con
crítica social, campañas y leyes. No podemos esperar a que la incorporación de las mujeres
jóvenes resuelva el problema. En España hemos retrocedido. Se ha perdido Educación para la
Ciudadanía, la única asignatura que incidía en la igualdad, y por otra parte vuelven los colegios
con segregación por sexo. Además, los organismos internacionales no tienen iniciativa. Por
ejemplo, en la UE aún no existe una directiva de violencia contra las mujeres. Hay iniciativas
locales en Latinoamérica y África, con formación, tanto a nivel escolar como profesional. Pese
a que no se ha trabajado en las causas, en España un 82% de las mujeres consiguen escapar de
la violencia de género y las muertes han disminuido un 33% en cinco años. (ALFAGEME, 2014)
No hay solución inmediata ni rápida, pero es posible acabar o minimizar ese tipo de violencia,
que tiene actualmente datos estadísticos a escala global alarmantes. En el ínterin, Claudia
García-Moreno, jefe del departamento de violencia contra las mujeres de la Organización
Mundial de la Salud, reafirma la importancia de acabar con creencias perjudicial y
estereotipos, añadiendo que se debe también trabajar la mente femenina, nutriendo en ellas
pensamientos de igualdad que rompen con ellos creencias que ellas mismas poseen, que las
inferiores. Ella afirma que "de donde es mala aceptable la violencia contra las mujeres existe
más violencia". Según ella, el acceso a empleos además de otras prácticas de inserción y que
promueva la independencia es primordial.
García-Moreno resalta la importancia del Estado en ese propósito, en invertir en capacitación
de los profesionales introduciendo ese tema en su formación, y generar liderazgos políticos en
esa perspectiva. Pues, a pesar de los avances legislativos que hacen de España un ejemplo, y
demuestra el reconocimiento del problema, aún hay mucho que realizar. (ALFAGEME, 2014)
Nadine Gasman, representante de la ONU Mujeres en Brasil y ex responsable del
departamento de Violencia contra las Mujeres de América Latina por la ONU, resalta que tres
factores son importantes: una justicia eficaz, y el papel de las víctimas en denunciar las
agresiones sufridas; Un sistema de salud y servicios sociales y apoyos económicos.
Según Gasman, los medios de comunicación son muy importantes para fomentar campañas
dirigidas a la educación de hombres y mujeres sobre violencia, además de actuar en la
prevención puede salvar vidas, por ejemplo en Brasil existe el número 180, campaña de
denuncia contra violencia, que tiene aplicación de celular y es difundido en todos los medios
de comunicación nacional. En resumen, Gasman afirma que la inversión correcta debe estar
vinculada a la salud, la justicia y, sobre todo, la educación. (ALFAGEME, 2014)

427
Brian Heilman, experto en Género y Evaluación en el Centro Internacional de Investigación en
Mujeres (ICRW), afirma que este tipo de violencia es un problema global y la mayor
preocupación es que en muchos lugares la violencia está permitida, no sólo tolerada,
Conceptos sociales que pueden revertirse a través de un largo proceso de educación:
Este tipo de violencia es un problema global. Por tanto, no hay una solución fácil. Pero uno de
los pasos más importantes es cambiar la idea de que la violencia es aceptable. En demasiadas
comunidades alrededor del mundo, las agresiones de los hombres hacia las mujeres se aceptan
como una parte normal de la vida. Esto es falso; la violencia contra las mujeres es una
violación de los derechos humanos, un delito, y una barrera para el crecimiento económico y
el bienestar de los seres humanos. (ALFAGEME, 2014)
Diana Deligiorgis, experta en gestión de conocimiento para poner fin a la violencia contra la
mujer de las Naciones Unidas, agregó al pensamiento de los demás especialistas en el asunto,
subrayando la importancia del trabajo internacional de los gobiernos, y corroborando con el
pensamiento de que el camino más corto para El combate eficaz a la violencia contra las
mujeres es la educación:
La extensión de la violencia contra las mujeres y la magnitud de sus consecuencias requieren
un rango de esfuerzos desde un nivel internacional hasta individualmente. Frecuentemente
pensamos en las respuestas que se necesitan para las supervivientes, pero para acabar con
todo debemos ir más allá de las consecuencias y trabajar proactivamente para enfrentar las
causas que hacen que ocurra. Necesitamos promover la igualdad entre niños y niñas, hombres
y mujeres, y necesitamos transformar corazones y cabezas para asegurar respeto mutuo,
relaciones sanas y tolerancia cero para cualquier forma de abuso. Acelerar las leyes, políticas y
programas para la prevención y respuesta a la lacra. Los Gobiernos deben cumplir con sus
compromisos. Implantar servicios multisectoriales y accesibles, desde líneas calientes hasta
ayuda al empleo para víctimas durante largos periodos de tiempo. Asegurar y promover todos
los derechos de las mujeres. La educación, sobre todo en secundaria, es un gran factor
protector. Hay intervenciones grupales como Stepping Stones en 65 países; programas de
microfinanciación combinados con aproximaciones de género en varios países, incluyendo
naciones en guerra o en posguerra; intervenciones fuera de la escuela para jóvenes y hombres.
Todo ello acompañado con la mejora global de la situación de las mujeres. (ALFAGEME, 2014)
La promoción del bienestar de todos los seres humanos no puede ser condicionada. No se
puede haber la defensa de derechos humanos y fundamentales cuando hay diferencia en
relación al sexo. Aunque exista previsión legal de igualdad entre los sexos, acostada en la
Declaración Universal de los Derechos Humanos, en la Constitución de Brasil y España. Esta
igualdad debe ser efectiva, no sólo mera aspiración fuera de la realidad, y las naciones deben
volver su atención hacia la efectividad del derecho humano.
4 CONSIDERACIONES FINALES

428
A través de la observación de las similitudes de las legislaciones para el tratamiento a la
violencia contra la mujer de los países Brasil y España, el presente estudio tuvo como objetivo
analizar tales semejanzas y posibles diferencias, ante el hecho de que los datos estadísticos de
los países son enormemente diferentes, aún que sus prácticas en el sentido de cohibir la
violencia contra la mujer sean elogiadas internacionalmente. Resaltando que, este fue un
primer abordaje al tema propuesto, otras investigaciones podrán y serán desarrolladas a partir
de tal problemática.
Sin embargo, durante la realización del presente trabajo, se verificó que España también posee
datos espantosos de violencia contra la mujer, a través de los resultados mostrando que una
considerable proporción de mujeres entrevistadas presenció, o habían sufrido violencia, sin
embargo los datos de la violencia contra la mujer En Brasil son aún mayores. Sin embargo, los
expertos se unen en España para buscar alternativas que solucionen posibles fallas.
Cabe señalar que uno de los factores observados que genera ese tipo de violencia es la falta de
concientización por parte de la sociedad, con respecto a las consecuencias que la violencia y la
supresión de derechos humanos y fundamentales pueden traer a toda la nación que la permite.
Dado que la violencia contra la mujer no es más que un reflejo de una sociedad que contiene
pensamientos e ideologías que promueven la desigualdad y la discriminación.
El estado tiene el papel fundamental en el combate a esos estereotipos, que promueven,
aunque directa o indirectamente, la supresión de derechos fundamentales y la falta de respeto
a los derechos humanos. Resaltando que el enfrentamiento a la violencia contra las mujeres
involucra legislaciones y políticas públicas, dispensadas a la sociedad teniendo como prioridad
la educación no sólo a las víctimas ya los agresores, sino a toda la sociedad.
Como medida eficaz de combate a este problema social de orden global es necesario trabajar
una serie de factores que a medio y largo plazo traerían efectos positivos de solución. La
educación en perspectiva de género a partir de las escuelas, con estudios de concientización
orientados a conceptos como igualdad, libertades y garantías individuales, y sobre todo, de
derechos humanos y fundamentales; Así como en los cursos de graduación y postgrado.
La educación puede ser considerada una herramienta que funcionará a largo plazo, sin
embargo, actuará en la raíz del problema, ya que la violencia es la expresión de la desigualdad
de género perpetrada en nuestra sociedad. Las leyes, políticas públicas de auxilio a las
víctimas, la criminalización, entre otros, son formas de remediar el problema, pero tratarlo en
sus raíces, sólo destruyendo conceptos y estereotipos discriminatorios, y eso sólo se hará a
través de la insistencia y perseverancia en la concientización y educación.
5 ANEXOS

429
5.1 ANEXOS A: GRÁFICOS
GRÁFICO 1 - Tasa de Homicidio por armas de fuego por 100 mil habitantes en países
considerados en constante conflicto, comparados a la tasa de homicidios de mujeres en Brasil
por 100 mil habitantes en el mismo año.

Fuente: Mapa de la Violencia Homicidios de Mujeres (2015), Mapa de la Violencia Homicidios


por Arma de Fuego (2016).
GRÁFICO 2 - Tasa de Homicidio de mujeres en Brasil por 100 mil habitantes comparados a la
tasa Homicidio de mujeres en España, en países considerados en conflicto (Jordania / Israel), y
otros países.

Fuente: Mapa de la Violencia Homicidios de Mujeres (2015), Mapa de la Violencia Homicidios


por Arma de Fuego (2016).
GRÁFICO 3 - Comunidades españolas con mayores tasas de violencia de género por 10 mil
mujeres según consta en las denuncias.

Fuente: Mapa de la Violencia Homicidios de Mujeres (2015), Mapa de la Violencia Homicidios


por Arma de Fuego (2016).
GRÁFICO 4 - Comunidades españolas con menores tasas de violencia de género por 10 mil
mujeres según consta en las denuncias.

430
Fuente: Jornal El País (RICON, 2016)
GRÁFICO 5 - Estadísticas obtenidas a través de las respuestas de las mujeres entrevistadas
entre el número de 80 mujeres, en respuesta en el orden de "SI" o "NO" para las cuestiones:
¿Sufrió o temió sufrir algún tipo de violencia durante su estancia en España o tomó
conocimiento o presenció alguna mujer sufrir violencia?

Fuente: Encuesta de campo realizada en julio de 2016 en Salamanca, España.


TABLA 1 - Número de muertes por violencia de género en España. Evolución anual.

ANO NÚMERO DE VÍTIMAS MORTAIS


2003 71
2004 72
2005 57
2006 69
2007 71
2008 76
2009 56
2010 73
2011 61
2012 52

431
2013 54
2014 54
2015 60
2016 44
TOTAL 870
Fuente: Ministerio de Sanidad, Servicios Sociales e Igualdad de España. Actualizado em 21 de
dez. de 2016.
TABLA 2 - Descripciones de las experiencias de las entrevistadas (mujeres), como respuesta a
la cuestión si sufrió algún tipo de violencia durante su estancia en España, o si se tomó
conocimiento / presenció alguna mujer sufrir violencia.
TABELA 2 ¿SOFRIÓ ALGÚN TIPO DE VIOLENCIA DURANTE SU PERMANENCIA EN
ESPAÑA?
EDAD NACIONALIDAD RESPUESTA DESCRIPCIÓN
21 BRASILEIRA SIM.
andando com uma colega no meio da Plaza
Mayor para voltarmos ao hostel, quando
percebemos que um homem estava nos
seguindo. Aceleramos o passo e ele continuou,
embora à distância, tentando disfarçar. Alguns
metros depois encontramos um grupo de
homens conversando e fingimos nos juntar a eles
e puxar assunto para não ficarmos sozinhas.
Aguardamos até que o homem que nos seguia
fosse embora - ele aguardou um pouco, mas logo
desistiu, porém passou por nós sem tirar os olhos
da minha colega e de mim e aparentemente

23 BRASILEIRA NÃO
estadia na Espanha, um homem, se aproveitando
do estado de embriaguez de uma mulher e contra
a manifesta vontade dela, a beijou e passou as

25 BRASILEIRA NÃO
estadia na Espanha, uma amiga estava sendo
perseguida por um colega também brasileiro,
que mesmo após diversos
432
durante todas as festas a noite inteira, sem que
ela pudesse tentar falar com outros rapazes. Ela

55 BRASILEIRA NÃO Portugal,


em Cascais, estava junto com mais 4 jovens
andando e conversando, quando um homem,
acompanhado por outro colega, provavelmente
imigrantes (tipo físico não europeu) falou algo
para as meninas e das meninas. Ficamos todas

21 ESTADUNIDENSE NÃO
safer than my country. But I witnessed my
teacher inviting some students to leave, I do not
know if this was harassment, they did not seem

21 TAIWANESA NÃO
que se persigue al profesora durante la clase. Me
parece extraño cómo viven los españoles y el
brasileños y la libertad que le dan a los extraños.
Taiwan mantener lejos, no nos damos las manos

Fuente: Encuesta de campo realizada en julio de 2016 en Salamanca, España.


TABLA 3: Estadística de Violencia Doméstica y de Género en España, cifras obtenidas a través
de sentencias prolatadas en el año 2015, por lo tanto esas cifras se refieren a los casos
analizados en el año 2015, que pueden ser casos ocurridos en 2015 o en años anteriores, Sin
embargo, esas cifras se refieren a los números de ocurrencia de casos de violencia recibidos
por el Registro Central para la Protección de las víctimas de violencia doméstica y de género.
Los datos para la tabla de la violencia de género sólo se refieren a las mujeres, los datos de la
violencia doméstica, las mujeres y los hombres.

Violencia Doméstica y de Género en 2015 en España

Violencia de Género Violencia Doméstica

Víctimas 1,2 27.624 7.229


Personas denunciadas 1,3 27.562 4.981

433
Personas condenadas 3,4 24.265 5.358
Personas absueltas 3,4 6.768 1.458
Fuente: INE - Instituto Nacional de Estadística de España, 2015.
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Andalúcia. 2016. Disponible
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434
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OLIVEIRA, Andréa K. C. M. Cabral. Histórico, Produção e Aplicabilidade da Lei Maria da
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435
436
EXECUÇÃO PROVISÓRIA DA PENA E POSSÍVEL LIMITE DA INTERPRETAÇÃO
CONSTITUCIONAL
231

Resumo: Pretende este artigo analisar criticamente alguns dos argumentos adotados como
razão de decidir no recente acórdão do Supremo Tribunal Federal, que reconheceu a
possibilidade de execução provisória da pena, bem como alguns dos argumentos contidos em
artigos jurídicos publicados imediatamente após o julgamento, ora aplaudindo, ora repudiando
a decisão da Corte. O artigo coloca a questiona de um possível limite à interpretação
constitucional. Defende-se que a norma é resultante da interpretação incidente sobre um
texto. O artigo passa pelas noções de pena, garantias processuais, processo, execução da pena,
execução provisória na doutrina e na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal. Por fim,
passa pela questão do possível limite à interpretação constitucional.
Palavras chave: Execução Provisória; Pena; Interpretação Constitucional.
INTRODUÇÃO
Nos últimos anos, foram descobertos no Brasil graves casos de corrupção envolvendo políticos

Lava-
Tamanha é a dimensão do problema que se tem a impressão de que a corrupção está
institucionalizada. Nesse contexto, surgiu alguma movimentação da sociedade civil,
acompanhada de clamor por maior rigor na apuração e punição dos envolvidos.
Em primeira instância, houve várias decretações de prisões preventivas, delações premiadas e
condenações.
Foi em nesse contexto que o Supremo Tribunal Federal resgatou seu antigo entendimento,
voltando a admitir a execução provisória da pena, que nada mais é que a admissão do início de
cumprimento da pena antes do trânsito em julgado da sentença condenatória.
A comunidade jurídica reagiu a essa nova orientação jurisprudencial, ora com elogios, ora com
severas críticas, estas assentadas, essencialmente, no argumento de que o Supremo julgou em
absoluto desrespeito à Constituição Federal, visto que esta fixou o trânsito em julgado como
marco para o fim da presunção de inocência.

Neste artigo, para além da exposição e análise dos principais argumentos apresentados a
respeito do assunto, pretende-se provocar a comunidade jurídica a refletir acerca de um

Juiz de Direito da Segunda Vara Cível da Comarca de Lorena, São Paulo, Brasil. Mestrando em Direito pelo Centro
231

Universitário Salesiano de São Paulo U.E. Lorena, Brasil.

437
possível limite à interpretação constitucional, pois a maior ou menor liberdade interpretativa
tem notória repercussão para efeito de adoção de uma postura protagonista ou de maior
retração ou autocontenção pelo Supremo Tribunal Federal.
Essa reflexão perpassa algumas questões, como: Pode uma suposta ou real vontade popular
circunstancial servir de fundamento para que o guardião da Constituição despreze o texto
constitucional? A interpretação constitucional é atividade livre e independente do texto
constitucional? Ou a submissão ao texto constitucional deve ser casuística e vinculada ao
resultado, podendo ou não haver submissão conforme o resultado que dela resulte?
Essas são algumas das reflexões que se pretende apresentar no presente artigo.
ESTADO E PENA: CONSIDERAÇÕES GERAIS
As mais variadas formas de violência232 verificadas na atualidade parecem confirmar a
percepção de Hobbes, de que o ser humano, em essência, é egoísta e se move para satisfação de
seus interesses, independentemente dos malefícios que possam resultar a semelhantes.
Essa característica humana oca

a liberdade e o transfiram para um poder comum


que a tod -171).
Em tal perspectiva Hebbesiana, a consecução da paz e da segurança custou ao indivíduo a
abdicação de parcela de sua liberdade, que é entregue a um ente mais forte, ao qual incumbirá
velar pelo bem comum.

afastou dessa ideia, defendendo que, em prol do bem comum, o homem sacrificou porções da
liberdade individual e as transferiu ao soberano, que assumiu a incumbência de defende-lo das
usurpações privadas de cada homem em particular (BECCARIA, 1998, p. 41).
Como forma de dissuadir o indivíduo de seu espírito despótico, torna-se necessária a
nas estabelecidas

A pena é, portanto, instrumento vocacionado à garantia da observância da lei e tem íntima

232
Embora as atenções costumem focar a violência criminalizada, esta é apenas uma dentre muitas outras formas de
violência. O que dizer, por exemplo, da fome? Segundo relatório da ONU, em 2015 795 milhões de pessoa estavam
passando forme no mundo. Revista pré. Univesp. Disponível em http://pre.univesp.br/a-fome-no-
mundo#.WTRRCuvythF. Acesso em 20 maio 2017.

438
Nos limites decorrentes de sua Constituição e dos tratados e convenções de Direitos Humanos
de que é signatário, o Estado elege os bens jurídicos que considera merecedores de tutela pelo
Direito Penal e, ao fazerem essa seleção, define a conduta ou conjunto de condutas lesivas a
esses bens jurídicos, as quais, por isso, tornam-se proibidas e passíveis de uma resposta penal.
Todavia, considerando-se que a proibição por si só não teria o condão de dissuadir a prática do
comportamento proibido, a lei, ao mesmo tempo em que descreve a conduta, comina a(s)
consequência(s) a que estarão sujeitos transgressores da regra proibitiva. Essa consequência é

veiculadas por lei (CF, art. 5º, inc. XXXIX).


Em síntese, a pena é a consequência da prática de um crime, tendo no ordenamento jurídico
brasileiro declarada finalidade de repressão e prevenção à prática do crime (Art. 59, do Código
Penal Brasileiro).
DEVIDO PROCESSO LEGAL, DIREITO DE PUNIR E EXECUÇÃO DA PENA
Sendo a pena a resposta estatal à incursão do agente em comportamento que configure crime,
sua aplicação e concretização estão condicionadas à prévia formação de um juízo de certeza de
que o acusado praticou um fato típico, antijurídico e culpável233, significando dizer que, mesmo
que o indivíduo seja flagrado cometendo uma conduta perceptível ao senso comum como
criminosa, não haverá automática e imediata concretização da sanção.
Essa situação de não punição imediata ao crime pode despertar incompreensão e
inconformismo populares, evocando um confronto entre a eficiência na repressão criminal -
convergente para a segurança social e o garantismo no processo penal, enfatizadora da

pois não se concebe um pro


A efetivação da pena pressupõe um processo de conhecimento por intermédio do qual se
buscará, perante o Poder Judiciário, o reconhecimento da responsabilidade penal do acusado,
dando concretude à difundida parêmia nulla poena sine iudicio, consubstanciadora da

2011, p. 33).
Em um Estado Democrático de Direito não é admissível um processo de caráter simbólico ou
de desfecho único, eis que a absolvição de um inocente é tão dever do Estado quanto à
condenação de um culpado, o que suscita a consideração, registrada por Antonio Scarance
Fernandes, de que o processo é o ambiente em que as atividades do órgão jurisdicional e das

233
Apesar do conceito tripartite adotado no texto, anotamos que o assunto não é pacífico na doutrina brasileira. No
sentido aqui adotado, citamos Rogério Greco, o qual menciona autores que, como Damásio de Jesus, consideram
crime o fato típico e antijurídico, sendo a culpabilidade apenas um pressuposto da pena.

439
partes devem desenvolver-se de maneira equilibrada e cooperativa, não cabendo a qualquer
delas a ocupação de uma posição central (FERNANDES, 2010, p. 33).
É esse equilíbrio que possibilitará que o processo de conhecimento não alveje a condenação ou
absolvição do acusado, mas sim se realize livremente para alcançar o resultado que se revelar
adequado ao caso concreto, podendo ser a condenação ou a absolvição.
Convergindo com essa orientação, a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988
consagrou textualmente o devido processo legal, dispondo, em seu art. 5º, inc. LIV, que

pressupondo que a interferência na esfera jurídica das pessoas seja precedida de um processo

Essa garantia constitucional, segundo Nelson Nery Júnior, é abrangente das demais garantias
constituc
due processo of law para que daí decorressem todas as consequências processuais que
p.
32).
A observância desses princípios é condicionante para que um processo possa ser considerado
justo e dotado de aptidão para permitir uma sentença justa.
Como a prática do crime, como dito alhures, não gera a imediata e automática incidência da
pena, é necessário que o órgão estatal constitucionalmente encarregado da persecução penal
em juízo, exercendo a ação penal234, corporificada na peça processual chamada denúncia,
provoque a atividade jurisdicional, postulando o reconhecimento do jus puniendi estatal em
relação ao suspeito da prática da conduta criminosa.
Oferecida uma denúncia que preencha os pressupostos processuais e condições da ação e se
encontre alicerçada em elementos que revelem minimamente a prática do crime e a respectiva
autoria, o juiz a receberá235, inaugurando o processo penal, seguindo-se com a citação do réu, a
fim de que possa defender-se em conformidade com as garantias constitucionais.
O processo, como se vê, marca-se pela tensão entre o jus puniendi estatal e o status libertatis

surgir uma lide de igual natureza, resultante do conflito entre o direito de punir do Estado e o
Consequentemente, nele há duas
pretensões antagônicas. Contudo, independentemente do resultado visado pelas partes

234
Ao Ministério Público, reconhecido pela Constituição Federal como instituição permanente e essencial à função
jurisdicional do Estado, foi dada a atribuição para promover, privativamente, a ação penal pública (Artigos 127,
caput, e 129, inc. I, ambos da Constituição Federal).
235
De acordo com o disposto no art. 395, incisos I a III, do CPP, lido a contrario sensu, o recebimento da denúncia
pressupõe o atendimento das condições da ação e dos pressupostos processuais, bem como que ela esteja assentada
em justa causa, ou seja, em elementos hábeis a indicar, ainda que minimamente, a existência do crime e a
vinculação do acusado a ele.

440
acusador e acusado - o processo deverá desenvolver-se descompromissado com um resultado
condenatório ou absolutório, dirigindo-se à finalidade de elucidação dos fatos e de seu correto
enquadramento jurídico.
Se após a produção probatória e avaliação das considerações das partes o órgão judicial
concluir pela existência de crime e de que o réu foi o seu autor, aí sim, ante a ausência de
discricionariedade, ficará vinculado ao único desfecho possível: a prolação de sentença
condenatória, a qual, transitada em julgado, constituirá título executivo, constituindo o
documento que embasará a concretização do jus puniendi no processo de execução penal.
Vale dizer: exaurida a atividade jurisdicional cognitiva, exercida mediante processo harmônico
com as garantias processuais constitucionais, e resultando numa condenação por sentença já
transitada em julgado, será iniciada a execução da pena, que é a atividade que

Tratou-se, até aqui, da execução definitiva da pena.


EXECUÇÃO PROVISÓRIA E PRINCÍPIO DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA
A doutrina, sobretudo quando se debruça no estudo das prisões de natureza cautelar,
costumeiramente faz distinção entre a prisão pena e as prisões de natureza cautelar.
Fernando da Costa Tourinho Filho, por exemplo, sustenta que a prisão pena é castigo, sendo
e culpado de haver cometido uma infração penal,

FILHO, 2001, p. 376), vinculando-a ao trânsito em julgado.


Portanto, para referido autor, o trânsito em julgado da sentença é o marco a partir do qual se
torna possível a prisão pena, de sorte que ou se tem uma sentença transitada em julgado e será
possível a prisão pena, ou a não se tem o trânsito em julgado e a prisão que eventualmente se
imponha ao réu terá natureza cautelar236, estando, por conseguinte, condicionada aos
pressupostos próprios da cautelar.
Igualmente negando a possibilidade de execução provisória, Silvio Rosa de Mesquita Junior
sustenta que a prisão provisória não tem natureza executiva, pois, quando se forma um
-se apenas a aplicação plena da legislação pertinente,
assegurando ao preso provisório, submetido a uma medida cautelar, os direitos insertos na

O autor está se referindo aos casos em que se concedem ao preso provisório os benefícios
assegurados pela Lei das Execuções Penais aos presos já condenados por sentença transitada
em julgado, desde que compatíveis com o caráter cautelar da prisão, a exemplo do que ocorre
com a orientação jurisprudencial contida no enunciado sumular 716 do Supremo Tribunal

236
Aury Lopes Junior, no livro intitulado Prisões Cautelares, faz referência às prisões em flagrante, preventiva e
temporária, todas condicionadas à efetiva necessidade da prisão.

441
-se a progressão de regime ade cumprimento de pena ou a

Nesse caso, realmente não há que se falar em execução provisória, pois retrata realidade
bastante distinta dela, pois o sentido de execução provisória, como vem sendo tratado na
jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, refere-se ao início do cumprimento da pena em
razão da superveniência de acórdão confirmatório da sentença condenatória.
Execução provisória e o Princípio da presunção de inocência na jurisprudência do Supremo
Tribunal Federal
Em breve histórico da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, é possível situar o tema
em três momentos, a saber: até 2009 o Supremo admitia a execução provisória da pena,
sustentando essa posição basicamente na ausência de efeito suspensivo nos recursos especial e
extraordinário.
Esse entendimento foi radicalmente alterado em fevereiro de 2009, quando, no HC 84.078-
MG, de relatoria do Ministro Eros Grau, a Corte Suprema deixou de admitir a execução
provisória da pena.
Naquela ocasião, destacaram-se dois argumentos de matriz constitucional: a ampla defesa e o
princípio da presunção de inocência.
Asseverou-se que a ampla defesa não pode ser visualizada de modo restrito, pois engloba todas
as fases processuais, inclusive as recursais de natureza extraordinária, de sorte que a prisão
antes do trânsito em julgado significa restrição à ampla defesa, caracterizando desequilíbrio
entre a pretensão estatal de aplicar a pena e o direito do acusado de elidir essa pretensão. E
que o princípio constitucional da presunção de inocência, estampado no inc. LVII, da

pena.
Esse entendimento vigorou por cerca de 7 (sete) anos, até que, em 17.02.16, no Habeas Corpus
126.292/SP, de relatoria do Min. Teori Zavascki, o Supremo voltou a adotar a orientação
abandonada em 2009, pautando-se em vários argumentos, entre eles, o da necessidade de
compatibilizar o princípio da presunção de inocência com a efetividade da jurisdição penal.

cabíveis da decisão de segundo grau, ao STJ ou STF, não se prestam a discutir fatos e provas,

cometerem equívocos, existem instrumentos possíveis, como medidas cautelares e mesmo o


habeas corpus. Além disso, depois da entrada em vigor da Emenda Constitucional 45/2004, os
recursos extraordinários só podem ser conhecidos e julgados pelo STF se, além de tratarem de
matéria eminentemente constitucional, apresentarem repercussão geral, extrapolando os
relator). Logo, não teriam finalidade de

442
vejamos a presunção de inocência como um princípio relevantíssimo para a ordem
constitucional, mas suscetível de ser conformado, tendo em vista inclusive as circunstâncias
(Gilmar Mendes, citando o direito
alemão para seguir o relator); quando uma interpretação constitucional não encontra mais
ressonância no meio social ela deve ser abandonada e hoje a sociedade não mais aceita a
presunção de inocência de uma pessoa condenada que não para de recorrer (Gilmar Mendes).
Nos votos contrários a contraposição firmou-se, destacadamente, na premissa de que a
Constituição Federal, ao contemplar o princípio da presunção de inocência, claramente
definiu o momento a partir do qual se descaracteriza a presunção de inocência, qual seja,
aquele em que sobrevém o trânsito em julgado da condenação criminal. O Texto da
Constituição, como afirmaram os Ministros Marco Aurélio e Celso de Mello, é inequívoco e
condicionante do fim da presunção de inocência ao trânsito em julgado da sentença.
Em suma, atualmente o entendimento do Supremo Tribunal Federal, firmado por 7 votos a 4, é
no sentido de que cabe a execução provisória da pena, porquanto não se incompatibiliza com a
presunção de inocência.
Execução provisória da pena e posições favoráveis e contrárias externadas após o julgamento
do habeas corpus 126292-SP
A decisão do Supremo Tribunal Federal foi recebida com aplausos e repúdios, não tendo sido
poucos os estudiosos que se manifestaram de forma absolutamente apaixonada e, por
conseguinte, de modo incompatível com a reflexão que deve fazer aquele que pretende
oferecer uma efetiva contribuição para o aperfeiçoamento do Direito.
POSICIONAMENTOS FAVORÁVEIS À DECISÃO DO SUPREMO
O juiz Sérgio Fernando Moro, protagonista da chamada operação Lava Jato, que vem
desfazendo um novelo que a cada giro conduz a novos casos de corrupção envolvendo

da efetividade da Justiça Criminal brasileira e indica a necessidade de uma reformulação do


nosso sistema processual penal para dar celeridade aos processos e preservar o sistema de

exemplo a Alemanha, França e Estados Unidos, que possuem nos seus ordenamentos jurídicos
o mesmo princípio da presunção de inocência, admitem o cumprimento d apena sem o

443
Vladimir Passos de Freitas defendeu a decisão, afirmando que a posição contrária à execução
provisória
por advogados menos capacitados, nem sequer recorriam ao STJ e ao STF e, para eles, a

nos assegurou que toda pessoa tem


direito a que se presuma sua inocência enquanto não se comprove legalmente sua culpa e que

direito a duas instâncias e em nenhum momento a quatro ou

Defendeu que não existirem motivos para temor à decisão do Supremo, contra o texto
idade da existência de milhares de uniões
de pessoas do mesmo sexo, o Supremo decidiu que eles poderiam casar-
art. 226, parágrafo 3º, da Constituição está escrito que é reconhecida a união estável entre
.

promover a pacificação social. Correta, pois, a decisão do STF, pois restaurou o equilíbrio

POSICIONAMENTOS CONTRÁRIOS À DECISÃO DO SUPREMO

tentativas de aniquilar o sagrado princípio constitucional da presunção de inocência,


referindo-se a duas propostas de modificação da legisla
A primeira teria ocorrido com a chamada PEC dos Recursos, apresentada em 2011 pelo
ministro Cézar Peluzo, que objetivava a redução de recursos ao Supremo e ao STJ, a qual, em

Délio Lins e Silva argumentou que nossa Constituição, ao contrário dos documentos
internacionais de direitos humanos e do direito alienígena, invocados como reforço
argumentativo à execução provisória da pena, é explícita, estabelecendo como marco para
início da execução da pena o trânsito em julgado.
Por conseguinte, tais instrumentos citados pelos ministros, diferindo do texto constitucional
pátrio, não pod
culpa se presume a inocência, sem, no entanto, dispor em que momento se prova a culpa,
deixando a critério do legislador infra-
devem ser ouvidos, sim, mas pelas novas casas legislativas.
O Poder Judiciário não pode pautar sua atuação pelo clamor social, mas sim pelas leis

444
míope e mudar de acordo com as conveniências de cada composição que a nossa Suprema

nossa Constituição Federal, passarem aos poucos a serem mitigados de forma expressa e
descarada, pois o aval para isso foi dado pelo Plenário da nossa Suprema Corte, numa torta

Um possível limite à Interpretação Constitucional: apontamentos teóricos e breve análise dos


argumentos centrais

possível asseverar que a maior ou menor liberdade para a interpretação pelo juiz varia no
tempo e no espaço.
O positivismo jurídico exegético buscava objetividade científica, apartando o Direito da moral

com caráter imperativo e f


de questões como legitimidade e justiça (BARROSO, 2001, p. 17).
De acordo com Barroso, o positivismo teve variações, chegando a seu ponto culminante no
normativismo de Hans Kelsen, sendo que, das características do positivismo por ele
mencionadas, destacado três: a) aproximação quase absoluta entre Direito e norma; b)
completude do ordenamento jurídico e c) a validade da norma legitimada pelo procedimento
seguido para sua criação, independendo de seu conteúdo(BARROSO, 2001, p. 21).
O fracasso político do positivismo abriu caminho para o pós-positivismo, que traduz um
conjunto de reflexões sobre o Direito, sua função social e sua interpretação, reintroduzindo no
ordenamento jurídico as ideias de justiça e legitimidade (Barroso, 2001, p.24).
Como manifestação do pós-positivismo, tem-se o neoconstitucionalismo, que tem como traço
característico o foco no Poder Judiciário, que assume posição protagonista.
Nesse ambiente, o Direito passa a ser analisado sobretudo sob uma perspectiva interna, do
participante dos processos que envolvem a sua interpretação e aplicação, tendendo ao mal do
subjetivismo.
Todavia, mesmo na leitura neoconstitucionalista, marcada por maior abertura interpretativa,
não há

realidade para a sua plena formação e desenvolvimento. Porém, de outro, também não pode
conferir primazia às forças de natureza puramente moral e sociológica, colocando em xeque a

445
delineamento do significado da norma, e complementar, ajustando-se às potencialidades do

Texto e contexto devem manter-


aproximação desses dois vetores, malgrado seja comum a todos os intérpretes, é
p
conexão entre texto e contexto, evitando, ao máximo, o surgimento de zonas de ruptura,

Conquanto a norma constitucional equivalha necessariamente ao texto e apesar da


insuficiência da interpretação meramente gramatical, nem por isso intérprete está autorizado
a abandonar o texto constitucional, autoconcedendo-se poderes para, sozinho, construir a
norma constitucional.
A norma não é ou não deve ser fruto da criatividade e da vontade do julgador, mas sim
resultado da interpretação por ele realizada sobre o texto, que não é o ponto final, mas é
necessariamente o ponto de partida da atividade interpretativa. O intérprete não está
autorizado a fechar os olhos para o texto ou a desprezar-lhe o valor semântico, qualquer que
seja o pretexto.
Não há dúvida de que a efetividade da jurisdição penal é um ideal de induvidosa legitimidade.
Contudo, não há possibilidade de um legítimo juízo de ponderação, porquanto insuficiente a
circunstância de serem dois princípios. O conflito não surge entre textos, mas sim entre as
normas a partir deles construídas. E, na construção da norma, o intérprete não pode desprezar
a obra do legislador, sobretudo do legislador constituinte originário. A Constituição Federal
traçou com marco do fim da presunção de inocência o trânsito em julgado, o qual somente
ocorre quando exauridas as vias recursais ordinárias ou extraordinárias. Logo, não é possível a
construção de uma norma que despreze o texto. Por mais relevante que seja o combate a
criminalidade, sobretudo no atual cenário de desvelamento de corrupção que talvez se possa
dizer institucionalizada, não é possível para esse ou qualquer outro fim desprezar a
Constituição.
O recurso ao Direito Comparado, adotado no julgamento da Corte Suprema e na manifestação
da Associação dos Magistrados do Brasil, não se afigura argumento válido. O Brasil rege-se
pela sua Constituição, e não pela Constituição de outros países, ainda que tidos como
desenvolvidos. Ademais, se esse argumento revestir-se de validade, nenhum problema haverá
em adotar o Direito de alguns estados Norte Americanos para aplicar, no Brasil, a pena de
morte, por exemplo, àqueles que praticarem crimes graves ou forem considerados
irrecuperáveis.
Também a Convenção Americana de Direitos Humanos não constitui fundamento válido para
autorizar a execução da pena, bastando para tal conclusão a consideração de que o artigo 29 da

446
Convenção consagrou o princípio da prevalência da norma mais benéfica, de modo que a
Convenção somente seria aplicável para ampliação do direito, e não para sua mitigação.
O princípio da isonomia igualmente não se presta para autorizar ou legitimar a execução
provisória da pena, eis que a solução para a desigualdade não passa pelo desprezo à
Constituição, mas sim por sua concretização, que, no caso dos réus hipossuficientes, seria
mitigada mediante ampliação e aperfeiçoamento da Defensoria pública, órgão a quem foi
confiada a missão constituição de realizar a prestação jurídica dos hipossuficientes, conforme
disposto no art. 134, caput, da Constituição Federal.
De igual modo, a opinião pública não pode prestar-se para autorizar o Supremo a romper com
o Texto Constitucional, pois a democracia convive com o constitucionalismo, que impõe
limites à vontade da maioria e preserva os direitos e garantias fundamentais, a exemplo do
princípio da presunção de inocência. O ambiente próprio é Legislativo, mediante a prática da
democracia.
O precedente invocado da União Homoafetiva, citado por Vladimir Passos para trazer
conforto quanto ao protagonismo do Supremo, produz resultado reverso, pois, se naquele caso
o desprezo ao texto atendeu ao anseio uma camada da sociedade sem refletir diretamente nos
direitos de outras, a análise em relação à execução provisória não pode ser a mesma,
porquanto reflete diminuição do alcance de uma garantia fundamental e leva,
necessariamente, a se imaginar até onde mais se poderá avançar ne

teses jurídicas? Ou para que serem as teses jurídicas? São elas construídas apenas para um
ideal contemplativo? O reconhecimento da possibilidade da execução provisória não é uma
tese jurídica?
Por outro lado, não se pode concordar com o radical entendimento de que o não haveria
possibilidade de redução do alcance do princípio da presunção de inocência ou que a proposta
de Emenda Constitucional apresentada pelo Ministro Cézar Peluzo, que objetivava a redução

acesso da defesa de um cidadão a todos os graus de jurisdição.


A uma porque o direito à ampla defesa tem o contorno que lhe conferir o Direito
Constitucional ou Processual, de sorte que bastaria que os recursos especial e extraordinário
se convertessem numa espécie de ação rescisória, como proposto, para que o trânsito em
julgado ocorresse já no julgamento do segundo grau de jurisdição.
A duas porque os graus de jurisdição são aqueles igualmente definidos na Constituição e na Lei
Processual. Aliás, um bom exemplo disso é que aquelas autoridade que tem o Supremo
Tribunal Federal como foro de julgamento não tem direito a um duplo grau de jurisdição, vez
que eventual recurso é decidido pelo próprio Supremo.

447
Portanto, a solução não está em admitir que o Supremo despreze o texto constitucional para
chegar ao resultado que circunstancialmente pode afigurar conveniente. A Constituição,
embora deva acompanhar a evolução social, inclusive mediante interpretação, é também um
instrumento que visa garantir a segurança das relação em geral.
Independentemente da conclusão a que se chegue o debate deve ser feito de forma serena,
devendo-se evitar e se possível abandonar a paixão, que tolda o entendimento.
CONCLUSÃO
O direito punitivo do Estado não é automático, devendo ser buscado através da atividade
jurisdicional a ser exercida num processo que observe as garantias fundamentais inerentes ao
processo.
Se ao final do processo reconhecer-se a responsabilidade penal do réu, será proferida uma
sentença condenatória, a qual, uma vez transitada em julgado, constituirá título hábil a
autorizar a concretização do direito punitivo estatal, que também se realizará por meio de um
processo. O processo de execução da pena.
A Constituição adotou o princípio da presunção de inocência, estabelecendo que o marco final
dessa presunção é o trânsito em julgado da sentença penal condenatória, que ocorre quando
da sentença não caiba mais qualquer recurso ordinário ou extraordinário.
A questão que surge é sabe se cabe execução da pena antes do trânsito em julgado da sentença
penal condenatória, que é chamada de execução provisória, exatamente em razão da
possibilidade de interposição ou da pendência de julgamento de recurso interposto.
Na doutrina vem prevalecendo o entendimento de que não cabe execução provisória da pena.
Entretanto, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal tem se mostrado vacilante.
Atualmente, porém, a Corte passou a admitir a execução provisória da pena, decisão que
suscitou grande discussão no meio jurídico, alguns aplaudindo e outros repudiando essa
decisão.
Apesar de reconhecer que o aguardo do trânsito em julgado da sentença tem oportunizado o
manejo de recursos extraordinários com finalidade meramente protelatória, fazendo o
processo se arrastar por anos, chegando, em alguns casos, à impunidade, adotamos o
entendimento de que a Constituição estabeleceu textualmente o marco a partir do qual
termina a presunção de inocência. Assim, enquanto não houver o trânsito em julgado não é
possível a execução da pena, não havendo, pois, que se admitir a execução provisória da pena.
A interpretação constitucional não é atividade absolutamente livre do intérprete. Ao contrário,
ele está vinculado ao texto constitucional, que não pode ser desprezado diretamente ou
através do desprezo ao seu valor semântico.

448
Apesar de se admitir a força da neopositivismo, que tem o neoconstitucionalismo como uma
de suas manifestações, dando lugar a maior margem de liberdade interpretativa, o texto
continua sendo o ponto de partida a partir do qual o intérprete construirá a norma jurídica.
A norma jurídica é fruto de um trabalho conjunto, no qual o intérprete exerce apenas uma
parte, porque uma parte já foi construída pelo legislador, ordinário ou constitucional.
Consequentemente, qualquer que seja o momento, e qualquer que seja a finalidade, não
justifica o desprezo à Constituição, cabendo, em caso de insatisfação, mobilizar o legislativo
para que se promovam as alterações necessárias.
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451
CIDADANIA E DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA: COMO VALORES FUNDAMENTAIS
PARA O COMBATE À INTOLERÂNCIA À LUZ DOS DIREITOS INTERNACIONAL,
BRASILEIRO E CHILENO.
237

238

Resumo: Este artigo apresenta uma abordagem teórico-conceitual sobre cidadania e


intolerância a partir do princípio da dignidade da pessoa humana prescritas como
fundamentos da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (art. 1º, incisos II e III)
e na Constituição Política da República do Chile de 1980 (nos arts. 1º, 4º, 5º). Tais conceitos
após o advento das Convenções Interamericanas Contra o Racismo, a Discriminação Racial e
Formas Conexas de Intolerância e Contra Toda Forma de Discriminação e Intolerância (OEA,
2013), como parâmetros de hermenêutica constitucional e expressão dos valores éticos
norteadores do espírito das Leis Maiores brasileira e chilena.
Palavras-chave: cidadania, direitos humanos, intolerância, dignidade da pessoa humana, Brasil,
Chile.
Abstract: This article presents a theoretical-conceptual approach on citizenship and
intolerance based on the principle of the dignity of the human person prescribed as
foundations of the Constitution of the Federative Republic of Brazil of 1988 (article 1,
subsections II and III) and in the Political Constitution of the Republic of Chile of 1980 (in
articles 1, 4, 5). Such concepts after the advent of the Inter-American Conventions against
Racism, Racial Discrimination and Related Forms of Intolerance and Against All Forms of
Discrimination and Intolerance (OAS, 2013), as parameters of constitutional hermeneutics and
expression of the ethical values guiding the spirit of the Major Laws Brazilian and Chilean.
Keywords: Citizenship, human rights, intolerance, dignity of the human person, Brazil, Chile
Sumário: Introdução. 1.Evolução Histórica dos Direitos Humanos. 2 Cidadania e Intolerância.
3. Conclusão. Referências
INTRODUÇÃO
Com o advento da Constituição da República Federativa do Brasil promulgada em 05 de
outubro de 1988, constitui-se o Estado Democrático de Direito e tendo como seus princípios

Doutor em Direito Civil pela Universidade de São Paulo (USP). Mestre em História do Direito pela Université
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Paris II. Promotor de Justiça do Ministério Público do Estado de São Paulo. Professor do curso de Mestrado do
Centro Universitário Salesiano de São Paulo UNISAL Campus Lorena.
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Mestrando em Direito pelo Centro Universitário Salesiano de São Paulo UNISAL Campus Lorena (SP).
E-mail: jaimenascimento@mpsp.mp.br e advbiel@gmail.com

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fundamentais inseridos a cidadania e a dignidade da pessoa humana em seu artigo 1º inciso II e
o inciso III respectivamente (BRASIL, 1988).
Também nos direitos e garantias fundamentais a cidadania está prescrita no artigo 5º em seus
incisos XXXIV, LIV, LXXI, LXXIII e LXXVII e artigo 60 § 4º.
Do mesmo modo, a dignidade da pessoa humana está prescrita nos artigos 5º, 34 em seu inciso
VII, alínea b, 226 §7º, 227 e 230 desta mesma Carta Magna.
A inserção dos direitos humanos rege pelas relações internacionais conforme prescrito no
artigo 4º inciso II, sobre a prevalência dos direitos humanos, inclusive através do Decreto nº
678 de 06 de novembro de 1992 que promulgou a Convenção Americana sobre os Direitos
Humanos, conhecida por Pacto de São José da Costa Rica.
Por outro lado, como objetivo fundamental da República Federativa do Brasil tem-se a
promoção do bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer
outras formas de discriminação, conforme prescrito em seu artigo 3º, inciso IV.
De forma equivalente, estes princípios e direitos estão consagrados na Constituição Política da
República do Chile, aprovada em plebiscito em 11 de setembro de 1980, conforme prescritos
nos artigos 1º, 4º e 5º, bem como descritos no artigo 19 onde guardam semelhança com a
Constituição da República Federativa do Brasil, promulgada em 5 de outubro de 1988.
Este artigo alicerça-se num esforço de conhecer com mais profundidade o tema cidadania e
intolerância, discutindo posições de alguns intelectuais acerca de sua conformação legal, e
suas implicações para o exercício da dignidade da pessoa humana.
Nesse mister fazemos uma abordagem sucinta acerca da importância da evolução histórica dos
direitos humanos como forma de ampliar o exercício da cidadania, destacando algumas
posições das diversas forças sociais e políticas que atuam e refletem sobre essa realidade
principalmente no tocante a democracia participativa.
A realização da pesquisa empírica se efetivará basicamente através de uma análise documental
nos dispositivos legais de políticas públicas (leis, decretos, resoluções, regimentos internos)
visando analisar as possíveis alternativas de formulação, implementação e controle social das
políticas propostas que permitam o exercício da cidadania com a inibição da intolerância.
Portanto embasaremos os principais pontos deste artigo em uma breve revisão bibliográfica,
considerando que o assunto por ser contemporâneo e dinâmico, normalmente surge nos meios
de comunicação como artigos e periódicos científicos, jornais, revistas e, atualmente, com
disponíveis nos acervos das bibliotecas, na rede Internet e repartições públicas.
Recorremos às contribuições de vários autores como BOBBIO (1992), BITTAR (2004),
DALLARI (2004), BONAVIDES (2006, 2008), RICOEUR (2009), OLIARI (2013) e outros
autores, que nos permitiram evidenciar diversas nuances e enfoques que perpassam a questão
da cidadania e a intolerância.

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Assim o trabalho foi estruturado na evolução histórica, o conceito de cidadania, direitos
humanos e cidadania, a intolerância como prática antagônica ao exercício dos direitos
humanos já consagrados no Brasil e no Chile após o período pós Constituição 1988 e 1980
respectivamente.
1.EVOLUÇÃO HISTÓRICA DOS DIREITOS HUMANOS
A Declaração Universal dos Direitos Humanos foi aprovada pela Organização das Nações
Unidas (ONU) em 10 de dezembro de 1948 e tinha como finalidade defender as liberdades
fundamentais do Homem. Por decorrer de um momento histórico em que ganhavam destaque
a democratização, a descolonização e a luta contra o preconceito sob todas as formas, pode-se
afirmar que a Declaração dos Direitos Humanos se consolidou como a materialização das
aspirações e reivindicações dos povos e do Homem (MBAYA, 1997, p.18).

uma vida digna, na qual o indivíduo possui condições adequadas de existência, participando

Os direitos humanos podem ser conceituados como prerrogativas inerentes à dignidade


humana que são reconhecidas na ordem constitucional dos Estados (CHIMENTI, CAPES e
ROSA, 2008, p. 46).
Ainda a mesma autora (2013, p.34), por serem inerentes ao ser humano, os direitos humanos
encontra o seu fundamento na noção de dignidade da pessoa humana, referindo-se à
concepção jusnaturalista de Ingo Sarlet (2010, p. 43) onde ressalta que na ideia da dignidade da

condição humana e independente de qualquer outra circunstância, é titular de direitos que


deve ser reconhecidos e respeitados por seus semelhantes e pelo Es
Contudo segundo Tolfo (2013, p.35), apesar da premissa de que os direitos humanos são
próprios da essência do ser humano, foi necessário o reconhecimento jurídico desses direitos
para que os mesmos tivessem exigibilidade em relação ao Estado conforme as concepções

A consciência dos direitos humanos conduz à emancipação das pessoas perante o seu contexto
social, lastreado ao conceito de cidadania, em construção permanente em razão da evolução
do processo histórico, acumulando novos valores e conquistas.
Ao referir-se à proteção jurídico-constitucional dos direitos do homem Tolfo (2013, p.35),
citando Bobbio, nota que:
Quando os direitos do homem eram considerados unicamente como direitos naturais, a única
defesa possível contra a sua violação pelo Estado era um direito igualmente natural, o
chamado direito de resistência. Mais tarde, nas Constituições que reconheceram a proteção

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jurídica de alguns desses direitos, o direito natural de resistência transformou-se no direito
positivo de promover uma ação judicial contra os próprios órgãos do Estado.
Para Soares (2004), os Direitos Humanos são, portanto, universais, naturais e ao mesmo tempo
históricos. São naturais e universais porque vinculados à natureza humana, mas são históricos
no sentido de que mudaram ao longo do tempo, num mesmo país e o seu reconhecimento é
diferente em países distintos, num mesmo tempo.
Ainda segundo a mesma autora (2004), o conjunto dos Direitos Humanos é classificado em
três dimensões, ou gerações ou seja, são gerações no sentido da evolução histórica e não no
sentido biológico, pois não são superados com a chegada de uma nova geração, os direitos
precedentes continuam incorporados na geração seguinte.
Na sua concepção, a primeira geração, ou dimensão, é a das liberdades individuais, ou os
chamados direitos civis. São as liberdades consagradas no século XVIII, com o advento do
liberalismo; constituem direitos individuais contra a opressão do Estado, contra o absolutismo,
as perseguições religiosas e políticas, contra o medo avassalador em uma época em que
predominava o arbítrio e a distinção em castas, em estamentos, mais do que em classes sociais.
Portanto, trata-se das liberdades de locomoção, propriedade, segurança, acesso à justiça,
associação, opinião e expressão, crença religiosa, integridade física. Essas liberdades
individuais, também chamadas direitos civis, foram consagradas em várias declarações e
firmadas nas constituições de diversos países.
Continuando a mesma autora (2004), a segunda dimensão é a dos direitos sociais, do século
XIX e meados do século XX. São todos aqueles direitos ligados ao mundo do trabalho, como o
direito ao salário, jornada fixa, seguridade social, férias, previdência dentre outros.
São também aqueles direitos que não estão vinculados ao mundo do trabalho considerados
mais importantes, uma vez que são direitos de todos e não apenas daqueles que estão
empregados.
Trata-se dos direitos de caráter social mais geral, como o direito à educação, saúde, habitação,
lazer e, novamente, segurança. São direitos marcados pelas lutas dos trabalhadores já no
século XIX e acentuadas no século XX, as lutas dos socialistas e da socialdemocracia, que
desembocaram em revoluções e no Estado de Bem-Estar Social.
Atualmente no Brasil e nos países efetivamente democráticos, são igualmente reconhecidos

Por fim, Soares (2004) define como terceira dimensão é aquela dos direitos coletivos da
humanidade. Referem-se esses à defesa ecológica, à paz, ao desenvolvimento, à
autodeterminação dos povos, à partilha do patrimônio científico, cultural e tecnológico.

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Assim sendo, testes nucleares, devastação florestal, poluição industrial e contaminação de
fontes de água potável, além do controle exclusivo sobre patentes de remédios e das ameaças
das nações ricas aos povos que se movimentam em fluxos migratórios (por motivos políticos
ou econômicos), por exemplo, independentemente de onde ocorram, constituem ameaças aos
direitos atuais e das gerações futuras.
O direito a um meio ambiente não degradado já se incorporou à consciência internacional

O mesmo ocorre com a dominação econômica dos países ricos, sob a hegemonia norte-
americana, secundada pelo G-8.
Essa dominação implacável identifica uma óbvia violação do direito mundial ao
desenvolvimento. E a consciência desse direito univer

às reuniões dos grandes órgãos da economia globalizada, que pretendem impor as suas regras
de um novo e devastador imperialismo.
Além das três gerações ou dimensões clássicas, descritas por Soares (2004) a partir da leitura
das definições estabelecidas por Karel Vasak e por Noberto Bobbio, atualmente se estuda a
existência de outras, decorrentes dos avanços sociais, genéticos e tecnológicos.
Na atualidade existem doutrinadores que defendem a existência dos direitos de quarta geração
ou dimensão, apesar de ainda não haver consenso na doutrina sobre qual o conteúdo dessa
-se dos direitos relacionados à

Já para Bonavides (2006, p.571-572), que defende a existência dos direitos de quarta geração,
com aspecto introduzido pela globalização política, relacionados à democracia, à informação e
ao pluralismo, conforme abaixo transcrito:
A globalização política neoliberal caminha silenciosa, sem nenhuma referência de valores. (...)
Há, contudo, outra globalização política, que ora se desenvolve, sobre a qual não tem
jurisdição a ideologia neoliberal. Radica-se na teoria dos direitos fundamentais. A única
verdadeiramente que interessa aos povos da periferia. Globalizar direitos fundamentais
equivale a universalizá-los no campo institucional. (...) A globalização política na esfera da
normatividade jurídica introduz os direitos de quarta geração, que, aliás, correspondem à
derradeira fase de institucionalização do Estado social. É direito de quarta geração o direito à
democracia, o direito à informação e o direito ao pluralismo.
Deles depende a concretização da sociedade aberta do futuro, em sua dimensão de máxima
universalidade, para a qual parece o mundo inclinar-se no plano de todas as relações de
convivência. (...) os direitos da primeira geração, direitos individuais, os da segunda, direitos
sociais, e os da terceira, direitos ao desenvolvimento, ao meio ambiente, à paz e à fraternidade,

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permanecem eficazes, são infra-estruturais, formam a pirâmide cujo ápice é o direito à
democracia.
Segundo Oliveira (2013, p.17), a quarta geração dos direitos do homem se refere à manipulação
genética, à biotecnologia e à bioengenharia, abordando reflexões acerca da vida e da morte,
pressupondo sempre um debate ético prévio. Através dessa geração se determinam os
alicerces jurídicos dos avanços tecnológicos e seus limites constitucionais.
Destaca-se como fundamental a Declaração Universal sobre o Genoma Humano e os Direitos
Humanos, adotada pela Conferência Geral da Organização das Nações Unidas para a
Educação, Ciência e Cultura (UNESCO) na sua 29.ª sessão, a 11 de Novembro de 1997 e
endossada pela Assembléia Geral das Nações Unidas através da Resolução nº 53/152, de 9 de
Dezembro de 1998, que reconhece o genoma humano como patrimônio da humanidade, com a
proibição de sua comercialização ou seja objeto de negociação econômica e financeira e
prescrevendo que ninguém pode ser discriminado em virtude de suas características
genéticas.
Ainda segundo Oliveira (2013, p.22), busca-se a preservação da individualidade humana e da
diversidade do genoma, proibindo o seu uso com fins não humanísticos, meramente privatista.

Bonavides (2008, p.82) conceitua que a concepção da paz no âmbito da normatividade jurídica
configura um dos mais notáveis progressos já alcançados pela teoria dos direitos
fundamentais.
Assim o direito à paz é concebido ao pé da letra qual direito imanente à vida, sendo condição
indispensável ao progresso de todas as nações, grandes e pequenas, em todas as esferas.
Iss
visibilidade superior aos demais direitos fundamentais.
A dignidade jurídica da paz deriva do reconhecimento universal que se lhe deve enquanto
pressuposto qualitativo da convivência humana, elemento de conservação da espécie, reino de
segurança dos direitos.
A seu parecer, em termos de legitimidade e democracia, jamais há de prosperar, em países
periféricos, Estado de Direito sem Estado Social.
Para Bonavides (2008, p.93), a lição conclusiva destas reflexões se resume desse modo em
fazer a paz axioma da democracia, designadamente a democracia participativa, com seus
instrumentos, com sua teoria, com seus valores de igualdade e justiça social, já inscritos por
direito positivo pelos legisladores constituintes que promulgaram no Brasil, em 1988, a Carta
republicana em vigor.

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Para o mesmo autor (2008, p.82) conclui sobre a importância de reconhecimento jurídico do
direito à paz e sua íntima integração a compreensão de democracia. Destaca a paz como um
direito fundamental de quinta geração que legitima o estabelecimento da ordem, da liberdade
e do bem comum na convivência dos povos.
Assim, a nova dimensão de direitos fundamentais reserva ao direito à paz o papel central de
supremo direito da humanidade.
Neste sentido, Cunha Junior (2012, p. 539) conclui que:
As gerações dos direitos revelam a ordem cronológica do reconhecimento e afirmação dos
direitos fundamentais, que se proclamam gradualmente na proporção das carências do ser
humano, nascidas em função da mudança das condições sociais.
A partir daí, fundamental a análise da correlação existente entre cidadania e intolerância.
2. CIDADANIA E INTOLERÂNCIA
Para Zvirblis (2006, p.169) a cidadania se constitui em liberdade política, no exercício dos
direitos, quer no aspecto de liberdade negativa, liberdade de ação, quer no aspecto de
liberdade positiva, de vontade, conforme bem apontado por Norberto Bobbio.
Cita ainda que Hannah Arendt conceituou a cidadania como o estado de pertencer a uma

Portanto para o mesmo autor (2006, p.169), ser cidadão é ter direito à vida, à liberdade, à
propriedade, à igualdade perante a lei; é, em resumo, ter direitos civis, bem como participar do
destino da sociedade, votar, ser votado e ter direitos políticos.
Destaca ainda, que cidadania se constitui em um dos fundamentos do Estado Democrático de
Direito (art. 1°, inciso II, da Constituição brasileira); é o direito de participar da vida política do
Brasil.
Mas, para isso, deve ser adquirida e pelas condições fixadas pelo próprio Estado, como pode
decorrer do nascimento ou de determinadas condições e pressupostos estabelecidos pelo
próprio Estado.
Ainda para Zvirblis (2006, p.170), a condição de cidadania traz como conseqüência direitos e
deveres que acompanham o indivíduo mesmo que se afaste de seu Estado.
Portanto, a cidadania ativa não pode deixar de preencher os requisitos exigidos pelo Estado,
pois, caso contrário, o indivíduo poderá perdê-la, sendo esta perda de suma gravidade,
mormente se o indivíduo não tiver condições de ser cidadão de outro Estado, ficando
impossibilitado de conviver em associações. Desta maneira, a perda só pode ocorrer em casos
em que for absolutamente necessária.

possibilidade de participar ativamente da vida e do g

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Não obstante as dificuldades de se conceituar o termo cidadania, clássico é a definição de
Marshall, que, analisando a evolução histórica da cidadania no Reino Unido, desenvolveu a
distinção entre as três dimensões da cidadania: civil, política e social, de forma que seria
considerado cidadão àquele titular das três categorias de direitos correspondentes.
A cidadania não se restringe a delegação ao Estado da tarefa de promover a justiça social,
concepção eivada nas ideias de assistencialismo e paternalismo, mas compreende uma postura
ativa dos cidadãos, uma vez que são eles que possuem as condições para promover a
transformação de sua realidade (BITTAR, 2004).
Segundo Domingos e Ramalho (2012, p. 5), o controle social é a participação na gestão pública
que garante aos cidadãos espaços para influir nas políticas públicas, além de possibilitar o
acompanhamento, avaliação e a fiscalização das instituições públicas e organizações não
governamentais, visando assegurar os interesses da sociedade.
Portanto, o controle social é um dos instrumentos de efetivação da democracia participativa,
que por conseqüência faz jus a aplicação da quinta geração dos direitos humanos.
Com essa atitude de participação, acompanhamento e fiscalização, o cidadão exerce o controle
social, interferindo no direcionamento das políticas públicas, exigindo e promovendo a
transparência e o uso adequado dos recursos públicos. Esse exercício ocorre em espaços
públicos de articulação entre governo e sociedade, constituindo importantes mecanismos de
fortalecimento da cidadania. (BRASIL, 2011, p. 30).
Para Ruas (2009, p.19), é importante desenvolver a compreensão de que as políticas públicas
são resultantes da atividade política e que esta consiste na resolução pacífica de conflitos,
processo essencial à preservação da vida em sociedade.
Segundo Salles (2010, p.79), a participação social, quando efetiva, é capaz de elevar a
governabilidade, pois tende a impactar a máquina administrativa promovendo maior
transparência, agilidade e flexibilidade, garantindo a adaptabilidade de longo prazo das
políticas públicas.
Para Salles (2010, p.43) citando Leonardo Avritzer, a partir da institucionalização de diversas
sugestões de medidas surgidas no processo de redemocratização, emergiram no País formas de
representação não eleitoral, ou representação por afinidade, categoria na qual se incluem os
Conselhos Municipais.
Da mesma autora (2010, p. 47), os conselhos responsáveis pela democratização das políticas
sociais contribuíram para o resgate d
redemocratização. Entre elas destacamos: a da saúde (Lei Orgânica da Saúde), a da assistência
social (Lei Orgânica da Assistência Social), a da proteção à criança e ao adolescente (Estatuto
da Criança e do Adolescente) e, as mais recentes, a da política urbana (Estatuto da Cidade) e da
Cultura (Sistema Nacional de Cultura).

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Há o entendimento que tais conselhos funcionam no Brasil como instrumentos democráticos
de participação popular, com a aparência do desenvolvimento de "uma nova cultura vinculada
tanto à dimensão dos direitos sociais inscritos na Constituição de 1988 como à participação de
uma pluralidade de atores sociais com presença na cena pública, na perspectiva de uma
democracia participativa." (SANTOS JÚNIOR, 2001, p. 1).
Para Dallari (2004, p.22), os objetivos econômicos do neoliberalismo brasileiro, presentes na
carta magna como por exemplo a garantia do lucro ilimitado e a integralidade do direito de
herança, privilegiam os interesses privados em detrimento dos interesses públicos, e por tal
razão, o exercício pleno da cidadania de algumas categorias esbarra sempre na indiferença dos
setores econômicos dominante.
Neste sentido a intolerância atua nos diversos modos seja política, religiosa, ideológica, de
raça, de gênero, de comportamento, de ideias manifestadas ao longo da civilização humana,
um dos principais fatores responsáveis pela violência e por desequilíbrios e descontroles
sociais.
o sistemático e de
agressividade irracional com relação a indivíduos e grupos específicos, à sua maneira de ser, a

Trata- aráter

Ainda segundo o mesmo autor (2003, p.12) a história das sociedades humanas até o presente é
uma história de permanente intolerância.
Com o advento da internet, as redes sociais permitem instrumentalizar as manifestações de
forma endêmica ressuscitando grupos ideológicos que se permeiam pela intolerância como
elemento essencial para sua propagação.
Anibal (2014), por sua vez, aponta que o extremismo com atos de intolerância ganha respaldo
no anonimato proporcionado pela internet. Ela exemplifica, mencionando o campo destinado
a comentários de notícias em sites, infestados de observações carregadas de fanatismos.
Nesse sentido:
Esse radicalismo impressiona e assusta. Por um lado, temos uma facilidade de comunicação,

jogados na internet revelam, infelizmente, uma sociedade conservadora e individualista,


.

combustível no descrédito pelo qual passam as instituições.


Assim:

460
Há uma crise de legitimidade. A pessoa não legitima [as instituições], mas não sabe o que quer
no lugar. É uma atitude criticista: critica-
porque esses movimentos podem abrir caminho para uma liderança populista e

Para Coêlho (2012), a intolerância e o autoritarismo se manifestam conjuntamente,


configurando como duas faces do mesmo problema social, que são antagônicos e
incompatíveis com a cidadania, a democracia, que pressupõe a pluralidade, com o respeito ao
outro e com a convivência entre os diferentes.
Não por acaso, as pessoas intolerantes tendem ao autoritarismo. Os regimes extremistas
costumam ser ditatoriais e de exceção. Neste diapasão, a ditadura é o regime como expressão
máxima dos intolerantes.

individualismo, incompatíveis com o respeito aos direitos humanos.


A experiência negativa do menosprezo assume então a forma específica de sentimentos de
exclusão, de alienação, de opressão, e a indignação que deles provém pôde dar às lutas sociais a
forma da guerra, quer se trate de revolução, de guerra de libertação, de guerra de
descolonização (RICOEUR, 2006, p. 215).
O Brasil é um Estado laico desde a primeira República, uma vez que já no governo republicano
provisório foi promovida a separação entre a Igreja e o Estado, através do Decreto 119-A, de 17
de janeiro de 1890, que posteriormente foi confirmado pela primeira Constituição
Republicana, em 1891.
A presente Constituição Federal de 1988 prescreve em seu artigo 19, o seguinte:
É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
I estabelecer cultos religiosos ou igrejas, subvencioná-los, embaraçar-lhes o funcionamento
ou manter com eles ou seus representantes relações de dependência ou aliança, ressalvada, na
formada lei, a colaboração de interesse público.
A inserção dos direitos humanos rege pelas relações internacionais conforme prescrito no
artigo 4º inciso II, sobre a prevalência dos direitos humanos, inclusive através do Decreto nº
678 de 06 de novembro de 1992 que promulgou a Convenção Americana sobre os Direitos
Humanos, conhecida por Pacto de São José da Costa Rica.
Por outro lado, como objetivo fundamental da República Federativa do Brasil tem-se a
promoção do bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer
outras formas de discriminação, conforme prescrito em seu artigo 3º, inciso IV.
De acordo com Ricoeur:
não posso limitar o meu desejo por uma obrigação, sem pôr o direito do outro a existir de
algum modo. Reciprocamente reconhecer o outro é me obrigar de alguma maneira, pois
461
obrigação e existência do outro são duas posições correlativas. O outro é um centro de
obrigação para mim, e a obrigação é um resumo abstrato de comportamentos possíveis para
com o outro (2009, p. 319)
Segundo Gonçalves (2012, p. 89), a liberdade religiosa que hoje se propaga e se busca através
dos elementos protetivos de Direitos Humanos é fruto direto de uma evolução histórica da
própria religião, bem como de sua influência na vida das pessoas e da disputa pelo poder entre
o Estado e a Igreja. E a tolerância será o resultado de toda uma construção dos organismos
internacionais em defesa dos direitos do homem, ou os Direitos Humanos.
Conforme assevera Silva (2016, p. 250), a liberdade de religião engloba, na verdade, três tipos
distintos, porém intrinsecamente relacionados de liberdades: a liberdade de crença; a
liberdade de culto; e a liberdade de organização religiosa.
A liberdade de religião e de opinião é considerada por muitos como um direito humano
fundamental.
Para Oliari (2013, p.10), a liberdade de religião inclui ainda a liberdade de não seguir nenhuma
religião, ou mesmo de não ter opinião sobre a existência ou não de Deus (agnosticismo e
ateísmo).
Porém segundo Steck (2013), a intolerância religiosa manifesta como um conjunto de
ideologias e atitudes ofensivas a crenças e práticas religiosas ou a quem não segue uma
religião, configurando como crime de ódio que fere a liberdade e a dignidade humana.
A liberdade religiosa se põe diante de todas as ideias e principalmente seguimento do próprio
ser humano.
Oliari (2013, p.10) destaca que a Declaração Universal dos Direitos Humanos, adotada pelos 58
Estados membros do conjunto das Nações Unidas, em 10 de dezembro de 1948, definia a
liberdade de religião e de opinião no seu artigo 18:
Todo o homem tem direito à liberdade de pensamento, consciência e religião; este direito
inclui a liberdade de mudar de religião ou crença e a liberdade de manifestar essa religião ou
crença, pelo ensino, pela prática, pelo culto e pela observância, isolada ou coletivamente, em
público ou em particular.
A Declaração para Eliminação de todas as Formas de Intolerância e Discriminação com base
em religião ou convicção (ONU, 25/11/1981), que completará 36 anos, representa um marco
significativo no reconhecimento da diversidade religiosa, com o devido respeito às diferenças e
estimulando a convivência amistosa entre as diferentes religiões. (BRASIL, 2011).
A Declaração Universal dos Direitos Humanos proclama que:

, a tolerância

462
A Lei federal brasileira nº 7.716/1989 posteriormente atualizada pela Lei federal nº 9.459/97,
dispõe sobre o combate à discriminação de pessoas com base religiosa, como a discriminação
de mulheres, de pessoas com deficiência, a homofobia e a xenofobia de fundamentação
religiosa.
No Chile, a seu turno, a Lei nº 20.609 publicada em 24 de julho de 2012, que estabelece
medidas contra a discriminação ou seja, Lei Antidiscriminação conhecida como Lei Zamudio,
veio ao encontro do combate à discriminação estabelecendo medidas e incluindo novas
categorias de discriminação.
A Declaração Sobre os Direitos das Pessoas Pertencentes a Minorias, promulgada em
Assembleia Geral das Nações Unidas, em 1992, dispõe sobre os problemas das minorias
nacionais e étnicas, religiosas ou linguísticas ressaltando a necessidade da cooperação
internacional para a promoção e a proteção dos direitos das pessoas pertencentes a grupos
minoritários e a promoção da amizade entre os povos.
Com a intensificação atual da intolerância, da violência, do terrorismo, da xenofobia, do
nacionalismo agressivo, do racismo, do antissemitismo, da exclusão, da marginalização e da
discriminação contra minorias nacionais, étnicas, religiosas e linguísticas, dos refugiados, dos
trabalhadores e das trabalhadoras migrantes, dos imigrantes e dos grupos vulneráveis da
sociedade e também pelo aumento dos atos de violência e de intimidação cometidos contra
pessoas que exercem sua liberdade de opinião e de expressão, todos comportamentos que
ameaçam a consolidação da paz e da democracia no plano nacional e internacional e
constituem obstáculos para o desenvolvimento, foram primordiais para a Declaração de
Princípios sobre a Tolerância. (BRASIL, 2011)
Assim a Declaração de Princípios sobre a Tolerância, promulgada em 1995, pela Conferência
da UNESCO, dispõe sobre as ações das Nações Unidas contra a discriminação racial e a
promoção da educação em direitos humanos e os direitos das populações indígenas do mundo,
além da preocupação com a intensificação da intolerância, da violência e da discriminação
étnica, religiosa linguística, de grupos vulneráveis. (BRASIL, 2011)
A Declaração Universal sobre a Diversidade Cultural, promulgada pela UNESCO em 2011,
constitui-se a partir da compreensão de que os direitos culturais são parte integrante dos
direitos humanos e que a diversidade cultural é patrimônio comum da humanidade e fator de
desenvolvimento e da solidariedade universal. (BRASIL, 2011).
A Convenção Interamericana contra toda forma de discriminação e intolerância, promulgada
pela Organização dos Estados Americanos em 2013, constitui-se em documento juridicamente
vinculativo como parte integrante dos direitos humanos e que seja promovida a total e de
erradicação incondicional de todas as formas de discriminação, considerando que é uma
obrigação dos Estados em adotar medidas a nível nacional e regional para promover e
incentivar o respeito a observância dos direitos humanos e liberdades fundamentais de todos
indivíduos e grupos .

463
Do mesmo modo, a Convenção Interamericana contra o racismo, a discriminação racial e
outras formas de intolerância, também promulgada pela Organização dos Estados Americanos
em 2013.
Estes dois instrumentos são considerados os mais importantes antidiscriminação adotadas em
todo o continente, tendo o Chile se tornado signatário em 2015.
Todo ser humano tem direito ao reconhecimento, gozo, exercício e proteção em pé de
igualdade, de todos os direitos humanos e liberdades fundamentais consagrados em suas leis
nacionais e instrumentos internacionais aplicáveis aos Estados Partes, tanto individualmente
como coletivamente.
4.CONCLUSÃO
Ainda assim, está de longe a implementação dos princípios da democracia participativa, uma
vez que o poder econômico ainda impõe a democracia representativa que prestigia
exclusivamente o indivíduo em detrimento do coletivo.
Assim exercício da plena cidadania ainda está comprometido, tornando hibrida e inibindo o
processo coletivo.
Assim formar de organização e articulação da sociedade civil em conjunto com as instituições
governamentais podem refletir em formas de implementação de políticas públicas e permitam
exercer a cidadania em detrimento das formas de intolerância.
Conclui-se que as religiões devem ser respeitadas, mas também devem exercer o respeito às
diferenças e às diversidades, com a convivência numa sociedade democrática, livre, plural e
principalmente promovendo a igualdade, a solidariedade, a justiça, a liberdade da
manifestação e expressão, convicção ou crença, a superação dos preconceitos e discriminações
e a predominância dos direitos humanos alicerçados pelos fundamentos básicos da
Constituição da República Federativa do Brasil.
Tornar efetivo o valor constitucional da igualdade, diminuindo as desigualdades sociais e
regionais, bem assim efetivando o pleno respeito aos direitos humano, eis a meta a ser
alcançada para impedir a escalada da intolerância e assegurar a vitória do regime da
pluralidade, da fraternidade e da centralidade da pessoa humana.
Assim os direitos políticos, inerentes a democracia, e os direitos individuais de liberdade, são
indissociáveis.
Desta forma, os discursos e políticas sobre a tolerância dissimulam o problema da
desigualdade social e escamoteiam os interesses de dominação e exploração econômica do
sistema.
Portanto, sem alterar o sistema econômico que produz miséria, violência e exclusão, cabe aos
sujeitos, no limite de suas individualidades, adotar comportamentos de respeito à tolerância e

464
de valorização da diversidade, a fim de supostamente promover uma sociedade mais justa,
inclusiva e democrática.
Temos constatados que os direitos humanos são reconhecidos pelo sistema político, porém
não são concedidos.
É latente a intolerância e o autoritarismo se manifestam como duas faces do mesmo problema
social, que são antagônicos e incompatíveis com a cidadania, a democracia, que pressupõe a
pluralidade, com o respeito ao outro e com a convivência entre os diferentes.
Não podemos deixar de exemplificar o recente atentado ocorrido em 11 de junho de 2016, onde
aproximadamente cinquenta pessoas foram mortas por um fundamentalista religioso em
consequência da intolerância religiosa com não aceite do outro, no caso, da intolerância
homofóbica, sem falar de outras violências praticadas pelo suposto Estado Islâmico.
Importante destacar que as iniciativas encartadas nas legislações brasileiras e chilenas
permitem criar as bases para instaurar as medidas protetivas judiciais para a concretização do
direito e visando combater eficazmente toda forma de discriminação.
De modo que o Estado em articulação com a sociedade possa elaborar e implementar políticas
públicas para garantir o exercício de seus direitos e liberdades.
Mas o cerne da intolerância deve ser combatido quando se permite desenvolver mecanismos
de democracia participativa com a participação da população enquanto cidadãos além do
controle social, buscando uma redistribuição da riqueza produzida de forma linear horizontal
promovendo a inclusão social e econômica dentro do processo de Justiça social.
Neste sentido o Chile promulgou a Lei Antidiscriminação denominada Lei Zamudio, que pune
os atos arbitrários motivados por sexo, raça ou condição social, avançando contra seu
tradicional conservadorismo.
Enfim, a convergência normativa das legislações permitirá a concretização da proteção destes
direitos.
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467
EL DESARROLLO SOSTENIBLE EN EL ENTRECRUZAMIENTO ENTRE EL DERECHO
AL MEDIO AMBIENTE Y EL DERECHO AL DESARROLLO
239

the imperative of
the twenty-first century. Saving our planet, lifting people out of poverty, advancing economic
growth these are one and the same fight. We must connect the dots between climate change,

Solutions to one problem m 240

INTRODUCCIÓN

respecto de los que tiene relación con el medio ambiente y el desarrollo sostenible:
ta contra la degradación, incluso mediante el consumo y
la producción sostenibles, la gestión sostenible de sus recursos naturales y medidas urgentes
para hacer frente al cambio climático, de manera que pueda satisfacer las necesidades de las
generaciones 241

En el extracto precedente, los Estados del mundo vinculan desarrollo sostenible, derecho al
desarrollo y derecho a un medio ambiente saludable. En consonancia, en el caso de Chile, el
Programa de Gobierno de la Presidenta Michelle Bachelet 2014-2018 se comprometía en
materia de medio ambiente a lo siguiente:

contaminación afectan con mayor severidad la calidad de vida de la población más vulnerable.
Tenemos el deber de cambiar esta realidad. La sustentabilidad exige no sólo equilibrar
crecimiento económico y protección ambiental, sino también, hacerlo con equidad social. Este
será el eje de nuestra gestión: lograr mayor equidad ambiental.

Hoy el desarrollo sustentable que nuestra ciudadanía reclama, implica un actuar decidido del
Estado para conservar el patrimonio natural y cultural, hacer un uso racional de los recursos,
impulsar una mejor calidad de vida y generar una visión y ocupación equilibrada y equitativa

Abogado (Chile), Doctor en Derecho (España), Magister en Relaciones Internacionales (España), Master en
239

Derechos Humanos y Derecho Humanitario (Francia). Postdoctorado en el Max Planck Institute for Comparative
Public Law and International Law (Heidelberg, Alemania). Profesor de Derecho Constitucional, Internacional,
Ambiental y Derechos Humanos, Centro de Estudios Constitucionales de Chile, Universidad de Talca (Santiago,
Chile). Subdirector del Centro de Estudios Constitucionales de Chile (Santiago, Chile). gaguilar@utalca.cl
240
Secretary-General, Introducing Report in General As
Doc. SG/SM/13823-GA/11148, 21 September 2011.
Asamblea General: Transformar nuestro mundo: la Agenda 2030 para el Desarrollo Sostenible. Doc. A/RES/70/1,
241

de fecha 21 de octubre de 2015. Preámbulo.

468
de los territorios, atendiendo la voz de nuestra gente que legítimamente exige mayor
participación en las definiciones sobre los proyectos que inciden en su calidad de vida o que
242

Por su parte, la cuenta pública de la Presidenta Michelle Bachelet del año 2016 señalaba la
Agenda 2030 para el Desarrollo Sostenible dentro de los principales logros alcanzados durante
el período mayo de 2015 a mayo de 2016. En efecto, mensaje de la Presidenta de Chile
mencionaba lo siguiente:

Naciones Unidas, ONU, en septiembre de 2015, orientará el trabajo de dicha organización y las
políticas públicas nacionales de sus miembros durante los próximos quince años. El eje central
de la agenda son las personas y su bienestar, y busca promover el desarrollo inclusivo,
igualitario y sostenible.
Los Objetivos de Desarrollo Sostenible, ODS, tendrán un impacto a nivel internacional,
regional y, sobre todo, nacional. Chile tiene un compromiso con el cumplimiento de las metas
de cada objetivo, por lo que los ODS tendrán un efecto directo en todas las políticas públicas a
nivel nacional durante los próximos quince años. Los 17 objetivos están diseñados para
promover y asegurar el desarrollo social y económico sostenible e inclusivo, así como a
garantizar la protección medioambiental, en beneficio de todos los ciudadanos, de ésta y de las
próximas generaciones, sin distinción de edad, sexo, discapacidad, cultura, raza, etnia, origen,
243

En estas declaraciones oficiales del gobierno de Chile se insiste en un completo compromiso


del Estado con la Agenda 2030 para el Desarrollo Sostenible. Es más, la propia Presidenta
declara que esta Agenda orientará las políticas públicas nacionales durante los próximos
quince años y que Chile tiene un compromiso con el cumplimiento de las metas de cada
objetivo, por lo que los Objetivos de Desarrollo Sostenible (ODS) tendrán un efecto directo en
todas las políticas públicas a nivel nacional durante los próximos quince años.
Estas declaraciones y compromisos gubernamentales contrastan fuertemente con relevantes
hechos recientes que permiten preguntarse si es que efectivamente las políticas públicas
nacionales han tomado en serio la Agenda 2030.
Durante parte del mes de enero y febrero de 2017 toda la población de Chile asistió a través de
la difusión incesante por la televisión y los diversos medios a presenciar incendios forestales
en la zona central de Chile de gran magnitud y dramatismo. Se observó incluso que se trataba
de los incendios forestales más grandes registrados en la historia del país. Las consecuencias

242
Programa de Gobierno de Michelle Bachelet 2014-2018, p 126. Disponible en:

243
Mensaje Presidencial, 21 de mayo de 2016. Michelle Bachelet, Presidenta 2014-2018, p. 54. Disponible en:

469
de estos incendios se hicieron sentir con especial fuerza sobre los grupos más vulnerables.244
Baste recordar a este respecto la terrible destrucción por las llamas del poblado de Santa Olga,
luego declarada zona de catástrofe.245
Por otra parte, el día 20 de abril de 2017, Aguas Andinas, la empresa privada metropolitana de
distribución de agua, anuncia corte masivo de agua en Santiago a raíz de las lluvias que se
habían producido en la zona.246
climático llegó para quedarse en nuestra región, en nuestro país, ustedes han presenciado lo
247

Esta presentación pretende examinar brevemente la interconexión que existe entre desarrollo
sostenible, derecho humano al medio ambiente y derecho al desarrollo. Para llevar a cabo este
somero análisis este trabajo se divide en dos partes. En la primera parte abordaremos
someramente el concepto de desarrollo sostenible. En la segunda parte, examinaremos la
vinculación existente entre el concepto de desarrollo sostenible y los derechos humanos.
1. DESARROLLO SOSTENIBLE

forjado en los años 1970. Uno de sus principales exponentes es el profesor Sachs. De acuerdo
con este autor, el ecodesarrollo se caracterizaría por los siguientes tres elementos:

equitativo del tener" (según la sugestiva aunque imprecisa fórmula de Joseph Lebret);
(B) la aceptación voluntaria de las limitaciones ecológicas basada en un principio, el de
solidaridad diacrónica (o intergeneracional), que completa al de solidaridad sincrónica
subyacente al desarrollo social; y

244

madera. Ya cuentan con servicios básicos de luz, agua potable (a través del programa de Agua Potable Rural) y antes

Emol, 26 de Enero de 2017.


-Olga-la-localidad-forestal-que-
desaparecio-con-el-
245
Vid. Incendio forestal en Santa Olga arrasó un número indeterminado de viviendas, 26 de enero de 2017.
-de-1000-casas-destruyo-el-
incendio-forestal-en-Santa-Olga-en-la-Region-del-
246
Terram, 21 de
-en-san-jose-de-maipo-generan-segundo-corte-
masivo-de-agua-del- 17/5/2017]
247

en El Ciudadano -orrego-y-
gerente-de-aguas-andinas-culpan-al-cambio-climatico-por-cortes-de-agua-tras-
17/5/2017]

470
su importancia pese a su carácter
248

En definitiva, el objetivo perseguido sería un desarrollo socialmente justo, ecológicamente


249

ecodesarrollo, definido en sus orígenes como una guía de orientación de estrategias de


desarrollo regional, especialmente adaptado a las áreas tropicales rurales, va generalizándose
con rapidez para definir proyectos de desarrollo integral ecológicamente racionales. El
concepto se amplía para sintetizar un estilo de desarrollo más igualitario y menos dependiente
que hace hincapié en una mayor racionalidad socioambiental para el manejo de los recursos y
el espacio, utilizando diseños ecológicamente viables en la planificación del desarrollo
económico, con aplicación de tecnologías ambientalmente adecuadas y buscando asimismo un
mayor control democrático y participación popular en las decisiones sobre el ambiente físico y
250

Por su parte, Diemer sost


permite poner en evidencia una representación del desarrollo sostenible centrado en los
desafíos de la sociedad, en una aproximación pluridisciplinaria, de grandes principios éticos
laman convivialidad en los países del Norte o buen vivir en los países del Sur, esta
búsqueda de una nueva sociedad arranca su substancia de la diversidad, se trata de obtener lo
251

El ecodesarrollo precedió al concepto de desarrollo sostenible, el cual es acuñado


definitivamente en los años 1980. En efecto, la denominada Comisión Brundtland de las
Naciones Unidas forja este principio, incorporando como elementos del mismo, inter alia,
nociones de racionalidad, equilibrio, balance ecológico y sobre todo, de equidad social y
justicia ambiental con proyecciones hacia el mundo a venir. De este modo, aparece en escena
en forma explícita y conectada con el desarrollo la justicia con las generaciones futuras. En

248
«Plutôt qu'une recette, en effet, l'écodéveloppement se veut une valeur heuristique permettant de choisir les
solutions les plus appropriées à chaque écosystème naturel, social et culturel, pour garantir l'amélioration des

«Stratégies du développement», in Revue Tiers Monde, T. XXI, N°83, Juillet-Septembre 1980, p. 689;. Riechmann,

-09-30_10-56-
249
Landscape Planning,
Vol. 12, Issue 3, November 1985, pp. 211-
uploads/biblioteca/2014-09-30_10-56-

250

-09-30_10-56- el 20/4/2017]; Luis


Jiménez Herrero, Medio ambiente y desarrollo alternativo, Iepala, Madrid 1989, p. 36.
251

présentations Nord Sud du développement durable», les 19 et 20


décembre 2012, Université Blaise Pascal IUFM Auvergne. Disponible en:
-dd-

471
este sentido, algunos autores han introducido el principio de responsabilidad en el contexto de
una ética medio ambiental del futuro.252
desarrollo que satisface las
necesidades de la generación presente sin comprometer la capacidad de las generaciones
253

fundamentales: a) el concepto de 'necesidades', en particular las necesidades esenciales de los


pobres, a las que se debería otorgar prioridad preponderante; b) la idea de limitaciones
impuestas por el estado de la tecnología y la organización social entre la capacidad del medio
254

Si bien es posible encontrar rastros del desarrollo de este principio desde los años 70, no es
sino hasta el denominado Informe Un Mundo Mejor, dirigido por Gro Brundtland en 1987, que
este principio recibe su consagración a nivel mundial. De acuerdo con este Informe,
tradicionalmente se ha entendido que el desarrollo sostenible es aquel que satisface las
necesidades de las generaciones actuales, sin comprometer la capacidad de las generaciones
futuras para satisfacer sus propias necesidades. Este nuevo concepto implicó el inicio de un
debate en torno al modelo de desarrollo social y ambiental y, consecuentemente, un análisis
más profundo de la relación entre derechos humanos y medio ambiente.
Con posterioridad, en el año 2000 se adoptaron los Objetivos del Desarrollo del Milenio.
Dichos objetivos no se cumplieron por parte de los Estados. En un esfuerzo adicional por
renovar sus solemnes compromisos, el 25 de septiembre de 2015, los Estados adoptaron la
Agenda 2030 que contiene los Objetivos de Desarrollo Sostenible. Estos constituyen un
conjunto de objetivos para poner fin a la pobreza, proteger el planeta y asegurar la prosperidad
para todos como parte de una nueva agenda de desarrollo sostenible.
La Agenda 2030 incorpora 17 Objetivos de Desarrollo Sostenible, los cuales deberían ser
alcanzados por la comunidad internacional de Estados en los siguientes 15 años. Estos son los
Objetivos de Desarrollo Sostenible:
Objetivo 1. Poner fin a la pobreza en todas sus formas en todo el mundo
Objetivo 2. Poner fin al hambre, lograr la seguridad alimentaria y la mejora de la nutrición y
promover la agricultura sostenible
Objetivo 3. Garantizar una vida sana y promover el bienestar para todos en todas las edades

252

de Hans Jonas», in Développement durable et territoires, Vol. 1, n° 3, Décembre 2010, pp. 1-13.
Informe de la Comisión Mundial sobre el Medio
253

A/42/427, de fecha 4 agosto de 1987, p. 67.


254

-09-30_10-56-

472
Objetivo 4. Garantizar una educación inclusiva, equitativa y de calidad y promover
oportunidades de aprendizaje durante toda la vida para todos
Objetivo 5. Lograr la igualdad entre los géneros y empoderar a todas las mujeres y las niñas
Objetivo 6. Garantizar la disponibilidad de agua y su gestión sostenible y el saneamiento para
todos
Objetivo 7. Garantizar el acceso a una energía asequible, segura, sostenible y moderna para
todos
Objetivo 8. Promover el crecimiento económico sostenido, inclusivo y sostenible, el empleo
pleno y productivo y el trabajo decente para todos
Objetivo 9. Construir infraestructuras resilientes, promover la industrialización inclusiva y
sostenible y fomentar la innovación
Objetivo 10. Reducir la desigualdad en y entre los países
Objetivo 11. Lograr que las ciudades y los asentamientos humanos sean inclusivos, seguros,
resilientes y sostenibles
Objetivo 12. Garantizar modalidades de consumo y producción sostenibles
Objetivo 13. Adoptar medidas urgentes para combatir el cambio climático y sus efectos
Objetivo 14. Conservar y utilizar en forma sostenible los océanos, los mares y los recursos
marinos para el desarrollo sostenible
Objetivo 15. Proteger, restablecer y promover el uso sostenible de los ecosistemas terrestres,
gestionar los bosques de forma sostenible, luchar contra la desertificación, detener e invertir la
degradación de las tierras y poner freno a la pérdida de la diversidad biológica
Objetivo 16. Promover sociedades pacíficas e inclusivas para el desarrollo sostenible, facilitar
el acceso a la justicia para todos y crear instituciones eficaces, responsables e inclusivas a
todos los niveles.
Objetivo 17. Fortalecer los medios de ejecución y revitalizar la Alianza Mundial para el
Desarrollo Sostenible.255
Los objetivos del desarrollo sostenible tienen tres dimensiones básicas, el ámbito social,
ambiental y económico, y, por ende, se proyectan a la esfera de los derechos humanos. De
todos los ODS, existen 6 que permiten muy precisamente efectuar el vínculo entre desarrollo
sostenible, derecho al medio ambiente y derecho al desarrollo. En efecto, el ODS N°2 recuerda
el derecho a la alimentación al referirse a la seguridad alimentaria, la nutrición y la agricultura
sostenible. El ODS N°6 conecta la gestión sostenible del agua con el derecho al agua potable y

Vid. Asamblea General: Transformar Nuestro Mundo: la Agenda 2030 para el Desarrollo Sostenible. Doc. N.U.
255

A/RES/70/1, de fecha 21 de octubre de 2015.

473
al saneamiento. El ODS N° 11 trae a nuestra mente el derecho a la vivienda en relación con los
asentamientos humanos sostenibles. El ODS N° 13 vincula el cambio climático con el
desarrollo sostenible.
esfuerzos respecto al cambio climático con la participación de la Presidenta de la República en
la Vigésimo Primera Conferencia de las Partes de la Convención Marco de Naciones Unidas
sobre Cambio Climático, COP21, realizada el 30 de noviembre de 2015 en París, Francia. Chile
demostró liderazgo presionando por un plan ambicioso, duradero y vinculante, lo que
256
De nuevo, en el año 2017, la Presidenta reiteró que las políticas públicas
nacionales en este caso del sector defensa- se insertaban en las obligaciones internacionales
que Chile había asumido.257 El ODS N° 14 relaciona la conservación y protección de la
naturaleza marina con el desarrollo sostenible. Y, por último, el ODS N° 15 conecta la
protección de los ecosistemas terrestres, de los bosques, de la tierra y de la diversidad
biológica con el uso sostenible de los mismos, todo lo cual permite relacionar este objetivo con
el derecho a un medio ambiente sin riesgos, limpio, saludable y sostenible.

Naciones Unidas dimos un paso que me atrevo a considerar histórico cuando aprobamos por
unanimidad, el año pasado, dentro de Agenda 2030, los Objetivos del Desarrollo Sostenible, y
luego en París adquirimos compromisos concretos en materia de cambio climático. De ahí
258
Y, este cambio de paradigma, puede verse
La promoción de la dignidad de la persona humana y el
respeto del planeta son reconocidos como objetivos centrales del desarrollo de todos los
países; b) La reducción de la desigualdad se transforma en un objetivo colectivo; c) Se hace
necesario introducir políticas de inversión y consumo sostenibles que modifiquen
significativamente los patrones actuales en una conjunción de políticas públicas, privadas y
personales; d) El trabajo decente debe ser un objetivo central del crecimiento económico; e)
Las políticas de cohesión y protección social deben ser parte integral del desarrollo sostenible;
f) Se reconoce la necesidad de poner en práctica políticas que integren las dimensiones
sociales, económicas y medioambientales lo que supone superar el paralelismo de las políticas

256
Mensaje Presidencial, 21 de mayo de 2016. Michelle Bachelet, Presidenta 2014-2018, p. 55. Disponible en:

257

programas nacionales y los compromisos internaciona


de S.E. la Presidenta de la República, Michelle Bachelet Jeria, en el marco de la Conmemoración de los 70 años de la
Academia Nacional de Estudios Políticos y Estratégicos Chile. Santiago, 10 de abril de 2017. Disponible en:
-content/uploads/CLASE-MAGISTRAL-
Vid. Conferencia de S.E. la Presidenta de la República, Michelle Bachelet Jeria, en la Academia Diplomática de
258

Chile "Andrés Bello", sobre el significado del concepto de "convergencia en la diversidad" en la política

[Visitado el 17/5/2017]

474
sectoriales; g) En fin, la sustentabilidad humana y del planeta pasa a ser un compromiso
259

En consecuencia, el principio de desarrollo sostenible es un principio rector de la política


internacional y de las distintas políticas nacionales que puede adoptar el Estado. Existen
suficientes evidencias de una práctica generalmente aceptada por los Estados. Además, el
principio de desarrollo sostenible se ha asentado como un principio ya consagrado en el
derecho internacional del medio ambiente y en el derecho internacional de los derechos

económica, social y ambiental- de una manera equilibrada e integrada, señalando la necesidad


260
Por lo tanto,

económico y social, -extremos sin los cuales es imposible concebir el perfeccionamiento del
Estado de Derecho y la consagración plena de la dignidad de la persona humana- es, así,
inseparable del proceso, que no debe detenerse y que por el contrario es preciso ahondar y
acelerar, dirigido a dar mayor eficacia al Sistema Regional de promoción de los derechos
261

Desde la perspectiva del derecho comparado, se ha reconocido la existencia de este principio


de desarrollo sostenible y el hecho de que su fuente se encuentra en el derecho internacional.
En efecto, en el caso Vell
Suprema de la India sostuvo el carácter consuetudinario del desarrollo sostenible. De hecho, la

ecología y desarrollo ha sido aceptado como parte del derecho internacional consuetudinario
aun cuando sus rasgos más destacados todavía deben ser finalizados por los juristas de derecho
262
Cabe reconocer que la Corte Suprema alcanzó esta conclusión solo haciendo
referencia a instrumentos de soft law tales como la Declaración de Rio y el Informe
Brundtland.263

259
Vid. Conferencia de S.E. la Presidenta de la República, Michelle Bachelet Jeria, en la Academia Diplomática de
Chile "Andrés Bello", sobre el significado del concepto de "convergencia en la diversidad" en la política
internacional. Santiago, 29 de agosto de 2016. Disponible e
[Visitado el 17/5/2017]
260
Bureau International du Travail: . Doc. GB.325/INS/6,
14 octobre 2015, par. 6.
261
torno a la protección internacional de los derechos humanos en el ámbito
Cursos de Derecho Internacional de Vitoria-Gasteiz, N°1, 1987, pp. 165-186, especialmente p.
186.
262
Supreme Court of India: Union of India, August 28, 1996, p. 9.
263

-court-
international-

475
Como hemos adelantado, nuestra propuesta es que todos estos elementos componentes del
desarrollo sostenible, esto es, aquellos que son generalmente aceptados por los Estados en su
práctica, deberían tener una expresión en el nivel de los derechos humanos.
2. DESARROLLO Y DERECHOS HUMANOS
Lo primero que quisiéramos resaltar tiene relación con la fundamentación de los derechos
humanos. Tal com
histórica, cultural, política y filosófica de la modernidad, razón por la cual adquieren su
universalidad, pues forman parte de la conciencia colectiva de los pueblos y las naciones de
nue 264
En realidad, como se desprende de lo anteriormente mencionado, la fuente
última de todos los derechos humanos es la conciencia jurídica universal.265 Esto tiene
importancia porque es de la esencia de la conciencia jurídica de los pueblos su carácter
evolutivo, adecuándose y adaptándose en sus estándares a las exigencias y condiciones de vida
actuales. Un ejemplo de ello es el principio de desarrollo sostenible, que ha nacido, ha
evolucionado y se conectado con los derechos humanos en forma creciente, pasando a ser una
noción relevantísima en el progreso contemporáneo de los pueblos y de los individuos. En este

realidad sería aún más negativa, porque no puede negarse que la superestructura jurídica
influye sobre la infraestructura económica y social cumpliendo además, una labor docente,
que podría llamarse hoy concientización, de la más alta importancia. El progreso normativo ha
servido, pues, para crear e impulsar una informada conciencia latinoamericana, que exige, con
266

Nuestra propuesta sugiere que el desarrollo, entendido como desarrollo sostenible, forma
parte integrante, como elemento componente, del derecho a disfrutar de un medio ambiente
sin riesgos, limpio, saludable y sostenible y del derecho al desarrollo.
La Agenda 2030 para el Desarrollo Sostenible manifiesta este vínculo de manera expresa. En
especial, la Agenda 2030 resalta el rol mayor que juega el sector privado en esta dinámica
entre desarrollo sostenible, el derecho a disfrutar de un medio ambiente sin riesgos, limpio,

264
Política y Cultura, núm. 35, 2011, pp. 27-45,
especialmente, p. 33.
265
senta años desde
la adopción de la Declaración Universal de Derechos Humanos de 1948, se han observado considerables progresos,
en particular, en el aspecto jurisdiccional de la protección internacional de los derechos humanos. Se trata de una
esfera de protección que no admite retrocesos y que ha contribuido, más que cualquier otro ámbito de las
legislaciones nacionales, a la expansión gradual del contenido material del jus cogens, además de revelar la urgente
necesidad actual de consolidar las obligaciones erga omnes de protección. Esos acontecimientos han sido posibles
gracias a la conciencia jurídica universal, como fuente material fundamental del derecho internacional y, de hecho,

266

Cursos de Derecho Internacional de Vitoria-Gasteiz, N°1, 1987, pp. 165-186, especialmente p.


185.

476
saludable y sostenible y el derecho al desarrollo. No pretendemos desarrollar este tema en este
breve trabajo, pero si queremos dejarlo, al menos, planteado, como uno de los grandes
aspectos que será necesario abordar en un futuro muy cercano, en el ámbito de las políticas
públicas, relacionadas con el desarrollo sostenible. Así, por ejemplo, la Agenda 2030 ya
expresó las consecuencias en el ámbito normativo del rol de las empresas en estas esferas:

derechos laborales y los requisitos sanitarios y ambientales de conformidad con las normas y
los acuerdos internacionales pertinentes y otras iniciativas que se estén llevando a cabo en
esta esfera, como los Principios Rectores sobre las Empresas y los Derechos Humanos y las
normas laborales de la Organización Internacional del Trabajo, la Convención sobre los
Derechos del Niño y los principales acuerdos ambientales multilaterales, para quienes sean
267

Hemos sostenido que uno de los puntos de unión más relevantes entre el desarrollo sostenible
y los derechos humanos es que ambas nociones se revelan portadoras del concepto de justicia.

hombres son seres humanos, a éstos les corresponde vivir en una democracia y estar en
posesión de todos los bienes que garantiza la Declaración Universal de los Derechos Humanos.
Esto sería lo justo. Lo injusto es lo inhumano, que existan comunidades e individuos
marginados, sumergidos en la pobreza y la ignorancia y, por si ello fuera poco, que se les haga
268
Como se ha
visto, la justicia es un componente central del desarrollo sostenible, tanto desde la perspectiva
de la justicia social como de la justicia ambiental y su específica manifestación de la equidad
intergeneracional. Estos elementos de justicia confluyen sin duda en los derechos humanos
derecho humano al medio ambiente sano y derecho humano al desarrollo- convirtiéndose en
piezas claves de la lucha contra la desigualdad social. Así, el desarrollo sostenible sería un
principio que permitiría subvertir la tradición a la que se refiere Gros Espiell, cuando señala
de la
explotación económica y la desigualdad social, de la discriminación contra las poblaciones
indígenas, de las dictaduras militares, de las expresiones subsistentes del imperialismo, del

267
Asamblea General: Transformar nuestro mundo: la Agenda 2030 para el Desarrollo Sostenible. Declaración sobre
los Objetivos del Desarrollo Sostenible. Doc. A/RES/70/1, de fecha 21 de octubre de 2015, par. 67; Consejo de
Derechos Humanos: Informe del Representante Especial del Secretario General para la cuestión de los derechos
humanos y las empresas transnacionales y otras empresas, John Ruggie. Principios Rectores sobre las empresas y
los derechos humanos: puesta en práctica del marco de las Naciones Unidas para "proteger, respetar y remediar".
Doc. N.U. A/HRC/17/31, de fecha 21 de marzo de 2011, Anexo.
268
Política y Cultura, núm. 35, 2011, pp. 27-45,
especialmente, p. 45.

477
caudillismo político y de la prepotencia gubernamental o administrativa, han sido un dato
269

2.1. DERECHO A DISFRUTAR DE UN MEDIO AMBIENTE SIN RIESGOS, LIMPIO,


SALUDABLE Y SOSTENIBLE:
Como es bien sabido, este derecho humano incluye la protección de los recursos naturales.
Además, este derecho contempla como un elemento componente el desarrollo sostenible. El
derecho a disfrutar de un medio ambiente sin riesgos, limpio, saludable y sostenible goza de un
reconocimiento directo y de uno indirecto. El reconocimiento directo corresponde a aquel que
se hace del propio derecho al medio ambiente. El reconocimiento indirecto es aquel en virtud
del cual se logra la protección del bien público del medio ambiente a través de la referencia
formal a la protección de otros derechos.
2.1.1. RECONOCIMIENTO DIRECTO COMO DERECHO HUMANO AL AMBIENTE SANO
La denominación generalmente aceptada en el ámbito internacional en el mundo
contemporáneo es el derecho a disfrutar de un medio ambiente sin riesgos, limpio, saludable y
sostenible. El reconocimiento directo de este derecho humano se pueden encontrar en el
ámbito internacional, sobre todo, a nivel regional, y también a nivel nacional, sobre todo, en
algunas constituciones contemporáneas.
2.1.1.1. FUENTES INTERNACIONALES
Las fuentes internacionales las encontramos en los tratados internacionales propia ente tales.
Primero haremos referencia al denominado Protocolo de San Salvador de 1988 en el ámbito
regional americano y luego, abordaremos la denominada Carta de Banjul de 1981 en la esfera
regional africana. Con posterioridad, enunciaremos los instrumentos de soft law que
fundamentan la existencia y reconocimiento estatal del derecho a disfrutar de un medio
ambiente sin riesgos, limpio, saludable y sostenible.
a) En el contexto de la Organización de Estados Americanos (OEA), se adoptó en 1988 el
Protocolo de San Salvador, que corresponde al Protocolo en materia de derechos económicos,
sociales y culturales a la Convención Americana sobre Derechos Humanos, el cual entró en
vigor en 1999. En este instrumento internacional jurídicamente vinculante para los Estados
que lo han ratificado, el artículo 11 consagra el derecho al ambiente sano, de la siguiente
manera:

1. Toda persona tiene derecho a vivir en un medio ambiente sano y a contar con servicios
públicos básicos.
2. Los Estados partes promoverán la protección, preservación y mejoramiento del medio
270

269

Cursos de Derecho Internacional de Vitoria-Gasteiz, N°1, 1987, pp. 165-186.

478
b) En la esfera de la antigua Organización de la Unidad Africana (OUA), se adoptó en 1981 la
Carta Africana sobre los derechos humanos y de los pueblos, la cual entró en vigor en 1986.
Este instrumento jurídicamente vinculante para aquellos Estados que han manifestado su
voluntad en obligarse por el tratado, contiene diversos artículos que se refieren al derecho al
medio ambiente, a la protección de los recursos naturales y al derecho al desarrollo, a saber:

1. Todos los pueblos dispondrán libremente de sus riquezas y recursos naturales. Este derecho
será ejercido en el exclusivo interés del pueblo. En ningún caso será pueblo alguno privado de
él.
2. En caso de expoliación, el pueblo desposeído tendrá derecho a la recuperación legal de su
propiedad así como a una compensación adecuada.
3. El derecho a disponer libremente de las riquezas y recursos naturales será ejercido sin
perjuicio de la obligación de promover la cooperación económica internacional basada en el
respeto mutuo, el intercambio equitativo y los principios del derecho internacional.
4. Los Estados firmantes de la presente Carta ejercerán, individual y colectivamente, el
derecho a disponer de sus riquezas y recursos naturales con vistas a reforzar la unidad y la
solidaridad africanas.
6. Los Estados firmantes de la presente Carta se comprometerán a eliminar toda forma de
explotación económica extranjera, especialmente la practicada por los monopolios
internacionales, con el fin de posibilitar que sus pueblos se beneficien plenamente de las

1. Todos los pueblos tendrán derecho a su desarrollo económico, social y cultural, con la debida
consideración a su libertad e identidad y disfrutando por igual de la herencia común de la
humanidad.
2. Los Estados tendrán el deber, individual o colectivamente, de garantizar el ejercicio del

ículo 24

270
Protocolo Adicional a la Convención Americana sobre Derechos Humanos en materia de Derechos Económicos,
, adoptado por la Asamblea General de la Organización de Estados
Americanos, en su décimo octavo periodo ordinario de sesiones, en San Salvador, El Salvador, el 17 de noviembre de
1988.

479
Todos los pueblos tendrán derecho a un entorno general satisfactorio favorable a su
271

Todo ello, sin considerar el enorme desarrollo de lo que se denomina el soft law en derecho
internacional del medio ambiente, el cual bien sirve para fundamentar el reconocimiento del
derecho a disfrutar de un medio ambiente sin riesgos, limpio, saludable y sostenible. Así, por
ejemplo, podemos mencionar la Declaración de Estocolmo de 1972, o la Declaración de Rio
1992 o bien, la Declaración de Johannesburgo 2002.272 Por último, cabe hacer presente que
desde 2002, el año de la Cumbre Mundial sobre el Desarrollo sostenible, la Comisión de
Derechos Humanos adoptó resoluciones sobre el medio ambiente que fueron tituladas
273

2.1.1.2. FUENTES NACIONALES


Desde la perspectiva del derecho constitucional comparado se puede afirmar el
reconocimiento del derecho humano a un medio ambiente sano en un amplio número de
Constituciones de Estados del mundo, incluyendo, por ejemplo, Perú y Chile. En este sentido,
según el Relator Especial de Naciones Unidas más de 90 Constituciones en el mundo
reconocen expresamente el derecho a disfrutar de un medio ambiente saludable. 274 Asimismo,
117 Constituciones de Estados del mundo mencionan el ambiente de algún modo. A
continuación haremos una pequeña referencia a las Constituciones de Alemania, Portugal,
España, Perú y Chile. En buena medida, todas estas Constituciones se han inspirado en la
evolución de la Constitución alemana.
El caso de Alemania es interesante, porque la construcción del derecho no reconocido
expresamente en el catálogo constitucional- ha sido jurisprudencial y el texto de la
Constitución ha recogido esta evolución y los desarrollos internacionales sobre la materia. En
particular, el artículo 20 a) permite entender que hay un reconocimiento particular del
desarrollo sostenible y de uno de sus pilares como es el principio de equidad
intergeneracional.

[Protección de los fundamentos naturales de la vida y de los animales]

Carta Africana sobre Derechos Humanos y de los Pueblos (Carta de Banjul), aprobada el 27 de julio de 1981,
271

durante la XVIII Asamblea de Jefes de Estado y Gobierno de la Organización de la Unidad Africana, reunida en
Nairobi, Kenya.
272
Vid. Informe de la Conferencia de las Naciones Unidas sobre el Medio Humano, Estocolmo, 5 a 16 de junio de
1972; Report of the United Nations Conference on Environment and Development (Rio de Janeiro, 3-14 June 1992)
Annex I, Rio Declaration on Environment and Development. Doc. U.N. A/CONF.151/26 (Vol. I), 12 August 1992;
Naciones Unidas: Informe de la Cumbre Mundial sobre Desarrollo Sostenible, Johannesburgo 26 de agosto al 4
septiembre 2002. Doc. A/CONF.199/20.
273
Vid. Res. 2002/75; Res. 2003/71; Res. 2005/60.
274
Consejo de Derechos Humanos: Informe del Experto independiente sobre la cuestión de las obligaciones de
derechos humanos relacionadas con el disfrute de un medio ambiente sin riesgos, limpio, saludable y sostenible, John
H. Knox. Doc. N.U. A/HRC/22/43, de fecha 24 de diciembre de 2012, par. 12.

480
El Estado protegerá, teniendo en cuenta también su responsabilidad con las generaciones
futuras, dentro del marco del orden constitucional, los fundamentos naturales de la vida y los
animales a través de la legislación y, de acuerdo con la ley y el Derecho, por medio de los
275

El caso de la Constitución de Portugal es particularmente relevante ya que contiene


reconocimiento del derecho humano a un medio ambiente ecológicamente equilibrado y del

1. Todos tienen derecho a un medio ambiente de vida humano, salubre y ecológicamente


equilibrado, y el deber de defenderlo.
2. Para asegurar el derecho al medio ambiente, dentro del marco de un desarrollo sustentable,
le corresponde al Estado, mediante organismos propios y con la implicación y la participación
de los ciudadanos:
1. Prevenir y controlar la contaminación y sus efectos y las formas perjudiciales de erosión;
2. Ordenar y promover la ordenación del territorio, teniendo como objetivo una correcta
localización de las actividades, un desarrollo socioeconómico equilibrado y la valoración del
paisaje;
3. Crear y desarrollar reservas y parques naturales y de recreo, así como clasificar y proteger
paisajes y lugares, de manera a que se garantice la conservación de la naturaleza y la
preservación de valores culturales de interés histórico o artístico;
4. Promover el aprovechamiento racional de los recursos naturales, salvaguardando su
capacidad de renovación y la estabilidad ecológica, respetando el principio de la solidaridad
entre las generaciones;
5. Promover, en colaboración con las entidades locales, la calidad ambiental de las poblaciones
y de la vida urbana, especialmente en el plan arquitectónico y en el de la protección de las
zonas históricas;
6. Promover la integración de objetivos ambientales en las diversas políticas de ámbito
sectorial;
7. Promover la educación ambiental y el respeto a los valores del medio ambiente;
8. Asegurar que la política fiscal haga compatibles el desarrollo y la protección del medio
276

275
Ley Fundamental de la República Federal de Alemania de 1949.
276
Constitución de Portugal de 2 de abril de 1976.

481
El caso de la Constitución española es bastante similar al de la Constitución de Portugal, aun
cuando más conciso, pero contiene los tres elementos a los que hemos hecho referencia a lo
largo de este estudio:

1. Todos tienen el derecho a disfrutar de un medio ambiente adecuado para el desarrollo de la


persona, así como el deber de conservarlo.
2. Los poderes públicos velarán por la utilización racional de todos los recursos naturales, con
el fin de proteger y mejorar la calidad de la vida y defender y restaurar el medio ambiente,
apoyándose en la indispensable solidaridad colectiva.
3. Para quienes violen lo dispuesto en el apartado anterior, en los términos que la ley fije se
establecerán sanciones penales o, en su caso, administrativas, así como la obligación de
277

En el caso de la Constitución de Perú, también se incorporan al texto constitucional las tres


menciones, derecho humano al medio ambiente, derecho al desarrollo y desarrollo sostenible,
aun cuando las referencias están, esta vez, dispersas en varios preceptos constitucionales:
- Derechos fundamentales de la persona.
Toda persona tiene derecho:

22. A la paz, a la tranquilidad, al disfrute del tiempo libre y al descanso, así como a gozar de un
278

Del ambiente y los recursos naturales


Artículo 66°.- Recursos Naturales
Los recursos naturales, renovables y no renovables, son patrimonio de la Nación. El Estado es
soberano en su aprovechamiento.
Por ley orgánica se fijan las condiciones de su utilización y de su otorgamiento a particulares.
La concesión otorga a su titular un derecho real, sujeto a dicha norma legal.
Artículo 67°.- Política Ambiental
El Estado determina la política nacional del ambiente. Promueve el uso sostenible de sus
recursos naturales.

277
Constitución española de 1978.
278
Constitución Política del Perú 1993.

482
Artículo 68°.- El Estado está obligado a promover la conservación de la diversidad biológica y
de las áreas naturales protegidas.
Artículo 69º.- Desarrollo de la Amazonía
El Estado promueve el desarrollo sostenible de la Amazonía con una l 279

Por último, en el caso de Chile, la norma constitucional relativa al medio ambiente no


reconoce expresamente esta interrelación sinérgica y enriquecedora entre el desarrollo
sostenible, el derecho humano a vivir en un medio ambiente libre de contaminación y el
derecho humano al desarrollo.
En efecto, la norma constitucional que se refiere al derecho se encuentra ubicada en el
capítulo III, dentro del catálogo de derechos fundamentales del artículo 19:
- La Constitución asegura a todas las personas:

8º.- El derecho a vivir en un medio ambiente libre de contaminación. Es deber del Estado velar
para que este derecho no sea afectado y tutelar la preservación de la naturaleza.
La ley podrá establecer restricciones específicas al ejercicio de determinados derechos o
280

En efecto, la Constitución chilena no reconoce el derecho al desarrollo. En cambio, Sí reconoce


el derecho al medio ambiente, bajo un enfoque individualista de los derechos. Además, no
menciona el desarrollo sostenible, ni como elemento componente del derecho a vivir en un
medio ambiente libre de contaminación ni como principio rector de la actividad económica y
social. Con todo, haciendo un esfuerzo interpretativo se podría entender incorporado, si se
considera la legislación ambiental chilena.
La ley 19.300 de 1994 sobre Bases Generales del Medio Ambiente señala, dentro de sus
disposiciones generales, que el derecho consagrado en el artículo 19 N°8 de la Constitución se
regula por las disposiciones de esta ley. Así, el artículo 1 de la referida ley indica:

ambiente, la preservación de la naturaleza y la conservación del patrimonio ambiental se


regularán por las disposiciones de esta ley, sin perjuicio de lo que otras normas legales

En este contexto, el artículo 2 de la misma ley contempla dentro de sus definiciones el


desarrollo sostenible. Este precepto señala:
-

279
Constitución Política del Perú 1993.
280
Constitución Política de la República de Chile de 1980.

483
g) Desarrollo Sustentable: el proceso de mejoramiento sostenido y equitativo de la calidad de
vida de las personas, fundado en medidas apropiadas de conservación y protección del medio

En consecuencia, una pregunta que se puede platear es para qué incluirlo en la Constitución si
ya está consagrado en la ley que regula el derecho. Atendida la cultura legal chilena y
considerando la importancia de poder desarrollar este principio por la jurisprudencia
constitucional, como un eje articulador en materia de derechos fundamentales, es necesaria su
reconocimiento en el texto expreso de la Constitución, de un modo similar que lo han hecho
las constituciones más arriba mencionadas.
Un elemento que es común en todos estos ordenamientos constitucionales es que ellos
contienen una referencia al principio de desarrollo sostenible. Todos, menos el ordenamiento
constitucional chileno, como se verá más adelante, el cual omite toda referencia al principio de
desarrollo sostenible y al régimen de uso y explotación de los recursos naturales.
2.1.2. RECONOCIMIENTO INDIRECTO DEL DERECHO HUMANO AL AMBIENTE SANO:
El vínculo entre derechos humanos, protección del medio ambiente y la amplia significación
del desarrollo sostenible ha sido reconocido indirectamente a través de los derechos que
puedan afectarse por la degradación ambiental (contaminación, destrucción de recursos). Esto
ha ocurrido con especial intensidad en el Sistema Europeo de Derechos Humanos y, más
aisladamente, también en el Sistema Interamericano de Derechos Humanos.
En el caso del sistema europeo, mencionaremos, únicamente a título ejemplar, el caso

derecho a la vida (artículo 2 de la Convención Europea sobre Derechos Humanos). En este


caso, la vivienda del demandante fue construida sin autorización sobre un terreno rodeado por
un basural utilizado en forma conjunta por cuatro concejos distritales. Una explosión de
metano ocurrida en el basural en abril de 1993 y una erupción fallida desde la pila de desechos
envolvió más de 10 casas situadas bajo el basural, incluyendo la vivienda que pertenecía al
demandante quien perdió 9 parientes cercanos en el estallido.
El demandante denuncia en particular que ninguna medida había sido tomada para impedir
una explosión a pesar de que un informe de un experto había llamado la atención de las
autoridades acerca de la necesidad de actuar con prevención ya que una explosión era
probable. La Corte Europea de Derechos Humanos sostuvo que había habido una violación del
artículo 2 de la Convención en su arista sustantiva, debido a la falta de medidas apropiadas
para impedir las muertes accidentales de 9 parientes cercanos del demandante. También
sostuvo que hubo una violación del artículo 2 de la Convención en su arista procesal, debido a
la falta de una protección adecuada de la ley salvaguardando el derecho a la vida. La Corte
observó en particular que el gobierno turco no había proporcionado a los habitantes de los
barrios marginales la información necesaria sobre los riesgos que ellos corrían viviendo allí.
Incluso si lo hubiera hecho, el Estado resta responsable ya que no había tomado las medidas
prácticas necesarias para evitar el riesgo para la vida de las personas. El marco regulatorio se
484
ha demostrado defectuoso ya que el vertedero había sido autorizado a funcionar y operar sin
un sistema de supervisión coherente. Igualmente, la política de planeamiento urbano de la
ciudad había sido inadecuada y sin duda había jugado una parte importante en la secuencia de
los hechos que culminaron en el accidente. En este caso, la Corte también sostuvo que hubo
una violación del artículo 1 (protección de la propiedad) del protocolo N°1 de la Convención,
una violación del artículo13 (derecho a un recurso efectivo) de la Convención en cuanto a la
denuncia bajo la arista sustantiva del artículo 2 y una violación del artículo 13 en cuanto a la
denuncia bajo el artículo 1 del Protocolo N°1.281
También en el sistema europeo, la Corte Europea de Derechos Humanos ha abordado la
interrelación entre desarrollo sostenible, derechos humanos y protección del medio ambiente
en casos estrechamente vinculados con la contaminación industrial. Para ello ha recurrido al
examen de la posible vulneración del derecho al respeto de la vida privada y familiar y del
hogar (artículo 8 de la Convención).
En el caso Dubetska and Others v. Ukraine, de 10 de febrero de 2011, los demandantes
denunciaron que su salud había sido afectada y sus hogares y entornos de vida habían sido
dañados como consecuencia de las actividades y operaciones de una mina de carbón de
propiedad estatal cerca de sus casas. Los demandantes también señalaron que las autoridades
Ucranianas no habían hecho nada para solucionar la situación.
La Corte sostuvo que había habido una violación del artículo 8 de la Convención. Observó en
particular que las autoridades Ucranianas eran conscientes de los efectos adversos para el
medio ambiente de la mina pero que no había ni reasentado a los demandantes encontrado
otra solución para disminuir la contaminación a niveles no perjudiciales para las personas
viviendo en las cercanías de los recintos industriales. Además, a pesar de los intentos de
penalizar el director de la industria y de ordenar y provocar el reasentamiento de los
demandantes, y no obstante que un acueducto centralizado fue construido en 2009
asegurándose que los demandantes tuvieran suficiente provisión de agua potable, durante 12
años las autoridades no habían encontrado una solución efectiva para la situación de los
demandantes. Asimismo, la Corte sostuvo que al encontrar una violación del artículo 8 de la
Convención, estableció la obligación del gobierno de Ucrania de adoptar medidas apropiadas
para solucionar la situación de los demandantes.
En el sistema interamericano, la conexión y el entrecruzamiento de derechos humanos,
protección del medio ambiente y desarrollo sostenible se ha producido, primeramente, gracias
a los casos de los derechos colectivos de los pueblos indígenas. En este sentido, una referencia
obligada lo constituye el conocido caso de la Comunidad Indígena Yakye Axa vs. Paraguay de
2005.282

281

282
Corte IDH: Caso Comunidad Indígena Yakye Axa vs. Paraguay. Fondo Reparaciones y Costas. Sentencia 17 de
junio de 2005. Serie C No. 125.

485
Uno de los avances más trascendentales que se han ido produciendo en la actividad de la Corte
IDH ha sido que cada vez ha debido profundizar más la relevancia que tiene la realización de
las evaluaciones de impacto ambiental para la efectiva protección de los derechos y del medio
ambiente en un contexto de desarrollo sostenible. En efecto, en la actual jurisprudencia de la
Corte IDH, la realización de un estudio de impacto ambiental, se revela como un punto de
conexión entre los derechos humanos, protección del medio ambiente y el desarrollo
sostenible. En el Caso Comunidad Garífuna Triunfo de la Cruz y sus miembros vs. Honduras la
Corte IDH comienza por recordar su ya tradicional jurisprudencia acerca de la propiedad
colectiva indígena a las tierras, territorios y recursos que han ocupado ancestralmente o usado
de otro modo (artículo 21 de la Convención Americana):

derecho a vivir libremente en sus territorios; la estrecha relación que los indígenas mantienen
con la tierra debe de ser reconocida y comprendida como la base fundamental de sus culturas,
su vida espiritual, su integridad y su sistema económico. Para las comunidades indígenas la
relación con la tierra no es meramente una cuestión de posesión y producción sino un
elemento material y espiritual del que deben gozar plenamente, inclusive para preservar su
legado cultural y transmitirlo a las generaciones futuras. La cultura de los miembros de las
comunidades indígenas corresponde a una forma de vida particular de ser, ver y actuar en el
mundo, constituido a partir de su estrecha relación con sus tierras tradicionales y recursos
naturales, no sólo por ser estos su principal medio de subsistencia, sino además porque
constituyen un elemento integrante de su cosmovisión, religiosidad y, por ende, de su
283

con su territorio, la protección del derecho a la propiedad, uso y goce sobre éste es necesaria
para garantizar su supervivencia. Esta conexión entre el territorio y los recursos naturales que
han usado tradicionalmente los pueblos indígenas y tribales y que son necesarios para su
supervivencia física y cultural, así como el desarrollo y continuidad de su cosmovisión, es
preciso protegerla bajo el artículo 21 de la Convención para garantizar que puedan continuar
viviendo su modo de vida tradicional y que su identidad cultural, estructura social, sistema
económico, costumbres, creencias y tradiciones distintivas serán respetadas, garantizadas y
284

Y, luego, la Corte IDH, en el Caso Comunidad Garífuna Triunfo de la Cruz y sus miembros vs.
Honduras, efectúa una clara conexión entre desarrollo sostenible, derechos humanos y
protección del medio ambiente, al referirse a la obligación de proceder a realizar un estudio de
impacto ambiental:

283
Corte IDH: Caso Comunidad Indígena Yakye Axa vs. Paraguay. Fondo Reparaciones y Costas. Sentencia 17 de
junio de 2005. Serie C No. 125, par. 101.
284
Corte IDH: Caso Comunidad Indígena Yakye Axa vs. Paraguay. Fondo Reparaciones y Costas. Sentencia 17 de
junio de 2005. Serie C No. 125, par. 102.

486
lo 7.3

haya lugar, se efectúen estudios, en cooperación con los pueblos interesados, a fin de evaluar la
incidencia social, espiritual y cultural y sobre el medio ambiente que las actividades de
desarrollo previstas puedan tener sobre esos pueblos. Los resultados de estos estudios deberán
ser considerados como criterios fundamentales para la ejecución de las actividades
o anteriormente que la realización de tales
estudios constituye una de las salvaguardas para garantizar que las restricciones impuestas a
las comunidades indígenas o tribales respecto del derecho a la propiedad no impliquen una
denegación de su subsistenci 285

puede tener sobre la propiedad y comunidad en cuestión. [No obstante,] el objetivo de [éstos]
no es sólo tener alguna medida objetiva del posible impacto sobre la tierra y las personas, sino

riesgos, incluidos los riesgos

deben: realizarse conforme a los estándares internacionales y buenas prácticas al respecto,


respetar las tradiciones y cultura de los pueblos indígenas y tribales y ser concluidos de
manera previa al otorgamiento de la concesión o licencia, ya que uno de los objetivos de la
exigencia de dichos estudios es que el Estado garantice el derecho de la Comunidad a ser
informado acerca de todos los proyectos propuestos en su territorio y a su participación
286

esente caso, el Estado debía garantizar que no se emprediera ninguna actividad

técnicamente capaces, bajo la supervisión del Estado, realizaran un estudio previo de impacto
social y ambiental. Al respecto, la Corte nota que no ha sido probado que fuera realizado el
287

Del mismo modo, ha habido un creciente reconocimiento por parte de los Estados y de las
organizaciones internacionales del vínculo entre medio ambiente y derechos humanos. Estos
desarrollos se han llevado a cabo tanto desde la perspectiva de la Organización de las Naciones

Corte IDH: Caso Comunidad Garífuna Triunfo de la Cruz y sus miembros vs. Honduras. Fondo, Reparaciones y
285

Costas. Sentencia de 8 de octubre de 2015. Serie C No. 305, par. 179.


Corte IDH: Caso Comunidad Garífuna Triunfo de la Cruz y sus miembros vs. Honduras. Fondo, Reparaciones y
286

Costas. Sentencia de 8 de octubre de 2015. Serie C No. 305, par. 180.


Corte IDH: Caso Comunidad Garífuna Triunfo de la Cruz y sus miembros vs. Honduras. Fondo, Reparaciones y
287

Costas. Sentencia de 8 de octubre de 2015. Serie C No. 305, par. 181.

487
Unidas (ONU) como en el ámbito de la Organización de Estados Americanos (OEA). Las
menciones en estos casos sólo pueden ser someras y a titulo ejemplar, pero ellas dan una clara
visión de las distintas posibilidades de reconocimiento indirecto de estas interacciones y
entrecruzamientos.288
2.2. DERECHO AL DESARROLLO
El derecho humano al desarrollo encuentra cierto reconocimiento en el derecho internacional
de los derechos humanos. En efecto, el derecho al desarrollo ha sido reconocido en la
Resolución de la Asamblea General 41/128 de 4 de diciembre de 1986, titulada Declaración

económico, social, cultural y político, que tiende al mejoramiento constante del bienestar de
toda la población y de todos los individuos sobre la base de su participación activa, libre y

Desde esta perspectiva, este derecho humano representa un título para un individuo y
comunidad a un desarrollo sostenible.
En efecto, la Declaración sobre el derecho al desarrollo reconoce en su artículo 1 que el
derecho al desarrollo es un derecho humano del individuo y de los pueblos y que es un derecho
de participación. El artículo 1 reza como sigue.

humano y todos los pueblos están facultados para participar en un desarrollo económico,
social, cultural y político en el que puedan realizarse plenamente todos los derechos humanos
y libertades fundamentales, a contribuir a ese desarrollo y a disfrutar del él.
2. El derecho humano al desarrollo implica también la plena realización del derecho de los
pueblos a la libre determinación, que incluye, con sujeción a las disposiciones pertinentes de
ambos Pactos internacionales de derechos humanos, el ejercicio de su derecho inalienable a la

Por otra parte, el artículo 2 de la Declaración sobre el derecho al desarrollo consigna que el ser
humano es el sujeto central del desarrollo, lo que confirma que el desarrollo bajo un enfoque
de derechos debe necesariamente ser un desarrollo multidimensional y humano. Además, el
artículo 2 n°3 reconoce que el desarrollo exige la participación actividad de individuos,
comunidades y pueblos y que éste debe basarse en la distribución justa y equitativa de los
beneficios derivados del desarrollo. El artículo 2 señala:
humana es el sujeto central del desarrollo y debe ser el participante activo y el
beneficiario del derecho al desarrollo.

288
Consejo de Derechos Humanos: Informe del Experto independiente sobre la cuestión de las obligaciones de
derechos humanos relacionadas con el disfrute de un medio ambiente sin riesgos, limpio, saludable y sostenible, John
H. Knox. Doc. N.U. A/HRC/22/43, de fecha 24 de diciembre de 2012; CIDH: Pueblos Indígenas, comunidades
afrodescendientes e industrias extractivas. Doc. OEA/Ser.L/V/II. Doc. 47/15, de 31 de diciembre de 2015.

488
2. Todos los seres humanos tienen, individual y colectivamente, la responsabilidad del
desarrollo, teniendo en cuenta la necesidad del pleno respeto de sus derechos humanos y
libertades fundamentales, así como sus deberes para con la comunidad, único ámbito en que
se puede asegurar la libre y plena realización del ser humano, y, por consiguiente, deben
promover y proteger un orden político, social y económico apropiado para el desarrollo.
3. Los Estados tienen el derecho y el deber de formular políticas de desarrollo nacional
adecuadas con el fin de mejorar constantemente el bienestar de la población entera y de todos
los individuos sobre la base de su participación activa, libre y significativa en el desarrollo y en

El desarrollo sostenible no significa, pues, un bienestar basado en el mero consumo de bienes,


sino que implica un bienestar del individuo y de la sociedad en el sentido amplio de la palabra.

tiene por objetivo ampliar las oportunidades de las personas, centrándose de manera general
289
En este sentido,

s vivir nuestra vida, conscientes de que todo


lo que hacemos tiene consecuencias para los 7.000 millones de habitantes del planeta, así
290

dad, la Declaración de Río, fruto de la


Conferencia de las Naciones Unidas sobre Medio Ambiente y Desarrollo celebrada en junio de
1992, vuelve a proclamar el derecho al desarrollo, vinculándolo de una forma muy estrecha con
la protección del medio ambiente, es decir, el derecho al desarrollo se debe ejercer de tal forma
que no ponga en peligro el ecosistema global. Además, el principio nº 3 de la Declaración

equitativamente a las necesidades de desarrollo y ambientales de las generaciones presentes y

291

El derecho al desarrollo ha sido asimismo reconocido por la jurisprudencia internacional y las


decisiones de órganos cuasi-jurisdiccionales de protección de los derechos humanos. En este
último sentido, la decisión relacionada con las condiciones de la comunidad Endorois en
Kenya, adoptada por la Comisión Africana de Derechos Humanos y de los Pueblos es
relevante, sobre todo cuando afirma que derecho al desarrollo implica capacidad de elección,

289
PNUD: Informe sobre desarrollo humano 2015. Trabajo al servicio del desarrollo humano. PNUD, Nueva York,
2015.
PNUD: Informe sobre desarrollo humano 2011. Sostenibilidad y Equidad: Un mejor futuro para todos. PNUD,
290

Nueva York, 2011.


291

[Visitado el 20/4/2017]

489
esto es, la libertad de elección debe estar presente como parte del derecho al desarrollo. 292
Entre el derecho humano al desarrollo y el principio de desarrollo sostenible se produce una
relación virtuosa y retroalimentadora. El derecho al desarrollo no persigue cualquier tipo de
desarrollo. En la época actual, el desarrollo al que se referiría este derecho debería incluir
componentes de sostenibilidad.
CONCLUSIÓN
Inspirándose de los modelos constitucionales mencionados en este trabajo, sería posible
imaginar una o más fórmulas destinadas a incluir en el texto constitucional chileno la
interrelación sinérgica entre el principio de desarrollo sostenible, el derecho humano a vivir
en un medio ambiente libre de contaminación y el derecho humano al desarrollo. El
reconocimiento expreso en el texto constitucional de esta interacción e interdependencia
adquiere, sin duda, una importancia capital para el desarrollo contemporáneo de los pueblos.

Vid. 276/03 Centre for Minority Rights Development (Kenya) and Minority Rights Group (on Behalf of Endorois
292

Welfare Council) / Kenya, par. 278.

490
SEQUESTRO INTERNACIONAL: UMA ANÁLISE NO CONTEXTO BRASILEIRO

Resumo
Também chamado de Subtração Interparental, o presente artigo apresenta um estudo a
respeito da proteção das crianças que são subtraídas por um de seus genitores de forma ilegal.
Para tanto, se faz necessário discorrer sobre a Convenção de Haia de 1980 que conta hoje com
bastantes países signatários, trazendo a conclusão que este assunto é infelizmente uma
problemática mundial.
Palavras-chave: Sequestro Internacional, Subtração Interparental, Convenção de Haia,
Criança, Direitos Humanos.
Abstract
Also called Interparental Subtraction, this article presents a study on the protection of
children who are subtracted by one of their parents illegally.
In order to do so, it is necessary to discuss the 1980 Haia Convention which has many
signatory countries today, bringing the conclusion that the subject unfortunately is a global
problem.
INTRODUÇÃO

(Filipenses 4:13)
A conexão entre as pessoas de cada região do planeta sem sombra de dúvidas está relacionada
à globalização, isto é, com o avanço tecnológico, os cidadãos estão cada vez mais próximos uns
dos outros.
Visando uma condição financeira e qualidade de vida, muitos deles têm até mesmo se
mudados para outro país e neles vivem normalmente, estudam, se casam e reproduzem.
No entanto, o que chama atenção é que essa capacidade de se deslocar aos países nem sempre
acaba sendo uma melhor opção futuramente para os cidadãos, haja vista ao sistema positivado
(jurídico) de cada nação, também por esse motivo criaram-se as chamadas convenções e
tratados internacionais.
Logo, tendo em vista as mudanças internacionais de domicílio envolvendo crianças,
direcionou o Brasil a ratificar a Convenção da Haia, que foi incorporada em nosso
ordenamento jurídico, pelo decreto 3.413/2000.

costuma chamar de subtração interparental ou deslocamento ilegal. A transferência ilícita e a


retenção indevida de menor, de até 16 anos (4.º), em território nacional, sem a devida

491
autorização do outro responsável pela guarda, configura sequestro internacional parenta,
sendo ilegal e injustificada, o que caracteriza ofensa ao dever de boa fé que deve estar presente
nas relações intersubjetivas. (DIAS, p.695-696)
Também se pode atribuir à Subtração interparental a transferência de uma criança ou
adolescente e sua permanência a outro país, sem o respectivo consentimento de seus
genitores.
Pela repatriação (busca e apreensão de menores) que é regulada pela Convenção da Haia,
poderemos contemplar a atuação das Autoridades dos Estados, por exemplo, para respectiva
localização da criança e do adolescente, prestando esclarecimentos sobre as diligências
realizadas conforme consta na Convenção da Haia de 1980 (Decreto 3.413/2000).
Nesse diapasão, é importante frisar que mesmo após a localização de uma criança ou
adolescente e as respectivas informações dos mesmos, a transferência de uma retirada ilícita
de seu país, ou seja, o seu retorno não se pode realizar de forma imediata, pois conforme artigo
227 da Constituição Federal deve-se analisar cada caso de uma forma bem peculiar, não
deixando de observar o princípio do melhor interesse da criança e do adolescente.
Em tempos de crise econômica mundial, muitas pessoas acabam migrando para outros países
em busca de uma vida melhor (em todos os sentidos).
Contudo, referidas decisões têm implicado e muito na vida das crianças e dos adolescentes.
1. A PROBLEMÁTICA DO SEQUESTRO INTERNACIONAL NO BRASIL
Crescendo cada vez mais, não se sabe precisar ao certo o início exato dessa problemática em
todo o mundo. Foi somente em 1980 na cidade de Haia em que se tratou a respeito do tema,
visando sua positivação nos ordenamentos jurídicos dos países signatários da referida
Convenção.
No Brasil, a Convenção só foi aderida após 20 anos de sua existência, sendo incorporada no
ordenamento jurídico, pelo Decreto 3.413/2000.
Há de se imaginar, portanto, que houveram casos nesse sentido, porém o Brasil ainda não a
havia ratificado.
Em seu artigo, Nádia de Araujo (2006, p. 500-501) cita que :
Nas situações em que a criança era retirada do Brasil irregularmente, a parte interessada
deveria ingressar na justiça estrangeira sem nenhum suporte do Estado Brasileiro. (Direito
internacional privado: teoria e prática brasileira. Rio de Janeiro: Renovar, 2011.)
Nos anos 2.000, o Brasil vivenciou um caso com grande repercussão mundial, o do menino
chamado Sean Goldman, ao final tendo sido julgado pelo STF.
Em seu Relatório no Agravo Regimental no Habeas Corpus 99.945 Rio de Janeiro, o Sr
Ministro Marco Aurélio descreve:

492
Cuida-se de habeas corpus com requerimento de liminar impetrado por Silvana Bianchi
Carneiro Ribeiro em favor do menor S.R.G.
Alega a impetrante que o paciente é filho de sua filha, a brasileira Bruna Bianchi Carneiro
Ribeiro Lins e Silva, com o cidadão norte-americano David Goldman, tendo nascido em 25 de
maio de 2000 no Estado de Nova Jersey, EUA, com registro no Consulado Brasileiro em Nova
York, EUA, e na 1ª Circunscrição do Registro Civil de Pessoas Naturais na Ilha do Governador,
Rio de Janeiro, com isso adquirindo a nacionalidade brasileira.
Em 2004, Bruna viajou ao Brasil trazendo consigo o ora paciente, com autorização do pai, aqui,
porém, resolvendo separar-se deste, seguindo-se ação de divórcio que culminou com o fim do
casamento.
Em meados de 2005, Bruna assumiu relacionamento com João Paulo Lins e Silva, contraindo
núpcias com o mesmo em 2007, vindo a falecer, entretanto, no dia 21 de agosto de 2008, depois
de dar à luz sua filha C., nascida de sua relação com João Paulo.
Com fundamento em relação de paternidade sócio afetiva, em 28 de agosto de 2008 João Paulo
Lins e Silva requereu junto ao Juízo de Direito da 2ª Vara de Família da Comarca do Rio de
Janeiro a guarda do menor, o que lhe foi deferido.
Em 26 de setembro de 2008, a União Federal, depois de acionada pela Autoridade Central
Administrativa Federal - ACAF, órgão encarregado de fazer observar a Convenção de Haia no
Brasil e que, por sua vez, fora instada a tanto por congênere norte americana, requereu a
busca, apreensão e restituição do paciente perante a 16ª Vara da Seção Judiciária do Rio de
Janeiro - RJ.
No processo nº 2008.51.01.018422-0, o Juiz Federal Substituto da 16ª Vara Federal do Rio de
Janeiro, Sr. Rafael de Souza Pereira Pinto, entre outras determinações, conclui que o menino
Sean deverá ser devolvido ao seu Pai nos Estados Unidos em prazo de até 48 horas.
Visando o impedimento por violação de preceito fundamental, foi impetrado Mandado de
Segurança a fim de suspender o retorno do menor. No entanto, por provocação ao Judiciário, o
Ministro Gilmar Mendes cassou a liminar de suspensão concedida, determinando assim o
retorno de Sean ao seu Pai David.
Nesse caso não há vencedor algum, ou melhor, dizendo, presume-se ter restado evidente o
quanto a questão psicológica do menor ficou exposta, podendo trazer sérios transtornos ao
mesmo, uma vez não observados os direitos humanos e liberdades fundamentais (Artigo 20 do
Decreto nº 3.143/2000).
Ainda, seria possível, ao tempo de duração do processo e idade do menor, também levar em
consideração a opinião do mesmo sobre o assunto, haja vista possuir grau de maturidade para
tal, nos termos do artigo 13, também do Decreto em comento.
2. CONVENÇÃO DE HAIA DE 1980

493
A Convenção sobre os Aspectos Civis do Sequestro Internacional de Crianças, também
conhecida como Convenção de Haia de 1980 foi incorporada ao Ordenamento Jurídico
Brasileiro somente no ano 2000 pelo decreto nº 3.413.
Dessa forma, a Convenção tem por objetivos a proteção da criança ilicitamente subtraída de
sua habitual residência por algum de seus genitores e respeitar os direitos de guarda e visita de
forma efetiva nos Estados Contratantes.
Dados (2017) - https://www.hcch.net/pt/states/hcch-members:
Temos atualmente como países signatários ou Estados Contratantes da Convenção, 82
membros, sendo 81 Estados e 1 Organização regional de integração econômica.
De acordo com o Artigo 2º da Convenção, a principal atribuição dos Estados Contratantes é a
de concretizar os objetivos da Convenção, tomando medidas apropriadas em seus territórios,
mas também atentos à procedimentos de urgência se for o caso.
Como será observado mais adiante em tópico específico, cada Estado designará uma
Autoridade Central, que por sua vez deverão cooperar entre si, nos termos da convenção.
Quanto à cooperação, no Brasil, a SDH (Secretaria de Direitos Humanos) em sua página
eletrônica na internet elenca as estatísticas de Subtração Interparental de Crianças, traçando
ainda uma definição sobre pedidos de cooperação ativos e passivos:
Estatísticas de Subtração Internacional de Crianças
Os pedidos de cooperação jurídica internacional tramitada pelo Brasil com base na Convenção
de Haia de 1980 sobre os Aspectos Civis do Sequestro Internacional de Crianças podem ser
ativos ou passivos. Os pedidos ativos são aqueles que o Brasil envia para o exterior pedindo a
cooperação de outro país. Os pedidos passivos são aqueles enviados pelas autoridades
estrangeiras solicitando a cooperação do Brasil. Os pedidos de cooperação podem ter como
objeto o retorno da criança ao seu país de residência habitual (art. 3º da Convenção) ou a
regulamentação do direito de visitas de um dos genitores em relação à criança (art. 21). Entre
janeiro e dezembro de 2015 tramitaram na Autoridade Central um total de 376 pedidos de
cooperação jurídica internacional (já somados os casos novos de 2015). Desse total 27,8% são
ativos (77% retorno e 23% visitas) e os outros 72,2% são pedidos passivos (87% retorno e 13%
visitas).
É possível notar, que têm crescido de uma forma bem significativa, sobretudo, envolvendo o
Brasil. De acordo com o Manual de Aplicação da Convenção da Haia de 1980 Justiça Federal:
-se àquele cônjuge que não detém a guarda dos seus filhos e vai
para outro país, onde fixa nova residência, subtraindo as crianças do convívio do outro; ou
então, embora tivesse a autorização inicial do outro para viagem, ali retém indevidamente a
criança. A Convenção estabelece, assim, um sistema de cooperação jurídica internacional
entre as autoridades centrais dos Estados Partes envolvidos, de forma a garantir um

494
procedimento célere para o retorno da criança ilegalmente removida ou retida ao local de sua

Entretanto, não se pode confundir a celeridade com retorno imediato da criança.


Isso porque, nos termos da própria Convenção, é possível averiguar que existem situações em
que efetuando o retorno imediato da criança, poderia causar sérios problemas ao menor.
Maria Berenice Dias (2016, p. 696 e 697) explica que:
O retorno imediato deve ocorrer quando a transferência ou retenção ilícita tiver ocorrido em
período menor de um ano entre o ato e o pedido apresentado às autoridades. Mesmo expirado
esse prazo, deve ser ordenado o regresso imediato, salvo quando comprovado que a criança já
se encontra integrada no seu novo meio. No entanto, a determinação de devolução da criança
ilicitamente retirada de seu país não é um princípio absoluto. Deve analisar o interesse maior
da criança, que tem assento constitucional.
Atitudes imediatas podem acarretar problemas irremediáveis às crianças que é sem sombra de
dúvidas o núcleo da Convenção. Dessa forma, todo cuidado é pouco, além, por óbvio, máximo
sigilo e proteção.
Nesse sentido destaca-se a decisão do Juiz Federal Substituto Sr Rafael de Souza Pereira Pinto
da 16ª Vara Federal do Rio de Janeiro no processo nº 2008.51.01.018422-0:
Estabeleço, em cumprimento à decisão daquela Eg. Corte, o seguinte regime de transição, a ser
realizado no Brasil, até ulterior julgamento do Mandado de Segurança n. o 2009.02.01.008575-
0, ou eventual decisão em contrário, proveniente de instância superior:
[...] vii) fica terminantemente vedada qualquer exposição do menino à imprensa [...].
Necessário se faz a análise de cada caso, tendo como base os dispositivos da Convenção, porém
não se pode olvidar do núcleo que é a criança e a sua proteção já presumida, mas que possui
assento Constitucional, reforçando ainda mais tal necessidade antes de uma tomada de
decisão.
3. OUTRAS CONVENÇÕES INTERNACIONAIS QUE VISAM PROTEÇÃO DA CRIANÇA
Posteriormente, conforme se extrai da página eletrônica da HCCH, os instrumentos, além da
Convenção de Haia de 1980, foram editadas também mais 02 (duas) Convenções
Internacionais pela Conferencia há Haia, quais sejam:
- Convenção sobre a Proteção de Menores e a Cooperação em matéria de Adoção
Internacional, concluída na Haia, em 29 de maio de 1993 (Convenção da Haia sobre Adoção).
Visa a proteção das crianças quanto aos receios de uma adoção ilegal e mal preparada em
âmbito internacional; e

495
- Convenção na jurisdição, na lei aplicável, no reconhecimento, na aplicação e na cooperação
respectivamente à responsabilidade parental e nas medidas para a proteção das crianças,
concluída na Haia em 19 de outubro de 1996.
Entende-se que essa última Convenção tem a pretensão de se evitar conflitos de jurisdição
entre as Autoridades de cada Estado e a lei aplicável, bem como de reforçar a proteção à
pessoa e patrimônio das crianças.
O Brasil, no entanto, ratificou apenas as seguintes Convenções:
- Convenção sobre os Aspetos Civis do Rapto Internacional de Crianças, concluída na Haia, em
25 de outubro de 1980; e
- Convenção sobre a Proteção de Menores e a Cooperação em matéria de Adoção
Internacional, concluída na Haia, em 29 de maio de 1993 (Convenção da Haia sobre Adoção).
Nesse diapasão, conclui-se que a ratificação no Ordenamento Jurídico Brasileiro dessas
Convenções de certa forma espelha a realidade em que o País obviamente se sujeitava,
levando-se em consideração as questões sociais e econômicas.
Ademais, sendo signatário dessas Convenções, o país se curva a uma melhor organização em
seus três poderes: Legislativo, Executivo e Judiciário reforçando ainda mais a necessidade de
proteção ao direito da Criança.
4. ASSENTO CONSTITUCIONAL BRASILEIRO
Nos termos do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), Lei 8.069/1990, considera-se
criança:
Art. 2º Considera-se criança, para os efeitos desta Lei, a pessoa até doze anos de idade
incompletos [...]
Para os efeitos da Convenção de Haia de 1980, considera-se criança:
Artigo 4: A Convenção aplica-se a qualquer criança que tenha residência habitual num Estado
Contratante, imediatamente antes da violação do direito de guarda ou de visita. A aplicação da
Convenção cessa quando a criança atingir a idade de dezesseis anos.
Muito embora o ECA tenha disposto em sua essência que existem exceções, sequer havia
correlação a ampliação da idade da criança. Foi então, somente no século XXI, ou seja, em
2000, por intermédio do Decreto 3.143 que ratificou a Convenção de Haia, quando se tratar do
Sequestro Internacional a conceituação do que vem a ser criança é majorada para 16 anos.
Nesse aspecto, importante ressaltar um avanço, sobretudo protetivo Estatal.
A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 preconiza algumas proteções e
deveres especiais do Estado e da Família.
Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado.

496
Art.227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao
jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à
profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e
comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação,
exploração, violência, crueldade e opressão.
É possível concluir neste tópico que os direitos e deveres do Estado e da Família advêm de uma
cooperação mútua, a fim de contribuir para com um crescimento saudável da criança,
compreendendo sua dignidade, evitando desavenças e problemáticas devastadoras.
Observa-se que o sistema está configurado para uma vida perfeita em sociedade, trazendo
proteção e deveres (assistência), assim também foi configurada a Convenção de Haia de 1980.
Isso significa dizer que, outrora algumas coisas não possam ser perfeitas, como por exemplo, o
fim de um casamento (cônjuge estrangeiro) onde existem crianças, não significa que não possa
haver um bom convívio Social e Familiar respeitando os direitos e guarda e visita existentes
nos Estados.
4.1 Princípio do Melhor Interesse da criança
Melhor inserido no artigo 227 da Constituição Federal e no ECA, conclui-se mais adequado a
aplicação do Princípio do melhor interesse da criança quando essas forem o tema em questão.
Isso porque frágeis em sua essência, atrelado a exclusivamente a inexperiência e dependência
de alguém, suas tomadas de decisões pendem a uma satisfação momentânea, não sendo a
forma adequada que se devem tomar as decisões envolvendo-as.
Segundo Rosanne Christine da Silva Bastos Lopes (2010, p. 22):
A aplicação do princípio do interesse superior do menor estabelece um padrão que considera,
acima de tudo, as necessidades do menor sobre os interesses dos pais, devendo considerar o
caso, concreto em todas as situações. Assim, o princípio do interesse superior do menor tem
por fundamento a resolução de conflitos que envolvem crianças.
Aline Vendrusculo (2011, p. 65) complementa:
O princípio do interesse superior do menor é um preceito jurídico de interpretação essencial,
que impõe limites à amplitude da autoridade do adulto sobre o menor. O princípio
fundamenta-se no fato de a criança não ter o entendimento necessário para decidir sobre
diversas situações, necessitando, pois, de atenção especial, a fim de assegurar o
desenvolvimento saudável de sua personalidade, protegendo-a de danos que podem ser
irreversíveis com o passar do tempo.
A análise de cada caso pressupõe a tão pronta decisão a ser tomada. No entanto, para todas
elas, entende-se que há uma total necessidade de se analisar se foram ou não preservados os
melhores interesses da criança.

497
Com relação aplicação ao princípio do melhor interesse da criança, tem-se a título de exemplo
as seguintes jurisprudências:
DIREITO DE FAMÍLIA. VIAGEM DE MENORES. AÇÃO DE SUPRIMENTO DE
CONSENTIMENTO PATERNO. MELHOR INTERESSE
DA CRIANÇA. CONVENÇÃO INTERNACIONAL SOBRE OS DIREITOS DA CRIANÇA E
ADOLESCENTE. DISPUTA ENTRE GENITORES. PEDIDO AUTORAL NEGADO.
MANUTENÇÃO. PRECEDENTES EG. STJ. TJ-RJ - APELACAO APL 01270537820088190001 RJ
0127053-78.2008.8.19.0001 (TJ-RJ)
No processo em comento, a genitora pretende autorização do outro genitor para que possa
viajar para um país Europeu, em busca de uma melhor condição de vida.
O Magistrado, porém, entendeu que autorizando a pretensão da genitora, estaria ele privando

A seguir, outra decisão:


APELAÇÃO CÍVEL. CRIANÇA E ADOLESCENTE. ALVARÁ JUDICIAL. VIAGEM
INTERNACIONAL DE MENOR NA COMPANHIA DA GENITORA. SUPRIMENTO DO
CONSENTIMENTO PATERNO. PRAZO. ALCANCE DA MAIORIDADE. AUSÊNCIA DE
PREVISÃO LEGAL. DOUTRINA DE PROTEÇÃO INTEGRAL DO MENOR. MELHOR
INTERESSE DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. (TJ-DF - Apelação Cível APC
20110130075994 TJ-DF)
Na decisão acima, o Desembargador esclarece, por exemplo, a autorização prevista no artigo
83,§2º, da Lei 8.069/1990 - Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Ainda completou:
2. Afigura-se essencial ao exercício da atividade do julgador, ao analisar pedido de autorização
de viagem de criança ou adolescente ao exterior, considerar o caso concreto e suas
especificidades, primando pela aplicação do princípio do melhor interesse do menor, e
buscando sempre evitar situações de risco, como, por exemplo, manobras
de alienação parental e sequestro de crianças e adolescentes não raras de ocorrer e de difícil
reversão.
Dessa forma, ainda que com vinculadas nas legislações nacionais e internacionais, as decisões
do judiciário pendem a prevalecer o melhor interesse da criança, atrelados sim a normas, mas,
sobretudo a um interesse social e visionário.
5. ATUAÇÕES E PROCEDIMENTOS CONVENÇÃO DE HAIA 1980
Nos termos do artigo 6º da Convenção, cada Estado deve designar uma Autoridade Central
que será encarregada de ofertar os respectivos cumprimentos das obrigações impostas pela
Convenção.
O Manual de aplicação da Haia de 1980 expõe (2015, p.10):

498
A autoridade central é o órgão nacional interno responsável pela condução da cooperação
jurídica com outros Estados ou organizações internacionais. Cabe-lhe receber, analisar,
adequar, transmitir e acompanhar os pedidos de cooperação, realizando sobre estes o juízo
preliminar de admissibilidade, levando em conta a legislação nacional e os tratados vigentes,
bem como normativos, práticas e costumes nacionais e internacionais. Compete-lhe ainda
buscar permanentemente a melhoria da cooperação, buscando torna-la mais célere e efetiva.
No Brasil a SEDH (Secretaria Especial dos Direitos Humanos) atua como Autoridade Central
Federal, responsável, portanto, pela cooperação jurídica com outros Estados, exercendo uma
função administrativa, nos termos da Convenção.
Artigo 7º da Convenção de Haia de 1980:
As autoridades centrais devem cooperar entre si e promover a colaboração entre as
autoridades competentes dos seus respectivos Estados, de forma a assegurar o retorno
imediato das crianças e a realizar os demais objetivos da presente Convenção.
Em particular, deverão tomar, quer diretamente, quer através de um intermediário, todas as
medidas apropriadas para:
a) localizar uma criança transferida ou retida ilicitamente;
b) evitar novos danos à criança, ou prejuízos às parles interessadas, tomando ou fazendo tomar
medidas preventivas;
c) assegurar a entrega voluntária da criança ou facilitar uma solução amigável;
d) proceder, quando desejável, à troça de informações relativas à situação social da criança;
e) fornecer informações de caráter geral sobre a legislação de seu Estado relativa à aplicação
da Convenção;
f) dar início ou favorecer a abertura de processo judicial ou administrativo que vise o retomo
da criança ou, quando for o caso, que permita a organização ou o exercício efetivo do direito de
visita;
g) acordar ou facilitar, conforme ás circunstâncias, a obtenção de assistência judiciária e
jurídica, incluindo a participação de um advogado;
h) assegurar no plano administrativo, quando necessário e oportuno, o retorno sem perigo da
criança;
i) manterem-se mutuamente informados sobre o funcionamento da Convenção e, tanto
quanto possível, eliminarem os obstáculos que eventualmente se oponham à aplicação desta.
Dentre essas medidas, destacamos a parte final da alínea h, citada acima, daí então vemos a
correlação ao artigo 227 da Constituição Federal do Brasil, ao passo que, deverão ser
preservados além do melhor interesse da criança, a sua respectiva proteção qual for hipótese.

499
Importante relacionar a seguir uma ilustração que Conselho da Justiça Federal apontou em
forma de um Fluxograma quanto a parte pré-processual ou então, denominada neste artigo de
procedimento Administrativo. (Manual de Aplicação da Convenção de Haia de 1980 Justiça
Federal, 2015, p.17 a 18):

500
6. PROCESSOS JUDICIAIS
Muito embora as partes tenham provocado a tutela jurisdicional a fim de garantir o direito que
lhe cabe, cabe ressaltar que o Judiciário após análise de todos requisitos de peticionamento e
condições da ação, procederá com agendamento de audiência inicial de conciliação, haja vista
recomendação do Conselho Nacional de Justiça, bem como aos dados que demonstram grande
parte de soluções de cunho familiar por consenso.
Dessa forma, o ordenamento jurídico Brasileiro poderá se valer de todos os meios a fim de que
estejam presentes os principais envolvidos na respectiva audiência.
Permanecendo infrutíferas as tentativas de consenso pelas partes, o processo segue para
julgamento, nos termos da Convenção ouvindo o Ministério Público e preservando o melhor
interesse da criança.
Neste sentido, elencam-se abaixo algumas decisões judiciais:

501
DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO. CONVENÇÃO DA HAIA SOBRE ASPECTOS CIVIS
DO SEQUESTRO INTERNACIONAL DE CRIANÇAS. COOPERAÇÃO JURÍDICA ENTRE
ESTADOS. BUSCA, APREENSÃO E RESTITUIÇÃO DE INFANTE. GUARDA
COMPARTILHADA. OCORRÊNCIA DE RETENÇÃO ILÍCITA POR UM DOS GENITORES.
EXCEÇÕES NÃO CONFIGURADAS. ÔNUS DA PROVA QUE INCUMBE À RECORRENTE.
RETENÇÃO NOVA. NECESSIDADE DE RETORNO DA CRIANÇA AO PAÍS DE RESIDÊNCIA
HABITUAL, JUÍZO NATURAL COMPETENTE PARA DECIDIR SOBRE A SUA GUARDA. (STJ
- RECURSO ESPECIAL REsp 1351325 RJ 2012/0227705-3 STJ)
INTERNACIONAL E PROCESSUAL CIVIL. BUSCA E APREENSÃO DE MENOR. MÃE
BRASILEIRA E PAI AMERICANO. CRIANÇA TRANSFERIDA ILICITAMENTE PARA O
BRASIL. CONVENÇÃO DE HAIA SOBRE OS ASPECTOS CIVIS
DO SEQUESTRO INTERNACIONAL DE CRIANÇAS. LEGITIMIDADE ATIVA: GENITOR E
AUTORIDADE CENTRAL BRASILEIRA. PROVA TESTEMUNHAL. NÃO PRODUÇÃO.
CERCEAMENTO DE DEFESA NÃO CONFIGURADO. MÉRITO. ESTUDO PSICOLÓGICO.
COMPLETA ADAPTAÇÃO DO MENOR AO NOVO MEIO SOCIAL. RESTITUIÇÃO AO PAÍS
DE MORADIA ANTERIOR: IMPOSSIBILIDADE. REFORMA DA SENTENÇA. TRF-1 -
APELAÇÃO CIVEL AC 3352220084013800 MG 0000335-22.2008.4.01.3800 (TRF-1)
Como se observa nas decisões colacionadas, os estudos psicológicos trazem mais
fundamentação às decisões dos Magistrados/Desembargadores, verificando ainda a adaptação
do menor em seu novo meio social.
Logo e também por todas essas verificações, poderá concluir se o menor deve ou não retornar
ao seu país de moradia anterior.
7. ALIENAÇÃO PARENTAL
Em tópico específico referente ao Princípio do Melhor Interesse da Criança, foi relacionado
um julgamento, onde o Desembargador se pronunciou acerca da alienação parental em
conjunto com o sequestro do menor.
Continuou ainda dizendo que a são essas, situações não raras de acontecer, bem como difíceis
de reversão.
Vejamos:
2. Afigura-se essencial ao exercício da atividade do julgador, ao analisar pedido de autorização
de viagem de criança ou adolescente ao exterior, considerar o caso concreto e suas
especificidades, primando pela aplicação do princípio do melhor interesse do menor, e
buscando sempre evitar situações de risco, como, por exemplo, manobras
de alienação parental e sequestro de crianças e adolescentes não raras de ocorrer e de difícil
reversão. (TJ-DF - Apelação Cível APC 20110130075994 TJ-DF).
Dessa forma, entende-se que a alienação parental também é um fator preocupante na seara
familiar, devendo ser fortemente combatida.
502
Disposto no artigo 2º da Lei 12.318 de 2010, a Alienação Parental é definida como:
Considera-se ato de alienação parental a interferência na formação psicológica da criança ou
do adolescente promovida ou induzida por um dos genitores, pelos avós ou pelos que tenham a
criança ou adolescente sob a sua autoridade, guarda ou vigilância para que repudie genitor ou
que cause prejuízo ao estabelecimento ou à manutenção de vínculos com este.
Para Jorge Trindade (2007, p102):
A Síndrome de Alienação Parental é um transtorno psicológico que se caracteriza por um
conjunto de sintomas pelos quais um genitor, denominado cônjuge alienador, transforma a
consciência de seus filhos, mediante diferentes formas e estratégias de atuação, com objetivo
de impedir, obstaculizar ou destruir seus vínculos com o outro genitor, denominado cônjuge
alienado, sem que existam motivos reais que justifiquem essa condição. Em outras palavras,
consiste num processo de programar uma criança para que odeie um de seus genitores sem
justificativa, de modo que a própria criança ingressa na trajetória de desmoralização desse
mesmo genitor.
É de se imaginar que a criança vítima de sequestro por um de seus genitores estaria propícia a
alienação parental.
Querendo evitar essa situação, a Convenção de Haia de 1980 também versa sobre a visitação
do outro genitor.
Ademais, este também um dos objetivos da mesma, nos termos do artigo 1º.
Nesse sentido é o entendimento do Desembargador Federal André Nekatschalow:
TRF-3 - APELAÇÃO CÍVEL: AC 6517 SP 0006517-63.2013.4.03.6105 PROCESSUAL CIVIL.
CONVENÇÃO SOBRE OS ASPECTOS CIVIS DO SEQUESTRO INTERNACIONAL DE
CRIANÇAS, CONCLUÍDA NA CIDADE DE HAIA, EM 25.10.80. OBJETIVOS.
APLICABILIDADE. APELAÇÃO PROVIDA.
Ainda nesse processo, o Desembargador expõe em sua fundamentação os seguintes parágrafos:
2. A Convenção de Haia tem por escopo tanto assegurar o retorno imediato de crianças
ilicitamente transferidas para qualquer Estado, quanto fazer respeitar de maneira efetiva os
direitos de guarda e de visita existentes num Estado contratante.
3. O objetivo da norma é permitir convivência dos pais com os filhos, ou seja, impedir que o
distanciamento entre genitor e filhos traga alienação parental, fortalecendo, assim, os vínculos
afetivos e sociais.
De acordo com Carolina Helena Lucas Mérida (2011, p.08):
A Convenção de Haia de 1980, apesar de imperfeita, tem sido uma das melhores alternativas
que impera nos casos desta natureza. A referida Convenção é um tratado multilateral que

503
insere os Estados em um regime internacional de localização e avaliação da real situação da
criança, que deverá ser restituída ao Estado de residência habitual.
Dessa forma, visando o fortalecimento dos vínculos afetivos e sociais, almejando o
crescimento sadio e psicológico do menor, tem-se que a Convenção está criteriosamente
moldada a fim de se evitar a Alienação Parental no âmbito internacional.
CONCLUSÃO
Buscou-se apresentar nesse artigo um reforço ante a problemática que ainda é vivenciada em
todo mundo.
Diversos doutrinadores ainda continuam a discorrer sobre esse tema, explorando a cada dia os
aspectos mais relevantes sobre o Sequestro Internacional.
A partir da análise fática do tema, ou seja, a compreensão e anuência dos motivos ensejadores
pela busca de uma condição melhor em outro país, conclui-se que população têm fechado os
olhos as questões sociais, sobretudo no amor ao próximo.
Muito embora o Brasil e outros países possam ser signatários da Convenção de Haia de 1980,
suspeita-se da existência de muitos outros casos, mas que não tomam forma administrativa e
ou judicial.
O Sequestro Internacional está intimamente ligado com o instrumento da Alienação Parental,
ao passo que a persuasão do genitor para com seu filho e para a sociedade é tão intensa e que
não existem suspeitas de tal ato.
Em outras palavras, estão havendo retenções ilícitas de menor por intermédio de um dos
genitores (prejudicando a criança em todo seu aspecto social e psicológico), mas que nunca
foram levados a conhecimento das autoridades. A vítima nessa história toda é apenas e tão
somente a criança, em toda sua vida.
Com qual mentalidade uma criança vitimada a tal situação pende a crescer e se desenvolver?
Uma criança enfrentar tão cedo em sua vida uma problematização familiar de cunho
internacional compromete e muito o seu lazer, saúde, educação e convívio social.
O presente artigo deixa claro e evidente que existem mecanismos para que se possam
erradicar essas atitudes covardes, ou senão diminuí-las. Mas será que só isso basta?
Sabe-se que existem Blogs, tratando a respeito da Alienação Parental e Sequestro
Internacional. No entanto é preciso ser feito muito mais.
Que possa ser compreendido e conscientizado não só o ordenamento jurídico Brasileiro, mas
também o Internacional. Estão vendando os olhos para os maiores tesouros que possuímos.
Estão se esquecendo de quem são a esperança de um mundo melhor, em todos os sentidos,
econômicos, sociais e religiosos. Se esqueceram do amor.

504
É necessário que esse assunto possa tomar uma veiculação cada vez maior em todo o planeta,
seja por intermédio de artigos científicos, senão telejornais, revistas e campanhas.
Se espera, por fim, que a legislação Brasileira possa ser cada vez mais atuante, querendo
incessantemente erradicar essa problemática e que possa dar um exemplo a ser seguido,
resguardando e preservando a proteção e melhor interesse da criança.
Referências
ARAUJO, Nadia de. Direito internacional privado: teoria e prática brasileira. Rio de Janeiro:
Renovar, 2011.
BRASIL. Decreto n. 3.951, de 4 de outubro de 2001. Designa a Autoridade Central para dar
cumprimento às obrigações impostas pela Convenção sobre os Aspectos Civis do Sequestro
Internacional de Crianças, cria o Conselho da Autoridade Central Administrativa Federal
contra o Sequestro Internacional de Crianças e institui o Programa Nacional para Cooperação
no Regresso de Crianças e Adolescentes Brasileiros Sequestrados Internacionalmente. Diário
Oficial da União, 5 out. 2001. Disponível em: Acesso em: 19 jun. 2012
DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito de Família: De acordo com o Novo CPC 11 Ed.
Saraiva,2016.
http://www.conjur.com.br/2015-dez-14/brasil-desrespeitou-convencao-haia-sean-goldman
Ivone Zeger (advogada especialista em Direito de Família e Sucessões)
http://www.sdh.gov.br/assuntos/adocao-e-sequestro-internacional/dados-estatisticos
JURIS BRASIL.Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/topicos/26738284/sequestro-
internacional-de-criancas-alienação-parental/jurisprudencia. Acesso em 12 de abril de 2017
JUSTIÇA FEDERAL. Conselho da Justiça Federal, Centro de Estudos Judiciários, Manuel de
Aplicação Da Convenção Da Haia De 1980.
LOPES, Rosanne Christine da Silva Bastos. Sequestro internacional de crianças: análise e
estudo do caso do menino Sean. Brasília, 2010. 80 f. Trabalho de conclusão de curso
(Bacharelado em Direito) Centro Universitário Uniceub, 2010. Disponível em: Acesso em: 1º
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SALES, Mione Apolinário, MATOS, Maurílio Castro de e LEAL Maria Cristina. Política Social,
Família e Juventude: Uma questão de direitos, 3ªEd. Cortez, São Paulo, 2008.
TRINDADE, Jorge. Síndrome de Alienação Parental (SAP). In: DIAS, Maria Berenice
(Coord.). Incesto e Alienação Parental: realidades que justiça insiste em não ver. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2007. p. 102-106.
VENDRUSCOLO, Aline. Sequestro internacional de crianças e o princípio do melhor interesse
da criança. Brasília, 2011. 96 f. Trabalho de conclusão de curso (Bacharelado em Direito)
Centro Universitário Uniceub, 2011. Disponível em: Acesso em: 12 jun 2012.

505
506
O PRINCÍPIO DA VEDAÇÃO AO RETROCESSO EM MATÉRIA AMBIENTAL COMO
REFLEXO DA PROTEÇÃO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA: REFLEXÃO SOBRE
A INCONSTITUCIONALIDADE MATERIAL DA PEC 65/2012 SOBRE LICENCIAMENTO
AMBIENTAL POR VIOLAÇÃO AO DIREITO À VIDA DIGNA E À SAÚDE
293

294

Resumo
Este artigo apresenta uma abordagem teórico-conceitual sobre o direito constitucional ao
meio ambiente ecologicamente equilibrado e sua ligação ao direito à vida digna e à saúde.
Nesse sentido, o estudo apresenta uma reflexão sobre a proposta de emenda constitucional n.
65/2012, na qual se busca reduzir o processo de licenciamento ambiental a mero requisito
formal para realização de grandes obras. Segundo a proposta, com a simples apresentação de
um Estudo Impacto Ambiental (EIA) pelo empreendedor, nenhuma obra poderá mais ser
suspensa ou cancelada. Diante do efetivo retrocesso ambiental decorrente dessa medida,
busca-se analisar referido projeto à luz dos princípios da vedação ao retrocesso e da proteção à
dignidade da pessoa humana como fundamento da República Federativa do Brasil, tendo como
norte o direito à vida e à saúde. Assim, num primeiro momento, analisa-se as diversas
concepções da noção de dignidade da pessoa humana e sua aplicação no âmbito do direito
constitucional ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, preconizado no artigo 225 da
Constituição Federal da República Federativa do Brasil de 1988. Em seguida, é feita uma
análise pormenorizada do projeto de emenda em contraposição à regra vigente, cotejando-se
com a matriz constitucional prevista como cláusula pétrea em seu artigo 60, §4º, inciso IV. O
artigo vale-se do método analítico, pautado na doutrina, bem como na legislação
constitucional, infraconstitucional relativas ao tema em estudo.
Palavras-chave: direitos humanos, dignidade da pessoa humana, meio ambiente, saúde, vida.
Introdução

Doutor em Direito Civil pela Universidade de São Paulo (USP). Mestre em História do Direito pela Université
293

Paris II (Panthéon-Assas). Promotor de Justiça do Ministério Público do Estado de São Paulo. Professor Titular do
Programa de Mestrado do Centro Universitário Salesiano de São Paulo UNISAL Campus Lorena. Líder do Grupo
ao Programa de Mestrado em
Direito do Centro UNISAL de Lorena SP. E-mail: jaimenascimento@mpsp.mp.br
294
Doutora em Direito. Mestre em Direitos Difusos e Coletivos. Professora Titular do Programa de Mestrado em
Direito do Centro Universitário Salesiano de São Paulo (UNISAL), de Lorena/ SP e nos Cursos de Graduação e Pós-
graduação. Professora e Pesquisadora do Programa de Mestrado em Direito do Centro UNISAL de Lorena - SP.
Pesquisadora dos Grupos de Estudos "Ética e Meio Ambiente", "Direito das Minorias" e do Observatório de
Violências nas Escolas UCB/UNESCO/ UNISAL. Coordenadora do Núcleo de Direitos Humanos do UNISAL -
Lorena-SP. Líder do Grupo de Pesquisa "Direitos Humanos" do Programa de Mestrado em Direito do Centro
UNISAL de Lorena SP. Professora Doutora III da EEL USP Universidade de São Paulo, onde ministra a disciplina
Direito Ambiental. E-mail: daisyrafa1@hotmail.com.

507
Neste século XXI, a humanidade avalia as conquistas e os desacertos que a trouxe até o
presente. As descobertas científicas, o surgimento diuturno de novas tecnologias, a
globalização enfim, o desenvolvimento apresenta uma série de benefícios à vida humana e
com ele os efeitos da interferência voraz ao meio ambiente, os riscos ao equilíbrio ecológico, a
poluição, a degradação e o dano ambiental.
Além disso, os reflexos à sadia qualidade de vida humana que até um determinado momento
da história não apresentava consciência da sua inter-relação com tudo o que compõe o meio
ambiente seja ele natural, artificial, cultural ou do trabalho. Passou-se da relação de simbiose
para a relação em que se torna predador, partindo da ideia de que todos os recursos ambientais
existam para sua satisfação.
Assim, ter por base o Desenvolvimento Sustentável e o conceito de Sustentabilidade nesta
sociedade capitalista com a conflituosidade entre desenvolvimento científico-tecnológico-
econômico e manutenção de condições e equilíbrio ambientais implica uma série de ações e
medidas a serem adotadas por todos, a partir do comprometimento individual, participação
coletiva, atuação do poder público e cooperação efetivas para a proteção dos bens ambientais.
A necessidade de proteção ao meio ambiente se faz hoje em razão da urgência em, impedir ou
reverter profundas alterações ao meio ambiente provocadas pelo desenvolvimento e consumo,
esta visão quanto à proteção do meio ambiente não basta para que ela seja efetiva.
Afinal, o Ser Humano, como parte integrante do meio ambiente, dele depende para que possa
continuar existindo e vivendo com saúde e qualidade. As mudanças provocadas pela atuação
antrópica acarretam consequências muitas vezes imprevisíveis diante das incontáveis
variáveis que influenciam o ecossistema.
Por outro lado, observa-se no Brasil recente diversas modificações legislativas que têm
privilegiado o setor agrário e desenvolvimentista, sem qualquer respaldo científico, anulando-
se conquistas legais em prol de interesses exclusivamente econômicos ou políticos, o que
acarreta retrocesso ambiental e o risco de perecimento de riquezas naturais que dão suporte à
vida e à saúde.
O objetivo deste artigo consiste em analisar essa conjuntura histórico-jurídica, partindo-se do
aparato doutrinário a fim de refletir sobre o Projeto de Emenda Constitucional 65/2012, que,
sob o pretexto de simplificar o processo de licenciamento ambiental, na prática, representa
sua supressão.
O artigo vale-se do método analítico, pautado na doutrina, bem como na legislação
constitucional, infraconstitucional relativas ao tema em estudo.
1. MEIO AMBIENTE: ASPECTOS JURÍDICOS
A pessoa humana é parte integrante de um sistema vivo: o meio ambiente. Somos espécies que
constantemente interferimos neste sistema.

508
A preocupação ambiental e a manutenção da qualidade ambiental para sustentação da vida
humana, no planeta, é tema discutido mundialmente.
O direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado integra os Direitos Humanos
Fundamentais denominado de terceira geração e intimamente ligado a dignidade.
Wolkmer (2003, p. 9) apresenta duas posições entre os estudiosos brasileiros quanto aos
direitos de terceira geração:
a) interpretação abrangente acerca dos direitos de solidariedade ou fraternidade (Lafer,
Bonavides, Bedin, Sarlet) incluem-se aqui os direitos relacionados ao desenvolvimento, à
paz, à autodeterminação dos povos, ao meio ambiente sadio, à qualidade de vida, o direito do
consumidor etc.;
b) interpretação específica acerca de direitos transindividuais (Oliveira J.) aglutinam-se aqui
os direitos de titularidade coletiva e difusa, adquirindo crescente importância o Direito
Ambiental e o Direito do Consumidor.
O Direito Ambiental enquadra-se, portanto, nos Direitos de Terceira Geração e tem por direito
humano fundamental o equilíbrio e a qualidade ambiental para que a vida humana seja sadia e
com qualidade.
A Lei de Política Nacional do Meio Ambiente (6.938/81) traz em seu artigo 3 º, inciso I, o
conceito de meio ambiente, caracterizando-
interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as

Para Silva (2001, p. 21) o conceito mostra a existência de três aspectos do meio ambiente:
I meio ambiente artificial, constituído pelo espaço urbano construído, consubstanciado no
conjunto de edificações (espaço urbano fechado) e dos equipamentos públicos (ruas, praças
áreas verdes, espaços livres em geral: espaço urbano aberto); II meio ambiente cultural,
integrado pelo patrimônio histórico, artístico, arqueológico, paisagístico, turístico, que,
embora artificial, em regra, como obra do Homem, difere do anterior (que também é cultural)
pelo sentido de valor especial que adquiriu ou de que se impregnou; III meio ambiente
natural ou físico, constituído pelo solo, a água, o ar atmosférico, a flora; enfim, pela interação
dos seres vivos e seu meio, onde se dá a correlação recíproca entre as espécies e as relações
destas com o ambiente físico que ocupam. É este o aspecto do meio ambiente que a Lei 6.938
de 31.8.1981, define em seu art. 3°, quando diz que, para os fins nela previstos, entende-se por
meio ambiente o conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química
e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas. (grifo nosso)
1.1. DOS PRINCÍPIOS APLICÁVEIS DO DIREITO AMBIENTAL
Apresentamos a seguir os princípios norteadores do Direito Ambiental Brasileiro
imprescindíveis para a participação dos cidadãos e formulação de políticas públicas, como

509
também a defesa, preservação e conservação do meio ambiente, conforme o caput do artigo
225 da Constituição Federal, seus respectivos parágrafos e incisos:
1.1.1. PRINCÍPIO DO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL
O Princípio do Desenvolvimento Sustentável tem por base a conciliação entre crescimento
econômico e social e preservação ambiental para manutenção da qualidade ambiental e a sadia
qualidade de vida das presentes e futuras gerações.
Este princípio nasceu em Estocolmo, em 1972 com a Conferência das Nações Unidas sobre
Meio Ambiente que deu origem a Declaração das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente
Humano.
Em 1992, com a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento no
Rio de Janeiro, enfatizou-se o desenvolvimento sustentável expandindo os princípios nascidos
em Estocolmo, trazendo na Declaração do RIO 92 onze artigos referentes a este princípio
dentre os quais destacamos:
Artigo 1º: Os seres humanos estão no centro das preocupações com o desenvolvimento
sustentável. Têm direito a uma vida saudável e produtiva, em harmonia com a natureza.
...
Artigo 4º: A fim de alcançar o desenvolvimento sustentável, a proteção do meio ambiente
deverá constituir-se como parte integrante do processo de desenvolvimento e não poderá ser
considerada de forma isolada.
A Constituição Federal Brasileira de 1988 traz o capítulo Do Meio Ambiente, caracterizado
como direito humano fundamental, o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado
para a sadia qualidade de vida da pessoa humana, conforme o caput:
Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum
do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao poder público e à coletividade o
dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.
Este direito deve ser compatível com os princípios da ordem econômica trazidos no capítulo
Dos Princípios Gerais da Atividade Econômica da Constituição Federal, inscritos no artigo 170,
in verbis:
Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa,
tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social,
observados os seguintes princípios:
(...)
VI - defesa do meio ambiente; inclusive mediante tratamento diferenciado conforme impacto
ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração e prestação;
VII - redução das desigualdades regionais e sociais;

510
(...)
Parágrafo único. É assegurado a todos o livre exercício de qualquer atividade econômica,
independentemente de autorização de órgãos públicos, salvo nos casos previstos em lei. (grifo
nosso)
O desenvolvimento sustentável é aquele pautado no equilíbrio ambiental, a fim de permitir
que as presentes e futuras gerações vivam com dignidade e saúde sem, no entanto, paralisar as
atividades socioeconômicas.
Desta feita, deve-se adotar formas de harmonizar o sistema de produção e o meio ambiente
para que não ocorra o esgotamento dos recursos naturais e consequentemente cause o
desequilíbrio ecológico.
Yoshida (2001, p. 8) ao tratar do tema traz o conceito de desenvolvimento humano sustentável,
o apresentado em quatro dimensões:
1-pressupõe ser o crescimento econômico condição necessária, mas não suficiente para o
desenvolvimento humano;
2- o desenvolvimento humano não ocorre num contexto de exclusão social;
3-as pessoas tem de ter acesso a informações, conhecimento e bens culturais para sua própria
promoção;
4- que a forma de crescimento econômico atual não comprometa as oportunidades das futuras
gerações, sendo imprescindível para o desenvolvimento humano, a sustentabilidade.
De modo que esta sustentabilidade possibilite à pessoa humana, condições de inserção política,
econômica, cultural, e social, imprescindíveis a sua dignidade.
1.1.2. PRINCÍPIO DA PREVENÇÃO / PRECAUÇÃO
O princípio da prevenção/precaução decorre da noção de risco inerente a qualquer
intervenção humana sobre determinado ecossistema.
A esse respeito, a Constituição Federal brasileira traz em seu artigo 225, §1º, inciso V:
Art. 225. (...)
§ 1.º Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao poder público:
...
V - controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos e substâncias
que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente; (grifo nosso)
A norma constitucional supracitada traz a Prevenção como princípio.
Assim, diante de toda e qualquer atividade que possa causar risco à qualidade ambiental deve-
se preceder a análise quanto a possível lesão ou ameaça, exigindo-se, pois, uma atuação

511
preventiva a fim de que se atue antecipadamente para que os perigos comprovados sejam
eliminados.
Machado (2010) apresenta meios para a aplicação deste princípio, são eles: a identificação e
inventário dos bens ambientais e fatores de risco de dano e poluição; mapeamento ecológico;
integração do planejamento ambiental e econômico; ordenamento territorial ambiental e
Estudo de Impacto Ambiental (previsto em nossa Constituição Federal em seu art. 225, § 1.º,
inciso IV), no tocante a este último, trata-se de instrumento fundamental para o
Licenciamento Ambiental.
A precaução, por sua vez, deve ocorrer diante da ausência de certeza científica absoluta, não
podendo a incerteza ser utilizada como razão para adiar a adoção de medidas eficazes, ou seja,
ela precede à manifestação do perigo e está insculpida no Princípio 15 da Declaração do Rio de
Janeiro de 1992, como segue:
De modo a proteger o meio ambiente, o princípio da precaução deve ser amplamente
observado pelos Estados, de acordo com suas capacidades. Quando houver ameaça de danos
sérios ou irreversíveis, a ausência absoluta de certeza científica não deve ser utilizada como
razão para postergar medidas eficazes e economicamente viáveis para prevenir a degradação
ambiental. (MACHADO, Direito Ambiental Brasileiro, 2010, p. 72) (grifo nosso)
A precaução é uma cautela antecipada, ou seja, precede-se a uma manifestação de perigo,
objetivando através de uma política ambiental adequada prevenir uma suspeita ou garantir
uma eficiente segurança diante de determinado perigo. Este princípio tem bases na segurança
do meio ambiente e da continuidade da vida, tanto que in dubio pro salute ou in dubio pro
natura.
Para Machado (2004, p. 57) ela nasce da
diferença temporal entre a necessidade imediata de ação e o momento de nossos

Ao analisar todas as possibilidades quanto ao perigo iminente e as consequências futuras, toda


a atividade desenvolvida deve ter bases na precaução a fim de não ocorra o desequilíbrio
ambiental e exposição da vida humana em risco.
Neste sentido, Leite e Ayala (2004, p. 47)
princípio da atuação preventiva exige uma atuação racional para com os bens ambientais,

O Poder Público tem responsabilidades na gestão de riscos, portanto, deve-


repartição da carga de riscos tecnol
sociedade moderna julgará o Estado pela sua capacidade de gerir riscos (MACHADO, 2004, p.
68).
A lei 9.605/98 trata da ausência da Precaução no parágrafo 3º do artigo 54, como se observa:

512
incorre nas mesmas penas previstas no parágrafo anterior quem deixar de adotar, quando
assim o exigir a autoridade competente, medidas de precaução em caso de risco de dano
ambiental grave ou irreversível. (grifo nosso)
Para se evitar ações e omissões que coloquem ou possam trazer risco à qualidade ambiental é
de suma importância a participação dos cidadãos para implementação e formação das políticas
ambientais pautadas na precaução e prevenção.
1.1.3 PRINCÍPIO DA INFORMAÇÃO
De acordo com Leme Machado (2010, p. 100) a informação dá a chance de nos inteirarmos,
para tomarmos posições e pronunciarmos sobre a matéria apresentada.
Sob o foco ambiental a Declaração do Rio de Janeiro de 1992 traz no princípio 10 o seguinte:
no nível nacional, cada indivíduo deve ter acesso adequado a informações relativas ao meio
ambiente de que disponham as autoridades públicas, inclusive informações sobre materiais e
atividades perigosas em suas comunidades.(grifo nosso)
Para Machado a informação ambiental não tem o objetivo exclusivo de formar a opinião
pública e enfatiza que é:
valioso formar a consciência ambiental, mas com canais próprios, administrativos e judiciais,
para manifestar-se. O grande destinatário da informação o povo, em todos os seus
segmentos, incluindo o científico não-governamental tem o que dizer e opinar (2010, p. 100).
Com exceção do segredo industrial ou do Estado, todas as informações ambientais devem ser
transmitidas não somente no caso de lesão ao meio ambiente, como também dados sobre
riscos e possibilidades de danos à qualidade ambiental, sendo encontrados em documentos e
estudos, no Licenciamento Ambiental.
A informação ambiental deve ser transmitida de forma a possibilitar tempo suficiente aos
informados para analisarem a matéria e poderem agir.
2. A PROPOSTA DE EMENDA CONSTITUCIONAL 65/2012 (PEC 65/2012)
Referida PEC foi apresentada pelo então Senador Acir Gurcacz proposta com o objetivo de
inserir no artigo 225 da Constituição Federal o §7º com a seguinte redação:
Art. 1º. O art. 225 da Constituição passa a vigorar acrescido do seguinte §7º.
Art. 225. .............................................................................................
............................................................................................................
§7º A apresentação de estudo prévio de impacto ambiental importa autorização para a
execução da obra, que não poderá ser suspensa ou cancelada pelas mesmas razões a não ser
em face de fato superveniente (NR)
Art. 2º. Esta emenda constitucional entra em vigor na data de sua publicação.

513
O nobre parlamentar justificou a proposta visando dar mais eficiência ao Estado para
realização de obras públicas que, segundo ele, vem sendo paralisada por conta de liminares
conferidas em ações judiciais protelatórias, em prejuízo à saúde, educação e a obras públicas
tais como construção de rodovias e pontes.
Sustenta o Senador que se perde muito tempo e recursos públicos vultosos em procedimentos
contrários à soberania popular traduzida pelo comparecimento às urnas e à vontade da
população em ver concretizados programas de governo.
Aduz que um Chefe do Poder Executivo municipal acaba tendo que tornar ágeis suas gestões
administrativas respectivas, com licitações, licenças ambientais e demais requisitos para
realização de uma obra pública de vulto, o que faz com quem muitas vezes acabe seu mandato
sem conseguir realizar as medidas que preconizara em seu programa de governo.
Afirma ainda que muitas vezes obras são paralisadas por conta de decisões liminares
resultantes de inquietudes da oposição diante de possíveis efeitos positivos junto à cidadania
decorrente de uma obra pública, em flagrante prejuízo à população.
Ressalta ainda ser custoso manter uma obra pública paralisada, de modo que a proposta visa
garantir que, uma vez iniciada uma obra, não poderá esta ser suspensa, senão por fatos novos
supervenientes à situação existente quando elaborados e publicados os estudos a que se refere
à Constituição Federal.
Embora a proposta tenha sido aprovada em sua redação original pela Comissão de
Constituição, Justiça e Cidadania (2016), ao ser encaminhada a plenário em maio do mesmo
ano, o Senador Blairo Maggi (2016) apresentou emenda ao texto que, basicamente, limita a
impossibilidade de suspensão ou cancelamento da aprovação para execução de obra
decorrente de estudo de impacto ambiental à via administrativa, ao argumento de que o texto
original poderia, dentre outras coisas, importar violação a cláusula pétrea consistente na
inafastabilidade da jurisdição.
Nesse sentido:
Art. 1º. O art. 225 da Constituição passa a vigorar acrescido do seguinte §7º.
Art. 225. .............................................................................................
............................................................................................................
§7º A apresentação de estudo prévio de impacto ambiental importa autorização para a
execução da obra, que não poderá ser administrativamente suspensa ou cancelada pelas
mesmas razões a não ser em face do não atendimento de outros quesitos legais ou de fato
superveniente (NR) (Grifos nossos)
Art. 2º. Esta emenda constitucional entra em vigor na data de sua publicação.
No decorrer da tramitação de referida PEC, foram juntadas diversas manifestações da
Sociedade, tais como da Sociedade Brasileira de Arqueologia Brasileira (2016), do Instituto de
514
Socioambiental (2016), do Conselho Estadual de Meio Ambiente CONSEMA/SP (2016), da
Procuradoria Geral de Justiça (2016) e do Grupo de Atuação Especial em Defesa do Meio
Ambiente do Ministério Público do Estado de São Paulo (2016), todas contrárias a referida
proposta.
3. ANÁLISE
De posse dos conceitos jurídicos analisados anteriormente, fica evidenciado o retrocesso
ambiental e o intuito do Legislador brasileiro em reduzir a proteção ambiental em tema de
licenciamento.
Em primeiro lugar, em sua redação originária, justifica-se a introdução do § 7º no artigo 225 da
Constituição Federal no fato de muitas liminares judiciais provocarem a paralisação de
empreendimentos cujos estudos encontram-se aprovados.
Ora, não pode uma emenda constitucional impedir que alguma lesão ou ameaça de lesão a
direito seja afastada do controle judicial, conforme claramente estabelece a cláusula pétrea
inserida no artigo 5º, inciso XXXVI, combinado com o artigo 60, §4º, inciso IV, da Constituição
Federal brasileira.
Nesse sentido:
TÍTULO II
DOS DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS
CAPÍTULO I
DOS DIREITOS E DEVERES INDIVIDUAIS E COLETIVOS
Art. 5º.
...
XXXV - a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito;
...
SEÇÃO VIII
DO PROCESSO LEGISLATIVO
...
SUBSEÇÃO II
DA EMENDA À CONSTITUIÇÃO
Art. 60
§ 4º Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir:
...

515
IV - os direitos e garantias individuais.
Exatamente, por conta desse primeiro empecilho que o Senador Blairo Maggi apresentou a
emenda em maio de 2016.
Contudo, os problemas não param por aí, pois ainda que mantido o texto com a limitação ao
âmbito administrativo, há violação frontal aos princípios insculpidos nos artigos 170 e 225 da
Constituição Federal, os quais determinam o chamado desenvolvimento sustentável.
Com efeito, da leitura de referida proposta, fica evidenciada a possibilidade de início de
empreendimento potencialmente poluidor com a simples apresentação do Estudo de Impacto
Ambiental, dispensando-se a fase do licenciamento como condicionante para que comecem as
alterações, o que atenta, dentre outros, contra os princípios da vedação do retrocesso e da
precaução.
Nesse sentido, conforme aduzido pelo Senador Randolfe Rodrigues, em Relatório juntado em
14/6/2016:
A flagrante inconstitucionalidade decorre, igualmente, da ofensa ao princípio da vedação do
retrocesso ambiental, da preservação da integridade ambiental como direito fundamental e
limitação constitucional explícita às atividades econômicas, conforme dispõe o inciso VI do
art. 170 da Constituição.
O princípio constitucional do desenvolvimento sustentável, expresso na conjugação do art. 225
com o art. 170 da Constituição, por sua vez, exige a atuação do Estado por meio do controle
estatal das atividades potencialmente poluidoras, materializada pelo devido processo legal do
licenciamento ambiental. A prevenção, princípio constitucional base do Direito Ambiental,
encontra-se consagrada no inciso V do § 1º ao art. 225, que estabelece como incumbência do
poder público, controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos e
substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente.
Ao dispensar o licenciamento ambiental, e autorizar a execução de obra mediante a mera
apresentação do EIA, a PEC nº 65, de 2012, cria exceção incompatível com os dispositivos
constitucionais do § 1o do art. 225 e com o princípio da moralidade administrativa, além de
violar o interesse público da proteção ambiental.
Note-se que, a despeito de avalizadas opiniões no sentido de sua inconstitucionalidade
material, o processo legislativo foi suspenso para a realização de audiência pública em data
futura.
Com todo o respeito devido ao Senado Federal brasileiro, seria de rigor a imediata rejeição de
referida proposta, pois não há dúvidas em seu teor sobre o quanto representaria a sua
aprovação a imposição ao país de graves consequências ambientais decorrentes de obras
públicas não analisadas pelo Estado sob o prisma ambiental.

516
Isso abriria a possibilidade de criação de uma verdadeira indústria de Estudos de Impactos
Ambientais pró forma, os quais, se aprovados, de pronto permitiriam que empreendimentos
potencialmente poluidores fossem concretizados, ao arrepio da Política Nacional do Meio
Ambiente tão defendida no bojo da Lei Federal 6,938 (BRASIL, 1981), colocando em risco a
qualidade de vida da população brasileira e, em última análise, ao seu inalienável direito à vida
digna e à saúde.
Assim sendo, é de rigor que referida emenda constitucional seja rejeitada, sob pena de o Brasil
incorrer em violação à própria Constituição Federal e aos compromissos internacionais que
assumiu em matéria ambiental.
De fato, conforme assevera Matthes (2010, p. 52), o direito ao meio ambiente sadio encontra-se
previsto no artigo 11 do Protocolo Adicional à Convenção Americana sobre Direitos Humanos
em Matéria de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais
Nesse sentido:
Artigo 11 Direito a um meio ambiente sadio
1. Toda pessoa tem direito a viver em meio ambiente sadio e a contar com os serviços públicos
básicos.
2. Os Estados Partes promoverão a proteção preservação e melhoramento do meio ambiente.
(Grifos nossos)
Não se pode ainda deixar de lado que, em 1992, o Brasil ratificou a Convenção Americana de
Direitos Humanos (Pacto de San José da Costa Rica), sendo certo ainda que a aceitação
expressa da jurisdição da Corte Interamericana foi incorporada ao direito interno apenas em
2002.295
Em outras palavras, eventual aprovação de referida emenda pode acarretar a
responsabilização do Brasil perante a Corte Interamericana de Direitos Humanos, conforme
asseveram Nascimento e Bianchi (2017).
CONCLUSÃO
Desde o início dos anos 80, o Brasil tem evoluído muito em matéria de defesa ao meio
ambiente ecologicamente sustentável.
Contudo, conforme visto, setores da sociedade motivados por interesses econômicos têm
induzido o Congresso Nacional a buscar efetuar reformas legais e constitucionais na
contramão das vitórias legislativas obtidas até então.
Isso ocorre, por exemplo, com a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 65/2012 que
objetiva subtrair o licenciamento ambiental como pré-requisito necessário para o início de
qualquer obra ou intervenção potencialmente poluidora.

295
Decretos 678, de 6 de novembro de 1992, e 4.463, de 8 de novembro de 2002, respectivamente.

517
Percebe-se que, no arcabouço democrático, diversos setores se posicionam contra a tais
iniciativas, conforme se pode observar das diversas moções de repúdio juntada ao processo
legislativo em questão.
Entretanto, não obstante tais manifestações, o Senado Federal, ao invés de aprovar o novo
relatório apresentado pelo Senador Randolfe Rodrigues, no sentido da total rejeição dessa
proposta, determinou para data futura a realização de audiência pública, como se tal iniciativa
fosse capaz de modificar a natureza das coisas.
Há sim uma contraposição de forças na Sociedade brasileira: de um lado a Ciência que
preconiza a necessidade de se garantir o desenvolvimento sustentável como matriz para a
garantia da vida digna e da saúde da população brasileira e, de outro, o Poder Econômico ou
por razões de ordem política, com discurso de cunho puramente desenvolvimentista,
buscando reduzir as exigências ambientais em nome de interesses particulares296.
Com todo o respeito devido, uma obra de grande vulto, por si só, não é algo que se conclua em
uma única gestão. Ela pressupõe planejamento estratégico-ambiental que muito
provavelmente tomará muito tempo. Não pode um Prefeito ou um Governador pretender em
apenas quatro anos iniciar e concluir um grande empreendimento, sob pena de danos
ambientais irreparáveis que serão mais gravosos à população afetada do que benéficos.
E em matéria ambiental, deve-se ouvir atentamente o que a academia, ou seja, os cientistas
(engenheiros, arquitetos, geólogos etc) preconizam a fim de garantir o direito à informação.
Fundamentais todos os pareceres técnicos de diversos setores, com ampla discussão
democrática, a fim de que haja mais ganhos do que perdas.
Referências

BRASIL. (31 de agosto de 1981). Lei Federal 6.938. Fonte:


http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L6938compilada.htm
BRASIL, Ministério Público do Estado de São Paulo, Grupo de Atuação Especial em Defesa do
Meio Ambiente. (20 de setembro de 2016). Carta de Piracicaba. Fonte: BRASIL, Senado
Federal: https://legis.senado.leg.br/sdleg-getter/documento?dm=3500099&disposition=inline
BRASIL, Ministério Público do Estado de São Paulo, Procuradoria Geral de Justiça. (19 de maio
de 2016). Nota Técnica n. 35/2016. Fonte: BRASIL, Senado Federal:
https://legis.senado.leg.br/sdleg-getter/documento?dm=3499991&disposition=inline

296
Isso fica muito claro na exposição de motivos do aludido projeto de lei, quando o ilustre Senador Acir Gurgacz

mandato. Caso não consiga tornar ágeis as gestões administrativas respectivas, inclusive as licitações, licenças
ambientais e demais requisitos para a realização de uma obra pública de vulto, encerrará o seu mandato sem
conseguir realizar as medidas que preconizara em seu programa de governo, por maior que seja sua boa vontade.

518
BRASIL, Senado Federal, Comissão de Constituição, Cidadania e Justiça. (28 de abril de 2016).
Parecer n. 469/2016. Fonte: https://legis.senado.leg.br/sdleg-
getter/documento?dm=3499885&disposition=inline: https://legis.senado.leg.br/sdleg-
getter/documento?dm=3499885&disposition=inline
BRASIL, Senado Federal, Senador Acir Gugacz. (12 de dezembro de 2012). Proposta de Emenda
Constitucional n. 65, de 2012. Fonte: BRASIL, Senado Federal: https://legis.senado.leg.br/sdleg-
getter/documento?dm=3499849&disposition=inline
BRASIL, Senado Federal, Senador Blairo Maggi. (12 de maio de 2016). Emenda n., - Plenário .
Fonte: BRASIL, Senado Federal: https://legis.senado.leg.br/sdleg-
getter/documento?dm=3499894&disposition=inline#Emenda1
Conselho Estadual do Meio Ambiente - CONSEMA/SP. (25 de maio de 2016). Moção de
repúdio CONSEMA 01/2016. Fonte: BRASIL, Senado: https://legis.senado.leg.br/sdleg-
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519
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YOSHIDA, C. Y. (2006). Tutela dos Interesses Difusos e Coletivos. São Paulo: Juarez de
Oliveira.

520
O ENSINO JURÍDICO E DIREITOS HUMANOS
297

A verdadeira educação consiste em pôr a descoberto ou fazer atualizar o melhor de uma pessoa.
Que livro melhor que o livro da humanidade.
Mahatma Gandhi
Resumo
A busca do ser humano pela verdade, seu desejo perene de desvendar cada vez mais os
segredos da natureza e os de sua própria existência, é uma chama que não se extingue e que

origem, de sua liberdade de ser? Neste sentido, acolhendo-se o conceito preciso de Alexy,
Direitos Humanos devem-se compreender unicamente os direitos do indivíduo e não os
chamados direitos de outras dimensões ou gerações, que nada mais são do que direitos
comunitários ou estatais. A única finalidade de um projeto em Direitos Humanos é sensibilizar
e humanizar, tocar a alma humana, quanto às suas aflições, torpezas, virtudes, capacidades, no
jogo da condição humana. Humanismo é isto: é cuidar para que o homem seja humano e não
des-humano, inumano, isto é situado fora de sua essência. Mas o quadro que nos apresenta a
sociedade hodierna é o de aprisionamento das mentes. Uma sociedade mecanizada e
amplamente colonizada, na esfera do mundo da vida, pela lógica da razão instrumental, o que

jurídico deveria agir de modo a ser mais que instrutivo (somatória de informações
acumuladas), enfatizando-se o seu aspecto formativo (gerador da autonomia do pensar),
porquanto somente o exercício da liberdade permite que se construa a liberdade, a ser
valorizada como um requisito imprescindível para a criação de uma cultura do exercício
democrático do convívio entre o alter e o ego. A crise maior está no descompasso entre o que
se pretende com os cursos acadêmicos, hoje quase todos voltados ao mercado de trabalho
profissional, e os verdadeiros anseios da comunidade por mais democracia e pela eliminação
das desigualdades, dos preconceitos, das discriminações e da miséria. O ser humano caminha
perdido nas brumas do egoísmo, do individualismo, da competição, da massificação que castra,
que empobrece, que anula, que iguala a diversidade cultural e a criatividade. Uma cultura
centrada nos direitos humanos é, todavia, uma cultura que conduz o homem a se descobrir
como uma emanação do Princípio da Vida, do Verbo, levando-o a realizar o caminho ao
Reverso.
Palavras-chave: Ensino dos Direitos Humanos; Direitos do indivíduo; Humanismo.
Resumen

297
Mestre em Direito pelo Centro Universitário Salesiano de São Paulo U.E. Lorena. e-mail:
jaquelinerodrigues@adv.oabsp.org.br

521
La búsqueda del ser humano por la verdad, su deseo perenne de desvelar cada vez más los
secretos de la naturaleza y los de su propia existencia, es una llama que no se extingue y que no
se extinguirá jamás. ¿Qué es "ser humano" que no la búsqueda de su esencia, de su origen, de
su libertad de ser? En este sentido, acogiendo el concepto preciso de Alexy, los derechos
humanos se deben comprender únicamente los derechos del individuo y no los llamados
derechos de otras dimensiones o generaciones, que no son más que derechos comunitarios o
estatales. La única finalidad de un proyecto en Derechos Humanos es sensibilizar y humanizar,
tocar el alma humana, en cuanto a sus aflicciones, torpezas, virtudes, capacidades, en el juego
de la condición humana. El humanismo es esto: es cuidar para que el hombre sea humano y no
deshumano, inhumano, esto es situado fuera de su esencia. Pero el cuadro que nos presenta la
sociedad actual es el de encarcelamiento de las mentes. Una sociedad mecanizada y
ampliamente colonizada, en la esfera del mundo de la vida, por la lógica de la razón
instrumental, lo que consiente que todo se desvirtúe en ser simplemente producto, objeto,
"cosificación". La enseñanza jurídica debería actuar de modo que sea más que instructivo
(sumatoria de informaciones acumuladas), enfatizando su aspecto formativo (generador de la
autonomía del pensamiento), porque sólo el ejercicio de la libertad permite que se construya la
libertad, a ser valorada como un requisito imprescindible para la creación de una cultura del
ejercicio democrático de la convivencia entre el alter y el ego. La crisis mayor está en el
desajuste entre lo que se pretende con los cursos académicos, hoy casi todos volcados al
mercado de trabajo profesional, y los verdaderos anhelos de la comunidad por más democracia
y por la eliminación de las desigualdades, de los prejuicios, de las discriminaciones y de la
miseria. El ser humano camina perdido en las brumas del egoísmo, del individualismo, de la
competencia, de la masificación que castra, que empobrece, que anula, que iguala la diversidad
cultural y la creatividad. Una cultura centrada en los derechos humanos es, sin embargo, una
cultura que conduce al hombre a descubrirse como una emanación del Principio de la Vida,
del Verbo, llevándolo a realizar el camino al Reverso.
Palabras clave: Enseñanza de los derechos humanos; derechos del individuo; Humanismo.
INTRODUÇÃO
O mundo em que vivemos não é um mundo caótico e sem sentido, como não é sem sentido a
nossa vida. Tudo o que acontece, no tempo e no espaço, ocorre dentro de um contexto
universal maior e mais abrangente do que aquele que resulta de uma visão determinista e
materialista do mundo. Somos dotados de uma personalidade individual que nos torna únicos
entre todos os seres humanos e, ao mesmo tempo, paradoxalmente indistinguíveis e
inseparáveis de uma totalidade que não pode ser nunca desfeita. E é essencial aperfeiçoar essa
personalidade, cultivá-la e dar-lhe completude. Por quê? Porque, embora o século XX tenha
produzido mais conhecimentos do que todos os anteriores, chega-se no século XXI ainda
acompanhado de outra realidade: o aprisionamento do saber acadêmico, na gaiola
embriagante do iluminismo simplificador, conduziu-nos à fragmentação, à perda da
capacidade de sentir e de pensar, à perda da consciência de ego e alter, à competição

522
desenfreada, à dominação do mais forte sobre o mais fraco, de indiferença perante tudo e
todos. E o melhor instrumento que o homem usa para exercer a dominação é, paradoxalmente,

ao longo da História, a fins egoístas (e de grupos) restritos. E é esta tradição que inscreveu nas
práticas nacionais de ensino, sobretudo o ensino jurídico, formas de conhecimento que estão
completamente isoladas da dinâmica da vida social. Em consequência, desenvolveu-se uma
estruturação de vida em que as pessoas valem pelo que possuem, e não pelo que são. A
humanidade vive em função de sua criação: o dinheiro, e relegou tudo o mais a plano
secundário, inclusive os valores humanos. O resultado dessa fragmentação nos deixa sem
rumos, sem perspectivas, nos deixa à deriva. O homem precisa decidir: tornar-se realmente
humano e beneficiador da vida, ou se prefere prosseguir no embrutecimento e ruína.
Nesse sentido, necessário, portanto, pensar qual seria a finalidade da educação e pesquisa em
direitos humanos, senão a humanização? Para tanto, entende-se que o portador e titular de
Direitos Humanos é toda pessoa enquanto pessoa, portanto, refere-se, aqui, aos direitos do
indivíduo, seguindo-se a conceituação precisa de Robert Alexy. E este mesmo autor (2007)
esclarece que só uma combinação do modelo explicativo (a participação séria em discursos
morais importa reconhecer a autonomia do outro) com o existencial (o homem é um ser
discursivo interessado não na utilidade individual, mas na correção), propicia uma
fundamentação racional e universal dos direitos humanos, traçando o que ele chama de
metafísica construtiva, a qual não será, diretamente, objeto de discussão neste artigo.298
Como reconstruir o remembramento e a unidade do conhecimento para reencontrarmos o
norte da integralidade humana, do ser como individualidade irredutível, porém pertencendo à
-se o caminho do saber que somente se
justifica quando é colocado a serviço do homem, e nunca contra ele. E nessa tentativa de

preocupação de receber contribuições de todo tipo de análise da realidade, seja por parte do
saber popular, seja do filosófico, teológico, estético, mítico, psicológico etc. E essa análise da
realidade é acompanhada da humilde convicção de que nunca sabemos tudo (RAMPAZZO,
2015).
No desenvolvimento do tema deste artigo, seguiu-se a metodologia transdisciplinar, a qual
possibilita adentrar na esfera do Sagrado, da Cosmogonia Humana, e alcançar o que há entre
mi
anula, em hipótese nenhuma, a individualidade de cada um: é a Humanidade, amálgama da
unidade na diversidade, da parte, do todo e da totalidade. A proposta de transdisciplinaridade

298
Ademais, Alexy afasta os argumentos religioso (Deus criou o homem segundo sua imagem e
semelhança), biológico (o êxito reprodutivo atrai ao altruísmo e repulsa a indiferença e a agressividade), intuitivo (a
existência dos direitos humanos é evidente), consensual (a validade dos direitos humanos deriva da convicção
concordante de todos), instrumental (reconhecer os direitos humanos conduz a maximizar a utilidade individual)
e cultural (os direitos humanos são uma conquista da história da cultura humana) como inaptos a fundamentar
racional e universalmente os direitos humanos.

523
oportuniza, dessa forma, o desenvolvimento da essencialidade do princípio democrático, ao
constituir discurso de interação/integração, dialógico e ontologicamente aberto. A abertura,
iagem de descobrimento não é

Um olhar novo para tentar responder, provisoriamente, à pergunta de Horkheimer e Adorno


nada menos que descobrir por que
a humanidade, em vez de ascender a uma condição verdadeiramente humana, está

A passagem da ciência à técnica: o desaparecimento dos fins em proveito dos meios


A empreitada ocidental de dominação do resto do mundo se fundamentou na certeza de
possuir a verdade e de superar todas as outras sociedades humanas. Essa certeza ainda
permanece em inalterada, ainda que tenha assumido feições diversas no correr da história.
Agora, a humanidade se divide em países desenvolvidos e em países subdesenvolvidos, mais
-intencionadas construíram até

ainda têm de recuperar com relação aos ocidentais.


Pensar a europeização ou a mundialização como processos de apagamento das diferenças e de
uniformização das crenças é lamentável, e julgar universais suas categorias de pensamento e
pretender impô-las ao mundo é o caminho mais seguro que conduz ao desastre. Neste ponto é
igualmente legítimo dizer que o universo da competição globalizada é, em sentido lato,

superiores a si mesmo para se tornar uma espécie de fim, como se a multiplicação de meios, do
poder ou do domínio dos homens sobre o universo se tornasse sua própria finalidade
(SUPIOT, 2007).
Assim, nessa nova perspectiva que nos é apresentada, ou seja, a da concorrência generalizada,
-se o quanto a noção de progresso muda
totalmente de significado, pois em vez de se inspirar em ideais transcendentes, vai pouco a
pouco se restringir a ser apenas o resultado mecânico da livre concorrência entre seus
diferentes componentes, tanto as empresas, como os laboratórios científicos e nos centros de
pesquisa, o imperativo é o mesmo: desenvolver os conhecimentos e, sobretudo, suas aplicações
à indústria, à economia, em síntese, ao consumo (FERRY, 2007, p. 247). Daí o formidável e
incessante desenvolvimento da técnica preso ao crescimento econômico e largamente
financiado por ele.
É por isso que se diz, com Horkheimer e Adorno (1985), que a técnica é uma racionalidade
instrumental, justamente porque nos diz como realizar do melhor modo um objetivo, mas ela
nunca o estabelece por si mesma. Ela designa geralmente o conjunto dos meios que é preciso
mobilizar para realizar um fim determinado. A técnica, portanto, concerne aos meios e não aos
fins. Ela é uma espécie de instrumento que se põe a serviço de todos os tipos de objetivos, mas

524
que ela mesma não os escolhe, explica-nos Luc Ferry (2007, p. 247). Deste modo, pela lógica da
razão instrumental, tudo se desvirtua em ser simplesmente produto: o ser humano é produto,

(HORKHEIMER, M.; ADORNO, 1985, p. 114). Em lugar de valores humanos, como amor,
lealdade, confiança, retidão, pensamento social, vemos a valorização dos números,
independentemente do que eles representam.299
E nesse caminhar, percebe-se um sintoma que é o da alarmante inversão do sentido dos
vetores que regem as diversas atividades. As missões, principalmente das atividades de cunho
social, como a Medicina, o Direito300, a Política, a Imprensa e a Educação foram
desconsideradas, apagadas dos diversos cadernos. Em seu lugar, surgiu o aproveitamento
indigno que os profissionais fazem daqueles a quem deveriam servir. Pois é assim... quando os
meios se tornam finalidades, os princípios desaparecem.
Simone Weil nos faz lembrar que essa mesma civilização industrial a que nos filiamos está
armada de meios com os quais p 301
do indivíduo, mesmo que
armada igualmente esteja de meios com os quais vem crescentemente ampliando as condições
de existência do homem. Nesse sentido, pode-se dizer que foi a própria cultura que abriu essa
ferida na humanidade moderna. Percebam! Uma ruptura da unidade interior da natureza
humana. Há um profundo abismo entre o que se é como indivíduo, e o que se é como um ser
coletivo. Tecendo uma crítica à cultura, esta como capaz de uniformizar, especializar e
fragmentar o indivíduo, promovendo uma total alienação do homem: o ser humano convertido
em peça da roda-gigante, exerce uma função mecânica, pervertido em sua essência (MARONI,
1998, p. 33).

299
medical centers (que pobreza de espírito!),
aparelhos e mais aparelhos médicos para quê? Pletora de universidades para despejar um número crescente de que
tipo de profissional? Na mídia, índices de audiência e similares significando o quê? Além de números? E
profissionais da área da Justiça são capazes de citar, de maneira precisa, o número e ano das leis, dos decretos, dos
acórdãos e das portarias que não costumam ser cumpridas e que só são usadas aqui e ali. Aparências em vez de
essências... Um palco armado, onde leis são apenas escritas, onde servidores públicos passam a ser autoridades,
onde ilegalidades são condenadas apenas em palavras, onde aqueles que deveriam servir simplesmente se servem,
onde cidadãos foram substituídos por idiotas, onde o prédio importa mais que o seu funcionamento, onde o título
LONDRES, 2007, p. 13).
Os advogados e professores, Dr. Robson Baroni e Dr. Modesto Carvalhosa, no Parecer sobre o novo projeto de
300

Código de Ética e Disciplina da Ordem dos Advogados do Brasil, teceram inúmeras críticas, dentre elas, no capítulo

levado a uma nítida tendência de mercantilização do e


Advogados, hoje verdadeiras empresas de prestação de serviços de advocacia, voltados primordialmente à captura
de poderosos clientes, numa dinâmica com tudo semelhante às empresas de publicidade
301

desconhecida da alma humana. É uma das mais difíceis de definir. O ser humano tem uma raiz por sua participação
real, ativa e natural na existência de uma coletividade que conserva vivos certos tesouros do passado e certos
pressentimentos do futuro. Participação natural, isto é, que vem automaticamente do lugar, do nascimento, da
profissão, do ambiente. Cada ser humano precisa ter múltiplas raízes. Precisa receber quase que a totalidade de sua

525
No entanto, há no ser humano um apelo para a unificação, para a comunhão com todas as
coisas. Poderemos assumir a parte prosaica e viver a parte poética de nossas vidas. E a
educação pode ajudar a nos tornarmos melhores.
Educação, conscientização e humanização: perspectiva transdisciplinar
2.1 O RUMO ATUAL DO ENSINO JURÍDICO: PROBLEMATIZANDO O EXCESSO DE
RACIONALISMO E DA TÉCNICA

tem sentido unicamente como educação dirigida a uma auto-


transmissão de conhecimentos, de mera modelagem de pessoas a partir do exterior e, sim, a
produção de uma consciência verdadeira, de uma consciência ampla, crítica e humanística,
diferentemente de uma formação técnico-operacional e reificadora da consciência.
Contudo, o que se vê, na prática hodierna, é que a racionalidade técnica impera nas práticas
nacionais de ensino, inclusive, e mormente, o ensino jurídico. Vive-se e respira-se o ambiente
302
Um ensino fundado em raciocínios técnico-operativos, totalmente divorciados
da dinâmica da vida social, que não consente a formação de habilidades libertadoras. Provida
de instrumentos para operar dentro do contexto de uma sociedade exacerbadamente
competitiva, individualista, consumista e capitalista selvagem, nos mesmos moldes de como se
pratica poder na sociedade.303 E o que se tanto discursa sobre a crise da educação, nada mais é
do que o reflexo de uma crise política maior, sendo sentida como um desarranjo social, cujas
demonstrações práticas se dão efetivamente através das marcas da própria violência
(BARRETO, 1992, p. 63).
E quais são os rumos e nortes do agir do profissional bacharelado pelas escolas de direito que
nos apresenta atualmente?304 Conforme Eduardo Bittar, posição da qual compartilhamos:

302
Nos grandes organismos de pesquisa, como o CNRS (Centro Nacional da Pesquisa Científica), os jovens que não
se dedicam a um tema ultra-avançado não têm a menor
chance de serem considerados autênticos pesquisadores. Não só a filosofia é obrigada a imitar a todo custo o

frequentemente mais preocupadas com os resultados concretos econômicos e comerciais do que com questões
fundamentais. (...) As grandes interrogações filosóficas apresentam-se aos novos especialistas, dominados pela
paixão da técnica, tomadas pela paixão do sério, como futilidades de outros tempos. Cf. FERRY, 2007, p. 254.
303
Não é demais ressaltar o fato de que hoje não são formadas pessoas; é formada mão de obra para empresas que as
vão empregar. Tem-se a produção em série de seres que irão fornecer seus serviços cada vez mais próximos à
situação da escravatura. Também não é exagero dizer que, numa sociedade capitalista como a nossa, o discurso por
detrás do véu é: Formemos milhares para que o preço do salário entre em competição. Não se prioriza a qualidade,
e sim a quantidade. E o Resultado social de tudo isso? Ah! Isso não importa!
304
Passando um olhar crítico pela área da educação, percebe-
ensino superior: Alunos são vistos como mensalidades, cursos de todos os matizes são criados, campi escolares
estão se multiplicando como farmácias, crescendo em número e perdendo em essência, cultura e sabedoria.
Multiplicam-se as escolas particulares, deterioram-
sequer o nome dos professores, profissão relegada à segunda classe. Ouvi de um educador uma bela frase:
no caso
um diploma escrito pró-forma está substituindo a verdadeira missão da educação. O conteúdo da formação
526
ão de um mundo auto-centrada; a idéia de responsabilidade
restrita à dinâmica da responsabilidade do código de ética da categoria; a noção de mundo

p. 322). Assim também alienante é o conhecimento instrutivo e técnico, preparatório para


exames simplistas e operatórios (OAB, Concursos públicos, Provas semestrais), se
desacompanhado de uma ampliação crescente da capacidade de leitura da realidade histórico-
social.

Direito,305 estará insuficientemente preparado para a análise de quadros de conjuntura social,


política e econômica, ou mesmo para pensar a responsabilidade do exercício de sua função
dentro do sistema. No geral, ademais, percebe-se que o discurso jurídico atua como uma força
social fundamental para a unificação ideológica em prol dos interesses dominantes, tendo em
vista o hermetismo de sua linguagem. Neste sentido, o Professor Tércio Sampaio Ferraz Júnior
assevera:
As doutrinas jurídicas se limitam, assim, a fornecer interpretações que não são propriamente
orientação para a ação, mas instrumentos de controle da massa despolitizada. Em
consequência, o jurista, desde que entra na Faculdade até o ápice de seu desenvolvimento
profissional, torna-se presa de uma corrente de bens de consumo que ele ajuda a produzir e a
administrar, e que exclui de seu trabalho qualquer reflexão crítica. Pois esta, se levada a sério,
destrói as bases mesmas de funcionamento de seu saber dogmático. (1984, p. 71).
Por isso, uma educação direcionada para a disseminação de uma cultura de direitos humanos
tem de ser capaz, acima de tudo, de propugnar a construção de uma sociedade preparada para

perdeu seu sentido, pois o que vale é o certificado da conclusão de um curso, qualquer que seja ele, seja por mérito,
seja por terem pago as mensalidades (senão o próprio diploma). O que interessa é despejar recém-formados que
vendam seus serviços a qualquer preço. (...) As injustiças cometidas pela Justiça clamam por uma justiça que não
sabemos onde podemos encontrar. Ou melhor, uma vez mais delegamos a terceiros tarefas que, ao longo do tempo,
se corroem e se pervertem, invertendo o vetor de sua atuação. A venda da Justicia romana agora veda a sua razão. A
balança de Themis está desequilibrada; e suas filhas, a Lei, a Paz e a Equidade, estão despidas de suas dignidades e
vagam sem rumo, oferecendo-se a aventureiros diversos que compram seus serviços sem entender nem sequer seu

A especialização pode se apresentar um problema quando desacompanhada da compreensão dos desafios


305

morais, econômicos e sociais que dão sentido à técnica jurídica. Morin nos explica que a instituição disciplina

estudado, do qual se corre o risco de esquecer que é destacado ou construído. Este objeto, então, será percebido
como uma coisa autossuficiente; as ligações e solidariedades desse objeto com outros objetos estudados por outras
disciplinas serão negligenciadas, e até isoladas em relação aos problemas que se sobrepõem às disciplinas, assim
como as ligações e solidariedades com o universo do qual ele faz parte. Cf. MORIN, 2009, p. 106. Nunca

de-formação
podem estar andando lado a lado! Cf. BITTAR, 2008.

527
o exercício da autonomia, condição fundamental para o exercício da cidadania306. Desenvolver
a capacidade de expansão da autonomia individual.307 Porque o que se vê é que o indivíduo
moderno é rebaixado a uma função, pois é ela quem representa um valor coletivo palpável e
suficiente para garantir a possível sobrevivência. Essa é a ferida que a cultura instituiu: não é o

2)308 Vejamos! Vive-se na era da


heteronomia, e não da autonomia, e de uma subjetividade fragilizada, a qual se vê acossada por
um forte influxo de heteronomias estrangeiras que determinam como a subjetividade deve ser
desde fora. Mas o processo de dissociação apresenta-se como um pharmakon: veneno e

306
O exercício da cidadania não deve estar adstrito à formalidade dos conceitos legais os quais descreve a Cidadania
tão somente como a capacidade de votar e ser votado. É executar um programa democrático que não se limita a
uma representação parlamentar.
307
Não se trata aqui de autonomia como fundamento de uma liberdade absoluta, emancipada de qualquer
dependência, e sim de um conceito complexo de autonomia, porque a constatação dos sistemas dependentes
possibilita reconhecer que os indivíduos que nele se encontram atuam com o meio, como forma própria de
comunicação, embora sem se desligarem por completo dos sistemas. A esse suporte da autonomia agrega-se, mais
tarde, o da identidade, representativo dos princípios da diferença e da equivalência, pelos quais será possível
reconhecer no indivíduo uma dupla face: um lado subjetivo de identificação do eu, que se assemelha, assim, ao
cogito e um lado objetivo de diferenciação, que pode ser observado pelo próprio eu, na forma do alter. Assim, para
determinado indivíduo, o ego e o alter se contemplam no mesmo ser auto-organizado. A auto-organização é
dependente e não autopoiética. Quer dizer que os seres vivos, ainda que compreendidos dentro de um determinado
sistema, estão sujeitos ao processo de perda de energia e que por isso devem extraí-la do mundo exterior, o que
implica uma constante interação com o meio. (...) Cf. TAVARES, 2000, p. 100. Corresponde ao princípio da
-organizadores, que se auto-
produzem e, por isso mesmo, despendem energia para manter sua autonomia. Como tem necessidade de retirar
energia, informação e organização de seu meio ambiente, sua autonomia é inseparável dessa dependência. É por
isto que precisam ser concebidos como seres auto-ecoorganizadores. Isto vale também para os seres humanos, que
desenvolvem sua autonomia na dependência de sua cultura; e também para as sociedades, que se desenvolvem na
ciais, só podemos ser autônomos a partir de
uma dependência original em relação à cultura, em relação a uma língua, em relação a um saber. A autonomia não é

308
E quanto menor for a personalidade, tanto mais imprecisa e inconsciente se torna a voz interior, até confundir-se
com a sociedade, sem poder distinguir-se dela, privando-se da própria totalidade para diluir-se na totalidade do
grupo. A voz interior é substituída pela voz do grupo social e de suas convenções; em lugar da designação aparecem
as necessidades da coletividade. A não poucos sucede que, mesmo estando nesse estado social inconsciente, são
chamados por uma voz individual e assim começam a distinguir-se dos outros e a deparar com problemas a respeito
dos quais os outros nada sabem. Em geral é impossível para esse indivíduo explicar às outras pessoas o que lhe
aconteceu, pois existe como que um muro de fortíssimos preconceitos a impedir a compreensão. Enfim, o que
impulsiona a alguém a escolher seu próprio caminho, e a elevar-se como uma camada de nevoeiro acima da
identidade com a massa humana? (...) O que, pois, dá o último impulso a favor de algo fora do comum? É o que se
denomina designação; é um fator irracional, traçado pelo destino, que impele a emancipar-se da massa gregária e de
seus caminhos desgastados pelo uso. Personalidade verdadeira sempre supõe designação e nela acredita, nela
deposita pístis (confiança) como em Deus, mesmo que na opinião do homem comum seja apenas um sentimento
pessoal de designação. Esta designação age como se fosse uma lei de Deus, da qual não é possível esquivar-se. O fato
de muitíssimos perecerem, ao seguir seu caminho próprio, não significa nada para aquele que tem designação. Cf.
JUNG, 2011, p. 187.

528
remédio; morte e cura. A solução, segundo Jung, é o homem individuado309, portador de uma
nova Subjetividade. A outra possibilidade é a barbárie, e seu subproduto, o totalitarismo.
Daí o papel da emancipação, da construção da autonomia, necessária para a cultura
democrática310, o que só é possível de ser operada pela educação. Ademais, educação e
emancipação estão conceitual e umbilicalmente comprometidas. Uma educação
emancipatória deve visar, acima de tudo, a produção do enraizamento311, porque se trata de um

autênticas significa assegurar as condições para a máxima realização de suas potencialidades


a forma, a compreensão da necessidade de uma percepção
multidimensional, de valores, de inteireza humana, de sentimentos e de poesia nos remete
para a construção de conhecimentos mais abrangentes, profundos e diversificados, para além
da linearidade e da fragmentação.
Nessa linha de pensamento, seguimos com Bittar (2008, p. 326), para quem o projeto de
Direitos Humanos deve ser capaz de sensibilizar e humanizar, por sua própria metodologia,
muito mais do que pelo conteúdo daquilo que se aborda através das disciplinas que possam
formar o caleidoscópio de referências de estudo e que organizam a abordagem de temas os
mais variados, que convergem para a finalidade última do estudo: o ser humano. Um projeto
pedagógico, portanto, que seja a favor de uma cultura dos direitos humanos para a formação
de uma sociedade mais justa a partir da transformação da consciência dos indivíduos sobre sua
inserção no grupo social. Assim, uma educação para os direitos humanos deve formular
problemas, não no nível abstrato, mas, sim, conscientizar se do passado histórico, tornando-o

309
Na concepção de Jung, a verdadeira educação se dá no processo de individuação, porque é nele que acontece a
transformação interna da alma. É no processo de individuação que o in-divíduo se constitui psicologicamente
tornando-se uma unidade separada (diferenciação) e ao mesmo tempo unido à humanidade toda (reintegração).
Essa construção progressiva de uma diferenciação do coletivo externo e das fantasias do inconsciente coletivo se dá
pela educação. Educar estas partes da psique é um trabalho de anos e não somente um trabalho psicológico, vale
saber, é um trabalho de auto-educação e de auto-conhecimento. Cf. CARVALHO, 2017.
Seguimos com o professor Juarez Tavares, o qual salienta que é preciso se ter outra compreensão de Democracia.
310

Não exclusivamente a representativa do Congresso. Isto é uma forma antiga de Democracia, e que existe para
manter a aparência de democracia. Inclusive, se verificarmos a Constituição Federal brasileira de 1824, poderemos
enunciar inúmeros princípios democráticos de defesa dos direitos fundamentais. No entanto, o Brasil nessa época
vivia sob o regime escravagista. Então, aquela Constituição era pró-forma, para as elites, e não para o povo
brasileiro. O mesmo acontece com as outras Constituições brasileiras. Sendo assim, alerta o professor Tavares, a
Constituição, na verdade, não encerra, especificamente, uma forma pela qual se possa defender e executar todos os
direitos fundamentais. A Democracia parte da ideia de que todos os cidadãos são sujeitos de direito, são autores do
processo democrático e, por isso, é indispensável que se reconheça a prevalência dos direitos fundamentais da
pessoa humana sobre qualquer razão de Estado. Não existe qualquer razão de Estado que possa sobrepor-se aos
direitos fundamentais! Pois foram as razões de Estado que levaram às guerras mundiais, e ainda levam ao
extermínio de muitas pessoas, às invasões indevidas no Iraque ou em outros países. Democracia é outra coisa! A
representação parlamentar é só uma forma de sistema político. Ela não esgota o que constitui a verdadeira
Democracia! Devemos exercitar uma democracia consciente, demonstrar nossa indignação para os fatos que
acontecem (...). Cf. FALA, 2016. E prosseguindo com Michel Foucault, numa criação de uma ética da resistência
como forma de enfrentamento da microfísica do poder. Cf. CASTELO BRANCO, 2015, p. 95.
311
Ver o desenvolvimento desse conceito na obra citada de Simone WEILL.

529
presente, para a análise da responsabilidade individual ante os destinos coletivos futuros.
Ademais, o próprio educador deve sempre ter em mente que pouco adianta falar e dar ordens.
O importante é o exemplo! Ele deve ter sido educado antes e ter experimentado em si mesmo
se são eficientes ou não as verdades psicológicas que aprendeu em sua escola (JUNG, 2011,
p.148).
Sensibilizar e humanizar importam em desconfirmar a presença da opressão
permanentemente transmitida pela própria cultura, esta mesma que constrói um indivíduo
consumido pela consciência reificada, como já salientamos. A desumanização é uma realidade
histórica, dolorosa constatação que os homens se perguntam sobre a outra viabilidade, a da
humanização. Neste sentido, Paulo Freire (1987, p. 30)
Humanização e desumanização, dentro da história, num contexto real, concreto, objetivo, são
possibilidades dos homens como seres inconclusos e conscientes de sua inconclusão. Mas se
ambas são possibilidades, só a primeira nos parece ser o que chamamos de vocação dos
homens. Vocação negada, mas também afirmada na própria negação. Vocação negada na
injustiça, na exploração, na opressão, na violência dos opressores. Mas afirmada no anseio de
liberdade, de justiça, de luta dos oprimidos, pela recuperação de sua humanidade roubada.
(grifo nosso);
Educar, portanto, numa concepção de educação para os direitos humanos, só tem sentido
enquanto preparação para o desafiar (BITTAR, 2008). Uma educação que não seja desafiadora,
que não se proponha a formar iniciativas, que não prepare para a mobilização, que não
instrumente a mudança, que não seja emancipatória, é mera fábrica de repetição das formas
de ação já conhecidas. Defende-se que o ensino jurídico deve ser mais formativo (geradora da
autonomia do pensar), do que instrutivo (somatória de informações acumuladas). Neste

Universidade sem luta política, sem crítica, sem ideal de transformação social não é uma
universidade, é apenas um curso de práticas, bem aos moldes propostos pelos regimes

efetivamente, a resolver os problemas humanos com os quais nos defrontamos, sociais,


econômicos, ambientais, filosóficos, éticos; se ela é verdadeiramente neste sentido, uma
pesquisa transformadora. Ela está verdadeiramente a serviço do Homem? Ou a serviço de
outros interesses? (THIERIOT, 2016).
O psicanalista C.G. Jung já dizia, em 1959, que o único perigo verdadeiro que existe é o próprio
homem. Ele é o grande perigo e estamos, infelizmente, inconscientes dele (Apud
ZWEIG,Connie; ABRAMS, 1991, p. 23). Responsabilizar as ciências por crimes e crueldades
cometidos por meio delas é o mesmo que condenar uma faca e não o assassino na cena de um
crime (BACHELARD, 1967, p.17).
Assim, lutar pela humanização, fazer-nos humanos é a grande tarefa da humanidade. Neste
pensamento, Paulo Freire (1987) situa toda tarefa pedagógica: contribuir com a humanização.

530
Este o sentido do fazer educativo! E reconhecer que só é possível o desenvolvimento integrado,
a partir de saberes que se complementam e que levam à compreensão da vida na sua
plenitude.
2.2 O pensar complexo e transdisciplinar na educação: Educar para a compreensão humana
O pensamento complexo baseia-
interdependente, interativo e inter-retroativo, e tece crítica a uma modalidade de pensar que
mutila, reduz, unidimensionaliza a realidade (MORIN, 2009; 2015). Ademais, a atitude de
contextualizar e globalizar é uma qualidade fundamental do espírito humano que o ensino
parcelado atrofia e que, ao contrário disso, deve ser sempre desenvolvida (MORIN, 2007, p.
20). De outro modo, frisa-se, não objetiva suprimir as disciplinas, ao contrário, tem por
objetivo articulá-las, religá-las, dar-lhes vitalidade e fecundidade. Além disto, Moraes (2017)
sinaliza que a complexidade, epistemologicamente, é matriz geradora da transdisciplinaridade,
calcada na lógica do terceiro incluído, nos níveis de realidade/níveis de percepção e na
complexidade. A transdisciplinaridade recoloca a subjetividade e a multidimensionalidade do
sujeito em suas relações consigo mesmo, com os outros e com o meio circundante, fazendo
emergir uma pluralidade de percepções e significados alinhados à auto-eco-organização312 do
sujeito.
Quando se faz referência ao processo da transdisciplina, está-se reportando ao sentido mais
amplo do conhecimento, onde a ciência não tem mais o poder de gerenciar comportamentos
que significam alcançar a eficiência pela eficiência, mas a eficiência pela construção da
dignificação da pessoa humana (CARNEIRO, 2015, p. 99).
Nessa linha de construção, delineia-se que o olhar complexo e transdisciplinar para a educação
tem preocupação central com o humano em sua tríade constitutiva
(indivíduo/espécie/sociedade). Mais interessada na vida e na religação de saberes e fazeres que
na formalização científica, a transdisciplinaridade questiona os papéis verticalizados e
polarizados de professor e aluno, contexto e conteúdo, didática e cultura, aprendizagem e vida,
sujeito e objeto. E as práticas pedagógicas emergentes destas bases preocupam-se com a
humanização dos sujeitos, justamente por terem compromisso social, ecoformador e
transdisciplinar, na busca de um novo sentido da vida (SUANNO, 2010, p. 164). Pensar
complexo e transdisciplinar é, ademais, diretamente, conviver dialogicamente em interação e
aceitação mútua à diversidade como potencial humano de fortalecimento da trama social e
ecossistêmica (ALVES, 2014); reconhecer, respeitar, valorizar e religar culturas tradicionais
estabelecer uma ecologia de saberes

caráter eurocêntrico, etnocêntrico e androcêntrico (MORAES, 2014).

312
Princípio explicado na nota n.11.

531
A pesquisa transdisciplinar, que privilegia outras noções éticas, leva-nos a repensar os
pressupostos que temos utilizados para integração da razão com a intuição, do imaginário com
o concreto e da sensibilidade, emoção e criatividade ao ato de conhecer.313
2.3 A HUMANIDADE NO SAGRADO COMO TERCEIRO TERMO INCLUÍDO: A REALIDADE
QUE NOS UNE
Quando não se encontra solução em uma disciplina, a solução vem de fora da disciplina:
Quando abandonamos as certezas de uma lógica que menospreza o invisível, a razão desperta
livre e o coração renasce amplo para ver o que os olhos se esqueceram de ver, as mãos de
tocar, os ouvidos de ouvir. Voltamos a nos integrar conscientemente com a totalidade da vida,
com o grande mistério da natureza. Libertando-nos de um racionalismo científico
ultrapassado e de uma superstição materialista, que vem prevalecendo no establishment
científico e cultural já faz 300 anos, o ser humano pode readquirir a sua verdadeira
perspectiva, que é cósmica e transpessoal.314 (DALDEGAN, 2005, p.121).
Nesse contexto, o fenômeno do sagrado é visto como aquilo que liga a pessoa às diferentes
dimensões de percepção e de realidade, permitindo que ela transite nessas diferentes
dimensões, dialogando, com abertura, rigor e tolerância, sem preconceituar ou rotular, mas
interagindo na dinâmica de renovar-se e recriar-se a partir de cada relação, preservando a sua
essência (NICOLESCU, 2001). O Sagrado corresponde à Essência de cada um de nós, e
transcende ao corpo físico, assim como a toda forma de energia. É a espiritualidade universal,
inerente a todos os Seres Humanos; é atemporal, adimensional Eterno e Infinito. Nossa
consciência oscila entre a percepção das formas temporais e a percepção do Ser-em-Si, do
Sagrado dentro de nós, que não tem forma, nem tempo.
Tudo isso deve contribuir para a formação de uma consciência humanística e ética de
pertencer à espécie humana. Porquanto o ser humano, ao longo dos milênios, manteve-se
consciente da chama sagrada que arde sem cessar em sua alma e que busca expressão nos
símbolos, formas e metáforas que vêm se projetando na consciência humana ao longo de toda

313
Para o Direito, a pesquisa realizada com base na complexidade e na transdisciplinaridade, mais do que método,
lógica e teoria do conhecimento, poderá, com efeito, ensejar também uma nova hermenêutica. Porquanto, sabemos
que a complexidade e a transdisciplinaridade são consequências uma da outra. Ora, as sociedades, sendo
complexas, exigem pesquisa transdisciplinar, por isso a sua importância para o Direito, pois o Direito emana da
sociedade e a ela reporta. Por essa razão, é nosso dever considerar a pesquisa transdisciplinar e seus problemas,
também no âmbito do Direito. Cf. CARNEIRO, 2015, p. 38.
Neste sentido, entendem-se as pretensões da psicologia de profundidade, transpessoal, que não se contenta com o
314

espaço atual já possuído pelo nosso Eu consciente, mas quer avançar sempre mais em todas as direções, alargando a
-
novo horizonte que vai além da pessoa, em dimensão transpessoal. Procura-se uma nova gnose, conhecimento para
descobrir o divino em nós e reavivá-lo. Pela Gnose a pessoa religa-se à energia-fundamento do cosmos. Aprofunda-
se uma percepção da interligação de todas as coisas. Daí toma-se consciência de que entre cada um e o cosmos
existem laços profundos, correspondências secretas, afinidades vitais que devem ser restabelecidas, superando o
dualismo interno (corpo-mente) e externo (cada um e natureza). Cf. RAMPAZZO, 2001, p. 59.

532
a história. É preciso traçar o caminho de volta: O caminho do conhecimento que o homem
deve seguir para (re) tornar-se um ser "visual- visionário": o caminho da unidade entre a
intuição e a razão.315 Para que o Sujeito, que é Transdisciplinar na essência, possa perceber-se
habitando outro nível de realidade que permita, não só a reconexão consigo mesmo, mas
também com o Outro, com a Natureza e com o Sagrado.
A ética humanista pura, que coloca a salvação totalmente nas mãos das próprias forças
humanas e não deixa espaço para o transcendente, não passa de uma especulação bem-
intencionada daqueles que, embora puros de coração, não conseguiram aproximar-se o
suficiente do Sagrado.316

315
Em comparação aos signos possíveis ou manifestos do mundo, o conhecimento humano desenvolveu dois
grandes tipos de dicotomias: empírica (externa) vs racional ( interna), intuitiva (emocional, afetiva) vs discursiva
(lógica). Da combinação dessas dicotomias complementares resulta quatro modos de conhecimento, de significação
do mundo, a saber: A significação de tipo experiencial (intuitivo-empírico); a significação de tipo holístico
(intuitivo-racional); A significação de tipo analítica (discursiva-racional) e a significação de tipo experimental
(discursivo-empírico). Estes tipos de significação não são puras. Elas se interferem ao nível de ações cognitivas
humanas complexas que impliquem a participação complementária dos dois hemisférios cerebrais. Ao mesmo
tempo, elas podem significar os principais tipos de discursos que o "homo cogitans" produziu no fim dos séculos:
mágico, ritual, mítico, iniciático, religioso, artístico, filosófico, científico, tecnológico. Por todos estes tipos de
discurso cognitivo, a luz pode ser considerada como um elemento mediador. Por que a Luz? Porque, no plano
ontológico, a vida do homem é um "dom do sol". Uma tal intuição está presente em todas as formas através das
quais o homem conheceu - no plano gnoseológico - sua relação com o mundo e implicitamente com a luz solar. A
Luz como arquétipo do conhecimento humano, constitui o "núcleo duro" cuja metamorfose descreve a evolução do
homem do nível bio-físico ao nível psíquico, da luz à iluminação, da natureza à cultura. Ultrapassando os limites de
uma ciência acadêmica, a passagem "da luz à iluminação" não representaria mais somente uma metáfora, mas um
processo de metamorfose objetiva, que descreveria a gênese mesma do conhecimento humano. Colocar em
evidência o caminho do conhecimento que o homem deve seguir para (re) tornar-se um ser "visual- visionário": o
caminho da unidade entre a intuição e a razão. (...) O mundo (Ontos) é unitário em sua essência. O conhecimento
humano (Logos) reflete a essência do mundo. O conhecimento do mundo pelo homem (Ontos torna-se Logos) é
unitário em sua essência. Se aceitarmos a equivalência etimológica (latina): Lumen =Lux (Monde = Lumière),
podemos dizer que conhecer a multiplicidade das formas/signos da luz é conhecer a essência mesma do mundo.
"Tanto de Luz, tanto de Conhecimento". Cf. -300.
316
Nós temos necessidade de compreender os fenômenos em profundidade, e não simplesmente aceitar o que nos é
dito, ou o que nos é dado através de circuitos e de instituições sociais bem estruturadas. Nós devemos aprender a
aceitar que nosso pensamento é uma grande força espiritual e concreta para instigar a mudança. (...) A
responsabilidade pessoal quer que cada pessoa procure o equilíbrio das energias interiores e exteriores, e reforce
seu sentido de conexão, de empatia e de visão criativa. As novas descobertas da neurociência, biologia e física
quânticas revelaram que uma forma de consciência conectada não-local tem uma base científica. Isso demonstra
que algumas experiências transcendentais ou espirituais de uma unicidade coletiva têm uma base válida no seio de
um novo paradigma científico. O nosso futuro evolutivo não tem que ser dividido entre a ciência e as ciências
humanas, mas pode ser - deve ser -
comprendre les phénomènes en profundeur et ne pas simplemen

pensée est une grande force spirituelle et concrète pour instinguer le changement. (...) La responsabilité

physique quanti -locale a une base scientifique. Nos


futurs èvolutionnaires n'ont pas à être divisés entre la science et les sciences humaines mais peuvent être - doivent
être - une fusion créatrice et un partenariat DENNIS, 2017).

533
Conclusão
Desenvolvido numa concepção de que só existe um conceito de Direitos Humanos, qual seja: o
do indivíduo, o chamado de primeira geração, porquanto os demais direitos (humanos) de
outras dimensões ou gerações nada mais são do que direitos comunitários ou estatais, os quais
constituem os meios para a realização dos direitos humanos. Nessa construção, desenha-se o
entendimento de que só com o desenvolvimento da autonomia individual, esta, todavia,

possível comportar um processo de identificação e de projeção do sujeito a sujeito, ao ver o


ego alter como alter ego, compreendendo as lágrimas, o sorriso, o medo, a cólera, a dor, enfim,
os sentimentos que fazem parte da natureza humana, poder-se-á mudar o cenário de barbárie
e de degradação humana. Para tanto, necessita de desenvolver a subjetividade crítica, pois esta
se encontra por demais fragilizada, sufocada pelas exigências da sociedade de consumo, e por
heteronomias estrangeiras, que decidem como essa subjetividade deve ser. Acredita-se, assim,
que só uma educação emancipadora, desafiadora, dentro de uma ética da resistência, pode
fazer frente ao quadro que nos tem sido imposto, de opressão, de dominação, de competição
exacerbada, de manipulação, a qual massifica, robotiza, e coisifica o homem, destruindo tudo e
provocando a ruína e o retrocesso. E uma educação transdisciplinar é aquela que nos
possibilitará desenvolver a capacidade de convívio, de socialização, de responsabilização na
relação ego-alter, numa cultura entendida efetivamente democrática, no despertar da
cidadania participativa. Mormente no ensino jurídico, já que o Direito trata de relações e
conflitos humanos; e que baseado tão somente que está numa racionalidade técnica-
instrumental, num excesso de adestramento nas especialidades e na busca de se adequar ao

formação de uma cultura ampla, crítica e humanística.


Uma educação para os Direitos Humanos deve ser capaz de tocar, de sensibilizar, de despertar
a criatividade, estimular o pensamento, descortinar horizontes, construir pontes para que se
possa despertar a subjetividade do indivíduo tão apagado, deslocado, sem lugar próprio,
incapaz, por isto, de independência e autonomia, que se mostra atualmente. Uma educação
que conscientiza do passado histórico, despertando a consciência histórica, das atrocidades
cometidas pelo homem, sedento de poder, contra o próprio homem. Daí deve-se perguntar:
Por que seres humanos são humanos? Qual nosso papel na teia da vida? Por que estamos aqui?
A filosofia deve voltar à Academia, não para que se decorem teorias, mas, principalmente e,
sobretudo, para que se façam perguntas e estimulem respostas, comportamentos que visem à
humanização, que mostrem, exaustivamente, o cenário odioso, de humilhação, de
superexploração, de ganância, de busca por títulos que se farão mortos, eis que o homem se
perdeu nas brumas de uma passado egoísta, que ainda insiste de se fazer presente. Despertar,
enquanto há tempo! E, definitivamente, deve-se compreender que como humanos, somos
unitas multiplex, pois, ao mesmo tempo que somos singularidades irredutíveis, pertencemos à
unidade que está entre, através e além de todos nós.

534
E para que serve a educação em direitos humanos, senão para humanizar? Humanizar...
O pesquisador deste estudo relata a seguinte experiência: Uma jovem mulher, de nome Maria,
uma refugiada que saíra da Venezuela junto a suas três filhas pequenas, que conheci na rua,
perguntou-me, ao saber que eu saíra de um Congresso Internacional de Direitos Humanos
(Chile, abril de 2017), sobre o que se discutia num Congresso sobre Direitos Humanos. Ela me
fez algumas perguntas, e eu as anotei num pequeno bloco. De forma resumida, eis que
compartilho: O que vocês falam nesse Congresso? Falam sobre a crise humana? O que os
humanos fazem aos próprios humanos? Se dizem Direitos Humanos, é porque somos
humanos, mas o que isto significa? Por que muitos de nós somos tratados com desprezo? Por
que muitos países se colocam como melhores e pisam em nós, que somos países fracos? E por
que existem países fortes e fracos? Vocês se lembram de falar de nós? Não! Vocês não sabem o
que estamos sentindo! Nós não somos lembrados. Não a nossa dor. A televisão só fala para
ganhar audiência. Mas vocês não sentem. Só nós que passamos fome, medo, podemos sentir e
expressar a nossa dor. E se vocês falam, não sentem a nossa dor! Nós temos medo, não
sabemos se iremos rever nossos familiares que ficaram para trás. Nós não podemos ser livres,
não podem
-me a
estação do metrô, deu-me um forte abraço, e agradeceu-me por tê-la ouvido. Eu lhe respondi:
Sou eu a ter gratidão, e agradecer por esse Encontro.
A narrativa sobre a minha Maria Venezuelana, cujos Olhos, e o olhar tão profundamente

Devemos nos esforçar por defendê-la a todo custo, justamente porque é a última: a opção de

que nos chama de volta a nossa Essência, pois que somos emanação da Vida, preenchidos pelo
Verbo, que só se faz Vivo, e não letra morta, quando nos unimos em Solidariedade a despertar
a Sabedoria do Amor Incondicional.
Cada um é o que é em face da verdade alcançada e permitida pelo seu possível.
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538
CONSTRUINDO CIDADES RESILIENTES: A EFETIVAÇÃO DE DIREITOS HUMANOS E A
REDUÇÃO DO RISCO DE DESASTRES NA REGIÃO METROPOLITANA DO VALE DO
PARAÍBA, SÃO PAULO, BRASIL.
317

RESUMO:
Quando se trata de direitos humanos, deve-se incluir o espaço onde habita a população em
suas discussões. Por ocasião da Conferência Rio+20, foram estabelecidos os Objetivos do
Desenvolvimento Sustentável, que, em um de seus tópicos, fixaram a busca por cidades
inclusivas, seguras, resilientes e sustentáveis, em continuação aos Objetivos do Milênio
propostos pela Organização das Nações Unidas (ONU). Este novo objetivo complementa
outras iniciativas da ONU visando a redução do risco de desastres, iniciada ainda nos anos
1990, quando da institucionalização de uma década específica para debater problemas
relativos aos desastres naturais. Hoje, sabe-se que o homem influencia diretamente na
ocorrência de desastres, de modo com que se deve procurar desnaturalizar tais eventos. Se o
homem exerce grande impacto na ocorrência de desastres, deve ele adotar providências
visando a sua redução, o que se dará por meio da correta ocupação e uso do solo nas cidades e
no campo, além de ações educativas diversas junto às comunidades, por exemplo. No Brasil,
fomentou-
volvida no âmbito do Quadro de
Ação de Hyogo, recentemente substituído pelo Quadro de Ação de Sendai, o que marcou a
mudança de foco entre a gestão dos desastres (pós-tsunami ocorrido na Ásia em 2005) e o
gerenciamento dos riscos (período 2015-2030). No cerne desta campanha, promovia-se a
articulação entre governos locais e sociedade, buscando aproximar os órgãos de proteção e
defesa civil da população, mormente aquela diretamente afetada pelos desastres. Este trabalho

especificamente nos contextos nacionais e internacionais, de que maneira a Campanha

risco de desastres, foi desencadeada na Região Metropolitana do Vale do Paraíba, Estado de


São Paulo, Brasil, que compreende 39 (trinta e nove) municípios no eixo São Paulo-Rio de
Janeiro, por meio da análise dos dados constantes da plataforma PreventionWeb, do Escritório
das Nações Unidas para a Redução do Risco de Desastres. Foram verificados quais municípios
se inscreveram na Campanha, quais preencheram o relatório de passos essenciais (1º ciclo) e o
relatório de progresso local (2º ciclo). Por fim, tem-se que o presente trabalho agrega às
discussões relacionadas à redução dos desastres, concluindo-se que a efetividade da Campanha
junto às comunidades é mínima, se comparados aos impactos dos desastres nas mesmas
comunidades.

Mestrando em Direito do Centro Universitário Salesiano de São Paulo (UNISAL). Graduado em Direito
317

(UNISAL). Associado efetivo da Associação Brasileira de Redução de Riscos de Desastres (ABRRD). Membro do
Grupo de Pesquisa em Direito Ambiental (UNISAL). E-mail: veiga.junior@live.com.

539
PALAVRAS-CHAVE: Direitos Humanos e Sociedade Contemporânea; Cidades Resilientes;
Objetivos do Desenvolvimento Sustentável.
Construyendo Ciudades Resilientes: la efectivación de derechos humanos y la reducción del
riesgo de desastres en la Región Metropolitana de Vale do Paraíba, São Paulo, Brasil.
João Carlos Valentim Veiga Junior
Alumno de Magíster en Derecho en el Centro Universitário Salesiano de São Paulo (UNISAL).
Graduado en Derecho (UNISAL). Asociado efectivo de la Asociasón Brasileña de Reducción de
Riesgos de Desastres (ABRRD). Miembro del Grupo de Investigación en Derecho Ambiental
(UNISAL). E-mail: veiga.junior@live.com.
RESUMEN:
Cuando se trata de los derechos humanos, debe incluir el espacio donde habita la población en
sus discusiones. En la Conferencia Rio+20, se establecieron los Objetivos de Desarrollo
Sostenible, el cual, en uno de sus mesajes, fijo la busqueda de ciudades incluyentes, seguras,
resilientes e sostenibles, continuando com los Objetivos del Milénio, propuestos por las
Naciones Unidas (ONU). Este nuevo objetivo complementa otras iniciativas de la ONU
destinadas a reducir el riesgo de desastres, que comenzó en los años 1990, cuando se
institucionalizó una década específica para discutir los problemas relacionados a los desastres
naturales. Hoy se sabe que el hombre influye directamente en la ocurrencia de desastres, por
lo que se debe buscar desnaturalizar estes fenómenos. Si el hombre tiene un gran impacto en
la ocurrencia de desastres, debe adoptar medidas a su reducción, que será a través de la
ocupación y uso correcto de la tierra en las ciudades y el campo, así como diversas actividades
educativas en las comunidades, por ejemplo. En Brasil, se fomentó una intensa participación

el Marco de Acción de Hyogo, recientemente substituido por lo


Marco de Acción de Sendai, lo que demuestra el cambio de enfoque entre la gestión de
desastres (post-tsunami en Asia, 2005) y la gestión de riesgos (periodo 2015-2030). En el centro
de esta campaña, se promovió la articulación entre los gobiernos locales y la sociedad,
tratando de acercar a los organismos de protección y defensa civil y la población,
especialmente los afectados por el desastre. Este trabajo pretende presentar el tema principal
de "Derechos Humanos en la sociedad contemporánea", específicamente en contextos
nacionales e internacionales, cómo la Campaña "Construyendo Ciudades Resilientes", que se
tiene como referencia para reducir el riesgo de desastres, se desencadenó en la región
metropolitana de Vale do Paraíba, Estado de São Paulo, Brasil, que comprende 39 (treinta y
nueve) municipios en el eje São Paulo-Rio de Janeiro, a través del análisis de los datos de la
plataforma PreventionWeb de la Oficina de las Naciones Unidas para la Reducción del Riesgo
de Desastres. Han sido designados cuales los municipios han firmado la Campaña, cuales
completarón el informe de pasos esenciales (1º ciclo) y el informe de situación local (2º ciclo).
Por último, este estudio se suma a las discusiones relacionadas con la reducción de desastres,

540
llegando a la conclusión de que la eficacia de la campaña en las comunidades es mínima, en
comparación con los efectos de los desastres en las mismas comunidades.
PALABRAS-CLAVE: Derechos Humanos y Sociedade Contemporánea; Ciudades Resilientes;
Objetivos de Desarrollo Sostenible.
INTRODUÇÃO
Os desastres guardam relação histórica com a humanidade. Remontam, segundo Veiga (2015) e
Braun (2005), ao próprio surgimento dos grupos humanos, quando da luta por sobrevivência
frente a um ambiente hostil ou aos rigores do clima (Bianchi & Veiga, 2016; Cotrim, 2005).
No Antigo Egito, segundo Cotrim (2005), eram realizadas grandes obras relacionadas à
irrigação, incluindo a construção de diques e barragens, voltadas à proteção das comunidades
ribeirinhas diante das inundações do Rio Nilo.
Hoje, sabe-se que o homem, enquanto ser social, influencia diretamente na ocorrência dos
desastres:

moradia no mercado informal de terras, ocupando áreas geomorfologicamente sensíveis, como


planícies de alagamento e de considerável aclive, expondo-se a riscos ambientais de enchentes

A naturalização dos desastres, conforme expõe Valencio (2014), deriva da abordagem tecnicista
por parte dos órgãos de proteção e defesa civil, cujo enfoque se dá nos perigos (hazards),
enquanto:
Na colet ̂nea intitulada Los desastres no son naturales, produzida pela Red de Estudios
Sociales em Prevenci n de Desastres em Am rica Latina - La Red, enfatiza- se que, quando
os planejadores de Estado dizem que os desastres s o naturais, buscam evitar um
questionamento mais amplo sobre o processo s cio hist rico no bojo do qual se desenrola a
din ̂mica socioespacial (Valencio, 2014, p. 3633).
Deste modo, deve-se procurar desnaturalizar tais eventos, pois se o homem exerce grande
impacto na ocorrência de desastres, deve ele adotar providências visando a sua redução.
Essa atuação, em caráter preventivo, se dará por meio da correta ocupação e uso do solo nas
cidades e no campo, respeito aos recursos naturais, além de ações educativas diversas junto às
comunidades, por exemplo. Como destaca Pinheiro (2015), se o munic pio o local onde
acontecem os desastres, nele tamb m deveria estar o primeiro aporte para atend ̂-los e, por
conseguinte, a oportunidade inicial de preveni-los .

Co

541
redução do risco de desastres, foi desencadeada na Região Metropolitana do Vale do Paraíba,
Estado de São Paulo, Brasil. Trata-se, portanto,
de um estudo descritivo com o objetivo de analisar a adesão e efetividade de participação dos
39 (trinta e nove) municípios desta Região na campanha das Nações Unidas.
2 NAÇÕES UNIDAS E A REDUÇÃO DE RISCOS: UM BREVE ESCORÇO HISTÓRICO
A preocupação com o meio ambiente ocupa o cenário global, em especial depois da década de
1970, quando, segundo Godard (2002 citado por Chaves & Rodrigues, 2006), passou-se a tomar
consciência acerca da necessidade de reflexão e ação por sobre o desenvolvimento tecno-
econômico tido à época e ensejador dos problemas ambientais.
-se que com a
globalização, o individualismo e o consumismo desenfreado, o homem durante muitos anos
utilizou e utiliza os bens naturais a seu bel-prazer, valendo-se da concepção arcaica da sua

desmatamento de florestas ocorre há séculos, mas que, na contemporaneidade, ele se dá de


forma global, como consequência da industrialização.
Em nosso cotidiano, as ameaças são intensificadas, entretanto elas não se converterão
politicamente em um conjunto de medidas preventivas, com foco na superação do risco, como
aduz Beck (2011).
Na década de 1970, a Organização das Nações Unidas [ONU] convocou uma Conferência sobre
o Ambiente Humano, conhecida como a Conferência de Estocolmo, da qual participou o
Brasil, adotando a posição de defesa à soberania nacional (Moura, 2016).
Resultado das discussões tidas nesta Conferência, a Declaração de Estocolmo positivou
princ pios e normas espec ficas ambientais, enfatizou o planejamento racional e o
desenvolvimento econ ̂mico, mas, sobretudo, reconheceu a necessidade do ser humano em
ter condi ̧ es de vida com dignidade e bem-estar, pautada em um ambiente sadio (Melo,
2015, p. 256).
Da referida Conferência, decorre ainda a criação do Programa das Nações Unidas para o Meio
Ambiente [PNUMA], a quem competiria a promoção da cooperação e a política sobre o meio
ambiente global, orientando a coordenação de programas ambientais no âmbito da ONU,
dentre outras atribuições arroladas na resolução que criou o órgão (United Nations, 1972).
Ainda no início dos anos 1970, conforme discorrem Chaves & Rodrigues (2006), surge a
primeira corrente de pensamento em torno do desenvolvimento sustentável, sob a
coordenação do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente [PNUMA], dedicando-se
à promoção de estratégias ao ecodesenvolvimento.

542
ponto de partida a confrontação com os novos conceitos e modelos desenvolvidos pelas

Na década de 1980, a Comissão Mundial sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento ratifica as


constatações, de modo oficial, tidas em decorrência da Conferência de Estocolmo, acerca do
modelo desenvolvimentista tido até então, propondo por fim o desenvolvimento em sua forma
sustentável (Morais & Ivanoff, 2016).
Por desenvolvimento sustentável, cuja definição foi trazida pelo Relatório Brundtland, datado
de 1988, entende- ende às necessidades e aspirações do presente sem

(Peralta & Leite, 2012, p. 18).


Em 1989, cumpre destacar que a Assembleia Geral das Nações Unidas estabeleceu a década
subsequente como aquela destinada ao desenvolvimento de estratégias voltadas à redução dos
desastres naturais (Bianchi & Veiga, 2016), da qual resultou a busca pela incorporação dos
aspectos preventivos em termos de desastres com a edição de diversos documentos voltados a
esta finalidade (Bianchi & Veiga, 2016; UFSC, 2013a).
Na década de 1990, cabe o destaque à Cúpula da Terra, ou também conhecida como Eco-92,
realizada na cidade do Rio de Janeiro e que resultou na expedição de uma declaração sobre o
meio ambiente e desenvolvimento, bem como na edição da Agenda 21.
Um dos frutos da Eco-92, a Agenda 21 teve seu lançamento no Brasil depois de decorridos dez

direcionar a política ambiental brasileira e de orientar as políticas de desenvolvimento para o

Na mesma época do lançamento da Agenda 21 no Brasil, teve sede em Joanesburgo, África do


Sul, uma segunda conferência sobre desenvolvimento sustentável destinada a revisar as
propostas da Eco-92 e formulação de um plano de ação global. Contudo, frustrou-se a
conferência como um espaço de debate político-filosófico, da qual não resultou um plano
concreto de atuação (Peralta & Leite, 2012).
Em uma análise acerca da implementação dos resultados da Eco-92:
[...] o Brasil, como os demais pa ses da Am rica Latina e do Caribe, apenas iniciou a
transi ̧ o ao desenvolvimento sustent vel. verdade que a regi o assumiu com
entusiasmo os compromissos da C pula da Terra e tentou adaptar-se maioria das
decis es e programas, mas as realiza ̧ es concretas s o ainda insuficientes. H muito
que ser feito para confrontar os m ltiplos desafios do futuro, muitos dos quais, h que
reconhecer, apenas se insinuavam quando os governos reuniram-se no Rio em 1992
(Guimarães & Foutoura, 2012, p. 511).

propostas na Eco 92, com o intuito de combater a pobreza e defender o meio am


543
(Peralta & Leite, 2012, p. 18), restando infrutífera por ter, na visão de Peralta e Leite (2012), se
consolidado como um debate político-filosófico de onde não resultou em um plano de ação
concreto.
Por fim, ocorrida em junho de 2012, a Conferência das Nações Unidas para o Desenvolvimento

político com o desenvolvimento sustentável, por meio da avaliação do progresso e das lacunas
na implementação das decisões adotadas pelas principais cúpulas sobre o assunto e do

(http://www.rio20.gov.br/sobre_a_rio_mais_20.html, recuperado em 10, maio, 2017).


Por ocasião da Conferência Rio+20, foram estabelecidos os Objetivos do Desenvolvimento
Sustentável, que, em um de seus tópicos, fixaram a busca por cidades inclusivas, seguras,
resilientes e sustentáveis, em continuação aos Objetivos do Milênio propostos pela ONU.
Este novo objetivo corrobora com outras iniciativas da ONU visando a redução do risco de
desastres, iniciada ainda nos anos 1990, quando da institucionalização de uma década
específica para debater problemas relativos aos desastres naturais, como já abordado
anteriormente.
Ao se definir a busca por cidades resilientes, é possível visualizar uma das dimensões
atribuídas ao conceito de sustentabilidade por Sachs (2002): a sustentabilidade geográfica,

es & Rodrigues, 2006, p. 105).


Em complemento, tem- ̂s crit rios referidos para o desenvolvimento sustent vel
continuam vigentes e s o imprescind veis: equidade social, prud ̂ncia ecol gica e
efici ̂ncia econ ̂mica (Morais & Ivanoff, 2016, p. 54).
3 CONSTRUINDO CIDADES RESILIENTES

pelo Escritório das Nações Unidas para a Redução do Risco de Desastres [UNISDR] em 2010,
abordando:
temas de gobernabilidad local y riesgo urbano con el objetivo de ayudar a los gobiernos locales
a reducir el riesgo y aumentar la resiliencia en el ámbito urbano a través de la aplicación del
Marco de Sendai para la Reducción del Riesgo de Desastres 2015-2030.
(http://www.eird.org/camp-10-15/sobrecampana.html, recuperado em 12, abril, 2017).
Faz-se premente uma campanha voltada às cidades já que:
De acordo com dados do Programa das Na ̧ es Unidas para os Assentamentos Urbanos (UN
Habitat), em cerca de 40 anos, dois ter ̧os da popula ̧ o mundial viver o em cidades,
sendo que aproximadamente 70% do crescimento demogr fico mundial dever o ocorrer
nos pa ses em desenvolvimento. Em 2050, estima-se que a Am rica do Sul ser a regi o

544
mais urbana do mundo, com 91,4% da sua popula ̧ o vivendo em reas urbanas
(Documento de Contribuição Brasileira à Conferência Rio+20, 2011, p. 15).
A campanha permite, por meio de suas ferramentas:
a los gobiernos y actores locales identificar lagunas en su resiliencia e incrementar su
capacidad financiera, técnica y de conocimiento para la planificación del desarrollo y la
gestión del riesgo. A través de la campaña, las ciudades entran a formar parte de una amplia
alianza de ciudades resilientes a nivel mundial. (http://www.eird.org/camp-10-
15/sobrecampana.html, recuperado em 12, abril, 2017).
No Brasil, fomentou-se intensamente a participação dos governos locais na Campanha

inicialmente no âmbito do Quadro de Ação de Hyogo [HFA], recentemente substituído pelo


Quadro de Ação de Sendai, o que marcou a mudança de foco entre a gestão dos desastres (pós-
tsunami ocorrido na Ásia em 2005) e o gerenciamento dos riscos (período 2015-2030).
O fomento tratado aqui pode se demonstrar pela então estruturação do Centro de Excelência
para a Redução do Risco de Desastres, na cidade do Rio de Janeiro, que:
resultou de uma parceria entre o Governo Federal e o UNISDR, numa iniciativa pioneira em
âmbito global e alinhada com as ações previstas no Marco de Ação de Hyogo (MAH) e com a
Política Nacional de Proteção e Defesa Civil (PNPDEC).
(https://nacoesunidas.org/agencia/unisdr/, recuperado em 20, maio, 2017).
Por seu turno, o Estado de São Paulo, por intermédio de sua Secretaria de Meio Ambiente,
considera a participação, ou pelo menos a adesão à campanha de cidades resilientes, para fins

a gestão ambiental com a descentralização e

(http://www.ambiente.sp.gov.br/municipioverdeazul/o-projeto/, recuperado em 15, maio,


2017). Tal programa serve, por meio do estabelecimento de um ranking, como instrumento
para promoção de políticas públicas ambientais.
No cerne desta campanha, promovia-se a articulação entre governos locais e sociedade,
buscando aproximar os órgãos de proteção e defesa civil da população, mormente aquela
diretamente afetada pelos desastres:
Sob os ausp cios das Na ̧ es Unidas, tem havido em todo o planeta um esfor ̧o para
tentar deslocar o eixo de poder, no tema dos riscos e desastres, para a prote ̧ o civil; ou seja,
busca-se incentivar a mobiliza ̧ o coletiva para que haja maior controle social acerca de
informa ̧ es sobre amea ̧as de toda a ordem assim como para a obten ̧ o de maior
apoio material s praticas comunit rias de resili ̂ncia (Valencio, A., Valencio, N. & Hanai,
2017, p. 27).

545
Tal situação se adequa ao novo contexto em que se inseriram os municípios brasileiros pós-
Constituição Federal de 1988, em que:
ganharam mais atribui ̧ es a autonomia, tendo que estar aptos a atender às demandas
sociais em diversas reas, especialmente aquelas prestacionais, ou seja, que envolvem
direitos sociais. Ademais, tamb m coube aos munic pios a execu ̧ o coordenada de uma
pol tica ambiental para garantir o tamb m fundamental direito ao meio ambiente
ecologicamente equilibrado (Silva & Romeiro, 2015, p. 211)318.
3.1 CARACTERIZAÇÃO DA REGIÃO DE ESTUDO
A Região Metropolitana do Vale do Paraíba e Litoral Norte [RMVale] foi criada por uma
legislação do Estado de São Paulo em 9 de janeiro de 2012 (Lei Complementar n. 1.166, 2012), e
tem como objetivos, dentre outros, a promoção do planejamento regional visando o
desenvolvimento econômico com uma consequente melhoria da qualidade de vida dos
cidadãos, a utilização racional do território e dos recursos naturais, bem como a proteção ao
meio ambiente (Lei Complementar n. 1.166, 2012).
A RMVale compreende 39 (trinta e nove) municípios localizados no que se denomina eixo São
Paulo-Rio de Janeiro, correspondendo somente àqueles cujo território estejam no estado de
São Paulo, o que equivale à divisão de mesorregião geográfica319 aplicada pelo Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística [IBGE].
Segundo estimativa do IBGE para o ano de 2015, a população da RMVale equivale a 2.453.387
habitantes, ocupando a 12ª colocação em relação as demais regiões metropolitanas brasileiras,
estando atrás de São Paulo, Rio de Janeiro e Porto Alegre, por exemplo, mas a frente de regiões
onde se localizam capitais como Goiânia, Belém e Natal. Em nível estadual, figura como a
terceira mais populosa, atrás da Grande São Paulo e Campinas apenas (IBGE, 2015).
3.2 ANÁLISE
Foram analisados os dados constantes na plataforma PreventionWeb, do Escritório das Nações
Unidas para a Redução do Risco de Desastres. Esta plataforma está disponível on line ao
público e a partir dela tem-se acesso aos relatórios:
Local HFA progress reports assess strategic priorities in the implementation of disaster risk
reduction actions and establish baselines on levels of progress achieved in implementing the
HFA's five priorities for action and the 10 essentials for making cities resilient.

Acerca da capacidade dos municípios para atendimento às demandas enquanto ente federado, recomenda-se a
318

leitura de: Silva, D. R. & Romeiro, P. (2015). Município: as atribuições constitucional e legal frente à realidade na
execução da política ambiental. Revista Direito & Paz, 2(33), 209-227.
319
-se por mesorregião uma área individualizada em uma Unidade da Federação que apresenta formas de
organização do espaço geográfico definidas pelas seguintes dimensões: o processo social como determinante o
quadro natural como condicionante e a rede de comunicação e de lugares como elemento da articulação espacial.
Estas três dimensões possibilitam que o espaço delimitado como mesorregião tenha uma identidade regional. Esta
identidade

546
(http://www.preventionweb.net/english/hyogo/progress/reports/, recuperado em 10, abril,
2017).
Foram verificados quais municípios se inscreveram na Campanha, quais preencheram o
relatório de passos essenciais (1º ciclo) e, por fim, quais submeterem o relatório de progresso
local (2º ciclo).
Dos 39 municípios que compõe a RMVale, verificou-se que 21 (vinte e um) estão inscritos na
Campanha, correspondendo a pouco mais da metade (53,84%). Por inscrição se entende o
envio, ao UNISDR, do termo de adesão à campanha, passando a figurar no portal eletrônico
como aderente.
Dos aderentes, anota-se que grande parte (61,9%) se concentra nas sub-regiões de Taubaté (7
municípios) e Guaratinguetá (6 municípios). Estas sub-regiões são centralizadas em relação
aos demais municípios da mesma Região Metropolitana. Faz-se mister indicar ainda que, no
município de Taubaté, se instalou, em junho de 2015, o escritório da 3ª Coordenadoria
Regional da Defesa Civil no interior do Estado de São Paulo [REDEC/I-3].
Entretanto, dos aderentes, apenas 28,57% procederam à análise quanto ao engajamento de seus
municípios ao Marco de Ação de Hyogo, por meio da Ferramenta de Autoavaliação do
Governo Local para a Resiliência a Desastres320 (LG-SAT, do acrônimo em inglês)
disponibilizada pelo UNISDR. Seja com relação ao primeiro relatório (10 passos essenciais) ou
aquele em que se faz a análise posterior.
Em que pese os trabalhos acadêmicos normalmente omitirem as nomenclaturas de localidades
(adotando inclusive critérios éticos para tanto), mister se faz destacar os nomes dos
municípios neste artigo, posto que, ao não mencioná-los poderia se incorrer no erro de
desvirtuar o objeto da pesquisa.
Ante as análises que se realizarão a seguir, informa-se preliminarmente que os dados de
referência habitacional equivalem às estimativas populacionais para o ano de 2016 fornecidas
pelo IBGE (2016).
Dentre os 6 (seis) municípios de grande porte (mais de 100.000 habitantes), 4 (quatro) não se
inscreveram na campanha (66%), 2 (dois) são aderentes, sendo que apenas um deles submeteu
dados pelo LG-SAT (16% do porte).
Neste ponto, frisa-se que Caraguatatuba, devastada em 1967 por movimento de massa (debris
flow) com a morte de 400 pessoas e milhares de desabrigados (Caraguatatuba, 2014 como
citado em Veiga, 2015), bem como São José dos Campos, não constam na plataforma

A Local Government Self-Assessment Tool for Disaster Resilience dispõe de questões-chave e mecanismos de
320

medição dos 10 princípios em busca de cidades resilientes, baseando-se nas prioridades e indicadores nacionais do
HFA. Confira: http://www.unisdr.org/applications/hfa/assets/lgsat/documents/Overview-of-the-LGSAT-
English.pdf

547
Cidades de porte médio (50.001 a 100.000 habitantes), que perfazem o total de 6 (seis),
apresentam-se conforme: 1 (um) município não inscrito (16%); e 5 (cinco) aderentes à
campanha, dos quais, 2 (dois) se utilizaram da LG-SAT (33% do porte).
Por outro lado, verifica-se também que nos municípios de pequeno porte (até 50.000
habitantes), a adesão à campanha é maior, contudo não o uso do LG-SAT: dos 27 (vinte e sete)
que se enquadram nesta faixa, 15 (quinze) são aderentes, dos quais apenas 3 (três) se utilizaram
da ferramenta de autoavaliação (11% do porte).
Aqui é de se apontar, a título exemplificativo, que há casos de municípios que anteriormente
foram atingidos por desastres, como Cunha, que em 2010 registrou 6 mortes em decorrência
de chuva intensa (UFSC, 2013b, p. 59), mas não deram seguimento à participação na campanha
da ONU.
Dos municípios aderentes e que efetivamente responderam aos questionamentos
disponibilizados pelo UNISDR via LG-SAT, temos, em ordem alfabética (por sub-região):
Caçapava (1), Campos do Jordão (2), São Luís do Paraitinga (2), Taubaté (2), Tremembé (2),
Piquete (3). Das sub-regiões 4 e 5, os municípios inscritos não submeteram seus relatos.
O perfil componente deste grupamento de aderentes usuários da ferramenta de autoavaliação
é o seguinte: 1 (um) município de grande, 2 (dois) de médio e 3 (três) de pequeno porte. Desses,
dois se sobrelevam historicamente no contexto da proteção civil, por já terem registrado
desastres321 em seu território: Campos do Jordão e São Luís do Paraitinga.

divisa com o Estado de Minas Gerais. Lá, os registros de desastres são antigos, a exemplo (não
se restringindo a este caso) do seguinte excerto:
No dia 18 de agosto de 1972, s 8 e 15 da manh , verificou-se um deslizamento de cerca de
70.000 mil metros c bicos de lama altamente aquosa e rica em mat ria org ̂nica de
origem vegetal, numa vila oper ria chamada Vila Albertina, situada quase 2 km a sudoeste da
entrada principal para Campos do Jord o. O fluxo de lama causou o soterramento de 60
casas e a morte de 17 pessoas. (Amaral & Fuck, 1973, p. 21).
Já São Luís do Paraitinga, o seu registro mais recente de desastres data de 2010. Segundo Veiga
(2015, p. 21):
Na ocasi o, foi registrada precipitac o pluviom trica da ordem de 605mm, quando a
m dia mensal estimada era de 195mm (CORSI; AZEVEDO; GRAMANI, 2012), ocasionando a
elevac o das guas do Rio Paraitinga em mais de 10 metros, al m de escorregamentos por
saturac o do solo (BROLLO et al, 2000).

Por desastres, esta pesquisa se limita à definição trazida pela legislação brasile
321

eventos adversos, naturais ou provocados pelo homem sobre um ecossistema vulnerável, causando danos humanos,

548
Caçapava, Taubaté e Piquete, por sua vez, apesar de também sofrerem consequências de
eventos adversos322, não chegam a configurar desastres, tampouco apresentam danos de
natureza humana (óbitos especialmente) em data recente (a partir de 2010).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
usca
assegurar a urbanização sustentável por meio de ações proativas por parte dos governos, em
todos os seus níveis, em articulação com a sociedade, o que guarda relação com a influência do
homem sobre os desastres, de modo que a desnaturalização de tais eventos se faz premente.
A incorporação da percepção do risco de desastres, como forma de tal desnaturalização, passa
necessariamente pelas cidades, que é onde se instalam os grupos humanos em sua grande
maioria na atualidade.
No entanto, os dados demonstram que muitos dos municípios da região estudada não
aderiram ou não se utilizaram da ferramenta disponibilizada pela campanha, e, entre estes, a
maioria possui menos de 50 (cinquenta) mil habitantes. Destacam-se, neste perfil, municípios
com histórico de desastres que envolveram não apenas aspectos ambientais e financeiros, mas
também danos humanos.
Em que pese a grande adesão por parte dos municípios de pequeno porte, que são em maior
número na região em estudo, a continuidade da campanha por meio do preenchimento da
ferramenta de autoavaliação LG-SAT restou prejudicada neste perfil, já que apenas 3 (três)
completaram esta etapa.
Também é de se indicar que, dos municípios aderentes, aproximadamente dois terços se
concentram na porção central da região estudada, o que pode guardar relação com o
posicionamento do Escritório Regional de Defesa Civil, no município de Taubaté.
Ainda que a adesão à campanha permita aos municípios a incorporac o da resiliência e, por
conseguinte, a redução da vulnerabilidade socioambiental, ainda é carente um retorno
imediato, por parte do governo estadual ou federal aos municípios participantes. Retorno este
em forma de contrapartida, com o fornecimento de materiais ou até mesmo repasse de
recursos financeiros.
Talvez por isso muitos dos municípios, em comparação com outros programas que visam o
implemento de medidas preventivas, tenham compreendido que sua não adesão à campanha

eram previstas contrapartidas em quaisquer dos ciclos da campanha promovida pelas Nações
Unidas.

Eventos adversos são aqueles de origem natural ou tecnológica que, em decorrência de sua magnitude, não
322

caracterizam ou não se tipificam como desastres, de acordo com as normas do Ministério da Integração Nacional.

549
Por outro lado, inexistem quaisquer implicações, que não a manutenção da situação como se
encontra atualmente, aos municípios não aderentes, o que contribui certamente para a
situação descrita neste trabalho.
Considera-se, ainda, que o espaço habitado pelas pessoas compõe o rol de temas para
discussão em termos de Direitos Humanos. É mister que os municípios, via governos locais, se
comprometam e responsabilizem pela qualidade e segurança destes espaços, a partir de uma
atuação voltada à gestão do risco de desastres, seja por sua prevenção, seja pela mitigação.
Por fim, conclui-se que a efetividade da Campanha junto às comunidades é mínima, se
comparados aos impactos dos desastres nas mesmas comunidades.
Referências
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do Jordão, SP, em agosto de 1972. Boletim IG, 4, 21-37. Disponível:
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reconhecimento de situação de emergência e estado de calamidade pública, sobre as
transferências de recursos para ações de socorro, assistência às vítimas, restabelecimento de
serviços essenciais e reconstrução nas áreas atingidas por desastre, e dá outras providências.
Disponível: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2010/Decreto/D7257.htm.

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552
LA FUNCIÓN SOCIAL DEL TRABAJO Y PROTECCIÓN DE LOS TRABAJADORES

La Función Social del Trabajo


La función social del trabajo encuentra su fundamento y regulación en el artículo 2 del Código
del Trabajo y que
cumple el trabajo y la libertad de las personas para contratar y dedicar su esfuerzo a la labor

Sin dudas, que de la sola lectura de este primer párrafo podemos llegar a la conclusión de que
la función social, no sólo encuentra su fundamento en el Código del Trabajo, sino que también
en la Constitución Política de la República y específicamente en los derechos y deberes
constitucionales relacionados con la libertad de las personas en cuanto al desarrollo de su
labor y elección del trabajo que realizarán.

Relacionando ambas normas se puede concluir que la función social del trabajo constituye
para las personas un derecho, ya que protege la esencia de la persona y su oportunidad de
acceder a cualquier fuente laboral lícita, siendo libre de elegir el trabajo al que quiere formar
parte y a la vez es un deber, ya que se debe entregar el acceso a una oportunidad laboral
respetando a la persona en su calidad humana y en sus capacidades, sin discriminar por
ninguna de sus características personales. Y quien desarrolla la labor debe efectuarla en forma
lícita y leal.
Y para entender que la función social finalmente envuelve un deber y un derecho hay que
observar los incisos siguientes de las normas aludidas.
De la lectura del artículo 2 del Código del Trabajo en sus siguientes incisos se desprende
expresamente que la función social del trabajo incluye el respeto a la dignidad humana,
atentando contra ella, las conductas entre otras de acoso sexual y el acoso laboral.
Los actos de discriminación se refieren a las distinciones que se efectúan por parte de un
potencial empleador al momento de elegir o seleccionar a una persona para un trabajo, son
exclusiones basadas en la raza, color, sexo, edad, estado civil, sindicación, religión, opinión
política, nacionalidad, ascendencia nacional u origen social, todas estas con el objeto de anular
o alterar la igualdad de oportunidades o de trato en el empleo y la ocupación. La única
excepción es distinguir en base a las calificaciones exigidas para un empleo.
Y esto tiene relación con lo regulado en el inciso 3° del artículo 19 N° 16 de la Constitución

553
Observando las causales de discriminación, es bien probable que cualquier persona en Chile
haya sufrido algún tipo de discriminación por alguno de los motivos expuestos en alguna
oportunidad de su vida laboral. De hecho en la actualidad como sociedad aún no existen las
mismas oportunidades laborales ni sueldos, entre hombres y mujeres por dar el ejemplo
quizás, más común. Es por ello que este principio es tan relevante, ya que permite una
regulación hacia una sociedad más sana y justa.
Además de lo mencionado el Código del Trabajo dispone que ningún empleador podrá
condicionar la contratación de trabajadores, a su situación económica, financiera, bancaria o
comercial que pueda estar incluso publicada en registros de datos personales o en registros
bancarios. Si en este caso se exceptúa dicha exigencia a los trabajadores de confianza del
empleador o que tengan facultades de administración, en cuyo caso si se podrá condicionar su
contratación a aspectos económicas, debido principalmente a su grado de responsabilidad en
la empresa y al manejo que potencialmente efectúen de dineros de su empleador.
Además en el último inciso del
trabajador en su derecho a elegir libremente su trabajo y velar por el cumplimiento de las

Por lo que no solamente es deber de los distintos empleadores respetar estos principios, sino
que además es deber del estado amparar y proteger que dichos derechos sean respetados en
favor del trabajador, lo que va en directa relación con lo dispuesto en la Constitución. Por lo
que establecer un marco regulatorio completo y actualizado a las necesidades de la sociedad,
es deber del estado y de las respectivas autoridades en el orden legislativo.
La constitución complementa todo lo señalado, disponiendo en su inciso 4° del artículo 19 N°16
que ningún trabajo puede ser prohibido a menos que sea contrario a la moral, a la seguridad o
a la salubridad pública o que en atención al interés nacional una ley lo declare prohibido.
También dispone que ninguna ley o autoridad pública podrá exigir la afiliación o desafiliación
a una organización o entidad alguna como requisito para desarrollar un determinado trabajo.
En el contexto de nuestra actual sociedad se puede señalar que a nivel de normas, la regulación
es bien completa, abarca variadas posibilidades de discriminación y su consecuente protección
para el trabajador. Sin duda en los últimos años la regulación es más completa.
Me parece a título personal, que las falencias están en el comportamiento que tenemos como
sociedad en el cumplimiento de la función social del trabajo y no solamente por parte del
empleador o del estado, sino también del trabajador. Son todos los estamentos de nuestra
sociedad los que deben propender al respeto de las normas señaladas en estos párrafos, sin
embargo a pesar de que las normas son bastante completas, hoy existe aún discriminación por
parte del empleador a la hora de elegir un trabajador y en algunos casos un aprovechamiento
del trabajador al tener las normas en su favor, de buscar resquicios y obtener beneficios de la
norma.

554
El empleador aún establece diferencias en los sueldos ante mismos cargos y en la elección del
trabajador distingue en muchos casos en su sexo, condición y nacionalidad.
Y el trabajador que conoce de las normas en muchas oportunidades, prioriza su interés por
sobre lo que realmente ocurre en un trabajo, ya que si el empleador no ha escriturado todo, ya
sea contrato de trabajo y otros documentos como la carta de despido, las presunciones se
encuentran a favor del trabajador y esa norma está muy bien que tenga dicho sentido, el
problema es que el trabajador al conocer de dichas circunstancias, en muchos casos hace pesar
dicho derecho por sobre la verdad, dándole peso legal a su palabra, lo que requiere de lealtad,
lo que en muchos casos no se cumple, generando una situación anómala difícil de regular o
controlar, por lo que finalmente la persona es la que debe dar el primer paso a que la norma
sea más eficiente y cumpla con su real objetivo.
La norma ha sido capaz de actualizarse a la realidad social global, sin embargo nuestra
sociedad sigue estancada en cierta forma a las malas prácticas. Quizás está impregnado en
nuestra idiosincrasia y es por ello que la labor educativa de las autoridades y de la familia es,
sin duda lo más relevante frente a lo que planteo. Si la sociedad viera las normas como un
medio de protección de las personas en el que va envuelto no sólo derechos sino también
deberes, tales como el de lealtad y respeto por la verdad y no ver la oportunidad de aplicar las
normas en su favor, sin importar lo que está ocurriendo en la práctica, aprovechándose de un
contexto sin preocuparse de la verdad, sin duda que las normas que analicé significarían un
mayor respeto a las personas y condición humana. Como sociedad debemos avanzar hacia la
verdad y respeto de las normas y en ese contexto ir actualizando las normas a un mayor
respeto de las personas.
Protección de los Trabajadores
Dentro de estas normas se abordarán tres materias de importancia y actualidad.
Esta materia sin dudas es una de las más importantes de nuestra legislación y una
preocupación del legislador laboral desde sus inicios. En el tiempo estas normas se ha ido
actualizando en forma constante, actualizándose a la realidad social y de la mujer propiamente
tal, existiendo mejoras concretas en la misma en la última década.
En estas normas se menciona que tanto las empresas privadas como las instituciones públicas
de distinto orden deben respetar la maternidad, y por lo mismo la protección abarca a todas
las instituciones del país, lo que es un claro indicio de la importancia de este capítulo.
El descanso maternal está compuesto de un prenatal de seis semanas antes del parto y de un
postnatal de doce semanas después del parto. Además en el artículo 197 bis se dispone de un
descanso postnatal posterior a las doce semanas mencionadas, llamado período postnatal
parental de doce semanas más. Durante este período la madre puede reincorporarse a sus
labores por la mitad de su jornada en cuyo caso el período postnatal parental se extenderá a
dieciocho semanas. Y en este caso la madre recibirá solamente el 50% del subsidio que le
corresponde en los períodos anteriores por estar trabajando media jornada.
555
Con esta normativa se le concede a la madre un período más largo para cuidar a niño (a) en el
tramo de tiempo que sin dudas se requiere de mayor atención, lo que sin duda es una clara
mejora a la protección de la maternidad.
Actualmente el padre también goza de un derecho a un permiso pagado de cinco días en caso
de nacimiento de un hijo, lo que sin duda es una materia pendiente de nuestra legislación
revisar y mejorar, dado el tiempo que es claramente insuficiente para cualquier cuidado de un
niño. Cinco días finalmente no aportan mucho en lo que se refiere a reemplazar a la madre.
Hoy uno observa que más bien sirve para acompañar a la madre por un tiempo corto o cubrir
una eventualidad o emergencia, pero no es un real descanso a un tiempo que permita a la
madre trabajar en dicho período y significar por lo tanto una igualdad en las condiciones
laborales entre un hombre y una mujer. Si bien no se puede desconocer que una madre es
totalmente irremplazable para un niño de menos de 6 meses, sin dudas el padre debiera tener
el derecho a un descanso de mayor tiempo que permitiera alternar considerablemente con la
madre y que también permitiera saber a cualquier empleador que ante un embarazo de una
trabajadora, no necesariamente significaría su ausencia por un período de más de 3 meses a lo
menos, considerando siempre en las variables que el hombre también podría asumir el
descanso. Una vez que se igualen las condiciones del descanso postnatal entre un hombre y
una mujer quizás las diferencias entre contratar a un hombre y una mujer se acorten para
cualquier empleador del país.
Sin embargo si hay una disposición que iguala las condiciones en una parte del descanso
postnatal. Si ambos padres son trabajadores, cualquiera de ellos a elección de la madre , podrá
gozar del permiso postnatal parental a partir de la séptima semana del mismo, por el número
de semanas que ésta indique.
En caso de muerte de la madre, el padre gozará del mismo período postnatal de la madre para
el cuidado de su hijo, sin perjuicio de gozar del fuero maternal.
En caso que durante el embarazo se produjere enfermedad de la madre como consecuencia de
éste, la madre tendrá derecho a un descanso prenatal suplementario cuya duración será fijada
por la institución médica correspondiente. Si el parto se retrasa, el descanso prenatal se
extiende hasta el parto efectivo y una vez producido éste comienza a correr el plazo del
postnatal. Si la madre durante el parto adquiriera una enfermedad que no le permitiera volver
a su trabajo con posterioridad al descanso postnatal, éste será prolongado por el tiempo que
fije la institución médica respectiva.
También en el artículo 199 y 199 bis se pueden observar normas que protegen al hijo.
Cuando la salud de un niño menor de un año requiera de atención en el hogar con motivo de
una enfermedad grave, lo que deberá acreditarse por un certificado médico a lo menos, la
madre trabajadora tendrá derecho al permiso y subsidio por el periodo que el respectivo
servicio determine. En el caso que ambos padres sean trabajadores, a elección de la madre,
gozará de ellos el padre.

556
La madre durante el período de embarazo y hasta un año después de expirado el descanso de
maternidad, excluido el postnatal parental gozará de fuero laboral. Y el empleador no podrá
despedir por tanto a la madre, sino que solamente a través de un juicio de desafuero.
Durante el período de embarazo la trabajadora no podrá desarrollar trabajos considerados
como perjudiciales para su salud y en la eventualidad de encontrarse desarrollando alguno el
empleador deberá trasladarla de labores inmediatamente. Estos trabajos se refieren a
exigencias físicas, levantar grandes pesos, desarrollar trabajo nocturno, etc.
Además las trabajadoras tendrán derecho a disponer a lo menos de una hora al día para dar
alimento a sus hijos menores de dos años.
Seguro Social contra riesgos de accidentes de trabajo y enfermedades profesionales. Ley 16.744
Accidente del Trabajo se entiende por toda lesión que una persona sufra a causa o con ocasión
del trabajo y que le produzca incapacidad o muerte. Se consideran también los ocurridos en el
trayecto directo de ida o regreso al trabajo.
Enfermedad profesional es la causada de una manera directa por el ejercicio de la profesión o
el trabajo que realice una persona y que le produzca incapacidad o muerte.
La víctima de un accidente del trabajo o enfermedad profesional tendrá derecho a atención
médica, quirúrgica y dental en establecimientos externos o a domicilio, hospitalización,
medicamentos, prótesis y aparatos ortopédicos, rehabilitación física y sus correspondientes
gastos de traslado a estos tratamientos.
Además existen subsidios en virtud del grado de daño causado por el accidente o enfermedad
del trabajo.
Si se produce una incapacidad temporal, el subsidio se pagará durante todo el tratamiento
hasta un máximo dos años de duración.
En caso de invalidez del trabajador, si la disminución de la capacidad es igual o superior a un
15% e inferior a un 40% la víctima tendrá derecho a una indemnización global cuyo monto no
excederá de 15 veces su sueldo base.
En caso que la disminución de la capacidad es igual o superior a 40% e inferior a 70%, el
trabajador tendrá derecho a una pensión mensual del 35% de su sueldo base.
La invalidez será total cuando sea igual o superior al 70% de incapacidad y el trabajador
recibirá una pensión mensual del 70% de su sueldo base.
Y si el trabajador se considera gran inválido y que requiere el auxilio de otras personas para
realizar actos elementales de su vida tendrá derecho además a un suplemento de pensión del
30% de su sueldo base.

557
Finalmente respecto de este punto me parece importante dar a conocer al lector que en toda
industria o faena en que trabajen más de veinticinco personas deberán funcionar uno o más
Comités Paritarios de Higiene y Seguridad que tendrán las siguientes funciones:
-Asesorar e instruir a los trabajadores para la correcta utilización de los instrumentos de
protección
- Vigilar el cumplimiento, tanto de la empresa como trabajadores de las medidas de
prevención, higiene y seguridad
-Investigar las causas de los accidentes del trabajo y enfermedades profesionales
-Indicar las medidas de higiene y seguridad que sirvan para la prevención de los riesgos
profesionales.
Investigación y sanción del Acoso sexual
Esta es una materia relativamente nueva en el derecho laboral, debe su incorporación al
Código del trabajo a través de la Ley 20.005 del año 2005. Y es tratada en los artículos 211-A
hasta 211-E.
En caso de acoso sexual, la persona afectada puede reclamar a la Dirección del Trabajo o la
respectiva Inspección del Trabajo.
Recibida la denuncia el empleador debe tomar además todas las medidas de resguardo
respecto de los involucrados, manteniéndolos separados dentro del lugar del trabajo o
redistribuir la jornada de trabajo.
Además el empleador deberá efectuar una investigación propia de los hechos que motivaron la
denuncia o en el plazo de 5 días remitir dicha información a la Inspección del Trabajo
respectiva para su propia investigación.
Si se produce una investigación interna que no podrá durar más de 30 días, deberá constar por
escrito y en la que se oirá a todas las partes involucradas.
Las conclusiones de la investigación del empleador o en su defecto de la Inspección del trabajo
deberán ponerse en conocimiento del empleador, denunciante y denunciado.
En conformidad al mérito del informe el empleador tendrá un plazo de 15 días contados desde
la recepción del informe, para aplicar las medidas o sanciones que correspondan.
Además de todo lo señalado anteriormente, desde el año 2005, el acoso sexual es causal de
despido contenida en el Código del Trabajo en el artículo 160 N° 1 letra b).

558
O DIREITO À ISENÇÃO DE IPVA AOS PROPRIETÁRIOS PORTADORES DE
DEFICIÊNCIA INAPTOS A DIRIGIR FACE AO PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA
HUMANA.
323

324

Resumo:
O IPVA (Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores), previsto no artigo 155, inciso
III, da Constituição da República Federativa do Brasil, é um tributo cuja competência
tributária foi atribuída aos Estados-membros e tem como fato gerador a propriedade de
veículos automotores, no sentido definido pelo Código de Trânsito Brasileiro. São
contribuintes do imposto as pessoas em nome de quem o carro foi licenciado, ou seja, aqueles
que constam nos certificados de registro do veículo. As legislações de alguns Estados-membros
têm garantido o direito à isenção IPVA para o dono de veículo portador de deficiência, desde
que seja seu condutor e que o carro seja adaptado, exigindo, inclusive, que ao pleito seja
anexado comprovante onde conste a aptidão para conduzir carro com adaptações especiais.
Trata-se do caso da legislação do Estado de São Paulo. Assim, a benesse não é estendida
àqueles que não dirigem o próprio veículo por falta de aptidão e que, por isso, o carro de sua
propriedade não seja adaptado, necessitando da ajuda de terceiros para sua locomoção
veicular. Diante da necessidade de inclusão social do portador de deficiência, bem como dos
princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana, da igualdade e da isonomia
tributária há que se reconhecer o direito ao não pagamento do tributo aos que se encontram
na situação analisada. A lei que garante a isenção busca garantir acessibilidade à pessoa com
deficiência e, com muito mais razão, há de se reconhecer o direito daquelas que não tem
carteira de motorista e necessitam de terceiro para lhes transportar. A prevalecer os ditames
legais, estar-se-ia face a duas espécies de deficientes: aqueles com condições de dirigir e
aqueles que não as possuem, sendo que os primeiros teriam vantagens não usufruídas pelos
últimos, o que os excluiriam das políticas públicas de acessibilidade e locomoção, em flagrante
afronta aos princípios constitucionais expostos. Desta forma, o artigo terá por fim analisar as
legislações estaduais que nesta seara são violadoras das normas constitucionais, o que será
feito com base na doutrina e na jurisprudência do País.

323
Doutora, Mestre e Especialista em Direito pela PUC-SP e especialista em Gestão Universitária pelo Centro
Universitário Salesiano de São Paulo U. E. de Campinas. Professora nos cursos de graduação e pós-graduação
(especialização e mestrado) do Centro Universitário Salesiano de São Paulo U.E. de Lorena. Professora do
Damásio Educacional e da Faculdade de Direito Damásio de Jesus. Advogada milenasellmann@hotmail.com
Mestre em Desenvolvimento Humano, Formação, Políticas e Práticas Sociais e especialista em Direito
324

Empresarial, Direito Penal Econômico e Europeu e em Formação de Professores para a Educação Superior Jurídica.
Professor do Curso de Graduação em Direito do UNISAL/Lorena. Coordenador Adjunto do Programa de Pós-
graduação em Direito Público com ênfase em Gestão Pública da Universidade de Taubaté/SP. Procurador do
Município e Consultor Jurídico - psatavares@hotmail.com

559
Palavras-chave: IPVA. Portadores de deficiência. Dignidade da pessoa humana
Abstract:

Constitution, is a tax whose jurisdiction was attributed to the Members States and has as
taxable event the property of motor veihicles, whose sense is defined on Brazilian Traffic
Code. The taxpayers are the people whose name the vehicle was licensed, the people whose
names appear on the vehicle document. The laws of some Members States have guaranteed
the right of tax exemption for the proprietors with disabilities provided that the proprietors
are the drivers and the vehicle has to be adapted, requiring that the request be attached with
the

drive their own vehicle for lack of abilty and because of this the cars whose belong to this
people is not adapted, requiring help from others for their locomotion by motor vehicles.
Faced with the need to the social inclusion of people with disabilities, as well as the
constitutional principles of the dignity of the human being, the equality and tax equality, it
must be recognized the right of the same tax exemption to the people who are in this analysis.
The law whose guaranteed the tax exemption seek to ensure the accessibility to the disabled
person and with stronger reason it must be recognized the rigth of the people who do not have

facing two modes of disability: the people who have capacity to drive and the people who do
not have this ability, and the first group would have benefits not granted to the last group,
excluding them from the public policy of accessibility and locomotion, in flagrant affront to
the constitucional principles exposed. Thereby, the article will have the purpose to analyze the
states laws that violate the constitucional rules, what will be done based on doctrine and
jurisprudence of the country.
Keywords: IPVA. Persons with Disabilities. Human dignity
Sumário. Introdução. 1 O imposto sobre a propriedade de veículos automotores (IPVA). 2
Isenção tributária. 2.1 Isenção de IPVA para portadores de deficiência. 3 Princípio da dignidade
da pessoa humana. 4 O direito à isenção de IPVA aos proprietários portadores de deficiência
inaptos a dirigir face ao princípio da dignidade da pessoa humana. Conclusão. Referência.
INTRODUÇÃO:
A Constituição da República Federativa do Brasil atribui competência tributária aos Estados e
ao Distrito Federal, no artigo 155, inciso III, para instituição, regulamentação e cobrança do
Imposto sobre a propriedade de veículos autores IPVA.
O imposto tem como fato gerador o fato de alguém ser proprietário de veículo automotor e
incide a cada primeiro de janeiro ou quando se adquire um veículo zero. Tem como sujeito
passivo, ou seja, devedor, a pessoa em nome de que o veículo foi licenciado, bem como será
devido para o Estado do licenciamento.
560
Ao regular o IPVA, alguns Estados, estabelecem hipóteses de não pagamento do imposto,
situações que são caracterizadas como isenção, causa de exclusão do crédito tributário.
Há Estados que isentam do pagamento da exação os proprietários de veículos automotores
portadores de deficiência, todavia, estabelecem condições para o gozo da benesse. Fixam como
requisitos que os portadores de necessidades especiais sejam habilitados e ainda possuidores
de carros adaptados à deficiência. Não asseguram o não pagamento do imposto aos portadores
de maiores necessidades especiais que, em virtude da deficiência, não podem dirigir e,
portanto, não são habilitados, mas possuem condição de ser proprietário de um veículo, não
adaptado, para sua locomoção. É o caso da lei do Estado de São Paulo.
Todavia, diante da necessidade de inclusão social do portador de deficiência, bem como dos
princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana, da igualdade e da isonomia
tributária, há que se reconhecer o direito ao não pagamento do tributo aos que se encontram
na situação analisada. A lei que garante a isenção busca garantir acessibilidade à pessoa com
deficiência e, com muito mais razão, há de se reconhecer o direito daquelas que não tem
carteira de motorista e necessitam de terceiro para lhes transportar.
As leis estaduais são inconstitucionais e a isenção deve ser estendida aos portadores das
necessidades especiais ventiladas, é o que será demonstrado. Para tanto, por primeiro, será
analisado o imposto sobre a propriedade de veículos automotores (IPVA), após o conceito de
isenção tributária, sua concessão para portadores de deficiência, princípio da dignidade da
pessoa humana para, por fim, tratar do direito à isenção de IPVA aos proprietários portadores
de deficiência inaptos a dirigir face ao princípio da dignidade da pessoa humana.
1 O IMPOSTO SOBRE A PROPRIEDADE DE VEÍCULOS AUTOMOTORES (IPVA).
O imposto sobre a propriedade de veículos automotores (IPVA) foi introduzido na
Constituição brasileira de 1967, substituiu a antiga taxa rodoviária única.
Atualmente, está previsto no artigo 155, inciso III, da Constituição da República Federativa do
Brasil, a qual comina:
Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre: [...]
III - propriedade de veículos automotores.
[...]
§ 6º O imposto previsto no inciso III
I - terá alíquotas mínimas fixadas pelo Senado Federal;
II - poderá ter alíquotas diferenciadas em função do tipo e utilização.
Assim, a competência tributária para instituição do imposto é dos Estados e do Distrito
Federal, o qual deverá incidir sobre a propriedade de veículos automotores, cabendo ao

561
Senado Federal fixar suas alíquotas mínimas, sendo facultado aos entes federados estabelecer
alíquotas diferenciadas tendo em vista o tipo e a utilização do automóvel.
Não há regras relativas ao imposto no Código Tributário Nacional, uma vez que a Lei n.
5.172/66, lei instituidora do Codex, é anterior a introdução da exação no sistema tributário
nacional.
Desta forma, diante da inexistência de norma geral editada pela União relativa ao IPVA, os
Estados e o Distrito Federal, nos termos do que dispõe o artigo 24, §3º da Constituição Federal
terão competência legislativa ampla para regular o tributo.
O fato gerador do imposto é a propriedade de veículos automotores de qualquer espécie, assim
não há incidência quando alguém exerce apenas a posse ou detenção do veículo.
O conceito de veículo automotor deriva Anexo I ("Dos conceitos e definições") do Código de
Trânsito Brasileiro (Lei n. 9.503/97):
[...] todo veículo a motor de propulsão que circule por seus próprios meios, e que serve
normalmente para o transporte viário de pessoas e coisas, ou para a tração viária de veículos
utilizados para o transporte de pessoas ou coisas. O termo compreende os veículos conectados
a uma linha elétrica e que não circulam sobre trilhos (ônibus elétrico)."
Será devedora (sujeito passivo) do tributo aquela pessoa que consta no CRV (certificado de
veículo) como proprietária e o imposto será devido para o Estado (sujeito ativo) em que o
veículo for licenciado.
Por ficção legal, o momento da ocorrência do fato gerador dar-se-á em 01 de janeiro de cada
ano ou em data constante nas leis estaduais. Tratando-se de veículos novos será a data da
aquisição e se importado a data do desembaraço aduaneiro.
A alíquota será fixada em lei estadual, podendo, conforme acima demonstrado, ser diferente
tendo em vista o tipo ou a sua utilização. Trata-se de tributo lançado de ofício ou direto.
A autoridade administrativa constitui o crédito tributário do IPVA utilizando-se das
informações que constam no seu banco de dados relativos à propriedade de veículos
automotores licenciados no Estado.
Até o momento em que é notificado, o sujeito passivo não participa do procedimento de
lançamento, pois não elabora declarações nem antecipa quaisquer valores.
O imposto é, portanto, sujeito ao lançamento de ofício. (ALEXANDRE, 2017, p. 739)
A base de cálculo é o valor venal do veículo automotor, ou seja, o valor do automóvel no
mercado e, nos termos do que dispõe o artigo 150, §1º, da Constituição Federal, sua alteração
não se sujeita ao princípio da anterioridade nonagesimal, desta forma, a majoração da base de
cálculo do IPVA não requer a espera de noventa dias para cobrança.
2 ISENÇÃO TRIBUTÁRIA.

562
Isenção é a dispensa do pagamento de um tributo por lei do ente federado tributariamente
competente.
Ricardo Alexandre (2017, p. 572) conceitua isenção como sendo a dispensa legal do pagamento
do tributo. Assim, o ente político tem competência para instituir o tributo e, ao fazê-lo, opta
por dispensar o pagamento em determinadas situações.
Luciano Amaro ensina:
No plano da definição da incidência, temos repetido que a isenção é mera técnica legislativa
pela qual, de um universo de situações que a lei poderia tributar, algumas situações (ou certas
situações com alguma especificidade) são excepcionadas da regra de incidência, de modo que a
realização concreta dessas situações não importa em realização do fato gerador, mas sim de
fato isento (portanto, não tributável). (2015, p. 313)

O artigo 175 do Código Tributário Nacional estabelece que são causas de exclusão do crédito
tributário a isenção e a anistia.
Na verdade, quando diante de umas das referidas causas, ainda que ocorrido o fato gerador do
tributo e o consequentemente nascimento da obrigação tributária principal, não será possível
a realização do lançamento tributário, não surgindo o crédito dele decorrente.
A diferença fundamental entre a isenção e a anistia é que a primeira exclui o crédito tributário
relativo ao tributo, enquanto a segunda exclui o crédito tributário relativo a penalidade.
A isenção está regulada no Código Tributário Nacional dos artigos 176 a 179.
Impõe o artigo 150, § 6º da Constituição Federal, a necessidade de lei específica para a
concessão do benefício fiscal, regra que é repetida no artigo 97, inciso VI, do Código Tributário
Nacional ao exigir a presença de lei para o estabelecimento das causas de exclusão do crédito
tributário.
Leciona Hugo de Brito Machado:
A isenção é sempre concedida por lei. Está incluída na área da denominada reserva legal,
sendo a lei, em sentido estrito, o único instrumento hábil para sua instituição (CTN, art. 97,
VI). Ainda quando prevista em contrato, diz o CTN, a isenção é sempre decorrente de lei que
especifique as condições e requisitos exigidos para sua concessão, os tributos a que se aplica e,
sendo o caso, o prazo de duração (art. 176). (2010, p. 244).
A isenção se diferencia da imunidade tributária posto que, enquanto aquela é resultado de
previsão numa lei específica, esta deriva de norma posta na Constituição Federal que
estabelece uma incompetência tributária, já que os entes tributantes, ao instituírem tributos,
não poderão fazer com que os mesmos incidam nas situações que foram imunizadas.
A imunidade é uma regra de não incidência, ao passo que na isenção há incidência com
posterior dispensa do pagamento. Desta forma, ao contrário da imunidade, a isenção é sempre
563
concedida posteriormente ao exercício da competência tributária, diga-se, após a criação do
tributo e somente pode derivar de lei do ente titular do poder de criar o tributo que a concede,
a qual recebe o nome de isenção autônoma.
Em regra, não é possível a concessão de isenção por ente federado que não seja competente
tributariamente; trata-se da vedação de concessão de isenções heterônomas, cuja proibição
encontra respaldo no artigo 151, III, do Diploma Constitucional, e seu beneficiário estará
obrigado ao cumprimento das obrigações tributárias acessórias, consistentes em obrigações de
fazer ou não fazer, estabelecidas em prol da melhor arrecadação e fiscalização da exação.
Alguns Estados concedem isenção de IPVA para proprietário de veículos automotores
portadores de deficiência, todavia, estabelecem uma série de exigências que acabam por violar
garantias constitucionais asseguradas aos contribuintes.
2.1 ISENÇÃO DE IPVA PARA PORTADORES DE DEFICIÊNCIA.
O imposto sobre a propriedade de veículos automotores (IPVA) é da competência tributária
dos Estados e do Distrito Federal, desta forma, conforme restou demonstrado, eventual
isenção do tributo somente poderá ocorrer via lei da própria entidade federada.
Alguns Estados concedem por lei isenção de IPVA para portadores de deficiência, entretanto,
estabelecem requisitos a serem preenchidos que fulminam com garantias constitucionais que
tem por fim assegurar e proteger a dignidade da pessoa humana.
São exemplos de Estados cujas legislações são violadoras das garantias as leis reguladoras do
IPVA dos Estados de São Paulo, Goiás e Rio Grande do Sul. Como corte metodológico do
trabalho, será feita a análise, exclusiva, das normas do Estado de São Paulo.
No Estado de São Paulo, o IPVA foi instituído pela lei n. 13.296/98 (com alterações posteriores),
cujo artigo 13, III e seu § 1º estabelecem a isenção para portadores de deficiência:
É isenta do IPVA a propriedade: [...]
III - de um único veículo adequado para ser conduzido por pessoa com deficiência física; [...]
§ 1º - As isenções previstas neste artigo, quando não concedidas em caráter geral, serão
efetivadas, em cada caso, por despacho da autoridade administrativa, em requerimento com o
qual o interessado faça prova do preenchimento das condições e do cumprimento dos
requisitos para sua concessão. (grifo nosso)
Complementa a regulamentação, o Decreto n. 59.953/13, que normatiza a imunidade, isenção,
dispensa de pagamento, restituição e redução de alíquota do imposto sobre a propriedade de
veículos automotores, cujo artigo 4º dispõe:
A isenção do Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores - IPVA poderá ser
concedida, em cada caso, por despacho da autoridade administrativa em requerimento com o
qual o interessado comprove o preenchimento das condições e o cumprimento dos requisitos,
nas seguintes hipóteses: [...]
564
I - um único veículo adequado para ser conduzido por pessoa com deficiência física que seja
seu proprietário; [...] (grifo nosso)
CAT n. 27/2015 (revogou a Portaria CAT
n. 56/96), que disciplina o reconhecimento de imunidade, a concessão de isenção, a dispensa
de pagamento e a restituição relativamente ao imposto e estabeleceu os documentos que
deverão ser anexados ao requerimento de isenção pelo proprietário de veículo automotor
deficiente:
O pedido para concessão da isenção deverá ser instruído com os seguintes documentos: [...]
II - tratando-se de veículo adequado para ser conduzido por pessoa com deficiência física que
seja seu proprietário, arrendatário ou devedor fiduciante:
a) cópia da Carteira Nacional de Habilitação - CNH, constando a aptidão para dirigir veículos
com as adequações discriminadas no laudo;
b) cópia da Nota Fiscal ou DANFE referente às adequações de fábrica ou realizadas por
empresa especializada, constante no Anexo X da Portaria CAT-18, de de 21-02-2013, ou laudo
expedido por entidade de inspeção credenciada pelo INMETRO, atestando as adequações
efetuadas;
c) declaração de que não possui outro veículo com o benefício. [...] (grifo nosso)
Das normas expostas, conclui-se que para requerer isenção de IPVA referente a veículo
licenciado no Estado de São Paulo, o proprietário deficiente deverá comprovar que é dono de
um único veículo adaptado e que o conduz, já que deverá instruir o pleito com cópia da
Carteira Nacional de Habilitação (CNH), em que conste a aptidão para dirigir veículos e cópia
da Nota Fiscal ou DANFE referente às adequações de fábrica ou realizadas por empresa
especializada.
A isenção do IPVA só beneficia os deficientes físicos que tenham aptidão para dirigir e que
sejam proprietários de automóveis adaptados, não alcança os deficientes que sejam
proprietários de veículos automotores e que não possuem carteira de habilitação, nem carro
adaptados porque suas deficiências os impedem de dirigir.
A benesse não é estendida àqueles que não dirigem o próprio veículo por falta de aptidão e
que, por isso, necessitando da ajuda de terceiros para sua locomoção veicular.
A lei que garante a isenção de IPVA busca assegurar acessibilidade das pessoas com
deficiência, de forma que, com muito mais razão, há de se estender o direito àquelas que não
têm carteira de motorista e necessitam da ajuda de terceiro para lhes transportar conduzindo
o veículo de sua propriedade.
Diante da necessidade de inclusão social do portador de deficiência, bem como dos princípios
constitucionais da dignidade da pessoa humana, da igualdade e da isonomia tributária há que

565
se reconhecer o direito ao não pagamento do tributo aos que se encontram na situação
analisada.
São inconstitucionais as leis dos Estados que preveem a necessidade do preenchimento das
citadas condições para que o portador de deficiência venha a ser dispensado do pagamento do
imposto sobre a propriedade do seu veículo automotor.
3 PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA.
A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, conhecida como cidadã, preocupou-
se em albergar direitos e garantias fundamentais, a fim de garantir o mínimo de dignidade à
pessoa humana, à inviolabilidade de domicilio, à liberdade de associação (direitos individuais,
conhecidos como de primeira geração), bem como definir deveres do Estado para a
concretização do mínimo existencial para que o Brasil fosse um Estado social (direitos
fundamentais sociais, conhecidos como de segunda geração).
Isso se deve, principalmente, ao momento político no qual a Constituição foi promulgada, em
que o Brasil acabara de passar por Ditatura Militar, que infringia todas as liberdades
individuais e também sociais, marcada pela opressão, pela tortura e por punições arbitrárias,
políticas e, muitas vezes, não emanadas por um tribunal de direito.
Por isso, não diferente poderia ser a enorme preocupação do atual texto constitucional em
trazer à baila tais prerrogativas como cláusulas pétreas, direitos que não podem ser
restringidos dos cidadãos brasileiros, tanto que, além de listar os direitos e garantias
fundamentais de primeira, segunda e terceira geração (artigos 5° e seguintes da CRFB), o art. 1º
do texto constitucional traz como fundamento da República o respeito à dignidade da pessoa
humana.
Art. 1º, inciso III: [...]
A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e
do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:
[...]
III a dignidade da pessoa humana. [...]
Todos os direitos e garantias fundamentais tem como fonte a dignidade da pessoa humana.

(NUNES JÚNIOR, 2017, p. 499).


Define o dicionário Plácido e Silva:
[...] dignidade é a palavra derivada do latim dignitas (virtude, honra, consideração), em regra se
entende a qualidade moral, que, possuída por uma pessoa serve de base ao próprio respeito em
que é tida: compreende-se também como o próprio procedimento da pessoa pelo qual se faz
merecedor do conceito público; em sentido jurídico, também se estende como a dignidade a
distinção ou a honraria conferida a uma pessoa, consistente em cargo ou título de alta

566
graduação; no Direito Canônico, indica-se o benefício ou prerrogativa de um cargo
eclesiástico. (1967, p. 526)
Os direitos e garantias fundamentais nascem, para proteção da dignidade da pessoa humana,
os quais, atualmente, est o previstos na Constitui ̧ o Federal de 1988, no T tulo II, cujo
artigo 5º, caput, comina o princípio da igualdade ou isonomia.
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos
brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade,
à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguinte [...]
É corolário do princípio da dignidade da pessoa humana o princípio da igualdade, do qual
decorre o princípio da isonomia tributária.
A isonomia tributária, prevista como uma garantia assegurada aos contribuintes, está expressa
no art. 150, inciso II, da Carta Magna:
Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos
Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: [...]
II - instituir tratamento desigual entre contribuintes que se encontrem em situação
equivalente, proibida qualquer distinção em razão de ocupação profissional ou função por eles
exercida, independentemente da denominação jurídica dos rendimentos, títulos ou direitos;
[...]
A igualdade tributária impõe que todos os contribuintes que estejam numa mesma situação
tenham o mesmo tratamento tributário, ao passo que os contribuintes em situações diferentes
devem ter tratamento diferenciado, sob pena de inconstitucionalidade.
O tratamento isonômico é uma regra que deve ser observada pelo legislador ao exercer a
competência tributária, bem como pelo aplicador do direito ao fazer seu trabalho
hermenêutico.
A igualdade fiscal, de acordo com Victor Uckmar (1999, p. 67), pode ser entendida também em
dois sentidos:
a) em sentido jurídico, como paridade de posição, com exclusão de qualquer privilégio de
classe, religião e raça, de modo que os contribuintes que se encontrem em idênticas situações
sejam submetidos a idêntico regime fiscal;
b) em sentido econômico, como dever de contribuir aos encargos públicos em igual medida,
entendida em termos de sacrifício, isto é, [...] em relação à capacidade contributiva dos
indivíduos.
Segundo Eduardo Sabbag (2016, p. 140) o princípio da igualdade tributária:

567
que visa coibir a odiosidade tributária, manifestável em comandos normativos
discriminatórios, veiculadores de favoritismos por meio da tributação.
Para que exista uma efetiva proteção a dignidade da pessoa é preciso que a isonomia tributária
seja cumprida, ou seja, que a tributação estabeleça tratamento diferenciado entre
contribuintes que estejam na mesma situação.
A previsão das leis dos Estados que, ao concederem isenção de IPVA, exijam do contribuinte
deficiente o preenchimento de requisitos, de forma a deixar fora do espectro da norma as
pessoas portadoras de deficiência proprietárias de veículos automotores que não possam
dirigir e, por isso, não possuem carteira de habilitação, nem carro adaptado, viola os princípios
tratados no presente tópico e, por isso, são inconstitucionais.
4 O direito à isenção de IPVA aos proprietários portadores de deficiência inaptos a dirigir face
ao princípio da dignidade da pessoa humana.
A proteção da dignidade da pessoa humana, como direito fundamental, restou demonstrada no
item anterior. Todavia, é preciso acrescer que a Constituição Federal garante e socorre, de
forma especial, a dignidade da pessoa humana portadora de deficiência física.
Decorre do artigo 23, inciso II, da Carta Magna, ser da competência comum da União, dos
Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, cuidar da saúde e assistência pública, da
proteção e garantia das pessoas portadoras de deficiência.
Já o artigo 24, inciso XIV, atribui competência legislativa corrente à União, aos Estados e ao
Distrito Federal no que tange a proteção e integração social das pessoas portadoras de
deficiência. Impõe o artigo 203 que a assistência social será prestada a quem dela necessitar,
independentemente de contribuição à seguridade social, tendo como um dos seus objetivos,
nos termos do inciso IV, a habilitação e reabilitação das pessoas portadoras de deficiência e a
promoção de sua integração à vida comunitária.
Face aos ditames contidos nos dispositivos, foi publicada e entrou em vigor a Lei n. 13.146, de
julho de 2015, que instituiu o Estatuto da Pessoa com Deficiência, cujo artigo 1o estabelece:
É instituída a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Estatuto da Pessoa com
Deficiência), destinada a assegurar e a promover, em condições de igualdade, o exercício dos
direitos e das liberdades fundamentais por pessoa com deficiência, visando à sua inclusão
social e cidadania. (grifo nosso)
Previu a lei, ao tratar do direito fundamental à vida, no artigo 10, competir ao Poder Público
garantir a dignidade da pessoa com deficiência ao longo de toda a vida, bem como, no artigo
53, assegurou a acessibilidade como direito que garante à pessoa com deficiência ou com
mobilidade reduzida viver de forma independente e exercer seus direitos de cidadania e de
participação social.

568
Como se vê, a dignidade da pessoa humana, especialmente a portadora de deficiência, fora
protegida não só por dispositivos constitucionais, como também por legislação especial que
criou o Estatuto da Pessoa com Deficiência cujas regras primam pela sua inclusão social.
Desta feita, viola o princípio da dignidade da pessoa humana, bem como os princípios dele
decorrentes, como a igualdade e a isonomia tributária, as previsões estaduais que concedem
isenção de IPVA na aquisição de veículos automotores apenas àqueles portadores de
necessidades especiais que estejam aptos a dirigir, em detrimento daqueles com grau mais
elevado de deficiência e, por isso, inaptos a dirigir face a grande restrição de seus movimentos.
Os deficientes citados, além de não serem habilitados, não podem, face à circunstância
especial que possuem, adquirir veículo adaptado, necessitando sempre da ajuda de terceiros
como condutores. Ora, a dificuldade de locomoção destas pessoas é muito maior em relação
àqueles que conseguem dirigir seu próprio veículo.
Neste sentido, valiosas as palavras do Desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo,
Ferraz de Arruda, no voto prolatado na Apelação/Reexame Necessário no 1009987-
59.2015.8.26.0344, da Comarca de Marília:
Em sendo assim, o direito no qual se funda a a ̧ o deve ser interpretado em conformidade
com o princ pio da igualdade, bem como com o princ pio da dignidade da pessoa humana,
previstos na Constitui ̧ o Federal, no que concerne s normas que asseguram a
prote ̧ o especial as pessoas deficientes.
Nesse passo, n o se justifica a negativa de outorga da isen ̧ o do IPVA aos portadores de
necessidades especiais que dependam de terceiros para a sua locomo ̧ o e a concess o
queles portadores de defici ̂ncias que tenham condi ̧ es de conduzir, seja em ve culos
adaptados ou n o, pois esta n o a finalidade do instituto.
Ali s, com maior raz o a necessidade de transporte de deficientes como a impetrante, em
raz o do alto grau de depend ̂ncia que sua enfermidade lhe imp e. (grifo nosso) (p. 04)
As jurisprudências também são uníssonas quanto à extensão da isenção na hipótese tratada:
MANDADO DE SEGURANÇA - Pretensão voltada ao reconhecimento do direito de isenção do
IPVA na aquisição de veículo automotor - Impetrante menor de idade e portador de paralisia
cerebral - Cabimento. A ratio legis do benefício fiscal indica que indeferir requerimento
formulado com o fim de adquirir um ve culo para que outrem o dirija, m ngua de
condi ̧ es de adapt -lo, afronta ao fim colimado pelo legislador ao aprovar a norma
visando facilitar a locomo ̧ o de pessoa portadora de defici ̂ncia f sica STJ, precedentes -
Reexame necess rio e recurso volunt rio da FESP n o providos. (Apela ̧ o no 0034476-
33.2011.8.26.0405, Rel. Des. Paulo Dimas Mascaretti, j. 08.05.13).
REEXAME NECESS RIO - Mandado de Seguran ̧a IPVA. Isen ̧ o Ve culo comum
destinado ao transporte de pessoa portadora de defici ̂ncia f sica tetraparesia fl cida por

569
(CID 10 M48.0 e M51.3) Admissibilidade. Senten ̧a mantida REEXAME NECESS RIO
DESPROVIDO.
Interpretac o teleol gica e sistem tica das normas que isentam tributos em favor de
deficientes f sicos, amarrada ao princ pio constitucional maior da isonomia, justifica a
isenc o de IPVA na aquisic o de ve culo comum destinado ao transporte de portadora de
deficiencia f sica (CID 10 M48.0 e M51.3), nada obstante ela n o tenha habilitac o nem
condic es para ser condutora de ve culo automotor adaptado. (Reexame Necessário no
1004024-05.2016.8.26.0322, da Comarca de Lins, relator Vicente de Abreu Amadei, dj.
9.05.2017)
Outrossim, cumpre aduzir que o artigo 8º do Estatuto da Pessoa com Deficiência impõe ser
dever do Estado assegurar a pessoa com deficiência a efetivação dos direitos referentes ao
transporte, à acessibilidade, à dignidade e à liberdade.

É dever do Estado, da sociedade e da família assegurar à pessoa com deficiência, com


prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à sexualidade, à paternidade e à
maternidade, à alimentação, à habitação, à educação, à profissionalização, ao trabalho, à
previdência social, à habilitação e à reabilitação, ao transporte, à acessibilidade, à cultura, ao
desporto, ao turismo, ao lazer, à informação, à comunicação, aos avanços científicos e
tecnológicos, à dignidade, ao respeito, à liberdade, à convivência familiar e comunitária, entre
outros decorrentes da Constituição Federal, da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com
Deficiência e seu Protocolo Facultativo e das leis e de outras normas que garantam seu bem-
estar pessoal, social e econômico. (grifo nosso)
Ao interpretar a norma citada, o Desembargador do Tribunal de Justiça do Estado de São
Paulo, Antonio Tadeu Ottoni, em voto proferido autos de Reexame Necessário n. 1040817-
41.2014.8.26.0506, da Comarca de Ribeirão Preto, em 5 de abril de 2017, se posicionou pela
busca do real sentido da norma constant do Estatuto.
Ressalte-se que não se trata de dar interpretação extensiva dos dispositivos aplicáveis à
espécie, mas sim da verificação do real significado da lei, que visa à inclusão social dos
portadores de necessidades especiais, minorando as restrições patológicas, lembrando-se que
o impetrante já obteve, inclusive, isenção de I.C.M.S. (fls. 23).
Entendimento contrário (negativa da isenção) implicaria tratamento mais gravoso àquela
pessoa que possui maior deficiência física ou mental do que o concedido àquela pessoa cuja
deficiência, de menor escala, lhe permite ser condutor de veículo adaptado, o que ofenderia o
princípio da isonomia e da dignidade da pessoa humana, bem como das normas que asseguram
proteção especial às pessoas com deficiência (art. 23, II, e art. 203, IV, da Constituição Federal).

570
Assim, não se vislumbra qualquer contrariedade ao disposto no artigo 111, inciso II, do Código
Tributário Nacional, vez que inexiste diferença quanto à natureza e necessidade de proteção
especial entre os deficientes que podem dirigir o próprio veículo e aqueles que dependem de
terceiro para tanto. (p. 04)

O Superior Tribunal de Justiça também assim já se posicionou:


TRIBUTÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. ISENÇÃO
DE ICMS E IPVA. AQUISIÇÃO DE VEÍCULO POR PORTADORES DE DEFICIÊNCIA FÍSICA
OU MENTAL. POSSIBILIDADE. CONDUÇÃO DO VEÍCULO POR TERCEIRA PESSOA.
INDIFERENÇA. SÚMULA 280/STF. AGRAVO NÃO PROVIDO. 1. A verificação do
preenchimento dos requisitos para a concessão da isenção nas Leis Estaduais 8.115/85 e
8.820/89 e no Decreto Estadual 37.699/97 encontra óbice na Súmula 280/STF: "Por ofensa a
direito local não cabe recurso extraordinário". 2. 'A peculiaridade de que o veículo seja
conduzido por terceira pessoa, que não o portador de deficiência física, não constitui óbice
razoável ao gozo da isenção preconizada pela Lei n. 8.989/95, e, logicamente, não foi o intuito
da lei' (REsp 523.971/MG, Rel. Min. FRANCIULLI NETTO, Segunda Turma, DJ 28/3/05). 3.

ESTEVES LIMA, Primeira Turma, julgado em 19.04.2012 destaquei em negrito)


A não extensão da benesse fiscal aos portadores de deficiência de maior severidade, viola a
dignidade da pessoa humana e, de outra banda, o princípio da isonomia tributária veda a
concessão de tratamento diferenciado para contribuintes que se encontrem em situação
equivalente.
Há que ser reconhecido o direito à isenção de IPVA para todos os deficientes físicos
proprietários de veículos automotores e não apenas aos habilitados e donos de veículos
adaptados.
São inconstitucionais as legislações estaduais que estabelecem condições para gozo do
benefício fiscal, atentando frontalmente a dignidade da pessoa humana portadora de
necessidade especial. Eventual interpretação em sentido contrário vai de encontro ao axioma
constitucional (proteção integral da pessoa deficiente) que serve de base normativa de
validade para as normas jurídicas.
CONCLUSÃO
O imposto sobre a propriedade de veículos automotores (IPVA), previsto no artigo 155, inciso
III, da Constituição da República Federativa do Brasil, é um tributo cuja competência
tributária foi atribuída aos Estados-membros e tem como fato gerador a propriedade de
veículos automotores, no sentido definido pelo Código de Trânsito Brasileiro.
São contribuintes do imposto as pessoas em nome de quem o carro foi licenciado, ou seja,
aqueles que constam nos certificados de registro do veículo.
571
As legislações de alguns Estados-membros têm garantido o direito à isenção de IPVA para o
dono de veículo portador de deficiência, desde que seja seu condutor e que o carro seja
adaptado, exigindo, inclusive, que ao pleito seja anexado comprovante onde conste a aptidão
para conduzir carro com adaptações especiais. Trata-se do caso da legislação do Estado de São
Paulo.
Assim, conforme restou demonstrado no trabalho, a isenção do IPVA não alcança os
deficientes que sejam proprietários de veículos automotores e que não possuem carteira de
habilitação, nem carro adaptados porque suas deficiências os impede de dirigir.
A benesse não é estendida àqueles que não dirigem o próprio veículo por falta de aptidão e
que, por isso, necessitando da ajuda de terceiros para sua locomoção veicular.
A lei que garante a isenção de IPVA busca assegurar acessibilidade das pessoas com
deficiência, de forma que, com muito mais razão, há de se estender o direito àquelas que não
têm carteira de motorista e necessitam da ajuda de terceiro para lhes transportar conduzindo
o veículo de sua propriedade.
Diante da necessidade de inclusão social do portador de deficiência, bem como dos princípios
constitucionais da dignidade da pessoa humana, da igualdade e da isonomia tributária há que
se reconhecer o direito ao não pagamento do tributo aos que se encontram na situação
analisada.
São inconstitucionais as leis dos Estados que preveem a necessidade do preenchimento das
citadas condições para que o portador de deficiência venha a ser dispensado do pagamento do
imposto sobre a propriedade do seu veículo automotor.
Atentos as estas violações, conforme julgados citados no trabalho, os tribunais superiores
brasileiros, estão, de forma reiterada, reconhecendo o direito à isenção do IPVA para os
portadores de necessidades especiais que não possam dirigir, mas que são proprietários de
veículos automotores, garantindo assim o objetivo de todas as normas citadas que é proteção
integral da pessoa deficiente.
Referência
ALEXANDRE, R. (2017). Direito tributário esquematizado. 11 ed. Salvador: JusPodivm.
AMARO, L. (2015). Direito tributário brasileiro. 20 ed. São Paulo: Saraiva.
MACHADO, H. B. (2010). Curso de direito tributário. 31 ed. São Paulo: Malheiros.
NUNES JUNIOR, F. M. A. (2017) Curso de direito constitucional. 1 ed. São Paulo: Revista dos
tribunais.
SILVA, P. e. (1967). Vocabulário Jurídico. Vol. II; São Paulo: Forense.
SABBAG, Eduardo (2016). Manual de direito tributário. 8. ed. São Paulo: Saraiva.

572
UCKMAR, V. (1999). Princípios comuns de direito constitucional tributário. Tradução e notas
de Marco Aurélio Greco. 2.ed. rev. e atual.. São Paulo: Malheiros.

573
LA PRESENCIA DEL DISCURSO RELIGIOSO EN LOS ESPACIOS PÚBLICOS Y EN EL
ESTADO, ENTRE LO SECULAR Y LO NEUTRO DE HABERMAS Y TAYLOR
325

326

Resumen
El presente ensayo tiene por objetivo esclarecer la cuestión de la presencia del discurso
religioso en la esfera pública política y en el Estado, teniendo como referencia lo secular de
Jürgen Habermas y lo neutro de Charles Taylor. Con base en el método bibliográfico se
desarrolla una investigación filosófica que incluye el estudio hermenéutico de los textos de los
autores citados. Inicialmente se aborda el sentido del Estado liberal, sus principios, programa
de acción y su posición secular que equilibra la protección de las identidades y la afirmación
de las libertades de los ciudadanos segundo Taylor. A seguir se expone la comprensión de los
principios del Estado de Direito de Habermas y sus fundamentos para una comparación. Se
destaca, así, el ejemplo de Cuba donde el patriotismo, como valor primario, se constituye en la
base de un discurso político civil que, como consecuencia, niega los valores religiosos,
minimizando las libertades de sus ciudadanos.

religión a la esfera de lo privado. Con respecto al pluralismo, se afirma la importancia del


discurso religioso, en la retomada de principios y valores constitutivos del Estado. Se numeran
las condiciones para el uso del lenguaje religioso en la esfera pública. Igualmente, se
establecen las diferencias entre el discurso religioso y filosófico destacadas en la obra de
Habermas y se reafirma la necesidad de la traducción del discurso religioso para alcanzar el
Se contraria el
argumento de Taylor acerca de la diferenciación entre el discurso religioso y el filosófico,
mostrando la posición de San Tomás de Aquino y la necesidad de la traducción del lenguaje
religioso para un lenguaje accesible a todos. Se concluye que la presencia del discurso religioso
es importante en la esfera pública, para garantizar las libertades fundamentales.
Palabras-clave: Discurso religioso; Esfera pública; Libertades fundamentales; Estado
democrático; Secularismo y neutralidad.
Resumo

325
Doutor em Filosofia pela Universidade Gama Filho (Rio de Janeiro). Professor e Pesquisador no Programa de
Mestrado em Direito do Centro UNISAL U.E. de Lorena (SP), Professor da FADE, Taubaté. E-mail:
enimine@gmail.com.
326
Doutor em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade do Oriente, Cuba. Professor e pesquisador do
Programa de Mestrado em Direito do Centro Universitário Salesiano de Sión Paulo- UNISAL. Professor e
pesquisador do Centro Universitário de Volta Redonda UniFOA. Professor e pesquisador do Centro Universitário
de Barra Mansa UBM. E-mail: metodologo2001@yahoo.com.br.

574
O presente ensaio tem por objetivo esclarecer a questão da presencia do discurso religioso na
esfera pública política e no Estado, situando-se entre o secular de Jürgen Habermas e o neutro
de Charles Taylor. A partir do método bibliográfico desenvolve-se uma investigação filosófica
visando o estudo hermenêutico dos textos dos autores supracitados. Inicialmente aborda-se o
sentido do Estado liberal, seus princípios, programa de ação e sua posição secular que
equilibra a proteção das identidades e a afirmação das liberdades dos cidadãos segundo Taylor.
A seguir expõe-se a compreensão dos princípios do Estado de Direito de Habermas e seus
fundamentos para comparação. Apresenta-se, igualmente, o exemplo de Cuba onde o
patriotismo, como valor primário, constitui a base de um discurso político civil que, como
consequência, nega os valores religiosos, desrespeitando as liberdades de seus cidadãos. Num
segundo momento expõe-
civilidade e um liberalismo que confina a religião à esfera do privado. Com o respeito ao
pluralismo, afirma a importância do discurso religioso, na retomada de princípios e valores
fundantes do Estado. Nomeiam-se as condições para o uso da linguagem religiosa na esfera
pública. Num terceiro momento se estabelecem as diferencias entre o discurso religioso e
filosófico em Habermas e se reafirma a necessidade da tradução do discurso religioso para
Repele o
argumento de Taylor sobre a diferenciação entre o discurso religioso e filosófico, mostrando a
prática de São Tomás de Aquino e a necessidade da tradução da linguagem religiosa para uma
linguagem acessível a todos. Conclui-se que a presencia do discurso religioso na esfera pública
é importante para garantir as liberdades fundamentais.
Palavras-chave: Discurso religioso; Esfera pública; Liberdades fundamentais; Estado
democrático; Secularismo e neutralidade.
INTRODUCCIÓN
El presente ensayo tiene por objetivo estudiar la repercusión del discurso religioso en la esfera
pública política y en el Estado, tomando como referencia las obras que caracterizan el
paradigma implícito entre lo secular de Jürgen Habermas y lo neutro de Charles Taylor. Con
base en una lectura bibliográfica específica se abordan las citadas obras teniendo como auxilio
la metodología de investigación filosófica desarrollada con un enfoque hermenéutico,
indicando el sentido de dos importantes textos, procurando así, indagar y, consecuentemente,
responder las siguientes cuestiones/problemas:
1) ¿Cómo Taylor presenta del Estado liberal, su programa de trabajo y la neutralidad que busca
el equilibrio entre los principios de la protección de las libertades y las identidades, la igualdad
y la participación en la complejidad actual de la sociedad?
2) ¿Cómo Habermas concibe el Estado democrático de derecho, el sistema de derechos y su
relación con el poder comunicativo y político?

democracia liberal?

575
4) ¿Por qué la diferencia del discurso religioso y filosófico debe ser mantenido?
El presente artículo, finalmente, permite comparar las posiciones de los autores y posibilitar
derivar conclusiones acerca de la necesidad de mantener la idea de la neutralidad de Taylor y
de comprender la distinción entre el discurso religioso y filosófico de Habermas.
5) A partir de la relación entre valores, política y sociedad se coloca en destaque la experiencia
de Cuba que, como país socialista minimizó durante varias décadas la religión para realzar los
valores revolucionarios y, fundamentalmente, el patriotismo.
1 LA CUESTIÓN DEL ESTADO Y LA NEUTRALIDAD EN EL PENSAMIENTO DE TAYLOR
Taylor propone un entendimiento de Estado relacionado con la comprensión liberal, que
marca la independencia de los Estados Unidos de América. Él se dirige, entonces a sus
principios, programa de acción y su posición que equilibra la protección de las identidades y la
afirmación de las libertades de los ciudadanos. En este contexto se ubica su comprensión de la
laicidad. En sus palabras Taylor (2011) afirma:
El secularismo implica una exigencia compleja. Con él se busca más de un bien. Podemos
destacar tres, que se corresponden con las tres categorías de la trinidad de la Revolución
francesa: libertad, igualdad, fraternidad. 1) Nadie debe ser coaccionado en materia de religión

Estados Unidos. 2) Debe existir igualdad entre personas con diferentes credos o creencias

participar en el proceso siempre en marcha por el que la sociedad determina qué metas se
prop p. 39-40)
En referencia a la trinidad de la Revolución Francesa, es evidente la profundidad del tema.
Están en juego las convicciones fundamentales de los miembros de una sociedad plural de
personas libres e iguales. Estos son los fundamentos que determinan la sociedad en cuestión y
de sus objetivos y metas. Hay que buscar un equilibrio entre estos diferentes bienes. Pero, el
problema es que no hay un cuerpo de principios eternos que pueda ser derivado únicamente
de la razón. Hay diferentes situaciones que requieren variadas formas de aplicar esos

en su derecho a
comportarse según la postura que elijan o que se encuentren; 2) tratar con igualdad a las
personas, cualquiera que sea su opción; 3) ofrecer a todos, la posibilidad de ser escuchados. No
hay razón para considerar la religión un caso especial, frente a los puntos de vista no

estadounidense por medio de los cuales nos propone un enfoque claro para enfrentar el
problema de equilibrar la identidad personal, la igualdad, y la posibilidad de ser escuchado.
En su discurso el citado autor señaló que la primera enmienda de la Constitución de Estados
Unidos busca excluir la confrontación entre las sectas cristianas y sólo a finales del siglo XIX
576
empieza a abrirse a otras religiones y filosofías no religiosas, fue entonces que la palabra laico
entró en escena en la América del Norte (2011, p. 44-45). Es evidente que el desarrollo de la
complejidad de la sociedad rodea el tema de la laicidad. En su interpr
todos los casos, el legislador y administración intentaban equilibrar dos metas. Una era
mantener la neutralidad de las instituciones públicas, considerada (con razón) una exigencia
esencial de la meta (2): la igualdad entre todas las creencias básicas. La otra era la meta (1)
asegurar el mayor grado posible de libertad religiosa o, en su formulación más general, de
46)
Así, está clara la cuestión clave es la neutralidad de las instituciones públicas, pero no hay sólo
un principio en jugo. Para que el pueblo sea soberano necesita formar una voluntad común,
tener una personalidad y necesita alto grado de compromiso colectivo y una identidad. Está en
juego la propia identidad del Estado democrático moderno.
Los ciudadanos tienen que hacer por sí mismos, por así decir, lo que en otro caso los
legisladores hacen por ellos. Pero esto solo es posible si los ciudadanos sienten una fuerte
identificación con su comunidad política y, por tanto, con quienes la comparten con ellos.
(Taylor, 2011 p. 49)
Es en este contexto que tiene que ser pensado el problema de equilibrar las libertades

estatus casi sagrado, pues alterarlos o debilitarlos puede parecer una amenaza al fundamento
-50)
Esto explica la profundidad de la materia. Taylor (2011) cree que:
Con el rechazo de las raíces cósmico-religiosas el punto central está vacío. Las sociedades

normalmente en las sociedades contemporáneas de la siguiente forma: 1) derechos humanos,


2) igualdad y no discriminación, y 3) democracia. ( p. 51)
Como puede verse las sociedades democráticas se organizan en torno a una filosofía de la
civilidad. Pero, en algunos casos puede existir una religión civil: una perspectiva religiosa que
incorpora y justifica la filosofía de la civilidad, al igual que en América del Norte. O bien puede
ser parte de una ideología no religiosa o antirreligiosa, como en el caso de la I República
francesa. (Taylor, 2011, p. 51)

suposición de igual valor: una posición que hemos dicho, cuando llevamos a cabo el estudio de

democracia realmente pluralista no puede volver a una religión, ni anti-religión civil, por
consolador que pudiera ser, sin traicionar sus principios. Estamos condenados a vivir en un
Taylor, 2011, p. 52)

577
primer plano las metas básicas. El secularismo responde al primer grado de diversidad, en el
segundo grado de diversidad es necesario equilibrar la libertad de consciencia y la igualdad de

Se observa que para el autor el secularismo se considera una respuesta adecuada al siglo XIX,
pero para el siglo XXI, de mayor grado de complejidad, es necesario retomar el objetivo de
equilibrar la libertad de conciencia y la igualdad de trato. Taylor (2010) escribió una extensa

los tres últimos capítulos se ocupa de los dilemas, los límites inquietos de la modernidad y las
conversiones (p. 902).

puede ser ni cristiano, ni musulmán, ni judío. Pero por la misma razón, tampoco debe ser
marxista, ni k

definido como el lenguaje oficial del Estado: el lenguaje en que se deben redactarse las leyes,
los decretos ad
pensó la neutralidad en la deliberación de los ciudadanos, y también de Habermas que pensó la
neutralidad en la deliberación parlamentaria.
2 LA CUESTIÓN DEL ESTADO EN EL PENSAMIENTO DE JÜRGEN HABERMAS

v2. p. 598ss), donde presenta la tendencia a la judicialización en el contexto de los modelos


claros de las relaciones de intercambio entre el sistema y el mundo de la vida. Pero es en su

título y subtítulo invertido en la traducción al portugués, que se ocupa de los principios del
Estado democrático y, por tanto, los principios del Estado liberal.
Después de exponer la tensión dialéctica entre facticidad y validez en el primer capítulo, y los
conceptos de la sociología del derecho, por una parte, y la filosofía del derecho en la otra,
Habermas articula desde la función social integradora del derecho en el segundo capítulo.
Luego pasa a abordar en el tercer capítulo el sistema de los derechos en su reconstrucción.
Afirma en otro texto: el paradigma procedimental del derecho discutido en la facticidad y
validez, dirige la atención a autoautorización de ciudadanos del estado que influyen
colectivamente sus condiciones sociales de existencia (2014, p. 102-103). De nuevo a la
ste nexo interno
del derecho con el poder político se refleja en las consecuencias objetivas y jurídicas de

realiza sobre los derechos fundamentales, que si bien los derechos positivos, se cubren de

578
Habermas (2010) reconoce que el Estado sólo puede convertirse en una figura institucional a
partir de la organización de las funciones de gobierno (p.171). Por eso: El Estado es necesario
debido a su poder de organización y aplicación de sanción y a la necesidad de una jurisdicción
organizada, representativa de una fuerza que protege la estabilidad y la identidad. (p.171). Son
los derechos humanos y la democracia los que legitiman las órdenes políticas modernas.
En tiempos modernos, la contribución del poder político a la función de la ley, la estabilización
de las expectativas de comportamiento, pasa a ser un motor para el desarrollo de una
seguridad jurídica (Habermas, 2010, p.182). Habermas (2010) hace hincapié en la necesidad del

ley, no es compatible con una acción comunicativa normalizadora, la fuente de la justicia, en la


cual el derecho basa su legitimidad, secará (p.186). La negación de esta tesis se constituye en
una amenaza creciente en la economía globalizada de hoy.
Habermas (2011) afirma por eso:
En los Estados democráticos del bienestar de la segunda mitad del siglo XX, la política tenía
todavía la capacidad de dirigir los subsistemas divergentes; aún podía contrarrestar las

globalizado, las posibilidades de la política de proteger la integración social se están


reduciendo peligrosamente. (p. 23)
Su evaluación es bastante grave para la legitimidad del Estado: La integración sistémica
responde a imperativos funcionales y abandona la integración social como un mecanismo
demasiado torpe y pesado (2011, p. 23). A pesar de las dificultades Habermas escribe:
El ejercicio de la autonomía política significa la formación discursiva de la voluntad común,
pero todavía no incluye la aplicación de las leyes que resultan de esta voluntad. El concepto de
poder político también se extiende al uso del poder administrativo y la competencia por el
acceso al sistema político. [...]. Por lo tanto, sugiero que se tenga en cuenta la ley como el
medio a través del cual el poder de comunicación se convierte en el poder administrativo.
(p.190, nuestra traducción)
Esta conversión define las diversas formas de racionamientos. Los problemas pragmáticos se
basan en el discurso racional, implican fines de evaluación racionales a la luz de los valores
aceptados. Las cuestiones éticas y políticas están vinculadas a los ideales que guían sus
proyectos de vida comunes y decisiones. Las cuestiones axiológicas son el resultado de la auto-
comprensión cultural y política dado por una hermenéutica que se apropia críticamente de las
tradiciones (Habermas, 2010, p.200-201). Un acuerdo motivado racionalmente se basa en
argumentos que convencen de la misma manera a todas las partes, una solución puede ser
aceptada por las diferentes partes por diferentes razones. Por lo tanto, es necesario asumir la
posibilidad de combinar todos los programas obtenidos discursivamente y que pueden
justificarse moralmente.

579
La ley es el poder político y viceversa, por lo que puede ser utilizada de manera estratégica. El
derecho es el medio para transformar el poder comunicativo de la administración (Habermas,
2010, p. 211-212). La comunicación entre ciudadanos y legisladores es necesaria. El principio de
legalidad de la administración aclara la dirección de la división del poder y afirma el principio
de interdicción de la arbitrariedad en el estado. La sociedad civil necesita contrarrestar la
desigual distribución de las posiciones sociales de poder social. Ella tanto puede permitir
cuanto restringir la formación de la fuerza comunicativa e influir en el proceso político. Según
Habermas (2010) el estado debe servir en última instancia, a la auto-organización política
autónoma de una comunidad (p. 217-221). Así se entiende la cuestión de la legitimidad del
orden político moderno en el sistema de equilibrio de derechos. Que debe lograrse a través de
un complejo proceso de deliberación inclusiva y en equilibrio con la acción comunicativa y los
sistemas funcionales. Sólo entonces se puede colocarse adecuadamente el problema del
discurso religioso y el estado secular a Habermas.

DEMOCRACIA LIBERAL

expresión del liberalismo que confina la religión a la esfera privada. En respeto al pluralismo,
se afirma la importancia del discurso religioso, en la retomada de principios y valores del
Estado. Se establecen, así, las condiciones para el uso del lenguaje religioso en la esfera
pública.

y el poder judicial monárquico deben pues su aura sagrada a las narraciones mitológicas que

simbólica donde se fusionan política y religión y que puede ser descrita utilizando con
-26). El citado autor entiende que estas
concepciones fueron elaboradas a partir del pensamiento discursivo de la Era axial, con las
cosmovisiones metafísicas y religiosas.
Una vez producida esta transformación, el soberano político no puede seguir siendo percibido
como la manifestación de lo divino, sino únicamente siendo percibido como su representante
humano. Desde entonces, él, como persona humana, se encuentra también subordinado al
nomos que es el patrón para medir toda acción humana. Como las cosmovisiones de la Era
Axial hacen posible tanto la legitimación como la crítica de la autoridad política, en los

religiosos y políticos. Aunque la creencia en la legitimidad, apoyada por la religión, puede muy
bien ser manipulada, no se encuentra nunca a completa disposición del soberano. (Habermas,
p. 2011, p. 26).
Es importante tener en cuenta que esta configuración soberana también está sujeta a la ley y,
muchas veces ent
580
régimen absolutista de tipo hobbesiano. Según Habermas (2011): conforme la descripción que
Carl Schitt hizo del primitivo Estado, la autoridad política seguía derivando su legitimidad de
la creencia en la autoridad de un Dios todopoderoso (p. 27). Habermas (2011), por no estar de

económicos de un sistema de intercambio económico regulado por el mercado y que, por


tanto, opera con independencia de las estructuras políticas y, por otra, a la necesidad de
-
o simbólico de autorrepresentacíon de una
sociedad que conscientemente influye en los mecanismos de integración social, entonces la
expansión del mercado en el interior de los Estados territoriales implica de hecho un cierto

revoluciones liberales de finales del siglo XVIII ratificaron la secularización de la autoridad

DEMOCRACIA LIBERAL
Habermas (2011) intenta preservar una fundamentación religiosa pública de la democracia e
del Estado de Derecho con connotaciones muy discretas. Consciente del origen religioso de la
dignidad humana elabora la cuestan: ¿Cómo se puede mantener vivo el respecto por la
inviolabilidad de la dignidad humana y, de un modo más general, la conciencia pública sobre la
importancia de las cuestiones normativas frente a las crecientes y apabullantes presiones
sistémicas sobre la integración social de nuestras comunidades políticas? (p.32).
El citado autor afirma que la legitimidad democrática es posible y recusa una fundamentación
religiosa de manera vinculante para todos. Pero plantea que la constitución liberal no debe
ignorar las contribuciones que los grupos religiosos (Haabermas, 2011, p.33). De este modo
ública ayuda a la interpretación

políticas (p.34). Es la afirmación de las libertades comunicativas que también implican la


presencia de discursos religiosos.
El único elemento que transciende la política administrativa y al poder político
institucionalizado surge del uso desordenado de las libertades comunicativas que mantienen
viva la marea de los flujos de comunicación pública desde abajo. Solo a través de estos canales
las comunidades religiosas activas y no fundamentalistas pueden llegar a convertirse en
fuerzas transformadoras en el centro de una sociedad civil democrática, especialmente cuando
las fricciones entre mensajes religiosos y seculares dan lugar a controversias que estimulan las
cuestiones normativas y despiertan la consciencia de su relevancia. (Haabermas,2011, p.34).

581
Sin embargo, el discurso religioso en la esfera pública no puede ser fundamentalista para que
en el choque con los discursos no religiosos pueda dar lugar a nuevas interpretaciones
normativas. Al respecto Rawls afirma:
Según esta propuesta, todos los ciudadanos deben tener libertad para decidir si utilizan el
lenguaje religioso en la esfera pública. Sin embargo, si lo utilizan tienen que aceptar que el
potencial contenido de la verdad de las afirmaciones religiosas se debe traducir a un lenguaje
universalmente accesible, antes de que puedan entrar en el orden del día de los parlamentos,

garantizar que toda decisión ejecutiva pública y legalmente sancionada pueda ser formulada y
justificada en un lenguaje universalmente accesible sin tener que restringir la diversidad

Habermas (2011) entonces aborda el tema de la necesidad de traducción y las nuevas

asimétrica. Los ciudadanos creyentes que se consideran también miembros leales de una
democracia constitucional deben aceptar el requisito de traducción como el precio a pagar por

Por último, explica el significado que para el ciudadano religioso tiene la conciencia reflexiva.
el uso público de la razón requiere una conciencia reflexiva que: 1) se
relaciona de forma razonable con las otras religiones; 2) deja las decisiones dependientes del
saber mundano a las ciencias institucionalizadas; y 3) hace compatibles con sus propias reglas

36)
Habermas (2011) sabe que su idea de que las grandes religiones son portadores de contenidos
de la verdad y de intuiciones morales, no es evidente para la población no creyente por lo que
es útil tener en cuenta las fuentes religiosas de la moral. El mundo occidental ha sido
configurado por la continua apropiación que ha hecho la filosofía de los contenidos semánticos
de la tradición judeocristiana, y es una cuestión abierta si este proceso de aprendizaje que ha

por completo
la razón, por parte de los ciudadanos creyentes como de los no lo son, puede espolear la
política deliberativa en una sociedad civil pluralista y conducir a la recuperación de los

con su idea de justicia


emancipadora en sentido bíblico. Los ideales normativos modernos tienen esto como
sustancia normativa de los principios constitucionales en circunstancias históricas cambiantes

582
(p. 38). Tiene entonces la posibilidad de un desarrollo más reflexivo del proceso de
intercambio entre los discursos religiosos y filosóficos que subyacen a las normas del estado de
derecho democrático.
4 LA DIFERENCIA ENTRE LA RAZÓN EN LA TRADICIÓN RELIGIOSA Y LA RAZÓN
SECULAR
En esta sección se pretende mostrar las diferencias entre el discurso religioso y filosófico,
como punto divergente constatado en las teorías de Habermas y Taylor. Este problema el
autor alemán mantiene una posición similar a la posición de Santo Tomás de Aquino, que
orienta el diálogo entre la Iglesia Católica Apostólica Romana y el Estado secular en la
actualidad que, según escribe Otto Bird (2005), sustenta la siguiente versión al argumento de
Santo Tomás:
Por lo que nos dice, si estamos discutiendo con los judíos, debemos usar la autoridad del
Antiguo Testamento; con los maniqueos, hablamos sólo de la autoridad del Nuevo Testamento
porque rechazan el viejo; con los cismáticos griegos, podemos utilizar el Antiguo y el Nuevo
Testamento y también la autoridad de sus padres, pero no de los Padres latinos, que no
aceptan, pero si estamos discutiendo con los que no acepta ninguna autoridad, entonces
tenemos que confiar sólo en la razón natural, en un esfuerzo para convencerlos. (p. 20)
Está claro que Santo Thomas, que vivió en el siglo XIII, mucho antes de la Ilustración, ya
reconoció la función cognitiva específica del lenguaje filosófico. De acuerdo con Habermas

seculares pertenecen a un contexto de supuestos; en este caso, a un enfoque filosófico, que se


distingue de cualquier tipo de tradición religiosa porque no exige pertenecer a una comunidad
de creyen
La pertenencia a una comunidad religiosa implica diferencias que van más allá de la dimensión

religiosas no depende solo de creencias cognitivas y de sus vínculos semánticos con otras
creencias, sino de creencias existenciales arraigadas en la dimensión social de pertenencia,

as religiosas pertenecen a un
género de discurso en el que no solo te mueves dentro de una determinada visión del mundo o
dentro de una interpretación cognitiva de un ámbito de la vida, sino que expresas, como dije
antes, una experiencia ligada a una comun -64). Esto significa que
la razón religiosa tiene características que sólo pueden ser percibidas por su experiencia
existencial y la comunidad, y los rituales pertinentes, que no están a disposición de los
ciudadanos no religios
imagen de Dios, en nuestra tradición, es fácilmente traducible a enunciados seculares que
otros deducen del concepto kantiano de autonomía o de cierta interpretación del hecho de

583
estar dot

Por lo tanto, está claro cómo el pensamiento de Habermas (2011), por el mantenimiento de la
diferencia entre el discurso filosófico y religioso, tiene como objetivo recuperar un sentido

en la esfera pública, porque estoy convencido de que en el público secular puede muy bien
hacer intuiciones morales sepultadas que un discurso religioso conmovedor puede hacer

pueda no estar al alcance de todos. Las razones tienen que ser dadas a través de un lenguaje

constitucionales, los ciudadanos de una sociedad pluralista no podrían ir a los tribunales ni


apelar a derechos específicos ni argumentar refiriéndose a cláusulas constitucionales con
esperanza de conseguir una decisión justa (p. 65). Luego sustenta:
Una vez que la legitimación religiosa de los reyes cristianos ha sido sustituida por una
legitimación liberal, la constitución ofrece ahora la fuente de razones que se supone que
comparten no solo las diferentes comunidades religiosas, sino también creyentes y no
creyentes. La constitución puede proporcionar esta plataforma común sólo si a su vez se puede

65).

de la comunidad particular de cada uno, mas impulsan una perspectiva común para que
diferentes comunidades puedan desarrollar un punto de vista más inclusivo, transcendiendo

5 RELIGIOSIDAD VERSUS PATRIOTISMO COMO VALOR PRIMARIO: EL CASO DE CUBA


La presente sección tiene como objetivo explicar, a partir del caso concreto de Cuba, la
relación, la implicación y la relevancia del discurso político y religioso en la esfera pública.
Cuba siempre fue una Isla eminentemente religiosa. La verdad es que la religiosidad cubana,
hasta el 27 de octubre de 1492 (fecha de su descubrimiento por Cristóbal Colón), tuvo sus bases
en las creencias indígenas.
Se sabe que la llegada de los colonizadores españoles posibilitó la imposición da cultura
Ibérica: lengua, economía, política y religión. Así, la religión católica se institucionalizó en lo
que sería, posteriormente, la América-Latina y se fortaleció con la llegada de misionarios
católicos de la orden dominicana en 1512.
La llegada de los colonizadores españoles originó la imposición del catolicismo como principal
religión (religión predominante), a pretexto de un proceso de evangelización del nuevo
mundo. Al final del período colonial español (1883-1898) ya se sabía del movimiento evangélico
formado por iglesias constituidas por misionarios cubanos.

584
Sin dudas, el nacimiento y la consolidación del nacionalismo cubano, representado y
defendido por criollos (descendentes de europeos, asiáticos, indígenas y africanos) nascidos en
Cuba, hicieron subsistir un catolicismo concomitante con el protestantismo y con otras
manifestaciones religiosas, a saber, o espiritismo (Ramos), a santería, a mazonería, testigos de
Jehová etc. Entre 1940 - 1950 otras denominaciones religiosas resurgirían como resultados de
los viajes de diversos misionarios a la Isla y debido a la influencia de las escuelas y de los
cursos introducidos por el movimiento protestante radicado en el exterior, especialmente en
los Estados Unidos de América.
Es posible afirmar que en aquel período más de un 90% de la población cubana fundamentaría
sus creencias en la existencia de Dios. Subsistían diferentes manifestaciones religiosas que
estarían interconectadas o en conflicto con el catolicismo o con el protestantismo. La
presencia de las Iglesias Católica y Protestante era y siempre fue predominante y decisiva en la
religiosidad cubana.
Para entender la naturaleza del discurso antirreligioso propuesto por los protagonistas de la
Revolución Cubana nos auxiliamos de las concepciones de sus idealizadores, así, por ejemplo
Ernesto Che Guevara (1980a):
Cuando más rápido empuñar las armas, cuando más rápido esgrimir los machetes sobre las
cabezas de los latifundistas, de los industriales, de los banqueros, de los exploradores de todo
tipo y de sus cabezas visibles, el ejército opresor, tanto mejor. El enemigo luchará para
mantenerse en el poder, es necesario pensar en la destrucción del ejército opresor y para
destruirlo es necesario oponerle un ejército popular. La eventual destrucción de los grupos
urbanos llevará a la muerte y alma de la revolución, su comando que, de su fortaleza rural
continuará catalizando el espíritu revolucionario de las masas y organizando nuevas fuerzas
para otras batallas. (p.79-94).
Como leemos en Guerra de Guerrillas: un método, la revolución cubana fue un proceso
violento, determinado por la voluntad de muerte o victoria y que tiene como método la lucha
armada, las acciones violentas contra los gobiernos y los propietarios de

(Guevara, 1980b, p. 95-115). No es difícil entender que la tomada del poder fue el objetivo
estratégico sine qua non de las fuerzas revolucionarias ya que estaba orientado para la

nuestro tesoro más sagrado, mas es preciso derramarlo para evitar que futuramente corra más
sangre. Esto quiere decir que no debemos temer a la violencia, la partera de las sociedades

Es posible, efectivamente, entender que tal era la orientación antes y después del triunfo da
Revolución Cubana. Al triunfar la Revolución en 1959, muchas medidas fueron tomadas para
asegurar el poder político, militar, y económico de la Isla. El gobierno naciente se colocó, como
misión principal, la reconstrucción socioeconómica de Cuba. Así, se inició un proceso de

585
propaganda y de contra propaganda que serviría, primero, para exaltar determinados hechos
históricos (todos ligados a la lucha de liberación nacional) y, consecuentemente, a la
imposición de una creencia: para una inversión de valores, con base en un proceso continuo de

Una verdadera manipulación de la información sería estratégicamente organizada por el


gobierno y sus organizaciones políticas (el Partido Comunista de Cuba y la Unión de Jóvenes
Comunistas de Cuba) que propiciaron la formación de cuadros (Guevara, 1980c, p. 43-50) y el
entrenamiento de trabajadores y estudiantes que serían los encargados de penetrar en los
grupos religiosos para un mejor control y una ordenada persecución, por ejemplo, por medio
del desarrollo de círculos ateístas que tenían como objeto fundamentalmente a los jóvenes,
grupos considerados la nueva generación de Cuba.
Luego, no se puede dudar que el gobierno naciente, desde sus inicios, deseaba su perpetuación
en el poder, lo que estaría en contradicción con la finalidad de la lucha revolucionaria:
erradicar la dictadura y toda fuerza de represión en Cuba (Guevara, 1080b, p. p.108). Esa fue,
de hecho, la mayor auto-contradicción histórica y contemporánea del régimen cubano.
Claro está que, para satisfacer tal pretensión, la ideología dominante debería ser mudada,
hasta mismo las creencias y la religiosidad del pueblo y de los propios líderes cubanos, tanto de
aquellos que lucharon como de los que murieron por la reconstrucción de Cuba. La
religiosidad de esos mártires debería ser negada, pues ellos servirían de ejemplos (de modelos)
para la juventud cubana.
Lógicamente, los valores invocados por la dirección juvenil de la Acción Católica y de las
Iglesias Evangélicas que participaron del movimiento de oposición y lucha contra el régimen
anterior serían ignorados. Así, por ejemplo, Frank País (líder da resistencia en las ciudades) fue
profesor de la escuela protestante e hijo de un ministro batista o que José Antonio Echeverría
(quien lideró el asalto al Palacio Presidencial en 1957) era católico. Se sabe, igualmente, de
otros tantos jóvenes católicos o evangélicos que participaron y murieron durante el proceso de
lucha revolucionaria.
Con el triunfo de los revolucionarios se originaron diversas mudanzas en Cuba, orientadas por
las transformaciones legislativas de cuño económico y social. Tales mudanzas también
alcanzaron la religiosidad del pueblo cubano. Por ejemplo, al comienzo de los años 60 las
iglesias cristianas consiguieron mantener vivos sus proyectos culturales. Esto fue posible, pues
tanto el nuevo presidente de la República de Cuba (Manuel Urrutia), como el propio
comandante en jefe del Ejército Rebelde, Fidel Castro, (en aquella época) y la cúpula del
gobierno tenían una orientación católica o evangélica. Mas, en verdad tales orientaciones
religiosas fue

orientado por la concepción ateísta y materialista de la historia cubana.

586
Debemos recordar que, por ejemplo, Fidel Castro estudió en escuelas católicas (en el Colegio
Belén). Ya otros ministros, por ejemplo, Faustino Pérez (ministro de Recuperación de Benes
Malversados), Manuel Ray Rivero (ministro de Obras Públicas) y José A. Naranjo (ministro del
Gobierno) eran protestantes. Igualmente, el reverendo Daniel Alvarez (presbiteriano) sería
designado subsecretario o vice-ministro del Bem-estar Social. Otros clérigos y laicos fueron
nominados para ocupar cargos provinciales y municipales. El nuevo director del Reformatorio
para Menores de Torrens sería el Reverendo Manuel B. Salabarría, conocido pastor metodista.
En el proceso de alfabetización revolucionaria figuraban con cargos importantes los
reverendos Raúl Fernández Ceballos (presbiteriano) y Agustín González (batista). En los
primeros meses de 1959, ministros evangélicos homenajearon al comandante Raúl Castro, en
aquella época ministro de las Fuerzas Armadas Revolucionarias y hoy presidente do Consejo
de Estado e de Ministros de Cuba, en acto celebrado en el Colegio Metodista Candler donde
estudiaba Fidel Castro Diaz-Balart, hijo de Fidel Castro. (Ramos, 1986, 635-640)
Conforme explica Marcos Antonio Ramos (1986), en el año 1960 el Partido Socialista Popular
(PSP) y los agentes que defendían ideales marxistas fueron ocupando cargos importantes en el
gobierno. En 7 de agosto de 1960 el Episcopado Cubano, por medio de una Circular Colectiva
criticó el establecimiento de relaciones económicas, culturales y diplomáticas con la antigua
Unión Soviética (Unión de Repúblicas Socialistas Soviéticas) y demás países del bloque
socialista. El documento ya revelaba serias preocupaciones acerca del destino de Cuba y las
Iglesias. A finales del año 1960 ya no se publicaban diarios independientes, pues habían sido
confiscados por el gobierno (ejemplo, el Diario de la Marina publicación particular que
defendía las posturas teológicas y sociales de la Iglesia Católica). Solamente el diario de la
Habana El Mundo publicaría noticias sobre el cristianismo. La revista católica La Quincena
también dejó de ser publicada. Mas, las Iglesias Católica y Evangélicas defendían el
entendimiento y no deseaban el confronto con el Estado.
Mas, el patriotismo de Estado versus religión se agravo cuando el líder máximo revolucionario
Fidel Castro proclamó el carácter socialista de la Revolución Cubana en 1961. Comenzaría ahí
una orientación marxista-leninista vacía y mal fundamentada. Un sistema socialista deturpado
que, por medio de una dirección (orientación partidaria) única, comenzaría a controlar, de
forma absoluta e irrestricta, la educación, el trabajo, las profesiones, la economía, la propiedad,
la tv, radio, prensa escrita y actualmente la Internet.
En 1961, se declaró la ruptura de las relaciones diplomáticas de Cuba con los Estados Unidos.
Así comenzó el éxodo masivo de la población y, fundamentalmente, de los misionarios de las
iglesias protestantes. Las Iglesias Batistas continuarían con sus seminarios en Habana y
Santiago de Cuba. Las Iglesias Presbiteriana, Metodista e Episcopal (Anglicana) continuaron
con la escuela ecuménica y con el Seminario Evangélico de Teología en la Provincia de
Matanzas. Igualmente, continuarían abiertos los seminarios de las iglesias Nazareno,
Evangélica Pentecostal (Asambleas de Dios), Evangélica Los Pinos Nuevos y Adventista del
Séptimo Día. El Instituto Bíblico de las Asambleas de Dios, radicado en Manacas, fue fechado

587
en 1963. Finalmente, las escuelas bíblicas dejaron de funcionar, debido a la salida de sus
misionarios. Las iglesias perdieron grande número de pastores, así como sus miembros
activos. La salida de Cuba se intensificó en 1962 con la crisis de los misiles nucleares. Se exigía
de las iglesias evangélicas el registro e informaciones tales como la lista de sus miembros,
dirección residencial y demás datos, así como informes detallados acerca de las reuniones. Se
restringió, igualmente, el número de actividades y eventos que podían ser realizados
regularmente sin permiso especial y con autorización solicitada (Ramos, 1986).
Los años siguientes fueron de persecución y prisión para os creyentes que, por diversas
razones, eran erróneamente vinculados a actividades contra-revolucionarias. El exterminio de
la propiedad privada y el excesivo control estatal hicieron imposibles los cultos en casi la
totalidad de las iglesias evangélicas que, de hecho, fueron cerradas.
Marcos Antonio Ramos también nos recuerda que entre 1971 y 1976 fueron publicados tres
documentos importantes por el gobierno cubano, que servirían para institucionalizar (y
legalizar) la persecución religiosa, a saber: 1. las Conclusiones del Congreso Nacional de
Educación e Cultura efectuado en 1971; 2. la Resolución adoptada en el Primero Congreso del
Partido Comunista en diciembre de 1975 e; 3. la Constitución Socialista de 1976.
Las Conclusiones del Congreso Nacional de Educación y Cultura efectuado, en 1971, derivaron
de un evento que tuvo como política, la separación absoluta de la Iglesia del Estado,
rechazando cualquier estímulo o ayuda recíproca entre el Estado y los grupos religiosos. La
Resolución adoptada por el Primero Congreso del Partido Comunista en diciembre de 1975
sirvió para promulgar la libertad de cultos, mas no la libertad religiosa. Conforme el texto
constitucional de aquella época, el Estado (socialista) desarrollaría su actividad y educaría el

constitucional, se reconocería la libertad de consciencia, el derecho a profesar cualquier


creencia y la práctica religio

por la Constitución.
Nuevos conceptos y frases fueron incorporados al lenguaje político y al cotidiano ordinario del
r de uso obligatorio y difundida en las
Escuelas, Universidades y Centros de trabajo. Los discursos políticos fueron y son construidos
con base en la defensa de determinados valores revolucionarios. Se evocan, conceptos
ideológicos y se confunde la patria

588
En los inicios de los años 90, movido por la crisis económica y social de la Isla, el gobierno se
vio obligado a suavizar ciertas limitaciones impuestas a la actividad económica, a la propiedad,
a la libertad contractual y, fundamentalmente, a la religión. Surgiría ahí una nueva estrategia
político-
o no abandonó su
política y las restricciones impostas durante cinco décadas, continúan. En ese contexto, el
cubano sigue condenado a las privaciones, organizadas por medio de métodos sutiles, criados
para el control de las libertades de expresión, locomoción, privacidad, asociación y religión.
La nueva estrategia consiste en la aproximación posible de grupos religiosos cubanos y
extranjeros lo que teóricamente contribuirá para un apoyo a la Revolución Cubana en colapso.
Fue así que, en 2 de abril de 1990, el líder máximo propició una reunión entre el Departamento
Ideológico del Partido Comunista de Cuba y 75 líderes del protestantismo en Cuba.
Igualmente, en 1997, Fidel Castro recibiría en la Habana setenta representantes de treinta y
una de las 54 iglesias evangélicas radicadas en Cuba. La reunión duró casi diez horas, en la cual
se trataron dos temas fundamentales propios de la relación Estado-Iglesia, surgiendo la
promesa de una posible construcción y remodelación de templos en el país. La reunión
esencialmente serviría para pacificar la visita del Papa Juan Paulo II, propuesta para el período
entre 21 e 25 de enero.
El IV Congreso del Partido Comunista de Cuba, celebrado en 10 de octubre de 1991 sería un
evento propicio para formalmente suprimir la prohibición para el ingreso al Partido
Comunista de Cuba de cubanos religiosos. Se sabe que por medio de resolución del propio
Partido Comunista se abolió toda práctica discriminatoria en el proceso de ingreso a aquellos
considerados revolucionarios, mas con creencias religiosas. Tales mudanzas positivaron la
reformulación de la Constitución Cubana, en la cual se reformularían los artículos 8º
(reconociendo, respetando y garantiendo la libertad religiosa), 42 e 55, prohibiéndose
cualquier discriminación por motivos religiosos. Tales revocaciones, al menos formalmente,
servirían para derrumbar la concepción ateísta que vigoró desde 1959 hasta 1991 retornando el
pueblo cubano a su espiritualidad anterior.
Fatos históricos posteriores2 indicaron mudanzas en el rumbo de la administración y del
gobierno cubano. Mas, resultaron ser estrategias para obtener apoyo internacional, para juntar
aliados internacionales en la lucha contra el embargo económico norte-americano.
Finalmente, el gobierno se comprometió a liberar un número indeterminado de presos
políticos (presos de consciencia) y hasta aceptar pastores y católicos en el Parlamento Cubano.

2
1- Em 19 de novembro Castro visita a cede do Vaticano; 2- Em 14 de dezembro de 1997 autorizou-se em Cuba a
celebración do Natal; 3- Em 21 de janeiro de 1998, o Papa Joión Paulo II visitou Cuba.

589
Las cinco décadas pasadas representaron la muerte espiritual, el silencio y miedo
predominante en la Isla3, ignorándose, así, la posibilidad de resolver los problemas cubanos
por la vía del diálogo. Infelizmente, la ausencia del diálogo torno dura y severa la persecución
de aquellos ciudadanos contrarios a los ideales del gobierno. La preservación de las llamadas
conquistas de la Revolución se transformó en pretexto para la preservación de intereses de un
grupo y no de un pueblo. El progreso, la igualdad y la justicia social se tornaron en quimeras,
meras promesas no cumplidas.
Conclusión
Es evidente la importancia de la presencia del discurso religioso en la esfera pública política
como un elemento que contribuye al estado liberal.
Habermas deja las puertas del Parlamento, mientras que Charles Taylor quiere en las
corporaciones políticas, restringiendo el lenguaje secular a las leyes.
Los dos autores entienden la importancia del discurso religioso y la necesidad de la igualdad en
la complejidad actual de la sociedad, que pasa a la diversidad de sectas cristianas a la
diversidad entre los creyentes y no creyentes. Por tanto, la narrativa de donde estamos y el
establecimiento de objetivos sociales es insuficiente sin el discurso religioso.
Explícita en la exposición de Taylor, la exposición se puede deducir en el pensamiento de
lo político" de la aceptación de los
principios de la democracia liberal para hacer frente a las limitaciones funcionales.
Por último, se entiende que la diferencia del discurso religioso y filosófico debe mantenerse, a
partir de San Tomás de Aquino tiene la conciencia de que el lenguaje de la razón natural puede
ser entendido por todos. Como el lenguaje religioso tiene características específicas que se
basan en experiencia de la comunidad y el ritual no es accesible a todos. Se entiende que el
mantenimiento de la distinción de los discursos pronunciados por Habermas no es la
expresión iluminista del perjuicio. Pero la necesidad de preservar las identidades epistémicas
en su diferencia. Esto justifica la posición de Habermas en el mantenimiento de la expresión
secular para expresar la necesidad de neutralidad de Estado, incluso en el grado actual de la
diversidad que supere las diferentes sectas crestas en el desarrollo de más compleja entre
creyentes y no creyentes.
Cuba es un ejemplo cercano del fracaso que resulta del divorcio entre la religión y el discurso
político.
Referencias

3
Nas décadas dos anos 60 e 70 procurou-se estender esse processo a todo o Continente Americano e a alguns países
asiáticos e africanos. Hodiernamente, ainda fala-se em guerra, assim como vimos nos episódios recentemente
protagonizados pela Venezuela, Colômbia e o Equador (ano 2008).

590
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591
DIREITOS E GARANTIAS PROCESSUAIS PENAIS: BREVES COMPARAÇÕES ENTRE AS
NORMAS INTERNAS BRASILEIRAS E A CONVENÇÃO AMERICANA SOBRE DIREITOS
HUMANOS
327

328

Resumo: O contexto histórico posterior à Segunda Guerra Mundial deu ênfase às questões
relacionadas aos Direitos e às Garantias Fundamentais, no âmbito internacional identificados

sociológicos para, então, num segundo momento, trazer consequências nas normas jurídicas
positivadas. Nesta esteira, ganha destaque a Convenção Americana sobre Direitos Humanos

promulgada pelo Brasil através do Decreto nº 678/1992. Com base nessas circunstâncias, no
presente trabalho, discorrer-se-á, de modo comparativo, sobre os direitos e as garantias
processuais penais constantes na CADH e que foram ou não incorporados ao processo penal
brasileiro, juntamente com os princípios que norteiam o Direito Material e Processual Penal.
Para tanto, utilizar-se-á de pesquisa bibliográfica e dos entendimentos do Supremo Tribunal
Federal (STF). A pesquisa se justifica diante da relevância para o universo do Direito, tendo em
vista que engloba a análise do conteúdo axiológico de princípios que podem ser utilizados na
interpretação das normas e no suprimento de lacunas, além de abranger estudos referentes à
hierarquia das normas e à influência dos Direitos Humanos no Direito Público, mais
especificamente ao Direito Penal.
Palavras-chave: Direitos Humanos; Direito Penal; Convenção Americana sobre Direitos
Humanos; princípios penais.
INTRODUÇÃO
No final da Segunda Guerra Mundial e dos terrores perpetrados pelo Nazismo, os Estados

universal que essa locução permite, num movimento simultâneo em que se estatui
regramentos afetos aos direitos e às garantias fundamentais, como também a segurança na

327
Graduanda em Direito pelo Centro Universitário Salesiano de São Paulo (UNISAL). Membro do Grupo de

Mestrado em Direito do UNISAL. E-mail: daaleixo@icloud.com


328
Professora de Direito na Universidade Federal de Itajubá (UNIFEI). Advogada. Mestra em Direito pelo UNISAL,

Faculdade Integrada e WDireito. Pós-graduanda em Direito Constitucional pela Faculdade de Ciências Humanas de

UNISAL.

vinculado ao Programa de Mestrado da Faculdade de Direito do Sul de Minas (FDSM). E-mail:


alinemarinoadv@gmail.com.

592
concepção mais ampla. Assim, de certo modo, as normas protetivas a esses direitos advêm da
necessidade de um ambiente protetor do bem-estar social.
Poucos anos após este cenário político, nasce a Convenção Americana sobre Direitos
Humanos, em

Sob este prisma, este estudo busca analisar a efetividade das normas expressas na referida
Convenção, por meio do método comparativo com as normas internas brasileiras, em especial
a Constituição Federal de 1988, bem como pela revisão bibliográfica.
Para tanto, no primeiro tópico, trazer-se-á generalidades sobre a hierarquia do Pacto de São
José da Costa Rica, ponto importante para se inferir o grau de importância dentro do Brasil.
Posteriormente, fazer-se-á uma comparação, pontuando semelhanças e diferenças entre as
regras e os princípios afetos ao processo penal presentes na Convenção Americana sobre
Direitos Humanos e na Constituição Federal de 1988, seguida de tópicos específicos para
enfatizar o princípio da presunção de inocência e a Audiência de Custódia.
Por fim, seguem as conclusões.
Hierarquia das normas: a posição da Convenção Americana sobre Direitos Humanos no Brasil
Antes de adentrar no tema propriamente dito, convém fazer uma breve análise da posição do
Pacto de São José da Costa Rica no Direito brasileiro, pois a observância no que tange à
hierarquia dessa norma é fundamental ao se estabelecer exigências na aplicabilidade e na
eficácia de seus dispositivos.
Esclarece-se que o entendimento consolidado no Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a
Convenção Americana sobre Direitos Humanos, incorporada ao ordenamento jurídico
nacional, em 1992, embora tenha sido firmada em 1969, reconheceu status supralegal e
infraconstitucional. Para se chegar a esse posicionamento, o STF passou por uma digressão
histórica sobre a hierarquia dos Tratados e Convenções Internacionais sobre Direitos
Humanos que pode ser subdividida em duas partes: correntes anteriores e posteriores à
Emenda Constitucional nº 45/2004.
Antes da EC 45/2004, existiam três correntes. A que defendia status supraconstitucional em
decorrência do progresso das relações internacionais, conforme explicitava Celso
Albuquerque de Mello. A que sustentava o status constitucional, com base no artigo 5º, § 2º, da
Constituição Federal, com aplicação imediata a partir do momento de ratificaçao pelo Brasil,
nos termos do § 1º do mesmo artigo, de acordo com os internacionalistas Cançado Trindade,
Flávia Piovesan e Mazzuoli. E, ainda, a terceira vertente, que afirmava pelo status
infraconstitucional, equivalente às leis ordinárias, aplicando-se este entendimento aos
Tratados e Convenções Internacionais ratificados pelo Brasil, independentemente se versam
ou não sobre Direitos Humanos. Assim, em eventual conflito entre lei e tratado, ora adotava-se
593
o caráter cronológico (lei posterior derroga lei anterior), ora o da especialidade (lei especial
derroga lei geral). Este foi o posicionamento do STF até meados de 2008.
Todavia, apesar de o STF entender pelo status infraconstitucional, o constituinte derivado, ao
aprovar a Emenda Constitucional nº 45, pareceu adotar a segunda posição, embora de forma
mitigada. É o que se depreende da leitura do artigo 5º, § 3º, ipsis literis:

forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos
votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais. (Incluído pela
Emenda Constitucional nº 45, de 2004)
Nota-se que a redação do dispositivo constitucional acima exposta refere-se tão-somente aos
Tratados e Convenções Internacionais sobre Direitos Humanos, sendo que a Carta Magna foi
omissa aos demais diplomas de caráter constitucional com matéria diversa.
Desse modo, para dirimir dúvidas no que se refere à hierarquia das normas após essa EC
45/2004, o STF, no Recurso Extraordinário (RE) 466.343/SP, de relatoria do Ministro Gilmar
Mendes, fixou o seguinte:
Primeiro: os Tratados e Convenções Internacionais sobre Direitos Humanos aprovados
conforme o artigo 5º, § 3º, da Constituição Federal terão status constitucional. Isto é, caso as
referidas normas internacionais sejam aprovadas pelo rito de Emenda Constitucional, em cada
Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos
membros, serão equivalentes às emendas constitucionais, o que lhes garante a hierarquia de
norma formalmente constitucional. Anota-se que, atualmente, apenas a Convenção sobre os
Direitos das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo seguiram essa regra (Decreto
Legislativo 186/2008 e Decreto 6.949/2009).
Segundo: os Tratados e Convenções Internacionais sobre Direitos Humanos não aprovados
conforme o artigo 5º, § 3º, da Constituição Federal terão status supralegal. Esse foi o
entendimento majoritário do Pleno do STF no RE 466.343, vencidos os ministros Celso de
Mello, Cezar Peluso, Eros Grau e Ellen Gracie, que defenderam o status constitucional.
E terceiro: os Tratados e Convenções Internacionais que não versem sobre Direitos Humanos
terão hierarquia infraconstitucional, de lei ordinária.
Logo, a Convenção Americana sobre Direitos Humanos, conhecida como Pacto de São José da
Costa Rica, objeto do presente estudo, enquadra-se na segunda regra, porque se trata de
Convenção Internacional sobre Direitos Humanos que não foi aprovada pelo rito de Emenda
Constitucional, restando, pois, o caráter supralegal desta norma.
Comparações entre os dispositivos relacionados ao Direito Processual Penal na Convenção
Americana sobre Direitos Humanos e na Constituição de 1988
CONTEXTUALIZAÇÃO

594
A preocupação com os Direitos Humanos, sobretudo nos países ocidentais, se acentuou após o
período das guerras mundiais, o que afetou a história do Brasil e, consequentemente, a
legislação internacional e nacional, eis que o Direito nasce de fatos. O contexto dos massacres
perpetrados pela Alemanha nazista, em que as ações eram legalizadas, trouxe
questionamentos em âmbito global, como também o nascimento de órgãos de proteção
humanitários, cujo exemplo mais emblemático é a Organização das Nações Unidas (ONU),
que, em 1948, editou a Declaração Universal dos Direitos Humanos, no intuito de concreticar
um mundo alicerçado na promoção da paz, nos valores democráticos e na ausência de guerra.
Posteriormente, na esfera regional, publicou-se, em 1969, a Convenção Americana de Direitos
Humanos, em São José da Costa Rica. A explicação é óbvia: o contexto internacional do
período de guerras afetou o continente Americano. A adesão dos países da América do Sul a
esta Convenção foi paulatina entre as décadas de 70 a 90. O Brasil somente aderiu a este
importante instrumento em 06 de novembro de 1992, com a promulgação do Decreto 678. Os
demais países da América do Sul que guardam proximidade geográfica com o Brasil também o
fizeram em datas relativamente próximas, como exemplo, o Chile em 1990, a Argentina em
1984, o Uruguai em 1985, o Paraguai em 1989, a Bolívia em 1979 e o Peru em 1978.
Nota-se, pois, uma pressão internacional no sentido de ter sido feita esta adesão, já que o Pacto
de São José da Costa Rica se originou em 1969 e somente em 1992 o Brasil o incorporou, ou
seja, 23 anos após a data de origem.
SEMELHANÇAS
Ressalta-se que esta aparentemente tardia promulgação foi realizada tão-só após o Brasil ter se
estruturado como Estado a partir da Constituição Federal de 1988, então em vigor. Isto é, antes
da adesão a uma norma de caráter internacional, o país ergueu uma estrutura nas normas
internas com significados convergentes. Isso se verifica ao se estabelecer comparações entre
os dispositivos da Convenção Americana de Direitos Humanos e da Constituição Federal de
1988, notadamente no que se refere aos princípios penais e processuais penais. A maioria
identificam-se entre si.
Em rol exemplificativo, temos os artigos 7º e 8º da Convenção Americana de Direitos
Humanos, que destacamos as seguintes previsões:
O enaltecimento do direito à liberdade, também reproduzido no art. 5º, incisos LXI, LXV e
LXVI, da Constituição Federal, que, em suma, prelecionam que a liberdade é a regra e a prisão,
a exceção, de forma que, para se admitir a prisão, necessita-se de ordem escrita e
fundamentada da autoridade competente ou de flagrante delito. Caso contrário, tem-se a
ilegalidade e, em consequência, o relaxamento da prisão, além das possibilidades de liberdade
provisória com e sem fiança.
As regras relacionadas ao devido processo legal, previstas também no art. 5º, incisos XXXVII,
XXXIX, XL, XLVI, XLVII, XLVIII, XLIX, L, LIII, LIV, LV, LVI, LVII, LVIII, da Constituição
Federal, que, basicamente, vedam o juízo ou tribunal de exceção e as provas ilícitas,
595
estabelecem a inadmissão de se configurar a infração penal na hipótese de inexistência de lei
anterior ao fato criminoso, prevê a irretroatividade da lei penal, salvo em benefício do réu,
resguardam os princípios da individualização da pena e da presunção de inocência, além da
necessidade do contraditório e da ampla defesa.
O direito do preso à informação e à identificação sobre a situação prisional, elencadas, de igual
modo, no art. 5º, incisos LXII, LXIII, e LXIV, da Constituição Federal.
A garantia à razoável duração do processo, também trazida pelo art. 5º, inciso LXXVIII, da
Constituição Federal.
O direito de não fazer prova contra si mesmo, que pode ser também depreendido no art. 5º,
inciso LXIII, da Constituição Federal, que prevê o direito do réu de permanecer calado.
DIFERENÇAS
Em que pese essas mencionadas semelhanças entre a Convenção Americana de Direitos
Humanos e os princípios penais e processuais penais previstos na Constituição brasileira,
algumas regras elencadas no Pacto de São José da Costa Rica não são idênticas às previstas nas
normas internas brasileiras. Neste sentido, colocamos as seguintes:
Direito do acusado de ser assistido gratuitamente por um tradutor ou intérprete, caso não
compreenda ou não fale a língua do juízo ou Tribunal. Embora haja previsão na legislação
brasileira quanto à assistência judiciária gratuita, no que tange a tradutor e intérprete, falta
previsão mais específica.
Direito de recorrer da sentença a juiz ou tribunal superior. Essa previsão é genérica no Pacto
de São José da Costa Rica, porém, na legislação interna brasileira, há mitigação da regra do
recurso, tendo em vista as ações originárias ajuizadas nos Tribunais Superiores.
Dever de condução do preso, sem demora, à presença de um juiz. Salienta-se que esta regra foi
recentemente normatizada no Brasil, por meio da Audiência de Custódia, disciplinada na
Resolução 213/2015 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). No entanto, há discussões sobre a
inconstitucionalidade formal ou não dessa Resolução, assunto que demanda outro trabalho de
pesquisa.
Percebe-se que o Brasil, embora tenha aderido à Convenção Americana de Direitos Humanos
em 1992, os dispositivos penais e processuais penais que estão nela disciplinados são mais
amplos quando comparados aos apontados artigos correlatos da Constituição Federal de 1988.
Isso traz uma relativa desvantagem, porque, apesar da incorporação dessa norma
internacional na ordem interna, há ausência de mecanismos que a tornem plenamente eficaz,
inclusive porque as normas constitucionais e infraconstitucionais brasileiras são mais restritas
em alguns pontos, a exemplo do sistema recursal mencionado.
Em torno dessa aparente antinomia, cabe lembrar do julgamento do Supremo Tribunal
Federal proferido no Recurso Extraordinário nº 466.343/SP, que reconheceu a hierarquia

596
supralegal aos Tratados e Convenções Internacionais sobre Direitos Humanos não aprovados
pelo rito de Emenda Constitucional, conforme a previsão do art. 5º, § 3º, da Constituição
Federal, o que se aplica ao Pacto de São José da Costa Rica, assunto abordado no tópico
anterior. Isso ocasionou mudanças interpretativas no que se refere à vedação da prisão civil do
depositário infiel, tendo o Supremo Tribunal Federal, inclusive, editado a Súmula Vinculante
25.
Resta, pois, o questionamento: até que ponto a Convenção Americana de Direitos Humanos
tem eficácia no Brasil, apesar da adesão?
A resposta, pois, é uma longa estrada a percorrer, o que se demonstrou até então, já que, por

jurídico somente no ano passado, 2016, tendo a incorporação do Pacto de São José da Costa
Rica, que a prevê, ocorrido ainda no ano de 1992. O debate é ainda mais longo quando trazido
para a esfera internacional propriamente dita, pois demanda uma revisão dos conceitos de
soberania nacional dentro do atual cenário neoconstitucional e transconstitucional na era
globalizada, o que requer novas propostas de trabalhos para uma análise mais incorporada
desses aspectos.
Com o fim de criar alicerces para esta análise em trabalhos futuros, no presente artigo, optar-
se-á por enfatizar o princípio da presunção de inocência e algumas considerações sobre a
Audiência de Custódia, como se confere nos tópicos a seguir.
O PRINCÍPIO DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA
No atual cenário pós positivista, os princípios ganham importância, seja no suprimento de
lacunas, seja com o objetivo interpretativo, seja fundamentando o ordenamento jurídico
(LORENZETTI, 1998). Como anota Bonavides (2005), o prestígio dos princípios advém do
aspecto valorativo, in verbis:
Os princípios têm, desse modo, contribuído soberanamente para a formação de uma terceira
posição doutrinária verdadeiramente propedêutica a uma teoria dos princípios, que intenta
estorvar no campo constitucional as ressurreições jusnaturalistas e, ao mesmo passo, suprimir
o acanhamento, a estreiteza e as insuficiências do positivismo legal ou estadualista, deixando à
retaguarda velhas correntes do pensamento jurídico, impotentes para dilucidar a positividade
do Direito em todas as suas dimensões de valor e em todos os seus graus de eficácia.
(BONAVIDES, 2005, p. 285)
Rothenburg (1999) também destaca o caráter valorativo dos princípios quando comparados às
demais normas do ordenamento jurídico:
Os princípios têm suas propriedades, diferenciando-se por sua natureza (qualitativamente)
dos demais preceitos jurídicos, a distinção está em que constituem eles expressão primeira dos
valores fundamentais expressos pelo ordenamento jurídico, informando materialmente as
demais normas (fornecendo-lhes a inspiração para o recheio). (ROTHENBURG, 1999)

597
Baseado neste pilar valorativo, a aplicação dos princípios torna-
estabelecido mediante um juízo de ponderação com outros princípios. Ponderar é estabelecer

(LORENZETTI, 1998, p. 317).


Quanto ao princípio da presunção de inocência, este guarda importância tanto na Constituição
Federal de 1988 quanto nas normas internacionais que o Brasil é signatário, a exemplo do
Pacto de São José da Costa Rica, do Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos e da
Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão (1789).
A ideia central de tal princípio é expressa no artigo 5º, inciso LVII, da Carta Magna, que

e regras do Direito
Penal, em que a atuação dos Poderes Legislativo e Judiciário se destacam, o primeiro por meio
da atividade legiferante, o segundo, através da aplicação das normas no caso concreto, como
adverte Palazzo:
A penetração dos valores constitucionais no corpo do sistema penal (como, de resto, no de
qualquer outro ramo do ordenamento) pode ocorrer mediante a via legislativa, por intermédio
de leis de atuação constitucional, ou pela via jurisdicional, entendendo-se como tal não apenas
o trabalho de adequação do magistrado a quanto se contenha nas malhas da lei, mas,
principalmente, a decisiva atividade da Corte constitucional. Ora, se a primeira via não
apresenta problemas particulares no campo penal, a segunda põe-se numa problemática
relação a propósito do princípio fundamental de estrita legalidade dos delitos e das penas.
(PALAZZO, 1989, p. 30)
Esta concepção constitucional dos princípios, entre eles o da presunção de inocência, também
é sentida na clássica obra de Luisi:
Os princípios atinentes da matéria penal e, pois, não exclusivamente criminais, permeiam a
Carta Magna de 1988, bastando, por ora, lembrar, dentre muitos outros, os preceitos
concernentes a bens da mais alta relevância social, como os relativos ao meio ambiente, ao
trabalho individual e coletivo, a atividade econômica pública e privada, a pesqusia científica
etc., para cuja tutela concreta se faz necessária a resposta penal. (LUISI, 1991, p. 12)
Com mais razão, essa dimensão constitucional dos princípios atinge com relevância maior o
Direito Penal, eis que este ramo do Direito é afeto às liberdades, dentro dos direitos e das
garantias fundamentais conquistados ao longo dos tempos. Deste modo, o princípio da
presunção da inocência ganha destaque, porque além de princípio, pode-se dizer que também
é uma regra a ser observada com obrigatoriedade, assumindo não só a função interpretativa e
de suprimento de lacunas, como é de praxe das normas principiológicas, como, ainda, com
efeitos vinculantes ao caso concreto, diante da positivação feita expressamente pelo
constituinte originário, além da previsão na legislação infraconstitucional.

598
A discussão, contudo, é feita na seara doutrinária. Por interpretação com base no contexto
histórico, este preceito, também reproduzido pelo Código Penal brasileiro, datado de 1941,
alinha-se, na origem, ao modelo italiano, à época, sob o regime fascista, o que traz divisão entre
as Escolas Penais liberais e anti-liberais. A liberal se fundamenta na liberdade individual,
sobreposta ao interesse social. Já a anti-liberal, relaciona-se ao tecnicismo jurídico e adota uma
postura de neutralidade, mais próxima com a não culpabilidade e com a repressão da
delinquência.
Luiz Flávio Gomes (2012) se filia ao modelo liberal e explica que o entendimento sobre o
conteúdo do princípio da presunção de inocência não pode ser diferente disso, tendo em vista
o sistema de direitos e de garantias preconizado pela Constituição de 1988. Vale detacar o
seguinte trecho:
Do processo de constitucionalização da presunção de inocência temos que extrair algumas
conseqüências jurídicas inafastáveis, todas atreladas ao que podemos denominar (super)
garantias dos direitos e garantias fundamentais. Essas (super) garantias são "não
jurisdicionais" ou "jurisdicionais". Dentre as primeiras destacam-se: (a) a aplicação imediata
do preceito, tal como previsto no art. 5.º, § 1.º, da CF (LGL\1988\3); (b) a vinculação de todos
(poderes públicos e particulares), que lhe devem estrita obediência. No que concerne às
garantias jurisdicionais cabe assinalar: (a) o acesso à jurisdição (sempre que algum direito
fundamental não é observado, conta o vitimizado com o direito líquido e certo e buscar a
tutela judicial desse direito); (b) o controle de constitucionalidade das leis que exige o
reconhecimento da primazia das normas constitucionais (a presunção maior do ordenamento
jurídico-penal, que é a da inocência, não pode ser restringida ou eliminada por presunções
"legais" menores em sentido contrário). (GOMES, 2012)
Com fulcro nessa explanação, Luiz Flávi

visto como regra probatória, como regra de tratamento e como regra de conduta.
Ocorre que, com a devida venia, ousamos em discordar de Gomes (2012), pois, ao que
aparenta, o constituinte originário apenas reproduziu um conteúdo, em vez de se utilizar do

mais amplo, contrário à culpa em sentido estrito, o teria feito expressamente, inclusive porque
a tendência do entendimento anterior à sua promulgação baseava-se no Código Penal de 1941 e
eventual mudança valorativa, assim, pressupõe um preceito explícito.
É mister esclarecer que a busca pela verdade material é um poder-dever do Estado, como
também o são a segurança e os direitos e garantias individuais (DOTTI, 2012), notadamente, a
liberdade. Todo esse arcabouço consta em trechos explícitos na Constituição de 1988, tendo,
pois, igual hierarquia na aplicação e, portanto, dependente de princípios para melhor se
interepretar o caso sob judice. Sem grandes esforços, percebe-se que, do confronto entre a
segurança de um todo versus a liberdade individual do suposto infrator, há que prevalecer o

599
direito pela tutela da maioria, inclusive para garantir a liberdade dessa mesma maioria,
sobretudo nos casos em que há flagrante delito e naqueles em que há a necessidade da prisão
preventiva.
Acrescenta-se a isso o fato de que, pela paridade de armas, ao mesmo tempo que se presume a
inocência de um acusado, pode-se defender, também, a presunção de culpabilidade, desde que
em prol do interesse da sociedade e já que o sistema está muito além de tão-só se verificar
direitos de cunho individual, como quer fazer crer Gomes (2012). Tanto é verídico que,
atualmente, fala-se também em direitos difusos e coletivos, com o propósito de defesa do
interesse público primário, o que, por pertencer a todos os seres humanos, em nível de
igualdade e sem titularidade determinada, acabam por ganhar proteção para além dos muros
individuais.
Dessa forma, há que se verificar o conflito para que a proteção entre os bens jurídicos seja a
máxima possível. Nessa esteira, Lopes (2000) oferece uma solução interessante, tendo como

O Estado Democrático de Direito deve estar fundado em três critérios importantes para a
construção dos bens jurídicos penais, ou seja, danosidade social, subsidiariedade e tolerância.
A danosidade social está relacionada ao ataque ao bem jurídico; a subsidiariedade relaciona-se
a intervenção penal na tutela de determinado bem jurídico; e finalmente, a tolerância é a
ponderação da média de sacrifício do bem jurídico que a sociedade deve suportar. (LOPES,
2000, p. 642-643)
Os critérios elencados por Lopes (2000) no trecho acima transcrito são relevantes porque,
para a valoração de um bem jurídico e consequente punição pelo desrespeito às normas,
procuram conciliar a aplicação se eventual sanção com as ideias de danosidade social, de modo
que a punição deve ser proporcional ao dano causado à sociedade, de subsidiariedade, isto é, o
caráter preventivo deve prevalecer sobre o repressivo, e de tolerância, ou seja, no caso de a
sociedade ser afetada, este efetio deve ser o menor possível.
A literatura sobre o estudo das penas é farta, porém, para cumprir com a delimitação objeto
deste trabalho, salienta-se a noção de que a sanção imposta deve considerar a proteção da
vítima e a ressocialização do delinquente, send
caracterizada como prevenção geral positiva já que a pena é a reação estatal perante fatos

JÚNIOR, 1995, p. 47).


O princípio da presunção de inocência situa-se neste liame entre a prevenção e a repressão.
Prevenção porque adstrito à consciência das normas e ao bem-estar da coletividade. Repressão
porque, ao se apurar com exatidão os fatos, aquele considerado infrator é digno da punição
necessária a coibir nova prática do mesmo delito. Em ambas as situações, observar-se-á a
circunstância explicada por Beccaria, cujo posicionamento se concentra na finalidade de

600
prevenir os crimes, sob pena de a crueldade na imposição das sanções contribuir para o
deserviço do que se pretende preservar:
(...) duas outras danosas consequências derivam da crueldade das penas, contrárias ao próprio
fim de prevenir os delitos. A primeira, é que não é tão fácil preservar a proporção essencial
entre o delito e a pena, porque embora uma engenhosa crueldade tenha contribuído para fazer
variar grandemente suas espécies, a pena, não pode, ainda assim, ultrapassar a última força a
que estão limitadas a organização e a sensibilidade humana. (BECCARIA, 1997, p. 88)
Assim, entendemos pela neutralidade do princípio da presunção de inocência, de modo que, ao
acusado, não se pode inferir pela inocência e nem pela culpabilidade, antes da decisão
condenatória transitada em julgado. Todavia, essa neutralidade é mitigada quando entra em
cena a tutela dos direitos e das garantias fundamentais na esfera transindividual.
ALGUMAS CONSIDERAÇÕES SOBRE A AUDIÊNCIA DE CUSTÓDIA
Ao lado do princípio da presunção de inocência, outra consideração importante a ser feita
quando o assunto é a comparação entre a Convenção Americana sobre Direitos Humanos e as
normas internas brasileiras que trazem princípios processuais penais é a Audiência de
Custódia329.
Nos termos do artigo 7º, item 5, da Convenção Americana sobre Direitos Humanos:
Toda pessoa presa, detida ou retida deve ser conduzida, sem demora, à presença de um juiz ou
outra autoridade autorizada por lei a exercer funções judiciais e tem o direito de ser julgada
em prazo razoável ou de ser posta em liberdade, sem prejuízo de que prossiga o processo. Sua
liberdade pode ser condicionada a garantias que assegurem o seu comparecimento em juízo.
(CADH, art. 7º, item 5)
A esta apresentação imediata do preso em juízo denomina-
além do Pacto de São José da Costa Rica, também tem previsão no Pacto Internacional de
Direitos Civis e Políticos, outra norma internacional assinada pelo Brasil. Contudo, em ambos
os diplomas não há previsões quanto ao aspecto procedimental.
Atenta-se, igualmente, que nas leis internas brasileiras também não há previsão da Audiência
de Custódia.330

329
Como este não é o tema central do presente trabalho, optar-se-á por trazer generalidades sobre o assunto

Resolução 213/2015 do CNJ.


Apesar da ausência de previsão legal da Audiência de Custódia, pode-se afirmar que, atualmente, o que mais se
330

aproxima desta ideia é o procedimento estabelecido no artigo 656 do Código de Processo Penal, que faculta ao juiz
determinar a apresentação imediata do preso ao receber a petição de habeas corpus.

601
Diante dessas lacunas, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) editou a Resolução nº 213, datada
de 15 de dezembro de 2015, determinando a apresentação do preso em juízo no prazo máximo
de 24 h do flagrante.
Embora haja diversas críticas no sentido de que há a necessidade de previsão por lei, e não por
uma mera resolução, os Tribunais estão se adaptando paulatinamente a esta norma do CNJ,
cujo objetivo é apresentar o acusado perante o juiz, com o propósito de que este verifique a
legalidade, a necessidade e a adequação da prisão, além de eventuais irregularidades, como
também da imposição de outras medidas cautelares, ouvidos o Ministério Público e o
advogado do preso ou a Defensoria Pública.
O projeto prevê também a estruturação de centrais de alternativas penais, centrais de
monitoramento eletrônico, centrais de serviços e assistência social e câmaras de mediação
penal, que serão responsáveis por representar ao juiz opções ao encarceramento provisório.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Diante do exposto, questiona-se sobre a eficácia ou ineficácia da Convenção Americana sobre
Direitos Humanos, sendo que essa discussão, como se vislumbrou, remete ao sistema de
hierarquia de normas, situando este diploma no status supralegal e infraconstitucional.
A esta hierarquia, verifica-se que apesar de o Brasil ser signatário do Pacto de São José da
Costa Rica, este não pode ter por eficaz todas as suas previsões, já que as normas internas
brasileiras são mais restritivas, o que, de certo modo, limita a aplicação da Convenção,
tornando-a mero diploma simbólico sem a devida força normativa.
Com efeito, é notável que tanto o Brasil, quanto o Chile, como também a maioria dos países
latino americanos somente aderiram à Convenção Americana sobre Direitos Humanos após

Inobstante essas considerações, cabe destacar que interpretação diferente dessa restritiva
implica mudanças no sistema de hierarquia, sobretudo quando se tem que a Constituição
Federal tem eficácia normativa como fundamento para as demais normas, o que é
incompatível com a atual configuração do Estado brasileiro.
Referências
BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 17. ed. São Paulo: Malheiros, 2005.
BONESANA, Cesare (Marquês de Beccaria). Dos delitos e das penas. Tradução de José Cretella
Júnior e Agnes Cretella. 2. ed. São Paulo: RT, 1997.
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2017.
BRASIL. Constituição Federal (1988). Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm >. Acesso em: 22 fev.
2017.
602
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Disponível em:
<http://www.stf.jus.br/portal/principal/principal.asp>. Acesso em: 22 fev. 2017.
CNJ. Audiência de Custódia. Disponível em: <www.cnj.jus.br>. Acesso em: 22 fev. 2017.
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<http://www.cidh.oas.org/basicos/portugues/c.convencao_americana.htm>. Acesso em: 22
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CORRÊA JÚNIOR, Alceu; SHECAIRA, Sérgio Salomão. Pena e Constituição: aspectos
relevantes para a sua aplicação e execução. São Paulo: RT, 1995.
DOTTI, Renê Ariel. Princípios do Processo Penal. Doutrinas Essenciais de Processo Penal, RT,
v. 1, jun. 2012, p. 397-424.
GOMES, Luiz Flávio. Sobre o conteúdo processual tridimensional do princípio da presunção
de inocência. Doutrinas Essenciais de Processo Penal, RT, v. 1, jun. 2012, p. 251-264.
LOPES, Maurício Antonio Ribeiro. Teoria Constitucional do Direito Penal. São Paulo: RT,
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LORENZETTI, Ricardo Luís. Fundamentos do Direito Privado. São Paulo: RT, 1998.
LUISI, Luiz. Os princípios constitucionais penais. Porto Alegre: Sérgio Antonio Fabris, 1991.
MAZZUOLI, Valério de Oliveira. Curso de Direito Internacional Público. 5. ed. São Paulo: RT,
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MELLO, Celso Albuquerque de. Curso de Direito Internacional Público. 12. ed. Rio de Janeiro:
Renovar, 2000.
PALAZZO, Francesco C. Valores Constitucionais e Direito Penal. Tradução de Gérson Pereira
dos Santos. Porto Alegre: Sérgio Antonio Fabris Editor, 1989.
PIOVESAN, Flávia. Temas de Direitos Humanos. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2012.
ROTHENBURG, Walter Claudius. Princípios Constitucionais. Porto Alegre: Sérgio Antonio
Fabris Editor, 1999.
TRINDADE, Antônio Augusto Cançado. Tratado de Direito Internacional de Direitos
Humanos. Volume I. Porto Alegre: Sérgio Antonio Fabris Editor, 2003.

603
A UTILIZAÇÃO DE INSTRUMENTOS DE TUTELA COLETIVA PARA A EFETIVAÇÃO DE
POLÍTICAS PÚBLICAS EM PROL DOS DIREITOS E DAS GARANTIAS FUNDAMENTAIS
331

332

Resumo: A abrangência dos direitos e das garantias fundamentais previstos na Constituição da


República Federativa do Brasil d
discussões relacionadas ao papel do Estado na efetividade de tais dispositivos, dividindo as
opiniões entre aqueles que ora defendem o mínimo existencial, ora se posicionam pela reserva
do possível. Em que pese o não esgotamento deste dilema na esfera do Direito Material, no
trabalho que se inicia, ater-se-á os instrumentos processuais de tutela coletiva previstos na
legislação brasileira, com destaque para as Ações Coletivas e para a atuação do Ministério
Público, com o objetivo de tecer análise crítica quanto à efetividade dos direitos no contexto
do Brasil. Para o estudo da problemática, far-se-á pesquisa bibliográfica na literatura referente
ao Processo Coletivo, aos Direitos e às Garantias Fundamentais e às Políticas Públicas. A
análise é pertinente, à medida que a disciplina dos Direitos Materiais e Processuais Coletivos
guarda certa dose de novidade no universo jurídico brasileiro, carecendo, muitas vezes, de
normas específicas que regulamentam determinada matéria. Acrescenta-se a isso a
insuficiência da simples previsão legal para a concretização dos direitos. O alcance deste
ensaio envolve profissionais da área jurídica e demais interessados que lidam com a
formulação e execução de Políticas Públicas.
Palavras-chave: Direitos Difusos e Coletivos; Direitos e Garantias Fundamentais; Políticas
Públicas; Ações Coletivas
Introdução
Os direitos transindividuais, inseridos na terceira dimensão ou geração dos direitos e das
garantias fundamentais, ganham importância quando se trata de Políticas Públicas, visto que
essas são voltadas para garantir direitos e deveres impostos ao bem comum da coletividade.
Baseando-se nessa ideia, o presente trabalho faz uma breve exposição sobre os instrumentos
processuais necessários à efetividade desses direitos enquanto Políticas Públicas,

331
Graduanda em Direito pelo Centro Universitário Salesiano de São Paulo (UNISAL). Membro do Grupo de

Mestrado em Direito do UNISAL. E-mail: daaleixo@icloud.com


332
Professora de Direito na Universidade Federal de Itajubá (UNIFEI). Advogada. Mestra em Direito pelo UNISAL,

Faculdade Integrada e WDireito. Pós-graduanda em Direito Constitucional pela Faculdade de Ciências Humanas de

zo, vinculado ao Programa de Mestrado em Direito do UNISAL.

vinculado ao Programa de Mestrado da Faculdade de Direito do Sul de Minas (FDSM). E-mail:


alinemarinoadv@gmail.com.

604
principalmente quando o cumprimento das normas não ocorre com a espontaneidade que
deveria existir, precisando, assim, da intervenção do Poder Judiciário para a concretização
destas.
Desse modo, o presente artigo subdivide-se em três tópicos.
No primeiro tópico, abordar-se-á aspectos conceituais que assemelham e diferenciam a
subclassificação dos direitos transindividuais em: difusos, coletivos e individuais homogêneos.
No segundo tópico, abordar-se-á o papel do Poder Público na formulação e na efetivação das
Políticas Públicas.
E, no terceiro tópico, dar-se-á importância para as funções jurisdicional e do Ministério
Público, por meio de Ações Coletivas, especificamente a Ação Civil Pública e o Mandado de
Segurança Coletivo, no que se refere à exigência no cumprimento de Políticas Públicas por
parte do Poder Executivo.
Por fim, seguem as conclusões.
BREVES CONSIDERAÇÕES CONCEITUAIS SOBRE OS DIREITOS TRANSINDIVIDUAIS
A evolução dos direitos e das garantias fundamentais trouxe, para fins didáticos, a divisão
quanto às gerações ou dimensões, baseada no lema da Revolução Francesa e no ideal de
perpetuação histórica dos direitos. Há um certo consenso doutrinário em relação às três
primeiras gerações ou dimensões.
A 1ª geração ou dimensão refere-se aos direitos civis e políticos, caracterizados como
liberdades negativas, em que a burguesia reivindicava a abstenção do Estado em meio ao
contexto do liberalismo.
A 2ª geração ou dimensão relaciona-se aos direitos sociais, às liberdades positivas, pois em
meio à luta do proletariado, houve a exigência de intervenção do Estado na economia e na
sociedade com o fim de propor políticas públicas em prol das classes desfavorecidas. Fala-se,
então, em igualdade, em justiça social.
Já a 3ª geração ou dimensão abrange os direitos de titularidade difusa ou coletiva e busca a
idéia de fraternidade, ou seja, a solidariedade, de forma que a preocupação vai além da esfera
meramente individual ou de apenas um grupo, ampliando-se a abrangência às gerações
humanas presentes e futuras. Genericamente, costuma-

Brasil, há a divisão em: Direitos Difusos,


Direitos Coletivos e Direitos Individuais Homogêneos. As definições dessas categorias
constam no artigo 81, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor (CDC).
No presente trabalho, destacam-se os Direitos Difusos e os Direitos Coletivos, para efeitos de
tutela jurídica. Quanto aos interesses difusos, têm-
natureza é indivisível, de que sejam titulares pessoas indeterminadas ligadas por
605
CDC. Já quanto aos interesses coletivos, há um grupo
determinado de pessoas, reunidas por uma relação jurídica básica comum, conceito também
de acordo com o CDC.
A importância advém do fato de os direitos difusos e coletivos atingirem, como os próprios
nomes sugerem, a coletividade e, portanto, recaem nas políticas públicas em prol da sociedade.
AS POLÍTICAS PÚBLICAS E O PODER PÚBLICO

ações, as atividades desenvolvidas pelo Estado para implementar os direitos que são

-se uma pluralidade, eis que estas são utilizadas tanto no Direito quanto nas
demais áreas do conhecimento, a exemplo da Ciência Política. neste ínterim, os Poderes
Legislativo e Executivo, com ênfase, devem ser os garantidores das Políticas Públicas.
O Poder Legislativo tem a incumbência de disciplinar as Políticas Públicas na legislação, como,
por exemplo, o fez ao disciplinar a Política Nacional do Meio Ambiente na Lei 6.938/1981, a
Política Nacional dos Recursos Hídricos na Lei 9.433/1997, a Política Nacional dos Resíduos
Sólidos na Lei 12.305/2010 e a Política Nacional de Relações de Consumo na Lei 8.078/1990.
Na mesma esteira, o Poder Executivo, nas palavras da professora Maria Paula Dallari Bucci, na
típica função de administrador, toma as Políticas Públicas como atividade político-
administrativa, de forma que se referem a
(...)programa de ação governamental que resulta de um processo ou conjunto de processos
juridicamente regulados processo eleitoral, processo de planejamento, processo de governo,
processo orçamentário, processo legislativo, processo administrativo, processo judicial
visando coordenar os meios à disposição do Estado e as atividades privadas, para a realização
de objetivos socialmente relevantes e politicamente determinados. (BUCCI)
Na omissão dos Poderes Legislativo e Executivo, predomina na atualidade o reconhecimento
pela atuação do Poder Judiciário como órgão no exercício de função de controle. Este exercício
pode ser feito por meio da análise de Ações Coletivas, sobretudo quando a discussão se refere
aos Direitos Difusos e Coletivos.
Outra discussão que se faz, agora quanto à atuação do Poder Judiciário relacionada à
efetivação das Políticas Públicas ligam-se às ideias do ativismo judicial, em que se discute
também o mínimo existencial e a reserva do possível, de forma que há críticas no sentido de o
Poder Judiciário, por vezes, fazer o papel de legislador positivo, contrariando a tripartição de
poderes e, por outra baila, garantindo o núcleo essencial mínimo dos direitos e das garantias

um orçamento compatível, reservando verbas que o garante, não podendo se esquivar com o
argumento da reserva do possível, em detrimento dos direitos sociais, assunto que demanda
outros trabalhos para uma análise pormenorizada (SARLET, 2001).

606
Apesar de o estud
posteriores, por ora, convém destacar as aparentes causas para a dificuldade de se efetivar as
Políticas Públicas.
Neste sentido, Renard, Caillosse e Béchillon (2000, p. 14) afirmam que o enquadramento de
estudo das Políticas Públicas é controvertido, o que dificulta suas previsões, delineamentos,
controles e efetividades. Assim explanam os autores:
A análise das políticas públicas vem dos Estados Unidos como um campo de estudo
especializado após a segunda guerra mundial. Orientada por meio da resoluçao de problemas
e, mais especificamente, de todas as visões conflituantes do funcionamento social, ela se

década de 1960. Seu desenvolvimento no cenário contemporâneo está na realizaçao de novos


programas públicos, onde ela beneficia, com programa para produzir um melhor
conhecimento das condições e dos resultados da ação dos governantes, de uma parte
constituem um corpus de conhecimentos diretamente úteis na tomada de decisão e, de outra
parte e simultaneamente, dos conhecimentos menos finalizados sobre os processos de
decisões. (RENARD; CAILLOSSE; BÉCHILLON, 2000, p. 14, tradução livre)333
Ao lado do difícil enquandramento das Políticas Públicas como objeto de estudo em uma
ciencia específica, nota-se também, pela própria explicação dos autores transcrita acima, que o
nascedouro das Políticas Públicas é relativamente novo, datando de fins da segunda guerra
mundial, o que corrobora para obstaculizar a efetividade.
Acrescenta-se às palavras de Renard, Caillosse e Béchillon as observações de Leonardo Secchi,
que trabalha especificamente a questão administrativa por detrás da aplicação das Políticas
Públicas.

que nem sempre este ciclo é respeitado, o que dificulta a concretização das Políticas Públicas.
O ciclo está representado no seguinte gráfico:

333
-
après la seconde guerre mondiale. Orientée vers la résolution de problèmes et très éloignée de toute vision
conflic

programmes publics, dont elle bénéficie, avec pour programme de produire une meilleure connaissance des

nces moins finalisées sur le processus

607
Ciclo das Políticas Públicas (SECCHI, 2012, p. 33)
Salienta-se que, para Secchi, a avaliação, fase posterior à implementação, como se pode
observar na representação acima, é de grande relevo, pois envolve vários critérios, os quais, ao
serem aferidos no caso prático, pode levar à continuidade, à alteração ou, ainda, à extinção de
uma Política Pública. Entre esses critérios, destacam-se:
- economicidade: refere-se ao nível de utilização de recursos (inputs);
- eficiência econômica: trata da relaçao entre inputs (recursos utilizados) e outputs
(produtividade);
- eficiência administrativa: trata do seguimento de prescrições, ou seja, do nível de
conformação da execução a métodos preestabelecidos;
- eficácia: corresponde ao nível de alcance de metas ou objetivos preestabelecidos;
- equidade: trata da homogeneidade de distribuição de benefícios (ou punições) entre os
destinatários de uma política pública.
(SECCHI, 2012, p. 50)

Ao lado dos critérios estabelecidos por Secchi (2012), cabe mencionar, ainda, o papel
importante que deve ser exercido pela sociedade no que tange à formulação,
acompanhamento, fiscalização e avaliação de Políticas Públicas voltadas à efetivação dos
direitos fundamentais, participação esta que deve ser não só admitida, como também
incentivada. As perguntas que restam, contudo, são: será que há este estímulo para a
participação ativa da sociedade? Será que os membros da sociedade têm preparo para a
discussão? Será que as pessoas em geral se interessam por estas discussões? Ainda que a
608
resposta a estas questões sejam negativas, uma afirmativa parece ser o senso comum a
solucionar estas indagações, qual seja: isso pode ser um indício do que realmente precisa ser
modificado para que as Políticas Públicas sejam conduzidas e implementadas enfim, a
mudança na mentalidade, resumida como modos de pensar e de agir.
AS POLÍTICAS PÚBLICAS E OS INSTRUMENTOS DE TUTELA COLETIVA
Destacam-se entre as Ações Coletivas: 1ª) a Ação Civil Pública de responsabilidade por danos
morais e patrimoniais causados ao meio ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor
artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico, a qualquer outro interesse difuso ou
coletivo, por infração da ordem econômica, e à ordem urbanística (art. 1º da Lei 7.347/1985); e
2ª) o Mandado de Segurança Coletivo, em que os direitos protegidos podem ser coletivos e
individuais homogêneos (art. 21, parágrafo único, I e II, da Lei 12.016/2009), devendo esses
direitos ser líquidos e certos, não amparados por habeas corpus ou habeas data.
MANDADO DE SEGURANÇA COLETIVO
Com relação ao Mandado de Segurança Coletivo, tem legitimidade para impetrá-lo:
Partido político com representação no Congresso Nacional, na defesa de seus interesses
legítimos relativos a seus integrantes ou à finalidade partidária, ou por organização sindical,
entidade de classe ou associação legalmente constituída e em funcionamento há, pelo menos,
um ano, em defesa de direitos líquidos e certos da totalidade, ou de parte, dos seus membros
ou associados, na forma dos seus estatutos e desde que pertinentes às suas finalidades,
dispensada, para tanto, autorização especial.
(art. 21, caput, da Lei 12.016/2009).
Apesar de a Lei 12.016/2009, que disciplina o Mandado de Segurança Individual e Coletivo não
prever expressamente a legitimidade do Ministério Público para a propositura do Mandado de
Segurança Coletivo, ao interpretar sistematicamente o microssistema de tutela coletiva, essa
legitimidade é admitida com base no art. 210 do Estatuto da Criança e do Adolescente.
AÇÃO CIVIL PÚBLICA
Quanto à Ação Civil Pública, tem legitimidade para a propositura, o Ministério Público, a
Defensoria Pública, a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, a autarquia,
empresa pública, fundação ou sociedade de economia mista e a associação que,
concomitantemente, esteja constituída há pelo menos um ano e que inclua, entre suas
finalidades institucionais, a proteção ao meio ambiente, ao consumidor, à ordem econômica, à
livre concorrência ou ao patrimônio artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico (art.
5º, incisos I a V, da Lei 7.347/1985). Destaca-se, aqui, o importante papel exercido pelo
Ministério Público que, caso não atue como parte, deverá atuar, obrigatoriamente, como fiscal
da lei, ao passo que, em relação aos demais legitimados, a lei faculta a possibilidade de atuação
como litisconsortes de qualquer das partes.

609
Nota-se a relevância do Ministério Público nestas ações, com o fim de dar efetividade aos
mandamentos constitucionais previstos nos artigos 127 a 130-A da Constituição de 1988, com

Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses


para a função institucional de zelar pelo
efetivo respeito aos serviços de relevância pública aos direitos assegurados
constitucionalmente, promovendo medidas necessárias à garantia destes (art. 129, II, da CF).
Problematiza-se, pois, a possível ampliação do papel do Ministério Público para a defesa dos
direitos individuais homogêneos, destacando o entendimento pela possibilidade, desde que
haja relevância social para a coletividade como um todo, aferida em concreto a partir dos
seguintes critérios elencados por Mazzilli (2016): (a) conforme a natureza do dano; (b)
conforme a dispersão dos lesados; (c) conforme o interesse social no funcionamento de um
sistema econômico, social ou jurídico.
Destaca-se, também, além desse papel do Ministério Público perante o Poder Judiciário, a pró-
atividade na esfera extrajudicial para a defesa desses direitos: o exercício de atividade
fiscalizatória; a instauração de inquérito civil, de procedimento de investigação criminal, de
investigação para apurar lesão a direito individual indisponível e de investigação
administrativa para apuração de lesão a direito individual; a celebração de Termo de
Ajustamento de Conduta (TAC); e a expedição de Recomendação.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Baseando-se nas considerações expostas até então, é notável que as Políticas Públicas
ganharam força nos Estados Unidos após o período da segunda guerra mundial. Todavia, como
o nascimento destas se deu neste país, obviamente, nas outras localidades do mundo o
desenvolvimento é ainda mais recente, o que dificulta a implementação, o controle e a tomada
de alternativas.
Essa dificuldade também ficou caracterizada no fato de as Políticas Públicas envolverem uma
certa dose de multidisciplinariedade não tão bem definidas, como também de os
administradores não observarem o seu ciclo natural, além do seu controle pela população
afetada ser deveras precário.
Diante deste cenário, resta como alternativa socorrer-se do Ministério Público e do Poder
Judiciário, por meio de ações coletivas, como a Ação Civil Pública e o Mandado de Segurança
Coletivo.
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BRASIL. Lei nº 7.347/1985. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em: 23 fev.
2017.
610
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2017.
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611
SECCHI, Leonardo. Políticas Públicas: conceitos, esquemas de análise, casos práticos. São
Paulo: Cengage Learning, 2012. pp. 33-60.

612
SISTEMA PRISIONAL BRASILEIRO: UMA VISÃO DA VIOLÊNCIA
334

RESUMO
Este artigo tem como objeto de pesquisa a análise a situação das penitenciárias brasileiras, a
violência nelas ocorridas, os conflitos e pressões que impedem o indivíduo privado de
liberdade de se ressocializar. O ambiente que deveria servir para reeducação e regeneração
dos encarcerados, com o objetivo de ao final da pena serem reinseridos na sociedade, torna-se
o lugar onde o criminoso, em razão da maneira que é tratado, retorna menos apto ao convívio
social devido a inúmeras violações aos seus direitos humanos, atingindo os três aspectos
humanos:bio-psico-social. Ademais o indivíduo fica a mercê dos sistemas de regras do crime,
recebe outra pena além daquela que foi imposta pelo ordenamento jurídico, a pena do sistema
carcerário, a qual o faz perder sua dignidade princípio fundamental garantido pela
Constituição Federal da Republica Federativa do Brasil de 1988. Para isso, discutem-se, através
de uma pesquisa bibliográfica, de natureza qualitativa, as formas de violências sofridas nestes
cárceres, sobretudo a violência objetiva. Ao final, espera-se contribuir para o debate acerca do
sistema carcerário e suas finalidades frente aos direitos humanos.
Palavras-chave: Violência. Direitos Humanos. Políticas Criminais. Ressocialização.

INTRODUÇÃO
O cenário do atual sistema penitenciário brasileiro é crítico. A superlotação, ausência de
atendimento básico à saúde e a desumanização são alguns dos problemas enfrentados no
cotidiano do cárcere. Os detentos não têm apenas sua liberdade privada, sobretudo, sua digni-
dade humana. Por serem expostos as falhas na implementação na legislação nas prisões, cria-
das paralelamente ao ordenamento, causa indignação, descrédito e revolta dos detentos, que se
condicionam à organizações criminosas e muitas vezes ao acabarem de cumprir a pena im-
posta pelo Estado, estão mais violentos causando uma alta taxa de reincidência e voltas para o
crime e prisão.

A INTERDISCIPLINARIDADE PARA UMA RELAÇÃO ENTRE A SOCIOLOGIA E O DIREITO


FRENTE A VIOLÊNCIA
A interdisciplinaridade é um elo de ligação entre as disciplinas, contextualiza que ha de
comum entre vários ramos do conhecimento. Na estudo jurídico é de extrema importância,
pois integraliza as disciplinas possibilitando melhor compreensão e um conhecimento mais

Graduanda em Direito pelo Centro Universitário Salesiano de São Paulo - Unisal U.E. de Lorena/SP. Centro
334

Universitário Salesiano de São Paulo/Lorena (UNISAL) Brasil


E-mail: ivanigardin@icloud.com
613
amplo em todas disciplinas,, o aprendizado teórico através da interdisciplinaridade proporcio-
na conhecimento globalizado, gerando maior eficácia na aplicabilidade do Direito.

A violência existente na sociedade muitas vezes se dá de forma inconsciente dos indi-víduos,


pela maneira de relacionar-se e conviver. Essa violência, pode ser cometida contra os próprios
apenados, que as leis da sociedade já condenaram, em razão do desvio de sua condu-ta social.
A Organização Mundial da Saúde reconhece a violência como um grave problema de saúde
pública, além de constituir uma violação dos direitos humanos, ela representa um risco maior
para a realização do processo vital humano: ameaça a vida, altera a saúde, produz en-
fermidade e provoca a morte como realidade ou como possibilidade, a violência no sistema
prisional afeta toda a sociedade e ao ordenamento jurídico com a queda na qualidade de vida,
constante estado de alerta e dificuldade na reabilitação social.

FUNDAMENTOS TEÓRICOS DA VIOLÊNCIA SUBJETIVA, OBJETIVA E SIMBÓLICA


Do latim violentĭa, a violência é um efeito do que é violento, uma ação realizada ge-ralmente
com ira e efeito de violentar outrem ou a si, de um comportamento deliberado que pode
causar danos físicos ou psíquicos.
A violência é um fenômeno complexo, ela pode ser objeto de diversas interpretações, suas
manifestações variam de comportamentos, relações e práticas. Aspectos distintos interfe-rem
nesta variação da violência: fatores intrapsíquicos, estruturais, culturais, sócio-políticos, éticos
e outros.
A agressão para a psicanálise, é um componente da pulsão sexual, de afirmação e con-servação
do eu. É um modo da pulsão de morte, não introjetada como culpa, ou sublimada, ser
orientada para um objeto fora da psiquê, como um recurso à força ou à coerção, de modo a
causar dano físico, psicológico e ético. Para esta abordagem da psicologia, o fenômeno da vi-
olência é explica
como uma forma de desrespeito e de negação do outro".(COSTA, 1991 in: LUCINDA e ou-tros,
1999) .
Em cada período histórico revela-se, de acordo com o contexto, normas de relacio-namento
para parâmetro do que é violência naquele momento específico, pois o conceito do que é
violência varia de acordo com o tempo vivido e a regras da sociedade em determinada época.
m tipo de
negociação, que pelo emprego da força ou da agressividade visa encontrar soluções para

614
-mínio da
experiência social que permeia as brechas da crise da modernidade e a busca de al-ternativas

A consequência é que a violência transcende seu estatuto objetivo, tratável teorica-mente,


exacerbando, pois, sua faceta subjetiva, ligada ao sentimento de insegurança. Assim, ficamos
prisioneiros das sensações produzidas pela violência, não alcançamos o campo da percepção
que pretende uma decodificação das sensações necessária para a reflexão. Freud (1914/1976)
articula a violência humana ao caráter narcisista do homem. Para o engrandecido eu a
diferença, o outro, é insuportável; assim surge um desejo de aniquilamento do outro. Freud
(1930/1976).
Segundo a visão de SLAVOJ ZIZEK335, há três formas de violência: uma subjetiva e duas
objetivas: a sistemática e a simbólica. A subjetiva é aquela facilmente visível, praticada por um
agente que podemos identificar no instante em que é cometida. Essa violência geral-mente é
vista como a quebra de um fundo zero de violência. Tudo está sem violência até que o ato
violento é praticado.
Essa forma subjetiva, entretanto, deve ser compreendida juntamente com as duas ou-tras
formas objetivas:
a) a violência simbólica presente nos discursos, palavras e representações diárias na mídia, na
indústria cultural, em obras: filmes, tv, jogos, quadros, etc. A utilização da linguagem, a
atribuição de sentidos contém violências, hegemonias, traços visíveis de opressão e exclusão.
b) a violência sistêmica representada pelo jogo de relações sociais, econômicas, políti-cas e
religiosas. Em outras palavras, se a violência subjetiva é uma quebra de uma aparente
normalidade de ausência de violência, a violência objetiva sistêmica é essa normalidade. Na
ausência do ato que quebra a aparente normalidade pacífica, ela atua permanentemente.
A violência subjetiva é a parte visível, descritas em dicionários como o ato de empre-gar forças
físicas, do olhar, da má vontade, dos maus tratos, de tirar vantagem, abusar da con-fiança, de
usar de força para se conseguir que deseja. Evidentes em atos de crime e terror, exercida por
um agente identificado.
A violência objetiva é uma violência invisível, está ligada a algo que impeça de pen-sar, de
racionar, algo que cause bloqueio intelectual, é a forma mais sutil de coerção. A vio-lência
conhecida como violência sistêmica, muitas vezes passa despercebida pelos que a so-frem bem
como pelos que a praticam.
-lência não
está em ação apenas nos casos evidentes e não pode ser percebida da mesma forma que a
subjetiva. A violência simbólica, termo elaborado por Pierre Bourdieu, caracterizada por
discurso de falsas crenças que induzem o indivíduo a acreditar, a consentir e a se comportar de

335
ZIZEK, Slavoj. Violência: seis notas à margem. Trad. Miguel Serras Pereira. Lisboa: Relógio D‟Água, 2009.
615
acordo com os padrões desejados pelo Establishment.336 Para ele, tal tipo de violência se realiza
enquanto produção simbólica e instrumento de dominação e no uso da industria cultu-ral:
-nhecimento
-mentos de imposição ou
de legitimação da dominação, que contribuem para assegu-rar a dominação de uma classe
sobre outra (violência simbólica) dando o reforço da sua própria força às relações de força que
as fundamentam e contribuindo assim, segundo a expressão de Weber para a
337

A violência simbólica viola a dignidade humana e muitas vezes é mais nociva que a violência
subjetiva. Segundo SLAVOJ ZIZEK ela está situada no medo e que este medo se funda na
violência inerente à própria linguagem, que é o meio de superar a violência direta.

FORMAS DE VIOLÊNCIA QUE PODEM SER IDENTIFICADAS NAS PRISÕES BRASILEIRAS


"É bem ruim, aqui na prisão. A gente se sente humilhada. Aqui a gente tá na mão deles. Eu seria
punida se eu te falasse o que acontece aqui" J.C

O ato da prisão em si, já caracteriza-se um ato violento, no entanto, tal ato é legitimado pelo
Estado.
A violência nos presídios inicia-se com a família dos presidiários, que para a visitação de seus
entes, necessitam ficar em um fila desde a madrugada, para somente entrar somente no
horário do almoço, nos dias de chuva, caso a pessoa se molhe, não entra pois a máquina apita,
tem que estar com uma capa descartável para que a roupa não seja molhada, capa esta que é
jogada fora quando a pessoa entra. As pessoas são humilhadas, os carcerários são gros-sos com
os familiares, como se estes tivessem culpa ou fossem participes do crime cometido pelo
aprisionado.
É feito controle de toda alimentação levada ao preso, a regra é que a não pode passar de 3 (três)
quilos de comida, distribuídos em dois recipientes de dois litros e meio, só pode levar arroz,
macarronada sem muito molho, filé de frango ou carne cozida, nada que contenha osso, 500
(quinhentas) gramas de frios, caso ultrapasse é jogado fora, não chega ao preso. Os materiais
de higiene também são controlados.
A prática de revista íntima é a parte mais constrangedora, repugnante e humilhante na visita,
onde as pessoas são obrigadas a ficarem nuas e abaixarem-se três vezes de frente e de costas,
verifica-se a boca, orelha, nariz, sola pé.

336
No sentido da elite que controla social e economicamente toda a sociedade, através das instituições públicas (p.
ex.: forças policiais) ou privadas (p. ex.: meios de comunicação soci-al).
337
BOURDIEU, Pierre. O poder simbólico. Tradução de Fernando Tomaz. 6. ed. Rio de Ja-neiro: Bertrand Brasil,
2003, p. 11.
616
T.S.M.D. relata a morte de uma pessoa no dia de visita, após passar pela revista, ela infartou.
No Estado brasileiro, os Direitos Humanos figuram simplesmente argumentos, pala-vras
escritas, não implementando atitudes que respeitem a dignidade humana. Não obstante, o
Brasil tem em suas prisões as piores condições de sobrevivência do mundo, há corrupção, tor-
tura e todas as formas de violência física e psicológica, proliferação e fortalecimento das fac-
ções criminosas como o Primeiro Comando da Capital (PCC) e Comando Vermelho. O país
tem vivido um agravamento da crise do sistema penitenciário, pelo quais o sistema político do
Estado não tem acordado nenhum consenso de medidas necessárias para mudar tal situação.
Argumentos que o atual Governo usa para privatizar os presídios, embora a rebelião que
marcou o começo do ano tenha iniciado num presidio privatizado, no Complexo Penitenciário
Anísio Jobim (Compaj), em Manaus.
A superpopulação carcerária, a escalada de violência entre os internos, as práticas de abusos,
maus tratos e torturas em relação a eles, a inexistência de garantias mínimas para os
condenados e o desrespeito sistemático e institucional à legislação ordinária e aos princípios
dos direitos humanos, até mesmo o descaso aos muitos prisioneiros que ja cumpriram sua
pena, aos que não tem sentença condenatória transitada em julgado e mesmo assim
continuam encarcerados, contribuindo para esta superlotação.
Ainda que construam novos presídios, estes não serão suficientes para atender a de-manda da
superlotação, uma vez que cada prisão gera grupos criminosos formados dentro e fora das

passam mal é um sacrifício para serem socorridos, não tem enfermaria que atenda as
necessidades. Os agentes tratam os prisioneiros muito mal, com palavras de baixo calão e
adjetivos depreciantes.
A alimentarão servida é péssima, com relatos de encontrar objetos estranhos e bichos na
salada a água é da pior qualidade, chegando a ter larvas.
Os banheiros tem condições precária, é um quadrado com com um buraco no meio,
geralmente a água para o banho no verão é quente demais e no inferno fria demais.
Como em regra os presídios são super lotados, chega aproximadamente a 50 (cinquen-ta)

comunidade carcerária para descrever as beliches, tem pedras de mármore no lugar de


colchões, e é feito rodízio para dormir nelas.
Quando vem a tropa de choque, é uma pressão psicológica imensa, ela ja chega com cães
bravos, ela joga uma bomba no presidio para que os presos ja saibam que ela está la, os presos
tem que ficar sem roupas, só de cueca, e ficar abaixados, depois colocam todos presos para
fora, formando corrente e eles não podem cair, caso caia, apanha, chegava a bater nos presos

617
sem nenhum motivo, hoje não mais por intervenção dos Direitos Humanos, exceto quando há
rebelião, que ja chegam batendo.
Ainda respeito da situação carcerária, diz Camila Caldeira Nunes Dias:338
O cenário do sistema carcerário nacional , com raríssimas exceções, é o caos. Super-lotação,
condições aviltantes, falta de assistência médica, social, jurídica; insuficiên-cia ou ausência de
itens básicos para higiene pessoal (sabonete, escova/pasta dental, papel higiênico, etc.), de
uniforme, de remédios. Inexistência de quaisquer ativida-des de trabalho ou educação.
Funcionários absolutamente desvalorizados, com salá-rios baixíssimos, condições terríveis de
trabalho que geram problemas psicológicos diversos. Corrupção, tortura e todas as formas de
violência física e psicológica. Dis-crepância na relação presos/funcionários e a incapacidade de
controle da população carcerária por parte do Estado e, portanto, incapacidade do Estado de
garantir a inte-
violações de direitos humanos são perpetradas pelo próprio Estado pelas condições a que estão
submetidos esses indivíduos. A superlotação desses estabelecimentos que os obriga a
dormirem uns em cima de outros, a péssima qualidade da alimentação que muitas vezes se
assemelha à "lavagem" dada a porcos e a ausência de atendimento médico que, não raro, impõe
uma morte lenta e dolorosa a esses indivíduos, constituem-se como formas gravíssimas de
violência cometida pelo Estado, e a violência entre os presos é o efeito da sua desumanização e

quê? Querem acesso a medicamen-tos, a alimentação decente? Não cometessem crimes.


Recentemente uma reportagem da Carta Capital, para ficarmos neste exemplo, mostrou
diversas denúncias de irre-gularidades no fornecimento de alimentação, sobretudo quando ela
é terceirizada - o que vem se tornando cada vez mais comum. Assim, ao invés de permitir que
a ali-mentação seja preparada na unidade, pelos próprios presos, muitos Estados têm pre-
ferido adquirir a alimentação de empresas terceirizadas, e na grande maioria dos casos a
qualidade da alimentação é péssima, horrível, impossível comer. Só que o preso não pode

alimentação oferecida na unidade, mas, se eles a recusassem, a recusa seria interpretada como
motim/subversão da ordem e poderiam, por isso, ser penalizados. Isso é apenas um exemplo
das arbitrariedades que o Estado comete contra a população carcerária. São abusos que não
têm fim. Então, o Estado paga um valor alto por uma alimentação que muitos animais
domésticos jamais comeriam e o preso não pode reclamar, tem que aceitar aquilo. Esse
exemplo da alimentação mostra a enorme vulnerabilidade da população carcerária diante dos
desmandos dos estados que têm por dever garantir os direitos do preso durante o
cumprimento da sua sentença. O preso não tem voz. Ou melhor, a sua voz não é ouvida, ela é
siste-maticamente deslegitimada e desprezada pelos gestores, políticos, pela sociedade. Por
isso, é lucrar em cima da população carcerária, econômica ou politicamente. E, por isso,

Camila Caldeira Nunes Dias, graduada em Ciências Sociais, com licenciatura plena, mes-tre e doutora em
338

Sociologia pela Universidade de São Paulo - USP. Pesquisadora do Núcleo de Estudos da Violência - NEV, da USP.
618
muitas vezes, a violência acaba sendo o meio de comunicação do preso, o único que,

A VIOLÊNCIA INVISÍVEL NAS PRISOES

Coleridge

Não é só no corpo ou objeto que a violência deixa suas marcas, a pior violência é aquela que
violenta a psique e a dignidade humana.
Há nos presídios brasileiros uma violência que degenera, uma violência que não se vê, a
chamada violência invisível, que não permite a regeneração pois coíbe a liberdade de pen-
samento.

décadas, a um agravamento extraordinário da crise já vivida pelo sistema penitenciário


nacional desde os seus primórdios. Os termos mais amplos desse fenômeno são conhecidos
pelos governantes, pelos operadores do Direito e por parte significativa dos formadores de
opinião, o que paradoxalmente não tem agrega-do qualquer consenso em torno das

No sistema carcerário impera-se pressões de todos tipos, imperando a opressão, que


conduzem o prisioneiro a agir coercitivamente para que o cárcere não seja mais cruel ainda. O

ignoradas, fazerem parte da estrutura social e não receberem atenção da mídia, ela diz respei-
to a formação cultural.
Ligados a esta crueldade estão os severos castigos impostos à desobediência das regras

Esses castigos e privilégios são o modo pelo qual o sistema carcerário, de posi-ção vantajosa
sobre os presos, articula para impor suas regras, são formas de violências. En-tão o preso tem
suas ações condicionadas para possíveis conquistas ou prejuízos. O sistema funciona através
do castigo ou prêmio.
A estrutura atual do sistema prisional brasileiro deixou de ter a utopia da ressocializa-ção,
assume a posição de punitiva e de forma de castigar e neutralizar os presos. Maus tratos
psicológicos fazem parte da realidade do sistema prisional, o confinamento solitário, imposi-
ções religiosas, humilhações, existência de pavilhão de castigo são demonstrações de temor à
violência sistêmica e sofrimento psicológico.
A violência sistêmica, por sua vez, é a violência instalada no próprio funcionamento da
sociedade e que forma, com a simbólica, condições extremamente adversas e injustas da

619
sociedade para com a parcela mais desfavorecida de sua população. A violência sistêmica bro-
ta da prática do autoritarismo, profundamente enraizada, apesar das garantias democráticas.
tendências auto-
reguladoras do internado, o qual precisará expor novos tipos de concepções e sentimen-tos

Para Goffman, as conseqüências da disciplina no indivíduo submetido a uma institui-ção total


são de caráter negativo, agindo no sentido de anular o indivíduo. Tanto que o autor
denominou a mortificação do eu como uma das principais conseqüências na identidade do
interno. O preso perde parte de sua autonomia pois será a instituição que determinará o que
deve fazer, quando e como. O processo
poder repressor.
A prisão representou a forma mais pura e explícita desse poder da sociedade discipli-nar. Para

Porém, esse poder não se limita aos muros do cárcere, nem se identifica com uma determinada
estrutura social. Ele permeia as relações atingindo todas as instâncias da vida.
Todos os prisioneiros sofrem de alguma forma, os impactos da cultura prisional. Vi-venciando
o encarceramento, compartilham as frustrações e angústias do convívio no cárcere.

DIREITOS HUMANOS DIANTE DA VIOLÊNCIA NAS PRISÕES

Conceito de Direitos Humanos: Os Direitos Humanos são um conjunto de direitos po-sitivados


ou não que servem para o respeito a dignidade da pessoa.
Os direitos Humanos atingem seu objetivo por meio da limitação Estatal e do estabe-lecimento
de igualdade entre os indivíduos.
Para começar uma análise, vejamos a visão da ex profissional do Sistema Prisional do Estado
de São Paulo, Marcia Cristina Gonçalves de Oliveira Frassão, mestre em Psicologia pela
Universidade Federal de Santa Catarina:339
A Psicologia, ciência recente considerando seu reconhecimento profissional, aparece nas
instituições como práticas efetivas e legitimadas por Leis que demarcam o fazer dos
psicólogos. Por alguns anos fui nomeada como profissional da Sistema Prisional do Estado de
São Paulo, a partir de concurso público, e como psicóloga participava da Comissão Técnica de
Classificação, que tinha como função a avaliação dos apri-sionados para progressão de pena.
Nesse lugar de avaliadora de um sujeito consti-tuído por conteúdos de personalidade que
demarcam sua possível periculosidade, que me levou a construir um posicionamento crítico

339
Marcia Cristina Gonçalves de Oliveira Frassão, Psicóloga, texto cedido pela autora em 01/06/2016.
620
sobre as práticas "psis", dentro das instituições prisionais. Considerando a complexidade da
situação que atravessa as biografias dessas pessoas que se encontram presas, bem como sua
relação com as inúmeras condições sociais, históricas, políticas e econômicas que a questão da
cri-minalidade contemporânea e suas múltiplas formas de penalização são aqui proble-
matizadas. Constatações empíricas de quem convive com a realidade prisional, es-pecialmente
a brasileira, demonstram que a prisão é um dos grandes mecanismos disciplinares e de
controle que potencializa a marginalização, exclusão social e as relações sociais mortíficas e
degradantes. Considerando esse panorama, comprova-das pelas pesquisas, é que podemos
pensar no sofrimento imposto pela experiência do cárcere. O processo de institucionalização,
seja ele qual for, produz sujeitos transcritos por olhares que o desumaniza, onde a sentença é
mais do que sua perma-nência por algum tempo na instituição, mas sim marcas, inscrições
que tem como eixo condutor a violência, a falta de direitos, produzindo sujeitos
desumanizados. Qual caminho pode ser trilhado por quem assume o trabalho nessas
instituições? o exercício da reflexão crítica acerca do conceito de justiça e do próprio conceito
de pena, perspectiva ética dentro do que se espera de uma sociedade inclusiva e defen-sora dos

Em nível mundial existem várias convenções como a Declaração Universal dos Direi-tos
Humanos, a Declaração Americana de Direitos e Deveres do Homem e a Resolução da
Organização
Preso.
Em nível nacional, nossa Carta Magna reservou 32 incisos do artigo 5º, que trata das garantias
fundamentais do cidadão destinadas à proteção das garantias do homem preso. Exis-te ainda
em legislação específica a Lei de Execução Penal os incisos de I a XV do artigo 41, que
dispõe sobre os direitos infraconstitucionais garantidos ao sentenciado no decorrer na
execução penal.
Porém, o que tem ocorrido na prática é a constante violação dos direitos humanos e a total
inobservância das garantias legais previstas na execução das penas privativas de liberda-de. A
partir do momento em que o preso passa à tutela do Estado ele não perde apenas o seu direito
de liberdade, como também todos os outros direitos fundamentais que não foram atin-gidos
pela sentença, passando a ter um tratamento execrável e a sofrer os mais variados tipos de
castigos que acarretam a degradação de sua personalidade e a perda de sua dignidade, num
processo que não oferece quaisquer condições de preparar o seu retorno à sociedade.
Dentro da penitenciaria, dentre várias outras garantias que são desrespeitadas, o preso sofre
principalmente com a prática de torturas e de agressões físicas. Essas agressões geral-mente
partem tanto dos outros presos como dos próprios agentes da administração prisional.
Os abusos cometidos por agentes penitenciários e por policiais ocorrem de forma acentuada
principalmente após a ocorrência de rebeliões ou tentativas de fuga. Após serem dominados,
-camento que

621
acontece após a contenção dessas insurreições, o qual tem a natureza de castigo. Muitas vezes
esse espancamento extrapola e termina em execução, como no exemplar caso que não poderia

oficialmente foram executados 111 (cento e onze) presos.


Diante dos Direitos Humanos e fundamentais consagrados na ordem jurídica nacional em face
da crise do sistema prisional, a revista Falando Sério discursa:340

valores cristalizados, com a reificação das práticas e dos lugares comuns é condição para a
instauração de uma nova perspectiva que introduza efetivamente a possibilidade da
transformação. Para superar os ciclos viciosos, é preciso tratar os desiguais sociais
desigualmente, reconhecendo essa condição como determinante das suas possibilidades de
existência no mundo. Não se trata de uma desresponsabi-lização dos sujeitos pelos seus atos
perante a comunidade, mas de derivar daí que as possibilidades de responsabilização dos
sujeitos são variáveis dependentes do quan-to a sociedade efetivamente é capaz de se
responsabilizar em relação a eles. O inves-timento humano é a única resposta capaz de
produzir transformações efetivas, per-manentes e duradouras, no sentido de incrementar a
capacidade dos sujeitos em se responsabilizarem para com os demais, para com a vida na polis.
O investimento humano é a única resposta que pode trazer de volta aquele que se alienou da
sua condição de sujeito social em função das desumanidades derivadas da sua experiên-cia de
convivência social. Falar a sério em relação ao tema da crise do sistema pri-sional brasileiro
significa construir de uma política pública que rompa o paradigma radical do encarceramento
como resposta ao desvio, para produzir uma política so-cial que invista na promoção humana,
no apoio e no suporte às pessoas, efetivando novas ofertas para o fortalecimento do laço social
onde ele se encontra frágil e mais ameaçado. O Conselho Federal de Psicologia apresenta sua
contribuição ao debate por meio desse agudo documento analítico propositivo, como entidade
comprometi-da com a construção de uma cultura de direitos humanos, com a valorização da
ci-dadania e com a efetivação da democracia no nosso país, evidenciando as amplas
possibilidades de contribuição da Psicologia para o enfrentamento dos nossos graves
problemas sociais. Não é possível que o País insista na reprodução de políticas pú-blicas
sabidamente fracassadas que não apenas se mostram incapazes de enfrentar os problemas
para os quais foram formuladas mas que se tornaram elas próprias parte importante dos
problemas a serem superados. Não é possível que o Brasil siga mantendo em seus cárceres
imundos agora quase meio milhão de seres humanos preponderantemente jovens e
miseráveis, muitos deles sequer com sentença conde-natória, sem que esse resultado mobilize
a consciência nacional em direção a pro-fundas e urgentes reformas. Não é possível que
governantes, parlamentares, magis-trados e promotores sigam, em sua grande maioria,
insensíveis às tragédias que inte-gram o cotidiano prisional sem perceber que elas revelam,

FALANDO SÉRIO sobre prisões, prevenção e segurança pública -


340

para o enfrentamento da crise do si


622
mais do que o perfil dos cárceres e o de seus ocupantes, características essenciais e
vergonhosas do próprio Estado brasileiro. É preciso que o processo histórico de consolidação
da democracia no Brasil e o subseqüente protagonismo da sociedade civil possam abrir espaço
para uma ampla reforma das leis penais e para um novo caminho de política criminal que
envolva, também, um compromisso efetivo de reforma prisional orientado pelos princípios
civilizatórios .
Há de se salientar ainda que a Lei de Execução Penal em seus art. 25, 26 e 27, dispõe sobre a
assistência ao egresso, enfatizando o Art. 25, I
"A assistência ao egresso consiste:
I na orientação e apoio para reintegrá-
se a opressão dentro do presídio não permite a regeneração, torna-se impossível o preceito
legal de garantir a reintegração à sociedade do indivíduo.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
-zados para as
atividades ilícitas, uma vez que todas as oportunidades de integraç
(Goffman, 1988)

Os indivíduos que cumprem pena possuem direitos garantidos por lei específica, a Lei de
Execução Penal, no Código Penal e pela Constituição Federal de 1988. Todavia se faz ne-
cessária à efetivação destes na realidade do apenado, contribuindo para sua recuperação e
reinserção no convívio social.
O Sistema Carcerário tem caráter punitivo, pois o priva de sua liberdade. Não deve haver
distorções na função do Estado, ele não deve apenas punir, mas também fornecer apara-tos
para que estas pessoas sejam punidas e não venham a cometer novas infrações e que saiam da
prisão, respeitados pelos demais cidadãos e sejam reinseridos na sociedade.
Concluímos que o próprio sistema carcerário e que a violência invisível existente nele, é
responsável pela não reabilitação do indivíduo, pois o aliena através da violência e que há
necessidade da intervenção Estatal para que seus de Direitos H humanos e Direitos Funda-
mentais sejam garantidos dentro dos presídios.

REFERÊNCIAS
CASADO FILHO, Napoleão. Direitos Humanos Fundamentais. Alice Binchini, Luiz Flá-vio
Gomes [Coord.] Col. Saberes Do Direito, vol.57. São Paulo: Saraiva, 2012.

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CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA. FALANDO SÉRIO sobre prisões, prevenção e
segurança pública -
-
te.cfp.org.br/wp-content/uploads/2008/12/cartilha_falando_serio.pdf. Acesso em Maio de
2016.
FOUCAULT, Michel. Vigiar e Punir: nascimento da prisão. Trad: Raquel Ramalhete. Petro-
polis: Vozes, 1999.
GOFFMAN, Erving. Manicômios, Prisões e Conventos. Trad: Dante Moreira Leite. São Paulo:
Perspectiva, 1974.
MICHAUD, Yves. A Violência. São Paulo: Ed. Ática, 1989.
ROSÀRIO, Angela Buciano do; NETO, Fuad Kyrillos; MOREIRA, Jacqueline de Oliveira. [Org.]
Faces da Violência na Contemporaneidade: sociedade e clínica. Barbacena, MG: EdUEMG,
2011.
ZENAIDE, Maria Nazaré Tavares. Fundamentos Teóricos Sobre a Violência. Tv Escola, 2013.
ZIZEK, Slavoj. Violência: seis notas à margem. Trad. Miguel Serras Pereira. Lisboa: Relógio

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