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Essa dança eu vi na tv!

Patrícia Lauxen1
Angélica Vier Munhoz2

Resumo: O presente artigo é resultado da monografia realizada no final do curso de Pós-Graduação


Lato Sensu em Dança, Corpo e Arte, promovido pelo Centro Universitário UNIVATES, no período
de 2008/2009. O estudo se propôs a investigar como as crianças estão recebendo as informações sobre
dança que elas obtêm na televisão, compreendendo de que forma isso ocorre. A revisão bibliográfica
realizada possibilitou o conhecimento mais amplo sobre mídia, televisão, infância e dança na televisão,
dando a base para o estudo. O estudo, de caráter qualitativo/descritivo, teve como instrumentos de coleta
de informações entrevistas semi-estruturadas, realizadas com oito alunos de quarta série de uma escola
municipal do município de Cruzeiro do Sul, no Estado do Rio Grande do Sul.

Palavras-chave: Dança. Mídia. Televisão.

I saw this dance on tv!


Abstract: This paper is the result of the monograph accomplished at the end of the Graduate School Lato
Sensu course in Dance, Body and Art (Dança, Corpo e Arte), offered by Centro Universitário UNIVATES
over 2008/2009. The study offered to investigate how children are taking information on dance they get
from television, understanding how that happens. The bibliographic review allowed a broader knowledge
about media, television, childhood and dance on television, giving basis to the study. In this qualitative-
descriptive study, semi-structured interviews carried out with eight fourth-class students of a municipal
school of Cruzeiro do Sul municipality, in the state of Rio Grande do Sul, were used as data collection
instruments.

Keywords: Dance. Media. Television.

1 ABREM-SE AS CORTINAS!
Televisão ligada. Informações ao alcance dos telespectadores. Dança dos Famosos,
Dança das Crianças, Qual é o seu talento, Concurso de Dança, Caminho das Índias.
Telenovelas, filmes, programas de auditório, concursos, noticiários. A dança num
simples “click”. Um “click” que leva o telespectador a conhecer as diversas formas de dança
existentes. Conhecimento sobre dança em casa, no trabalho, no restaurante. Basta um
“click” e uma vasta gama de danças está à sua disposição. À disposição de uma variedade

Graduada em Educação Física/Univates; Pós Graduada em Dança, Corpo e Arte/Univates.


1

Doutora em Educação/UFRGS; Professora do Centro de Ciências Humanas e Jurídicas do Centro


2

Universitário UNIVATES/RS/BR.
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de telespectadores: crianças, adolescentes, jovens, adultos, idosos. Telespectadores que


estão recebendo as informações e analisando-as de acordo com suas experiências, suas
vivências, suas danças.

Dança e mídia. Tema que chamou a atenção após presenciar algumas cenas nas
aulas de educação física de uma escola. Após a morte do cantor Michael Jackson, os
alunos começaram a se interessar muito por ele, principalmente por sua dança. Eles
imitavam suas coreografias, assistiam aos shows, cantavam suas músicas. Essas crianças
de oito a 11 anos não são da época em que Michael Jackson era o “Rei do Pop”! O que
aconteceu para que o astro chamasse a atenção delas?

A morte do cantor Michael Jackson foi o assunto mais debatido nos canais de
televisão durante semanas após o acontecimento e esse aparecimento constante na mídia
chamou a atenção das crianças. Elas assistem televisão e conheceram a dança desse
astro pela “telinha”. Este foi o grande passo para o presente estudo: como as crianças
(público este que passa muitas horas em frente à televisão) estão recebendo essas
informações de/sobre dança da televisão? Essas informações estão sendo transformadas
em conhecimento de/sobre dança? A dança na televisão está sendo notada por estes
telespectadores?

2 COMEÇA O SHOW!
Acordar às seis horas da manhã. Tomar café assistindo ao telejornal. Fazer uma
leitura rápida dos principais acontecimentos noticiados no jornal. Ir trabalhar. Checar
os e-mails recebidos. Almoçar assistindo ao telejornal do meio-dia. Voltar ao trabalho.
Trabalhar com o rádio ligado para estar atento às novidades. Checar os e-mails. Acessar
a página de notícias do dia. Voltar para casa. Checar as ligações e mensagens do celular
realizadas e recebidas. Tomar um banho. Checar os recados no Orkut. Jantar assistindo
às telenovelas da noite. Checar os e-mails e os recados no Orkut. Dormir.

Assim anda a vida de muita gente no mundo contemporâneo. Correria, agitação,


muito trabalho, pouco descanso, muitas tarefas, poucos momentos livres, muitos
compromissos, poucos momentos de lazer e vida conectada na mídia. Televisão,
computador, celular, rádio, jornal, revista. Tudo é mídia. Tudo é tecnologia. Segundo
Kenski (2002), as mídias ou os meios de comunicação como jornal, rádio, computador
e televisão são os suportes das tecnologias de comunicação e informação que realizam
o acesso, veiculação de informações e demais formas de articulação comunicativa entre
as pessoas e todo o mundo.

As pessoas se utilizam dessas tecnologias na sua vida cotidiana e muitas vezes se


tornam dependentes disso, ou seja, elas vivem ligadas às informações da televisão, aos

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contatos pela internet e ao que acontece com maior frequência, não vivem sem o telefone
celular, pois é por meio desse pequeno aparelho eletrônico que fazem a maior parte dos
seus contatos com outras pessoas:

A menina de 12 anos, mal chega em casa, após um dia na escola (particular), e não consegue
sequer trocar de roupa: liga o computador e, olhos em brilho, conecta-se ao MSN. Em
segundos, estará em contato on line com cinco, dez, vinte amigos, a maioria dos quais colegas
com quem esteve há menos de uma hora, ao vivo. A mesma menina aguarda ansiosa o horário
da Novela das Oito: desde seu quarto, escuta a música-tema de abertura do folhetim eletrônico,
coloca-se temporariamente off line no MSN, vai até a sala, senta-se ao sofá, janta sob protestos,
está “vidrada” na tela. A seu lado, inseparável, o celular: é possível que algum torpedo chegue a
qualquer momento ou que alguém muito esperado ligue. O ouvido, de longe, continua atento
aos sinais emitidos pelas entradas de possíveis novos amigos no MSN. Hiper-conectada, isso
não a impede de conversar com a mãe, responder a perguntas sobre novidades na escola,
planejar o próximo fim de semana com o pai, a festa na noite de sexta-feira, o almoço com a
madrinha no domingo, ou combinar pelo telefone convencional a pesquisa escolar na Internet,
na casa de uma amiga (FISCHER, 2007, p. 1).

O trecho do texto de Fischer (2007) mostra que nem mesmo as crianças escapam
do grande poder que a mídia exerce sobre a vida das pessoas. Internet, MSN, Orkut,
televisão, rádio, celular. Objetos eletrônicos, instrumentos e produtos midiáticos que se
tornam parte do dia a dia de qualquer cidadão que quer estar “ligado” no mundo, que
quer estar “por dentro” dos acontecimentos e das novidades, independente de idade,
sexo, cor, raça. Todos os membros da sociedade estão expostos aos efeitos midiáticos
contemporâneos sendo estimulados a “consumir” esses produtos que lhes são colocados
à disposição.

Sim! Consumir esses produtos, pois a cultura da mídia é uma forma de cultura
comercial e seus produtos são mercadorias que buscam atrair lucro. A mídia produz
conceitos, modas, atitudes, crenças, valores, símbolos, tratando de assuntos relativos à
vida cotidiana para atrair a atenção das pessoas e vender seus produtos:

Contudo, em certo sentido, a cultura da mídia é a cultura dominante hoje em dia; substitui
as formas de cultura elevada como foco da atenção e de impacto para grande número de
pessoas. Além disso, suas formas visuais e verbais estão suplantando as formas da cultura
livresca, exigindo novos tipos de conhecimento para descodificá-las. Ademais, a cultura
veiculada pela mídia transformou-se numa força dominante de socialização: suas imagens
e celebridades substituem a família, a escola e a Igreja como árbitros de gosto, valor e
pensamento, produzindo novos modelos de identificação e imagens vibrantes de estilo, moda
e comportamento (KELLNER, 2001, p. 27).

São imagens e figuras que a cultura da mídia coloca à disposição e com as quais
as pessoas podem se identificar, utilizando-as de modelo para sua vida, imitando-as.

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Assim, ela acaba por exercer efeitos socializantes e culturais por meio destes modelos
que se criam: modelos de papéis, sexo, atitudes e comportamentos.

Muitas pessoas tomam como verdades absolutas aquilo que veem na mídia,
construindo sua identidade por meio dessas verdades, acreditando ser o melhor para
si. São simbolismos produzidos pela mídia com os quais as pessoas de identificam e se
afirmam como pessoa. De acordo com Thompson citado por Gallardo e Sborquia (2002),
em todas as sociedades os seres humanos utilizam-se da produção e do intercâmbio de
informações e de conteúdos simbólicos. Isso faz parte da vida social. Utilizar-se das
informações que a mídia oferece e apropriar-se das verdades e dos modelos que ela cria
faz parte da vida das pessoas.

3 “CLICK” DE OLHO NA “TELINHA”


Mídia. Televisão, computador, celular, rádio, jornal, revista. Televisão. Este é o
meio midiático que está mais presente nos dias de hoje, tanto nas casas quanto nos
locais de trabalho dos brasileiros. A televisão é o mais popular e por isso os poucos
momentos de lazer que os brasileiros se permitem vivenciar são, na maioria das vezes,
em frente à televisão. E nesses contatos com a televisão, as pessoas recebem informações
e estabelecem relações lidando com a possibilidade de construção de significados a partir
das informações obtidas:

A mídia televisiva como tecnologia de comunicação e informação invade o cotidiano e


passa a fazer parte dele. Não é mais vista como tecnologia, mas como complemento, como
companhia, como continuação do espaço de vida das pessoas. Por meio do que é transmitido
pela televisão, as pessoas adquirem informações e transformam seus comportamentos.
Tornam-se “teledependentes”, consumidores ativos, permanentes e acríticos de tudo o que é
oferecido pelo universo televisivo (KENSKI, 2002, p. 1).

A televisão passou a fazer parte da composição das famílias. De acordo com a


Pesquisa Nacional por Amostragem de Domicílios (PNDA), realizada pelo Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) no ano de 2005, 93% dos domicílios
do Brasil possuem televisão. Apenas 7% de toda a população do país não possuem
este eletrodoméstico em suas casas (INSTITUTO..., 2005). É um percentual muito
significativo, que mostra que a grande maioria dos brasileiros possui este meio de
comunicação em suas casas.

Magalhães (2008) relata que durante seu estudo, em que foram visitadas casas de
famílias de uma cidade do interior do Rio Grande do Sul, encontraram um número
significativo de aparelhos de televisão, em média três em cada unidade doméstica.
Aparelhos grandes e sofisticados em diversos lugares das casas: na sala de estar, na sala

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de TV, nos quartos, na cozinha e até mesmo no banheiro. Isso mostra como as pessoas
dão importância para a televisão dentro de suas casas e também nas suas vidas. Além de
ser um eletrodoméstico muito cobiçado, elas se inspiram nos artistas mais “badalados”
para se vestir, para mudar o visual como o corte de cabelo, falam as gírias que surgem
nas telenovelas, fazem a dieta que apareceu no Programa da Ana Maria Braga e assim
por diante:

As pessoas assistem com regularidade a certos programas e eventos; há fãs de várias séries e
estrelas com um grau incrível de informação e conhecimento sobre o objeto de sua fascinação;
as pessoas realmente modelam comportamentos, estilos, atitudes pelas imagens da televisão;
os anúncios por ela veiculados de fato desempenham certo papel na manipulação da demanda
do consumidor (KELLNER, 2001, p. 303).

A televisão tem a preocupação de produzir algo atrativo para as pessoas, para que
elas possam assistir a um determinado programa e se identificar diante de alguma
situação. As novelas, por exemplo, na maioria das vezes retratam a vida de pessoas de
diversas classes sociais, diferentes realidades de famílias, algumas bem estruturadas
outras não, com problemas com filhos adolescentes, casais que se separam, casais
que casam e constituem lindas famílias, casais homossexuais, pessoas que sofrem
preconceitos (negros, pessoas com necessidades especiais, homossexuais), pais que
sofrem com filhos usuários de drogas, adolescentes rebeldes ou com dificuldades de
socialização, enfim, casos da vida diária dos brasileiros. Dessa forma, a novela abrange
um público diversificado, pois seus assuntos são atrativos para todas as classes sociais e
para todas as faixas etárias.

4 PROTAGONISTAS DE SHOW
Discovery Kids, Nickelodean, Cartoon Network, TV globinho, TV Xuxa, Malhação,
Computador, Orkut, MSN, The Sims, Mp3, Mp4, IPod, Playstation, celular. Atrativos
midiáticos para crianças e adolescentes. Programas e objetos eletrônicos cada vez mais
consumidos por este público em questão.

Muitas crianças, ainda na sua mais tenra idade, não têm mais na sua lista de
presentes as bonecas, os carrinhos, um jogo para jogar com os amigos ou os brinquedos
do momento. Eles querem um celular, um Mp3, um Playstation ou um computador. A
vida atrelada aos meios midiáticos já afetou as crianças. Atualmente, os pais têm dado
preferência em deixar os filhos dentro de casa, assistindo televisão, jogando videogame,
ou utilizando o computador, pois acreditam que dessa forma estarão mais seguros e
protegidos da violência, da criminalidade e do perigo das ruas.

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Essa é a realidade do mundo contemporâneo, segundo Maciel e Nascimento (2004,


p. 1) “crianças mais sedentárias e envolvidas com brincadeiras e jogos eletrônicos. Um
mundo virtual e midiático. No Brasil, adolescentes passam cerca de cinco horas por dia
diante da televisão”. A televisão passou a fazer parte da infância. Não há como negar
que nos dias de hoje, um dos públicos que mais dá audiência são as crianças, pois elas
passam muitas horas por dia assistindo televisão:

A pesquisa realizada pela Eurodata TV Worldwide analisou os hábitos de crianças de 4 a 11


anos em nove países. As brasileiras consomem uma média de 3h e 31min por dia de televisão,
enquanto nos EUA a média é de 3h e 16min. Ainda segundo a pesquisa, os resultados nos
países variam também de acordo com o tempo que as emissoras dedicam à programação
infantil e à penetração da TV por assinatura que possui canais 24h só para crianças (MOURA,
2010, p. 1).

As pesquisas e estudos realizados no mundo estão mostrando essas modificações


no modo de viver a infância, nas mudanças das brincadeiras e atividades diárias e na
importância que as crianças e adolescentes estão depositando nos meios midiáticos:

Meio rural, próximo da Capital gaúcha, ambiente externo, assentamento de agricultores do


MST, atores jovens de camadas populares. O grupo de três adolescentes (duas meninas e um
menino) acaba de sair da escola de Ensino Médio, uma escola pública estadual: todos portam
seus celulares, não se cansam de consultar se há nova mensagem, se alguém ligou durante
o tempo “silencioso” do aparelho, quando estavam em aula. Andam rápido, está quase na
hora da novela adolescente Malhação. Como estará a personagem gordinha, o galã que todas
desejam, a menina que vai fazer um teste para modelo? E a personagem de 16 anos que ficou
grávida? O mundo deles está e ao mesmo tempo não está lá. Identificação e crítica se mesclam.
Os que têm computador em casa também se apressam, pois há possibilidade de saberem de
novidades no Orkut: quantas pessoas terão acessado sua página? Não seria melhor mudar
algum dado do profile? Quem sabe acrescentar uma foto ao álbum? E, claro, imediatamente
clicar no scrapbook e ver as desejadas mensagens que lhe foram enviadas? Ou então entrar
na página de um amigo e mandar a ele ou a ela aquilo que “só” pode ser dito ali, naquele
privilegiado espaço digital? É preciso apressar-se. Mas há tempo também, muito tempo, para
rir, chorar, comentar um desacerto com a professora, uma discussão com o pai ou a mãe, a
pesquisa que precisam entregar depois de amanhã, ou então procurar a menina ou o menino
desejados, nem que seja só com o olhar, na rua ao lado. Ideários do Movimento Sem Terra
misturam-se sem distinção a sonhos de consumo e práticas com tecnologias digitais. O tempo
é curto, o tempo é imenso, cabe tudo nele para esses jovens (FISCHER, 2007, p. 1).

A citação acima é um retrato do dia a dia de muitas crianças atualmente. O tempo


todo estão “ligados” às tecnologias a que têm acesso e ao mundo virtual que criam para
si, como seu perfil do Orkut, Msn ou E-mail. Acabam muitas vezes permanecendo mais
tempo nesse mundo virtual do que no seu mundo social, diante da família e amigos.
Buckingham (2000) relata que, atualmente, em todas as sociedades industrializadas e
em países em desenvolvimento, as crianças têm passado mais tempo na companhia dos
meios de comunicação do que com seus familiares, professores e amigos. As crianças

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parecem estar cada vez mais vivendo “infâncias midiáticas”, em que suas experiências
diárias são repletas de narrativas, imagens e mercadorias produzidas pelas grandes
corporações globalizadas de mídia. É possível dizer que hoje o próprio significado
da infância nas sociedades contemporâneas está sendo criado e definido por meio das
interações das crianças com as mídias eletrônicas.

5 IMAGENS EM MOVIMENTO
Dança. Uma forma de comunicação e manifestação cultural que surge nos
primórdios da vida humana. Antes mesmo de utilizar as palavras, o homem primitivo
já se servia do movimento corporal para manifestar as suas emoções, da mesma forma
que se utilizava da dança para marcar os acontecimentos importantes da vida cotidiana,
como o nascimento, casamento, morte, caça, guerras, iniciação dos adolescentes,
doenças, cerimoniais tribais, vitórias, paz, estações do ano, sementeira, colheita, festas
do sol, da lua e da fertilidade (FAHLBUSCH, 1990).

Uma dança envolve valores, envolve cultura. Para entender uma dança, é preciso
entender o meio cultural no qual ela está inserida, os movimentos dançados contam
histórias, apresentam problemas ancestrais, místicos ou mesmo de origem urbana
contemporânea. Dança de salão, dança de rua, dança do ventre, danças folclóricas, dança
clássica, jazz, dança moderna, dança contemporânea, sapateado, dança aeróbica, dança
do créu, dança rebolation, dança da cordinha, dança da garrafa, dança do quadrado,
dança do entope e desentope, dança da gordura, dança da galinha, dança da bundinha.
São muitas as danças que surgem nas telas da TV.

A televisão atualmente proporciona diversos momentos em que essas inúmeras


danças, ou melhor, manifestações corporais e culturais aparecem. Dentro da
programação dos diversos canais da televisão aberta há muitos quadros, concursos e até
mesmo novelas que trazem a dança. Dança dos Famosos, Dança das Crianças, Ballet do
Faustão, Caminho das Índias e Tempos Modernos (Rede Globo), Qual é o seu talento, Dança
da esteira e Concurso de Dança (SBT), Escorregão Musical e Debaixo do Chuveiro (Rede
Record), Talentos Infantis, Dance, Dance, Dance, Jovens Talentos e Você faz o show (Band).
Telenovelas, filmes, programas de auditório, concursos, noticiários, propagandas. É a
dança num simples “click”. A dança ao alcance de todos por meio da tela da televisão.

A dança na televisão não é um fato recente. Vem de muitas décadas. Desde as


danças das chacretes no Programa do Chacrinha, na década de 1960, passando por
várias novelas que mostravam cenas de dança como Dancin Days (1978), Rainha da
Sucata (1990), Explode Coração (1995), até os concursos de dança que acontecem
atualmente em programas de auditório:

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A dança vem participando deste processo de midiatização via televisão desde o seu advento
no Brasil. Das antológicas performances de Rita Cadillac, na Buzina do Chacrinha, às
antigas coreografias da abertura do Fantástico, ou ainda da Dança da Galinha Azul, que o
apresentador Gugu Liberato ensinava no programa Viva a Noite e que expressa nos versos da
música a febre na qual a coreografia se transformou: “De Leste a Oeste, de Norte a Sul / A
onda é a dança da galinha Azul” (SANTOS, 2005, p. 77).

Por intermédio desses programas, é possível conhecer muitos trabalhos de dança de


diversos estilos, com pessoas de todas as idades e de vários cantos do país. É uma forma
de acessar conhecimento sobre dança. A televisão tem este poder de levar diversão,
entretenimento, conhecimento e cultura até as pessoas, dentro de suas casas:

Daniel Filho, ator, diretor e produtor, chama a televisão de circo eletrônico, por considerar
que é do circo que a televisão retira suas características de grande show de variedades pelo
qual desfilam curiosidades, personalidades, músicos e verdadeiros mágicos do entretenimento
(COSTA, 2005, p. 128).

Assistir a um espetáculo de dança nem sempre é possível, pois requer certo


investimento financeiro, muitas vezes os locais das apresentações são distantes sendo
necessário um deslocamento e também nem sempre temos à disposição espetáculos de
dança em nossas cidades. A televisão, nesse sentido, facilitou e facilita o acesso à dança
e a diferentes danças, pois é possível ter este contato na sua própria casa.

Além disso, a dança presente na televisão, nos programas de auditório, telenovelas,


filmes, shows, entre outros, faz com que muitas pessoas tenham interesse em aprender
determinado tipo de dança, sendo estimulados por aquele programa na televisão,
buscando experiências e vivências práticas de dança. Nesse sentido, a televisão pode ser
um instrumento positivo no estímulo da prática dessa arte corporal tão rica de cultura
e movimento.

6 PASSOS COREOGRAFADOS
Por meio de pesquisa qualitativa, o estudo produziu dados descritivos, que foram
abordados subjetivamente, observando em cada um deles a significância quanto ao
problema levantado, sem haver preocupação com generalizações e em quantificar os
resultados.

Participaram do estudo oito alunos de quarta série de uma escola municipal do


Município de Cruzeiro do Sul, no Estado do Rio Grande do Sul, dentre eles quatro
meninos e quatro meninas, todos com idade de 10 e 11 anos. A seleção desses estudantes
se deu pelo fato de serem alunos de educação física da pesquisadora e também pelo

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fato de serem alunos que nunca participaram de uma aula de dança; dessa forma, suas
experiências com dança eram de outras formas.

A coleta de informações foi realizada por meio de entrevistas semiestruturadas


com perguntas abertas, previamente agendadas com os participantes, totalizando oito
entrevistas. Esse instrumento possibilitou que o entrevistador tivesse maior liberdade
e flexibilidade durante a entrevista, podendo direcionar as questões obtendo, assim,
informações mais profundas.

As entrevistas realizadas foram gravadas, transcritas literalmente e organizadas em


unidades de significados, por meio das categorias de análise, fornecendo uma melhor
compreensão das informações obtidas. Durante todo o processo de pesquisa, foram
utilizados nomes fictícios para cada participante, garantindo o sigilo das informações e
preservando a identidade dos participantes.

7 FECHAM-SE AS CORTINAS...
O estudo mostrou que essas crianças atualmente estão muito ligadas à televisão.
Os momentos de lazer delas crianças são ocupados basicamente por brincadeiras com os
amigos mais próximos de suas casas, algumas atividades domésticas e assistir televisão.

Este “assistir televisão” também não é orientado, ou seja, elas assistem com diferentes
pessoas da família e às vezes sozinhas, escolhendo elas mesmas os programas desejados,
inclusive programações que não são recomendadas para crianças, como as novelas. Essas
crianças mostraram um interesse muito grande pelas novelas, todas relataram assistir
todos os dias. São crianças de 10 e 11 anos que nem poderiam estar vendo novelas, pois
geralmente a faixa etária permitida para essa programação é a partir dos 12 anos. Mas
sabe-se que no Brasil as novelas são campeãs de audiência, é uma rotina muito comum
nas famílias brasileiras sentar-se à frente da televisão para assistir à novela. A família
toda se reúne, inclusive as crianças.

A fala das crianças também trouxe elementos importantes sobre o instrumento de


divulgação da dança que é a televisão. Elas contaram que muitas das danças que elas
conhecem, tiveram acesso pela tela da televisão. Essa parece ser uma questão significativa,
pois apreciar uma dança pela TV é importante, tem seu valor, pois é conhecimento da
arte, da cultura, muitas vezes serve inclusive como forma de aprendizado de uma dança,
quando as pessoas tentam imitar determinados movimentos por meio da visualização,
mas vivenciar a dança na prática é uma atividade que deveria estar presente no cotidiano
dessas crianças, em especial na escola.

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Também surgiram, durante o estudo, questões sobre o estímulo da televisão para a


busca da prática da dança. Os participantes contaram que muitas vezes, quando assistem
às danças na televisão, sentem vontade de aprender, acham os movimentos bonitos e
sentem o desejo de aprender a realizar aqueles movimentos.

O estudo, de modo geral, mostrou que essas crianças têm percebido as danças que
estão surgindo na televisão e também têm sido estimuladas a vivenciarem na prática
essas danças, porém, não estão tendo essa oportunidade. Faltam iniciativas políticas ou
até mesmo educativas no contexto onde estão inseridas para que tenham acesso à dança.

As cortinas se fecham, mas ainda permanecem muitas dúvidas sobre como essas
crianças podem ter acesso à dança, como a vivência prática da dança pode chegar até
elas, que estão vivenciando a dança pela televisão.

REFERÊNCIAS

COSTA, Cristina. Educação, imagem e mídias. São Paulo: Cortez, 2005.

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