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25/9/2014 Ordem dos Advogados - Pareceres do CDLisboa - Procuração forense

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PARECERES DO CDLISBOA

Procuração forense

1 – A Senhora Advogada, Dr.ª... solicitou em 4 de Março findo um Parecer a este Conselho Distrital, com base nos seguintes factos:

a) Deslocou-se ao Governo Civil para tratar da obtenção de dois passaportes relativos a Clientes seus e, para além de estar munida de todos os documentos necessários, estava
igualmente habilitada com uma procuração passada a seu favor e destinada àquela finalidade, sendo mandantes os seus citados clientes;
b) A sua pretensão foi recusada com base no facto de, segundo o funcionário atendedor, a revalidação de passaportes poder ser apenas tratada pelo próprio interessado ou, em
alternativa, por uma agência de viagens; neste último caso, ao abrigo do disposto no art. 23.° do Dec.-Lei n.° 438/88, de 29 de Novembro;
c) Perante o exposto, pretende a Senhora Advogada consulente saber a opinião deste CDL.

2 – Como primeiro ponto assente e irrefutável, temos que, ao abrigo do art. 23.° do Dec.-Lei n.° 438/88, de 29/11, as agências de viagens e turismo, legalmente constituídas e
registadas, podem intervir directamente na obtenção de passaportes de outrem.

3 – Igualmente pacífico é que o interessado directo possa intervir no procedimento administrativo gracioso, com vista à satisfação do seu interesse (in casu, a obtenção de
passaporte); vide, para tanto, os art.s 52.° a 54.° do Código do Procedimento Administrativo.

4 – Todavia, o cerne da questão situa-se em saber se um mandatário do interessado pode substituí-lo na pretensão em causa ou seja, no pedido de obtenção de passaporte em nome
deste, o mandante. E, em particular, terá também de averiguar-se se isso é possível a um mandatário judicial.

5 – Como é sabido, a representação é a situação jurídica em que uma pessoa pode legitimamente agir em nome e no interesse de outra, para que na esfera jurídica desta se
produzam os respectivos efeitos (art. 258.° do Código Civil). Na representação, o representante age em nome do representado quando está na posição deste, tudo se passando como
se fosse o representado a actuar. Diferentemente, o representante age no interesse ou por conta do representado quando a sua actuação visa prosseguir interesses deste; o
representante é obrigado a actuar e a decidir, não se limitando a transmitir uma decisão alheia, situação em que se estaria perante a figura do núncio.

6 – De acordo com o critério da fonte donde provêm os poderes representativos, a representação (não se confunde com a gestão de negócios, pois nesta há alguém a actuar em nome
e por conta do dono do negócio sem, contudo, aquele possuir poderes representativos) pode ser:

a) Legal, quando os poderes são conferidos por lei; são os casos, por exemplo:
- Pais, tutores, protutores, curadores e Representantes do Ministério Público, quanto aos incapazes;
- O cônjuge, nos casos previstos nos art.s 1678.°, n.° 1, alínea f) e 1679.°, ambos do Código Civil;
- Os administradores de falências e de insolvências;

b) Voluntária, quando os poderes representativos são conferidos pela vontade do representante através dum acto unilateral chamado procuração (art.s 262.° e 263.° do Código Civil
e art. 125.° do Código do Notariado.

7 – A procuração confere poderes representativos, mas não obriga o seu destinatário a usá-la; por isso costuma ser elemento de contratos. É o caso do mandato (art.s 1157.° e segs.
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25/9/2014 Ordem dos Advogados - Pareceres do CDLisboa - Procuração forense
do Código Civil o qual, aliado a uma procuração, toma o nome de mandato civil com representação, ou mandato representativo (art." 1178.° e 1179.° do Código Civil; o seu
equivalente comercial é o mandato comercial, regulado pelos art.s 231.° a 265.° do Código Comercial. Neste tipo de contratos, os actos praticados pelo mandatário produzem
efeitos na esfera jurídica do mandante e são realizados em nome deste.

8 – Embora não interesse para o caso aqui em análise, acrescenta-se, a título de esclarecimento, que o mandato civil sem representação está consagrado nos art.s 1180.° a 1184.° do
Código Civil, designando-se o seu equivalente comercial por contrato de comissão, regulado pelos art.— 266.° a 277.° do Código Comercial.

9 – Em face do exposto de "5" a "7" do presente parecer e circunscrevendo-nos ao seu objecto, qualquer pessoa munida da respectiva procuração que confira poderes suficientes para
o acto, pode representar qualquer interessado (a) na obtenção do competente passaporte.
10 – E o que dizer, acerca dos Advogados e Solicitadores? Dentre variadas normas da nossa Ordem Jurídica, o mandato judicial é abordado nos seguintes preceitos legais:
- Art.s 20.°, n.° 2 e 32.°, n.° 3 da Constituição da República Portuguesa;
- Art. 62.° do Código de Processo Penal;
- Art.s 32.°, 34.° e 60.° do Código de Processo Civil;
- Art. 10.° do Código de Processo de Trabalho;
- Art. 5.°, 26.°, n.° 1, 104.°, n.° 2 e 132.°, da Lei de Processo nos Tribunais Administrativos;
- Art. 7.° do Código de Processo Tributário.

11 – Ora, o mandato judicial só pode ser exercido por:

a) Advogados e Advogados Estagiários com inscrição em vigor na Ordem dos Advogados, conforme preceitua o n.° 1 do art. 53.° do Estatuto da Ordem dos Advogados, aprovado pelo
Dec.-Lei n.° 84/84, de 16 de Março;
b) Solicitadores, com as limitações da lei de processo, de acordo com o n.° 3 do art. 53.° daquele Estatuto e igualmente de acordo com o previsto no Estatuto dos Solicitadores.

12 – Isto significa existirem diversos actos técnico-jurídicos que legalmente só podem ser exercidos por pessoas e entidades profissionalmente habilitadas para tal, pelo que o
exercício do mandato judicial (e, igualmente, a consulta jurídica e a procuradoria jurídica) fora dos casos regulados por lei é ilegal e criminoso sendo, por conseguinte, punido por
lei (art. 358.° do Código Penal), dado integrar a prática do crime de usurpação de funções.

13 – Todavia, o mandato judicial não se aplica ao caso ora em análise, já que se trata de obter um determinado fim (renovação de passaporte) estranho àquele. Por conseguinte, de
duas, uma:

a) Ou a Senhora Advogada consulente estava munida de procuração com poderes para renovar o passaporte dos seus Clientes;
b) Ou estava na posse de mera procuração forense que, por si só, não tem a virtualidade de lhe conferir poderes para renovar passaportes.

Conclusões:
A – Qualquer pessoa, munida da respectiva procuração que confira poderes suficientes para o acto, pode representar qualquer interessado (a) na obtenção ou renovação do
competente passaporte.

B – A simples procuração forense não confere, por si só, poderes para os fins em causa.

C – Porque se desconhece o conteúdo da procuração de que a Senhora Advogada consulente estava munida, o presente parecer terá de ser, obviamente, inconclusivo.

Relator: Rui Correia de Sousa

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