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A Romancista

Alina Paim

GILFRANCISCO

Edições GFS
GILFRANCISCO

Copyright 2007, by GILFRANCISCO


Rua Laguna, 42 (casa) Conjunto Beira Mar – I, bairro Atalaia
Telefone (79) 3248-4239 – Aracaju – Sergipe – Cep. 49037-730
Site: www.gilfrancisco.tk
E-mail gilfrancisco.santos@gmail.com
Revisão: Antonio Carlos Oliveira Barreto e Nadja Cruz
Editoração: Paulo Afonso Cardoso da Silva
Impressão: Polikromia Gráfica e Editora Digital – (79) 3213-0778
Edições GFS

Ficha elaborada Cleilde Melo Sousa – CRB-5/1088

G473g GILFRANCISCO.
A Romancista Alina Paim / GILFRANCISCO.
Aracaju: Edições GFS: 2008.
95 p. ilust.
1. Literatura Sergipana – ensaio.
2. Biografia. 3. Crítica Literária. I Título.

CDU 821.134.3(813.7) - 4
292

Impresso em agosto de 2008


Aracaju/Sergipe

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A Romancista Alina Paim

Ao poeta amigo
Antonio Carlos de Oliveira Barreto

Para Núbia Marques (in memoriam)

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GILFRANCISCO

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A Romancista Alina Paim

De repente - eu
com toda a força brilho -
e de novo o dia nasce.
Brilhar sempre,
brilhar em toda a parte,
até ao dia em que a fonte da vida se esgote,
brilhar -
e é tudo !
É o nosso lema - meu
e do sol!

Vladimir Maiakóvski
(1893-1930)

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GILFRANCISCO

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A Romancista Alina Paim

Agradecimentos:

Ana Carla Loureiro


Jornalista

Ana Maria Fonseca Medina


Memorial do Poder Judiciário do Estado de Sergipe

Antônio José Nascimento


Professor da UFS

Antônio Paim
Professor e Filósofo

Célio Nunes
Jornalista e contista

Cleones Gomes dos Santos


Historiador e Professor da UVA

Eneida Marques
Filha da escritora Núbia Marques

Gustavo P. Bomfim
Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe

Iara Carmen e Graça Cantalino


Fundação Clemente Mariani

Jackson da Silva Lima


Historiador e Folclorista sergipano

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GILFRANCISCO

Luiz Antonio Barreto e Cristina Cavalcante


Instituto Tobias Barreto de Educação e Cultura – Pesquise

Milton Sobral
Arquivo Público do Estado de Sergipe

Monique Nascimento Ramos


Acadêmica do curso de Letras

Paulo Afonso Cardoso da Silva


Jornalista

Pedrinho Santos
Biblioteca Epifânio Dória

Raquel Fábio
Fundação Biblioteca Nacional

Roseane Leal Nascimento


Pesquisadora

Teresa Paim
Filha da escritora Alina Paim

Wagner Ribeiro
Poeta sergipano

Waldir Freitas Oliveira


Conselho Estadual de Cultura/ Bahia

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A Romancista Alina Paim

S U M Á R I O
Apresentação
A Romancista Alina Paim * Gilfrancisco

Entrevistas
Leitura Descobre uma Professora * Melo Lima
A Redescoberta de Alina Paim * Gilfrancisco

Julgamento Crítico
Estrada da Liberdade * Ascendino Leite
Na Estrada da Liberdade * Santos Morais
Um Livro de Combate * Reginaldo Guimarães
Apresentação “Simão Dias” * Graciliano Ramos
Novo Romance de Alina Paim * Oswaldo Alves
Alina Paim * Zózimo Lima
A professorinha de Estância já
tem história literária * Barboza Mello
Prefácio “O Sol do Meio-Dia” * Jorge Amado
Alina Paim é só romancista * Valdemar Cavalcanti
A Mulher e seus Símbolos * Núbia Marques
Prefácio “A Sétima Vez” * Núbia Marques

Síntese Biográfica

Obras Publicadas

Fortuna Crítica

Subsídios Biográficos

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A P R E S E N TA Ç Ã O
GILFRANCISCO

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A Romancista Alina Paim

A Romancista Alina Paim


GILFRANCISCO

Silenciosa, talentosa e paciente, essa romancista sergipana, deficiente visual


aos 89 anos, construiu seu mundo sem pressa, jamais se desligou do interesse humano,
do sentido político e social de suas histórias e de seus personagens. Apesar das
opiniões favoráveis a sua obra que mereceram da crítica nacional e internacional, a
colocando na altura das melhores romancistas da sua geração, seu nome está injusta-
mente excluído dos compêndios literários brasileiros. Muitos desses intelectuais
militantes, a exemplo de Enoch Santiago Filho, Renato Mazze Lucas, Jacinta Passos
e a própria Alina Paim foram também silenciados pelo Partido, apesar de terem sido
beneficiados da rede de relações construída no seu itinerário.

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Gênero literário em prosa, relativamente longo, o romance é caracterizado
pela narrativa de acontecimentos fictícios, mas geralmente verossímeis, relaciona-
dos a uma ação centrada num enredo, na análise de personagens ou no exame de
uma situação. Entendido como sucedâneo do poema épico, o romance moderno
tem raízes nos romances de cavalaria, mas só se configurou como hoje o conhece-
mos no século XVIII, tendo por precursores entre outros, o abade Prévost (Ma-
non Lescaut, 1731) e Henry Fielding (Tom Jones, 1749).
Ciente de sua vocação literária e disposta a seguir a trilha, Alina Paim
optou pelo romance, não se deixou tentar pela atração do conto, nem da crônica,
nem mesmo de artigo para jornal. Seu interesse maior e único o romance. Mesmo
tendo estreado aos 23 anos, o tempo lhe assegurou o necessário capital de expe-
riência e observação, indispensáveis para todo romancista. O romance tem em
Alina Paim a mão que o denuncia de todos os segredos e violências, explorando-
o em cada ângulo difícil sem restringi-lo à mera análise superficial, exigindo assim
do crítico que a estuda um esforço vital, um reconhecimento de nuances, amplian-
do sua visão de autora consciente e politizada.
Alina dá a medida exata, a atualização essencial da narrativa romanesca,
um sentido de concepção nova na caracterização dos personagens, onde os confli-
tos interiores surgem à descoberta inteiramente vigiada pelos seus equilíbrios de
narradora onisciente. Alina é uma romancista que escreve com naturalidade, conta
a sua história com um gosto e emoção crescente, conseguindo captar o que há de
duradouro e de eteno na criatura humana. Denunciando a história de várias criatu-
ras, cujos pequenos dramas ganham enormes proporções, porque exprimem toda
espécie de mutilação de uma sociedade rural, como no romance Simão Dias.
Alina Leite Paim nasceu na cidade de Estância, (68 km de Aracaju) berço
da imprensa sergipana, a 10 de outubro de 1919, filha de Manuel Vieira Leite e de

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GILFRANCISCO

Maria Portela de Andrade Leite, ambos sergipanos. Com três meses de idade mudou-
se com os pais para Salvador. Ao perder a mãe, foi para Simão Dias (SE), morar na casa
dos avós paternos, onde sofreu muito com a rigorosa educação dos parentes, princi-
palmente pelas constantes e severas repreensões das três tias solteironas. A severa
educação que recebera nesses primeiros anos, de certa forma contribuiria para sua
aprovação em 1932, no primeiro ano do curso fundamental com distinção nos exames
de suficiência do Colégio Nossa Senhora da Soledade, em Salvador.
Simão Dias foi um celeiro político-econômico de grandes e influentes famí-
lias que marcaram toda a história de Sergipe. Ali, Alina fez os estudos preliminares
na Escola Menino Jesus e dos sete aos dez anos, freqüentou o Grupo Escolar
Fausto Cardoso, da Praça da Matriz, onde recebe formação religiosa e participa de
diversas atividades relacionadas à expansão do catolicismo. Parte de sua infância
e adolescência serviu de cenário e título para o seu segundo romance, escrito nos
meses de agosto a dezembro de 1946. Mudou-se outra vez para Salvador e conti-
nuou seus estudos no colégio Nossa Senhora da Soledade. Aos doze anos passou
a escrever para o jornalzinho do educandário de freiras, onde se formou como
professora e trabalhando depois numa escola da Estrada da Liberdade, hoje um
dos bairros mais populosos de Salvador.
Casou-se em 1943, com o médico baiano Isaías Paim e mudou-se em
seguida para o Rio de Janeiro, onde reside com uma de suas filhas. Como na época
não conseguisse trabalho, foi ensinar na Escola para filhos de pescadores, na Ilha
de Marambaia. Aí escreveu seu primeiro romance, Estrada da Liberdade, publica-
do em fins de 1944, com enorme repercussão nos meios literários e de público,
esgotando-se em quatro meses a primeira edição.
Como seu diploma de professora somente era válido dentro dos limites do
Estado da Bahia, encontrou-se, de súbito, sem profissão definida. E, a convite de
Fernando Tude de Souza, diretor da Rádio do Ministério da Educação e Cultura
- MEC, começou a escrever para o programa infantil “No Reino da Alegria”,
dirigido por Geni Marcodes. Para esse programa, colaborou entre 1945 a 1956,
escrevendo para crianças e adolescentes. Desde sua chega ao Rio de Janeiro, Alina
participou ativamente da vida literária do País, publicou quase dez romance e
quatro obras infantis, alguns de seus romances foram editados na Rússia (1957),
China (1959), Bulgária (1963) e Alemanha (1968).
Em 1944, a jovem Alina Paim se dirigiu a Barboza Mello, ligado ao Partido
Comunista, então diretor da Editora Leitura, levada pelo jornalista Osvaldo Alves
para entregar os originais do livro Estrada da Liberdade, e durante esse primeiro
contato, a jovem foi contando como e porque o escreve. Segundo Barboza, Alina
Paim era “uma menina de cabelos soltos, cacheados, 1,50 de altura, 48 quilos de
peso, rosto bonito de ingênua, fala suave, e uma tímida inconcebível numa adoles-
cente que queria ser escritora”.
Publicado pela Editora Leitura, do Rio em 1944, o romance Estrada da
Liberdade retrata a vida de uma professora cheia de idéias, em contato com a amarga

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A Romancista Alina Paim

realidade de sua comunidade de bairro proletário, onde tenta aplicar métodos moder-
nos de aprendizagem. Alina baseou-se em sua infeliz experiência para escrever. Conhe-
ceu a fome e a miséria da infância baiana abandonada, de quem ela se apaixonou e que
muito contribuiu para leva-la a colocar a sua arte a serviço do povo. Pouco a pouco a
professora vai tendo a revelação de tudo. L~e livros diferentes dados por amigos novos
e chega assim a uma nova concepção da vida, do amor, das relações entre as pessoas
humanas e revolta-se contra tudo que é falso e lhe fora ensinado, uma educação dirigida
no interesse dos poderosos e ricos.
Esse é o clima em que se desenvolve a ação de Estrada da Liberdade, cuja
estrada entraram as primeiras “tropas libertadoras” nas lutas da Independência da
Bahia (1823), e, por esse motivo, recebeu a denominação simbólica. Alina faz isso
com muita felicidade: não cria as histórias, não inventa, mostra-se apenas com o
coração revoltada pelas injustiças sociais e pela miséria econômica, como se con-
tasse para uma pessoa amiga aquilo que viu e ouviu.
Essa obra foi muito elogiada pela crítica, pois nela a autora já mostra sua
tendência para a ficção e para as causas humanitárias. Estrada da Liberdade é uma
romance simples, sem as costumeiras técnicas apuradas, foge a temática da época
(seca, cangaço, cacau, café). O painel do livro, prende a atenção do leitor pela
leveza do estilo e pela condição natural dos seus personagens que se apresentam
como qualquer humano, com defeitos e qualidades. Em menos de 2 anos a edição
de Estrada da Liberdade estava esgotada, tendo contribuído para isso as freiras
daquele Convento que eram as maiores compradoras do livro, não para ler, mas
para queimar... Elas não gostaram do que Alina havia escrito, colaborando para a
imortalidade do Convento Nossa Senhora da Soledade.
Nesse romance de estreia já se observavam os principais traços que iriam
caracterizar a sua obra posterior, apesar de Alina iniciar-se como escritora numa
época em que os romancistas brasileiros estavam voltados para a literatura regio-
nalista ou de denúncia social, como é o caso de Graciliano Ramos e José Lins do
Rego, enquanto ela enfoca em seus textos o ser humano com suas angústias e
questionamentos existenciais.
A partir daí, seguem vários romances que denunciam o poder dos fortes
sobre os fracos. Mostra, também, o amor como forma de realização e destruição
do ser humano; a exploração do homem como força-trabalho, que caracteriza a
sociedade brasileira. Suas obras sempre refletem um tipo de crítica humanitária.
Alina Paim era consdierada de esquerda e lutadora pelas causas feministas, o que
lhe causou sérios problemas durante o regime militar nas décadas de 60 e 70.
A redemocratização do país em 1945, com a queda de Getúlio Vargas e a
convocação de uma Assembléia Nacional Constituinte, coincidiria com a imposi-
ção de novos reformismos, a partir do Ato Adicional nO 9, de fevereiro, o Brasil se
surpreende com a extensão e a importância do movimento comunista, que está
ligado ou dirigindo uma série de atividades políticas fundamentais. Com a saída de
Carlos Prestes da prisão, um novo panorama se apresenta: o PCB se tornará legal

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GILFRANCISCO

e uma nova fase se abre para as esquerdas, em geral. A sociedade brasileira, então,
irá passar por um novo momento de sua história, havendo a participação democrá-
tica de todas as suas classes sociais e uma mais ampla conquista de direito sociais
e isso inclui a literatura.
A morte de Mário de Andrade nesse ano como que assinala o fim de um
ciclo questionador da cultura, das instituições e das idéias. Sua obra crítica deixa
entrevar não apenas força aglutinadora, mas sobretudo sensibilidade e abertura
intelectual e todas as vocações capazes de revelar aspectos inventivos de algum
modo interligados com a trajetória renovadora da arte no Brasil.
Em 1949 a Livraria Editora Casa do Estudante do Brasil edita o romance
Simão Dias, com apresentação de Graciliano Ramos, amigo e grande incentivador
da tímida escritora sergipana: “A estréia, recebida com louvores, jogou a moça na
literatura. Alina fez vários livros. Este, o terceiro, deixa longe a Estrada da Liber-
dade, manifesta um valor que o trabalho da juventude apenas indicava. A autora
observa, estuda com paciência, tem a honestidade rigorosa de não tratar de um
assunto sem domina-lo inteiramente. As suas personagens são criaturas que a
fizeram padecer na infância ou lhe deram alguns momentos de alegria, em cidade-
zinhas do interior. Nenhum excesso de imaginação”.
Nesse livro, Alina retrata parte de sua infância e adolescência, compartilha com
o leitor suas memórias sobre o cotidiano desta cidade do estado de Sergipe. Orientada
pelo amigo Graciliano Ramos, Alina mantém o teor autobiográfico do romance, não
substituindo os verdadeiros nomes dos personagens, no intuito de aproximar ao leitor
o cotidiano da cidade e de seus habitantes nomeados no relato. Quando o romance foi
publicado causou espanto em alguns membros de sua família, pois tiveram as suas
vidas expostas publicamente. Alina escreveu um livro útil e o fez com amor, com
generosa ternura, captando o ambiente, o meio, a atmosfera que cercou a formação,
intelectual e humanista, erigindo o edifício do seu romance argamassando-o de reminis-
cências pessoais ou coletando depoimentos.
A Sombra do Patriarca de 1950, publicado pela Livraria Globo retrata a vida
no campo romanceando a maléfica e prepotente atuação do Senhor de Engenho. É
neste ambiente do meio rural do Nordeste, numa antiga fazenda na qual um mundo
de personagens vive em redor do velho fazendeiro, tio Ramiro, e em função dele.
As pessoas e as coisas obedecem ao patriarca, sua vontade prevalece sobre tudo e
todos. Existências se mutilam sob o poder dessa energia despótica e rígida, sob
caprichos decorrentes de uma concepção absurda da vida. O velho latifúndio
muda a seu talante o destino de todo ser humano a seu alcance.
Ninguém se surpreende com tal estado de coisas até que um dia Raquel,
uma sobrinha do velho, vem passar poucos dias na fazenda. Mas como adoece de
impaludismo, é forçada a permanecer mais tempo, observa o poder infinito e
anacrônico do patriarca, descobre uma por uma as causas – locais, sociológicas,
históricas, psíquicas – em que ele se baseia, e com o descobrimento começa a
revoltar-se contra ele. Assim é a história de Raquel na velha fazenda, contada por

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A Romancista Alina Paim

ela na primeira pessoa, mas é também uma imagem do latifúndio que confere
ilimitado poder a seu detentor e paralisa todas as vidas que dele dependem. A
Sombra do Patriarca, de Alina Paim, é o quadro vivo das vidas em conflitos, em
que a opulência acaba sendo derrotada pelas forças coesas de uma classe que um
dia entendeu de reivindicar ancestrais direitos postergados.
A literatura popular refletiu as lutas desse período. Em particular a coleção,
“Romances do Povo”, dirigida por Jorge Amado, publicada pela Editora Vitória que
reuniu 25 títulos de autores de vários países. Um desses livros, A Hora Próxima, é de
Alina Paim, escritora sergipana militante do Partido Comunista do Brasil e colaborou
na elaboração de uma narrativa literária que espalham as lutas do povo, revelando o
futuro de inevitáveis conquistas para o proletariado. A Hora Próxima, título que
compõe a coleção (Vol. XI), vendeu 10 mil exemplares somente na primeira tiragem,
em 1955. O livro foi traduzido para o russo e chinês, segue as pegadas de Jorge
Amado, introdutor e praticante-mor do realismo socialista no Brasil.
A partir dos anos 50-60 temos a explosão da linguagem e dos temas em
Clarice Lispector e Lygia Fagundes Telles, cujos achados vão inspirar e alimentar o
surgimento de uma prosa densa, combativa e reivindicatória, em busca da afirmação da
mulher na sociedade, em igualdade de condições com os homens. Essas são mudanças
significativas nos direitos das mulheres. Romancista como Alina Paim questiona os
modelos, reivindica a igualdade, denuncia as mazelas da educação patriarcal, analisa a
maternidade e as relações no espaço do místico, assume a emergência do erotismo,
encara a violência, assume as contingências da liberdade sexual.
O lançamento no mercado da pílula contraceptiva, seu engajamento nos
movimentos reivindicatórios, entre outros marcos, delinearam um novo perfil de
mulher. As mudanças sociais e culturais ganham novo ímpeto dos anos 80 até o
momento atual, como desenvolvimento acelerado das mídias, a comunicação via
internet fazendo parte do dia-a-dia, abrindo perspectivas para divulgação de
conhecimentos e troca de idéias sobre questões de gêneros.
Segundo Jacob Gorender, em 1950, ouve uma reunião no Rio de Janeiro,
num apartamento em Copacabana dirigida por Diógenes Arruda, então braço direi-
to de Carlos Prestes, contando com a presença de aproximadamente 30 intelectu-
ais militantes, entre eles Alina Paim, James Amado, Carrera Guerra, Astrojildo
Pereira, Werneck de Castro, Oswaldino Marques e outros. O objetivo do encontro
era “implantar a teoria do realismo socialista entre os intelectuais comunista”.
Arruda, tentou orientar a produção cultural dos militantes, mas encontrou resis-
tência, porém, entre os próprios intelectuais alinhados, caso de Graciliano Ramos.
O Realismo Socialista, padrão estético imposto pelo regime comunista na
antiga União Soviética, com a missão de controlar a produção intelectual, subordi-
nando-a aos cânones dogmáticos do comunismo de então. De acordo com tais
princípios, a literatura e a arte deviam exercer papel exclusivamente pedagógico,
difundindo os esforços comunistas para a construção do “homem novo” e do
“mundo novo” nos países socialistas. Para tanto, os textos deveriam ser pautados

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GILFRANCISCO

pela objetividade social e participante. Em lugar da cultura burguesa, considerada


pelos comunistas “decadente e degenerada”, os escritores e artistas tinham por
obrigação se empenhar em edificar a “cultura proletária”, que julgavam a única
capaz de desmistificar os valores morais da classe dominante e sustentar o caráter
revolucionário da obra de arte. Graciliano, apesar de se ter filiado ao Partido
Comunista, jamais tolerou tal ingerência partidária no campo da literatura.
A ação central do livro é uma greve dos ferroviários em 1950, em vários
entroncamentos da Rede Mineira. A estrada da Rede, em Cruzeiro, é tomada por
um piquete de mulheres com a tarefa de deter a locomotiva 437, que se prepara
para engatar uma composição e seguir viagem. O maquinista titubeia e, ante a
firmeza e ousadia do grupo de mulheres, pára a 437, que imediatamente tem na
caldeira esfriada e posta fora de combate. A locomotiva se tornará a bandeira do
movimento grevista. Escrito há cinqüenta e seis anos, A Hora Próxima, se refere ao
grande momento em que as massas, protagonistas de uma ação política organizada
e revolucionária, dirigirão a humanidade ao rompimento da aurora. A narrativa de
Alina Paim se prende à ação das massas, sem contudo tornar-se aprisionada de
factualismos e justificativas.
Portanto, sob a direção da comissão de greve, composta somente por
mulheres, forma-se o cenário: a locomotiva 437, apelidada de Joana, no centro do
acampamento, recebe o cartaz com letras vermelhas que expõe os motivos do
movimento – “Nossa luta é contra a fome e a miséria”. Em A Hora Próxima, a
lembrança de Hermogênio da Silva Fernandes, um dos nove fundadores do histórico
Partido Comunista Brasileiro, líder operário em Cruzeiro (Vale do Paraíba – São
Paulo), perpassa todo o texto como o bom plantador que semeia em terra fértil.
O romancista baiano prefaciou o romance “Sol do Meio-Dia”, vencedor
entre mais de uma centena de concorrentes, prêmio Manoel Antonio de Almeida,
concedido pela Associação Brasileira do Livro, em 1962, o livro foi publicado no
ano anterior pelas edições ABL, comenta a trajetória da romancista, desde da
estréia de Estrada da Liberdade. A história de Ester, a jovem que veio de Paripiran-
ga para o Rio de Janeiro, cidade maravilhosa e vive nas pensões coletivas, onde se
concentra a população problematizada pelas dificuldades nas grandes cidades:
“Volta hoje, Alina Paim a seu público com Sol do meio-dia, romance já consagrado
com um alto prêmio, o da Associação Brasileira do Livro, julgado já por figuras
como as de Valdemar Cavalcanti, João Felício dos Santos e Plínio Bastos. Eis uma
notícia excelente para os leitores, sobretudo para os muito que têm acompanhado
com constância e admiração a carreira vitoriosa da romancista. Ela atinge agora sua
maturidade criadora. A menina da Estrada da Liberdade, que irrompeu pelo roman-
ce brasileiro em 1945 e nele impôs sua presença, soube construir seu caminho e
crescer de livro para livro, para chegar à madureza deste Sol do meio-dia, que será
sem dúvida um dos acontecimentos literários importantes do ano. Estou certo do
sucesso deste romance não só junto aos intelectuais mas também entre o grande
público pois ele é construído com a experiência vivida e o amor ao ser humano”.

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A Romancista Alina Paim

A escritora estanciana fez incursões na literatura infantil, atendendo solici-


tação da Editora Conquista, publicou: O Lenço encantado; A casa da coruja verde
e Luzbela vestida de cigana. Em 1965, no mais disputado certame novelística da
época no país, em meio a três centenas de livros, coube a sua Trilogia de Catarina
o Prêmio Especial Walmap, IV Centenário do Rio de Janeiro criado exclusivamen-
te para distinguir essa obra. A comissão julgadora foi integrada pelos acadêmicos
Raimundo Magalhães Júnior, Adonias Filho e pelo novelista Otto Lara Resende.
A Trilogia de Catarina, lançada pela Editora Lidador na coleção Imago, compreen-
de os seguintes títulos: O Sino e a Rosa, A Chave do Mundo e o Círculo, em que
a romancista traça a trajetória de uma mulher entre o sonho, o aprendizado da vida
na busca de um sentido existencial, num protesto contra os códigos, sempre
dentro de um padrão da realidade e dignidade feminina.
No início da década de sessenta, o Brasil vivia momentos políticos
extremamente graves. Logo a seguir à inauguração de Brasília (1961) e à eleição do
novo presidente, Jânio Quadro (empossado em 1960), a euforia da nação provocada
pela política desenvolvimentista: o milagre brasileiro foi abalado pela renúncia de
Jânio Quadro (agosto de 1961). Segue-se um período de caos político que a
instituição do Sistema Parlamentar de Governo, em 2 de setembro de 1961 (tendo
a frente João Goulart), não conseguiu reorganizar. A deterioração da situação leva
ao Golpe Militar de 31 de março de 1964, e ao início de uma nova ditadura.
Indagada sobre o sentido de sua personagem, informa Alina Paim: “Catarina
tem uma constante: a busca do sentido da vida, a compreensão de si mesma e do
que lhe acontece para melhor se integrar na vida e no convívio de seus semelhan-
tes. Os três romances de Catarina deslizam no espaço de uma noite e de vigília. É
um trabalha com muitos planos de tempo. Ao amanhecer, após longa análise, a
Catarina que encara o sol é bem mais amadurecida que a Catarina que se encolheu
no topo da escada, no princípio da noite. Foram violados, com certa audácia, os
seus compartimentos selados”.
Um ano depois publica Flores de Algodão e 13 anos depois rompe o silên-
cio com “A Correnteza”, publicada pela Record em 1979. Sobre este romance, um
dos maiores críticos literários da época, Valdemar Cavalcanti diz que o romance
“constitui um painel da vida de subúrbio do Rio. Mas não é positivamente a
moldura o que mais importa neste romance, embora montada com indiscutível
mestria. Importante mesmo é o quadro psicológico que Alina Paim apresenta, de
extraordinária nitidez. E o leitor inteligente observe no fino do traço das figuras
femininas, em particular, e veja como ela as desenha, com mãos leves e firmes,
mãos como de uma Marie Laurencin que se desse ao romance”. A Correnteza
ocupa lugar privilegiado neste espaço ficcional brasileiro, livro para ser lido mui-
tíssimas vezes. Exemplo de sua enorme capacidade de testemunho dum roteiro
lírico, dum movimento rítmico de ação continua, duma originalidade incessante-
mente cultivada num alargamento espacial onde seus tipos criados têm oportuni-
dade de expandir-se em implicações sutis, num aparato episódio solene e drástico,

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GILFRANCISCO

contudo movido por um realismo, cru, paralisante.


Em 1994, o Governo do Estado de Sergipe, por iniciativa da escritora Núbia
N. Marques, na época Diretora Presidente da Fundação Estadual de Cultura –
Fundesc, publicou na coleção Ofenísia Freire, capa de Ronaldson, uma edição
cuidadosa o romance, A Sétima Vez. Neste livro Alina Paim retorna à análise de
vida problematizada do velho Teodoro, aposentado, e já sonhando com a tranqüi-
lidade de um cata-vento, vê-se empurrado para a atividade laborativas, pois neces-
sitava criar o neto, colhido pela orfandade. Os esquemas competitivos que na
mocidade poderia muito bem enfrentar, o leva a esforço de sobrevivência. A velhi-
ce encontra na pena dessa vigorosa romancista o dardo crítico e a reflexão sábia de
uma fase de vida humana que, a despeito da labuta já enfrentada, empobrecida por
uma aposentadoria irrisória, volta com toda força para buscar o pão cotidiano,
dentro das adversidades e dificuldades que cercam um velho.
Esta apresentação é uma significativa amostragem ao leitor de primeira
viagem na obra alinaense, uma síntese a partir da qual apresenta um painel
representativo da sua ficção que assume o compromisso de mostrar à riqueza e
variedade da narrativa dessa autora estanciana, através de uma visão particular que
aciona o intimismo e a memória, produzindo uma obra séria, corajosa e meritória,
sem dúvida uma contribuição importante à literatura contemporânea.
Alina Paim deixou uma obra importantíssima para a literatura brasileira,
devido a sua perspectiva muito particular de retratar o ser humano. Com uma
linguagem simples, sua narrativa enveredava por atalhos inesperados, lançava-se
em soluções novas, sem cair no hermetismo ou nos modismos modernistas. Hoje,
a relativa distância histórica de sua estréia permite dizer que sua narrativa abre um
caminho novo na literatura brasileira, situando-se num dos pontos mais altos de
nossa ficção de vanguarda.
Como integrante do Partido Comunista, Alina Paim exerceu atividades po-
líticas diversas, tendo convivido durante meses com mulheres dos trabalhadores
ferroviários que participaram ativamente da grave da Rede Mineira, de grande
repercussão nacional – por isso, sofrendo perseguições e pressões de toda ordem,
inclusive processo judicial. Traduziu trabalhos importantes de Jorge Dimitrof e
Vladimir Lenin, além de colaborar em vários periódicos: O Momento (BA), Época
(SE), Leitura (RJ), dentre outros, sendo que essas colaborações eram em sua
maioria, capítulos dos seus livros.

Aracaju. Jornal da Cidade, 20/21.abr.2006.

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A Romancista Alina Paim

ENTREVISTAS

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GILFRANCISCO

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A Romancista Alina Paim

Leitura descobre uma romancista


Estrada da Liberdade – 1O volume da Coleção Leitura
MELO LIMA

Estrada da Liberdade chegou à redação desta revista por força do convite


que a Cia. Editora Leitura fez aos romancistas do Brasil, e foi lido segundo a ordem
de recebimento dos originais. Em consequência, passou vários dias numa estante
à espera que chegasse a sua vez. Mas, curiosidade numa redação é o que não falta,
e eis que um redator esteve a folheá-lo, levou-o para casa e no dia seguinte veio
com as alviçaras. Descobrira uma grande romancista.
Imediatamente a atenção de todos se voltou para a “Estrada da Liberda-
de”. O que significava aquele título? Onde se passava a história? A escritora tinha
mesmo talento, sabia escrever?
Uma das pessoas encarregadas de julgar os originais leu um capítulo em
que Alina Paim faz a sua personagem Marina descobrir certos pecados que lhe
pareciam inconfessáveis (ela principiava a trabalhar num bairro onde a vida se
manifestava em seus mesquinhos aspectos de pobreza e de vícios) e o autor de
“Um homem dentro do mundo”, que é sempre um escritor sem tempo para escre-
ver, não conseguiu também conter a curiosidade. Levou o livro de Alina Paim para
casa. Volume grosso, perto de trezentas páginas datilografadas, e com certos alga-
rismos tão visíveis que nos gritavam as aperturas dos tipos que ali estavam viven-
do. Nada de quantias que nos lembram logo não problemas, mas soluções agradá-
veis e reconfortantes. Aquele romance parecia gemer como um louco os conflitos
das suas vidas, e de maneira tão exterior e direta que um romancista que nos
visitava na ocasião sugeriu modificassemos os algarismos, escrevessemos cin-
quenta cruzeiros ao invés de Cr$ 50,00... Seria mais discreto, não?
Por que tanta preocupação por um livro que não léramos ainda? Seria
assim tão bom a ponto de forçar o romancista Oswaldo Alves a encontrar no
tempo uns minutos que ele próprio ignorava que ainda possuisse?
Ali, na segunda página, um inexperiente encontrou de súbito o “espírito
do livro e da escritura” na dedicatória que ela fizera: “A Jorge Amado, Dias da
Costa e Edison Carneiro”. Dedicatória de bom gosto, sem dúvida, porém não
explicava “o espírito” do romance nem da romancista: de qualquer modo, parecia
um sinal de que Alina Paim era baiana. Sim, baiana da gema. Toda gente concordou.
Mais tarde, outra visita nos esclareceu que “Estrada da Liberdade” era o nome de
um bairro da Cidade do Salvador, um bairro tão característico que determinados

23
GILFRANCISCO

problemas sociais aparecem nele mais sintomáticos e revoltantes.


– As tropas libertadoras passaram por lá.
– Que tropas libertadoras?
– Não se recorda do célebre 2 de Julho cantado por Castro Alves?
Oswaldo Alves leu o romance quase de um jato, como se diz e o superinten-
dente da Cia. Ficou com pulgas arás das orelhas, ansioso também para conhecer
“Estrada da Liberdade”. Insistimos com Oswaldo para contar-nos o enredo do livro.
– Ora, minha gente...
Difícil contar numa redação onde todos conversam literatura para o deses-
pero de alguém desambientado o enredo de um romance escrito com minúcias
descritivas, introspecção, monólogos e muito de movimento e romanesco. Marina
era uma personagem bem caracterizada, o romance escrito com vigor e naturalida-
de, tinha um capítulo onde se falava na propaganda franquista num colégio de
freiras que era uma dessas páginas tão bem realizadas que parecia de um romancis-
ta assim com a impiedosa e consciente serenidade de Graciliano Ramos e com o
arrebatamento emmmpolgante de Jorge Amado. Alina Paim condensara naquele
capítulo uma acusação tão bem feita que o romance permanecesse intacto em toda
a eloquente segurança da sua técnica verdadeiramente clássica. Quem seria essa
escritora que se apresentava assim, satisfazendo ao mesmo tempo o editor, os
curiosos, as visitas e literatos que o tinham lido?
Pouco depois Oswaldo Alves lia um capítulo em voz alta para que ouvis-
semos. O gerente da Companhia Editora Leitura, Augusto de Souza, que é homem
de Portugal e com largas permanências em Vieira, Frei Luiz de Souza e em todos os
bons e sábios portugueses de vários séculos, afirmou imediatamente que “essa
escritora sabe de fato escrever”, estava-se vendo que “era uma escritora conside-
rável”. Mais uma virtude que o livro de Alina Paim despertara. Além de emocio-
nante, realizado com as exigências que um sujeito como Oswaldo Alves não pode
deixar de fazer, “Estrada da Liberdade” ainda manifestava a virtude que Augusto
de Souza achava imprescindível em qualquer livro, de ficção ou de poesia, de
história ou ensaio, para que fosse “considerável”.
O editor começava a ver no romance não simplesmente uma história que o
satisfazia só no sentido literário. De tempo em tempo, dizia que o livro tinha
atualidade, que certos problemas estavam “planteados” com a segurança própria
de uma pessoa “consciente”.
Estavam, portanto assegurados os palmos de terra daqueles originais pal-
pitantes de vida. Não se discutiria mais, seria editado. Competia agora à secretaria
de “Leitura” providenciar a apresentação da escritora, comunicar-lhe a decisão,

24
A Romancista Alina Paim

dizer-lhe que o seu livro eataria na rua possivelmente em setembro próximo.


Minutos depois apareceu Dias da Costa. Interrogado, disse logo que o
livro era bom e que aconselharia a publicá-lo. Mas Dias da Costa era suspeito, a
dedicatória estava ali a ameaçá-lo... O escritor revoltou-se, afirmou que seria inca-
paz de elogiar um livro se não fosse digno. Pedimos-lhe desculpas com prazer,
perguntamos-lhe notícias de Alina Paim, como era o seu tipo, se casada ou soltei-
ra, se possuia já uns trinta ou quarenta anos...
– Trinta anos coisa nenhuma!
Alina deve andar por ai na casa dos 21 a 23 anos, no máximo.
– Não me diga!
– No duro. Quer saber mesmo a idade certa de Alina? – e o oferecimento de
Dias da Costa soou-nos como uma perfidia engatilhada, mas nesse instante entrou
o escritor Valdemar Cavalcanti com a sua pasta de homem sempre ocupado. Vinha
fazer uma visita, folhear números recentes do “New York Times” e do “Tribune”,
dar notícias de uma tradução que anda fazendo para a casa, saber como iamos
psando e outras coisas confessáveis. Viu o livro, folheou-o, deteve-se em algumas
partes, acrescentou que era bastante volumoso, quis saber em que Estado nascera
a escritora. E no dia seguinte apareceu uma crônica na “Folha Carioca” assinada
por ele onde havia já uma notícia simpática a respeito do livro. Comedido, Valde-
mar Cavalcanti não fazia afirmativas mais indicava claramente que pelo menos os
trechos que lera lhe tinham agradado.
Outras pessoas leram “Estrada da Liberdade”: duas inteiramente distintas
em coisas literárias, uma senhora inteligente aqui da gerência da editora e um
senhor que só se preocupa com os noticiários de guerra. D. Anéia Miller achou o
livro “formidável”, e o senhor sempre preocupado com os noticiários de guerra
afirmou: - “Assim, sim, é que se devia escrever um romance”!
Estava decidido, portanto. Comunicamos a Alina Paim à notícia de que o
seu romance fora escolhido para iniciar a “Coleção Leitura”. Modéstia à parte
seria um começo magnífico não só para a coleção como também para o seu roman-
ce. Desta revista só encontraria apoio, porque era de fato merecedora. Quando
teriamos o prazer de vê-la para uma conversação?

EG
A presença de Alina Paim foi uma surpresa tão grande que a exclamação
saltou logo, como se fosse elogio:
– Tão jovem ainda! O seu romance parece de uma criatura mais idosa...
– O senhor acha?

25
GILFRANCISCO

Uma nortista estava-se vendo, baiana da cidade do Salvador, os olhos


negros com um brilho extraordinário, e a pronunciar certas palavras como só os
baianos as pronunciam.
– Está aqui há muito tempo?
– Não “mutcho”. Vai fazer pouco mais de um ano.
– Trouxe o livro da Bahia?
– Não. Quando vim da Bahia trazia-o na cabeça, bem escondidinho. Eu lá
pensava que pudesse escrever um romance capaz de interessar uma editora! Tinha
que me preocupar primeiro com a vida, trabalhar... O senhor compreende, não é?
– Escreveu- aqui mesmo na Ladeira da Glória?
– Foi em Marambaia.
– Aquela Escola de Pesca do Estado do Rio?
– Lá mesmo. Passei um ano a ensinar os filhos dos pescadores de Marambaia...
– Encontrou então muito tempo para escreve.
– Escrevi-o aos pedacinhos, dentro dos minutos que sobravam. Sou uma
professora de vocação, gosto de ensinar, quero bem aos meus alunos, de maneira
que me dedicava de corpo e alma aos bichinhos. Como se pode ter tempo para
escrever despreocupadamente quando cada aluno que a gente ensina representa às
vezes um drama tão grande que até parece uma acusação dirigida a nós próprios?
– Conhece Lia Corrêa Dutra?
– De nome. Por quê?
– Ela também fala assim como essa mesma paixão pelos filhos dos outros.
Nunca vi uma pessoa se preocupar tanto com os seus alunos pobres.
– Se Lia Corrêa Dutra é assim, vou simpatizar ainda mais com ela.
Depois de uma pausa, continuou:
– É que somos obrigadas a saber o que se passa em cada uma daquelas
crianças. Uma professora honesta não pode deixar de angustiar-se. De repente nos
vemos absorvidas também pelo drama dos garotos e de seus pais, de suas irmãs e
de toda a família. Quantas e quantas vezes sou forçada a sair das minhas funções
de simples professora para cuidar de conflitos cujas soluções parecem tão distan-
tes, tão dolorosas... Certos problemas que não têm nenhuma significação para nós
são às vezes tremendos para os pais de meus alunos, para os bichinhos mesmos...
Alina Paim é uma criatura tão humana que isso salta logo ao primeiro
contato. Quando fala de seus alunos da Bahia não se contém a lembrança de um
período de “Estrada da Liberdade” desses que a gente recorda quando menos
espera: “Ia deixando (Marina) a rua dos Ossos, rua estreita, calçamento péssimo,
postes apagados, onde nada acontece e no entanto em cada casa a vida escreve uma

26
A Romancista Alina Paim

história de angústias e de preocupações”.


– Escrevi “Estrada da Liberdade” – esclareceu como se pedisse desculpas
por falar em seu romance – para as minhas colegas que ainda não conhecem as
surpresas da vida, o que é a realidade, o que uma professora sem governo, sem
amparo e confiança sofre no meio de tantas crianças que não são simplesmente
problemas sentimentais e resolver, mas vidas que precisamos salvar a todo instan-
te para que nós professores, não morramos também a cada instante.
– “E se diz que aqui se vem para se poder viver, e, no entanto aqui também
se morre”... ouviu?
– Isso mesmo – concordou meio surpresa – Marina, heroina de “Estrada da
Liberdade” vai para a vida com essa impressão de vitória, mas o que encontra é a
derrota, são mil caminhos atravessados de dificuldades, desilusões, misérias de orde-
nados, incompreensões que destroem a vontade de bem conviver com o próximo, e
tudo lhe vem como acusação, impiedosamente. Precisa vencer, tem que lutar, e luta –
meu Deus! – com que sacrifícios. Não há recompensa senão o que um espírito forte
por natureza consegue depois de muito tempo: consciência das coisas que o cercam,
desejo de lutar não mais simplesmente pela necessidade de viver, mas também por uma
questão de princípios, como se tivesse salvando todas as ingênuas como a própria
Marina. É que, em todos os minutos do dia e da noite, elas vão iniciando o mesmo
caminho do seu sofrimento. Digo-lhe não como um desabafo, mas com consciência,
certa de que, se encontrasse capacidade para realizá-lo literariamente, contribuiria um
pouquinho para esclarecer a todas as moças que saem de colégios de freiras e daqueles
colégios onde só se ensina o medo da vida e não o que é preciso para se merecer a vida
e poder realmente ensiná-la. Porque o que se ensina na aula não são lições. Ensina-se a
vida, e esses livros, essas lições, esses ditados são como parte da vida. Eu mesma
ensinei durante muito tempo na rua onde a personagem de “Estrada da Liberdade”
ensina. Sei o que é aquela vida...
EG
O terrível drama da vocação. Marina a exercer o ofício de professora
quando devia ser simplesmente uma aluna. Presa de pequenas evidências, de
muros sem paredes, via os fatos e não sabia explicá-los nem dizer de onde vinham
nem porque surgiam. Drama da vocação, transe de suícidio.
O que era um homem? No princípio do romance, quando Marina inicia a
sua vida prática, o homem significava para ela qualquer coisa de sujo, de bicho
grosseiro e malicioso que só serve mesmo para destruir purezas que vários anos de
reclusão num colégio de freiras e de ensinamentos tortos tinham transformado em

27
GILFRANCISCO

chagas, em desejos, interrrogações sem respostas, noturnas. Depois, a descoberta


de que o homem pode ser um companheiro também, de que tudo aquilo que lhe
haviam ensinado não significava pureza. Era malícia. A preocupação com dinheiro
minguado, os sonhos da virgem como cintilações de um sol que não clarea, as
tragédia dos alunos, das colegas, a solidão que cada um leva em si mesmo e a que
é provocada por um sítio de desventura, e todos os problemas de personagens
bem definidas, com linguagem, movimento e vidas próprias.
“Estrada da Liberdade” é um romance onde o tema amoroso, por exemplo,
se encontra descrito como necessidade lógica e natural, e não como de personagens
mórbidas que pensam e falam de amor sem conhecer nem homens nem mulheres.
Marina encontra Paulo, luta por ele, torna-se merecedora, alcançando aquele
sereno minuto da vida que permite o direito verdadeiro de “conquistar” o amor,
que é como um clarão ou como uma estrela a penetrar as trevas que antes a
escondiam. Não mais uma voz divisada através de chamado poderoso e persisten-
te. Presença do homem, simplesmente, e apoio para sustentar o próprio peso do
mundo. E então ela pode observar que a “Estrada da Liberdade” fora a sua escola
e que aqueles meninos de “pernas sujas de lama e barriga vazia” constituiram os
seus mestres, percebendo também que “eles eram aos milhares”. Agora, ao partir,
sentia e compreendia que o que ficava para traz, além nas trevas que a sua estrela
limitara, era o resultado de uma educação errada.
“Como tinha divertido Miguel com seu convencimento, falando-lhe de
autores que escreviam apenas para agradar os ricos, encher de fantasia a ociosida-
de dos privilegiados”. “Começara a olhar as pessoas e os acontecimentos procu-
rando compreendê-los. Descobrira a rua dos Ossos, leva os romances de fatos
miudos e intensos que eram vividos naquelas casas de porta e janela, naqueles
sobradinhos sem nenhuma beleza. Tornarra-se mais humana”.
“Agora encarava o futuro confiante, plena de desejo de lutar, sem medo
das dificuldades, esperando vencer. Compreendia que em si o amor agia como algo
renovador e construtivo, e se abandonava completamente à sua ação criadora”.

Rio de Janeiro. Leitura, jun.1944.

28
A Romancista Alina Paim

A Redescoberta de Alina Paim:


o realismo crítico da romancista
GILFRANCISCO

Após longa peregrinação por mais de cinco anos em vários Estados brasi-
leiros para obter informações sobre a escritora sergipana Alina Paim, 88 anos, a
tão esperada notícia de que ela ainda estava viva, finalmente chegou à tarde de 6 de
novembro de 2007, por intermédio do seu cunhado Antonio Paim, 81 anos, pro-
fessor e pensador filosófico baiano atualmente vivendo em Brasília. A confirma-
ção veio através de um telefonema em resposta ao e-mail enviado por mim, com o
intuito de obter endereço ou número do telefone de Alina. O professor forneceu-
me o tal número, disse-me que ela há muito residia em Campo Grande (MT), e fez
algumas recomendações sobre seu estado de saúde. Devido a avançada idade, ela
está com dificuldades visuais e auditivas. À noite, por volta das 21 horas, liguei
para falar com Teresa Paim, sua filha, atendendo a solicitação de seu tio Antonio.
Mas, para minha surpresa, Teresa não estava e Alina atendeu à ligação. Neste
instante meu coração gelou ao ouvi-la pela primeira vez sua voz.
Em pouco tempo de conversa pude observar a força que tinha aquela
mulher de 89 anos, pela lucidez e o carisma. Sem dúvida uma mulher sábia – disse-
lhe que era um dos maiores vultos do contexto social, político e cultural da socie-
dade brasileira contemporânea e que, representa o arquétipo feminino de maneira
mais completa. Entre uma pausa e outra vou falando do que queria dela, pois me
encontrava em fase de conclusão do livro sobre sua obra, para a coleção BASE
(Bahia e Sergipe), fascículo número 3, sobre autores significativos da literatura
desses dois estados e desejava obter algumas informações. Aproveitei a oportuni-
dade para falar também do projeto da professora Ana Maria Leal Cardoso, do
Departamento de Letras da Universidade Federal de Sergipe, que organizará um
livro sobre a crítica literária de alguns dos seus romances publicados e havia me
designado para escrever o capítulo referente a sua biografia.
O agradecimento saía por uma voz trêmula e bastante emocionada com
aquela notícia a muito esperada: “O coração já está muito velho para suportar
essas coisas”, disse ela, sensibilizada, em voz mansa e pausada. “É uma honra e
uma grande alegria tê-lo como meu biógrafo”. Mais tarde em conversa com sua
filha Teresa, disse-me que logo após a conversa que mantivemos, Alina contou-lhe
que eu havia ligado e que estava escrevendo sobre ela. E concluiu: “Gil, mamãe
ficou muito feliz com sua ligação”. Por que você não vem passar uns dias aqui em
janeiro? Estaremos na nova casa que se encontra em reforma. Seria ótimo, teria
todo o tempo para ficar com ela. Ela adora falar sobre o seu passado, dos amigos,
das viagens, dos livros”.
Dias depois enviei nova correspondência contendo 43 perguntas abran-

29
GILFRANCISCO

gendo sua trajetória como mulher, mãe, escritora e militante partidária, com o propó-
sito de primeiramente publicar em forma de entrevista e posteriormente como capítu-
lo do livro “A romancista Alina Paim” a ser publicado no próximo mês. Confira a
entrevista.

1.Vamos começar do começo! O seu por exemplo. Fale sobre seus pais?
Alina Paim – Minha mãe morreu quando eu tinha seis anos incompletos. Dois
meses depois ela completaria vinte seis anos. Nasci em Estância/Sergipe, papai e
mamãe também. Não conheci meu avô paterno, pois ele deixou a avó (faleceu), seu
nome era José Leite e minha avó Danana Vieira; meu avô materno, Berrnardino
Cruz de Andrade, era coletor em Simão Dias, foi para lá com seis anos, pois não
tinha onde ficar, a mãe havia morrido. Minha avó Adelaida Andrade Portela era
dona de casa, lia bem, fazia bem as contas, tinha feito um bom primário e o vô era
cobrador de impostos, tomava conta da coletoria. Todo dia primeiro se não era
domingo estava com a mala cheia de dinheiro, rolos de moedas amarelas. Eu já
sabia juntar as moedas pelo tamanho. Minha vó teve vinte partos e vinte hum
filhos (gêmeas mãe e tia).
2. Quantos irmãos você teve?
AP – Tive outros irmãos por parte de pai, pois ele teve três mulheres.
3. As primeiras letras você aprendeu com quem?
AP – Aprendi com minha mãe aos quatro anos. Durante um almoço de domingo,
presentes meu pai e meu tio (irmão dele), disseram: amanhã vai começar a ler,
aprender a ler. Minha mãe fez uma aposta com meu pai. Ele sabia que eu só iria
para a escola com seis, sete ou oito anos. Ela disse que me faria aprender a ler
dentro de três meses. Caso eu não aprendesse desistiria, não me ensinaria mais.
4. Como se desenvolveu os ensinamentos?
AP – Minha mãe resolveu que seria de tarde, pois pela manhã eu continuaria a
brincar como sempre. Na tarde da segunda feira, Senhora (empregada) foi designa-
da para uma tarefa muito importante que era sair comigo para ir a uma quitanda
comprar o ABC, uma lousa com uns lápis de pedra, um caderninho e a tabuada. Ela
me arrumou toda como se fosse para a maior festa: sapatinho, meia de seda,
vestido longo, laço bordado no cabelo, para comprar as coisas mais importantes
da minha vida. Senti uma alegria enorme, doida para almoçar logo e começar.
5. Você estava me falando sobre um trato feito entre seus pais. O que
aconteceu na realidade?
AP – Meu pai não podia perguntar nada antes dos três meses sobre o trato que
fizeram. Lembro-me de fatos que ocorreram quando tinha três anos. O aprendiza-
do foi tudo, lembro como se fosse agora, senti muita alegria. No primeiro dia da

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A Romancista Alina Paim

compra, à tarde minha mãe pegou o lápis e o livro pela primeira vez. Mostrou o
ABC que ali era de aprender a ler, saber a história, o outro era de saber números.
Por exemplo: se você tem três bolachas e come as duas, era desse jeito que a mãe
ensinava. Quando ela morreu, eu já estava no terceiro livro de leitura antes de
completar seis anos, cujo autor era Felisberto de Carvalho, considerada a leitura
mais difícil da época. Meus pais o escolheram, porque haviam estudado letras, foi
o que leu nada de livros com letras grandes e histórias tolas.
6. Qual foi a reação de seu pai ao final da aposta?
AP – Final do prazo da aposta, numa terça-feira, meu pai chegou da fazenda.
Minha mãe chamou Manoel e disse que ele podia pegar a tabuada, o ABC, o
livro, lápis, pois ela está na cartilha de Felisberto (a mais difícil e respeitada)
na página 40. Peguei a tabuada, li salteado, dizia o zero pai não é nada, mais
pega o um e zero e fica dez. Ele começou da maneira mais absurda, salteada,
para me atrapalhar e eu ia respondendo. A mãe ensinava numa alegria enorme,
quase brincando. Ele disse (prometeu) que não diria nada a vó Donana (mãe
dele), só falaria nisso depois dos três meses. Minha mãe disse que se ele
tivesse satisfeito poderia dizer a ela no dia seguinte.
7. Como era sua avó Donana?
AP – A vó Donana não tinha curso superior, mas era inteligente, criou oito filhos
homens, ficou viúva com o mais velho pequeno e só um se formou em medicina,
foi para São Paulo, os outros seguiram a profissão do pai, criador de gado. Ela
gostava de arte, teatro, de ler. Quando eu tinha cinco anos me levou para assistir
uma ópera em Salvador, juntamente com papai, mamãe e vovô.
8. Afinal, quando foi que seu pai falou com Donana?
AP – Dia da aposta dos três meses, meu pai marcou para contar à mãe (vó
Donana) que tinha o sonho de ter um filho ou neta, fosse quem fosse, mostrasse
que tinha inteligência, que estudasse; Quando ele viu que eu estava na cartilha e
respondia tudo que perguntava, ficou numa alegria e disse a Maroquinha (Maria)
que contaria a vó Donana. Disse que ia sair e não demoraria nada e foi comprar as
frutas que só aparecem no fim de ano (uma fortuna) para comemorar (morango,
por exemplo). Vai ser natal hoje, disse ele, (eu me arrepio quando lembre disso). A
mãe disse: esse se chama pêssego, e esse morango: aqui não tem, vem de longe. A
maçã e a pêra eu conhecia, a cor da maça era um amarelo incomum. Conheci
também o pêssego e o vermelho morango, representando um ano bom. Na Bahia
não se diz Ano Novo, se diz Ano Bom. Na terça-feira meu pai saiu para comprar
algo que pendurasse para eu ser dona, uma pasta. Quando cheguei à escola, já
estava no terceiro livro, aos seis anos. Ele disse à Maroquinha que precisava
daquela comemoração, pois ela acreditou na criança, e ele não. No dia seguinte fora
pra vó Donana que disse: o que é isso com a criança? Donana meta a mão, puxe,

31
GILFRANCISCO

veja e pergunte. O que tem aí dentro? Respondi: vó eu estou aprendendo a ler.


Tenho lápis, tabuada, lápis de pedra, pedra! A vó ficou boba, pois eu aprendi
pulado. A pedra de lousa me impressionava, pois escrevia e apagava. Meu pai
pediu a Donana para perguntar. – Eu disse pode perguntar o ABC pulado. Maro-
quinha como você fez isso? (perguntou minha vó). Lembra do aniversário...
9. E seus passeios com vó Donana?
AP – Continuei aprendendo com mamãe. Eu guardo viva essa lembrança extraordi-
nária. Um dia ela levou-me à livraria para comprar livros, soletrei co-ra-ção de cri-
an-ça. Ela disse que eu estava na cartilha e perguntou o que tinha de bonito. Sair da
livraria lendo várias coisas e explicando-as. Levamos dois livros, um tinha vinte
três histórias para mamãe ler e contar e o outro livro dezenove, Branca de Neve,
Ali babá e outras histórias.
10. Em Simão Dias, você foi educada por suas tias. Como foi essa convivência?
AP – As quatro solteironas foram extremamente importantes para a minha forma-
ção; Meu pai não tinha onde me colocar, pois tinha acabado todas as tolerâncias.
Laura, irmã da minha mãe, me esperou e aceitou, tinha muita personalidade. Qua-
tro tias: Iaiá, Adelaidinha, Emília e Laura, todas costuravam. Apanhei muito das
tias, exceto de Laurinha, fiquei com ela até sua morte. Ela tinha tuberculose, foi à
Bahia se receitar. Laurinha morreu nos últimos meses dos meus nove anos (quatro anos
vividos em Simão Dias). Mandaram levá-la a Salvador para um médico que soubesse
mais que o de Simão Dias, ela adoeceu no último ano quando completei nove anos.
Quando ela morreu comecei a apanhar a beça, o médico deu um mês e meio de vida, ela
era uma pessoa muito alegre, as outras tias me perseguiam, sofri pra cachorro.
11. Fale sobre o Grupo Escolar Fausto Cardoso?
AP – Eu gostei muito do colégio interno, podia morar sem dever favor, eu entendia
isso, lá eu morava e estudava. As freiras me conheceram antes de entrar para
estudar. Durante as férias tomavam conta de mim nos passeios à Salvador na casa
de minha tia irmã gêmea de minha mãe. Demonstrei no Grupo Escolar um adianta-
mento no aprendizado em língua portuguesa e aritmética. No colégio das freiras
tinha atraso em História do Brasil, Geografia e Ciência, Geologia, Botânica e
Antropologia, fiquei no terceiro ano. No quarto ano eu já estava na idade verdadei-
ra, mas era um pouco abaixo.
12. Como foi estudar num colégio interno?
AP – A minha vida era muito boa lá, consegui comprar uns livros para estudar
sozinha; para ficar como era em Simão Dias, na frente de todo mundo, era o que
dava prazer em estudar no colégio Nossa Senhora da Soledade.
13. E a visita do Inspetor sergipano ao colégio?

32
A Romancista Alina Paim

AP – Fiquei estudando e o diretor acabou sabendo, tinha um Inspetor de Aracaju


que ia ministrar uma aula. Professora Consuelo foi muito boa comigo, fiquei na
primeira fila, em uma exposição, bem em frente ao diretor e ao inspetor. Fiquei
iluminada com a apresentação, ele perguntou se alguém queria dizer tudo o que
havia dito? Eu me manifestei, dei a explicação completa segundo as professoras. O
inspetor disse: Eu estou abraçando a menina mais inteligente dessa cidade. Estava
feliz para chegar a casa e contar a meus avós. Minha vó ficou muito contente em
compensação apanhei que nem bicho das minhas tias, porque eu ia crescer e virar
mulher sem-vergonha. Eu chorava de soluçar e meu avô quando chegou perguntou
o que eu tinha. Meu avô entrou dizendo: “que o inspetor e o diretor vieram me dar
um abraço, pois eu sou o avô da menina mais inteligente da cidade.”
14. Como era sua relação com as professoras do colégio?
AP – O período no Colégio das irmãs foi uma melhora, uma possibilidade de
viver tranqüila, vivia dez, quinze dias em um lugar, um mês em outro na casa
de conhecidos, pois meu pai não se casou. Nesse período o colégio só recebia
interno com dez anos e eu ainda faltava quatro anos. Aos dez eu já tinha uma
experiência com as freiras, pois lá eu passava as férias duas vezes em dois
anos. O colégio estava vazio e a freira Madre Gertrudes tomava conta de mim.
Ela me ajudou a fazer escolhas, me instruiu, foi uma mulher extraordinária.
Preparava redações, assuntos, aulas pelo menos para a metade do primeiro
semestre e os dois últimos meses ela trabalhava mais as aulas do fim do ano,
enquanto preparava tomava conta de mim. Botava para eu fazer uma redação
de português, isso durante as férias. Papel de rico era muito caro, por isso eu
ganhava papel de embrulho e tijolo. Eu amava esse tijolo e ele quebrou, mos-
trei o papel com o tijolo quebrado e ela disse que iria conseguir um outro tijolo.
Havia uma sintonia muito grande das duas. No quarto dia ele perguntou se eu
gostava disso, da língua portuguesa, respondi que gostava de ficar dizendo
coisas, estava aprendendo. Prometeu que no dia seguinte arrumaria uma ou
duas horas para ficar conversando e conseguiria um papel pautado para eu
escrever. Ela arranjou papéis de caderno velho, tinha uma porção de folhas e
prometeu cortá-las, em seguida perguntou sobre o que eu sabia do português.
15. Mas me conte sobre as outras freiras?
AP – A professora Agripina do Grupo Escolar me dava carinho enquanto eu
apanhava, foi quem me ensinou o português, se afeiçoou a mim, enquanto que
Consuelo me ensinou o primeiro adiantado e o segundo. Agripina o terceiro e
quarto. A professora Consuelo explicava tudo com paciência e dava mais uma
pitadinha de conhecimento para mim, acrescentava mais um pouco sobre o assun-
to. Ela me dava papel para eu rabiscar e foi quem pediu ao diretor para eu ser aluna
dela. Consuelo levava coisa gostosa de casa para comermos dez horas, dividia o
lanche comigo.

33
GILFRANCISCO

16. O que seu pai achava sobre o colégio?


AP – Meu pai me contava as coisas abertamente, contava tudo sobre o matadouro.
Um dia fui perguntar sobre namoro e apanhei. Vi um cachorro com uma cadela e fiz
uma brincadeira e uma solteirona me deu uma surra sem eu saber o que estava
havendo. No colégio de freiras encontrava-me com deficiências toleráveis com
relação aos outros, meu pai comprou livros para eu estudar sozinha, noções para
alcançar os livros em que estavam. Com três meses alcancei e passei para primeiro
lugar. Não me judiaram. Irmã Gertrudes me disse que havia coisas que eu não deveria
falar na frente de outras pessoas, coisas imorais, descaradas e que eu podia conversar
com ela que tinha mais conhecimentos sobre essas coisas. Ela era a minha amiga mais
próxima e me orientou, estimou no português. A primeira vez eu disse que meu pai não
podia pagar aula particular, ela disse que não era aula particular, era conversa, ela tinha
paixão pela língua portuguesa.
17. Com se deu a sua participação no jornalzinho do colégio das freiras?
AP – Tinha um jornal chamado Arco-Íris que era impresso em tipografia e havia os
artigos publicados nas páginas principais. A freira que saía comigo de manhã me
passava os jornais para eu ler. Não havia nomes de quem escrevia apenas o pseu-
dônimo. Ela disse que eu poderia escrever ali também. Com 8,5 a 9 anos eu fazia
redação e ela disse que para colocar no jornal teria que ser uma redação maior, de
três folhas e meia. Aprendi a espichar a redação. Imediatamente pedi para ler os
Arco-Íris anteriores, disseram-me que eram redações grandes e comecei a espichar
mais um pouco. Precisava de três bandas de caderno mais a metade. Pensei: se eu
espichar e estiver boa vai para o jornal, perguntei? Confirmaram que sim. Comecei
a espichar. Haveria um número do Jornal Arco-Íris das férias com o dobro de
páginas.No Convento ensinavam-me sobre o senso de realidade sem falar difícil
para mim. Diziam-me como era escrever para uma coisa. Levei para a freira o texto
“Canção da tarde” que perguntou se alguém tinha me dado o título, disse-lhe que
não, tudo era da minha cabeça. Expliquei que sabia o que era canção. A irmã disse
vou mostrar “Canção da tarde” à madre superior, copie direitinho no papel pauta-
do, caneta e cuidado para não pingar nada. Eu expressava nessa redação o meu
sentimento pelo sol, ele tinha que ir embora, coitado, Canção da tarde era o título
e Alina Leite seria o nome assinado no jornalzinhio. Resolveram colocar no jornal
sem eu ser aluna ainda, mas já afirmavam que eu seria aluna.
18. E seu encontro com Júlio Verne?
AP – Ah o certo é que antes de completar dez anos eu já tinha lido vinte oito
volumes da obra de Júlio Verne, eu lia três volumes por semana, mas só podia ler
um, mas consegui enganar, pois a capa era da mesma cor. Fiquei apaixonada por
Júlio Verne, pelas histórias, queria uma foto, até sonhei beijando ele e acordei aos
berros, fiquei três dias de castigo. Estava no primeiro ano do convento quando a
Madre superiora perguntou como poderia saber tanto de Júlio Verne? Irmã Ger-

34
A Romancista Alina Paim

trudes contou a ela que os cinqüenta e poucos livros de Júlio Verne tinha a capa da
mesma cor e a madre perguntou: quantos eu já havia lido? Oito, não. Cinco? Não.
Quatorze. Não. Quantos livros Alina? – vinte oito. Eu disse que gostava de dizer
a história e o nome do livro, fui buscar o caderno de rascunho que a irmã tinha me
dado, estava todo escrito sobre Júlio Verne e eu comecei a contar o que estava
escrito. Ela contou os resumos e constatou que tinha vinte oito e pediu para só contar
a meu pai quando o jornal estivesse pronto. A madre achava que eu estava enfeitiçada,
disse que eu ia usar pseudônimo de um passarinho, respondi a Madre Gertrudes que
não queria um passarinho, seria Alina Leite, assim como Júlio Verne. Ela foi falar com
a superiora, pois nunca havia visto dois escritos num mesmo número do jornal.
19. Os textos foram aprovados para o jornal?
AP – No outro dia, de tarde, fui chamada e me assustei. A irmã gostou muito e
havia mostrado o texto à Madre Superiora que disse-lhe que eu deveria entrar no
próximo número do Arco-Íris. Foi uma das coisas que mais me levou à altura, pois
fui escolhida sem ser aluna. Fiquei toda satisfeita, feliz. Os artigos tinham de ser
assinados com pseudônimos de passarinhos ou plantas, mas eu só queria se
pusesse o meu nome Alina Leite, pois eu era gente e escrevi. Fomos até a Madre
Superiora para que decidisse sobre o pseudônimo e ela concordaria em colocar
Alina Leite. Dei um pulo bati nas costas dela e disse que ela era inteligente. Fiquei
muito feliz. Cada colaborador só poderia participar com uma redação publicada,
porém me concederam à oportunidade de publicar duas.
20. Você foi noiva muita jovem ainda, porque terminou o noivado?
AP – Fiquei noiva aos dezenove anos em 1940, de um estudante de medicina do
Amazonas. O nome dele era Djalma Batista, o noivado foi desfeito por ele que
quis me levar para o Amazonas. Já estava bem encaminhado, toda semana ele
escrevia e recebia uma carta. Na segunda-feira dia dos correios, abri a carta e ele
simplesmente liquidou o noivado, pelo meu bem estar bem e dele, pois havia em
ambas as famílias casos de doença mental. Isso me causou um mal enorme, não
conseguia dizer a ninguém, nem no convento, nem na escola pública onde ensinava.
Resolvi que só tinha um caminho, me matar. Pensei no que ia dizer não me sentia
valendo mais nada, resolvi morrer. Saí, comprei remédios que ouvi falar que eram muito
fortes, mortais, comprei muitas caixas, coloquei vários no pires e escondi as caixas para
que ninguém estivesse sabendo do que eu estava morrendo. Engoli cinqüenta e oito
comprimidos às 10 horas senti muito sono e escutei as cinco pancadas do almoço e
pensei: não morri, tinha que ir almoçar.
21. Você estava decidida a morrer? Por que não pediu ajuda?
AP – Levantei com o raciocínio virado, tonto, ouvi o barulho das pessoas descendo
para o refeitório, me sentia meio tonta, era um sábado, dia da irmã de caridade. Fui
chegando e senti que deveria segurar, pois poderia ficar tonta e percebi que estava

35
GILFRANCISCO

andando meio estranha e todos me olhavam. Quando eu cheguei à mesa todo


mundo estava de pé, 35 a 40 pessoas e eu disse: estão olhando para mim, ainda não
viram nada, mas vão ver agora, puxei a toalha da mesa e vi os pratos se quebrando,
comida caindo, os vigias me seguraram, levando-me num carro. Eles me disseram
que era melhor eu ir, tomaria conta de mim, um de cada lado, presa no bando atrás.
Fomos para uma casa de saúde de Henriqueta Martins Catarino. Ela queria fala comi-
go, queria um entendimento daquilo que eu tinha feito, queria-me dizer que procedia
livremente. Colocaram-me numa sala especial para emergência. O médico se dirigiu a
mim e disse que iria conversar comigo, tinha coisas em comum comigo, a literatura: um
romance contra outro romance será que dá, então discutimos, estudamos.
22. Quanto tempo permaneceu na Casa de Saúde?
AP – Esperei até as cinco horas, mas surgiu uma emergência então ela (Henriqueta)
não pôde vir e pediu para que eu esperasse até o dia seguinte às 8 horas. Fiquei lá
para dormir, senti muita fadiga como se eu tivesse convalescendo. Dormir e na
manhã seguinte ela chegou dizendo que tinha ido lá para eu desdizer o que havia
dito no almoço. Respondi que não iria desdizer que durante a sua mocidade ela
tinha tido mau comportamento. Henriqueta estava na minha frente e os olhos
caíram, falei coisas bem pesadas do passado dela como mulher. Ela ficou uma fera
e disse que não desistiria fácil, almoçaria lá e depois do almoço se eu não desistisse
seria entregue à minha família. A 1 h e 30 min ela me chamou e disse: vai desdizer
ou não vai, respondi que não ia e ela reafirmou que eu seria entregue a minha
família. Mais tarde ela ainda me deu outra oportunidade, perguntou se eu queria
que convocasse os que estavam presentes, que eu não estava no meu juízo perfei-
to. Disse que não ia fazer isso, tinha profissão, paguei sempre com meu trabalho.
23. Foram difíceis os dias negros em que passou no hospital?
AP – Comportei-me com todo o meu juízo no Hospital Juliano Moreira, antigo
Hospital São João de Deus. Tinha uma cama branca, havia um cochão de plástico,
um travesseiro também revestido de plástico, mas não havia cobertor. Era grande
o quarto e não tinha mais nada. Ao fundo uma banheira, um bidê, um vaso sanitário
e uma pia, uma espécie de veneziana pintada e bem conservada, de cor verde, achei
estranho, me deitei e fiquei sossegada, me controlei para não chorar. Levaram a
minha comida e me deram um caneco. Era frango, não havia nada de vidro nem
plástico, tudo bem partido e uma colher de sopa. Se eu quisesse mais água tinha
que beber na pia. Estava exausta de emoção, fui dormir e antes chorei. Não tinha
jeito, não tinha roupa, nada comigo só à roupa do corpo.
24. Após sua formatura, você passou a ensinar no colégio das freiras?
AP– Sim. No colégio das freias eu tinha oito turmas, meu lugar de professora do
Estado conseguido por um concurso onde concorri com 320 candidatos para 14
vagas e eu consegui o 12O lugar. Até junho eu teria no colégio das freiras os quatro

36
A Romancista Alina Paim

anos do ginásio, geografia e coreografia e de julho em diante os dois secundários e


o primeiro e segundo anos da Escola Normal do Estado da Bahia. Havia um tom
estranho, pois ela parecia estar julgando a minha família.
25. Quando e como você conheceu Isaías Paim?
AP – Conheci Isaías Paim em Salvador, quando eu tinha vinte anos. Ele estudava
medicina, quarto ano, e quis namorar comigo. Ele foi mandado pelo médico, era
residente e o diretor gostava muito dele e ajudava-o. Conheci o diretor do Hospi-
tal, Dr. João Mendonça, quando me internaram lá. Como lhe falei anteriormente,
eu tive uma atitude que não estava certa com as coisas, essa atitude foi porque
durante a refeição no pensionato, que era de uma das famílias mais ricas de Salva-
dor, filha do comendador Catarino, falei o que não devia. O encontro com Isaías
ocorreu na casa de saúde Juliano Moreira, quando ele entrou com um avental branco,
uma seringa e veio me aplicar à injeção, eu ainda não tinha ainda conversado com o
diretor. Era uma injeção habitual, um calmante, deixei que ele aplicasse. Isaías resolveu
estudar medicina numa fase já adulta e era de uma família pobre, viveu cinco anos como
residente no hospital de loucos, queria ser pediatra.
26. Quando e onde se casaram e quem foram seus padrinhos?
AP – Casei-me em Salvador, no dia oito de janeiro de 1943, meu pai era um dos
padrinhos, um casamento simples e três dias depois já estava com a passagem
comprada para morar no Rio de Janeiro. Em 13 ou 14 de janeiro a mala e a
papelada de livros estavam prontas para embarque, parecia uma livraria, eram 48
caixotes de livros.
27. Quando você chegou ao Rio de Janeiro em 1943, qual foi a sua impres-
são sobre a cidade?
AP – Fiquei entusiasmada com o Rio de Janeiro (1943), a maior cidade que eu
conhecia até então era Salvador. Fui de navio, o cenário de Copacabana me deixou
deslumbrada, tomei logo carinho pela cidade. Morei em muitos bairros: Laranjei-
ras (aristocrático), Perto do Largo do Machado, Ipanema, Leblon, em umas ruas
de Copacabana (duas ruas diferentes), Engenho de Dentro (Bairro da rede ferrovi-
ária), Subúrbio (vivi lá quatro anos). O que mais gostava era de fazer passeios para
lugares muito bonitos usando bondes ou usando o ônibus. Não precisava de
automóvel, uma pessoa simples podia andar na cidade, viver na cidade.
28. A vocação literária, descobriu quando?
AP – Descobri minha vocação literária desde menina, aos oito anos e meio, oito ou nove.
Ainda não estudava no colégio das freiras, mas elas me recebiam nas férias de fim do ano para
eu passar os dois meses, pois já tinha recorrido a quase todo mundo. Eu gostava de fazer
redação de língua portuguesa e fiz camaradagem com a freira da cozinha, recebia as compras
para me dar o papel de embrulho, pedia a ela para não amassar o papel.

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GILFRANCISCO

29. Você se acha uma contadora de história por convicção?


AP – Me acho uma contadora de história com convicção, sentia uma alegria.
Sempre gostei de história, hoje já não ouço muito bem.
30. Sua estréia literária foi com Estrada da Liberdade?
AP – Sim, na época eu já era militante do Partido Comunista.
31. A condição de militante no intelectual empobrece sua capacidade criadora?
AP – A condição de militante não empobreceu minha capacidade criadora, pois
não quis modificar a realidade para encaixar idéias e ficar forte, fazer propaganda.
32.Sua obra infantil tem engajamento político-social?
AP – Não, inventava história para entreter as crianças, durante os 20 minutos que
faltavam para tocar a sineta. Já inventava as histórias há muito tempo, mesmo
antes de formada, quando ia tomar conta de crianças que as freiras mandavam.
Anos depois um amigo que fazia parte de uma editora disse que eu poderia muito
bem escrever livro infantil por causa das minhas personagens e tanto falou que me
deu uma vontade. Escrevi: “O lenço encantado”, feito um gênero que fosse possí-
vel um romance de criança. As crianças gostaram muito do livro, em seguida
escrevi “O Chapéu do professor” e “Luzbela Vestida de cigana”, que um dia
assustou todo mundo, pois saiu andando. “Flocos de Algodão” era um livro infan-
til com uma parte instrutiva sobre o algodão, e surgia como um personagem.
Escrevi ao todo quatorze livros, dez romances e quatro infantis.
33. O princípio fundamental do realismo socialista é a captação da realida-
de com a visão partidária, objetivando uma tomada de posição explícita a
favor da construção do socialismo. Podemos dizer que sua obra ou parte
dela faz parte do chamado realismo socialista?
AP – Minha obra faz parte do realismo crítico, o livro da greve, esplendoroso, é
um livro classista, uma reivindicação por melhores salários.
34. Apesar de ser sergipana, qual a marca fundamental da Bahia na sua
formação intelectual e política?
AP – Fui levada para a Bahia com três meses de idade, cresci, me eduquei e vivi
na Bahia. Conheci Estância quando tinha dezoito anos, como prêmio de meu pai
pela minha formatura em professora – sempre tive muito carinho por Sergipe,
meus pais eram sergipanos, todo mundo era sergipano.
35. O Sol do meio-dia, Prêmio Antônio de Almeida, da ABL (1961), além de
ter sito traduzido para o búlgaro e alemão, é seu melhor romance de públi-
co e crítica?
AP - Ele foi muito bem recebido, veio antes do primeiro livro da minha trilogia de

38
A Romancista Alina Paim

Catarina e após “A Hora Próxima”. Não foi o melhor romance de público, pois não
teve mais versões. O que teve mais versões e sentido político foi: “A Hora Próxi-
ma”, sobre a greve dos ferroviários.
36. Você respondeu processo judicial, qual o motivo?
AP – Decretaram a tal ordem de prisão, processo em torno de mim. Fizeram o
desagravo de querer me condenar por causa do livro, conduziram-me a uma porta
e havia uma grande fila. Havia inúmeras pessoas para beijar a minha mãe pelo livro
que eu tinha escrito sobre a vida deles. Mandaram-me estender a mão para todos
e após teria a reunião do desagravo. Um velho ferroviário me abraçou, chorou e
disse que eu havia escrito a vida dele, foi à coisa mais comovente esse encontro
com o velhinho. Senti-me completa ao escrever sobre aquela luta, o Partido apoiou
a tradução de “A Hora Próxima” em russo e chinês. O sucesso desse romance foi
o fato de que a luta operária era o centro, a história de uma greve forte na maior
ferrovia de um país.
37 . Entre 1945/1956 você trabalhou na Rádio-MEC, para o programa infan-
til “No Reino da Alegria”, dirigido por Geni Marcondes. Como foi essa
experiência?
AP – Entre 1945 e 1956 trabalhei na rádio MEC, dirigida por Fernando Souza
entrei lá através dele, era muito amigo do editor Barbosa Melo, trabalhavam juntos
no edifício. Ele leu meus originais na mão de dois amigos do Paim. A experiência na
rádio durou 16 anos, o programa no Reino da Alegria, dirigido por Geni Marcon-
des, ia ao ar de segunda à sexta das cinco as cinco e meia. Escrever para a rádio foi
muito interessante. Eu queria ver se descobria o segredo de escrever uma coisa e
vê-la existir só através da palavra. Deixei de ensinar, pois o Rio de Janeiro não
reconhecia meu diploma. Li os programas que me deram, de vários tipos de pesso-
as. Havia um programa dirigido às professores rurais (educativo), chamado Brasil
versus Estados Unidos.
38. Como eram preparados esses programas?
AP – Levei três vezes doze assuntos sobre o mar ou seja trinta e seis assuntos. A
cada doze não havia repetição de aspectos, parecia outro mar. Foi aprovado de
imediato. O primeiro episódio é impossível lembrar. Haviam personagens pré-
estabelecidos, pois havia um limite já que cada personagem era pago pelo seu
desempenho. Não havia verba suficiente para isso, tive direito a duas crianças:
Catita (6 anos) e o irmão (8 anos) não aparece a mãe, mas sim a avó pois a figura da
avó era um tipo fabuloso. Ele disse que ia ler, e eu disse leia. Não quis que colocasse
música, preferi ler jornal. Disseram-me que o meu programa seria às sextas-feiras, para
não fugir da cabeçinha da criança até segunda, pois balança a atenção da criança.
Eu disse que o som do mar eu queria como um elemento de transição
com um narrador costurando o texto, queria um narrador vibrando para passar
calor para os meninos. Eles disseram que os meninos pegariam fogo; Umas cinco

39
GILFRANCISCO

linhas na transição atrás da voz só e um barulho de mar não exagerado, eu disse,


pois se não seria monótono aquele blá blá blá na cabeçinha da criança; As crianças
provaram que prestaram atenção, pois havia ensinamentos sempre, toda semana
tinha um prêmio que era sorteado com as respostas certas. O fulano de tal vinha
todo orgulhoso receber o prêmio e dizia que havia gostado da história. A gente via
aquela agonia, aquele negócio. Trabalhei com isso por dezesseis anos.
39. O exercício da crítica literária lhe rendeu inimizades?
AP – Nunca fiz crítica literária, não me atraía. A tônica de minha ficção era o
realismo, mas não era o realismo crítico e sim o realismo socialista;
40. Em 1964, com a instauração do regime militar no Brasil, muitos de seus
amigos foram presos ou exilados. Você esteve presa e em quais circunstâncias?
AP – Escapei do exílio, pois fiquei escondida por vinte e três dias. Houve uma
greve na rede ferroviária sem preparação, tomei até um susto, estourou meio
irresponsável e foi declarada na cidade de Cruzeiro, de São Paulo, onde eu tinha
estado lá três semanas antes fazendo levantamento da história das greves. Em
1917 muitas pessoas que ainda vivia me contaram coisas de suas vidas. Fiquei
amiga de Zé de Barros, ele ficou como um cavalheiro. Um vereador telefonou para
um jornal comunista chamado Imprensa Popular e correram para dar um jeito que
eu não fosse presa de manhã, foram lá em casa, me chamaram e disseram para
abrir, pois era importante, disse-me para eu não sair de mala na mão. Por vinte e
três dias fiquei num apartamento de uma pessoa que simpatizava pelo Partido e se
arriscou a me ajudar. Não posso dizer quem foi.
41. A mulher está sempre presente em sua obra. Isso tem relação com sua
infância?
AP – A mulher está sempre presente em minha obra, mas não tem relação com
minha infância, apenas com a compreensão que tem da vida. A mulher era muito
importante por isso deveria estar presente;
42. Em recente conversa com Antonio Cândido ele me disse que viu você pela
primeira vez ao lado de Jorge Amado, no I Congresso de Escritores realizado
em São Paulo. O que o encontro representou para você na época.
AP – Deveria haver uma presença forte da mulher.
43. Há quanto anos você mora em Campo Grande?
AP – Moro em Campo Grande (Mato Grosso do Sul) com minha filha Teresa
desde 8 de fevereiro de 2000.

Aracaju. Cinform, 21 a 27.abr.2008. www.cinformonline.com.br

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A Romancista Alina Paim

JULGAMENTO
CRÍTICO

41
GILFRANCISCO

42
A Romancista Alina Paim

Reuni neste capítulo alguns textos esquecidos em


velhos jornais, periódicos obscuros e livros esgotados
que, por certo, complementam a compreensão desta
personagem marcante, enigmática e revolucionária,
defensora do espírito libertário, cuja obra é inspiração
para todos os que sonham com um mundo melhor e
lutam para tornar esse sonho realidade.

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GILFRANCISCO

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A Romancista Alina Paim

Estrada da Liberdade
ASCENDINO LEITE

Concluimos a leitura do livro de estreia de Alina Paim – Estrada da Liber-


dade – e se não ousamos dizer que lemos um grande romance, estimamos poder
afirmar que achamos em suas páginas uma forma definitiva de literatura.
Não queremos forçar um paradoxo. A nosso ver, não devemos subestimar
a sensibilidade, as marcas ou artificios dos deslumbramentos de que, em regra
geral, padecem os livros de inspiração feminina. No caso de uma estréia como a
dessa jovem escritora que nos surge da Bahia através de um romance, a existência
desses transportes pode, talvez, oferecer indicações mais preciosas do que a
experiência vivida.
No que respeita à Alina Paim, a complexa ordem desses fatores se mani-
festa num sentido mais sério e consequente; as concessões ao temperamento não
chegam a atrofia as intenções ou propósitos da ficção, enquanto a técnica de
realização literária se processa de modo bastante seguro. Isto significa que a ro-
mancista de Estrada da Liberdade dispõe de recursos reais de expressão, que as
suas possibilidades são legítimas e nos deixam perplexos diante daquelo que ainda
será licito delas esperar-se.
Desde os primeiros capítulos de Estrada da Liberdade, somos forçados a
admitir as qualidades fundamentais da literatura sentida femininamente, mas sem
notas falsas, sem derramamentos, sem aqueles extases de mocinhas habilidosas,
como eram, outrora, aceitas as nossas revelações de escritoras. O livro de Alina
Paim constitui, neste particular, uma autêntica surpresa. É o tipo do romance
social como poderia ser inventado ou criado por uma imaginação de mulher, ro-
mance contido nas limitações de uma grande naturalidade e de uma forma acentu-
adamente feminina de sentir e traduzir o real. Livro escrito na terceira pessoa
afigura-se, entretanto, um depoimento psicologico de feito autobiográfico, a his-
tória de uma sensibilidade de mulher se transforma e se afirma plena de teor
humano, à medida que se lhe chegam o conhecimento e a descoberta do mundo.
Com a professorinha Marina, pomos os nossos passos nos caminhos e
nas dimensões dos pequenos dramas coletivos, colocamo-nos bem no centro das
coisas e dos sentimentos, bem no meio de criaturas que por serem modestas
obscuras e humildes ou por serem afortunadas, estultas, mas e orgulhosas palmi-
lham, entretanto, as mesmas estradas da condição humana. Marina reflete a singe-
leza dessa luta comum, acentua também, com uma beleza não pungente e uma
eloquencia não menos veridica, o quadro das desigualdades sociais sobrepondo-
se, quase sempre, às aspirações mais legítimas do individuo.
No conjunto desse livro de narração amena, de poucos ou nenhuns desa-
bafos – um romance sincero e lógico, não há dúvida – no meio dos tipos de

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GILFRANCISCO

invenção mais ou menos feminina, a professorinha recém-saída do colégio de


freiras é de um encanto particular e tangivel. Toda uma experiência súbita da vida
se desenvolve diante dos seus olhos atônitos; e a lição que lhe ocorre, entre
indagações sem resposta e fundas inquietudes, é uma mensagem de solidariedade
e de justiça, um desejo de fraternidade e de amor.
Na expressão de um sentimento de tal amplitude, a romancista pôs o
melhor dos seus recursos de observação e dos seus dotes de escritora. Conduziu-
se, até o fim, marcando esplêndidos momentos de realização literária, sem trair os
impulsos de seu temperamento feminino.
O tema e a expressão, felizmente, encontraram em Estrada da Liberda-
de uma forma definitiva de ficção, que nos leva a esperar ainda muita coisa de
Alina Paim.

Rio de Janeiro. Leitura, dez/jan. 1945.

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A Romancista Alina Paim

Na Estrada da Liberdade
Alina Paim, jovem romancista baiana, outrora da Estrada
da Liberdade, que vem obtendo um justo sucesso.

SANTOS MORAIS

Estrada da Liberdade, zona pobre da Bahia desenvolve-se o romance com


que a srª Alina Paim inicia sua vida literária. Dizem que por aquela longa e sinuosa
estrada entraram as primeiras tropas libertadoras nas lutas da Independência, e,
por tal motivo, recebeu a denominação simbólica. É mais certo, porém admitir-se
que tal desfruta os seus moradores de serem pobres e infelizes até o desespero, e
de se arrastarem nas ruas ou nas casas miseráveis como trapos humanos.
Situemos nesse ambiente uma escola pública e uma professora inteligente
ensinando às infelizes crianças maltrapilhas. Imaginemos o choque de princípios e
o despertador da consciência dessa jovem educadora num convento de freiras,
cheia de preconceitos e de princípios falsos, miserável daquelas crianças soltas e
desnudas, compreendendo a responsabilidade que lhe caberá então nos seus des-
tinos irmanando-se aos seus sofrimentos e procurando compreender-lhes as natu-
rezas selvagens e rebeldes. Imaginemos ainda o contraste que se dá pois essa
mesma professora ensina também distante possa-se um ano de atividades escola-
res. Mas a professorinha não se cansa de observar e aprender. Vive em dois
planos. O real, presente, e o invariavelmente a uma outra recordação e observa o
contraste, a errada educação burguesa, os falsos preconceitos, a assimilação e a
mentira, ajuda de internato, cheia de pequenas misérias e miseráveis enganos
hipócritas e má. Pouco a pouco a professorinha vai tendo a revelação de tudo. Lê
livros diferentes dados por amigos novos, e chega assim a uma nova concepção da
vida, do amor, das relações entre as pessoas humanas, e revolta-se contra tudo que
é falso e lhe fora ensinado deliberadamente mercê de uma educação dirigida no
interesse dos poderosos e ricos.
Eis o clima em que se desenvolve a ação de “Estrada da Liberdade” roman-
ce de uma jovem estreante que lemos com interesse. Simples e comovente, e um
livro rico de pequenas emoções, em que sentimos uma rara sensibilidade a vibrar
continuamente.
Vejamos por acaso pequenos episódios extraídos do livro: – Acompanha-
da de uma velha empregada, a professora passa pelo largo do Barbalho. Vêm um
casal de namorados pobres, aos abraços e beijos. A empregada velha comenta a
perdição das raparigas de hoje e diz:
– “Quarqué dia tá com fio no bucho”. Mas a professora Mariana pensa:
“haverá daqui a uns seis anos mais um pretinho de forma suja de lama, para a
escola pública”.
Em outro momento a professora recebe a confissão de uma aluna. Vieram

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GILFRANCISCO

da aula de catecismo, onde o padre falara dos pecados da carne e da punição do


inferno. A criança ficou com um problema terrível, pois tendo sua casinha um só
quarto, dormiam todos juntos, e ela via muitas vezes o ato sexual dos pais. Com as
palavras e ameaças do padre, ficou mortificada e, horrorizada, num colégio de
freiras, para onde vão as crianças ricas. Entre estes dois mundos estanques e
confessou à professora. Entre explicações e gestos de ternura, Mariana diz:

– Não é coisa nojenta, é um ato sagrado. Vou contar-lhe uma coisa –


naquele momento começa a vida de uma criancinha. Um dia quando você crescer
terá um filhinho. Ele começará assim. Eu comecei assim, você, o padre, todo o
mundo.
Depois desse dia, a criança ficou sua amiga.
Viajando nas férias, a professora recapitula sua vida neste ano de tantas
transformações e pensa:

– É imensa a escola da Estrada da Liberdade, e como tudo naquelas ruas de


barrancos falavam com eloqüência! A miséria gritava e como era assustador o número
dos surdos! Os bondes iam e vinham e ninguém ouvia, ninguém enxergava.
A Estrada da Liberdade fora sua escola e seus mestres foram Alvaisa,
Carlos Gomes, Arcanja, Marina, Alfredo e Azenete, e todos os pequenos de
pernas sujas de lama e barriga vazia. Eles eram aos milhares!
E é assim todo o livro. Somente num capítulo quando a professora
recorda as leituras espirituais do convento em que as freiras defendiam a revolução
fascista da Espanha, o livro perde um pouco da sua simplicidade e se torna
panfletário. Este capítulo, porém é de grande significação do livro, pois situa um
importante problema que é a culpabilidade de muitos agentes religiosos na propa-
gação do fascismo, quando era possível fazê-lo.
Eis um livro que merece ser lido.

Salvador. O Momento, 16.abr.1945.

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A Romancista Alina Paim

Um Livro de Combate
REGINALDO GUIMARÃES

O maior elogia, talvez, que se posso fazer ao livro Estrada da Liberdade de


Alina Paim é o da originalidade. Seu romance foge a tudo que se tem escrito entre
nós no domínio da ficção. Ninguém, até hoje, escreveu sobre o ambiente que ela
nos mostrou tão a nu, escandalosamente vivo, numa sinceridade de estreante, sem
os tiques da técnica apurada e bem acabadinha. Tem-se escrito sobre a seca, sobre
o cangaço, as fazendas de cacau e de café, tem-se feito romance psicológico, mas
ninguém até hoje penetrou numa escola de freiras para filmar suas cenas, suas
dores, suas maldades, toda essa coisa que vive por detrás do pano e que é a
verdadeira tragicomédia que o público não tem o direito de ver. E Alina Paim faz
isso com muita felicidade. Vê-se que não cria as histórias, não inventa, não tem
preocupação de atitudes marcadas, de que todo o mundo veja que é ela quem está
dizendo aquilo. Pelo contrário, mostra-nos apenas, com o coração revoltado pelas
injustiças sociais e pela miséria econômica, como se contasse para uma pessoa
amiga aquilo que viu e ouviu e mais uma recuperação de tanto tempo perdida. Ela
quer orientar aqueles que ainda não conhecem e continuam a trilhar o caminho
cerrado da educação artificial e falsa, como passarinhos que saltitassem, inadver-
tidamente, enquanto serpentes gulosas os espreitam.
Esse é o painel do livro. Tudo marcado de maneira simples, escrito como
se ditar para alguém, sem pensar em purismos, consegue prender a atenção do
leitor pela leveza do seu estilo e pela urdidura natural dos seus personagens que
se apresentam como os humanos defeitos e qualidades de todo pedaço de vida.
Nesse particular, lembrei-me, por acaso, de “Os Corumbas”. Não que ela procure
seguir a técnica do romancista sergipano, mas, pelo seguimento e fatalismo de
seus personagens. Ela, como Amando Fontes, aprende a vida pelo início e vai
seguindo até o fim. Não tem a preocupação de fixar o meio para contar depois o
que passou. Segue tudo como se fora um livro de memória.
Uma das partes mais vivas do seu livro é o capitulo em que nos apresenta
Marina tão preocupada com o problema sexual, ao primeiro contato com o livro
de forel. É tão vivo e tão natural que nos choca e entusiasma ao mesmo tempo,
levando-nos a pensar que estamos vendo a mocinha ingênua, de educação falsa,
adquirida através de uma moral religiosa adulterada, toda trêmula e receosa como
se estivesse realizando um crime hediondo.
É assim todo o livro, é toda uma luta pela recuperação do tempo perdido,
um libelo contra a maldade e a injustiça. Ela quer salvar as novas Marias José. A
contra ação deseducadora das Madres e Edwiges. Por isso demos esse livro palpi-
tante, sangrento, cheio de sinceridade nas suas cores e nas suas ações, sem o
pensamento antecipado do sucesso enganador dos “Best Seller”. Muita gente
precisava aprender-lhe o jeito de dizer as coisas de contar os fatos sem interferir

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GILFRANCISCO

nos personagens como se fossem bonecos de papelão. Ela deixa que as pessoas atem
por si mesmo. Movimentando-se de acordo com os seus modos de ver a vida ou com
suas autodeterminações. Não se lhe observa a preocupação de emoldurar os quadros
do seu livro com efeitos de fundo de tela, a fim de encher o livro, criar paisagens
fictícias para as antologias reacionárias que andam por aí. Tudo nela é módico, bem
encaminhado, pondo em muito baixo plano os pequenos defeitos de estréia.
Creio que com Estada da Liberdade, Alina Paim aparece como já disse.
Certamente que sua tendência é para seguir subindo e sua linha será sempre a linha
reta dos que olham os humilhados e oprimidos não com a piedade branca e reaci-
onária dos aristocratas, mas, com o olhar de quem lhes ensina o meio de saírem do
charco para olharem as estrelas.

Salvador. O Momento, 11.jun.1945.

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A Romancista Alina Paim

Apresentação
GRACILIANO RAMOS

Alina Paim chegou aqui há quatro anos, tímida, novinha, com jeito de
freira à paisana.
O romance que nos deu pouco depois não revelava nenhuma timidez e,
logo nas primeiras folhas, desmentia a aparência religiosa. Exibia até muita
coragem, dava às coisas os nomes verdadeiros, sem respeito exagerado às
conveniências.
A estréia, recebida em louvores, jogou a moça na literatura. Alina fez
vários livros. Este, o terceiro, deixa longe a Estrada da Liberdade, manifesta um
valor que o trabalho da juventude apenas indicava. A autora observa, estuda com
paciência, tem a honestidade rigorosa de não tratar de um assunto sem dominá-lo
inteiramente. As suas personagens são criaturas que a fizeram padecer na infância
ou lhe deram alguns momentos de alegria, em cidadezinhas do interior. Nenhum
excesso de imaginação.
Em geral os homens são vistos à distância, não se fixam. A escritora julga
talvez não conhece-los bem e receia apresentá-los deformados; limita-se quase
sempre a fazer referência a eles ou, quando é indispensável, a mantê-los na ação
em diálogos curtos, em rápidas passagens. Aqui duas figuras masculinas parecem
contrariar esta afirmação. Caracteres bem definidos: um velho e um idiota. Mas o
primeiro já deixou de ser homem, o segundo ainda se conserva menino.
O que surge com intensidade é a existência das mulheres – complicações,
desarranjos, pequeninos problemas. Há umas admiráveis tias velhas, rendeiras,
beatas, calejadas nos mexericos.
E há também a criança atormentada, a melhor criação de Alina. Vê-se bem
que a romancista cochilou nas orações compridas, trocou bilros na almofada e
agüentou muito puxão de orelha. Foi bom. Essas desventuras lhe fornecem hoje
excelente matéria.

Rio de Janeiro. Simão Dias, Editora da Casa do Estudante do Brasil, 1949.


Livraria Editora Cátedra-INL/MEC, 2ª edição, Rio de Janeiro, 1979.

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A Romancista Alina Paim

Novo romance de Alina Paim


OSWALDO ALVES

Alina Paim apareceu na literatura brasileira em 1943, com um livro que


iria provocar uma série de reações e críticas, favoráveis e desfavoraveis. Agora
lançou o seu terceiro livro, um romance excessivamente amargo, talvez, mas afir-
mativo e sincero, cujo título é “Simão Dias”.
Neste romance, as indispensáveis qualidades já reveladas pela autora nos
livros anteriores se fundem com a soma das experiências por ela acumuladas nos
últimos seis anos, durante os quais trabalhou intensamente, criando e manejando
tipos os mais diversos, enriquecendo a esplêndida galeria que hoje compõe a sua
obra literária. Por isso mesmo a narrativa é aqui mais espontânea e fluente, cheia,
desenrolando-se num ritmo largo e forte. A linguagem é mais direta, mais precisa.
Um pouco rude, às vezes, mas sempre clara, viva e segura.
O estilo simples indica esse ponto de consciente despojamento a que
aspiram os escritores maduros, certos de que a arte consiste em contar as coisas,
formular idéias e problemas humanos, de maneira desprentensiosa e profunda.
Este é um romance de quadros vigorosos, jogados em traços incisivos e
amplos, nuns entrelaçamentos notáveis, que forma a unidade da história, ou me-
lhor, das histórias, já que não existe aqui personagem central. Todos os tipos se
equivalem, dando-nos igual conteúdo como reflexos de vidas as mais diversas. É a
história de várias criaturas cujos pequenos dramas morais ganham enormes pro-
porções porque exprimem toda espécie de mutilação de uma sociedade rural deca-
dente, minada de preconceitos e recalques, onde os sentimentos atrofiados criam
um mundo de deformações morais.
Este romance é, sobretudo, a vida de uma cidade do inteiror do Brasil.
Pode mesmo ser qualquer uma dessas pequenas cidades brasileiras em que a
rotina, a estagnação e os vícios de uma formação defeituosa conduzem quase
sempre à patética indiferença em face dos problemas que hoje agitam o mundo.
São vidas soltas que se encadeiam em páginas excelentes, de um modo
natural e por isto mesmo vivo e sincero. Luiza – talvez a única alma de certo modo
enriquecida por um sopro de legítimo sentimento da vida – move-se em quadros
um tanto dispersos. Mas a evolução de suas idéias e da sua própria vida é perfei-
tamente lógica e natural.
Noutros planos, outros personagens de igual porte compõem um só bloco
de sentimentos sombrios. No desenrolar do romance, porém, esses sentimentos
adquirem novos valores, que dão ao romance um tom afirmativo, à medida que os
personagens vão descobrindo as verdades humanas através de um longo processo
comparativo – mais adivinhando do que aprendendo.
Seu Bernardino, Adélia, Iaiá, Totonho, mãe Carolina, Das Dores todas

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GILFRANCISCO

essas figuras não são de forma alguma personagens de segundo plano. Eles com-
pletam os quadros com igual intensidade, valorizados pela autora de maneira sutil
e inteligente. Das Dores destaca-se algumas vezes, é certo, evoluindo de menina
para mulher, no tumulto de indagações aflitivas sobre o mistério da vida e da
fecundação. Entra muitas vezes em choque com as pessoas adultas, pois não vê o
mal onde ele lhe é apontado: encontra-o, inversamente, em quase tudo que exaltam
como virtudes consagradas, por força mesmo das contradições da sociedade defor-
mada em que vive, e na qual seu caráter se vai formando. Entre essas contradições,
Luiza lhe aparece como a única pessoa equilibrada, razoável e lógica.
Mesmo destacando-se algumas vezes, Das Dores há de ser, no entanto,
apenas uma peça indispensável à estrutura deste romance tão forte e tão humano.

Rio de Janeiro. Leitura, set. 1949.

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A Romancista Alina Paim

Alina Paim
ZÓZIMO LIMA

Está ai uma escritora sergipana de muito talento, filha de Simão Dias que
eu, como muitos dos nossos conterrâneos, desconhecia até agora.
Chama-se ela Alina Paim, nasceu na terra de Ranulfo Prata, passou a
meninice em Estância, e, depois, seguiu para o Rio, onde, além de professora,
firmou a sua reputação como novelista de primeira água, que não, ficou aquém
de Rachel de Queiroz, Dinah Silveira, Lúcia Miguel Pereira e Lúcia Benedetti.
Alina Paim, que é ainda muito moça pelo que constato da fotografia, já escre-
veu três romances, festejados pela imprensa: Estrada da Liberdade; Simão Dias e A
Sombra do Patriarca, agora mesmo editado pela Livraria Globo, de Porto Alegre.
A Sombra do Patriarca, que obedece ao mesmo tema de Estrada da Liber-
dade, é a dolorosa via-sacra da classe proletária, vítima da injustiça social do
capitalismo com o seu poder absorvente, os seus preconceitos baseados na
divisão de classe e na herança de títulos de nobreza que, pouco a pouco, diante
da acelerada marcha socialista, vão caindo esfrangalhados.
Há, ainda, por aí, tocaiado nos alpendres de “casa grande” quem alimen-
te ilusões de que estes restos de fidalguia, mantidos à força de dinheiro consegui-
do a exploração de trabalhador se manterão ainda por dilatado tempo. Engano
manifesto. Não há de ter a avalanche que destruirá as barreiras que separam a
miséria da riqueza. Não será a barbárie stalinista com os seus sangrentos expur-
gos que fará melhorar as condições de vida da humanidade.
É o próprio homem, cansado de sofrer, abroquecido na fé religiosa dos seus
antepassados, que se revoltará para a conquista da felicidade não fluida por aqueles
ambiciosos, individualistas que olvidaram as advertências do apóstolo Thiago.
É impossível que no mundo continue por mais tempo a desigualdade
humana no que tange ao bem e mal estar. Uns comem, outros passam fome. Uns
vestem, com opulência, outros andam quase nus. Nos hospitais, outros andam
quase nus. Nos hospitais há quartos com instalações de luxo asiático que são um
insulto à enxerga no salão promiscuo onde geme o enfermo indigente que tem
também direito à vida mas não tem dinheiro.
É mister por fim ao egoísta opulento, de mentalidade medieval, que
adquire com o dinheiro arrancado aos pobres, ao trabalhador de enxada, ao
carregador do cais, ao caixeiro do armazém, ao supersticioso, vastas terras para
proveito próprio com prejuízo da pobreza que nelas habita muitos anos e é
expulsa sem a piedade pregada por Jesus.
A sombra do Patriarca, de Alina Paim, é o quadro vivo das vidas em confli-
tos, em que a opulência acaba sendo derrotada pelas forças coesas de uma classe que
um dia entendeu de reivindicar ancestrais direitos postergados.

Aracaju. Correio de Aracaju, 24.nov.1951.

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A Romancista Alina Paim

A Professorinha de Estância já tem História Literária


BARBOZA MELO

Em 1944, quando éramos editores e pensávamos lançar todos os jovens de


talento deste país (que sonhadores), fomos surpreendidos com a visita de uma
menina de cabelos soltos, cacheados, 1,50 de altura, 48 quilos de peso, rosto
bonito de ingênua, fala suave, e uma timidez inconcebível numa adolescente que
queria ser escritora.
Trazia-a Osvaldo Alves nosso companheiro – atual desertor da literatu-
ra, depois de ter conquistado lugar de destaque na referida, com “Um Homem
Dentro do Mundo”
–Aqui está uma escritora que deseja ser lançada por Leitura.
A mocinha ao ouvir estas palavras quase desapareceu na cadeira. Creia
mesmo que naquele instante ela perdeu metade do seu peso e do seu tamanho.
Ficamos conversando, e a custo nos informando – ela falava tão baixo – das
suas modestas pretensões. Tinha um romance para editar, que se chamava “Es-
trada da Liberdade”. E, mais à vontade, foi contando como e porque o escreveu.
– Nascida em Estância, vivi minha meninice em Simão Dias – ia dizendo –
saindo desta cidade sergipana com 10 anos, endereçada ao Convento de Nossa
Senhora da Soledade, em Salvador, situado, precisamente na Estrada da Liberdade
(que deu nome ao romance) onde permaneci 12 anos, sendo 8 como interna e 4
como professora. Deixando o Convento, casei-me e, sem pensar escrever livro, ia
anotando num caderninho tudo de interesse que vivi naquele casarão. O resultado
foi este romance que submeto à sua crítica.
Assim falou aquela adolescente professorinha de Convento sem denotar a
mínima convicção no seu primeiro trabalho literário.
Oswaldo Alves já me havia falado do livro com a maior simpatia. Tomei os
originais daquelas mãos quase trêmulas, e no dia seguinte já o havia lido.
Telefonei-lhe comunicando que ia editar o seu romance – ela emudeceu. Não
teve palavras nem para agradecer, nem para perguntar quando o lançaria. Compre-
endi que estava terrivelmente emocionada, e não adiantava continuar.
Em 1945, com a Estrada da Liberdade de Alina Paim (este o nome da
professor,inha adolescente), a Editora Leitura lançava uma escritora que viria a ter
posição definitiva entre os nossos bons romancistas.
Em menos de 2 anos a edição estava esgotada, tendo contribuído para isso
as freiras daquele Convento, que eram as maiores compradoras do livro, não para
ler, mas para queimar... Elas não gostavam do que Alina havia escrito, colaborando
para a imortalidade do Convento Nossa Senhora da Soledade.
Quatro anos depois a mocinha continuava mocinha, mas já com outro
romance: A Sombra do Patriarca.
Reminiscência da vida do campo. Foi entregue a Editora Globo de Porto

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GILFRANCISCO

Alegre que, quando o lançou em 1950, já Alina, num passe de mágica, tinha feito
outro – Simão Dias – que a Livraria Editora Casa do Estudante do Brasil publicou
na frente daquele, em 1949. Este era realmente o terceiro, não o bastante ter saído
um ano antes do segundo.
Graciliano Ramos tendo lido os originais “Simão Dias”, fez a apresentação
do mesmo numa orelha da capa.
A mocinha não pára, trabalhadora infatigável, se interessa pela situação e
participação das mulheres na greve ferroviária de 1954, em Minas e temos então o
seu quarto romance, A Hora Próxima, editado no ano seguinte, na Coleção Roman-
ces do Povo, dirigida por Jorge Amado para Editorial Vitória. Grande tiragem
(8.500 exemplares) e , seguramente, o seu melhor trabalho literário. Já teve duas
traduções, uma para o russo, que lhe proporcionou cento e cinqüenta mil cruzei-
ros de direitos, recebidos por intermédio do Banco do Brasil, com prefácio de
Jorge Amado, e outra edição em chinês. A primeira tradução foi em 1957 e a última
dois, anos depois.
Alina Paim continua a mesma mocinha que nós a conhecemos há 16 anos
passados. Engordou uns quilinhos, que lhe fizeram muito bem, e dos seus cabelos
negros, cortados, destacam- se alguns fios de platina ( não sei se são verdadeiras).
Continuou escrevendo romances, era natural. Sol do Meio-Dia, é o seu
último livro, que acaba de ganhar o Prêmio Manuel Antônio de Almeida, instituído
pela Associação Brasileira do Livro, com a dotação de R$ 100.000.00, e que será
editado pela editora criada pela mesma ABL.
Tão confiante está a ABL no êxito do romance que pensa em fazer com ele
um grande lançamento nacional.
Chegou mesmo a lançar outro concurso, entre desenhistas e pintores, para
a capa do livro, com o prêmio de R$ 20.000,00 para o primeiro lugar. Será o
romance de capa mais cara já editado no Brasil.
Pensou em uma novela de 70 ou 80 páginas – dissemos – quando começou
a escrever Sol do Meio-Dia. E saiu um livro de 350 páginas datilografadas .Contou
que era a historia de uma moça (Ester) que veio de Paripiranga, na Bahia. Quem
sabe se não é a história dela?
Alina Paim também se interessa por literatura infantil: este ano a Conquista
lançará três volumes de histórias infantis : O lenço encantado, A casa da coruja
verde e Luzbela vestida de cigana, todos ilustrados por Percy Deane.
Antes de encerrar esta conversa com a vencedora do Prêmio Manuel Antô-
nio de Almeida, dissemos a Alina que, seguramente, ela estava escrevendo outro
romance (ela não pára) e como se chamava?
A resposta veio imediata: História de Catarina.

Rio de Janeiro. Leitura. Ano XIX, no 37 Julho, 1960.

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A Romancista Alina Paim

Prefácio
JORGE AMADO

Alina Paim é um nome que dispensa toda e qualquer apresentação. Não só


o público brasileiro há muito a consagrou como um dos nossos melhores roman-
cistas: também fora do Brasil sua obra tem repercutido com sucesso, em tradu-
ções que levaram seus personagens até as distantes plagas das línguas russa e
chinesa. Entre os prosadores surgidos em 1945, geração das mais significativas,
seu nome é estrela de primeira grandeza.
Modesta e tímida, essa sergipana conquistou seu lugar definitivo em nos-
sa literatura sem jamais fazer vida literária, sem pertencer a grupos, sem uma
concessão, afastada dos meios literários e da publicidade fácil, das igrejinhas e do
disse-que-disse. Para ela existe a literatura e não vida literária, o que não significa
ter-se a romancista trancado numa torre de cristal, pois jamais se negou a seus
deveres de cidadão, jamais separou sua literatura da vida.
Seu êxito permanente e sólido deve-se à importância de seus romances. A
partir da Estrada da Liberdade, estréia tão comentada na época, elogiada pela crítica
e apoiada pelo público ledor, revelando uma romancista que se afirmaria depois
completamente em A Sombra do Patriarca, Simão Dias (a meu ver, seu melhor livro
entre os anteriores e um dos grandes romances brasileiros) e A Hora Próxima.
Tratando da professorinha no bairro operário denso de problemas na capital da
Bahia ou de velhas solteironas nas cidades mortas do interior de Sergipe ou de
valentes trabalhadores nas greves das ferrovias, uma unidade marca sua obra: a
compreensão e a solidariedade humanas. Suas figuras de mulheres são silenciosas e
acanhadas, sabe todos os segredos da alma feminina, penetra fundo no coração do
ser humano. Escrevendo uma língua viva e colorida, tendo hoje um completo conhe-
cimento do seu “metier” de romancista, ao publicar seu quinto romance encontra-se
situada na primeira fila de nossos escritores.
Volta hoje, Alina Paim, a seu público com Sol do Meio-Dia, romance já
consagrado com um alto prêmio, o da Associação Brasileira do Livro, julgado já
por figuras como as de Valdemar Cavalcanti, João Felício dos Santos e Plínio
Bastos. Eis uma notícia excelente para os leitores, sobretudo para os muitos que
têm acompanhado com consciência e admiração a carreira vitoriosa da romancista.
Ela atinge agora sua maturidade criadora. A menina da Estrada da Liberdade, que
irrompeu pelo romance brasileiro em 1945 e nele impôs sua presença, soube
construir seu caminho e crescer de livro para livro, para chegar à madureza deste
Sol do Maio-Dia, que será sem dúvida um dos acontecimentos literários impor-
tantes do ano. Estou certo do sucesso deste romance não só junto aos intelectuais
mas, também entre o grande público pois ele é construído com a experiência
vivida e o amor ao ser humano.

Rio de Janeiro. Sol do Meio-Dia, Edições ABL, 1961.

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GILFRANCISCO

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A Romancista Alina Paim

Alina Paim é só romancista


VALDEMAR CAVALCANTI

Com Alina Paim aconteceu o que poucas vezes tem ocorrido nos anais da
literatura brasileira: o caso da escritora jovem, ainda no período dos exercícios
preliminares da criação literária, traçar decididamente seu caminho, ciente de sua
vocação e disposta a não fugir da trilha. E não foi por um terreno de fácil semea-
dura que a mocinha de Estância optou: foi pelo romance. Embora a vida não lhe
houvesse dado tempo para juntar o necessário capital de experiência e observação,
que é, afinal, capital de giro para todo romancista. Tanto que já aos 23 anos
estreava com Estrada da Liberdade, surpreendendo os críticos da época e os
leitores de bom gosto com a maneira segura de seu comportamento literário, a
demonstrar que bem conhecia o chão em que pisava. Daí em diante de outra coisa
não cuidou senão de sua carreira. Nenhuma concessão nem transigência. Não se
deixou tentar pela atração do conto. Nem da crônica. Nem de artigo leve de jornal.
Interesse maior e único o romance. Largou a província natal, foi para Salvador,
matando o tempo como professora de bairro pobre, até vir para o Rio. Sem o
menor sinal de pressa, fazendo tudo para apurar a escrita, olho vivo nos fatos e
nos seres humanos, foi construindo conscienciosamente sua obra de romancista,
estimulada por alguns prêmios importantes, até chegar ao requinte de escrever
uma espécie de romance desmontável – para usar a expressão de Rubem Braga – a
Trilogia de Catarina, três romances acoplados, que dão a exata medida de seu raro
poder criador, tanto quanto do rigor de disciplina da imaginação.
Agora, ressurge, madura, com A Correnteza, que constitui um painel da vida
de subúrbio do Rio. Mas não é positivamente a moldura o que mais importa neste
romance, embora montada com indiscutível mestria. Importante mesmo é o qua-
dro psicológico que Alina Paim apresenta, de extraordinária nitidez. E o leitor
inteligente observar no fino do traço das figuras femininas, em particular, e veja
como ela as desenha, com mãos leves e firmes, mãos como de uma Maria Lauren-
cin que se desse ao romance.

Rio de Janeiro. A Correnteza, Editora Record, 1979.

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GILFRANCISCO

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A Romancista Alina Paim

A Mulher e seus Símbolos


NÚBIA MARQUES

O título nos vem à mente, a partir do livro da escritora sergipana-


sulista Alina Paim, A Correnteza. A experiente romancista consegue, dentro de
uma visão feminina, nos levar ao intricado mundo psicológico, que circunscre-
ve a mulher à casa e aos problemas domésticos, longe de ser essa mulher, de
modo essencial. Alina, com pena segura e lúcida, recria a mulher, dentro dos
seus limites, muito embora não seja a fútil e ingênua criatura que sempre
esteve à sombra da casa, à sombra dos fatos, mediana e simplista, à sombra de
tudo, livre intérprete dos seus destinos.
Obstinada em conseguir seu grande mundo, a casa, Isabel passa por paus
e pedras, passa pisando a ternura, carregando o sonho como quem carrega um
totem. A casa, começo e fim da sua vida, a moradia, o sonho hegemônico não
apenas da mulher, mas substancialmente ligada a ela pelos que fazeres cotidianos
de uma dona de casa. Não a imagem e semelhança de muitas mulheres, no seu
feminismo pacato e débil, construções da burguesia que consegue reduzir a mu-
lher, a socializadora por excelência, a uma dominada pouco arguta e simples.
A problemática feminina desde a questão da mãe solteira, ao adultério,
desde o fazer bolos ao ouvir a música erudita, da escolha inadequada do homem, à
traição a sua irmã, estão presentes nesse grande livro. A inconsequente e pouco
sábia rivalidade que faz das mulheres não seres iguais, mas seres que se devoram
quando está em questão o homem. A maternidade controvertida, o amor nas múl-
tiplas formas, na sua nudez absoluta, a velhice e a loucura percorrem todos os
cantos do livro que faz de Alina uma escritora que nada deixa a desejar, nem perde,
ou é menor do que uma Clarice Lispector.
Romance (que a ficha técnica classificou de contos brasileiros, com que
não concordamos), A Corenteza é escrito numa linguagem permeada de filosofia e
poesia, forte, enxuta, que leva o leitor a sentir-se perplexo, a força ficcional de sua
autora. O fantástico e o real, o delírio e a realidade andam de braços dados. O social
não deixa de estar presente e muito forte, quando desfilam na sua narrativa os que
vivem nos subúrbios da cidade do Rio, com seus inúmeros problemas, com a luta
quase desigual entre a vida e a morte. A liberdade de todos e da Isabel estão na
jaula, aprisionadas pelas buscas de dias melhores. A luta feroz contra as adversi-
dades da vida faz de Isabel um gigante. A Correnteza é um livro onde o amor e o
ódio se contradizem e se completam, um livro para ser lido e vivido muitas vezes.
A casa e a mulher são um bloco só e a segurança total.

Aracaju. Arte e Literatura, no 298 (Gazeta de Sergipe), semana de 3 a 9 jul. 1988.

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A Romancista Alina Paim

Prefácio – A Sétima Vez


NÚBIA MARQUES

Alina Paim nasceu em Estância (SE) e viveu a primeira infância em Simão


Dias (SE). Aos 10 anos, órfão, foi residir em Salvador, no Convento Nossa Senho-
ra da Soledade, situado na Estrada da Liberdade, nome que serve de título ao seu
primeiro romance, editado pela Leitura, que retrata a vida de uma professora cheia
de ideais, em contato com amarga realidade de sua população de bairro proletário,
onde tenta aplicar métodos modernos de aprendizagem.
Em 1949, a Livraria Editora Casa do Estudante do Brasil edita Simão Dias,
que teve como apresentador Graciliano Ramos, amigo e incentivador da tímida
escritora nordestina. Alina nos disse como foi importante em sua vida o apoio e
admiração do velho Graça, sempre cáustico nas suas críticas, muito importante na
sua vida literária. A Editora Globo publicou em 1950 A Sombra do Patriarca, que
retrata a vida no campo, romanceando a maléfica e prepotente atuação do senhor
de engenho. A Editora Vitória, dirigida por Jorge Amado, publica em 1954 A Hora
Próxima, coleção Romance do Povo, traduzido para o russo e chinês. Livro que
retrata a participação das mulheres numa greve de rede ferroviária. Depois veio
Sol do Meio-Dia, que recebe o prêmio Manoel Antônio de Almeida em 1962. A
história de Ester, a jovem que veio de Paripiranga para o Rio de Janeiro, cidade
maravilhosa e vive nas pensões coletivas, onde se concentra a população proble-
matizada pelas dificuldades nas grandes cidades. Alina fez incursões na literatura
infantil e a editora Conquista publicou: O Lenço Encantado, a Casa da Coruja
Verde e Luzbela vestida de Cigana. Em 1965 ganha o prêmio especial Walmap com
a Trilogia de Catarina: O Sino e a Rosa, A Chave do Mundo e o Círculo, em que a
romancista traça a trajetória de uma mulher entre o sonho, o aprendizado da vida
na busca de um sentido existencial, num protesto contra os códigos, sempre
dentro de um padrão da realidade e dignidade feminina. Em 1966 publica Flores de
Algodão. Treze anos depois, rompe o silêncio e ressurge com A Correnteza,
publicada pela Record em 1979, mais uma vez a população suburbana sofrida na
batalha pela sobrevivência tem em Alina a voz digna. Há onze anos que Alina
escreveu A Sétima Vez e não encontrou editores, estes viraram as costas aos
romancistas que não entraram na ciranda de leitura fácil, leve, enganosa, alienado-
ra, permitindo o crescimento avassalador do lixo-literário nacional e internacional.
Agora A Sétima Vez retorna à análise de vida problematizada do velho
Teodoro, aposentado, e já sonhando com a tranqüilidade de um cata-vento, vê-se
empurrado para atividades laborativas, pois necessitava criar o neto, colhido pela
orfandade. Os esquemas competitivos que na mocidade poderia muito bem en-
frentar, o leva a esforço de sobrevivência. A velhice encontra na pena dessa vigo-
rosa romancista o dardo crítico e a reflexão sábia de uma fase de vida humana que,
a despeito da labuta já enfrentada, empobrecida por uma aposentadoria irrisória,
volta com toda força para buscar o pão cotidiano,dentro das adversidades e difi-

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culdades que cercam um velho.


O Governo do Estado de Sergipe, ao editar A Sétima Vez, premia uma
grande escritora, a intelectualidade séria e comprometida, a que se alia à força
literária e sobretudo evidencia o cuidado do gasto público com programas sérios,
no amparo dos que não possuem o fôlego financeiro para arcar com os gastos
exorbitantes de uma publicação.

Aracaju. A Sétima Vez, Fundesc – Fundação Estadual de Cultura, 1994.

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A Romancista Alina Paim

SÍNTESE
BIOGRÁFICA

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GILFRANCISCO

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A Romancista Alina Paim

1919. Nasce a 10 de outubro, em Estância, município do estado de Sergipe, filha


de Manuel Vieira Leite e de Maria Portela de Andrade Leite, ambos sergipanos,
Alina Leite foi batizada em Simão Dias. Com três meses de nascida mudou-se com
os pais para Salvador.
1920. Batizada em 9 de março, na Igreja Matriz de Simão Dias, tendo como padri-
nhos Bernardino da Cruz Andrade e dona Adelaide Carolina Portela de Andrade.
1926. Órfão da mãe, retorna para Sergipe e vai morar no município de Simão Dias
com os avós, permanecendo dos 7 aos dez anos, onde freqüenta o Grupo Escolar
Fausto Cardoso, da Praça da Matriz.
1929. Com a idade de dez anos, retorna a Salvador para continuar seus estudos,
passando a residir no Convento de Nossa Senhora da Soledade, próximo à Lapinha,
situado na Estrada da Liberdade, onde permanece por doze anos, sendo oito como
interna e quatro como professora pública primária, período cujas reminiscências
inspiraram seu primeiro romance “Estrada da Liberdade”. Nesse educandário de frei-
ras, escreve aos doze anos os primeiros textos (“Canção da tarde” e “Júlio Verde”)
para o jornalzinho interno “Arco-Íris”.
1937. Aos 18 anos visita Estância como prêmio de seu pai por sua formatura em
professora.
1938. Fica noiva do estudante amazonense de medicina Djalma Batista.
1943. Alina Paim deixa o Convento e casa-se em 8 de janeiro com Isaías Paim (1925),
dias depois muda-se para o Rio de Janeiro, onde residiu até 1999. Como na época não
conseguiu trabalho melhor (seu diploma de professora somente era válido dentro dos
limites do Estado da Bahia), de súbito, sem profissão definida, foi ensinar na Escola para
filhos de pescadores, na Ilha de Marambaia. Aí escreveu seu primeiro romance, Estrada da
Liberdade, publicado em fins do ano seguinte, com enorme repercussão nos meios literá-
rios e de público, esgotando-se em quatro meses a primeira edição.
1944. Publica no Rio de Janeiro, pela Editora Leitura, o romance “Estrada da
Liberdade”, onde conta, em forma de ficção, sua decepcionante experiência de pro-
fessora. Esse lançamento coincide com as publicações do romance de Clarice Lispec-
tor, “Perto do Coração Selvagem”, e do segundo livro de contos, “Praia Viva”, de
Lygia Fagundes Telles.
1945. Em janeiro Alina Paim participa do 1O Congresso Brasileiro de Escritores, em
São Paulo, do qual, Astrojildo Pereira foi um dos três redatores da declaração de
princípios, que exigiu “completa liberdade de expressão”, e conclamou todos a luta-
rem por um governo eleito por “sufrágio universal, direto e secreto”.
1945/1956. Convidada por Fernando Tude de Souza, diretor da Rádio do Ministério da
Educação e Cultura – MEC, Alina passa a escrever para o programa infantil (textos para
crianças e adolescentes) “No Reino da Alegria”, dirigido por Geni Marcondes.
1946. Dirigida por Astrojildo Pereira, “Literatura” nasceu em setembro desse ano com a
disposição de ser uma revista ampla, democrática – do seu conselho de redação faziam
parte Álvaro Moreyra, Anibal Machado, Artur Ramos, Graciliano Ramos, Orígenes Lessa
e Manuel Bandeira. Em suas páginas foram estampadas colaborações de Otávio Tarquínio
de Souza, Jorge de Lima, Raymundo Souza Dantas, Guilherme Figueiredo, Lúcia Miguel
Pereira e Francisco de Assis Barbosa. Foram publicados seis números.
1947. Participa do 2O Congresso Brasileiro de Escritores, Belo Horizonte. Em maio,

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o Tribunal Superior Eleitoral cassou o registro do PCB, que mal chegara a ter dois
anos de vida legal, no pós-guerra.
1949. A Livraria Editora Casa do Estudante do Brasil edita o romance (autobiográfi-
co) “Simão Dias”, com apresentação de Graciliano Ramos. Nesse livro, Alina retrata
parte de sua infância e adolescência.
1950. Publica pela Livraria Globo, de Porto Alegre, o romance “A Sombra do Patri-
arca”, onde retrata a vida no campo, romanceando a maléfica e prepotente atuação
do senhor de engenho. Participa de uma reunião no Rio de Janeiro, contando com a
presença de aproximadamente 30 intelectuais militantes do Partido, entre os quais
James Amado, Diógenes Arruda, Carrera Guerra, Astrojildo Pereira, Werneck de Cas-
tro, Oswaldino Marques e outros.
1955. Através da coleção “Romances do Povo”, volume XI, dirigida pelo escritor
baiano Jorge Amado, Alina Paim publica, pela Editora Vitória, “A Hora Próxima”. O
romance vende 10 mil exemplares somente na primeira tiragem.
1961. Lança no Rio de Janeiro, pelas Edições ABL, o romance “Sol do Meio-dia”, com
prefácio de Jorge Amado e conquista o primeiro prêmio do concurso da ABL (Associação
Brasileira de Livros). Essa obra foi traduzida para o russo, chinês, búlgaro e alemão.
1962. Convidada pelo Herser, editor da Conquista, Rio de Janeiro, Alina Paim faz
incursões na literatura infantil e publica três livros: A casa da coruja verde; O lenço
encantado e Luzbela vestida de cigana. Entrevistada pela escritora Wania Filizola,
declarou: “Sentir-se realizada é uma expressão muito definitiva e utópica. Enquanto
alguém enxerga possibilidade de aprender e aperfeiçoar-se, ainda está tentando reali-
zar-se. É o meu caso”.
1964. Com trilogia de Catarina (O Sino e a Rosa, A Chave do Mundo e O Círculo,
todos publicados pela Imago), ganhou o Prêmio Especial Walmap – Curitiba, IV
Centenário do Rio de Janeiro, criado exclusivamente para distinguir essa obra, cuja
comissão julgadora foi integrada pelos acadêmicos Raimundo Magalhães Júnior, Ado-
nias Filho e pelo novelista Otto Lara Resende.
1966. Quando Alina Paim publica Flores de Algodão, patrocinado pelo Serviço de Infor-
mação Agrícola do Ministério de Agricultura, já é uma escritora de fama internacional.
Premiada, traduzida, mas sempre resguardada, recusando-se a ser “importante”.
1979. Rompe o silêncio depois de treze anos com a publicação, pela Record, do
romance “A Correnteza”
1994. Publica, através do Governo do Estado de Sergipe, por iniciativa da escritora
Núbia Marques, na época presidente da Fundação Estadual de Cultura – Fundesc, o
romance “A Sétima Vez”.
1995. A partir desse ano, Alina apresenta um problema na retina, impossibilitando de
ler e, conseqüentemente, pára de escrever.
2000. No início de fevereiro deixa o Rio de Janeiro – onde morava com uma de suas filhas
– e passa a residir em Campo Grande (MS), com a filha mais velha, Teresa Paim.
2004. Falece a 24 de julho seu companheiro, o médico Isaias Paim, pai de suas filhas.
2007. Em novembro, Alina quebra o silêncio e concede entrevista exclusiva ao jornalista
Gilfrancisco. Alguns trechos foram publicados no semanário Cinform, de Aracaju.

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OBRAS
PUBLICADAS

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• Estrada da Liberdade (romance)


Rio de Janeiro: Editora Leitura, 1944 (223 páginas)
• Simão Dias (romance)
Rio de Janeiro: Livraria Editora da Casa dos Estudantes do Brasil, 1949 (207 páginas)
2a edição. Rio de Janeiro: Livraria Editora Cátedra/INL-MEC, 1979 (184 páginas)
• A Sombra do Patriarca (romance)
Porto Alegre (RS): Editora Globo, 1950 (265 páginas)
• A Hora Próxima (romance)
Rio de Janeiro: Editorial Vitória, 1955
• Sol do Meio Dia (romance)
Prêmio Manoel Antônio de Almeida, da Associação Brasileira do Livro, 1961.
Rio de Janeiro: Edições ABL, 1961 (328 páginas)
• A Casa da Coruja Verda (literatura infantil)
Rio de Janeiro: Editora Conquista, 1962, (77 páginas)
• Luzbela Vestida de Cigana (literatura infantil)
Rio de Janeiro: Editora Conquista, 1962 (77 páginas)
• O Lenço Encantado (literatura infantil)
Rio de Janeiro: Editora Conquista, 1962 (77 páginas)
• O Sino e a Rosa (romance)
Rio de Janeiro: Editora Lidador, 1965 (171 páginas)
• A Chave do Mundo (romance)
Rio de Janeiro: Editora Lidador, 1965 (180 páginas)
• O Círculo (romance)
Rio de Janeiro: Editora Lidador, 1965 (181 páginas)
(Pela trilogia de Catarina, Alina Paim recebeu o Prêmio Especial Walmap, IV
Centenário do Rio de Janeiro, 1965)
• Flocos de Algodão (literatura infantil)
Rio de Janeiro: Serviço de Informação Agricola do Ministério da Agricultura, 1966
• A Correnteza (romance)
Rio de Janeiro: Editora Record, 1979 (231 páginas)
• A Sétima Vez (romance)
Aracaju-SE: Fundação Estadual de Cultura – Fundesc, 1994 (188 páginas)
Livros Traduzidos
• A Hora Próxima (russo)
Moscou: Editora de Literatura Estrangeira, 1957
• A Hora Próxima (chinês)
Pequim, 1959
• Sol do Meio Dia (búlgaro)
Sófia: Norodna Cultura, 1963
• Sol do Meio Dia (alemão)
Berlim, 1968
Traduções
• A luta pela unidade da classe operária contra o fascísmo, Jorge Dimitrof
Rio de Janeiro: Editorial Vitória, 1946 (104 páginas)
• Um passo adiante, Dois passos atrás, Vladimir I. Lenin
Rio de Janeiro: Editorial Vitória, 1946 (251 páginas)

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FORTUNA
CRÍTICA

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ALBUQUERQUE, Úrsula Rangel. A Educação feminina no romance Simão Dias, de Alina


Paim. Aracaju: Anais da VI Semana de História (A Historiografia de Maria Thetis Nunes),
Universidade Federal de Sergipe – UFS – Departamento de História, 2004.
ALVES, Oswaldo. Novo Romance de Alina Paim. Rio de Janeiro: Leitura, set. 1949.
AMADO, Jorge. Prefácio “O sol do-meio-dia”. Alina Paim. Rio de Janeiro: Edições
ABL, 1961.
ARAÚJO, Jorge de Souza. A Correnteza. Rio de Janeiro: Jornal do Brasil, 1977.
CARDOSO, Ana Maria Leal. Marcas do feminismo em Alina Paim “Do Imaginário às
Representações na Literatura”, Ana Maria Leal Cardoso e Carlos Magno Gomes
(org.). São Cristóvão: Editora-UFS, 2007.
____ A Identidade da Mulher em Alina Paim. (Identidade e Alteridades: Teoria e
Prática), org. Carlos Magno Gomes e Marcelo Alário Ennes. São Cristóvão: Editora
– UFS/ Fundação Oviêdo Teixeira, 2008
CAVALCANTI, Valdemar. Alina Paim é só romancista, “Prefácio” – A Correnteza,
Alina Paim. Rio de Janeiro: Editora Record, 1979.
COELHO, Nelly Novais. Dicionário Feminino Brasileiro.
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www. Informesergipe.com.br / www.kplus.cosmo.com.br
___ A Redescoberta de Alina Paim (entrevista), Aracaju: semanário Cinform, 21 a 27
abr. 2008.
GUIMARÃES, Reginaldo. Um Livro de Combate. Salvador: O Momento, 11 jun. 1945.
LEITE, Ascendino. Estrada da Liberdade. Rio de Janeiro, Leitura, dez-jan, 1945.
LIMA, Melo. Leitura Descobre uma Professora. Rio de Janeiro, Leitura, jun. 1944.
LIMA, Zózimo. Alina Paim. Aracaju: Correio de Aracaju, 24. nov. 1951.
MARQUES, Núbia Nascimento. A Mulher e seus Símbolos. Aracaju: Arte e Literatura-
Gazeta de Sergipe nO 398, semana de 3 a 9 jul. 1988.
____ “Prefácio”, A Sétima Vez. Alina Paim, Aracaju: Fundesc – Fundação Estadual de
Cultura, 1994.
MELO, Barboza. A Professorinha de Estância já tem História Literária. Rio de Janeiro:
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MORAIS, Santos. Na Estrada da Liberdade. Salvador: O Momento, 16. abr. 1945.
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Mídia Independente – www.midiaindependente.org (29 abr. 2008).
OLIVEIRA, Ilka Maria. A Literatura na Revolução: Contribuições Literárias de
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Leitura, 1944. Linhas Tortas (crônicas). São Paulo: Livraria Martins Editor, 1962.
RUBIM, Antônio Albino Canelas. O Partido Comunista e os Intelectuais.
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SUBSÍDIOS
BIOGRÁFICOS

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Alina Paim e Paulo Carvalho Neto

Capa do romance Estrada da


Liberdade – 1944

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Livro publicado em 1944

Alina Paim na biblioteca de sua casa

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Simão Dias, edição de 1949

Simão Dias, 2a edição de 1979

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A Sombra do Patriarca, edição de 1950

A Hora Próxima, edição de 1955

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A Chave do Mundo, edição de 1965

O Círculo, edição de 1965

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Floco de Algodão, edição de 1966

A Correnteza, edição de 1979

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A Sétima Vez, edição de 1994

Alina Paim, dezembro de 2007

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Alina Paim colabora com o texto “Simão Dias”.


Época, no 2, out/nov, 1948.

Alina Paim colabora com o texto “A Carta”.


Leitura, no 43/44, jan/fev, 1961.

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Grupo Escolar em Simão Dias


onde Alina Paim estudou

Alina Paim com o escritor Paulo Carvalho Neto

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O AUTOR
GILFRANCISCO, nascido em 27 de maio
de 1952 em Salvador, Bahia. Começou como
jornalista, trabalhando nas sucursais dos jornais
Movimento e Em Tempo, no início dos anos se-
tenta, época em que participou das atividades cul-
turais no Estado, produzindo vários shows musi-
cais, passando a integrar o Grupo Experimental de
Cinema da UFBA.
Em 1975 foi assistente de fotografia de Tho-
mas Farkas no filme Morte das Velas do Recônca-
vo, dois anos depois como assistente de produ-
ção de Olney São Paulo, no filme Festa de São
João no interior da Bahia, ambos documentários
dirigidos por Guido Araújo, entre outros.
Foi durante algum tempo consultor e professor do Centro de Estudos e Pes-
quisas da História. Licenciado em Letras pela Universidade Católica do Salvador-
UCSal, é professor universitário e jornalista.
É autor de Conhecendo a Bahia; Gregório de Matos: o boca de todos os
santos; As Cartas, uma História Piegas ou Destinatário Desconhecido (com Gláucia
Lemos); Ascendino Leite; Crônicas & Poemas recolhidos de Sosígenes Costa; Flor
em Rochedo Rubro: o poeta Enoch Santiago Filho; Poemas de Enoch Santiago Filho
(pesquisa, introdução, biobibliografia e notas); Godofredo Filho & o Modernismo na
Bahia; O poeta Arthur de Salles em Sergipe; Imprensa Alternativa & Poesia Marginal,
anos 70; Musa Capenga: poemas de Edison Carneiro; Tragédia: Vladimir Maiakóvski;
Walter Benjamin: o Futuro do Passado Versus Modernidade & Modernos; Literatura
Sergipana, uma Literatura de Emigrados, entre outros.
Tem publicações em diversos periódicos do país: Revista da Bahia (EGBA); Revista
Exu (Fundação Casa de Jorge Amado); Revista Travessia (UFSC); Revista Cepa (BA);
Revista Teias (UFSC); Revista Kawé Pesquisa (UESC); Revist’aura (SP); Revista Arte Livro
(BA); Judiciarium (SE); Revista da Literatura Brasileira (SP); Nordeste Magazine (SE);
Aracaju Magazine (SE); Preá (RN); Revista de Cultura da Bahia; Candeeiro (SE); Letras de
Hoje (RS); Revista do Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe; Revista da Academia
Sergipana de Letras.

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Publicações do autor pelas


Edições GFS

Coleção Base (Bahia/Sergipe)


1.Literatura Sergipana,
uma literatura de emigrados
2.Jacinta Passos: a busca da poesia
3.A romancista Alina Paim
4.O contista Renato Mazze Lucas
5.Instrumentos e Ofício:
inéditos de Carlos Sampaio
6.Sosígenes Costa: novos textos esparsos
7.Enoch Santiago Filho:
novos textos esparsos
8.Bernardino de Souza,
geógrafo e historiador
9.Os irmãos Aluysio & Walter Sampaio
10.O Cronista Enoch Santiago
11.Pedro Kilkerry: maldito entre malditos
12.Glauber Rocha: Noticiário Cultural
13.O Rebelde Alves Ribeiro
14.O Historiador José Calasans
15.Os Modernistas José Maria & Abelardo
Romero
16.O Rebelde Clóvis Amorim

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