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Risco e Modernidade

Uma nova teoria social?*

Renata Motta

A teoria da modernização reflexiva desenvolvi- que riscos tais como terrorismo, crises financeiras e
da por Ulrich Beck (1986, 1997, 2007) e colabora- mudança climática não mais podem ser confinados
dores (Beck, Bonß e Lau, 2003; Beck e Lau, 2005) a fronteiras nacionais.
tem como tese central a configuração de uma socie- O diagnóstico de Beck sobre o mundo con-
dade de risco como reação às consequências negati- temporâneo encontra muitos pontos de contato
vas do processo de industrialização e modernização. na realidade e encontrou bastante ressonância para
Embora tenha se iniciado nas sociedades ociden- além do mundo acadêmico. Entretanto, seu argu-
tais, notadamente, naquelas que tomaram a dian- mento apresenta fragilidades teóricas e conceituais
teira nos processos de industrialização, a moder- que limitam a plausibilidade da teoria da moderni-
nização reflexiva se globaliza a partir do momento zação reflexiva e de sua tese da sociedade global do
risco –, sobretudo sua aplicabilidade para as regiões
* Agradeço a Frédéric Vandenbergue e aos participantes com trajetórias distintas da modernidade europeia
do ST “Teoria social contemporânea”, no qual uma (Alexander, 1996; Chernillo, 2007; Costa, 2004;
versão prévia deste texto foi apresentada durante o 34°
Encontro Anual da Anpocs, em 2010. Meus agrade-
Elliott, 2002; Fine, 2007; Knöbl e Joas, 2004). Pre-
cimentos a Sérgio Costa, pelo intercâmbio intelectual tende-se analisar a teoria da modernização reflexiva
sobre modernidade, aos editores e pareceristas desta em dois passos argumentativos: o primeiro detém-
revista, pelas valiosas sugestões, e a Jonas Oliveira, pela -se sobre a noção de risco como categoria socioló-
revisão criteriosa e enriquecedora.
gica; o segundo consiste no exame dos conceitos de
Artigo recebido em 22/03/2013 modernidade e de reflexividade na arquitetura teó-
Aprovado em 25/03/2014 rica de Beck. O objetivo deste diálogo é construir
RBCS Vol. 29 n° 86 outubro/2014
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hipóteses alternativas para pesquisas sociológicas 2008), Beck, Bonß e Lau (2003), Bonß (1995),
sobre a tematização de riscos em conflitos e debates na primeira (sociológica), e de Douglas (2003) e
acerca de novas tecnologias. Douglas e Wildavsky (1983), na segunda (antro-
O texto está dividido em cinco partes, além pológica) – é que a sociologia conceitua risco como
desta introdução e da conclusão. A primeira apre- específico da modernidade (ocidental), ao passo
senta um breve resumo da teoria da modernização que a antropologia o trata como uma forma par-
reflexiva e a tese da sociedade do risco de Beck. Na ticular de uma função encontrada em sociedades
segunda, descrevo as principais teses do autor para em outros tempos e espaços. Consequentemente,
postular uma sociedade global do risco de Beck. a teoria antropológica relativiza o conceito de ris-
Na seção seguinte, discutem-se o conceito de risco co como equivalente funcional para atribuição de
como categoria sociológica e a pertinência de uma responsabilidade e demanda por justiça, sem deixar
teoria sociológica sobre risco. Desenvolvo, na quar- de reconhecer sua particularidade relativa à cultura
ta seção, o argumento de que risco e modernidade ocidental.
estão relacionados de uma forma mais geral que a Beck se destaca nesta área da sociologia e ul-
postulada por Beck ou, dito de outra forma, que trapassa as fronteiras disciplinares e acadêmicas
Beck estipula condicionantes para a emergência de como referência neste tema, ao defender que risco é
sociedades de risco que não são plausíveis empiri- o novo princípio organizador da sociedade. A mu-
camente. Uma teoria sociológica sobre risco e mo- dança social que leva a esta nova sociedade é explica-
dernidade precisa ir além de: (i) explicações causais da a partir de uma teoria da modernização, na qual
mecânicas e deterministas como a vinculação entre modernidade é conceituada como a primazia do
risco e sociedades altamente industrializadas; (ii) futuro – em detrimento do passado – sobre o pre-
explicações essencialistas que vinculam risco a certa sente. A noção de que o futuro é aberto e depende
cultura. Na quinta seção, proponho cinco premis- do que é feito no presente fundamenta a semântica
sas para a investigação sociológica nesta temática. do risco. Em um diálogo com os pós-modernistas,
Beck defende que a modernidade não acabou, mas
se encontra em uma segunda fase. A primeira mo-
A sociedade do risco e a dernidade seria definida pela ênfase otimista na
modernidade reflexiva possibilidade de construir o futuro por meio de de-
cisões humanas; a segunda, seria configurada pela
Uma das grandes contribuições da sociologia percepção das consequências futuras negativas das
do risco consiste precisamente em situar o conceito ações presentes.
de risco em uma teoria sobre a sociedade. O debate A tese de Beck sobre a sociedade de risco é bem
em outras disciplinas, como na ciência política, nas conhecida: em um primeiro estágio da moderni-
relações internacionais, especialmente no direito zação, o desenvolvimento científico e tecnológico
internacional público, na psicologia e na economia, produz sistematicamente novos riscos, mas de for-
muitas vezes se encontra descontextualizado, com a ma continuamente legitimada, na medida em que
“importação” ingênua de um problema empírico. o Estado se vale da ciência para conhecer e contro-
A sociologia e a antropologia diferenciam-se neste lar tais riscos. A história das instituições políticas
debate ao propor uma explicação para a evidência da sociedade moderna dos séculos XIX e XX pode
do tema “risco” na sociedade contemporânea, rela- ser entendida como a criação conflituosa de um sis-
cionando o conceito com uma teoria de sociedade. tema legal para lidar com as incertezas e os riscos
A questão que se impõe, portanto, diz respeito industriais fabricados, isto é, fruto de decisões. O
à maneira como isso é feito. Pode-se afirmar que cálculo de risco, o princípio do seguro e o Estado
uma grande diferença entre as explicações socioló- de bem-estar social possibilitam contratos de risco
gicas e as antropológicas mais conhecidas na temá- sancionados pelo Estado, isto é, institucionalizam
tica do risco – refiro-me, sobretudo, aos trabalhos promessas de segurança diante de um futuro des-
de Beck (1986, 1997, 2007), Luhmann (2005, conhecido.
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Entretanto, a radicalização do desenvolvimen- e nas disciplinas técnicas” (Idem, p. 37). O autor pos-
to industrial gera efeitos que não se conseguem tula que se abrem novas possibilidades de simbiose
mais prever e, portanto, controlar. Fracassam as entre as ciências naturais e as sociais. Entretanto, há
condições e as instituições básicas da primeira lutas entre definições antagônicas de risco.
modernidade, como o Estado-nacional, a luta de Aqui entra o terceiro elemento do conceito
classes e a concepção de um progresso linear técni- de risco, a saber, a pluralidade de definições e ra-
co-econômico. Trata-se do segundo estágio da mo- cionalidades conflitantes. A consequência princi-
dernidade, o da modernidade reflexiva, quando ela pal seria a quebra do monopólio da racionalidade
se confronta com as consequências de seu sucesso – pela ciência e a entrada da racionalidade social e
a sociedade de risco. “A categoria da sociedade de ris- de diferentes atores da modernização na disputa
co tematiza o processo de questionamento das ideias pela definição dos riscos. A ciência não consegue,
centrais para o contrato de risco, a possibilidade com um cálculo objetivo de risco baseado na pro-
de controle e a possibilidade de compensação de babilidade, apaziguar os diferentes valores e inte-
incertezas e perigos fabricados industrialmente” resses sociais em jogo (Idem, pp. 38-39). Por fim,
(Beck, 2007, p. 26, tradução livre1). o elemento “futuro” refere-se à conceituação de
Vale retomar aqui os pontos principais da risco como algo que não aconteceu, mas é uma
conceituação de risco proposta por Beck. Na teo- ameaça, uma projeção de perigos futuros. A nor-
ria da sociedade do risco, o autor define como os matividade do risco, neste caso, toma a forma da
principais componentes do risco: conteúdo teóri- demanda implícita para evitá-lo. Ao reivindicar
co; conteúdo normativo; pluralidade de definições ações de controle, de mitigação e se, possível,
conflitantes (racionalidade científica e racionali- ações que evitem sua realização, este futuro inde-
dades sociais); componente de futuro. O primei- sejável determina a ação no presente da sociedade
ro elemento é uma das formas pelas quais Beck do risco.2
(1986, pp. 35-36) diferencia risco de riqueza. Am-
bos seriam objeto de um tipo de distribuição que
configura classificações sociais, respectivamente, Globalizando a modernidade reflexiva
situações de perigo e classes sociais. Suas lógicas
possuem valores opostos: enquanto a apropriação Ulrich Beck publicou, em 2007, o livro Wel-
de riqueza é desejada, os riscos são evitados, nega- trisikogesellschaft: auf der Suche nach der verlorenen
dos. Se os bens da riqueza podem ser diretamente Sicherheit, título que poderia ser traduzido como
consumidos e experimentados, os riscos são, em “Sociedade global de risco: na busca da segurança
princípio, mediados pela linguagem, pois não po- perdida”. No prefácio, o autor explica que tenta-
dem ser sentidos ou vistos diretamente – alguns só o ra traduzir o livro World risk society, publicado em
são para gerações futuras. Assim, a objetividade do 1999, para o alemão, entretanto muito havia se
risco depende dos mecanismos de percepção e de passado desde então, e a proposta tradução gerou
interpretação da ciência – teorias, experiências, ins- uma nova obra.3 De 1999 a 2007, acontecimentos
trumentos de mensuração, explicações causais –, como ataques terroristas, crises financeiras interna-
sobretudo para conceituar risco como produto não cionais, debates sobre pesquisas com embriões e a
intencional do processo de modernização. mudança climática na agenda internacional instiga-
Sobre o conteúdo normativo, Beck defende que ram o autor a tratá-los como encenações de riscos
há uma ética implícita no conceito de risco. Os de- globais e como elementos do que ele considera uma
bates a esse respeito implicam a questão de aceitação sociedade global de risco.
do risco, a qual está relacionada com a questão maior: Esta se configura em dois momentos: a mo-
como queremos viver? “Afirmações sobre risco são a dernização reflexiva e o momento cosmopolita. O
forma pela qual a ética e, com ela, também a filosofia, argumento principal é de que os perigos fabricados
a cultura, a política reaparecem nos centros da mo- pela sociedade industrial extrapolam, na sociedade
dernização, isto é, na economia, nas ciências naturais de risco, as fronteiras nacionais, como resultado
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da modernização. Beck tem como objetivo nesta ciação social na modernidade. Beck compartilha
obra ampliar a teoria e a sociologia do risco com com Luhmann a conclusão de que, com base na
três passos: 1) pela perspectiva da globalização; 2) teoria da diferenciação dos sistemas, os riscos glo-
pela perspectiva da encenação; e 3) pela perspectiva bais são invisibilizados, já que cada sistema opera
comparativa de três lógicas de risco global – ecoló- segundo sua lógica; consequentemente, eles não
gica, econômica e terrorista. têm condições de perceber e gerir os riscos globais.
A sociedade global do risco parte do segundo “Os perigos globais da modernização não podem
estágio da modernização e inclui o que Beck deno- ser classificados na ciência ou na economia ou na
mina “momento cosmopolita”. Este enfatiza que os política, eles representam, pelo contrário, um tipo
perigos fabricados pelo homem, como os riscos de de coprodução dos subsistemas” (Idem, p. 345). O
crise ecológica, crise financeira global e de ameaça diagnóstico de Beck parte da conclusão de Luh-
terrorista não se deixam limitar espacial, temporal mann e, no entanto, vai em direção oposta. Se as
ou socialmente. Eles sobrepujam as fronteiras na- instituições competentes foram constituídas na ló-
cionais, configurando-se como riscos globais. Seu gica da diferenciação funcional, com os riscos glo-
potencial cosmopolita reside na capacidade de afe- bais elas se tornam inimputáveis e incompetentes, o
tar democraticamente todos, mesmo que de forma que gera uma “irresponsabilidade organizada”. Há
desigual, perpassando as diferenças de classe dentro uma contradição institucionalizada entre a necessi-
de nações e entre estas. dade de decidir e a crescente impossibilidade de fa-
Beck fundamenta epistemologicamente o con- zê-lo, o que gera mais riscos. Assim, o autor propõe
ceito na interseção entre realismo e construtivismo. uma mudança no entendimento da modernização
Segundo a perspectiva realista, a globalidade dos como crescente diferenciação de sistemas para en-
perigos é comprovada pelas ciências naturais. Po- tendê-la como autodestruição, autodissolução, mas
rém, o que se considera como risco global não é também autorrenovação.
produto apenas do saber científico, mas de percep- A terceira tese concerne ao antagonismo dos
ções culturais, mediadas e construídas; trata-se de riscos. Para o autor, não existe uma ontologia do
uma parte do saber social, com suas contradições e risco, já que riscos por si não existem, existem con-
conflitos. Na perspectiva construtivista, a sociedade flitos de risco, que dividem o mundo em dois cam-
global de risco não resulta da qualidade “global” do pos incomensuráveis: aqueles que decidem sobre
problema, definida pelas ciências naturais, mas das o risco, podendo criá-lo ou evitá-lo, e aqueles que
coalizões discursivas transnacionais que colocam o consomem o risco como efeitos indesejáveis e im-
problema na agenda global. Portanto, o autor pro- previstos da decisão alheia. O antagonismo dos ris-
põe um “construtivismo realista” para fundamentar cos globais é desarmado pela política nacional, na
sua teoria, aliando ambas as epistemologias. qual as desigualdades e as assimetrias internas das
Essa teoria possui cinco argumentos ou teses relações de poder de definição tornam mais invi-
centrais (Beck, 2007, cap. 11). A primeira supõe síveis os antagonismos internacionais na definição
uma nova qualidade histórica da sociedade global dos riscos. Por outro lado, ele é agravado porque a
de risco. Para o autor, a condição humana do sé- indeterminação do risco ressalta a importância da
culo XXI caracteriza-se pelos riscos incalculáveis e percepção de risco. Se na Guerra Fria, a dimensão
as incertezas fabricadas da vitória da modernização. política e o tema da segurança eram centrais, na so-
A singularidade da nova qualidade histórica da so- ciedade global do risco, a cultura invade a política.
ciedade é seu poder de decidir sobre a existência São as culturas de percepção de risco que se antago-
humana e do mundo. A sociologia teria como tare- nizam – risco é o tema central.
fa retomar a dimensão histórica e criar uma teoria O quarto argumento se dá em dois passos: a
social para o século XXI que diagnostique as mu- postulação do cosmopolitismo real e a teoria da
danças pelas quais a sociedade está passando. reflexividade. Partindo do conceito de risco como
A segunda tese consiste nas contradições insti- indiferenciação entre realidade e representação e
tucionais como contraposição à teoria da diferen- como algo não delimitado espacial ou temporal-
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mente, o autor deduz que seus efeitos globais for- conceito e a ambição do autor em construir um
çam a comunicação para além das fronteiras na- novo conceito de sociedade têm como consequên-
cionais. O cosmopolitismo não é uma opção, mas cia justamente ocultar o horizonte normativo nos
uma condição, pois todos se encontram unidos debates sobre o risco. Ilustrarei meu argumento
pelas ameaças: não se pode mais fechar-se nas fron- com a discussão sobre novas tecnologias.
teiras nacionais e externalizar riscos, uma vez que Ao definir risco como efeitos não intencionais
todos são conectados na produção e na definição de do progresso ou como catástrofe antecipada, Beck
riscos. Esta condição gera reflexividade, no sentido abandona a ontologia ambivalente do conceito so-
de uma crítica aplicada da razão instrumental (que ciológico de risco e apenas enfatiza o seu caráter
só incorre na reflexão da adequação entre meios e negativo, aproximando-se do conceito utilizado
fins), já que a racionalidade do risco é oposta a ela. pelo senso comum e pelas ciências naturais. Isso
Sua lógica é a do choque, do sofrimento, da com- negligencia o fato de o risco envolver uma decisão
paixão (por exemplo, quando há um tsunami). na qual atores percebem vantagens em detrimen-
Por fim, Beck argumenta que há lógicas dis- to de possíveis danos futuros. Um problema adi-
tintas dos riscos globais e constrói uma tipologia cional é que, segundo Beck (2007, p. 90), apenas
formada pelos riscos econômicos, ecológicos e alguns países apresentam as condições para que os
terroristas. Os dois primeiros distinguem-se dos riscos sejam “involuntariamente desmascarados”:
segundos a partir de duas variáveis: catástrofes de existência de democracia parlamentar, relativa in-
efeitos não intencionais (ou colaterais) e catástrofes dependência da mídia e produção de riqueza avan-
intencionais. As primeiras têm duas medidas de va- çada. O exemplo de Beck é o de sociedades em que
lor, bom ou ruim e trazem uma combinação espe- a fome, para a maioria da população, não é a maior
cífica de vantagens para uns e danos prováveis para preocupação, mas o perigo do câncer ou da Aids.
outros. Isto não vale para as segundas. Nas primei- A sociedade de risco é uma sociedade dessegurada
ras, o Estado de exceção é fruto de imprudência e (pois, paradoxalmente, a cobertura de seguro di-
não de uma decisão visando a este objetivo (o que minui com o aumento do perigo) em um contexto
coloca a autoridade estatal, científica e econômica histórico da seguridade total do Estado de bem-es-
em questão). Nas segundas, a decisão sobre o Es- tar social (seguro contra todos os riscos, Vollkasko-
tado de exceção não está mais nas mãos de atores -Gesellschaft). Ou seja, Beck recorre ao topo da se-
estatais, não se encontra mais limitada, mas social, gurança social para fundamentar sua narrativa de
espacial e temporalmente ilimitada. Os três com- “segurança perdida”.
partilham duas características: (i) todos demandam Para alguns autores, Beck cai na armadilha do
uma reação ativa que ultrapassa as bases da política macrorrealismo ou hiper-realismo (Knöbl, 2007;
nacional e internacional e abrem espaço, dessa for- Costa, 2004), a saber, a abstração a partir de uma
ma, para novas filosofias políticas; (ii) não podem experiência singular para construir uma teoria da so-
mais ser vistos como ameaças externas, mas devem ciedade em geral. Knöbl e Joas (2004) questionam se
ser entendidos e tratados como ameaças fabricadas. o diagnóstico de 1986 (lançamento do livro Risikoge-
sellschaft) não estava por demasiado vinculado à situ-
ação da Alemanha Ocidental pré-reunificação, onde
Risco como categoria sociológica o Estado de bem-estar social havia de certa forma
prosperado e podia-se supor que problemas e con-
Um dos maiores legados de Beck foi lançar a flitos socioeconômicos perdiam significado relativo.
discussão sociológica sobre o risco. Contestando o Beck não nega que os conflitos de classe continuam
monopólio das ciências naturais sobre o assunto, vigentes ao afirmar que riscos são desigualmente dis-
Beck chama a atenção para as limitações da ciên- tribuídos e sua lógica combina-se com a desigualda-
cia para responder a questões a esse respeito, ilumi- de social.4 Entretanto, uma de suas teses centrais é de
nando a dimensão normativa implícita no conceito que os conflitos sobre risco se dão em sociedades que
de risco. Entretanto, pretendo demonstrar que tal já solucionaram relativamente a “questão social”.
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Mesmo considerando a persistência dos conflitos cessário distinguir entre risco como categoria nativa
de classe, para Beck a lógica do risco se sobrepõe à e risco como conceito sociológico. No primeiro caso,
da distribuição social de recursos e oportunidades; o contexto são as regras multilaterais do comércio
para ele, risco é a categoria central de organização da agrícola e de alimentos, dos padrões internacionais
sociedade. de saúde humana, animal e vegetal (estabelecidas no
Porém, não seria sua teoria uma generaliza- âmbito das organizações internacionais OMC, FAO,
ção muito apressada de uma situação particular no OMS, OIE, IPPC), bem como os órgãos nacionais
tempo e no espaço? Como aplicar essa teoria em e regionais de proteção à saúde e ao meio ambiente.
sociedades em que a desigualdade social é a ques- Nestes, risco é conceituado no marco das ciências
tão mais premente? Ou em sociedades cuja esfera naturais como tamanho do dano multiplicado por
pública não é tão permeada por debates que recor- sua probabilidade de ocorrência.5 Especificamente
rem ao conceito de “risco”? Elas são “sociedades de no plano internacional, os membros da OMC acor-
risco”? Quais as condições de uso do termo “risco”? daram direitos e obrigações recíprocas que incluem
Conceituar “risco” como os efeitos negativos o direito de restringir o comércio internacional para
do progresso econômico restringe a conformação a proteção da saúde e do meio ambiente. Mas isso
de uma sociedade de risco àquelas que já teriam tem que ser justificado na linguagem dos riscos. As
auferido os ganhos dessa industrialização e do de- regras multilaterais partem de uma concepção neo-
senvolvimento da ciência e da técnica, ao passo que liberal de Estado ao exigir uma justificativa para sua
as sociedades em desenvolvimento seriam ávidas intervenção no livre mercado, incluindo a restrição
pelo progresso. É como se reivindicações “pós- do desenvolvimento de uma tecnologia. Essa justi-
-materiais”, como as preocupações sobre os riscos ficativa deve ser feita por meio da ciência e em ter-
à saúde e ao meio ambiente, fossem privilégio das mos de danos à saúde e ao meio ambiente. Nesse
sociedades centrais. No entanto, a suposição de que contexto, o privilégio da racionalidade científica foi
a luta contra as desigualdades, ou seja, de que as reforçado.
demandas materiais ou o reconhecimento por dig- O uso desta categoria “nativa” não permite ob-
nidade praticamente excluam do horizonte norma- servar que risco, diferentemente de outros termos
tivo das sociedades periféricas preocupações com os como perigo, danos, perdas, envolve uma decisão,
riscos ambientais e sanitários, obscurece o que está ou seja, não é resultado de uma catástrofe natural
em jogo em conflitos sobre riscos. (Beck, 1986; Luhmann, 2005, 2008). Para uma
Postular que a tematização dos riscos seria uma perspectiva sociológica, é necessário tornar visível
etapa posterior à do acúmulo material torna invi- no conceito de risco não somente essa atribuição a
sível que, no debate sobre riscos das tecnologias, uma decisão, mas a observação de que tal decisão
não somente danos ambientais e sanitários podem foi tomada por alguém na expectativa de incorrer
ser contestados, mas também questões como, por em ganhos, a despeito de possíveis perdas. Risco
exemplo, concentração de renda. O debate sobre não é somente negativo (probabilidade de ocorrên-
os alimentos transgênicos é um exemplo de que, cia de um dano); para quem tomou a decisão, é
muito mais do que a proteção da saúde humana positivo incorrer em risco. No caso da biotecnolo-
e do meio ambiente, o que está em jogo são ques- gia aplicada à agricultura, trata-se de uma decisão
tões socioeconômicas e éticas, como o oligopólio vista como uma oportunidade para auferir ganhos
sobre sementes, direito de propriedade intelectual (de produtividade, de redução de custos com pesti-
sobre material genético, direito dos agricultores de cidas e de direitos de propriedade intelectual) que
coexistência de culturas transgênicas, convencio- podem se confirmar ou não no futuro. A decisão
nais e agroecológicas. Longe de afetar somente os envolve possíveis perdas que podem afetar quem
europeus, estes são problemas globais que possuem não participou da transação e não está auferindo as
efeitos específicos em cada região. vantagens potenciais. Como argumentado a respei-
O conceito de risco tal como utilizado nesses de- to da resistência dos europeus aos transgênicos, por
bates precisa ser situado em seu contexto. Faz-se ne- exemplo, se esta situação é percebida em toda a sua
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assimetria por aqueles que não tomaram a decisão, Dessa forma, a tese da sociedade de risco tal
faz sentido contestar a decisão. Daí o potencial para como defendida por Beck não subsiste ao teste em-
conflitos e a politização dos riscos. pírico sem recorrer às categorias, às temáticas e às
Entretanto, nos conflitos acerca de decisões sobre explicações “clássicas” da teoria social – e a outras
o risco de novas tecnologias, o conceito nativo é estra- teorias –, tais como classe e desigualdade social; de-
tégico (Pettricione, 2004). Isso porque se trata de um mocracia e esfera pública; valores e política, moral
argumento considerado legítimo para se opor ao de- e justiça; concepções de Estado e sobre o papel da
senvolvimento de uma tecnologia e ao livre comércio história. Ademais, o momento cosmopolita da so-
de bens. Inflar a incerteza sobre danos futuros à saúde ciedade de risco precisa ser relativizado, pois, ainda
e ao meio ambiente é uma forma indireta de contestar que haja debates sobre riscos considerados globais
os ganhos certos e presentes de outros atores. em arenas internacionais e transnacionais, como o
Que o debate sobre riscos tenha que ser feito caso dos riscos ecológicos, os temas da agenda glo-
na linguagem da ciência deixa atores das regiões bal também são objeto de formação de opinião e de
onde há menos recursos para pesquisa em desvanta- deliberação em esferas públicas e instâncias decisó-
gens nesta teoria. Se o uso do termo “risco” depen- rias nacionais, onde há mecanismos de responsabi-
de de capital científico, o qual é altamente concen- lização tradicionais.
trado, não se pode dizer que ele ultrapassa as velhas Embora a formação de esferas públicas trans-
lutas por distribuição de recursos. Ao contrário, o nacionais e regionais seja gradualmente reconheci-
discurso sobre riscos é limitado pelas desigualdades da – e objeto de uma crescente agenda de pesquisa
sociais, com o efeito perverso de torná-las opacas e na linha habermasiana –, trata-se de um desenvol-
secundárias na teoria sociológica. vimento incipiente. De todo modo, a questão não
O debate sobre a nova tecnologia é feito indi- pode ser resolvida a priori, já que há conflitos sobre
retamente, discutindo de forma camuflada sobre os riscos em arenas distintas – locais, regionais, nacio-
seus fins a partir de seus efeitos colaterais. Se o de- nais, internacionais – e a pesquisa empírica deverá
bate sobre os fins não pode ser feito abertamente circunscrever temas, atores, arenas e significados.
com as regras tecnocráticas da OMC, os conflitos Antes de postular uma qualidade global para os
sobre os meios, ou seja, sobre como regular riscos, riscos, tal qual fossem um fenômeno objetivo in-
são a forma de politizar a questão. Não por acaso, dependentemente da percepção, é mais profícuo
nas controvérsias sobre alimentos transgênicos, por tratar o “risco” como uma maneira de observar uma
exemplo, a discussão vai além do suposto “mérito”, decisão ou uma forma de atribuir significados (fra-
a saber, os riscos à saúde e ao meio ambiente, e evol- me) a uma determinada questão.
ve a posição da sociedade sobre o tipo de instituição Por todas essas considerações, parece-me que
ou nível que seria competente e legítimo para tratar não é necessária uma nova teoria social ou um novo
do assunto: uma autoridade científica ou política, o conceito de sociedade em torno da temática do ris-
nível federal ou estadual, o nível comunitário/euro- co, ou seja, não há ruptura ou uma nova qualida-
peu ou os Estados-membros? Tendo em vista os flu- de histórica tal como defendida por Beck que de-
xos globais de comércio, uma decisão tomada pelo mande uma nova sociologia. Considero necessário
país exportador será aceita pelos importadores? dispor de um conceito de risco teoricamente fun-
Somente pode discutir os fins – e de forma in- damentado. Não menos importante e frutífero é
direta – quem possui os meios, a arma da ciência, na elaborar hipóteses para orientar investigações sobre
linguagem dos riscos. Assim, a teoria da sociedade de as circunstâncias que levam à tematização de riscos
risco, ao ratificar ingenuamente o conceito de ma- ou à adoção deste frame em situações de confronto
neira restrita, tratando os riscos como efeitos nega- político6 ou sobre os efeitos que a mobilização de
tivos da industrialização, exclui as regiões periféricas argumentos sobre “risco” possui para o desenrolar
econômica e cientificamente do debate, negando- dos conflitos. Para tanto, é preciso, antes de tudo,
-lhes uma arma para contestarem formas opacas e analisar as teses de Beck sobre conflitos globais e
sutis de concentração de renda. como ele relaciona risco e modernidade.
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Uma nova modernidade, culturas de risco? opção, mas um resultado das contradições geradas
pela orientação do pensamento e da ação humana
A forma como Beck relaciona risco e moderni- por modelos da sociedade industrial que legitimam
dade, dividindo esta em etapas e alterando o sinal constantemente novos riscos (Beck, 2007).
valorativo acerca do futuro, não é livre de contra- Em um diálogo com a teoria de Beck, pro-
dições. Se Beck denuncia o progresso linear postu- ponho outro tipo de relação entre risco e moder-
lado pela velha teoria da modernização, ele retoma nidade e outras condições para a emergência da
implicitamente a lógica explicativa desta última. reflexividade – noção que sugiro substituir, neste
Por um lado, a teoria da modernização reflexiva caso, por “tematização de riscos”.7 Meu argumento
pode ser interpretada como uma crítica contundente de partida é que, para se analisar sociologicamente
à teoria da modernização tradicional (Knöbl e Joas, “risco”, há que se postular, de um lado, a ambiva-
2004). A ideia de efeitos não intencionais do pro- lência constitutiva da modernidade e, de outro, a
gresso contraria seu postulado de linearidade – este é existência de apenas uma modernidade global. Há
o significado de “reflexividade” em Beck, não como implicações de ordem temporal e espacial.
autorreflexão, mas como autoconfrontação impen- Na dimensão temporal, só faz sentido tematizar
sada, a aplicação da modernidade sobre si mesma riscos no presente se coexistirem percepções distin-
levando à sua dissolução (Beck, 1997). A moder- tas do futuro: os que esperam ganhos e progresso,
nização não segue inexoravelmente, mas pode ser bem como aqueles que temem efeitos colaterais
interrompida e desenvolver-se em outra direção. O negativos. É em um possível conflito entre essas vi-
futuro é incerto; podem prosperar, segundo Beck, a sões antagônicas – o que o próprio autor reconhece
dialética antimoderna ou a do “mais moderno”. A como a ontologia do fenômeno – que os riscos são
tese da modernidade reflexiva contradiz abertamente visibilizados. O esquema proposto por Beck de con-
a teoria da diferenciação funcional, especialmente a trapor modernidade simples, como crença otimista
variante evolucionista de Niklas Luhmann, quando no futuro, a modernidade reflexiva, como medo dos
afirma que há des-diferenciação dos subsistemas com efeitos futuros negativos do progresso, nega o caráter
relação ao risco. Segundo Beck (2007, p. 23), a di- ambivalente dos riscos e da própria modernidade.
ferenciação é problematizada pelos atores sociais e Riscos não são somente negativos, pois o futuro é
a sociedade de risco demanda uma nova divisão do aberto e incerto. É importante reforçar este cará-
trabalho entre a política, a ciência e a economia. ter, em princípio, ambivalente dos riscos, portanto,
A teoria da modernização reflexiva, por outro constitutivamente modernos.
lado, é criticada por fazer uso da figura retórica da Na dimensão espacial, negar o postulado das
ruptura de época, sendo considerada uma “repagi- duas etapas da modernidade, sugerindo ainda que
nação” da velha teoria da modernização (Alexander, perspectivas distintas sobre risco e modernidade são
1996; Costa, 2004; Knöbl e Joas, 2004). A estraté- contemporâneas, implica trazer todas as regiões do
gia argumentativa de pares dicotômicos é retomada, globo para compartilhar uma única e mesma mo-
desta vez, substituindo tradição/modernidade por dernidade. Assim como proposto por Domingues
primeira/segunda modernidade, ou modernidade (2009, pp. 212-215; 2011; 2013), estamos todos
simples/modernidade reflexiva. Alexander afirma integrados na modernidade, como uma civilização
que se trata da velha teoria em nova roupagem. global. Em vez de modernidades múltiplas, como
Ademais, a ideia de reflexividade como auto- proposto por Eisenstadt (2000), Domingues par-
aplicação da modernidade sobre si mesma é uma te do caráter global da civilização moderna para
metáfora mecanicista que remete a uma lógica ine- propor uma comparação entre movimentos mo-
xorável, como se fosse uma inflexão inevitável na dernizantes em distintas regiões e em sistemas
trajetória linear do progresso. A tese da moderniza- sociais diferentes. Dessa forma, nega-se a tese do
ção reflexiva postula uma transição forçosa da dinâ- “Sonderweg” europeu (Domingues, 2009; Knöbl,
mica da modernização, segundo o modelo dos efei- 2007) e são considerados as contingências da his-
tos colaterais latentes. A reflexividade não é uma tória, o papel de atores coletivos e a possibilidade
Risco e Modernidade  23

de tensões, contradições (por exemplo, entre as di- distinção entre riscos objetivos e percepções de ris-
mensões da economia e da política) e reversões de co, bem como entre especialistas e leigos – que tem
trajetórias. como fundamento a ciência técnica do risco. A tese
Em suma, a pesquisa sobre a tematização dos da encenação do risco proposta por Beck contraria
riscos na contemporaneidade seria mais profícua se essa concepção, principalmente quando aplicada
a divisão a priori da modernidade em etapas fosse aos riscos globais: quanto menos calculável o pe-
abandonada por análises mais sensíveis à história e rigo, maior a importância das variadas percepções
que ultrapassassem as fronteiras da Europa e dos culturais de risco.8
Estados Unidos. Partindo-se desta concepção de Assim, diferentemente dos conflitos socioeco-
que a modernidade é ambivalente e global, há que nômicos entre capital e trabalho da primeira moder-
se questionar o uso do adjetivo “reflexiva” para con- nidade e, no plano internacional, entre o Leste e o
ceituar apenas uma etapa posterior da moderniza- Oeste, na segunda modernidade, as linhas de conflito
ção, circunscrita a poucas sociedades. Isso implica são culturais. Ao contrário do que sugere Hunting-
que a tematização acerca dos riscos não está dire- ton, Beck afirma que o conflito não se dá entre civili-
tamente relacionada com o grau de modernização zações fundadas em religiões tradicionais, mas entre
das sociedades nem com culturas específicas, que crenças antagônicas sobre riscos.9 Assim, o autor afir-
são dois postulados centrais da tese da sociedade de ma que os Estados Unidos e a Europa enxergam um
risco de Beck. ao outro como histéricos (2007, p. 140): os europeus
Quanto ao primeiro postulado, ele implica uma seriam histéricos em relação ao meio ambiente e à
forma de medir o grau de modernização – por exem- alimentação transgênica – “comida-Frankstein” –,
plo, em termos de industrialização e progresso cien- ao passo que os norte-americanos seriam histéricos
tífico e tecnológico, de racionalização “burocrática- em relação ao terrorismo.
-legal”, de resolução da “questão social” – de uma Proponho a seguir duas críticas à abordagem
sociedade para definir se ela se encontra no estágio culturalista sobre o risco: (i) ela não explica a emer-
da reflexividade. Deduzir-se-ia uma trajetória linear gência de cada cultura específica anunciada em sua
como nas antigas teorias da modernização, e as so- tematização, nem explica por que algumas culturas
ciedades ocidentais europeias e anglo-saxãs estariam tematizam uns riscos e não outros; (ii) ela considera
supostamente na dianteira desse processo. Em uma as unidades de análise independentes. Creio que a
versão mais refinada sobre a diferença entre o pri- tematização de certos riscos se deve a fatores mui-
meiro e o segundo estágios da modernidade, Beck e tas vezes contingentes, que podem levar ou não à
Lau (2005) explicam que não há ruptura entre eles, constituição de um padrão cultural para lidar com
mas continuidade, no sentido de que os princípios certos tipos de risco, mas não é generalizável para
básicos da modernidade seguem válidos e são o mo- todos; creio ainda que a tematização se dá quando
tor dinâmico da modernização. A diferença é que decisões são percebidas como ilegítimas e passíveis
as instituições básicas mudam, como resposta aos de contestação.
imperativos daqueles princípios em contextos espe- Com relação à primeira crítica, é uma questão
cíficos. Novamente, nega-se a ambivalência consti- empírica afirmar se há aceitação ou rejeição de um
tutiva da modernidade e recorre-se a uma teoria da tipo de risco, ou melhor, se um tema é conceitua-
evolução social, que privilegia algumas sociedades do em termos de risco por determinados atores de
como pioneiras na criação de instituições mais aptas uma sociedade. É preciso abordar a história de um
para os desafios contemporâneos. tema específico em um espaço determinado perma-
No que tange ao segundo postulado, em um necendo sensível ao papel das contingências e das
diálogo com Samuel Huntington, Beck argumenta rupturas em eventos singulares. Por exemplo, a ale-
que o mundo contemporâneo não está diante de gação de que os europeus são histéricos em relação
um choque de civilizações, mas de um embate en- aos alimentos transgênicos não procede quando se
tre culturas de risco. Trata-se também de uma crí- pretende afirmar a existência de uma cultura de ris-
tica à concepção racionalista de risco – baseada na co específica sobre alimentos entre os europeus.
24  REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS SOCIAIS - VOL. 29 N° 86

Outro exemplo pode ser observado na área estar presentes: a compreensão por parte daqueles
de saúde pública. Há certo consenso (Kropp e que possivelmente seriam afetados de que se trata de
Wagner, 2005; Vos e Asselt, 2009) sobre o papel uma decisão, que poderia ter outro resultado, posto
da eclosão da encefalopatia espongiforme bovina ser contingente; e a capacidade de atribuir a essa de-
(o mal da vaca louca) na criação de um clima de cisão uma possível ocorrência de danos, cuja repar-
desconfiança entre as instituições europeias quanto tição não consideram aceitável. A explicação para a
à segurança dos alimentos. Trata-se de um evento tematização de riscos passa, portanto, por uma teo-
contingente, no sentido de que poderia ter acon- ria sobre democracia, moral e justiça.
tecido em qualquer região onde há pecuária inten-
siva e que adotasse a mesma ração animal. Nesse
caso, a atitude das autoridades sanitárias britânicas Uma proposta para a análise
de desconsiderar ou subestimar evidências de peri- sociológica sobre risco
go iminente é antes uma contraprova de que, em
vez de maior sensibilidade para riscos do progresso No lugar de uma explicação culturalista, que
desenfreado, houve muita tolerância em relação à mostra as diferenças na tematização do risco com
incerteza.10 Não só a eclosão da doença mas tam- base na diversidade cultural – ou seja, uma tauto-
bém a sequência de eventos e ações das autoridades logia –, ou da explicação mecanicista, que supõe
europeias são consideradas precedentes importan- a configuração inevitável de sociedades de risco a
tes para explicar a resistência de cidadãos europeus partir do grau de industrialização e de moderniza-
ou autoridades da União Europeia ao uso da bio- ção, proponho uma análise sociológica sobre risco
tecnologia agrícola. baseada em cinco premissas.14
Ademais, muitos cidadãos europeus e Estados Primeiro, ela deve partir de um postulado mais
da comunidade estão abertos para o consumo de geral sobre a relação entre modernidade e risco: o
alimentos transgênicos.11 Como falar, então, de uma alargamento das condições abertas para a tomada
cultura de risco europeia nesse caso? A relação entre de decisões que terão consequências no futuro,15 as
teoria e empiria, na aplicação da tese da sociedade quais podem ser percebidas de forma positiva ou
global de risco ao exemplo dos produtos agrícolas negativa, isto é, de forma, em princípio, norma-
geneticamente modificados, mostra a importância tivamente ambivalente. A escolha de atribuição é
de se considerarem as circunstâncias contingentes e empiricamente variável, de acordo com os atores e
específicas (Knöbl, 2007) que influenciaram a sen- as circunstâncias.
sibilidade dos europeus em matéria de segurança Segundo, a coexistência de maneiras distintas
alimentícia. Por outro lado, não se trata de uma de considerar a incerteza acerca do futuro quando
postura generalizada; quando o assunto é variação se toma decisões no presente, isto é, o pressupos-
de culturas e, portanto, diferenças na percepção de to de que há variação na percepção de um mesmo
risco, é difícil estabelecer consenso absoluto.12 Por- fenômeno. Em outras palavras, a modernidade –
tanto, a resistência de grupos de consumidores e definida pela crescente primazia do futuro sobre o
ambientalistas neste caso não pode ser deduzida de presente e da importância atribuída às decisões –
uma suposta cultura de risco europeia. contempla variações na forma de perceber o futuro.
A segunda crítica à abordagem culturalista do Terceiro, essas variações não podem ser explica-
risco é que ela trata as unidades de análise de forma das automaticamente pelo nível de industrialização
independente.13 Seja definida em unidades político- ou pela peculiaridade cultural, entre outros fatores
-geográficas, seja em termos de atores coletivos ou correlatos. Há um grande grau de contingência e é
individuais, a unidade de análise escolhida recorre preciso entender o que precisamente acontece em
à semântica do risco para discutir uma determinada cada história, o que traz a dimensão dos atores para
questão, quando decisões tomadas por outrem (por a análise, tirando-a do nível macro exclusivamente.
exemplo, a exportação de lixo tóxico) são percebidas Quarto, a tematização dos riscos pressupõe a
como ilegítimas. Para isso, duas condições devem existência de uma relação social na qual uma deci-
Risco e Modernidade  25

são é considerada ilegítima, sobretudo quando se diferentes maneiras. Segundo, pressupõe-se a co-
percebem as vantagens de algum ator e as possíveis existência de formas distintas de se considerar a
consequências negativas para outrem. Ou seja, tal incerteza acerca do futuro na tomada de decisão,
decisão coloca em jogo valores não compartilhados, tanto entre unidades de análise definidas espacial-
levando à sua contestação, o que envolve questões mente, como entre atores. Terceiro, essas variações
morais, políticas e legais. Consequentemente, a não podem ser explicadas automaticamente por
quinta premissa, qual seja, a adoção de um con- fatores como cultura ou nível de industrialização.
ceito sociológico de risco que pressupõe o conflito. Em outras palavras, a explicação dos conflitos so-
bre o risco deve ser sensível ao papel da contin-
gência em cada fenômeno e ao papel dos atores
Conclusão sociais que contestam decisões recorrendo ao tema
dos riscos. Essa condição leva à quarta premissa: a
Este diálogo com a teoria da sociedade (global) existência de uma relação social na qual uma de-
de risco de Ulrich Beck teve como propósito não cisão é percebida como ilegítima, sobretudo por
apenas apontar deficiências, mas pensar o sentido do oferecer vantagens para determinado ator e conse-
conceito de “risco” para a sociologia, sobretudo para quências negativas futuras para outrem. Por fim, a
estudar sociedades que aparentemente não se enqua- quinta premissa: a adoção de um conceito socio-
dram na categoria “sociedades de risco”. A conclusão lógico de risco que pressupõe o conflito e torna
preliminar é que o conceito de risco merece um tra- visíveis questões científicas, socioeconômicas, po-
tamento sociológico, a fim de se analisarem impor- líticas e normativas ali envolvidas.
tantes linhas de conflito na sociedade contemporâ- Quanto às condições para que uma decisão
nea em toda sua complexidade – isto é, sem adotar seja considerada ilegítima e seja, portanto, contes-
conceitos nativos ou perspectivas de apenas um tipo tada como uma questão de risco, o exemplo da
de ator ou racionalidade. O caminho mais profícuo biotecnologia agrícola mostrou que há uma con-
é identificar quais as condições para que uma decisão tradição entre os pressupostos. Por um lado, os
seja considerada ilegítima e seja, portanto, contes- conflitos em torno dos alimentos transgênicos en-
tada na linguagem de “risco”. Nesse sentido, muito volvem questões éticas e socioeconômicas, o que
mais que uma resposta definitiva, trata-se de uma desqualifica a ciência como principal árbitro da
pergunta aberta, que convida a se explorar possíveis contenda. Entretanto, “risco” é considerado o ar-
caminhos a serem testados empiricamente. gumento legítimo não só para intervir na regula-
Em segundo lugar, a proficuidade deste con- ção de tecnologias, mas também para contestá-las.
ceito para análises empíricas depende de uma teo ‑ Ademais, nas atuais regras nacionais, regionais e
ria que, de um lado, não possua postulados me- internacionais, o “risco” só pode ser evocado com
canicistas – e categorize sociedades a priori como o auxílio das ciências naturais e para referir-se a da-
“reflexivas” ou “de risco” – e, de outro, possua um nos sanitários e ambientais. A questão é como dis ‑
grau de generalidade suficiente para evitar que pes- ponibilizar esta arma para todos os atores que
quisas sobre risco sejam meras descrições de casos desejam debater não somente os meios de mini-
específicos. Como proposta de cumprir ambas as mizar ou evitar os efeitos negativos de tecnolo-
exigências, foram esboçadas cinco premissas para a gias, mas sobretudo os fins e a distribuição de seus
teorização sobre o conceito de risco na sociologia. benefícios. Da forma como tem sido usado, o con-
Primeiro, postula-se uma relação genérica en- ceito de risco deixa opaco o horizonte normativo
tre modernidade e risco: o aumento das condições da discussão e negligencia as desigualdades sociais
abertas para a tomada de decisões que vincularão que podem ser reforçadas pela invisibilização da
o futuro, as quais podem ser percebidas de for- situação ambivalente do risco na modernidade.
ma positiva ou negativa, ou seja, normativamente Enfim, uma teoria sobre risco, embora necessária,
neutra. Presume-se também uma dimensão tem- não pode inaugurar uma nova sociologia ou um
poral única, em que tais conceitos se vinculam de novo conceito de sociedade, pois não prescinde de
26  REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS SOCIAIS - VOL. 29 N° 86

explicações para as tematizações de risco que tra- xergam a biotecnologia com resistência, mas que sua
gam as dimensões ética, socioeconômica e política aprovação tem crescido constantemente desde 1999.
dos conflitos. Disponível em http://www.gmo-compass.org/eng/
news/stories/415.an_overview_european_consumer_
polls_attitudes_gmos.html, acessado em 26/4/2010.
Notas 12 Em relação às normas de higiene aceitas para estabe-
lecimentos de consumo, por exemplo, consumidores
europeus demonstram uma tolerância que muitas ve-
1 Todas as citações feitas de obras lidas em língua es-
zes não é encontrada em outros países, como o fato
trangeira são traduções livres.
de os funcionários manusearem alimentos e dinheiro
2 Na teoria da sociedade global do risco, Beck inclui sem lavar as mãos ou usar luvas.
três argumentos: os riscos são globais; sua realidade
13 Esta é a crítica teórica e metodológica que Knöbl
não é apenas material, mas depende da encenação de
(2007) faz à teoria das civilizações de Eisenstadt e à
catástrofes; as lógicas de risco global (ecológica, eco-
tese das modernidades múltiplas.
nômica e terrorista) diferenciam-se entre catástrofes
não intencionais e intencionais. 14 Meu argumento é fortemente influenciado pela lei-
tura do conceito sociológico de risco de Luhmann,
3 Esta foi traduzida para o inglês, em 2009, com o títu-
mas não se trata de uma aplicação de sua teoria dos
lo World at risk (Polity Press).
sistemas.
4 Uma das dificuldades de dialogar e de falsificar a teo-
15 O que é diferente de postular um determinismo me-
ria de Beck é que ele não exclui nada de sua argumen-
cânico do presente sobre o futuro. Trata-se de ressaltar
tação, e esta não é sistematizada.
que há uma assimetria temporal maior que torna o
5 Working principles for risk analysis for application in the futuro cada vez mais dependente de decisões tomadas
framework of the Codex Alimentarius (adopted by the no presente (Luhmann, 2008).
26th Session of the Codex Alimentarius Commission,
2003; Codex Alimentarius Commission Procedural
Manual; Thirteenth edition), Annex 1 Definitions.
6 A inspiração aqui é o conceito de contentious politics Bibliografia
de Tilly e Tarrow (2007).
7 Já que este conceito desempenha um papel mais amplo
ALEXANDER, Jeffrey. (1996), “Critical Reflec-
na agenda de pesquisa intitulada “modernização refle- tions on `Reflexive Modernization’”. Theory,
xiva” (Beck, Bonß e Lau, 2003; Beck e Lau, 2005), Culture and Society, 13 (4): 133-138.
que inclui a tese da sociedade (global) de risco de Beck. ASSELT, Marjolein van; VOS, Ellen & Rooija-
8 “Na medida em que os riscos globais escapam ao cál- ckers, Bram. (2009), “Science, Knowled-
culo de risco segundo métodos científicos e se trans- ge and Uncertainty in EU risk regulation”,
formam em objeto do não saber, prevalece a percepção in E. Vos e M. Everson (orgs.), Uncertain
cultural, isto é, a crença pós-religiosa, quase religiosa Risks Regulated. Abington, Routledge-Ca-
na realidade dos riscos globais, adquire um significado vendish, pp. 359-388.
central” (Beck, 2007, p. 140). BECK, Ulrich. (1986), Risikogesellschaft: auf dem
9 Entretanto, o autor estabelece uma relação (inversa) Weg in eine andere Moderne. Frankfurt am
entre culturas de risco e religião: quem crê em Deus é Main, Suhrkamp.
ateu para os riscos, daí o fundo religioso dos conflitos ______. (1997), “A Reinvenção da Política: Rumo
de crenças sobre riscos. Com a tipologia de riscos glo-
a uma Teoria da Modernização Reflexiva”, in
bais (ecológicos, financeiros e terroristas), o argumen-
U. Beck, A. Giddens e S. Lash, Modernização
to de Beck se assemelha ao de Huntington.
reflexiva: política, tradição e estética na ordem
10 Asselt, Vos e Rooijackers (2009) desenvolvem o par de
social moderna. São Paulo, Editora da Unesp,
conceitos “tolerância à incerteza” e “intolerância à in-
certeza”, operacionalizando-no de forma interessante.
pp. 11-71.
______. (2007), Weltrisikogesellschaft: auf der Su-
11 Pesquisas sobre comportamento de consumo mos-
che nach der verlorenen Sicherheit. Frankfurt am
tram que a maioria dos consumidores europeus en-
Main, Suhrkamp.
Risco e Modernidade  27

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156  REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS SOCIAIS - VOL. 29 N° 86

RISCO E MODERNIDADE: RISK AND MODERNITY: RISQUE ET MODERNITE : UNE


UMA NOVA TEORIA SOCIAL? A NEW SOCIAL THEORY? NOUVELLE THEORIE SOCIALE?

Renata Motta Renata Motta Renata Motta

Palavras-chave: Risco; Modernidade; Keywords: Risk; Modernity; Social theory; Mots-clés: Risque; Modernité; Théorie
Teoria social; Reflexividade; Cultura. Reflexivity; Culture. sociale; Réflexivité; Culture.

O artigo versa sobre a teoria da moderni- The article discusses the Ulrich Beck’s L’article aborde la théorie de la moder-
zação reflexiva de Ulrich Beck, conside- theory of reflexive modernization, con- nisation réflexive d’Ulrich Beck, compte
rando a sua recente expansão com a tese sidering its recent expansion with the tenu de sa récente diffusion grâce à la
de uma sociedade global do risco. Dois thesis of a world risk society. Two ele- thèse d’une société globale du risque.
elementos são analisados: a noção de ments are analyzed: (i) the notion of Deux éléments sont analysés: la notion
risco como categoria sociológica e a re- risk as a sociological category, and (ii) de risque comme catégorie sociologique
lação entre os conceitos de modernidade the relationship between the concepts et la relation entre les concepts de mo-
e de reflexividade. Quanto ao primeiro, of modernity and reflexivity. As for the dernité et de réflexivité. Par rapport au
levanta-se a questão sobre a reivindicada first, the article puts under scrutiny the premier élément, une question s’est posée
centralidade do conceito “risco” como claimed centrality of the concept of risk à propos de la centralité revendiquée de
categoria sociológica e sobre o alcance de as a sociological theory and the scope of a la notion de “risque” en tant que caté-
uma teoria sociológica sobre risco. Quan- sociological theory about risk. In relation gorie sociologique et de la portée d’une
to ao segundo, argumenta-se que a teoria to the second, it argues that Beck’s theory théorie sociologique sur le risque. Par
de Beck possui as seguintes limitações: has some limitations: the use of mechani- rapport au second, nous soutenons que
uso de explicações causais mecânicas e cal and deterministic causal explanations, la théorie de Beck présente les limitations
deterministas para restringir a discussão such as those of restricting the thematiza- suivantes: l’utilisation d’un traitement
a sociedades altamente industrializadas; tion of risks to highly industrialized soci- mécanique et déterministe des explica-
explicações essencialistas sobre a relação eties, as well as essentialist explanations tions causales telles que la restriction de
entre risco e cultura. Como alternativa, on the relationship between risk and la thématisation des risques pour les so-
propõem-se cinco premissas para pes- culture. As an alternative approach, us- ciétés fortement industrialisées; les expli-
quisas sociológicas que sejam aplicáveis a ing the example of the new technologies, cations essentialistes sur la relation entre
sociedades não europeias, utilizando-se o it suggests five assumptions that should le risque et la culture. Alternativement,
exemplo de novas tecnologias. guide sociological research on the subject nous proposons cinq hypothèses de re-
of thematization of risk, which would be cherches sociologiques sur la thématisa-
applicable to non-European societies. tion du risque qui sont applicables aux
sociétés non-européennes, en utilisant
des exemples issus des débats sur les nou-
velles technologies dans ses sociétés.

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