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AUTO-IMAGEM
NA PERSPECTIVA DO ENVELHECIMENTO
FORTALEZA
2007
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AUTO-IMAGEM
NA PERSPECTIVA DO ENVELHECIMENTO
Orientadora:
Lucila Bomfim Lopes Pinto, Msc
FORTALEZA
2007
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AUTO-IMAGEM
NA PERSPECTIVA DO ENVELHECIMENTO
Especialização em Gerontologia
Escola de Saúde Pública do Ceará
Banca Examinadora:
_______________________________________________
Lucila Bomfim Lopes Pinto, Mestra
Orientadora
_______________________________________________
Rosita de Lina Paraguaçu Assumpção
Professora examinadora I
_______________________________________________
Tulia Fernanda Meira Garcia
Professora examinadora II
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AGRADECIMENTOS
Aos meus pais, José Leite Furtado e Helenita Mendonça Leite, responsáveis pela
minha existência, pelo carinho, amor e dedicação que sempre tiveram por mim.
Aos meus filhos, Patni, Idya e Adya, torcedores féis em todas as minhas conquistas.
Vocês que são meus verdadeiros parâmetros profissionais e emocionais. São as
razões especiais da minha vida. Obrigada pela compreensão, confiança e apoio
imprescindíveis.
Ao meu amado irmão Halânio, pela maneira peculiar de estar presente em minha vida
em todos os momentos. Aprendemos a nos respeitar pelas nossas pequenas
diferenças e imensas semelhanças, e descobrir o verdadeiro sentido do amor
fraternal.
Agradeço, de maneira especial, aos meus amados tios Tavares e Branca, pelo
carinho, confiança e incentivo, fonte de intenso estímulo e esperança. Obrigada pela
presença indispensável em minha vida, e por enfrentarem comigo todos os percalços
nas horas mais difíceis e dolorosas.
Ao meu estimado amigo e terapeuta, Nelson Barros, por quem tenho verdadeiro
carinho e admiração. Obrigada pelas orientações, apoio e carinho imprescindíveis.
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RESUMO
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO__________________________________________10
2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA_____________________________15
2.1 Gerontologia, Psicologia e Interdisciplinaridade_______________15
2.2 O Narcisismo_________________________________________ 26
2.3 Velhice, mal-estar na cultura contemporânea ocidental ________ 38
2.4 Auto-imagem com suporte trabalho de grupo________________ 47
3 METODOLOGIA________________________________________ 51
REFERÊNCIAS___________________________________________57
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1 INTRODUÇÃO
2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
De acordo com Lima (1999), apud Lopes (2000, p.5), “ao lado da variabilidade
relativa à periodização das fases da vida em diversas sociedades culturais, observar
a transformação de novas formas de pensar o ciclo da vida através da história revela
o quanto esta periodização se torna significativa nas sociedades ocidentais”.
A velhice não poderá ser confinada em um sistema assistencial
inevitavelmente precário. Aos idosos, deve-se dar a oportunidade de oferecer sua
disponibilidade, a experiência, todos os seus talentos e sentimentos em
contrapartida à solidariedade à qual têm direito. Será graças a essa reciprocidade
que as sociedades poderão conservar ou reencontrar sua unidade.
Birman (1994 p. 30) diz que “a velhice não tem concepções, mas
interpretações sobre o percurso da existência, e como interpretações, estas
concepções se transformam historicamente”.
Até a década de 1970, o Brasil foi considerado um país de jovens. Naquela
ocasião, as próprias características demográficas da população brasileira foram
utilizadas pela ideologia do regime político vigente, para reforçar a idéia
discriminatória em relação ao velho. Assim, a imagem da velhice, presente no
imaginário das pessoas em geral, foi se impregnando de valores estigmatizadores,
nos quais foram evidenciados os aspectos negativos do envelhecimento, tendo
como parâmetro a imagem do jovem. Desta forma, a doença, a inatividade, o
abandono, as rugas, a flacidez do corpo, a solidão constituem algumas das
características que definem o "ser velho". As qualidades opostas a estas foram
creditadas como bonificações pertencentes aos jovens.
Nesse sentido, a palavra “velho” é carregada de preconceitos, como se o
homem não envelhecesse desde o dia de sua concepção. Sendo, portanto, o
envelhecimento um processo que percorre toda a vida, logo, o ser humano
envelhece enquanto vive. Desta forma o envelhecimento não é estático, mas
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Ressalta esse autor citado acima que o preconceito de idade contra a velhice
é determinado “etarismo”. Há anos os etaristas não aceitavam a Gerontologia como
disciplina ou ciência a ser cultivada no Brasil, pois afirmavam que não havia
problemas nessa área do idoso, por possuir apenas 5,3% de pessoas idosas
superior a 60 anos.
O sentimento de juventude permanece no íntimo das pessoas e as mudanças
na aparência, que vão se operando ao longo do tempo, passam desapercebidas
para o indivíduo. É o olhar do outro que dá a exata dimensão da passagem dos anos
que Simone de Beauvoir retratou na seguinte frase: "O indivíduo idoso sente-se
velho através do outro, sem ter experimentado sérias mutações; interiormente não
adere à etiqueta que se cola a ele: não sabe mais quem é". (1990, p.358).
A crise de valores por que passa a sociedade produz indefinição do atual
momento e a necessidade de novos paradigmas provoca ansiedade e modificações
no comportamento das pessoas e, em especial, nos idosos e, conseqüentemente,
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nas organizações educacionais direcionadas para atender esse público cada vez
mais presente.
É indiscutível a relevância das atividades educacionais, socioculturais, de
lazer e integração dirigidas aos idosos. Para exemplificar, o movimento das
universidades abertas à terceira idade experimenta incremento substancial, nos
últimos anos, difundindo conceitos e experiências práticas que representam nova
forma de promover a saúde da pessoa idosa.
Portanto, é relevante chamar a atenção para a emergência de novos modelos
de atenção ao idoso, sintonizados com políticas de saúde que levem em
consideração outros âmbitos - social, cultural, psíquico, educacional, intelectual e
esportivo.
A Gerontologia, ramo científico que compreende a interdisciplinaridade,
carece até hoje de estudos aprofundados, de políticas públicas, ou seja, de
materialização e enfretamento concreto da realidade em que se encontram os
idosos nos dias atuais.
Lenoir (1989), apud Lopes (2000), comenta que a transformação do
envelhecimento em objeto científico põe em jogo múltiplas dimensões; do desgaste
e do prolongamento da vida ao desequilíbrio demográfico e custo financeiro das
políticas sociais.
A pluralidade de especialistas e abordagens da Gerontologia não impede a
constituição de um saber claramente delimitado, em que as disciplinas, cada uma a
sua maneira, contribuem para definir a última etapa da vida como categoria de idade
autônoma, com propriedades específicas dadas naturalmente pelo avanço da idade,
a qual exige tratamentos especializados, como, por exemplo, o desgaste físico pelos
médicos, a ausência de papéis sociais, pelos sociólogos, a solidão, pelos
psicólogos, a idade cronológica, pelos demógrafos, os custos financeiros e as
ameaças à reprodução das sociedades, pelos economistas e especialistas na
Administração Pública.
O papel da Gerontologia, em sua constituição, incorpora subsídios técnicos e
científicos de outros ramos afins que os transcendem. Ao responder a algumas
necessidades, a Gerontologia desenvolve um trabalho interdisciplinar em sua
gênese, no fundamento da própria produção do saber e da própria ação interventiva.
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máscara do desejo. O escultor tem razão quando assegura que não é a beleza que
falta aos nossos olhos e sim o desejo que ausenta de nosso olhar. Rodin disse certa
vez (apud MEDEIROS, 2005):
Não era a beleza que faltava aos nossos olhos, mas estes é que
falhariam em não percebê-la. Interessante pensar na feiúra como
uma “falha” do olhar. A feiúra não seria então a falta de beleza e sim
a incapacidade de percebê-la. Talvez o artista nos ajude a
compreender o estranho fenômeno do horror e da discriminação que
se atribui a tudo que possa ser designado como feio (p, 68).
2.2 O Narcisismo
Narciso,
foste caluniado pelos homens,
por teres deixado cair, uma tarde,
na água incolor,
a desfeita grinalda vermelha do teu sorriso.
Narciso,
eu sei que
não sorrias para o vento,
dentro da onda: sorrias para a onda,
apenas, que enlouquecera,
e que sonhava gerar no ritmo do seu corpo,
ermo e indeciso...
Cecília Meireles
É necessário deixar bem claro, nesta tentativa de conceituar o mito, que este
não tem aqui a conotação costumeira de fábula, lenda, invenção, ficção, mas a
acepção que lhe atribuíam e ainda atribuem as sociedades arcaicas, as
impropriamente denominadas culturas primitivas, nos quais mito é o relato de um
acontecimento no tempo primordial, mediante a intervenção de entes sobrenaturais.
De outro lado, o mito é sempre uma representação coletiva, transmitida
através de várias gerações e que relata uma explicação do mundo. Mito é, por
conseguinte, a palavra "revelada", o dito. E, desse modo, se o mito pode se exprimir
ao nível da linguagem, ele é, antes de tudo, uma palavra que circunscreve e fixa um
acontecimento.
Diel (1991 p. 37) define o conceito de Mitologia:
Talvez se pudesse definir mito, dentro do conceito de Carl Gustav Jung, como
a conscientização de arquétipos do inconsciente coletivo, quer dizer, um elo entre o
consciente e o inconsciente coletivo, bem como as formas mediante as quais o
inconsciente se manifesta.
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Lowen (1993) comenta que a personagem Eco que aparece no mito (uma
ninfa apaixonada por Narciso) representa a alteridade, e alter quer dizer outro.
Observando o desenvolvimento da libido, o desejo amadurece no sentido do amor e
dá ao indivíduo a possibilidade de desejar o outro, na sua peculiaridade, na sua
diferença. Caso contrário, deseja-se a si no outro e mergulham-se mãos no lago,
procurando algo inexistente.
O mito persiste por suas imagens, que podem ser expressas por meio dos
símbolos verbais de qualquer linguagem. Para Vernant (1999), “o símbolo
verdadeiro vale por si mesmo, por sua dinâmica interna, seu poder de
desenvolvimento indefinido, sua capacidade e por um aspecto da experiência
humana ressonância com todo o universo”. (BOHADANA,1988, p. 55).
Spalding (1965) fala sobre o reflexo de Narciso na água e refere-se à palavra
“reflexo”, que vem do latim e quer dizer retorno, (re-flectere; re = retornar e flectere =
curvar-se. Portanto, o reflexo de Narciso é a imagem que retorna para a coisa
Narciso, por estar vinculada a ela. Ele percebia aquela imagem como coisa, como
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outro. Por não ser, no entanto, possível a imagem substituir a coisa, não havendo
interação das duas coisas (onde na realidade só havia uma), se tornou inviável.
O tema do espelho, como imitação da vida origina-se na Antigüidade e
relaciona-se quase sempre ao próprio conhecimento, aquele de si. Afirma Merleau-
Ponty (1964, p. 24); “(...) é o instrumento de uma magia universal que transforma as
coisas em espetáculos, os espetáculos em coisas, o eu em outro e o outro em mim”.
Entre os gregos, os olhos eram como espelhos, dos quais, como de um sol,
emanavam os raios de luz. Em Platão (132-133 ac) apud Bohadana (1988, p. 55),
encontra-se:
Quando olhamos para o olho de alguém que está à nossa frente,
nosso rosto se reflete no que chamamos de pupila como um
espelho: aquele que se olha vê sua imagem (...). Assim, quando o
olho considera outro olho, quando fixa seu olhar na parte deste olho
que é a melhor, aquela que vê, ele vê a si mesmo.
Traz logo a imagem de algo decrépito, decadente, que perdeu o uso ou a validade,
que já está na hora de ser descartado.
“Quem louva a velhice não a teve diante dos olhos”, diz Bobbio (1997 p.45).
Sem de dúvidas, a velhice remete à idéia de fim e é, constantemente, empregada
para assinalar a decadência de uma civilização, de um povo, de uma cidade ou de
uma raça. Não causa estranheza, então, que na dicotomia velho/jovem, o último
represente o pólo positivo. O novo representa o progresso enquanto o velho é
associado retrocesso. Velhice representa a lentidão, inclusive física, e tal lentidão é
penosa não apenas para os outros como para o próprio velho.
“O velho está naturalmente destinado a ficar para trás, enquanto os outros
avançam”. (BOBBIO, 1997, p.47). Tal situação agrava-se, não só pela rapidez das
transformações, em razão do progresso científico e tecnológico, como também pelo
imediatismo e rápida obsolescência de produtos, idéias e valores que norteiam a
sociedade de consumo: o novo logo fica velho e o tempo que resta para a
assimilação é cada vez mais curto.
Enquanto o mundo dos jovens é o futuro, o dos velhos é a memória. Certos
de que as lembranças ficam cada vez mais distantes e apagadas, elas ainda trazem
o sentido de historicidade do sujeito, carregam ainda tradições e antigos valores, o
que, de certa forma, se apresenta como incompatível nos tempos atuais.
Nas sociedades tradicionais e mais estáticas, o velho apresenta-se como
aquele que reúne em si o patrimônio cultural da comunidade, seja na esfera da ética,
seja na dos costumes. Em nossa sociedade, com transformações cada vez mais
rápidas, o velho passa a ser aquele que nada sabe, em relação aos jovens.
Destituído de seu lugar de sabedoria, em uma sociedade onde tudo se compra e se
vende, também a velhice pode ser transformada em mercadoria. As clínicas de
repouso e/ou asilos, a geriatria ramo da Medicina em expansão, os grupos de
atendimento ao idoso e as práticas corporais direcionadas ao “não-envelhecimento”
apontam para a inclusão do velho na lógica do consumo.
Como aponta Mendlowicz (2003), é numa sociedade globalizada, dividida
entre ganhadores e perdedores e sem ideais, que os sujeitos se entregam às
compulsões. Nessa urgência, qualquer espera equivale ao desespero, causado por
enorme intolerância com aquilo que o atrapalhe em sua busca pela perfeição. E
nada mais distante da perfeição, na sociedade atual, do que a velhice.
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Guimarães Rosa
realizado com o idoso seja em grupo, pois pode haver uma aproximação e uma
maior convivência de pessoas da mesma faixa etária, proporcionando ao idoso
consciência de si, mas também do outro, e observar que, como ele, existem outras
pessoas idosas na comunidade em que vive, conforme apresenta Zimermam (2000,
p. 74):
Na utilização do processo de grupo, através das múltiplas relações
que são entre os seus componentes, visando à integração do
indivíduo no grupo, possibilitando sua extensão individual como
membros operantes de seu grupo, de sua família, de sua
comunidade.
3 METODOLOGIA
Jean-Jacques Rousseau
O atual trabalho monográfico tem como maior referencial leituras acerca dos
pressupostos em Freud no que diz respeito ao narcisismo, por também ser um dos
poucos psicanalistas a se reportarem à própria velhice. Algumas considerações
foram feitas a Jacques Lacan sobre o “Estádio do espelho”, como também não se
poderia deixar de referenciar Joel Birmam, pois se destacou na abordagem do tema
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3 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Fernando Pessoa
emoções, os afetos, as trocas com o mundo externo, corpo veículo como fonte de
prazer na busca incessante de satisfação e gozo. E, assim, o idoso, em muitos
casos, não se sente ou não se vê mais como objeto de desejo, impressão
confirmada pela sociedade que a todo instante lhe sinaliza o quanto ele é agora
“velho”, feio, improdutivo, inútil.
A perda do corpo jovem deveria ser um dos lutos que o sujeito ao longo de
sua vida aprenderia a elaborar e enfrentar, pois é fundamental que os idosos
aprendam a lidar com as transformações de seu corpo, que possam compreender
que essas modificações fazem parte do envelhecimento, bem como aprender a tirar
proveito de sua atual condição, prevenindo e mantendo em bom nível de sua
independência e plena autonomia.
É possível ao idoso, o exame retrospectivo de ressignificação de sua
existência. Avaliar o que planejou, aprendeu, as conquistas e realizações pode
trazer alegria e sentimento de felicidade. É alguém que cumpriu sua tarefa de tecer
um feixe de sentidos e significados, criando o mundo e atribuindo-lhe uma
configuração, sendo, portanto, uma relação ativa, afetiva e dinâmica.
A dimensão temporal é construção e movimento; nesse sentido, passado,
presente e futuro estão intrinsecamente relacionados.
As experiências se repetem, são passíveis de ressignificação, a serviço de
um futuro. Não se trata, porém, de apenas mera repetição. O idoso pode recuperar
as reminiscências, na tentativa de uma renovação, de uma reinscrição, ou seja, algo
é resgatado e se estrutura.
O passado não é somente acúmulo de recordações, de lembranças,
agradáveis ou não, e de saudade do que se foi, mas sim tem um significado do que
já foi vivido que passa a ser acolhido, propiciando engajamento em novos projetos.
Quer-se dizer com isso que abre as perspectivas para o novo, o futuro.
O futuro projetado que não pertence às pessoas, a não ser na expectativa e
na esperança, ainda não é, mas poderá vir a ser.
A velhice é um contínuo de reconstrução, que se faz com sabedoria, beleza,
sonhos, desejos e curiosidades. Para isso, é preciso uma preparação interna. Ter
projetos e colorir a existência com novos matizes após os sessenta anos é possível,
apesar das frustrações, vivências traumáticas e dos dissabores. Viver significa fazer
planos para o amanhã.
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REFERÊNCIAS
FREUD, S. (1905) Sobre a Psicoterapia. In: Edição Eletrônica Brasileira das Obras
Psicológicas Completas de Sigmund Freud. Rio de Janeiro, Imago, 2000 v. 8.
FREUD, S. (1923) O Ego e o Id. Edição Eletrônica Brasileira das Obras Psicológicas
Completas de Sigmund Freud. Rio de Janeiro: Imago, 2000 v. 19.
KEHL, M. R. - Sobre Ética e Psicanálise. São Paulo: Companhia das Letras, 2002.
MILLER, Z, & SHALOMI S. Mais velho mais sábio. Rio de Janeiro: Campus. 1996.
VERNANT, J-P. Mito e sociedade na Grécia antiga. Rio de Janeiro: José Olimpio,
1999.