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ANTROPOLOGIA SOCIAL E CULTURAL

(Organizada pela Tathiana Chicarino)

UNIDADE I

1. INTRODUÇÃO AO PENSAMENTO ANTROPOLOGICO


1.1.Primeiras aproximações (a descoberta do outro)

Com o movimento de colonização e o comércio colonial, os europeus tiveram contacto com


outros continentes sobretudo africano, onde estabeleceu se o contacto com as pessoas e nesse
contacto foi possível o questionamento ‘’quem são eles?’’

Esse questionamento inicialmente foi feito em relatos de viagens, depoimentos e interpretações


de caracter religioso, sendo que estava longe de ser científico, pois não configurava um campo
de conhecimento que tivesse como objecto de estudo o HOMEM.

No seculo XIX, a antropologia define o objecto de estudo ‘’as sociedades primitivas’’. Havia um
afastamento do investigador e o objecto de estudo causada pela distância geográfica porque as
sociedades eram de pequenas dimensões e isoladas com pouco contacto com outras culturas, e
por ser sociedades simples os antropólogos sentiam se capazes de compreender essas sociedades
como um todo que pode ser observado.

Nesse processo, o trabalho de campo do investigador na sociedade estudada ia sendo confirmado


como o caminho legítimo (cientifico) de produção de conhecimento pela antropologia.

Com a crise da identidade no seculo XX provocada pela dupla revolução onde as sociedades
primitivas objecto de estudo da antropologia desaparece porque as sociedades mais simples se
transformaram ao entrar em contacto com sociedades maiores formando novas sociedades e
desta forma acontece o aperfeiçoamento da antropologia. Assim sendo, abre-se um novo vasta
campo de trabalho para esta ciência pela diversidade das sociedades contemporâneas.

Antropologia deixa de ser definida pelo seu objecto de estudo e se afirma como forma especifica
de abordagem, amadurecendo, ampliando o dialogo e a possibilidade de trabalho conjunta com
outras disciplinas principalmente com sociologia.

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1.2.Estranhamento

É um recurso que antropologia e a sociologia usam para melhor entender os fenómenos sociais e
culturais.

A antropologia estranha o que não conhece, isto é, quando nos deparamos com algo
absolutamente estranho, nos esforçamos para compreender de onde vem tanta estranheza e por
que aquilo causa estranhamento.

A sociologia, estranha o que acha que já conhece, no sentido de quando estranhamos aquilo que
nos parece absolutamente normal (nada estranho) somos capazes de compreender melhor o que
acontece a nossa volta.

1.3.A Origem de Pensamento Antropológico

Antes da antropologia

A génese da reflexão antropológica, é contemporânea a descoberta do novo mundo.

As profundas transformações provocadas pela dupla revolução, o descobrimento de novas terras


e exploração colonial colocaram o homem europeu (entendido como civilizado) com homens de
culturas desconhecidos e muito diferente. A questão que sempre surgia no confronto desses
homens diferente era: ´´aqueles que acabaram de ser descobertos pertencem a humanidade?´´

As respostas dessas perguntas são polarizadas ate chegar ao conceito de o ´´bom´´ e ´´mau´´
selvagem.

Mau selvagem, é um conceito que visa retirar o ´´homem diferente´´ da esfera humanidade
civilizada e da cultura, e os colocar na esfera da natureza. Enquanto que, o bom selvagem,
destaca os homens do novo mundo como inocentes, e que seriam cristãos se entendessem os
europeus, pois eles, não tem e nem entendem nenhuma crença.

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1.4.Um começo evolucionista

A teoria da evolução biológica

O homem surgiu há cerca de 200 mil anos e alcançou a forma física actual há cerca de 80 mil
anos. O homem teria se desenvolvido pelos mesmos processos de todos outros animais, pelas leis
da evolução, distinguindo se entretanto, por ter adquirido a capacidade de produzir o que
chamamos de cultura: a linguagem, a fabricação e uso de ferramentas e a proibição do incesto.

A antropologia cultural e social, pode ajudar a antropologia biológica a localizar a posição do


homem enquanto homo sapiens na sua ordem e escala de evolução. A grande tarefa da
antropologia biológica, esta em encontrar o lugar do homem na natureza e, ao mesmo tempo,
determinar a sua própria natureza.

2. EVOLUÇÃO CULTURAL
2.1.Três estratégias da evolução da humanidade

Lews Morgan, classificou a história da humanidade em três grandes períodos étnicos, divididos
em subperíodos, marcado cada um deles por uma sequência de inovação cultural.

Esquema de Lews Morgan

Infância da raça humana. Subsistência por meio de


Inferior
frutas e castanhas. Início da fala articulada.
Selvageria
Médio Dieta alimentar baseada em peixe e no uso do fogo.
Superior Arco e flechas.
Inferior Cerâmica.
Domesticação de animais.
Barbárie Médio Cultivo de milho, irrigação, arquitectura de pedra e
adobe.
Superior Instrumentos de ferro
Civilização Alfabeto fonético e uso da escrita em produtos literários.

Em relação a evolução da família ao longo da história, Morgan indicava cinco formas sucessivas,
são elas: a consanguínea (matrimonio de grupo dentro de uma mesma geração ou matrimonio
entre irmãos e irmãs); a punalúa (matrimonio de grupo onde, entretanto, estava vetado o
casamento entre irmãos e irmãs); ade casais (uma forma de transição entre o matrimonio de

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grupo e a monogamia); a patriarcal (associado aos hebreus e romanos primitivos) e a
monogamia (onde homens e mulheres podiam terminar o casamento o quanto desejassem).

2.2.O papel da religião no desenvolvimento das sociedades

De ponto de vista metodológica e da própria concepção do que seria o fenómeno religioso,


Taylor aponta duas questões importantes. Primeiro, estudar a religião do ponto de vista
etnógrafo, e não teológico, e segundo, não estabelecer sequências rígidas para a evolução das
ideias religiosas, identificando ´´sobrevivências´´ de crenças em seres animistas mesmo nas
sociedades modernas.

Porem, apontava um movimento gradual que sai do politeísmo (crença múltiplas) chegando ao
monoteísmo (crença em um só Deus), e fazia a seguinte distinção: um ‘‘animismo inferior’’, sem
moral, em que a alma, depois da morte persiste de modo independente de seus actos durante a
vida, e um ‘’animismo superior’’, comandado por uma ‘’doutrina de retribuição’’, isto é, em que
a alma e castigado ou ´´premiado´´ em função do que fez ou deixa de fazer antes da morte.

3. A UNIDADE DA CULTURA

A cultura ou civilização olhada no sentido etnográfico, é aquele todo complexo que inclui
conhecimento, crença, arte, moral, lei, costume e quaisquer outras capacidades ou hábitos
adquiridos pelo homem na condição de membro da sociedade.

Toylor não fala de ´´culturas´´ mas de uma cultura ou civilização. Desse modo vai expressar
cultura ´´sempre no singular, essencialmente hierarquizada em estágios´´. Referindo–se as
investigações das ciências naturais, destaca-se a unidade da natureza, regida por leis e
sequencias de causas e efeitos, e critica a dificuldade, paro muitos, de ´´aceitar o estudo da vida
humana como um ramo da ciência natural.

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UNIDADE II

1. O HOMEM E A CULTURA
1.1.Os padrões da cultura

A ciência dos costumes

Ruth Benedict, caracteriza a antropologia como a ciência que se ocupa dos seres humanos como
produtos da vida em sociedade.

Levando em conta características físicas, técnicas, industriais, convexões e valores que


distinguem cada sociedades, os costumes destas ´´outras sociedades´´ deveriam ser tratados pelos
antropólogos sem preconceitos, de modo a verificar como os costumes de quaisquer povos
funcionam nas vidas dos indivíduos que os compõem. Ou seja, os costumes, mais do que
qualquer comportamento individual, estão de acordo com uma massa de conduta pormenorizada
capazes de nos informar sobre as características de cada sociedade.

Cada homem em qualquer lugar do mundo, desde o seu nascimento, seria condicionado por
valores, instituições e costumes de sua própria sociedade e estranharia de imediato, as culturas
diferentes da sua. Para os homens, o outro nunca é humano.

2. As culturas como laboratório

As culturas primitivas seriam para Benedict, um laboratório onde se pode estudar a diversidade
de instituições humanos. Na sociedade primitiva, a tradição cultural é simples o bastante para
que indivíduos adultos possam conhece-la em sua totalidade, e os hábitos e principais morais do
grupo obedecem a um único padrão geral claramente definido.

E embora possamos encontrar traços que são universais ou quase universais nas sociedade
humanas, por exemplo, as restrições ao casamento endogâmico (entre membros da mesma classe
social ou tribo para conservar sua riqueza ou etnia), o animismo (crença na existência de almas
em todos elementos da natureza, fazendo-os agir de modo intencional). Não é possível utiliza-los
para reconstruir uma historia única do homem, por causa da pluralidade dessas sociedades.
Obviamente, esses traços poderiam distinguir respostas locais de respostas comuns a todos

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homens, alem de nos ajudar a compreender o papel de enorme importância desempenhado pelo
comportamento culturalmente condicionada.

3. A pesquisa antropológica
3.1.O trabalho de campo como método de pesquisa
a) A observação participante

Na pesquisa antropológico, a observação participante é um passo fundamental, pois o


pesquisador deve mergulhar na sociedade a estudar e conviver com seus membros, vivenciando,
intensamente esta outra cultura. Portanto, não basta observar, recolher dados, fazer entrevista,
etc. O pesquisador, tem diante de si uma tarefa bastante difícil, pois ao mesmo tempo em que
vivemos intensamente esse novo mundo, precisa saber olha-lo, isto é, lançar mão de sua
bagagem antropológico e ficar atento para que seus valores não interfiram negativamente nesse
processo. A subjectividade do pesquisador e do pesquisado, são fundamentais para a formulação
de sua compreensão da cultura.

b) Método genológica

Este método baseia-se, em sistemas de parentesco, que consiste em entrevistar uma pessoa
perguntando-lhe quem são seus parentes, tanto consanguíneos quanto por casamento, desde a
família nuclear, passando por parentes por adopção ou por cerimónias. O sistema de
parentesco nos permite elaborar um quadro mais amplo, e bastante importante da sociedade
estudada, já que nos remetem para eventos e instituições presentes em toda a sociedade,
abarcando costumes, economia, crenças, demografia, geografia, etc.

c) Os estudos de caso

São estudos localizados, que trabalham sobre recortes da vida social, em um grupo, um evento,
uma pessoa, etc. a meta é estuda-los mais em suas particularidades do que em busca de
generalizações, ou seja, a verdade só surge e pode ser comprovada como consequência do
conhecimento dos casos particulares.

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4. Teorias da Antropologia Cultural
4.1.O funcionalismo e a crítica ao evolucionismo e ao difusionismo

Rompe-se radicalmente com o evolucionismo e com o difusionismo lançando as bases de uma


nova corrente antropológico: o funcionalismo.

Partindo do princípio que cada sociedade deveria ser estudada como uma totalidade. Mais do que
refutar o evolucionismo e o difusionismo, inverte-se o olhar do antropólogo sobre os povos e os
costumes primitivos. Se antes eram considerados evidencias de forma de vida social anteriores a
civilização, agora são vistos como maneiras contemporâneas que tinham muito a ensinar a
sociedade ocidental.

A grande característica do difusionismo e o seu objectivo último, eram os indivíduos e não a


sociedade. As instituições existiam para as pessoas e não o contrário, e eram as necessidades das
pessoas, em último, analisa suas necessidades biológicas, que constituam o motor primeiro da
estabilidade social e da mudança.

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UNIDADE III

1. ANTROPOLOGIA FRANCESAEO SURGIMENTO DE NOVAS PERSPECTIVAS


ANTROPOLOGICAS

1.1.A desconfiança na Etnologia

Porem, nem sempre o teórico considerou a etnologia como base relevante para a antropologia.
Durkheim “desconfia da etnologia”, quase sempre baseada em observações “difusas e rápidas”,
recomendando aos sociólogos em geral que trabalhem com sociedades cujas crenças, tradições,
direitos e costumes estejam registadas em documentos escritos.

A etnografia que Durkheim desconfiava era a de Edward Taylor e de todos os “compiladores”


que elaboravam teorias com o método próprio dos historiadores, ou seja, de registo, porem sem
análise profunda a respeito.

Com as L’Années, Durkheim contribuiu de forma vigorosa para a etnologia, colaborando para
que ela deixasse ser amontado de curiosidades, aberrações ou vestígios do passado a história da
humanidade e ganhasse um novo significado. Todo esse movimento levou a uma redefinição do
papel da etnografia: a partir de Durkheim, cada uma das observações revela um experiencia e
permite isolar verdades gerais (LÉVI-STRAUSS, 1989, p. 55)

1.2.Natureza e Cultura

Será inútil, portanto, procurar na natureza a origem da cultura, algo que, para Lévi-Strauss,
dificilmente pode ser instaurada entre os homens sem intervenção da linguagem. No caso da
natureza a regularidade encontrada é a da herança biológica, enquanto que, na cultura, a
regularidade é dada pela organização social.

1.3.Proibição do incesto

Porem, Lévi-Strauss oferece uma saída. Para ele, onde existe regra, há cultura e, no que se refere
à natureza, precisamos encontrar critério que seja universal. Existe um lugar onde a regra (a
cultura) e a universalidade (a natureza) se encontram na proibição do incesto, um “conjunto

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complexo de crenças, costumes, estipulações e instituições que estabelecem os casamentos
desejáveis e os casamentos que são proibidas”

A explicação da proibição do incesto não passa pela genética, pelo terror instintivo próprio da
natureza, ou da psique humana, nem pela combinação ou justaposição de elementos da natureza
e elementos da cultura. Ela é muito mais do que isso, pois “constitui o passo fundamental graças
ao qual, principalmente, se realiza a passagem da natureza aa cultura

1.4.Estrutura Social e Relações Sociais

Em primeiro lugar, Lévi-Strauss define que a estrutura social jamais se confunde com as relações
sociais. A estrutura social refere-se à construção de modelos a partir da realidade social, e não
directamente à realidade empírica. Assim, a realidade social seria a matéria-prima empregada na
construção de modelos “que tornam manifesta a própria estrutura social” (Lévi-Strauss, 1973, p.
316).

1.5.Consciente e inconsciente

Para Boas, a análise estrutural é eficiente, principalmente, nos casos em que a sociedade
estudada não possui um modelo consciente para explicar ou interpretar um conjunto de
fenómenos ou fatos sociais. Os modelos conscientes (presos às normas) são, para Lévi-Strauss,
“os mais pobres que existem”, pois se prendeu ao que é mais visível e dificultam o alcance da
sua estrutura mais profunda (LEVI-STRAUSS,1973, p.317).

Clifford Geertz (1926-2006), teórico norte-americano, é autor do livro A Interpretação das


culturas, no qual inaugura “um estilo individual [...] de produzir insights, no lugar da grande
teoria arrumada” (SCHWARCZ, 2001, p. 231).

Já no prefácio, o próprio Geertz considera os 15 ensaios que compõem o livro “mais estudos
empíricos do que indagações teóricas”, pois não são sente à vontade quando se distancia “das
imediações da vida social”. Seu principal foco é desenvolver o que considera ser cultura, o papel
que ela desempenha na vida social considera ser a cultura, o papel que ela desempenha na vida
social e a maneira como deve ser estudada. (GEERTZ, 1978, p. 7).

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1.6.A prática da etnografia

Para Geertz, se formos capazes de compreender o que é a prática da etnografia, podemos


começar a entender “a análise antropológica como uma forma de conhecimento”. Para a
etnografia, não basta descrever, pois corremos o risco de descrever apenas o que “parece ser”.
Sendo assim, há uma hierarquia estratificada de estruturas significantes que o etnógrafo precisa
compreender.

Aqui esta, para Geertz, o objecto da etnografia: uma multiplicidade de estruturas conceituais
complexas em que tiques nervosos, piscadelas conspiratórias, imitação e ensaio podem ser
percebidos e interpretados de modos diferentes e de acordo com as suas particularidades (
Geertz, 1978, p. 15-6).

1.7.Interpretação e infecção

A etnografia é uma descrição densa e etnográfica se depara com estruturas conceituais


complexas que se amarram umas às outras, sendo estranhas, irregulares e inexplícitas. São o que
Geertz chama de “as coisas desse mundo” e precisamos perguntar o que elas significam e
transmitem. O etnógrafo preciso primeiro apreende-las, para depois apresenta-las (GEERTZ,
1978, P. 20).

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UNIDADE IV

1. ANTROPOLOGIA NO BRASIL
1.1.Antropologia Urbana

A rede social

Foram os antropólogos ingleses que formularam um método de pesquisa-chamado de rede social


“que abriu o urbano para a antropologia” (GOMES, 2013, p. 157). Eles estavam interessados em
estudar como vivia a classe trabalhadora inglesa e como a vida urbana criava complexos de
relações que ultrapassavam a esfera da família, das relações individuais que se entrecruzaram
mas que não chegavam a construir grupos ou variantes culturais.

1.2.O método do caso ampliado

Também foram ingleses que criaram outro método que ampliou as possibilidades de actuação da
antropologia diante da vida urbana: o “método de caso ampliado”. A premissa era que: [...] toda
e qualquer situação ou evento social esta imbricado com outras instituições, formando um rede
de relacionamentos intercomunicações em que os participantes nem sempre estão cientes de tudo
que está acontecendo, mas participam vivamente daquilo que lhes é dado conhecer. (GOMES,
2013, p. 157).

1.3.A cultura da cidade

Em 1916, Robert Park escreve um artigo em que dá sugestões para a investigação do


comportamento humano no meio urbano.

Para ele, a cidade não é uma amontoada de homens, de ruas, de edifícios, de redes de luz
eléctrica, ou de bondes. Nem uma mera constelação de instituições e aparatos administrativos,
como escolas, hospitais, departamentos de polícia, tribunais, etc. Ela é, antes de mais nada, [...]
um estado de espírito, um corpo de costumes e tradições e dos sentimentos organizados,
inerentes a esses costumes e transmitidos por essa tradição. [A cidade] é um produto da natureza,
e particularmente da natureza humana (PARK, 1976, p.26).

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2. IDENTIDADE NACIONAL E PENSAMENTO SOCIAL NOS ANOS 1930
2.1.A nação e as tradições

A invenção das tradições

Por “tradição inventada” entende-se um conjunto de práticas, normalmente reguladas por regras
tácita ou abertamente aceitas; tais práticas, de natureza ritual ou simbólica, visam inculcar certos
valores e normas de comportamento através da repetição, o que implica, automaticamente, uma
continuidade em relação ao passado (HOBSAWM, p. 9)

Porem, não podemos pensar as tradições de modo rígido. Elas não surgem simplesmente para
substituir outras tradições que se tornaram aboletas. Na verdade, muitas vezes, são utilizadas
para “conservar velhos costumes em condições novas ou usar velhos modelos para novos fins”,
como as universidades e a Igreja Católica (HOBSBAWM, 1984, p. 13)

Para Hobsawm, as tradições inventadas podem ser classificadas em três categorias superpostas:
as que estabelecem a simbolização a coesão social e a formação de comunidades reais ou
artificiais; as que estabelecem ou legitimam instituições, status ou relações de autoridade; e
“aquelas cujo propósito principal é a socialização, a inculpação de ideias, sistemas de valores e
padrões de comportamento.

3. RAIZES DO BRASIL
3.1.A escravidão revelada

Retomando os períodos da história brasileira, marcadas por Welfort, ele a separa em “três
séculos de colónia”, “um século de império” e quase meio século de república agraria”
(WEFFORT, 1991, p. 11). Mas para Sérgio Buarque de Holanda, o grande divisor de águas da
história brasileira- aquilo que marca realmente a passagem de uma época à outra é a abolição da
escritura. Mais do que uma civilização, agrícola, para Holanda “o que os portugueses instalaram
no Brasil foi, sem dúvida, uma civilização de raízes rurais” (HOLANDA, 1993, p. 41), apoiada
durante muito tempo no trabalho escravo. É essa a grande ruptura na estrutura económica e
social do país que vai “jogar” o Brasil em outro patamar. Os escravos libertos pela Lei Áurea, em
1888, foram abandonados à própria sorte e os latifúndios continuaram intocáveis. Veja como o
sociólogo Florestan Fernandes define esse momento:

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O liberto se viu convertido, sumaria e abruptamente, em senhor de si mesmo, tornando-se
responsável por sua pessoa e por seus dependentes, embora não dispusesse de meios matérias e
morais para realizar essa proeza nos quadros de uma economia competitiva (FERNANDES,
2008, vol. 1, p. 29).

3.2.O homem cardial

Para Sófocles, “todo aquele que acima da Pátria coloca seu amigo, eu o terei por nulo”.
Caminhando nesse mesmo sentido e considerando o domínio rural que surge, Sérgio Buarque de
Holanda desenvolve sua teoria em torno do conceito de homem cordial, nem sempre é entendido.

Holanda esta se referido ao facto de que, na história do nosso país, há um predomínio das
vontades particulares- proarias da esfera domestica e dos domínios rurais- sendo, estas pouco
dispostas a obedecer a uma ordenação impessoal das relações sociais. São laços primários- de
sangue e de coração- que fornecem o modelo obrigatório de qualquer composição social entre
nós (Holanda, 1993, p. 106).

A cardinalidade tem pouco a ver com a bondade, com boas maneiras ou com a expressão da
criatividade. Aliás, na civilização, há norma, obediência e coerção. Na cordialidade, ao contrário,
domina a soberania do individuo, a dificuldade em se submeter a regras e aa autoridade: toda a
impossibilidade deve ser transposta em busca da intimidade e de uma convivência mais familiar.

4. O POVO BRASILEIRO
4.1.A tendência ao branqueamento

Nogueira percebeu, então, que havia uma grande diferença entre os dados estatísticos e a
realidade observada no município: para o censo de 1940, a população mestiça era de 4%, mas,
pela pesquisa, chegava a 20%. Qual seria a origem de tamanha diferença?

Nogueira chega à conclusão de que há em todo esse contexto uma tendência ao branqueamento
associada aos pensadores do século XIX, a ideia racista de branqueamento da população”
(CAVALCANTI, 2001, p. 24). Para ele, estávamos diante de uma tendência concreta da
população de classificar como branca parte da população mestiça. Ou melhor, como os dados do
censo são informados pelos próprios sujeitos- cada um declara qual é a sua cor- sendo assim, o
branqueamento era “desejado” pelos entrevistados, isto é, pela própria população.

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4.2.A igualdade proibida

Na época colonial, tudo indicava o lugar de cada um na hierarquia social: nomes, formas de
tratamento, trajes e inclusive leis que tratavam diferencialmente os membros (e raças etnias) que
ocupavam cada degrau dessa hierarquia.

Da Matta também acredita que é somente com a chegada da independência e da abolição da


escravatura que a pirâmide da hierarquia social deve gerar outras “formas geométricas”, isto é, as
elites locais se deparam com necessidades “de criar suas próprias ideologias e mecanismos de
racionalização para as diferenças internas do país” (DA MATTA, 2010, p. 76). Mas para isso, é
preciso realizar uma operação delicada, pois essa identidade precisa “justificar, racionalizar e
legitimar diferenças internas” (DA MATTA, 2010, p. 76).

5. AS POLITICAS AMERINDIAS
5.1.As ausências

Do ponto de vista do ocidente, as sociedades primitivas são sociedades sem Estado. Embora isso
não deixe de estar correto, há, nessa opinião, um juízo de valor etnocêntrico que coloca estas
sociedades “à margem da história universal”, que vê o Estado como o destino inevitável de toda
a sociedade, uma vez que ele seria a consequência da civilização. Assim, as sociedades
primitivas são vistas como detentoras de faltas e ausências: sociedades sem Estado, sem escrita,
sem história (CLASTRES, 1978, p. 133).

Essas faltas também são detectadas na economia (economia de subsistência versus economia de
mercado). A economia de subsistência é vista como uma incapacidade de produzir excedentes e
é associada à miséria dos selvagens, que permanecem atados ao drama de, no máximo, produzir
o mínimo para a sua sobrevivência.

5.2.Subsistência e abundancia

Precisamos então rever o que é e a economia de subsistência, pois essa expressão carrega
também outro preconceito e imagem concebida: de que o índio não gosta de trabalhar. O pouco
tempo dedicado no trabalho e o lazer irritavam, igualmente os franceses e os portugueses. Por
outro lado, os Índios exibiam saúde, beleza, prole numerosa, e “abundancia e variedades de
recursos alimentares” (CLASTRES, 1978, p. 135).

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Existe tempo para produzir excedentes mas não existe finalidade, uma vez que não há a
necessidade comercial. A economia de subsistência não é um defeito, uma incapacidade inerente
a essas sociedades; ao contrário, nelas há uma recusa ao excesso de excedentes”. Além disso, “há
efectivamente produção de excedentes” dentro do tempo normal de trabalho: excedentes que
serão consumidos em festas, dados como presente, para visitas etc.

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