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INTRODUÇÃO
2. O conceito de organização do trabalho;
3. As linhas teôricas sobre organização do A questão da produtividade é hoje, mais do que nun-
trabalho; ca, tema de discussões que se desenvolvem desde os
4. Um modelo de contingência sobre organização recintos acadêmicos até o interior das fábricas. Há
do trabalho; posições bastante diferentes, e as controvérsias não
5. A rotinização do trabalho; parecem estar sendo eliminadas, malgrado os esfor-
6. O centro-de-decisões e a organização do ços de economistas, engenheiros, psicólogos. sindi-
trabalho; calistas e empresários.
7. Produtividade x desorganização dos
trabalhadores. O objetivo deste artigo é propiciar alguns sub-
sídios para esse debate; o material aqui apresenta-
do é o resultado de uma pesquisa sobre característi-
cas do processo da organização do trabalho nos siste-
mas de produção de empresas industriais, cujo enfo-
que, voltado para o aspecto organizacional propria-
mente dito, relaciona-se sobretudo com a questão da
produtividade.
2. O CONCEITO DE ORGANIZAÇÃO DO
TRABALHO
a) "Existe uma maneira ótima de se desempenhar Nessa ocasião, foi levantada a hipótese de que a
uma tarefa; para estabelecê-la, deve-se examinar a produtividade seria bem maior desde que os aspectos
realidade de forma científica." psicológicos dos trabalhadores estivessem adequada-
mente tratados. No entanto, como pouco se conhecia
Para tornar operacional esta colocação, foi desen- sobre tais aspectos psicológicos, o resultado prático
volvido um conjunto de técnicas, hoje consolidado foi a adoção de medidas que visavam, fundamental-
no chamado estudo de tempos e movimentos. mente, melhorar o ambiente de trabalho.
A aplicação dessas técnicas implica, contudo, uma Deve-se a Maslow (3), Argyris (4), Herzberg (5),
segunda premissa, que é a seguinte: entre outros, os estudos que procuram elucidar os fa-
tores psicológicos que afetam o comportamento das
b) "É necessário separar o planejamento da execução pessoas no trabalho.
da tarefa."
Da análise da obra desses autores, chega-se a duas
20 Isto porque, de acordo com a concepção tayloris- colocações básicas:
ta, "o operário, ainda o mais competente, é incapaz
de compreender esta ciência" . 1. A produtividade de uma pessoa é tanto maior
quanto mais satisfeita ela estiver.
Porém, na medida em que os elementos que plane-
jam o trabalho não são aqueles que o executam, e 2. A satisfação é decorrente de fatores intrínsecos ao
também que tal planejamento resulta numa maneira trabalho.
ótima de executar a tarefa:
Conseqüentemente, para que se atinja altos níveis
c) "É necessário promover a seleção do melhor de produtividade, o trabalho deve ser estruturado de
forma a acarretar satisfação para os indivíduos, e is-
operário para cada tarefa, o seu treinamento e o seu
to será atingido desde que se propicie condições para
desenvolvimento.' , que eles possam atingir as características de perso-
o enquadramento do operário no esquema seria nalidade de pessoas maduras.
simples, na medida em que: A solução proposta para o problema assim coloca-
do é apresentada num conjunto de técnicas que se
d) "Todo trabalhador procura maximizar seus ga- convencionou chamar enriquecimento de cargos.
nhos monetários."
Tais técnicas são as seguintes:
Isto deu ensejo ao desenvolvimento dos sistemas
de incentivo salarial. Por outro lado, como "a expe- a) rotação de cargos - implica o revezamento entre
riência demonstra que quando os trabalhadores estão as pessoas envolvidas nas tarefas do sistema produti-
reunidos tornam-se menos eficientes do que quando vo;
a ambição de cada um é pessoalmente estimulada", b) ampliação horizontal - neste caso, agrupam-se
torna-se necessário: diversas tarefas, de mesma natureza, num único car-
go;
e) "Evitar grupos de trabalho." c) ampliação vertical - é o caso onde se atribuem ta-
refas de diferentes naturezas (exemplo: produção,
Em síntese, o esquema de racionalização da tarefa inspeção, manutenção) a um único cargo;
e do cargo prevê um completo serviço de apoio ao
operário, desde a cuidadosa análise científica da tare- d) enriquecimento de cargos - admite que se aplique
fa que ele deve desenvolver até a criação de um sofis- a ampliação horizontal e a vertical a um único cargo.
Em resumo, no esquema de grupos semi-autô- A análise da literatura (7) sugere que, quando o sis-
nomos, o grupo recebe uma tarefa com baixo nível de tema de produção é não-automatizado, o que se re-
detalhamento, recebe recursos para executá-la e tem quer é que o trabalhador tenha conhecimento e habi-
autonomia para se estruturar durante o processo de lidade para desenvolver as tarefas que lhe são entre-
desenvolvimento do trabalho. gues, o que caracteriza um esquema que guarda al-
guns traços do sistema artesanal, o qual denominare-
mos sistema semi-artesanal.
4. UM MODELO DE CONTINGÊNCIA
SOBRE ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO O fato de um sistema ser semi-automatizado e não
totalmente automatizado geralmente decorre de res-
A coexistência de três métodos para organizar o tra- trições de caráter físico, como é o caso da indústria
balho no setor produtivo nos levou a investigar as ra- automobilística, ou de caráter econômico, como é o
zões da não preponderância de um método sobre os caso da indústria de calçados (8). Não obstante, a au-
outros e das condições que permitem que os três tomatização, mesmo que parcial, indica que já houve
métodos permaneçam em uso, simultaneamente. um estudo detalhado e minucioso da tarefa. Homens
e máquinas assumem, então, papéis semelhantes, e o
A análise da literatura existente resultou num mo- que se exige dos trabalhadores é, basicamente, obe-
delo de contingência sobre organização do trabalho, diência a procedimentos preestabelecidos. O método
pois a experiência parece indicar que o melhor de organização do trabalho mais adequado é o da ra-
método para a organização do trabalho numa empre- cionalização da tarefa e do cargo.
sa é função de características próprias da empresa.
Quando o sistema de produção é automatizado, a
Os autores pesquisados concentraram sua atenção função do homem se resume, na maior parte do tem-
basicamente em duas dessas características, quais se- po, às tarefas de rotina, de monitoração e controle
Organização do trabalho
Diversas pesquisas (9) indicam que o método mais
das máquinas. No entanto, se algo de anormal acon-
adequado para a organização do trabalho nestas con-
tecer, é preciso que o operário aja rápida e precisa-
dições é o de grupos semi-autônomos.
mente, para evitar danos consideráveis, decorrentes
do alto custo dos equipamentos e dos materiais em Em resumo, a posição dos autores-pesquisadores,
transformação. no que concerne ao método de organização do tra-
Responsabilidade e iniciativa tornam-se, então, os balho, em função da tecnologia de produção, é a se-
fatores mais importantes para o trabalhador. guinte:
Quadro 1
Enrique-
Organização Racionalização cimento GSA
do Semi-artesanal
de cargos
trabalho
N~O
Dinâmico Quase-estacionário
Observamos, então, que a literatura existente sobre -----------,1
organização do trabalho lança mão de duas dimen- a I
sões para justificar a adequação dos diferentes ~~ ~.~ I
I
métodos existentes: tecnologia de produção e dina- I
mismo ambiental. § ~. 1
I!!. 1
de cargos
verdadeira, isto é, em ambientes quase-estacionários
existe propensão à automatização, pudemos delinear
Grupos
o seguinte modelo de contingência sobre organização semi-autônomos
do trabalho:
5. A ROTINIZAÇÃO DO TRABALHO
5.1 A amostra
Para a coleta de dados junto às empresas utiliza- As empresas foram distribuídas pelas três catego-
mos o esquema de entrevistas com pessoas em nível rias - não-automatizadas, semi-automatizadas e au-
de diretoria, geralmente o diretor industrial, ou com tomatizadas - de acordo com: a) o tipo de equipa-
o gerente de produção. Em três delas entrevistamos o mento utilizado (máquinas universais ou específicas);
diretor e o gerente de produção. Em quatro empresas b) a forma de ordenação de produção (sob pedido ou
chegamos ainda a entrevistar supervisores de pro- não); c) o tipo preponderante de relação, em termos
dução. da obtenção do produto (homem-produto ou
máquina-produto) .
Organização do trabalho
Quadro 3
Mec I AI I
Ambiente Met 3 AI 2
quase Me! 4 Pia I
estacionário Tex I
Mec 2 EI I
Ambiente Me! I Me! 2
Dinâmico Mec 2
a) que todas as empresas consideradas utilizavam um Os dados colhidos na pesquisa de campo mostram
mesmo esquema para a organização do trabalho, in- que as empresas que se situam em ambientes dinâmi-
dependentemente da tecnologia de produção e do cos, cujas tarefas estão em constante redefinição, ins-
grau de dinamismo ambiental; talam vários departamentos incumbidos de planejar e
controlar o trabalho: departamento de projetos; de-
b) que esse esquema não era idêntico a qualquer dos partamento de engenharia industrial; departamento
métodos propostos pelas diferentes linhas teóricas. de tempos e métodos; departamento de programação
e controle de produção; departamento de planeja-
Este esquema de organização do trabalho, por nós mento do processo produtivo; departamento de con-
denominado rotinização do trabalho, pode, não obs- trole de qualidade. Já as empresas em ambientes
tante, ser considerado uma variante da racionali- quase-estacionários, com tarefas estáveis, apresen-
zação da tarefa e do cargo, na medida em que utiliza tam um aparato bem menor, sendo que as empresas
Organização do trabalho
6.2 Tipos de processo de planejamento e controle do
produzir e controlar o trabalho; assim, o planeja-
mento condiciona a forma de execução e de controle. trabalho
Não obstante, as características do processo de pla-
Como o enfoque básico de nosso estudo está voltado
nejamento devem ser definidas em função do tipo de
para as atividades que definem as ações dos trabalha-
controle que se queira exercer; ou seja, planejamento
dores no sistema de produção, procuramos estabele-
e controle se revelam faces de uma mesma moeda, .
cer uma categorização que refletisse o modo como os
condicionando diretamente a forma de execução.
diferentes processos abordam esta questão específi-
ca. É evidente que nesta tentativa de categorização
Nas empresas industriais, as características da or-
privilegiamos certos elementos em detrimento de ou-
ganização do trabalho ficam definidas quando o
centro-de-decisões estabelece as diretrizes do proces- tros.
so de planejamento e controle do trabalho. A variável básica que utilizamos para estabelecer
uma categorização dos processos de planejamento e
É importante que se distinga os dois tipos de deci-
controle do trabalho foi o grau de envolvimento dos
sões que estão envolvidos nesta colocação. Primeira-
mente, há decisões que podem ser consideradas de operários no referido processo.
caráter estratégico, pois são elas que definem os
Consideremos operário o indivíduo encarregado
princípios básicos que orientam a estruturação do
da execução do trabalho - o seu envolvimento, ou
processo de planejamento e controle do trabalho pro-
não, nas atividades de planejamento e controle per-
priamente dito. mitiu que caracterizássemos três tipos básicos de pro-
cessos de planejamento e controle do trabalho.
Em segundo lugar, deve-se considerar as decisões
do tipo operacional, que são aquelas necessárias para
Em primeiro lugar, existem os casos em que o
o funcionamento normal do processo, depois que ele
operário é totalmente excluído do processo de plane-
já estiver estruturado. Poder-se-ia dizer que são as
jamento e controle. Quando isto ocorre, dizemos que
decisões envolvidas na operação cotidiana do proces-
o processo é externalizado, ficando implícito que es-
so. sas atividades de planejamento e controle são desen-
volvidas por outras pessoas na empresa. Caso
Consideramos centro-de-decisões a pessoa, ou gru-
contrário, se o operário é também o responsável pelo
po de pessoas, responsável pelo primeiro tipo de de-
planejamento e controle de seu próprio trabalho, di-
císões. Quanto ao segundo tipo, o centro-de-decisões
zemos que o processo é intemaiizado.
poderá também assumir a responsabilidade sobre
26 elas, ou delegá-la a outras pessoas ou departamentos.
Finalmente, existem empresas onde os operanos
são responsabilizados apenas por algumas das deci-
sões concernentes à sua tarefa, sendo as restantes de
responsabilidade de outras pessoas da empresa. O
Figura 3
processo é, então, semi-externalizado.
C Execuçlo)
senvolver o processo, e cujo funcionamento depende
da existência de procedimentos claros, formalmente
estabelecidos, o processo será considerado impes-
soal.
Esquematicamente, teríamos, então, os seguintes Esta conclusão nos levou a duas outras hipóteses,
tipos de processo de planejamento e controle de tra- mutuamente exclusivas. Não nos parece viável dis-
balho: cuti-las em profundidade em face do escopo deste
artigo, mas gostaríamos de expô-las e colocar alguns
fatos que surgiram durante a pesquisa, os quais já
Figura 4 propiciam subsídios para uma discussão inicial.
Em todas essas empresas, em contato com o A partir do material levantado em nossa pesquisa,
centro-de-decisões, procuramos entender quais eram acreditamos existirem sérios argumentos no sentido
da comprovação desta hipótese.
os fatores utilizados, e sua hierarquização, no pro-
cesso de definição das diretrizes para a organização
do trabalho na produção. Verificamos que as opiniões emitidas pelos cen-
tros-de-decisões em relação à mão-de-obra sem
pre tiveram conotação negativa, destacando a incom-
7. PRODUTIVIDADE X DESORGANIZAÇÃO petência, a irresponsabilidade e a indolência dos
DOS TRABALHADORES operários, traços estes que foram justificados por fa-
tores culturais, educacionais e até institucionais, co-
Desenvolvida a pesquisa de campo, cujos dados fo- mo é o caso do FGTS.
ram analisados de forma individualizada, como se
tratasse do estudo de 32 casos, concluímos que as em- Se nos reportarmos às características do esquema
presas que empregam idênticos processos de planeja- de rotinização, observaremos que ele, realmente, é
mento e controle de trabalho apresentam poucas ca- dirigido para um tipo de mão-de-obra não-qualifica-
racterísticas comuns (em termos de tamanho, de tec- da, barata e instável.
nologia de produção, tipo de administração, etc.).
Confirmou-se, assim, a hipótese de que a escolha de Não obstante, nesse esquema o trabalho é organi-
um esquema de organização do trabalho por parte de zado de forma a:
Organização do trabalho
- não permitir a qualificação e o aperfeiçoamento utilizadas na aplicação do método do que com as pre-
missas que justificam todo o procedimento.
de mão-de-obra;
_ não permitir o contato e o agrupamento entre os 3. Maslow, A. (1943). Uma teoria de motivação hu-
operários, evitando sua possível organização; mana. Ind: Balcão, Y. B. & Cordeiro, L. L. eds. O
_ manter baixos os salários individuais dos Comportamento humano na empresa. Rio de Janei-
operários; ro, FGV, 1975. p. 337-66.
- induzir a rotatividade da mão-de-obra.
4. Argyris, C. The Individual and organization: so-
Podemos concluir, então, que os centros-de- me problems of mutual adjustment. In: Administra-
decisões têm uma concepção definida sobre a mão- tive Science Quarterly, June 1957; Personality and
de-obra e a partir dela organizam o trabalho de tal organization theory revisited. Administrative Science
forma que o operário assume padrões de comporta- Quarterly, 18, June 1973.
mento de acordo com o esperado.
5. Herzberg, F.; Mausner, B. & Snyderman, B: The
o trabalho na produção não é organizado de for- Motivation to work. New York, Wiley, 1959.
ma a utilizar a mão-de-obra de maneira eficiente,
mas sim de forma a desqualificá-la e desorganizá-la, 6. Davis, L. E. & Taylor, J. C. The Design of jobs.
minimizando a possibilidade de surgimento de confli- Penguin Books, 1972. p. 12.
tos dentro da fábrica. Em outras palavras, os
centros-de..<fecisões"sacrificam a eficiência para evi- 7. Entre eles: Blauner, R. Alienation and freedom.
tar problemas com a mão-de-obra" . Chicago, The University of Chicago Press, 1964;
Woodward, J. Industrial organization: theory and
pratice. London, Oxford University Press, 1965; Jo-
Os dados disponíveis não nos permitem ir mais nes, J. C. The Designing of man-machine systems.
adiante na discussão desta hipótese. Ela abre, entre- Ergonomics, 10 (2), 1967.
tanto, novos caminhos de investigação, pois toca em
um ponto nevrálgico do sistema capitalista que é o da 8. Bright, J. Management and automation. Cam-
contradição entre o objetivo declarado de eficiência e bridge, Mass. Harvard University Press, 1958.
lucro e sua realização no campo da organização do
trabalho, onde o objetivo de máxima produtividade é 9. Entre eles: Blauner, R. op. cit.; Susman, G. I.
sobrepujado pelo de minimização dos conflitos entre The Impact of automation on work group autonomy
28 capital e trabalho. and task specialization. In: Davis, L. E. & Taylor, J.
C. eds. Design of jobs. Penguin Books, 1970; Wal-
ker C. R. Toward the authomatic factory, New Hea-
ven, Vale University Press, 1957.