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Refletindo sobre o novo

What phonological deficit?

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Comentado por: Ana Luiza Gomes Pinto Navas

Ramus F, Szenkovits G. What phonological deficit? Q J Exp Psychol (Colchester). 2008;61(1):129-41.

O artigo aqui comentado traz uma revisão crítica sobre a - déficits em memória operacional fonológica, demonstra-
hipótese do déficit de processamento fonológico em pacien- dos pelo baixo desempenho em tarefas de memória
tes com dislexia do desenvolvimento. Os autores pretendem seqüencial de dígitos e/ou repetição de pseudopalavras.
detalhar o que exatamente do processamento fonológico está - recuperação lexical lenta, demonstrada pelo baixo desem-
prejudicado nestes pacientes, se as próprias representações penho em tarefas de nomeação automática rápida.
fonológicas ou o acesso a elas. Todas essas dificuldades em habilidades verbais
Franck Ramus (FR) & Gayaneh Szenkovits (GS) (2008), (fonológicas) têm um componente em comum que são as
do Laboratoire de Sciences Cognitives et Psycholinguistique representações fonológicas. Portanto, a explicação mais
(EHESS/CNRS/DEC-ENS), Paris, France, descrevem uma comum para o déficit de processamento fonológico assume
retrospectiva histórica das diversas abordagens teóricas so- que as representações fonológicas são imprecisas, degrada-
bre dislexia do desenvolvimento e especificamente dos avan- das, não-específicas e/ou não categóricas(1-3).
ços da hipótese do déficit de processamento fonológico. No entanto, o processamento fonológico está envolvido
Há algumas décadas os psicolingüistas têm estudado em em muitos outros aspectos além dessas três dimensões le-
detalhe a estrutura das representações fonológicas, suas re- vantadas, e portanto, a hipótese de uma falha na estrutura
gras (ou computações) operacionais e os vários níveis de re- das representações fonológicas deve manifestar-se também
presentação e processamento que estão envolvidos tanto na nas etapas iniciais de aquisição do sistema fonológico nos
produção como na percepção da fala como mostra a Figura 1. primeiros anos de vida, bem como, na produção e percepção
de contrastes fonológicos.

Explorando o Déficit de Processamento Fonológico

Para entender e identificar quais os diferentes níveis de


representações fonológicas deficientes, os autores adotaram
uma estratégia experimental. Iniciaram então uma série de
estudos delineados para responder a estes questionamentos
baseada em experimentos cuidadosamente elaborados para
comparar os níveis, lexical e sublexical das representações,
em tarefas envolvendo palavras e não-palavras; e comparar
as vias de entrada e de saída, em tarefas de repetição
(envolvimento das duas vias) e tarefas de discriminação au-
ditiva (envolvimento somente das representações de entra-
da).
Figura 1. Modelo de processamento de informação de percepção e Todas as condições avaliadas mostraram diferenças sig-
produção de fala e acesso lexical (Ramus, F & Szevotivcs, G. 2008)* nificativas entre os grupos de adultos disléxicos e adultos
sem queixas de leitura sugerindo que o déficit de
Assim, os autores destacam três dimensões do déficit de processamento fonológico é evidenciado qualquer que seja
processamento fonológico que estão envolvidos nos distúr- o nível de representação, lexical ou sublexical, de entrada ou
bios específicos de leitura: de saída (Figura 1). Observou-se também que o déficit
- déficits em consciência fonológica, demonstrados pelo fonológico nas representações de entrada é mais evidente
baixo desempenho em tarefas de exclusão de fonemas. nos adultos disléxicos do que no grupo controle.
Em conjunto, esses resultados apontaram para a necessi-
(1) Professora Adjunto do Curso de Fonoaudiologia da Faculdade de Ciências dade de um estudo mais detalhado da diferenciação entre a
Médicas da Santa Casa de São Paulo – FCMSCSP – São Paulo (SP), Brasil. integridade das representações e o acesso a elas. A primeira
Endereço para correspondência: Ana Luiza Gomes Pinto Navas. R. Dr.
Cesário Mota Jr., 61, 8oandar, São Paulo – SP, CEP 01221-020. E-mail:
ana.navas@fcmscsp.edu.br *Tradução da autora.

Rev Soc Bras Fonoaudiol. 2007;12(4):341-2


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alternativa é de que as representações estejam degradadas, acesso fonológico, ou seja, todos os processos de acesso às
com alguns traços fonéticos perdidos resultando em erros de representações fonológicas (lexicais ou sublexicais) estari-
comparação e de produção. A outra alternativa é de que as am prejudicados como descrito a seguir:
representações fonológicas estejam intactas, ou seja, o pro- (1) A memória operacional verbal requer o acesso às repre-
cesso de codificação fonológica tenha ocorrido de forma sentações fonológicas para que sejam mantidas no siste-
adequada ao longo do desenvolvimento de linguagem, no ma de armazenamento para posterior recuperação, con-
entanto, os recursos de processamento impõem a verdadeira forme funcionamento da alça fonológica(4).
limitação. (2) Habilidades metalingüísticas de consciência fonológica
Novamente, os autores exploram estas duas possibilida- envolvem o acesso consciente às representações
des por meio de estudos controlados. Em tarefas de discri- fonológicas que devem sobrecarregar os mecanismos de
minação e repetição de não-palavras participantes com acesso e manutenção temporária destas representações;
dislexia mostraram o mesmo desempenho do grupo contro- (3) O acesso lexical avaliado pelas tarefas de nomeação rá-
le. No entanto, foram encontradas diferenças entre os grupos pida também implicam em um rápido acesso às repre-
quando a tarefa envolvia uma maior demanda de recursos de sentações fonológicas.
processamento. O denominador comum nestes casos é a complexidade
Finalmente, os pesquisadores estudaram o papel do aces- da operação em termos de acesso às representações. Outros
so lexical do via input fonológico e mostraram que os indiví- pesquisadores já apresentaram propostas semelhantes como
duos com dislexia apresentam o mesmo grau de facilitação a “hipótese de limitação de processamento”(5) e a “noção de
fonológica do que o grupo controle. Esses achados também déficit de saída (output)”(6).
concordam com a idéia de que as representações fonológicas Para finalizar, gostaria de salientar que os estudos e ex-
estão intactas. perimentos que embasaram esta extensa e detalhada revisão
Em suma, as representações fonológicas de adultos com crítica sobre a natureza do “déficit de processamento
dislexia não diferem das de adultos sem queixas de leitura. fonológico” na dislexia do desenvolvimento foram realiza-
A proposta apresentada pelos autores, após uma série de es- dos com indivíduos adultos. Os próprios autores apontam
tudos ao longo de 20 anos de pesquisa em psicolingüística é para a necessidade de que esta hipótese fosse testada com
de que indivíduos com dislexia apresentam uma falha no crianças ao longo do desenvolvimento.

REFERÊNCIAS

1. Mody M, Studdert-Kennedy M, Brady S. Speech perception deficits in 4. Baddeley AD,Lewis V, Vallar G. Exploring the articulatory loop. Q J
poor readers: Auditory processing or phonological coding? J Exp. Child Exp Psychol. 1984;36A:233-52.
Psychol. 1997;64(2):199-231. 5. Shankweiler D, Crain S. Language mechanisms and reading disorder:
2. Serniclaes W, Van Heghe S, Mousty P, Carre´ R, Sprenger-Charolles L. a modular approach. Cognition. 1986;24(1-2):139-68.
Allophonic mode of speech perception in dyslexia. J Exp. Child 6. Hulme C, Snowling M. Deficits in output phonology: An explanation
Psychol. 2004;87(4):336-61. of reading failure? Cognitive Neuropsychol. 1992;9(1):47-72.
3. Snowling MJ. Dyslexia. 2nd ed. Oxford, UK: Blackwel; 2000.

Rev Soc Bras Fonoaudiol. 2007;12(4):341-2

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