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5 FORMAS DE PROTEGER SEU CÉREBRO

Manter a saúde mental é mais fácil do que muita gente imagina. As pesquisas
dos últimos 10 anos apontam ser possível, sim, estimular a formação de novos
neurônios (o que até 1998 a ciência considerava impossível!) e,
conseqüentemente, afastar os riscos de doenças como Parkinson e mal de
Alzheimer. Saiba como.

POR DANIELA TALAMONI


FOTOS FERNANDO GARDINALI

O que fazer para manter o corpinho em forma e poupar as articulações, as artérias,


o fígado, os pulmões, o coração e tantos outros órgãos e sistemas vitais todo
mundo está cansado de saber: atividade física regular, alimentação leve e
balanceada, abandono de vícios e exames preventivos anuais. Agora, o desafio da
ciência é desvendar os mistérios que ainda envolvem a complexa estrutura cerebral
para encontrar saídas que também ajudem a conter ao máximo a morte natural dos
neurônios e a preservar a saúde mental.
Essa preocupação faz sentido. Muitas pessoas passam a vida tentando conciliar
uma rotina de trabalho estressante com aulas de ginástica, avaliações e consultas
médicas, almoço e jantar saudáveis, algumas horas de lazer... E até conseguem,
mas, quando finalmente conquistam o bem-estar físico, é a cabeça que começa a
falhar, especialmente após os 60 anos.

Segundo relatório publicado pela revista científica inglesa The Lancet, um novo caso
de demência surge a cada sete segundos no mundo (o que inclui entre outros
distúrbios progressivos e degenerativos do cérebro o mal de Alzheimer) - são quase
5 milhões de novas vítimas ao ano. E estima-se que esses números possam
quadruplicar, chegando a um total de 81 milhões de pessoas nas próximas três
décadas.

Para piorar, soma-se a essa triste estatística o fato de neurocientistas e


pesquisadores sempre terem alertado para a fragilidade das células nervosas
cerebrais. Até mesmo nós, simples mortais, aprendemos que os neurônios vão
morrendo com o passar dos anos e, uma vez danificados, não podem se regenerar.
Resultado: a nossa única esperança de manter a lucidez na terceira idade seria
mesmo continuar cuidando da saúde geral e fortalecendo as conexões (a
comunicação entre as células nervosas do cérebro) para tentar ao menos adiar as
conseqüências das perdas neuronais - uma vez que é impossível evitá-las.

A boa nova é que em 1998 uma notícia abalou o mundo da neurociência e, apesar
de ainda causar controvérsias, sugere um futuro menos sombrio para a
humanidade. Naquele ano, uma pesquisa publicada na revista Nature Medicine
comprovava uma desconfiança que surgiu na década de 60 com os estudos
realizados com ratos pela equipe do neurocientista norte-americano Fred Gage - e
para a qual pouca gente deu importância na época -, a de que novos neurônios são
produzidos diariamente no cérebro humano.

O fenômeno, que ficou conhecido como neurogênese, logo atraiu o interesse da


comunidade científica que passou a acompanhar de perto todos os detalhes das
descobertas.

Espécies de células-tronco localizadas ao redor dos ventrículos (as cavidades


internas do cérebro por onde deságua o líquido encefalorraquidiano que vem da
medula espinhal) são capazes de dar origem aos neurônios e todas as células do
Sistema Nervoso Central (SNC). Chamadas de precursoras, essas 'células-mãe' se
multiplicam toda vez que há perda de neurônio. As células nervosas 'recém-
nascidas', então, migram para suprir a região onde houve o dano e restabelecer o
circuito nervoso por ali. Muitos desses 'bebês', porém, não conseguem chegar até o
seu destino e morrem pelo caminho - é a apoptose, um acidente de percurso cujo
risco de ocorrer aumenta 90% à medida que o indivíduo envelhece.

Segundo o neurologista Cícero Galli Coimbra, professor e pesquisador do


Departamento de Neurologia e Neurocirurgia da Universidade Federal de São Paulo
(Unifesp), depois desses achados, cientistas de todo o mundo passaram a se
empenhar na identificação dos fatores que, ao longo dos anos, podem estimular ou
impedir tanto a multiplicação e o nascimento das células nervosas do cérebro
quanto a apoptose. "Agora, este será o melhor caminho para descobrir tratamentos
mais eficazes e até a prevenção de doenças relacionadas às falhas e perdas de
neurônios, como os males de Parkinson e Alzheimer", acredita.

Para provar isso, o médico fez um levantamento de todos os estudos relacionados


ao assunto e publicado em revistas científicas especializadas desde 98 e revelou
para Viva Saúde pelo menos cinco atitudes que, comprovadamente, contribuem
para equilibrar a perda e o nascimento de células nervosas e, conseqüentemente,
preservar o nosso cérebro intacto por mais tempo.

Segundo o especialista, quem estiver falhando em algum dos fatores relacionados à


neurogênese a seguir tem muito mais chance de desenvolver doenças
neurodegenerativas no futuro, mesmo que não apresente nenhuma predisposição
genética. Confira:

1 FUJA DO ESTRESSE CRÔNICO


As pesquisas da década de 60 desenvolvidas pela equipe do neurocientista Fred
Gage com ratos adultos já sugeriam uma possível influência do estilo de vida na
saúde dos neurônios. Em animais criados em gaiolas cheias de brinquedos para
explorar, observou-se um aumento de novas células nervosas no hipocampo (a
área responsável pela capacidade de memorizar e aprender). Enquanto que
naqueles ratinhos submetidos a estresse constante, uma condição desfavorável ao
aprendizado, essa produção diminuiu significativamente.

"Hoje, já se sabe que as tensões diárias, a angústia e a preocupação antecipada -


sensações comuns no dia-a-dia do homem moderno - são capazes de afetar
também o cérebro do ser humano. Esse estresse crônico bloqueia a neurogênese
no início, impedindo que as células precursoras se multipliquem", explica o
neurologista Cícero Galli, da Unifesp.

Vários estudos já comprovaram que, nestas condições, o cérebro só perde


neurônios e não os repõe. O próprio médico, que já avaliou mais de 600 portadores
de mal de Parkinson desde 2002, foi um dos pesquisadores a demonstrar isso. Em
junho do ano passado, durante um congresso sobre a doença na Alemanha, ele
apresentou resultados que indicavam o estresse como um dos principais
responsáveis pela destruição das células nervosas produtoras da dopamina, matéria
química que, entre outras funções, tem papel fundamental na manutenção das
atividades motoras. Essa deficiência dificulta os movimentos, provoca rigidez
muscular e causa os tremores em quem desenvolve esse distúrbio neurológico
crônico e progressivo. "Não há dúvidas de que a tensão emocional está envolvida
em 95% dos casos de mal de Parkinson, que são exatamente aqueles que não têm
uma causa genética. Sempre descubro um trauma por trás do problema. Uma das
minhas pacientes, por exemplo, começou a manifestar os sintomas da doença
algumas horas depois de presenciar a morte do marido em um assalto no trânsito",
conta o neurologista.

Não é à toa que, de acordo com o médico e especialista Cícero Galli, 40% dos
parkinsonianos tiveram ou tem depressão e que, nestes casos, a doença costuma
evoluir mais rapidamente.
Além disso, aqueles que são tratados com a ajuda de psicoterapia têm apresentado
excelentes resultados. "Os que recebem instruções para relaxar e encarar a vida de
forma mais simples e descontraída, em casos mais leves, podem deixar de
apresentar os sintomas. Enquanto aqueles que se encontram em estágios finais da
enfermidade, há ao menos uma melhora do quadro, com o desaparecimento de
problemas urinários, bem como dos pesadelos e dificuldades de raciocínio - comuns
nessa fase", explica.

2 INCLUA GEMA DE OVO NO CARDÁPIO


Depois da absolvição pela condenação injusta que o colocava como principal
responsável por elevar as taxas de colesterol no sangue, o ovo ganha mais um
motivo para ser consagrado como uma opção do bem e, agora, indispensável no
prato. O fato é que a gema (e não a clara, é bom lembrar), mais do que qualquer
outro alimento, oferece uma grande concentração de colina - uma substância que,
agora se sabe, reveste a membrana das células (incluindo as células nervosas do
cérebro) e que não é produzida pelo organismo. "A presença dela é muito
importante para a formação de novas células, incluindo as células nervosas
cerebrais do adulto. Quanto mais colina no organismo, mais material para a
formação da membrana celular", explica o neurologista da Unifesp.

Mas não é só. Ela também forma acetilcolina, um neurotransmissor relacionado às


funções de aprendizado e memória, e teria um papel importante na gravidez e no
desenvolvimento do cérebro do feto. Os pediatras ainda não recomendam uma
suplementação da colina durante a gestação, mas a importância dessa substância
para o bebê foi sugerida em 1997, a partir dos resultados de estudos realizados
pelo pesquisador Steven Zeisel, da Universidade da Carolina do Norte, dos Estados
Unidos, com ratas de laboratório prenhas. "Aquelas que recebiam suplemento de
colina durante a gestação estimulavam muito mais o crescimento das células
nervosas nos ratinhos.

Quando estes nasciam, eram testados em um labirinto e demonstravam muito mais


agilidade para aprender o caminho e encontrar a saída do que aqueles nascidos de
ratas que não haviam sido submetidas à suplementação", conta Cícero Galli. A
importância dessa e de outras descobertas sobre as funções da colina tem sido tão
grande que o governo norte-americano providenciou em 2004 a divulgação de um
banco de dados (o USDA Database for the Choline Content of Common Foods) para
verificar a presença da substância nos alimentos. Com a ajuda dele, é possível
saber por exemplo que a colina também está presente em boas quantidades no
fígado de boi e de frango, no gérmen de trigo e na soja. E que cinco gemas de ovo
somam 682,4 mg de colina, enquanto só a clara equivale a 1,1 mg e 1 litro de leite
a apenas 14 mg da substância. "Vale lembrar que para oferecer todos os benefícios
para o cérebro precisaríamos de pelo menos 500 mg de colina por dia, o que pode
ser obtido com uma cardápio variado", alerta o neurologista.

3 TOME SOL NA MEDIDA CERTA


Quem, afinal, em uma metrópole como São Paulo, não costuma sair de carro para
trabalhar, estacionar no prédio onde fica a empresa, permanecer o dia inteiro
trancafiado em um escritório com janelas escuras e anti-ruídos e voltar para casa
ao anoitecer sem ver a cara do astro-rei ou perceber se a temperatura lá fora
mudou?

É isso mesmo... A vida moderna nos transformou em ratos de esgoto ou de


laboratório (como preferir), pelo menos no que diz respeito ao contato saudável
com o sol. A conclusão foi do bioquímico Reinhold Vieth, da Universidade de
Toronto, no Canadá. Ele avaliou os níveis de vitamina D (que para ser assimilada
pelo organismo precisa da ajuda dos raios solares) em animais e comparou aos
níveis encontrados no homem moderno. Foi então que percebeu a queda dessa
vitamina.

E em que isso prejudica o cérebro? "Além de ser essencial para a formação óssea,
ela estimula a produção de NGF (fator de crescimento dos neurônios)", esclarece
Cícero Galli. Descrita em 1956, a NGF é uma proteína essencial para a
sobrevivência e fortalecimento das células nervosas cerebrais, por ser capaz de
enviar sinais contínuos para que um neurônio dirija suas terminações na direção de
outro e forme uma sinapse (aproximação entre os neurônios, onde ocorrem várias
reações químicas que ainda estão sendo estudadas). Quanto mais numerosas e
fortes forem essas conexões (sinapses), menos ocorrências de apoptose e mais
eficientes as capacidades cognitivas, como a memória.

4 ALIMENTAÇÃO SOL NA MEDIDA CERTA


Aminoácido de maior concentração nas células do corpo, a taurina tem a função de
impedir a formação de coágulos no sangue, diminuir a quantidade de triglicérides
(gordura) no sangue, fortalecer o endotélio (a camada de revestimento dos vasos
sangüíneos e, agora se sabe, bloquear a apoptose (a morte dos novos neurônios).
O problema é que o organismo produz naturalmente esta substância, mas sua
quantidade diminui bastante com o passar do tempo. Não é à toa que, segundo o
neurologista Cícero Galli, alguns geriatras têm recomendado a seus pacientes com
mais de 60 anos fórmulas para repor essa substância no organismo, embora isso
ainda seja questionável. "Ainda não se sabe qual o mecanismo que envolve a
taurina com a neurogênese, nem mesmo a quantidade necessária para cada
pessoa", alerta.

5 EVITE O CONSUMO DE ÁLCOOL


Não é difícil imaginar por que bebidas alcoólicas e outras drogas podem afetar o
cérebro. Essas drogas costumam afetar em cheio o Sistema Nervoso Central,
provocando uma mudança no comportamento ao serem ingeridas. Quem bebe além
da conta, por exemplo, pode ter tonturas, falta de coordenação motora, confusão
mental, desorientação e até anestesia momentânea. Já usuários de maconha
apresentam alteração nos sentidos (visão, audição, olfato e tato), na cognição
(pensamentos, memória e atenção) e até no humor. "As células nervosas cerebrais,
apesar de complexas, são extremamente frágeis e sensíveis. E, além de estimular a
morte de neurônios, o uso dessas substâncias pode bloquear a formação de novos",
afirma o neurologista da Unifesp, Cícero Galli. Vale lembrar que mesmo aqueles
que dizem beber socialmente podem estar arriscando a sua saúde mental no
futuro. De acordo com o especialista, ainda não se sabe qual a quantidade de
álcool, por exemplo, já é capaz de interromper a neurogênese, até porque a
sensibilidade do organismo varia de pessoa para pessoa.

COMO A NEUROGÊNESE FOI DESCOBERTA

Na década de 60, Fred Gage e sua equipe de


pesquisadores da Universidade da Califórnia (EUA), em
experiências com canários machos adultos, notaram que
toda vez que os pássaros cantavam havia proliferação de
novos neurônios. Até então, a ciência acreditava que as
células nervosas cerebrais não podiam nascer em cérebros
adultos - no máximo, conseguiam amadurecer ou fortalecer
suas conexões.

Para verificar a presença dos neurônios recém-nascidos,


porém, não bastava um microscópio potente. Todos os
neurônios são iguais e transparentes, e só com a ajuda
desse equipamento não haveria como saber quais eram os
novos habitantes do cérebro.

Nesse sentido, a tecnologia foi permitindo o uso de técnicas


mais eficientes e que possibilitaram a realização de testes
mais precisos a partir da década de 90 em ratos, sagüis e
outros primatas adultos. A técnica utilizada para comprovar
a neurogênese tinha como princípio deixar uma marca
visível em todo o neurônio que nascia. Para isso, os
cientistas lançaram mão de um marcador celular, a
substância BrDu (bromodesoxiuridina), que tem a
propriedade de ser captada pelas células que estão se
reproduzindo no organismo. O BrDu fica colorido após
reação química e pode ser destacado e visualizado por
microscópio. Assim, ficaria comprovado o nascimento de
neurônios. Mas como fazer essa experiência com humanos?

O BrDU é tóxico e seria necessário remover o cérebro para


procurar com o microscópio os neurônios marcados. Ou
seja, seria necessário conseguir doadores e aguardar sua
morte. Mas em 1998 pesquisadores suecos tiveram uma
grande chance. Como o BrDu estava sendo usado em
pacientes terminais com câncer, para verificar a
multiplicação de células cancerígenas e a existência de
metástase, os cientistas explicaram a importância do
experimento às famílias de cinco pacientes e obtiveram a
permissão para remover o seus cérebros após a morte para
analisar a região do hipocampo. Os resultados, finalmente,
comprovaram a neurogênese e foram publicados na revista
científica Nature.

PRODUÇÃO: LUANA PRADE.


CABELO E MAQUIAGEM: ROBERTO FERNANDES.
AGRADECIMENTOS: GREGORY
Fonte: Revista Viva Saúde

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