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As limitadas no novo Código Civil

Dentro de um ano, todas as empresas deverão estar adaptadas às


normas estabelecidas pelo novo Código Civil, que passou a definir os
critérios que balizam a vida das sociedades limitadas.

Até lá, muitas dúvidas deverão surgir, até porque a nova legislação
aumentou a burocracia administrativa e tornou o dia-a-dia dessas
empresas mais complexo.
Houve, porém, uma preocupação do legislador com a proteção aos
minoritários, ainda que tímida, e também com a salvaguarda dos
direitos de terceiros.

Três convidados do Jornal do Advogado apresentam aqui sua visão


sobre a atual situação das sociedades limitadas: Celso de Souza Azzi,
especialista em Direito Societário, e os conselheiros da OAB SP Cesar
Augusto Garcia e Caio Celso Nogueira de Almeida.

Prática mais complexa

Apesar de algumas omissões, disposições conflituosas e às vezes


confusas do novo Código Civil, a intenção do legislador de reunir todo a
legislação do Direito de Empresa em um só diploma é válida. Consolidou
leis esparsas e alguns entendimentos doutrinários e jurisprudenciais em
um único livro, o qual deve ser aperfeiçoado na medida das
necessidades reclamadas pela rotina das sociedades. O deputado
Ricardo Fiúza, com a colaboração da OAB SP e do Centro de Estudos das
Sociedades de Advogados, o CESA, já preparou e enviou projeto de lei
ao Congresso propondo melhorias.

As sociedades limitadas, que constituem cerca de 95% das empresas


brasileiras, passaram a ser reguladas diretamente pelo Código Civil e
pelas normas referentes às sociedades por ações quando o contrato
social assim expressamente permitir .

Como o novo código veda a constituição de sociedade entre cônjuges


quando estes forem casados sob o regime da comunhão universal de
bens ou da separação obrigatória, seria mais apropriado que entre os
requisitos do contrato social estivesse também a declaração do regime
de bens adotado pelos cônjuges. Isso permitiria aos órgãos registrários
observar o exato cumprimento da lei.

No tocante à integralização do capital social, novas regras importantes


surgiram, aumentando a responsabilidade dos sócios e criando
obrigações que visam salvaguardar interesses de terceiros e da própria
sociedade. Nesse sentido, todos os sócios são solidariamente
responsáveis pela exata avaliação dos bens conferidos ao capital social,
o qual não pode ser aumentado antes de ser totalmente integralizado.

Quanto à cessão de quotas, não havendo disposição em contrário no


contrato, qualquer sócio poderá ceder sua quota, total ou parcialmente,
a quem seja sócio, independentemente da anuência dos demais, e a
quem não seja sócio, se não houver oposição de sócios representando
mais de um quarto do capital social, permanecendo o cessionário e o
cedente, pelo prazo de dois anos contados do registro da alteração,
solidariamente responsáveis perante terceiros e a sociedade pelas
obrigações inerentes àquela participação.

Na hipótese de sócio remisso, a sociedade deverá constituí-lo em mora


para que integralize sua quota em até 30 dias, sob pena de os demais
sócios reduzirem sua participação ao montante até aquele momento
efetivamente pago ou tomar-lhe a quota e excluí-lo da sociedade. Em
qualquer hipótese, não sendo o valor da quota do sócio remisso suprido
pelos demais sócios ou por terceiro, deverá o capital social sofrer a
respectiva redução.

Na redução do capital social, mais uma vez se preocupa a lei com a


defesa de interesses de terceiros que poderiam ser prejudicados com a
medida, principalmente com a retirada da sociedade de bens e capital
em espécie, para fins fraudulentos de modo a torná-la insolvente. Note-
se que a lei só permite a redução em duas hipóteses: quando houver
perdas irreparáveis ou quando o capital mostrar-se excessivo em
relação ao objeto da sociedade.

O novo código mantém a linha adotada para as sociedades anônimas no


sentido de exigir a instalação de reunião ou de assembléia para
deliberação de determinados assuntos, o que torna a organização da
limitada mais complexa do que a prática e o dia-a-dia reclamam.
Mas a convocação de reunião ou de assembléia para deliberação pelos
sócios não deve ser entendida como obrigatória em todos os casos. A lei
traz um rol exemplificativo de assuntos que dependem de deliberação
dos sócios e que, pelo menos em tese, deveriam ser aprovados em
reunião ou assembléia de quotistas.
Há, entretanto, uma exceção à regra, que parece prevalecer na maioria
das vezes, pois é mais comum haver alterações contratuais em que
comparecem todos os sócios do que o contrário. Ou seja, a exceção
acabou por prevalecer à regra, a não ser naqueles casos em que a
natureza da deliberação e a sua efetivação dependam essencialmente
da convocação de reunião ou de assembléia, o que parece ser a
hipótese da redução do capital social.

Ainda com relação às deliberações é importante ressaltar que a maioria


do capital não garante mais ao seu titular a aprovação de todas as
matérias, pois o novo código estabelece quoruns mínimos para a
aprovação de certos assuntos, por exemplo, três quartos do capital
social para a alteração do contrato social.

Mais uma vez a nova legislação peca pelo excesso de complexidade ao


introduzir um elenco de quoruns diferenciados para cada matéria a ser
aprovada e ao impor quoruns difíceis de serem atingidos para a
deliberação de alguns assuntos, o que poderá levar ao aumento das
divergências ente os sócios.

Assim é que, para a nomeação e/ou destituição de administrador,


dependendo de sua qualidade e da forma da nomeação, a lei exige
quoruns específicos e diferenciados que variam entre mais da metade e
unanimidade do capital social. Os sócios deverão sempre observar os
quoruns da lei para evitar futuras nulidades argüidas pelo sócio
dissidente.

Celso de Souza Azzi


Especialista em Direito Societário e vice-presidente da Junta Comercial
do Estado de São Paulo
Nem tão por quotas, nem tão limitadas

Acredito em Pascal e em sua teoria dos vasos comunicantes, ou seja: de


que a natureza a tudo nivela e equilibra. Seguindo o raciocínio, se leis
são criadas para diminuir as diferenças, as próprias relações humanas
encontram mecanismos para neutralizar essa lei. A idéia aplica-se às
modificações introduzidas pelo novo Código Civil em seus artigos 1.052
até 1.087. À primeira vista, fica a impressão de que o legislador quis dar
às limitadas ares de mini-sociedades anônimas de capital fechado. Sim,
porque importou, com modificações, algumas das regras da Lei das
S.A.. Num primeiro momento, impressiona, pois aumentou a burocracia
administrativa para a gestão desse tipo de empresa regular.

Todavia, mergulhando no espírito da norma, percebe-se que a intenção


foi outra, embora muitos comercialistas discordem. Pretendeu o
legislador dar uma nova roupagem às limitadas, possibilitando aos
grandes empresários investir mais capital na produção, criação de
empregos e formas de trabalho. Com isso, novas pequenas, médias, ou
mesmo grandes empresas surgirão, contando com sócios, não
necessariamente administradores do negócio. Quiçá essa postura do
Código coloque fim à quase eterna discussão sobre serem as limitadas
sociedades de capital ou de pessoas. Parece indicar que são muito mais
sociedade de capital do que de pessoas, pois permite até que a empresa
seja administrada por terceiros não-sócios.

O Brasil está carente de novas fórmulas de empreendimentos. Só para


mencionar um exemplo, lembro o da Espanha, na lei de 23/03/1995,
que criou a Sociedad Limitada Laboral - algo híbrido entre uma
sociedade limitada e uma cooperativa, que admite a pluralidade de
administradores sócios ou não sócios. Enquanto isso, nosso país,
atrasado nas questões comerciais, vive de uma eterna discussão
eleitoreira entre capital e trabalho de forma estanque, num sincretismo
e num anacronismo inexplicáveis.

Concernente à Administração da Sociedade, o contrato social tem de


determinar se ela será feita pelos sócios, por terceiros nomeados por
eles, ou conjuntamente por sócios e não-sócios. Sendo por sócios, se
por todos ou por apenas alguns deles. Nesse caso, para se destituir um
da administração da sociedade, precisa-se da aprovação dos detentores
de dois terços do capital, ou pelo quorum que o contrato social dispuser.
Caso o sócio seja nomeado por ato separado, a destituição poderá ser
feita por maioria do capital social.

No caso de administração de não sócios, a regra só muda se o capital


não estiver totalmente integralizado, hipótese em que é necessária a
aprovação unânime dos sócios. Na transferência de quotas, se não
houver disposição em contrário no contrato, qualquer sócio poderá
transferi-las a outro sócio, independentemente da concordância dos
demais, ou para terceiros, hipótese que requer a concordância de três
quartos do capital.

As novidades que chamam à atenção de forma mais amiúde são as da


obrigatoriedade de elaboração de inventário, do balanço patrimonial e
do balanço do resultado econômico, conforme dita o artigo 1.065. Há
alguma discussão no sentido de se fazer obrigatória, mediante
aditamento desse artigo, a publicação dessas demonstrações
financeiras. Mas, por enquanto, são só discussões.

Assembléias ou reuniões de sócios? A obrigatoriedade de realização de


assembléias para sociedades limitadas com mais de 10 sócios está
estampada no parágrafo 1º, do artigo 1.071. Ou com qualquer número,
se o Contrato Social determinar. Há regulamentação específica para
convocação, quorum, presidência etc. Por outro lado, a instalação de um
Conselho Fiscal depende expressamente de disposição no Contrato
Social. Não constitui uma obrigatoriedade legal, mas, uma possibilidade.
O que, diga-se en passant, nunca foi defeso durante a vigência da
norma derrogada.

Entendo que as modificações vieram para melhor, já que dão maior


transparência a esse tipo de empresa. Afinal, ser empresário de uma
sociedade por quotas de responsabilidade limitada não é coisa para
amadores. Até porque, precisamos contar com um mercado capitalista
equilibrado. Entretanto, muitas mudanças ficaram à margem de minha
manifestação - exemplos: Disregard Doctrine, o direito de retirada, a
concordata, o direito de preferência. Aconselho ao leitor: se for laico e
pretender criar uma Limitada, sempre procure um advogado.
Cesar Augusto Garcia
Conselheiro da OAB SP e professor de Direito Comercial, Processual Civil
e Teoria Geral do Processo

Minoritários Protegidos

Finalmente, depois do transcurso do vacatio legis, o novo Código Civil


entra em vigor. Foi um ano todo de expectativas. E não foram poucos os
que achavam que o Código Civil ao entrar em vigência já poderia ser
considerado ultrapassado, mercê dos avanços das ciências que não
foram nele ordenados. Poderia até ser justa a afirmação, não fosse o
Código Civil um monumento legislado estudado e discutido por 27 anos
antes de sua sanção. Há, é verdade, matéria jurídica de direito que hoje
pode ser considerada relevante e que não foi nele incluída. Não abordou
o código assuntos referentes aos transgênicos, à internet, à reprodução
assistida e artificial, à clonagem dos seres vivos.

Mesmo assim, o nosso Código Civil é um primor, quer quanto ao seu


conteúdo, quer quanto à sua propriedade, quer quanto à sua atualidade,
quer quanto à sua essência jurídica. Além de trazer consigo as normas
corretas da ética, os interesses sociais foram postos acima dos
particulares e como condão expressivo usou-se o princípio da
praticidade, para que o homem comum possa entender os seus direitos.

Uma das novidades do novo código é o livro que trata "Do direito de
empresa." Apesar das críticas, o certo é que o direito de empresa veio
para ficar, adaptando-se perfeitamente aos entendimentos modernos
desse ramo do Direito Privado.

As sociedades de atividades econômicas, na esfera civil, receberam nova


roupagem, mais atual e mais justa. Nesse entendimento, há que se
destacar as novas normas que vieram definir a sociedade limitada, antes
regida de forma precária pelo Decreto 3.708, de 10 de janeiro de 1919,
tendo sido suas atividades acomodadas por meio de extensa
jurisprudência.

De importância singular - 95% das empresas regularmente constituídas


são sociedades limitadas -, a sociedade limitada está regulamentada em
36 artigos (do 1.052 ao 1.087) no atual Código Civil.
Tem por objetivo desenvolver atividade empresarial e é composta de
duas ou mais pessoas, cuja responsabilidade está determinada na
proporção do capital subscrito na sua constituição ou conforme disposto
em alteração do contrato social, ficando, no entanto, todos os seus
integrantes responsáveis solidariamente pela integralização do capital.

Pelo que ficou estabelecido na sua regulamentação, nos casos omissos,


a sociedade limitada será regida supletivamente pelas normas da
sociedade simples, podendo, entretanto, ficar estabelecido de forma
expressa em seu contrato social que as omissões poderão ser
suplementadas pela lei das sociedades anônimas.
O ponto mais criticado, tanto por doutrinadores como por empresários,
é a exclusão de sócio, dada a subjetividade dos termos em que foi
estabelecida. Diz o Código que o sócio pode ser excluído quando estiver
pondo em risco a continuidade da empresa, mercê de ato de inegável
gravidade.

Para aprovar a exclusão é necessária a maioria absoluta do capital


social. Acontece que não está claro como se avaliará o ato que define o
risco de continuidade da empresa, assim como a valoração do grau de
periculosidade da ação do sócio que possa ser excluído da sociedade. O
que se pode admitir são os atos decorrentes de desvio de conduta
ligados a fraudes, apropriação indébita, concorrência desleal etc. Esses
atos atingem diretamente o princípio da ética empresarial, afrontando
os princípios fundamentais do Código.

Considero de suma importância a proteção conferida, ainda que de


forma tímida, aos cotistas minoritários. O legislador houve por bem
considerar nula qualquer estipulação que exclua qualquer sócio de
participar dos lucros e também das perdas.

Com pelo menos um quinto do capital, poderá o sócio fiscalizar a


empresa, bem como eleger, separadamente, um membro para o
conselho fiscal e seu suplente, assim como convocar assembléia quando
o administrador retardar sua convocação. Também pode examinar a
qualquer tempo os livros e documentos da empresa, estado do caixa e
da carteira da sociedade, desde que o contrato não tenha definido a
época própria em que esses procedimentos podem ser efetuados.

Pelo novo sistema, o contrato social poderá instituir o conselho fiscal, o


qual será composto, no mínimo, por três membros, que não precisam
ser necessariamente sócios, obstando-se por imperativo legal a
participação de cônjuges, empregados e parentes dos sócios até terceiro
grau.

É de se destacar que a cessão de cotas do capital para terceiros,


estranhos à sociedade, somente se dará se não houver oposição de pelo
menos um quarto dos detentores de um quarto das cotas da empresa.
Quando a administração for exercida por não-sócio da empresa, será
obrigatória a anuência de pelo menos dois terços do capital
integralizado. Caso o capital não esteja ainda integralizado, o código
exige unanimidade para a designação de administrador estranho à
sociedade.

No final de cada exercício social, é obrigatória a elaboração do amplo


levantamento do inventário, do balanço patrimonial e do balanço de
resultado econômico.

Havendo mais de 10 sócios será obrigatória a realização de assembléia


anual, que ocorrerá nos primeiros quatro meses seguintes ao
encerramento do exercício social. Para a realização da assembléia, a
convocação será feita pelos administradores e o anúncio será publicado
em jornal, pelo menos três vezes, devendo ser respeitado um prazo no
mínimo de oito dias para a primeira convocação e de cinco dias para as
que se sucederem.

Na assembléia, aos sócios caberá deliberar sobre aprovação das contas


da administração, designação ou destituição de administradores, modo
de sua remuneração, modificação do contrato social, incorporação,
fusão, dissolução da sociedade ou a cessação do estado de liquidação,
nomeação e destituição dos liquidantes e julgamento de suas contas e
pedido de concordata.

É necessário o voto de três quartos dos sócios para a modificação do


contrato, incorporação, fusão, cessação do estado de liquidação. Para a
designação de administradores, modo de remuneração que não tenha
sido fixada no contrato e pedido de concordata, o quorum será de
maioria absoluta do capital social.

Resta, por fim, tão somente ressaltar que as regras que definem a
constituição dessas empresas já se encontram em plena vigência, por
força do artigo 2.033 das Disposições Transitórias, e as existentes têm
um ano para a devida adaptação às novas normas.

Caio Celso Nogueira de Almeida


Conselheiro da OAB SP

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