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DIREITO INTERNACIONAL PÚBLICO

Personalidade e capacidade jurídica


Uma pessoa ou sujeito de direito é dotado de personalidade jurídica quando tem
capacidade para ser titular autónomo de relações jurídicas, sendo susceptível, nes-
ta medida, a certos direitos e obrigações decorrentes da sua própria personalidade.

A capacidade de agir é uma competência reconhecida ao sujeito pela ordem ju-


rídica, não só para exercer direitos ou cumprir obrigações como também para os
adquirir ou as assumir, e para fazer tudo isto autonomamente, por acto próprio e
exclusivo.

No Direito Internacional existe um conjunto de entidades susceptíveis de titularem


direitos e obrigações e de estabelecerem relações jurídico-internacionais:

- Estados
- Indivíduos
- Organizações Internacionais
- Igreja Católica
- Ordem Soberana de Malta
- Beligerantes
Estas entidades são sujeitos de direito internacional (discutidas à frente).

Dotação da personalidade jurídica e da capacidade de agir e o papel do re-


conhecimento no Direito Internacional

Para que uma entidade seja considerada sujeito de Direito Internacional, tem de ter
uma personalidade jurídica internacional e respectiva capacidade para assegurar os
direitos e cumprir obrigações decorrentes dessa capacidade. Acontece que o recon-
hecimento dos sujeitos de Direito Internacional soberanos (Estados) é essencial ou
para a atribuição da personalidade, ou para a efectivação da capacidade de agir dos
novos entes de sujeito internacional.

Reconhecimento: Acto pelo qual um Estado, constatando uma situação de facto ou


de direito, aceita que esta lhe é oponível. É, neste sentido, um acto jurídico unilat-
eral formal e materialmente internacional que tem por objecto qualquer modifi-
cação da ordem jurídica internacional. Deste modo, variadíssimas situações ou fac-
to jurídico-internacionais podem ser objecto de reconhecimento, tal como o recon-
hecimento de um novo Estado ou de qualquer outro sujeito de Direito Interna-
cional.

1
Requisitos para que uma entidade possa ser considerada sujeito de Direito
Internacional

As condições necessárias para que um sujeito seja dotado desta personalidade


diferem consoante a natureza do sujeito:

- Estados: a doutrina dominante mostra que o Estado é dotado de personalidade


jurídica a partir do momento da sua instituição. Assim, a sua formação é um
fenómeno extra jurídico ou meta-jurídico, que o Direito se limita a constatar sem
nele intervir. Esta linha de pensamento está plasmada na Teoria Declarativa do
Reconhecimento1, que advoga que o reconhecimento por parte dos outros su-
jeitos (Estados) tem um alcance meramente declarativo, dado que o Estado, a
partir do momento do seu nascimento, é uma entidade jurídico-internacional titu-
lar de direitos e obrigações internacionais. Nesta linha, a personalidade jurídica
do Estado não depende de qualquer acto de reconhecimento. Contudo, os efeitos
deste reconhecimento são expressos na capacidade de agir do Estado, embora,
formalmente, esta capacidade não sofra limitações 2. De facto, este reconheci-
mento é essencial para que possa estabelecer relações jurídicas (tal como a cele-
bração de tratados) com outros sujeitos de Direito Internacional.

- Indivíduos: a sua personalidade jurídico-internacional não precisa também de ser


reconhecida, bastando estar dotado de personalidade no seu Estado de origem.

- Organizações Internacionais: a sua personalidade depende do reconhecimento


constitutivo, por parte dos Estados fundadores dessas Organizações, o qual
decorre do próprio acto constitutivo (acordo que institui a Organização). Com o
acordo constitutivo, o novo ente surge na comunidade internacional como uma
pessoa jurídica dotada de personalidade. A sua capacidade de agir, contudo, é
parametrizada pelos seus próprios fins e objectivos, limitada pela esfera de com-
petências reservadas aos Estados, podendo só ser plenamente efectivada com o

1
Esta teoria opõe-se à Teoria Constitutiva do Reconhecimento (defendido em espe-
cial pela escola Voluntarista), que advoga que a personalidade e capacidade jurídica
dos Estados só aparecem com o acto de reconhecimento. Nesta teoria, o reconhec-
imento surge ao lado da população, do território e do poder político como um quar-
to elemento constitutivo de um Estado. Contudo, esta teoria, conduzindo a uma
certa arbitrariedade por fazer depender a existência de um Estado da vontade dos
que já existem, entra em conflito com os princípios fundamentais do Direito Inter-
nacional, nomeadamente o da autodeterminação dos povos e da igualdade dos Es-
tados.
2
Exceptuando Estados semi-soberanos, como acontece com os vencidos de uma
guerra, ou territórios que se encontram sob administração e que são jurídico-inter-
nacionalmente representados por outros Estados.

2
reconhecimento dos Estados não-membros da sua capacidade para poder agir
internacionalmente (neste último caso, este reconhecimento não é constitutivo
mas sim declarativo).

- Beligerantes: a personalidade jurídica desses sujeitos depende do reconhecimen-


to, pois é este acto que lhes atribui a qualidade de sujeitos de Direito Interna-
cional. O reconhecimento aparece assim como elemento de direito atributivo da
personalidade jurídica e, consequentemente, também da capacidade de agir
destes sujeitos mas, uma capacidade sempre limitada pelos fins que estes entes
prosseguem.

Modalidades de Reconhecimento

- Expresso: quando se traduz numa declaração solene feita pelo Estado


recognoscente através da qual manifesta inequivocamente a sua vontade de re-
conhecer o novo sujeito de Direito Internacional - adopta a forma de acto jurídico
unilateral ou bilateral (quando é feita através de uma convenção, ou de acto con-
certado caso de declarações ou comunicados conjuntos).

- Implícito: quando, apesar de inexistir qualquer manifestação expressa e in-


equívoca da vontade de reconhecer, esta vontade está, contudo, subentendida
implicitamente em certas condutas ou em certos factos praticados por um sujeito
já existente relativamente ao ente reconhecido.

- Individual: quando cada sujeito reconhece o novo sujeito através de um acto ju-
rídico individual que só a ele, ente recognoscente, vincula.

- Colectivo: quando um grupo mais ou menos amplo de Estados conjuntamente


acordam em reconhecer um novo sujeito. Actualmente, os Estados tomam essa
iniciativa no quadro de uma Organização Internacional a que todos pertencem.
No entanto, a doutrina mostra que o reconhecimento dos Estados por uma Orga-
nização não implica que cada Estado-membro, mesmo que tenha votado favorav-
elmente no âmbito dessa Organização, fique impedido ou perca o seu direito de
reconhecer individualmente o sujeito.

- Reconhecimento de jure: definitivo e irrevogável que produz, sem quaisquer limi-


tações, todos os efeitos de direito. Esta modalidade de reconhecimento é a forma
classicamente adoptada na prática internacional e, regra geral, é expresso.

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- Reconhecimento de facto: é um reconhecimento provisório, revogável e com
efeitos limitados. Esta forma de reconhecimento é normalmente utilizada quando
um Estado prefere não reconhecer de forma definitiva a entidade que se intitula
Estado ou Governo - por a situação não ser clara ou por motivos políticos - mas,
ao mesmo tempo, considera desejável manter determinados contactos oficiais.

O reconhecimento surge no Direito Internacional com um carácter discricionário


posto que, regra geral, não existe nem uma obrigação de reconhecer, nem um dev-
er de reconhecer. Contudo, não tem um carácter arbitrário visto que deverá re-
speitar sempre certas regras por forma a evitar reconhecimentos que violem as re-
gras fundamentais do Direito Internacional, nomeadamente as que proíbem o re-
curso à força para criar ou impor certas situações internacionais.

Revogabilidade e caducidade do reconhecimento

A revogação do conhecimento é a destruição ou cessação dos efeitos dele através


de um outro acordo jurídico unilateral praticado pela mesma entidade autor do acto
de reconhecimento. As exigências da segurança e da estabilidade das relações in-
ternacionais, bem como do princípio da boa fé, impõem que, em princípio, o recon-
hecimento não deva ser revogado de uma forma arbitrária e infundada. Contudo,
também é certo que o carácter discricionário do reconhecimento, aliado aos inter-
esses políticos dos Estados apontam para a admissibilidade da sua revogação, tanto
mais que sob um ponto de vista jurídico, nada obsta teoricamente de um acto ju-
rídico unilateral seja revogado por outro.

Caducidade

A caducidade só é possível naqueles casos de reconhecimento provisório ou tran-


sitório, como acontece com o reconhecimento dos beligerantes, insurrectos e
movimentos de libertação, ou nos casos em que se verifica o desaparecimento de
um sujeito. Nesses casos, o ente recognoscente não necessita de praticar qualquer
acto declarativo da caducidade.

Sujeitos de Direito Internacional


Os Estados são os sujeitos originários do Direito Internacional e, nessa medida, os
principais protagonistas, mas não resulta que sejam os únicos titulares da personal-
idade jurídica internacional. Actualmente, são reconhecidos como sujeitos de Dire-
ito Internacional os seguintes entes:

- Estados
- Indivíduos
- Organizações Internacionais

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- Igreja Católica
- Ordem Soberana de Malta
- Beligerantes

Estados
Concepção estrutural do Estado: estruturas estatais típicas

Sob o ponto de vista estrutural, o Estado pode ser visto como uma superestrutura
jurídico-política onde o poder se organiza em aparelhos repressivos e ideológicos
através dos quais é exercido com o objectivo de assegurar a coesão da unidade de
uma dada formação social.

- Aparelhos repressivos: constituídos pelo exército, polícia, prisões, outras institu-


ições coercivas como certos ramos especializados do Governo e da Administração
(aparelho governamental). Estes encontram-se fortemente centralizados e, con-
sequentemente, a direcção dos mesmos é unificada e exercida pelo grupo que,
no seio do bloco no poder, detém a hegemonia. Estas instituições têm dominan-
temente uma função repressiva, sendo que, em determinados momentos, ex-
ercem também uma função ideológica, quando através deles se veiculam ati-
tudes, comportamentos ou códigos sociais, rituais, etc..

- Aparelhos ideológicos: para além do aparelho governamental, que exerce uma


função essencialmente repressiva, a sociedade política e civil também integra a
superestrutura estatal, integrando aparelhos ideológicos como os meios de in-
formação, a Igreja, a Escola, a família. Estes aparelhos exercem tarefas comple-
mentares aos aparelhos repressivos, quando veiculam rituais, códigos sociais,
modelos de comportamento, e de atitudes, etc.. A sua autonomia relativa é nor-
malmente maior do que a dos aparelhos repressivos, embora possam estar fun-
cionalmente unificadas em termos ideológicos. Estes aparelhos não têm poder
próprio e não elaboram a ideologia, mas são lugares onde se materializa.

A nível internacional, estes aparelhos são unitários por forma a garantir a coesão
da sociedade, isto é, a unidade de uma dada formação social, neste caso, o Estado.
Os aparelhos repressivos são essenciais para a efectivação da acção estatal no
campo internacional embora a ideologia desempenhe um papel importante na moti-
vação dos comportamentos dos Estados.

Elementos constitutivos de um Estado

A concepção jurídica defende a existência de três elementos constitutivos de um


Estado:

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- Povo ou População: no âmbito do Direito Internacional, a ideia de povo está liga-
da à de cidadania e de nacionalidade que são os mais importantes elementos ju-
rídicos de conexão entre o povo e o Estado. Nesta medida, o povo é definido
como um conjunto de indivíduos de um Estado sobre qual este exerce os seus
poderes, sendo estes indivíduos destinatários da ordem jurídica estatal. No en-
tanto, para aqueles que entendem que é a nacionalidade que explica a relação
entre o povo e o Estado, torna-se necessário distinguir o povo da população, pos-
to que esta recobre uma realidade mais ampla do que aquela, por se referir a to-
das as pessoas, nacionais ou estrangeiras, que vivem habitualmente no território
de um Estado. Assim entendida, a população não constituí um elemento definidor
do Estado. Todavia, a noção de povo não é suficiente para recobrir todas as reali-
dades que devem ser tomadas em conta pelo direito e pela política internacional,
tornando-se assim necessário privilegiar o conceito de nação. De facto, é fre-
quente a identificação ou associação da ideia de povo com a de nação e desta
identificação tem resultado todo ou esforço de elaboração doutrinal do conceito
de nação. Para uma concepção objectivista, defendida na Alemanha, a nação
deve ser definida com base num conjunto de factores materiais e objectivos tais
como a raça, a língua, a cultura, a história comum, etc.. Já para uma concepção
subjectivista, defendida em França e em alguns países latinos, é a vontade dos
indivíduos de viver em comum que constituí o principal critério de definição de
uma nação.

- Território (validade espacial): Os Estados são formações territoriais. Não pode


haver Estados sem território e a prática jurídico-internacionais e a doutrina con-
sagram o princípio segundo o qual a perda total do território estatal tem como
consequência o desaparecimento do Estado. É no território que se fixa de forma
permanente a população e é no interior dele que o Estado exerce a maior parte
dos seus poderes. O território é composto por território terrestre (que integra o
solo e subsolo), fluvial e lacustre, marítimo3 e aéreo. O território é determinado
pelos seus limites. Estes são fixados através da delimitação (acordo entre os Es-
tados contíguos no qual negoceiam e fixam os limites e o traçado da fronteira de
acordo com os critérios naturais, artificiais ou imaginários) e demarcação (um
processo puramente técnico através do qual as partes vão executar o acordo es-

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Relativamente a este território, o Estado tem uma jurisdição absoluta nas
primeiras 12 milhas, com a excepção de que não pode proibir os barcos de circular
(principio decorrente da liberdade dos mares); uma jurisdição limitada a questões
alfandegárias, nomeadamente quando se trata de contrabando, e de saúde, nas 12
milhas seguintes; e direito a exploração económica dos recursos naturais até às
200 milhas.

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tabelecido, fixando materialmente, no terreno, os limites que foram previamente
estabelecidos).

- Poder político (validade temporal): a organização institucional que efectivamente


exerce o domínio sobre a população e território, que realiza todas as funções de
autoridade pública no seu território e defende os interesses estatais no exterior, é
um verdadeiro elemento definidor de um Estado. O poder só interessa ao Direito
Internacional quando se encontra materializado em instituições. É, portanto, um
fenómeno organizacional e de domínio efectivo, quaisquer que sejam os modelos
de organização e os meios utilizados para o exercício efectivo desse domínio. O
Estado, como sujeito de Direito Internacional, goza de um estatuto internacional
que tem como pedras angulares dois princípios fundamentais: o da soberania e o
da igualdade. Sob o ponto de vista do Direito Internacional, a soberania recon-
duz-se à ideia de independência de um Estado na ordem jurídica internacional,
significando isto que o Estado tem exclusividade de competências (só o Estado
pode exercer os poderes ou competências decorrentes da soberania no seu ter-
ritório e nas pessoas que nele habitam), autonomia de competências (não está
dependente de ordens ou instruções de outros Estados) e plenitude de com-
petências (no interior do seu território, a competência do Estado é ilimitada). No
que respeita à igualdade, a sua origem está assente no pensamento jusnatural-
ista - os Estados são, sob ponto de vista do Direito Internacional, juridicamente
iguais, o que significa que todos os Estados, independentemente da extensão do
seu território, do número de habitantes, do seu poder económico, político ou mili-
tar, têm os mesmos direitos e obrigações.

Esta corrente jurídica foi elaborada a partir de Jellinek que, por entender que a na-
tureza e a função desta superestrutura não poderia ser entendida exclusivamente
através da instância jurídica, defendia que a questão do Estado não devia ser trata-
da exclusivamente sob o ponto de vista jurídico, mas devia ser abordada também
sob ponto de vista sociológico, embora os dois métodos não devam ser confundi-
dos. No entanto, uma corrente formalista e normativista, defendida por Kelsen,
nega qualquer possibilidade de uma teoria sociológica do Estado. Kelsen apresenta
o Estado como uma ordem normativa, juridicamente centralizada, que apenas pode
ser ordem de coerção. O autor entende também que os elementos do Estado só
podem ser defendidos juridicamente, isto é, apenas podem ser apreendidos como
vigência e domínio da vigência de uma ordem jurídica, pelo que o povo é o conjun-
to de indivíduos submetidos a uma determinada ordem coerciva relativamente cen-
tralizada, o território é o domínio espacial de vigência de uma ordem jurídica es-
tatal e o poder domínio é o domínio de vigência de uma ordem jurídica estatal efec-
tiva.

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Poderes do Estado sobre o território

No quadro das competências territoriais, existem competências discricionárias (que


visam proteger a soberania estatal e estão ligadas à ideia do domínio reservado dos
Estados, sendo um conjunto de actividades jurídicas que o Estado pode exercer
sem qualquer submissão ao Direito Internacional por serem essenciais à sua
própria sobrevivência) e vinculadas (conjunto de competências estatais de certo
modo limitadas pelo Direito Internacional, pelo que as actividades estatais devem
ser desenvolvidas com estrita observância das regras daquele Direito que o vincu-
lam).

Os Estados podem exercer poder fora do território a com base na soberania territo-
rial:

- Navios ou aeronaves militares;


- Navios públicos ou aeronaves civis;
- Navios e aeronaves privados, quando estão no alto mar ou no espaço aéreo in-
ternacional;

- Missões diplomáticas.
Poderes do Estado sobre a população

A nacionalidade é o vínculo jurídico que liga uma pessoa a um dado Estado, vínculo
através do qual a pessoa passa a pertencer à população desse Estado. O Direito
Internacional deixa para o direito interno os critérios específicos para regulamen-
tação da atribuição, conservação e perda da nacionalidade. Contudo, é possível
identificar critérios de conexão reconhecidos como geralmente válidos pela ordem
jurídica internacional, entre os quais é possível salientar o ius saguins (laços de
sangue) e o ius solis (local de nascimento).

No entanto, este vínculo jurídico não permite uma acção limitada do Estado em re-
lação aos seus nacionais. De facto, a liberdade de supremacia plena relativamente
aos nacionais foi sendo limitada pelo Direito Internacional através de um conjunto
mais ou menos vasto de normas protectoras do indivíduo ou dos direitos individu-
ais.

- Até à Primeira Guerra Mundial, foram celebrados vários tratados que protegiam a
liberdade religiosa.

- No período entre Guerras, o tratado de paz que pôs termo à Primeira Guerra veio
instituir a protecção das minorias.

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- No pós-Segunda Guerra Mundial surgem novas instituições com vista à protecção
dos direitos humanos. Estas podem ter um âmbito universal, como a Declaração
Universal dos Direitos e Liberdades Fundamentais do Homem (1948), aprovada
pela Assembleia Geral da ONU, onde estão consagrados direitos civis, políticos,
económicos, sociais e culturais; ou regional, caso da Convenção Europeia dos Di-
reitos do Homem (1950), aprovada pelo Conselho da Europa; da Convenção de
São José da Costa Rica (1969), produzida pela Organização dos Estados Ameri-
canos; da Carta Africana dos Direitos do Homem e do Povo (1981), aprovada
pela Organização da Unidade Africana, etc..

No que diz respeito à competência dos Estados sobre os seus nacionais fora do ter-
ritório estatal, entende-se que os Estados podem regulamentar a actividade daque-
les em territórios estrangeiros ou impor-lhes obrigações, desde que o Estado de
acolhimento aceite a aplicação das normas internas do Estado de origem no seu
território. Reconhece-se, ainda, aos Estados o direito de chamar (ius evocandi) os
seus nacionais que se encontrem no estrangeiro, quer para cumprir certas obri-
gações, quer para efeitos jurídico-criminais. Para efectivar esses direitos, os Esta-
dos têm celebrado tratados de emigração, de extradição, cooperação judiciária,
comércio, etc., com vista a permitir um efectivo exercício desses direitos. Final-
mente, faz-se notar que os Estados podem proteger os seus nacionais residentes
no estrangeiro através do mecanismo da protecção diplomática e, na falta de con-
venção sobre tratamento dos seus nacionais, através da exigência de um tratamen-
to que corresponda a um standard mínimo internacionalmente reconhecido.

No que diz respeito à competência estatal sobre os estrangeiros no seu território, o


Direito Interno de cada Estado está dotado de um conjunto de normas destinadas a
estrangeiros, normas essas que são, regra geral, de carácter administrativo e que
se destinam a regulamentar as actividades dos estrangeiros no território do Estado
de acolhimento (por exemplo, necessidade do passaporte, registo de entrada, au-
torização de residência, etc.). No Direito Internacional existem também normas que
impõem tratamentos especiais aos estrangeiros nomeadamente no que se refere à
entrada e permanência no território nacional de cada Estado, às suas condições ex-
pulsão, e ao seu tratamento de acordo com um standard mínimo internacional-
mente reconhecido, que garante as liberdades mínimas e compatíveis com uma ex-
istência e vivência humanas dignas: a garantia de devida protecção de estrangeiros
que vivam no seu território, a consagração de diversos direitos, relativos à vida,
integridade física, honra, liberdade ou propriedade, acesso à justiça, e a obrigação
de respeitar todas as Convenções que sejam partes relativas aos Direitos e Liber-

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dades Fundamentais do Homem, ou na ausência dessas convenções, a Declaração
Universal dos Direitos do Homem.

Organizações Internacionais
Uma Organização Internacional é uma entidade autónoma e permanente, com per-
sonalidade e capacidade jurídica internacional, constituída por associação voluntária
de sujeitos do Direito Internacional por acto jurídico internacional, dotada de regu-
lamento interno próprio e de órgãos permanentes encarregados de prosseguir os
objectivos definidos no acto constitutivo.

- Pkl jnzxl,3IUjjurídica interna dos Estados que os

constitucionaliza à medida que essa ordem jurídico-política vai sendo


democratizada. Esta internacionalização começa ver- dadeira e de forma efectiva
com a Carta das Naçõesschatz Unidas e prossegue com a

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Declaração Universal dos Direitos do Homem (1948), sendo de seguida consoli-
dado em diversas convenções internacionais. Os direitos do homem têm uma
origem estatal marcada por uma forte carga ideológica e a sua integração no Di-
reito Internacional é fruto de um processo lento e laborioso que se inicia de for-
ma decisiva com a Carta das Nações Unidas.

- Negação da personalidade jurídica activa do indivíduo, no que toca à defe-


sa dos seus direitos. O indivíduo é um sujeito menor, isto é, um sujeito a quem
não se reconhece, na maior parte dos casos, capacidade de agir em defesa dos
seus direitos, isto é, para, por si só, assegurar junto das instâncias internacionais
a defesa dos seus direitos, necessitando, para o efeito, da mediação estatal 5.
Não, dispõe, portanto, de eficazes meios de defesa dos seus direitos. A partir do
final do século XX, contudo, tem-se vindo a assistir à instituição de mecanismos
que lhe permitem recorrer directamente às instâncias internacionais, nomeada-
mente aos Tribunais Internacionais, para aí fazer valer os seus direitos, mesmo
contra os Estados de que são nacionais. Estes mecanismos não estão ainda gen-
eralizados, mas apesar disso, a sua institucionalização progressiva em especial no
seio das OIs, constitui um importante passo na defesa dos Direitos do Homem.

- Destinatário directo e imediato das deveres de Direito Internacional. Os


indivíduos gozam de um estatuto de plena capacidade nos termos do qual pode
ser directamente responsabilizado pelos seus actos ilícitos. Nessa medida, é con-
siderado destinatário directo de normas sancionarias internacionais. A partir do
século XX, ao mesmo tempo que se alarga o número de factos classificados como
infracções internacionais, cuja prática gera responsabilidade individual do agente
(como acontece com o tráfico de estupefacientes, ou várias modalidades de pi-
rataria aérea e o terrorismo) outros factos são classificados como infracções in-
ternacionais geradoras da responsabilidade do autor do facto ilícito, agora con-
siderado e punido como agente público, que os pratica em nome do interesse de
um Estado. Assim acontece com os crimes de guerra, os crimes contra a paz, os
crimes de genocídio, crimes contra a humanidade, etc..

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A mediação integra formas institucionais de protecção estabelecidas por diversas
convenções internacionais: relatórios (informações de carácter geral dadas pelos
Estados a órgãos internacionais sobre a aplicação das disposições convencionais
sobre os Direitos dos Homem), reclamações apresentadas pelos Estados (um Esta-
do pode apresentar a um órgão internacional uma reclamação contra outro Estado,
nela alegando que este último viola os direitos individuais ou não cumpre as obri-
gações que assumiu nesta matéria), e inquérito (no quadro da Assembleia Geral da
ONU a técnica do inquérito a situações de graves violações dos Direitos do homem
tem sido utilizada em casos considerados extremamente graves).

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- Impossibilidade de participação no processo de criação de normas inter-
nacionais. Dado que o indivíduo é destinatário directo de normas internacionais
e que, pode, em determinadas circunstâncias defender os seus direitos em in-
stâncias internacionais, pode concluir-se que desta impossibilidade da partici-
pação na formulação normativa internacional resulta somente que o indivíduo
não goza de uma plena capacidade de exercício em sede do Direito Internacional.

Igreja Católica
A Igreja Católica é hoje considerada uma Organização Internacional transnacional
de natureza confessional com personalidade jurídica internacional.

Esta personalidade advém da:

- Lei das Garantias (1871): Lei Italiana que reconhece ao Papa todas as prerrogati-
vas e privilégios que, por Direito Internacional, competem aos Chefes de Estado.

- Tratado de Latrão (1929): Tratado onde a Itália reconhece expressamente a


soberania da Santa Sé na ordem internacional como atributo inerente à sua na-
tureza, em conformidade com a tradição e com as exigências da sua missão no
mundo bem como a plena propriedade, a absoluta e exclusiva autoridade e
soberana jurisdição da Santa Sé (governo da Igreja) sobre o Vaticano, criando o
Estado Cidade do Vaticano. Assim, a Cidade do Vaticano6 aparece como um meio,
um instrumento jurídico necessário à manutenção da independência da Igreja,
embora a Igreja e a Cidade do Vaticano sejam dois sujeitos distintos do Direito
Internacional, ainda que haja uma relação especial de submissão da Cidade à
Igreja.

A Igreja está, nesta medida, independente de qualquer poder temporal, o que é


reconhecido pela própria Igreja no Código do Direito Canónico e no Tratado de La-
trão, onde diz que a Santa Sé declara a sua vontade de se manter afastada dos
conflitos temporais entre os demais Estados, salvo se as partes conflituantes, de
comum acordo, recorrerem à sua missão pacificadora, reservando, contudo, o seu
direito de fazer valer a sua autoridade moral e espiritual. Apesar da controvérsia
sobre a subjectividade jurídico-internacional da Igreja, hoje nenhum Estado, mes-
mo aqueles que com ela não tenham relações diplomáticas, nega tal personalidade,
embora a considere limitada ao poder espiritual.

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A Cidade do Vaticano é reconhecida por certos autores como um Estado, embora
com características particulares (não tem súbditos permanentes, e a sua principal
função é proporcionar uma base independente de governo e só secundariamente
velar pelo bem-estar comum dos seus membros). Por estas razões, alguns autores
recusam-se a reconhecer a cidade do Vaticano como um Estado.

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Ordem de Malta
A Ordem de Malta, originariamente, era uma organização de carácter religioso e
militar, estando hoje centrada em actividades religiosas e de beneficência. A sub-
jectividade jurídica da Soberana Ordem de Malta é bastante discutida na doutrina.
Por um lado:

- Não tem território;

- Está subordinada à Igreja Católica sob o ponto de vista religioso, dependendo da


Santa Sé e encontrando-se submetida às leis canónicas.

Por outro lado:

- É-lhe reconhecida uma soberania funcional, sendo reconhecida pela Igreja certas
prerrogativas próprias dos sujeitos de Direito Internacional: a ordem pode man-
ter relações diplomáticas com os Estados, enviando e recebendo embaixadores, e
celebrar Tratados que lhe permitem desenvolver a sua actividade assistencial e
religiosa no território dos Estados;

- Tem um ordenamento jurídico próprio, constituído por uma Carta Constitucional,


um Código e um governo próprio.

Cruz Vermelha Internacional


A Cruz Vermelha Internacional é fruto das iniciativas laicas de prestação de serviços
de natureza assistencial, que começam a surgir a partir do século XIX, momento
em que tais actividades deixam de ter uma natureza exclusivamente religiosa. Foi
fundada em 1863, tendo um carácter humanitário destinada a proteger e auxiliar
as vítimas de guerra.

Apesar de ser uma Organização Não-Governamental, a Cruz Vermelha Internacional


pode participar em Tratados Internacionais, sendo reconhecida a sua personalidade
jurídica internacional. A Cruz Vermelha também mantém relações com os Estados e
as Organizações Internacionais, que lhe solicitam diversos serviços de natureza in-
ternacional e, para o efeito, com ela celebram convenções. Participa activamente na
formação das normas do Direito das Gentes, quando celebra, em nome próprio,
Tratados ou Convenções Internacionais.

Beligerantes e Insurrectos
Os insurrectos não são sujeitos de DI pois tratam-se de uma situação efémera.
Contudo, se a sublevação de grupos sociais organizados contra o governo de um
Estado levar a que os insurrectos acabem por controlar, de forma organizada, uma
parte do território e da população do Estado, prolongando a sua luta até à realiza-

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ção integral dos seus objectivos (conquista do poder), ou que se limitem a controlar
pequenas áreas territoriais, barcos de guerra ou civis, então assiste-se a insur-
reição passa a ser considerada uma situação de beligerância.

O prolongamento da insurreição e a sua transformação numa situação de be-


ligerância acaba sempre por levar os terceiros Estados a terem de adoptar uma
posição face às partes em conflito, a qual pode traduzir-se no seu reconhecimento
como sujeitos de Direito Internacional. Isto permite:

- A aplicação às partes em luta do Direito Internacional da Guerra;


- A isenção do Estado de responsabilidade pelos danos causados pelos revoltosos;
- A neutralidade, perante a luta, dos Estados que reconhecem a beligerância.

Os terceiros Estados, para evitar o reconhecimento prematuro de uma situação de


beligerância, devem esperar para que se reunam todos os requisitos necessários
para se qualificar a situação como uma real situação de beligerância, ou seja, que
os revoltosos se encontrem dotados de uma organização, que controlem uma parte
do território e da população do Estado e que se afirmem pela luta como um movi-
mento contra o governo estabelecido.

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