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EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR DESEMBARGADOR PRESIDENTE DO

EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS.

Processo n°.

VICTOR CECCATO PENHA, advogado, inscrito na OAB/MG sob o nº ..., com escritório
profissional à Rua Dona Zulmira Pereira da Silva, 340, Bairro São Paulo, na cidade de
Governador Valadares/MG, CEP: 35-030-140, vem, respeitosamente à presença de Vossa
Excelência, com fulcro nos art. 5º, inciso LXVIII da Constituição da República Federativa
do Brasil, e art. 647 e seguintes do Código de Processo Penal, impetrar a presente

ORDEM DE HABEAS CORPUS

com pedido de LIMINAR, em favor de JOÃO DAS COUVES, nacionalidade, estado civil,
desempregado, portador do RG, CPF , residente e domiciliado na Rua ... n° ..., Bairro ...,
CEP: ...,na cidade de ... Estado de ..., que encontra-se preso em razão de coação ilegal
praticada pelo MM. Juiz da ... Vara Criminal de Governador Valadares, ... , consoante os
fatos e fundamentos jurídicos a seguir expostos:

RESENHA FÁTICA
O impetrante encontra-se preso em flagrante delito desde o dia 12 de março de 2019,
pois lhe foi imputada a prática do crime previsto no art. 155, caput do Código Penal
Brasileiro.
A autoridade coatora converteu a prisão em flagrante do paciente em segregação
preventiva e manteve a custódia cautelar do conduzido, sob o argumento da garantia da
ordem pública, uma vez que o flagrado responde a processo criminal em curso perante o
juizado especial criminal da comarca, não sendo pois o primeiro envolvimento em
ocorrências criminosas.

DO DEFERIMENTO DO PEDIDO DE RELAXAMENTO DE PRISÃO

M.M. julgadores, a defesa se vê renitente com a decisão do juiz “a quo”, que


converteu a prisão em flagrante para segregação preventiva, em face da ausência dos
requisitos autorizadores da prisão preventiva.
Respeitáveis Julgadores, é de suma importância no ato de se fazer uma lídima
justiça, a observância de todos os critérios objetivos e subjetivos. Neste caso em questão, a
autoridade coatora se ateve apenas à periculosidade abstrata do tipo penal insculpido no
artigo 155 do CP, sem assinalar os motivos indispensáveis para se garantir a ordem pública.
É inadmissível, pela defesa, resignar-se com essa decisão, baseado no fato que o ato
praticado pelo paciente se resume em um fato atípico em nosso ordenamento jurídico, pois
trata-se de um “furto famélico, estado de necessidade que é legalmente previsto como uma
das causas excludentes de ilicitude no art. 24 do Código Penal Brasileiro, 'verbis'”:

Considera-se em estado de necessidade quem pratica o fato para salvar de perigo


atual, que não provocou por sua vontade, nem podia de outro modo evitar, direito
próprio ou alheio, cujo sacrifício, nas circunstâncias, não era razoável exigir-se.

De fato, de acordo com Rogério Sanches Cunha (2017), “a jurisprudência tem


reconhecido o estado de necessidade (art. 24 do CP), desde que presentes os seguintes
requisitos (ônus de defesa): a) que o fato seja praticado para mitigar a fome; b) que seja o
único e derradeiro recurso do agente (inevitabilidade do comportamento lesivo); c) que haja
subtração de coisa capaz de diretamente contornar a emergência; d) a insuficiência dos
recursos adquiridos pelo agente com o trabalho ou a impossibilidade de trabalhar.”
Em verdade, cumpre ressaltar que o ato praticado pelo acusado nem mesmo possui
tipicidade, uma vez que, por constituir delito de menor importância, se amolda nos efeitos do
Princípio da Insignificância. Afinal, não basta que a conduta praticada tenha apenas
correspondência nos elementos de um tipo penal. Faz-se necessário que a conduta seja capaz
de lesar ou expor terceiros a risco, provocar lesões significantes ao bem jurídico tutelado.
Nesse sentido, o princípio da insignificância ou da bagatela encontra-se relação com
o princípio da intervenção mínima do Direito Penal. Este, por sua vez, parte do pressuposto
que a intervenção do Estado na esfera de direitos do cidadão deve ser sempre a mínima
possível, para que a atuação estatal não se torne demasiadamente desproporcional e
desnecessária, diante de uma conduta incapaz de gerar lesão ou ameaça de lesão ao bem
jurídico tutelado.
A jurisprudência de nossos Tribunais Superiores tem fixado certos requisitos para
que o aplicador do direito possa reconhecer a insignificância de determinada conduta. São
eles:
a) mínima ofensividade da conduta;
b) a ausência de periculosidade social da ação;
c) o reduzido grau de reprovabilidade do comportamento; e
d) a inexpressividade da lesão jurídica (HC 92.463 e HC 92.961 no STF e Resp
1084540 no STJ).

Também se faz importante ressaltar que, caso lhe seja atribuído a qualificação de
furto previsto no artigo 155 do CP, no presente caso, a impetração indaga a decretação da
prisão preventiva do paciente, sustentando, em resumo, que não estariam presentes os
requisitos que autorizam tal medida extrema, pois a decisão atacada se apoiou na garantia da
ordem pública, e dessa forma não demonstrou acertadamente a presença de algum dos
requisitos previstos nos art. 310, II, e, 312 do CPP.
Não obstante, cumpre ressaltar já que a tipificação legal da conduta do acusado
também não se enquadrou em nenhum dos requisitos legais estabelecidos no art. 313 do CPP,
os quais eram necessários para a decretação daquela. Senão, vejamos:

Art. 313. Nos termos do art. 312 deste Código, será admitida a decretação da prisão
preventiva:
I – nos crimes dolosos punidos com pena privativa de liberdade máxima superior
a 4 (quatro) anos;
II – se tiver sido condenado por outro crime doloso, em sentença transitada em
julgado, ressalvado o disposto no inciso I do caput do art. 64 do Decreto-Lei no
2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal;
III – se o crime envolver violência doméstica e familiar contra a mulher, criança,
adolescente, idoso, enfermo ou pessoa com deficiência, para garantir a execução
das medidas protetivas de urgência; (...)

Diante de fato indiscutível da ilegalidade e abuso de autoridade da decisão que


transformou o flagrante delito em segregação preventiva, não tem outro destino senão o
relaxamento da prisão preventiva, soltando-se imediatamente o paciente, conforme
literalidade da Constituição Federal (art. 5º, inciso LXV1) e entendimento jurisprudencial:

HABEAS CORPUS. PRISÃO PREVENTIVA. DECRETAÇÃO.


FUNDAMENTAÇÃO SUCINTA. NULIDADE. ARTIGO 93, INCISO IX, DA
CONSTITUIÇÃO FEDERAL. REQUISITOS. ARTS. 254 E 255 DO CPPM.
DENÚNCIA NÃO OFERECIDA. EXCESSO DE PRAZO.
CONSTRANGIMENTO ILEGAL. RELAXAMENTO. HABEAS CORPUS
CONCEDIDO. UNANIMIDADE. O caráter extraordinário de que se reveste a
custódia preventiva exige, para a sua efetivação, a necessária fundamentação, a
qual deve apoiar-se em elementos concretos e ajustados aos pressupostos abstratos
definidos pelos arts. 254 e 255 do CPPM, sob pena de violação do Princípio da
Presunção de Inocência, haja vista que a segregação cautelar presume pena não
personificada. O artigo 93, inciso IX, da Constituição Federal, exige que a decisão
prolatada pelo Magistrado seja fundamentada, ainda que sucintamente, sem
determinar, contudo, o exame aprofundado da matéria submetida a exame, não
sendo possível declarar a nulidade de uma decisão com fundamentação concisa,
mas sim aquela que carece da devida motivação.

AUSÊNCIA DOS REQUISITOS DO ART. 312 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL


– PEDIDO SUBSIDIÁRIO DE REVOGAÇÃO DA PRISÃO PREVENTIVA

Caso esta Egrégia Corte entenda pela legalidade da prisão preventiva, indeferindo o
pedido do seu relaxamento, o paciente pleiteia, subsidiariamente, pela REVOGAÇÃO da
prisão preventiva e ele imposta, eis que ausentes os requisitos do art. 312 do CPP.
Em nosso ordenamento jurídico o Código de Processo Penal dispõe sobre a prisão
preventiva apenas para os casos em que, além da presença de justa causa, exista a
indispensabilidade de se assegurar, através da medida cautelar, a ordem pública conforme
entendeu a autoridade coatora.
Assim, no que toca a prisão preventiva, tem-se que esta somente pode ser decretada
como garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução

1 Art. 5º, inciso LXV da CF: “a prisão ilegal será imediatamente relaxada pela autoridade judiciária”.
criminal ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do
crime e indício suficiente de autoria (art. 312 do CPP).
Todavia, conforme mencionado, observa-se que não restaram demonstrados os
requisitos para a decretação da referida prisão pré processual. Eis que, conforme se comprova
nos documentos em anexo, o acusado é primário e de bons antecedentes, isto é, jamais foi
condenado criminalmente por quaisquer crimes, possui residência fixa e ocupação lícita.
Além disso, deve-se mencionar que a fundamentação da autoridade judiciária
competente para a decretação da prisão preventiva foi inválida, eis que baseou a ameaça a
ordem pública no fato do acusado responder a processo criminal em andamento.
Todavia, o acusado não é reincidente, pois, em que pese responder a processos
criminais, estes estão curso, ou seja, não há decisão transitada em julgado. De fato, a
reincidência pressupõe uma sentença condenatória transitada em julgado por prática de
crime. Há reincidência somente quando o novo crime é cometido após a sentença
condenatória de que não cabe mais recurso” (JESUS, Damásio de. Direito Penal – Parte
Geral. 34. ed. São Paulo: Saraiva, 2013. v. 1. p. 611).
Nesse sentido, a manutenção da prisão preventiva afronta o direito à liberdade e o
princípio da presunção de inocência (art. 5º, inciso LVII da Constituição Federal).
Assim, conforme demonstrado, a decretação da prisão preventiva deve ser
devidamente revogada, devendo o requerente ser posto imediatamente em liberdade, uma vez
que se encontra recolhido sem necessidade, visto que não restaram preenchidos os requisitos
constantes do art. 312 do CPP.
É assim que determina a CF em seu art. 5º, inciso LXVI, ao preceituar que “ninguém
será levado à prisão ou nela mantido, quando a lei admitir a liberdade provisória, com ou sem
fiança” e o art. 316 do CPP ao determinar que “o juiz poderá revogar a prisão preventiva se,
no correr do processo, verificar a falta de motivo para que subsista, bem como de novo
decretá-la, se sobrevierem razões que a justifiquem”.

APLICAÇÃO DE MEDIDA CAUTELAR DIVERSA DA PRISÃO

Como se percebe a ausência dos elementos que autorizam a medida constritiva de


liberdade do impetrante, a preservação de sua prisão, instaura evidente constrangimento
ilegal.
A defesa não tem a intenção através deste pedido entrar no mérito da causa, somente
pretende-se evitar que o paciente pague através da segregação cautelar uma censura muito
mais grave do que o provimento jurisdicional final.
Até porque, o delito em tese cometido pelo acusado possui pena de reclusão de 1 a
4 anos, e, tendo em vista as circunstâncias em voga, dificilmente será proferida sentença
condenando-o acima do mínimo legal, o que possibilita a substituição da pena privativa por
restritiva de direitos. Assim, é no mínimo contraditório que o acusado venha a cumprir pena
privativa de liberdade na fase pré processual e assim não o faça depois da sentença.
O Excelso Supremo Tribunal Federal entende que a prisão preventiva é exceção e
que só poderá ser decretada se for demonstrado que as medidas cautelares não se mostram
adequadas no caso:

Agravo regimental. Prisão preventiva. Pretendida decretação pelo encontro, em


poder do investigado, de um documento falso, e pelo fato de ter ele mantido
contatos com promotor de justiça, a fim de, supostamente, interferir em
investigação criminal federal. Desnecessidade. Documento sem potencial para
prejudicar as investigações em curso. Hipótese, ademais, em que as medidas
cautelares diversas da prisão, previstas nos arts. 319, II a V, e 320, ambos do
Código de Processo Penal, se mostram suficientes para obviar o periculum
libertatis. Pretendida decretação da custódia provisória por suposto
descumprimento de medidas cautelares. Inadmissibilidade. Hipótese em que não
houve descumprimento injustificado de medida imposta nem situação de fuga.
Recurso não provido. 1. A prisão preventiva é a ultima ratio, a derradeira medida
a que se deve recorrer, e somente poderá ser imposta se as outras medidas
cautelares dela diversas não se mostrarem adequadas ou suficientes para a
contenção do periculum libertatis (art. 282, § 6º, CPP). 2. Na espécie, as medidas
cautelares diversas da prisão previstas nos arts. 319, II a V; e 320, ambos do Código
de Processo Penal, se mostram suficientes para obviar o periculum libertatis. 3. O
encontro, em poder do investigado, de documento falso, sem potencial algum para
prejudicar as investigações em curso, não autoriza a decretação de sua prisão
preventiva. 4. Se a medida cautelar de proibição de manter contato com pessoa
determinada se mostra adequada e suficiente para eliminar a situação de risco
gerada pelo estado de liberdade do imputado, a prisão preventiva, para evitar que
esses contatos prejudiquem a investigação, se mostra desproporcional. 5. Uma vez
não demonstrada a intenção de fuga do agente nem o descumprimento injustificado
das medidas cautelares de recolhimento domiciliar noturno e de proibição de se
ausentar da comarca em que reside, descabem sua revogação e a consequente
decretação da prisão preventiva. 6. Agravo regimental não provido”. (Inq 3842
AgRsegundo-AgR, Relator(a): Min. DIAS TOFFOLI, Primeira Turma, julgado em
07/10/2014, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-022 DIVULG 02-02-2015 PUBLIC
03- 02-2015 REPUBLICAÇÃO: DJe-051 DIVULG 16-03-2015 PUBLIC 17-03-
2015)

Dessa maneira também entende Eugênio Pacelli de Oliveira:


Com efeito, a prisão cautelar é utilizada, e somente aí se legitima, como instrumento
de garantia da eficácia da persecução penal, diante de situações de risco real
devidamente previstas em lei. Se a sua aplicação pudesse trazer consequências mais
graves que o provimento final buscado na ação penal, ela perderia a sua justificação,
passando a desempenhar função exclusivamente punitiva. A proporcionalidade da
prisão cautelar é, portanto, a medida de sua legitimação, a sua ratio essendi.
(OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de. Curso de Processo Penal, 13ª ed., rev. e atual., Rio
de Janeiro: Lumen Juris, 2010, p. 505).
Assim, alternativamente, no presente caso, as medidas cautelares do artigo 319 do
Código de Processo Penal se mostram absolutamente eficazes e adequadas, inexistindo
qualquer razão para a constrição cautelar da liberdade do requerente.
Mesmo porque, como se sabe, o novo sistema de medidas cautelares pessoais
apresenta a característica de preferibilidade em relação à prisão preventiva, ou seja, o
magistrado deve sempre privilegiar os meios que sejam menos gravosos e invasivos dos
direitos fundamentais dos cidadãos, e que também garantam a segurança da ação penal.
No tocante a exposição das circunstâncias do fato e das condições pessoais do
acusado, se Vossas Excelências não entenderem em revogar a prisão preventiva decretada,
oportunamente, ao menos, substituam a prisão preventiva por uma das medidas cautelares
dos artigos 282 e 319 do CPP, com a redação dada pela Lei n°. 12.403/2011.

PEDIDO

De acordo com todo o exposto sobre o caso concreto, e com toda documentação que
comprova os fatos alegados em favor do Paciente, requer:

1) que o pedido de MEDIDA LIMINAR seja deferido, com a expedição de alvará


de soltura, para que, dessa forma o Paciente possa responder ao processo em liberdade,
considerando-se que os requisitos para autorização de tal medida estão claramente presentes:
- pois diante da privação de liberdade do Paciente, o periculum in mora é notório,
considerando que estejam presentes as razões de cautela previstos no ordenamento jurídico
brasileiro, assim provoca lesões à dignidade humana do preso, e também de toda sua família,
causando, assim, prejuízo de difícil reparação aos familiares e ao preso.
-e no que se refere ao fumus boni juris, na observância à leitura de toda argumentação jurídica
presente nesta peça, observada a documentação comprobatória necessária juntada neste
pedido, é compatível para a comprovação de que não existem motivos para que se exija do
paciente a manutenção de sua prisão preventiva considerando dessa maneira a falta das razões
de tal medida cautelar
2) Que a Ordem de Habeas Corpus seja deferida, validando-se o pedido de liminar,
e dessa forma, o RELAXAMENTO da prisão preventiva, tendo em vista a ilegalidade e abuso
de autoridade na sua decretação;
3) subsidiariamente, na hipótese do não acolhimento do relaxamento da prisão
estipulada pela autoridade coatora, que a seja deferida a REVOGAÇÃO da prisão preventiva
pela ausência de justa causa, nos termos do art. 648, I, do Código de Processo Penal, para
que a Paciente possa, conforme determina a Lei aplicada ao caso concreto, responder ao
Processo em liberdade; e
3) alternativamente, se esta não for a percepção de Vossas Excelências, solicita-se
que, pelo menos, em conformidade com o art. 282 do CPP, a observância de medida cautelar
diversa da prisão, prevista no artigo 319 do CPP, com a redação dada pela Lei n°.
12.403/2011.

Nestes termos, pede juntada e deferimento.

De Governador Valadares para Belo Horizonte, 23 de março de 2019.

Victor Ceccato Penha


OAB/MG

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