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O Paradoxo do Comediante: Leitura Direcionada,


Diderot/Copeau

Research · October 2016


DOI: 10.13140/RG.2.2.18620.44164

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1 author:

Harry Edmar Schulz


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O Paradoxo do Comediante: Leitura Direcionada Diderot/Copeau, Harry Edmar Schulz

“O Paradoxo do Comediante”
Leitura Direcionada
Considerando
Denis Diderot e Jacques Copeau

Harry Edmar Schulz

Julho de 2014

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São Carlos, 2014.
Projeto:Humanização como ferramenta de aumento de interesse nas exatas
O Paradoxo do Comediante: Leitura Direcionada Diderot/Copeau, Harry Edmar Schulz

Prefácio:
O que é apresentado para leitura neste texto é
uma discussão em torno do teatro, mais especificamente em
torno das idéias de Diderot e de Copeau acerca da
sensibilidade, como característica do ator, para representar
peças teatrais. Em que medida isto pode ser útil na busca de
ferramentas didáticas para o projeto “Humanização com
ferramenta de aumento de interesse nas exatas”, que é o
motivo da elaboração desses pré-textos? O tema em si, da
sensibilidade, não é aquilo que levou à inclusão deste texto
no referido projeto, mas a forma como o tema é conduzido,
principalmente por Copeau.
Entende-se que atuar no contexto de uma
profissão exige profissionalismo. Nesse aspecto, Diderot e
Copeau concordam, embora usem diferentes formas de se
expressar e se voltem exclusivamente à profissão de ator. A
maneira como Diderot busca exemplos que permitem a
“visualização” desse profissionalismo (o episódio de
Garrick) e a forma como Copeau mostra que o exemplo é
tomado em uma situação de exceção (uma máscara)
coincide com procedimentos na área de exatas. Exemplos
fora de contexto podem ser utilizados, conferindo uma falsa
impressão de solução para os alunos, apesar de se obter
soluções com eles. Não se pretende aqui avançar em uma
discussão temática para a área quantitativa, mas pode-se
também exemplificar, de maneira a mostrar como o tema
induz a pensar quantitativamente: “no estudo das alturas
conjugadas em ressaltos hidráulicos utiliza-se generalizada-
mente a solução que despreza a força dissipativa de fundo.
Daí se dimensionam grandes estruturas de dissipação de
energia justamente utilizando essas alturas conjugadas. Há,
evidentemente, um paradoxo quantitativo aqui: como se
utiliza, num contexto claramente dissipativo, uma solução
não dissipativa? Garrick, tomado “sem sensibilidade”, se
identifica com a solução “sem dissipação”, que todos
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São Carlos, 2014.
Projeto:Humanização como ferramenta de aumento de interesse nas exatas
O Paradoxo do Comediante: Leitura Direcionada Diderot/Copeau, Harry Edmar Schulz

aceitam. Mas ela é uma máscara para o que há de fato. “Há


dissipação”, controlada pelos princípios já usados, assim
como, conforme mostra Copeau, “há sensibilidade”,
controlada ou liberada pelo profissionalismo (pelo domínio
da técnica).
Observar como se constroem os argumentos
que fazem com que as discussões sejam elaboradas em
torno do tema principal é relevante para as áreas exatas do
conhecimento. Assim, o presente texto, inicialmente
distante de um “viés exato”, passa a ser interessante para o
projeto na medida em que posições distintas em torno de
um tema são justificadas e, com isso, geram interesse pelo
tema. Pretende-se fazer alunos de exatas se interessarem
pelo tema específico de seus estudos.
O presente texto pode ser visto como uma
segunda análise vinculada ao teatro (ver Schulz, 2014),
localizando situações e argumentos que podem ser de
interesse para o projeto original. Sempre se menciona que
eventuais conclusões são extraídas no contexto desse
projeto, podendo não ter aplicabilidade geral. Mas, se uma
aplicabilidade mais ampla puder ser extraída delas, passa a
ser um ganho bem-vindo.

Harry Edmar Schulz


São Carlos, 5 de Julho de 2014
Projeto: Humanização como ferramenta de
de aumento de interesse nas exatas

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São Carlos, 2014.
Projeto:Humanização como ferramenta de aumento de interesse nas exatas
O Paradoxo do Comediante: Leitura Direcionada Diderot/Copeau, Harry Edmar Schulz

Sumário

1 – Introdução:.............................................................(5) .

2 – Estudo propriamente dito:................................... (6) . .

2.1 – Prolegômenos de Diderot:............................... (6) . .

2.2 – Opiniões introdutórias sobre o comediante:..(7) .

2.3 – Si vis me flere. Dolendum est primus ipsi tibi


(?):.........................................................................(8) .

2.4 – O momento histórico do discurso de Diderot:(12)


2.5 – Alguns dos que discursavam:....................... (14) . .

2.6 – A sensibilidade:...............................................(16)
3 – Conclusão:........................................................... (21) .
.

4 – Referências Bibliográficas:................................. (23) .

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São Carlos, 2014.
Projeto:Humanização como ferramenta de aumento de interesse nas exatas
O Paradoxo do Comediante: Leitura Direcionada Diderot/Copeau, Harry Edmar Schulz

O Paradoxo do Comediante
Leitura Direcionada considerando
Denis Diderot e Jacques Copeau
_________________________________________

Diálogo Motivador (ver o Paradoxo do Comediante):

- Nenhuma sensibilidade?

- Nenhuma. Não coordenei ainda bem minhas razões, e me


permitireis vo-las expor como elas me vierem, na desordem da
própria ordem de vosso amigo.

____________________________________________________

1 - Introdução:
A presente leitura transita pelo Paradoxo do
Comediante, captando aqui e ali as observações de outros leitores
(autores ou comentadores) e se atendo mais especificamente à
abordagem do próprio Diderot e à interpretação de Copeau. Não
se trata, entretanto, de uma leitura geral, mas condicionada ao
pretexto para a discussão entre os personagens utilizados por
Diderot, no tocante à sensibilidade.

O texto utilizado para a leitura é, principalmente, a


tradução de Guinsburg, conforme aparece na coleção “Os
Pensadores” de 1979, a partir da página 352.

O tema decorre de uma proposta de leitura feita na


disciplina de Estética 1, na Universidade Federal de São Carlos,
no curso de Filosofia.

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São Carlos, 2014.
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O Paradoxo do Comediante: Leitura Direcionada Diderot/Copeau, Harry Edmar Schulz

Não se trata de uma primeira leitura de Diderot, mas


é uma leitura direcionada, o que a distingue, por exemplo, do
texto de Schulz (2014), no qual todo o conjunto lido foi
considerado para o entendimento da proposição do autor
(naquele caso, a conclusão pela necessidade de estudo para
autores e críticos).

2 - Estudo propriamente dito:


2.1 - Prolegômenos de Diderot:
Como mencionado na introdução, o tema
imediatamente mais evidente é a sensibilidade, que aparece na
primeira exclamação do texto motivador: “Nenhuma
sensibilidade!” Segundo o tradutor, Guinsburg (1979), o
Paradoxo do Comediante é tido por comentadores de Diderot
como um caso particular de uma teria geral da sensibilidade. E
talvez aqui já se faça necessário direcionar um pouco o tema para
a conceituação de sensibilidade que talvez mais se aproxime,
neste início de texto, àquilo a que Diderot se referia. Para tanto
lança-se mão do auxílio de Abagnano (2007) nesta primeira
delimitação. Segundo Abagnano (2007) a sensibilidade pode ser
1) Toda a esfera das operações sensíveis do homem, que abrange
tanto o conhecimento sensível quanto os apetites, os instintos e
as emoções; 2) Capacidade de receber sensações e de reagir a
estímulos. Por exemplo, “a sensibilidade dos vegetais”; 3)
Capacidade de julgamento ou avaliação em determinado campo.
Por exemplo, “sensibilidade moral”, “sensibilidade artística”,
etc.; 4) Capacidade de compartilhar as emoções alheias ou de
simpatizar. Nessa acepção, diz-se que é sensível quem se comove
com os outros, e insensível quem se mantém indiferente às
emoções alheias.

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O Paradoxo do Comediante: Leitura Direcionada Diderot/Copeau, Harry Edmar Schulz

Para o presente estudo, a definição de número 4 é


aquela que mais se aproxima da primeira discussão dos
personagens do Paradoxo do Comediante.

A exclamação feita: “Nenhuma sensibilidade!”


ocorre bastante próxima do início do texto, na quinta página da
tradução lida, após Diderot ter introduzido o texto em meio a um
diálogo em que o primeiro interlocutor pretende se esquivar do
julgamento de uma obra teatral de um amigo do segundo
interlocutor. No contexto da discussão são mencionadas a
possibilidade de fracasso, de sucesso, a admiração da mulher
amada, e, ao final, o primeiro interlocutor manifesta então a sua
opinião. Esta é negativa e o primeiro interlocutor conclui que o
comediante imitador pode até representar a peça de maneira
aceitável, mas sem méritos. Uma repreensão a este possível
comediante é feita, iniciando-se então propriamente o tema em
volta do ator.

2.2 - Opiniões introdutórias sobre o comediante


O primeiro interlocutor, que apresenta suas ideias,
diz que o comediante tem uma natureza inconstante, alternando
momentos bons e ruins, mas que há dificuldades para formar um
bom comediante, uma vez que mesmo as frases de um texto a ser
apresentado não são exatas naquilo que querem transmitir,
considerando as limitações da palavra escrita.

Sobre o texto que supostamente ambos


interlocutores leram, o primeiro interlocutor opina que
comediantes com diferentes culturas, como a inglesa e a
francesa, irão aprová-lo, apesar dos enganos que o autor
cometeu. O segundo interlocutor, nessa altura do texto, lembra os
personagens menores dos diálogos de Platão, que apenas

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aquiescem às argumentações de Sócrates ou de outros


personagens maiores. Ou seja, a sua função, no diálogo que se
apresenta, é direcionar o leitor a aceitar a argumentação do
primeiro interlocutor.

Chega-se, então, à questão da sensibilidade. Entre as


qualidades mais importantes de um comediante, o primeiro
interlocutor coloca “um espectador frio e tranquilo”, “penetração
e nenhuma sensibilidade”, “a arte de tudo imitar”, “igual aptidão
para toda espécie de caracteres”. É então que o segundo
interlocutor frisa para o leitor o cerne desta passagem. Ou,
lembrando aqui que se trata de fato de um ser inexistente cuja
possibilidade de “vida” apenas foi dada efemeramente pela pena
de Diderot, este se utiliza desse interlocutor para parar o texto e
pontuar a palavra:

- Nenhuma sensibilidade!

2.3 - Si vis me flere. Dolendum est primum


ipsi tibi,... (Horácio)
Se você quiser me fazer chorar, você tem que sofrer em
primeiro lugar(?)

A palavra incomoda o leitor. Diderot atinge o seu


intento de inserir uma figura de dúvida nessa possibilidade
estranha: um ator não pode ter sensibilidade? Sendo um mestre
na arte de escrever, Diderot prepara seu próprio palco para o que
vai ser uma longa digressão acerca de suas ideias. E ele o faz
criando um cenário que, de antemão, não existe, que é o texto
que ambos os interlocutores leram. A resposta ainda me
impressiona pela ausência de informação e pela força de
imposição do cenário. O primeiro interlocutor diz:

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- Nenhuma. Não coordenei ainda bem minhas


razões, e me permitireis vo-las expor como elas me vierem, na
desordem da própria obra de vosso amigo.

Ou seja, Diderot se permite, no diálogo que cria, a


liberdade de criação futura. Diderot, nessa altura, sabe o que quer
dizer, mas não sabe como. Esta é uma dúvida comum ao escritor.
Os interlocutores, ou os personagens de seu diálogo, não são de
fato importantes, mas sim as ideias que Diderot quer transmitir.
Com esta frase sem compromisso, mas que lança sobre o leitor o
cenário no qual seu diálogo vai transitar, Diderot se permite
escrever sem ser necessário retornar e modificar posições de
personagens, ou mesmo de ordens pré-existentes.

O leitor é informado de que há uma obra na base


dessa argumentação, mas uma obra falha (que nunca existiu, que
não é apresentada ao leitor, cujo tema fica de fato obscuro).
Assim, para Diderot, como escritor, se houver necessidade, ao
longo dos argumentos, de alterar ou reforçar uma opinião, isso
ocorrerá em um cenário que de antemão aceita tal alteração, por
ser maleável (Diderot pode revela-lo enquanto escreve). É um
bom artifício. É legítimo para o escritor que procura direcionar
seus próprios conceitos. Guinsburg (1979) cita Verniére,
comentador de Diderot, informando que a obra teve várias
versões e foi apenas publicada postumamente, em 1830. Talvez
Diderot tenha, enfim, retornado e modificado algo, mas esse fato
apenas ratifica o que foi expresso antes: Diderot sabia o que
queria dizer, mas enquanto compunha o texto, não sabia como.

O uso do diálogo por parte de Diderot, utilizando


também a aquiescência dos interlocutores menores frente aos
argumentos dos maiores, pode ser decorrente de sua admiração
por Platão. Como dito por Andrade e Murakami (2002), “Platão
foi para Diderot um mestre insuperável, o que era pouco comum
em pleno século XVIII francês, em que Voltaire era tido por

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São Carlos, 2014.
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modelo absoluto. Mas, de certa forma contra esta corrente das


luzes, Diderot posicionou-se ao lado de Rousseau, não recusou o
pensamento platônico. Fascinado pela tríade platônica, do Bem,
do Verdadeiro e do Belo, Diderot apresentava-se como espécie
de filósofo - em busca de um possível vínculo entre filosofia e
arte, tentando assimilar Platão à filosofia moderna”.

Verificado que Diderot, a partir desse momento,


expõe as suas ideias de maneira livre, resta verificar o conteúdo e
a mensagem de cada ideia que desliza sobre o papel.

Diderot então descreve o que pensa de um


comediante sensível, que representa com alma. E o que desponta
é a inconstância em suas apresentações (do comediante),
havendo vigor na primeira e frieza na terceira. Nesse caso, um
imitador atento passa a ser mais adequado ao “papel de ator”.
Diderot também usa os termos “discípulo ponderado da
natureza”, “copista rigoroso de si próprio ou de seus estudos” e
“observador contínuo de nossas sensações”. Os adjetivos e as
ações nesse sentido se sucedem: “representar com reflexão”,
“com estudo da natureza humana”, “com imitação constante
segundo algum modelo ideal” “com imaginação”, “com
memória”, onde “tudo foi medido”, “combinado”, “apreendido”,
“ordenado em sua cabeça”.

O ator, considerando esse conjunto de adjetivos,


deve ser um estudioso da natureza humana e um imitador
racional (no sentido contrário a emotivo). Talvez a atualidade do
ano 2014 (a marca do tempo provavelmente vai tornar esse
pequeno texto imediatamente ultrapassado, mas ainda assim
sinto-me induzido a colocá-la) veja essa postura com
naturalidade. Afinal, as escolas de arte que se voltam ao teatro
procuram formar “profissionais”, isto é, indivíduos que devem
poder mimetizar racionalmente situações e emoções de
personagens a eles apresentados como objeto de trabalho. Nesse

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caso, se o personagem for um assassino, a representação deve ser


convincente, mas não se espera que o ator se transforme em um
psicopata de fato toda vez que subir ao palco e assassine os
coadjuvantes. É natural! Da mesma forma, sem dúvida uma atriz
que tenha como objeto de trabalho uma personagem depressiva
que se suicida na peça não incorporará as emoções da
personagem para que de fato se suicide. Seria uma apresentação
de uma única noite! O profissionalismo atual é uma condição de
sobrevivência do ator. Sim: carrasco e decapitado tomam café
juntos nos bastidores após toda a cena sangrenta em que a cabeça
de Danton rola no cesto da guilhotina e espectadores desmaiam
na plateia. E talvez ambos falem dos problemas de escola de seus
filhos, como:
- Minha filha fala que os ditados de Francês são
terríveis, porque não há como saber escrever o “ô” ditado em
“Peugeot” ou em “Bordeaux”.
- Pois é! Pra minha surpresa, meu filho prefere
estudar Alemão. Ele diz que é uma língua mais objetiva.
O que acabamos de fazer foi criar uma cena em que
o cotidiano do ator não se mistura ao personagem. Pouco importa
que a França esteja entrando na fase do terror de estado. Pouco
importa todo o sangue que ainda escoará nas sarjetas de Paris.
Isto é apenas parte de um estudo, de um ideal de terror
construído na mente de cada ator que, profissionalmente,
cataloga informações e as memoriza para que seus gestos,
entonações e expressões faciais mostrem em frações de segundo
uma realidade que o espectador deve viver intensamente: mas
apenas o espectador (aqui estamos enfatizando a posição de
Diderot). O ator é o homem racional que está sob o véu
impermeável do personagem e efetua os movimentos deste como
uma marionete. A leitura do texto de Diderot induz a pensar que
ele apontava precisamente nesta direção (com a ressalva de que
sua França ainda estava a salvo das passagens que brevemente
descrevemos). Em suma, o que Diderot nomeia de “nenhuma
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sensibilidade!” talvez hoje denominemos de “profissionalismo”


para o ator.

2.4 - O momento histórico do discurso de


Diderot:
Franklin de Matos (1988) descreve, em seus textos,
alguns momentos que permitem talvez entender as influências
externas no que desponta como “idas e vindas” das afirmações de
Diderot, o que gera a impressão de contradição em seus textos.
Nesse caso, trata-se de decifrar essas “voltas”, discutidas por
seus comentadores. Diz Franklin de Matos (1988): “...o
confronto... não se trava entre as surdas paredes da Academia. O
século XVIII, como se sabe, marca um desses momentos
privilegiados na história da filosofia, em que a disputa filosófica
retoma seu estatuto de coisa pública... Os destinos da filosofia - e
a felicidade dos homens – se jogam nos salões, nos cafés (onde
às vezes se esgueira, incógnito, o informante da polícia), nas
salas de espetáculo, nas complexas e delicadas relações entre o
autor, o livreiro e o censor.”

Ainda que as palavras sugiram uma ação de


“espionagem” sobre a opinião escrita, esse fato, na realidade do
século XXI, não induz sustos muito grandes aos habitantes da
maior parte do planeta. Para entender melhor o momento
histórico da França de 260 anos atrás, vale a pena seguir um
pouco mais na leitura de Franklin de Matos (1988): “...ao
escrever um livro... Pensamentos Filosóficos... o filósofo corre o
risco de ver a obra condenada pelo Parlamento de Paris e, em
seguida, mandada à fogueira. ... (A)o escrever... sobre os cegos...
o filósofo pode ser acusado de impiedade e ateísmo e, por isso,
enviado à Bastilha ou Vicennes. ... suas alternativas não são
muitas... morrer pela filosofia... Ou então, pode se desdizer para
persistir, para organizar, por exemplo, um Dicionário que... lhe

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permita continuar falando dos assuntos proibidos... Mas o


privilégio de impressão... pode ser revogado... seguindo-se a isto
a condenação papal.”

Sem dúvida a descrição se tornou mais incisiva. O


Parlamento manda queimar as obras; as acusações possíveis são
medievais e incultas: “impiedade e ateísmo”, conceitos nascidos
na mesma Europa que Diderot vê se transformar. A condenação
papal é apenas o supra-sumo de uma situação esdrúxula,
primitiva, para suprimir a vontade de pensar, que pode derrubar a
instituição que reina como representante de um reino idealizado
que tudo pode. Nesse caso, é preciso cuidado.

O modo europeu é tão primitivo que o contato com


o Novo Mundo lhe impôs mudanças, mesmo este tendo sido
invadido e aniquilado com uma violência jamais vista e jamais
repetida. Lembremos que faziam apenas 250 anos que os novos
alimentos, os produtos da terra, os minerais e os metais do Novo
Mundo estavam adentrando na velha Europa e possibilitando e
financiando sua revolução econômica e de costumes. Um
exemplo extremamente simples dessa revolução é o tabaco,
assim denominado na língua dos Tainos, que em 1561 foi
enviado à França por Jean Nicot (de onde vem o termo
“nicotina”) devido ao auxílio contra enxaquecas, mas que passou
a ser ostentado nas cortes, expondo gloriosas plumas de fumaça
sobre seus usuários (ver, por exemplo, o verbete tabaco em
http://pt.wikipedia.org/wiki/Tabaco). Diderot viveu a França de
Luis XV (após mim, o dilúvio! – que, diga-se de passagem,
veio!), uma sociedade não exatamente higiênica, por
recomendações médicas e religiosas (!). Também estava
coagulada de “velhas famílias nobres” e de “novos ricos”, mas
em uma realidade pós-feudal, ainda repleta da violência e da
ignorância que caracterizaram a Europa nos séculos anteriores à
invasão do Novo Mundo. Trata-se aqui apenas de continuar a
ambientação iniciada por Franklin de Matos (1988), para que se

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possa avaliar em que tipo de sociedade o indivíduo Diderot


manifestava suas opiniões.

Acerca do movimento de Diderot através de sua


sociedade, Franklin de Matos (1988) continua: “As
considerações acima lembram o óbvio: as fronteiras entre a
filosofia e a política são muito tênues no século XVIII. ... (O)
itinerário de Diderot como filósofo é indesligável da trajetória
“política”... A evocação basta para prevenir o estudioso de que a
‘unidade’ de sua obra não é da ordem da filosofia sistemática e,
por isso, não cabe denunciar suas contradições...”

Enfim, os comentadores de Diderot apontam


contradições, que não nos cabem discutir. Toda essa ambientação
visa, no contexto do discurso do paradoxo do comediante,
mostrar que a época de Diderot é “menos profissional” do que
uma leitura não ambientada permite supor. Segue daí a conclusão
pela validade desse discurso, precisamente naquele tempo.

2.5 - Alguns dos que discursavam:


Silva (2013) está entre os autores que apresentam
seus argumentos na análise da obra de Diderot também o
ambientando em seu tempo, e, em adição, mostrando a opinião
daqueles que transitavam pelo mesmo ambiente. Silva (2013)
cita Rousseau, uma das personalidades da época. Nas palavras da
autora: “Jean-Jacques Rousseau é conhecido pelo seu método
filosófico dicotômico, ou paradoxal ... essa dualidade se
evidencia como um jogo de oposição entre uma sociedade
corrompida pelos espetáculos teatrais (e outras formas de
representação), versus uma sociedade livre dos efeitos
corruptores da cena teatral...”

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Observa-se, portanto, na pessoa de Rousseau,


alguém que possuía restrições pelo menos a alguma forma do
teatro. Continuando com a leitura de Silva, tem-se: “... nessa
última (cena teatral, inserção nossa), o único espetáculo possível,
segundo esse filósofo, é aquele em que o próprio espectador é o
espetáculo, ou seja: as festas populares.”

A opinião descrita, em primeira leitura, não parece


embasável em argumentos atualmente plausíveis. Mas a
discussão foi intensa, apresentando lances interessantes, como a
carta a D’Alambert, em que Rousseau critica um verbete acerca
de teatro preparado para o projeto da enciclopédia por
D’Alambert. O autor do verbete defendia a opinião de inaugurar
uma companhia de comediantes em Genebra. Mas Rousseau
critica severamente esta postura e demonstra o seu desprezo ao
teatro francês daquele século. Por outro lado, apoia os
espetáculos cívicos.

No tocante ao comediante, Falletti (2011) também


retorna ao clima de discussão da época, mencionando que: “Há
uma tradição muito longa, a partir do Humanismo e da
Renascença, de comentadores para os quais essa frase (Se você
quiser me fazer chorar, você tem que sofrer em primeiro lugar(?),
inserção nossa), extraída de seu contexto original, soava como
uma recomendação para os atores de teatro... nos séculos XVII e
XVIII, nos debates filosóficos sobre as teorias das emoções e os
atores, a frase de Horácio era muitas vezes repetida para definir a
posição daqueles que pensavam que os atores deveriam
identificar-se com os estados mentais dos personagens que
representavam – uma batalha histórica jamais concluída entre os
defensores da técnica e os defensores da inspiração nas teorias do
ator.”

Falletti (2011) menciona a descrição que Diderot faz


de David Garrick, cujo “virtuosismo serve como prova de que o

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ator não sente verdadeiramente aquilo que mostra, mas domina


suas paixões e com lucidez e inteligência é capaz de compor e
tornar a sangue frio a gama dos sentimentos que exprime.”

Com o comentário de Garrick retorna-se à


concepção de Diderot para o comediante, que remete à idéia de
“profissionalismo” do ator. O que se observa, a partir do exemplo
da valorização de espetáculos cívicos, de festas populares, que
dificilmente haveria, para a atividade do comediante, um status
de “profissão” (de onde deriva o termo que aqui usamos). Mas o
comentário acerca de Garrick, como usualmente é interpretado,
também remete a uma segunda leitura acerca da insensibilidade
proposta por Diderot, leitura para a qual usamos um texto de
Jacques Copeau (reprint 1999).

2.6 - A sensibilidade:
O estudo preliminar de Jacques Copeau lido na
versão espanhola do paradoxo sobre o comediante de 1999 serve
aqui como uma boa base para mostrar o “incômodo” gerado pela
expressão ousada de Diderot. Diz Copeau:

“Diderot aceita o artista de teatro. Ele o conhece. A


maioria das observações que faz a seu respeito são justas... Exige
muita “racionalidade” do ator. A este respeito concordamos de
bom grado com ele, contrariamente àqueles que querem rebaixar
nosso ofício, considerando-o incompatível com as altas funções
do espírito” (tradução nossa).

Percebemos que, com as palavras “nosso ofício”,


estamos diante da opinião de um ator. Nesse caso, deve ser
considerado saudável que a um ator seja dado o direito de
manifestar sua opinião. Senão estaremos também cometendo o

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erro de Platão no Sofista, que gerou um belo diálogo, mas não


colocou nele um sofista de fato para defender “seu lado”. Como
informação adicional, vale lembrar que Copeau, cuja opinião
fomos buscar, “foi um importante diretor, autor, dramaturgo e
ator do teatro francês. Fundador do importante ‘théatre du
Vieux-Colombier’ em Paris, Copeau torna-se crítico de teatro de
vários jornais franceses, participando da criação da importante
revista ‘la Nouvelle Revue Française’ em 1908 junto com André
Gide e Jean Schlumberger. Funda uma importante escola de
atores junto ao seu teatro onde influencia uma grande geração de
artistas franceses, através de seu treinamento para o ator. Alberto
Camus, outro importante homem de teatro, afirma que há duas
formas de teatro na França no século XX ‘um antes de Copeau e
outro depois de Copeau’”(ver, por exemplo,
http://pt.wikipedia.org/wiki/Jacques_Copeau).

Com a autoridade agora relembrada, de ser este um


marco divisório do teatro francês, continuemos a leitura de
Copeau:

“Nesse homem é necessário um espectador frio e


tranquilo...” Trata-se do grande artista. Isso significa conceder-
lhe uma faculdade que todo artista “de hierarquia” possui: ‘Em
consequência, exijo que possua penetração...”. Sim, mas Diderot
acrescenta: “e nenhuma sensibilidade” (tradução nossa).

Também Copeau frisa esta frase incômoda. Nesse


caso, quem frisa tem uma autoridade razoável para fazê-lo. E
Copeau continua:

“Eis aqui o paradoxo, que distorcerá tudo. Paradoxo


que assumiu a sua forma mais agressiva nas observações sobre
Garrick. Ali lemos que: ‘A falta ade sensibilidade é o que faz
atores sublimes”. Esta frase, ao ser escrita, provavelmente
encheu Diderot de profundo entusiasmo (é como o vento
tempestuoso, que enlouquece o seu espírito!). Mas no momento
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de transcrevê-la no Paradoxo, capta a sua enormidade e a corrige


deste modo “a que prepara os atores sublimes”, frase que não diz
muito mais.

Seria fácil fingirmos que não sabemos o que Diderot


designa com o nome de ‘sensibilidade’. Não é a simples
‘qualidade de sentir’. Todavia, menos ainda é a grande ‘precisão’
que se atribui, em Física, a certos instrumentos, tornando-os
capazes de indicar ‘as mais leves variações’, e que poderíamos
aqui reivindicar como o dom mais requintado do artista”
(tradução nossa).

Copeau sente, portanto, a mesma necessidade que


colocamos no início desse texto, de definir a sensibilidade no
contexto de Diderot. Mas a sua digressão é mais longa,
acrescentando:

“Quando Diderot escreve: ‘Os grandes poetas, os


grandes atores e talvez em geral todos os grande imitadores da
natureza são os seres menos seníveis’, penso que não deseja
rejeitar no artista, ou no ‘contemplador’, outra coisa que não seja
certa ‘suscetibilidade à impressão das coisas morais’,
suscetibilidade que ele mesmo sofria, e essa facilidade para os
‘sentimentos de humanidade, de piedade, de ternura’ que Bossuet
chamava ‘vulgar’ e que nós, desrespeitosamente, denominamos
de ‘sentimentabilidade’... ‘Existe uma espécie de vaga
sensibilidade – disse Duclos – que não é mais que uma
debilidade orgânica’” (tradução nossa).

Interessantemente, a discussão de Copeau inicia pela


descrição do próprio Diderot acerca da “disposição companheira
da debilidade dos órgãos, ...da fragilidade dos nervos,... que nos
leva... a sumirmos em confusão...” Mas com isso de fato Copeau
quer mostrar as contradições de Diderot. E, nesse particular, não
conseguimos acompanhar, de forma breve, a argumentação de

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um ator e autor de tamanha projeção. Comentando a questão da


debilidade, Copeau ironiza:

“Era questão, então, para Diderot, demonstrar que a


‘enfermidade’ por ele recém-descrita não constitui a faculdade
principal do artista ‘de hierarquia’, em particular o grande ator de
teatro? Se nisso reside todo o seu paradoxo, belo paradoxo!...
Mas, em mais de uma ocasião, Diderot contradisse sua própria
tese...” (tradução nossa).

Copeau, crítico, escolhe outro trecho da obra,


citando:

“’...a arte de imitar tudo – disse Diderot -, ou, o que


é o mesmo, uma mesma aptidão para todo tipo de caracteres e
papéis.’ Diderot pretende ver nisso toda a arte do comediante”.

As duas coisas não significam a mesma coisa


(Copeau se refere à arte de imitar e à aptidão para todos os
papéis, inserção nossa). Alguns atores jamais farão outra coisa
que imitar seus personagens. Atuam segundo o modelo. A pura
faculdade de imitação, que está muito difundida, frequentemente
é superficial. Não é aquilo que distingue o temperatmento de um
ator verdadeiro. O velho Salvini, a quem tive oportunidade de
encontrar em Florença pouco antes de sua morte, dizia-me com
certo desdém, ao falar de alguns atores modernos em quem
observava esta flexibilidade excessiva: são máscaras” (tradução
nossa).

Aqui, portanto, estabelece-se um limite para aquela


primeira indicação de “insensibilidade” que foi adotada neste
breve texto. Falou-se em profissionalismo no sentido de não se
abandonar aos sentimentos do personagem. Em termos evidentes,
comentou-se que o personagem assassino não pode levar o ator a
assassinar de fato, nem o personagem suicida pode levar o ator a
se suicidar. Mas Copeau, ator, vai um pouco mais longe no trato

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de sua profissão e diz que Diderot, ao mencionar Garrick, se


enganou, cometeu um mal-entendido. E isto porque, ao descrever
a transformação facial de Garrick, concentrou-se “na máscara”,
porque Garrick nesse momento não estava representando, não
estava encarnando um personagem. Em suma, o que Diderot
descreveu não foi um ator atuando. Assim, o profissionalismo é
algo mais do que apenas estar preparado para mimetizar, ou seja,
de efetuar as caretas que Garrick efetuou.

Adiante, Copeau diz que a ação de “incorporar-se ao


personagem”, ou de “entrar na pele do personagem” é uma
expressão invertida. De fato é o personagem que entra na pele do
ator, é o personagem quem é o possuidor, a quem o ator dá a
liberdade da vida.

Não há de fato, por parte de Copeau, uma crítica


imediata à necessidade da observação, do raciocínio, da técnica.
Mas Copeau dá outro viés à sensibilidade e à técnica, que, talvez,
possa ser entendido nesta passagem:

“O essencial do comediante é entregar-se. Para dar-


se é necessário que primeiramente possua a si mesmo. Nosso
ofício, com a disciplina que pressupõe, ... é trama própria da
nossa arte, junto com a liberdade que esta exige e os
deslumbramentos que encontra. A expressão emotiva decorre da
expressão adequada. Não apenas a técnica não exclui a
sensibilidade, mas a autoriza e a põe em liberdade. É o seu
suporte e guardiã. É graças ao trabalho que podemos abandonar-
nos, porque graças a ele saberemos voltar a encontrar-nos. O
estudo e observância dos princípios, um mecanismo à prova de
falhas, a memória segura, uma dicção obediente, a respiração
regular e os nervos em repouso, a cabeça e o estômago leves,
dão-nos essa garantia que nos inspira a audácia. A regularidade
nas inflexões da voz, nas posições e movimentos, preserva a

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nitidez, clareza, a variedade, a invenção, a igualdade, a


renovação. Permite-nos improvisar” (tradução nossa).

3 - Conclusão:
Diderot buscou mostrar a necessidade da observação
racional e da técnica de mimetização na descrição daquilo que
era importante ao ator. A sua restrição à sensibilidade dizia
respeito, na leitura feita do paradoxo, à representação
excessivamente emotiva e, infere-se, pouco estudada. Um ator
sem o devido estudo do personagem e abandonado à emoção é
aquilo que Diderot pretende evitar. Em quemedida esta
interpretação é fiel à ideia de Diderot é difícil aferir, uma vez que
os próprios comentadores de Diderot nos informam que algumas
contradições despontam em seus escritos. Entretanto, a leitura
“sem interrupção” de seu texto transmite essa primeira
impressão. O que se conclui da posição de Diderot é uma defesa
do que se denomina mais brevemente de “profissionalismo” na
atividade do ator.

O texto de Copeau, que analisou o Paradoxo, mostra


a posição de um ator (de envergadura!) que defende a
necessidade do controle da técnica, que “libera” a sensibilidade.
Copeau, portanto, não descarta a sensibilidade, mas a coloca
como dependente da técnica.

Possivelmente se ambos, Diderot e Copeau,


pudessem se sentar hoje no Café Procope, contemporâneo de
ambos, com vestígios de existir desde o século XVII e situado à
mesma Rue de L’Ancienne Comédie-13 (sob os céus de uma
Paris que deve algo de seu ar a eles), poderiam mostrar que
defendem provavelmente posições análogas, mas com distorções
no uso das palavras para as explanações dos conceitos.

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Mas isso apenas seria possível em uma peça


teatral...

(O fundo do palco descortina o pano preto e


aparece a silhueta da cidade... Dois homens que se supunha
separados por cerca de 150 anos levantam-se da mesa do café,
cumprimentam-se... despedem-se... Suas silhuetas sombreadas
pelo lusco-fusco se afastam... enquanto ao fundo se ouve uma
bandinha francesa tocar um som algo rachado acompanhando
uma voz algo rouca, baixa,... Sous le ciel de Paris jusqu'au soir
vont chanter l'hymne d'un peuple épris de sa vieille Cité... Sim, é
uma cidade velha... mas é Paris, ...de Diderot e de Copeau).

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4 - Referências Bibliográficas:
Abagnano, N. (2007) Dicionário de Filosofia, Trad. Bosi, A. e
Benedetti, I.C., Livraria Martins Fontes Editor, São
Paulo.

Andrade, R.K. e Murakami, M. (2002) O iluminismo de Denis


Diderot: Jacques, o fatalista e seu amo. R. Vernáculo,
n. 6/7.

Copeau, J. (reprint 1999) Estudio Preliminar de Jaques Copeau:


Reflexiones de um comediante sobre “la paradoja” de
Diderot, a La Paradoja del Comediante, Denis Diderot,
Ediciones elaleph.com.

Diderot, D. (~1769, obra póstuma 1830), Paradoxo sobre o


Comediante, Coleção Os Pensadores, Abril Cultural,
Editor Vitor Civita (1979), versão digital, p. 352-426
São Paulo.

Falletti, C. (2011) Si vis me flere. Emoções pelo espelho.


R.bras.est.pres., Porto Alegre, v.1, n.2, p. 286-300,
jul./dez. Disponível em
http://www.seer.ufrgs.br/presenca 288

Guinsburg, J. (1979) Tradução e Notas ao Paradoxo sobre o


Comediante, Coleção Os Pensadores, Abril Cultural,
Editor Vitor Civita, versão digital, p. 352-426.

Franklin de Matos, L.F. (1988) O espetáculo teatral segundo


Diderot, p. 89-117. Disponível em
www.revistas.usp.br/discurso/article/download/37932/4
0659.

Schulz, H.E. (2014) Expandindo Diderot. Projeto: Humanização


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http://pt.scribd.com/doc/230323119/Expandindo-
Diderot.

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Silva, E.S. (2013) Diferenças que se igualam: um olhar sobre o


público de teatro em Rousseau e Diderot. Repertório,
Salvador, n. 20, p.139-142.

Verbetes na Wikipédia:
http://pt.wikipedia.org/wiki/Tabaco)
http://pt.wikipedia.org/wiki/Jacques_Copeau

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Imagem da capa:

Valoriza-se as pessoas de Diderot e de Copeau, com


imagens colocadas de maneira um tanto solta em um palco
que mostra um símbolo relacionado de maneira imediata à
Paris, ou à França. A discussão entre os dois personagens
ocorre com um substancial lapso de tempo entre eles, mas
o tema do “ator em um palco de teatro” é comum a ambos.
A figura apresenta elementos sem se preocupar com sua
justaposição exata, ou sua ordenação precisa, resolvendo,
por exemplo, todos os jogos de luzes. Sem dúvida trata-se
de teatro, e trata-se do mesmo teatro focado pelos dois
autores. Mas há diferenças decorrentes do lapso de tempo
em que os autores se situam na “conversa”. Em sua
discussão, quem “ganhou” foi exatamente este teatro, que
agora existe como instituição respeitada nas sociedades
que se formaram ao longo dos séculos.

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