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10/04/2019 Acidentes de trabalho na construção civil e o Direito Penal | Revista Digital - AECweb

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Acidentes de trabalho na construção civil e o


Direito Penal Articulista
EURO BENTO MACIEL
FILHO
Artigo de Euro Bento Maciel Filho, mestre em Direto Penal pela PUC-SP e sócio do
escritório Euro Filho Advogados Associados

De uns anos para cá, a atividade da construção civil, seguramente, passou por um período de PERFIL
grande evolução. Não bastassem o grande número de edifícios novos e o boom do mercado Euro Bento Maciel Filho é advogado criminalista,
imobiliário, é certo que o próprio Governo Federal tem estimulado o setor, posto que, além das mestre em Direto Penal pela PUC-SP e sócio do
obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), também a Copa do Mundo e os Jogos escritório Euro Filho Advogados Associados

Olímpicos de 2016 podem ser considerados importantes fatores para o incremento daquela
atividade.

Como consequência do grande número de obras de engenharia civil – públicas ou privadas, tanto
faz –, o número de vagas e oportunidades de trabalho também têm tido um aumento considerável.
Todavia, faz-se necessário mencionar que a construção civil é, por excelência, uma atividade
extremamente perigosa.

Com efeito, segundo o último levantamento feito pela Previdência Social (em 2011), a construção
civil é o segundo setor com o maior número de mortes em acidentes do trabalho no País (o
“campeão” é o setor de transporte rodoviário de cargas).

É evidente que essa estatística não é motivo de orgulho. Muito pelo contrário, trata-se de causa de
grande preocupação. Daí, então, é que as autoridades encarregadas de zelar pela segurança no
trabalho têm buscado soluções e formas para diminuir aqueles números.

Nesse sentido, cabe ao Poder Público tornar mais eficiente a fiscalização dos canteiros de obras,
OUTROS ARTIGOS
independentemente do valor das multas a serem aplicadas. Contudo, é evidente que o empresário
do setor também pode ajudar a diminuir nossas tristes estatísticas, sendo certo que, para tanto, STEFAN WAJDOWICZ
basta seguir à risca as normas técnicas a respeito e, ainda, não só fomentar a contratação de Transparência e gestão são
palavras-chave para a construção
engenheiros especializados em segurança do trabalho como também promover a realização de
civil
cursos e palestras sobre o tema aos seus funcionários.

DANIELLA M. THOMAZ
De toda forma, é bom deixar claro que, como regra, um acidente grave — sobretudo quando
Lei do Distrato traz novidades para o
houver uma vítima fatal — ocorrido em um canteiro de obras faz surgir, no mínimo, duas setor imobiliário
consequências jurídicas relevantes:
MARCUS GRANADEIRO
a) a primeira é o comparecimento, no local, de um auditor fiscal do Trabalho (cargo ligado ao Obras públicas e a política de custos
Ministério do Trabalho e Emprego), cuja função, basicamente, é verificar o cumprimento, por parte que derruba pontes
das empresas, da legislação de proteção ao trabalhador. Além de vistoriar a obra, poderá também
o fiscal determinar a paralisação dos trabalhos e, eventualmente, multar a empresa no caso de Ver todos os artigos
descumprimento de alguma norma técnica inerente à legislação de proteção ao trabalhador.

b) a segunda, por sua vez, é a apuração do fato tanto pelo Órgão de Fiscalização do Trabalho,
como também, e principalmente, pela polícia.

No que toca à apuração da polícia, a medida inicial a ser adotada será a instauração de um
inquérito policial. A partir daí, a polícia civil passará a investigar o fato. Ao longo das investigações
serão examinados diversos fatores, tudo para se tentar buscar a dinâmica e as causas do
acidente.

No curso do inquérito policial, as oitivas de funcionários, engenheiros e outras pessoas relevantes


à investigação podem se revelar provas importantes na apuração dos fatos. Entretanto, o laudo
pericial do local, ou seja, o estudo e a análise do sítio dos fatos, de forma a tentar recuperar a
dinâmica dos fatos e entender as razões do ocorrido é, sem dúvida, um dos elementos mais
importantes da investigação.

Contudo, para que a perícia seja eficaz e atinja seus resultados, faz-se necessário que a Polícia
Militar, assim que comunicada após o acidente, compareça à obra e lá permaneça para preservar
a área e assim evitar que possíveis vestígios do fato sejam alterados. Importante mencionar que a
alteração (dolosa) do local dos fatos pode, dependendo da hipótese, caracterizar o crime de fraude
processual, previsto no artigo 347, do Código Penal, cujas penas variam de três meses a dois

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anos de detenção, podendo ser dobradas “se a inovação se destina a produzir efeito em processo
penal”.

Em suma, o que a Polícia Civil busca apurar é se o fato foi culposo, doloso ou se tudo não passou
mesmo de um lamentável acidente, fruto do acaso ou de culpa exclusiva da vítima.
Pois bem, limitando a análise apenas aos casos de acidentes fatais ocorridos em um canteiro de
obras, é certo que, basicamente, dois são os delitos que podem surgir ao final das investigações,
quais sejam: homicídio doloso ou homicídio culposo.

Mas, em casos que tais, quem, ao cabo de contas, seria o responsável sob a ótica do Direito
Penal? Inicialmente, insta ressaltar que a responsabilidade criminal é pessoal e intransferível, ou
seja, não é a “empresa de engenharia” (pessoa jurídica) que responde criminalmente por
eventuais acidentes de trabalho, mas sim seus funcionários e/ou diretores.

Partindo desse princípio, é bom deixar claro que, em casos que tais, a responsabilidade criminal
recai, inicialmente, nos ombros da pessoa diretamente responsável pela segurança de trabalho.
Provavelmente, será ela a primeira a ser convocada pela Autoridade Policial para prestar seus
esclarecimentos.

Tal se justifica porque, salvo raras exceções, os acidentes (fatais ou não) na construção civil
decorrem de algum descuido quanto à observância das regras de segurança do trabalho.
Contudo, é evidente que a responsabilidade penal também pode alcançar tanto o mestre de obras
quanto o engenheiro responsável. Independentemente de quem seja o responsável, é inegável
que, em grande parte dos acidentes fatais ocorridos na construção civil, as causas estão ligadas
ou a alguma falha no projeto ou então à ausência ou ao uso incorreto dos Equipamentos de
Proteção Individual – EPIs.

Na prática, é bom que se diga que as causas mais constantes estão relacionadas, de fato, à falta
ou ao uso inadequado dos EPIs. Com efeito, a prática revela que, por vezes, é o trabalhador que
se recusa a utilizá-lo, apesar de a empresa ter fornecido tudo o que era preciso para um trabalho
seguro. Já em outras oportunidades, é a empresa que não fornece ou, então, fornece EPIs
vencidos, desgastados ou impróprios.

Aliás, no caso específico em que a obra é tocada sem o devido e necessário fornecimento dos
EPIs aos funcionários, vale mencionar que a responsabilização criminal do agente pode ocorrer
mesmo sem qualquer acidente na obra. É que, ao menos em tese, o engenheiro responsável que
assim atua pode vir a praticar o crime previsto no art. 132, do C.P. (expor a vida ou a saúde de
outrem a perigo direto e iminente – Pena: detenção de 3 meses a 1 ano, se o fato não constitui
crime mais grave). Entretanto, se e quando houver um resultado mais grave (lesão ou morte), o
crime do artigo 132 deixará de ser aplicado para que, em seu lugar, surja o chamado “crime de
dano” que, no caso, será ou o homicídio (doloso ou culposo) ou o delito de lesão corporal (doloso
ou culposo).

Vale frisar, por relevante, que, como regra, a responsabilização criminal pelos acidentes fatais
ocorridos na construção civil se dá na modalidade culposa. De fato, nesses casos (acidentes que
resultem em morte), o homicídio seria tipificado como crime culposo (art. 121, § 3º - Pena:
detenção de 01 a 03 anos), e, ainda, seria analisada a aplicação da causa de aumento de pena
prevista na primeira parte do § 4º, do artigo 121, do C.P. (“no homicídio culposo, a pena é
aumentada de 1/3 se o crime resulta de inobservância de regra técnica de profissão, arte ou
ofício...”).

Positivamente, o crime doloso, dentro desse contexto é verdadeira exceção, posto que, como
regra, o responsável direto pela obra, mesmo nas vezes em que não fornece os EPIs, não deseja
que o acidente ocorra e nem, muito menos, que sobrevenha o resultado mais grave (óbito).

Porém, caso surja alguma situação que denote alta probabilidade de dano, vale dizer, algo tão
intenso que permita afirmar que o acidente é quase certo e que, por isso, houve verdadeira
assunção de risco por parte do responsável, a hipótese pode descambar para o dolo eventual (ex:
o engenheiro determina a um funcionário que trabalhe na laje do 20º andar de um prédio em
construção, próximo da beirada, sem o uso do cinto trava-quedas); o que justificaria a punição,
caso reconhecido o crime pelo Júri popular, ou com esteio no caput do artigo 121 (homicídio
doloso, cuja pena é de 06 a 20 anos de reclusão), ou, então, a depender da situação fática, com
base no §2º do artigo 121 (homicídio qualificado, cujas penas variam entre 12 e 30 anos de
reclusão).

Em restando caraterizado o crime, seja ele culposo ou doloso, muito embora a pessoa jurídica não
possa ser responsabilizada na seara penal, certo é que, na esfera trabalhista, a história é bem
diversa. De efeito, havendo provas claras de que a negligência ou descaso do responsável foi uma
das causas do acidente, a empresa ficará sujeita ao pagamento de pesada indenização à família
da vítima. Mas, para que fique bem claro, não é porque um acidente fatal ocorreu no canteiro de
obras que, necessariamente, haverá alguém a ser punido.

Ora, se, ao final das investigações ficar demonstrado que não houve desídia de quem quer que
fosse e nem, muito menos, imprudência, negligência ou imperícia de qualquer responsável técnico
ou engenheiro, mas sim, e apenas, ato impensado ou equivocado que tenha sido praticado pelo

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próprio acidentado ou, então, que tudo não passou de um triste acidente, o inquérito policial,
fatalmente, será arquivado a pedido do Ministério Público.

Se as investigações apontarem, ao final, que não há como se atribuir “culpa” a qualquer


funcionário, é forçoso reconhecer que tal entendimento transcende para a esfera trabalhista.
Sendo assim, ou a empresa ficará livre de qualquer responsabilidade ou, pelo menos, terá sua
culpa “atenuada”, o que acarretará uma sensível redução no valor da indenização a ser paga.
Portanto, as provas produzidas no curso de um inquérito policial podem repercutir na esfera
trabalhista, ou a favor ou contra o empresário.

Por derradeiro, cumpre ressaltar que o acidente de trabalho, por óbvio, pode e deve ser evitado.
Entretanto, é evidente que reduzir os casos a zero é algo utópico, verdadeiramente impossível, já
que o ser humano comete erros. Porém, se a empresa e os seus engenheiros adotarem regras
padrões já existentes para evitar os acidentes, sempre com a efetiva fiscalização, bons resultados
serão colhidos e o número de acidentados, certamente, irá diminuir. Dentro desse contexto, tanto o
fornecimento dos EPIs a todos os funcionários quanto a conscientização de que a segurança no
trabalho depende, principalmente, do uso correto daqueles equipamentos, são medidas que
podem salvar muitas vidas na construção civil e assim reduzir as tristes estatísticas do setor.

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