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Alexandre Sugamosto é bacharel em Filosofia pela Universidade do Sul de Santa Catarina e especialista em
metodologia do Ensino de Língua Portuguesa e Estrangeira. Mestrando em Ciências da Religião (PUC-MG), tem realizado
pesquisas nas áreas de teopoética, religião e literatura e ciências da linguagem religiosa. Professor de Ética Corporativa,
Compliance e Filosofia Organizacional do ISAE-FGV e de "Evolução do pensar à luz da filosofia" no Master em
Neuroestratégia e Pensamento Transversal, da ESIC. Já publicou em revistas, jornais e livros didáticos e é consultor nas
áreas de Cultura, Educação, Comportamento Humano e Desenvolvimento de Equipes. Membro do corpo editorial
da Revista ANANKE.
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Auden (The New York Review of Books, 23/10/1980)
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Ou vate/vidente, a depender da tradução.
definirá o lugar transmutativo do poema na vida breve de Rimbaud: “a velharia
poética entrava em boa parte na minha alquimia do verbo”.
Antes de partir para o exílio mais estranho da história da literatura, o jovem
francês declarou ainda que o poeta verdadeiro é um ladrão de fogo e inscreveu
a atividade poética naquela antiquíssima linhagem que tem em Prometeu seu
patriarca. Qual seja a concepção final desse místico em estado selvagem que foi
Rimbaud, a verdade é que o seu mutismo posterior nunca será explicado: cessou,
afinal, a atividade divina? Ele perdeu o dom da vidência? Deixou de sonhar ou foi
aniquilado pelo próprio fogo que havia raptado? 4
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Em um poema inflamado, outro francês, Victor Hugo, usa uma dicção muito próxima daquela esboçada na Carta do
Vidente: Peuples! Écoutez le poète! Ecoutez le rêveur sacré! Dans votre nuit, sans lui complète, Lui seul a le front éclairé
(“Povos! Escutai o poeta! Escutai o sonhador sagrado! Na vossa noite, sem ele completa, ele apenas tem a iluminada
fronte! ”).
Contudo, há nessas linhas um elemento ainda não pensado: a quem o
soneto duro fará sofrer? Para quem está dirigida essa maquinação doentia
operada na oficina? Drummond não diz, mas está subentendido: chamar o poema
de tarefa, e não de destino ou vocação, é destituí-lo de seu caráter
sagrado/mágico. Afinal, toda tarefa precisa de um encarregado, alguém que
possa executar a função. Dessa condição surge o operário da palavra, o Bartleby
lírico, e com ele o fardo da composição que opera em suas próprias nuvens
semânticas: desgaste, suor, labuta, mecânica. Ao contrário da Todesfuge de
Celan, o poema mecânico, quase sempre representado pelo poeta parnasiano
fazendo malabarismos com o dicionário, é um mergulho na morte e na cisão. Eliot,
mesmo tendo sido bancário e levado uma vida rotineira, optou por singrar outros
universos com seu Waste Land: a rotina e o tédio estão no poema ou no próprio
poeta que o executa? Por acaso já escreveram os operários?
A vocação, por outro lado, mistifica seus eleitos. Os autores videntes -
Rimbaud, Blake, Nerval, etc. - se tornam os profetas de uma religião sem Deus e
pairam na bruma de um segredo só comunicável sob certas cifras. Mallarmé
escreveu pouco, mas seus alunos e admiradores diziam que havia algo naquele
estranho professor que ficava sentado pelos cantos baforando e murmurando
imprecações e desígnios pítios.
Há também o caso trágico de poetas que não foram considerados úteis o
suficiente e que, portanto, não passavam de parasitas da pátria. O exemplo mais
famoso é o do escritor russo Joseph Brodsky. Em 1963, um ainda jovem Brodsky foi
levado ao tribunal para prestar alguns esclarecimentos sobre as suas estranhas
atividades. Abaixo, transcrevo um pequeno trecho do delirante interrogatório 5:
J.: Quem decidiu que o senhor era poeta? Quem o classificou entre os
poetas?
B.: Ninguém. (Sem qualquer desafio) E quem me classificou no gênero
humano?
J.: E o senhor estudou com tal objetivo?
B.: Qual objetivo?
J.: De se tornar poeta. Não tentou fazer os estudos superiores para se
preparar… para aprender…
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A tradução completa, realizada pelo poeta Guilherme Gontijo Flores, pode ser acessada em:
https://escamandro.wordpress.com/2015/01/16/o-julgamento-de-brodsky-melhores-momentos/
B.: Eu não pensava que seria possível aprender isso.
J.: Como se tornar poeta, então?
B.: Penso que… (Desconcertado) … é um dom de Deus…
Mais uma vez confesso que o trabalho me interessa infinitamente mais que
o produto do trabalho. Não amo senão o trabalho do trabalho: os começos
me entendiam e suspeito ser perfectível tudo aquilo que chega de uma vez.
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VALÉRY apud BRASILEIRO, Antônio. Da Inutilidade da Poesia. Rio de Janeiro: 7 Letras, 2012, p. 59.
Mas se é apenas pela tautologia existencial e extensão de seus próprios
domínios cognitivos, há ainda uma esperança de salvação - intelectual, anímica
ou mental - pelo poema? Matilde Campilho anuncia que a poesia não salva o
mundo, mas salva o minuto, e isto, segundo ela, já é o suficiente.
Sendo este um exercício antes interrogativo do que peremptório,
poderíamos estender a pergunta norteadora aos poetas mágicos, loucos, divinos,
possuídos, incompreendidos, solitários ou engajados. Que fazem em um mundo nas
raias da tecnocracia absoluta? Em quais poderes confiam para continuar a
construir mundos e linguagens? Por que não desistem, de uma vez por todas, de
seu ofício ou arte taciturna?
A sentença de Antônio Pina desembola, de maneira pouca esperançosa,
a linha que iniciamos:
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PINA, Manuel António em "Ainda não é o Fim nem o Princípio do Mundo. Calma, é apenas um pouco tarde". Disponível
em: http://www.museudaimprensa.pt/biografiamultimedia_manuelantoniopina/opoeta/poemas.pdf Acesso em 11
nov 2018.
REFERÊNCIAS
FRIEDRICH, Hugo. Estrutura da lírica moderna. São Paulo: Livraria Duas Cidades,
1978.
RIMBAUD, Arthur. Prosa poética. Tradução: Ivo Barroso. 2ed. Rio de Janeiro:
Topbooks, 2007.