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A ARQUEOLOGIA COMO UMA PRÁTICA INTERPRETATIVA SOBRE O PASSADO


NO PRESENTE: PERSPECTIVAS TEÓRICO-METODOLÓGICAS

Chapter · January 2008

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Silvia Moehlecke Copé


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A ARQUEOLOGIA COMO UMA PRÁTICA INTERPRETATIVA SOBRE O PASSADO NO
PRESENTE: PERSPECTIVAS TEÓRICO-METODOLÓGICAS

Dra. Silvia Moehlecke Copé


Me. Carolina Aveline Deitos Rosa

Introdução
Todo conhecimento acerca do passado remoto é produzido pela arqueologia. É
resultado de um processo ativo desempenhado por um sujeito no presente, que através
do seu empenho em compreender como viviam os grupos humanos em tempos antigos,
constitui uma forma de saber. Este conhecimento não é dado ou refletido pelos objetos,
mas é elaborado a partir do seu resgate e do seu estudo por pesquisadores situados em
uma dada sociedade.
Ao compreender a arqueologia enquanto uma prática interpretativa, que constrói
socialmente e de forma ativa o passado no presente (e não meramente como um reflexo
passivo das coisas que ocorreram em tempo remoto), esta disciplina deixa de tratar
apenas de eventos ou de cultura material. Passa a ser compreendida enquanto um evento
e uma produção material, pois elabora todo o conhecimento sobre o modo de viver de
sociedades antigas.
Seguindo este enfoque, produto das abordagens pós-processualistas adotadas nos
anos 80 e hoje cognominadas de arqueologias interpretativas, presente e passado não
são concebidos de forma oposta ou dicotômica, pois um se constitui em relação ao outro
num processo ativo e dialético. O passado não é visto como completo, acabado, ele está
vivo de alguma forma no presente, através da presença física dos vestígios materiais
(Hodder, 1992; Shanks e Tilley, 1987, Tilley, s/d). Assim sendo, os arqueólogos devem
mediar passado e presente, pois o trabalho arqueológico une estes dois tempos.
Com o objetivo de mostrar como o conhecimento arqueológico é produzido
pelos investigadores a partir da cultura material, neste artigo nos propomos analisar
como este processo ocorre através das atividades que resultam na constituição dos dados
e na elaboração dos discursos.


Professora e pesquisadora do Núcleo de Pesquisa Arqueológica – NuPArq, Depto de História,
IFCH/UFRGS

Pesquisadora do Núcleo de Pesquisa Arqueológica – NuPArq, Depto de História, IFCH/UFRGS
2

A produção dos dados arqueológicos

A natureza dos dados arqueológicos


Quando o arqueólogo escava, ele não produz ‘dados’ no sentido literal do termo,
estes não estão prontos à espera de observadores que apenas os coletam no registro
arqueológico. Os dados são construções contemporâneas, frutos da prática interpretativa
dos arqueólogos ao escavar os sítios e ao analisar os restos materiais obtidos a partir de
determinados métodos de análise. Então, a essência dos dados é como representação dos
fatos e os métodos da arqueologia é que produzem tais informações (Tomaskova, 2003).
Dessa forma, os dados arqueológicos são constituídos em grande parte de acordo
com a maneira como são vistos por uma lente moderna, baseada em uma leitura teórica.
Dados e teoria estão fortemente ligados, os primeiros podem ser vistos como forma de
apropriação teórica do real, enquanto que os últimos trabalham com estes dados através
da conceitualização (Shanks e Tilley, 1987). Com isso, há pretensão de desmantelar o
argumento de alguns pesquisadores de que uma investigação pode ter uma base teórica
desvinculada da pesquisa prática. Uma teoria arqueológica não tem sentido algum se
não estiver ligada a prática, da mesma forma, os dados são sempre elaborados de acordo
com alguma noção teórica.

A práxis arqueológica
A prática arqueológica envolve pesquisa de campo e laboratório, muitas vezes
realizada concomitante ou alternadamente, e compreende, como em qualquer outra
disciplina, três momentos distintos e inter-relacionados: a elaboração de projeto e
planejamento, a execução do projeto e a divulgação de resultados. A elaboração do
projeto exige a eleição do tema e a problemática, o levantamento bibliográfico, gráfico e
a análise das coleções existentes de pesquisas anteriores, a definição do recorte espaço-
temporal, a orientação teórico-metodológica, o cronograma, o financiamento. Além
disso, como a legislação brasileira determina que tudo que está no subsolo brasileiro
pertence à União, os projetos arqueológicos devem ser aprovados pelo Instituto do
Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) e a autorização da pesquisa ser
publicada no Diário Oficial da União (D.O.U.), em cuja portaria consta o nome do
arqueólogo, o prazo em que deve ser realizado o trabalho e a instituição que ficará
responsável pela guarda do material proveniente da pesquisa.
3

A execução do projeto compreende etapas também inter-relacionadas de campo


e de laboratório. O campo compreende atividades de prospecção e de escavação e, o
laboratório, a curadoria do material arqueológico segundo sua matéria prima, a limpeza,
a numeração e o acondicionamento, a análise macroscópica e microscópica segundo
atributos estipulados, a tabulação dos dados produzidos e a interpretação do conjunto
das evidências. A divulgação dos resultados da pesquisa deve abranger diversas
modalidades e públicos: as publicações e apresentação à comunidade científica nos
fóruns específicos e ao grande público. Como o objeto do arqueólogo está
desaparecendo devido à expansão das malhas urbanas, da abertura de novas fronteiras
agropecuárias, ou ainda, de grandes obras de engenharia, é de extrema importância a
constituição e a preservação dos acervos arqueológicos, assim como a realização de
projetos de educação patrimonial junto à população, exigida pelo IPHAN através de
uma Portaria de 2004.
O trabalho em campo
Quando os atores da história não estão ao alcance das mãos do historiador, este
se volta para os locais depositários dos registros das ações humanas passadas como os
arquivos municipais, estaduais, nacionais, públicos ou privados, em busca de suas
fontes. Assim também o arqueólogo prospecta e escava os arquivos depositados no solo,
em busca de dados sobre sociedades pretéritas.
A experiência em campo ou ‘o estar em campo’ não significa meramente definir
a logística, as estratégias ou os métodos mais adequados, ou ainda, as técnicas
pertinentes para abordar o registro arqueológico e o como documentar as nossas
descobertas. Hoje, seguindo as tendências dos últimos anos na arqueologia, o campo é
uma instância de reflexão teórica e interpretação e não simplesmente um momento de
execução das diversas técnicas de coleta. O campo significa também as relações com as
comunidades locais, suas interpretações do passado e seus interesses políticos e sociais.
O momento da descoberta
O cinema, entre outros meios mediáticos, desenvolveu no imaginário popular a
imagem do arqueólogo desbravador de lugares desconhecidos, por vezes inacessíveis,
em busca de magníficos objetos e de templos escondidos. Na verdade, a maioria dos
achados arqueológicos ocorre de maneira acidental: agricultores arando a terra,
aventuras infanto-juvenis exploratórias de novos lugares, edificações de todo tipo desde
a colocação de um simples moirão até a construção de uma hidroelétrica. Todavia,
somente o arqueólogo possui o treinamento e a autorização para fazer o registro
4

sistemático destes achados. Aliás, nem todos os sítios precisam ser descobertos, pois sua
existência material é inquestionável como as pirâmides mesoamericanas e as cidades e
estradas andinas. No Brasil, alguns sítios arqueológicos possuem dimensões
monumentais como os conhecidos sambaquis ao longo das costas marítima e fluvial, as
estruturas semi-subterrâneas e as estruturas em alto relevo no planalto sul brasileiro, os
grandes abrigos sob rocha com pinturas e gravuras produzidas por grupos caçadores e
coletores existentes em quase todo o território nacional, as grandes aldeias anelares do
centro-oeste brasileiro e da Amazônia, os ‘tesos’ da cultura marajoara, as igrejas, os
centros históricos urbanos, as fortalezas, entre outros. Provavelmente, alguns desses
sítios foram edificados não exclusivamente para atender necessidades materiais, mas
sim com a intenção de legar à posteridade elementos de representação de dada
sociedade. Entretanto, a grande maioria dos sítios arqueológicos é fruto das ações
cotidianas das diversas sociedades e está enterrado ou é visível na superfície do solo
somente em forma de objetos dispersos e precisam, portanto, de um exame mais
minucioso – o que Renfrew & Bahn (1993) chamam de prospecção de reconhecimento,
para ser detectado.
Nos últimos anos os arqueólogos, em razão de estarem se interessando pela
reconstrução do uso humano global da paisagem, deram-se conta que há dispersões
apenas perceptíveis de artefatos, que não poderíamos qualificar de sítios, mas que
representam atividades humanas significativas, geralmente articuladas a assentamentos.
Alguns investigadores como Dunnel & Dancey (1983) sugeriram que estas áreas fora
dos sítios, com uma baixa densidade de artefatos, não constituem sítios propriamente
ditos e que deveriam ser localizadas e registradas, o que somente pode ser feito
mediante um trabalho sistemático de prospecção que implique procedimentos de
amostragens cuidadosos. Cabe lembrar que áreas vazias possuem um potencial
informativo importante, como por exemplo, as praças centrais de aldeias ou de
estruturas cerimoniais. Este enfoque é útil, sobretudo, em áreas onde viveram povos
com um modo de vida itinerante que deixaram um registro arqueológico disperso, como
em grande parte da América e África (Renfrew & Bahn, 1993).
A prospecção arqueológica
Tradicionalmente, a imagem do arqueólogo trabalhando em campo está
associada à minuciosa escavação de sítios individuais, sejam pré-históricos ou
históricos. Atualmente a escavação ainda possui sua importância, porém, a prospecção
tem ganhado destaque devido ao desenvolvimento de estudos regionais que pressupõe
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um programa de prospecção, o qual muitas vezes é mais barato, mais rápido e


relativamente pouco destrutivo. Portanto, a prospecção objetiva obter a maior
quantidade de informações possível acerca de uma determinada área e identificar todos
os sítios arqueológicos e evidências isoladas fornecendo, dessa maneira, uma visão do
contexto onde os mesmos estão inseridos.
Há várias maneiras de prospectar uma área as quais podem ser utilizadas
isoladas ou preferencialmente concomitantes: a prospecção aérea, a prospecção sob a
superfície e geofísica, e a prospecção superficial.
A prospecção aérea (as fotografias aéreas oblíquas são boas para descobrir sítios
e as verticais são boas para elaborar plantas e mapas) avançou muito com a
popularização dos micro-computadores, as imagens e mapas digitalizados, os filmes
infravermelhos, a prospecção térmica e todos os recursos do sensoriamento remoto de
alta resolução como as imagens de satélites e os programas de georeferenciamento
como o SIG (Sistema de Informação Geográfica ou, em inglês, GIS – Geographic
Information Systems) e o fácil acesso a programas livres como o Google Earth.
A prospecção sob a superfície é a busca por evidências arqueológicas enterradas,
realizada comumente através de sondagens (tradagens, cortes estratigráficos em
quadrículas e/ou trincheiras), ou através da prospecção geofísica que emprega métodos
mais caros de teledetecção que inclui métodos sísmicos e acústicos; ondas de radio e
impulsos elétricos; métodos de prospecção magnética; detectores de metais; entre outras
técnicas (Clark, 1990).
A prospecção na superfície (superficial) consiste no percurso a pé da área a ser
prospectada, observando as modificações da paisagem e a superfície do solo, em busca
de evidências arqueológicas. É o tipo mais utilizado, eficiente, barato e pode ser feito de
diversas formas segundo a disponibilidade de tempo e dinheiro. Em pequenas áreas é
possível, e sempre recomendável, fazer a prospecção total (full coverage), porém, em
grandes áreas isto é praticamente impossível exigindo a estratégia da prospecção por
amostragem. Esta pode ser tradicional (também chamada de oportunista porque se
baseia nas informações obtidas junto à população e, a partir dos sítios conhecidos, a
procura por outros no entorno) ou probabilística (utilizada geralmente em prospecção de
grande escala ou quando não se possui nenhuma informação sobre a área a ser
investigada ou, ainda, quando o tempo e o dinheiro disponível são escassos). Nesta
última modalidade de prospecção, a área é dividida em linhas eqüidistantes (transects)
ou em quadrados (squares) que, por sua vez, serão percorridas de forma aleatória
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simples ou estratificada (a diferenciação de estratos pode estar ligada a diferenças na


cobertura vegetal ou a acidentes topográficos) ou sistemática e sistemática estratificada,
segundo as propostas de Haggett (1965) e reproduzidas em Renfrew & Bahn (1993) e
em Drewett (1999).
Após definida e executada a estratégia da prospecção superficial e localizados os
sítios, estes deverão estar ou ser posicionados em mapas com as coordenadas
geográficas, trabalho este facilitado pelo uso de um GPS (Global Positional System),
aparelho que rastreia os satélites mais próximos e através de um sistema de triangulação
(exige no mínimo três satélites) dá a posição exata do sítio em coordenadas geográficas
(em graus) e em UTM (Universal Transversal Mercator) (em centímetros).
Para cada sítio deverá ser elaborado um mapa topográfico (que representa as
diferenças na elevação ou altura mediante curvas de nível, medidas com ajuda de um
nível, teodolito ou estação total, e ajuda a relacionar as estruturas com a paisagem
circundante) e um planimétrico (que representa as dimensões do sítio e as suas
estruturas, sua posição em relação aos pontos cardeais, a cobertura vegetal, o uso da
terra atual, etc. e ajuda a explicar a inter-relação entre as distintas estruturas ou entre os
artefatos). O ideal é que a posição das estruturas e dos artefatos também seja sinalizada
nos mapas, entretanto, se são muitos os artefatos, o registro pode ser feito por seleção de
artefatos ou por amostragem. O arqueólogo deve decidir se irá coletar ou não o material
arqueológico e como, pois dependendo dos seus objetivos e a densidade do material
arqueológico, a coleta será total ou parcial (amostragem). Se parcial, a coleta será
assistemática (coleta aleatória dentro do perímetro do sítio) ou sistemática (coleta na
área do sítio dividido em um sistema de rede quadricular ou uma série de linhas de
percursos eqüidistantes; o tamanho dos quadrados assim como a distância entre as
linhas dependerá do grau de intensidade dado à coleta).
Nossa equipe realizou duas experiências de coleta por amostragem em sítios
superficiais com perímetros aproximados de 1 km de diâmetro. No sítio RS-PE-311,
após o quadriculamento total do sítio em quadras de 5 x 5 m, elegemos as quadrículas
centrais do eixo norte-sul e do eixo leste-oeste, as quais se cruzavam no centro do sítio
formando uma cruz, para efetuar a coleta total do material arqueológico (Figura 1). No
sítio RS-PE-22 fizemos o mesmo quadriculamento, porém a coleta se deu na forma de

1
RS-PE-01 é a sigla do sítio que nos diz sobre a localização do mesmo: RS = Rio Grande do Sul, PE =
bacia hidrográfica do rio Pelotas e o 01 é o nº seqüencial dos achados na região. Esta forma de registro é
nacional e segue as regras do Cadastro Nacional dos Sítios Arqueológicos – CNSA, banco de dados
acessível no site do IPHAN.
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um tabuleiro de xadrez, sendo que em cada quadra selecionada, a escavação de


quadrículas de 1x 1m também foi na forma de tabuleiro. Para agilizar o trabalho
desenvolvemos uma malha móvel de 5 m² dividida em quadrículas de 1 x 1 m (Figura
2).
Este sistema de coleta superficial nos propiciou, a partir de plotagem do nº dos
artefatos por quadrículas em um mapa elaborado manualmente ou por meio digital, as
áreas do sítio com maior densidade de artefatos e onde, consequentemente, maior
trabalho deveria ser investido. Além disso, indicou os locais mais adequados para a
escavação na busca de estratigrafia para obter cronologia e observar outros momentos
de ocupação humana no local (Figura 3).
Cabe lembrar que a prospecção e a escavação são complementares e não
excludentes: a prospecção nos diz um pouco de uma grande quantidade de sítios e pode
repetir-se a qualquer momento enquanto a escavação nos diz muito de uma pequena
parte de um sítio e somente pode realizar-se uma vez (Renfrew & Bahn, 1993).

A escavação arqueológica
A escavação é a principal forma de produção de documentação arqueológica. É
a única maneira de comprovar a confiabilidade dos dados superficiais, confirmar a
exatidão das técnicas de teledetecção e ver na realidade o que resta no sítio
arqueológico. A escavação dá os dois tipos de informação que mais interessam os
arqueólogos: as atividades humanas desenvolvidas em um determinado momento no
passado e as mudanças nestas atividades de uma época a outra (Renfrew & Bahn, 1993).
Um dos propósitos da prospecção é a escolha do(s) sítio(s) a ser(em)
escavado(s), que além de depender dos objetivos do projeto de pesquisa, deve
contemplar a variabilidade de sítios identificada na área prospectada e o grau de
relevância e significância dos mesmos. A necessidade de determinar o grau de
relevância (dado pelo valor humanístico e científico) de um sítio arqueológico advém da
impossibilidade de salvar todos os bens arqueológicos da nação, assim há que se
estabelecer critérios para seu estudo e preservação (Dunnel, 1984 apud Caldarelli,
2002). A significância é dada pela singularidade do sítio, seu estado de conservação, seu
papel como elemento definidor de identidades sociais, seu potencial para explanação de
processos sócio-culturais passados, etc. (McMillan, Grady & Lipe, 1984 apud
Caldarelli, 2002). A escolha também é definida por questões logísticas e pragmáticas
como acesso ao sítio, infra-estrutura (equipe e equipamento, alojamento, alimentação)
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disponível que, por sua vez, novamente dependem das variáveis tempo e recursos
financeiros.
Como em todo trabalho arqueológico, os procedimentos iniciais no sítio
compreendem o registro documental e fotográfico da situação encontrada e do seu
estado de conservação, assim como, o percurso de sua área observando-se a sua
extensão, a sua forma e a sua implantação no relevo. Durante a prospecção de
reconhecimento realizada na área a ser investigada geralmente são feitas as medições e
anotações quanto à distância dos recursos d’água mais próximos, a distância, acesso,
visibilidade entre os sítios localizados, as possíveis fontes de matérias-primas e
realizadas amostras.
Após a escolha do sítio a ser escavado e o registro de sua situação original, o
primeiro passo para a escavação é a escolha de um local com boa visibilidade da área
total do sítio, onde será colocado o Ponto Zero (= P0, que poderá ser também o Ponto de
Referência de Alturas = PR) que servirá para amarrar todos os demais pontos de
controle do trabalho como as demais estações topográficas e as linhas de base e
referência. Após a seleção dos pontos de controle e o local - o Ponto 100/100 – da
intersecção das linhas de orientação e de base para implantação da malha de
quadriculamento, procede à elaboração do croqui planimétrico e do perfil topográfico
do sítio e seu entorno imediato (Figura 4). O sítio está pronto para ser escavado.
É clássico nos manuais de arqueologia distinguir dois métodos principais de
escavação. O primeiro deles, a escavação “estratigráfica”, “vertical”, “temporal”,
“diacrônica”, ou ainda, a chamada “micro-história” tem como preocupação maior as
mudanças que se produzem no tempo, verificada na superposição dos níveis de
ocupação e com a datação relativa dos artefatos. A arqueologia apropriou-se do
princípio estratigráfico da geologia que se baseia na superposição dos estratos
acumulados com o passar do tempo através de processos que prosseguem até hoje
(Harris, 1991). Os estratos arqueológicos (os níveis com restos culturais) abarcam
períodos de tempo muito mais curtos que os geológicos, porém o princípio é o mesmo:
quando um estrato se sobrepõe a outro, o que está em cima é sempre mais recente que o
anterior, portanto, nos dão uma seqüência vertical dos eventos que se acumularam
naquele local e um controle de eventuais anomalias que poderiam comprometer a
escavação como inversões estratigráficas muito comuns quando ocorrem enterramentos
ou quando há fatores de bioperturbação. O método da escavação estratigráfica foi
utilizado desde o século XVII, porém é identificado com Mortimer Wheeler que o
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sistematizou, racionalizou e divulgou. No método Wheeler destacam-se seis


características essenciais: 1. delimitação no terreno da área a ser escavada por
quadrículas, 2. preservação de testemunhos entre as quadrículas; 3. transcrição gráfica
do corte estratigráfico a partir das duas paredes preservadas em cada quadrícula; 4.
numeração dos estratos no corte da parede; 5. atribuição dos artefatos aos estratos
numerados; 6. preservação ou escavação dos testemunhos estratigráficos (Wheeler,
1989).
Em contraposição, o segundo método seria a escavação “horizontal”, “espacial”,
“sincrônica”, cuja principal preocupação é as atividades humanas que se desenvolvem
simultaneamente (contemporâneas) em um determinado espaço, a escavação de
unidades sociologicamente significativas. Este método surgiu em decorrência das
críticas feitas às limitações do método anteriormente descrito e foi chamado de
escavação em áreas amplas ou método arqueo-etnográfico de Leroi-Gourhan, que
propõe 1. a escavação em grande superfície, 2. notação tridimensional detalhada dos
vestígios encontrados nos estratos, 3. o uso da técnica da decapagem, ou seja, cada
objeto é cuidadosamente solto (desprendido) até sua base com a ajuda de uma espátula
de dentista, um pincel ou uma colher de pedreiro. A decapagem sobre uma grande
superfície restitui uma visão do solo de habitação muito próximo daquele que tinham
seus habitantes no momento de sua partida, advindo daí a visão etnográfica, sincrônica e
cotidiana da estratigrafia (estratigrafia horizontal). A principal premissa epistemológica
da escavação de grandes superfícies refere-se à caracterização de cada unidade
estratigráfica como resultante de uma ação social (Leroi-Gourhan & Brézillion, 1972;
Leroi-Gourhan, 1984).
Estes dois conjuntos de técnicas são na verdade as duas faces de uma mesma
moeda: a compreensão do passado nas suas dimensões espaço-temporal. As técnicas de
escavação não são universalmente válidas possuindo características diversas em épocas
e ambientes culturais diferentes. Há três questões centrais: as técnicas não são neutras,
pois derivam dos pressupostos epistemológicos e, em última análise, político-culturais
subjacentes à prática arqueológica; as técnicas são diferentes tendo em vista a satisfação
de objetivos diversos e objetos (tipos de sítios) diferentes; não há técnicas corretas (o
que levou à afirmação extremada de Wheeler (1989) de que não havia técnicas corretas
de fazer arqueologia, mas muitas erradas).
Assim como na prospecção, os métodos e técnicas definidos no projeto de
pesquisa devem ser permanentemente re-avaliados à medida que prossegue a escavação,
10

pois o esperado pode não ser o encontrado. Aqui, reportamos-nos ao texto clássico de
Redman (1973) sobre a pesquisa em multi-estágios onde destaca a necessidade de
constante retro-alimentação. Independentemente das técnicas e métodos empregados,
uma escavação só será boa no momento que o registro dos métodos de recuperação seja
bem feito, pois toda escavação é única porque na sua execução destruímos uma boa
parcela do suporte material dos nossos dados. O registro de cada fase da intervenção
deve ser meticuloso, ou seja, pode-se pecar por excesso jamais por omissão.
O ato de escavar propriamente dito é a separação dos artefatos e ecofatos,
através do uso de um pincel ou de uma colher de pedreiro, da terra que os envolvem. A
terra retirada será ou não peneirada e colocada num monte suficientemente afastado do
sítio para não atrapalhar a escavação e razoavelmente perto para facilitar o seu uso para
tapá-la no seu final. As peças arqueológicas são deixadas no local até o final do nível
artificial ou da camada natural, para efetuar o registro da sua distribuição espacial
através da técnica de triangulação (McIntosh, 1987: 83). Em cada quadrícula o
escavador fará um diário de quadrícula, onde constará a posição exata de cada objeto e
de seu estrato arqueológico, ou seja, um registro tridimensional do objeto. A
estratigrafia será documentada de forma gráfica (fotografia e desenho dos cortes e
perfis) e escrita através da descrição dos níveis/camadas com sua espessura,
composição, cor (com auxílio do código de Munsell), inclinação do terreno, etc., ao
longo do trabalho ou no seu final.
Ao longo da escavação e à medida que são encontradas as evidências
arqueológicas deverão ser coletadas amostras de sedimentos para análise
sedimentológica, palinológica ou, ainda, micro morfológica e micro estratigráfica do
solo, bem como de carvões para datação radiocarbônica e análise antracológica.
Igualmente, de acordo com o tipo de sítio, os objetivos da pesquisa e as dificuldades
encontradas no registro arqueológico, decisões deverão ser tomadas sobre o tipo de
peneiramento da terra, com ou sem água, e o uso de peneiras com malhas especiais (no
caso de restos de microorganismos vegetais e animais); sobre a adoção da técnica de
flotação, sobre as técnicas a serem empregadas no caso de restos humanos, entre outras.
Observamos que os projetos de longo prazo geralmente dão mais resultados,
com equipes diferentes e com normatização das formas de registro para toda a equipe.

O trabalho em laboratório
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A espécie humana tem sido definida muitas vezes em função de sua especial
habilidade para fabricar ferramentas e muitos arqueólogos têm explicado o progresso
humano em grande parte sob o ponto de vista dos avanços tecnológicos. Os restos dos
artefatos feitos pelo homem ao longo do tempo constituem a maior parte do registro
arqueológico e eles nos permitem estabelecer tipologias, cronologias, conhecer mais
sobre a dieta alimentar, descobrir antigos padrões de comércio e intercâmbio e inclusive
conhecer sistemas de crenças (Renfrew & Bahn, 1993).
Os primeiros utensílios reconhecíveis remontam a 2,5 milhões de anos e, até a
adoção da cerâmica em torno de 12.000 anos, a pedra foi a matéria-prima predominante
nas descobertas arqueológicas. Somente em condições favoráveis como sítios
pantanosos, gelados ou secos, os objetos construídos com matéria orgânica podem
sobreviver e, em vista desta escassa capacidade de conservação, lembramos que
inclusive aqueles que já se decompuseram por completo podem ser detectados
ocasionalmente pelos ocos, mudanças no solo ou marcas/impressões que deixaram. A
existência de um artefato pode ser detectada também pelas marcas deixadas nas coisas
ou locais alterados pela ação do mesmo. Portanto, o arqueólogo deve levar em conta que
o universo empírico é incompleto.
Durante a escavação ou em laboratório, o arqueólogo deve determinar primeiro
se o objeto foi feito e/ou utilizado pelo homem no passado, pois nem sempre é óbvio.
Por isso, foi necessário estabelecer critérios para estipular a mediação humana como no
material feito sobre pedra (o material lítico) os bulbos resultantes da percussão
intencional de um seixo sobre outro. A mediação humana é analisada em laboratório
através de uma série de encaminhamentos metodológicos que dependem da orientação
teórico-metodológica do arqueólogo.
Na interpretação das evidências podemos contar com a utilização da análise
arqueológica propriamente dita, da analogia etnográfica e da arqueologia experimental
(reviver o passado através da experimentação). Neste artigo, nos ateremos à análise
arqueológica.
Quando não realizada em campo, em laboratório processa-se a triagem do
material segundo a matéria-prima. O material é revisado, separado, lavado, secado,
acondicionado e enviado para os laboratórios especializados. No caso do laboratório ou
da equipe não possuir integrantes especializados, os ossos pertencentes a esqueletos
humanos serão remetidos para um laboratório de Antropologia Física; os ossos de
animais para um laboratório de Paleontologia ou para um zooarqueólogo; o pólen irá
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para um laboratório de Palinologia; os sedimentos para a Geologia; o carvão para um


laboratório de Física que faz datações do Carbono 14, etc.
Na análise arqueológica dos objetos, é conveniente diferenciar duas bases sobre
os quais os artefatos são construídos: as matérias-primas disponíveis na natureza e
apropriadas e modificadas pelo homem segundo suas especificidades como a pedra, o
osso, o chifre, a madeira, entre outros, e aquelas que dependem do domínio da
tecnologia do fogo (pirotecnologia) como a cerâmica, a faiança, a louça, o vidro e os
metais em geral, muitas vezes denominadas matérias-primas artificiais (Renfrew &
Bahn, 1993). Em geral, as primeiras foram transformadas com o auxílio de instrumentos
líticos: perfuradores, alisadores, etc. e foram usadas concomitantemente ao lítico.
A análise do material lítico
Os artefatos líticos (a pedra é a matéria-prima) eram elaborados a partir da
percussão de um seixo que possuía a função de batedor/martelo sobre um bloco ou
outro seixo de pedra. A partir desta percussão eram extraídas lascas até a obtenção da
forma desejada, que dependia da função que se pretendia dar ao objeto. O núcleo (o
bloco/seixo original trabalhado) transformava-se no artefato/instrumento principal e as
lascas produzidas poderiam ser descartadas ou também utilizadas na produção de
artefatos como facas, raspadores, perfuradores, pontas de flecha. A habilidade do
fabricante e a qualidade do artefato dependiam muito do tipo e da qualidade de matéria-
prima disponível. De modo geral, a história da tecnologia lítica européia mostra que os
instrumentos tornaram-se cada vez mais complexos e eficientes, enquanto em algumas
regiões da América, as indústrias líticas mais elaboradas são as mais antigas.
Na análise do material lítico, os itens que devem ser considerados são referentes
à:
1. Matéria-prima: tipo (silex, calcedônia, basalto, arenito, quatzo, etc.),
propriedades (frágeis ou resistentes), tipo de suporte (seixo, calhau, bloco, etc); fontes
(tipo: leitos de rios, afloramentos de rochas nas montanhas, minas e pedreiras, distância
do sitio, abundância, facilidade de extração), formas de extração, transporte, tratamento
térmico. Se a matéria-prima não é local, o objeto ou a matéria-prima foi intercambiada.
2. Manufatura: morfologia, tecnologia de produção dos artefatos (lascado ou
polido, sobre núcleos ou sobre lascas/lâminas, técnicas de percussão direta, indireta,
bipolar; com ou sem retoques, retoques por percussão ou pressão, percutor duro ou
mole,etc.) e aplicada a técnica da remontagem.
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3. Classificação tecno-tipológica dos artefatos: criação de tipos de instrumentos


e/ou adornos e aplicação da tipologia estatística, ou seja, um objeto ou um conjunto de
objetos é típico de uma determinada cultura quando está estatisticamente bem
representado.
4. Identificação da função dos artefatos líticos a) através dos seus atributos
manufaturais (instrumentos = pontas de flechas, machados, facas, raspadores, etc.;
adornos = contas, braceletes, pingentes, tembetás, etc.; cerimoniais = zoólitos, bastões
de mando,etc.); b) através do estudo de micro-desgaste: mesmo sendo uma matéria-
prima dura descobriu-se, através do uso de microscópios, marcas de uso e a partir daí
estabeleceu-se 6 categorias no emprego do lítico: na madeira, osso, pele, carne, chifres e
plantas não lenhosas. Outras marcas mostram o movimento do utensílio, por exemplo,
perfurar, cortar ou raspar. Para a pergunta de como foi feito o desgaste, utiliza-se da c)
arqueologia experimental (reprodução das cadeias operatórias, uso/desgaste,
comparação).
5. A utilização e a evolução dos artefatos e tecnologias de produção através do
tempo. No Velho Mundo, a sofisticação das técnicas de lascamento e polimento
permitiu a divisão da pré-história nos períodos Paleolítico inferior, médio, superior,
Mesolítico e Neolítico.
Entre os autores que elaboraram manuais com metodologias de análise do
material lítico podemos citar Semenov (1982), Luedtke (1992), Andrefsky (1998), Odell
(2004), Whittaker (2005), além de coletâneas como as organizadas por Swanson (1975)
com proeminentes nomes da análise lítica (Bradley, Crabtree, Collins) e de Hayden
(1979), entre outros. Na corrente francesa, devemos citar Bordes (1961), Brézillon
(1968), Tixier, Inizan & Roche (1976), Dauvois (1976). Para o Brasil, temos os manuais
de Laming-Emperaire (1967) e Prous (2005).
A análise do material cerâmico
A beleza singela de uma vasilha cerâmica esconde um grande desenvolvimento
tecnológico ligado ao domínio do fogo. A pirotecnologia começa a 1,5 milhões de anos
com o controle do fogo pelo homem que o utiliza para aquecer-se, proteger-se de outros
predadores, cozinhar e conservar seus alimentos, para trabalhar as pedras, endurecer a
madeira. Há 26.000 anos, o homem usa desta tecnologia para fazer estatuetas de argila
cozidas a uma temperatura de 500 a 800 º C. Em torno de 10.000 anos constrói fornos
para secar grãos e cozinhar pães, primeira forma controlada de aumentar a temperatura.
14

Há grupos de caçadores e coletores nômades que possuem cerâmica, porém, em


geral, a sua aparição coincide com a adoção de um modo de vida mais sedentário e/ou
com uma dieta baseada em produtos agrícolas, onde há necessidade de recipientes mais
resistentes e duradouros.
Como no lítico, entre as técnicas analíticas necessárias para o estudo da cerâmica
está a análise arqueológica propriamente dita que através da observação dos fragmentos
cerâmicos, a olho nu e/ou com lupa binocular, permite identificar os tipos de matérias-
primas utilizadas, detectar as técnicas de construção dos recipientes, de acabamento, de
secagem/queima e do tratamento pós-queima. Cabe ao arqueólogo também escolher e
aplicar técnicas para a reconstrução das formas e do sistema classificatório das mesmas,
selecionando as variáveis tecnológicas relacionadas com a forma/tamanho e a função
que os recipientes desempenharam na sociedade. As funções das vasilhas também
podem ser identificadas através do estudo do contexto dos recipientes - usos múltiplos,
reciclagens e marcas de uso. Podemos acrescentar a esta análise um tratamento
estatístico. Os elementos decorativos da cerâmica possuem um alto potencial
informativo sobre organização social, aspectos ideológicos, cosmovisão do grupo, etc.
O uso dos recipientes pode ser verificado através de vestígios encontrados como
fósforo, pólen, sais, resinas, borrachas, carboidratos, gordura animal e vegetal, além das
marcas de uso causadas por desgastes mecânicos (desgastes por atividades de mexer,
misturar e socar, apoiar - observáveis no interior, nas bases interna e externa, na borda
abaixo do lábio; no afloramento do núcleo, nas depressões circulares formadas através
de desgastes por líquidos), por fogo e fuligem (indica maneiras de usar: nas bases indica
uso suspenso sobre o fogo e nas paredes indica uso dentro do fogo) (Wüst, 1996).
A vida útil dos recipientes varia conforme os seguintes aspectos: a função, a
resistência, o tamanho, a freqüência de uso, os hábitos motores, a presença de animais
domésticos. O estudo da vida útil dos recipientes permite compreender a formação do
refugo, estimar demografia, estimar tempo de permanência, número de recipientes por
unidade doméstica (status), proporção das categorias de recipientes (subsistência).
As literaturas etnológicas e etno-arqueológicas nos permitem inferir os processos
cognitivos envolvidos nas diversas escolhas e o possível contexto social da produção da
cerâmica. A arqueologia experimental, através da coleta de amostras de argila nos pode
informar sobre a localização das fontes de matérias-primas, o modo de extração e o
processo seletivo, e ainda permite a repetição das possíveis cadeias operatórias na
15

produção cerâmica, a experimentação de secagem/queima de recipientes cerâmicos,


além de outros testes experimentais.
Entre os manuais que propõem metodologias de análise da cerâmica podemos
citar clássicos como Shepard (1965) e Meggers & Evans (1970), as propostas por Rye
(1981), Anderson (1984), Nelson (1985), Arnold (1988), Kolb (1989), Sinopoli (1991),
Skibo (1992), e Rice (1995), assim como, as compilações de textos encontrados em
Chilton (1999) e em Neff (2005), entre outros.
A análise da arte rupestre
Arte Rupestre é chamada toda expressão gráfica - gravura ou pintura - que
utiliza como suporte uma superfície rochosa, independentemente de sua qualidade e de
suas dimensões, que tanto pode ser as paredes de abrigos, de grutas ou de penhascos,
como também de rochas isoladas ou agrupadas em campo aberto, ou ainda, os lajedos
nas margens de rios.
Em campo, a primeira tarefa é contemplar e estudar em detalhe as
representações nas paredes, nos tetos e nos blocos caídos de um abrigo sob rocha ou
outro suporte rochoso. Após a análise do conjunto de representações, deve-se verificar
se constitui painéis, ou seja, conjuntos de representações que se caracterizam por sua
proximidade no espaço. A separação entre os painéis pode ser realizada quando são
identificados espaços vazios entre os grupos de figuras, seja por acidentes topográficos
do suporte rochoso resultando uma concentração de figuras em nichos ou em
protuberâncias, sejam por temas, figuras, cenas diferenciadas. O objetivo desta divisão é
facilitar a cópia das representações de arte no sítio. Esquematicamente, as etapas a
serem efetuadas a seguir são a análise dos painéis; a numeração dos painéis e das
figuras; a localização sobre as plantas e perfis topográficos do sítio; a descrição das
representações de forma isolada e por painéis; a cópia sobre um plástico fino, flexível e
transparente com pincéis de tinta indelével; as fotografias, assim como filmes de vídeo.
Para as gravuras, pode ser feito um molde em látex.
Ainda em campo devem ser verificadas as técnicas de cada representação. No
caso das gravuras: a técnica de realização (picotagem ou raspagem), a largura e a
profundidade do traço. Nas pinturas: a técnica do desenho (tipo de contorno, a largura
do traço); a técnica empregada para preenchimento da figura; a análise, ao microscópio,
do traço do contorno e do interior para descobrir quais instrumentos foram utilizados; a
análise de superposições; a ação do sol sobre as representações e suas conseqüências; a
observação da alteração devida às intempéries ou a outros fatores que possam ter
16

modificado as pinturas. Além da análise das condições físicas do suporte rochoso,


amostras de pinturas podem ser realizadas de forma adequada para a identificação, em
laboratórios especializados, do tipo de pigmentos empregados, e ainda verificar a
possibilidade de datação por AMS.
Em laboratório, é feita a análise minuciosa de todos os painéis e a análise de
cada representação em detalhe. Nos dois casos, a análise é feita em diferentes níveis: ao
nível descritivo são considerados os elementos morfológicos da figura; as regras de
composição, de perspectiva e os dados técnicos de realização; ao nível interpretativo,
podemos determinar o universo cultural contido no grafismo a partir do universo
cultural do pesquisador. A partir das fotografias e das cópias em plástico, são
reproduzidos os painéis sobre planos topográficos (em dimensões reduzidas) feitos
sobre folhas de papel vegetal. Isto permite fácil manipulação da totalidade dos painéis
em laboratório (Guidon, 1986).
Os atributos técnicos (a maneira do desenho, a morfologia das figuras) e/ou as
variações temáticas são empregadas para definir unidades estilísticas e proceder com
uma série de classificações. Os pesquisadores classificam a arte rupestre de diferentes
formas, os quais deram um nome particular às suas tradições, sub-tradições, estilos e
fácies. As tradições são definidas segundo o tipo de figuras representadas e sua
freqüência no interior desta classe; as sub-tradições são estabelecidas de acordo com as
diferentes representações gráficas de um tema e sua distribuição geográfica e os estilos
são ligados às técnicas de execução dos grafismos (Pessis, 1983).
No Brasil, apesar de reconhecida desde o período colonial, a arte rupestre
começou a ser estudada de maneira mais séria somente no século XX. Durante as
décadas de 1930 a 1960, as publicações sobre o tema eram descritivas e compunham-se
de listas de nomes dos sítios, onde muitas vezes estavam ausentes as localizações
geográficas. É a partir da década de 1970 que uma série de projetos de pesquisa
arqueológica voltou-se ao estudo mais sistemático da arte parietal, principalmente nos
estados onde existe uma abundância de sítios com pinturas e gravuras como Minas
Gerais, Piauí, Goiás. Durante os anos 1980, outros programas iniciaram-se nos estados
de Pernambuco, Rio Grande do Norte, Paraíba, Bahia, Mato Grosso e Mato Grosso do
Sul (Guidon, 1986) e produziram as primeiras tentativas de classificação da arte
rupestre por regiões com cartas de distribuição dos fenômenos e de sínteses como
aquelas de Albano (1979/80), Prous (1979/1980, 1983, 1991), Guidon (1975,
1981/1982, 1984, 1986), Schmitz (1981, 1984) ou Monzon (1987).
17

Apesar de alguns arqueólogos dissonantes (Meneses, 1983, Wüst, 1991 e Prous,


2002), a maioria das publicações recentes sobre a arte rupestre no Brasil continua a
tratá-la como uma manifestação cultural a parte das demais no registro arqueológico.
Não é nosso propósito discutir as interpretações e significados da arte rupestre, porém
elas estão em perfeita sintonia com o desenvolvimento das orientações teórico-
metodológicas que abordaremos abaixo e da própria compreensão do fenômeno da
cultura (Wüst, 1991). Será somente a partir da década de 1990 que as análises
contextuais e da arqueologia da paisagem serão aplicadas à arte rupestre (Callahan,
2003, Chippindale & Nash, 2004).

A interpretação dos dados


A mediação entre passado e presente é muito particular na arqueologia, pois no
seu exercício evidencia-se seu caráter intrinsecamente multidisciplinar. Oriunda das
ciências humanas, a arqueologia incorpora o arcabouço teórico-metodológico destas,
mimetizando-se, segundo a ênfase, em uma arqueologia social ou arqueologia política.
É uma ciência histórica quando privilegia a diversidade das sociedades humanas no
tempo e uma ciência antropológica quando se volta para a diversidade humana no
espaço. A interdisciplinaridade com a etnologia e etnografia gerou um novo ramo de
conhecimento, a etnoarqueologia, resultado da recorrente busca de explicações para as
evidências arqueológicas na analogia etnográfica. Segundo Renfrew & Bahn, (1993)
etnoarqueologia é o estudo das culturas contemporâneas com o fim de compreender as
relações de comportamento que subjazem a produção da cultura material e a diferença
fundamental é que agora são os arqueólogos que pesquisam as sociedades vivas. Os
trabalhos de Richard Gould entre os aborígenes australianos (1969), de Richard Lee
entre os !Kung San do sul da África (1972), de Lewis Binford entre os esquimós
Nunamiut (1978), de Ian Hodder entre as tribos da região do lago Baringo (1982), de
Lewis-William sobre o xamanismo na interpretação da arte rupestre na África do Sul
(1986), converteu a etnoarqueologia em um dos avanços mais significativos da
arqueologia antropológica.
No Brasil, esta linha de vanguarda na virada da década de 1980 ganhou adeptos
e a equipe do Museu Paranaense reuniu profissionais que propuseram e apresentaram na
38ª Reunião da SPBC em Curitiba um ‘Programa de formação e pesquisa em
etnoarqueologia no estado do Paraná’ (Gaissler, Neves, Andrade Lima, Wüst, Miller,
Meneses, 1986) que incluiu um curso sobre etnoarqueologia (1987) e a proposta de
18

elaboração de projetos etnoarqueológicos. A disciplina evoluiu e diversos projetos


foram executados. Em 2000, o Núcleo de Pesquisa Arqueológica da UFRGS promoveu
um Ciclo de Conferência sobre Etnoarqueologia (2000) e, em 2002, um volume do
periódico Horizontes Antropológicos foi dedicado a esta área de conhecimento (Silva &
Souza, 2002).
A arqueologia encontra seus arquivos sob e/ou na superfície do solo exigindo
dos arqueólogos o conhecimento de suas propriedades (Pedologia), seja para entender o
porquê as antigas sociedades escolhem um determinado local para viverem (Geografia,
Geomorfologia), seja porque algumas características do solo preservam e outras
destroem os registros (Geologia, Climatologia, Sedimentologia), seja para entender o
porquê do abandono do local e o que aconteceu após o seu abandono = os processos
pós-deposicionais. O método geológico da estratigrafia, junto com alguns fenômenos
resultantes das glaciações do Quaternário, nos permite obter datações relativas, ou seja,
nos dá relações de contemporaneidade, anterioridade e posterioridade entre objetos,
eventos, níveis arqueológicos e geológicos. As ciências da Terra permitem entender a
composição ambiental atual, assim como a análise de paleopaisagens e os processos
diferenciados de adaptação dos grupos humanos ao ambiente. O aporte das Geociências
é tão importante no exercício e na interpretação dos dados arqueológicos que deu
origem a um novo campo científico, a Geoarqueologia (Goldberg & MacPhail, 2006).
Na prospecção arqueológica, a Geoarqueologia provê o arqueólogo com informações
sobre solos enterrados, áreas favoráveis para a ocupação humana e um modelo preditivo
para a locação de sítios. Na escavação, pode contribuir para avaliar o potencial de
conservação do contexto cultural e da estratigrafia arqueológica dentro dos diferentes
depósitos.
Procedem das Ciências Exatas as técnicas que permitem a localização e
ordenação temporal dos fatos que compõem a pretendida reconstrução histórica = a
datação absoluta. Entre os diversos métodos de datação podemos citar o Carbono 14
utilizado para eventos recentes de milhares de anos e o Potássio-Argônio para eventos
que atingem até milhões de anos. As ciências duras auxiliam nas atividades de campo
como, na prospecção, com o uso das técnicas de teledetecção geofisica e na análise do
material arqueológico proveniente das escavações. A análise traceológica obtida através
do microscópio de varredura permite o estudo dos micro-desgastes do material lítico, a
análise dos pigmentos de pinturas rupestres permite conhecer a sua composição, a
análise cerâmica pela ativação dos nêutrons fornece dados sobre a composição dos
19

elementos químicos e permite a identificação das jazidas, a difração do Raio X fornece


uma listagem dos minerais presentes na argila e pode revelar padrões de manufatura e
captar categorias êmicas. A análise com microscópio polarizado permite a contagem
qualitativa e quantitativa dos elementos minerais e os testes químicos podem detectar
vestígios orgânicos como através da espectroscopia infravermelha (açúcar, peixe,
pinturas orgânicas, vinho); do gás cromatográfico (leite, manteiga, óleo de oliva, peixe,
porco); da espectrometria de ressonância magnética do próton (menos comum), entre
muito outros (Wüst, 1996). A intersecção destas áreas de conhecimento deu origem a
um novo campo, a Arqueometria, termo criado em Oxford em 1958 (Hackens, 1997).
Nos sítios arqueológicos encontramos, além das estruturas e de artefatos, os
chamados ecofatos: os restos vegetais (sementes, grãos, raízes, caules, frutos, madeira, e
carvão) estudados pela Botânica e os restos ósseos de animais estudados pela Zoologia.
Os ecofatos nos contam como era a dieta alimentar dos grupos humanos estudados. A
subsistência, a necessidade mais elementar de todas, é um dos campos da arqueologia
tecnicamente mais avançado. Para questões mais complexas como a dieta alimentar
(que implica um padrão de consumo durante um longo período de tempo), alguns
métodos centram-se nos ossos humanos: as análises isotópicas dos esqueletos de uma
população humana podem indicar p.ex., o balanço dos alimentos marinhos ou terrestres
de sua dieta e inclusive mostrar as diferenças nutricionais entre os membros mais
avantajados da mesma sociedade. Entretanto, a maior parte de nossa informação sobre
subsistência primitiva procede diretamente dos restos do que foi consumido, estudados
por novos campos do saber das Biociências como a zooarqueologia e a paleobotânica
que recuperam não somente as espécies consumidas, mas o modo pelo qual elas foram
manipuladas. A interpretação dos restos de alimentos requer procedimentos bastante
sofisticados, pois a única prova inquestionável de que uma espécie vegetal ou animal foi
realmente consumido é a presença de suas provas nos conteúdos estomacais ou em
coprólitos (fezes fossilizadas). Em todos os demais casos temos que deduzí-lo do
contexto ou das circunstâncias do achado como um grão carbonizado em uma fogueira,
ossos cortados ou queimados ou resíduos em uma vasilha (Renfrew & Bahn, 1993).
As Ciências Biológicas, além da longamente utilizada antropologia física e
paleoantropologia que nos conta a trajetória evolutiva humana, desenvolveu novas
linhas interpretativas nos campos da paleopatologia e da paleoparasitologia. A
paleopatologia, através da análise dos restos esqueletais humanos, de fatores
bioculturais e ambientais, permite discutir os processos tafonômicos num sítio
20

arqueológico, definir mudanças populacionais ao longo do tempo, demarcar atividades


físicas, tensão social, estilo de vida, dieta e indicar práticas culturais ligadas ao ritual da
morte e seus desdobramentos (Mendonça de Souza, 1999). A paleoparasitologia, através
da técnica de reidratação dos coprólitos, mostra que os achados de parasitos em material
arqueológico trazem contribuições importantes para teorias de migrações humanas pré-
históricas e, através da técnica da biologia molecular, permitiram diagnosticar a
tuberculose e a doença de Chagas em múmias sul-americanas pré-colombianas e
constatar que os parasitos possuem maior freqüência em sociedades sedentárias do que
em nômades (Sianto, Fernandes, Lobo, Ferreira, Gonçalves, Araújo, 2003).
Um último, porém não conclusivo, exemplo da soma profícua da
multidisciplinariedade da arqueologia e de suas particularidades científicas (que fazem o
arqueólogo assemelhar-se a um detetive) é a arqueologia forense. O surgimento de um
novo tipo de direito com a criação dos conceitos de crimes de guerra e de direitos
humanitários instituído com o processo de Nuremberg (1945/46), a procura no governo
de Raul Alfonsín dos desaparecidos da ditadura militar (1983-1984), os genocídios no
Iraque (1991-1992), na ex-Iugoslávia (1993-1994) e Ruanda (1995-1996) entre outros, e
a fundação em 2002 da Corte Penal Internacional, exigiu profissionais com competência
para exumar os corpos. O emprego das técnicas e dos métodos da osteologia
antropológica e da arqueologia está sendo fundamental para esclarecer questões da
história recente através da obtenção de provas e dando aos mortos a possibilidade de
testemunharem as atrocidades de que foram vitimas (Haglund, 2007).
A multidisciplinariedade da arqueologia está a serviço da busca de explicações
para questões locais como a reconstituição da sucessão de sociedades e de seus modos
de vida em um determinado território, assim como para questões mais amplas como o
surgimento do homem e a reconstituição de sua trajetória sobre o nosso planeta. Além
disso, serve ao entendimento de temas transversais, como o colapso/abandono das
grandes civilizações, cuja explicação mais recente enfatiza a reorganização/mudança
das relações ecológicas e sociais, usando a emergente perspectiva da teoria da
resiliência (Nelson, Hegmon, Kolov, Schollmeyer, 2006). Independente da aplicação da
“teoria do caos” ou de “modelos não lineares” para interpretar o registro arqueológico,
as explicações mais convincentes estão justamente na intersecção de numerosos fatores
e de diversos campos do saber.
Portanto, através da aplicação dos avanços científicos realizados nestes campos
de conhecimento, as limitações inerentes à disciplina arqueológica são minoradas e os
21

alcances interpretativos são potencializados. O quadro abaixo sintetiza as interações


entre as diferentes áreas do conhecimento.

Ciências Humanas Ciências da Terra

Arqueologia enquanto História Arquivos no solo – Estratigrafia


(ênfase na diacronia) = Arqueologia Reconstituição ambiental através da
pré-histórica, histórica (oriental, sedimentologia, geologia,
clássica, moderna, contemporânea) geomorfologia, geografia –
Análise de paleopaisagens e
Arqueologia enquanto Antropologia processos diferenciados de adaptação
(ênfase na sincronia) Cronologia relativa: estratigrafia e
estruturas pleistocênicas
Intersecção de áreas de
conhecimento: Etnoarqueologia, Interseção de áreas de conhecimento:
Geoarqueologia

Arqueologia

Ciências Biológicas Ciências Exatas

Estudos dos ecofatos: macro restos Métodos físico-químicos para obter


vegetais = botânica, microflora = datação absoluta
palinologia, restos animais = zoologia
Análises bioquímicas: fosfatos,
Antropologia Física: restos ósseos cálcio, sedimentos, etc.
humanos = Anatomia Comparada,
Fisiologia, Genética
Intersecção de áreas de
Intersecção de áreas de conhecimento: Arqueometria (ex:
conhecimento: Paleobotânica, análise da cerâmica através da
Zooarqueologia, difratometria do Raio X, traceologia
Paleopatologia,Paleoparasitologia do lítico através do microscópio de
= Bioarqueologia varredura, análise de pigmentos de
pinturas)
22

O processo de construção dos dados na arqueologia brasileira

Considerando que os dados são gerados pelos arqueólogos, devemos levar em


conta a influência dos contextos históricos, sociais e políticos específicos nos quais
estão inseridos os pesquisadores e as suas escolhas por determinados métodos de
trabalho. Aqui desejamos relacionar as diversas práticas interpretativas, teórica e
metodologicamente embasadas, desenvolvidas na produção do conhecimento, com
aquelas que se efetuaram no contexto da arqueologia brasileira da última metade do
século passado. Considerando aspectos como as diversas ênfases ou unidades de
análise, as metodologias utilizadas em campo e laboratório, o entendimento das relações
homem versus natureza, o alcance interpretativo e conhecimento produzido,
identificamos três momentos diferentes na construção dos dados arqueológicos: a
corrente empirista evolucionista e histórica culturalista, a corrente
processualista/positivista e a corrente pós-processualista/interpretativista.
O empiricismo evolucionista e histórico culturalista:
Predominantes nas décadas de 1960 e 1970, as tendências empiricista
evolucionista e empirista histórico culturalista2 colocam a ênfase das análises nos
artefatos e possuem como objetivo recolher uma quantidade significativa de objetos em
um grande número de sítios e, no caso dos pesquisadores que atuaram ou adotaram as
premissas do Programa Nacional de Pesquisas Arqueológicas (PRONAPA), classificá-
los em fases e tradições arqueológicas. Assim, para os evolucionistas, o simples achado
de algumas pontas de projétil entre centenas de outras peças líticas era suficiente para
intuir o seu uso para atividades de caça e, portanto, concluir que se tratava de
sociedades caçadoras e coletoras de vegetais. As pontas eram consideradas o fóssil-guia
ou o elemento diagnóstico e o seu uso e seu estilo tecnológico definiriam o tipo e o
nível de desenvolvimento da sociedade sob investigação. Com raras exceções, os
demais artefatos e restos de debitagem não eram considerados e, muitas vezes, somente
contabilizados. Nesta abordagem, os artefatos tinham uma natureza passiva, eram vistos
como conseqüência da ação humana ou, ainda, como um mero reflexo do seu
comportamento.

2
Estas duas correntes possuem corpos teóricos diametralmente opostos, entretanto, como na arqueologia
brasileira as duas foram colocados em prática no mesmo período e usados de forma combinada por alguns
profissionais, discutiremos sob o mesmo título.
23

O trabalho de campo arqueológico constituía um registro objetivo de dados,


como uma simples observação de informações na qual o sujeito – o arqueólogo que
trabalha em campo – é visto como um fornecedor e não como um produtor dos dados
(Hodder, 1999; Berggren e Hodder, 2003). Através de numerosas prospecções rápidas
com coleta de material de superfície para ser estudado como amostras e de cortes
estratigráficos realizados no centro das estruturas ou do sítio (era presumido que
qualquer parte do sítio era típica do conjunto) buscavam obter cronologia. Quanto mais
artefatos e sítios conhecidos, mais dados eram fornecidos, assim havendo um grande
acúmulo de peças para a montagem do quebra-cabeça de “reconstruir o passado” 3.
A análise laboratorial privilegiava, entre os artefatos, os instrumentos e através
da tabulação dos seus atributos criavam-se tipos de instrumentos (método tipológico)
que eram comparados entre si (método comparativo) e com o material de outros sítios.
Para obter cronologia relativa, os atributos e os tipos de artefatos eram seriados
(seriação de ocorrência e de freqüência) (Trigger, 2004: 194).
O alcance interpretativo da aplicação desta abordagem era limitado aos fatores
econômicos e sociais definidos a partir dos artefatos: quando eram achados somente
artefatos líticos tratava-se de sociedades de caçadores e coletores, quando aparecia
cerâmica, os grupos humanos eram detentores da horticultura ou agricultura. Através do
uso da analogia etnográfica com sociedades de caçadores e coletores e agricultores do
período colonial inferiam a forma de organização social e associavam as culturas
arqueológicas a grupos étnicos específicos. O meio ambiente físico era semelhante ao
atual e servia como cenário ou determinava as ações humanas. Enfim, o principal
objetivo era obter seqüências espaço-temporal dos artefatos para definir culturas
arqueológicas e procurar as suas origens recorrendo a fatores externos como difusão e
migração para explicar as mudanças no registro arqueológico. A primazia eram os
dados empíricos e as reflexões teóricas estavam implícitas.
O processualismo positivista:
Nas décadas de 1980 e 1990 observamos uma gradual adoção das tendências
processualistas/positivistas e neo-evolucionistas onde, concebendo a arqueologia como
uma ciência social, a abordagem teórico-metodológica deveria sempre estar explicitada.

3
O tipo de coleta do material arqueológico e a idéia de reconstruir o passado estão relacionados com a
abordagem histórica culturalista, onde o conceito de cultura, adotado por Franz Boas, seria de um padrão
de normas mantido implicitamente pelos membros da cultura e obtida através da tradição e difusão.
24

A partir do surgimento da vertente processual na arqueologia em alguns países,


principalmente nos Estados Unidos (Binford, 1962, 1968), algumas coisas começaram a
mudar na elaboração dos dados arqueológicos. A partir de uma visão sistêmica da
cultura, emprestada dos funcionalistas e neo-evolucionistas, a arqueologia se julgava
capaz de desvendar sistemas e processos sociais, políticos, econômicos e mesmo
ideológicos, desde que se empregassem métodos e técnicas analíticas adequadas. A
meta principal consistia na busca de leis gerais de comportamento.
O trabalho de campo passou a ser encarado como uma atividade bem planejada,
com projetos bem definidos e voltados para responder problemas de pesquisa sobre o
passado. As coleções começaram a ser obtidas a partir de rigorosos métodos de
amostragens regionais, prospecção intensiva e escavação seletiva, tratadas com testes
estatísticos para permitir generalizações. Porém, embora aceitando que os dados não
eram por si só evidentes e que a teoria era necessária, esta nova abordagem continuava
defendendo os dados como objetivos, observados pelo arqueólogo a partir de uma
neutralidade científica. Esta forma de ver as coisas foi influenciada pelo enfoque
positivista, baseado na objetividade e na neutralidade do profissional na realização das
pesquisas.
Os arqueólogos adeptos desta corrente teórico-metodológica passaram a registrar
de forma sistemática os locais onde os artefatos eram encontrados (grande importância
era dada ao contexto), a realizar mapas da distribuição espacial dos objetos para
procurar áreas de atividades diferenciadas dentro dos sítios (análise intra-sítios) e a
verificar a sucessão estratigráfica, pois a maior preocupação estava em explicar como
ocorriam as mudanças de um modo de ocupação para outro, a dinâmica ou processo
cultural. A distribuição espacial dos sítios e sua forma de implantação no relevo
permitiram verificar padrões de assentamento dos grupos humanos na paisagem (análise
inter-sítios), a qual era vista como também se alterando com a passagem do tempo. O
estudo das paleopaisagens mesuraria o grau de adaptação dos grupos humanos ao
ecossistema (um dos produtos da aplicação da teoria dos sistemas na interpretação dos
dados).
Segundo Trigger (2004:198), o objetivo principal de semelhante pesquisa era
reconstruir uma impressão visual da vida no passado: como eram as casas, que tipo de
roupas as pessoas vestiam, que utensílios usavam e em que atividades se envolviam.
Para tanto, toda a informação era importante e todos os dados deveriam ser recolhidos
sejam os dejetos de debitagem sejam os remanescentes da fauna e da flora. Em
25

laboratório, propostas metodológicas de análises tecno-funcionais privilegiaram os


restos de debitagem ignorados até então. A tabulação das séries de atributos permitiu
tratamentos estatísticos elaborados.
O tratamento dos sítios como objeto analítico permitiu verificar padrões de
assentamentos e as análises regionais levaram a identificar sistemas de assentamentos,
bem como a discutir questões de contato cultural e áreas de fronteiras. Este novo
enfoque, baseado na compreensão sistêmica do comportamento humano e na análise
espacial dos eventos (hierarquia no uso do espaço) aumentou sensivelmente o alcance
interpretativo da arqueologia, acrescentando à reconstituição da economia dos grupos
humanos pretéritos, a sua organização social e política.
O pós-processualismo interpretativista4:
O contextualizar
A unidade de análise desta corrente não são os artefatos ou os sítios
arqueológicos, mas sim o contexto. O contexto aqui não é considerado, como na
corrente processualista, o meio ambiente ou o espaço que abriga os artefatos, os sítios
ou uma cultura. O contextualizar é compreendido como o ato de entrelaçar, conectar as
coisas, os lugares, as pessoas. Um objeto ou um sítio arqueológico nunca significa nada
por si mesmo, mas sim uma teia de relações com outras coisas que compõem um
contexto, um campo de significações (Thomas, 1996).
A interpretação arqueológica requer que as coisas sejam relacionadas com outras
para fazer sentido ao que restou do passado. Desta maneira, um artefato sem
proveniência tem valor limitado, visto que os significados somente podem ser
abordados se os contextos de uso são considerados, se as diferenças e as semelhanças
entre as coisas são levadas em conta (Hodder, 1986). A interpretação do significado será
alcançada quanto mais ricamente forem tramados os dados, uma vez que uma grande
quantidade de informações permite descobrir mais semelhanças e diferenças entre os
materiais. Assim, a análise contextual implica movimentos constantes entre teoria e
dados, entre objetos e contextos (Hodder, 1992).
A partir do momento em que os contextos dos objetos são conhecidos eles
deixam de ser completamente mudos, pois as associações que estabelecem com outros

4
Há diversas correntes sob o cognome de arqueologias interpretativas, algumas incompatíveis entre si
como a marxista e a teoria da desconstrução. Nossa intenção não é discorrer sobre elas, porém cabe
lembrar que esta linha teórica deu voz aos segmentos minoritários (mulheres, escravos, índios, etc.)
trazendo o conflito social como um tema privilegiado.
26

elementos fornecem as chaves para sua significação. Neste sentido, toda interpretação
deste tipo de conteúdo se vê restringida pela análise do contexto (Hodder, 1986).
Tendo em vista que a arqueologia é uma disciplina histórica, é importante
considerar que todas as ações humanas são localizadas em contextos históricos que são
específicos para cada cultura. Assim, quando se analisa alguma relação estabelecida
entre uma cultura material e um grupo de pessoas, necessariamente deve-se inseri-la
dentro do contexto histórico e cultural específico5. Apenas para exemplificar, os objetos
têm atributos materiais universais, como um machado para cortar árvore
necessariamente deve ser elaborado com uma determinada matéria-prima e deve
apresentar marcas de uso específicas com a realização desta atividade. Entretanto, este
mesmo machado está ligado a um contexto histórico particular, no qual pode estar
associado a esqueletos femininos em um enterramento. Neste sentido, significa mais do
que uma ferramenta utilitária, pois remete a outro tipo de significação, vinculada a
questões como gênero (Hodder, 1992).
Dando significado à cultura material ou ‘o colocar em palavras o que não é verbal’
O contextualizar é dar significado a cultura material. Cultura material é o termo
comumente utilizado nesta e em outras disciplinas para se referir aos produtos materiais
da ação humana, os quais são as principais fontes que conduzem à presença humana no
passado mais remoto. Refere-se à transformação da matéria inerte em um objeto
cultural. Desta forma, toda prática de indivíduos é escrita e impressa no mundo com as
coisas (Shanks e Tilley, 1987). De acordo com Glassie (1999), a “cultura material é
cultura feita material”, começando necessariamente com as coisas, mas não terminando
com elas, o estudo da cultura material usa os objetos para abordar o pensamento e a
ação humana. Na troca com a natureza, homens e mulheres fazem coisas, deixam rastros
na terra, estas são as coisas da cultura material (Glassie, 1999: 41-44).
Conforme Hodder (1992) a cultura material é fascinante para muitas pessoas
pelo seu caráter dual, uma vez que aproxima elementos de ciências distintas. Abarca as
ciências sociais (humanas) e as naturais (exatas) num mesmo conceito, que captura esta
dualidade. As primeiras preocupam-se com os significados conceituais que não são
puramente abstratos e que existem em relação a uma determinada cultura, enquanto que
as últimas ocupam-se de analisar as características físicas dos objetos, suas propriedades
materiais observáveis. Logo, o arqueólogo depara-se com uma fonte de estudo que é

5
É oportuno ressaltar que, em contraposição à corrente anterior que pretendia identificar leis gerais, esta
abordagem possui uma natureza particularizante.
27

uma conjunção de elementos abstratos e concretos presentes em todas as culturas,


representadas contemporaneamente pelos objetos materiais.
Além disso, diferentemente de outras formas de expressão cultural, os objetos
têm uma maneira própria de expressar-se. Entender a cultura material vai além de
interpretar uma linguagem, por exemplo, porque relata pensamentos e ações que
resistem à formulação verbal (Glassie, 1999). Assim, a significação da cultura material
é difícil de ser colocada em palavras, como destaca Glassie, “... o artefato tem seu
próprio meio de significar, e em apreendê-lo começamos a ouvir vozes nas coisas, gritos
dos deuses atrás dos vidros dos museus. Então aceitamos a estranha responsabilidade de
colocar em palavras o que não é verbal” (Glassie, 1999:47).
Glassie (1999) propõe um modo de esquematizar a variedade contextual e
organizar as categorias de informação dentro das quais os artefatos absorvem
significância específica. Seu método compreende em considerar as coisas como textos,
conjuntos de partes, nos quais os significados são trazidos quando os colocamos de
volta aos seus contextos e os analisamos como partes de conjuntos. Um texto, um
objeto, um sítio não tem apenas um contexto - têm muitos a cada movimento de
associação. Dentro desta metodologia de análise, este autor sugere que os artefatos
absorvem significância ao visionar contextos enquanto séries de ocasiões pertencendo a
três classes mestres – criação, comunicação e consumo – as quais foram arranjadas por
este autor, desta maneira, para contar de forma cumulativa as histórias de vida dos
artefatos.
Portanto, a cultura material é constituída por significados. Não é um reflexo
direto do comportamento humano, pois existem idéias, crenças e significados
interpostos entre as pessoas e as coisas, estruturados em relação a processos sociais
(Hodder, 1982, 1986, 1992). Durante o processo de modificação da matéria natural em
produto cultural, significações surgem no desencadeamento das relações entre os
sujeitos e os objetos.
Os significados podem ser entendidos como a soma dos relacionamentos entre as
pessoas e as coisas (Glassie, 1999). Não fornecem um espelho para as condições
materiais de existência e para as relações sociais para reprodução social, pois são
constitutivos desta existência e, desta maneira, não estão amarrados aos objetos. Por
este motivo, como afirma Thomas, os significados abstratos não devem de forma
alguma ser separado da materialidade dos objetos, exatamente porque eles são
constitutivos deste mundo material (Thomas 1995, 1996).
28

Os envolvimentos entre os seres humanos e os objetos estão constantemente em


movimento. Há uma pluralidade de significados presentes na vida cotidiana, na medida
em que os artefatos significam diferentes coisas para diferentes pessoas e são
comumente reavaliados e repensados com o passar do tempo. Deste modo, não são
somente propriedade do passado, em razão de que também tem uma existência
significativa no presente (Thomas, 1996). As pessoas geralmente incorporam itens
materiais produzidos em outros períodos de tempo estabelecendo significados muitas
vezes diferentes daqueles que eles possuíam em outras sociedades, em outras culturas.
Em resumo, a cultura material possui múltiplos significados de acordo com as
pessoas (codificações culturais, inconscientes, significados não intencionais), com o
contexto e com o tempo, e não são produtos de necessidades práticas ou de ações dos
indivíduos que a originaram, mas sim significados simbólicos e ideológicos que
excedem os elementos físicos e externos.
O caráter ativo das coisas, das pessoas, dos lugares.
Os seres humanos são sujeitos ativos. Produzem objetos não apenas para
subsistir, mas igualmente para formar, manter e transformar relações sociais complexas.
Os artefatos, de forma similar, desempenham um papel ativo na constituição da
sociedade, pois também estão envolvidos nas práticas sociais. São necessários para
compor as relações entre os indivíduos, bem como para mantê-las sendo de grande
relevância, pois podem armazenar e preservar informação de ordem social, formando
assim um componente da realidade.
Os lugares constituem locais de significados humanos. Toda existência humana
envolve existência em algum lugar. As relações estabelecidas entre as pessoas e as
coisas sempre ocorrem em um determinado local. Os indivíduos, de um modo geral,
ligam-se aos espaços de diferentes formas, de diversos sentidos, tornando-os
significativos em virtude de seu envolvimento humano com eles.
Os arqueólogos tradicionalmente dirigem atenção aos espaços, aos lugares, às
paisagens que possuem alguma relação com a vida das pessoas que existiram
remotamente. Espaço é um termo comumente utilizado na arqueologia para se referir de
um modo geral aos locais relacionados à habitação humana. Segundo autores associados
às abordagens pós-processuais como Tilley (1994) e Thomas (1996), o espaço não é um
pano de fundo passivo, mas sim uma entidade ativa e complexa em relação às vidas
humanas. É formado por relações sociais estabelecidas entre os indivíduos e entre os
29

indivíduos e os objetos culturais. Neste sentido, pode ser visto como socialmente
produzido pelas pessoas, estando sempre centrado em relação à atividade humana.
Thomas (1996) sugere a utilização do termo lugar para referir-se aos locais
relacionados a um mundo humano. Para ele, o espaço pode ser transformado em um
lugar pela ação humana, ao serem usados e consumidos e, igualmente, por
envolvimento em estruturas de pensamento. Não é necessário, todavia, que este seja
alterado fisicamente para que isso aconteça. Os lugares envolvem uma paisagem
específica, um conjunto de atividades sociais, teias de significados e rituais – todos
inseparavelmente entrelaçados.
Como os seres humanos que viveram no passado não habitam mais os lugares, é
preciso colocá-los de volta através das análises arqueológicas, incluindo-os nas
interpretações (Thomas, 1996).
O papel ativo do pesquisador
O conhecimento sobre o passado é sempre produzido de forma ativa pelo
pesquisador, um sujeito ativamente interpretante que faz constantemente perguntas de
uma forma dinâmica à cultura material. O arqueólogo, portanto, é um sujeito real que
escava e pensa sobre um passado que também é real (Shanks e Tilley, 1987). A
escavação e a análise dos artefatos, como vimos anteriormente, são em essência
atividades de construção de elementos sobre o passado, que embora tenham uma
materialidade empírica real, trata-se de formas de representação dos fatos realizadas no
presente.
Segundo Shanks e Tilley (1987) um passado observado é um passado
problemático, no sentido de que concebe a arqueologia como uma observação de
objetos separados do observador. No entanto, parece-nos claro que as fontes materiais
arqueológicas são constituídas na prática, uma vez que os sítios são escavados.
A partir da proposta de Hodder (1999) de ‘escavar de forma contraditória’, de
um modo alternativo aos paradigmas amplamente difundidos na arqueologia,
concordamos com o fato de que a interpretação ocorre em toda a prática de campo, pois
descrever e medir são atos interpretativos. O próprio registro arqueológico já seria uma
leitura, em razão de que diz respeito ao que o pesquisador vê em vez do que
simplesmente há (Barker, 1989: 146 apud Hodder, 1999: 692). Da mesma forma, os
métodos selecionados para a escavação dependem do entendimento a priori do sítio, da
mesma forma que do conhecimento prévio do arqueólogo ou dos arqueólogos
responsáveis. Logo, ambos os métodos de escavação e de registros de dados dependem
30

da forma como as coisas são vistas pelos profissionais. Acreditamos que devemos tentar
acabar com as barreiras que opõem interpretação e prática e, ao fazermos isto,
acabaremos aceitando o papel central da interpretação no real processo de construção
dos dados.
O investigador deve ser capaz de afirmar ‘isto é a minha forma de compreender
as coisas’ e não se esconder atrás da descrição objetiva de artefatos. Como a escavação
é uma atividade produtiva de dados, mas também destrutiva, ela mostra-se como o
melhor momento para serem exploradas visões alternativas sobre os dados. Cabe então
fazer com que este trabalho seja produtivo e esteja aberto a outras formas de dar sentido
ao passado.
Com o resgate da cultura material encontrada sob determinada orientação
metodológica, o pesquisador investiga estes objetos em laboratório com o intuito de
obter um conjunto de dados. Para Tomaskova, os vestígios pré-históricos recuperados
(...) podem somente se tornar dados através da representação por meio de algumas
convenções relativamente pertinentes na documentação. Os métodos produzem um
produto específico, tangível e muito real - um banco de dados que pode ser controlado,
examinado e comparado por outros investigadores. (Tomaskova, 2003:496)
Certamente a classificação é o método mais conhecido e aplicado na arqueologia
para o estudo dos artefatos, o qual se baseia em determinadas convenções para guiar a
análise. Há várias formas de classificar os objetos, mas todas elas baseiam-se em
convenções, atributos escolhidos de acordo com a aplicação de uma metodologia
específica, a qual está sempre situada num contexto também particular. Assim,
conforme Tomaskova (2003:50), tais convenções “não são regras infinitas, mas acordos
bastantes locais baseados numa lógica particular”.
Uma leve variação nos aspectos valorizados, até mesmo num nível básico de
tamanho, é capaz de produzir padrões bastante diferentes de dados. Um exemplo disto
pode ser encontrado na classificação tipológica de artefatos líticos, que dá primazia aos
instrumentos na representação dos fatos pré-históricos. Outros vestígios abarcados em
outras formas de estudo representariam uma gama mais ampla de ocorrência de
transformações naturais e culturais num sítio, e assim constituiria um banco de dados
mais inclusivo para a reconstituição de toda a história da ocupação humana no lugar
estudado (Tomaskova, 2003).
31

A elaboração de discursos arqueológicos

A arqueologia é uma meta-linguagem do passado. Compreende a realização de


pesquisas empíricas que resultam na descoberta e no estudo de objetos materiais da
mesma forma que resulta na escrita sobre esta cultura material, na sua transcrição em
palavras. Estuda as coisas elaboradas pelos seres humanos no passado através da
linguagem escrita, tornando-as inteligíveis de outra maneira ao serem transferidas para
os textos (Olsen, 1990).
Ao conceber o conhecimento arqueológico enquanto uma forma de discurso
sobre o passado através da escrita dos textos, Tilley defende que a arqueologia não é
“ler os sinais do passado, mas um processo de escrever estes sinais no presente” e
salienta que a arqueologia trata-se de uma prática que vai além de ler o passado,
representado pela cultura material, uma vez que o produz ao escrever sobre ele,
elaborando os discursos arqueológicos (Tilley, 1989, Tilley, s./d).
Os objetos materiais são modificados com a escrita e tornam-se objetos
discursivos nos textos, que compreendem afirmações, conceitos, problemas forjados
pelos arqueólogos. Este processo de colocar as coisas nos textos pode ser visto ao
mesmo tempo como uma violência a estas coisas e como um exercício produtivo e
criativo.
Antes de serem transformados, os artefatos são objetos com uma pluralidade de
significados, são coisas com uma materialidade física e real elaboradas pelas pessoas no
passado. Depois de transcritos, estes mesmos artefatos tornam-se textos de estrutura
argumentativa teórica com conotações materiais (Shanks e Tilley, 1987). No texto
escrito, os objetos aparecem na forma pela qual foram entendidos pelo autor, em uma
determinada conjuntura. Um exemplo disto pode ser percebido na forma em que os
autores vinculados à vertente processual e pós-processual criaram seus próprios objetos
discursivos – os primeiros como objeto adaptativo e os últimos enquanto parte de um
sistema significativo (Tilley, 1990).
Um texto escrito, do mesmo modo que as outras formas de representação da
realidade passada, não deve ser entendido nem como uma expressão direta do real nem
como divorciado dele. Da mesma forma nunca abarca todas as relações entre a cultura
material e as pessoas que a produziram, pois sempre há seleções e escolhas realizadas
pelo autor. É neste sentido que Tilley caracteriza os textos arqueológicos enquanto
32

‘artefatos contemporâneos’, visto que são ativamente construídos pelo arqueólogo no


presente (Tilley, 1998).
O leitor, por sua vez, não é um consumidor passivo do conhecimento, pois
auxilia a criá-lo dando outros significados ao relato, entendendo-o de uma forma
particular (Tilley, s./d). O autor está fazendo claramente uma referência ao estudo da
cultura material através da metáfora do texto, discussão inicialmente suscitada pelo
trabalho Reading the Past, de Hodder (1986) onde, ‘ler a cultura material’ da mesma
forma que um texto escrito, permitiria a cultura material ser lida e interpretada de várias
maneiras, possuindo não apenas um, mas vários significados.

Finalizando: a produção do conhecimento sobre o passado no presente

Como procuramos mostrar até aqui, defendemos a arqueologia enquanto uma


prática interpretativa, desenvolvida por atividades de campo e de laboratório (com o
rigor processualista) que resultam na produção de dados e de discursos arqueológicos e,
que desta forma é responsável por construir socialmente e de forma ativa o passado no
presente.
Entretanto, ao mesmo tempo em que concordamos com a idéia de que o passado
é construído socialmente no presente, ressaltamos que tal processo somente é possível
de ser realizado com base nos objetos materiais, os quais têm uma materialidade
empírica que deve ser levada em consideração. Não podemos aceitar o relativismo
extremo da moda pós-moderna. Neste sentido, pelo fato de que os arqueólogos realizam
suas pesquisas através da cultura material, acreditamos que não há um idealismo no
sentido de que o passado é inventado. Como afirmam alguns autores, este de alguma
forma pode resistir às construções modernas, restringindo o que se pode dizer sobre ele
e permitindo a determinadas teorias se ajustarem melhor ou não (Hodder, 1992; Shanks
e Tilley, 1987; Tilley, s./d). Logo, torna-se perigoso para o arqueólogo defendê-lo
somente como tendo sido construído no seu tempo, pois acaba correndo o risco de
fechar-se na perspectiva do presente, negando assim, a existência de tudo que aconteceu
remotamente e que é comprovado pela presença das evidências materiais.
Certamente é difícil para uma ciência humana, como a arqueologia, afirmar com
certeza tudo o que aconteceu no passado. Esta é uma questão que deve incomodar a
maioria dos que trabalham nesta área, os quais certamente já se perguntaram se os
resultados de seu trabalho condizem com a realidade passada, se conseguiram alcançar
33

os significados contidos nos objetos ou se podem afirmar alguma coisa com grau
elevado de certeza sobre os eventos passados. Após refletir bastante sobre esta questão,
percebemos que este debate gira em torno de dar ou não dar certezas, e é exatamente
neste ponto que nos parece oportuno que a questão deva ser discutida.
Uma vez que se conceba esta disciplina como uma ciência social produzida por
pessoas no presente, que de forma ativa constroem o conhecimento sobre o passado, tais
dúvidas parecem ficar mais claras. As certezas que podem ser dadas, a nosso ver, são de
que pessoas viveram no passado remoto e elaboraram coisas - objetos reais em
determinados locais - os quais foram trocados, usados, descartados. Cabe aos estudiosos
partir dessas e de outras informações para realizar suas pesquisas e elaborar suas
interpretações na tentativa de atribuir significados. Uma perspectiva contextual pode
auxiliar nesta tarefa, pelo fato de que, ao estabelecer relações entre os vestígios
materiais, o investigador pode aproximar-se das significações contidas nos objetos.
Tilley (s./d) propõe que para manter uma posição materialista e defender o
passado como uma construção, algo socialmente produzido e feito aqui e agora, no
presente, este assunto deve ser abordado a partir de três materialidades que estão
intrinsecamente entrelaçadas: a materialidade do passado (a realidade física dos objetos
materiais), a materialidade do presente (a partir de onde é produzido o conhecimento
sobre o passado pelo arqueólogo) e a materialidade do processo de produzir discursos (a
escrita de textos sobre o passado no presente).
Ao considerar estas três instâncias da materialidade, o arqueólogo respeita a
existência material dos objetos e a sua relação com o tempo remoto e também situa a
sua produção enquanto historicamente e socialmente situada no período em que se
encontra. Ainda, ressalta a importância de compreender os textos arqueológicos
enquanto formações discursivas, elaboradas pelo investigador no seu contexto atual. Tal
forma de ver as coisas permite que a arqueologia seja reconhecida em toda sua
complexidade, pois os relatos realizados sob esta abordagem são “construções que não
são menos reais, sinceras ou autênticas por serem construídas”, pois são frutos de uma
ciência social (Hodder, 1992).

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« Cette pratique [l’archéologie], sur le terrain, est faite de laborieuses négociations


avec les aménageurs susceptibles de détruire un site archéologique, de fouilles
minutieuses et souvent ingrates par tous les temps, de longues analyses en laboratoire
et de dépouillements de listings, d’austères rapports documentaires, de publications fort
savantes... Peu de sciences humaines ont un rapport aussi déséquilibré entre le temps
d’accumulation de l’information et celui du traitement et de la synthèse. D’une certaine
façon, vingt années de fouilles systématiques sur un site équivalent un peu, pour
l’historien, à prende simplement un registre d’archives sur un rayonnage ».
DEMOULE, J-P, 2007.

Silvia Moehlecke Copé, doutora pela Universidade de Paris I Panthéon Sorbonne, é


coordenadora do Núcleo de Pesquisa Arqueológica – NuPArq do Depto de
História/IFCH e fundadora e coordenadora do Museu de Arqueologia e Etnologia –
MUAE/IFCH, professora de Pré-história geral, Pré-história americana, Pré-história
brasileira e Arqueologia I e II.

Carolina Aveline Deitos Rosa, graduada em História pela UFRGS e mestre em História
pela PUCRS, é pesquisadora do Núcleo de Pesquisa Arqueológica – NuPArq do Depto
de História/IFCH/UFRGS.

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