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29/04/2019 Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra

Acórdãos TRC Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra


Processo: 210/08.2TBLMG-B.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: ARLINDO OLIVEIRA
Descritores: INSOLVÊNCIA
GRADUAÇÃO DE CRÉDITOS
INCUMPRIMENTO DEFINITIVO
CONTRATO PROMESSA DE COMPRA E VENDA
DIREITO DE RETENÇÃO
CASO JULGADO
Data do Acordão: 04-04-2017
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: COMARCA DE VISEU, VISEU, JUÍZO DE COMÉRCIO
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE REVOGADA
Legislação Nacional: 808º Nº 1 DO CC, 581º DO CPC
Sumário: 1. A afectação prática/económica não se pode confundir com a
afectação jurídica, sendo que apenas esta última poderia relevar
para a qualificação do credor hipotecário como terceiro
juridicamente interessado e para o afastar da eficácia do caso
julgado decorrente do trânsito da sentença que reconheceu ao
promitente-comprador o direito de retenção sobre o imóvel
prometido.

2. Compulsando a matéria de facto considerada como provada, in


casu, parece-nos que, efectivamente, se verificam os pressupostos
para que possa operar a pretendida resolução do contrato
promessa em causa, com base em incumprimento definitivo por
parte dos promitentes vendedores insolventes.
Decisão Texto Integral:

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra


Por sentença proferida em 24 de Abril de 2008, transitada em julgado,
foi declarada a insolvência de A... e B..., identificados nos autos.
Foi fixado o prazo de 30 dias para reclamação de créditos.
De fls. 3 a 7 dos autos veio o Sr. Administrador da Insolvência
apresentar a lista de créditos a que alude o art. 129º do C.I.R.E.
Não foram identificados créditos não reconhecidos.
O “ C..., S.A.”, a que sucedeu o “ D..., S.A.” veio, a fls. 9 e seguintes,
impugnar a lista apresentada no que tange aos créditos reclamados
pelos seguintes credores:
- E... e mulher F...;
- G...e mulher H...;
- I...;
- J...;
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- L.. e mulher M..; e


- “ N..., Lda.”.
Alegando, em síntese, que desconhece se foram pagas as quantias
relativas aos sinais, se as fracções em causa se encontram,
efectivamente ocupadas pelos reclamantes ora identificados, bem como
se os mesmos realizaram as invocadas obras, para além do que
desconhece se estava fixado prazo para a celebração da escritura
definitiva, que os contratos promessa não contêm o reconhecimento
presencial das assinaturas, sendo, por isso, nulos, não se identifica nos
contratos promessa o objecto do negócio, o que acarreta a respectiva
nulidade e que a hipoteca tem de prevalecer sobre o direito de retenção,
sob pena de violação do artigo 2.º da CRP.
Estes vieram contestar a impugnação deduzida: G...e mulher H... a fls.
40 e seguintes; E... e mulher F..., I...e J... a fls. 71 e seguintes; “ N...,
Lda.” a fls. 224 e seguintes; e L.. e mulher M..a fls. 231 e seguintes, em
síntese, por serem titulares do direito de retenção, sobre a fracção que,
cada um deles ocupa, devidamente identificadas em cada um dos
contratos promessa celebrados, que haviam prometido comprar aos
insolventes, tendo pago as quantias que alegam, a título de sinal, que
ocupam, desde as referidas datas e tendo realizado obras na fracção
que, cada um dos reclamantes ocupa, no que despenderam as quantias a
tal título mencionadas, o que lhes confere o direito a ser-lhes
reconhecido o referido direito de retenção, a ser graduado no lugar que
lhe compete, tendo por referência a fracção que, cada um deles ocupa.
O “ C..., SA” a que sucedeu o “ D..., S.A.” pronunciou-se sobre os
documentos juntos pelos credores impugnados (fls. 264 e seguintes).
O “ C..., S.A.” a que sucedeu o “ D..., S.A.” veio desistir da
impugnação do crédito “ N..., Lda.” (fls. 547), a qual foi homologada
(fls. 550).
Foi proferido despacho saneador, no qual se decidiu improcedente a
questão da nulidade dos contratos-promessa por vício de forma,
invocada pelo D... e se identificou o objecto do litígio e organizaram-se
os temas da prova.
Teve lugar a audiência de julgamento, com gravação dos depoimentos
nela prestados, após o que foi proferida a sentença de fl.s 480 a 503 v.º
(existe um erro de paginação, uma vez que de fl.s 848 se volta 349),
na qual se fixou a matéria de facto dada como provada e não provada e
respectiva fundamentação e a final, se decidiu o seguinte:
“Nesta conformidade, e pelo exposto, o tribunal decide:
- Homologar a relação de créditos reconhecidos apresentada pelo
Senhor Administrador da Insolvência a fls. 3 a 6 do presente apenso, à
excepção da natureza do crédito da “ N..., Lda.” que tem a natureza de
comum, pelas razões expostas.

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- Sem prejuízo do pagamento precípuo das dívidas da massa insolvente


definidas no art. 51º do C.I.R.E., graduar os créditos verificados pela
seguinte ordem:
A) Relativamente ao produto da venda sobre o imóvel descrito na verba
nº1 (imóvel descrito na CRP de Lamego sob o nº569/19930924 da
freguesia da Sé):
1º - Crédito da Fazenda Nacional por IMI relativa a este imóvel.
2º - Crédito reclamado por “ X..., S.A.” até ao limite constante do
registo através da apresentação 6 de 2004/03/18.
3º - Todos os restantes créditos comuns a par e em rateio.
B) Relativamente ao produto da venda sobre o imóvel descrito na verba
nº3 (imóvel descrito na CRP de Lamego sob o nº466/199220110-P da
freguesia da Sé):
1º - Crédito da Fazenda Nacional por IMI relativa a este imóvel.
2º - Crédito de G...e mulher H....
3º - Crédito reclamado pela “ D..., S.A.” até ao limite constante do
registo até ao limite constante do registo através da apresentação 5 de
2001/05/22.
4º - Todos os restantes créditos comuns a par e em rateio.
C) Relativamente ao produto da venda sobre o imóvel descrito na verba
nº4 (imóvel descrito na CRP de Lamego sob o nº466/19920110-Q da
freguesia da Sé):
1º - Crédito da Fazenda Nacional por IMI relativa a este imóvel.
2º - Crédito reclamado por “ D..., S.A.” até ao limite constante do
registo através da apresentação 5 de 2001/05/22.
3º - Todos os restantes créditos comuns a par e em rateio.
D) Relativamente ao produto da venda sobre o imóvel descrito na verba
nº5 (imóvel descrito na CRP de Lamego sob o nº466/199220110-R da
freguesia da Sé):
1º - Crédito da Fazenda Nacional por IMI relativa a este imóvel.
2º - Crédito de G...e mulher H....
3º - Crédito reclamado pela “ D..., S.A.” até ao limite constante do
registo através da apresentação 5 de 2001/05/22.
4º - Todos os restantes créditos comuns a par e em rateio.
E) Relativamente ao produto da venda sobre o imóvel descrito na verba
nº6 (imóvel descrito na CRP de Lamego sob o nº466/19920110-S da
freguesia da Sé):

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1º - Crédito da Fazenda Nacional por IMI relativa a este imóvel.


2º - Crédito reclamado por “ D..., S.A.” até ao limite constante do
registo através da apresentação 5 de 2001/05/22.
3º - Todos os restantes créditos comuns a par e em rateio.
F) Relativamente ao produto da venda sobre o imóvel descrito na verba
nº7 (imóvel descrito na CRP de Lamego sob o nº466/19920110-T da
freguesia da Sé):
1º - Crédito da Fazenda Nacional por IMI relativa a este imóvel.
2º - Crédito reclamado por “ D..., S.A.” até ao limite constante do
registo através da apresentação 5 de 2001/05/22.
3º - Todos os restantes créditos comuns a par e em rateio.
G) Relativamente ao produto da venda sobre o imóvel descrito na verba
nº8 (imóvel descrito na CRP de Lamego sob o nº466/199220110-U da
freguesia da Sé):
1º - Crédito da Fazenda Nacional por IMI relativa a este imóvel.
2º - Crédito de L.. e mulher M...
3º - Crédito reclamado pela “ D..., S.A.” até ao limite constante do
registo através da apresentação 5 de 2001/05/22.
4º - Todos os restantes créditos comuns a par e em rateio.
H) Relativamente ao produto da venda sobre o imóvel descrito na verba
nº9 (imóvel descrito na CRP de Lamego sob o nº466/199220110-V da
freguesia da Sé):
1º - Crédito da Fazenda Nacional por IMI relativa a este imóvel.
2º - Crédito de L.. e mulher M...
3º - Crédito reclamado pela “ D..., S.A.” até ao limite constante do
registo através da apresentação 5 de 2001/05/22.
4º - Todos os restantes créditos comuns a par e em rateio.
I) Relativamente ao produto da venda sobre o imóvel descrito na verba
nº10 (imóvel descrito na CRP de Lamego sob o nº466/199220110-X da
freguesia da Sé):
1º - Crédito da Fazenda Nacional por IMI relativa a este imóvel.
2º - Crédito de I....
3º - Crédito reclamado pela “ D..., S.A.” até ao limite constante do
registo através da apresentação 5 de 2001/05/22.
4º - Todos os restantes créditos comuns a par e em rateio.

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J) Relativamente ao produto da venda sobre o imóvel descrito na verba


nº11 (imóvel descrito na CRP de Lamego sob o nº466/19920110-Z da
freguesia da Sé):
1º - Crédito da Fazenda Nacional por IMI relativa a este imóvel.
2º - Crédito reclamado por “ D..., S.A.” até ao limite constante do
registo através da apresentação 5 de 2001/05/22.
3º - Todos os restantes créditos comuns a par e em rateio.
K) Relativamente ao produto da venda sobre o imóvel descrito na verba
nº12 (imóvel descrito na CRP de Lamego sob o nº466/199220110-AA
da freguesia da Sé):
1º - Crédito da Fazenda Nacional por IMI relativa a este imóvel.
2º - Crédito de E... e mulher F....
3º - Crédito reclamado pela “ D..., S.A.” até ao limite constante do
registo através da apresentação 5 de 2001/05/22.
4º - Todos os restantes créditos comuns a par e em rateio.
L) Relativamente ao produto da venda sobre o imóvel descrito na verba
nº13 (imóvel descrito na CRP de Lamego sob o nº466/19920110-AB da
freguesia da Sé):
1º - Crédito da Fazenda Nacional por IMI relativa a este imóvel.
2º - Crédito de J....
3º - Crédito reclamado por “ D..., S.A.” até ao limite constante do
registo através da apresentação 5 de 2001/05/22.
4º - Todos os restantes créditos comuns a par e em rateio.
M) Relativamente ao produto da venda sobre o imóvel descrito na
verba nº14 (imóvel descrito na CRP de Lamego sob o nº466/19920110-
AC da freguesia da Sé):
1º - Crédito da Fazenda Nacional por IMI relativa a este imóvel.
2º - Crédito reclamado por “ D..., S.A.” até ao limite constante do
registo através da apresentação 5 de 2001/05/22.
3º - Todos os restantes créditos comuns a par e em rateio.
N) Relativamente ao produto da venda sobre o imóvel descrito na verba
nº15 (imóvel descrito na CRP de Lamego sob o nº466/19920110-AD
da freguesia da Sé):
1º - Crédito da Fazenda Nacional por IMI relativa a este imóvel.
2º - Crédito reclamado por “ D..., S.A.” até ao limite constante do
registo através da apresentação 5 de 2001/05/22.

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3º - Todos os restantes créditos comuns a par e em rateio.


Custas pela massa insolvente.”.
Inconformado com tal decisão, dela interpôs recurso, o credor
reclamante, D..., SA, o qual foi admitido como sendo de apelação,
com subida imediata, nos próprios autos e com efeito meramente
devolutivo (cf. despacho de fl.s 854), finalizando as suas alegações de
recurso, com as seguintes conclusões:
i. Vem o presente recurso interposto da sentença de verificação e
graduação de créditos porquanto:
a) Não verificou, nem graduou, o crédito hipotecário reclamado pelo
Recorrente pelo produto da venda do imóvel iden ficado pela verba
n.º 1 do auto de arrolamento e apreensão e bens, quando é certo que
a aludida garan a real foi reclamada e o respe vo crédito consta da
lista defini va de créditos reconhecidos, elaborada nos termos do
ar go 129º n.º 1 do CIRE e que, apesar de ter sido verificada na
sentença recorrida, não foi considerada para efeitos de graduação do
crédito;
b) Rela vamente às verbas nº3, 5, 8, 9, 10, 12 e 13, graduou à frente
do crédito hipotecário do recorrente os créditos dos respe vos
promitentes-compradores.
ii. Salvo o devido respeito, ao decidir como decidiu, a douta sentença
recorrida padece de vários erros de julgamento, quer quanto à matéria
de facto quer quanto à aplicação do direito, jus ficando o presente
recurso de apelação.
iii. Falta de prova de pagamento dos sinais invocados pelos
Recorridos E... e mulher, G...e mulher e I...:
a) Os Recorridos abs veram-se de juntar aos autos os extratos
bancários das contas sacadas pelos cheques com que alegadamente
teriam efetuado os pagamentos por eles alegados, e bem assim como
dos cheques (com a exceção de G...), para se verificar se os
pagamentos ocorreram e a quem pertenciam os fundos afetos a tais
pagamentos, apesar de no ficados por duas vezes (em 25/11/2014 e
19/12/2014) pelo tribunal para esse efeito;
b) Compe a-lhes provar tais pagamentos (art. 342º, CC) e, perante a
omissão do dever de colaboração devida, que os fundos lhes
pertenciam e que os cheques foram efe vamente depositados (art.
344º, nº2, CC);
c) Os depoimentos prestados pelos próprios e pelos familiares
indicados como testemunhas não lograram fazer prova suficiente
quanto aos pagamentos (aqui com a exceção de G..., que juntou cópias

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bancárias de cheques) nem quanto à origem dos fundos empregues


em tais supostos pagamentos;
d) Nem se alcança como meros funcionários dos correios teriam
disponibilidade para fazer tais pagamentos (em dois dos casos – I... e
J.. – para comprar casas para as respe vas filhas);
e) Não sendo a confissão/quitação con da nos contratos prova
irrefutável perante terceiros que não intervieram nos contratos.
f) Termos em que devem ser eliminados os pontos 11, 31, 51 e 70 dos
FP.
g) O que tem como consequência necessária o não reconhecimento de
qualquer crédito aos Recorridos E... e mulher, G...e mulher, I... e J....
iv. Falta de prova da habitação dos Recorridos G...e mulher nas frações
por eles prome das adquirir:
a) O Recorrido G...é repe damente referido nos depoimentos como “o
suíço”, por se encontrar a residir na Suíça à altura em que outorgou o
contrato-promessa, situação que se man nha à data do julgamento.
b) Tendo várias testemunhas referido, de forma perentória que o dito
G...nunca habitou o apartamento e que, desde que recebeu a chave, o
manteve arrendado a terceiros.
c) O que de resto também resulta dos documentos por este juntos a
29/02/2012, que incluem um contrato de arrendamento celebrado em
11/09/2007, tendo por objeto a fração “P” (apartamento, verba nº3 da
sentença);
d) É certo que o próprio Recorrido G...alegou que precisava do
apartamento para gozo das suas férias, mas tal não se afigura credível
na medida em que está demonstrado nos autos que o arrendou
sucessivamente a terceiros, além de que indicou outra morada em
Lamego quando outorgou o contrato promessa.
e) Quanto à fração “R” a matéria da como provada revela-se ainda
mais estranha se vermos em conta que se trata de um lugar de
garagem, atendendo às regras a experiência comum, dado que
ninguém medianamente esclarecido, na plena posse das suas
faculdades, em normais circunstâncias de vida, habita num lugar e
garagem, dorme no mesmo, toma ali refeições, recebe amigos e
correspondência.
f) Menos ainda se for dono de um apartamento no mesmo prédio, que
opta por arrendar a terceiros…
g) Termos em que deve igualmente eliminar-se os pontos 36 e 38 dos
FP, por não se terem provado.

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v. Os pontos 86 a 97 dos Factos Provados não foram alegados na


reclamação dos Recorridos L.. e M.., a que dizem respeito, pelo que
devem ser eliminados.
a) O legislador estabeleceu que mesmo o credor que tenha o seu
crédito reconhecido por decisão defini va não está dispensado de o
reclamar no processo de insolvência se nele quiser obter pagamento –
art. 128º, nº3, CIRE.
b) É nesse requerimento de reclamação de créditos que o credor tem
que alegar e demonstrar a proveniência, o montante e a data de
vencimento do seu crédito, assim como a sua natureza e, se for caso
disso, as garan as de que eventualmente goze o seu crédito – art.
128º, nº1, CIRE.
c) O art. 90º, do CIRE, estabelece mesmo a obrigatoriedade dos
credores do insolvente exercerem os seus direitos, durante a
pendência do processo de insolvência, segundo os meios processuais
regulados no CIRE.
d) Daqui decorre que o que releva para efeito de obter o pagamento
do crédito no processo de insolvência é apenas a reclamação e a
verificação do crédito que é feita no próprio processo de insolvência.
vi. E, em consequência, nenhum crédito ser reconhecido aos
Recorridos L.. e mulher.
vii. A passagem «tendo sido verbalmente apontada por eles a data de
30 de Maio de 2004 como limite máximo» constante do ponto 94 dos
FP carece de qualquer sustentação na prova produzida em sede de
audiência de julgamento ou em qualquer outro meio de prova, pelo
que sempre deverá ser removida.
viii. Termos em que a redação do ponto 94 dos FP deverá ser alterada
para a seguinte:
«Acordaram ainda que a escritura pública seria realizada logo que os
Insolventes ob vessem todos os documentos necessários para tal».
ix. Quanto à graduação pelo produto da liquidação da verba nº1, na
relação de créditos reconhecidos do art. 129º, o AI consignou que o
crédito reclamado pelo recorrente gozava de garan a real sobre o
prédio urbano descrito na CRP de Lamego sob o nº569, verba nº1 a
que se reporta a sentença recorrida.
x. Apesar da sentença de graduação de créditos verificar a natureza
garan da por hipoteca dos créditos reclamados pelo Banco recorrente
ao afirmar que «No caso em apreço, os credores supra referidos
cons tuíram hipotecas sobre os imóveis apreendidos. Assim, os seus
créditos e acessórios nos termos preditos, são garan dos por tais
hipotecas nos termos que infra se concre zarão», terminou sem
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graduar o crédito do Recorrente acima mencionado pelo produto da


venda do imóvel CRP 569 hipotecado para garan a desse crédito, sem
qualquer jus ficação que mo vasse ou fundamentasse tal posição.
xi. Não foi apontado nenhum erro manifesto da referida relação que
jus ficasse tal divergência entre a relação de créditos reconhecidos e a
sentença, tendo inclusivamente o crédito do recorrente, porque não
impugnado, sido reconhecido logo no saneador, tendo em conta o
disposto no art. 136º, nº4, do CIRE.
xii. Deverá assim a al. A) da decisão recorrida passar a ter a seguinte
redação:
A) Relativamente ao produto da venda sobre o imóvel descrito na
verba nº1 (imóvel descrito na CRP de Lamego sob o nº569/19930924
da freguesia da Sé):
1º - Crédito da Fazenda Nacional por IMI relativa a este imóvel.
2º - Crédito reclamado pela “ D..., S.A.” até ao limite constante do
registo através da apresentação 17 de 2002/08/14.
3º - Crédito reclamado por “ X..., S.A.” até ao limite constante do
registo através da apresentação 6 de 2004/03/18.
4º - Todos os restantes créditos comuns a par e em rateio.
xiii. Quanto à graduação pelos produtos das vendas das verbas nº3, 5,
8, 9, 10, 12 e 13, são vários os vícios de que a sentença recorrida
padece ao graduar rela vamente a essas verbas os créditos
reclamados pelos respe vos promitentes-compradores antes do
crédito hipotecário do Recorrente.
xiv. Em primeiro lugar, porque não ocorreu incumprimento defini vo
de qualquer dos contratos- promessa que incidiram sobre aquelas
verbas, desde logo porque os contratos nem sequer fixavam qualquer
prazo certo para outorga dos contratos prome dos.
xv. Se pretendiam a fixação de um prazo para o cumprimento da
obrigação, os promitentes-compradores teriam que ter feito uso de
uma ação de fixação de prazo – art. 777º, Código Civil,
xvi. Sendo irrelevantes as cartas que alguns alegaram ter enviado
interpelando o insolvente para outorgar a escritura, na medida em que
não preenchem os requisitos da interpelação cominatória prevista no
art. 808º, nº1, do CC para converter a mora em incumprimento
defini vo,
xvii. Nem tal era possível, na medida em que sem prazo não havia
sequer mora.
xviii. Cons tuem pressupostos do reconhecimento do direito de
retenção, previsto no art. 755.º, n.º 1, al. f), do CC: a) a existência de
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promessa de transmissão ou de cons tuição de direito real; b) a


entrega (ao promitente-comprador) da coisa objecto do contrato-
promessa; c) a tularidade, por parte do beneficiário, de um direito de
crédito sobre a outra parte, decorrente do incumprimento defini vo
do contrato-promessa.
xix. Não havendo incumprimento defini vo, não há obviamente direito
de retenção.
xx. Nem direito a exigir o sinal em dobro, por faltar o não
cumprimento imputável à
contraparte.
xxi. Os promitentes-compradores não perderam de resto o interesse
na prestação, tanto assim que fizeram obras nos imóveis e residem
neles, arrendaram ou prometeram vendê-los a terceiros.
xxii. A sentença que declarou resolvido, por incumprimento imputável
aos insolventes, o contrato promessa em causa e condenou os RR. a
res tuir o sinal em dobro é totalmente irrelevante para os presentes
autos, atendendo ao acima referido, conforme de resto foi
reconhecido no saneador.
xxiii. Além disso, não ocorreu tradição válida das frações
correspondentes às verbas 5, 8,
9, 10, 12 e 13.
xxiv. De facto, a promessa respeitante à celebração de contrato para o
qual a lei exija documento, quer autên co, quer par cular, só vale se
constar de documento assinado pela parte que se vincula ou por
ambas, consoante o contrato promessa seja unilateral ou bilateral -
art. 410º, nº2, CC.
xxv. As es pulações verbais acessórias anteriores ao documento
legalmente exigido para a declaração negocial, ou contemporâneas
dele, são nulas, salvo quando a razão determinante da forma lhes não
seja aplicável e se prove que correspondem à vontade do autor da
declaração - art. 221º, nº1, CC.
xxvi. As es pulações posteriores ao documento só estão sujeitas à
forma legal prescrita para a declaração se as razões da exigência
especial da lei lhe forem aplicáveis - art. 221º, nº2, CC.
xxvii. Decorre dos contratos que não foi neles es pulada a tradição do
bem prome do vender, com a exceção da verba nº3, única
rela vamente à qual foi es pulada por escrito a tradição.
xxviii. A entrega da coisa não cons tui um puro ato material, nem um
ato unilateral, mas sim um ato complexo, em que estão presentes um

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ato voli vo de disposição recep cia e a vontade do outro sujeito de


assumir aquele poder que lhe é atribuído.
xxix. Ora, face ao disposto no acima citado art. 221º, nº2, do CC, para
ser válida e eficaz, a tradição nha fatalmente que ter sido acordada
por escrito!
xxx. Pois as exigências de salvaguarda da certeza e segurança jurídicas
que impõem a outorga de um documento escrito para promessa de
venda de um imóvel verificam-se igualmente – e de forma
par cularmente incisiva – quanto ao acordo quanto à tradição do
bem.
xxxi. Até porque a tradição do bem no âmbito de um contrato-
promessa acaba por ter consequências mais gravosas para o credor
hipotecário, por exemplo, do que a promessa em si, acabando por
cons tuir um verdadeiro direito real de garan a que inclusivamente se
sobrepõe à hipoteca.
xxxii. Aliás, para a promessa com eficácia real o legislador estabeleceu
exigências de forma ainda mais rigorosas – art. 413º, CC.
xxxiii. Assim, em coerência com as referidas preocupações do
legislador, não pode a tradição do bem subsequente a um contrato
promessa que não a previa operar-se sem acordo escrito nesse
sen do,
xxxiv. Sob pena de em casos como o presente, em que o promitente
vendedor está ausente em parte incerta, os promitentes-compradores,
conluiando-se entre si e servindo de testemunhas uns dos outros,
conseguirem provar uma tradição que nunca foi acordada por escrito e
antecipar-se ao credor hipotecário na graduação pelo produto
da venda dos bens em causa.
xxxv. Donde a tradição das verbas 5, 8, 9, 10, 12 e 13, a ter ocorrido,
sempre seria nula por falta de forma, não podendo dela extrair-se
qualquer efeito jurídico relevante.
xxxvi. Subsidariamente, mesmo que assim se não entendesse, a
sentença recorrida sempre devia ter tratado de modo diferente a parte
dos créditos dos promitentes-compradores correspondente ao sinal
em dobro, da que resulta de meras entregas por conta do preço e dos
gastos com obras no imóvel.
xxxvii. Os sinais convencionados são muito inferires a metade aos
valores reclamados pelos promitentes-compradores e graduados antes
do crédito hipotecário.
xxxviii. Com efeito, o art. 755º do CC, na al. f) do nº1, apenas
reconhece o direito de retenção ao beneficiário de promessa com

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tradição da coisa pelo crédito resultante do não cumprimento


imputável à outra parte, nos termos do art. 442º.
xxxix. Conforme se reconhece na sentença, a N..., Lda. efetuou
trabalhos de eletricidade nos prédios onde se situam as frações
apreendidas, tendo reclamado crédito emergente desses trabalhos e
invocado quanto ao mesmo direito de retenção.
xl. Esse crédito foi reconhecido na relação de créditos reconhecidos a
que se reporta o art. 129º do CIRE nos exatos termos e com a
qualificação com que foi reclamado e apenas o recorrente o
impugnou.
xli. E não foi impugnado pelos promitentes-compradores.
xlii. Reconhecendo que esse direito de retenção seria incompa vel
com os direitos de retenção invocados pelos promitentes-
compradores, o Tribunal concluiu que a lista padecia de manifesto erro
ao reconhecer aquele crédito que os promitentes-compradores não
impugnaram.
xliii. Do disposto no n.º 3 do ar go 130º do CIRE resulta que caso
entendesse o tribunal que a lista de créditos elaborada pelo Exmo. Sr.
Administrador da Insolvência padecia de um erro substancial
manifesto, devia ter determinado que este procedesse à re ficação ou
subs tuição da lista por outra e, de seguida, permi do às partes o
exercício do direito conferido pelo ar go 130º n.º 1 do CIRE, nos
termos dos por convenientes,
xliv. O que, in casu, não fez porque o erro, claramente, não existe nem
muito menos é manifesto, logo não é susce vel de ser corrigido pelo
Tribunal.
xlv. Assim, das duas uma, ou o erro era manifesto, no sen do em que
se tratasse de um erro de cálculo ou de escrita revelado pelo próprio
contexto da declaração, ou das circunstâncias em que a declaração é
feita, nos termos referidos no art. 249º, do CC, aqui aplicável ex vi art.
295º do mesmo Código, ou então o erro não existe ou não é manifesto
e, não tendo o crédito sido impugnado, não restava ao Juiz a quo outra
alterna va senão reconhecê-lo e graduá-lo em conformidade com a
lista.
xlvi. Assim, não tendo os promitentes-compradores impugnado crédito
com direito de retenção incompa vel com o seu próprio, não podiam
em caso algum aspirar a que o seu direito de retenção viesse a ser
reconhecido, sob pena de contradição insanável da fundamentação da
decisão.
xlvii. Tanto mais que o crédito da “ N..., Lda.” foi reconhecido
defini vamente no saneador de 21/11/2016, ao abrigo do disposto no

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art. 136º, nº4, do CIRE, uma vez que na altura o recorrente já nha
desis do da sua impugnação.
xlviii. Por isso considerou-se ali reconhecido aquele crédito e
restringiu-se o objeto do li gio, exclusivamente, à verificação da
existência dos créditos reclamados pelos promitentes- compradores e
das respe vas garan as.
xlix. Ora, não se pode na decisão final, para simplificar o raciocínio do
julgador, pura e simplesmente alterar créditos que já estavam
adquiridos nos autos!
l. Também não se podia ter reconhecido qualquer direito de retenção
quanto às verbas nºs 3, 5, 8 e 9 na medida em que os respe vos
promitentes-compradores não são consumidores.
li. A qualidade de consumidor é elemento cons tu vo essencial da
garan a real / direito de retenção, pelo que cabe ao credor que dela se
pretenda prevalecer cumprir o ónus de alegar e provar os factos que
consubstanciam tal qualidade.
lii. Tratando-se como vimos de um autên co direito real de garan a, o
direito de retenção confere ao credor que tem em seu poder certa
coisa pertencente ao devedor, não só a faculdade de se recusar a
entregá-la enquanto o devedor não cumprir, como ainda a de executar
a coisa e pagar-se à custa dela com preferência sobre os demais
credores – arts. 754º, 755º e 759º, CC.
liii. E de facto, o Acórdão Uniformizador 4014, do STJ, veio fixar que
«no âmbito da graduação de créditos em insolvência o consumidor
promitente-comprador em contrato, ainda que com eficácia
meramente obrigacional com tradi o, devidamente sinalizado, que
não obteve o cumprimento do negócio por parte do administrador da
insolvência, goza do direito de retenção nos termos estatuídos no art.º
755.º, n.º 1, al. f) do Código Civil»
liv. Ora, os promitentes-compradores G...e mulher e L.. e mulher
M..nunca alegaram quer vessem adquirido o imóvel para habitação
própria, isto é, para uso pessoal, familiar ou domés co, na fórmula da
al. a) do art. 2º da Convenção de Viena de 1980, de modo a sa sfazer
necessidades pessoais e familiares.
lv. Quanto aos promitentes G...provou-se de resto que o imóvel
sempre
esteve arrendado a terceiros.
lvi. Termos em que os créditos de E... e mulher F... deverão ser
graduados como comuns e a al. K) da decisão deverá passar a ter a
seguinte redação:

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K) Relativamente ao produto da venda sobre o imóvel descrito na


verba nº12 (imóvel descrito na CRP de Lamego sob o
nº466/199220110-AA da freguesia da Sé):
1º - Crédito da Fazenda Nacional por IMI relativa a este imóvel.
2º - Crédito reclamado pela “ D..., S.A.” até ao limite constante do
registo através da apresentação 5 de 2001/05/22.
3º - Todos os restantes créditos comuns a par e em rateio.
lvii. Quando muito, a não se entender assim, apenas poderia ser
graduada como garan da por direito de retenção rela vamente ao
aludido imóvel (verba nº12), à frente do credor hipotecário, a parte do
crédito reclamado por E... e mulher F... correspondente ao dobro do
único sinal de €10.000,00 que alegaram ter prestado, devendo no mais
ser graduado como comum.
lviii. Por seu lado os créditos de G...e mulher, H..., deverão ser
graduados como comuns e as als. B) e D) da decisão passarem a ter a
seguinte redação:
B) Relativamente ao produto da venda sobre o imóvel descrito na
verba nº3 (imóvel descrito na CRP de Lamego sob o nº466/199220110-
P da freguesia da Sé):
1º - Crédito da Fazenda Nacional por IMI relativa a este imóvel.
2º - Crédito reclamado pela “ D..., S.A.” até ao limite constante do
registo através da apresentação 5 de 2001/05/22.
3º - Todos os restantes créditos comuns a par e em rateio.
e
D) Relativamente ao produto da venda sobre o imóvel descrito na
verba nº5 (imóvel descrito na CRP de Lamego sob o nº466/199220110-
R da freguesia da Sé):
1º - Crédito da Fazenda Nacional por IMI relativa a este imóvel.
2º - Crédito reclamado pela “ D..., S.A.” até ao limite constante do
registo através da apresentação 5 de 2001/05/22.
3º - Todos os restantes créditos comuns a par e em rateio.
lix. Quando muito, a não se entender assim, apenas poderia ser
graduada como garan da por direito de retenção sobre os aludidos
imóveis (verbas nºs 3 e 5), à frente do credor hipotecário, a parte do
crédito reclamado por G...e mulher, H..., correspondente ao dobro do
sinal de €4.987,98 alegadamente prestado, devendo no mais ser
graduado como comum.
lx. Os créditos de I... deverão também ser graduados como

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comuns e a al. I) da decisão deverá passar a ter a seguinte redação:


I) Relativamente ao produto da venda sobre o imóvel descrito na verba
nº10 (imóvel
descrito na CRP de Lamego sob o nº466/199220110-X da freguesia da
Sé):
1º - Crédito da Fazenda Nacional por IMI relativa a este imóvel.
2º - Crédito reclamado pela “ D..., S.A.” até ao limite constante do
registo através da apresentação 5 de 2001/05/22.
3º - Todos os restantes créditos comuns a par e em rateio.
lxi. Quando muito, a não se entender assim, apenas poderia ser
graduada como garan da por direito de retenção rela vamente ao
aludido imóvel (verba nº10), à frente do credor hipotecário, a parte do
crédito reclamado por I... correspondente ao dobro do sinal de
€25.000,00, único que alega ter prestado, devendo no mais ser
graduado como comum.
lxii. Quanto ao crédito de J... deverá ser graduado como
comum e a al. L) da decisão deverá passar a ter a seguinte redação:
L) Relativamente ao produto da venda sobre o imóvel descrito na verba
nº13 (imóvel
descrito na CRP de Lamego sob o nº466/199220110-AB da freguesia
da Sé):
1º - Crédito da Fazenda Nacional por IMI relativa a este imóvel.
2º - Crédito reclamado pela “ D..., S.A.” até ao limite constante do
registo através da apresentação 5 de 2001/05/22.
3º - Todos os restantes créditos comuns a par e em rateio.
lxiii. Quando muito, a não se entender assim, apenas poderia ser
graduada como garan da por direito de retenção rela vamente ao
aludido imóvel (verba nº13), à frente do credor hipotecário, a parte do
crédito reclamado por J... correspondente ao dobro do sinal de
€9.975,95 prestado, devendo no mais
ser graduado como comum.
lxiv. Finalmente, o crédito de L.. e mulher M.., não devia sequer ter
sido reconhecido por não ter sido alegada a matéria dos pontos 86 a
96 dos FP.
lxv. A não se entender assim, deverá ser graduado como comum,
devendo em qualquer dos casos as als. G) e H) da decisão passar a ter
a seguinte redação:

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G) Relativamente ao produto da venda sobre o imóvel descrito na


verba nº8 (imóvel
descrito na CRP de Lamego sob o nº466/199220110-U da freguesia da
Sé):
1º - Crédito da Fazenda Nacional por IMI relativa a este imóvel.
2º - Crédito reclamado pela “ D..., S.A.” até ao limite constante do
registo através da apresentação 5 de 2001/05/22.
3º - Todos os restantes créditos comuns a par e em rateio.
D) Relativamente ao produto da venda sobre o imóvel descrito na
verba nº9 (imóvel descrito na CRP de Lamego sob o nº466/199220110-
V da freguesia da Sé):
1º - Crédito da Fazenda Nacional por IMI relativa a este imóvel.
2º - Crédito reclamado pela “ D..., S.A.” até ao limite constante do
registo através da apresentação 5 de 2001/05/22.
3º - Todos os restantes créditos comuns a par e em rateio.
lxvi. Quando muito, a não se entender assim, apenas poderia ser
graduada como garan da por direito de retenção sobre os aludidos
imóveis (verbas nºs 8 e 9), à frente do credor hipotecário, a parte do
crédito reclamado por L.. e mulher M.., correspondente ao dobro do
sinal de €49.879,78 que supostamente terão prestado, devendo no
mais ser graduado como comum.
Termina, pe cionando a procedência do recurso e a revogação da
sentença recorrida, que deve ser subs tuída por outra que acolha a
sua pretensão.
Contra alegando, os reclamantes G...e mulher, apresentam as seguintes
conclusões:
1ª- A douta sentença recorrida está profusa e proficuamente
fundamentada, não merecendo o menor reparo, quer quanto aos pontos
da matéria de facto apontados, quer quanto às cinco questões de direito
suscitadas.
2ª Insurge-se a Recorrente contra a matéria de facto provada sob os
pontos 31º no que aos ora recorridos diz respeito, referente às quantias
entregues a título de sinal e princípio de pagamento, inicial e reforços
aos Insolventes, pugnando que não devem ser considerados provados;
3ª- Desde logo alega o Banco que os recorridos não juntaram cópias
dos cheques e dos extractos bancários comprovativos de tais supostos
pagamentos, quando bem sabe que tal era um capricho do recorrente à
custa dos recorridos, já que não dispunham de tais documentos, e se os
quisessem obter e na medida do possível, dado o tempo decorrido,
teriam de pagar aos bancos, incluindo ao recorrente, uma avultada
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quantia em comissões e outros “alcavalas”, dinheiro este que os


reclamantes não podem despender inutilmente;
4ª- E inutilmente dado que o pagamento do sinal e reforços já estava
profusa e proficuamente provado e fundamentada em vários
documentos:
-sentenças transitadas em julgado e que não foram impugnadas,
-contratos promessa de compra e venda onde consta a respectiva
quitação dada pelos promitentes vendedores;
- cópias dos cheques que serviram de pagamento dos reforços de sinal
constantes acção intentada pelos reclamantes contra os promitentes
vendedores e ora insolventes .
5ª- Sendo que o Banco recorrente produz afirmações de má fé e de
forma difamatória que se lamenta, e a esquecer-se dos seus esquemas
até 2014, pois o dinheiro investido pelos recorridos proveio do seu
trabalho no estrangeiro durante décadas;
6ª- Os recorridos provaram, como lhes competia, quer por documentos
autênticos – sentença, quer por documentos particulares – cheques e
contratos, quer pela prova testemunhal, o pagamento do sinal e
respectivos reforços de cada um deles.
7ª- Os depoimentos das testemunhas produzidos em sede de audiência
de julgamento e gravados, e que nos dispensamos de repetir aqui, são
um sinal inequívoco de como a prova testemunhal complementou e
inequivocamente confirmou a prova documental.
8ª – Aliás, a fundamentação da douta sentença relativamente a estes
factos provados e no que a este respeito interessa é perfeitamente
elucidativa, pela sua clareza e singeleza.
10ª- Pelo que não podem os ora recorridos concordar com a
modificação da matéria de facto pretendida, pois que, não se verificam
os erros que o recorrente lhe imputa, não havendo, assim, qualquer erro
de julgamento ou erro de apreciação da prova.
11ª Acresce que, é preciso não esquecer, a forma como se encontra
estruturada a audiência final, em torno do sistema da oralidade: o
princípio da imediação. Foi à luz deste contacto directo que permitiu ao
Mmo Juiz formar a sua convicção e, por conseguinte, dar como
provados tais factos naqueles termos e não como requerido pelo
recorrente.
12ª Pois, é este contacto imediato, principalmente entre o Juiz e a
testemunha e o juiz, que permite ao julgador captar uma série valiosa
de elementos (através do que pode perguntar, pedir esclarecimentos,
observar e depreender do depoimento, da pessoa e das reacções do
inquirido) sobre a realidade dos factos, que a mera leitura do relato
escrito do depoimento não pode facultar.

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13ª E, depois de uma leitura atenta à resposta à matéria de facto


provada e respectiva fundamentação e sentença, apercebemo-nos que
toda a articulação dos factos resultou de uma conjugação perfeita dos
princípios estruturantes a toda a audiência de discussão e julgamento,
que são eles: Oralidade, Livre apreciação da prova e Imediação.
14ª Em consequência, e de acordo com o supra exposto, ou melhor,
perante aquilo que de concreto permitiu ao Mmo Juiz a quo decidir em
conformidade, dúvidas não restam que todos estes argumentos
explanados pelo Recorrente, em nada perfilam ou condizem, com uma
diferente resposta do Tribunal.
15ª- No que concerne à questão da não prova de habitação das fracções
prometidas comprar pelos ora recorridos, sempre se diga que não
assiste qualquer razão à Recorrente;
16ª- Desde logo, porque tal não corresponde minimamente à verdade,
sendo que da prova produzida em sede de audiência de discussão e
julgamento, mais precisamente dos depoimentos da testemunha T... e
das declarações de parte do Credor Reclamante marido, bem como dos
documentos juntos aos autos, resultaram cabalmente provados os factos
dados como provados na douta sentença sob o nº 36 e 38;
17ª- Pois que, resultou proficuamente provado que os credores
reclamantes adquiriram a fracção de apartamento para nela residirem
aquando das suas deslocações em período de férias em Portugal, mais
precisamente no Verão e no Natal;
18ª- Bem como, que adquiriram a fracção de garagem para seu uso
exclusivo e próprio e aparcamento da sua viatura.
19ª- Tendo resultado, também, provado que os credores reclamantes,
aqui recorridos, logo aquando da entrega das chaves do apartamento no
Verão de 2002 e da garagem no Verão de 2004 passaram a utilizá-la
para os fins pretendidos aquando da celebração do contrato promessa
de compra e venda das mesmas, ou seja, habitando a fracção de
apartamento aquando das suas deslocações de férias a Portugal e
utilizando a fracção de garagem para aparcamento da sua viatura e
armazenamento dos seus bens pessoais;
20ª- Tendo, efectivamente, passados alguns anos, os credores
reclamantes procedido ao arrendamento da fracção de habitação a
terceiro, porém, salvo melhor opinião em contrário, tal não afecta, nem
poderia afectar a sua qualidade de consumidor no acto de consumo
praticado;
21ª- Encontrando-se os credores reclamantes abrangidos pela noção e
conceito de consumidor prevista no artigo 2º da Lei de Defesa do
Consumidor, pois que pretendeu adquirir as fracções para seu uso
próprio, exclusivo e familiar e não para fins comerciais e lucrativos, de
revenda;

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22ª- Por outro lado e sem prescindir, sempre se refira que é


jurisprudência e doutrina unânimes que o Acórdão Uniformizador de
Jurisprudência nº4/2014 não poderá aplicar-se aos presentes autos;
23ª- Porquanto, à data da apresentação da reclamação de créditos no
âmbito dos presentes autos não era exigível, nem sequer previsível que
a qualidade de consumidor fosse um requisito essencial para a
atribuição do direito de retenção aos promitentes compradores aqui
recorridos;
24ª- Além de que a Recorrente apenas agora, em sede de recurso,
levanta a presente questão da não qualidade de consumidor dos
credores reclamantes, não tendo esta questão sido suscitada em sede de
impugnação do crédito e a respectiva qualidade;
25ª- Assim, constituindo esta uma verdadeira “nova questão”, não
poderá aqui, salvo melhor opinião, ser discutida e debatida e muito
menos decidida.
26ª- Relativamente à questão do incumprimento definitivo do contrato
promessa, não perfilhamos o entendimento da recorrente da
necessidade de ser intentada prévia acção de fixação judicial de prazo,
por duas ordens de razão:
- Sempre existiu a sentença transitada em julgado que decidiu “
declarar resolvido por incumprimento imputável aos Réus, o contrato
promessa ...” e “Declarar que o autor tem direito de retenção sobre a
identificada fracção autónoma...” , reconhecendo, assim, o direito de
retenção aos promitentes-compradores.
- Pese embora implícito sempre foi acordado um prazo, sendo a
escritura efectuada quando o promitente vendedor dispusesse dos
documentos necessários para celebrar a escritura de compra e venda;
27ª - Por um lado, o incumprimento definitivo já havia sido declarado
por sentença transitado julgado, no âmbito do processo mencionado nos
pontos 45º e 47º dos factos provados, que decidiu exatamente nesse
sentido.
28ª- Pese embora o entendimento da recorrente que as sentenças não
lhe são oponíveis por ser terceiro, no entanto, a autoridade do caso
julgado pode atingir terceiros, no sentido de que a sentença se lhes
impõe. São os chamados terceiros juridicamente indiferentes, pessoas a
quem a sentença não causa nenhum prejuízo, por não bulir com a
existência ou validade do seu direito, embora possa afectar a sua
consistência prática e económica.
29ª- Nestes termos, parece-nos, salvo melhor opinião, que a sentença
que reconhece o direito de retenção não afecta a existência, a validade
e/ou a consistência jurídica do direito do credor hipotecário, mas
apenas a consistência económica daquele direito, precisamente por
aquele direito ser graduado à frente da hipoteca, aquela sentença faz

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caso julgado contra o terceiro (in casu, credor hipotecário recorrente),


sendo-lhes oponível, v.g neste sentido- Ac. TRPorto de 13.01.2015.
30ª- No que concerne ao segundo argumento, atente-se ao Ac. do STJ
de 11.01.2011, cujo relator foi o Conselheiro Fonseca Ramos, cuja
situação factual é totalmente coincidente com a descrita nos presentes
autos no que aos ora recorridos diz respeito;
31ª- No caso dos nossos autos, resulta da factualidade provada, não
posta em crise, nos pontos 40º a 44º dos factos provados, ainda que
implicitamente, previsto um prazo para a escritura pública de compra e
venda, os promitentes-compradores interpelaram admonitoriamente os
promitentes-vendedores para que estes a realizassem, o que não
sucedeu.
32ª- Assim, deu-se por definitivamente incumprido o contrato pois,
foram os promitentes-vendedores interpelados admonitoriamente por
cartas registadas com A/R para que procedessem à marcação da
escritura de compra e venda, e foram minuciosamente cumpridos os
requisitos da interpelação cominatória:
Intimação para o cumprimento (“...devem proceder à marcação da
escritura...”)
Fixação de um termo peremptório para o cumprimento (“...nos
próximos 10 dias...”)
Admonição ou cominação de que a obrigação se terá por
definitivamente cumprida (“...Caso não procedam à marcação da
mesma, irei pedir judicialmente a resolução do contrato promessa de
compra e venda...”)
33ª- De igual modo a “fuga” ou “desaparecimento” do promitente-
vendedor é um comportamento violador do contrato promessa, já que
esse comportamento pode e deve ser interpretado à luz do que o
homem médio entendesse e que atentas as circunstâncias do caso
concreto, promitente vendedor “fugido” para parte incerta, com o
propósito de “fugir” aos credores”, é de per si suficiente para não
cumprimento do contrato.
34ª- E a realização de obras pelos recorridos, necessárias e úteis, para
poder utilizar convenientemente o imóvel, não significa que
mantenham o interesse na prestação, pois se assim fosse não requeriam
o incumprimento definitivo do contrato, como sucedeu e ademais,
parece-nos, sem grande esforço, que ninguém teria interesse em
adquirir uma fracção que não tem licença de habitabilidade e num
prédio hipotecado.
35ª- Por outro lado, a interpelação admonitória não tem de ser expressa
nem de resultar de documento escrito conforme entende o recorrente,
como o entendeu o nosso Supremo Tribunal, em Ac. datado de
30.04.2015, relator Conselheiro Tomé Gomes, supra transcrito;

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36ª- Acresce que no caso dos autos parece-nos que a actuação do


insolvente revela definitiva vontade de não cumprir, como resulta de
toda a prova produzida em audiência de discussão e julgamento,
designadamente pontos 32 e 33, entre outros que o recorrente não
questiona e tais comportamentos são, salvo melhor opinião, totalmente
incompatíveis com a intenção de cumprir o contrato.
37ª- No que concerne à questão suscitada da tradição da coisa
relativamente à fracção de garagem, para ser válida e eficaz tinha de ser
acordada por escrito, pois que o documento escrito é um acto
meramente formal e que o acto material é muito mais importante e
relevante, que se traduz na entrega das chaves e na entrega do imóvel,
como, aliás, resulta provado na sentença.
38ª- A tradição do imóvel “embora surja frequentemente ligado à
celebração da promessa, não é um efeito necessário desta, mas um
efeito da eficácia translativa do direito própria do contrato prometido”
(vide Ac. TRL de 16.09.2014 e Ac. TRP de 03.04.2014).
39ª- A doutrina e a jurisprudência são unânimes que é suficiente a
tradição meramente simbólica, referindo-se o legislador à tradição
indistintamente e, aliás, ubi lex non distinguit, nec nos distinguier
debemus, conforme neste sentido Ac. STJ de 14.10.2014 cujo relator
foi o Conselheiro João Camilo -sendo que in casu houve até a tradição
material .
40ª- Nesta situação verifica-se um investimento de confiança por parte
do promitente adquirente capaz de justificar o mecanismo de tutela tão
forte, e em boa medida estranho ao sistema, como é o direito de
retenção na configuração que ele actualmente tem, de direito real de
garantia não registado e especialmente privilegiado.
41ª-Salvo melhor entendimento, a ideia que transparece de todo o
regime instituído é a de que, a partir do momento em que se dá a
traditio, com o aludido significado de uma situação geradora de
especial confiança, seja ela material (através do contacto físico
imediato do promitente-comprador com o imóvel, maxime com
ocupação habitacional do mesmo), seja ela simbólica (v.g., entrega das
chaves), justificar-se-á o recurso, pelo promitente-comprador, aos
mecanismos previstos nos arts. 442.º n.º 2 e 755.º n.º 1 al. f).
42ª – Insurge-se o recorrente contra a douta sentença a quo, por
entender que deveriam ser tratados de modo diferente a parte dos
créditos dos promitentes compradores correspondentes ao sinal em
dobro das entregas por conta do preço e das despesas efectuadas com as
obras necessárias e uteis.
43ª- Ora, no que concerne às entregas por conta do preço, nos termos e
para os efeitos do disposto no art. 441º do CC, “presume-se que tem
carácter de sinal toda a quantia entregue, no momento da celebração
do contrato ou em momento posterior, pelo promitente comprador ao

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promitente-vendedor, ainda que a titulo de compensação ou de


principio de pagamento”.
44ª Ora, resulta dos factos provados sob os pontos 31º, que o valor do
sinal não se resume ao valor primeiro sinal ou sinal entregue aos
promitentes-vendedores aquando da outorga dos contratos promessa de
compra e venda, mas sim à soma de todos os valores entregues a titulo
de sinal e princípio de pagamento e que ocorreram posteriormente.
45ª- No que respeita ao valor das despesas com as obras, a recorrente
parte de uma premissa errada pois que, ao contrário do alegado pelo
recorrente, tais despesas com obras no imóvel beneficiam do direito de
retenção nos termos do disposto no art. 754º, e não, como afirma pela
alínea f) do art. 755º, daí o seu vício de raciocínio.
46ª- Assim, tendo os recorridos realizado obras no imóvel no valor de
€4.417,92 - facto 35 dos factos provados da douta sentença, e que o
Banco não colocou em crise - assiste-lhes o direito de retenção sobre
tais benfeitorias, sendo úteis e necessárias e que não podem ser
levantadas sem o seu detrimento e o da fracção.
47ª- Relativamente à alegada incompatibilidade de direito de retenção,
diremos de má fé, porque é uma alegação agora em sede de recurso
absolutamente contraditória com a posição do recorrente ao longo do
processo e dos factos provados, que não impugnou nesta parte ou
peticionou a sua reapreciação, pois que tal crédito foi efectivamente
impugnado pelo próprio recorrente, e tem uma posição quando o
impugnou, e só e muda para a posição contrária quando adquiriu tal
crédito.
48ª- Como resulta do facto provado sob o ponto 5 do item I da douta
sentença e ponto 4 do Item II , e ponto 11 do item II o recorrente
impugnou o crédito da “ N..., Lda .
49ª- Sendo impugnado ab initio consitui uma impugnação com todas as
consequências legais, tendo manifesta influência na lista de credores,
mesmo que mais tarde venha a existir desistência dessa impugnação,
porque a lista de credores, face a tal impugnação e demais outras,
aguarda obviamente a graduação de créditos a efectuar pelo Juiz em
sede de sentença final em conjunto com os demais créditos reclamados
e impugnados.
50ª- Sendo falsa a alegação do recorrente na pag. 48 das suas doutas
alegações “ que o crédito da N..., Lda foi reconhecido definitivamente
no saneador de 21.11.2014...”, pois como consta expressamente em tal
despacho:
“Apontou-se em anterior despacho a existência de uma
incompatibilidade entre o direito de retenção de que beneficia o crédito
da N..., Lda e os direitos de retenção dos demais credores cujos
créditos foram impugnados. Esta eventual incompatibilidade, face ao
acima se referiu relativamente à eficácia do caso julgado das sentenças

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que fundamentaram o reconhecimento dos créditos destes credores, só


é passível de ser dirimida em sede de audiência de julgamento, no
âmbito da presente acção. Assim, a decisão que vier a ser proferida no
que diz respeito aos créditos reclamados e impugnados terá em conta o
crédito da N... e a sua graduação.”
51ª- Ora quando se refere “ a sua graduação” obviamente que se trata
de reconhecer ou não o direito de retenção, pois a sentença não “altera”
qualquer crédito, apenas profere a graduação do crédito, e bem.
52ª- Por outro lado face ao facto provado sob o ponto 101 da sentença,
e a recorrente não põe em crise tal facto provado, a N..., Lda não esteve
na posse das sobreditas fracções ou não existindo traditio, como não
houve, obviamente que não pode ter ou ser-lhe reconhecido qualquer
direito de retenção.
53ª Por outro lado não podia a N..., Lda gozar do direito de retenção
“sobre todo o prédio descrito sob o nº 466”, o que pressupõe inclusive
sob as partes comuns, quando os recorridos já estavam na posse das
suas fracções.
54ª- Aliás, o próprio recorrente no seu requerimento de fls .. sob o
ponto 13 reconhece que “ … a questão do direito de retenção da N...,
Lda sobre todas as fracções que invocou ter, iria sempre colidir com o
direito de retenção invocado pelos requerentes”.
55ª- Sendo a N..., Lda uma pessoa não poderia estar na posse de todo o
prédio, designadamente sobre as fracções dos reclamantes, e não sendo
“consumidor”, não se verifica qualquer direito de retenção, pelo que o
erro do Sr. Administrador é manifesto, não havendo assim qualquer
incompatibilidade, pois que pura e simplesmente não existe direito de
retenção do Banco sobre as fracções dos ora recorridos.
Termos em que, e nos mais e melhores de direito que V. Exªs
doutamente suprirão, deve ser negado provimento ao recurso da
recorrente, mantendo-se a douta decisão recorrida, e assim se fará
inteira Justiça.
Contra-alegando, os reclamantes J..., E... e mulher e I..., apresentaram
as seguintes conclusões:
1ª- A douta sentença recorrida está profusa e proficuamente
fundamentada, não merecendo o menor reparo, quer quanto aos pontos
da matéria de facto apontados, quer quanto às quatro questões de
direito suscitadas.
2ª Insurge-se a recorrente contra a matéria de facto provada sob os
pontos 11º, 51 e 71º no que aos ora recorridos diz respeito, referente às
quantias entregues a título de sinal e principio de pagamento, inicial e
reforços aos Insolventes, pugnando que não devem ser considerados
provados;

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3ª- Desde logo é alegado pelo Banco que os recorridos não juntaram
cópias dos cheques e dos extractos bancários comprovativos de tais
supostos pagamentos, quando bem sabe que tal era um capricho do
recorrente à custa recorridos, já que não dispunham de tais documentos,
e se os quisessem obter e na medida do possível, dado o tempo
decorrido, teriam de pagar aos bancos, incluindo ao recorrente, uma
avultada quantia em comissões e outros “alcavalas”, dinheiro este que
os reclamantes não podem dispender inutilmente e até violadora do
sigilo bancário;
4ª- E inutilmente dado que o pagamento do sinal e reforços já estava
profusa e proficuamente provado e fundamentada em vários
documentos:
-sentenças transitadas em julgado e que não foram impugnadas,
-contratos promessa de compra e venda onde consta a respectiva
quitação dada pelos promitentes vendedores;
- cópias dos cheques que serviram de pagamento dos reforços de sinal
constantes nas respectivas acções intentadas pelos reclamantes nas
respectivas acções contra os promitentes vendedores e ora insolventes .
5ª- Sendo que o Banco recorrente produz afirmações de má fé e de
forma difamatória que se lamenta, e a esquecer-se dos seus esquemas
até 2014, pois o dinheiro investido pelos recorridos proveio do seu
trabalho durante décadas;
6ª- Os recorridos provaram, como lhes competia, quer por documentos
autênticos – sentença, quer por documentos particulares – cheques e
contratos, quer pela prova testemunhal, o pagamento do sinal e
respectivos reforços de cada um deles.
7ª- Os depoimentos das testemunhas produzidos em sede de audiência
de julgamento e gravados, e que nos dispensamos de repetir aqui, são
um sinal inequívoco de como a prova testemunhal complementou e
inequivocamente confirmou a prova documental.
8ª – Aliás, a fundamentação da douta sentença relativamente a estes
factos provados e no que a este respeito interessa é perfeitamente
elucidativa, pelo sua clareza e singeleza.
10ª- Pelo que não podem os ora recorridos concordar com a
modificação da matéria de facto pretendida, pois que, não se verificam
os erros que o recorrente lhe imputa, não havendo, assim, qualquer erro
de julgamento ou erro de apreciação da prova.
11ª Acresce que, é preciso não esquecer, a forma como se encontra
estruturada a audiência final, em torno do sistema da oralidade: o
princípio da imediação. Foi à luz deste contacto directo que permitiu ao
Mmo Juiz formar a sua convicção e, por conseguinte, dar como
provados tais factos naqueles termos e não como requerido pelo
recorrente.
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12ª Pois, é este contacto imediato, principalmente entre o Juiz e a


testemunha e o juiz, que permite ao julgador captar uma série valiosa
de elementos (através do que pode perguntar, pedir esclarecimentos,
observar e depreender do depoimento, da pessoa e das reacções do
inquirido) sobre a realidade dos factos, que a mera leitura do relato
escrito do depoimento não pode facultar.
13ª E, depois de uma leitura atenta à resposta à matéria de facto
provada e respectiva fundamentação e sentença, apercebemo-nos que
toda a articulação dos factos resultou de uma conjugação perfeita dos
princípios estruturantes a toda a audiência de discussão
e julgamento, que são eles: Oralidade, Livre apreciação da prova e
Imediação.
14ª Em consequência, e de acordo com o supra exposto, ou melhor,
perante aquilo que de concreto permitiu ao Mmo Juiz a quo decidir em
conformidade, dúvidas não restam que todos estes argumentos
explanados pelo Recorrente, em nada perfilam ou condizem, com uma
diferente resposta do Tribunal.
15ª- Relativamente à questão do incumprimento definitivo do contrato
promessa, não perfilhamos o entendimento da recorrente da
necessidade de ser intentada prévia acção de fixação judicial de prazo,
por duas ordens de razão:
Sempre existiu a sentença transitada em julgado que decidiu
“declarar resolvido por incumprimento imputável aos Reus, o contrato
promessa ...” e “Declarar que o autor tem direito de retenção sobre a
identificada fracção autónoma...” , reconhecendo, assim, o direito de
retenção aos promitentes-compradores.
Pese embora implícito sempre foi acordado um prazo, sendo a
escritura efectuada quando o promitente vendedor dispusesse dos
documentos necessários para celebrar a escritura de compra e venda;
16ª - Por um lado, o incumprimento definitivo já havia sido declarado
por sentença transitado julgado, no âmbito dos processos mencionados
nos pontos 25º, 26º, 65º, 66º, 84º e 85º dos factos provados, que
decidiram exatamente nesse sentido.
17ª- Pese embora o entendimento da recorrente de que as sentenças não
lhe são oponíveis por ser terceiro, a autoridade do caso julgado pode
atingir terceiros, no sentido de que a sentença se lhes impõe. São os
chamados terceiros juridicamente indiferentes, pessoas a quem a
sentença não causa nenhum prejuízo, por não bulir com a existência ou
validade do seu direito, embora possa afectar a sua consistência prática
e económica.
18ª- Nestes termos, parece-nos, salvo melhor opinião, que asentença
que reconhece o direito de retenção não afecta a existência, a validade
e/ou a consistência jurídica do direito do credor hipotecário, mas
apenas a consistência económica daquele direito, precisamente por
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aquele direito ser graduado à frente da hipoteca, aquela sentença faz


caso julgado contra o terceiro (in casu, credor hipotecário recorrente),
sendo-lhes oponível, v.g neste sentido- Ac. TRPorto de 13.01.2015.
19ª- No que concerne ao segundo argumento, atente-se ao Ac. do STJ
de 11.01.2011, cujo relator foi o Conselheiro Fonseca Ramos, cuja
situação factual é totalmente coincidente com a descrita nos presentes
autos no que aos ora recorridos diz respeito;
20ª- No caso dos nossos autos, resulta da factualidade provada, não
posta em crise, nos pontos 20º a 24º, 60º a 64º e 79º a 83º dos factos
provados, ainda que implicitamente, previsto um prazo para a escritura
pública de compra e venda, os promitentes-compradores interpelaram
admonitoriamente os promitentes-vendedores para que estes a
realizassem, o que não sucedeu.
21ª- Assim, deu-se por definitivamente incumprido o contrato pois,
foram os promitentes-vendedores interpelados admonitoriamente por
cartas registadas com A/R para que procedessem à marcação da
escritura de compra e venda, e foram minuciosamente cumpridos os
requisitos da interpelação cominatoria:
Intimação para o cumprimento (“...devem proceder à marcação da
escritura...”)
Fixação de um termo peremptório para o cumprimento (“...nos
próximos 10 dias...”)
Admonição ou cominação de que a obrigação se terá por
definitivamente incumprida (“...Caso não procedam à marcação da
mesma, irei pedir judicialmente a resolução do contrato promessa de
compra e venda...”)
31ª- De igual modo a “fuga” ou “desaparecimento” do promitente-
vendedor é um comportamento violador do contrato promessa, já que
esse comportamento pode e deve ser interpretado à luz do que o
homem médio entendesse e que atentas as circunstâncias do caso
concreto, promitente vendedor “fugido” para parte incerta, com o
propósito de “fugir” aos credores”, é de per si suficiente para não
cumprimento do contrato.
32ª- E a realização de obras pelos recorridos, necessárias e úteis, para
residir no imóvel, dado não terem onde morar, não significa que
mantenham o interesse na prestação, pois se assim fosse não requeriam
o incumprimento definitivo do contrato, como sucedeu e ademais,
parece-nos, sem grande esforço, que ninguém teria interesse em
adquirir uma fracção que não tem licença de habitabilidade e num
prédio hipotecado.
33ª- Por outro lado, a interpelação admonitória não tem de ser expressa
nem de resultar de documento escrito conforme entende o recorrente,
como o entendeu o nosso Supremo Tribunal, em Ac. datado de
30.04.2015, relator Conselheiro Tomé Gomes, supra transcrito ;
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34ª- Acresce que no caso dos autos parece-nos que a actuação do


insolvente revela definitiva vontade de não cumprir, como resulta de
toda a prova produzida em audiência de discussão e julgamento ,
designadamente pontos 12, 13, 23, 24, 64 e 83, entre outros que o
recorrente não questiona e tais comportamentos são, salvo melhor
opinião, totalmente incompatíveis com a intenção de cumprir o
contrato.
35ª- No que concerne à questão suscitada da tradição da coisa, para ser
válida e eficaz não tinha de ser acordada por escrito, pois que o
documento escrito é um acto meramente formal e que o acto material é
muito mais importante e relevante, que se traduz na entrega das chaves
e na entrega do imóvel, como, aliás, resulta provado na sentença.
36ª- A tradição do imóvel “embora surja frequentemente ligado à
celebração da promessa, não é um efeito necessário desta, mas um
efeito da eficácia translativa do direito própria do contrato prometido”
(vide Ac. TRL de 16.09.2014 e Ac. TRP de 03.04.2014).
37ª- A doutrina e a jurisprudência são unânimes que é suficiente a
tradição meramente simbólica, referindo-se o legislador à tradição
indistintamente e , aliás, ubi lex non distinguit, nec nos distinguier
debemus, neste sentido Ac. STJ de 14.10.2014 cujo relator foi o
Conselheiro João Camilo -sendo que in casu houve até a tradição
material.
38ª- Nesta situação verifica-se um investimento de confiança por parte
do promitente adquirente capaz de justificar o mecanismo de tutela tão
forte, e em boa medida estranho ao sistema, como é o direito de
retenção na configuração que ele actualmente tem, de direito real de
garantia não registado e especialmente privilegiado.
39ª- Salvo melhor entendimento, a ideia que transparece de todo o
regime instituído é a de que, a partir do momento em que se dá a
traditio, com o aludido significado de uma situação geradora de
especial confiança, seja ela material (através do contacto físico
imediato do promitente-comprador com o imóvel, maxime com
ocupação habitacional do mesmo), seja ela simbólica (v.g., entrega das
chaves), justificar-se-á o recurso, pelo promitente-comprador, aos
mecanismos previstos nos arts. 442.º n.º 2 e 755.º n.º 1 al. f).
40ª – Insurge-se o recorrente contra a douta sentença a quo, por
entender que deveriam ser tratados de modo diferente a parte dos
créditos dos promitentes compradores correspondentes ao sinal em
dobro das entregas por conta do preço e das despesas efectuadas com as
obras necessárias e úteis.
41ª- Ora, no que concerne às entregas por conta do preço, nos termos e
para os efeitos do disposto no art. 441º do CC, “presume-se que tem
carácter de sinal toda a quantia entregue, no momento da celebração do
contrato ou em momento posterior, pelo promitente- comprador ao

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promitente-vendedor, ainda que a titulo de compensação ou de


principio de pagamento”.
42ª Ora, resulta dos factos provados sob os pontos 11º, 51º e 70º, que o
valor do sinal não se resume ao valor primeiro sinal ou sinal entregue
aos promitentes-vendedores aquando da outorga dos contratos
promessa de compra e venda, mas sim à soma de todos os valores
entregues a titulo de sinal e princípio de pagamento e que ocorreram
posteriormente.
43ª- No que respeita ao valor das despesas com as obras, a recorrente
parte de uma premissa errada pois que, ao contrário do alegado pelo
recorrente, tais despesas com obras no imóvel beneficiam do direito de
retenção nos termos do disposto no art. 754º, e não, como afirma pela
alínea f) do art. 755º, daí o seu vício de raciocínio.
44ª- Assim, tendo os recorridos realizado obras no imóvel no valor de
12.578,17€ - facto 15, 9.068,68 € - facto 55 e 21.402,02 € - facto 74
dos factos provados da douta sentença, respectivamente, e que o Banco
não colocou em crise - assiste-lhes o direito de retenção sobre tais
benfeitorias, sendo úteis e necessárias e que não podem ser levantadas
sem o seu detrimento e o da fracção.
45ª- Relativamente à alegada incompatibilidade de direito de retenção,
diremos de má fé, porque é uma alegação agora em sede de recurso
absolutamente contraditória com a posição do recorrente ao longo do
processo e dos factos provados, que não impugnou nesta parte ou
peticionou a sua reapreciação, pois que tal crédito foi efectivamente
impugnado pelo próprio recorrente, e tem uma posição quando o
impugnou, e só e muda para a posição contrária quando adquiriu tal
crédito.
46ª- Como resulta do facto provado sob o ponto 5 do item I da douta
sentença e ponto 4 do Item II, e ponto 11 do item II o recorrente
impugnou o crédito da “ N..., Lda.
47ª- Sendo impugnado ab initio constitui uma impugnação com todas
as consequências legais, tendo manifesta influência na lista de credores,
mesmo que mais tarde venha a existir desistência dessa impugnação,
porque a lista de credores, face a tal impugnação e demais outras,
aguarda obviamente a graduação de créditos a efectuar pelo Juiz em
sede de sentença final em conjunto com os demais créditos reclamados
e impugnados.
48ª- Sendo falsa a alegação do recorrente na pag. 48 das suas doutas
alegações “que o crédito da N...,Lda foi reconhecido definitivamente
no saneador de 21.11.2014...”, pois como consta expressamente em tal
despacho:
“ Apontou-se em anterior despacho a existência de uma
incompatibilidade entre o direito de retenção de que beneficia o crédito
da N...,Lda e os direitos de retenção dos demais credores cujos créditos

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foram impugnados. Esta eventual incompatibilidade, face ao acima se


referiu relativamente à eficácia do caso julgado das sentenças que
fundamentaram o reconhecimento dos créditos destes credores, só é
passível de ser dirimida em sede de audiência de julgamento, no
âmbito da presente acção. Assim, a decisão que vier a ser proferida no
que diz respeito aos créditos reclamados e impugnados terá em conta o
crédito da N... e a sua graduação.”
50ª- Ora quando se refere “ a sua graduação” obviamente que se trata
de reconhecer ou não o direito de retenção, pois a sentença não “altera”
qualquer crédito, apenas profere a graduação do crédito, e bem.
51ª- Por outro lado face ao facto provado sob o ponto 101 da sentença,
e a recorrente não põe em crise tal facto provado, a N..., Lda não esteve
na posse das sobreditas fracções ou não existindo traditio, como não
houve, obviamente que não pode ter ou ser-lhe reconhecido qualquer
direito de retenção.
52ª Por outro lado não podia a N..., Lda gozar do direito de retenção
“sobre todo o prédio descrito sob o nº 466”, o que pressupõe inclusive
sob as partes comuns, quando os recorridos já estavam na posse das
suas fracções.
53ª- Aliás , o próprio recorrente no seu requerimento de fls .. sob o
ponto 13 reconhece que “ … a questão do direito de retenção da N...,
Lda sobre todas as fracções que invocou ter, iria sempre colidir com o
direito de retenção invocado pelos requerentes”.
54ª- Sendo a N..., Lda uma pessoa colectiva não poderia estar na posse
de todo o prédio, designadamente sobre as fracções dos reclamantes, e
não sendo “consumidor”, não se verifica qualquer direito de retenção,
pelo que o erro do Sr Administrador é manifesto, não havendo assim
qualquer incompatibilidade, pois que pura e simplesmente não existe
direito de retenção do Banco sobre as fracções dos ora recorridos.
Termos em que, e nos mais e melhores de direito que V. Exªs
doutamente suprirão, deve ser negado provimento ao recurso da
recorrente, mantendo-se a douta decisão recorrida, e assim se fará
inteira Justiça.
Por último, contra-alegando, os reclamantes L.. e mulher, apresentam
as seguintes conclusões:
1ª) O recurso apresentado pelo Recorrente não tem qualquer razão de
ser, uma vez que a douta sentença recorrida, devidamente
fundamentada, reflete, corretamente, aquilo que se passou na audiência
de julgamento e encontra-se em conformidade com a nossa legislação e
jurisprudência.
2ª) O Recorrente, na matéria que diz respeito aos Credores
Reclamantes, L.. e mulher M.., invoca aspetos, para tentar inverter o
correta e doutamente decidido, que não só são contraditórios, como
chegam a procurar fundamentos que são contrários à própria lei.
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3ª) O depoimento da testemunha U...foi claro pois referiu que o valor


total do contrato era de 159.615,33€, mas que eles apenas pagaram
80.000,00€, correspondente ao valor de metade no negócio celebrado,
veja-se a transcrição, em rodapé, a fls. 11 do douto e extenso recurso e
que foi o que na realidade se passou e que foi, aliás, confirmado pela
douta sentença proferida e já transitada em julgado, na ação que
instauraram e que lhes reconheceu o seu direito de retenção.
4ª) O depoimento da testemunha supra referida foi conciso, correto e
muito claro, tendo daí retirado o Mmo. Juiz “a quo” o devido sentido e
veracidade das suas afirmações, sendo que esta é a mais elementar
função do Tribunal, assente nos princípios da oralidade e da imediação
que norteia a interpretação a dar pelos Juízes na apreciação da prova
testemunhal.
5ª) Neste caso nem seria necessário, pois o simples recurso à análise
dos documentos juntos são disso a prova cabal, mais concretamente os
cheques de pagamento, com as respetivas quitações legais, os
comprovativos dos descontos bancários e, ainda a douta sentença que
lhes garantiu o seu direito de retenção.
6ª) Os factos dados como provados nos pontos de 86 a 97 da douta
sentença reportam-se ao contrato promessa celebrado entre os aqui
recorridos e os insolventes, contrato esse que foi junto aos autos, tanto
aqui como da ação em que viram reconhecido o seu direito de retenção,
factos esses que ali foram dados como assentes, tendo sido atribuída
validade formal e material ao referido contrato.
7ª) O despacho proferido nestes autos, em 21/11/2014, não reconheceu,
sequer ao Recorrente qualquer legitimidade para arguir a nulidade do
contrato promessa celebrado.
8ª) Os credores reclamantes reclamaram o seu crédito, de acordo com o
disposto no art. 128º do CIRE, pois disseram o montante e a origem do
seu crédito, suportado pelos documentos legais exigidos, neste caso a
douta sentença proferida nos autos que correram termos pelo extinto 2º
Juízo do Tribunal da Comarca de Lamego, com o nº 369/06.3TBLMG.
9ª) A falta de estipulação do prazo para a marcação da escritura,
também não corresponde minimamente à verdade, foi estipulado um
prazo, entre os promitentes-compradores e o promitente vendedor,
como, aliás, todas as testemunhas corroboraram, só não foi reduzido a
escrito, por culpa exclusiva dos insolventes que, quando viu que não
conseguia marcar as escrituras devidas, entregou os apartamentos
àqueles para que acabassem e fugiu para parte incerta, nunca mais
tendo sido visto desde essa altura.
10ª) A douta sentença fundamentou-se, relativamente ao crédito dos
aqui recorridos L.. e mulher M.. resultou da análise conjugada dos
meios

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de prova, tanto da cópia da sentença que tomou o nº369/06.3TBLMG


tendo corrido os seus termos no 2º Juízo do Tribunal Judicial de
Lamego (fls. 234 a 240), das facturas relativas ao consumo de
electricidade, àgua e gás (fls. 241 a 243, 738 a 751, e 757 a 760), dos
cheques emitidos pelos credores em referência relativo ao pagamento
da quantia de €29.930,00 em 30-05-2002, a título de antecipação do
pagamento do preço (fls. 244 e 755 a 757), do contrato-promessa
celebrado em 13 de Setembro de 2001 entre o insolvente enquanto
promitente-vendedor, onde se identificam os imóveis prometidos
vender; se descrimina a quantia entregue a título de sinal e a forma e
tempo do pagamento do preço restante - fls. 245 a 248, da informação
bancária do “Nova Rede” relativamente à conta da qual foram
levantados por meio de cheque os montantes para pagar ao insolvente o
valor do sinal pago (fls. 974 e 975 Estes documentos particulares não
foram impugnados pelo “ C..., S.A.” quanto à sua genuinidade e do
depoimento de U... e das declarações de parte do credor L...
11ª) Esta fundamentação, como se vê, está devidamente alicerçada em
documentos nunca questionados pelo Recorrente e os depoimentos das
testemunhas foram claros, concisos e verdadeiros.
12ª) Dúvidas não existem de que os credores reclamantes, aqui
recorridos, pagaram aos insolventes as quantias que alegaram.
13ª) Pelo que não se vê por onde pode esta matéria de facto dada como
provada ser atacada da forma como o Recorrente o faz, pois não existe
qualquer erro ou deficiência na sua apreciação.
14ª) Em relação ao depoimento das testemunhas e às declarações de
parte prestadas, o Mmo. Juiz “a quo” usou, e bem diga-se, o recurso ao
princípio da oralidade e da imediação para concluir, sobre os
depoimentos, da forma como fez, pois estes princípios permitem aos
interlocutores uma maior interação e análise da forma como são
prestados os depoimentos.
15ª) A tudo isto juntamos a livre apreciação da prova, corolário dos
princípios anteriores, pelo que se pode dizer, sem sombra de dúvidas,
que a sentença recorrida, reproduz fielmente aquilo que efetivamente se
passou em audiência de julgamento.
16ª) A prova tem de ser julgada no seu conjunto, permitindo ao Mmo.
Juiz que a analisa retirar dela o seu sentido verdadeiro e que contribua
para a descoberta da verdade material, o que aqui foi feito e bem feito,
diga-se.
17ª) Não restam quaisquer dúvidas quanto à habitação dos imóveis
pelos ora recorridos, nem o Recorrente coloca em causa.
18ª) No entanto, sempre será de referir que a nossa jurisprudência é
unânime no sentido de que o Acórdão Uniformizador de Jurisprudência
nº4/2014, pelo qual se entende que o direito de retenção apenas deverá
ser conferido ao promitente-comprador que seja consumidor não

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poderá aplicar-se à presente reclamação de créditos, formulada seis


anos antes da sua existência, por não ser previsível àquela data a
exigência de tal requisito, que não estava previsto na lei e que só muito
mais tarde começou a ser suscitada na doutrina e jurisprudência.
19ª) Isto mesmo resulta claramente dos Acórdãos do Tribunal da
Relação de Coimbra de 02.02.2016 no Proc. nº1516/14.7TBCLD-B.C1,
in www.dgsi.pt e de 08.09.2015 no Proc. nº20806/11.6TBVIS-C.C1.
20ª) Mas mais concretamente, o STJ se pronunciou também sobre a
questão no Acórdão proferido 16/02/2016 no processo nº
135/12.7TBMSF.G1.S1.
21ª) Mas tal questão nem sequer pode ser apreciada, uma vez que
apenas foi suscitada, agora, em sede de recurso, por parte do
Recorrente, não tendo sido sequer motivo de impugnação da garantia
invocada pelos Recorridos, devendo, por isso, ser considerada uma
verdadeira “questão nova”.
22ª) Quanto à falta de incumprimento definitivo alegado pelo
Recorrente também não lhe assiste qualquer razão, nem de facto, nem
de direito, tendo, nesse aspeto, a douta sentença recorrida sido clara e
assertiva, na forma como abordou a questão.
23ª) Quanto à fixação do prazo para cumprir também tal questão não
pode proceder porque houve uma sentença, transitada em julgado, que
declarou “resolvido o contrato promessa por incumprimento definitivo
totalmente imputável aos RR”, aqui insolventes, condenando-os ainda
“no pagamento da quantia de 159.619,56€, correspondente ao dobro do
sinal prestado”.
24ª) A mesma sentença reconheceu, ainda que os aqui credores
reclamantes, “têm um direito de retenção sobre as frações” para
“garantia da mencionada importância.”
25ª) Além disso, a fixação do prazo para a realização da escritura
pública ficou dependente da reunião dos documentos necessários, pelos
insolventes, para a sua realização, que nunca conseguiu.
26ª) Assim, por um lado, o incumprimento definitivo foi fixado por
sentença, transitada em julgado, como se vê dos pontos 98 e 99 da
matéria dada como provada.
27ª) O Recorrente entende que esta sentença, transitada em julgado não
lhe pode ser oponível, o que na nossa humilde opinião não pode
proceder.
28ª) De acordo com o conceito de caso julgado, nesta situação em
particular, a sentença que reconhece o direito de retenção não afecta a
existência, a validade e/ou a consistência jurídica do direito do credor
hipotecário, mas apenas a consistência económica daquele direito,
precisamente por aquele direito ser graduado à frente da hipoteca,

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aquela sentença faz caso julgado contra o terceiro (in casu, credor
hipotecário recorrente), sendo-lhes oponível.
29ª) Neste sentido, veja-se o Ac. T.R. do Porto de 13.01.2015 que
prevê: “A sentença que reconhece o direito de retenção do promitente-
comprador sobre imóvel hipotecado não afecta a existência, a validade
e/ou a consistência jurídica do direito do credor hipotecário; apenas
afecta a consistência prática/económica deste direito, na medida em que
o direito de retenção é graduado à frente da hipoteca. Sendo, assim, o
credor hipotecário um terceiro juridicamente indiferente, aquela
sentença faz caso julgado contra si, sendo-lhe oponível.”
30ª) De igual modo, atente-se aos Ac. TRE de 14.06.2012 proc.
3052/10.1TBSTR-C.E1, e Ac. STJ de 16.03.99, in BMJ 485/356, Ac.
STJ de 24.03.1992, in BMJ 415/622, Ac. STJ de 03.06.2003, proc. nº
03A1432, TRP de 21.10.2008, proc. nº 0822499, Ac. TRP de
26.05.2011, proc. nº 395/09.0TBSJM-B.P1.
31ª) De qualquer forma tal não assume a relevância nem o alcance que
o recorrente pretende pois, independentemente da qualificação a que se
chegue, a consequência associada a esta omissão é sempre a preclusão
da possibilidade de se voltar a discutir o crédito e a correspondente
garantia, com a graduação dos créditos e respectivas garantias
reconhecidas acima do crédito hipotecário.
32ª) No que concerne ao segundo argumento, atente-se ao Ac. do STJ
de 11.01.2011, do Sr. Conselheiro Fonseca Ramos, que foi o relator,
cuja situação factual é totalmente coincidente com a discutida nestes
autos.
33ª) Como se vê do ponto 94 da matéria de facto “Acordaram ainda
que a escritura pública seria realizada logo que os Insolventes
obtivessem todos os documentos necessários para tal, tendo sido
verbalmente apontada por eles a data de 30 de Maio de 2004 como
limite máximo.”
34ª) Antes que obtivessem os documentos, os insolventes entregaram
os imóveis e desapareceram sem dar qualquer notícia, impedindo,
assim, que pudessem ser contactados pelos credores reclamantes, para
marcar as escrituras devidas.
35ª) Esse comportamento pode e deve ser interpretado à luz do que o
homem médio entende e que, tendo em conta as circunstâncias do caso
concreto, o facto de o promitente vendedor ter “fugido” para parte
incerta, com o propósito de “fugir aos credores”, é demonstrativo do
facto de não pretender dar cumprimento do contrato.
36ª) Mais defende o recorrente que os recorridos não perderam o
interesse na prestação até porque fizeram obras e residem no imóvel.
37ª) Primeiramente e como é do conhecimento do recorrente os
promitentes-compradores não tinham outro lugar para viver aquando da
sua deslocação em férias a Portugal e se não houvessem perdido o
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interesse na prestação certamente não requeriam o incumprimento


definitivo do contrato, como sucedeu.
38ª) Além disso, facilmente se percebe que ninguém teria interesse em
adquirir uma fracção que não tem licença de habitabilidade e, ainda
mais, num prédio hipotecado.
39ª) Ainda que assim não se entenda, o que não se concede, não
podemos esquecer que a interpelação admonitória não tem de ser
expressa nem tem de resultar de documento escrito. Na verdade, é mais
do que denunciador do não cumprimento do contrato, o comportamento
do promitente-vendedor, que se encontra em parte incerta, impedindo,
por sua vontade a tal interpelação.
40ª) Assim o entendeu o nosso Supremo Tribunal, em Ac. datado de
30.04.2015, cujo relator foi o Sr. Conselheiro Tomé Gomes, onde
consta: “.... tem sido admitido que, para os mesmos efeitos, é
dispensável a interpelação admonitória, desde que se verifique uma
recusa inequívoca de cumprir por parte do devedor[6].
41ª) No mesmo sentido vide Ac. STJ de 22.06.2010, cujo relator
Conselheiro Fonseca Ramos.
42ª) No caso dos autos a actuação do insolvente revela definitiva
vontade de não cumprir, desde logo porque, resulta de toda a prova
produzida em audiência de discussão e julgamento, veja-se a título de
exemplo os pontos 33, 43, 44, 96, da matéria de facto dada como
provada.
43ª) Tais comportamentos são, salvo melhor opinião, totalmente
incompatíveis com a intenção de cumprir o contrato.
44ª) Mas, ainda que se entendesse ser necessária a propositura de acção
de fixação de prazo, sempre poderia concluir-se, dos factos provados, o
incumprimento definitivo do contrato, através de uma ilação inferida
dos factos provados em sede de presunção judicial, nos termos do art.
349º e 351º do CC, tal como o fez o nosso Supremo Tribunal, num caso
análogo.
45ª) Se fossem os credores reclamantes obrigados a instaurar a ação
para fixação de prazo, o que acarretaria mais perda de tempo, pois não
seria possível citá-los, a não ser editalmente, estaríamos a prejudica-los,
em benefício dos próprios insolventes, o que seria contra tudo aquilo
que os ditames da boa-fé exigem.
46ª) Relativamente à tradição da coisa quanto às fracções dos credores
reclamantes, o recorrente entende que para ser válida e eficaz tinha de
ser acordada por escrito, invocando para tanto o disposto no art. 221º
do CC, sob epígrafe “âmbito da forma legal”.
47ª) Ora, o documento escrito é um acto meramente formal e o acto
material é muito mais importante e relevante, que se traduz na entrega

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das chaves e na entrega dos imóveis, como, aliás, resulta provado na


sentença.
48ª) A lei prevê “as estipulações posteriores ao documento só estão
sujeitas a forma legal prescrita para a declaração se as razões de
exigência especial da lei lhe forem aplicáveis”, pelo que se trata de uma
exceção e não de uma regra.
49ª) O contrato promessa tem por objecto a celebração de um outro
contrato, o contrato prometido, sendo deveres principais para os
promitentes emitirem declarações de vontade necessárias à
concretização da promessa feita. E os efeitos que decorrem desse
contrato promessa não se confundem com os que decorrem do contrato
prometido, que só se concretizarão com a realização deste.
50ª) Na verdade, a tradição do imóvel “embora surja frequentemente
ligado à celebração da promessa, não é um efeito necessário desta, mas
um efeito da eficácia translativa do direito, própria do contrato
prometido, pelo que, ainda que coexista com o contrato-promessa, a
tradição da coisa não é efeito deste, mas resultado de uma convenção
negocial complementar ao contrato promessa através da qual os
promitentes antecipam os efeitos do contrato prometido, naturalmente
na expectativa e com a confiança de que este irá ser celebrado. Sendo
uma convenção complementar ao contrato promessa, geralmente é
verbal, não lhe sendo aplicáveis as cláusulas insertas no contrato
promessa” (vide Ac. TRL de 16.09.2014 e Ac. TRP de 03.04.2014).
51ª) Aliás, é doutrina e jurisprudência aceite que é suficiente a tradição
meramente simbólica, referindo-se o legislador à tradição
indistintamente.
52ª) Neste sentido, Ac. STJ de 14.10.2014 cujo relator foi o
Conselheiro João Camilo, que prevê “A verificação do direito de
retenção previsto na al. f) do n.º 1 do art. 755.º do CC, basta-se com um
contrato-promessa em que haja uma tradição da coisa prometida
meramente simbólica”,
53ª) E o Ac. TRC de 15.01.2013 que dispôs “A traditio exigida para
que se constitua o direito de retenção reclama apenas a detenção
material lícita da coisa – não sendo necessário, para esse efeito, uma
posse. Por outras palavras: a posse não constitui requisito daquela
garantia real”.
54ª) O elemento literal dos arts. 442.º n.º 2 e 755.º n.º 1 al. f) comporta
os dois entendimentos, na medida em que as disposições legais referem
genericamente a tradição, não distinguindo, para os efeitos que
prevêem, entre tradição material e simbólica.
55ª) Não podemos esquecer que o espírito que presidiu à reforma do
regime do contrato promessa no qual tenha havido traditio e que
conduziu ao regime jurídico dos arts. 442.º n.º 2 e 755.º n.º 1 al. f, é em

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boa verdade, alheio à distinção técnico-jurídica operada noutros


contextos entre a tradição real e meramente simbólica.
56ª) É importante analisar em quais das situações lhes correspondem e
se se verifica um investimento de confiança por parte do promitente
adquirente capaz de justificar o mecanismo de tutela tão forte, e em boa
medida estranho ao sistema, como é o direito de retenção, na
configuração que ele actualmente tem, de direito real de garantia não
registado e especialmente privilegiado.
57ª) Veja-se o Acórdão do STJ, proferido em 16/02/2016, no processo
nº 135/12.7TBMSF.G1.S1, que refere que “I – A traditio é um
pressuposto indispensável do direito de retenção e que se configura
como o poder de facto sobre a coisa que o promitente vendedor
conferiu ao promitente-comprador, ou seja, como um conjunto de atos
materiais ou simbólicos demonstrativos do controlo sobre a coisa.
IV – Não se verifica a inconstitucionalidade dos artigos 755.º, n.º 1 al.
f) e 759.º do Código Civil por violação dos princípios da confiança e
da proporcionalidade previstos nos artigos 2.º e 18.º da CRP, pois o
regime jurídico plasmado naquelas normas, segundo o qual o direito
de retenção prevalece sobre a hipoteca, encontra justificação na tutela
dos direitos dos particulares. Tem-se entendido que as entidades
bancárias cujo crédito está garantido por hipoteca voluntária têm
outros instrumentos de tutela da sua posição, o que não ocorre com o
promitente-comprador, a parte mais fraca do contrato e com menos
acesso à informação.”
58ª) A ideia que transparece de todo o regime jurídico instituído é a de
que, a partir do momento em que se dá a traditio, seja ela material
(através do contacto físico imediato do promitente-comprador com o
imóvel, maxime com ocupação habitacional do mesmo), seja ela
simbólica (v.g., entrega das chaves), justificar-se-á o recurso, pelo
promitente comprador, aos mecanismos previstos nos arts. 442.º n.º 2 e
755.º n.º 1 al. f.
59ª) Em face da “ratio legis”, a entrega é seguramente relevante quando
o promitente comprador tenha já constituído no imóvel o centro da sua
vida familiar. Verificando-se uma ligação mais intensa com o imóvel, o
índice de confiança depositado pelo promitente adquirente na
estabilidade do negócio é potencialmente mais significativo, o que,
consequentemente, justifica uma tutela acrescida.
60ª) Nestes autos, resultou provado que:
“95. Os Insolventes não acabaram as obras e a escritura pública não foi
realizada.
96. Os Insolventes entregaram as chaves dos apartamentos aos credores
supra referidos e ausentaram-se para local desconhecido.
97. Os credores supra referidos para tornarem habitáveis os imóveis
colocaram portas, quadro de electricidade, instalação de água e fizeram
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neles diversos melhoramentos.”


61ª) Pelo que, da factualidade descrita dúvidas não restam quanto à
efectiva tradição das fracções.
62ª) Neste sentido, atente-se ao citado Ac. STJ de 16.02.2016, “O
direito de retenção tem sido concedido aos promitentes-compradores,
entendendo-se que a constituição de sinal e a tradição da coisa têm
subjacente uma forte confiança na firmeza e concretização do negócio,
impondo-se, em consequência, com particular acuidade, defender o
mais possível o exato cumprimento do contrato e que a execução
específica não resulte inoperante mercê da alienação da coisa a
terceiro, quando a promessa se encontre destituída de eficácia real.
Nesta sequência, tem-se admitido que existe transmissão da posse do
promitente vendedor para o promitente-comprador, não por via do
contrato-promessa mas por força do acordo negocial da traditio e da
efetiva entrega da coisa. Neste caso o promitente-comprador, que
recebe a coisa e a usa como se fosse sua, praticando sobre ela os atos
materiais correspondentes ao exercício do direito de propriedade, é um
verdadeiro possuidor em nome próprio”.
63ª) Sobre a questão da inclusão no direito de retenção de créditos não
abrangidos pelo art. 442º do CC. entende o Recorrente que deveriam
ser tratados de modo diferente a parte dos créditos dos promitentes
compradores correspondentes ao sinal em dobro das entregas por conta
do preço e das despesas efectuadas com as obras necessárias e úteis.
64ª) No que concerne às entregas por conta do preço, nos termos e para
os efeitos do disposto no art. 441º do CC, “presume-se que tem carácter
de sinal toda a quantia entregue, no momento da celebração do contrato
ou em momento posterior, pelo promitente comprador ao promitente-
vendedor, ainda que a título de compensação ou de princípio de
pagamento”.
65ª) Resulta dos factos provados que:
“91. Os credores supra referidos entregaram aos insolventes, na data
da celebração do contrato, a quantia de €49.879,78, de que estes deram
logo ali quitação.
92. Em 30 de Maio de 2002 os credores supra referidos entregaram aos
Insolventes mais €29.930,00, por meio de cheque do qual os
Insolventes deram quitação”.
66ª) O valor do sinal não se resume ao preço pago de início, o primeiro
sinal ou o sinal entregue aos promitentes-vendedores aquando da
outorga dos contratos promessa de compra e venda, mas sim à soma de
todos os valores entregues a título de sinal e princípio de pagamento e
que ocorreram posteriormente.
67ª) Assim, deve considerar-se verificado aquele primeiro valor, ou
seja, €159.619,56 relativo ao dobro do sinal prestado, apesar de ser
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pago em várias tranches, que lhe confere o direito de retenção nos


termos da alínea f) do 755º.
68ª) Em relação ao último ponto, actua aqui o Recorrente, com esta
posição, de forma contraditória com a posição que teve ao longo do
processo e dos factos provados, que não impugnou nesta parte ou
peticionou a sua reapreciação, pois que tal crédito foi efectivamente
impugnado pelo próprio recorrente, e tem uma posição quando o
impugnou, e só e muda para a posição contrária quando adquiriu tal
crédito.
69ª) Como resulta do facto provado sob o ponto 5 do item I da douta
sentença e ponto 4 do Item II, o recorrente impugnou o crédito da “
N..., Lda.
70ª) Ora, sendo impugnado ab initio constitui uma impugnação com
todas as consequências legais, tendo manifesta influência na lista de
credores, mesmo que mais tarde venha a existir desistência dessa
impugnação.
71ª) A lista de credores, face a tal impugnação e às outras, aguarda
obviamente a graduação de créditos a efectuar pelo Mmo. Juiz em sede
de sentença final em conjunto com os demais créditos reclamados e
impugnados.
72ª) É falsa a alegação do recorrente na pág. 48 das suas doutas
alegações quando refere que “Tanto mais que o crédito da N..., Lda. foi
reconhecido definitivamente no
73ª) Pois como consta expressamente em tal despacho:
“Esta eventual incompatibilidade, face ao acima se referiu
relativamente à eficácia do caso julgado das sentenças que
fundamentaram o reconhecimento dos créditos destes credores, só é
passível de ser dirimida em sede de audiência de julgamento, no
âmbito da presente acção. Assim, a decisão que vier a ser proferida no
que diz respeito aos créditos reclamados e impugnados terá em conta o
crédito da N... e a sua graduação.”
74ª) A N..., Lda. não esteve na posse das sobreditas fracções nem
existiu traditio, pelo que, obviamente, não pode ter ou ser-lhe
reconhecido qualquer direito de retenção. Além disso, sendo a N... uma
pessoa colectiva não podia gozar do direito de retenção, quando os
recorridos já estavam na posse das suas fracções.
75ª) Aliás, o próprio recorrente no seu requerimento de fls. sob o ponto
13 reconhece que “ … a questão do direito de retenção da N..., Lda
sobre todas as fracções que invocou ter, iria sempre colidir com o
direito de retenção invocado pelos requerentes”.
76ª) Assim, o direito de retenção teria sempre de ser reconhecido aos
recorridos e nunca à N..., Lda, pois esta não tinha a traditio das mesmas
fracções nem a possibilidade de exercer o seu direito.
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77ª) Antes de adquirir o crédito, o Recorrente tinha uma posição e após


adquirir o crédito da N..., passou a ter outra completamente diferente.
78ª) Além disso os direitos de retenção dos ora recorridos sobre as
respectivas fracções, foram reconhecidos sobre fracções certas e
determinadas e decorrentes do incumprimento pelos insolventes dos
contratos-promessa celebrados, como consta das doutas sentenças
transitadas em julgado.
79ª) É certo que as sentenças transitaram em julgado e não sendo
oponível ao recorrente a excepção de caso julgado, já é oponível a
excepção da autoridade de caso julgado que tais sentenças representam,
como é doutrina e jurisprudência uniformes.
80ª) Isto é, as decisões proferidas nos processos anteriores e transitadas
em julgado, que reconheceram os direitos de retenção sobre
determinadas fracções, obstam a que aquela relação jurídica ou situação
jurídica material possa ser validamente definida de modo diverso por
outra sentença, por causa da certeza e segurança jurídica, princípios
corolários do direito.
81ª) Para ter direito de retenção deveria ter na sua posse “todo o
prédio”, ou as fracções dos respondentes, o que nunca se verificou, nem
podia verificar, pois o prédio estava em construção, nem tendo havido,
como se refere no douto despacho de fls … qualquer “traditio”.
82ª) Tendo em conta a douta sentença, verifica-se que lista de créditos
apresentada padece de um manifesto erro ao reconhecer como crédito
garantido por direito de retenção o crédito daquela “ N..., Lda”,
posteriormente transmitido para o “ D..., S.A.” (cfr. Apenso F), que
deve ser corrigido.
Nestes termos, e nos mais e melhores de direito que V. Exas.
doutamente suprirão, deve ser negado provimento ao recurso do
Recorrente, mantendo-se a douta decisão recorrida, nos seus precisos
termos, fazendo-se assim a tão costumada e esperada Justiça.
Colhidos os vistos legais, há que decidir.
Tendo em linha de conta que nos termos do preceituado nos artigos
635, n.º 4 e 639, n.º 1, ambos do NCPC, as conclusões da alegação de
recurso delimitam os poderes de cognição deste Tribunal e
considerando a natureza jurídica da matéria versada, são as seguintes
as questões a decidir:
A. Incorrecta análise e apreciação da prova – reapreciação da
prova gravada, relativamente aos itens 11.º, 31.º, 51.º e 70.º; 36 e
38.º, dos factos dados como provados, devendo os mesmos passar a
considerar-se como não provados; 86.º a 97.º, que devem ser
eliminados e 94.º, que deve passar a ter a redacção indicada na
conclusão 8.ª.

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B. Omissão da graduação do crédito do recorrente, relativamente à


verba n.º 1, que foi admitido e reconhecido e, como tal, deve ser
graduado;
C. Se não se verifica o incumprimento definitivo de nenhum dos
contratos promessa;
D. Se não ocorreu tradição válida das fracções correspondentes às
verbas 5, 8, 9, 10, 12 e 13;
E. Se os créditos resultantes de entregas por conta do preço e de
despesas com obras efectuadas nas fracções, não conferem aos
recorridos o direito de retenção a que se arrogam;
F. Incompatibilidade entre o direito de retenção invocado pelos ora
recorridos e o direito de retenção de que é titular a N..., que lhe foi
reconhecido e graduado, por falta de impugnação, logo no
despacho saneador e;
G. Se não pode ser reconhecido o direito de retenção, quanto às
verbas 3, 5, 8 e 9, por os respectivos promitentes compradores não
poderem ser considerados como consumidores.
É a seguinte a factualidade dada como provada na sentença
recorrida:
1. Por sentença proferida em 24 de Abril de 2008, transitada em
julgado, foi declarada a insolvência de A... e B..., identificados nos
autos.
2. Foi fixado o prazo de 30 dias para reclamação de créditos.
3. De fls. 3 a 7 do presente apenso, veio o Sr. Administrador da
Insolvência apresentar a lista de créditos a que alude o art. 129º do
C.I.R.E.
4. Foram impugnados os créditos dessa lista reclamados por E... e
mulher F..., G...e mulher H..., I..., J..., L.. e mulher, e “ N..., Lda.”. Os
demais não foram impugnados.
5. Veio igualmente reclamar créditos, através de acções de verificação
ulterior de créditos, o Estado (apensos D e L).
6. Foram apreendidos a favor da massa insolvente os imóveis
constantes do auto de apreensão de fls. 3 e seguintes do apenso
respectivo.
7. Os imóveis, objecto de contrato promessa dos credores reclamantes
E... e mulher F..., G...e mulher, I..., J..., e L.. e mulher M.., estão
onerados com hipotecas constituídas a favor do “ C..., S.A.”, hoje “
D..., S.A.”.
*

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8. E... celebrou com os Insolventes, em 29 de Janeiro de 2002, através


de documento particular, um contrato promessa pelo qual estes
prometeram vender e o primeiro prometeu comprar uma “habitação
tipo T3, no terceiro andar direito do bloco três, com a garagem número
vinte para um automóvel e o arrumo número um no sótão, no prédio
que aqueles estão a construir no lugar de Rina, freguesia da Sé, deste
concelho de Lamego ...”.
9. A referida fracção actualmente é designada pela fracção “AA” do
prédio construído em propriedade horizontal, inscrito na matriz urbana
da freguesia da Sé sob o artigo 1969 e descrita na Conservatória do
Registo Predial de Lamego sob o nº00466/19920110-AA.
10. Os Insolventes prometeram vender aos credores supra referidos e
estes prometeram comprar a referida fracção autónoma pelo preço de
€87.290,00, livre de quaisquer ónus, encargos ou responsabilidades.
11. A título de sinal e princípio de pagamento, inicial e reforços, os
credores supra referidos entregaram aos Insolventes a quantia global de
€22.500,00.
12. Em meados do mês de Agosto de 2004, os Insolventes entregaram
as chaves do apartamento, em definitivo, aos credores reclamantes
supra referidos, para eles o habitarem como se deles fosse.
13. Bem como concordaram que os reclamantes realizassem pequenas
obras e acabamentos que faltava efectuar da fracção e garagem, já que
eles não tinham capacidade financeira para o fazer.
14. Os credores reclamantes supra referidos efectuaram pinturas,
colocaram pavimentos, efectuaram trabalhos de pichelaria, adquiriram
e colocaram louças sanitárias e móveis, efectuaram serviços de
electricidade, colocaram portas e armários, móveis de cozinha e
finalizaram ou arremataram pequenas obras no apartamento.
15. Tais obras importaram em materiais, mão-de-obra e serviços o valor
total de €12.578,17, que os credores reclamantes supra referidos
pagaram.
16. Os credores reclamantes e a sua família, algum tempo depois da
entrega das chaves, passaram a habitar a fracção em causa como se
fosse sua, com exclusão de outrem, sem oposição de quem quer que
seja e à vista de toda a gente, até ao presente.
17. Todos os reconhecendo como donos da fracção em causa, inclusive
os Insolventes.
18. A partir de Agosto de 2004 os credores reclamantes e sua família
dormem na fracção em causa, aí tomam as suas refeições, recebem
amigos e correspondência, assumindo o pagamento de todas as
despesas relacionadas com a fracção, bom como as quotas do
condomínio, tendo ainda pago uma quota-parte das obras efectuadas
nas partes comuns do prédio.
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19. Requereram à C. M. de Lamego o contador da água e respectivo


fornecimento, bem como requereram a instalação do gás e o
fornecimento da energia eléctrica, tendo pago as despesas inerentes a
tais instalações.
20. A escritura pública de compra e venda deveria ser realizada quando
os Insolventes obtivessem todos os documentos necessários e
indispensáveis à realização da mesma.
21. O credor reclamante, promitente-comprador, deveria ser notificado,
por carta registada, com a antecedência mínima de 15 dias, o que nunca
veio a acontecer, nunca tendo marcado a respectiva escritura pública.
22. Os credores reclamantes enviaram uma carta registada aos
Insolventes, em, 29 de Abril de 2005, a solicitar-lhes a marcação da
data da escritura pública.
23. Tal carta veio devolvida por “Não atendeu dia …” e “não tem
receptáculo postal” e “o destinatário retirou-se”.
24. O prédio onde se situa a fracção em causa não tem licença de
habitabilidade.
25. Os credores reclamantes supra referidos propuseram uma acção
judicial contra os insolventes que correu termos no 1º Juízo do TJ de
Lamego, tomando o nº445/05.0TBLMG, a qual foi julgada procedente.
26. A sentença, já transitada em julgado, foi proferida no dia 16-10-
2006 e decidiu o seguinte:
“1 - Declarar-se resolvido, por incumprimento imputável aos Réus, o
contrato promessa referido em 2-al. c). / 2 – Condenar-se os Réus a
pagarem aos Autores a quantia de €45.000,00, correspondente ao
dobro do sinal prestado; / 3 – Mais condenar os Réus a pagarem aos
Autores, a título de indemnização, a quantia de €12.578,17, pelas
despesas efectuadas pelo segundo na fracção autónoma; / 4 –
Condenar ainda os Réus em juros de mora, à taxa legal, relativos às
quantias indicadas em 2º e 3º, desde a citação até efectivo e integral
pagamento. / 5 – Declarar que o Autor tem direito de retenção sobre a
identificada fracção autónoma para garantia da mencionada
importância de €45.000,00”.
*
27. G...celebrou com os Insolventes, em 02 de Março de 2001, através
de documento particular, um contrato promessa pelo qual estes
prometeram vender e o primeiro prometeu comprar um apartamento
tipo T2, correspondente ao terceiro andar esquerdo do Bloco número
dois, com arrumos números cinco e seis no sótão e a garagem número
quinze na cave, no prédio que aqueles estão a construir no lugar de
Rina, freguesia da Sé, deste concelho de Lamego.
28. O Insolvente prometeu ainda vender e os credores reclamantes em
referência prometeram comprar uma garagem com o número vinte e
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quatro na cave do Bloco número três do mesmo prédio.


29. As referidas fracções actualmente são designadas pelas fracções
“P” e “R” do prédio construído em propriedade horizontal, inscrito na
matriz urbana da freguesia da Sé sob o artigo 1969 e descrita na
Conservatória do Registo Predial de Lamego sob o nº00466/19920110-
P e R.
30. Os Insolventes prometeram vender aos credores supra referidos e
estes prometeram comprar as referidas fracções autónomas pelo preço
de €64.843,73 e a garagem número vinte e quatro do Bloco três pelo
preço de €4.987,98, livre de quaisquer ónus e encargos.
31. A título de sinal e princípio de pagamento, inicial e reforços, os
credores supra referidos entregaram aos Insolventes a quantia global de
€69.831,71.
32. Em meados do mês de Agosto de 2004, os Insolventes entregaram
as chaves do apartamento, em definitivo, aos credores reclamantes
supra referidos, para eles o habitarem como se deles fosse.
33. Bem como concordaram que os reclamantes realizassem pequenas
obras e acabamentos que faltava efectuar da fracção e garagem, já que
eles não tinham capacidade financeira para o fazer.
34. Os credores reclamantes supra referidos efectuaram pinturas,
colocaram pavimentos, efectuaram trabalhos de pichelaria, adquiriram
e colocaram louças sanitárias e móveis, efectuaram serviços de
electricidade, colocaram portas e armários, móveis de cozinha e
finalizaram ou arremataram pequenas obras no apartamento.
35. Tais obras importaram em materiais, mão-de-obra e serviços o valor
total de €4.417,92, que os credores reclamantes supra referidos
pagaram.
36. Os credores reclamantes e a sua família, algum tempo depois da
entrega das chaves, passaram a habitar a fracção em causa como se
fosse sua, com exclusão de outrem, sem oposição de quem quer que
seja e à vista de toda a gente, até ao presente.
37. Todos os reconhecendo como donos das fracções em causa,
inclusive os Insolventes.
38. A partir do Verão de 2002 e 2004 os credores reclamantes e sua
família dormem na fracção em causa, aí tomam as suas refeições,
recebem amigos e correspondência, assumindo o pagamento de todas
as despesas relacionadas com a fracção, bom como as quotas do
condomínio, tendo ainda pago uma quota-parte das obras efectuadas
nas partes comuns do prédio.
39. Requereram à C. M. de Lamego o contador da água e respectivo
fornecimento, bem como requereram a instalação do gás e o
fornecimento da energia eléctrica, tendo pago as despesas inerentes a
tais instalações.
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40. A escritura pública de compra e venda deveria ser realizada quando


os Insolventes obtivessem todos os documentos necessários e
indispensáveis à realização da mesma.
41. O credor reclamante, promitente-comprador, deveria ser notificado,
por carta registada, com a antecedência mínima de 15 dias, o que nunca
veio a acontecer, nunca tendo marcado a respectiva escritura pública.
42. Os credores reclamantes enviaram uma carta registada aos
Insolventes, em 03 de Maio de 2005, a solicitar-lhes a marcação da data
da escritura pública.
43. Tal carta veio devolvida por “Não atendeu dia …” e “não tem
receptáculo postal” e “o destinatário retirou-se”.
44. O prédio onde se situa a fracção em causa não tem licença de
habitabilidade.
45. Os credores reclamantes supra referidos propuseram uma acção
judicial contra os insolventes que correu termos no 1º Juízo do TJ de
Lamego, tomando o nº419/05.0TBLMG, a qual foi julgada procedente.
47. A sentença, já transitada em julgado, foi proferida no dia 18-06-
2007 e decidiu o seguinte:
“1 - Declarar-se resolvido, por incumprimento imputável aos Réus, o
contrato promessa referido em 2-al. c). / 2 – Condenar-se os Réus a
pagarem aos Autores a quantia de €139.663,42, correspondente ao
dobro do sinal prestado; / 3 – Mais condenar os Réus a pagarem aos
Autores, a título de indemnização, a quantia de €4.199,42, pelas
despesas efectuadas pelo segundo na fracção autónoma; / 4 –
Condenar ainda os Réus em juros de mora, à taxa legal, relativos às
quantias indicadas em 2º e 3º, desde a citação até efectivo e integral
pagamento. / 5 – Declarar que o Autor tem direito de retenção sobre a
identificada fracção autónoma para garantia da mencionada
importância de €139.663,42”.
*
48. I... celebrou com os Insolventes, em 20 de Maio de 2002, através de
documento particular, um contrato promessa pelo qual estes
prometeram vender e o primeiro prometeu comprar um apartamento
tipo T3, correspondente ao segundo andar direito do Bloco número três,
com arrumos número dois no sótão e a garagem número vinte e cinco
na cave, no prédio que aqueles estão a construir no lugar de Rina,
freguesia da Sé, deste concelho de Lamego.
49. A referida fracção actualmente é designada pela fracção “X” do
prédio construído em propriedade horizontal, inscrito na matriz urbana
da freguesia da Sé sob o artigo 1969 e descrita na Conservatória do
Registo Predial de Lamego sob o nº00466/19920110-X.
50. Os Insolventes prometeram vender aos credores supra referidos e
estes prometeram comprar a referida fracção autónoma pelo preço de
www.dgsi.pt/jtrc.nsf/8fe0e606d8f56b22802576c0005637dc/25f1cf11ca34a3d6802581050039ea58?OpenDocument 44/92
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€82.300,00, livre de quaisquer ónus e encargos.


51. A título de sinal e princípio de pagamento, inicial e reforços, os
credores supra referidos entregaram aos Insolventes a quantia global de
€27.500,00.
52. Em meados do mês de Agosto de 2004, os Insolventes entregaram
as chaves do apartamento, em definitivo, aos credores reclamantes
supra referidos, para eles o habitarem como se deles fosse.
53. Bem como concordaram que os reclamantes realizassem pequenas
obras e acabamentos que faltava efectuar da fracção e garagem, já que
eles não tinham capacidade financeira para o fazer.
54. Os credores reclamantes supra referidos efectuaram pinturas,
colocaram pavimentos, efectuaram trabalhos de pichelaria, adquiriram
e colocaram louças sanitárias e móveis, efectuaram serviços de
electricidade, colocaram portas e armários, móveis de cozinha e
finalizaram ou arremataram pequenas obras no apartamento.
55. Tais obras importaram em materiais, mão-de-obra e serviços o valor
total de €9.068,68, que os credores reclamantes supra referidos
pagaram.
56. Os credores reclamantes e a sua família, algum tempo depois da
entrega das chaves, passaram a habitar a fracção em causa como se
fosse sua, com exclusão de outrem, sem oposição de quem quer que
seja e à vista de toda a gente, até ao presente.
57. Todos os reconhecendo como donos da fracção em causa, inclusive
os Insolventes.
58. A partir de Agosto de 2014 os credores reclamantes e sua família
dormem na fracção em causa, aí tomam as suas refeições, recebem
amigos e correspondência, assumindo o pagamento de todas as
despesas relacionadas com a fracção, bom como as quotas do
condomínio, tendo ainda pago uma quota-parte das obras efectuadas
nas partes comuns do prédio.
59. Requereram à C. M. de Lamego o contador da água e respectivo
fornecimento, bem como requereram a instalação do gás e o
fornecimento da energia eléctrica, tendo pago as despesas inerentes a
tais instalações.
60. A escritura pública de compra e venda deveria ser realizada quando
os Insolventes obtivessem todos os documentos necessários e
indispensáveis à realização da mesma.
61. O credor reclamante, promitente-comprador, deveria ser notificado,
por carta registada, com a antecedência mínima de 15 dias, o que nunca
veio a acontecer, nunca tendo marcado a respectiva escritura pública.
62. Os credores reclamantes enviaram uma carta registada aos
Insolventes, em, 22 de Abril de 2005, a solicitar-lhes a marcação da
www.dgsi.pt/jtrc.nsf/8fe0e606d8f56b22802576c0005637dc/25f1cf11ca34a3d6802581050039ea58?OpenDocument 45/92
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data da escritura pública.


63. Tal carta veio devolvida por “Não atendeu dia …” e “não tem
receptáculo postal” e “o destinatário retirou-se”.
64. O prédio onde se situa a fracção em causa não tem licença de
habitabilidade.
65. Os credores reclamantes supra referidos propuseram uma acção
judicial contra os insolventes que correu termos no 2º Juízo do TJ de
Lamego, tomando o nº420/05.4TBLMG, a qual foi julgada procedente.
66. A sentença, já transitada em julgado, foi proferida no dia 16-10-
2006 e decidiu o seguinte:
“1 - Declarar-se resolvido, por incumprimento imputável aos Réus, o
contrato promessa referido em 2-al. c). / 2 – Condenar-se os Réus a
pagarem aos Autores a quantia de €55.000,00, correspondente ao
dobro do sinal prestado; / 3 – Mais condenar os Réus a pagarem aos
Autores, a título de indemnização, a quantia de €9.068,68, pelas
despesas efectuadas pelo segundo na fracção autónoma; / 4 –
Condenar ainda os Réus em juros de mora, à taxa legal, relativos às
quantias indicadas em 2º e 3º, desde a citação até efectivo e integral
pagamento. / 5 – Declarar que o Autor tem direito de retenção sobre a
identificada fracção autónoma para garantia da mencionada
importância de €55.000,00”.
*
67. J... celebrou com os Insolventes, em 05 de Setembro de 2000,
através de documento particular, um contrato promessa pelo qual estes
prometeram vender e o primeiro prometeu comprar um apartamento
tipo T3, correspondente ao terceiro andar esquerdo do Bloco número
três, com arrumos número quatro no sótão e a garagem número vinte e
dois na cave, no prédio que aqueles estão a construir no lugar de Rina,
freguesia da Sé, deste concelho de Lamego.
68. A referida fracção actualmente é designada pela fracção “AB” do
prédio construído em propriedade horizontal, inscrito na matriz urbana
da freguesia da Sé sob o artigo 1969 e descrita na Conservatória do
Registo Predial de Lamego sob o nº00466/19920110-AB.
69. Os Insolventes prometeram vender aos credores supra referidos e
estes prometeram comprar a referida fracção autónoma pelo preço de
€82.301,65 (16.500.000$00), livre de quaisquer ónus e encargos.
70. A título de sinal e princípio de pagamento, inicial e reforços, os
credores supra referidos entregaram aos Insolventes a quantia global de
€62.349,74.
71. Em meados do mês de Agosto de 2004, os Insolventes entregaram
as chaves do apartamento, em definitivo, aos credores reclamantes
supra referidos, para eles o habitarem como se deles fosse.

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72. Bem como concordaram que os reclamantes realizassem pequenas


obras e acabamentos que faltava efectuar da fracção e garagem, já que
eles não tinham capacidade financeira para o fazer.
73. Os credores reclamantes supra referidos efectuaram pinturas,
colocaram pavimentos, efectuaram trabalhos de pichelaria, adquiriram
e colocaram louças sanitárias e móveis, efectuaram serviços de
electricidade, colocaram portas e armários, móveis de cozinha e
finalizaram ou arremataram pequenas obras no apartamento.
74. Tais obras importaram em materiais, mão-de-obra e serviços o valor
total de €21.402,02, que os credores reclamantes supra referidos
pagaram.
75. Os credores reclamantes e a sua família, algum tempo depois da
entrega das chaves, passaram a habitar a fracção em causa como se
fosse sua, com exclusão de outrem, sem oposição de quem quer que
seja e à vista de toda a gente, até ao presente.
76. Todos os reconhecendo como donos da fracção em causa, inclusive
os Insolventes.
77. A partir de Agosto de 2004 os credores reclamantes e sua família
dormem na fracção em causa, aí tomam as suas refeições, recebem
amigos e correspondência, assumindo o pagamento de todas as
despesas relacionadas com a fracção, bom como as quotas do
condomínio, tendo ainda pago uma quota-parte das obras efectuadas
nas partes comuns do prédio.
78. Requereram à C. M. de Lamego, em Outubro de 2004, o contador
da água e respectivo fornecimento, bem como requereram a instalação
do gás e o fornecimento da energia eléctrica, tendo pago as despesas
inerentes a tais instalações.
79. A escritura pública de compra e venda deveria ser realizada quando
os Insolventes obtivessem todos os documentos necessários e
indispensáveis à realização da mesma.
80. O credor reclamante, promitente-comprador, deveria ser notificado,
por carta registada, com a antecedência mínima de 15 dias, o que nunca
veio a acontecer, nunca tendo marcado a respectiva escritura pública.
81. Os credores reclamantes enviaram uma carta registada aos
Insolventes, em 20 de Abril de 2005, a solicitar-lhes a marcação da data
da escritura pública.
82. Tal carta veio devolvida por “Não atendeu dia …” e “não tem
receptáculo postal” e “o destinatário retirou-se”.
83. O prédio onde se situa a fracção em causa não tem licença de
habitabilidade.
84. Os credores reclamantes supra referidos propuseram uma acção
judicial contra os insolventes que correu termos no 2º Juízo do TJ de
www.dgsi.pt/jtrc.nsf/8fe0e606d8f56b22802576c0005637dc/25f1cf11ca34a3d6802581050039ea58?OpenDocument 47/92
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Lamego, tomando o nº395/05.0TBLMG, a qual foi julgada procedente.


85. A sentença, já transitada em julgado, foi proferida no dia 06-10-
2006 e decidiu o seguinte:
“1 - Declarar-se resolvido, por incumprimento imputável aos Réus, o
contrato promessa referido em 2-al. c). / 2 – Condenar-se os Réus a
pagarem aos Autores a quantia de €124.699,47, correspondente ao
dobro do sinal prestado; / 3 – Mais condenar os Réus a pagarem aos
Autores, a título de indemnização, a quantia de €21.402,02, pelas
despesas efectuadas pelo segundo na fracção autónoma; / 4 –
Condenar ainda os Réus em juros de mora, à taxa legal, relativos às
quantias indicadas em 2º e 3º, desde a citação até efectivo e integral
pagamento. / 5 – Declarar que o Autor tem direito de retenção sobre a
identificada fracção autónoma para garantia da mencionada
importância de €124.699,47”.
*
L.. e M..
86. L.. e M..e os insolventes celebraram, em 13 de Setembro de 2001,
um contrato-promessa de compra e venda, mediante o qual os segundos
prometeram vender aos primeiros, e estes prometeram comprar àqueles,
duas fracções autónomas tipo T3, correspondentes aos primeiros
andares direito e esquerdo do bloco 3 do prédio sito no lugar da Rina,
freguesia da Sé, concelho de Lamego, descrito na C.R. Predial sob os
nº466/19920110-U e V
87. Tais facções encontram-se hoje descritas na CRP de Lamego sob as
letras U e V e inscritas na matriz urbana da freguesia da Sé sob o artigo
1969, tendo já sido constituída a propriedade horizontal, que se
encontra registada sob a cota F1.
88. O 1º direito é composto por uma habitação tipo T3, com a garagem
nº26 na cave e um arrumo no sótão com o nº6.
89. O 1º esquerdo é composto por uma habitação tipo T3, com a
garagem nº27 na cave e um arrumo no sótão com o nº5.
90. No acordo referido em 1 as partes estipularam o preço global de
€159.615,32.
91. Os credores supra referidos entregaram aos insolventes, na data da
celeração do contrato, a quantia de €49.879,78, de que estes deram logo
ali quitação.
92. Em 30 de Maio de 2002 os credores supra referidos entregaram aos
Insolventes mais €29.930,00, por meio de cheque do qual os
Insolventes deram quitação.
93. Acordaram ainda que a restante quantia, €79.807,66, seria entregue
na data da celebração da escritura pública de compra e venda.

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94. Acordaram ainda que a escritura pública seria realizada logo que os
Insolventes obtivessem todos os documentos necessários para tal, tendo
sido verbalmente apontada por eles a data de 30 de Maio de 2004 como
limite máximo.
95. Os Insolventes não acabaram as obras e a escritura pública não foi
realizada.
96. Os Insolventes entregaram as chaves dos apartamentos aos credores
supra referidos e ausentaram-se para local desconhecido.
97. Os credores supra referidos para tornarem habitáveis os imóveis
colocaram portas, quadro de electricidade, instalação de água e fizeram
neles diversos melhoramentos.
98. Os credores reclamantes supra referidos propuseram uma acção
judicial contra os insolventes que correu termos no 2º Juízo do TJ de
Lamego, tomando o nº369/06.3TBLMG, a qual foi julgada procedente.
99. A sentença, já transitada em julgado, foi proferida no dia 17-01-
2008 e decidiu o seguinte:
“1 - Declarar resolvido, por incumprimento imputável aos Réus, o
contrato promessa referido em 2-al. a). / 2 – Condenar os Réus a
pagarem aos Autores a quantia de €159.619,56, correspondente ao
dobro do sinal prestado; / 3 – Mais condenar os Réus a pagarem aos
Autores, a título de indemnização, a quantia que vier a ser apurada em
posterior liquidação de sentença nos termos aludidos em 4-II; / 4 –
Condenar ainda os Réus em juros de mora, à taxa legal, relativos à
quantia indicada em 2º, desde a citação até efectivo e integral
pagamento. / 5 – Declarar que os Autores têm direito de retenção sobre
as identificadas fracções autónomas para garantia da mencionada
importância de €159.619,56”.
100. A “ N..., Lda.” efectuou serviços de electricidade nas partes
comuns dos edifícios onde se situam as fracções apreendidas e nas
próprias fracções, no valor de €43.448,05.
101. A “ N..., Lda.” nunca esteve na posse das fracções apreendidas nos
autos.
Com interesse para a boa decisão da causa, não se provaram
quaisquer outros factos.
A. Incorrecta análise e apreciação da prova – reapreciação da
prova gravada, relativamente aos itens 11.º, 31.º, 51.º e 70.º; 36 e
38.º, dos factos dados como provados, devendo os mesmos passar a
considerar-se como não provados; 86.º a 97.º, que devem ser
eliminados e 94.º, que deve passar a ter a redacção indicada na
conclusão 8.ª.
Alega o ora recorrente, que o Tribunal incorreu em erro de julgamento
ao dar como provados os factos ora referidos, devendo, na sua óptica,
os mesmos serem considerados como não provados e rectificada a
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resposta constante do item 94.º, nos termos que propõe, apoiando-se


para tal nos depoimentos prestados pelas testemunhas J..., P..., I..., R...,
F..., G..., U...e V..., que reputa de insuficientes para que tais factos
sejam dados como provados; para além de que, as sentenças em que se
declararam resolvidos os contratos promessa celebrados entre os
credores e os insolventes, tendo como objecto as fracções que cada um
deles vem ocupando e a reconhecer-lhes o direito de retenção, não lhes
são oponíveis.
Posto isto, e em tese geral, convém, desde já, deixar algumas notas
acerca da produção da prova e definir os contornos em que a mesma
deve ser apreciada em 2.ª instância.
Toda e qualquer decisão judicial em matéria de facto, como operação
de reconstituição de factos ou acontecimento delituoso imputado a uma
pessoa ou entidade, esta através dos seus representantes, dependente
está, da prova que em audiência pública, sob os princípios da
investigação oficiosa (nos limites e termos em que esta é permitida ao
julgador) e da verdade material, se processa e produz, bem como do
juízo apreciativo que sobre a mesma recai por parte do julgador, nos
moldes definidos nos artigos 653, n.º 2 e 655, n.º 1, CPC – as já supra
mencionadas regras da experiência e o princípio da livre convicção.
Submetidas ao crivo do contraditório, as provas são pois elemento
determinante da decisão de facto.
Ora, o valor da prova, isto é, a sua relevância enquanto elemento
reconstituinte dos factos em apreço, depende fundamentalmente da sua
credibilidade, ou seja, da sua idoneidade e autenticidade.
Por outro lado, certo é que o juízo de credibilidade da prova por
declarações, depende essencialmente do carácter e probidade moral de
quem as presta, sendo que tais atributos e qualidades, como regra, não
são apreensíveis mediante o exame e análise das peças ou textos
processuais onde as mesmas se encontram documentadas, mas sim
através do contacto directo com as pessoas, razão pela qual o tribunal
de recurso, salvo casos de excepção, deve adoptar o juízo valorativo
formulado pelo tribunal recorrido.
Quanto à apreciação da prova, actividade que se processa segundo as
regras da experiência comum e o princípio da livre convicção, certo é
que em matéria de prova testemunhal (em sentido amplo) quer directa
quer indirecta, tendo em vista a carga subjectiva inerente, a mesma não
dispensa um tratamento a nível cognitivo por parte do julgador,
mediante operações de cotejo com os restantes meios de prova, sendo
que a mesma, tal como a prova indiciária de qualquer outra natureza,
pode e deve ser objecto de formulação de deduções e induções, as quais
partindo da inteligência, hão-de basear-se na correcção de raciocínio,
mediante a utilização das regras de experiência e conhecimentos
científicos, tudo se englobando na expressão legal “regras de
experiência”.

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Estando em discussão a matéria de facto nas duas instâncias, nada


impede que o tribunal superior, fundado no mesmo princípio da livre
apreciação da prova, conclua de forma diversa do tribunal recorrido,
mas para o fazer terá de ter bases sólidas e objectivas.
Não se pode olvidar que existe uma incomensurável diferença entre a
apreciação da prova em primeira instância e a efectuada em tribunal de
recurso, ainda que com base nas transcrições dos depoimentos
prestados, a qual, como é óbvio, decorre de que só quem o observa se
pode aperceber da forma como o testemunho é produzido, cuja
sensibilidade se fundamenta no conhecimento das reacções humanas e
observação directa dos comportamentos objectivados no momento em
que tal depoimento é prestado, o que tudo só se logra obter através do
princípio da imediação considerado este como a relação de
proximidade comunicante entre o tribunal e os participantes de modo a
que aquele possa obter uma percepção própria do material que haverá
de ter como base da decisão.
As consequências concretas da aceitação de tal princípio definem o
núcleo essencial do acto de julgar em que emerge o senso; a maturidade
e a própria cultura daquele sobre quem recai tal responsabilidade.
Estamos em crer que quando a opção do julgador se centre em
elementos directamente interligados com o princípio da imediação (v.
g. quando o julgador refere não foram (ou foram) convincentes num
determinado sentido) o tribunal de recurso não tem grandes
possibilidades de sindicar a aplicação concreta de tal princípio.
Na verdade, o depoimento oral de uma testemunha é formado por um
complexo de situações e factos em que sobressai o seu porte, reacções
imediatas, o contexto em que é prestado o depoimento e o ambiente
gerado em torno de quem o presta, não sendo, ainda, despiciendo, o
próprio modo como é feito o interrogatório e surge a resposta, tudo isso
contribuindo para a convicção do julgador.
A comunicação vai muito para além das palavras e mesmo estas devem
ser valoradas no contexto da mensagem em que se inserem, pois como
informa Lair Ribeiro, as pesquisas neurolinguísticas numa situação de
comunicação apenas 7% da capacidade de influência é exercida através
da palavra sendo que o tom de voz e a fisiologia, que é a postura
corporal dos interlocutores, representam, respectivamente, 38% e 55%
desse poder - “Comunicação Global, Lisboa, 1998, pág. 14.
Já Enriço Altavilla, in Psicologia Judiciaria, vol. II, Coimbra, 3.ª
edição, pág. 12, refere que “o interrogatório como qualquer
testemunho, está sujeito à crítica do juiz, que poderá considerá-lo todo
verdadeiro ou todo falso, mas poderá também aceitar como
verdadeiras certas partes e negar crédito a outras”.
Então, perguntar-se-á, qual o papel do tribunal de recurso no controle
da prova testemunhal produzida em audiência de julgamento?

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Este tribunal poderá sempre controlar a convicção do julgador na


primeira instância quando se mostre ser contrária às regras da
experiência, da lógica e dos conhecimentos científicos. Para além disso,
admitido que é o duplo grau de jurisdição em termos de matéria de
facto, o tribunal de recurso poderá sempre sindicar a formação da
convicção do juiz ou seja o processo lógico. Porém, o tribunal de
recurso encontra-se impedido de controlar tal processo lógico no
segmento em que a prova produzida na primeira instância escapa ao
seu controle porquanto foi relevante o funcionamento do princípio da
imediação.
Tudo isto, sem prejuízo, como acima já referido, de o Tribunal de
recurso, adquirir diferente (e própria) convicção (sendo este o papel do
Tribunal da Relação, ao reapreciar a matéria de facto e não apenas o de
um mero controle formal da motivação efectuada em 1.ª instância – cf.
Acórdão do STJ, de 22 de Fevereiro de 2011, in CJ, STJ, ano XIX,
tomo I/2011, a pág. 76 e seg.s e de 30/05/2013, Processo
253/05.7.TBBRG.G1.S1, in http://www.dgsi.pt/jstj.
Tendo por base tais asserções, dado que se procedeu à gravação da
prova produzida, passemos, então, à reapreciação da matéria de facto
em causa, a fim de averiguar se a mesma é de manter ou de alterar, em
conformidade com o disposto no artigo 662, do NCPC., pelo que, nos
termos expostos, nos compete apurar da razoabilidade da convicção
probatória do tribunal de 1.ª instância, face aos elementos de prova
considerados (sem prejuízo, como acima referido de, com base neles,
formarmos a nossa própria convicção).
Vejamos, então, a supra referida factualidade posta em causa pelos ora
recorrentes, nas respectivas alegações de recurso.
A. Incorrecta análise e apreciação da prova – reapreciação da
prova gravada, relativamente aos itens 11.º, 31.º, 51.º e 70.º; 36 e
38.º, dos factos dados como provados, devendo os mesmos passar a
considerar-se como não provados; 86.º a 97.º, que devem ser
eliminados e 94.º, que deve passar a ter a redacção indicada na
conclusão 8.ª.
Para melhor esclarecimento e facilitar a decisão desta questão, passa-se
a transcrever o teor de tais itens:
“11. A título de sinal e princípio de pagamento, inicial e reforços, os
credores supra referidos entregaram aos Insolventes a quantia global
de €22.500,00.
31. A título de sinal e princípio de pagamento, inicial e reforços, os
credores supra referidos entregaram aos Insolventes a quantia global
de €69.831,71.
32. Em meados do mês de Agosto de 2004, os Insolventes entregaram
as chaves do apartamento, em definitivo, aos credores reclamantes
supra referidos, para eles o habitarem como se deles fosse.

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33. Bem como concordaram que os reclamantes realizassem pequenas


obras e acabamentos que faltava efectuar da fracção e garagem, já que
eles não tinham capacidade financeira para o fazer.
36. Os credores reclamantes e a sua família, algum tempo depois da
entrega das chaves, passaram a habitar a fracção em causa como se
fosse sua, com exclusão de outrem, sem oposição de quem quer que
seja e à vista de toda a gente, até ao presente.
37. Todos os reconhecendo como donos das fracções em causa,
inclusive os Insolventes.
38. A partir do Verão de 2002 e 2004 os credores reclamantes e sua
família dormem na fracção em causa, aí tomam as suas refeições,
recebem amigos e correspondência, assumindo o pagamento de todas
as despesas relacionadas com a fracção, bom como as quotas do
condomínio, tendo ainda pago uma quota-parte das obras efectuadas
nas partes comuns do prédio.
51. A título de sinal e princípio de pagamento, inicial e reforços, os
credores supra referidos entregaram aos Insolventes a quantia global
de €27.500,00.
70. A título de sinal e princípio de pagamento, inicial e reforços, os
credores supra referidos entregaram aos Insolventes a quantia global
de €62.349,74.
86. L.. e M..e os insolventes celebraram, em 13 de Setembro de 2001,
um contrato-promessa de compra e venda, mediante o qual os
segundos prometeram vender aos primeiros, e estes prometeram
comprar àqueles, duas fracções autónomas tipo T3, correspondentes
aos primeiros andares direito e esquerdo do bloco 3 do prédio sito no
lugar da Rina, freguesia da Sé, concelho de Lamego, descrito na C.R.
Predial sob os nº466/19920110-U e V
87. Tais facções encontram-se hoje descritas na CRP de Lamego sob as
letras U e V e inscritas na matriz urbana da freguesia da Sé sob o
artigo 1969, tendo já sido constituída a propriedade horizontal, que se
encontra registada sob a cota F1.
88. O 1º direito é composto por uma habitação tipo T3, com a garagem
nº26 na cave e um arrumo no sótão com o nº6.
89. O 1º esquerdo é composto por uma habitação tipo T3, com a
garagem nº27 na cave e um arrumo no sótão com o nº5.
90. No acordo referido em 1 as partes estipularam o preço global de
€159.615,32.
91. Os credores supra referidos entregaram aos insolventes, na data da
celeração do contrato, a quantia de €49.879,78, de que estes deram
logo ali quitação.

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92. Em 30 de Maio de 2002 os credores supra referidos entregaram aos


Insolventes mais €29.930,00, por meio de cheque do qual os
Insolventes deram quitação.
93. Acordaram ainda que a restante quantia, €79.807,66, seria
entregue na data da celebração da escritura pública de compra e
venda.
94. Acordaram ainda que a escritura pública seria realizada logo que
os Insolventes obtivessem todos os documentos necessários para tal,
tendo sido verbalmente apontada por eles a data de 30 de Maio de
2004 como limite máximo.
95. Os Insolventes não acabaram as obras e a escritura pública não foi
realizada.
96. Os Insolventes entregaram as chaves dos apartamentos aos
credores supra referidos e ausentaram-se para local desconhecido.
97. Os credores supra referidos para tornarem habitáveis os imóveis
colocaram portas, quadro de electricidade, instalação de água e
fizeram neles diversos melhoramentos.”
É a seguinte a respectiva motivação (cf. fl.s 486 a 493):
“A convicção no que diz respeito aos factos provados e não provados
resultou de uma análise conjugada e crítica dos diversos meios de
prova. No que diz respeito aos factos relativos aos insolventes, à sua
situação de insolvência, e aos actos praticados no processo, o tribunal
analisou as decisões, os requerimentos, e as peças processuais
constantes não só do processo principal, como também dos seus
diversos apensos.
No âmbito do presente apenso o tribunal teve em conta os extractos
bancários da conta dos insolventes no “Millenium BCP”, no período
relativo a Março de 2001 a Agosto de 2004 (fls. 673 a 702 e 833 a 836,
e 855 a 857).
O tribunal teve também em conta as declarações do Sr. Administrador
da Insolvência, Q..., o qual depôs sobre os actos praticados no
processo, designadamente, no que toca à apreensão de bens.
Foi ainda inquirida a testemunha O...., legal representante da “ N...,
Lda.” a qual foi credora na presente acção e que alegou ter um direito
de retenção sobre as fracções em causa, designadamente, sobre
aquelas hipotecadas ao “ C..., S.A.” A testemunha reportou-se aos
serviços prestados para o Insolvente nos prédios em questão, mas
também aos serviços que prestou aos promitentes-compradores das
fracções, serviços por estes custeados. Reportou-se ao facto de, após
terem sido entregues as chaves aos promitentes compradores, apenas
teve acesso às fracções com autorização destes.
Quanto à impugnação do crédito de E... e mulher F...

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A convicção do tribunal quanto aos factos provados resultou da análise


conjugada dos meios de prova. Assim, partiu-se da análise dos
documentos juntos pelos credores supra referidos, apreciando-se
criticamente os seguintes:
- Cópia do contrato-promessa celebrado em 29 de Janeiro de 2002
entre o insolvente e os credores supra referidos. Neste se identificam os
imóveis prometidos vender, e se descrimina a quantia entregue a título
de sinal e a forma e tempo do pagamento do preço restante (fls. 88 a
90)
- A cópia da certidão de direitos, ónus e encargos relativa ao imóvel
aqui em causa (fls. 91 a 96).
- A cópia do cheque emitido pelos credores em referência relativo ao
pagamento do sinal de €10.000.00 em 30-07-2002 (fls. 97); a cópia do
cheque emitido em 21-04-2004 para efectuar o pagamento da quantia
de €2.500,00 por conta do preço (fls. 98).
- As cópias de cheques, facturas e recibos relativas a despesas
efectuadas pelos credores reclamantes em referência com a aquisição
de serviços, bens e materiais para equiparem o imóvel objecto do
contrato-promessa no valor global de €12.578,17. (fls. 99 a 129)
- Os contratos de fornecimento de gás, água e luz celebrados entre
Outubro de 2004 e Fevereiro de 2005, e documentos conexos relativos
aos consumos e aos pagamentos (fls. 130 a 133, 727 a 733, e 912 a
927)
- A interpelação, datada de 29-04-2005, dirigida aos insolventes para
o cumprimento do contrato promessa – marcação da escritura pública
através de carta registada com aviso de recepção (fls. 134 a 137).
- Cópia da sentença proferida na açcão declarativa de condenação
proposta pelos credores em epígrafe contra o ora insolvente e que
tomou o nº445/05.0TBLMG tendo corrido os seus termos no 1º Juízo
do Tribunal Judicial de Lamego (fls. 567 a 574).
Estes documentos particulares foram impugnados pelo “ C..., S.A.”
quanto à sua genuinidade. Foram também por isso relevantes os
depoimentos das seguintes testemunhas que, no essencial, depuseram
com isenção e objectividade:
I..., o qual é credor reclamante nos presentes, tendo celebrado um
contrato-promessa relativo a imóvel situado no mesmo prédio dos
credores reclamantes supra referidos. Conhece bem os credores E... e
F... pois, para além de a sua filha ser vizinha deles, foi colega de
trabalho do credor E... nos CTT.
Demonstrou, por isso, conhecer a celebração do contrato-promessa
pelos credores supra referidos com os Insolventes, o pagamento de
sinal, e as vicissitudes relativas ao cumprimento do mesmo. Reportou-
se à entrega das chaves do apartamento e ao acordo alcançado nessa
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altura para o acabamento dos apartamentos, pressupondo um futuro


acerto de contas. Revelou saber a que empresas os credores supra
referidos adjudicaram os trabalhos em falta na sua fracção e como
foram efectuados os trabalhos nas partes comuns. Sabia também que
os credores E... e F... destinavam o apartamento para a sua habitação
própria e que lá habitam de forma permanente. Por fim revelou
conhecer as causas que os levaram propor acção pedindo a resolução
do contrato.
J..., o qual é credor reclamante nos presentes autos, tendo celebrado
um contrato-promessa relativo a imóvel situado no mesmo prédio dos
credores reclamantes supra referidos. Conhece bem os credores supra
referidos pois, para além de a sua filha ser vizinha deles, foi colega de
trabalho do credor E... nos CTT.
Demonstrou, por isso, conhecer a celebração do contrato-promessa
pelos credores supra referidos com os Insolventes, o pagamento de
sinal, e as vicissitudes relativas ao cumprimento do mesmo. Reportou-
se à entrega das chaves do apartamento e ao acordo alcançado nessa
altura para o acabamento dos apartamentos, pressupondo um futuro
acerto de contas. Revelou saber a que empresas os credores supra
referidos adjudicaram os trabalhos em falta e porquê. Sabia também
que os credores E... e F... destinavam o apartamento para a sua
habitação própria e que lá habitam de forma permanente. Por fim
revelou conhecer a acção que estes propuseram pedindo a resolução
do contrato.
T..., o qual conhece bem os credores em causa. Foi esta testemunha que
desenhou os prédios onde se situam as fracções e tratou da
constituição em propriedade horizontal. Foi procurador dos
Insolventes e elaborou as minutas dos contratos-promessa, não tendo,
porém, intervenção na celebração dos mesmos.
Referiu-se ao pagamento pelos credores reclamantes ao Insolvente a
título de sinal e á forma como eram determinadas as fracções objecto
dos contratos-promessa ainda antes da constituição em propriedade
horizontal.
Aconselhou o Insolvente, face às suas dificuldades de financiamento, a
entregar as fracções objecto dos contratos-promessa aos promitentes-
compradores para que estes as acabassem a expensas suas.
Demonstrou saber que a fracção aqui em causa foi entregue aos
credores supra referidos e que estes aí efectuaram obras de
acabamento. Demonstrou ainda saber que os credores destinavam a
fracção à sua habitação própria, e ao facto de aí residirem.
Disse também que os Insolventes não celebravam o contrato por não
conseguirem distratar as hipotecas.
V..., cunhado dos credores reclamantes supra referidos e fornecedor
dos Insolventes.

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Demonstrou ter conhecimento da celebração do contrato-promessa


entre o Insolvente e os seus cunhados e dos seus termos; do pagamento
de sinal; da entrega das chaves e do acordo relativo aos acabamentos
da fracção em causa. Referiu-se aos acabamentos efectuados pelos
credores reclamantes e o preço pago por esses serviços.
R..., genro do credor reclamante I... e actual morador na fracção
objecto do contrato-promessa celebrado com o seu sogro. Os credores
reclamantes E... e F... são seus vizinhos. Demonstrou ter conhecimento
do negócio celebrado por estes com o Insolvente, da entrega das
chaves para que procedessem ao acabamento da sua fracção, e que aí
efectuaram obras. Reportou-se ao facto dos credores E... e F...
residirem na fracção em causa em data anterior aquela em que ele aí
começou a morar; e
P..., filha do credor reclamante J... e actual moradora na fracção
objecto do contrato-promessa celebrado com o seu pai. Os credores
reclamantes E... e F... são seus vizinhos. Demonstrou, por isso, ter
conhecimento do negócio celebrado por estes com o Insolvente, da
entrega das chaves para que procedessem ao acabamento da sua
fracção, e que aí efectuaram obras. Reportou-se ao facto dos credores
E... e F... residirem na fracção em causa em data anterior aquela em
que ela aí começou a morar
Quanto à impugnação do crédito de G...e mulher H....
A convicção do tribunal quanto aos factos provados resultou da análise
conjugada dos meios de prova. Assim, partiu-se da análise dos
documentos juntos pelos credores supra referidos, apreciando-se
criticamente os seguintes:
- Cópia do contrato-promessa celebrado em 02 Março de 2001 entre o
insolvente e os credores supra referidos, do qual consta o
reconhecimento presencial e notarial das assinaturas. Neste se
identificam os imóveis prometidos vender; se descrimina a quantia
entregue a título de sinal e a forma e tempo do pagamento do preço
restante; por fim faz-se nele referência ao facto de os promitentes
compradores entrarem “na posse imediata dos bens da alínea a)
(habitação T2)” - fls. 49 a 51
- A cópia do recibo emitido pelo insolvente relativo ao pagamento do
sinal de €4.987,98 em 11-01-2001 (fls. 52), e a cópia do cheque emitido
para efectuar o pagamento antes referido (fls. 53); a cópia do recibo
emitido pelo insolvente relativo ao pagamento do sinal de €9.975,96
em 01-08-2001 (fls. 54), e a cópia do cheque emitido para efectuar o
pagamento antes referido (fls. 55);a cópia do cheque emitido em 06-
12-2001 para efectuar o pagamento de €9.975,96 por conta do preço
(fls. 56 e 57); a cópia do cheque emitido em 02-07-2002 para efectuar
o pagamento de €15.000,00 por conta do preço (fls. 58 e 59); a cópia
dos cheques emitidos em 07-07-2003 para efectuar o pagamento de
€20.000,00 (€10.000,00, cada) por conta do preço (fls. 60 e 61); a

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cópia do cheque emitido em 30-12-2002 para efectuar o pagamento de


€9.976,00 por conta do preço (fls. 62);
- Cópias de facturas relativas a despesas efectuados pelos credores
reclamantes em referência com a aquisição de serviços, bens e
materiais para equiparem o imóvel objecto do contrato-promessa no
valor global de €5.372,14 (fls. 63 a 69);
- Documento relativo à requisição da luz eléctrica para a fracção em
causa datada de 10 de Novembro de 2004 (fls. 70); bem como outros
documentos relativos ao consumo água, eletricidade e gás na fracção
em causa (fls. 945 e 946).
- Cópia do contrato de arrendamento, datado de 11 de Setembro de
2007, celebrado pelos credores supra referidos na qualidade de
senhorios da fracção em causa (fls. 944 e 945).
Estes documentos particulares foram impugnados pelo “ C..., S.A.”
quanto à sua genuinidade. Foram também por isso relevantes para a
formação da convicção do tribunal os depoimentos das seguintes
testemunhas que, no essencial, depuseram com isenção e
objectividade:
I..., o qual é credor reclamante nos presentes autos, tendo celebrado
um contrato-promessa relativo a imóvel situado no mesmo prédio onde
se situa uma garagem ocupada pelos credores reclamantes supra
referidos. Disse ter conhecimento que estes se encontravam na mesma
situação que a sua. Referiu-se ao facto de o credor reclamante ter
estado na reunião promovida pelo Insolvente para entregar as chaves
dos apartamentos e autorizar o acabamento dos apartamentos pelos
promitentes-compradores.
F..., a qual é credora reclamante nos presentes autos, tendo celebrado
um contrato-promessa relativo a imóvel situado no mesmo prédio onde
se situa uma garagem ocupada pelos credores reclamantes supra
referidos.
Disse ter conhecimento que os credores supra referidos se
encontravam na mesma situação que a sua. Referiu-se ao facto de o
credor reclamante ter estado na reunião promovida pelo Insolvente
para entregar as chaves dos apartamentos e autorizar o acabamento
dos apartamentos pelos promitentes-compradores. Sabe que os
credores reclamantes efectuaram as obras de acabamento da garagem
que se situa no bloco 3.
T..., o qual conhece bem os credores em causa, sendo a credora mulher
ainda sua parente afastada. Foi esta testemunha que desenhou os
prédios onde se situam as fracções e tratou da constituição em
propriedade horizontal. Foi procurador dos Insolventes e elaborou as
minutas dos contratos-promessa, não tendo, porém, intervenção na
celebração dos mesmos.

www.dgsi.pt/jtrc.nsf/8fe0e606d8f56b22802576c0005637dc/25f1cf11ca34a3d6802581050039ea58?OpenDocument 58/92
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Referiu-se ao pagamento pelos credores reclamantes ao Insolvente a


título de sinal e à forma como eram determinadas as fracções objecto
dos contratos-promessa ainda antes da constituição em propriedade
horizontal.
Aconselhou o Insolvente, face às suas dificuldades de financiamento, a
entregar as fracções objecto dos contratos-promessa aos promitentes-
compradores para que estes as acabassem a expensas suas.
Demonstrou saber que as fracções aqui em causa foram entregues aos
credores supra referidos e que estes aí efectuaram obras de
acabamento, designadamente na garagem situada no bloco 3.
Demonstrou ainda saber que o credor destinava as fracções à sua
habitação primeiro e que, depois, decidiu arrendar.
Disse também que os Insolventes não celebravam o contrato por não
conseguirem distratar as hipotecas.
V..., cunhado dos credores reclamantes supra referidos e fornecedor
dos Insolventes.
Demonstrou ter conhecimento da celebração do contrato-promessa
entre o Insolvente e os seus cunhados e dos seus termos; do pagamento
de sinal; da entrega das chaves e do acordo relativo aos acabamentos
da fracção em causa. Referiu-se aos acabamentos efectuados pelos
credores reclamantes e o preço pago por esses serviços.
As declarações de parte do credor G...permitiu aferir a coerência dos
documentos juntos, no confronto com a prova testemunhal produzida.
Esclareceu os factos relativos à celebração dos contratos-promessa
relativas às fracções nos dois blocos, ao pagamento do sinal, à
ocupação da garagem no bloco 3 e às obras aí efectuadas. Esclareceu
também a razão pela qual não foi celebrada a escritura pública de
compra e venda.
Quanto à impugnação do crédito de I....
A convicção do tribunal quanto aos factos provados resultou da análise
conjugada dos meios de prova. Assim, partiu-se da análise dos
documentos juntos pelos credores supra referidos, apreciando-se
criticamente os seguintes:
- Cópia do contrato-promessa celebrado em 20 Maio de 2002 entre o
insolvente enquanto promitente-vendedor, e o credor supra referido,
este na qualidade de promitente-comprador. Neste se identificam os
imóveis prometidos vender; se descrimina a quantia entregue a título
de sinal e a forma e tempo do pagamento do preço restante - fls. 139 a
145.
- A cópia dos cheques emitido pelo credor em referência relativo ao
pagamento do sinal de €700,00 e €1.800,00 em 06-08-2004 (fls. 146)
- As cópias de cheques, facturas e recibos relativas a despesas
efectuadas pelos credores reclamantes em referência com a aquisição
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de serviços, bens e materiais para equiparem o imóvel objecto do


contrato-promessa (fls. 147 a 160)
- A interpelação, datada de 22-04-2005, dirigida aos insolventes para
o cumprimento do contrato promessa – marcação da escritura pública
através de carta registada com aviso de recepção (fls. 161 a 164).
- Cópia da sentença proferida na açcão declarativa de condenação
proposta pelo credor em epígrafe contra o ora insolvente e que tomou
o nº420/05.4TBLMG tendo corrido os seus termos no 2º Juízo do
Tribunal Judicial de Lamego (fls. 575 a 582).
- Extracto dos pagamentos mensais efectuados à CM de Lamego a
partir de 2004 relativos ao consumo de água na fracção em causa, bem
como o extracto das companhias de electricidade relativos ao consumo
de energia eléctrica a partir de 2004 (fls. 704 a 716 e 941 e 942)
Estes documentos particulares foram impugnados pelo “ C..., S.A.”
quanto à sua genuinidade. Foram também por isso relevantes os
depoimentos das seguintes testemunhas que, no essencial, depuseram
com isenção e objectividade:
J..., o qual é credor reclamante nos presentes, tendo celebrado um
contrato-promessa relativo a imóvel situado no mesmo prédio do
imóvel a que se reporta o contrato-promessa celebrado com o credor
reclamante supra referido. Conhece bem o credor supra referido pois,
para além de a sua filha ser vizinha da filha dele, foi colega de
trabalho do credor I... nos CTT.
Demonstrou, por isso, conhecer a celebração do contrato-promessa
pelo credor supra referido com os Insolventes, o pagamento de sinal, e
as vicissitudes relativas ao cumprimento do mesmo. Reportou-se à
entrega das chaves do apartamento e ao acordo alcançado nessa
altura para o acabamento dos apartamentos, pressupondo um futuro
acerto de contas. Revelou saber a a que empresas o credor supra
referido adjudicou os trabalhos em falta e porquê. Sabia também que o
credor I... destinava o apartamento para a habitação da sua filha e que
esta lá habita de forma permanente. Por fim revelou conhecer a acção
que este propôs pedindo a resolução do contrato.
F..., o qual é credora reclamante nos presentes, tendo celebrado um
contrato-promessa relativo a imóvel situado no mesmo prédio do
imóvel a que se reporta o contrato-promessa celebrado com o credor
reclamante supra referido. Conhece bem o credor supra referido pois,
para além de ser vizinha da filha dele, o seu marido foi colega de
trabalho do credor I... nos CTT.
Demonstrou, por isso, conhecer a celebração do contrato-promessa
pelo credor supra referido com os Insolventes, o pagamento de sinal, e
as vicissitudes relativas ao cumprimento do mesmo. Reportou-se à
entrega das chaves do apartamento e ao acordo alcançado nessa
altura para o acabamento dos apartamentos, pressupondo um futuro

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acerto de contas. Revelou saber a que empresas o credor supra


referido adjudicou os trabalhos em falta e porquê. Sabia também que o
credor I... destinava o apartamento para a habitação da sua filha e que
esta lá habita de forma permanente. Por fim revelou conhecer as
causas que o levaram à propositura da acção pedindo a resolução do
contrato.
T..., o qual conhece bem o credor em causa. Foi esta testemunha que
desenhou os prédios onde se situam as fracções e tratou da
constituição em propriedade horizontal. Foi procurador dos
Insolventes e elaborou as minutas dos contratos-promessa, não tendo,
porém, intervenção na celebração dos mesmos.
Referiu-se ao pagamento pelo credor reclamante ao Insolvente a título
de sinal e á forma como eram determinadas as fracções objecto dos
contratos-promessa ainda antes da constituição em propriedade
horizontal.
Aconselhou o Insolvente, face às suas dificuldades de financiamento, a
entregar as fracções objecto dos contratos-promessa aos promitentes-
compradores para que estes as acabassem a expensas suas.
Demonstrou saber que a fracção aqui em causa foi entregue ao credor
supra referido e que este aí efectuou obras de acabamento.
Demonstrou ainda saber que o credor destinava a fracção à habitação
da sua filha. Referiu-se ao facto de esta aí residir.
Disse também que os Insolventes não celebravam o contrato por não
conseguirem distratar as hipotecas.
V..., cunhado dos credores E... e F... e fornecedor dos Insolventes.
Demonstrou ter conhecimento da celebração do contrato-promessa
entre o Insolvente e o credor supra referido. Sabe que ele pagou
quantias a título de sinal e que o Insolvente lhe entregou as chaves da
fracção para que aí procedesse a obras de acabamento. Referiu-se aos
acabamentos efectuados pelo credor reclamante. Revelou que aí vive a
filha e o genro do credor reclamante.
R..., genro do credor reclamante e actual morador na fracção objecto
do contrato-promessa celebrado com o seu sogro. Demonstrou, por
isso, ter conhecimento do negócio celebrado por este com o Insolvente,
da entrega das chaves para que procedessem ao acabamento da sua
fracção, e que aí efectuou obras e valor destas. Reportou-se ao facto de
residir na fração em causa porque o credor I... queria que aí residisse
a sua filha com a família. Disse desde quando ali reside.; e
P..., filha do credor reclamante J... e actual moradora na fracção
objecto do contrato-promessa celebrado com o seu pai. A filha do
credor I... e a família desta são seus vizinhos. Demonstrou, por isso, ter
conhecimento do negócio celebrado por este com o Insolvente, da
entrega das chaves para que procedesse ao acabamento da sua
fracção, e que aí efectuou obras. Reportou-se ao facto da família da
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filha do credor I... residirem na fracção em causa em data anterior


aquela em que ela aí começou a morar.
As declarações de parte do credor I... permitiu aferir a coerência dos
documentos juntos, no confronto com a prova testemunhal produzida.
Esclareceu os factos relativos à celebração do contrato-promessa, ao
pagamento do sinal, à ocupação da fracção e às obras aí efectuadas.
Esclareceu também a razão pela qual não foi celebrada a escritura
pública de compra e venda e as causas pelas quais propôs a acção
judicial.
Quanto à impugnação do crédito de J....
A convicção do tribunal quanto aos factos provados resultou da análise
conjugada dos meios de prova. Assim, partiu-se da análise dos
documentos juntos pelos credores supra referidos, apreciando-se
criticamente os seguintes:
- Cópia do contrato-promessa celebrado em 05 de Setembro de 2000
entre o insolvente enquanto promitente-vendedor, e o credor supra
referido, este na qualidade de promitente-comprador. Neste documento
escrito se identificam os imóveis prometidos vender; se descrimina a
quantia entregue a título de sinal e a forma e tempo do pagamento do
preço restante (fls. 166 e 167).
- A cópia da certidão de direitos, ónus e encargos relativa ao imóvel
aqui em causa (fls. 168 a 173).
- A cópia do cheque emitido pelos credores em referência relativo ao
pagamento do sinal de 1.000.000$00 em 06-04-2001 (fls. 174); a cópia
do cheque emitido em 18-01-2001 para efectuar o pagamento da
quantia de 4.000.000$00 por conta do preço (fls. 175); a cópia do
cheque emitido em 25-02-2002 para efectuar o pagamento da quantia
de €12.469,95 por conta do preço (fls. 176); a cópia do cheque emitido
em 06-08-2002 para efectuar o pagamento da quantia de €4.987,98
por conta do preço (fls. 177); a cópia do cheque emitido em 28-08-
2003 para efectuar o pagamento da quantia de €9.975,96 por conta do
preço (fls. 178)
- As cópias de cheques, facturas e recibos relativas a despesas
efectuadas pelos credores reclamantes em referência com a aquisição
de serviços, bens e materiais para equiparem o imóvel objecto do
contrato-promessa (fls. 179 a 214 e 930 a 939)
- Os contratos de fornecimento de gás, àgua e luz celebrados entre
Outubro de 2004 e Fevereiro de 2005 e documentos conexos relativos
ao pagamento (fls. 215 a 219)
- A interpelação, datada de 20-04-2005, dirigida aos insolventes para
o cumprimento do contrato promessa – marcação da escritura pública
através de carta registada com aviso de recepção (fls. 220 a 223).

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- Cópia da sentença proferida na açcão declarativa de condenação


proposta pelo credor em epígrafe contra o ora insolvente e que tomou
o nº395/05.0TBLMG tendo corrido os seus termos no 2º Juízo do
Tribunal Judicial de Lamego (fls. 583 a 593).
- Extracto dos pagamentos mensais efectuados à CM de Lamego a
partir de 2004 relativos ao consumo de água na fracção em causa, bem
como o extracto da companhia gás relativos ao consumo de gás desde
2005 a 2009 (fls. 718 a 724)
Estes documentos particulares foram impugnados pelo “ C..., S.A.”
quanto à sua genuinidade. Foram também por isso relevantes os
depoimentos das seguintes testemunhas que, no essencial, depuseram
com isenção e objectividade:
I..., o qual é credor reclamante nos presentes autos, tendo celebrado
um contrato-promessa relativo a imóvel situado no mesmo prédio dos
credor reclamante supra referido. Conhece bem o credor em causa
pois, para além de as respectivas filhas serem vizinhas, foi seu colega
de trabalho nos CTT.
Demonstrou, por isso, conhecer a celebração do contrato-promessa
pelo credor supra referido com os Insolventes, o pagamento de sinal, e
as vicissitudes relativas ao cumprimento do mesmo. Reportou-se à
entrega das chaves do apartamento e ao acordo alcançado nessa
altura para o acabamento dos apartamentos, pressupondo um futuro
acerto de contas. Revelou saber a que empresas os credores supra
referidos adjudicaram os trabalhos em falta. Sabia também que o
credor J... destinava o apartamento para a habitação da filha e que
esta lá habita de forma permanente. Por fim revelou conhecer as
causas que levaram à propositura da acção que este propôs pedindo a
resolução do contrato.
F..., o qual é credora reclamante nos presentes, tendo celebrado um
contrato-promessa relativo a imóvel situado no mesmo prédio do
imóvel a que se reporta o contrato-promessa celebrado com o credor
reclamante supra referido. Conhece bem o credor supra referido pois,
para além de ser vizinha da filha dele, o seu marido foi colega de
trabalho do credor J... nos CTT.
Demonstrou, por isso, conhecer a celebração do contrato-promessa
pelo credor supra referido com os Insolventes, o pagamento de sinal, e
as vicissitudes relativas ao cumprimento do mesmo. Reportou-se à
entrega das chaves do apartamento e ao acordo alcançado nessa
altura para o acabamento dos apartamentos, pressupondo um futuro
acerto de contas. Revelou saber a que empresas o credor supra
referido adjudicou os trabalhos em falta e porquê. Sabia também que o
credor J... destinava o apartamento para a habitação da sua filha e que
esta lá habita de forma permanente. Por fim revelou conhecer as
causas que o levaram à propositura da acção pedindo a resolução do
contrato.

www.dgsi.pt/jtrc.nsf/8fe0e606d8f56b22802576c0005637dc/25f1cf11ca34a3d6802581050039ea58?OpenDocument 63/92
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T..., o qual conhece bem o credor em causa. Foi esta testemunha que
desenhou os prédios onde se situam as fracções e tratou da
constituição em propriedade horizontal. Foi procurador dos
Insolventes e elaborou as minutas dos contratos-promessa, não tendo,
porém, intervenção na celebração dos mesmos.
Referiu-se ao pagamento pelo credor reclamante ao Insolvente a título
de sinal e á forma como eram determinadas as fracções objecto dos
contratos-promessa ainda antes da constituição em propriedade
horizontal.
Aconselhou o Insolvente, face às suas dificuldades de financiamento, a
entregar as fracções objecto dos contratos-promessa aos promitentes-
compradores para que estes as acabassem a expensas suas.
Demonstrou saber que a fracção aqui em causa foi entregue ao credor
supra referido e que este aí efectuou obras de acabamento.
Demonstrou ainda saber que o credor destinava a fracção à habitação
da sua filha. Referiu-se ao facto de esta aí residir.
Disse também que os Insolventes não celebravam o contrato por não
conseguirem distratar as hipotecas.
V..., cunhado dos credores E... e F... e fornecedor dos Insolventes.
Demonstrou ter conhecimento da celebração do contrato-promessa
entre o Insolvente e o credor supra referido. Sabe que ele pagou
quantias a título de sinal e que o Insolvente lhe entregou as chaves da
fracção para que aí procedesse a obras de acabamento. Referiu-se aos
acabamentos efectuados pelo credor reclamante. Revelou que aí vive a
filha e o genro do credor reclamante.
R..., genro do credor reclamante I... e actual morador na fracção
objecto do contrato-promessa celebrado com o seu sogro. É, por isso,
vizinho da filha do credor reclamante supra referido. Demonstrou
saber ter este celebrado um contrato-promessa de compra e venda com
o Insolvente, da entrega das chaves para que procedesse ao
acabamento da fracção, e que aí efectuou obras. Reportou-se ao facto
de na fracção residir a filha do credor reclamante.; e
P..., filha do credor reclamante J... e actual moradora na fracção
objecto do contrato-promessa celebrado com o seu pai. Demonstrou,
por isso, ter conhecimento do negócio celebrado pelo seu pai com o
Insolvente, do pagamento do sinal, da entrega das chaves para que
procedesse ao acabamento da sua fracção, e que aí efectuou obras e o
valor destas. Reportou-se ao facto de residir com a sua família na
fracção em causa e desde quando.
Quanto à impugnação do crédito de L.. e mulher M...
A convicção do tribunal quanto aos factos provados resultou da análise
conjugada dos meios de prova. Assim, partiu-se da análise dos

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documentos juntos pelos credores supra referidos, apreciando-se


criticamente os seguintes:
- Cópia da sentença proferida na açcão declarativa de condenação
proposta pelos credores em epígrafe contra o ora insolvente e que
tomou o nº369/06.3TBLMG tendo corrido os seus termos no 2º Juízo
do Tribunal Judicial de Lamego (fls. 234 a 240).
- Cópia de facturas relativas ao consumo de electricidade, àgua e gás
(fls. 241 a 243, 738 a 751, e 757 a 760).
- A cópia dos cheques emitido pelos credores em referência relativo ao
pagamento da quantia de €29.930,00 em 30-05-2002, a título de
antecipação do pagamento do preço (fls. 244 e 755 a 757);
- Cópia do contrato-promessa celebrado em 13 de Setembro de 2001
entre o insolvente enquanto promitente-vendedor, e os credores supra
referidos, estes na qualidade de promitentes-compradores. Neste
documento escrito se identificam os imóveis prometidos vender; se
descrimina a quantia entregue a título de sinal e a forma e tempo do
pagamento do preço restante - fls. 245 a 248.
-A informação bancária do “Nova Rede” relativamente à conta da
qual foram levantados por meio de cheque os montantes para pagar ao
insolvente o valor do sinal pago (fls. 974 e 975 Estes documentos
particulares foram impugnados pelo “ C..., S.A.” quanto à sua
genuinidade. Foram também por isso relevantes os depoimentos das
seguintes testemunhas que, no essencial, depuseram com isenção e
objectividade:
U..., amigo de há longa data dos credores reclamantes. Actualmente
reside numa das fracções objecto do contrato-promessa celebrado.
Disse ter apalavrado um negócio com os credores reclamantes para
adquirir a fracção logo que ela passe para o nome destes. Referiu-se
ao contrato-promessa celebrado pelos credores reclamantes; ao
pagamento do sinal; à ocupação das fracções pelos promitentes-
compradores; às dificuldades para conseguir que os insolventes
celebrassem o contrato prometido.
As declarações de parte do credor L.. permitiu aferir a coerência dos
documentos juntos, no confronto com a prova testemunhal produzida.
Esclareceu os factos relativos à celebração do contrato-promessa, ao
pagamento do sinal, à ocupação da fracção e às obras aí efectuadas.
Esclareceu também a razão pela qual não foi celebrada a escritura
pública de compra e venda e as causas pelas quais propôs a acção
judicial
Vejamos, então, se dos depoimentos invocados pelo ora recorrente, e
sem olvidar as considerações prévias, quanto a tal, já acima explanadas,
existem motivos para que as supras mencionadas respostas sejam
modificadas ou alteradas.

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Em primeiro lugar, cumpre mencionar que, na nossa opinião, é


insuficiente para que se dêem por provados os pagamentos relativos aos
sinais, o facto de declaração nesse sentido constar do teor dos contratos
promessa outorgados pelas partes.
Os contratos promessa em causa constituem meros documentos
particulares, cuja força probatória, nos termos do disposto no artigo
376.º do CC, se resume a que se considerem provadas as declarações
contrárias aos interesses do declarante, deles constantes, não bastando,
por isso, para que, por si só, se possa dar como provada a existência
dos alegados pagamentos à insolvente.
De resto, nem no caso de documentos autênticos, se pode considerar
que os mesmos se bastam, desacompanhados de outros elementos de
prova, para dar como provado que foi feito o pagamento eventualmente
neles declarado, mas apenas e tão só se pode dar como assente que foi
proferida perante o oficial público que o pagamento já foi efectuado –
neste sentido, por todos, veja-se P. de Lima e A. Varela, in Código Civil
Anotado, Vol. I, 3.ª Edição Revista E Actualizada, Coimbra Editora,
1982, a pág. 326.
Assim, por maioria de razão, apenas com base no teor de tais contratos
promessa, meros documentos particulares, não se pode dar como
provada a existência dos aludidos pagamentos.
Resta, pois, reapreciar a prova testemunhal produzida a fim de
averiguar da veracidade dos pagamentos em causa.
Ora, ouvidos, na íntegra, os depoimentos prestados pelas testemunhas e
credores reclamantes que depuseram acerca desta questão, resulta que
as mesmas, de relevante, referiram o seguinte:
A testemunha I..., referiu qual o preço que acordou com os insolventes,
pagar pela fracção que pretendia comprar, indicando a quantia de
16.500 contos, bem como as quantias que pagou a título de sinal (7.500
contos, no total), que pagou através de cheque.
Confirmou que o insolvente lhes entregou as chaves do apartamento,
em Agosto de 2004, para os compradores acabarem as obras, porque
ele não tinha mais dinheiro para as fazer e que no fim se faria o “acerto
de contas”, o que eles aceitaram e cada um deles concluiu o que faltava
fazer, tendo recorrido aos serviços das pessoas e empresas que já as
tinham iniciado.
Descreveu as obras que fez e respectivos preços.
Relativamente à marcação da escritura referiu que “era quando aquilo
estivesse pronto” e “houvesse a documentação necessária”.
Disse ainda que a sua fracção, no seguimento do acordado com o
empreiteiro foi ocupada a partir de Janeiro de 2005.
Enviaram uma carta para o empreiteiro, para ser marcada a escritura,
mas a mesma veio devolvida, vindo a saber que o mesmo tinha
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“fugido”.
Referiu, ainda, que os responsáveis da N..., nunca tiveram as chaves
das fracções, só a elas tendo acesso para realizar as obras de
electricidade, para o que lhes era fornecida a chave por cada um dos
compradores.
Por F..., que comprou uma das fracções, foi referido que o preço
acordado foi o de 17.500 contos e pagou de sinal, a quantia global de
4.000 contos, que pagaram em cheque.
Que o apartamento lhes foi entregue em Agosto de 2004, apontando as
razões invocadas pela anterior testemunha e nos mesmos moldes.
Descreveu as obras que teve de fazer no apartamento para o poder
habitar e respectivos custos.
Relativamente à marcação da escritura disse que o vendedor lhes
referiu que a mesma seria feita mais tarde, “que em 15 dias isso se
resolvia”, e que lhes enviaria uma carta a marcá-la, o que nunca
aconteceu.
Acrescentou que todos os compradores estavam na mesma situação e
todos ocuparam a respectiva fracção, para o que o vendedor lhes
entregou as chaves e todos fizeram obras de acabamento e mais tarde se
“acertariam as contas”.
T..., disse que foi quem desenhou os prédios em causa e foi procurador
do empreiteiro e, nessa qualidade, fez as minutas dos contratos
promessa que vieram a ser elaborados.
Referiu que o empreiteiro não acabou os prédios porque não tinha
dinheiro para isso e que “disse às pessoas para irem acabando”, o que
assim sucedeu, tendo os compradores feito as obras por sua conta.
Referiu que não assistiu à entrega das chaves mas o vendedor disse-lhe
que as ia entregar às pessoas, para acabarem as obras.
Conhece as pessoas que compraram as fracções e referiu que as
mesmas as ocuparam e sempre o têm vindo a fazer e que alguns as
arrendaram e disse que “O Sr. L.. nunca mais quis saber daquilo para
nada! O que ele queria era saber da vida dele”.
Mencionou, ainda, o modus operandi do vendedor que, segundo ele,
consistia em “sacar dinheiro” aos compradores para ir avançando com
as obras, que não acabou e por isso procedeu à entrega das chaves e
disse aos compradores para ocuparem as fracções.
Referiu, também, algumas das quantias pagas a título de sinal.
J..., credor reclamante, indicou o preço acordado para a venda e as
quantias que pagou a título de sinal, em moldes coincidentes ao por si
alegado.

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Em consonância com as anteriores testemunhas descreveu o


circunstancialismo de que rodeou a entrega das chaves aos
compradores, a realização das obras de acabamento e ocupação das
fracções, o que todos assim fizeram e tendo referido a quantia que
despenderam com as obras.
Mais disse que a situação dos compradores era semelhante e
procederam de igual forma.
Pela testemunha V..., cunhado do reclamante E... e conhece os demais e
forneceu inertes e areias para a obra em causa, a mando do empreiteiro,
referiu que o cunhado comprou por 17.500 contos e pagou logo 2.000
contos de sinal e, posteriormente pagou mais e que os outros
compradores também pagaram o sinal.
Mais tarde, como o empreiteiro não tinha dinheiro para acabar as obras
“entregou as chaves aos proprietários, para eles acabarem as obras”.
Acrescentou que, nessa sequência, os compradores ocuparam os
apartamentos que tinham comprado, depois de fazerem as obras de
acabamento, que o empreiteiro, não tinha feito.
R..., genro do credor I..., referiu que vive, com a família, no
apartamento que compraram, desde Janeiro de 2005, que o sogro o
comprou por 16.500 contos e pagou 27.500 €, de sinal, através de
cheque.
Quanto ao facto de o vendedor não ter acabado as obras e seus motivos,
entrega de chaves e realização das obras, respectivo pagamento e
ocupação das fracções, confirmou o referido pelas demais testemunhas.
Quantificou o custo das obras que fizeram no apartamento que
compraram, indicando o montante de cerca de 10.000,00 €.
A testemunha P..., filha do credor J..., referiu que o pai comprou o
apartamento para a depoente ir para lá viver, o que se verifica desde
início de 2005.
Foi acordado como preço da venda a quantia de 16.500 contos e o pai
já pagou a quantia de 12.500 contos, de sinal, por várias vezes e sempre
por cheque.
Relatou o episódio da entrega das chaves, em consonância com o que
afirmaram as demais testemunhas e descreveu as obras que realizaram
e respectivo custo, que quantificou em cerca de 20.000,00 €.
Referiu, também, a situação dos demais compradores, em moldes
semelhantes à sua, “estavam todos em idêntica situação”, todos tendo
ocupado as suas fracções, estando algumas arrendadas (as pertencentes
a pessoas que estão na Suíça).
U..., disse ser amigo do L.. e vive num dos apartamentos que este
comprou, referindo o preço de compra e que este pagou ao empreiteiro.

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Este não acabou as obras e entregou as chaves, nos moldes e


condicionalismos já referidos.
O credor S..., referiu a quantia que pagou a título de preço e de sinal,
em consonância com oque alegou e que ocupou o apartamento que
comprou, no Verão de 2002, que já estava concluído, tendo apenas que
fazer obras numa garagem que comprou, noutro bloco (o 3), que não
estava pronta, porque o vendedor não a acabou e onde guarda uma
rulote, descrevendo a situação que envolveu esta garagem em moldes
similares ao dos descritos pelas demais testemunhas que adquiriram
fracções no bloco ora referido.
Contribuiu para as obras feitas nas partes comuns.
O credor L.., referiu que comprou dois apartamentos, por 16.000
contos cada um, tendo pago a quantia de 16.000 € por um e que o outro
era para “pagar no fim”.
Descreveu a entrega das chaves em moldes semelhantes aos dos demais
já referidos, bem como descreveu e quantificou as obras que fez e a
situação dos demais compradores.
O..., gerente da N..., descreveu a situação antes e depois da insolvência
do construtor.
Descreveu os trabalhos que realizou e as condições em que
acordou/contratou acabar as obras com os compradores, referindo que
nunca tiveram as chaves dos apartamentos, que “os apartamentos já
tinham porta e chave, as pessoas abriam a porta quando eu precisava de
lá entrar”.
Analisados estes depoimentos, somos de opinião que é de sufragar, na
quase totalidade, a “leitura” que dos mesmos foi feita em 1.ª instância,
sendo de aceitar os argumentos ali expendidos para justificar as
respostas positivas que mereceram os itens em causa, com uma
pequena ressalva no que se refere ao 94.º.
Os itens 11.º, 31.º, 51.º e 70.º, respeitam aos pagamentos efectuados a
título de sinal, inicial e reforços.
Ora, basta ler a fundamentação, para tal exarada na sentença recorrida,
para se concluir que tal factualidade é de dar como provada.
Efectivamente, como ali consta e se faz referência expressa às fl.s dos
autos em que se encontram as cópias dos vários cheques que para tal
foram emitidos, verifica-se que tais pagamentos se encontram
comprovados nos autos.
Todos os pagamentos foram efectuados através de cheques emitidos à
ordem do comprador e foram juntas as respectivas cópias.
Por referência a critérios/situações de normalidade e razoabilidade é
natural, lógico e seguro que alguém que pague as quantias aqui
envolvidas, se reúna de cautelas mínimas, com vista a provar que fez
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tais pagamentos, para mais tratando-se, como se trata, de pagamentos


por conta da aquisição de imóveis.
O razoável, normal e expectável é que quantias de tais montantes sejam
pagas através de um qualquer meio (cheque, letra, transferência
bancária) que permita a sua comprovação futura e se exija o
comprovativo de tal pagamento ter sido efectuado, mediante a emissão
do competente recibo, para mais se se atentar que no âmbito da
celebração de contratos promessa se verifica uma alta taxa de
incumprimento contratual.
Assim, juntas as cópias de tais cheques, como o foram, é de dar tal
matéria como demonstrada.
E nem se diga, salvo o devido respeito, como o faz o recorrente, que
assim não pode suceder porque não foram juntos os elementos
bancários e cópias bancárias de tais cheques, a tal referentes.
Não se pode olvidar o largo período de tempo já decorrido e exigir que
as pessoas ainda tenham na sua posse os extractos bancários.
Por outro lado, cf, consta de fl.s 649; 673 a 702; 780; 832 a 836; 354 a
357 e 363 a 404, não obstante notificadas para juntarem tais elementos,
a CGD referiu já não ter tais elementos e o Millenium forneceu os
extractos bancários de contas dos insolventes.
Assim, parece-nos suficiente para a demonstração de tais pagamentos,
a junção das cópias dos cheques, nos moldes acima referidos.
Os itens 86.º a 97.º, respeitam ao crédito reclamado por L.. e M...
Refere o recorrente que os factos ali descritos não foram alegados.
Como resulta da fundamentação de facto atinente (cf. fl.s 492 v.º e
493), para a demonstração dos mesmos teve-se em conta o conteúdo da
sentença, cuja cópia se encontra junta de fl.s 234 a 240 e cópia do
respectivo contrato promessa.
Assim, tais factos são de ter por assentes, por já constarem da referida
sentença.
Questão diferente é a da oponibilidade desta ao recorrente. Mas disso
não se trata em sede de fundamentação de facto, mas sim de direito, do
que, em sede própria, se curará.
Os itens 36.º a 38.º, referem-se à ocupação das fracções por G...e
família.
Dos depoimentos prestados, de forma unânime, resulta que todos os
compradores, directamente ou através de arrendamento, ocuparam as
fracções prometidas comprar e respectivas garagens, pelo que tais
factos são de ter por provados.
Da relevância/irrelevância da ocupação através de arrendamento se
cuidará em momento oportuno, designadamente, para a questão de
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saber se se trata ou não de consumidor, a fim de saber se gozam do


direito de retenção.
O item 94.º, refere-se ao crédito de L.. e mulher, no que concerne ao
prazo para a marcação da escritura.
Inexiste documento escrito quanto a tal, ao contrário do que sucede
com alguns dos demais compradores.
Quanto a tal o que foi dito foi que a escritura seria marcada mais tarde,
logo que obtidos os documentos para tal, mas sem que se referisse uma
data limite para tal.
Pelo que, nenhuma prova foi feita no sentido de que, relativamente a
este crédito, se fixasse, por acordo verbal, uma data limite para a
realização da escritura.
Pelo que, se altera a redacção do item 94.º, que passa a ter a
seguinte redacção:
94.º - Acordaram ainda que a escritura pública seria realizada logo
que os insolventes obtivessem os documentos necessários para tal.
Consequentemente, quanto a esta questão, procede, parcialmente,
em conformidade com o ora decidido, o presente recurso, em
função do que se altera, nos moldes acima referidos, a redacção que
foi dada ao item 94.º; mantendo-se toda a demais factualidade que
foi dada como provada e não provada na sentença recorrida.
B. Omissão da graduação do crédito do recorrente, relativamente à
verba n.º 1, que foi admitido e reconhecido e, como tal, deve ser
graduado.
No que a esta questão concerne, alega o recorrente D... que apesar de
reconhecido o seu crédito e sem que na decisão recorrida se aponte
qualquer causa para tal, aquando da graduação dos créditos referentes à
verba n.º 1, se omitiu o seu crédito.
Efectivamente, compulsando o dispositivo da sentença, verifica-se que,
relativamente a todos os imóveis, com excepção da verba n.º1, se
reconheceu e graduou o crédito reclamado pelo D..., em consonância
com as regras que determinam a respectiva graduação.
Cremos que a mencionada omissão se deve a mero lapso, nada
resultando da sentença em recurso que se quisesse não ter em conta o
crédito em causa.
Assim, no que toca a esta questão, procede o recurso, determinando-
se que o crédito reclamado pelo ora recorrente, D..., é graduado em 2.º
lugar, logo a seguir ao crédito da Fazenda Nacional, pelo que a alínea
A), da parte decisória da sentença recorrida passa a ter a redacção
indicada na conclusão XII.ª, ou seja:

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A) Relativamente ao produto da venda sobre o imóvel descrito na


verba nº1 (imóvel descrito na CRP de Lamego sob o
nº569/19930924 da freguesia da Sé):
1º - Crédito da Fazenda Nacional por IMI relativa a este imóvel.
2.º - Crédito reclamado pelo D..., SA até ao limite constante do
registo através da apresentação 17 de 2002/08/14.
3º - Crédito reclamado por “ X..., S.A.” até ao limite constante do
registo através da apresentação 6 de 2004/03/18.
3º - Todos os restantes créditos comuns a par e em rateio.

C. Se não se verifica o incumprimento definitivo de nenhum dos


contratos promessa.
Relativamente a esta questão do recurso, alega o recorrente que inexiste
incumprimento definitivo de qualquer dos contratos promessa, porque
neles não se fixava nenhum prazo para a outorga da escritura, nem os
promitentes compradores requereram, judicialmente, a fixação de prazo
para tal; para além de que as cartas que, alguns deles enviaram, com
vista a tal desiderato, não preenchem os requisitos da interpelação
cominatória a que se refere o artigo 808.º, n.º 1, do Código Civil, do
que decorre inexistir o invocado direito de retenção, nem o direito de
exigir o sinal em dobro.
Nas respectivas contra-alegações, os recorridos defendem que assim
não se pode considerar porquanto existe sentença que já declarou
resolvidos os contratos promessa em causa e lhes reconheceu o direito
de retenção; que se fixou prazo, de forma implícita, com a menção de
que o seria quando se dispusesse dos documentos para tal e que as
cartas enviadas, por alguns deles, a exigir a marcação da escritura,
reúnem os requisitos legalmente exigidos para tal.
Na sentença recorrida, considerou-se que a existência de anteriores
sentenças em que se declararam resolvidos os contratos promessa em
causa, tem força bastante para que assim seja declarado nos presentes
autos e, considerando-as oponíveis ao ora recorrente.
Assim, esta questão desdobra-se em duas ordens de razões, a saber, a
eficácia das aludidas sentenças relativamente ao recorrente e se as
cartas enviadas são aptas a preencher a previsão do artigo 808.º, n.º 1,
do Código Civil.
Iniciando a primeira destas pela oponibilidade da sentença, há que ter
presente a razão de ser do caso julgado.
Como consabido, e reproduzindo o por nós já defendido em decisões
anteriores, visa a “excepção de caso julgado” evitar que o órgão
jurisdicional contrarie na decisão posterior o sentido da decisão anterior
ou repita na decisão posterior o conteúdo da decisão anterior.
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Garante, portanto, a impossibilidade de o tribunal decidir sobre o


mesmo objecto duas vezes de maneira diferente e a inviabilidade do
tribunal decidir sobre o mesmo objecto duas vezes de maneira idêntica.
Encontrando-se os seus requisitos enumerados no artigo 581º do
NCPC, a saber: identidade de sujeitos, de pedido e de causa de pedir.
Identidade de sujeitos que reside no facto de as partes serem as mesmas
nas duas acções sob o ponto de vista da sua qualidade jurídica.
Identidade da causa de pedir que existe quando a pretensão deduzida
nas duas acções procede do mesmo facto jurídico, identidade que tem
de ser procurada não relativamente às demandas formuladas, mas na
questão fundamental levantada nas duas acções; pelo que, tendo a
nossa lei adoptado a chamada teoria da substanciação, se exige sempre
a indicação do título ou facto jurídico em que se baseia o direito do
autor.
Identidade do pedido que tem de ser apreciada não só em relação ao
que se pede nas duas acções mas também em relação ao que se alega a
respeito da questão fundamental que comanda o pedido das acções.
Sendo inquestionável o que acabamos de observar, está longe de
representar ou constituir, só por si, uma explicação acabada para a
compreensão da “excepção de caso julgado”.
Se, quanto à identidade de sujeitos, nenhumas dificuldades
normalmente se suscitam, não é com a mesma facilidade que se
percebe tal identidade nos elementos objectivos (causa de pedir e
pedido).
E, a propósito dos limites objectivos do caso julgado, não será
despiciendo referir que desde há muito que a concepção/sistema restrito
do caso julgado se foi impondo quer na doutrina quer na
jurisprudência; ou seja, hoje, não é sustentável dizer que qualquer
fundamento fica pelo trânsito em julgado indiscutível (sistema amplo
do caso julgado), devendo antes ser dito, como regra, que só a decisão
tem foros de indiscutibilidade, sendo tudo o mais (todos os seus
fundamentos) discutível (sistema restrito).
Porém, o que se diz como regra (só ter a sentença força de caso julgado
na parte decisória e não nos motivos) é algo que não tem uma rigidez
absoluta, distinguindo-se, tendo como ponto de partida tal regra
(própria dum sistema restritivo puro), hipóteses em que os fundamentos
têm força de caso julgado e hipóteses em que não têm[1].
Verdadeiramente, hoje, em termos de limites objectivos do caso
julgado, impera a ideia pragmática do “in medio virtus”[2]; o sistema
restritivo adoptado acaba por ser apenas “pseudo-restritivo” ou, mais
exactamente, um sistema intermédio[3].
De modos diversas e com mais ou menos nuances (de linguagem), diz-
se recorrentemente que a decisão e fundamentos constituem um todo
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único; que toda a decisão é a conclusão de certos pressupostos (de facto


e de direito), pelo que o respectivo caso julgado se encontra sempre
referenciado a certos fundamentos; que reconhecer que a decisão está
abrangida pelo caso julgado não significa que ela valha com esse valor,
por si mesma e independentemente dos respectivos fundamentos;
enfim, que não é a decisão, enquanto conclusão do silogismo judiciário
que adquire o valor de caso julgado, mas o próprio silogismo no seu
todo; que o caso julgado incide sobre a decisão como conclusão de
certos fundamentos e atinge esses fundamentos enquanto pressupostos
dessa decisão[4].
“Em regra, o caso julgado não se estende aos fundamentos de facto da
decisão; mais exactamente, os fundamentos não adquirem valor de
caso julgado quando são autonomizados da respectiva decisão
judicial; não são vinculativos quando desligados da respectiva decisão.
Mas valem (os fundamentos) enquanto fundamentos da decisão e em
conjunto com esta[5]”.
Enfim, repetindo, os pressupostos da decisão estão cobertos pelo caso
julgado enquanto pressupostos da decisão – caso julgado relativo – ou
seja, a força de caso julgado alarga-se aos pressupostos enquanto
tais[6]; o que está em causa no caso julgado é o raciocínio como um
todo e não cada um dos seus elementos; e só o raciocínio como um
todo faz caso julgado[7].
Mas mais – e relacionado com esta ideia dos fundamentos, enquanto tal
(ligados ao decidido), adquirirem valor de res judicata – o caso julgado
também possui um valor enunciativo, ou seja, a eficácia do caso
julgado exclui toda a situação contraditória ou incompatível com
aquela que ficou definida na decisão transitada, ficando afastado todo o
efeito incompatível, isto é, todo aquele efeito que seja excluído pelo
que foi definido na decisão transitada.[8]
Mais ainda, os fundamentos podem possuir um valor próprio de caso
julgado sempre que haja que respeitar e observar certas conexões entre
o objecto decidido e um outro objecto; conexões que podem ser,
designadamente, de prejudicialidade, o que significa, por ex., que, se
numa compra e venda o comprador obtém a redução do preço
atendendo aos defeitos da coisa, não pode questionar a validade do
contrato em acção em que o vendedor requeira que ele lhe pague a
quantia em dívida.
E ainda o que resulta do que é normalmente chamado de “efeito
preclusivo”; que designa o efeito da sentença segundo o qual não se
pode formular a mesma solicitação processual no futuro com base em
factos não supervenientes ao momento do encerramento da discussão
em 1.ª instância – 663.º/1= 611.º/1 do NCPC[9].
Podendo referir-se, neste ponto, que “o âmbito da preclusão é
substancialmente distinto para o autor e para o réu. Quanto ao autor, a
preclusão é definida exclusivamente pelo caso julgado: só ficam
precludidos os factos que se referem ao objecto apreciado e decidido
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na sentença transitada. Assim, não está abrangida por essa preclusão


a invocação de uma outra causa de pedir para o mesmo pedido, pelo
que o autor não está impedido de obter a procedência da acção com
base numa distinta causa de pedir. (…). Quanto ao âmbito da
preclusão que afecta o réu, há que considerar que lhe incumbe o ónus
de apresentar toda a defesa na contestação (art. 498.º/1), pelo que a
preclusão que o atinge é independente do caso julgado: ficam
precludidos todos os factos que podiam ter sido invocados como
fundamento dessa contestação, tenham ou não qualquer relação com a
defesa apresentada e, por isso, com aquela que foi apreciada pelo
tribunal.”[10]
O que significa – é o sentido do efeito preclusivo para um réu – que os
contra-direitos que um réu possa fazer valer – e não fez – são
ininvocáveis contra o caso julgado; que este abrange aquilo que foi
objecto de controvérsia e ainda os assuntos que o réu tinha o ónus de
trazer à colação, estando neste último caso todos os meios de defesa do
réu; que a indiscutibilidade duma questão, o seu carácter de res
judicata, pode resultar tanto duma investigação judicial, como do não
cumprimento dum ónus que acarrete consigo por força da lei esse
efeito[11].
É, na síntese clássica, a regra do “tantum judicatum quantum
disputatum vel disputari debetat”.
E é chegado a este ponto da compreensão dos limites objectivos do
caso julgado – nos meandros das situações incompatíveis, de
prejudicialidade e do chamado efeito preclusivo – que emerge a
“figura” da autoridade de caso julgado e os exemplos de escola (e
jurisprudenciais) da verificação da “autoridade de caso julgado”.
Como excepção dilatória, visa o caso julgado (material) prevenir, como
já se referiu, a possibilidade de prolação de decisões judiciais
contraditórias com o mesmo objecto (efeito impeditivo); como
autoridade de caso julgado, garante a vinculação dos órgãos
jurisdicionais e o acatamento pelos particulares de uma decisão anterior
(efeito vinculativo).
Quando o objecto processual antecedente é repetido no objecto
processual subsequente, o caso julgado da decisão anterior releva como
excepção de caso julgado no processo posterior; quando o objecto
processual anterior funciona como condição para a apreciação do
objecto processual posterior, o caso julgado da decisão antecedente
releva como autoridade de caso julgado material no processo
instaurado em 2.º lugar[12].
Daí que a excepção do caso julgado pressuponha a identidade de
sujeitos, de pedido e de causa de pedir; enquanto, naturalmente, a
autoridade do caso julgado dispensa tal tríplice identidade[13].
Porém, tal dispensa não significa um não confinamento da “figura” do
alcance e da autoridade do caso julgado àquelas situações em que a
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sentença reconhece, no todo ou em parte, um concreto direito do A.,


assim fazendo precludir todos os meios de defesa do R., os
concretamente deduzidos e até os abstractamente dedutíveis com base
em direito próprio; ou àquelas situações em que a sentença, ao
reconhecer um direito, constitui um pressuposto ou condição de
julgamento de um outro objecto ou prejudica/exclui a invocação de
direitos contraditórios e incompatíveis.
São aliás bem elucidativos os exemplos em que tal “figura” se
considera normalmente como verificada:
Se uma decisão reconhece o direito de propriedade sobre uma parcela
de terreno e condena o R. à sua restituição e à demolição da construção
que na mesma efectuou, não pode o R. – por força da autoridade do
caso julgado da primeira decisão – em nova acção, ainda que com
fundamento em acessão industrial imobiliária, pedir o reconhecimento
do direito de propriedade sobre a mesma parcela de terreno; apesar de
não se verificar a excepção dilatória do caso julgado, atenta a
diversidade da causa de pedir, a segurança e a certeza jurídica
decorrentes do trânsito em julgado da primeira decisão obstam a que,
em nova acção, se questione o direito de propriedade e as obrigações de
restituição e de demolição reconhecidas na primeira acção com base
numa realidade que já se verificava aquando da primeira acção e que aí
poderia/deveria ter sido invocada pelo R. (quer para impedir a
procedência da acção, quer para sustentar, em sede reconvencional, o
direito potestativo de acessão imobiliária.
Se uma decisão condena no pagamento de uma indemnização, não
pode aquele que é ali condenado vir pedir, com base no enriquecimento
sem causa, a restituição da quantia paga; impedimento esse que resulta,
não da excepção de caso julgado (face à diversidade das causa de
pedir), mas da autoridade de caso julgado formado pela primitiva
acção/decisão.
Se uma decisão condena no preço (duma compra e venda) duma coisa,
não pode o condenado, em posterior acção, vir invocar vício
invalidante de tal compra e venda; impedimento que também resulta da
autoridade de caso julgado formado pela primitiva acção/decisão.
Se numa acção de reivindicação se reconhece a propriedade, tal vale
como autoridade de caso julgado num processo posterior em que o
proprietário requer a condenação da contraparte no pagamento duma
indemnização pela ocupação indevida do imóvel.
Exemplos que têm em comum a identidade de sujeitos (em ambas as
acções: na já decidida e na nova acção).
O que não é o caso da situação sob recurso – em que o aqui recorrente e
credor D... não foi parte nos anteriores processos – que convoca outro
tipo de considerações sobre o caso julgado:

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Designadamente, que o caso julgado só produz efeitos entre as partes,


projectando a sua eficácia apenas nas relações entre as partes do
processo; que aos terceiros que não participam no processo, que não
hajam tido a oportunidade de defender os seus interesses – que podem
naturalmente colidir, no todo ou em parte, com os da parte vencedora –
não pode ser oposta a força de caso julgado duma decisão (a
inoponibilidade do caso julgado a terceiros representa um corolário do
princípio do contraditório).
O que não significa nem “que todos aqueles que não figuram no
processo como partes possam ignorar as sentenças proferidas e
transitadas nas diferentes acções, agindo como se elas não existissem
na esfera das realidades jurídicas”[14]; nem, no pólo oposto, a
doutrina dos efeitos reflexos do caso julgado em relação a terceiros;
mas apenas que a sentença acaba por definir, perante todos, as situações
jurídicas das partes, acabando por irradiar repercussões que são mera
consequência do modo como o direito substantivo conexiona as
situações jurídicas desses terceiros com as situações jurídicas das
partes.
Tudo estando pois em saber “em que medida terceiros podem estar
sujeitos, já não à autoridade do caso julgado, que, enquanto tal, não os
atinge, mas à eficácia da sentença, quer no plano dos seus efeitos
práticos ou de facto, quer no dos seus efeitos jurídicos indirectos.”[15]
Sendo justamente em tal ponto do problema que “é usual distinguir os
terceiros juridicamente indiferentes dos terceiros juridicamente
interessados: os primeiros (juridicamente indiferentes) são, ou
pretendem ser, titulares duma situação jurídica que não pode, pela sua
natureza, ser atingida pelo caso julgado, mas cuja consistência prática
o caso julgado pode afectar, como é o caso do credor comum, cujo
direito de crédito permanece, não obstante o desaparecimento de um
bem do património do seu devedor diminuir a garantia que este
representa para ele e restantes credores; juridicamente interessados
são os titulares, ou pretensos titulares, de situações jurídicas que, a
ser-lhes oposto o caso julgado, por ele podem ser, em si, afectados,
quer por resultarem suprimidas, quer por terem o seu conteúdo
modificado[16].
Ou, nas palavras do Prof. Antunes Varela[17]:
“Há, em 1.º lugar, as pessoas a quem podemos chamar terceiros
juridicamente indiferentes. São as pessoas a quem a sentença não
causa prejuízo jurídico, por não bolir com a existência ou validade do
seu direito, embora possa afectar a sua consistência prática ou
económica. (…) Nestes casos, em que a decisão contida na sentença
não causa prejuízo jurídico ao direito de terceiro, nenhuma razão há
para recusar a invocação do caso julgado perante esse terceiro, visto a
regra da eficácia relativa do caso ter por fim evitar que terceiros sejam
prejudicados, na consistência jurídica ou no conteúdo do seu direito
(sem eles terem tido a possibilidade de se defender e esse risco não
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ocorrer em tal tipo de situações). Pode, por conseguinte, dizer-se que,


em relação aos terceiros juridicamente indiferentes, a sentença impõe-
se-lhes”.
E há as situações “em que as pessoas se arrogam a titularidade de uma
relação ou posição incompatível com a reconhecida na sentença.
Na acção de reivindicação instaurada por A contra B, a sentença
reconhece, por hipótese, a propriedade de A. sobre a coisa, sendo certo
que C se arroga a qualidade de proprietário da mesma coisa. (…)
Nos casos deste tipo, nenhuma razão há, de acordo com o espirito da
norma que prescreve a eficácia relativa do caso julgado, para impor a
sentença ao terceiro, titular da posição incompatível com a declarada
na sentença transitada.
Pelo contrário.
Se a sentença proferida for invocada contra terceiro, deve reconhecer-
se a este a ampla possibilidade de alegar e demonstrar a existência do
seu direito, incompatível com a decisão passada em julgado.”
Ora, salvo o devido respeito, a situação sob recurso corresponde à
primeira hipótese, uma vez que a decisão proferida nas anteriores
sentenças não bole, não contende com a existência ou validade do
direito do recorrente, embora possa afectar a sua consistência prática ou
económica, na medida em que o direito de retenção tem efeitos, a nível
da graduação de créditos, relativamente aos direitos que são conferidos
pela hipoteca.
Pelo que, se tem de concluir que, efectivamente, por força derivada da
eficácia do caso julgado das sentenças anteriores, estão resolvidos os
contratos promessa celebrados entre promitente vendedor e promitentes
compradores, ocasionado pelo incumprimento culposo e definitivo dos
promitentes vendedores, com as consequências daí decorrentes.
Sobre esta problemática, entre outros, pode ver-se o Acórdão da
Relação do Porto, de 13/01/2015, Processo n.º 5729/09.5YYPRT-C.P1,
disponível no respectivo sítio do itij, onde se conclui no sentido ora
propugnado, dado que, como ali se refere e acima já se fez referência,
não se pode “confundir afectação prática/económica com afectação
jurídica, sendo certo que (…) só esta última poderia relevar para a
qualificação do credor hipotecário como terceiro juridicamente
interessado e para o afastar da eficácia do caso julgado decorrente do
trânsito da sentença que reconheceu ao promitente-comprador o
direito de retenção sobre o imóvel prometido.”.
Para além deste fundamento, relativamente aos promitentes
compradores que enviaram carta registada ao insolvente, com vista à
marcação da escritura, também este procedimento, leva a semelhante
conclusão.

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Efectivamente, os contratos, é sabido, devem ser pontualmente


cumpridos (406º do CC).
Quando assim não acontece, quando ocorre um qualquer desvio entre a
execução do contrato e o programa negocial, verifica-se um
“inadimplemento”.
Inadimplemento que, em certos casos, confere ao credor um direito de
resolução legal.
Dito de outro modo, nos casos em que a violação e/ou desvio do
programa negocial assumem determinada importância e gravidade, que
justifiquem o desaparecimento do interesse do credor na manutenção
da relação contratual, confere a lei ao credor o direito de resolução
(cfr., v. g., arts 793º, n.º 2, 801º, n.º 2, 802º, n.º 1, 808º todos do CC).
Direito de resolução legal que, assim configurado, se apresenta como
um direito potestativo extintivo dependente de um fundamento, o
mesmo é dizer, dependente de um inadimplemento grave.
Inadimplemento grave, cuja definição, em primeira linha, pertence ao
credor, a quem compete a sua invocação.
Assim, visando por norma o credor conseguir, com o cumprimento
exacto e pontual da obrigação, quer uma finalidade de uso quer uma
finalidade de troca, deverá em princípio ser considerada grave toda
aquela inexecução ou inexactidão do cumprimento que torne inviável
um certo emprego do objecto da prestação ou que impossibilite o
credor de a aplicar ao uso especial que tinha em vista.
Regra geral, o fim-motivo visado pelo credor fica fora e não faz parte
integrante do conteúdo da obrigação (fica no limbo dos simples
motivos juridicamente irrelevantes), porém, embora o fim-motivo seja
irrelevante no quadro da fase estipulativa, tal não significa que não
possa tornar-se relevante na fase executiva do negócio.
Ora, é justamente através da resolução legal que, em certos casos, tais
“fins-motivos”, tais interesses do credor que não entraram a fazer parte
do conteúdo do contrato e da obrigação do devedor, se tornam
relevantes.
“Fins-motivos”/interesses do credor (susceptíveis de relevar em termo
de resolução) que serão sempre determinados e perspectivados
objectivamente; objectividade que significa que o interesse afectado
pelo incumprimento há-de ser apreciado por qualquer outra pessoa
(designadamente pelo juiz) e não segundo o bel-prazer, o capricho ou o
juízo arbitrário do credor.
É justamente tal situação, de relevância do fim-motivo negocial, para
efeito de inexecução do negócio, que se encontra prevista no art. 808º,
n.º, 1, 1ª parte, do CC, quando se diz que se considera para todos os
efeitos não cumprida a obrigação sempre que, em consequência de
mora, o credor perder o interesse na obrigação.
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Efectivamente, a conversão da mora em incumprimento definitivo


implica aplicar à situação o art. 801º, que, nos contratos bilaterais,
confere ao credor uma opção entre exigir uma indemnização ou
resolver o contrato exigindo ao mesmo tempo o ressarcimento dos
prejuízos sofridos.
“Para além dos casos em que a mora, em conjugação ou não com
outras causas, fez desaparecer o interesse do credor na prestação, há
que ter em conta todos os outros em que tal não acontece mas nos
quais não seria legítimo obrigar o credor a esperar indefinidamente
pelo cumprimento. Não seria justo manter o credor indefinidamente
vinculado ao contrato (inibindo-o designadamente de fazer uma
compra de cobertura ou de por qualquer outro modo prover à
satisfação da necessidade que o levou a contratar) visto que ele,
embora com direito, ficaria sempre sujeito a ter de cumprir por seu
lado - bem como a ter de receber a prestação retardada. Por isso, em
várias legislações se prevê a possibilidade de o credor (parte não
inadimplente), uma vez incurso em mora o devedor, fixar a este um
prazo suplementar razoável - mas peremptório - dentro do qual se
deverá verificar o cumprimento, sob pena de resolução automática do
negócio.
A situação é contemplada na segunda parte do n.º 1 do já referido art.
808º. Fora dos casos em que a mora tem por consequência a perda do
interesse na prestação por parte do credor, este tem à sua disposição o
mecanismo seguro da intimação ou interpelação cominatória, que
igualmente pode conduzir às consequências do art. 801º, se a
obrigação não for cumprida dentro do prazo suplementar razoável
fixado na mesma interpelação ou intimação.
Trata-se de um remédio concedido por lei ao credor para os casos em
que não tenha sido estipulada uma cláusula resolutiva ou um termo
essencial nem ele possa alegar, de modo objectivamente fundado,
perda do interesse na prestação por efeito da mora. Constitui, como já
disse alguém, um meio especial de “autotutela privada” que faz do
credor árbitro da sorte da relação. Por esta via, a lei legitima o credor
para provocar unilateralmente uma modificação da relação,
introduzindo nela um elemento novo, ou seja, um novo prazo de
cumprimento que se caracteriza pela sua peremptoriedade. Prazo, este
que, aliás, nada impede possa ser logo estipulado no momento da
constituição da obrigação.
A interpelação admonitória com fixação de prazo peremptório para o
cumprimento a que se refere a segunda parte do n.º 1 do art. 808º é,
pois, uma intimação formal dirigida ao devedor moroso para que
cumpra a sua obrigação dentro de certo prazo determinado, sob pena
de se considerar o seu não cumprimento como definitivo. Assim,
através da fixação de um prazo peremptório, obtém-se uma
clarificação definitiva de posições.
A interpelação admonitória deve conter três elementos:
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a) a intimação para o cumprimento; b) a fixação de um termo


peremptório para o cumprimento; c) admonição ou a cominação
(declaração admonitória) de que a obrigação se terá por
definitivamente não cumprida se não se verificar o cumprimento dentro
daquele prazo. Trata-se, pois, de uma declaração intimativa.
A interpelação admonitória é unia declaração receptícia: torna-se
definitiva e irrevogável a partir do momento em que chega ao poder do
devedor ou é dele conhecida (art. 224º). A partir desse momento, o
credor já não pode exigir o cumprimento. Se, posteriormente, credor e
devedor acordam um outro prazo, então já lhe podem dar o efeito, ou
de termo essencial, ou de cláusula resolutiva.
Diz a lei que o prazo fixado pelo credor deve ser um prazo razoável.
Essa razoabilidade variará, evidentemente, conforme a natureza da
prestação. O prazo razoável será aquele que o for para o aprestamento
da prestação. Assim, se a prestação consistir numa soma de dinheiro,
será mais breve; se ela consistir na entrega de uma mobília que ainda
tem de ser confeccionada ou acabada, no todo ou em parte , será mais
longo (sublinhado nosso). Mas, se deve ser um prazo suficiente para
que o devedor complete o aprestamento da prestação, também não
deve ser tal que prejudique ou faça até desaparecer o interesse do
credor. Se o credor verifica que, se a prestação não for feita dentro de
certo prazo suplementar, se dará um evento que fará desaparecer o
interesse que para ele tem a prestação, deve avisar disso o devedor.
O devedor poderá discutir posteriormente em tribunal a razoabilidade
do prazo, se pretende evitar as consequencias do art. 801º. Nesta
hipótese, se o tribunal lhe der razão, nem por isso ressuscita uma
relação extinta: limita-se a declarar a subsistência da relação anterior
em virtude da ineficácia da interpelação admonitória e da declaração
de resolução que porventura se lhe tenha seguido [18] ”.
Por último, de referir que a resolução que se basta com uma declaração
nesse sentido à outra parte, cf. artigo 436.º, n.º 1, do Código Civil.
Por outro lado, de acordo com o disposto no artigo 799, n.º 1, Código
Civil, incumbe ao devedor provar que a falta de cumprimento não
procede de culpa sua e só existe incumprimento definitivo quando a
prestação não tenha sido cumprida e já não possa vir a sê-lo
posteriormente e desde que continue a existir interesse do credor na
prestação, de acordo com o disposto no artigo 808.º, do Código Civil.
De acordo com o disposto neste preceito “a perda do interesse
na prestação é apreciada objectivamente “.
Como ensina A. Varela, in RLJ 118 - 54 “a lei não se contenta com a
simples perda (subjectiva) do interesse do credor na prestação em
mora para decretar a resolubilidade do contrato; o n.º 2 do artigo
exige que a perda do interesse seja apreciada objectivamente“.

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A perda do interesse não pode ater-se, somente, numa simples mudança


de vontade do credor na efectivação do negócio, desacompanhada de
qualquer circunstância de relevo para além da mora. A perda do
interesse há-de objectivar-se segundo o critério de razoabilidade
própria do comum das pessoas - no mesmo sentido, veja-se Menezes
Cordeiro, in Estudos de Direito Civil, vol. I, pág. 55 e Pedro Romano
Martinez, in Cumprimento Defeituoso Em Especial Na Compra E
Venda E Na Empreitada, pág.s 333 e 334.
A diferença entre a mora e o incumprimento definitivo reside no
facto de a mora se traduzir na falta de cumprimento na data
estabelecida, continuando o cumprimento a ser possível e a satisfazer o
interesse do credor, enquanto o incumprimento definitivo revela uma
situação em que a prestação já não pode ser efectuada ou deixe de
satisfazer o interesse do credor. Daqui resulta que a aplicação das
sanções aludidas no artigo 442.º, n.º 2, CC, pressupõe o incumprimento
definitivo do contrato promessa não bastando a simples mora.
Neste sentido, entre outros, a nível jurisprudencial, os Acórdãos do
STJ, de 8/2/200, CJ, STJ, 2000, I, 72 e de 27/11/97, in BMJ 471, 388 e
da Relação de Guimarães, de 31/03/2004, CJ, 2004, II, 277.
Ora, compulsando a matéria de facto considerada como provada, in
casu, parece-nos que, efectivamente, se verificam os enumerados
pressupostos para que possa operar a pretendida (pelos promitentes
compradores) resolução do contrato promessa em causa, com base em
incumprimento definitivo por parte dos insolventes.
Consequentemente, estamos perante uma situação de incumprimento
definitivo por parte destes, que nunca diligenciaram pela marcação da
escrituram, nem, sequer, terminaram a obra, pelo que, nos termos acima
expostos, podiam os promitentes compradores operar a pretendida
resolução dos contratos promessa sub judice, e, assim, fazer suas as
quantias recebidas a título de sinal, regendo, no caso específico do
regime do contrato promessa o estatuído no artigo 442.º, n.º 2, do
Código Civil, no que se refere ao sinal entregue.
De salientar que, como acima referido, se concluiu que foram os
insolventes que deram azo ao incumprimento do contrato promessa
celebrado com os promitentes compradores, não o cumprindo por causa
que lhe é imputável, ao não assegurar as condições estabelecidas para
que se pudesse outorgar a escritura definitiva.
Last but not least, não pode deixar de se notar que, não obstante tudo o
que acima se disse, nos presentes autos, acerca da força de caso
julgado, mais uma vez, nos presentes autos de reclamação de créditos,
se discutiu (e reconheceu) a existência dos créditos ora impugnados,
pelo que, também, por essa razão, não pode proceder a pretensão do ora
recorrente.
Pelo que, no que concerne a esta questão, improcede o recurso.

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D. Se não ocorreu tradição válida das fracções correspondentes às


verbas 5, 8, 9, 10, 12 e 13.
No que a esta questão respeita, alega o recorrente que exigindo a lei
que o contrato promessa seja redigido a escrito e por no mesmo nada
constar quanto à tradição das fracções, mesmo que esta tenha ocorrido,
seria nula por vício de forma.
Contrapõem os recorridos que se trata de tradição simbólica, que não
deriva do contrato promessa mas sim do acordo, posterior, para que os
compradores acabassem as obras e ocupassem as referidas fracções, em
função do incumprimento contratual dos insolventes.
O que nos remete para a regra do art. 221.º, n.º 1, do C. Civil – em que
se dispõe que “ as estipulações verbais acessórias anteriores ao
documento legalmente exigido para a declaração negocial, ou
contemporâneas dele, são nulas, salvo quando a razão determinante da
forma lhes não seja aplicável e se prove que correspondem à vontade
do autor da declaração”.
Regra que, quanto ao âmbito da forma legal, consiste em a exigência da
forma (enquanto modo de exteriorizar declarações de vontade)
abranger, além das cláusulas essenciais do negócio jurídico, as
estipulações acessórias, típicas ou atípicas, sejam contemporâneas da
conclusão de negócio sejam subsequentes.
Todavia, tal regra, contida no art. 221.º do C. Civil, admite restrições;
uma vez que se reconhece, logo no mesmo preceito, a validade de
estipulações verbais anteriores ao documento exigido para a declaração
negocial ou contemporâneas dele, desde que se verifiquem,
cumulativamente, os seguintes requisitos:
a) que se trate de cláusulas acessórias – isto é, não pode, como é
evidente, estar-se perante estipulações essenciais, assim como, não
sendo essenciais, não podem as cláusulas que não constem do
documento contradizer o próprio conteúdo do documento, mas apenas
completá-lo (estando para além do conteúdo);
b) que não sejam abrangidas pela razão de ser da exigência da
forma/documento;
c) que se prove que correspondem à vontade das partes.
Como consabido, a razão para tal regime assenta no facto de se
entender que se as partes tivessem querido contratar tais cláusulas não
deixariam de as introduzir, fazer constar, do documento que
elaboraram. Não o tendo feito, presume-se que não foram queridas
pelas partes contratantes.
Como refere Carlos Alberto da Mota Pinto, in Teoria Geral do Direito
Civil, Coimbra Editora, 1976, a pág. 343: “é manifesto que há uma
presunção natural de o documento ser completo, pelo que, na dúvida

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sobre a existência de uma estipulação acessória, anterior ou


simultânea, adicional, é de decidir contra a sua existência.”.
No entanto, salvo o devido respeito, o facto em causa: - entrega das
chaves pelos insolventes aos promitentes compradores, para estes
habitarem os apartamentos prometidos comprar e para realizar as obras
para tal necessárias, em nada contende com o conteúdo do contrato
promessa.
Não se trata de nada contrário ao teor dos contratos, ao invés,
reconhece-se a impossibilidade de os cumprir, por parte dos
insolventes, dando aos promitentes compradores a possibilidade de os
habitarem, nas referidas condições.
Trata-se de uma tradição simbólica – que se basta com a entrega das
chaves – tal como decorre do AUJ de 20/03/14, a seguir melhor
referenciado.
Consequentemente, também, quanto a esta questão, improcede o
recurso.
E. Se os créditos resultantes de entregas por conta do preço e de
despesas com obras efectuadas nas fracções, não conferem aos
recorridos o direito de retenção a que se arrogam.
No que a tal respeita, aduz o recorrente que só é de conceder que
conferem o invocado direito, as quantias pagas a título de sinal (inicial)
e não as subsequentes, entregues por conta do preço ou com as obras
efectuadas pelos vários promitentes compradores.
Contrapõem, estes, que as despesas com as obras estão abrangidas pelo
disposto no artigo 754.º do Código Civil e se presume com carácter de
sinal toda a quantia entregue pelo promitente comprador ao promitente
vendedor, nos termos do disposto no artigo 441.º do mesmo Código.
No que se refere às obras efectuadas, como se refere na sentença
recorrida, trata-se de benfeitorias, necessárias e úteis (o que o
recorrente não contesta), insusceptíveis de serem levantadas.
Pelo que, são atendíveis, em conformidade com o disposto no artigo
754.º do Código Civil.
De igual modo, nos termos do disposto no seu artigo 441.º, se verifica a
aludida presunção de que se trata de sinal, relativamente a todas as
quantias entregues ao promitente-vendedor, pelo promitente-
comprador, quer a título de antecipação ou princípio de pagamento.
Assim, igualmente, quanto a esta questão, improcede o recurso.
F. Incompatibilidade entre o direito de retenção invocado pelos ora
recorridos e o direito de retenção de que é titular a N..., que lhe foi
reconhecido e graduado, por falta de impugnação, logo no
despacho saneador.

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No que a esta questão se refere, alega o recorrente que não tendo os


promitentes-compradores impugnado o direito de retenção a que se
arroga a “ N...”, que é incompatível com o direito a que aqueles
aspiram, não pode este ser reconhecido.
Contra-alegam estes, afirmando que foi o próprio recorrente que o
impugnou e que logo no despacho saneador se suscitou a questão da
incompatibilidade destes direitos, que seria decidida a final.
Também, de referir que, inicialmente, aquando da impugnação do
crédito da N..., o que o recorrente (cf. artigo 89.º - fl.s 29),
entendia/defendia era que este era incompatível com o direito de
retenção invocado pelos promitentes-compradores, relativamente às
fracções por cada um deles ocupadas e não o contrário.
Ainda de ter em linha de conta que no despacho saneador (cf. fl.s 644),
se consignou que no que concerne a esta eventual incompatibilidade, só
seria dirimida na decisão final, no que se referia ao crédito reclamado
(e impugnado pelo recorrente) pela N....
Ora, na sentença recorrida, quanto a este direito, refere-se o seguinte:
“Quanto ao crédito reclamado por “ N..., Lda.”
Dos factos provados resulta que a “ N..., Lda.” efectuou trabalhos de
electricidade nos prédios onde se situam as fracções apreendidas.
Todavia, a credora reclamante nunca esteve na posse dos imóveis onde
efectuou tais trabalhos. De resto, o direito de retenção que invoca seria
manifestamente incompatível com a posse que os credores reclamantes
supra referidos invocam sobre as fracções objecto dos contratos-
promessa dos quais resulta o seu crédito.
Assim, verifica-se que lista de créditos apresentada padece de um
manifesto erro ao reconhecer como crédito garantido por direito de
retenção o crédito daquela “ N..., Lda”, posteriormente transmitido
para o “ D..., S.A.” (cfr. Apenso F). Com efeito, a falta de impugnação
dos créditos reconhecidos na lista importa a homologação desta, salvo
caso de manifesto erro (art. 130º, nº3 do CIRE). Ora, no caso em
apreço, e no que diz respeito ao direito de retenção do crédito que
inicialmente era titular a “ N..., Lda.”, tal direito não pode incidir
sobre as fracções sobre as quais incide o direito de retenção dos
promitentes-compradores.
Assim, tal crédito será reconhecido como crédito comum.”
Contra o que, no fundo, se insurge o recorrente, com o fundamento em
que tendo sido apresentada a lista de credores, sem que haja sido
objecto de qualquer reclamação, designadamente, por parte dos ora
recorridos, não podia a mesma vir a ser posteriormente objecto de
impugnação, em conformidade com o disposto no artigo 130.º, n.º 1, do
CIRE.

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É pacífico que na lista de credores consta como reconhecido o direito


de retenção da N..., sobre a totalidade dos imóveis, como, de igual
modo, consta como reconhecido o mesmo direito, relativamente aos
recorridos, relativamente às fracções por estes prometidas comprar.
Ou seja, reconhecem-se direitos incompatíveis, quanto a estas fracções,
sendo certo que, como se refere na sentença recorrida e assim se
demonstrou, a N..., nunca esteve na posse das fracções ocupadas pelos
recorridos, pelo que o Sr. Administrador da Insolvência, não deveria ter
reconhecido o mesmo direito de retenção que reconheceu aos
recorridos, àquela, por referência às fracções por estes, ocupadas.
Na prática, reconheceu, simultaneamente, o direito de retenção à N...,
na qualidade de empreiteira e aos promitentes-compradores, quanto às
fracções prometidas comprar e que já ocupavam.
Tendo agido como agiu, isso, traduz-se numa duplicação do mesmo
direito, que só aos recorridos poderia ser reconhecido.
Ora, de acordo com o disposto no artigo130.º, n.º 1, do CIRE:
“Nos 10 dias seguintes ao termo fixado no n.º 1 do artigo anterior,
pode qualquer interessado impugnar a lista de credores reconhecidos
através de requerimento dirigido ao juiz, com fundamento na indevida
inclusão ou exclusão de créditos, ou na incorreção do montante ou da
qualificação dos créditos reconhecidos.”.
Ressalvando-se, porém, no seu n.º 3 que:
“Se não houver impugnações, é de imediato proferida sentença de
verificação e graduação de créditos, em que, salvo o caso de erro
manifesto, se homologa a lista de credores reconhecidos elaborada
pelo administrador da insolvência e se graduam os créditos em
atenção ao que conste dessa lista.”.
Daqui decorre pois que, em geral, o prazo para a impugnação da lista
de credores, deve ser feita no prazo de 10 dias contados do termo do
prazo fixado no artigo 129.º, n.º 1, do CIRE, podendo fundar-se na
indevida inclusão ou exclusão de um crédito ou incorrecções do
montante ou da qualificação do crédito reconhecido, do que resulta que
pode constituir fundamento para a impugnação ali prevista, o facto de
certo crédito constar da lista de créditos reconhecidos, quando devia
constar na dos não reconhecidos ou de ter sido excluído da lista dos
créditos reconhecidos, devendo dela constar.
Por outro lado, como resulta do n.º 3 do artigo 130.º do CIRE, não
havendo impugnações, é de, imediato, proferida sentença de
verificação e graduação de créditos, em consonância com a lista
apresentada pelo Administrador, resumindo-se, em tal caso, o papel do
Juiz a homologar a referida lista.
O que só assim não sucederá se o Juiz entender que se verifica um caso
de “erro manifesto”, caso em que o Juiz não deverá homologar a lista
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de credores que lhe foi apresentada.


Como referem Carvalho Fernandes e João Labareda, CIRE Anotado,
2.ª Edição, Quid Júris, Lisboa, 2013, a pág. 555:
“a inexistência de impugnações não constitui garantia significativa da
correcção das listas elaboradas pelo administrador da insolvência.
Este reparo deve ser entendido em função dos curtos prazos
concedidos pela lei, quer ao administrador da insolvência, para
elaborar as listas, quer aos interessados para as impugnar. Nota tanto
mais relevante quanto é certo serem, na grande maioria dos casos, em
número significativo os créditos reclamados e volumosos os
documentos que instruem as reclamações.
Por outro lado, impressiona, no que respeita às garantias, que a sua
constituição esteja normalmente dependente do preenchimento de
requisitos formais ad substantiam, cuja falta seja, afinal de contas,
puramente ignorada ou desconsiderada por mero efeito da falta de
impugnação.
Por isso, defendemos que deve interpretar-se em termos amplos o
conceito de erro manifesto, não podendo o juiz abster-se de verificar a
conformidade substancial e formal dos títulos dos créditos constantes
da lista que vai homologar para o que pode solicitar ao administrador
os elementos de que necessite.”.
O mesmo defende Mariana França Gouveia, Verificação do Passivo,
Revista Themis, Edição Especial, 2005, Novo Direito da Insolvência, a
pág. 156, que ali refere:
“No lugar paralelo da sentença de homologação, desistência ou
transacção (artigo 300.º do CPC), o juiz examina o objecto e a
qualidade das pessoas para apurar a validade do negócio. E a
sentença que profere é uma sentença de mérito, produzindo caso
julgado material. Não deve pois interpretar-se a norma do artigo 130º,
n.º 3 como uma oposição ao juiz, até porque ele é o autor da sentença.
Deve antes entender-se a regra como uma possibilidade de
simplificação processual à sua disposição.”.
Esta faculdade concedida ao juiz de não homologar “cegamente” a lista
que credores que lhe foi apresentada, radica nos poderes de fiscalização
que lhe são conferidos pelo disposto no artigo 58.º do CIRE, onde se
inclui o poder de fiscalizar se o Administrador da insolvência elaborou
a relação de créditos com observância de todas as determinações legais,
quer de ordem formal, quer substancial.
Apercebendo-se o Juiz de que existe erro manifesto na elaboração da
lista de credores por parte do Administrador, deve aquele determinar a
elaboração de nova lista, rectificada em conformidade e, em seguida,
dar às partes a oportunidade de se pronunciarem quanto a ela – cf.
Acórdãos do STJ, de 25/11/2008, Processo 08A3102 e de 30/09/2014,

www.dgsi.pt/jtrc.nsf/8fe0e606d8f56b22802576c0005637dc/25f1cf11ca34a3d6802581050039ea58?OpenDocument 87/92
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Processo 3045/12.4TBVLG-B.P1.S1, ambos disponíveis no respectivo


sítio do itij.
Ora, no caso em apreço, verifica-se, como antes já referido, que ao
elaborar a lista de credores, no que respeita à reclamante N..., não lhe
deveria ter sido reconhecido o direito de retenção, relativamente às
fracções ocupadas pelos ora recorridos, mas foi.
Estamos, assim, em face da inclusão de um crédito, parcialmente
indevido, hipótese prevista na 2.ª parte do n.º 1 do artigo 130.º do
CIRE, como fundamento da impugnação da lista de credores elaborada
pelo Administrador.
A inclusão do crédito em causa, na perspectiva de que o direito de
retenção da N... abarca as fracções ocupadas pelos recorridos traduz-se
em “erro manifesto”, pois que, face ao exposto, a sua relacionação
deveria excluir estas fracções. Erro a que incumbia por termo,
determinando-se a sua correcta relacionação, como, de resto, já se
aflorara no despacho saneador, como acima já mencionado.
Assim, face ao exposto, quanto a esta questão, improcede o presente
recurso.
G. Se não pode ser reconhecido o direito de retenção, quanto às
verbas 3, 5, 8 e 9, por os respectivos promitentes compradores não
poderem ser considerados como consumidores.
Relativamente a esta questão, alega o recorrente que os promitentes
compradores G...e mulher e L.. e mulher, não beneficiam do direito de
retenção, com o fundamento em que os mesmos não usam as fracções
para habitação própria, arrendando-as.
Os credores ora identificados, tal como os demais e como resulta do já
anteriormente exposto, radicam a reclamação do seu crédito no facto de
terem outorgado contratos promessa versando sobre as fracções
autónomas acima identificadas, de que já têm a posse, pelo que
invocam o direito de retenção sobre as referidas fracções, ao abrigo do
disposto no artigo 755.º, n.º 1, al. f), do Código Civil.
Na sentença recorrida, com base no AUJ, n.º 4/2014, de 13 de Março
de 2014, in DR, I.ª Série, n.º 95, de 19 de Maio e porque se consideram
os mesmos como consumidores, foi-lhes (a todos) reconhecido o
invocado direito de retenção.
No AUJ acima referido uniformizou-se a jurisprudência no sentido de
que:
“No âmbito da graduação de créditos em insolvência o consumidor
promitente-comprador em contrato, ainda que com eficácia meramente
obrigacional com traditio, devidamente sinalizado, que não obteve o
cumprimento do negócio por parte do administrador da insolvência,
goza do direito de retenção nos termos do estatuído no artigo 755º n.º 1
alínea f) do Código Civil.”.
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No entanto, não se colhe deste AUJ o que se entende por consumidor,


pelo que a respectiva definição terá de se buscar na designada Lei de
Defesa do Consumidor – Lei 24/96, de 31 de Julho, que já vai na 6.ª
versão, sendo a última a que lhe foi introduzida pela Lei n.º 47/2014, de
28/07 – de acordo com a qual, cf. seu artigo 2.º, n.º 1:
“Considera-se consumidor todo aquele a quem sejam fornecidos bens,
prestados serviços ou transmitidos quaisquer direitos, destinados a uso
não profissional, por pessoa que exerça com carácter profissional uma
actividade económica que vise a obtenção de benefícios.”.
Como refere J. Calvão da Silva, in Venda de Bens de Consumo,
Comentário, Almedina, Maio de 2003, a pág. 44, consagra-se neste
preceito uma noção de consumidor em sentido estrito – pessoa que
adquire um bem ou um serviço para uso privado, pessoal, familiar ou
doméstico, de modo a satisfazer as necessidades pessoais e familiares,
mas já não aquele que obtém ou utiliza bens e serviços para satisfação
das necessidades da sua profissão ou empresa, acrescentando que todo
aquele que adquira bens ou serviços destinados a uso não profissional
deverá ser tido como consumidor.
Esta noção restrita de consumidor veio a ser a acolhida, entre outros, no
Acórdão do STJ, de 25/11/2004, Processo 7617/11.6TBBRG-C.G1.S1,
disponível no mesmo sítio dos anteriores, em que se coloca a tónica na
aquisição de um bem ou serviço para uso privado, de modo a satisfazer
as necessidades pessoais e familiares, por contraponto à aquisição de
bens ou serviços para satisfação de necessidades da sua profissão ou
empresa.
O facto de, eventualmente, as fracções serem arrendadas leva a que os
seus proprietários sejam considerados como não consumidores para os
fins em referência?
Em nossa opinião tal não afasta que devam ser considerados como
consumidores, atento o acima exposto.
Efectivamente, a aquisição das ditas fracções, como referido, não
constitui a satisfação de necessidades profissionais ou de uma empresa,
caindo a situação sub judice no âmbito da “economia familiar”, mais
não traduzindo do que uma forma de investimento.
Presumivelmente, as fracções em causa foram adquiridas com capitais
provenientes de poupanças e posteriormente os recorridos destinaram-
nas ao arrendamento, em face do que, somos em crer que não se
suscitam dúvidas de que se trata de consumidores, para os efeitos em
referência.
Como refere F. Gravato Morais, in Cadernos de Direito Privado, n.º 46
Abril/Junho de 2014, a pág. 53, deve considerar-se uma protecção mais
abrangente do que a que se reduz ao retentor-habitacional.
Por tudo isto, devem os credores G... e mulher e L.. e mulher ser
considerados, como o foram na sentença recorrida, consumidores, nos
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termos e para os efeitos ora tidos em vista.


Assim, igualmente, neste segmento é a decisão recorrida de manter,
improcedendo o recurso, quanto a esta questão.
Nestes termos se decide:
Julgar parcialmente procedente o presente recurso, em função do que se
revoga a sentença recorrida, relativamente à graduação dos créditos
respeitantes à verba n.º 1, passando a ser a seguinte a redacção da
alínea A), da parte decisória da sentença):
A) Relativamente ao produto da venda sobre o imóvel descrito na
verba nº1 (imóvel descrito na CRP de Lamego sob o
nº569/19930924 da freguesia da Sé):
1º - Crédito da Fazenda Nacional por IMI relativa a este imóvel.
2.º - Crédito reclamado pelo D..., SA até ao limite constante do
registo através da apresentação 17 de 2002/08/14.
3º - Crédito reclamado por “ X..., S.A.” até ao limite constante do
registo através da apresentação 6 de 2004/03/18.
3º - Todos os restantes créditos comuns a par e em rateio;
Mantendo-a, quanto, a tudo o mais nela, decidido.
As custas do presente recurso são a suportar pelo recorrente, na
proporção de 9/10 (nove décimos).
Coimbra, 04 de Abril de 2017.
Relator:
Arlindo Oliveira
Adjuntos:
1º - Emidio Francisco Santos
2º - Catarina Gonçalves
[1] A dificuldade – como refere o Prof. Castro Mendes, in Limites
Objectivos do Caso Julgado em Processo Civil, pág. 121 e ss. – está
“em estabelecer a distinção em bases científicas sem empurrar a
questão para uma casuísmo necessariamente arbitrário”.
[2] Efectivamente, a concepção/sistema restrito (da sentença só ter
força de caso julgado na parte decisiva e não nos fundamentos) leva a
conclusões duvidosas e em última análise insatisfatórias (como resulta
dos inúmeros exemplos citados por Castro Mendes, obra citada, pág.
143).
[3] Como observou – há mais de 50 anos, mas com inteira actualidade
– o Prof. Castro Mendes (obra citada, pág. 133) – mesmo aqueles (Dias
Ferreira) que diziam que “a sentença só tem força de caso julgado na
parte decisiva e não nos motivos, considerandos ou enunciações”, não
deixavam de acrescentar “excepto quando os considerandos estejam
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relacionados com a decisão por forma que com ela formem um todo
indivisível”. Do mesmo modo a jurisprudência que “aceita a regra
segundo a qual o caso julgado não se alarga aos fundamentos da
decisão”, logo acrescentado “que o CPC admite a decisão implícita,
como consequência necessária do julgamento expressamente proferido
e já transitado, constituindo problema de interpretação da sentença
saber se nela há um fundamento implícito”.
[4] Seguimos de perto Miguel Teixeira de Sousa, Estudos sobre o Novo
Processo Civil, pág. 578.
[5] Miguel Teixeira de Sousa, Estudos sobre o Novo Processo Civil,
pág. 579/80.
[6] O Prof. Antunes Varela – Manual de Processo, 1.ª ed., pág. 693 e ss.
– parece ser um pouco mais restritivo, na medida em que apenas diz
que “é a resposta dada na sentença à pretensão do A., delimitada em
função da causa de pedir, que a lei pretende que seja respeitada
através da força e autoridade do caso julgado”; e que “a força do caso
julgado não se estende, por conseguinte, aos fundamentos da sentença,
que no corpo desta se situam entre o relatório e a decisão final”;
porém, mais à frente não deixa de reconhecer que “reveste o maior
interesse, para a delimitação do caso julgado, a fixação do sentido e,
sobretudo, do alcance dessa resposta contida na decisão final”; e que
“é ponto assente na doutrina que os fundamentos da sentença podem e
devem ser utilizados para fixar o sentido e alcance da decisão contida
na parte final da sentença, coberta pelo caso julgado”
[7] O que, aliás, é de certo modo corroborado pelo art. 498.º do VCPC=
art. 581.º do NCPC, ao colocar os dois requisitos da identidade
objectiva – pedido e causa de pedir – precisamente no mesmo plano;
sem qualquer diferença de projecção e alcance.
[8] Miguel Teixeira de Sousa, obra citada, em que ilustra o referido
com os seguintes exemplos: Se o R. é condenado, como devedor, a
cumprir uma prestação ao A., aquele não pode demandar este último
pedindo a restituição, com base no enriquecimento sem causa, da
quantia paga; se o R. é condenado a entregar uma coisa ao A., aquele
não pode instaurar uma acção pedindo a restituição da mesma coisa.
[9] A sentença condenatória corresponde à situação existente no
momento do encerramento da discussão nos termos do art. 663.º/1 do
CPC.
[10] Miguel Teixeira de Sousa, obra citada, pág. 585/6.
[11] E a indiscutibilidade não pode ser posta em causa invocando
argumentos, factos ou razões que o efeito preclusivo cobriu. - Prof.
Castro Mendes, obra citada, pág. 186.
[12] A excepção do caso julgado encerra a vertente negativa, em ordem
a evitar a repetição de acções; a autoridade do caso julgado traduz a
vertente positiva, no sentido de imposição externa da decisão tomada.

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[13] Se a exigisse não faria diferença com a excepção de caso julgado.


[14] Prof. Antunes Varela, Manual de Processo, 1.ª ed., pág. 706.
[15] Lebre de Freitas, CPC, Vol. 2.º, anotação ao então art. 674.º, pág.
685.
[16] Lebre de Freitas, local citado.
[17] Local citado, pág. 708.
[18] Baptista Machado, Resolução por Incumprimento, in Homenagem
ao Prof. Teixeira Ribeiro, págs. 381 a 385).

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