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O ANO DE ESCOLARIDADE
GRUPO I
Para responderes aos quatro itens que se seguem, ouve atentamente o áudio.
1. Para cada item (1.1 a 1.4), seleciona a opção que completa a frase, de acordo com o
sentido do texto. Escreve o número do item e a letra que identifica a opção escolhida.
Texto A
O Lírio do Monte
Perto dos 15 anos apossou-se de mim uma loucura branda e desatei a fazer versos campestres
de louvor às avenas que nunca tinha ouvido, à Natureza que nunca tinha visto e à Paisagem quase
unicamente desvendada em sonhos.
Aos 17 anos, imberbe e cândido, possuía na gaveta toda a Natureza metrificada e escrita num
caderno a que pus este título de sabor botânico: Lírios do Monte. E – zuncha! – graças à baba
colaborante da família, dentro em breve o livro amarelecia nas montras com uma capa de Stuart e
algumas críticas levianas nos jornais cúmplices.
Eram duzentas páginas inspiradas no Parque Eduardo VII – única natureza selvática de Lisboa
–, onde aparecia, várias vezes, a palavra «bonina» (flor que nunca vi) a rimar com «colina», além
de outras plantas, utensílios e fenómenos bucólicos do meu mais absoluto desconhecimento.
O mais grave, porém, não sabem os senhores… Anos depois da publicação auspiciosa de Lírios
do Monte, parti com um amigo em peregrinação de estudo para o campo.
Já então resolvera banir dos meus hábitos esse vício tão estruturalmente português de falar
de cor das coisas e dos animais. E, para combater a ignorância, saía com frequência de Lisboa,
enérgico e decidido a aprender experimentalmente o aspeto das árvores, o feitio dos pedregulhos
e a configuração dos bichos.
O meu companheiro (agora professor de liceu) servia-me de cicerone e ensinava-me, como
podia e sabia, toda a sua ciência anedótica do sábio principiante.
– Olha: aqui tens os abrolhos. Já os conhecias?
– Não – respondia eu, em êxtase de ignorância lírica. – Só sabia que «abrolhos» rimava com
«olhos». E as boninas? As que rimam com colinas? Onde estão?
E assim, desta maneira, diligenciava dar conteúdo objetivo a certos sons irreais que existiam
dentro de mim.
Um dia encontrámos num vale uma flor entranhadamente roxa.
– Que é? – perguntei curioso. – Nunca vi esta flor!
– Nem eu – respondeu o meu companheiro de explorações ligeiramente vexado.
E durante alguns minutos deu voltas e mais voltas à flor, a matutar na solução do problema.
Talvez fosse isto, talvez fosse aquilo. Quem sabe se não seria outra coisa qualquer?
Ao cabo, a disfarçar a ignorância, meteu o mistério na algibeira, resolvido a classificar a flor
em casa.
Passados dias (meu Deus, que vergonha!) entra-me o meu amigo pelo quarto a gritar:
– Sabes que flor é?
– Não.
– Não fazes ideia, pá?
– Não.
– Faz um esforço!
– Não.
– Pois ouve e não desmaies: é um Lírio do Monte!
José Gomes Ferreira, O Mundo dos outros, Lisboa Publicações D. Quixote, 1990
1.4 «([…] meu Deus, que vergonha!)» Esta expressão surge entre parênteses porque
A. faz referência a uma entidade religiosa.
B. pretende realçar o sentimento do narrador.
C. se trata de uma frase intercalada no discurso.
D. se trata de uma frase irónica.
Texto B
O meu avô
Quando o Sol entrava, pela manhã, pelas três janelas da sala de visitas, as paredes muito
claras e alegres encantavam-me. Aconchegava-me no cadeirão fofo, deixava-me estar assim,
durante uns momentos, imóvel, para depois pegar num dos álbuns pesados sobre a mesinha
coberta com uma toalha de rendas. Achava-os maravilhosos, os álbuns, com as suas capas de
marfim e as letras floreadas que diziam, segundo o avô me explicava: «Álbum». Num havia as
fotografias das pessoas de família, que, com poucas exceções, se apoiavam numa mesa oval e
sorriam cordialmente. Usavam trajos de corte antiquado e chapéus que faziam lembrar
fantochadas de Carnaval. Logo na primeira folha o retrato da bisavó Katarina mãe do avô.
– Lindo nome, Katarina, dizia o avô. Queria que fosses também Katarina, mas a tua mãe tem
preferência pelos nomes que estão na moda.
Eu tinha um nome que estava na moda, o que me agradava.
Mas o avô, teimosamente, chamava-me com frequência Katarina e eu, talvez por
compreender o que havia nisso de intimidade entre nós os dois, gostava.
Ao virar as folhas de cartolina detinha-me sempre na fotografia da minha mãe. Era bonita,
a minha mãe: a testa alta, os olhos grandes, a trança a contornar-lhe a cabeça como uma coroa e
uma blusa de gola engomada com a rendilha a tocar-lhe nas orelhas, o que lhe realçava o pescoço
alto. Embora eu estranhasse não viver com ela e com o meu pai, como os meus irmãos, isso não
chegava a entristecer-me. Tinha o meu avô.
Na sala de estar, ao mesmo tempo, de jantar, havia um sofá de pelúcia vermelha, por detrás
da mesa. Não era comparável ao da sala de visitas, não só por não ser azul celeste, mas também
por estar em vários sítios puído e desbotado. Nele os avós se sentavam lado a lado, e não havia
refeição em que não me saltasse à vista como era baixa a avó e alto o avô. Eu empoleirava-me
numa cadeira, elevada por duas almofadas. Depois da refeição terminada, o avô punha um
barretinho na cabeça e rezava, as mãos no colo, uma em cima da outra… Em seguida, tirava-me
da cadeira, aconchegava-me entre os joelhos e pousava-me a mão direita sobre a cabeça. Era
assim, que me abençoava dia após dia, e sempre com a mesma calma, a mesma solenidade, o
mesmo amor.
Embora o costume da avó fosse ter pressa e não se deixar um momento desocupada, nunca
se levantava antes de o avô me ter abençoado. Só então corria de cá para lá e de lá para cá: levava
a louça para a cozinha, sacudia a toalha de linho, dobrava-a com cuidado, cobria a mesa com a
toalha de gobelim, para, finalmente, se meter na cozinha a lavar a louça. Era o momento propício
para eu e o avô nos divertirmos. Como um gatinho aninhava-me no seu colo, e ele afagava-me
chamando-me «querida» e «meu amor». Aliados, unha com carne, tínhamos a avó como inimigo
comum. Gatinhávamos no chão, brincávamos aos cavalinhos, fazendo o avô, já se vê de cavalo e
eu de cavaleiro. Se a avó voltava inesperadamente e nos apanhava em flagrante, desmanchava o
nosso prazer, porquê o avô tinha de ouvir coisas feias como: «Devias ter vergonha, Markus!
Desperdiças o tempo do senhor. E ainda por cima amimalhas a menina. Que há de ser um dia da
pobre criaturinha?»
A «pobre criaturinha» ficava sentada no chão, perplexa e triste, enquanto o avô se erguia,
devagar, e se sentava na cadeira de espaldar para abrir o jornal.
Por vezes chegava a perguntar-lhe se a avó fora alguma vez criança como eu ou se tivera
sempre o tamanho e o juízo que lhe conhecia.
1. O que sugere o título do texto, relativamente à presença do narrador? Justifica com uma frase
retirada do texto.
3. Explica por que motivos Rose tem preferência por um dos avós.
6. Caracteriza e identifica a personagem referida com algum destaque no texto, que, no entanto,
não participa na ação.
7. «Era bonita, a minha mãe: a testa alta, os olhos grandes, a trança a contornar-lhe a cabeça como
uma coroa.» A figura de estilo que está presente na frase transcrita designa-se
A. metáfora.
B. comparação.
C. hipérbole.
D. aliteração.
GRUPO III
1. Identifica a classe das palavras sublinhadas na frase: «Embora o costume da avó fosse ter pressa
e não se deixar um momento desocupada, nunca se levantava antes de o avô me ter abençoado.»
GRUPO IV
Elabora uma narrativa em que recordes alguém especial da tua infância. Inclui o retrato dessa
pessoa, atitudes especiais, episódios que reflitam a tua admiração, o teu carinho, a vossa amizade
e a vossa cumplicidade.
O teu texto deve ter um mínimo de 150 e um máximo de 240 palavras, deve incluir a descrição de
um espaço e deve ter um título adequado.