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(PDF) MORTE E LUTO NO CIBERESPAÇO | Nuricel Villalonga Aguilera - Academia.edu
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Esta visão da Internet como um “ciberespaço”, um espaço à parte do “mundo real” em que
desconhecidos de vários lugares do mundo se conhecem e formam novas comunidades, e onde
habitados por uma minoria, e usado com freqüência por um grupo ainda menor – hoje, nos parece
a Internet se tornou um espaço majoritário, vários serviços para o dia‐ a‐ dia no “mundo real”
migraram para ou nasceram no mundo virtual, e, longe de representar um desligamento do local e
da identidade no mundo presencial, o virtual funciona, cada vez mais, como uma extensão da vida
pesquisa nos anos 90. O Myspace, por outro lado, é basicamente uma novidade: os Serviços de
Redes Sociais (SRS), que constroem redes públicas ou semi públicas
‐ a partir de um mapeamento
das amizades de seus usuários, surgiram, para efeitos práticos, nesta década, em que rapidamente
E ao contrário do mundo de amizades virtuais dos tempos do ciberespaço, os SRS servem
primariamente para comunicação entre pessoas que já se conhecem presencialmente e o
Ellison, a partir de um estudo que concluiu que 91% dos adolescentes americanos usa SRS para
[1]
conversar com pessoas que já se conhecem ; segundo estas autoras, são poucos os jovens que
[2]
procuramnovas amizadescom completosdesconhecidosnestessistemas.Choi , investigando
o
SRS Cyworld na Coréia do Sul, chegou em uma cifra próxima: 85%. Em um estudo da Ofcom sobre o
uso de SRS's por adolescentes, por volta de dois terços dos entrevistados responderam que usa tais
contato, 35% conversavam com amigos de amigos (conservando, assim, a localidade da rede social
[3]
e sua ligação com o “mundo real”), e apenas 17% disseram que conversam com estranhos. . O
levantamento da Pew Internet com a mesma demografia concluiu que 49% dos adolescentes
faziam novos amigos pela Internet – sem que a pergunta especificasse, contudo, se estes novos
amigos já estavam em sua rede social estendida ou se eram desconhecidos de regiões distantes.
O anonimato, também, se perde na era dos SRS's . Novamente segundo a Pew, 82% dos
adolescentes americanos usa seu nome real em SRS's
, e 79% inclui fotos em seus perfis (ainda
assim, apenas 5% divulgam seus nomes completos, endereços e fotos pessoais para todos; a
[4]
maioria que compartilhaestasinformaçõesas mantém visíveisapenas para amigos). Segundo
Boyd
e Danah, os SRS's
servem hoje como espaços privados e protegidos em que os jovens se
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usuários a construir um perfil – uma descrição textual, em vários campos, de si mesmos – que não
difere fundamentalmente dos mecanismos de construção da persona virtual de quinze anos atrás.
Segundo o levantamento da Ofcom, 55% dos adolescentes coloca alguma informação falsa em seus
seus perfis são basicamente falsos. Estas identidades falsas, segundo a Ofcom , são “extensões
exageradas de suas personalidades off ‐ line”; os SRS's permitem a alguns usuários “retratar uma
adoção de personas e a dúvida sobre os demais usuários eram ostensivas e constantes, nos tempos
dos softwares de redes sociais estes fenômenos são bem mais tênues; a tendência geral é tomar o
Uma nota que precisa ser feita para a compreensão de alguns dos itens a seguir é sobre o uso
das ferramentas de recados (também: “scraps ”; no Myspace conhecidos por “comentários”.
Vamos, por simplicidade, adotar “recados”, aqui independente do SRS em questão) pelo segmento
mais jovem dos usuários.Estasferramentassão usadas para conversae funcionam, para fins
práticos, como mensagens em aberto, que ficam visíveis no perfil do receptor – ao menos até que
este decida apagá‐ los. Segundo levantamento da Pew, 84% dos adolescentes que usam o Myspace
[5]
já usaram recados , e Boyd e Hanah chegam a descrevêlos como “uma forma de moeda
‐
cultural.” A troca de recados, para estes autores, é coletivamente esperada e serve para solidificar
o grupo.
Estes dados se referem essencialmente ao público americano – citamos apenas um contra ‐
exemplo, sobre a Coréia do Sul. Pesquisas desta natureza no Brasil, ao nosso saber, ainda não
foramrealizadas.Estasestimativasnão se traduziriam
precisamentepara o caso brasileiro,
é certo;
mas é muito difícil imaginar que as tendências gerais aqui apontadas também não se aplicariam –
o gosto do brasileiro por SRS's, diga‐ se, é notório, e sua penetração, principalmente pela rede
Orkut , é reconhecidapor quase todos. Mas não falamosaqui somente destessistemas,mas da
nova forma de utilização e caracterização de si próprios que os softwares sociais trazem.
Independente de estarmos usando um programa de mensagem instantânea, um MMORPG ou uma
anterior, o modelo do MUD estendeu ‐ se como paradigma para pensar as relações humanas na
Internet.
A internet transformou ‐ se numa expansão do espaço “offline” e questões concernentes à vida
e morte materiais, migraram para dentro do mundo online em busca de resignificações e com
Diversos autores têm notado consideráveis semelhanças entre muitos dos temas do imaginário
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místico. No entanto, a construção da Internet não previu essas questões, bem como a morte de
seus usuários. A web está a tempo bastante no ar para que muitos dos que surfaram suas ondas já
utilizações inusitadas por parte daqueles que vivenciam esses espaços, acrescentando elementos à
uma “antropologia online”, uma “semiose da net”. E as soluções perpetradas, estão associadas ao
Resta‐ nos estimar os contornos da nova experiência subjetiva a partir de diferenças com o que já
existiu, ou seja, pensar na experiência fundamental da subjetividade, a morte, e “como as novas
tecnologias podem estar transformando nossa percepção e nossas estratégias afetivas em lidar
com a morte do outro” (Paulo Vaz), a partir do estudo das representações da morte na
cibercultura.
Temos o século XXI assistindo a expressões de luto, que transbordam do real para os espaços
virtuais, tentando ajustar seus rituais mortuários do mundo offline para o online. Os ritos fúnebres,
da angústia que a consciência da finitude humana gera. Rituais emprestam formas convencionais
para organizar certos aspectos da vida social celebrando nossa solidariedade, partilhando
socializaram em práticas fúnebres, uma série de cerimônias, incluindo aí o funeral, no qual a
sociedade oficializa e ritualiza a despedida do falecido. As estratégias de enfrentamento da
angústiaque a consciênciada sua finitudetem provocadono serhumano ao longo dos tempos tal
que, para quem fica, via de regra, o aceitamento da morte é um processo penoso (especialmente
Por um longo período, no entanto, “a morte foi acompanhada por sentimento de
[7]
familiaridade, resignação passiva e esperança mística” . Uma entrega ao Destino estabelecida
numa cerimônia pública, com ritos fixados pelos costumes e tão importantes quanto o funeral ou o
luto. Com o século XIX despontou a morte romântica considerada bela, sublime repouso,
eternidade e possibilidade de uma reunião com o ser amado e de reencontro com entes queridos
(Airès, 1975). Também nesse período reforçaram ‐ se os elementos de uma crença de “vida além‐
transmissão de mensagens pela imaterialidade das ondas eletromagnéticas do telégrafo teria
de metáforas suscitadas pelo telégrafo. Allan Kardec e Flammarion, na França (1854) e a Society for
Physical Research(1882),nos EstadosUnidos,estimulamestudossobrea mortee os fenômenos
sobrenaturais (Kovács, 2002). Como coloca Ericson Saint Clair, a velocidade na transmissão de
informações, imaterialidade das mensagens, era de utopias, tecnologia relacionando morte,
também teriam circundado o imaginário cultural dos fins do século XIX com o advento do telégrafo
[10]
elétrico.
Segundo Airès,
dos séculos
XII
ao XIX,
ocorre
gestação
das bases
do que viria
a ser
a civilização
5
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Os recados de luto dirigem‐ se à pessoa do falecido, como se conversassem com ele;
Ainda mais curioso, não há mudança de registro nestes recados póstumos, escritos na mesma
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