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DOSTOIÉVSKI E O

PAPEL DO FLÂNEUR
EM VIVENCIAR A
CIDADE

FERNANDA LIMA
ORIENTADOR: PEDRO PAULO PALAZZO
RESUMO
Por meio da leitura de São Pe-
tersburgo em Dostoiévski,
visa-se a resgatar o conceito de
flâneur, tipo citadino que foi
inserido no meio acadêmico por
Walter Benjamin. O flâneur é o
elemento necessário para em-
basar essa união entre arquitetu-
ra e literatura, visto que essa
personagem, tão abordada na
literatura do século XIX, vivencia
a cidade de maneira intensa,
deixando-se contaminar por
todos os seus aspectos. O
flâneur está presente nas obras
de Dostoiévski, em personagens
como Ordinóv, de A Senhoria, e
o Sonhador, de Noites Brancas,
e por meio destas pretende- se
transportar o universo literário
para o real, mesclando a literatu-
ra de Dostoiévski com a minha
própria vivência na cidade de
São Petersburgo.
INTRO
Falar sobre a relação entre Dostoiévski e São Petersbur-
go é entender o quanto que a cidade influenciou na poética
do escritor. A estreita congruência entre o urbanismo e a
arquitetura dessa cidade são como personagens materializa-
das dentro dos livros dostoiévskianos, tão importante quanto
seus heróis russos e até influenciadora das tramas que os
mesmos sofrem. O autor cria um universo entre cidade e per-
sonagem que exemplifica com destreza a influência que a
arquitetura e o urbanismo exercem no enredo, permitindo o
leitor adentrar com facilidade e até criar afeto perante os de-
safios psicológicos que as personagens vivenciam.
O objetivo geral deste ensaio é traçar conexões entre a
literatura de Dostoiévski, utilizando-se aqui do livro A Senho-
ria, escrito em 1847, e Noites Brancas, escrito em 1848, com
a arquitetura e o urbanismo de São Petersburgo. Dito isso,
pretende-se utilizar a personagem Vassíli Ordinóv e O Sonha-
dor, que perambulam como flâneurs, como principal foco na
questão de se vivenciar a cidade. Essas personagens serão,
neste trabalho, o elo entre literatura e arquitetura e urbanismo.
Ao passo que os objetivos específicos do trabalho estão foca-
dos em se traçar um paralelo entre as personagens e a minha
vivência da cidade de São Petersburgo, mesclando as
minhas próprias experiências com as que as personagens
vivenciam na novela.
Justifica-se a escolha desse objeto de estudo por meio
de relacionar um autor tão célebre quanto Dostoiévski com
arquitetura e urbanismo, visto que esse tema carece de refer-
encias e é importante para unir literatura com o curso de
arquitetura. Por meio desse tema, viso resgatar o conceito de
flâneur, termo cunhado por Benjamin, mas que já estava pre-
sente na literatura de Charles Baudelaire. O flâneur seria o
elemento necessário para embasar essa união, visto que essa
personagem, tão abordada na literatura do século XIX, viven-
cia a cidade de maneira intensa, deixando-se contaminar por
todos os seus aspectos. Aliar as personagens de Ordinóv, de
A Senhoria e O Sonhador, de Noites Brancas com o próprio
Dostoiévski e a minha visão da cidade, é transportar o univer-
so literário para o real, algo que merece notoriedade no meio
acadêmico.
Para alcançar os objetivos propostos nesse ensaio desen-
volveu-se uma abordagem bibliográfica referente à literatura de
Dostoiévski e ao termo fisiológico do flâneur e seu papel em
vivenciar a cidade.
O primeiro passo foi analisar a obra de Mikhail Bakhtin,
especialmente seu livro Problemas da poética de Dostoiévski,
em que o autor discorre sobre a literatura de Dostoiévski e
suas particularidades. Nessa obra, Bakhtin formula o conceito
de romance polifônico e o aplica na poética de Dostoiévski.
“Pode-se até dizer que Dostoiévski criou uma espécie de novo
modelo artístico do mundo, no qual muitos momentos basilares
da velha forma artística sofreram transformação radical” (Bak-
thin, 2013, p. 1).
Bakthin nos revela que os heróis da literatura de
Dostoiévski não são meros objetos de domínio do autor, mas
têm sua própria personalidade, sua independência. O que o
torna importante para analisar neste ensaio, visto que o autor
trata Dostoiévski como um artista singular e não um mero escri-
tor. Ele consegue imergir na obra de Dostoiévski e apresentar
suas singularidades, que elevam o patamar de sua literatura.
Para melhor entender a obra de Bakhtin irei me basear no
artigo Diálogo inconcluso: Os conceitos de dialogismo e polifo-
nia na obra de Mikhail Bakhtin, escrito por Patrícia Marcuzzo
em 2008. Nessa obra a autora explica certos conceitos utiliza-
dos na obra de Bakhtin, como o monologismo e o dialogismo,
sendo o último característica dos romances de Dostoiévski. De
acordo com Marcuzzo, “o monologismo se refere ao discurso
único, definitivo e uniforme.” (Marcuzzo, 2008, p. 4). Nos
romances monológicos está presente uma única voz au-
toritária, a voz do próprio autor, e as personagens não possuem
vozes diferenciadas. Bakhtin analisa o dialogismo a partir das
obras de Dostoiévski, em que o autor não é autoritário, mas sim
mero espectador das tramas que envolvem as personagens.
Marcuzzo cita que nos romances do autor russo existem em-
bates de muitas vozes sociais, que exemplificam o dialogismo
descrito por Bakthin.
Outra bibliografia adotada no embasamento deste trabalho, mais
precisamente tratando de uma das obras do autor, é a tese de
doutorado de Maria de Fátima Bianchi, O “Sonhador” de A Senho-
ria, de Dostoiévski: um “homem supérfluo”, escrita em 2006. Essa
tese foi analisada em conjunto com a própria obra A Senhoria, de
autoria de Dostoiévski. Trata-se de duas obras que se comple-
mentam, visto que Bianchi traduziu diretamente do russo a novela.
Partindo agora do paralelo proposto entre realidade e
ficção, optou-se por analisar algumas das obras de Dostoiévski
com a minha visão da cidade. Ao analisar minha experiência em
conjunto com suas obras, pude adentrar-me melhor na visão em
que o autor propunha, tornando-me uma flâneuse que investiga a
cidade de maneira despretenciosa, porém intensa. O que permitiu
também pesquisar a influência da vida do autor em suas outras
personagens. Para isso adotou-se o livro Dostoievsky - His life and
work, escrito por Konstantin Mochulsky, na década de 1940, em
paralelo com o trabalho de Giuliana Almeida, Pelo Prisma Biográfi-
co: Joseph Frank e Dostoiévski, escrito em 2013. Ambos os tra-
balhos nos fornecem uma visão biográfica do autor em paralelo
com sua obra, o que enriquece a pesquisa que este trabalho se
propõe a fazer.
Para entender melhor o termo e o tipo fisiológico do
flâneur, optou-se por revisar os ensaios que Walter Benjamin
desenvolve a respeito da obra de Charles Baudelaire. Nesses tra-
balhos, Benjamin aponta várias características do flâneur, esse
observador do espaço urbano. Acredito que o flâneur é o elo entre
arquitetura e literatura e exemplificar tal tipo com algumas de suas
personagens, o próprio Dostoiévski e minha visão é unir o universo
ficcional com o real, para assim poder compreender melhor esse
tipo fisiológico e sua relação com o espaço urbano e arquitetônico.
Após a abordagem bibliográfica se desenvolveram
alguns desenhos de minha autoria sobre a minha estadia na
cidade de São Petersburgo, uma forma de me conectar com a
cidade e também me tornar um flâneur, para assim entender
melhor o universo que Dostoiévski pretendia abordar.
SUMÁRIO

Resumo ..... P. 3

Introdução ..... P. 4

Capítulo 1 - Dostoiévski e sua relação


com São Petersburgo ..... P. 8

Capítulo 2 - O flâneur e algumas de


suas características ..... P. 14

Capítulo 3 - Excertos de obras de


Dostoiévski sobre o flâneur em São
Petersburgo ..... P. 19

Capítulo 4 - A minha visão de São Pe-


tersburgo ..... P. 25

Considerações finais .... P. 35

Referências bibliográficas ... P. 36


CAPÍTULO 1
Dostoiévski e sua relação com São Petersburgo
Fyodor Mikhailovitch Dostoiévski, nascido em Moscou em 30
de Outubro de 1821, e morto em São Petersburgo, em 1881, foi
um escritor permeado por desventuras, muitas das quais foram
cerne para a construção de algumas de suas personagens. O
autor não somente descrevia a cidade mas também esmiuçava
o tipo fisiológico que habitava a cidade, como cita no conto
“Como é perigoso…Entregar-se a sonhos de vaidade”: “A
escada de serviço desempenha um papel importante na vida
do criado petersburguês; nela ele passa as melhores horas de
sua vida, as horas em que sua audição temerosa não fica tensa
o tempo todo” (Dostoiévski, 2017, p. 31 e 32). Dostoiévski es-
creveu sobre os petersburgueses como se os conhecesse, e
retratou a cidade em que vivia com o olhar de um verdadeiro
artista, entregando-se de corpo e alma em sua obra.
Dostoiévski foi um homem de profundas tragédias.
Sua vida era permeada por enfrentamentos que foram inspi-
rações para moldar o caráter de seus heróis, tornando-o, se-
gundo Giuliana Almeida, um homem “Hiperbiografável” (Almei-
da, 2013, p. 41). É importante adentrar na biografia do autor
para entender de maneira mais precisa a sua obra. Sua família
era Ortodoxa, algo que influenciou profundamente o autor, que
mais tarde abordaria a dualidade da religião e do misticismo
como temática constante em seus romances, como bem es-
creve Konstantin Mochulsky, em sua obra Dostoievsky - His life
and work, publicada na década de 1940: “Este homem que foi
responsável pela mais brilhante argumentação já escrita em
defesa do ateísmo, este homem que ‘durante toda a sua vida,
Deus atormentou’ combinou dentro de seu coração a mais
ardente fé com a maior descrença. Toda a dialética religiosa
de seus romances deriva dessa trágica dualidade” (Mo-
chulsky, 1967, p.120 Todas as traduções são nossas).
Dostoiévski vivia na literatura, onde todos os seus anseios e
desesperos eram fonte de inspiração para moldar a personali-
dade de suas personagens, daí a constatação de que o autor
parece “resolver os enigmas da personalidade” (Mochulsky,
1967, p. 535)
Dostoiévski como bispo ortodoxo
Aquarela, grafite e guache sobre papel.
Dostoiévski vinha de uma família patriarcal; Mochulsky discorre que
a relação do autor com o pai não era saudável, o velho Andrey
Dostoiévski constantemente causava temor nos filhos. Mais tarde,
nas correspondências de Fyodor Dostoiévski, nenhum pesar foi
relatado após a morte de seu pai (Mochulsky, 1967, p. 6). Mo-
chulsky ainda cita que um amigo próximo do escritor, Baron Vran-
gel, deixa claro que Dostoiévski quase nunca falava do pai e pediu
para que os amigos não perguntassem sobre o mesmo, o que
demonstra a mágoa que o autor sentia perante Andrey Dostoiévski.
A relação de pai e filho foi abordada em Os Irmãos Karamazov, seu
ultimo romance, onde Mochulsky argumenta que foi uma forma de
Fyodor Dostoiévski se libertar dos traumas proporcionados pelo
pai. Não se pode dizer que Fyodor Pavlovich Karamazov era
Andrey Dostoiévski personificado, mas é inegável que a ideia de se
criar o pai Karamazov foi profundamente inspirada no pai de
Dostoiévski, como bem observou a filha do escritor, Lyubov Fyodor-
ovna, em suas memórias (Mochulsky, 1967, p. 7)
Ao mudar-se para São Petersburgo, o autor dedicou-se
com fervor aos seus romances, sendo Gente Pobre o primeiro de
sua carreira. Finalizado em 1844, o livro, fortemente inspirado nas
ideias do romance Eugène Grandet de Balzac, foi a porta de entra-
da para envolver Dostoiévski no mais aclamado círculo de escri-
tores peterburguenses. Maria de Fátima Bianchi, em sua tese de
doutorado “O ‘Sonhador’ de A Senhoria, de Dostoiévski, um
‘Homem Supérfluo’ ” nos fala que Vissarion Belinski, um dos princi-
pais críticos da época, ao ler o manuscrito de Gente Pobre, ficou
fascinado com a temática e o enredo maduro que o jovem escritor
apresentava, transportando Dostoiévski, de um autor quase de-
sconhecido, para uma grande promessa da literatura russa.
São Petersburgo produziu profundo impacto em Dostoiésv-
ki, tanto que em algumas de suas obras, a cidade é como uma
personagem, uma influenciadora nas tramas que permeiam sua
escrita. Em seu romance Noites Brancas, escrito em 1848, o autor
introduz o leitor na relação da personagem com a cidade, sua
familiaridade e urbanismo: “Porque já faz oito anos que moro em
Petersburgo, e não consegui estabelecer quase nenhuma
relação” (Dostoiévski, 2005) Nesse trecho a personagem discorre
sobre relação de cunho social e não com a cidade em si, visto
que adiante no romance podemos perceber que Petersburgo
trava papel importante na vida de tal personagem. O autor conti-
nua: “Mas pra quê preciso de relações? Eu já conheço toda Pe-
tersburgo sem isso; aí está por que me parecia que todos me
abandonavam quando toda Petersburgo se levantou e partiu de
repente para o campo. Comecei a ter medo de ficar sozinho e
vaguei durante três dias inteiros pela cidade numa tristeza profun-
da, sem entender absolutamente o que se passava comigo. Quer
fosse para Niévski, quer fosse para o jardim, quer vagasse pela
marginal do rio, não havia um só rosto daqueles que me acostu-
mara a encontrar naqueles lugares, na hora habitual, o ano
inteiro” (Dostoiévski, 2005). Niévski é a principal avenida de São
Petersburgo, que rendeu diversas obras em sua homenagem,
dentre eles a novela Avenida Niévski, escrita em 1835 por Gogol.
O jardim e a marginal do rio que a personagem cita referem-se a
dois dos principais pontos turísticos de Petersburgo: O Jardim de
Verão e a marginal do rio Neva.
O próprio título da novela já nos dá uma pista sobre a inter-
ação de Dostoiévski com Petersburgo, visto que Noites Brancas
se refere ao fenômeno que ocorre no verão onde o sol não se põe
totalmente deixando São Petersburgo com uma atmosfera lúgu-
bre e “fantasmagórica”, ideal para a trama dessa obra. Para
Dostoiévski, tudo na cidade parece criar vida e auxiliar no desen-
volvimento da relação da personagem com a cidade, as janelas
das casas conversam com o narrador, como bem cita: “As casas
também são minhas conhecidas. Quando caminho, é como se
todas avançassem para a rua em minha direção, olhassem para
mim com todas as suas janelas e quase dissessem: ‘Bom dia,
como vai sua saúde? Eu estou bem, Graças a Deus, e em maio
vão me aumentar um andar’. Ou: ‘Eu quase me queimei e fiquei
mesmo assustada’, etc. Dentre elas tenho as minhas favoritas,
minhas amigas íntimas; uma delas deseja se tratar com um
arquiteto neste verão.” (Dostoiévski, 2005)
São Petersburgo carrega em sua modernização a imagem
da Rússia que buscava se assemelhar com outras capitais da
europa. Marco Antonio Menezes, em seu artigo Narrativas urban-
as: Gogól, Poe e Ginsberg, discorre sobre como a capital da
Rússia até então era a própria imagem da modernidade: “…con-
cebida e imposta por Pedro a seus súditos. Ela representava a
negação das tradições russas e o abraço de algo estranho, novo,
estrangeiro”. E isso produz um impacto nas obras de Dostoiévski,
cujas palavras são traduzidas pelo narrador de Noites Brancas:
“Agora você entende, leitor, de que modo eu travei relações com
toda Petersburgo.” (Dostoiévski, 2005).
Em Abril de 1847, Dostoiévski começa a escrever um folhe-
tim intitulado Crônicas de São Petersburgo, para a Gazeta de São
Petersburgo. O autor demonstrou apreço pela liberdade que o fol-
hetim lhe proporcionava, podendo escrever sobre sua visão sobre
a cidade. Mochulsky cita que Dostoiévski se intitulava um flâneur
de São Petersburgo (Mochulsky, 1967, p. 70). Nos folhetins ele es-
crevia sobre cenas da cidade, combinando sua vivência em São
Petersburgo com o que lhe era oferecido aos olhos de um flâneur.
Toda a cidade lhe servia de inspiração, combinava-a com
resenhas de livros que tinha lido, peças de teatro e performances
que havia assistido. O material que produzia em seu folhetim lhe
serviu mais tarde como embasamento para escrever algumas de
suas obras, como A Senhoria, Noites Brancas, Coração Débil e O
Eterno Marido.
“Lá eu estava passando pelo Mercado de Feno, deliberando
sobre o que escrever. O desânimo roeu meu ser. Era uma manhã
úmida e enevoada; Petersburgo se tornara desagradável e irrita-
da, como uma jovem socialite irritadiça ... Era deprimente olhar
para as enormes paredes úmidas e para os mármores, baixos-rel-
evos, estátuas, colunas que, ao que parece, também ficavam
aborrecidas com o tempo sujo ... no granito molhado e nu do as-
falto que estava rachado, com os transeuntes, verde pálido,
severo, de alguma forma terrivelmente zangado ... Todo o horizon-
te de Petersburgo parecia tão azedo, tão azedo...Petersburgo
estava amuado... Era evidente que estava amamentando. Desejo
terrível de fugir para algum lugar longe daqui e de modo algum
ficar neste pântano sombrio da Ingermanland ”(Dostoiévski apud
Mochulsky, 1967, p. 70).
Esse trecho citado por Mochulsky revela um Dostoiévski per-
ambulando pelo Mercado de feno, uma parte mais pobre da
cidade, como um flâneur, atento a tudo que observava, descreven-
do como o clima da cidade, tão sombrio, afetava os passadiços e
as estátuas. Quando cita o “pântano sombrio da Ingermanland”
Dostoiévski nos dá uma imagem da região pantanosa em que São
Petersburgo foi construída, na Ingría, região histórica da Rússia,
próxima da Finlândia. Como era atraente o desejo de simplesmente
fugir da cidade, revelando uma Petersburgo que não parecia em
nada com a descrita em Noites Brancas. Isso nos mostra que o
autor escrevia sobre uma São Petersburgo real, bela em seus en-
feites de modernidade mas também azeda em seu clima e ruelas,
como bem cita Marcos Antonio Menezes: “Tanto Puchikin, quanto
Dostoievski e Gógol consideravam-na fantasmagórica, simbolizan-
do os conflitos um tanto apocalípticos da Rússia Imperial. A literatu-
ra produzida na cidade e sobre ela é uma das grandes con-
tribuições da vigorosa arte russa à cultura universal.” (Menezes,
2000, p. 93).
Dostoiévski utilizou-se de São Petersburgo como instrumento
para sua obra, apropriando-se da cidade em todas as suas ma-
zelas e belezas. A cidade foi construída pelo czar Pedro, O
Grande, e inaugurada em 1717, para ser a nova face da Rússia
moderna, negando a tradição urbana de uma Rússia que até então
era fechada para o resto da Europa. A então capital do império
Russo, Moscou, com suas ruelas estreitas e lamacentas, represen-
tava um país atrasado, aos olhos do czar. Em viagem à Amsterdam
e Paris, Pedro ficou encantado pelo traçado retilíneo dessas
cidades, que logo depois reproduziu em Petersburgo, com suas
largas avenidas, palácios e estátuas que representavam a glória do
Império Russo. Algo que inspirou diversos escritores a produzirem
literatura em suas vivências pela cidade, entre eles Nicolai Gógol,
que descreveu Petersburgo em diversos de seus contos, e acabou
por ser uma das principais fontes de inspiração para o próprio
Dostoiévski.
CAPÍTULO 2
O flâneur e algumas de suas características
As transformações arquitetônicas e urbanísticas que ocorreram no
século XIX nas grandes cidades europeias catalisaram o nasci-
mento de diferentes tipos citadinos. Dentre eles consolidou-se o
flâneur, objeto de estudo de Walter Benjamin que, baseado na liter-
atura de Charles Baudelaire, fez dessa figura um assunto de
estudo acadêmico no século XX. De acordo com Benjamin, as
reformas urbanísticas, por exemplo a da Paris de Haussmann,
foram aspectos que incentivaram a atuação da flânerie, visto que o
hábito do flâneur está em transitar pelas largas passagens sem
aparente objetivo. “A passagem ocupa uma posição intermediária
entre a rua e o interior de uma residência” (Benjamin,1985, p. 66 ),
espaço esse que torna-se habitat natural do flâneur, “bancas de
jornal são suas bibliotecas e os terraços dos cafés são as sacadas
de onde, após cumprido o trabalho, ele contempla a sua casa”
(Benjamin,1985, p. 67). A casa do flâneur é a própria rua.
O flâneur provém de uma classe mais ociosa, muitas vezes
abastada, visto que torna-se inviável deixar a cidade contaminar
seus sentidos sem estar completamente entregue. Ou melhor, o
desinteresse atua nessa parte, visto que o flâneur é tipo fisiológico
despretensioso. Esse desinteresse é acompanhado de um certo
afastamento das causas sociais. A vivência da cidade torna-se
algo individualista, onde os sentimentos do flâneur imperam, como
bem cita Anita Seppä quando diz que para Baudelaire a moderni-
dade é o culto do individual, ideia essa baseada nessa falta de
interesse pelo outro, o dândi como “ a manifestação social da ina-
tividade e da liberdade não utilitária” (Seppä, 2004).
O flâneur cria para si um universo paralelo, o outro aparece
como uma ideia do próprio, ou seja, ele cria histórias para os outros
transeuntes, ele se apaixona pela ideia que tem de tais pessoas.
Os interesses privados tornam-se fruto da imaginação do flâneur:
“Asseguravam que qualquer um seria capaz de, sem ser perturba-
do, decifrar - por conhecimento de causa - a profissão, o caráter, a
origem e o modo de viver dos transeuntes”. (Benjamin, 1985, p.
68).
Edgar Allan Poe, com muitos de seus textos traduzidos por
Baudelaire, influenciou o escritor profundamente, no que
condiz com o fato do flâneur ser um detetive da vida nas
grandes cidades.

“ “Se, desse modo, o flâneur chega a ser um detetive contra


a sua própria vontade, trata-se de algo que socialmente lhe
cai muito bem. Legitima a sua vagabundagem. A sua
indolência é apenas aparente. Atrás dela se esconde a vig-
ilância de um observador que não perde o malfeitor de vista.
Assim, o detetive vê se abrirem vastos campos à sua sensibi-
lidade. Ele constitui formas de reação adequadas ao ritmo da
cidade grande. Colhe as coisas em pleno vôo; com isso, ele
pode se imaginar bem próximo ao artista. Todo mundo louva
o rápido lápis do desenhista.” (Benjamin,1985)

Walter Benjamin escreve que Baudelaire amava a


solidão, desde que essa se manifestasse no meio de uma
multidão (Benjamin, 1985). O livro de Poe, O homem da multi-
dão, une a ideia de detetive com o homem imerso no meio de
vários tipos urbanos, Benjamin ressalta que:

“…Só resta a armação: o perseguidor, a multidão e um


desconhecido que organiza seu percurso através de Lon-
dres de tal modo que ele sempre está no meio dela. Esse de-
sconhecido é o flâneur. E assim isso também foi entendido
por Baudelaire quando ele, em seu ensaio sobre Guys,
chamou o flâneur de ‘l’homme des foules’” (Benjamin, 1985,
p.76)
No entanto, existe uma diferença entre o flâneur de Poe
e o de Baudelaire. Para Poe, esse tipo urbano não se sente
seguro em meio à sociedade, por isso procura a multidão,
para que assim possa se esconder. O flâneur torna-se sus-
peito em seus escritos, “a melancolia em Poe nada tem a ver
com a razão ou moral. Ela brota na solidão metropolitana,
onde os seus habitantes estão enclausurados.” (Menezes,
2000). Para Baudelaire, exemplificado aqui por seu soneto “À
une passante”, o flâneur escolhe a multidão, não para se es-
conder, mas como “refúgio para o amor que foge do poeta”
(Benjamin,1985):

A uma passante
A rua em torno era um frenético alarido.
Toda de luto, alta e sutil, dor majestosa,
Uma mulher passou, com sua mão suntuosa
Erguendo e sacudindo a barra do vestido.
Pernas de estátua, era-lhe a imagem nobre e fina.
Qual bizarro basbaque, afoito eu lhe bebia
No olhar, céu lívido onde aflora a ventania,
A doçura que envolve e o prazer que assassina.
Que luz… e a noite após! – Efêmera beldade
Cujos olhos me fazem nascer outra vez,
Não mais hei de te ver senão na eternidade?
Longe daqui! tarde demais! “nunca” talvez!
Pois de ti já me fui, de mim tu já fugiste,
Tu que eu teria amado, ó tu que bem o viste!

(Charles Baudelaire. As Flores do mal. Edição bilíngüe.


Tradução de Ivan Junqueira. Rio de Janeiro: Nova Fronteira,
1985: p. 361.)
A rua é o palco de encontro entre o poeta e seu amor, torna-se tão
personagem quanto o homem que se apaixona e a mulher a quem
descreve. O soneto traduz a ideia que Baudelaire tem do flâneur,
um tipo urbano que se surpreende em cada rua, em cada trecho
da cidade, caminha despretensioso e vê sua inesperada amada
se distanciado em meio a multidão. O flâneur procura conforto na
multidão: seu anonimato é protegido pelo turbilhão de transeuntes
de quem compartilha a calçada.
Nicolai Gógol também utilizou-se do flâneur para produzir
alguns de seus contos, Avenida Niévski foi o principal deles, hom-
enagem à principal avenida de São Petersburgo. O autor, em se-
melhança com Baudelaire, se apropria de dois jovens que pas-
seiam pela cidade em busca de mulheres amadas que se perdem
em meio a multidão de transeuntes. Gógol descreve a Avenida
Niévski com a primazia de quem a conhece bem e apresenta-nos
tipos urbanos dos mais variados, que dividem com suas person-
agens o caminhar pela cidade:

“Não há nada melhor do que a Avenida Niévski, pelo menos


em Petersburgo; para essa cidade ela representa tudo. Com o
quê não brilha essa rua – beldade de nossa capital? Sei que
nenhum dos pálidos funcionários públicos que a habitam, trocaria
a avenida Niévski por qualquer vantagem que fosse. Não só quem
tem vinte e cinco anos de idade, lindos bigodes e sobrecasaca
admiravelmente benfeita, mas até quem tem pelos brancos que
repontam no queixo e a cabeça lisa como uma travessa de prata
se entusiasma com a avenida Niévski. E as senhoras! Ah, para as
senhoras, a avenida Niévski é ainda mais agradável. Mas para
quem ela não é agradável? Basta entrar na avenida Niévski para
sentir o aroma de um passeio. Mesmo que tenhamos algum
assunto urgente e incontornável, ao entrar na avenida certamente
esqueceremos tudo. Aqui é o único lugar onde as pessoas apare-
cem não por necessidade, um lugar para onde são atraídas não
por uma obrigação, nem pelo interesse comercial, que arrebata
Petersburgo inteira.” (Gogól, 2012).
O autor continua:

“A bota suja e malfeita do soldado reformado sob cujo


peso até o granito parece rachar, e o sapatinho em miniatura,
leve como fumaça, da jovem senhorita que vira a cabecinha
para as vitrines reluzentes das lojas assim como o girassol se
vira para o sol, e o sabre tilintante do sargento-mor cheio de
esperança, que o arrasta raspando com força no chão – todos
descarregam sobre ela o poder da força ou o poder da fra-
queza. Que veloz fantasmagoria se cumpre aqui no decurso
de um só dia! Quantas mudanças ela sofre em apenas vinte e
quatro horas!” (Gógol, 2012).

Gógol reuniu várias descrições de São Petersburgo ao


longo do conto Avenida Niévski e assim como nas obras de
Dostoiévski a cidade aparecia como uma personagem que,
de certo modo, influenciava nas tramas dos heróis. Para os
autores São Petersburgo era a face da modernidade russa,
compondo-se como capital do Império e se aproximando do
restante da europa. E com essa modernidade e largas aveni-
das o flâneur pôde encontrar um ambiente confortável e com
isso a literatura russa do século XIX ganhou um novo tipo de
herói.
CAPÍTULO 3
Excertos de obras de Dostoiévski sobre o flâneur em São Petersburgo

Não há dúvidas de que Dostoiévski foi um estimável escritor da


literatura russa do século XIX e que continua a ser estudado até os
dias atuais. Analisar tal autor por um viés arquitetônico e urbanístico
é imprescindível para compor estudos acadêmicos sobre a relação
entre literatura e arquitetura. E como forma de unificar esse assunto
escolheu-se o flâneur, figura importante do século XIX, presente nas
obras de vários escritores, dentre eles o próprio Dostoiévski. Breve-
mente comentou-se a relação do escritor com São Petersburgo e
algumas características da própria flânerie, mas para adentrar ainda
mais nesse assunto apresento aqui alguns comentários sobre a
poética desse autor e, para compor os argumentos, alguns excertos
de sua obra.
Mikhail Bakhtin foi um importante literato que estudou com
afinco a obra de Dostoiévski. Em seus estudos o autor conclui que
Dostoiévski “criou uma espécie de novo modelo artístico do mundo,
no qual muitos momentos basilares da velha forma artística sofreram
transformação radical” (Bakhtin, 2013). Esse novo modelo de
romance diz-se polifônico, ou seja, de acordo com Bakhtin, a poéti-
ca de Dostoiévski apresenta uma nova relação entre autor e person-
agem.
“Para chegar ao conceito de polifonia, Bakhtin analisa desde a
primeira obra de Dostoiévski — Gente Pobre — até seu último
romance — Os irmãos Karamazov. Bakhtin destaca que, desde
Gente Pobre, percebe-se a representação do discurso do outro na
forma de sua antecipação no monólogo de um dos personagens”
(Marcuzzo, 2008).
A polifonia em Dostoiévski pode ser interpretada como a
relação autor —personagem em que existe uma multiplicidade de
consciências, em que as vozes do autor se misturam com a do herói
que por sua vez dialoga com as opiniões de outras personagens.
Existe portanto uma autonomia das personagens: o autor é um co-
adjuvante nos romances, “não são apenas objeto do discurso de
autor, são também sujeitos de seus próprios discursos” (Bezerra,
apud Marcuzzo, 2008).
Bakthin também cita que nos romances de Dostoiévski existe
o dialogismo, onde não existe uma voz autoritária do autor, as vozes
das personagens existem em consonância (Marcuzzo, 2008):
“Assim, pois, nas obras de Dostoiévski não há um discurso de-
finitivo, concluído, determinante de uma vez por todas. (…) A pala-
vra do herói e a palavra sobre o herói são determinadas pela atitude
dialógica aberta face a si mesmo e ao outro. (…) No mundo de
Dostoiévski não há discurso sólido, morto, acabado, sem resposta,
que já se pronunciou sua última palavra.” (Bakthin, apud Marcuzzo,
2008).
De acordo com Bakthin, a consciência do herói torna-se inde-
pendente do autor, ela é dada como a consciência do outro, “Ela
possui indecência excepcional na estrutura da obra, é como se
soasse ao lado da palavra do autor, coadunando-se de modo espe-
cial com ela e com as vozes plenivalentes de outros heróis” (Bakh-
tin, 2013).
Os excertos das obras aqui citadas nos dão um pequeno ex-
emplo de como a polifonia e o dialogismo ocorrem, apesar de não
estarem inteiramente amadurecidos, como nos últimos romances
de Dostoiévski, mas elas servem principalmente para se mostrar
como a descrição da cidade de São Petersburgo se dá na literatura
dostoiévskiana. Analiso aqui duas obras do autor, A Senhoria, escri-
ta em 1847 e Noites Brancas, escrita em 1848.
Cabe novamente ressaltar que São Petersburgo era a face da
modernidade russa, uma tentativa bem sucedida de se aproximar
das cidades da Europa ocidental. É nessa cidade que dá-se o pano
de fundo para as obras analisadas, onde São Petersburgo torna-se
personagem influenciadora das tramas das personagens.
“São Petersburgo tornou-se famosa em todo mundo como
uma jóia arquitetônica de palácios resplandescentes, orgulhosa-
mente alinhados as margens do espectral Neva. A beleza das con-
struções históricas de Petersburgo é evidente. Erguidas com vas-
tidão, luxo, senso artístico e refinamento sem paralelos, elas exalam
um encantamento quase místico, especialmente nas noites bran-
cas, no início do verão, que envolvem a arquitetura clássica numa
atmosfera de fantasia” (Volkov, 1997).
A novela A Senhoria nos apresenta Vassíli Ordinóv, um
jovem apaixonado pela ciência, mas que frustrado, começa a
perambular pela cidade de São Petersburgo, a fim de encontrar
um quarto para alugar, visto que havia sido despejado de sua
moradia anterior. Ao entrar em uma pequena igreja nos arre-
dores da cidade, encontra-se com as outras personagens da
trama, Múrin, um velho comerciante, e sua jovem companhia
Katierina, por quem Ordinóv demonstra profundo interesse. O
encontro entre essas personagens além de ser fundamental
para o enredo da novela, demonstra também um encontro da
Rússia de um Bárin, termo que é atribuído a pessoas da nobre-
za, personificado por Ordinóv, e aquela de um Mujique, denomi-
nação dada aos camponeses russos, aqui representados pela
figura de Múrin. O que podemos interpretar como que a situ-
ação que a Rússia do século XIX influenciou Dostoiévski, que
desde seu romance Gente Pobre, já era tão sensível às causas
sociais.
Em busca de um novo apartamento, a personagem Or-
dinóv se vê imersa na vida cotidiana das ruas de São Peters-
burgo. Tudo na cidade parece chamar sua atenção, os burbu-
rinhos dos comerciantes, os anúncios colados nas paredes, os
prédios e a rua agitada:
“(…) pegou seu boné e saiu perambulando pelas traves-
sas de São Petersburgo, olhando todos os anúncios fixados
nos portões dos prédios e selecionando os prédios maiores,
mais enegrecidos e apinhados, onde seria mais provável en-
contrar o canto que lhe convinha na casa de algum locatário
pobre”. (Dostoiévski, 2006).
O livro é permeado de uma linguagem poética e elabora-
da que é enriquecida com a minuciosa descrição das paisagens
urbanas de São Petersburgo. Por ser uma narrativa em terceira
pessoa, o autor faz o leitor imergir na visão da personagem
principal, demonstrando seus anseios, sentimentos e tragédias.
Há controvérsias sobre quem seria realmente a personagem
principal. Joseph Frank considera que Katierina o é, visto que é
a personagem central nos dramas tanto de Múrin quanto de Or-
dinóv. (Bianchi, 2006, p. 123). Alguns autores citam Ordinóv,
primeira personagem a ser apresentada na novela, como um
espectador dos acontecimentos externos.
Ordinóv é um intelectual, um apaixonado pela ciência, e diferen-
temente de outros heróis dos livros anteriores de Dostoiévski, é um
sonhador que se aproxima do romântico e não do realista. Ao ser
forçado a sair de seu convívio solitário e buscar um novo apartamen-
to, a personagem se vê imersa em uma cidade agitada onde tudo lhe
parece novidade, como bem cita Dostoiévski: “Andava pelas ruas
como um alienado, como um eremita que de repente saiu de seu
deserto mudo para uma cidade ruidosa e tumultuosa. Tudo lhe pare-
cia novo e estranho” (Dostoiévski, 2006, p. 12).
Ao caminhar pelas ruas da cidade, os sentimentos da person-
agem se misturam com as sensações que São Petersburgo lhe pro-
porcionava. Ordinóv vivencia a cidade de maneira intensa, algo que
lhe provoca profunda satisfação, “Sentia cada vez mais prazer em
vagar pelas ruas. Olhava para tudo embasbacado, como um flâneur.”
(Dostoiévski, 2006, p. 12). Bianchi pontua que a palavra flâneur usada
por Dostoiévski nesse trecho do livro era nova na literatura russa e
surgiu no círculo literário petersburguês por influência do “ensaio fisi-
ológico francês, assim como das novelas e dos romances de Balzac,
em que um dos tipos característicos se tornou o flâneur que frequen-
tava os bulevares parisienses” (Bianchi, 2006, p. 9).
Dostoiévski, a medida que Ordinóv passeia pela cidade, nos en-
volve na atmosfera petersburguesa:

“A multidão e a vida na rua, o burburinho, a movimentação, a


novidade dos objetos, a novidade da situação - toda essa vida mes-
quinha e esse farelório cotidiano, que há tanto tempo aborrece o pe-
tersburguês ocupado e azafamado, que passa a vida toda procurando
inutilmente, mas com ansiedade, um meio de encontrar paz, tranquili-
dade e repouso em algum ninho aconchegante, conquistado com seu
trabalho, suor e por vários outros meios -, toda essa prosa vulgar e
esse fastio suscitavam nele, ao contrário, uma sensação de alegria
radiante e serena.” (Dostoiévski, 2006).
Em outro trecho do livro, o autor continua:

“Tudo o surpreendia; não deixava escapar uma só impressão e


olhava com um ar pensativo para o rosto dos transeuntes, espreitava
a fisionomia de todos os que o rodeavam, punha-se a escutar afetu-
osamente a conversa popular, como se tudo viesse a confirmar suas
próprias conclusões, nascidas na calada de suas noites solitárias”.
(Dostoiévski, 2006).
Ordinóv começa seu passeio no centro da cidade, com um obje-
tivo concreto de procurar uma nova moradia, mas ao penetrar nas
ruas e avenidas de Petersburgo, viu-se embasbacado por todas as
novas sensações que experimentara. Esquecendo-se de seu objetivo
principal, a personagem continuou suas andanças e viu-se distante do
centro da cidade:
“Sem perceber, foi parar em um arrabalde de Petersburgo, dis-
tante do centro da cidade. Depois de comer alguma coisa em uma tav-
erna solitária, saiu de novo vagueando. Tornou a passar por muitas
ruas e praças, Ao longo delas estendiam-se longas paliçadas ama-
relas e cinzentas, e em vez dos edifícios luxuosos começou a encon-
trar isbás completamente decrépitas e, ao mesmo tempo, prédios de
fábricas colossais, monstruosos, enegrecidos, vermelhos e com
chaminés altas.” (Dostoiévski, 2006)
Nesse trecho da obra o autor nos dá a pista de duas São Peters-
burgos, a do centro da cidade, bela em seus enfeites e prédios luxuo-
sos e a da periferia, com isbás, habitação mais pobre de camponeses
russos, e fábricas enegrecidas e monstruosas.
Escrito em primeira pessoa, Noites Brancas, Dostoiévski nos
apresenta O Sonhador, petersburguês que, assim como Ordinóv,
caminha pela cidade, mas ao invés deste, sem objetivo inicial. A casu-
alidade de seu passeio o faz encontrar uma mulher próxima em uma
ponte próxima a um canal. Ele se apaixona perdidamente pela moça
e começam seus encontros e diálogos.
O interessante dessa obra dá-se primeiramente em seu título,
Noites Brancas, fenômeno que ocorre em determinada época do ano,
onde o sol não se põe totalmente, deixando as noites mais claras do
que o usual. Boris Schnaiderman logo nos avisa, na contracapa do
livro:
“São Petersburgo é, sem dúvida, uma das grandes personagens
da literatura russa. E é assim que ela aparece nesta novela singular.
Surge aí a fantasmagoria do cotidiano, numa cidade cuja própria ex-
istência tem algo de fantástico e inverossímil.” (Schnaiderman, in
Dostoiévski, 2005, contracapa).
E nessa novela, ela aparece adornada de descrições. O clima
da cidade confunde-se com o humor do escritor, que vê-se interina-
mente conectado com São Petersburgo. Todos os encontros do
Sonhador com Nastiénka, a moça por quem se apaixona, são em
meio ao urbano de Petersburgo, sempre na rua, próximo aos canais
do Rio Neva. A cidade está envolta num clima fantasmagórico que
molda as características das personagens, tecendo um teor de liter-
atura fantástica nos diálogos e aventuras dos amantes:
“Há algo inexplicavelmente comovedor em nossa natureza pe-
tersburguesa quando, com a aproximação da primavera, ela mostra
de repente todo o seu vigor, todas as forças que lhe concedeu o
Céu, e se cobre de veludo, se embeleza e se adorna com flores…In-
voluntariamente ela me dez recordar aquela moça seca e enfermiça,
para a qual você olha às vezes com piedade, às vezes com uma
certa compaixão, e às vezes sequer a percebe, mas que de repente,
num instante, de modo voluntário e inexplicável, aparece surpreen-
dentemente bela.” (Dostoiévski, 2005).
Em outro trecho do livro o autor comenta:
“Quando soaram nove horas, não consegui permanecer no
quarto; vesti-me e saí, apesar do tempo ruim. Eu estava ali, sentado
em nosso banco. Andei por sua viela, mas fiquei com vergonha e
voltei sem olhar para as janelas, chegando a dois passos da sua
casa. Cheguei em casa numa tristeza tamanha como nunca havia
sentido. Que tempo úmido e tedioso! Se estivesse um tempo bom,
eu teria passeado a noite toda…” (Dostoiévski, 2005).
Na primeira citação o Sonhador aparece feliz, e logo Peters-
burgo lhe parece bela, adornada, em outro momento, após algumas
desventuras amorosas, a cidade lhe parece fria, tediosa. Existe est-
reita relação entre o humor da personagem e o modo como ele
vivencia a cidade, tornando sua opinião por São Petersburgo intrín-
seca ao que sente.
As duas novelas aqui brevemente comentadas servem como
uma primeira base para a pesquisa do elo entre as obras de
Dostoiévski e sua abordagem sobre a cidade de São Petersburgo. A
Petersburgo de Dostoiévski nos aparece com várias facetas, o autor
consegue abordar tanto o seu caráter embelezado, quanto a parte
mais pobre da cidade, aquela que não vemos ser divulgada em
meios turísticos. E através dessa descrição, o próprio flâneur, repre-
sentado aqui por Ordinóv e o Sonhador, elementos que perambulam
por Petersburgo, vivenciando a cidade em suas várias formas.
CAPÍTULO 4
A minha visão de São Petersburgo

Autorretrato com coroa russa


Aquarela, guache e grafite sobre papel.
Para melhor entender como travei uma relação de carinho
com São Petersburgo é preciso explicar como se deu minha
chegada nessa cidade que tanto despertou meus sentidos.
Fui parar em Petersburgo com a bagagem de uma estu-
dante de arquitetura e urbanismo da Universidade de
Brasília. Despretenciosa cheguei em terras russas através
de um ônibus vindo de Helsinki, em pleno verão europeu. O
primeiro impacto foi que não anoitecia, era dia em São Pe-
tersburgo durante todas as noites. Dostoiévski discorre
sobre as noites brancas da cidade em várias de suas obras
e naquele momento pude entender de fato o que o escritor
descreveu. “As noites de verão de São Petersburgo são
mais claras que os dias de inverno de São Petersburgo”
(Dostoiévski, 2017, p. 38). E de fato eram. Minha mente tropi-
cal não podia entender a discrepância desse fenômeno,
lembro de ter me questionado se conseguiria morar em uma
cidade, em um país, que diverge tanto durante as estações.
Mas lá estava eu, estudante de urbanismo, cansada da
viagem de ônibus e com a brasilidade de quem não está
acostumada com o frio do verão russo.
Adentrei a cidade sem expectativas, o que facili-
tou a minha imersão, li pouca coisa sobre São Petersburgo
antes de minha viagem, o que conhecia de seu urbanismo e
arquitetura era aquilo que deixavam escapar, entre linhas,
alguns autores de minha predileção, como Gógol e o próprio
Dostoiévski. O frio me extasiava a mente mas não me impe-
dia de sair para perambular pela cidade. Viciei-me em tentar
desvendar o que diziam os anúncios e placas espalhados
pela cidade, como divergiam as ruelas da parte histórica da
cidade, eram como duas Rússias, cada uma envolta em seu
próprio universo.
A São Petersburgo dos cartões postais era aquela europeia,
com seu mármore, suas estátuas e todos os palácios. As pes-
soas anseiam por conhecer essa Petersburgo. Tiram fotos de
recordação e fazem seus passeios turísticos sem muita
atenção aos pequenos detalhes. Lembro de sentar na praça
do Palácio de Inverno e observar essas pessoas. O próprio
Palácio de Inverno é a representação da influência europeia na
Rússia: desenhado por Bartolomeo Rastrelli, arquiteto italiano,
foi a morada de vários czares ao longo da história. Fiquei imag-
inando o italiano passando um tempo na fria Rússia, como
deve ter sido diferente para ele, como é diferente pra mim. As
pessoas faziam fila para visitar o Hermitage, museu do Palácio
de Inverno, e eu sem dinheiro não pude participar dessa eufo-
ria, contentei-me em observar a arquitetura rococó do lado de
fora.
Um dos meus passatempos era observar as pes-
soas nesses ambientes turísticos: havia famílias tirando fotos
próximas as estátuas, na fila para visitar o Hermitage, alguns
poucos desenhando os monumentos e os artistas de rua per-
formando para ganhar alguns trocados. Nada diferente das
outras cidades turísticas europeias. Fiquei imaginando o que
essa cidade teria para me oferecer, e uma quase decepção
varreu minha mente. Comecei então a ocupar meu tempo de-
senhando essas pessoas, imaginando uma vida para elas.
Uma família italiana buscando uma nova experiência nas férias
de verão, apaixonados por arte fazendo um tour pelas
riquezas europeias na Rússia e eu, estudante de arquitetura e
urbanismo, quase decepcionada, buscando vivenciar o que
os meus escritores russos vivenciaram nessa cidade. Será que
eles passavam por esses lugares turísticos para observar os
estrangeiros? Na novela A Senhoria, Dostoiévski fazia menção
a um alemão que morava em Petersburgo, mas ele não pare-
cia o tipo turístico. “…acabou por encontrar um alojamento na
água-furtada de um alemão pobre, apelidado de Spiess, que
morava com a filha Tínkhen.” (Dostoiévski, 2006, p. 20). Spiess
definitivamente não era do tipo turístico. Comecei a pensar que
nunca conheceria a Rússia que tanto fascinou os escritores
que amo. Mas isso não me deteve em apreciar os locais turísti-
cos da cidade. Comecei a desenhar. Desenhava os es-
trangeiros, as estátuas, o palácio. E fui embriagando a mente
com essas imagens, mas sempre com aquele pensamento
impertinente: “cadê a São Petersburgo despida da veste
turística?”
Nessa tentativa de me conectar com a cidade acabei por
começar a desenhar tudo o que me chamava atenção. Voltei à
praça do Palácio de Inverno com outra missão, a de desenhar.
Me conectei com o Palácio, comecei a perceber sua relação
com o rio Neva, que circundava o Palácio e cortava a cidade.
Passei uma hora desenhando até que me cansei e fui em busca
de novos modelos. Me vi na Nevsky Prospekt, Avenida Niévski,
a principal avenida de São Petersburgo, tema de tantos ensaios
e contos por parte dos escritores russos. Gógol escreveu um
conto inteiro dedicado à Avenida Niévski:
“A pessoa que se encontra na avenida Niévski parece menos
egoísta do que nas ruas Morskaia, Gorókhovaia, Litiéinaia,
Mechánskaia e em outras ruas onde a ganância, a cobiça e a
necessidade se manifestam nos pedestres e nas pessoas que
passam em carruagens e em caleches abertas. A Avenida
Niévski é a via de comunicação obrigatória de Petersburgo.
Aqui, o morador de Petersburgo ou de Víborg, que há alguns
anos não revê um amigo de Piéski ou do portão de Moscou,
pode estar seguro de que o encontrará sem falta. Nenhum guia
de ruas e nenhuma agência de informações fornece notícias
tão confiáveis como a avenida Niévski. A todo-poderosa Aveni-
da Niévski! A única alegria do pobre num passeio em Peters-
burgo! Como são limpas e varridas suas calçadas e, Deus,
quantos pés deixaram nelas seus rastros.” (Gogol, 2012, p.
1–15)
A Avenida Niévski é o coração de Petersburgo, e
como é movimentada! Deixei-me perder por entre as pessoas,
me senti como uma verdadeira russa, perambulando pelas
calçadas, misturada em meio a multidão. Lá eu era só mais
uma, não parecia mais uma turista que veio à cidade visitar os
palácios e no final da tarde ir para o meu hotel descansar. Eu
podia me conectar com a cidade de vez, tantos tipos citadinos
compartilhando os mesmos passos que eu.
Mercado de Pulgas
Acrilica, aquarela, guache e grafite sobre papel
Arranhei no russo tentando conversar com alguns transeuntes.
Sem sucesso. O russo não se abre fácil para estranhos, ainda
mais para estrangeiros. Isso não me impediu de imaginar uma
vida para eles, no que trabalhavam, quantos filhos tinham, se
eram felizes ou amargurados. Olhava para as janelas das
casas tentando vislumbrar mesmo que pouco, o seu interior.
Assim como o sonhador de Noites Brancas, as janelas pareci-
am falar comigo, falavam em uma língua que eu não conseguia
decifrar, mas não deixavam de conversar. Olhei para elas com
olhar de arquiteta, vi de que material eram feitas, como es-
tavam dispostas, as instalações aparentes, grandes tubos que
davam forma para aquele grande edifício, como pulmões, tor-
nando-o vivos aos meus olhos estrangeiros. Tentei observar a
mutação das fachadas, a principal sempre embelezada e as
laterais mais descuidadas, mas não menos atraentes. Obser-
vava alguns grafites tímidos em sua alvenaria, personalizando
as suas arestas.
Fiquei curiosa quanto ao interior daquelas casas. As
únicas imagens que tenho de interior de residências russas
são as de onde estava ficando, um pequeno hostel em um
apartamento antigo, composto por três grandes quartos e um
pé direito imenso, e o que minhas leituras me permitiam imagi-
nar, como nesse trecho da novela A Senhoria, de Dostoiévski:
“O apartamento todo consistia em um único cômodo
bem amplo, dividido em três compartimentos por dois
tabiques; a entrada dava diretamente para uma ante-sala est-
reita, escura; em frente havia uma porta que conduzia ao outro
lado do tabique, evidentemente o quarto dos donos da casa. À
direita, atravessando a ante-sala, se passava para o quarto
que estava sendo alugado. Era bem estreito e apertado,
espremido pelo tabique contra duas janelas bem baixas. A
casa estava toda atravancada e atulhada de objetos indis-
pensáveis a qualquer residência; era pobre, apertada, mas na
medida do possível limpa. Os móveis consistiam em uma mesa
branca modesta, duas cadeiras também modestas e bancos
em ambos os lados da paredes. Sobre uma prateleira no canto
havia uma imagem grande, antiga, com auréola dourada, e
uma lamparina acesa diante dela. No quarto alugado e em
parte da ante-sala ficava um forno a lenha russo enorme e de-
sajeitado” (Dostoiévski, 2006, p. 26).
Forno russo
Acrilica, aquarela, guache e grafite sobre papel
Infelizmente tive pouco contato com o interior das casas russas,
mas o exterior delas estava quase que familiar. Caminhei por
várias ruas e passei por muitas residências e ao perambular pela
cidade deparei-me com uma parte mais distante do centro históri-
co de Petersburgo, aos fundos da Avenida Niévski. Era evidente-
mente uma área mais pobre da cidade, parecia-me um mercado
de pulgas. Anúncios por todos os cantos, uma escada de incên-
dio cortando a fachada de um dos edifícios, as próprias fachadas
estavam mal cuidadas, revelavam o vermelho do tijolo, como que
em carne viva. Chaminés, telhados desgastados. E Russos.
Russos que não estavam acostumados com uma estrangeira bo-
quiaberta com toda aquela maravilha que nos circundava. Ven-
diam os mais variados tipos de utensílios, desde roupas íntimas
até comida. Tudo o que eu queria era entender o que aqueles
vários anúncios que decoravam minha vista diziam. Sentia os
olhares dos vendedores pesando sobre mim. Se eu não estava lá
para comprar o que eu queria? Nem eu sei, na verdade tudo o
que sabia era que tinha achado uma Petersburgo próxima aos
contos de Dostoiévski, não que a outra Petersburgo adornada
fugisse completamente ao que Dostoiévski escrevia, na verdade
o que era importante ali era a junção dessas duas partes da
cidade e o quão distintas elas eram.
O rio Neva, imponente, fazia a junção dessas duas Pe-
tersburgos. Águas turvas, frias, águas de um rio russo. Era per-
sonagem principal daquela cidade. Cortava a cidade como veias
pulsantes, e eu não deixava de observar o quanto que a pais-
agem mudava quando estava próxima ao rio. Fiz uma breve asso-
ciação com Veneza, mas logo deixei-a de lado. São Petersburgo
parecia incomparável naquele momento.
Havia achado a Petersburgo que estava almejando,
mas equivoquei-me ao pensar que a São Petersburgo turística era
menos pertencente a cidade do que aquela do mercado de
pulgas. Depois de pouca reflexão me senti envergonhada. Perce-
bi que me sentia mais confortável na parte turística, talvez por não
saber o idioma ou porque o olhar dos vendedores russos haviam
me intimidado. No final cheguei à conclusão óbvia de que
também era turista, eles me viam como turista. E me passou pela
cabeça: Seria o flâneur um turista na cidade? Um turista na sua
própria cidade.
Senhoras ortodoxas
Acrilica, aquarela, guache e grafite sobre papel
Baba Yaga
Acrilica, aquarela, guache e grafite sobre papel
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Neste trabalho procurei brevemente abordar a relação entre
arquitetura e literatura através das obras de Fiódor
Dostoiévski e sua relação com São Petersburgo, através da
figura do flâneur, tipo citadino que surgiu com as transfor-
mações urbanas do século XIX e que foi academicamente
introduzido na literatura do século XX, através de Walter
Benjamin e que continua sendo assunto para estudos atuais.
Mesclei as desventuras das personagens dostoiévskianas O
Sonhador, de Noites Brancas, e Vassíli Ordinóv, de A Senho-
ria, com minha própria vivência da cidade de São Petersbur-
go, para enfim tentar entender um pouco mais do flâneur e
sua vivencia nas cidades.
BIBLIOGRAFIA
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