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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ

CENTRO DE CIÊNCIAS TECNOLÓGICAS


DA TERRA E DO MAR
Curso de Tecnologia em Construção Naval

ANDREWS RICARDO LONGHI

ANÁLISE DA INDÚSTRIA DE NAVIPEÇAS PARA O MERCADO DE


CONSTRUÇÃO NAVAL NACIONAL

Itajaí, SC
2009
ANDREWS RICARDO LONGHI

ANÁLISE DA INDÚSTRIA DE NAVIPEÇAS PARA O MERCADO DE


CONSTRUÇÃO NAVAL NACIONAL

Dissertação apresentada ao Curso de


Tecnologia em Construção Naval da
Universidade do Vale do Itajaí, como
requisito parcial à obtenção do título de
Tecnólogo em Construção Naval.

Orientador: Prof. Rubens Birch Gonçalves

Itajaí, SC
2009

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ANDREWS RICARDO LONGHI

ANÁLISE DA INDÚSTRIA DE NAVIPEÇAS PARA O MERCADO DE CONSTRUÇÃO


NAVAL NACIONAL

Esta Monografia foi julgada adequada para a obtenção do titulo de Tecnólogo em Construção
Naval e aprovada pelo Curso de Tecnologia em Construção Naval da Universidade do Vale
do Itajaí, Centro de Ciência tecnológicas da Terra e do Mar.

Área de Concentração: Construção Naval e Navipeças

Itajaí, ____de _____________de _______.

__________________________________________
Prof. Msc. Roberto Barddal
UNIVALI – CTTMar de Itajaí
Presidente da Banca

__________________________________________
Prof. Rubens Birch Gonçalves
UNIVALI – CTTMar de Itajaí
Orientador

__________________________________________
Prof. Humberto Fajardo, Eng.
UNIVALI – CTTMar de Itajaí

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ANÁLISE DA INDÚSTRIA DE NAVIPEÇAS PARA O MERCADO DE CONSTRUÇÃO
NAVAL NACIONAL

ANDREWS RICARDO LONGHI

RESUMO

No Brasil, a demanda atual do mercado de construção naval é motivada principalmente pela


exploração de petróleo offshore. E esta demanda mostra-se bastante favorável para a
estruturação e consolidação da indústria de fornecedores (as Navipeças), pois possuí papel
fundamental para o setor uma vez que, a construção naval caracteriza-se como uma indústria
montadora, e as embarcações são compostas por materiais e equipamentos dos mais diversos
gêneros e segmentos. Além de suprir a demanda, as navipeças participam diretamente no
processo de produção do estaleiro, agregando qualidade, redução de custos e prazos, e
principalmente, na inserção de novos produtos e tecnologias. O estudo evidenciou que
desenvolver uma cadeia de suprimento local é condição para gerar uma indústria naval
competitiva e habituada a mudanças bruscas.

Palavras-chave:

- Indústria de Navipeças, Construção Naval

4
SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO ............................................................................................................... 6
1.1. CONSIDERAÇÕES INCIAIS ............................................................................................. 6
1.2. OBJETIVO GERAL ........................................................................................................... 7
1.3. OBJETIVOS ESPECÍFICOS ............................................................................................. 7
1.4. METODOLOGIA ............................................................................................................... 7
1.5. DELINEAMENTO DO TRABALHO.................................................................................. 8

2. CONSTRUÇÃO NAVAL NACIONAL ............................................................................... 9


2.1. BREVE HISTÓRICO ........................................................................................................ 9
2.2. ASPECTOS GERAIS DA INDÚSTRIA DE CONSTRUÇÃO NAVAL ............................... 11
2.3. CADEIA DA CONSTRUÇÃO NAVAL .............................................................................. 12
2.4. COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA DE CONSTRUÇÃO NAVAL ............................. 13
2.4.1. CONCORRENTES DA INDÚSTRIA DE CONSTRUÇÃO NAVAL .................... 16
2.4.2. ENTRANTES POTENCIAIS ................................................................................... 16
2.4.3. ARMADORES ......................................................................................................... 16
2.4.4. FORNECEDORES ................................................................................................... 17
2.4.5. SUBSTITUTOS ........................................................................................................ 17
2.5. MERCADO ATUAL .......................................................................................................... 18
2.6. PROCESSO DE FINANCIAMENTO ................................................................................ 22

3. INDÚSTRIA DE NAVIPEÇAS ....................................................................................... 23


3.1. PARTICIPAÇÃO DAS NAVIPEÇAS NO MUNDO .......................................................... 25
3.2. PRÁTICA INTERNACIONAL DO SETOR DE NAVIPEÇAS ........................................... 25
3.3. A ATUAL INDÚSTRIA DE NAVIPEÇAS NACIONAL ..................................................... 27
3.4. CADEIA E NAVIPEÇAS ................................................................................................... 31
3.5. MERCADO DE NAVIPEÇAS NACIONAL ....................................................................... 33
3.6. GARGALOS DA INDÚSTRIA DE NAVIPEÇAS .............................................................. 35

4. CONCLUSÃO................................................................................................................... 37

5. REFERÊNCIAS .............................................................................................................. 40

5
INTRODUÇÃO
1.1. Considerações iniciais

As atividades marítimas são de enorme importância estratégica e econômica para


um país, potencializando a geração de empregos, recursos financeiros em escala e a
movimentação de diversos outros segmentos na sua cadeia. Atualmente, as perspectivas do
cenário econômico nacional demandam uma crescente necessidade de novas embarcações,
seja para renovar a frota ou para suprir o mercado, demanda esta, motivada principalmente
pela indústria de petróleo, tendo como armadores a Petrobrás e Transpetro. E esta demanda
atual mostra-se bastante favorável para início de uma recuperação da indústria naval
brasileira, que percorreu 20 anos de desindustrialização. Contudo a história nos mostrou que
uma indústria dependente do mercado interno, sendo este o precursor do aquecimento atual do
setor, e de políticas protecionistas, se torna uma indústria vulnerável às variações do mercado,
caracterizando o principal fator da decadência do setor nos anos 80.

Segundo Fadda (2004), para a indústria de construção naval apresentar condições


de enfrentar os ciclos de altos e baixos do mercado, deve estar capacitada e disposta a
aproveitar os recursos disponíveis em uma base global. No âmbito global as oportunidades
econômicas tornam-se maiores, e os estaleiros até então restritos ao seu mercado local
encontram a possibilidade de expandir seu horizonte de negócios em outros países, permitindo
a oferta de produtos mais baratos e com prazos menores. Porém, essa nova era da economia
também impacta na geração acirrada da concorrência, em que os estaleiros disputam cada vez
mais espaços no mercado global impulsionando a competitividade.

E para que a indústria naval brasileira possa acompanhar o ritmo do mercado


global e garantir uma brecha para poder se consolidar, é necessário o desenvolvimento de uma
indústria em nível competitivo. Entretanto nenhuma empresa é um elo isolado em uma
indústria, conforme afirma Coutinho et al. (2006), e sim, pertencente a uma cadeia de
atividades correlacionadas. A consolidação da indústria de construção naval necessita não só
de estaleiros eficientes, mas também do desenvolvimento de toda a cadeia atuante do
segmento, desde políticas econômicas favoráveis, mão de obra qualificada, e o principal, uma
cadeia de suprimentos sólida.

A competitividade na indústria naval é proveniente de sua capacidade de gestão


do processo produtivo. Sem produtividade ou sem a eficiência do processo produtivo
6
dificilmente um estaleiro vai sobreviver no mercado. A nacionalização da cadeia de
suprimentos é fator estratégico para que os estaleiros insiram no âmbito global de maneira
competitiva, principalmente, em termos de estrutura de custo e tempo de entrega da obra. Em
extremo oposto, uma cadeia de suprimentos desarticulada pode ser um gargalo à
competitividade dos estaleiros nacionais, sendo que os custos de transporte e custos de
transação relacionados à importação favorecem essa substituição por fornecedores locais.

1.2. Objetivo geral

O presente trabalho tem como objetivo, abordar a indústria de navipeças inserida


no mercado de construção naval nacional, no sentido de aprofundar o conhecimento sobre sua
atuação no setor, e sua participação para o desenvolvimento da competitividade na indústria
naval brasileira em uma esfera global.

1.3. Objetivos específicos

• O objetivo inicial do trabalho é identificar as principais características da indústria de


construção naval nacional.

• Verificar a perspectiva do mercado atual.

• O panorama onde se insere a cadeia de suprimentos

• A atuação dos fornecedores nacionais de navipeças no setor.

• E os principais gargalos da indústria navipeças brasileira.

1.4. Metodologia

O estudo baseou-se em pesquisa bibliográfica recente, o que permitiu levantar e


analisar os principais aspectos estruturais da indústria de navipeças nacional e as principais
práticas internacionais. Inicialmente, com base em Moura (2008) e Coutinho et al. (2006),
realizou-se a revisão bibliografia para identificar as principais características da indústria
naval brasileira. No sentido de compreender a construção naval em uma abordagem

7
econômica global, foram revisados estudos realizados por Fadda (2004). E para aprofundar o
conhecimento sobre a indústria de navipeças, realizou-se a revisão bibliográfica do estudo
feito por Favarin et al. (2008), entre outros autores que na medida do desenvolver da pesquisa
serão citados.

1.5. Delineamento do trabalho

Na introdução foi descrito em forma sucinta o cenário atual da indústria naval


nacional, abrangendo os principais elos da cadeia, que serão analisados para levantamento das
informações deste trabalho. O segundo capítulo do estudo compreende o segmento base, a
construção naval nacional, descrevendo um resumo histórico do setor e a identificação das
principais forças atuantes da cadeia, além de suas características estratégias em ambiente
político e econômico, e as perspectivas atuais e futuras de atuação no mercado. O terceiro
capítulo reuniu informações sobre a cadeia de navipeças, dados nos aspectos mercadológicos
nacionais e as oportunidades de entrada de novos fornecedores. E por fim, o quarto capítulo
é realizado a conclusão do trabalho.

8
2. CONSTRUÇÃO NAVAL NACIONAL
2.1. Breve histórico

A indústria de construção naval brasileira surge através do pioneirismo de Irineu


Evangelista de Sousa, fundador do primeiro estaleiro brasileiro em 1845, localizado na região
de Ponta de Areia na cidade de Niterói, Rio de janeiro. Irineu Evangelista de Sousa era um
homem visionário, mais conhecido pelos títulos de nobreza recebidos; de barão e de visconde
com grandeza de Mauá. Durante 11 anos à frente do estaleiro foram construídos 72 navios, a
vapor e a vela. O estaleiro foi destruído por um incêndio em 1857 e reconstruído três anos
depois, mas por força da lei criada em 1860 isentando a entrada de navios construídos no
estrangeiro, o estaleiro foi à falência. (MOURA, 2008).

Apesar das iniciativas visionárias do Barão de Mauá, a indústria de construção


naval passou a ter certa relevância um século depois, a partir de 1958. Com o plano de metas
do governo Juscelino Kubitschek, foi definido estímulos às empresas do segmento, visando à
recuperação, ampliação e renovação da indústria de construção naval. (VELASCO e LIMA,
1997). O Fundo da Marinha Mercante (FMM) e o Adicional de Frete para Renovação da
Marinha Mercante (AFRMM) são criados subseqüentes aos planos de metas, com objetivos
de incentivar o mercado nacional e desestimular a importação e afretamento de embarcações
de bandeira estrangeira, e conseqüentemente, assegurar a produção dos estaleiros nacionais
(MOURA, 2008).

Na década de 70 foi criado o primeiro Plano de Construção Naval (I PCN), com


essa iniciativa do governo, foi possível obter resultados bastante favoráveis para o
desenvolvimento da indústria naval, sendo que os armadores tiveram a aquisição de novas
embarcações favorecida pelo financiamento, inicialmente integral, e pela proteção da
concorrência internacional. Tais medidas protecionistas possibilitaram ao Brasil, colocar-se
como o segundo maior parque mundial de construção naval em volume de processamento de
aço, ficando atrás somente do Japão. Com isso os estaleiros nacionais passaram a ter suas
carteiras preenchidas, novos estaleiros foram fundados e outros foram ampliados e
modernizados. (PASIN, 2002). Segundo publicação do Departamento Intersindical de
Estatística e Estudos Socioeconômicos - DIEESE (1998), o crescimento do segmento neste
período contribuiu significativamente para o desenvolvimento da indústria nacional de
fornecedores, chegando a um potencial capacitivo de fabricar quase tudo que um navio

9
precisava. Nesse mesmo período foram criadas novas unidades de ensino para a
especialização da mão de obra.

A decadência da construção naval brasileira teve inicio na década de 80,


acarretada pela queda da demanda do mercado interno, ocasionadas pela crise internacional
do petróleo dos anos 70 e pela crise econômica interna em que o Brasil enfrentava no período.
A desestabilidade econômica do país nesta época causou a alta das taxas de juros, tornando-se
insuportáveis os financiamentos de longo prazo, o que impediu que os armadores nacionais
adquirissem novas embarcações. (DIEESE, 1998).

Gráfico 1 – Empregos na Construção Naval.


Fonte: Adaptado do DIEESE (1998).

A partir de 1979, como se observa no gráfico 1, o país regrediu de maneira


contínua o nível de empregos no setor, que nos anos de ouro da construção naval como foi
chamada a década de 70, atingiu o patamar de 40 mil empregos, no final dos anos 90 chegou
ao seu nível mais baixo, quase uma desativação completa da indústria (DIEESE, 1998).

A dependência dos estaleiros brasileiros pelo limitado mercado interno, fez com
que desabassem juntamente com os armadores que não suportaram a crise. Ao contrário do
Brasil, os concorrentes asiáticos (Japão e Coréia do Sul) perceberam a necessidade de
competir no mercado global, e adotaram estratégias que visavam o mercado voltado para
exportação, com a estratégia de custo baixo e priorizando a capacitação tecnológica e a

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eficiência produtiva. O resultado destas estratégias completamente opostas levou os estaleiros
asiáticos a controlar mais de 75% do mercado mundial, enquanto os estaleiros brasileiros
como já foi visto, entraram em crise juntamente com seus únicos clientes, os armadores
brasileiros. (VELASCO e LIMA, 1997).

2.2. Aspectos gerais da indústria de construção naval

A indústria de construção naval possui essencial importância para o


desenvolvimento sócio-econômico de um país, caracterizando-se como uma indústria
estratégica pela movimentação de grandes contingentes de recursos, geração de empregos e a
elevação da demanda de diversos outros segmentos na cadeia de suprimentos (PINTO et al.,
2006). Pode-se avaliar a importância dessa indústria através do fato de que mais de 70% das
mercadorias comercializadas mundialmente é realizado por via marítima ou por hidrovias,
sendo que para o comércio exterior brasileiro esta via de transporte chega a 95%. Através
destes fatos, entende-se a construção naval como um elo vital no processo de
desenvolvimento econômico mundial, tendo o navio como integrador da logística de
transportes. (ABDI, 2008).

Segundo Queiroz (2009), a indústria de construção naval tem como definição


gerar meios necessários para atender a demanda dos armadores, assim estes, apresentarem ao
mercado a competência de transporte marítimo. A posição geográfica de um pais e a
capacidade de produzir navios e possuir frota própria é considerada uma necessidade
estratégica, principalmente, na redução de gastos com fretes e afretamentos, sendo este um
elemento indutor dessa indústria (QUEIROZ, 2009).

A construção naval, segundo Sabbatini et al. (2008), é um segmento que está


exposto diretamente aos ciclos do mercado e que convive com altos riscos devido ao fato do
navio ser um produto considerado de valor elevado se comparado a diversos outros produtos,
pois possuir um tempo de produção entre a encomenda e a entrega do produto, que pode
variar de 6 a 24 meses ou mais, o que pode provocar instabilidade na lucratividade dos
estaleiros. Partindo de uma visão mais abrangente, Queiroz (2009), ilustra a construção naval
como uma das atividades inserida no ambiente da indústria marítima, dentre um conjunto de
outras atividades distribuídas por diversos setores correlacionados, tais como, reparação
naval, fornecimento de equipamentos marítimos, operações de apoio portuárias e offshore,

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entre outras atividades que certamente são influenciadas a partir da movimentação do setor,
como poder ser visualizado na figura 1.

Figura 1 – Complexos Produtivos da Indústria Marítima.


Fonte: QUEIROZ (2009) Adaptado de Moura, Botter e Silva (2007).

Através dos mais diferentes segmentos no âmbito marítimo, como citado acima,
surge à demanda pela indústria de construção naval. De acordo com ABDI (2008), verifica-se
que a demanda potencial de contratação de navios em estaleiros nacionais é regida
basicamente por quatro fatores, são eles:

a) Crescimento da demanda por transportes;


b) Substituição dos navios sucateados;
c) Substituição de navios devido às imposições de normas e regulamentos internacionais;
d) Avanços tecnológicos e adequação às necessidades do tráfego.

2.3. Cadeia da construção naval

Coutinho et al. (2006) define a construção naval como pertencente a um elo


importante dentro de uma cadeia, e não como um setor isolado, um elo envolvendo diversos
outros segmentos que são afetados direta ou indiretamente com o desenvolvimento ou
retrocesso dessa correlação. Em uma visão mais detalhada, Coutinho et al. (2006), identifica
os principais agentes pertencentes da cadeia, a fim de aprofundar o conhecimento do poder de
atuação de cada participante, figura 2.

12
Figura 2 – Principais agentes e relações na cadeia de construção naval.
Fonte: COUTINHO et al. (2006).

Legenda
a) Venda de produtos siderúrgicos.
b) Venda de sistemas de propulsão, equipamentos, componentes diversos, blocos semi-acabados.
c) Desenvolvimento de projetos, treinamento.
e) Venda de projetos: design, processo produtivo e layout, seleção de fornecedores etc.
f) Venda direta de embarcações novas ou serviços de reparo.
g) Venda indireta de embarcações novas.
h) Venda direta de embarcações novas ou serviços de reparo, inclusive para marinha de guerra.
i) Política de compra, financiamento subsidiado para instalação/expansão de estaleiros e
regulamentação de produtos.
j) Financiamento para compra de embarcações novas.
l) Venda indireta de embarcações novas e venda direta de embarcações usadas.
m) Financiamento para compra de embarcações novas no mercado doméstico e regulamentação de
transporte aquaviário.
n) Contratação de serviços de certificação, classificação e inspeção de projetos, produtos e processos.
p) Certificação, classificação e inspeção de projetos, produtos e processos.

O armador pertence ao elo mais forte dessa cadeia, uma vez que os estaleiros
produzem navios sob encomenda para os armadores, os quais colocam seus requisitos de
projeto, porte, velocidade, tipo de carga, rotas de operação, de acordo com as oportunidades
de mercado existentes. Os armadores são agentes responsáveis por explorar comercialmente a
13
embarcação, compostos normalmente por empresas de navegação, que oferecem serviços de
transporte e ou apoio marítimo. (CUNHA, 2006).

De acordo com Queiroz (2009), os estaleiros possuem papel fundamental dentro


da cadeia, organizando todo processo de produção e gerindo os contratos junto aos
fornecedores de navipeças e serviços, a fim de garantir um andamento de insumos compatível
com a programação do projeto. Sendo o estaleiro agregador de todas as partes do navio e
responsáveis pela entrega do produto final, poderiam representar naturalmente o principal elo
dessa indústria (QUERIOZ, 2009).

A construção naval é uma indústria dependente de mão-de-obra e de fornecedores


de materiais, conforme cita Coutinho et al. (2006), encarregando assim, o segmento de
navipeças com um papel decisivo na cadeia de construção naval, participando diretamente na
estratégia de organização da produção do estaleiro, e na inserção de tecnologia no setor. Para
Coutinho et al. (2006), os custos associados à construção ou aquisição de e equipamentos
também são compreendidos como um dos elementos determinantes para a competitividade na
indústria naval.

O governo interfere por meio de mecanismos diretos e indiretos em todos os elos


da cadeia, influenciando a instalação, expansão, sustentação da indústria e a oferta de
transporte marítimo, impondo limitações em termos operacionais e no porte das embarcações,
em atendimento a requisitos de segurança ambiental e trabalhista. A reserva de mercado é o
tipo de estratégia política mais utilizada, especialmente para navegação de cabotagem, através
do afretamento de embarcações de bandeira nacional. Os estaleiros também encontram
importante suporte para investimentos direcionados a expansão e modernização da capacidade
produtiva, por meios de financiamentos realizados por bancos estatais ou agências
governamentais. (COUTINHO et al. 2006).

2.4. A competitividade da indústria de construção naval

Segundo Fadda (2004), a definição de mercado global é a busca em satisfazer as


demandas mundiais comuns, onde, a concorrência global é enfrentada em muitos outros
países. Um exemplo citado pela autora é o que vem ocorrendo com os maiores estaleiros do
mundo: os asiáticos disputam com os estaleiros europeus, os mercados de embarcações
sofisticadas. Um estaleiro inserido no mercado global deve estar preparado para maiores
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riscos, e ao mesmo tempo para maiores oportunidades. Os riscos advêm do aumento da
pressão competitiva, enquanto as oportunidades de mercados compreendem a um nível
mundial. (FADDA, 2004).

As estratégias do tipo “country-centered strategy” tomada por alguns países,


caracterizada por uma indústria com base no mercado nacional ou regional, utilizando-se de
vantagens competitivas protecionistas, principalmente nos casos de fornecedores de matérias-
primas e dos fornecedores de equipamentos e acessórios. Trata-se de uma estratégia de baixa
dimensão, onde, uma indústria de construção naval limitada somente ao mercado interno, não
é capaz de suportar os concorrentes inseridos no mercado global. O tipo de estratégia “simple
global strategy” abraça o mercado global adotando uma base exportadora, sendo está uma
estratégia de maior dimensão e poder competitivo. (FADDA 2004).

No desenvolver da pesquisa com o objetivo de identificar as forças competitivas


da indústria de construção naval, diversos autores (FADDA, 2004; CUNHA, 2006; MOURA,
2008) tomaram como referência o modelo analítico de Porter (1986), que definiu o estado de
competição em uma indústria de construção naval, como função de cinco forças competitivas
básicas (Figura 3), que são: concorrentes na indústria de construção naval, entrantes
potenciais, armadores, fornecedores e substitutos.

Figura 3 – Forças Competitivas na Indústria de Construção Naval.


Fonte: FADDA (2004) apud PORTER (p.541, 1986).

15
2.4.1. Concorrentes da indústria de construção naval

A competitividade resulta de estratégias adotadas pelas empresas para aumentar a


sua obtenção de rentabilidade no mercado. Na indústria naval a competitividade é proveniente
de sua capacidade de gestão do processo produtivo: sem produtividade ou sem a eficiência do
processo produtivo, dificilmente um estaleiro vai sobreviver no mercado. Existem diferentes
estratégias de vantagem competitiva tomadas pelos estaleiros, principalmente, em termos de
estrutura de custo, capacidade financeira, nível de tecnologia, padrões de qualidade e tempo
de entrega do produto. (CUNHA, 2006).

2.4.2. Entrantes potenciais

Os governos locais possuem grande interesse na entrada de novos concorrentes na


indústria, assim, estão sempre dispostos a financiar e auxiliar a entrada de novos estaleiros,
criando facilidades para superar barreiras, dado ao interesse estratégico gerado pela indústria
de construção naval visando os impactos positivos na economia. A principal barreira
enfrentada pelos novos estaleiros é a curva de aprendizagem ou de experiência,
principalmente, a indústria naval sendo intensiva de mão de obra. Conforme o estaleiro
acumula maior experiência no processo produtivo de uma embarcação, o custo de fabricação
tende a diminuir, a mão de obra torna-se mais eficiente, assim, podendo oferecer para o
mercado um produto com menores custos. A pouca experiência gera custos mais altos do que
as empresas já estabelecidas, tendo que suportar prejuízos iniciais significativos, devido à
necessidade de fixar preços abaixo ou aproximadamente iguais aos custos, de modo a
acumular a experiência até conseguir a competir com as empresas estabelecidas. (FADDA,
2004).

2.4.3. Armadores

O armador, elemento indutor dessa indústria, ao escolher um estaleiro para


construir sua embarcação leva em consideração preço, prazo, qualidade. O prazo de entrega é
um critério de importância para a maioria dos tipos de embarcações, já preço é mais
significativo para o armador, quando se trata da compra de embarcações menos sofisticadas
como os navios tanques, graneleiros e navio de carga geral. A qualidade é mais importante na

16
compra de embarcações de alta tecnologia, tais como, navio-contêiner, LNG (liquified natural
gás) e navio de passageiros. O poder de negociação dos armadores é fundamental em relação
aos aspectos de escolha do estaleiro construtor, mas isto depende do tipo e o volume de
compra na indústria naval. Os armadores que adquirem embarcações em grandes volumes
ampliam sua importância nos resultados produtivos dos estaleiros, e armadores que são
bastante sensíveis ao preço buscam embarcações mais padronizadas possíveis ou não se ateêm
à qualidade da embarcação. (FADDA, 2004).

2.4.4. Fornecedores

Fadda (2004) ressalta que a construção naval é uma indústria montadora,


altamente dependente de mão de obra e de fornecedores. Portanto, os fornecedores podem
exercer maior poder de negociação sobre cadeia de uma indústria, ameaçando elevar preços
ou reduzir a qualidade dos bens e serviços fornecidos. No segmento da construção naval a
cadeia de suprimentos é caracterizada por um número reduzido de fornecedores no mercado,
principalmente, aqueles capacitados e aprovados pelas sociedades classificadoras a fornecer
para o segmento, o que por muitas vezes pode implicar na irregularidade no prazo de entrega
dessa matéria-prima. Dessa forma os fornecedores possuem grande poder de barganha sobre
os estaleiros, pois, conforme Fadda (2004, p.08):

“Os fornecedores poderosos podem afetar a competitividade de uma


empresa com base nos preços que eles podem comandar, a qualidade
daquilo que fornecem e o tratamento dispensado aos clientes
preferenciais. No caso da construção naval, os fornecedores japoneses de
motores e máquinas para a indústria naval desempenham um papel
determinante na competitividade mundial de construtores navais.”

2.4.5. Substitutos

A pressão dos substitutos, assim chamado pela autora, empresas que competem
com outros segmentos, porque seus produtos podem ser substituídos pelo concorrente. No
caso da indústria naval cita-se como exemplo a pressão competitiva em que empresas de
transporte de graneis líquidos sofreriam com os oleodutos que seriam construídos ao longo do
litoral do país. A substituição do transporte marítimo pelos oleodutos implicaria na redução da
demanda por navios tanque, afetando diretamente os estaleiros que teriam redução de sua
produção. (FADDA, 2004).
17
2.5. Mercado atual

Como foi citado anteriormente por Velasco e Lima (1997), a construção naval
nacional sofreu uma grande retração na segunda metade da década de 80, após atingir seu
auge. Durante um longo período não houve demanda por construções de grande porte e a
indústria ficou limitada ao reparo de navios e construções de pequeno porte. O grande
problema dos estaleiros brasileiros segundo Velasco e Lima (1997), não é falta de encomendas,
mas a falta de capacidade para competir com o mercado internacional, disputando os espaços
existentes junto aos armadores europeus e americanos, com produtos diferenciados e de alta
qualidade, desafio este a ser enfrentado pela indústria nacional. Para ilustrar esta situação,
Velasco e Lima (1997, p.03) lembram que:

“Dos 61 navios financiados no período 1985/94, apenas 15 foram


entregues rigorosamente dentro do prazo contratual, sendo que o atraso
médio dos demais superou 24 meses, período maior que o previsto para a
própria construção.”

A demanda por novas embarcações está intensamente relacionada com os ciclos


de crescimento da economia mundial. E as receitas que sustentam o fluxo da cadeia de
construção originam-se inicialmente no mercado de frete, no qual os armadores são
remunerados pelo afretamento de suas embarcações. (CUNHA, 2006).

No momento atual, segundo Silva (2008), as expectativas da indústria naval


brasileira para uma retomada e consolidação do setor estão aquecidas, em conseqüência da
demanda por navios do setor de petróleo e da marinha mercante de cabotagem, representada
pelas encomendas de armadores nacionais como, Petrobras, Transpetro e da Log-In (Vale).
Silva (2008) ressalta ainda, que a crise nos anos 80 se formou a partir do petróleo, e que
também neste momento, é o petróleo que vem dinamizar a indústria naval nacional.

A Transpetro subsidiária da Petrobras lançou em 2004, o programa intitulado


PROMEF (Programa de Modernização e Expansão da Frota). O programa tem objetivos de
atender as necessidades de renovação e de ampliação da capacidade da sua frota de
petroleiros. Estes objetivos, no entanto, não se resumem somente a atender a demanda interna
da Transpetro, mas também promover a geração de postos de trabalho, e a recuperação da
capacidade de construção de navios de grande porte da indústria naval brasileira, recolocando
o país no mercado fornecedor mundial. (CUNHA, 2006). Atualmente o Brasil, que já foi o
18
segundo maior produtor mundial, de acordo com a Transpetro (2009), se encontra em oitavo
lugar em encomendas e quinto de petroleiros no ranking mundial, mas pode melhorar
sensivelmente sua posição. Isto porque, os maiores produtores Japão, Coréia e China estão
com suas carteiras tomadas até o final de 2010, o que abre possibilidades concretas para o
Brasil (MASSAÚ, 2006).

Na primeira fase de encomendas do PROMEF (2005-2007) foi licitada e contrata


a construção de 26 navios de longo curso, que serão construídos nos estaleiros Mauá,
Atlântico Sul, Rio Naval, Estaleiro Ilha e Itajaí. A segunda fase de licitação (2008) foi
ampliada de 16 para 23 navios (Veja Tabela 1 - Encomendas do PROMEF por tipo de navio,
2007-2012). A princípio o índice de nacionalização dos navios foi estabelecido em 65% na
primeira fase e em 70% na segunda fase. (ABDI, 2008).

Tabela 1 – Encomendas do PROMEF por tipo de navio, 2007-2012 (em unidades).

Fonte: TRANSPETRO (2007).

As compras realizadas por armadores nacionais representam cerca de 90% de toda


a demanda. Além dos petroleiros encomendados pela Transpetro, a cabotagem tem
apresentado crescimento acelerado no período recente, estima-se em cerca de 50 novos navios
a oferta por transporte de cabotagem para os próximos 10 anos. A Petrobras encomendou a
construção de 146 embarcações de apoio marítimo e 40 navios-sonda, devido ao aumento da
exploração de petróleo offshore. A expansão dos portos brasileiros, de acordo com o autor,
exigirá entre 50 e 60 novas embarcações de apoio portuário. Também foi identificada uma
demanda por reparos navais em volume significativo, baseado no reparo programado que
abrange cerca de 70% das docagens no Brasil. (FAVARIN et al., 2008).

19
As encomendas locais possuem papel fundamental para desenvolvimento da
formação e qualificação da mão de obra e do fornecimento de navipeças a níveis
competitivos. A escala destas encomendas pode permitir que os estaleiros invistam em
modernização e ampliação da capacidade produtiva e atualizem-se tecnologicamente,
colocando-os no rumo de uma curva de aprendizado capaz de reposicionar a indústria
brasileira como um produtor relevante no mercado global, especializando-se em embarcações
relacionadas à exploração de petróleo offshore (plataformas, navios-tanque e navios de
apoio). (ABDI, 2008).

Os principais parques produtivos nacionais estão instalados nos estados do Rio de


Janeiro, Santa Catarina, Pará, Amazonas, São Paulo, Rio Grande do Sul e Ceará, cabendo
ressaltar que de acordo com Silva (2008), Pernambuco assumiu a dianteira com a construção
do maior estaleiro do Brasil (Atlântico Sul), com capacidade de processar a ordem de 160 mil
toneladas de aço por ano e construir navios de meio milhão de toneladas. O valor total
contratado pelos estaleiros entre os anos de 2003 e 2006 foi de mais de US$ 801 milhões
(Veja Tabela 2 - Valor contratado aos estaleiros nacionais no período de 2003-2006), gerando
36 mil empregos diretos (SINAVAL, 2007).

Tabela 2 – Valor contratado aos estaleiros nacionais no período de 2003-2006.

Fonte: SINAVAL (2007).

Como pode ser observado na figura 4 as embarcações de apoio marítimo


representavam 69% do volume contratado aos estaleiros nacionais, nos anos de 2003 a 2006,
sendo um nicho em franca expansão no mundo. Segundo Queiroz (2009), a capacidade de
processar aço neste período girava em torno de 300 mil toneladas por ano, enquanto no ano de
2002 foi registrado um processamento inferior a 30 mil toneladas.
20
Figura 4: Distribuição das contratações realizadas a estaleiros nacionais por tipo de embarcações.
Fonte: SINAVAL (2008).

Segundo estudo de Amarante et al. (2008), além da reestruturação dos


estaleiros e a escassa mão de obra qualificada, a indústria naval enfrentará dificuldades
associadas ao fornecimento, principalmente para alcançar níveis de nacionalização adequados.
A dependência externa na obtenção de produtos intervém diretamente nos aspectos logísticos,
onde, o sistema de produção de um estaleiro é adaptado, para evitar períodos de inatividade
causados por problemas de transição do produto, e ainda, agrega o aumento de estoques. A
proximidade geográfica de fornecedores gera vantagens nesses aspectos, podendo assim,
prover a consolidação do segmento. (Amarante et al., 2008). Neste mesmo estudo foram
levantados os principais problemas encontrados pelo setor, são eles:

• Escala: a baixa escala de produção dificulta a diluição dos custos fixos e a baixa escala de
compras inviabiliza descontos por volume. Exemplos: a baixa escala de produção de
trocadores de calor (inviabilizando a produção em série) e a baixa escala de compra de
motores principais importados;

• Logística: o custo de transporte impacta o valor do material importado, além da necessidade


de fretes internos. Exemplo: frete, seguros e custos portuários para importação de motores
principais, provenientes de países asiáticos;

• Tecnologia: os processos obsoletos de produção impactam na qualidade do produto e no


custo de aquisição de tecnologia. Exemplo: a inexistência de fornecedores locais com projetos
de molinetes para petroleiros leva à necessidade de licenciamento;
• Insumos: necessidade de importação de insumos ou disponibilidade local de menor
qualidade. Exemplo: necessidade de importação de barras de aço usadas nas amarras;

21
• Impostos de importação: a carga tributária sobre componentes importados impacta nos
custos de produção. Exemplo: a carga tributária sobre os queimadores das caldeiras a óleo
onera os custos de produção (AMARANTE et al., 2008, p. 07).

Os dois primeiros fatores são considerados pelo autor, como as principais


barreiras a serem enfrentadas pela indústria de construção naval brasileira. Os argumentos se
inserem através da baixa demanda interna de determinados equipamentos, sendo necessária
demanda de mercado externo para a viabilidade de implantação em território nacional, assim,
sem que se criasse a dependência do fornecedor externo. Os custos logísticos abrangem
aproximadamente 10% do valor importado, que naturalmente são agregados ao valor final da
embarcação, dificultando qualquer âmbito de competitividade. (Amarante et al., 2008).

2.6. Processo de financiamento

Para o segmento da construção naval nacional, o Fundo da Marinha Mercante


(FMM) é a principal fonte de financiamento dos armadores para a aquisição de navios,
segundo Silva e Martins (2007). O FMM tem origem da arrecadação tributária sobre tarifas
de frete, chamado de Adicional ao Frete para a Renovação da Marinha Mercante (AFRMM),
paga pelas empresas de navegação que utilizam os portos brasileiros (SILVA e MARTINS,
2007).

As taxas do AFRMM, segundo Silva e Martins (2007), são as seguintes:


- 25% nos fretes de importação;
- 10% na cabotagem;
- 40% na navegação interior (neste caso, aplica-se apenas para granéis líquidos).

Atualmente o uso do FMM estabelece três etapas operacionais, conforme afirma


Silva e Martins (2007): a primeira caracteriza-se pela verificação da prioridade do projeto da
embarcação, certificando-se a mesma se está de acordo com as metas da Política da Marinha
Mercante, estabelecidas pelo Departamento da Marinha Mercante (DMM). A segunda etapa
consiste em uma análise da empresa por meio de consulta prévia, e caso o parecer seja
favorável ao projeto, a documentação será encaminhada para o Banco Nacional de
Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) ou outros bancos oficiais federais (Banco do

22
Brasil, Banco do Nordeste e Banco da Amazônia). E por fim, ocorre a análise de viabilidade
financeira do projeto, onde é fixado o valor a ser financiado, as taxas, prazos e as garantias de
pagamento. (SILVA e MARTINS, 2007).
Tendo como agente financiador o BNDES, as condições atuais de financiamento
para a construção, modernização e reparo de embarcações para armadores que registrarão seus
barcos no REB - Registro Especial Brasileiro ou visam à exportação, são informadas na
Tabela 3.

Tabela 3: Embarcações Registradas ou Pré-registradas no REB (Registro Especial Brasileiro)

Fonte: BNDES (2009).

Os financiamentos do FMM, geralmente, oferecem taxas diferenciadas


proporcionais ao índice de nacionalização. Os projetos com conteúdo local acima de 60%
possuem uma redução na taxa de juros de 0,5% ao ano (BNDES, 2009). Assim, de acordo
com Coutinho et al. (2006), construir em território brasileiro aparentemente é mais vantajoso,
já que a carga tributária aplicada a importação de embarcações gira em torno de 52%,
podendo variar em função do estado, além da possibilidade do armador ter ao acesso do
financiamento da FMM.

3. INDÚSTRIA DE NAVIPEÇAS

Segundo Coutinho et al. (2006), o segmento de navipeças possui papel


fundamental na cadeia da construção naval, principalmente quanto ao nível competitivo e
estratégico do sistema produtivo de um estaleiro. A relação de cooperação entre construtor e
fornecedor é extremamente importante para atender exigências de prazos, custos e qualidade,
principalmente em sistemas de produção Just in time1 (COUTINHO et al., 2006).

Como foi citado anteriormente, a indústria de navipeças nacional já foi bastante


significativa, com capacidade de fornecer praticamente todos os equipamentos necessários

23
para uma embarcação, até mesmo, motor-principal de diferentes marcas e hélices, dentre
outros equipamentos, mas, não a um nível competitivo. A falta de demanda interna e com a
abertura do mercado nos anos 90, levou o setor de navipeças brasileiro a não suportar a
concorrência das empresas do exterior. Grande parte foi à falência e as que permaneceram
tiveram que migrar para outros segmentos e se adaptar para atender o setor. (DIEESE, 1998).

Para melhor entender a relevância das navipeças, é importante ressaltar os


principais componentes geradores de custo de uma embarcação, sendo que Queiroz (2009)
identifica como os três principais fatores: o aço, navipeças (máquinas e equipamentos) e mão
de obra. Os dois primeiros caracterizam os fornecedores, e a mão de obra é destinada ao
construtor (estaleiro). Em embarcações de longo curso, figura 5, o aço representa de 15 a
20% e as navipeças representam de 55 a 60%, portanto, cerca 75% do valor total da
embarcação é destinada para obtenção materiais e equipamentos necessários para construção e
somente 15% a produção (QUEIROZ, 2009).

Figura 5 – Estrutura de custos de produção de um navio.


Fonte: QUEIROZ (2009) apud KANERVA (2004).

A figura 6, mostra uma visão geral da cadeia que entrelaça o fornecedor o


construtor e o cliente final, desenvolvido por Favarin et al. (2008), em que, através dos
requisitos básicos exigidos pelo armador, sendo ele o cliente final, o projeto detalha todas as
peças e equipamentos necessários para atender os requisitos, e os fornecedores de navipeças
entram com a função de suprir esta demanda com o produto adequado dentro dos parâmetros
exigidos pelo projeto, para que o estaleiro possa fazer o processo de construção da
embarcação. Já o papel da classificadora é certificar que o navio construído atenda aos
requisitos técnicos de qualidade e segurança.

1
Just in time é um sistema de administração da produção que determina que nada deve ser produzido,
transportado ou comprado antes da hora exata. (WIKIPÉDIA, 2009).

24
Figura 6 - Principais agentes envolvidos na indústria de construção naval.
Fonte: FAVARIN (2008).

3.1. Participação das navipeças no mundo

O Japão é uma das grandes potências em construção naval, e é exemplo, de que


para consolidar uma indústria competitiva, é necessário contar com uma cadeia de
suprimentos que seja capaz de atender as necessidades do mercado. O Japão possui um nível
de nacionalização de 98% dos equipamentos empregados na construção de navios. Em 2000,
sua indústria de fornecedores tinha uma base de 741 empresas com um total de 33.000
empregos diretos. A indústria de navipeças da Coréia do Sul fornece cerca de 90% dos
equipamentos. Nesses países há um forte desenvolvimento compartilhado de projetos, e o fato
de que a cadeia de suprimentos se localiza no entorno dos estaleiros demonstra a importância
da proximidade física, caracterizando-se assim, como um fator determinante para
competitividade. (FAVARIN, 2008).

3.2. Prática internacional do setor de navipeças

No início dos anos 80 os estaleiros chegavam a produzir entre 70 a 80% do valor


total da embarcação, o aumento do outsourcing2 por parte dos estaleiros lideres passaram a
produzir cerca de 20 a 30% em suas próprias instalações. O outsourcing se tornou uma prática
indispensável para a redução do tempo de produção e extremamente fundamental para
geração de competitividade no mercado global. Com esta tendência a cadeia de fornecedores
está cada vez mais integrada aos processos de fabricação de uma empresa, e desta forma os
principais estaleiros do mundo passaram a dividir a sua produção através da terceirização,
com ganhos significativos na redução de custos e prazos, transformando os estaleiros em
montadores. (QUEIROZ, 2009).
2
Outsourcing designa a ação que existe por parte de uma organização em obter mão-de-obra de fora
da empresa, ou seja, mão-de-obra terceirizada (WIKIPÉDIA, 2009).

25
Conforme Sabbatini et al. (2007) afirma, a metade da força de trabalho por parte
dos estaleiros asiáticos e europeus é terceirizada, substituindo grande parte da mão de obra
direta, assim, ficando sob responsabilidade dos fornecedores exercerem atividades de
montagem e instalação de materiais e equipamentos, entregando o sistema completo e pronto
para funcionar. Os resultados associados à diminuição de mão de obra, através da utilização
do outsourcing são bastante favoráveis, de acordo com Sabbatini et al. (2007), principalmente
nos países desenvolvidos, onde, os custos da mão de obra são elevados, a tabela 4 mostra
que, a terceirização gerou significativa redução de custos nas indústrias coreana e japonesa, e
uma pequena redução no caso dos construtores norte-americanos.

Tabela 4 - Outsourcing e Impactos nos Custos em Países Selecionados.

Fonte: SABBATINI et al. (2007).

A subcontratação reduz o número de fornecedores secundários, que fornecem


peças e componentes de menor valor agregado, agora não fornecem mais para o estaleiro, mas
para os fornecedores que prestam serviços diretamente para os estaleiros, com mão de obra
própria, reduzindo, assim também, os gastos dos estaleiros com contração e treinamento de
funcionários (COUTINHO et al., 2006). Para estes autores o outsourcing da indústria naval
pode ser definido em dois tipos. São eles:

a) “Peak outsourcing” ou terceirização tradicional: quando a mão de


obra própria é substituída por trabalhadores subcontratados que
exercem as mesmas funções produtivas dentro do estaleiro e
servem como alternativa menos custosa para compensar ciclos de
negócio: pôde-se expandir ou reduzir de forma rápida, flexível e
mais barata a mão de obra durante um boom ou uma retração de
demanda.

26
b) “Total outsourcing”: quando a subcontratação estende-se para o
fornecimento de atividades completas (“sistemas”), tais como
sistemas elétricos, sistemas de aquecimento/ventilação, áreas
comuns e circulação, blasting e pintura, montagem de blocos e
super blocos já outfitted, entre outras etapas e atividades. Tais
atividades podem ser realizadas na própria planta produtiva do
estaleiro, que oferece assim os ativos fixos para sua realização
(exemplo: galpões de pintura, oficinas de montagem, etc); ou
também realizadas nas plantas de outros estaleiros ou de
fornecedores de navipeças e entregues (e montadas e
comissionadas) no site do estaleiro, com graus variáveis (mas
crescentes) de turnkey (Coutinho et al., 2006, p.35).

Coutinho et al. (2006) ressalta, que a utilização do outsourcing requer uma total
parceria entre os dois elos, o construtor e o fornecedor, sendo o desempenho do estaleiro
dependente dos resultados desta cooperação. Entendesse assim, que o outsourcing é uma
prática de elevando risco, por outro lado, permite maximizar obtenção de lucros reduzindo os
custos e prazos de entrega, portanto, é necessário identificar os fornecedores e suas
competências, fazendo com que este tipo de fornecedor estratégico seja integrado nos
processos de desenvolvimento de produto (COUTINHO et al., 2006).

3.3. A atual indústria de navipeças nacional

As perspectivas atuais do mercado brasileiro de construção naval são bastante


favoráveis, criando assim, oportunidades para retomada do desenvolvimento de uma cadeia de
suprimentos em um nível competitivo e diversificado. A capacidade atual brasileira atinge
cerca 66% dos componentes de uma embarcação de grande porte, e poderá chegar a 82% até
2015. (MASSAÚ et al., 2006).

Através de pesquisas realizadas por Queiroz (2009), sabe-se que existe um


número variado de produtos, peças e materiais em todos os tipos de sistemas e serviços
utilizados na construção naval, fornecidos pelas indústrias de navipeças nacionais. Para
algumas classes de sistema de um navio, como as relacionadas com produtos hidráulicos e de

27
propulsão e serviços de engenharia e projetos, existe um número não desprezível de empresas
que fornecem ou já forneceram estes produtos e serviços (QUEIROZ, 2009).

Com o intuito de levantar as principais práticas da cadeia de fornecimento de


navipeças no Brasil, em uma visão micro, tendo como foco os principais estaleiros do país,
Queiroz (2009) procurara abranger as principais ações empreendidas pelas indústrias de
navipeças, bem como as ações dos fornecedores em relação à sua atuação na cadeia, e por
meio da aplicação de um questionário criou-se uma amostra correspondendo a respostas de
126 empresas de navipeças e 66 empresas de serviços. De acordo com as informações obtidas
pelos autores, representados graficamente nas figuras 7 e 8, levantou-se que 62% das
empresas fornecedoras de navipeças consideraram-se pequenas ou micro empresas pelo
critério do número de funcionários, enquanto 66% delas se consideram médias ou grandes
pelos critérios de faturamento (QUEIROZ, 2009).

Figura 7: Distribuição das empresas por porte, segundo o critério de quantidade de funcionários.
Fonte: QUEIROZ (2009).

28
Figura 8: Distribuição das empresas por porte, segundo o segundo o critério de faturamento.
Fonte: QUEIROZ (2009).

Na mesma pesquisa foi definido que cerca de 40% das empresas de navipeças e
31% das empresas de serviços pesquisadas, que atualmente atendem a construção naval
nacional, fazem o fornecimento de forma esporádica para o seu cliente do segmento. A falta
de demanda periódica aponta claramente para a carência de escala na construção naval
brasileira, e apenas 9% das empresas de navipeças e 11% das empresas de serviços apontaram
no estudo, contratos de longo prazo para fornecimento de equipamentos para mais de uma
embarcação. (QUEIROZ, 2009).

A amostragem foi mais além e buscou identificar o campo de atuação das


empresas entrevistas, e constatou-se que a grande maioria das empresas questionadas não tem
o setor naval como o principal destino de vendas. Apenas 8% dos fornecedores de navipeças
(figura 9), afirmou ter o setor naval como seu principal cliente, justificando a pouca demanda
atual da construção naval para os seus produtos (QUEIROZ, 2009).

As oscilações do mercado de construção naval atingem diretamente as


navipeças, e por causa desses altos e baixos no decorrer da história, a flexibilidade e
diversificação das indústrias fornecedoras do setor se tornam um meio de reduzir as incertezas
do mercado. Atuando em outros setores, os fornecedores garantem certa estabilidade
(FAVARIN et al., 2008).

29
Figura 9: Distribuição das empresas por setor consumidor.
Fonte: QUEIROZ (2009).

A falta de escala da demanda afeta a competitividade dos atuais fornecedores de


peças e serviços para a cadeia da construção naval, a autora afirma ainda, que não existem
garantias de que os fornecimentos atuais seriam capazes de atender o mercado requisitado
pelas encomendas da Petrobrás e Transpetro, nas exigências associadas com qualidade, preço
e prazo. Entretanto a pesquisa também revela que 75% das empresas fornecedoras de
produtos possuem expectativas de aumentar as vendas para a construção naval nos próximos
anos. Esta expectativa de crescimento da demanda está relacionada mais com a possibilidade
de maior demanda de construção do setor offshore (plataformas e embarcações de apoio) do
que a construção de navios de grande porte. (QUEIROZ, 2009).

A expectativa de crescimento associada ao setor offshore pode ser claramente


observada na figura 10, onde as plataformas e navios de apoio portuário e plataformas
correspondem a 69% do mercado demandante, mostrando que o segmento offshore seria uma
grande fonte de novos fornecedores para a indústria naval. Navios de longo curso,
embarcações militares e outros tipos de embarcação representam 31% da carteira de pedidos.
(QUEIROZ, 2009).

30
Figura 10: Principal destinação dos produtos comercializados pelas empresas.
Fonte: QUEIROZ (2009).

3.4. Cadeia de navipeças

A indústria de navipeças de acordo com Coutinho et al. (2006), é a principal fonte


de inserção de tecnologia na construção naval, que caracteriza-se com um setor bastante
diversificado com produtos de alta tecnologia e valor agregado, tais como, motores e
propulsores, e pequenas empresas fornecedoras de peças e componentes tecnologicamente
mais simples.
Segundo a Transpetro (2009) um navio pode ser composto de 20 mil a 30 mil
peças dentre dois mil itens diferentes. Estudos de Massaú et al. (2006), sustentam que a
indústria naval engloba 14 diferentes gêneros industriais e utiliza 602 matérias-primas, sendo
que alguns dos principais gêneros e subgêneros que compõem as navipeças, citados pelo autor
são:

Indústria Mecânica
- Motores
- Máquinas, aparelhos para instalação hidráulica
31
- Equipamentos térmicos, de ventilação e refrigeração
- Caldeiras geradoras de vapor
- Equipamentos de transmissão

Indústria de Material Elétrico, Eletrônico, Comunicação e Informática


- Condutores
- Capacitadores
- Fiação
- Painéis de Controle
- Peças e acessórios diversos
- Lâmpadas
- Aparelhos diversos para energia elétrica
- Aparelhos diversos para telecomunicações
- Aparelhos de “hardware” (informática)
- Geradores e transformadores
- “Softwares” diversos (gerenciamento e execução)

Indústria de Material de Transporte


- Guindastes e gruas
- Aparelhos diversos de movimentação
- Esteiras e correias transportadoras
- Empilhadeiras

Indústria de Madeira
- Madeira compensada, aglomerada e outras
- Chapas, placas e revestimentos
- Madeira arqueada

Indústria da Borracha
- Laminados
- Isoladores
- Revestimentos
- Juntas e vedadores

32
Indústria Química
- Óleos e graxas industriais
- Tintas, esmaltes e lacas
- Solventes e adesivos
- Corantes e Pigmentos

Indústria de Matéria Plástica


- Laminados planos
- Tubos, canos e conexões
- Manilhas
- Peças e acessórios para energia elétrica e comunicação
- Artefatos diversos

Eletrônica Embarcada
- Radares
- Painéis de controle
- Navegadores
- Equipamentos de localização e orientação
- Outros

3.5. Mercado de navipeças no Brasil

O faturamento da indústria de navipeças mundial corresponde cerca de 60 bilhões


de euros anualmente e, a indústria européia é uma das grandes fornecedoras, principalmente
no segmento de propulsão de geração de energia, englobando 32% deste valor, ou em torno de
19 bilhões de euros (QUEIROZ, 2009). Estimasse que a demanda da construção naval
brasileira, fornecerá um montante de US$ 269 milhões para o setor de navipeças, distribuídos
percentualmente em diversos segmentos, conforme a figura 11 (ABDI, 2008).

33
Figura 11 – Distribuição percentual do preço de navios, realizada a partir de uma amostra de navios no
Brasil (estimativa em fase de projeto) [%].
Fonte: ABDI (2008) apud COPPE (2006).

Tabela 5 – Distribuição de valores.

Demanda Montante
Instrumentos e motores US$ 141 milhões
Acessórios de casco e convés US$ 46 milhões
Acomodações US$ 63 milhões
Pintura US$ 7 milhões

Fonte: Adaptado da ABDI (2008).

A maior parte deste valor distribuído conforme a tabela 5 deverá ser absorvida
pelo mercado externo segundo a ABDI (2008). Com a demanda projetada as indústrias
nacionais não encontram viabilidade de fabricar alguns equipamentos e fornecer a valores que
possam competir com o mercado externo, que de acordo com ABDI (2008), são normalmente
equipamentos de alto valor agregado e porte tecnológico, tais como:

⋅ Motor principal
⋅ Motores auxiliares
⋅ Bombas de carga
⋅ Válvulas de carga e lastro
⋅ Sistemas de navegação e comunicação
⋅ Materiais especiais de tubulação
34
⋅ Sistemas de automação e controle
⋅ Máquinas de leme
⋅ Purificadores de óleo

ABDI (2008) aborda estudos realizados pela Transpetro, onde foi avaliado em
quais segmentos da indústria de navipeças brasileira, haveria viabilidade para serem
fabricados localmente em função da demanda do mercado. Constatou que o Brasil conta com
47 fornecedores nos seguintes produtos:

⋅ Chapa grossa
⋅ Tubulações
⋅ Tintas e solventes
⋅ Consumíveis
⋅ Caldeiras
⋅ Bombas e válvulas comuns
⋅ Eixos
⋅ Fundidos do leme
⋅ Amarras
⋅ Cabos elétricos

3.6. Gargalos da indústria de navipeças no Brasil

Para Favarin et al. (2008), os fornecedores nacionais terão que transpor um grande
desafio pela frente, devido as duas décadas de desindustrialização do setor. De acordo com o
autor, para os armadores as empresas brasileiras ainda não possuem um nível adequado para
fornecer produtos com padrões de qualidade internacional, por isso, as exigências para se
comprar localmente são menores. A reestruturação e a modernização aparecem como
dificuldades a serem vencidas pela indústria. (FAVARIN et al., 2008). A ABDI (2008)
identifica alguns dos problemas a serem enfrentados pelos fornecedores nacionais para o
aumento do conteúdo local:

a) Projeto do navio importado especifica fornecedor de fora e é hermético propositadamente;


b) Fornecedor não sabe de que peças o estaleiro precisa;

35
c) Certificação/homologação parece ao fornecedor um processo muito complicado e caro;
d) Estrutura de compras enxuta não permite uma análise muito aprofundada da lista de
compras;
e) Falta de confiança nas encomendas futuras por parte dos fornecedores;
f) Falta de confiabilidade no produto nacional por parte dos armadores;
g) Falta de fornecedores que integrem os sistemas (first tier) no Brasil.

4. CONCLUSÃO

A indústria de construção naval brasileira já passou por altos e baixos, e através


dos erros e acertos durante sua história, pode-se tomar como fonte de aprendizado para que
sejam tomadas estratégias futuras de desenvolvimento sustentável do setor, criando assim,
possibilidades de contornar todos os gargalos presentes na indústria e competir no mercado
global.

A principal vantagem identificada, na indústria naval nacional, foram os estímulos


governamentais que incentivam o mercado, entre estes se destaca a criação do Fundo da
Marinha Mercante (FMM), que possibilitou aos armadores o financiamento para aquisição de
embarcações construídas preferencialmente no Brasil. Porém, a proteção de mercado e a
dependência dos armadores nacionais por um logo período de tempo, geraram uma indústria
naval frágil às constantes mudanças do mercado econômico, pois, se a oferta está garantida e
a concorrência interna é menor, cria-se de certa forma um descuido em relação à capacitação
técnica e a eficiência produtiva dos estaleiros, sendo estes os principais mecanismos de
competitividade de uma indústria global. O índice de nacionalização exigidos nas licitações
das embarcações atua nesse sentido, e deve ser aplicado com cautela, servindo como incentivo
para a indústria local, principalmente como porta de entrada. Mas, como já foi mencionando
ao logo do estudo, vantagens protecionistas geram resultados artificiais e de curto prazo, pois,
pode criar um maior poder de barganha dos fornecedores locais, o que, aumenta os custos dos
armadores para cumprir tais exigências.

O momento atual da indústria naval brasileira está aquecido pela demanda interna.
Os estaleiros estão com suas carteiras preenchidas de obras, e o montante desta demanda
ocupará os estaleiros nacionais por alguns anos. Mas em uma perspectiva de longo prazo, é
necessário pensar além da demanda atual, e criar estratégias com base na competitividade

36
perante o mercado global, que impactarão no desenvolvimento contínuo da indústria,
capacitando-a, a enfrentar as variações da economia local e não de vantagens superficiais
protecionistas. De acordo com a revisão bibliográfica, a indústria de construção naval deve
estar preparada para aproveitar os recursos disponíveis em uma base global, portanto, um
estaleiro nacional para sobreviver, necessariamente terá que produzir navios para exportação e
competir no mercado internacional.

Para tanto, a indústria de construção naval necessita uma série de condições para
permanecer no mercado, sendo que o desenvolvimento de uma rede de fornecedores local
bem estabelecida é a principal fonte estratégica de competitividade do setor. Desse modo,
entende-se que a cadeia de suprimentos não é mais uma atividade comum, mas, uma ligação
estratégica que torna os estaleiros mais eficientemente produtivos. Conforme cita Fadda
(2004), a construção naval é uma indústria montadora altamente dependente de fornecedores,
assim, o sistema produtivo de um estaleiro é diretamente afetado pelas condições de preços,
prazos e qualidade dos bens e serviços fornecidos. Em função desse fator considera-se
determinante para a competitividade do setor, a proximidade física entre fornecedores e
estaleiro. Um elevado índice de conteúdo local eleva a possibilidade do estaleiro se inserir no
mercado global.

Apesar de que hoje a globalização possibilita o acesso a produtos de menores


custos, qualidade superior e maior diversidade, de acordo com Favarian et al. (2008), a
importação de equipamentos e pacotes tecnológicos podem garantir vantagens mais cômodas
aos estaleiros, entretanto, essa prática não cria inteligência local e condiciona um padrão
tecnológico dependente do país fornecedor.

Com este estudo, evidencia-se que no Brasil ainda há pouca integração entre
estaleiros e a cadeia de suprimentos local. A decadência da indústria da construção naval
iniciada nos anos 80, fez com que poucas empresas fornecedoras se mantivessem ativas,
sendo que destas, a maior parte migrou para outros segmentos, o que levou praticamente a
total paralisação do desenvolvimento de novos produtos e serviços nacionais. Os fornecedores
de navipeças são as principais fontes de inserção de tecnologia na construção naval (Coutinho
et al., 2006), mas, para tanto a demanda deve ser tal, que permita que estas empresas
permaneçam no mercado.

37
Por este motivo o Brasil dificilmente possuirá condições competitivas de
fornecimento em relação aos produtos de alta tecnologia, pois, como o volume de produção
ainda é pequeno a capacitação tecnológica dos fornecedores nacionais de equipamentos é
relativamente baixa. O conteúdo local da produção de peças deve se concentrar naqueles
setores em que o Brasil já possui certa competência. Além disso, a falta de confiança nas
encomendas futuras por parte dos fornecedores pode ser outra dificuldade a ser enfrentada,
pois, cria uma barreira de investimentos para ampliação de produtos para o setor. Este fato é
bastante relevante do ponto de vista da geração de estímulos para a entrada de produtos
diferenciados e novos fornecedores. A dificuldade encontrasse também da indústria local
saber que peças fabricar e fornecer aos estaleiros. Esse fato acontece quando há a importação
de projetos de embarcações onde a especificação de equipamentos já é definida por
fornecedores estrangeiros. Cabendo relembra a importância da maior integração dos
fornecedores nos processos de construção da embarcação.

Entretanto, os fornecedores nacionais encontram através da demanda atual, grande


oportunidade de desenvolver melhores práticas de fabricação, qualidade e custos para seus
produtos, ampliando a sua curva de aprendizado e o nível de confiabilidade dos equipamentos
nacionais fornecidos. Por fim, para que a indústria de construção naval brasileira possa
competir no mercado global, será necessário antes de tudo, o desenvolvimento de todos os
mecanismos que entrelaçam o setor, investir intensivamente em tecnologia, modernização,
produtividade, e qualificação de mão de obra, condições estas necessárias para a consolidação
do principal elo de competitividade desta indústria.

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5. REFERÊNCIAS

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