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DISCUSSÕES DE GÊNERO E O AMBIENTE ESCOLAR

Em 14 de junho de 2016 foi aprovado pela Assembleia Legislativa de São Paulo o Plano
Estadual de Educação (PNE), que estabelece 23 metas a serem cumpridas pelo governo estadual nos
próximos dez anos. Apesar de toda a polêmica, ficaram de fora do texto final as metas que incluíam a
discussão de gênero e diversidade sexual nas escolas. A controvérsia em torno do PNE dividiu a
Assembleia em dois grupos: de um lado grupos que afirmavam que a escola não é lugar para discutir
questões de gênero e, de outro, deputados, apoiados por alunos e professores, que defendiam que:
“debate de gênero tem de acontecer, machismo e homofobia matam gente pra valer”. Mas afinal,
porque este tema que gera tanta polêmica?
Segundo Kátia Pupo, coordenadora do ensino médio da Escola Miguel de Cervantes, em São
Paulo, e autora do artigo “Questão de gênero na escola”, até hoje as relações entre homens e mulheres
são assimétricas, principalmente no que a sociedade espera de um ou outro gênero. “Meninas e
meninos já percorreram um caminho social de convivência, sabem a que gênero pertencem e o que se
espera deles, porém, estão impregnados das velhas concepções preconceituosas sobre o homem e a
mulher, construídas com base nas diferenças de sexo”, argumenta Puppo. Para ela, a escola é um
“lugar de formação e imposição de princípios sexistas onde encontraremos um imenso campo de ação
para promover reflexões e, quiçá, mudanças que possam romper com os paradigmas tradicionais de
comportamento masculino e feminino”. Ao não explicitar as desigualdades de gênero, a escola pode
continuar reproduzindo modelos tradicionais na relação entre os sexos, sendo o principal deles a
marginalização da mulher diante do homem.
Gênero e ideologia
Falar sobre gênero nas escolas é uma forma de tornar esses espaços mais inclusivos, sem
anular as diferenças entre os indivíduos. De acordo com o Manifesto pela igualdade de gênero na
educação: por uma escola democrática, inclusiva e sem censuras, um documento elaborado em 2015
por um coletivo de entidades ligadas aos direitos humanos e grupos de pesquisa de todo o país,
também pode dar contornos mais democráticos para os debates de ideias e ideologias de cada um.
Ainda segundo esse documento, “ao contrário de ‘ideologias’ ou ‘doutrinas’ sustentadas pela
fundamentação de crenças ou fé, o conceito de gênero está baseado em parâmetros científicos de
produção de saberes sobre o mundo. É um conceito operador que cria sentido para as diferenças
percebidas em nossos corpos e articula pessoas, emoções, práticas e coisas dentro de uma estrutura de
poder. E é, nesse sentido, que o conceito de gênero tem sido historicamente útil para que muitas
pesquisas consigam identificar mecanismos de reprodução de desigualdades no contexto escolar”.
Uma invenção ideológica de caráter doutrinário, esse é o principal argumento de grupos que
se posicionaram contra a inclusão das discussões de gênero em qualquer ambiente público e, portanto,
nas escolas. Segundo eles, ao falar sobre gênero para os alunos os professores poderiam subverter a
ideia de sexo biológico, um dado da natureza e, portanto, imutável. No caso do PNE estadual, os
deputados ligados à grupos religiosos, advertiam que essas discussões no ambiente escolar
constituiriam uma verdadeira ameaça à família tradicional. A pressão que eles exerceram acabou por
surtir efeito e as metas que incluíam esses tópicos foram excluídas do PNE. O mesmo aconteceu em
diversos municípios brasileiros.
Na verdade, aqui ocorre uma confusão entre os conceitos de sexo e de gênero. O sexo é uma
classificação a partir das características biológicas das pessoas como machos ou fêmeas, baseada, por
sua vez, em características orgânicas como cromossomos, níveis hormonais, órgãos reprodutivos e
genitais. Na espécie humana temos, portanto, dois sexos. Mas isso não significa que existem apenas
dois gêneros. A definição do gênero de um indivíduo não depende do sexo, trata-se, na verdade de um
tipo de classificação pessoal e social das pessoas como homens ou mulheres e que orienta papéis e
expressões de gênero.
Conhecer, respeitar
Entender todas as nuances que cercam as questões de gênero abre caminho para reduzir e,
quem sabe, erradicar a homofobia e a violência contra mulher. Segundo o relatório anual divulgado
pelo Grupo Gay da Bahia (GGB), 338 pessoas LGBT foram mortas em 2015, em todo o país. Desse
total de vítimas, 52% são homens homossexuais, 37% travestis, 16% lésbicas, 10% bissexuais. De
acordo o Relatório Global das Nações Unidas sobre a natureza, o escopo e os impactos desse tipo de
violência (em inglês), lançado pela Unesco esse ano, mais de 85% de estudantes lésbicas, gays,
bissexuais e transgêneros de alguns países já sofreram violência na escola, incluindo bullying.
Estudantes que não são LGBT, mas não são compreendidos dentro dos padrões de seus gêneros,
também são alvo. É um tipo de violência que afeta o desempenho dessas crianças e jovens, em muitos
casos, gerando abandono da escola. A Unesco no Brasil é a favor de que a legislação brasileira e os
planos de educação incorporem perspectivas de educação em sexualidades e gênero. Em comunidade
de seu escritório no Brasil, a entidade afirma que “a eliminação das desigualdades de gênero é
determinante para a construção de uma sociedade inclusiva e equitativa. Todos os estudantes têm o
direito de viver e aprender em um ambiente livre de discriminação e violência. Com educação e
diálogo é possível prevenir a violência de gênero”.
Para a educadora Kátia Puppo, o debate e o diálogo na escola representam um caminho
próspero. “É tarefa da escola fazer com que alunos e alunas reflitam sobre seus sentimentos e emoções
diante de conflitos interpessoais, desconstruindo preconceitos de gênero e contribuindo para a
construção de novos modelos de relação entre homens e mulheres pautados em princípios de igualdade
e justiça”, conclui.

Para você, filha (o), aluna (o) concluinte do Ensino Médio, cidadã ou cidadão, atriz ou ator
social, peça fundamental e também responsável pela construção social, qual a importância e a
necessidade de se promover o debate das questões de Gênero dentro do ambiente escolar?

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