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Nome: Cauã Vieira da Silva

Número USP: 5939872


Turma: 24

RESENHA: O CONTRATO SOCIAL DE JEAN-JACQUES ROUSSEAU

Este trabalho tem por objetivo elaborar uma resenha sobre o livro O Contrato
Social, escrito em 1762, pelo escritor, filósofo, pedagogo e músico genebrino Jean-
Jacques Rousseau (28/06/1.712 – 02/07/1.778).

Primeiramente, cumpre apresentar a sua obra: no campo da filosofia política e


Teoria do Estado, Rousseau se destaca por apresentar uma concepção inédita sobre a
vontade popular ou vontade geral em sua tematização das estruturas do Estado erigidas
a partir da noção de contrato social, pensamento apresentado, primeiramente, em 1755
em seu Discurso Sobre A Origem E Os Fundamentos Da Desigualdade Entre Os
Homens e desenvolvido em seu livro O Contrato Social de 1762. Porém, sua obra
tematiza diferentes vertentes da prática humana, como o romance epistolar intitulado
Julie ou la Nouvelle Héloïse de 1761, um escrito sobre a pedagogia escrito em 1762, a
saber: Emílio ou Da Educação, um ensaio sobre a Origem das Línguas, publicado
postumamente em 1781, bem como um texto destinado à música escrito em 1743
denominado Dissertação sobre a Música Moderna, além da composição de algumas
peças musicais como a opéra-ballet, Les Muses Galantes, o mélodrama intitulado
Pygmalion e, ainda fragmentos de um balé sobre o tema de Daphnis et Chloé.

Por outro lado, é mister pincelar as características principais da corrente


filosófica contra a qual o filósofo genebrino se insurge em seu Contrato Social. Com
efeito, Rousseau se insere na corrente de pensamento conhecida como juscontratualista,
onde pensadores, como Grotius, Pufferdorf, Hobbes, Espinosa, Locke, conceitualizam a
origem da sociedade tal como aquela conhecida pela época moderna a partir de uma
construção subjetiva de um contrato firmado entre os indivíduos em sua passagem da
vida nômade para a vida sedentária e coletiva. Nesse sentido, pode-se dizer que
Rousseau vai mirar principalmente Hobbes em seu Contrato Social, uma vez que o
filósofo inglês funda o convívio social a partir das ideias de medo e guerra generalizada,
a fim de ser possível a instauração de um poder comum distinto do coletivo que o
instaurou, isto é, Thomas Hobbes evidencia, em seu famoso escrito intitulado O Leviatã
de 1651, que o estado pré-social, denominado estado de natureza, caracterizava-se pela
guerra generalizada de todos contra todos, em virtude de não haver normas para refrear
os ânimos individuais, todos pensavam que tinham direito a todas as coisas, incluindo a
propriedade alheia e os demais seres humanos, produzindo, por um lado, o direito do
mais forte, ou seja, o indivíduo mais forte teria direito a todas as coisas pertencentes
aqueles que ele conseguiria suplantar e, por outro lado, o medo exacerbado dos
indivíduos em relação aos seus semelhantes, medo este que empurra, para Hobbes, os
indivíduos para a ideia de pacto, por meio do qual a proteção individual estaria
assegurada mediante a instauração de um poder comum distinto e transcendente a este
coletivo, a saber: um poder soberano. Contudo, em sua apreensão da nervura do real,
Rousseau vai desconstruir uma a uma as noções erigidas por Hobbes. Desse modo,
tentar-se-á apresentar as pedras basilares do contrato de Rousseau, evidenciando, por
conseguinte, a ruptura realizada pelo pensador genebrino com a tradição
juscontratualista, a qual possui como principal representante Thomas Hobbes. Para
tanto, será exposto neste trabalho as seguintes noções: direito do mais forte, estado de
guerra, propriedade, pacto social, vontade geral e soberano.

1. DIREITO DO MAIS FORTE

Rousseau se insurge contra o argumento hobbesiano de que, no estado de


natureza, a força, enquanto o fator que distingue os diferentes indivíduos uns dos outros,
produz um direito, ao qual se deve obediência, ao formular o argumento do instinto de
autodefesa em uma situação de assalto no interior de uma floresta. Diz ele:

Quando um bandido me ataca num recanto da floresta, não somente sou obrigado a dar-lhe
minha bolsa, mas, se pudera salvá-la, estaria obrigado em consciência a dá-la, visto que, enfim, a pistola
do bandido também é um poder?
Convenhamos, pois, em que a força não faz o direito e que só se é obrigado a obedecer aos
poderes legítimos. (Contrato Social, p. 60)

Ou seja, Rousseau recorre ao traço mais próximo de nossa remota animalidade,


qual seja: o instinto, para tentar observar se a força consolidaria uma direito a ser
obedecido no estado de natureza. Ele esclarece que, em uma situação de assalto em um
lugar deserto, o instinto leva o indivíduo a análise da possibilidade da autodefesa e,
existindo esta possibilidade, o ser humano revida a força com a força, ao contrário do
que formulou Hobbes. E ainda conclui que somente a legitimidade concedida a um
poder gera a obrigação de obediência nos indivíduos. Mais à frente, será destacado
quais sãs as características atribuídas por Rousseau a um poder legítimo.
2. ESTADO DE GUERRA e PROPRIEDADE

Em outro momento do Contrato Social, Rousseau se opõe a hipótese do estado


de guerra generalizada ser a origem do pacto social. Nesse sentido, o filósofo genebrino
apresenta uma concepção inovadora sobre o estado de natureza, ao propor que, em seu
interior, o indivíduo não é nem bom, nem mal, mas tão-somente perseguidor de seus
instintos naturais e não há a existência de propriedade, tal como pensada pela
modernidade filosófica.

Com efeito, em seu Discurso sobre a origem e os fundamentos da desigualdade


entre os homens, Rousseau evidencia que bom e mau são qualidades ausentes do
indivíduo inserido na infância da humanidade, uma vez que, agindo somente com vistas
à satisfação de suas necessidades básicas1, não poderiam ser reputadas suas ações com
base em qualidades constituídas no interior das sociedades, isto é, critérios sociais para
qualificar um ente que, hipoteticamente, existe em um estado pré-social.

Nesse sentido, Rousseau assevera em O Contrato Social a impossibilidade de


existir inimizade entre os homens no estado de natureza gerada pela disputa pela
propriedade que cada um possui, em virtude de ser a propriedade também uma categoria
social. Diz o filósofo genebrino:

[...] os homens em absoluto não são naturalmente inimigos. É a relação entre as coisas e não a
relação entre os homens que gera a guerra, e, não podendo o estado de guerra originar-se de simples
relações pessoais, mas unicamente das relações reais, não pode existir a guerra particular ou de homem
para homem, nem no estado de natureza, no qual não há propriedade constante, nem no estado social, em
que tudo se encontra sob a autoridade das leis. (O Contrato Social, p. 63)

1
Esse cuidado argumentativo em perceber que não se pode reputar existentes no indivíduo em estado de
natureza qualidades existentes somente no meio social é patentes no seguinte trecho do Discurso sobre a
origem e os fundamentos da desigualdade entre os homens: Parece, a princípio, que os homens nesse
estado de natureza, não havendo entre eles espécie alguma de relação moral ou de deveres comuns, não
poderiam ser nem bons nem maus ou possuir vícios e virtudes, a menos que, tomando essas palavras num
sentido físico, se considerem vícios do indivíduo as qualidades capazes de prejudicar sua própria
conservação, e virtudes aquelas capazes de em seu favor contribuir, caso em que se poderiam chamar
mais virtuosos aqueles que menos resistissem aos impulsos simples da natureza. (Discurso da
Desigualdade, p. 75)
Ou seja, Rousseau ressalta que a propriedade só tem existência no meio social. É
a sociedade que regulamenta a distinção entre um bem particular e todos demais, de
modo que é tomado como ameaça e afronta direitos a realização de determinada ação
que lese direitos. No estado de natureza, ao contrário, tudo é exposto para que os
indivíduos alcancem sua finalidade precípua, a saber: a manutenção da existência, de
sorte que a guerra no estado de natureza se apresenta, para Rousseau, como contrário a
sua verdadeira essência.

3. PACTO SOCIAL e VONTADE GERAL

Para tematizar o advento do pacto social, Rousseau parece utilizar


analogicamente o conceito de força da física newtoniana. Com efeito, o filósofo
genebrino assim assevera:

Suponhamos os homens chegando àquele ponto em que os obstáculos prejudiciais à sua


conservação no estado de natureza sobrepujam, pela sua resistência, as forças de que cada indivíduo
dispõe para manter-se nesse estado. Então, esse estado primitivo já não pode subsistir, e o gênero
humano, se não mudasse de modo de vida, pereceria. (O Contrato Social, p. 69)

Ou seja, Rousseau indica que, em dado momento do estágio evolutivo do


homem, a força de atrito existente parecer impedir a continuidade da existência do ser
humano, de modo que somente por meio de uma mudança de paradigma poderia surgir
uma força maior que a força de atrito para assegurar a continuidade da vida humana na
superfície terrestre. E o autor denota que essa força maior é o pacto social, enunciado da
seguinte forma:

“Encontrar uma forma de associação que defenda e proteja a pessoa e os bens de cada associado
com toda a força comum, e pela qual cada um, unindo-se a todos, só obedece contudo a si mesmo,
permanecendo assim tão livre quanto antes”. Esse, o problema fundamental cuja solução o contrato social
oferece.
As cláusulas desse contrato são de tal modo determinadas pela natureza do ato, que a menor
modificação as tornaria vãs e de nenhum efeito, de modo que, embora talvez jamais enunciadas de
maneira formal, são as mesmas em toda a parte, e tacitamente mantidas e reconhecidas em todos os
lugares, até quando, violando-se o pacto social, cada um volta a seus primeiros direitos e retoma sua
liberdade natural, perdendo a liberdade convencional pela qual renunciara àquela. (O Contrato Social, p.
70)

O escritor de O Contrato Social desvela aqui o que seria o pacto social na sua
perspectiva. Com efeito, Rousseau esclarece que, ao realizar o acordo comum
denominado pacto social, os indivíduos abrem mão de sua liberdade natural, isto é,
negam a possibilidade de utilizarem todas as coisas segundo os ditames de sua vontade,
e constroem a liberdade convencional ou liberdade civil. Como Rousseau acentua:

O que o homem perde pelo contrato social é a liberdade natural e um direito ilimitado a tudo
quanto aventura e pode alcançar. O que com ele ganha é a liberdade civil e a propriedade de tudo que
possui. (O Contrato Social, p. 77)

À diferença da teoria hobbesiana do pacto social, a qual propõe a criação de


uma poder distinto e transcendente ao coletivo de indivíduos que instauram a ordem
social, Rousseau acentua ao longo do Contrato Social a importância dessa liberdade
civil. E isto se dá, em virtude de esta liberdade se caracterizar pela sua imanência, isto é,
a instituição da ordem social faz com o que o indivíduo adquira uma nova espécie de
liberdade diferente da liberdade natural, mas marcada, sobretudo, pelo traço da
autorregulação do próprio coletivo. Nesse sentido, em vez de a vontade individual
operar como fonte diretiva do indivíduo, será o coletivo de indivíduos -denominado
povo- instaurador da ordem social que irá por a norma para si mesmo, ou seja, é a
vontade coletiva que passa a regular a esfera da ação prática exercida por todos os
membros dessa mesma coletividade. E é justamente nesta autoposição da vontade
coletiva ou vontade geral que reside a imanência da concepção de liberdade civil
rousseauniana, visto que já não se trata de uma alienação da liberdade de cada indivíduo
a um poder que lhe transcendente, e sim que, caracterizando-se o indivíduo como
membro do povo e na medida em que é o próprio povo que irá regulamentar as ações
individuais, ao obedecer a pletora de regulamentações erigidas para o bem comum, ele
obedecerá somente a si mesmo, seguirá as regras instituídas por ele próprio enquanto
integrante do corpo legislativo. Desse modo, pode-se dizer que Rousseau desfaz o laço
que unia a análise das estruturas do Estado às amarras religiosas ainda existentes em sua
época e entrona o ser humano como criador de uma segunda natureza, convencionada
legalmente e autorregulada.

4. PODER SOBERANO

Em face do acima exposto, pode-se dizer que a liberdade civil traz à luz o caráter
imanente da vontade geral. Além disso, o acordo celebrado pela coletividade produz o
surgimento de um novo ente político, cuja vontade será caracteriza por essa mesma
vontade geral. Esse ente é definido por Rousseau como Estado, soberano e potência a
depender da perspectiva adotada, da seguinte forma:

“[...] esse ato de associação produz, em lugar da pessoa particular de cada contratante, um corpo
moral e coletivo composto de tantos membros quantos são os votos da assembleia, e que, por esse mesmo
ato, ganha sua unidade, seu eu comum, sua vida e sua vontade. Essa pessoa política, que se forma, desse
modo, pela união de todas as outras, tomava antigamente o nome de cidade e, hoje, o de república ou de
corpo político, o qual é chamado por seus membros de Estado quando passivo, soberano quando ativo, e
potência quando comparado a seus semelhantes. Quanto aos associados, recebem eles, coletivamente, o
nome de povo e se chamam, em particular, cidadãos, enquanto partícipes da autoridade soberana, e
súditos enquanto submetidos ás leis do Estado. “(O Contrato Social, p. 71)

Com efeito, a coletividade de indivíduos contratantes faz surgir uma nova pessoa
política, cujo corpo é composto pelos membros da coletividade e a vontade se cristaliza
pela vontade geral da coletividade. Além disso, o filósofo genebrino ressalta que essa
pessoa política surgida a partir do pacto social corporifica o Estado enquanto age
passivamente, isto é, enquanto se realiza a mera execução das normas coligidas pela
vontade pública, entretanto, ao se observar essa mesma pessoa política em sua
atividade, ela cristalizará o poder soberano, ou seja, o exercício da produção legislativa
traz a lume a soberania pertencente ao povo, e por fim, a pessoa política adquire a
qualidade de potência quando comparada às demais pessoas políticas surgidas a partir
de pactos semelhantes em outros povos.

Nesse sentido, Rousseau assevera que o soberano, o qual pode ser conceituado
como poder comum dotado de território específico e instituído para o bem comum de
um determinado povo, é indissociável do próprio povo, está imbricado
fundamentalmente a este. Compreensão inovadora que reverberou em inúmeras
produções do Poder Constituinte Originário de diferentes países, inclusive do Brasil,
como ressalta o teor do parágrafo único do artigo 1º da Constituição Federal da
República Federativa do Brasil de 1988:

Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente,
nos termos desta Constituição.

Ou seja, em que pese a pessoa política brasileira ser subdividida em três espécies
de poder distintos, quais sejam: o poder executivo, o poder legislativo e poder
judiciário, a fonte da qual emana esses poderes é o povo, único poder soberano
legalmente constituído em terras brasileiras. Por outro lado, em virtude de se constituir
como uma Constituição de traços mistos, o exercício desse poder soberano do povo será
realizado, indiretamente, por meio da eleição de representantes, ou diretamente, através
dos institutos do plebiscito, referente e ação popular.

Por fim, com vistas a coligir os diferentes aspectos da teoria política apresentada
por Jean-Jacques Rousseau em seu Contrato Social, far-se-á uso da seguinte passagem
retirada deste livro para evidenciar, uma vez mais, a liberdade civil surgida a partir do
contrato social rousseauniano:

“A fim de que o pacto social não represente, pois, um formulário vão, compreende ele
tacitamente este compromisso, o único que poderá dar força aos outros: aquele que recusar obedecer à
vontade geral a tanto será constrangido por todo um corpo, o que não significa senão que o forçarão a ser
livre, pois é essa a condição que, entregando cada cidadão à pátria, o garante contra qualquer dependência
pessoal.” (O Contrato Social, p. 75)

Ou seja, Rousseau evidencia que, mesmo no interior da comunidade política


erigida após o pacto, poderá haver conflito entre a vontade individual e a vontade
coletiva. Contudo, a vontade geral deverá se sobrepor à vontade individual de algum ou
alguns, em razão de a vontade coletiva visar o bem viver da coletividade, para o qual
justamente houve a realização do contrato social. Nesse sentido, o conflito presente na
expressão “forçar a ser livre” ressalta aquilo que foi apresentado acima: a liberdade civil
consiste na obediência à norma posta pela própria coletividade e aquele que se opuser a
isso, preferindo a retomada de sua antiga liberdade natural, deverá se coadunar com os
ditames da vontade geral produzida pelo poder soberano do povo, visto ser a garantia da
manutenção da existência deste, bem como a preservação da existência do próprio
indivíduo.

Portanto, a resenha aqui elaborada buscou evidenciar as inovações apresentadas


pelas noções fundamentais da Teoria do Estado de Jean-Jacques Rousseau constante de
seu livro O Contrato Social.

5. BIBLIOGRAFIA

Brasil. Constituição da República Federativa do Brasil De 1988. Disponível em:


http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm. Acesso
em 14/05/2019.
Rousseau, Jean Jacques. O Contrato Social in Coleção Os Pensadores Volume I.
Editora Nova Cultural, São Paulo, 1999.

Rousseau, Jean Jacques. Discurso Sobre A Origem E Os Fundamentos Da


Desigualdade Entre Os Homens in: Coleção Os Pensadores Volume II. Editora Nova
Cultural, São Paulo, 1999.

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