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1. Introdução
de São Paulo, algumas das figuras mais representativas da época nas áreas de
"estabelecer as normas de como se deve cantar na língua do país"1 . Este encontro, que
Congresso da Língua Nacional Cantada. Seus anais são o objeto de observação deste
canto erudito.2
àquela altura se pretendia. Estas justificativas porém lançam argumentos que podem ser
Pode-se dizer que não existe país algum civilizado que não procure conhecer, estabelecer
e tradicionalizar as suas manifestações filológicas e artísticas. ( . . . . ) É sabido que na
Itália existe uma maneira artística de pronunciar o italiano, no teatro ou na declamação.
Na França uma longa tradição do bem falar se estabeleceu nos teatros, como o exemplo
normativo da Comédie Française e do Conservatório de Paris. Na Alemanha, a linguagem
do Hannover foi escolhida para o teatro erudito, como a que mais correspondia
foneticamente á pureza da língua alemã. [normas, pg. 4]
1
Anais do Primeiro Congresso da Língua Nacional Cantada, São Paulo, Departamento de Cultura, 1938.
As duas primeiras citações dizem respeito à Introdução, páginas 3 a 4. Todas as outras são das "Normas
para bôa pronúncia da Língua Nacional no canto erudito", páginas 49 a 94, doravante chamado
simplesmente de "Normas". A cópia usada para referencia neste trabalho é da Revista Brasileira de
Música, 1º fascículo, Rio de Janeiro, Escola Nacional de Música da Universidade do Brasil, 1938, páginas
1 a 35. A Bibliografia no final deste trabalho deve ser vista como relevante complemento ao leitor
interessado sobre o assunto ou, em alguns casos, como suporte de consulta.
2
Tais Normas foram elaboradas definitivamente por Antenor Nascentes, Luís Heitor Corrêa de Azevedo
e Mário de Andrade, a partir de um Anteprojeto proposto pelo próprio Departamento de Cultura.
2
Itália, França e Alemanha vêm de uma prática cultural milenar, sendo estes
países inclusive dos mais representativos na história da música cantada ocidental, além
de terem dimensões territoriais substancialmente menores que o Brasil, o que nos coloca
são fruto de exercício contínuo durante séculos enquanto que aqui, mal saímos da
nacional, num desprêzo cego do bem dizer, e que carreiam para a nossa linguagem sons
fonéticas regionais não desnorteiam a pureza da nossa língua, até porque está é
texto inclusive se mostra, em alguns momentos, com idéias incongruentes já que fala
em língua-padrão e uniformidade de falar, declamar, cantar, mas afirma que "não existe
fonema sem timbre ou palavra sem sonoridade" [Normas, pg. 5]. Constata-se nos dias
atuais uma realidade antagônica à prevista pelos que consideravam a fixação dessa
língua-padrão como "mais um fator patriótico de unidade nacional" [Normas, pg. 6]:
não só não houve a padronização nos moldes colocados como, em níveis até mais
do Brasil" [Normas, pg. 6]; "a mais rápida e mais incisiva de todas" [Normas, pg. 7]; "a
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de maior musicalidade" [Normas, pg. 7]; "a mais elegante" [Normas, pg. 7]; "produto
pg. 7], etc. Como exposto anteriormente, distante da contraposição aos respeitáveis
nas quais ela aconteceu para que se possa entender os sucessos e os fracassos desta
cada uma das 19 vogais e 25 consoantes que existiam na chamada língua padrão vigente
"As vogais são na verdade os sons das palavras, e por isso devem tomar
aproximadamente todo o tempo que duram os sons musicais. As consoantes quer
precedendo, quer sucedendo á vogal silábica, são ruídos que se ajuntam ao som
vocálico. (. . .) Devem por isso as consoantes ser articuladas com nitidez perfeita, mas
sempre com a maior brevidade" [Normas, pg. 9].
Fig. 1
Vogais som, prolongamento
Consoantes ruído, brevidade
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Mário de Andrade, Luis Heitor Corrêa de Azevedo e Antenor Nascentes são porta-vozes neste
documento de outros como Manuel Bandeira, Oneida Alvarenga, Frutuoso Viana, Camargo Guarnieri,
Francisco Mignone, Claude Levi-Strauss e Cecília Meireles.
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Constatou-se pequenas modificações entre os fonemas considerados na época e os atuais. Este trabalho,
por seu caráter introdutório e enfoque histórico, mantém as vogais e consoantes originais.
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Vale salientar que serviram como base para a elaboração do Anteprojeto usado como referencia, as
seguintes publicações: O Linguajar Carioca em 1922 e O Idioma Nacional - 1933 - Antenor Nascentes;
Lições de Português - 1934 - Souza da Silveira; O Português do Brasil - 1936 - Renato Mendonça; A
Língua do Nordeste - 1934 - Mário Marroquim; Dialeto Caipira - 1920 - Amadeu Amaral; além do
relatório apresentado pela Comissão nomeada para estudar a pronúncia carioca.
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3.2 As Vogais
A
oral aberto (vatapá)
oral surdo (cola)
nasal fechado (rã)
E
oral aberto (fé)
oral fechado (ipê)
oral surdo (covarde)
nasal fechado (vem)
nasal surdo (então)
I
oral aberto (vil)
oral fechado (cima)
nasal (vim)
O
oral aberto (só)
oral fechado (cor)
oral surdo (ato)
nasal fechado (som)
nasal surdo (camondongo)
U
oral aberto (sul)
oral fechado (tudo)
nasal (rum)" [Normas, pg. 8]
Fig. 2
Fechado Aberto
Esquecer (i)squ(i)ci
Remeter Remiti
Dever d(i)vi
de noite d(i) dia
ao pé d(â) cama ao pé d(á) casa
“Em muitos casos porém esta quase tendência (para a vogal fechada) não é
observada. Diremos com os cariocas adôtar, prêgar (religião), pêgada ao inverso dos
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Portugueses: adòtar, prègar, pègada” [Normas, pg. 9]. Verifica-se porém que,
principalmente no norte e nordeste do Brasil, o falar português parece ser muito mais
praticado.
Nas regiões graves e super-graves, abrir levemente. Isto parece ser uma tendência entre
os cantores eruditos e realmente há razão para tal. Caso contrário, tanto a evidência na
entendimento do texto.
preposição separadamente, a não ser pela clarificação "discreta do a" [Normas, pg. 13].
"As partículas em e como e, de, em, me te, se, lhe, lhes, soam com e surdo,
i, di, im, mi, lhi, lhis" a menos apareçam substantivadas "um quê de triste" ou façam
parte de exceções como dê-noite, cor-dê-rosa, etc. De uma forma geral, nos casos de e
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surdo, deve-se usar uma vogal de compromisso, algo como "uma mistura vocálica de i
com e, mais próxima dêste por se movimentar o canto moderadamente" [Normas, pg.
14].
para, em sílabas pretônicas, trocar o i pelo e (dêreito, menistro), e para nasalizar o i oral
discreto do ditongo.
tônica ou pretônica.
baticúum, azúul, etc. Esta tendência porém "não será observada no canto nem no sons
rápidos nem lentos em nenhuma posição da frase" a não ser "apenas quando cair em
síncopas, cuja execução vocal implica exatamente, numa oscilação de voz" [Normas,
pg. 18].
exemplos como "seim", "beim", "boum" por formarem ditongos com suas vogais de
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compromisso e rechaçada em "péis", "retróis", "lúiz" por ser associada a formas incultas
de se pronunciar.
"Os ditongos devem ser considerados pelo cantor como uma vogal única
crescentes duma semiconsoante" [Normas, pg. 18]. A brevidade sugerida nas normas
pelos vários sons dados a ele" [Normas, pg. 19]. Vejamos exemplo abaixo:
Fig. 3
Confidência, Heitor Vila-Lobos
Fig. 4
Forma incorreta: deforma foneticamente o ditongo
Fig. 5
Forma correta
destinado a um som só pelo compositor, o cantor divide êsse som por tres ou quatro
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partes iguais e dá o terço o quarto dessa divisão à semivogal final. Os hiatos que o
19]:
Fig. 6
Escrita Execução
partes iguais, lembrando que, nos dois casos, deve-se fugir da rigidez matemática na
Fig. 7
Escrita Execução
hiatos (AI, AU, AO, Ã0, ÊI, ÔI e OU, ÉA, EA e EÃO, AIA, AIO, ÊIA, ÊIO, IA, IO,
ÓIA, ÓIO, ÔIA, ÔIO, ÚIA, ÚIO, OA') que são importantes mas representam
peculiaridades das regras gerais expostas acima e que neste trabalho, por seu caráter
Num número incontável de casos "quando uma palavra termina por vogal e
a palavra seguinte começa também por vogal, o hiato resultante procura muitas vezes
desaparecer, quer contraindo-se em duas vogais num ditongo, quer uma delas
devorando a outra" [Normas, pg. 28]. "Você faç'a mesma coisa", "Ganhei
camp'o boi bumbá", "O leit'umedecido". Os tritongos também têm incidências inúmeras
medida certa da divisão deste som, de forma a equilibrar as exigências do canto com as
B
oclusiva bilabial sonora (bom)
fricativa bilabial sonora (aba)
C ou Q
oclusiva velar surda (caqui)
D
oclusiva dental sonora (dom)
fricativa dental sonora (brando)
F
fricativa labiodental surda (golfo)
G
fricativa velar sonora (pago)
oclusiva velar sonora (gato)
J
fricativa palatal sonora (junto)
L
fricativa lateral velar surda (final)
fricativa lateral alveolar sonora (lilás)
LH
fricativa lateral palatal sonora (falhando)
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M
oclusiva nasal bilabial sonora (mamãe)
N
oclusiva nasal velar sonora (angú)
oclusiva nasal alveolar sonora (ninar)
NH
oclusiva nasal palatal sonora (manhã)
P
oclusiva bilabial surda (pipa)
R
vibrante alveolar sonora (aro)
vibrante alveolar surda (carta)
fricativa alveolar sonora (flor)
S ou C ou Ç ou X
fricativa alveolar surda (saci, massa, caça, próximo)
T
oclusiva dental surda (total)
V
fricativa labiodental sonora (vivo)
X ou CH
fricativa palatal surda (xixi, chuchu)
Z ou S
fricativa alveolar sonora (asa, azar)" [Normas, pg. 8]
espúrios que lhe destroem a claridade". "Nestes casos deverão ser usados os próprios
do país" [Normas, pg. 10]. O fato é que é exatamente a pronúncia carioca a maior
pronunciada de forma inculta como "animau" sem que isto signifique o vício contrário
(demonho por demônio), o que não se usa no canto erudito" [Normas, pg. 32].
por companhia.
completo ensurdecimento como seu demasiado rolamento. Nem o inculto palada, nem
melodias rápidas, pois que em vez de acrescentar ruídos, os diminue" [Normas, pg. 33]:
s diante de j (ge ou gi) ou de x (ch): a chaves por as chaves, o jarros por os jarros, o
incontestáveis formas erradas de falar como "quaji" por quase, fôia por folha, etc., pela
sua obviedade. Vale salientar que certas regras também não foram citadas por não
fazerem mais sentido na ortografia atual. Por exemplo, aquela que manda evitar o soar
do p em palavras como excepção, exceptuar e psalmo. O que mostra que naquela época
mantém o seu valor próprio. "Em todos êstes casos a primeira consoante do grupo (ou
as duas primeiras nos agrupamentos ternários) deve ser conceitualmente concebida pelo
cantor como sí fosse uma apoiadura rapidíssima e as mais das vezes muito nítida"
Fig. 8
Escrita Execução
valor psicológico do texto. "É evidente que em casos tais, a dicção mesmo erudita,
que envolvem o r, à moda do belcanto italiano (brruto por bruto, trremer por tremer),
4. Conclusão
cobriram, pelo respaldo das pessoas envolvidas, as normas que são foco deste trabalho
representam um suporte de valor inestimável para quem deseja cantar e compor música
brasileira. Estas porém não me cabem na condição de humilde compositor. Deixo-as aos
sobre aspectos aqui não mencionados e que dizem respeito à prosódia do ponto de vista
suas implicações rítmicas além de tantas outras especificidades. Mas este já é assunto
Bibliografia Complementar
Jatobá, Pedro (1938). Colisão entre as Acentuações Verbal e Musical no Canto. Anais
do I Congresso da Língua Nacional Cantada. São Paulo: 663.