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Parece existir um consenso entre políticos e economistas de que a reforma da Previdência é

necessária e urgente. Pelo menos é o que é difundido pela maior parte da imprensa brasileira. A
população do país, porém, não está tão convencida assim. Segundo pesquisa do Datafolha,
divulgada no dia 10 de abril, 51% dos brasileiros são contra a reforma proposta pelo presidente Jair
Bolsonaro, 41% são a favor e o restante é neutro ou não soube responder. Em fevereiro, dias antes
da apresentação da nova proposta, as estatísticas eram diferentes. De acordo com uma pesquisa
feita, na época, pela CVA Solutions, 49% da população do país aprovava a reforma da Previdência,
enquanto apenas 25% rejeitava.

Desde o dia 20 de fevereiro, quando o presidente Bolsonaro apresentou sua proposta, a mídia
tradicional aumentou ainda mais o enfoque em explicar o projeto, suas consequências para cada
cidadão e o impacto na economia do país. A população passou a questionar as medidas e a buscar
respostas em outros meios de comunicação. Daí a maior repercussão, principalmente em veículos
alternativos, de economistas que criticam inteira ou parcialmente a reforma e lançam dúvidas sobre
a neutralidade da imprensa na apresentação do tema à população.

Para o analista econômico Rafael Bianchini, a mídia faz uma abordagem simplificadora da medida:
“O Brasil não vai quebrar sem a reforma da Previdência, como afirma a imprensa, mas é preciso, sim,
repensar o modelo”. Enquanto Bianchini acredita que, em alguns pontos, a reforma pode ser útil, o
economista Eduardo Moreira, um dos maiores críticos da proposta, utiliza as mídias sociais para
defender uma percepção inteiramente contrária à reforma de Bolsonaro. Seu canal no Youtube tem
mais de 160 mil inscritos e um dos vídeos, intitulado “A indefensável reforma da Previdência”, já
atingiu 140 mil visualizações.

A notoriedade nas mídias sociais levou Eduardo Moreira a palestrar sobre a reforma da Previdência
em março, na Comissão de Direitos Humanos do Senado. No debate, exibido na íntegra pela TV
Senado, o economista disse que a atual proposta de reforma não é feita pensando no bem da
população brasileira. Para Moreira, o déficit acontece pelo fato de o Brasil não ter crescido nos
últimos anos, e não pela falta da reforma da Previdência. Ele disse que, até 2015, o país ainda tinha
superávit na Seguridade Social, mas o dinheiro era praticamente todo gasto com juros de dívidas.
Segundo Moreira, se os fundos tivessem sido guardados, poderiam amortecer a crise, já que
somariam mais de R$ 1 trilhão. “Que país é esse que quando tem sobra [de dinheiro], gasta, e
quanto tem falta, corta?”, questionou o economista na palestra. Bianchini também não vê a reforma
da Previdência como solução final para o déficit. Segundo ele, uma reforma tributária é tão
importante quanto. “Só o corte de despesas não é suficiente. Sem algum aumento de carga
tributária, não sairemos da crise”, diz Bianchini.

Os dois economistas ressaltam pontos negativos da proposta de Bolsonaro. Bianchini cita a


compensação de trabalho da mulher via idade, e não por tempo de contribuição, e a Previdência
para militares, que se aposentam com o último salário, e não com a média. “A reforma de Bolsonaro
é confusa e vai dar muita incerteza jurídica”, prevê. O economista, porém, encontra proposições
razoáveis no projeto, como a criação de uma idade mínima para aposentadoria.

Moreira é mais incisivo e diz que há muitos problemas graves na proposta de Bolsonaro. Um deles é
a mudança na aposentadoria de trabalhadores rurais. Hoje, eles precisam comprovar 15 anos de
trabalho para se aposentar. Caso a reforma seja aprovada, precisarão contribuir 20 anos inteiros
para o INSS. Para Moreira, eles dificilmente conseguirão comprovar 240 meses de trabalho,
aumentando o êxodo para as cidades e a ampliação das periferias, da criminalidade e da pobreza.
Outro ponto bastante criticado pelo economista é o corte do Benefício de Prestação Continuada
(BPC), pago àqueles que comprovam invalidez ou a idosos com renda per capita familiar inferior a
um quarto de um salário mínimo. “Cortar o BPC significa matar brasileiros”, afirmou o economista
no Senado.

Enquanto ainda existem dúvidas quanto à reforma da Previdência entre a população e os


economistas, o governo continua investindo em maneiras de defender o projeto. Na semana do dia
15 de abril, foi divulgada uma pesquisa conduzida pelo Ministério da Economia com analistas de
mercado, para reunir estimativas do impacto da reforma. A média das respostas aponta para uma
expectativa de crescimento adicional de 1,1 ponto percentual no PIB de 2019, no caso de uma
aprovação integral da proposta de Bolsonaro. O governo segue promovendo a ideia e tentando
acelerar as etapas de tramitação. Mesmo assim, a votação da admissibilidade do projeto foi adiada
diversas vezes. Somente no dia 23 de abril, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos
Deputados votou e considerou o projeto constitucional.

As discussões na Câmara entre partidos de oposição, centro e favoráveis ao governo ainda serão
exaustivas. Para Eduardo Moreira, o debate deve ser feito com calma. “Essa proposta afeta 100% da
população brasileira, como podemos ter pressa em aprová-la?”, analisa. Pelo visto, apesar do apoio
de grande parte da imprensa e do ainda pouco utilizado capital político presidencial, a aprovação da
reforma não será feita de forma tranquila.

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