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LUC DA COSTA RIBEIRO

SERVIDÃO AMBIENTAL
Aplicabilidade em Zonas Urbanas de Mananciais

São Paulo-SP
2014
LUC DA COSTA RIBEIRO

SERVIDÃO AMBIENTAL
Aplicabilidade em Zonas Urbanas de Mananciais

Monografia apresentada à Escola Paulista


da Magistratura, como exigência parcial
para aprovação no 2º Curso de Pós-
Graduação ‘Lato Sensu’ – Especialização
em Direito Notarial e Registral Imobiliário.

Orientadora: Prof.ª Tânia Mara Ahuali

São Paulo-SP
2014
FOLHA DE APROVAÇÃO

LUC DA COSTA RIBEIRO

SERVIDÃO AMBIENTAL
Aplicabilidade em Zonas Urbanas de Mananciais

Monografia apresentada à Escola Paulista


da Magistratura, como exigência parcial
para aprovação no 2º Curso de Pós-
Graduação ‘Lato Sensu’ – Especialização
em Direito Notarial e Registral Imobiliário.

Data da aprovação:
Nome:
Titulação:
Assinatura:
Dedico esta monografia aos meus pais e
irmã: Adalberto, Jô e Monique.
AGRADECIMENTOS

Agradeço à Fran pelo apoio emocional e incentivo constante. Aos colegas


do cartório, pelo trabalho sério e responsável, que me permitiu momentos de paz de
espírito para a produção intelectual. Aos professores e colegas desta pós-
graduação, pelos ensinamentos e companheirismo. Aos profissionais da Cetesb, em
especial Elson e Vivian, pela oportunidade de debater e implantar o instituto da
servidão ambiental. Ao Prefeito Gabriel, de Rio Grande da Serra, e ao Secretário
Sérgio, por apostarem nesta ideia e levá-la à Cetesb. Aos profissionais da Sephama,
de Ribeirão Pires, que também nos proporcionaram bons debates e estímulo aos
estudos. Aos corretores e demais profissionais do mercado imobiliário, pelo
comprometimento e entusiasmo para levarmos um progresso sustentável à
Comarca, em especial à Eliete, que me propiciou bons insights neste tema.
RESUMO

A presente monografia apresenta um estudo sobre o tema da servidão ambiental.


Traz um panorama sobre a servidão tradicional do Direito Civil: conceito,
classificação, constituição, conteúdo, exercício, formas de extinção, ações
processuais e aspectos registrais. Em seguida, faz uma incursão no Direito
Ambiental através da legislação específica, com reflexão acerca da relativização do
direito de propriedade, sobre o Código Florestal e sobre a legislação de mananciais.
Por fim, penetra no tema da servidão ambiental; faz uma retrospectiva histórica do
instituto na legislação brasileira, classifica-o, distingue-o da servidão civil,
caracteriza-o, mostra o procedimento de instituição e alienação, e sua aplicabilidade
a imóveis urbanos, defende a utilização de áreas de preservação permanente,
discorre sobre a importância do retorno financeiro para o empresário do verde e
finaliza com a defesa de sua aplicação às áreas de mananciais.

Palavras-chave: Código Civil. Código Florestal. Direito Civil. Direito Ambiental.


Registro de Imóveis. Servidão Ambiental Urbana. Área de Proteção Permanente.
Áreas de Mananciais.
ABSTRACT

This monograph presents a study on the topic of conservation easement. It brings an


overview about traditional servitude of Civil law: concept, classification, constitution,
content, exercise, forms of extinction, procedural actions and registral aspects. Then
makes a foray into the environmental law through specific legislation, with a reflection
on relativization of property rights, on the Forest Code and on the water sources
legislation. Finally, penetrates into the theme of conservation easement; makes a
historical retrospective of the institute in the brazilian legislation, classifies it,
distinguishes it from civil servitude, characterizes it, shows the procedure of
institution and alienation, and its applicability to urban property, defends the use of
permanent preservation areas, discusses the importance of the financial return to
green's entrepreneur and ends with the defence of its application to water sources
areas.

Key words: Civil Code. Florestal Code. Civil Law. Environmental Law. Property
Registry. Urban Conservation Easement. Permanent Preservation Area. Water
Sources Areas.
SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................... 8

2 O DIREITO REAL DE SERVIDÃO ................................................................................... 10


2.1 CONCEITO .................................................................................................................... 11
2.2 CLASSIFICAÇÃO .......................................................................................................... 12
2.3 CONSTITUIÇÃO ............................................................................................................ 13
2.4 CONTEÚDO E EXERCÍCIO .......................................................................................... 15
2.5 EXTINÇÃO E AÇÕES PROCESSUAIS ......................................................................... 20
2.6 ASPECTOS REGISTRAIS ............................................................................................. 23

3 MEIO AMBIENTE E DIREITO .......................................................................................... 26


3.1 A LEGISLAÇÃO AMBIENTAL ........................................................................................ 28
3.2 MITIGAÇÃO DO DIREITO DE PROPRIEDADE............................................................. 32
3.3 ALGUNS PONTOS RELEVANTES DO CÓDIGO FLORESTAL..................................... 33
3.4 A LEGISLAÇÃO DE MANANCIAIS ................................................................................ 35

4 SERVIDÃO AMBIENTAL URBANA ................................................................................. 37


4.1 EVOLUÇÃO LEGISLATIVA ........................................................................................... 37
4.2 CLASSIFICAÇÃO DA SERVIDÃO AMBIENTAL ............................................................ 42
4.3 PRINCIPAIS DISTINÇÕES ENTRE A SERVIDÃO CIVIL E A AMBIENTAL ................... 43
4.4 A (SUTIL) AMPLIAÇÃO PARA IMÓVEIS URBANOS .................................................... 44
4.5 A CARACTERIZAÇÃO DO INSTITUTO......................................................................... 45
4.6 INSTITUIÇÃO E ALIENAÇÃO: UM PROCEDIMENTO BIFÁSICO ................................. 47
4.7 ÁREAS DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE: UM APELO PARA QUE SEJAM
COMPUTADAS ................................................................................................................... 51
4.8 O RETORNO FINANCEIRO .......................................................................................... 52
4.9 A COMPENSAÇÃO EM ÁREAS DE MANANCIAIS ....................................................... 53

5 CONCLUSÃO ................................................................................................................... 57

REFERÊNCIAS ................................................................................................................... 59

ANEXO A – MODELO DE CONTRATO – ANOREG-BR .................................................... 61

ANEXO B – MODELO DE ESCRITURA PÚBLICA – ANOREG-BR ................................... 65

ANEXO C – MINUTA DE PROPOSTA DE PROCEDIMENTO - CETESB ........................... 69


8

1 INTRODUÇÃO

O momento anterior à produção da monografia é aquele no qual se


depara, de um lado, com uma infinita gama de possibilidades de pesquisa e, de
outro, com a necessidade de delimitar o tema. É também um momento de
confrontação, de perceber que, ao pesquisar, absorvem-se informações segundo os
próprios paradigmas e que, ao escrever e defender a monografia, haverá uma
exposição de si mesmo, do seu próprio entendimento sobre o mundo, que no fundo
é a exposição da essência do pesquisador.
Dess´arte, o tema da monografia deve ser instigador, atiçar a curiosidade
daquele que pesquisa e, por outro lado, ser útil às outras pessoas, pois assim o
entusiasmo pelo tema impulsionará o estudo e a fase da criação da monografia será
vivenciada com prazer. A servidão ambiental urbana foi eleita como tema de estudo,
em vista das dificuldades enfrentadas pelos usuários relativas ao uso e ocupação do
solo em região de mananciais.
O Código Florestal é de 1965. A legislação paulista de proteção aos
mananciais remonta a 1975. O instituto da servidão ambiental entrou para o direito
brasileiro no ano 2000 (ainda com o nome de servidão florestal). Mas foi com o Novo
Código Florestal de 2012 que o instituto tomou corpo e, como demonstraremos, com
a supressão de apenas uma palavra, ampliou-se sobremaneira e pôde ser aplicado
também em zona urbana. Dessa forma, inaugurou-se um cenário propício,
juntamente com a promulgação da Lei Específica da Billings, para a regularização de
situações imobiliárias antes insolvíveis.
O método de pesquisa escolhido foi o qualitativo. Considerando que no
Direito não há soluções únicas, mas várias soluções possíveis dentro de
argumentações válidas, o método qualitativo foi o mais adequado, uma vez que a
partir do estudo de várias leis e doutrina, num exercício de raciocínio lógico e
sistemático (dentro do Direito Positivo), se chegou a uma argumentação válida para
uma possível e melhor solução. A técnica de pesquisa utilizada foi a bibliográfica,
pois foram empreendidos estudos de fontes primárias ---Constituição, Código Civil,
Lei de Registros Públicos, legislação ambiental e outras leis pertinentes ---, bem
como de fontes secundárias --- livros de doutrina e artigos científicos.
9

O objetivo geral foi trazer elementos para uma melhor compreensão do


instituto da servidão, pelo qual um imóvel fica vinculado a outro, independentemente
de quem seja seu proprietário, trazendo-lhe algum tipo de utilidade. Em seguida,
verificar importância e o impacto do Direito Ambiental sobre o direito de propriedade,
bem como sua missão de proporcionar às futuras gerações um meio ambiente
saudável. Por fim, entender o instituto da servidão ambiental, um verdadeiro
casamento de um instituto privado com uma finalidade pública (ambiental).
A estruturação desse instituto, do ponto de vista civil, muitas vezes não se
encaixa perfeitamente à servidão ambiental. Foi feito um diálogo entre doutrinadores
civilistas, ambientalistas e registradores, bem como da legislação em vigor, para
encontrar um devido contorno jurídico da servidão ambiental. O ponto fulcral do
trabalho é o demonstrar que a servidão ambiental, que já existe desde 2000, passou
a poder ser utilizada também na zona urbana, principalmente como mecanismo de
compensação ambiental. Para isso, foi condição sine qua non aprofundar o conceito
jurídico de servidão e verificar as profundas alterações trazidas pelo Novo Código
Florestal.
O segundo capítulo inicia-se com uma interessante explanação sobre a
tipicidade dos direitos reais. Em seguida, faz uma abordagem civilista do direito de
servidão, expondo-se seu conceito, classificação, formas de constituição, conteúdo,
exercício, extinção, ações processuais e finaliza com aspectos do procedimento
registral.
No terceiro capítulo, trata-se do Direito Ambiental: sua importância,
contemporaneidade, e suas relações com o direito de propriedade. Também faremos
uma breve exposição sobre a evolução das leis ambientais, com o intuito de verificar
a proteção proposta pelas leis de proteção a mananciais.
No quarto capítulo, trataremos da servidão ambiental. Procuraremos
enquadrá-la na estrutura apresentada no primeiro capítulo para, por fim, defender a
extensão do instituto às áreas urbanas.
Ao final, ainda juntaremos modelos de constituição de servidão ambiental
e a proposta da Cetesb para aplicação do instituto em áreas de mananciais.
10

2 O DIREITO REAL DE SERVIDÃO

O estudo do direito real, ou das coisas, se inicia pelo direito de


propriedade. Ele está previsto no art. 1225, I, e arts. 1228 e seguintes do Código
Civil. A propriedade é formada por um feixe de direitos: usar (jus utendi), fruir (jus
fruendi), dispor (jus abutendi) e reivindicar (jus persequendi)1. Os demais direitos
reais são formados por um ou combinação de mais de um desses direitos.
Antes de entrar no conceito da servidão, para bem entender os direitos
reais, é importante apreender a noção de tipicidade. Os direitos reais valem contra
todos (erga omnes), portanto, apenas aqueles previstos e delineados na lei podem
entrar nessa categoria. Não é possível criar outros direitos reais pela autonomia da
vontade. Isso porque, como todos têm de respeitá-los, sua delimitação deve ser
muito precisa, para que todos possam saber seu alcance.
Méndez Gonzáles explica essa característica de forma muito didática:
Com efeito, uma das diferenças básicas entre os denominados direitos
pessoais obrigacionais ou contratuais e, em contrapartida, os designados
direitos reais, está em que, nos primeiros, as partes dispõem de uma vasta
liberdade de configuração de seu conteúdo, ao passo que, nos segundos,
não. Nesses últimos, rege o princípio da tipicidade que se retrata, em
extremo, no numerus clausus próprio de alguns sistemas. A razão dessa
diferença repousa em que os direitos reais implicam um aproveitamento
direto e exclusivo dos bens, a respeitar-se por todos.
Se essas formas de aproveitamento não fossem típicas – em maior ou
menor medida –, isso importaria custos inviáveis de informação para o
mercado, pois ninguém poderia assegurar-se de estar ou não violando
algum ius in rem alheio.
(...) Os direitos de crédito, ao contrário, limitam-se a disciplinar relações
entre as partes, em que as possibilidades de colisão são menores e, em
consequência, a liberdade de configuração, muito maior. (MÉNDEZ
GONZÁLES, 2012, pp. 88-9)2

1 “Os romanos sintetizavam os atributos da propriedade como jus utendi et abutendi e as faculdades
do proprietário nas expressões: usus,fructus e abusus, ou nos verbos uti, frui e abuti. O jus utendi é o
direito da pessoa servir de uma coisa para todos os fins a que a mesma pode se prestar; o jus
abutendi significa os modos de dispor de uma coisa, alienando, emprestando, transformando-a e até
destruindo-a; significa, enfim todos os meios e variações possíveis sobre o direito de disposição de
uma coisa; com o ius fruendi, identifica-se o direito de gozo da coisa, tudo o que a mesma possa
proporcionar de renda, benefício, ou o que, por qualquer modo, satisfaça vontades, necessidades ou
interesses do proprietário.” (SOUZA, 2014a)
2 A doutrina sempre foi firme ao afirmar que o art. 167, I, da Lei 6015/73, que descreve os atos

passíveis de registro, seria numerus clausus. Um dos grandes defensores desta interpretação era o
Desembargador Ricardo Henry Dip. No entanto, em recente palestra, ele afirmou que repensou sua
posição e já consegue ver outras possibilidades de registro que não estejam expressamente previstas
naquele artigo. Da mesma forma, o Registrador Flauzilino Araújo dos Santos, em palestra, também
defendeu esta posição, dizendo que o numerus clausus se referiria à tipicidade dos direitos reais, que
só poderiam ser criados por lei, mas não à possibilidade de registro e publicidade na matrícula.
Ambos deram o exemplo da multipropriedade (time sharing), que é uma demanda do mercado, com
11

2.1 CONCEITO

A servidão é uma sujeição jurídico-real de um imóvel em relação a outro


(res servit rei), de proprietário diverso (nemini res sua servit3), trazendo ao primeiro
(dominante) um acréscimo de fruição em desfavor do segundo (serviente)4. O
instituto está previsto nos arts. 1378 a 1389 do Código Civil.
Vejamos como a define o art. 1378:
A servidão proporciona utilidade para o prédio dominante, e grava o prédio
serviente, que pertence a diverso dono, e constitui-se mediante declaração
expressa dos proprietários, ou por testamento, e subsequente registro no
Cartório de Registro de Imóveis.

Constitui-se unicamente sobre bens imóveis. Pode ser instituída por


acordo de vontades ou por testamento. Depende de registro para existir5.
Trata-se de um jus in re, direito sobre a coisa. O ônus não é imposto a
uma pessoa, mas a outro imóvel, o vínculo não é pessoal, mas sim real. O proveito
resultante da servidão tem de ser imediatamente um proveito da coisa, e só
mediatamente um proveito do seu titular. Por outro lado, tal encargo não impede o
proprietário do imóvel serviente de usar e gozar sua propriedade.
Orlando Gomes nos traz importantes aspectos sobre o instituto:
Servidão é o direito real sobre a coisa imóvel, que lhe impõe um ônus em

alta relação com o imóvel e que se deveria albergar na publicidade registral. Confira-se, em reforço, o
recente Provimento CG 37/2013, que reformulou o Cap. XX (referente ao Registo de Imóveis) das
Normas de Serviço da Corregedoria Geral de Justiça do Estado de São Paulo: item 11.41 e item 229.
3 Essa característica da servidão vem desde os romanos. De fato, tem sentido quando se

considerada que o proprietário de dois imóveis pode usar e gozar de ambos à vontade. Mas quando
se pensa na dinâmica do trânsito imobiliário, quer nos parecer que essa característica tão forte na
servidão perde sustentação. O proprietário pode falecer e, quando o imóvel for transferido aos
herdeiros, ele irá sem o gravame (a menos que se reconheça judicialmente a servidão por destinação
do pai de família). Outra situação comum é de o proprietário de vários imóveis já querer deixar
definida a relação entre eles, para só então vender. Isso daria mais confiança a quem quisesse
comprar, pois as servidões já existiriam. Ainda podemos citar a situação em que o proprietário do
imóvel dominante adquire transitoriamente a propriedade do serviente. Pelo instituto da confusão a
servidão se extinguiria, mas essa não seria a vontade do proprietário que deseja vendê-lo logo em
seguida. Dessa forma, defendemos que a servidão deveria poder ser constituída em imóveis do
mesmo proprietário, como que ele mesmo abrindo mão de alguns direitos sobre o bem.
4 “A servidão é ainda um direito de gozo, mas a coisa cujo gozo o direito serve não é a mesma que

constitui seu objeto.” (ASCENSÃO, 2000, p. 489)


5 “A constituição de uma servidão é sempre uma alienação parcial do direito de propriedade.

Assim, a inscrição ou transcrição das servidões é formalidade substancial: a) com força declaratória,
em se tratando de usucapião e de direito hereditário; b) como força constitutiva, nos demais casos.”
(LOPES, 1960, p. 135)
12

proveito de outra, pertencente a diferente proprietário. (...)


São elementos constitutivos da servidão:
1º) a existência de um ônus ou encargo;
2º) a incidência num prédio em proveito de outro;
3º) o fato de pertencerem os prédios a diferentes donos.
(...)Necessário por fim que torne o prédio dominante mais útil, mais cômodo
ou, ao menos, mais agradável.
(GOMES, 2006, pp. 319-20).

Para Oliveira Ascensão é:


Servidão é o direito real que permite aumentar as utilidades que um direito
real de gozo sobre um imóvel proporciona, mediante uma restrição
correlativa de um direito de gozo sobre um imóvel vizinho. (ASCENSÃO,
2000, 488)

Já para Roberto Bove, que muito bem tratou sobre o tema:


Servidão é um ônus real constituído em favor de um prédio, chamado
dominante, imposto a outro prédio pertencente a dono diverso, denominado
serviente, em virtude do qual o proprietário do segundo perde o exercício de
algum de seus direitos dominicais sobre o seu prédio, ou tolera que dele se
utilize, para certo fim, o proprietário do primeiro.
A servidão é um encargo, considerado em relação ao prédio serviente, e, ao
mesmo tempo, é um benefício encarado em face do prédio dominante.
Das parcelas dos direitos dominicais, que adquire o dominante, resulta, para
ele, uma posição jurídica ativa, - o "jus faciendi", ou a de proibir que o
serviente pratique em seu prédio, determinados atos, - o "jus prohibendi".
A posição do proprietário serviente é passiva, destinado a suportar o
encargo - "in patiendo"; ou obrigado a abster-se de exercitar certos atos - "in
non faciendo. (BOVE, 2011, 1328-9)

O instituto da servidão também é utilizado no Direito Administrativo e


agora, mais recentemente, no Direito Ambiental. Em cada um, ele toma feições
próprias. Todos eles, no entanto, buscam seu fundamento no direito clássico de
servidão, com as derrogações próprias desses outros ramos do direito.

2.2 CLASSIFICAÇÃO

A doutrina comumente classifica as servidões em:


13

contínuas descontínuas6
aparentes não-aparentes7
urbanas rústicas
positivas negativas

Apronfundaremos a classificação quando tratarmos da servidão


ambiental.

2.3 CONSTITUIÇÃO

Como vimos anteriormente, segundo o art. 1378 do Código Civil, a


servidão se constitui mediante declaração expressa dos proprietários, ou
testamento. Na verdade, conjugando-se outros artigos, temos as seguintes formas
de constituição: 1) ato entre vivos (unilateral ou bilateral), 2) testamento, 3)
destinação do proprietário, 4) ato judicial, 5) usucapião.
É muito importante diferenciar os títulos de aquisição, retromencionados,
com o modo de aquisição. O modo é o registro no cartório de Registro de Imóveis.
Os títulos podem ser vários.
O mais comum é a instituição por acordo de vontade dos proprietários8.
Pode ser gratuito ou oneroso. A formalização desse acordo depende de escritura
pública, caso o valor do imóvel seja maior do que trinta salários mínimos (art. 108 do
Código Civil). Nesse mesmo sentido é a lição de Orlando Gomes:
A convenção, isto é, o acordo de vontades, é o modo mais comum de
constituição das servidões prediais. Mas, em verdade, deve ser tomado
antes como fonte do que modo de constituição propriamente dito. De fato. A
servidão é um direito real imobiliário. Ora, entre nós, os direitos reais sobre
imóveis não se constituem senão pelo competente registro. Os contratos

6 O critério de distinção não é a permanência ou a continuidade, mas a intervenção ou ausência de


intervenção do homem.
7 “As servidões aparentes, quer contínuas, quer descontínuas, são subordinadas ao Registro de

Imóveis, para a sua validade. (...) No nosso modo de entender, a única diferença entre servidões
aparentes e não aparentes, para o efeito do Registro de Imóveis, é que as primeiras podem ser
objeto de usucapião, ao passo que tal não pode ocorrer em relação às últimas. (...) Quanto ao mais,
aplicam-se a ambas as regras comuns do Registro de Imóveis. Ambas estão compreendidas no
Registro Imobiliário...” (LOPES, 1960, pp. 134-5)
8 Somente os proprietários podem estipular servidão. Necessário ainda que gozem da faculdade de

dispor. De observar, também, as regras gerais relativas à capacidade de contratar. (GOMES, 2006,
327)
14

produzem apenas efeitos obrigacionais; geram obrigações; não têm força


para criar direito real. Consequentemente, a convenção não constitui
servidão. Assim, sendo, o contrato serve como título à aquisição do direito
real de servidão. (GOMES, 2006, p. 327)

Outro título de constituição é o testamento. Importante observar que por


declaração de última vontade, o testador deve ser proprietário do prédio serviente e
o legatário deve ser proprietário do prédio que o testador pretende favorecer com a
constituição do ônus.
Há situações em que o proprietário de dois prédios estabelece um
gravame de um em favor de outro. Por serem ambos do mesmo proprietário, não é
possível falar-se em servidão. A doutrina utiliza o termo serventia. Ela só se torna
servidão com a alienação de um dos imóveis, desde que o proprietário consinta que
aquele gravame subsista. Bove explica bem:
São necessárias as seguintes condições, para a constituição desta espécie
de servidão:
a) a existência de dois prédios, de forma que um possa prestar utilidade a
outro;
b) o instituidor deve ser proprietário de ambos os prédios;
c) as serventias devem ser aparentes;
d) as serventias, que o proprietário estabelecer, para utilidade do prédio
favorecido, devem ser com o intuito de convertê-las em servidão, e não
como meros fatos acidentais;
e) a posterior separação dos dois prédios, que devem passar a pertencer a
donos diversos.
Enquanto os dois prédios pertencerem ao mesmo proprietário, não constitui
um encargo excepcional sobre a propriedade, porque, sendo o titular de
ambos o mesmo indivíduo, tal limitação seria inadmissível, pois o
proprietário de uma coisa não pode ter servidão sobre ela. Tendo ele, no
domínio, um título geral, legítimo e suficiente, para conferir-lhe o uso e gozo
de todas as utilidades, de que a coisa é suscetível, a servidão careceria de
objeto. E não pode haver servidão que não confira a seu titular um dos usos
da coisa pertencente a outrem.
(...) é necessário que haja, no ato da separação, a intenção de se constituir
a servidão. (BOVE, 2011, P. 1346)

Além da servidão por destinação do proprietário, que pode ser


reconhecida por sentença, Bove lembra outro caso de servidão constituída por ato
judicial:
Algumas servidões são constituídas por sentença do juiz, quando este, em
ato de partilha, determina que um prédio preste ao outro certa servidão,
quer para igualar os co-herdeiros, quer por necessidade para uso uns dos
outros. (BOVE, 2011, 1344)

O Código Civil, por fim, prevê a aquisição por usucapião da servidão


aparente no art. 1379. Se o possuidor tiver título, o prazo é de 10 anos; caso
15

contrário, ele se eleva para vinte9.

2.4 CONTEÚDO E EXERCÍCIO

Partindo-se do título mais comum, que é o contrato, passemos a analisar


a forma, os sujeitos e o objeto.
A forma, como já foi dito, será normalmente a escritura pública.
Os sujeitos devem ser os proprietários dos bens. Mas e se houver algum
ônus? O quadro abaixo se propõe a solucionar diversas hipóteses, com base nas
lições de Serpa Lopes e Roberto Bove10:

Prédio Serviente
Quem pode constituir servidão: Quem não pode constituir servidão:
o que tenha capacidade para alienar, por
os relativa ou absolutamente incapazes;
ato "inter vivos" ou "causa mortis"; são
bem como os tutores, curadores, e, em
portanto 4 requisitos: 1) ser proprietário,
geral, todos os administradores que
2) ter capacidade jurídica, 3) poder
tiverem bens alheios confiados a sua
alienar o imóvel, 4) ter o consentimento
administração
dos demais, caso não seja o único dono;
um cônjuge, sem o consentimento do
o casal;
outro;
o co-proprietário de um imóvel em
comum, desde que concorra o um co-proprietário, sem anuência dos
consentimento de todos os demais demais;
condôminos conjuntamente;
o proprietário do domínio resolúvel; o credor fiduciário;
o proprietário do domínio útil; o senhorio direto, na enfiteuse;
o superficiário; o proprietário, no direito de superfície;

9 Aqui temos uma pequena contradição no Novo Código Civil, uma vez que a usucapião da
propriedade foi reduzida para quinze anos, mas a da servidão ainda se mantém em vinte. O
Enunciado 251 da III Jornada de Direito de Civil do Conselho da Justiça Federal estabelece: “O prazo
máximo para o usucapião extraordinário de servidões deve ser de 15 anos, em conformidade com o
sistema geral de usucapião previsto no Código Civil.”
10LOPES, Miguel Maria de Serpa. Tratado dos registros públicos: em comentário ao decreto nº

4.857, de 9 de novembro de 1939... 4. ed. rev. e aum. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1960. V.3, p.
127; BOVE, Roberto. O direito real de servidão. In: DIP, Ricardo; JACOMINO, Sérgio (org.). Direito
Registral: doutrinas essenciais. Volume V: Propriedade e direitos reais limitados. (Coleção doutrinas
essenciais). São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011, p. 1343-4.
16

o nu proprietário, no caso de usufruto,


apenas quando a servidão não ocasionar
o usufrutuário;
prejuízo ao direito do usufrutuário, ou se
houver o consentimento deste;

o devedor hipotecário (com ressalvas11); o credor anticrético;


o fiduciário, no fideicomisso;
o proprietário de um imóvel já gravado de
servidão, contanto que o seu exercício
não prejudique o exercício da servidão
preexistente.

Prédio Dominante
Quem pode adquirir servidão: Quem não pode adquirir servidão:
quem não é proprietário do prédio
o titular do domínio resolúvel;
dominante;

o proprietário do imóvel onerado com


quem é proprietário ou co-proprietário
usufruto, beneficiando-se o usufrutuário,
dos dois imóveis;
enquanto durar o usufruto;

11“O ônus real, criado posteriormente ao ônus hipotecário, fica subordinado, quanto à sua
subsistência, ao primado deste último.
(...) Quer isso significar, pelo argumento a contrario, que todos os ônus reais constituídos e transcritos
posteriormente à hipoteca não podem subsistir, tanto quanto sejam incompatíveis com a aludida
garantia real: inclusione unius fit exclusivo alterius.
Assim sendo, e contrabalançando com uma interpretação mais larga diremos: não fica vedada a
constituição das servidões, apenas será um ônus real subordinado, quanto à sua subsistência, ao
interesse primordial do crédito hipotecário pré-inscrito.
Não cabe, portanto, ao credor hipotecário provar que o ônus real da servidão é prejudicial ao seu
crédito. Mas ao titular da propriedade do prédio dominante incumbe a prova e a promoção dos meios
necessários a demonstrar o não interesse do credor hipotecário, o qual, a seu turno, não pode
evidentemente, ir além do valor do seu crédito, limite definido do seu direito real sobre o imóvel dado
em garantia.
(...) Do exposto, pode-se chegar à seguinte conclusão: a) a constituição de servidões sobre um prédio
hipotecado tem a sua subsistência condicionada à garantia hipotecária, a menos que o credor
hipotecário, por meio de convenção, haja consentido nessa constituição; b) facultado ao credor
hipotecário vender o prédio hipotecado como livre de ônus, no caso acima referido; c) ao dono do
prédio dominante incumbe pedir a manutenção do ônus, provando que a permanência do mesmo não
prejudica o valor da garantia real.” (LOPES, 1960, pp. 129-30)
17

o proprietário exclusivo de um prédio


não pode adquirir servidão em vantagem
desse prédio e em desvantagem de
o co-proprietário de um prédio em
outro prédio, do qual seja co-proprietário;
comum, se houver o consentimento
se, porém, o proprietário do prédio
conjunto dos demais condôminos;
dominante tornou-se co-proprietário do
prédio serviente, quando já existia a
servidão de caminho, esta prevalece12;

o usufrutuário, em favor do prédio sujeito


não pode uma pessoa adquirir servidão
ao usufruto; o enfiteuta, em favor do
em proveito de um terceiro, mas apenas
prédio dado em enfiteuse; extinguindo-se
no seu próprio.
a servidão juntamente com o ônus;

legatário, desde que seja proprietário do


prédio dominante.

O objeto da servidão, como direito real que é, já está predefinido na lei.


Nada impede porém as partes regulem a extensão do direito e dos ônus no título
constitutivo13.
A servidão é direito acessório ao de propriedade. Desta acessoriedade
decorrem a inalienabilidade, a indivisibilidade, a perpetuidade, embora nada impeça
sua constituição por tempo limitado.
A primeira característica é a inalienabilidade. A servidão é um vínculo de
um imóvel a outro. O proprietário do imóvel dominante não pode transferir seus
direitos de fruição a outro proprietário. Da mesma forma, o proprietário do imóvel
serviente não pode transferir este ônus a outro imóvel. O direito adere ao imóvel.
Essa relação é infungível. Isso não implica, porém, que o proprietário do imóvel
serviente, quando esta recair apenas sobre parte do imóvel (i.e, servidão de
passagem), não possa removê-la para outra parte do imóvel, desde que não
prejudique o imóvel dominante. É o que diz o art. 1.384 do Código Civil:
Art. 1.384. A servidão pode ser removida, de um local para outro, pelo dono
do prédio serviente e à sua custa, se em nada diminuir as vantagens do
prédio dominante, ou pelo dono deste e à sua custa, se houver considerável

12 “Pacifici-Manzoni, refutando o ponto de vista de Aubry et Rau, entendem que, no caso de co-
propriedade, somente é possível subsistir a servidão, se numa pessoa se reunir parcialmente a
propriedade do fundo dominante e a do fundo serviente.
Seguiu entre nós, essa doutrina J. M. Carvalho Santos, esclarecendo que, no condomínio, é permitido
manter-se a servidão, mas nunca instituir. Distingue-se a conservação das servidões da aquisição
destas.” (LOPES, 1960, p. 124)
13 “... se aplicam as regras de interpretação dos negócios jurídicos. A interpretação é restritiva.”

(GOMES, 2006, p. 329)


18

incremento da utilidade e não prejudicar o prédio serviente.

A indivisibilidade está prevista no art. 1.368 do Código Civil, in verbis:


Art. 1.386. As servidões prediais são indivisíveis, e subsistem, no caso de
divisão dos imóveis, em benefício de cada uma das porções do prédio
dominante, e continuam a gravar cada uma das do prédio serviente, salvo
se, por natureza, ou destino, só se aplicarem a certa parte de um ou de
outro.
Significa que a servidão não se altera com a divisão dos imóveis, pois se
houver divisão dos prédios servientes todos continuam sujeitos, e se houver divisão
dos prédios dominantes todos podem usar da servidão. (ASCENÇÃO, 2000, p. 489).
Ademais, o direito não pode ser cedido, nem penhorado, nem hipotecado
separadamente, nem destacado do prédio dominante para serem atribuídas a um
outro, pois acompanham o imóvel em suas transmutações (LOPES, 1960, p. 123).
Sobre a perpetuidade, Bove nos dá uma boa explicação:
... adere perpetuamente aos prédios, acompanhando-os em todas as suas
passagens das mãos de um proprietário para as de outro. (...)
A perpetuidade da causa deve considerar-se como um requisito ou
elemento natural da servidão, no sentido de que esta deve cessar ou
extinguir-se, desde que desapareça a necessidade do prédio dominante ou
a possibilidade de o prédio serviente continuar a prestar o serviço.
Uma das consequências da normal perpetuidade da servidão é a sua
irremissibilidade, isto é, o proprietário do prédio serviente não pode obrigar o
do prédio dominante a desistir da servidão, recebendo o seu valor em
dinheiro. (BOVE, 2011, pp. 1331-2)

Com relação à extensão, a servidão pode originar uma obrigação de não


fazer (ex.: não elevar o prédio acima de uma determinada altura) ou de suportar que
se faça (ex.: servidão de passagem). Trata-se de uma obrigação negativa, ou
dizendo de outra forma, puramente passiva por parte do serviente.
O dono do prédio serviente tem, fundamentalmente, uma obrigação,
negativa: a de não entravar ou dificultar o exercício da servidão. Não lhe é
permitido praticar qualquer ato prejudicial ao direito do possuidor do prédio
dominante. Nenhuma obrigação positiva lhe incumbe em princípio.
(GOMES, 2006, p.329)

Nunca pode a servidão, em relação ao senhor do prédio serviente, traduzir-


se na obrigação de fazer - "Servitus in faciendo consistere nequit".
E, de sua essência, um direto real, que recai diretamente sobre a coisa, e
sobre ela se exerce. Se o senhor do prédio serviente se obriga a praticar
atos, em benefício do dono do prédio dominante, cria uma relação de direito
pessoal, que se rege pelos princípios do Direito das Obrigações. (BOVE,
2011, p. 1329)

Regra geral, o proprietário do prédio dominante será o responsável pelas


obras necessárias para seu uso e conservação14. Todavia, o contrato pode dispor o

14 Código Civil:
19

contrário. Se o proprietário do prédio serviente ficar responsável pelas obras, poderá


exonerar-se abandonando a coisa15.
Existe uma destinação e uma finalidade para a servidão. O dono do
prédio serviente não poderá embaraçar de modo algum seu exercício legítimo da
servidão. Por outro lado, constituída para certo fim, a servidão não se pode ampliar a
outro diverso16. Permite, entretanto, a apropriação de frutos ou produtos desse
prédio, nas hipóteses em que o proveito deles se possa depreender dentro dos
direitos do prédio dominante. O exercício do direito se restringirá às necessidades
deste, evitando-se, quanto possível, agravar o encargo ao prédio serviente17.
Importa, por fim, distinguir o conteúdo da servidão com o do usufruto:
A servidão... atribui uma faculdade determinada, mas só a quem for titular
de um direito real de gozo sobre prédio vizinho. É constitutivo do tipo
servidão que ambos os sujeitos sejam mediatamente determinados. (...) O
usufruto... atribui sempre o gozo, considerado como uma totalidade; de tal
modo que se se quiser excluir alguma faculdade, essa terá de ser
especialmente indicada. A técnica deste direito opõe-no claramente à
servidão. Aqui, são as faculdades individualizadas de gozo que se
concedem e que devem ser portanto especificamente referidas. (BOVE,
2011, p. 1329)

Não está o dono do prédio serviente impedido de:


- constituir novas servidões, da mesma, ou diversa natureza, em favor de
outros prédios, contanto que não ofendam, ou diminuam, as servidões
preexistentes;
- remover a servidão de um local para outro, contanto que o faça à sua
custa, e não diminua em nada as vantagens do prédio dominante.
Questão importante é, também, a do local da servidão. Este local pode ser
fixado por acordo no título constitutivo. Mas, se o lugar não estiver
convencionado, a qual dos proprietários compete sua fixação? Divergem as
opiniões, mas, visto que o lugar deve ser marcado onde for menos oneroso
ao prédio serviente, é o proprietário deste prédio quem o deve indicar.
(BOVE, 2011, p.1353)

A questão levantada por Bove sobre a localização da servidão parece ser


mais teórica, pois a servidão só se constitui mediante o registro. Na qualificação

Art. 1.380. O dono de uma servidão pode fazer todas as obras necessárias à sua conservação e uso,
e, se a servidão pertencer a mais de um prédio, serão as despesas rateadas entre os respectivos
donos.
Art. 1.381. As obras a que se refere o artigo antecedente devem ser feitas pelo dono do prédio
dominante, se o contrário não dispuser expressamente o título.
15 Art. 1.382. Quando a obrigação incumbir ao dono do prédio serviente, este poderá exonerar-se,

abandonando, total ou parcialmente, a propriedade ao dono do dominante.


Parágrafo único. Se o proprietário do prédio dominante se recusar a receber a propriedade do
serviente, ou parte dela, caber-lhe-á custear as obras.
16 "O titular da servidão deve exercitá-la estritamente nos termos de sua constituição e de inteiro

acordo com o seu fim, sem sair dos limites das necessidades a que ela buscou satisfazer.
Deve usá-la, portanto, "civiliter modo", de forma menos onerosa ao prédio serviente.” (BOVE, 2011, p.
1332)
17 Arts. 1383 e 1385 do Código Civil.
20

registral, se a servidão não for relativa a um imóvel todo, a que corresponde um


número de matrícula, ela deverá se submeter ao princípio da especialidade, ou seja,
deverá vir suficientemente descrita no título a parcela do imóvel a que
corresponde18.

2.5 EXTINÇÃO E AÇÕES PROCESSUAIS

O Código Civil traz algumas formas de extinção da servidão: 1) renúncia


pelo dominante, 2) perda da utilidade ou desnecessidade, 3) resgate pelo serviente,
4) confusão, 5) não-uso. Essas hipóteses estão todas previstas nos arts. 1388 e
1389 do Código Civil. Podemos citar ainda: a destruição da coisa e a usucapião do
prédio serviente por terceiro, como se fora livre.
A renúncia é o ato de vontade pelo qual o proprietário do prédio
dominante abre mão do seu direito à servidão. Ela pode ser expressa, através de
título hábil; ou tácita, quando provém de atos incompatíveis com o exercício da
servidão (por exemplo, quando o senhor do prédio dominante não impede que o
dono do serviente faça nele obra incompatível com o exercício da servidão).
Somente a primeira autoriza o cancelamento direto no Registro de imóveis, pois se
materializou num título. A segunda depende de declaração judicial que a reconheça,
sendo a sentença o título nesse caso.
Como foi explicado na seção anterior, a servidão só existe para atender a
uma finalidade ou destinação. Ela deve agregar utilidade ao prédio dominante.
Assim, caso se comprove a perda da utilidade ou sua desnecessidade, pode-se
cancelá-la. Também será necessário título judicial. Oliveira Ascensão afirma isso de
forma categórica:
A desnecessidade é uma causa autônoma de extinção de direitos reais, e
distingue-se facilmente do não uso. (...) se a servidão deve trazer um
proveito ao prédio, é natural que se extinga quando se torne desnecessária.
A servidão voluntária de trânsito para a estrada principal deve fatalmente
extinguir-se quando o novo traçado dessa estrada a fizer passar pelo prédio
dominante. (ASCENSÃO, 2000, p.511)

18Para facilitar a aplicação da servidão ambiental para compensação em área de proteção de


mananciais, a Cetesb criou o módulo de compensação ambiental (MCA), que será explicado no
capítulo 4.9.
21

Dentro dessa categoria também pode-se encaixar o caso da destruição do


prédio dominante ou serviente. Se o prédio dominante não mais existir, não tem
sentido existir a servidão, pois não tem ao que servir ou trazer utilidade. Por outro
lado, se o prédio serviente for destruído, fica sem substrato o direito de servidão.
Cabe ao dominante arcar com o custo da reedificação. Se for feita, a servidão
subsiste.
A servidão, porém, renascerá "ipso iure" se o prédio serviente voltar à
situação anterior, por exemplo, se o prédio demolido for reedificado,
contanto que esta restauração se faça antes de se operar a prescrição.
(BOVE, 2011, p. 1354)

O resgate equivale à renúncia, mas agora do ponto de vista do imóvel


serviente. Lembrando da característica da irremissibilidade, mencionado por Bove, o
serviente não pode simplesmente adquirir de volta a servidão. Isso não depende
apenas da vontade dele. O resgate se dá com o acordo de vontades manifestado
em título hábil. Esse será o instrumento a ser levado ao cartório para o
cancelamento.
A confusão se dá pela união em uma só pessoa da propriedade do imóvel
dominante e serviente. Nessa hipótese, a servidão transforma-se em serventia.
Conforme comentamos na nota de rodapé número 3, não concordamos com ela19.
Tanto é assim, que a doutrina tem de se desdobrar para acolher diversas nuances
da confusão.
Para se dar a confusão, é essencial:
a) que a propriedade dos prédios, dominante e serviente, abranja a
totalidade deles, - pois a servidão não se perde por partes;
b) que o adquirente se torne senhor do prédio dominante "in perpetuum”.
Se a aquisição é, desde o princípio, revestida do caráter de transitória, para
vigorar somente durante algum tempo. neste caso, cessada ela, revive a
servidão. (BOVE, 2011, p. 1354)
É necessário, porém, que essa reunião seja completa, de todo o prédio
dominante como de todo prédio serviente.
O cancelamento do ônus poderá ser efetuado nesse caso pelo Oficial do
Registro, mediante requerimento do novo titular único da propriedade de
ambos os prédios, e a verificação dessa situação o Oficial pode fazê-la com
os próprios elementos decorrentes dos seus livros, ou de outro oficial, se o
prédio dominante e o serviente estiverem situados em circunscrições
diversas. (LOPES, 1960, p. 146)

Uma vez que o cancelamento da servidão por confusão depende de


requerimento, este pode não ser feito e o imóvel ser alienado novamente a terceiro.

19“Ocorre simplesmente a impossibilidade de exercício, pelo que alguns não consideram a confusão
propriamente modo de extinção das servidões, mas, tão-só, de suspensão de seu exercício,
admitindo que se restaura se sucede a separação do domínio dos dois prédios. Predomina, no
entanto, a doutrina que a inclui entre os modos de extinção.” (GOMES, 2006, p. 330)
22

Nesse caso, Serpa Lopes leciona que o terceiro adquiriu o imóvel convicto da
existência da servidão, pois que ainda não cancelada. Dessa forma, “a despeito da
existência de uma causa de extinção, continua a subsistir, e isso pela razão de
continuar a viver formalmente.” (LOPES, 1960, p. 148)
O não-uso origina o chamado usucapião de liberdade (usucapio libertatis),
pelo qual o prédio serviente fica livre de ônus se o dominante não usufruir dele por
dez anos contínuos. Esse fato extintivo é mais evidente nas servidões positivas.
Nas negativas, o não uso se começa a contar do momento em que o dono
do prédio dominante perde a posse da servidão, isto é, do momento em que
o dono do prédio serviente consuma o ato proibido. Por exemplo, na
servidão "non altius tollendi", a prescrição correrá desde o dia em que no
prédio serviente o edifício existente foi erguido a uma altura superior à que
tinha, sem que o proprietário do prédio dominante opusesse embargo.
(BOVE, 2011, p. 1357)

A doutrina ainda traz o caso de extinção da servidão por resolução do


domínio:
Na servidão, cumpre distinguir três hipóteses, a saber: a) resolução do
direito do proprietário do prédio dominante; b) resolução do direito do
proprietário do prédio serviente; c) contrato de servidão sob condição
resolutiva, que se realizou.
Na primeira hipótese, a servidão subsiste, porque o efeito retroativo da
resolução é aplicável, somente, a todos os encargos e diminuições, e não
às vantagens, que não saíram do patrimônio do proprietário aparente e por
isso não têm natureza de benfeitorias.
Portanto, as servidões só se extinguem nas outras duas hipóteses acima.
A realização da condição resolutória tem efeito retroativo.
Nas servidões, porém, a resolução só opera para o futuro; porque é
impossível recuperar o proveito já fruído pelo proprietário dominante.
(BOVE, 2011, p. 1356)

Qualquer que seja a forma de extinção, uma vez registrada a servidão (e


só assim se constitui como direito real qualquer tipo de servidão, mesmo não-
aparente, pois dá-se publicidade contra terceiros e futuros adquirentes), ela só se
extingue pelo cancelamento do registro20. É o que diz o artigo 1387 do Código Civil,
que apenas exclui desta regra a desapropriação. Serpa Lopes espanca qualquer
dúvida:
a) em havendo uma convenção na qual os interessados hajam pactuado a
extinção de uma servidão, o Oficial do Registro pode, à vista da respectiva
escritura, efetuar o cancelamento do ônus, bem como no caso de confusão,
pois só existe um único interessado.
b) nos demais casos, o cancelamento do ônus de servidão somente pode
ser levado a efeito, à vista do consentimento dos interessados ou de sua
não oposição. Na falta deste requisito ou de impugnação, o cancelamento

20 “Qualquer que seja o fato extintivo, a servidão só deixa de existir quando cancelada. O
cancelamento é exigido a fim de que a extinção valha contra terceiros, não sendo, pois modo de
extinção propriamente dito.” (ASCENSÃO, 2000, p. 511)
23

somente pode ser realizado mediante sentença, caso em que o papel do


Oficial do Registro de Imóveis se resume em cumprir a determinação
judicial. (LOPES, 1960, p. 144)

Para finalizar esta seção, apenas para completar o estudo civilista das
servidões, mencionamos as possíveis ações para defesa deste direito: ação
confessória, ação publiciana, ação negatória, interditos proibitórios, nunciação de
obra nova e usucapião. Considerando que não é o foco deste trabalho a discussão
processual da servidão, remetemos o leitor para o trabalho de BOVE, 2011, pp. 1359
e seguintes.

2.6 ASPECTOS REGISTRAIS

A qualificação da servidão no Registro de Imóveis, assim como de


qualquer outro título, começa pela análise da matrícula. Se o imóvel ainda não tem
matrícula, deve-se analisar a transcrição e abrir-se a matrícula. Caso a transcrição
ainda esteja na circunscrição anterior a que pertenceu o imóvel, deve-se levar ao
atual registro de imóveis a certidão atualizada da transcrição21.
Antes mesmo de examinar o título, o registrador deve analisar o imóvel.
Inicia com a leitura da descrição. No atual sistema de matrícula, vige o princípio da
especialidade objetiva. A descrição do imóvel deve ser suficiente para identificá-lo e
individualizá-lo. Mesmo que ela não esteja perfeita, é possível o registro. No entanto,
se o imóvel não tiver qualquer amarração com o solo, se estiver “flutuando” no
espaço, deve-se pedir a prévia retificação do registro (princípio da ubiquidade).
Em seguida, passa-se à análise do atual proprietário. Deve-se identifica-
lo, bem como sua qualificação deve estar completa (princípio da especialidade
subjetiva).
Ainda na matrícula, verifica-se a existência de ônus. A depender dos ônus
existentes, o registrador vai avaliar a possibilidade do registro do título.

21Se o imóvel pertenceu a muitas circunscrições, deve-se extrair a certidão da última transcrição.
Para comprovar que aquela é a última, deve-se ainda requerer a certidão negativa de cada um dos
cartórios posteriores que tiveram a atribuição daquele imóvel. Ribeirão Pires, por exemplo, antes de
se tornar comarca em 1966, pertenceu aos seguintes cartórios de registro de imóveis: 1º Santo
André; 9º, 12º, 6º e 3º de São Paulo. Se a transcrição da última aquisição estiver, digamos, no 12º
CRI de São Paulo, para abrir a matrícula em Ribeirão Pires, também será necessário trazer a certidão
dos cartórios seguintes, quais sejam: 9º de São Paulo e 1º de Santo André.
24

Uma vez que a matrícula tenha sido analisada, o registrador tem em sua
mente a descrição do imóvel, o atual proprietário e os ônus. Passa então à
qualificação do título, neste caso o da constituição da servidão.
Como foi visto, em geral o título será uma escritura pública ou um título
judicial. É possível que seja um instrumento particular quando o valor do imóvel não
atingir trinta salários mínimos22. Frise-se: o valor de trinta salários mínimos não é o
atribuído à servidão, mas sim ao imóvel inteiro.
Verificada a adequação da forma do título, passa-se ao seu conteúdo.
Primeiro verificam-se as partes. No caso da servidão, de um lado estará o
proprietário do imóvel serviente e de outro o do imóvel dominante. Ambos devem
corresponder às respectivas matrículas. Ambos devem ser maiores e capazes ou
estarem representados. Ambos não podem ter impeditivo para alienar o bem (ex.:
alguma indisponibilidade averbada no imóvel) No caso de existência de ônus, deve-
se observar o quadro que apresentamos na seção 2.4 deste capítulo.
Em seguida, verifica-se a descrição do imóvel. Pode ser dado em
servidão o imóvel inteiro ou parte dele. Se for o imóvel inteiro, a descrição deve
coincidir com a matrícula. Se foi parte do imóvel, a descrição na matrícula tem de ser
boa o suficiente para se ter certeza que a descrição daquela parte se contém na
matrícula do imóvel serviente. Nesse caso, deve acompanhar a escritura: 1) planta
demonstrando a área total e a área de servidão, devidamente assinada com
reconhecimento de firma do proprietário e do engenheiro responsável pela apuração
da área; 2) memorial descritivo, devidamente assinado com reconhecimento de firma
do proprietário e do engenheiro; e 3) ART (se engenheiro) ou RRT (se arquiteto),
acompanhada da guia de recolhimento.
Por fim, verifica-se se os tributos foram pagos, as demais exigências
formais quanto ao título (escritura ou judicial) e a autenticidade das assinaturas.
O registro será feito na matrícula do imóvel serviente. Mas como se trata
de um vínculo entre imóveis, é fundamental que se averbe no imóvel dominante a
existência da servidão.
Ao elaborar o ato, o registrador deve sempre mencionar o número e a
data da prenotação, pois os efeitos do registro se retroagem àquela. Em seguida,

221) O valor de 30 salários mínimos é o do imóvel e não o do negócio: assim, se as partes atribuírem
valor inferior, mas o valor venal for maior, prevalece a escritura pública. 2) O valor é do imóvel inteiro
e não da parte que está sendo alienada ou onerada. 3) O valor é o da época do negócio.
25

fará eventuais averbações de atualização do imóvel (cadastro na Prefeitura,


atualização de algum documento das partes ou do estado civil). Por fim fará o ato de
registro da servidão. No texto, deve identificar precisamente o título no qual se
baseou, e o nome e qualificação das partes (proprietários dos imóveis serviente e
dominante). Em seguida, fará menção ao objeto e à extensão da servidão: se o
imóvel serviente não for dado por inteiro, deve-se descrever a parcela que está
sendo dada em servidão; em seguida, deve-se definir que tipo de servidão: se é uma
servidão positiva ou negativa, quais as utilidades que o serviente está acrescendo
ao dominante. Ao final do ato o registrador data e assina, identificando seu nome e
cargo.
Questão controvertida é a forma de cobrança dos emolumentos do
registro da servidão. A tabela de emolumentos no Estado de São Paulo não tem
solução expressa para este caso, como tem para o usufruto. Entre os registradores
bandeirantes, pudemos encontrar cinco interpretações:
1) Aplicar o item 1.5 das notas explicativas da tabela de Notas (20% do valor do
imóvel todo).
2) Entender que a servidão equipara-se a usufruto e aplicar 1/3 do valor do imóvel
para o registro.
3) Aplicar o valor proporcional da área de servidão, considerando o valor venal do
imóvel.
4) Usar o valor atribuído ao negócio.
5) Aplicar o item 1.5 das notas explicativas da tabela de Notas "com
temperamentos", ou seja, apenas na área objeto da servidão (20% do valor da área).
Depois de registrada a servidão, deve-se imprimir o ato na matrícula,
digitalizá-la, expedir a certidão, cotar os emolumentos no título, elaborar o recibo
discriminando tudo que foi feito, atualizar os indicadores real e pessoal (não há
emissão de DOI).
26

3 MEIO AMBIENTE E DIREITO

O planeta Terra existe há cerca de 4,5 bilhões de anos. Por quase de 1


bilhão de anos, só existia rocha incandescente, que aos poucos foi endurecendo,
virou pedra e formou a superfície terrestre. A vida na Terra surgiu há uns 3,6 bilhões
de anos, com organismos unicelulares muito simples. O ser humano, tal qual o
conhecemos, somente apareceu no cenário há apenas de 200 mil anos.
Dotado de inteligência, o humanoide construiu ferramentas, domou
animais e cultivou a terra. Durante milhares de anos, foi possível a coexistência dele
com a natureza. Entretanto, no último século, temos visto uma aceleração de
“desenvolvimento” como jamais ocorreu em todo o sempre. O avanço da tecnologia,
do conhecimento e o próprio crescimento populacional progridem numa escala
geométrica.
Interessante notar que o dito homo sapiens não consegue conviver
harmonicamente com a natureza, que é de onde extrai sua própria subsistência. Ele
é capaz de jogar esgoto na água que vai beber e poluir o ar que respira. Alguns
analistas mais ácidos, apelidaram o homem de “bactéria humana”, numa analogia à
doença que o ser humana representaria para o planeta.
Na verdade, todo o discurso ecológico não visa a preservar o planeta,
mas simplesmente o ser humano. O planeta existia há bilhões de anos antes do
homem e, certamente, vai continuar existindo, mesmo que haja uma hecatombe
nuclear. E mesmo outras formas de vida também prosseguirão.
No documentário Earthlings (Terráqueos)23, pode-se perceber quão
reduzida é a consciência do ser humano em relação à sua posição no planeta. Ora,
ele é um habitante da Terra assim como qualquer outra forma de vida (borboleta,
golfinho, formiga etc.). Mas se acha em uma posição de dominar e destruir todas as
demais formas de vida. Portanto, é nessa fase histórica que o direito ambiental está:
todos (os homens) têm direito a um meio ambiente saudável. Ainda que não seja
ainda o desejável, já houve um progresso radical em relação a outros períodos24.

23https://www.youtube.com/watch?v=vPtrekRyTMA (acesso em 09.09.2014)


24O Brasil, na década de 70, quando os países desenvolvidos já começavam a se conscientizar da
questão ambiental, fazia uma propaganda internacional de crescimento a qualquer custo: “venha
poluir no Brasil!”
27

O cientista David Suzuki faz uma demonstração muito convincente do


momento histórico que vivemos, através de uma analogia do abuso de recursos,
com enfoque no crescimento exponencial. Esta demonstração pode ser vista no
youtube: https://www.youtube.com/watch?v=jJgzREDxzyk (acesso em 09.08.2014).
Conseguimos a seguinte transcrição:
Factos da Vida
“Você sabe que há imensas coisas que podemos consertar neste
mundo, sobre que podemos fazer alguma coisa…”

“Mas algumas coisas são factos da vida… essas são coisas que temos
de aceitar e de trabalhar com elas.”

Crescimento Exponencial
Um desses factos, salienta Suzuki, é o crescimento exponencial:

“Se alguma coisa está a crescer a 1% por ano ela duplicará em 70


anos. 2% por ano ela duplicará em 35 anos, 3% por ano em 24 anos…
alguma coisa a crescer exponencialmente duplicará a sua duração
temporal previsível. Agora vou mostrar-lhe porque todas estas coisas
sobre… ‘Temos de manter a economia a crescer’… é derradeiramente
suicida.”

Um Sistema Análogo ao Planeta


1 tubo de ensaio cheio de comida = o planeta.
Bactérias que comem a comida = humanos.

A Experiência:
1 célula de bactéria é introduzida num tubo de ensaio completamente cheio.
De acordo com o crescimento exponencial ela irá dividir-se a cada minuto.

“Então na hora zero haverá 1 célula (bactéria). A 1 minuto há 2 (células). A


2 minutos há 4. A 3 minutos há 8. A 4 minutos há 16.”

Ciclo de Crescimento de 60 Minutos


“Aos 60 minutos o tubo de ensaio está completamente cheio de bactérias e
não há comida de sobra. Então temos um ciclo de crescimento de 60
minutos. Quando está o tubo de ensaio apenas meio cheio?”
59 minutos: 50% cheio.
“Mesmo que tivesse a crescer durante 59 minutos está apenas metade
cheio, mas um minuto mais tarde estará completamente cheio. Então isso
significa que …”
58 minutos: 25% cheio.
57 minutos: 12.5% cheio.
55 minutos: 3% cheio.

Viver No 59º Minuto


“O nosso lar é a biosfera. Ela é fixa e finita. Ela não consegue crescer. E
temos de aprender a viver com esse mundo finito. Cada cientista com quem
falei concorda comigo: Já passámos o 59º minuto.25

Essa situação foi expressa por Souza:


A população mundial cresce de forma assustadora e o mais grave o
crescimento vem ocorrendo em cidades e, em países do terceiro mundo.

25 Disponível em : <http://bloguedoprimata.blogs.sapo.pt/113899.html>. Acesso em 09.08.2014.


28

Estudos recentes da Organização das Nações Unidas – ONU mostram que


a população mundial atingiu 6,5 bilhões de habitantes, tendo crescido 1
bilhão de habitantes em relação a 1993, podendo chegar aos 7 bilhões em
2012 e, em 9 bilhões em 2050. Este mesmo relatório, realizado com base
em estudos da Divisão de População da ONU, analisando tamanho da
população e crescimento demográfico concluiu que as pessoas estão
trocando as zonas rurais pelos centros urbanos. Do total do crescimento,
90% ocorrerão em países pobres e 90%, dos 90% em áreas urbanas. Em
igual período estima-se que o PIB mundial deverá multiplicar-se em três
vezes e meia. A grande preocupação é o que ocorrerá com o Planeta Terra
se a poluição e a deterioração ambiental aumentar na mesma proporção. O
crescimento da população implica no aumento da produção de alimentos o
que acaba resultando em ampliação da área plantada, em geral provocando
desmatamento em fronteiras agrícolas, aumento da quantidade do uso de
agrotóxicos, tudo resultando em impacto ambiental. (...)
A conjugação de todos esses fatores vem exigindo uma profunda revisão do
modelo econômico, social, político e, sobretudo jurídico, da maneira de se
encarar e administrar o meio ambiente. (SOUZA, 2008, p. 30-1)

O momento em que vivemos é delicado. Requer bastante reflexão e, mais


do que isso, uma ação efetiva rumo a uma nova forma de crescimento e relação com
o planeta e com as demais formas de vida26. O papel do direito, em especial o
ambiental, releva-se como uma forma de regrar esse novo panorama. No Brasil, a
legislação ambiental vem ganhando cada vez mais espaço, especialmente a partir
da Constituição de 1988.

3.1 A LEGISLAÇÃO AMBIENTAL

Segundo Camilo, a legislação ambiental no Brasil só começou a tomar


corpo de verdade após 1980: “Não se pode considerar a legislação anterior à
década de 1980 como protetiva ao meio ambiente, visto que tutelavam a economia,
e de forma reflexa o meio ambiente.” (CAMILO, 2014, p. 2535). Da mesma forma,
Souza fala da ineficácia do Código Florestal de 1965:
O Código Florestal representou importante avanço em termos de criação
legislativa. No entanto, sua aplicação prática deixou muito a desejar. (...) O
mesmo ocorreu com as áreas de reserva legal no resto do País, que devem
ser de, no mínimo, vinte por cento por propriedade, disposição que foi
solenemente ignorada em todo o território nacional. Não foi diferente o
tratamento dado pelos proprietários rurais à importantíssima mata ciliar,
faixa de cobertura florestal que deveria revestir as margens de todos os rios
ou de qualquer curso d’água. A reserva legal não foi preservada, as

26 Outro documentário muito esclarecedor sobre uma atitude sustentável é “A história das coisas”:
https://www.youtube.com/watch?v=7qFiGMSnNjw (acesso em 09.08.2014).
29

margens foram devastadas provocando erosão, assoreamento e


contaminação dos rios. (SOUZA, 2014a)27

Vejamos a evolução da legislação brasileira neste quadro:

Quadro Cronológico – Principais Leis Ambientais (e correlatas*)


Ano Lei
1920 Elaboração do anteprojeto do Código Florestal
1934 Decreto 23.793 - Código Florestal de 1934
1934 Decreto 24.643 – Código de Águas*
1964 Lei 4.504 – Estatuto da Terra*
1965 Lei 4.771 - Código Florestal de 1965
1981 Lei 6.938 - Política Nacional do Meio Ambiente
1988 Constituição Federal - art. 225
Lei 7.754 - Medidas para proteção das florestas existentes nas nascentes
1989
dos rios
1991 Lei 8.171 - Política Agrícola
1997 Lei 9.433 - Política Nacional de Recursos Hídricos
1998 Lei 9.605 - Crimes Ambientais
1999 Lei 9.795 - Política Nacional de Educação Ambiental
2000 MP 1956-50 - Institui servidão florestal
2001 Lei 10.257 – Estatuto da Cidade
2006 Lei 11.284 - Institui servidão ambiental
Lei Complementar 140 - Fixa normas para a cooperação ambiental entre
2011
os entes federados
2012 Lei 12651 - Novo Código Florestal

A Constituição de 1988 foi um marco na proteção do meio ambiente:


trouxe um capítulo sobre o meio ambiente e ainda enfatizou muito bem a função
social e ambiental da propriedade. Para sistematizar as disposições constitucionais a
respeito do tema, fizemos o seguinte quadro:

Constituição Federal de 1988 - Meio Ambiente


Art. 23. É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios:

27No mesmo sentido é a impressão de Camilo: “No Brasil foi tardia, é falha e é corrompida pelos
sentimentos de utilitarismo e antropocentrismo intrínsecos ao homem.” (2014, p. 2537)
30

III - proteger os documentos, as obras e outros bens de valor histórico, artístico e cultural, os
monumentos, as paisagens naturais notáveis e os sítios arqueológicos;
IV - impedir a evasão, a destruição e a descaracterização de obras de arte e de outros bens de
valor histórico, artístico ou cultural;
VI - proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas;
VII - preservar as florestas, a fauna e a flora;
XI - registrar, acompanhar e fiscalizar as concessões de direitos de pesquisa e exploração de
recursos hídricos e minerais em seus territórios;
Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre:
VI - florestas, caça, pesca, fauna, conservação da natureza, defesa do solo e dos recursos naturais,
proteção do meio ambiente e controle da poluição;
VII - proteção ao patrimônio histórico, cultural, artístico, turístico e paisagístico;
VIII - responsabilidade por dano ao meio ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor
artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico;
Art. 30. Compete aos Municípios:
I - legislar sobre assuntos de interesse local;
II - suplementar a legislação federal e a estadual no que couber;
VIII - promover, no que couber, adequado ordenamento territorial, mediante planejamento e controle
do uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano;
IX - promover a proteção do patrimônio histórico-cultural local, observada a legislação e a ação
fiscalizadora federal e estadual.
Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem
por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os
seguintes princípios:
III - função social da propriedade;
VI - defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado conforme o impacto
ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração e prestação;
Art. 182. A política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder Público municipal, conforme
diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções
sociais da cidade e garantir o bem- estar de seus habitantes.
§ 2º - A propriedade urbana cumpre sua função social quando atende às exigências fundamentais
de ordenação da cidade expressas no plano diretor.
Art. 186. A função social é cumprida quando a propriedade rural atende, simultaneamente, segundo
critérios e graus de exigência estabelecidos em lei, aos seguintes requisitos:
I - aproveitamento racional e adequado;
II - utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente;
Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso
comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à
coletividade o dever de defendê-lo e preservá- lo para as presentes e futuras gerações.
§ 1º - Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público:
I - preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais e prover o manejo ecológico das
espécies e ecossistemas;
II - preservar a diversidade e a integridade do patrimônio genético do País e fiscalizar as entidades
dedicadas à pesquisa e manipulação de material genético;
III - definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus componentes a serem
especialmente protegidos, sendo a alteração e a supressão permitidas somente através de lei,
vedada qualquer utilização que comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua
proteção;
IV - exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de
significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará
publicidade;
V - controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos e substâncias que
comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente;
31

VI - promover a educação ambiental em todos os níveis de ensino e a conscientização pública para


a preservação do meio ambiente;
VII - proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua
função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade.
§ 2º - Aquele que explorar recursos minerais fica obrigado a recuperar o meio ambiente degradado,
de acordo com solução técnica exigida pelo órgão público competente, na forma da lei.
§ 3º - As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores,
pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação
de reparar os danos causados.
§ 4º - A Floresta Amazônica brasileira, a Mata Atlântica, a Serra do Mar, o Pantanal Mato-
Grossense e a Zona Costeira são patrimônio nacional, e sua utilização far-se-á, na forma da lei,
dentro de condições que assegurem a preservação do meio ambiente, inclusive quanto ao uso dos
recursos naturais.
§ 5º - São indisponíveis as terras devolutas ou arrecadadas pelos Estados, por ações
discriminatórias, necessárias à proteção dos ecossistemas naturais.
§ 6º - As usinas que operem com reator nuclear deverão ter sua localização definida em lei federal,
sem o que não poderão ser instaladas.

O art. 23 tratou da competência comum a todos os entes da federação de


atuar no campo ambiental. O art. 24 referiu-se às competências legislativas
concorrentes também a todos os entes da federação: a União legisla normas gerais
e os Estados complementam com normas específicas. Já o art. 30 trata da
competência dos Municípios para atuar e legislar sobre assuntos de interesse local
(atuação que ganha força com a LC140/11). Os arts. 170, 182 e 186 especificam a
função socioambiental da propriedade. Por fim, o art. 225 traça todo o arcabouço
jurídico do meio ambiente, trazendo para à baila o direito intergeracional, pois
propõe um meio ambiente equilibrado para as presentes e futuras gerações.
No Estado de São Paulo, a atenção para a questão ambiental já vem de
longe. Contamos com uma extensa e complexa legislação.

Principais Leis Ambientais do Estado de São Paulo


Lei Estadual nº 6.884/62 - Dispõe sobre os parques e florestas estaduais,
monumentos naturais.
Lei Estadual n° 118/73 - Autoriza a Constituição da CETESB
Lei Estadual n° 997/76 - Dispõe sobre o controle da poluição do meio ambiente.
Lei Estadual n° 898/75 - Já alterada pela Lei Estadual nº 3746/83 - Disciplina o uso
do solo para a proteção dos mananciais, cursos e reservatórios de água e demais
recursos hídricos de interesse da Região Metropolitana da Grande São Paulo
Lei Estadual n° 1.172/76 - Delimita as áreas de proteção relativa aos mananciais,
cursos e reservatórios de água a que se refere o artigo 2° da Lei n° 898/75, e
estabelece normas de restrição de uso do solo em tais áreas.
Lei nº 1.817, de 27 de outubro de 1978 - Estabelece os objetivos e as diretrizes
para o desenvolvimento industrial metropolitano e disciplina o zoneamento
industrial, a localização, a classificação e o licenciamento de estabelecimentos
industriais na Região Metropolitana da Grande São Paulo, e dá providências
correlatas.
32

Lei Estadual n° 4.056/84 - Dispõe sobre a área mínima dos lotes no parcelamento
do solo para fins urbanos.
Lei Estadual n° 6.134/88 - Dispõe sobre a preservação dos depósitos naturais de
águas subterrâneas do Estado de São Paulo, e dá outras providências.
Lei Estadual n° 6.171/88 - Já alterada pela Lei Estadual nº 8.421/93 - Dispõe sobre
o uso, conservação e preservação do solo agrícola.
Lei Estadual n° 7.663/91 - Estabelece normas de orientação à Política Estadual de
Recursos Hídricos bem como ao Sistema Integrado de Gerenciamento de
Recursos Hídricos.
Lei Estadual n° 7.750/92 - Dispõe sobre a Política Estadual de Saneamento, e dá
outras providências.
Lei Estadual n° 9.509/97 - Dispõe sobre a Política Estadual do Meio Ambiente,
seus fins e mecanismos de formulação e aplicação (SEAQUA).
Lei Estadual n° 9.989/98 - Dispõe sobre a recomposição da cobertura vegetal no
Estado de São Paulo.
Lei Estadual n° 11.165/02 - Institui o Código de Pesca e Aquicultura do Estado.
Lei Estadual n° 11.977/05 - Institui o Código de Proteção aos Animais do Estado dá
outras providências.
Lei Estadual n° 12.300/06 - Institui a Política Estadual de Resíduos Sólidos e define
princípios e diretrizes.
Lei Estadual n° 12.780/07 - Institui a Política Estadual de Educação Ambiental.
Lei Estadual n° 13.579/09 - Define a Área de Proteção e Recuperação dos
Mananciais da Bacia Hidrográfica do Reservatório Billings - APRM-B.
Lei Estadual n° 13.798/09 - Institui a Política Estadual de Mudanças Climáticas -
PEMC.

3.2 MITIGAÇÃO DO DIREITO DE PROPRIEDADE

Entre os romanos, o direito de propriedade era considerado absoluto e


ilimitado. Tinha um cunho eminentemente individualista. No século XVIII a doutrina
civilista começou a repensá-lo e a limitá-lo. Hoje se fala muito em função sócio-
econômico-ambiental do direito de propriedade28.
O Direito Romano nos legou uma visão egoística da propriedade, toda
centrada no indivíduo, que poderia livremente decidir pelo uso e destinação
da coisa no seu exclusivo interesse.(...)
O jus utendi et abutendi, ou seja aquele direito ilimitado de usar a coisa para
todos os fins possíveis, livremente dispondo da mesma, inclusive
destruindo-a, consagrado nas expressões romanas usus,
fructus e abusus, não mais existe. A propriedade subordinada às vontades,
anseios, desejos e até delírios de seu dominus desapareceu. (...)

28 A nova postura do Direito justificou, inclusive a imposição de grandes limitações a direitos


individuais clássicos e consagrados, como o direito de propriedade e o direito à livre iniciativa.
(SOUZA, 2008, p. 31)
33

Quando se diz que a propriedade privada tem função social, na verdade,


está se afirmando que ao proprietário se impõe o dever de exercer o seu
direito de propriedade não mais, unicamente, em seu próprio e exclusivo
interesse mas, também, em benefício da coletividade. Assim, é
precisamente o cumprimento da função social e de uma nova postura
cobrada pela coletividade, o que legitima o exercício do direito de
propriedade pelo seu titular. (...)
A função social da propriedade deve ser entendida em sua tríplice
dimensão: laboral, social e ambiental. Dessa forma deve ser produtiva de
maneira a atender a gerar e distribuir riqueza, fixando o homem no campo e
propiciando-lhe condições de vida digna. A dimensão social entendida como
a responsabilidade do proprietário em fazer um uso adequado de maneira a
preservar o interesse coletivo atendendo necessidades das gerações atuais
e das gerações futuras de modo a efetivar a equidade intergeracional.
Finalmente a dimensão ambiental resultante do uso racional e equilibrado
da terra que é um bem de fruição individual mas de responsabilidade
coletiva em razão de suas importâncias para atender as necessidades
humanas e manter o equilibro ecológico em um ambiente equilibrado capaz
de propiciar sadia qualidade de vida. (SOUZA, 2014a)

Juridicamente, a função social (em sentido amplo) da propriedade está


delineada em alguns dispositivos legais: art. 5º, XXIII; 170, III; 182 (urbana); 186
(rural), todos da Constituição de 1988; art. 1228, §1º do Código Civil; art. 2º do
Estatuto da Cidade, entre outros.
Hoje, o conteúdo do direito de propriedade é o que resta de diversas
limitações: de uso não abusivo do direito, do direito de vizinhança, de limitações
administrativas, urbanísticas e ambientais. A própria manutenção da propriedade é
limitada, pois o sujeito que não paga suas obrigações propter rem (IPTU, taxa
condominial) pode se vir a perdê-la. E ainda há obrigações positivas, como
demonstra Cardoso:
[...] a função social e ambiental não constitui um simples limite ao exercício
do direito de propriedade, como aquela restrição tradicional, por meio da
qual se permite ao proprietário, no exercício do seu direito, fazer tudo o que
não prejudique a coletividade e o meio ambiente. Diversamente, a função
social e ambiental vai mais longe e autoriza até que se imponha ao
proprietário comportamentos positivos, no exercício do seu direito, para
que a sua propriedade concretamente se adeque à preservação do meio
ambiente. (CARDOSO, 2010b, p. 168)

3.3 ALGUNS PONTOS RELEVANTES DO CÓDIGO FLORESTAL


34

Duas formas drásticas de limitação da propriedade são a reserva legal e


as áreas de preservação permanente. As primeiras aplicáveis apenas a imóveis
rurais e as segundas também a urbanos.
Segundo o Código Florestal (Lei 12.651/2012), art. 3º, reserva legal é
área localizada no interior de uma propriedade ou posse rural, com a função de
assegurar o uso econômico de modo sustentável dos recursos naturais do imóvel
rural, auxiliar a conservação e a reabilitação dos processos ecológicos e promover a
conservação da biodiversidade, bem como o abrigo e a proteção de fauna silvestre e
da flora nativa. A área de preservação permanente (APP) é aquela protegida,
coberta ou não por vegetação nativa, com a função ambiental de preservar os
recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica e a biodiversidade, facilitar o
fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem-estar das
populações humanas.
A reserva legal é uma parte do imóvel que fica afetada à preservação
ambiental. Os índices estão previstos no art. 12 do Código Florestal. Na maior parte
do Brasil, equivale a 20% do imóvel, mas pode chegar a 80%. A localização deste
ônus no imóvel seguirá as diretrizes do art. 14 e será inscrita no Cadastro Ambiental
Rural (CAR – art. 18). A forma de exploração da reserva legal está prevista no art.
17:
Art. 17. A Reserva Legal deve ser conservada com cobertura de vegetação
nativa pelo proprietário do imóvel rural, possuidor ou ocupante a qualquer
título, pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado.
§ 1o Admite-se a exploração econômica da Reserva Legal mediante manejo
sustentável, previamente aprovado pelo órgão competente do Sisnama, de
acordo com as modalidades previstas no art. 20.

As áreas de preservação permanente são aquelas situadas às margens


de cursos d´água, nascentes, topos de morro e outras previstas no art. 4º e 6º.
Diferente da reserva legal, que é uma parte eleita dentro do imóvel rural, a APP é
identificada por sua própria natureza e localização, em imóvel rural ou urbano.
Dessa forma, não precisa de nenhuma publicidade especial.
Já a área de preservação permanente prescinde de anotação no Ofício do
Registro Imobiliário ou em órgão específico, por se tratar de imposição legal,
geral, unilateral e gratuita. A própria lei dá publicidade e eficácia necessárias
para o seu conhecimento por todos. (RIZZARDO, 2014, p. 283)

Importante frisar que não se pode computador para o índice da reserva


legal, áreas de APP. Isso implica que o imóvel rural poderá ter sua área útil
drasticamente reduzida em função das limitações ambientais.
35

É possível a utilização de áreas de APP para atividades de baixo impacto


(art. 9º). Também elas poderão, excepcionalmente, contar no índice da reserva legal
nos casos do art. 15.
Nos últimos anos, algumas flexibilizações quanto à reserva legal foram
feitas: compensação de reserva legal (art. 66, III); o citado aproveitamento de áreas
de APP; a instituição em regime de condomínio ou coletiva (art. 16); possibilidade de
extinção quando do parcelamento urbano (art. 19); manejo sustentável (arts. 20 a
24).
Novidade importante da Lei 12651/12 foi a possibilidade de regularização
fundiária de interesse específico em área de APP (art. 65). A Lei 11.977/09 só previa
essa possibilidade para o interesse social.

3.4 A LEGISLAÇÃO DE MANANCIAIS

O Estado de São Paulo, desde os anos 70, tem se preocupado com a


questão da proteção das águas. Em 1975, a Lei Estadual n. 898 disciplinou o uso do
solo para a proteção dos mananciais. Em 1976, a Lei Estadual n. 1.172 delimitou as
áreas de proteção relativa aos mananciais.
Essa foi uma legislação bem restritiva e tratou de forma uniforme a
situação dos mananciais em todo o Estado. Como a maior parte da legislação
daquela época, padeceu de inefetividade. É flagrante a forma desordenada que toda
a região de mananciais da Grande São Paulo foi ocupada.
Recentemente, tendo em vista uma abordagem mais realista e factível, o
Estado está revendo essa legislação de mananciais e adequando-a às
peculiaridades de cada bacia hidrográfica. Foi nesse contexto que surgiu em 2009 a
lei específica da Billings: Lei estadual 13.579.
Uma característica importante das leis de mananciais é a disciplina da
forma de uso e ocupação do solo. Foram criados diversos índices para o
licenciamento ambiental: lote mínimo, área florestada, área permeável, coeficiente
máximo de aproveitamento, coeficiente de elevação, entre outros. O tratamento
desses índices se mostra semelhante ao que se dá à reserva legal.
36

A nova lei da Billings flexibilizou diversos desses índices em áreas onde a


ocupação já se consolidou e endureceu-os em outras onde as áreas estavam mais
preservadas. Surge com isso um grande questionamento com relação ao direito
adquirido aos índices, nos casos em que eles foram endurecidos; ou à revisão deles,
nos casos em que foram suavizados.
Por outro lado, houve a possibilidade de compensação de índices em
casos de regularização. Verificamos aqui a grande valia da aplicação da servidão
ambiental, tal qual é feita para compensação da reserva legal.
37

4 SERVIDÃO AMBIENTAL URBANA

A servidão ambiental surgiu nos Estados Unidos, onde é denominada


conservation easement. Vários outros países se valem do instituto para proteger o
meio ambiente, como é o caso do Canadá, Costa Rica, México, Inglaterra e
Espanha29. Nos países de língua espanhola, é denominada servidumbre ecológica.
No Brasil, foi introduzida em 2000, pela Medida Provisório 1956, reedição
n. 50, de 26/5/2000. Naquela época o instituto era chamado de servidão florestal e
passou a compor o art. 44-A do antigo Código Florestal (Lei 4771/65).
Essa medida provisória foi reeditada até o número 57, posteriormente
mantida na legislação pela MP 2080-58, de 27/12/2000, reeditada até o número 64,
e finalmente perpetuada na legislação pela MP 2166-65, de 28/6/2001, reeditada até
o número 67.
Em 2006, a Lei 11284 introduziu a servidão ambiental, agora já com este
nome, na Lei da Política Nacional do Meio Ambiente (Lei 6938/81), art. 9º-A. Apenas
realocou a matéria, mas não trouxe nenhuma novidade. Finalmente, o Novo Código
Florestal trouxe a servidão ambiental tal qual ela se encontra hoje, com um
tratamento mais bem detalhado.

4.1 EVOLUÇÃO LEGISLATIVA

A MP 1956-50/2000 introduziu algumas alterações importantes no Código


Florestal, entre elas, a criação no direito brasileiro da servidão florestal. Fê-lo através
da alteração da redação do art. 44 e inclusão dos arts. 44-A e 44-B na Lei 4771/65,
e ainda de um inciso na Lei 9393/96. Essa mesma redação se manteve até a
inclusão definitiva do texto pela MP 2166-67, de 24/8/2001 (que só foi
expressamente revogada pelo Novo Código Florestal).
Art. 44. O proprietário ou possuidor de imóvel rural com área de floresta
nativa, natural, primitiva ou regenerada ou outra forma de vegetação nativa
em extensão inferior ao estabelecido nos incisos I, II, III e IV do art. 16,

29 CAMILO, 2014, p. 2538.


38

ressalvado o disposto nos seus §§ 5o e 6o, deve adotar as seguintes


alternativas, isoladas ou conjuntamente:
III - compensar a reserva legal por outra área equivalente em importância
ecológica e extensão, desde que pertença ao mesmo ecossistema e esteja
localizada na mesma microbacia, conforme critérios estabelecidos em
regulamento.
§ 5o A compensação de que trata o inciso III deste artigo, deverá ser
submetida à aprovação pelo órgão ambiental estadual competente, e pode
ser implementada mediante o arrendamento de área sob regime de servidão
florestal ou reserva legal, ou aquisição de cotas de que trata o artigo 44B.
Art. 44A. O proprietário rural poderá instituir servidão florestal, mediante a
qual voluntariamente renuncia, em caráter permanente ou temporário, a
direitos de supressão ou exploração da vegetação nativa, localizada fora da
reserva legal e da área com vegetação de preservação permanente.
§ 1o A limitação ao uso da vegetação da área sob regime de servidão
florestal deve ser, no mínimo, a mesma estabelecida para a Reserva Legal.
§ 2o A servidão florestal deve ser averbada à margem da inscrição de
matrícula do imóvel, no registro de imóveis competente, após anuência do
órgão ambiental estadual competente, sendo vedada, durante o prazo de
sua vigência, a alteração da destinação da área, nos casos de transmissão
a qualquer título, de desmembramento ou de retificação dos limites da
propriedade.
Art. 44B. Fica instituída a Cota de Reserva Florestal-CRF, título
representativo de vegetação nativa sob regime de servidão florestal, de
Reserva Particular do Patrimônio Natural ou reserva legal instituída
voluntariamente sobre a vegetação que exceder os percentuais
estabelecidos no art. 16 deste Código.
Parágrafo único. A regulamentação deste Código disporá sobre as
características, natureza e prazo de validade do título de que trata este
artigo, assim como os mecanismos que assegurem ao seu adquirente a
existência e a conservação da vegetação objeto do título.

Ela surgiu como uma forma de compensação da reserva legal de imóveis


rurais30. O proprietário de um imóvel rural desprovido de reserva legal poderia
arrendar a quantidade de área que precisasse para compensá-la na propriedade
rural de outro proprietário que renunciasse voluntariamente ao seu direito de
supressão ou exploração da vegetação nativa. Deveria haver anuência do órgão
ambiental estadual competente e averbação na matrícula do imóvel.
Também foi criado um título representativo de vegetação nativa – CRF –,
cujas aquisição de cotas também servia para compensar a reserva legal. Essa é
uma forma de transformar a servidão ambiental numa espécie de “crédito ambiental”.
Para incentivá-la, também foi alterada a legislação do ITR (Lei 9393/96) para excluir
da área tributável aquela instituída como servidão florestal (art. 10, §1º, II, d).
Seis anos depois, a Lei 11284/2006 introduziu a servidão ambiental como
instrumento econômico na Lei de Política Nacional do Meio Ambiente (Lei 6938/81):

30 “A servidão ambiental não tem como escopo substituir áreas de preservação permanente ou de
reserva legal, mais sim instituir um plus no que se refere à preservação. É uma inovação à proteção
ao meio ambiente.” (CAMILO, 2014, P. 2538)
39

Art. 9o-A. Mediante anuência do órgão ambiental competente, o proprietário


rural pode instituir servidão ambiental, pela qual voluntariamente renuncia,
em caráter permanente ou temporário, total ou parcialmente, a direito de
uso, exploração ou supressão de recursos naturais existentes na
propriedade.
§ 1o A servidão ambiental não se aplica às áreas de preservação
permanente e de reserva legal.
§ 2o A limitação ao uso ou exploração da vegetação da área sob servidão
instituída em relação aos recursos florestais deve ser, no mínimo, a mesma
estabelecida para a reserva legal.
§ 3o A servidão ambiental deve ser averbada no registro de imóveis
competente.
§ 4o Na hipótese de compensação de reserva legal, a servidão deve ser
averbada na matrícula de todos os imóveis envolvidos.
§ 5o É vedada, durante o prazo de vigência da servidão ambiental, a
alteração da destinação da área, nos casos de transmissão do imóvel a
qualquer título, de desmembramento ou de retificação dos limites da
propriedade. (grifos nossos naquilo que foi inovado)

As inovações basicamente foram três: a) o nome do instituto passou a ser


servidão ambiental, e não mais florestal; b) ficou claro que a servidão ambiental
deveria ser averbada na matrícula de todos os imóveis envolvidos (§4º); c) houve a
ampliação das limitações também ao uso dos recursos naturais (e não mais
vegetação nativa). Por fim, incluiu a averbação no rol do art. 167, II, da Lei 6015/73
(item 23).
Ocorre que a Lei 11284/2006 introduziu o art. 9º-A na Lei 6938/81, mas
não revogou o art. 44-A da Lei 4771/65. Coexistiam na legislação a servidão florestal
e ambiental. No entanto, pelo teor dos dispositivos legais de uma e de outra,
verificava-se a identidade entre ambos, o que levou a doutrina a afirmar a
derrogação do art. 44-A da Lei 4771/65.
Em 2012, houve a promulgação do Novo Código Florestal – Lei 12651.
Essa lei trouxe diversas alterações ao ordenamento jurídico ambiental. Entre elas,
criou diversos novos dispositivos referentes à servidão ambiental e definiu melhor o
instituto (arts. 9º-B e 9º-C). Vejamos:
Art. 13. Quando indicado pelo Zoneamento Ecológico-Econômico - ZEE
estadual, realizado segundo metodologia unificada, o poder público federal
poderá:
I - reduzir, exclusivamente para fins de regularização, mediante
recomposição, regeneração ou compensação da Reserva Legal de imóveis
com área rural consolidada, situados em área de floresta localizada na
Amazônia Legal, para até 50% (cinquenta por cento) da propriedade,
excluídas as áreas prioritárias para conservação da biodiversidade e dos
recursos hídricos e os corredores ecológicos;
§ 1o No caso previsto no inciso I do caput, o proprietário ou possuidor de
imóvel rural que mantiver Reserva Legal conservada e averbada em área
superior aos percentuais exigidos no referido inciso poderá instituir servidão
ambiental sobre a área excedente, nos termos da Lei no 6.938, de 31 de
agosto de 1981, e Cota de Reserva Ambiental.
40

Art. 15. § 2o O proprietário ou possuidor de imóvel com Reserva Legal


conservada e inscrita no Cadastro Ambiental Rural - CAR de que trata o art.
29, cuja área ultrapasse o mínimo exigido por esta Lei, poderá utilizar a área
excedente para fins de constituição de servidão ambiental, Cota de Reserva
Ambiental e outros instrumentos congêneres previstos nesta Lei.
Art. 44. É instituída a Cota de Reserva Ambiental - CRA, título nominativo
representativo de área com vegetação nativa, existente ou em processo de
recuperação:
I - sob regime de servidão ambiental, instituída na forma do art. 9o-A da Lei
no 6.938, de 31 de agosto de 1981;
Art. 50. A CRA somente poderá ser cancelada nos seguintes casos:
II - automaticamente, em razão de término do prazo da servidão ambiental;
Art. 66. O proprietário ou possuidor de imóvel rural que detinha, em 22 de
julho de 2008, área de Reserva Legal em extensão inferior ao estabelecido
no art. 12, poderá regularizar sua situação, independentemente da adesão
ao PRA, adotando as seguintes alternativas, isolada ou conjuntamente:
III - compensar a Reserva Legal.
§ 5o A compensação de que trata o inciso III do caput deverá ser precedida
pela inscrição da propriedade no CAR e poderá ser feita mediante:
I - aquisição de Cota de Reserva Ambiental - CRA;
II - arrendamento de área sob regime de servidão ambiental ou Reserva
Legal;
Art. 68. Os proprietários ou possuidores de imóveis rurais que realizaram
supressão de vegetação nativa respeitando os percentuais de Reserva
Legal previstos pela legislação em vigor à época em que ocorreu a
supressão são dispensados de promover a recomposição, compensação ou
regeneração para os percentuais exigidos nesta Lei.
§ 2o Os proprietários ou possuidores de imóveis rurais, na Amazônia Legal,
e seus herdeiros necessários que possuam índice de Reserva Legal maior
que 50% (cinquenta por cento) de cobertura florestal e não realizaram a
supressão da vegetação nos percentuais previstos pela legislação em vigor
à época poderão utilizar a área excedente de Reserva Legal também para
fins de constituição de servidão ambiental, Cota de Reserva Ambiental -
CRA e outros instrumentos congêneres previstos nesta Lei.
Art. 78. O art. 9o-A da Lei no 6.938, de 31 de agosto de 1981, passa a
vigorar com a seguinte redação:
“Art. 9o-A. O proprietário ou possuidor de imóvel, pessoa natural ou
jurídica, pode, por instrumento público ou particular ou por termo
administrativo firmado perante órgão integrante do Sisnama, limitar o uso de
toda a sua propriedade ou de parte dela para preservar, conservar ou
recuperar os recursos ambientais existentes, instituindo servidão ambiental.
§ 1o O instrumento ou termo de instituição da servidão ambiental deve
incluir, no mínimo, os seguintes itens:
I - memorial descritivo da área da servidão ambiental, contendo pelo menos
um ponto de amarração georreferenciado;
II - objeto da servidão ambiental;
III - direitos e deveres do proprietário ou possuidor instituidor;
IV - prazo durante o qual a área permanecerá como servidão ambiental.
§ 2o A servidão ambiental não se aplica às Áreas de Preservação
Permanente e à Reserva Legal mínima exigida.
§ 3o A restrição ao uso ou à exploração da vegetação da área sob servidão
ambiental deve ser, no mínimo, a mesma estabelecida para a Reserva
Legal.
§ 4o Devem ser objeto de averbação na matrícula do imóvel no registro de
imóveis competente:
I - o instrumento ou termo de instituição da servidão ambiental;
II - o contrato de alienação, cessão ou transferência da servidão ambiental.
41

§ 5o Na hipótese de compensação de Reserva Legal, a servidão ambiental


deve ser averbada na matrícula de todos os imóveis envolvidos.
§ 6o É vedada, durante o prazo de vigência da servidão ambiental, a
alteração da destinação da área, nos casos de transmissão do imóvel a
qualquer título, de desmembramento ou de retificação dos limites do
imóvel.
§ 7o As áreas que tenham sido instituídas na forma de servidão florestal,
nos termos do art. 44-A da Lei no 4.771, de 15 de setembro de 1965,
passam a ser consideradas, pelo efeito desta Lei, como de servidão
ambiental.” (NR)
Art. 79. A Lei no 6.938, de 31 de agosto de 1981, passa a vigorar acrescida
dos seguintes arts. 9o-B e 9o-C:
“Art. 9o-B. A servidão ambiental poderá ser onerosa ou gratuita, temporária
ou perpétua.
§ 1o O prazo mínimo da servidão ambiental temporária é de 15 (quinze)
anos.
§ 2o A servidão ambiental perpétua equivale, para fins creditícios, tributários
e de acesso aos recursos de fundos públicos, à Reserva Particular do
Patrimônio Natural - RPPN, definida no art. 21 da Lei no 9.985, de 18 de
julho de 2000.
§ 3o O detentor da servidão ambiental poderá aliená-la, cedê-la ou transferi-
la, total ou parcialmente, por prazo determinado ou em caráter definitivo, em
favor de outro proprietário ou de entidade pública ou privada que tenha a
conservação ambiental como fim social.”
“Art. 9o-C. O contrato de alienação, cessão ou transferência da servidão
ambiental deve ser averbado na matrícula do imóvel.
§ 1o O contrato referido no caput deve conter, no mínimo, os seguintes
itens:
I - a delimitação da área submetida a preservação, conservação ou
recuperação ambiental;
II - o objeto da servidão ambiental;
III - os direitos e deveres do proprietário instituidor e dos futuros adquirentes
ou sucessores;
IV - os direitos e deveres do detentor da servidão ambiental;
V - os benefícios de ordem econômica do instituidor e do detentor da
servidão ambiental;
VI - a previsão legal para garantir o seu cumprimento, inclusive medidas
judiciais necessárias, em caso de ser descumprido.
§ 2o São deveres do proprietário do imóvel serviente, entre outras
obrigações estipuladas no contrato:
I - manter a área sob servidão ambiental;
II - prestar contas ao detentor da servidão ambiental sobre as condições dos
recursos naturais ou artificiais;
III - permitir a inspeção e a fiscalização da área pelo detentor da servidão
ambiental;
IV - defender a posse da área serviente, por todos os meios em direito
admitidos.
§ 3o São deveres do detentor da servidão ambiental, entre outras
obrigações estipuladas no contrato:
I - documentar as características ambientais da propriedade;
II - monitorar periodicamente a propriedade para verificar se a servidão
ambiental está sendo mantida;
III - prestar informações necessárias a quaisquer interessados na aquisição
ou aos sucessores da propriedade;
IV - manter relatórios e arquivos atualizados com as atividades da área
objeto da servidão;
V - defender judicialmente a servidão ambiental.”
Art. 80. A alínea d do inciso II do § 1o do art. 10 da Lei no 9.393, de 19 de
dezembro de 1996, passa a vigorar com a seguinte redação:
“Art. 10. .....................................................................
42

§ 1o ......................................…………………….............
.............................................................................................
II - ...................................................…………................
.............................................................................................
d) sob regime de servidão ambiental;
...................................................................................” (grifos nossos)

As alterações mais importantes foram: a) possibilidade de redução do


índice de reserva legal, desde que haja compensação com servidão ambiental, para
regularização de áreas rurais consolidadas (art. 3º, III); b) possibilidade de utilizar
área excedente ao percentual mínimo de reserva legal como servidão ambiental; c)
instituição da cota de reserva ambiental (antigo CRF), com base em servidão
ambiental; d) possibilidade de utilizar a servidão ambiental para completar extensão
de reserva legal inferior ao mínimo legal; e) norma de transição que preserva o
direito adquirido (art. 68); f) possibilidade de o possuidor (e não só o proprietário)
instituir servidão ambiental; g) supressão da qualificação “rural” para o imóvel; h)
deixa expresso que pode ser pessoa física ou jurídica; i) possibilita a instituição,
além de escritura pública, por instrumento particular ou termo administrativo; j)
ampliação da proteção de recursos “naturais” para recursos “ambientais”; k)
supressão da anuência do órgão ambiental; l) especificação do que deve incluir o
instrumento de servidão ambiental (§1º dos arts. 9º-A e 9º-C); m) revogação da
servidão florestal e conversão das já existentes em servidão ambiental (art. 9º-A,
§7º); n) prazo mínimo de 15 anos para a servidão ambiental temporária; o) direitos e
deveres dos contratantes (art. 9º-C, §§2º e 3º); p) adequação da nomenclatura na
Lei do ITR.

4.2 CLASSIFICAÇÃO DA SERVIDÃO AMBIENTAL

A servidão ambiental pode ser classificada como: voluntária ou


convencional, rústica, não-aparente31, negativa e contínua.
Servidão rústica é aquela que compreende o solo ou terreno não-
edificado, quer dentro ou fora da cidade32. Não-aparente, a que não se manifesta por
sinais exteriores. Bove esclarece a negativa e a contínua:

31 Não podem ser objeto de usucapião.


43

É servidão negativa aquela que tem por objeto uma abstenção de


determinados fatos por parte do prédio serviente, e, como tal, não exige
para o seu exercício, por parte do prédio dominante, prática de qualquer
ato. Tem por objeto impedir o proprietário serviente de usar livremente o seu
prédio (...)
Contínuas - são as que, uma vez estabelecidas, se exercem, ou se podem
exercer, independentemente de prática continuada de atos por parte de seu
titular (...) uso ou exercício é independente de fato do homem, no sentido de
que a ação deste, se existe, só constituir condição da sua existência, mas
não condição do seu exercício. (BOVE, 2011, pp. 1341-2)

4.3 PRINCIPAIS DISTINÇÕES ENTRE A SERVIDÃO CIVIL E A AMBIENTAL

Civil Ambiental33
Constituída por escritura pública, nos Constituída por instrumento público ou
termos do art. 108 do CC particular ou por termo administrativo –
art. 9º-A da Lei 6938/81
Registrada no cartório de Registro de Averbada no cartório de Registro de
imóveis - art. 167, I, 6, da Lei 6015/73 imóveis - art. 167, II, 23, da Lei 6015/73
Imóvel urbano ou rural Até o Novo Código Florestal, apenas em
imóvel rural (de 2000 a 2012)
Entre imóveis vizinhos ou próximos Os imóveis não precisam estar
próximos, basta que estejam no mesmo
bioma (art. 66, §6º, II, da Lei 12651/12)

32 BOVE, 2011, p. 1335. Na verdade, essa é a utilização clássica da servidão ambiental. No entanto, a
nova redação trazida pela Lei 12651/12 parece estender sua utilização para recursos artificiais, como
o patrimônio histórico, artístico e cultural, como veremos a seguir.
33 Considerando apenas a servidão ambiental, Cardoso propõe diversas submodalidades: “Nesse

sentido, pode-se optar pelos seguintes tipos de servidão ambiental: a) servidão ambiental para a
proteção integral da flora, dos recursos naturais, não se admitindo nenhum tipo de manejo, como a
proteção de importantes ecossistemas em extinção, tais como florestas, mangues, terras úmidas,
caatingas, dentre outros; b) servidão ambiental para a conservação admitindo-se o manejo
sustentável dos recursos naturais, como as de florestas destinadas à captura de carbono, permissão
para o ecoturismo, caminhos ecológicos, montanhismo, esportes em rios, lagos, mares e demais; c)
servidão ambiental para proteção ou conservação de paisagens de notável beleza cênica; d) servidão
ambiental para limitar a construção ou urbanização, proibindo-se determinados ou todos os tipos de
construções; e) servidão ambiental para proteção ou conservação histórica ou arqueológica, com a
finalidade de garantir o conhecimento para as futuras gerações.” (CARDOSO, 2010a, p. 395)
44

Livre acordo entre contratantes Até o Novo Código Florestal, precisava


de anuência do órgão ambiental
Entre imóvel dominante e serviente Pode ser apenas em um imóvel – uma
limitação de uso que não favoreça
nenhum outro imóvel em específico (art.
9º-A)

4.4 A (SUTIL) AMPLIAÇÃO PARA IMÓVEIS URBANOS

A nova redação trazida pelo Novo Código Florestal incorporou diversas


sugestões da doutrina: especificou mais o contrato, direitos e deveres, incentivou o
retorno financeiro ao caracterizar melhor a CRA, ampliou a proteção para recursos
“ambientais” (conceito mais amplo que vegetação nativa ou recursos naturais),
ampliou a aplicação do instituto a imóveis urbanos.
Essa última modificação foi introduzida de modo quase imperceptível. É
possível que muitos aplicadores do direito, acostumados à servidão ambiental
utilizada apenas a imóveis rurais, nem tenham notado a diferença, pois houve
apenas a supressão da palavra “rural” e a utilização da expressão recursos
“ambientais”. Ao que parece, a doutrina de Sônia Cardoso foi atendida pelo
legislador. Vejamos sua análise quanto à redação anterior do art. 9º-A:
A propósito, traz-se à colação, também, o conceito de recuso ambiental.
Este se encontra consubstanciado no art. 3º, V, da Lei 6.38/81 como “a
atmosfera, as águas interiores, superficiais e subterrâneas, os estuários, o
mar territorial, o solo, o subsolo, os elementos da biosfera, a fauna e a
flora". Ao abrigar em seu conceito os elementos da biosfera, essa lei
expandiu sobremaneira o conceito de recurso ambiental, levando em
consideração não apenas os recursos naturais, mas também o ecossistema
humano. Nesse sentido pode-se afirmar que “a categoria dos recursos
naturais é parte de um conjunto mais amplo, os recursos ambientais. Em
outros termos, todo recurso natural é ambiental, mas nem todo recurso
ambiental é natural”. (citando Edis Milaré)
Portanto, o conceito de recursos ambientais é mais amplo, pois compreende
os naturais e os artificiais, como o patrimônio histórico, artístico e cultural da
propriedade.
Percebe-se que o dispositivo legal (Lei 6.938/81, art. 9-A), em razão do uso
dessa terminologia, não abrange os recursos ambientais e, por
consequência, os bens ambientais que se encontram, normalmente nos
centros urbanos. (CARDOSO, 2010b, PP. 156-7)
45

Por um lado, a nova redação deixou expresso que o instituidor pode ser o
proprietário ou o possuidor, pessoa natural ou jurídica; deixou claro que o
instrumento pode ser público, particular ou termo administrativo; mas foi muito sutil
nessa ampliação do objeto. Uma vez que a proteção deixa de ser apenas de
recursos naturais e também passa a proteger recursos artificiais, englobados no
conceito de recursos ambientais, fica claro que a lei quis proteger também imóveis
urbanos com a servidão ambiental.
Como incentivo fiscal, a lei excluiu a área de servidão ambiental da área
tributável do ITR. Com a ampliação do alcance do instituto para imóveis urbanos, é
conveniente que os Municípios, por paralelismo, adaptem sua legislação de IPTU
para também não incidir o imposto sobre áreas e servidão ambiental.

4.5 A CARACTERIZAÇÃO DO INSTITUTO

Como vimos, a servidão ambiental atualmente está regulada pelos arts.


9º-A a 9º-C da Lei 6938/81, atualizada pela Lei 12651/12. Apesar da expansão do
alcance para imóveis urbanos, esta foi feita de modo tímido, de modo que todas as
referências da lei ainda indicam elementos de imóveis rurais, como por exemplo a
reserva legal. A extração dos elementos para a utilização em imóveis urbanos
comporta um esforço interpretativo maior.
A nova redação do art. 9º-A praticamente reproduziu o que já existia. Os
arts. 9º-B e 9º-C foram a novidade. No entanto, utilizam termos que parecem uma
adaptação da doutrina estrangeira: instituidor da servidão, em vez de imóvel
serviente; e detentor da servidão, em vez de imóvel dominante. Por outro lado,
deixaram de introduzir um importante participante que funciona como um fiscal da
servidão: a OCT (organizações de conservação de terras)34.

34 "Por outro lado, embora não exista a figura jurídica do detentor da servidão no ordenamento
jurídico brasileiro, faz-se necessária a sua criação, para que realmente haja maior eficácia da tutela
ambiental realizada por proprietários e organizações privadas.
O detentor da servidão ambiental seria o encarregado de fazer cumprir as restrições ambientais
impostas à propriedade pelo próprio dono do imóvel e, para alcançar seus objetivos, deve receber
incentivos tributários por parte do Estado.
As OCTs seriam um elemento imprescindível para o cumprimento dos termos avençados no contrato;
seria o seu responsável, uma vez que teria a obrigação de monitorar, inspecionar e exigir do
proprietário todas as restrições impostas à propriedade. Por isso, deve dispor de uma infraestrutura
46

Com os dois novos artigos, fica mais clara a intenção da lei ao criar a
servidão ambiental. Em momento algum o art. 9º-A faz referência a imóvel
dominante e serviente. Essa é uma inovação no instituto da servidão.
Tradicionalmente ela é uma vinculação de um imóvel em relação a outro, em que o
dominante frui alguma utilidade do serviente.
Na servidão ambiental, quando não utilizada para compensação, é
possível apenas que o proprietário (ou possuidor) abra mão de algumas faculdades
(uso e gozo) da propriedade, sem vincular esse ônus a nenhum outro imóvel. Nessa
situação, praticamente se descaracteriza a servidão, tal qual é entendida no direito
civil35. O Código Civil espanhol, entretanto, já incorporou essa nova roupagem: art.
531 "También pueden establecerse servidumbres en provecho de una o más
personas, o de uma comunidad, a quienes no pertenezca la finca gravada.”
A servidão ambiental pode ser instituída pelo proprietário ou possuidor. O
proprietário deve poder dispor do bem e ter capacidade de direito. A legitimação do
possuidor pode, por um lado, alargar a possibilidade de quem pode instituí-la, mas
por outro lado traz a insegurança quanto à publicidade. A posse é uma situação de
fato. Não há documento oficial que comprove a situação de possuidor. Dessa forma,
seu instrumento de servidão não terá acesso ao cartório de Registro de Imóveis.
O instituidor pode ser pessoa natural ou jurídica. Não importa se o
proprietário é uma pessoa física, uma sociedade ou uma associação. Qualquer ente
com personalidade jurídica pode utilizar a servidão ambiental.

suficiente para garantir o avençado, e, também, deter legitimidade para a propositura de medidas
judiciais necessárias ao cumprimento da servidão ambiental. Na realidade essas instituições
proporcionariam grande serviço ao governo e à coletividade conservando terras privadas."
(CARDOSO, 2010b, p. 190)
35 CARDOSO, 2010b: "Em verdade, o instituto não é tipicamente servidão, porque não há uma

relação prédio serviente/prédio dominante (servidão privada), nem mesmo um vínculo entre uma
coisa serviente (o imóvel particular), e um bem de domínio público (servidão pública).” (p. 163, citando
José Afonso da Silva) “O direito deve rever os seus conceitos clássicos para concretização da
preservação ambiental. Nessa esteira, a servidão ambiental, tal como está disposta no texto
normativo, é instituída a favor do meio ambiente ou entre proprietários para compensar o
desequilíbrio ecológico entre determinados imóveis. Portanto, embora a servidão ambiental não
corresponda puramente à servidão civil nem à servidão administrativa, é uma categoria jurídica em
benefício do meio ambiente.” (p. 163) "A servidão civil exige que o prédio serviente empreste
vantagem ao prédio dominante. De forma similar, a servidão administrativa, imposta pelo Estado,
requer que um prédio beneficie a coletividade. E, de maneira análoga, a servidão ambiental instituída
pelo proprietário privado surge como uma utilidade ou benefício proporcionado por um prédio ao meio
ambiente ecologicamente equilibrado.” (p. 161)
"Por outras palavras: por meio da servidão de conservação ou servidão ambiental, o proprietário
destina a totalidade ou parte de sua área para fins de preservação ambiental, impondo uma ou mais
limitações de uso do imóvel protegido. (...) Deparamo-nos com um instituto de Direito Ambiental a
servidão adequado para atendimento a esse novo tipo de exigência que é a proteção ambiental, não
sendo necessário o requisito de imóvel dominante e serviente." (SOUZA, 2014b, p. 129)
47

Não há forma legal prescrita. O instrumento pode ser público ou particular.


A nova redação do art. 9º-A ainda ampliou para possibilitar o termo administrativo
firmado perante órgão integrante do Sisnama para a instituição. Já o art. 9º-C faz
menção a contrato de alienação, cessão ou transferência36.
O objeto da servidão é a limitação do uso da propriedade para preservar,
conservar ou recuperar os recursos ambientais existentes. A restrição ao uso ou à
exploração da vegetação deve ser, no mínimo, a mesma estabelecida para a
Reserva Legal, ou seja: cobertura de vegetação nativa, admitindo-se exploração
econômica mediante manejo sustentável37.
Pode englobar a propriedade toda, ou apenas parte dela. No caso de
imóveis rurais, o que exceder à área obrigatória de reserva legal pode ser dado em
servidão ambiental.
O prazo da servidão é perpétuo ou temporário. Sendo temporário, o
mínimo são quinze anos. Sendo perpétuo, a lei equipara a servidão à RPPN38 para
fins creditícios, tributários e para acesso a recursos dos fundos públicos. Frise-se, no
entanto, a diferença entre ambas:
"A servidão florestal distingue-se da RPPN por ser menos restritiva na
proteção dos recursos, além de poder ter caráter temporário. Essa figura
deverá ser regulamentada, mas sabemos que suas restrições de uso são
menos rigorosas que as existentes nas RPPNs, pois lhes foi dado o mesmo
regime da reserva legal, sendo que nessas há, expressamente, uma
ampliação das restrições de uso da reserva legal, conforme estabelece a
Medida Provisória 2.080/60.” (CARDOSO, 2010b, p. 163, citando Sônia
Maria Pereira Wiedmann)

Pode existir ou não uma contraprestação, ou seja, pode ser onerosa ou


gratuita. Em sendo onerosa, as partes podem estabelecer a forma de pagamento à
vista ou em prestações mensais. É importante ressaltar que, independentemente de
ser gratuita, a servidão ambiental precisa ter incentivos para existir e ser
economicamente viável.

4.6 INSTITUIÇÃO E ALIENAÇÃO: UM PROCEDIMENTO BIFÁSICO

36 Parece que a utilização desses três termos foi uma atecnia legislativa. A servidão tradicional nasce
com a instituição e é transferida com a cessão.
37 Art. 17 da Lei 12561/2012. Observe-se que esta é uma restrição quando a servidão ambiental for

referente a recursos naturais, mas não tem sentido dentro de toda a gama de proteção dos recursos
ambientais.
38 Reserva Particular do Patrimônio Natural: art. 21 da Lei 9985/2000 e Decreto 5746/2006.
48

O instrumento ou termo de instituição da servidão ambiental deve incluir,


no mínimo, os seguintes itens: I - memorial descritivo da área da servidão ambiental,
contendo pelo menos um ponto de amarração georreferenciado39; II - objeto da
servidão ambiental, cuja preservação mínima é da vegetação nativa; III - direitos e
deveres do proprietário ou possuidor instituidor; IV - prazo durante o qual a área
permanecerá como servidão ambiental.
Já o contrato de alienação, cessão ou transferência deve conter, no
mínimo, os seguintes itens: I - a delimitação da área submetida a preservação,
conservação ou recuperação ambiental40; II - o objeto da servidão ambiental; III - os
direitos e deveres do proprietário instituidor e dos futuros adquirentes ou
sucessores; IV - os direitos e deveres do detentor da servidão ambiental; V - os
benefícios de ordem econômica do instituidor e do detentor da servidão
ambiental; VI - a previsão legal para garantir o seu cumprimento, inclusive medidas
judiciais necessárias, em caso de ser descumprido.
Comparando a instituição da servidão com a alienação (arts. 9ª-A e 9º-C),
temos:
Instituição (art. 9º-A) Alienação, cessão ou transferência
(art. 9º-C)
memorial descritivo da área da servidão a delimitação da área submetida a
ambiental, contendo pelo menos um preservação, conservação ou
ponto de amarração georreferenciado recuperação ambiental
objeto da servidão ambiental o objeto da servidão ambiental
direitos e deveres do proprietário ou os direitos e deveres do proprietário
possuidor instituidor instituidor e dos futuros adquirentes ou
sucessores
os direitos e deveres do detentor da
servidão ambiental
prazo durante o qual a área prazo determinado ou caráter definitivo
permanecerá como servidão ambiental

39 Mais um ponto em que o regramento é para imóvel rural. O georreferenciamento atualmente tem
sido obrigatório apenas para imóveis rurais. Quanto a imóveis urbanos, a legislação sempre diz
“preferencialmente georreferenciado”. Considero que se pode entender pela não-obrigatoriedade nos
imóveis urbanos.
40 Não faz menção a georreferenciamento.
49

os benefícios de ordem econômica do


instituidor e do detentor da servidão
ambiental
a previsão legal para garantir o seu
cumprimento, inclusive medidas judiciais
necessárias, em caso de ser
descumprido

Observamos primeiramente que o termo administrativo é apenas para


instituição, mas não para alienação. Não fica claro se o contrato de alienação tem
forma livre, ou se aplicaria a ele o art. 108 do Código Civil. Entendemos que a
utilização do termo “contrato”, e não escritura, bem como a expressa autorização do
instrumento particular para a instituição, autorizam concluir que não é requisito a
forma pública.
A instituição do art. 9º-A é aquela em que há apenas uma limitação
voluntária ao uso da propriedade. Tanto que só é requisito do instrumento os direitos
e deveres do proprietário do imóvel, nada se falando do detentor da servidão. Por
outro lado, uma vez que o instrumento serve para formalizar uma autolimitação, não
tem sentido em falar em direito e deveres, pois esses termos são usados em direito
quando há relação entre pessoas. Esses direitos e deveres são nada mais do que o
próprio objeto da servidão. A menos que existisse a OCT e para alguns direitos a
que o proprietário fizesse jus se cumprissem determinados deveres.
O art. 9º-C traz a servidão ambiental que será usada para compensação,
pois nela há o imóvel serviente e o dominante. O §3º do art. 9º-B diz o seguinte:
O detentor da servidão ambiental poderá aliená-la, cedê-la ou transferi-la,
total ou parcialmente, por prazo determinado ou em caráter definitivo, em
favor de outro proprietário ou de entidade pública ou privada que tenha a
conservação ambiental como fim social.

A pergunta que se faz é: é necessário primeiro instituir a servidão pelo art.


9º-A para depois aliená-la? Parece-nos que sim41, pois os termos utilizados pela lei

41 Em sentido contrário, podemos argumentar no seguinte sentido: a lei não colocou isso como
condição expressa. A instituição e a alienação estão colocadas em artigos distintos e autônomos.
Existe a previsão de averbação de ambos, sem que uma seja requisito da outra. O contrato previsto
no art. 9º-C já traz todos os requisitos de uma servidão. Não faz depender de uma prévia instituição.
Além do mais, se a prévia instituição fosse necessária, o contrato seria apenas de cessão dos direitos
de servidão, e não de alienação e transferência. Dentro desse contexto, o georreferenciamento de um
ponto de amarração não seria necessário no caso de alienação.
50

são: “o detentor da servidão ambiental” e não o proprietário. Além do mais, na


redação anterior, havia a prévia anuência do órgão ambiental estadual. Na atual
redação, a chancela do órgão ambiental não foi colocada como requisito prévio. No
entanto, entendemos que ela é conveniente, principalmente nos casos de imóveis
urbanos, e nesses casos haverá a possibilidade de instituição através de termo
administrativo firmado perante órgão integrante do Sisnama. Quando a servidão
ambiental for perpétua, ela terá os mesmos benefícios da RPPN (§2º do art. 9º-B),
então também nos parece necessário submetê-la ao órgão ambiental. Além do mais,
para compensar áreas de reserva legal, essas áreas de servidão ambiental também
serão submetidas ao CAR (art. 66, §5º da Lei 12651/12).
Através do instrumento de instituição da servidão ambiental, o proprietário
estabelece as limitações de uso que deseja impor ao imóvel. Depois de instituída,
ele se torna detentor da servidão ambiental e poderá alienar, ceder ou transferir a
outros proprietários que dela necessitem. No caso da reserva legal, ele terá de se
inscrever no CAR (art. 29 da Lei 12651/12).
No caso dos imóveis urbanos em áreas de mananciais, cujo objetivo seja
a compensação de área permeável e florestada, é de todo conveniente, senão
imprescindível, a prévia aprovação das restrições voluntárias pela Cetesb, para que
no futuro ela aceite tal área como compensação nos licenciamentos ambientais.
Com relação aos direitos e deveres estabelecidos no contrato de
alienação da servidão ambiental, traz a lei o seguinte:

Deveres do proprietário do imóvel Deveres do detentor da servidão


serviente (§2º) ambiental (§3º)
manter a área sob servidão ambiental documentar as características
ambientais da propriedade
prestar contas ao detentor da servidão manter relatórios e arquivos atualizados
ambiental sobre as condições dos com as atividades da área objeto da
recursos naturais ou artificiais servidão
permitir a inspeção e a fiscalização da monitorar periodicamente a propriedade
área pelo detentor da servidão para verificar se a servidão ambiental
ambiental está sendo mantida
prestar informações necessárias a
quaisquer interessados na aquisição ou
51

aos sucessores da propriedade


defender a posse da área serviente, por defender judicialmente a servidão
todos os meios em direito admitidos ambiental

Uma vez instituída, a servidão ambiental será averbada no imóvel


serviente (averbação com conteúdo financeiro). No caso de compensação, é
noticiada no(s) imóvel(is) dominante(s) (averbação sem conteúdo financeiro).
Durante o prazo de vigência da servidão ambiental, é vedada a alteração
da destinação da área, nos casos de transmissão do imóvel a qualquer título, de
desmembramento ou de retificação dos limites do imóvel. Ela se torna um ônus real,
com publicidade dada pela averbação no Registro de Imóveis. Portanto, qualquer
mutação subjetiva ou objetiva não alteram a sua estabilidade.

4.7 ÁREAS DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE: UM APELO PARA QUE SEJAM


COMPUTADAS

A servidão ambiental não se aplica às Áreas de Preservação Permanente


e à Reserva Legal mínima exigida. Há doutrinadores que acham isso conveniente42.
Nós, por outro lado, entendemos que, ao menos em área urbana, a
servidão ambiental em APP é muito positiva.
A flexibilização quanto ao uso da APP começou no ano 2000, trazido no
mesmo diploma legislativo que introduziu a servidão florestal. Anteriormente, não se
podia computar na reserva legal áreas em APP. A partir desse momento, o §6º do
art. 16 da Lei 4771/65 passou a trazer algumas exceções. Atualmente, o art. 15 da
Lei 12651/12 facilitou ainda mais esse cômputo.
As áreas de APP são extremamente importantes para o meio ambiente.
Para o ambientalista radical, é fácil deixar o problema todo nas costas do particular.
Mas isso acaba dando um resultado contrário ao esperado. O fato de as APPs
causarem uma forte limitação à propriedade, acaba sempre resultando no abandono

42“(...) a servidão ambiental não poderá ser constituída sobre as áreas de preservação permanente e
de reserva legal (art. 9º-A, §1º). A técnica empregada pelo legislador foi adequada, pois separou as
áreas protegidas legalmente da área protegida por ato de vontade do proprietário privado.”
(CARDOSO, 2010ª, p. 385)
52

da terra, o que gera campo fértil para invasões e ocupações clandestinas, que
resultam por destruir tudo que se queria proteger. Se o proprietário tivesse uma
contrapartida econômica, certamente ele se empenharia em protegê-las. E isso é
justo, pois essa proteção é a benefício de toda a coletividade. Então, de lege
ferenda, seria muito interessante que as áreas de APP também pudessem ser alvo
de servidão ambiental.

4.8 O RETORNO FINANCEIRO43

O instituto da servidão ambiental pode ser visto como uma grande


colaboração na preservação ambiental. Por um lado, facilita a atividade econômica,
ao permitir a compensação da reserva legal. Por outro, agrupa áreas de reserva
legal em maciços verdes. O ideal é incentivar a instituição de servidões perpétuas.
O proprietário de áreas de servidão ambiental tem de ser visto como um
“empresário do verde”. Sua atividade econômica é a preservação ambiental. Em
troca, ele deve ser recompensado financeiramente.
A lei já instituiu algumas formas de remuneração. A alienação de áreas de
servidão para compensação pode ser onerosa. Isso traz uma contraprestação
importante para o empresário do verde. No entanto, temos que pensar que um
pagamento único no momento da aquisição da área de servidão não será suficiente
para o empresário do verde mantê-la protegida para sempre.
Dessa forma, é importante a lei criar o máximo de incentivos. Um deles é
a isenção de ITR para imóveis rurais. Propomos a isenção do IPTU para imóveis
urbanos.
Outra forma é a criação do CRA (art. 44 da Lei 12651/12), uma forma de
título que facilitaria um comércio de áreas de servidão ambiental.

43 "A introdução da servidão ambiental no direito brasileiro poderá representar um poderoso


instrumento para efetivar o direito ambiental. No entanto a sua viabilidade dependerá do grau de
incentivos fiscais e econômicos que serão oferecidos a proprietários e interessados.
Como sempre, avulta o velho problema da determinação do grau de efetividade de normas
ambientais. O grau máximo é atingido, apenas, quando há um controle forte e a certeza de que as
autoridades farão cumprir a lei ou quando são oferecidos incentivos econômicos e tributários."
(SOUZA, 2014b, p. 148)
53

Há também a possibilidade de utilizar economicamente as áreas verdes


no comércio de créditos de carbono44.
Nos Estados Unidos, o governo ainda possibilita uma forma de
abatimento no imposto de renda, relativo à terra onerada com servidão ambiental.
Isso também seria bem-vindo no Brasil.
Finalmente, criarem-se formas de extração econômica das áreas de
servidão ambiental é muito conveniente. Seja através de um manejo sustentável,
seja transformando-as em parques ecológicos ou ainda em áreas de pesquisa
científica. Tudo isso deve ser compatibilizado pelo órgão ambiental com a proteção
implantada em determinada área.

4.9 A COMPENSAÇÃO EM ÁREAS DE MANANCIAIS

Como dissemos no capítulo anterior, as leis de mananciais em São Paulo


trouxeram bastantes restrições ambientais aos imóveis localizados nas áreas que
delimitaram. Essas limitações visam a proteger as águas, o chamado “ouro azul”,
bem essencial à vida e cada vez mais escasso (água doce e potável).
Os proprietários de imóveis em tais áreas sofrem tais limitações não em
benefício próprio, mas em benefício da coletividade. E não só da coletividade local,
mas de toda a região. Assim, não é justo que eles sejam apenados com tais
restrições sem nenhuma contrapartida. O próprio desenvolvimento econômico da
região fica comprometido. A lei deve procurar criar mecanismos de compensação
financeira para os municípios e proprietários45 atingidos.

44 "Como é de conhecimento geral as árvores em crescimento consomem grande quantidade de


carbono, razão pela qual o plantio de florestas representa uma medida eficaz para absorção do
carbono resultante da atividade econômica. As florestas existentes, em menor quantidade, também
absorvem parte do carbono. Dessa forma, o reflorestamento e florestamento resultaria em créditos de
carbono os quais poderiam ser negociados como títulos representativos, resultando na incorporação
ou conservação de grandes áreas de florestas e cumpririam a função de sumidouros de carbono.
Por meio da servidão florestal o proprietário de um reflorestamento poderia constituir títulos,
inclusives as chamadas debêntures ecológicas, e vendê-los em bolsa, representando importante
incentivo para a formação de novas florestas, ou eventualmente a manutenção de florestas
existentes." (SOUZA, 2014b, p. 142)
45 Por exemplo, linhas de crédito a taxa zero para custear os processos de licenciamento ambiental e

outros benefícios fiscais, como a exclusão das áreas de restrição da área tributável do IPTU.
54

Em 2002, a Lei Paulista 11216 trouxe alguns mecanismos de


compensação importantes, inclusive permitindo a compensação em áreas não-
contíguas. Em 2009, a Lei Paulista 13579 trouxe um regramento específico para a
Bacia Billings, inclusive com um capítulo sobre compensações (arts. 89 a 98).
Poderia a servidão ambiental urbana ser utilizada como forma de
compensação nas áreas de mananciais?
O art. 90 da Lei 13579/09 traz seis incisos com diversas formas de
compensação. Tal enumeração, no nosso entender, é apenas enumerativa, ou seja,
caberiam outras formas de compensação, desde que o órgão ambiental verifique
que estão de acordo com os fins colimados pela lei.
Nossa experiência profissional em áreas de mananciais verificou que os
mecanismos oferecidos pela lei eram insuficientes e caros. É comum que em épocas
passadas, quando a legislação de proteção dos mananciais não tinha qualquer
eficácia real, o proprietário tenha ferido diversos índices ambientais. As formas de
compensação mais comuns são a financeira, por demais onerosa, e a vinculação de
outro terreno para compensação.
Muitas vezes, para compensar uma área de 100,00m2, o proprietário
tinha de adquirir outra muitas vezes maior. Isso porque o lote mínimo na região é de
250,00m2. No entanto, as regiões onde o lote mínimo tem essa metragem são
aquelas mais adensadas, onde o valor de tal lote é muito alto. Para conseguir áreas
mais baratas, o proprietário teria de buscar em regiões mais afastadas, onde o lote
mínimo pode chegar a 7500,00m2, mas o preço é bem menor. Imagine compensar
100,00m2 com um lote de 7500,00m2? É ilógico e antieconômico.
Alguns profissionais do mercado imobiliário sugeriam que vários
proprietários adquirissem uma gleba de tamanho suficiente e todos dessem-na para
compensação de seus imóveis. O problema dessa solução são as dificuldades do
condomínio comum com pluralidade de condôminos. Uma das características da
propriedade é a exclusividade. A propriedade em condomínio é uma forma anormal
da propriedade. Imagine-se uma matrícula de uma gleba com dezenas de
proprietários e dezenas de vinculações de compensação? Para cada compensação,
todos teriam de anuir. Ademais, pense-se no caso de morte de algum dos
proprietários. Com o passar dos anos, a inclusão dos herdeiros de cada um dos que
fossem falecendo iria tornar impraticável tal solução. A matrícula do imóvel ficaria
enorme e totalmente incompreensível.
55

Com o fim de contribuir com o desenvolvimento da região, procuramos a


Cetesb e propusemos a aceitação da servidão ambiental urbana como forma de
compensação. Em procedimento iniciado pela Prefeitura de Rio Grande da Serra, o
mecanismo foi estudado e aceito. Em seguida, fizemos reuniões para estabelecer o
procedimento de utilização. A minuta do procedimento está no anexo desta
monografia.
Em resumo, o que ficou definido é o seguinte:
- há preferência por grandes propriedades localizadas em áreas de baixa
densidade demográfica ou em áreas de conservação ambiental. Não há interesse
ambiental por compensação em áreas de ocupação consolidada.
- o proprietário que deseja instituir a servidão ambiental deverá fazer um
levantamento topográfico da área, apresentando planta e memorial descritivo, com a
indicação das APP´s, se existentes. Deverá haver ao menos um ponto de amarração
georreferenciado.
- deverá ser apresentado relatório de caracterização florestal e projeto de
recomposição vegetal, caso haja trechos sem vegetação nativa.
- a planta já deverá apresentar a demarcação das áreas que serão
alienadas para compensação. Cada área demarcada não poderá ser inferior a
100,00m2 e será chamada de MCA – módulo de compensação ambiental. Haverá
um controle compartilhado de disponibilidade desses módulos pela Cetesb, cartório
e proprietário, cada um ficando com uma planta.
- a propriedade deve ser cercada e preservada pelo instituidor46.
- a Cetesb analisará os documentos e verificará se a propriedade está
apta para servir de compensação. Em caso positivo, autorizará a instituição da
servidão ambiental para tal fim. Nesse caso, poderá lavrar termo administrativo que
será levado para averbação (com valor declarado relativo à área total de servidão)
no Registro de Imóveis.
- uma vez instituída a servidão ambiental, o proprietário poderá negociar o
MCA´s. Uma vez que a servidão ambiental já foi aprovada pela Cetesb, seus MCA´s
terão plena aceitação para compensação de outras áreas naquele mesmo bioma.
Na prática funcionará assim (exemplo hipotético): a) proprietário X de uma
gleba de 100.000m2 institui perante a Cetesb a servidão ambiental, com 1000

46 Seria interessante que fosse também exigido o seguro ambiental, nos termos do art. 9º, XIII, da Lei

6938/81.
56

MCA´s. b) a indústria Y tem um galpão industrial de 2000,00m2, quando poderia ter


construído apenas 1550,00m2, ou seja, ela deve compensar 450,00m2. A indústria
Y compra do proprietário X cinco MCA´s e entra com procedimento de regularização
do galpão perante a Cetesb. A Cetesb poderá emitir a licença ambiental do galpão,
pois este estará compensado pela servidão ambiental. Será feita uma averbação da
alienação dos cinco módulos (com valor declarado relativo aos cinco módulos) no
imóvel onde foi instituída a servidão ambiental, e uma averbação (sem valor
declarado) noticiando aquela servidão no imóvel da indústria. Em seguida será
averbada a declaração de vinculação (DV) no imóvel da indústria, que fundamentará
a expedição da licença ambiental de regularização do galpão.
Com essa regulamentação do instituto pela Cetesb, espera-se que sua
utilização se difunda e que facilite a regularização de milhares de imóveis nas áreas
de proteção dos mananciais.
57

5 CONCLUSÃO

Chega-se ao fim deste trabalho com a boa impressão de ter trazido


subsídios para uma melhor compreensão do instituto da servidão ambiental.
Primeiramente mergulhamos no estudo do instituto da servidão dentro do
Direito Civil. Verificamos que este é um direito real que vincula dois imóveis,
trazendo utilidades ao chamado dominante. É um direito que tende a ser perpétuo e
se torna independente dos proprietários, sendo um liame de imóvel a imóvel.
Procuramos explorar todas as características do título, dos sujeitos e do objeto,
aprofundando nos aspectos registrários.
Em seguida, fizemos um panorama do momento ambiental em que
vivemos: o homem dominou a técnica e a ciência e com elas vem trazendo
transformações cada vez mais impactantes ao planeta. Surge daí a preocupação do
direito intergeracional, ou seja, proporcionar às futuras gerações um meio ambiente
ecologicamente saudável. O próprio direito de propriedade, que já foi considerado
absoluto, tem sofrido fortes limitações em razão de suas funções sócio-econômico-
ambientais. No Brasil, as leis que tratam de assuntos ambientais remontam ao início
do século XX, mas só mais recentemente que deixaram a ênfase econômica e
tomaram a ênfase protetiva ambiental. A Constituição de 1988 foi um marco. E mais
recentemente o novo Código Florestal.
No Estado de São Paulo, a preocupação com a proteção ambiental vem
da década de 70. As áreas de mananciais receberam uma rica legislação, mas que
infelizmente padeceu de grande ineficácia. Com as inúmeras invasões e ocupações
irregulares que se deram em todo o Estado e, principalmente, na região
metropolitana, cada vez mais procura-se chegar a um meio termo (factível) entre o
bem-estar humano e a proteção ambiental.
No último capítulo, fizemos uma extensa análise da legislação da servidão
ambiental. Apontamos toda a evolução legislativa e recentes mudanças trazidas pela
Lei 12.651/12. Nesse ponto, chegamos ao ápice do trabalho, pois pudemos
comprovar que a servidão ambiental, que antes era aplicada só em áreas rurais,
atualmente pode ser utilizada em zona urbana para proteção dos recursos
ambientais (que é um conceito que também abrange elementos típicos da cidade).
58

Na caracterização do instituto, mostramos que a servidão ambiental


primeiramente é instituída com a abdicação de direitos de uso e gozo sobre
determinada área, para preservação da vegetação nativa. Nesse ponto, distingue-se
sobremaneira da servidão civil, pois não há relação de imóvel com imóvel.
Uma vez instituída a servidão ambiental, o proprietário do imóvel serviente
pode ceder quotas da área de servidão para compensação de outros imóveis que
não tenham suficiente área de reserva legal (rural) ou de área permeável ou
florestada (urbano).
Considerando que, em áreas de proteção dos mananciais, toda forma de
uso e ocupação do solo deve ser precedida de licença ambiental (ou quando não o
tenha sido, deve passar por uma regularização ambiental), a necessidade de áreas
para compensação é enorme e a servidão ambiental vem ao encontro dessa
necessidade, proporcionando áreas de compensação a um custo bem mais
acessível. Em contrapartida, essas áreas de compensação ficam todas agrupadas
formando bolsões verdes onde a possibilidade de desenvolvimento de diversidade
biológica (tanto vegetal quanto animal) é muito maior.
Mas para o sucesso e eficácia do instituto, é importante que haja
incentivos e recompensas para aqueles que quiserem investir nessa forma de
preservação voluntária do meio ambiente. A figura do “empresário do verde” surge
como um ator importante e positivo no cenário do mercado.
Enfim, entregamos ao público o resultado de alguns anos de reflexão
frente a problemas e necessidades do dia-a-dia. Ficaremos muito gratos se esse
trabalho puder contribuir para o desenvolvimento sustentável da região
metropolitana de São Paulo e trazer efeitos positivos na preservação das águas dos
mananciais, com mais um mecanismo de efetivação da legislação que os protege.
59

REFERÊNCIAS

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Editora, 2000.

BOVE, Roberto. O direito real de servidão. In: DIP, Ricardo; JACOMINO, Sérgio
(org.). Direito Registral: doutrinas essenciais. Volume V: Propriedade e direitos reais
limitados. (Coleção doutrinas essenciais). São Paulo: Editora Revista dos Tribunais,
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BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em:


<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/ConstituicaoCompilado.htm>.
Acesso em 14.09.2014.

_______. Lei 4.771, de 15 de setembro de 1965. Código Florestal. Disponível em:


<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L4771impressao.htm>. Acesso em
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_______. Lei 6.015, de 31 de dezembro de 1973. Lei dos Registros Públicos.


Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L6015compilada.htm>.
Acesso em 14.09.2014.

_______. Lei 6.938, de 31 de agosto de 1981. Política Nacional do Meio


Ambiente. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L6938compilada.htm>. Acesso em
14.09.2014.

_______. Lei 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Código Civil. Disponível em:


<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/2002/L10406compilada.htm>. Acesso em
14.09.2014.

_______. Lei 12.651, de 25 de maio de 2012. Novo Código Florestal. Disponível


em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-
2014/2012/Lei/L12651compilado.htm>. Acesso em 14.09.2014.

CAMILO. Andryelle Vanessa. Da servidão ambiental como mecanismo de


efetivação na defesa do meio ambiente, pp. 2533 a 2552. Disponível em:
<http://www.publicadireito.com.br/conpedi/manaus/arquivos/Anais/sao_paulo/2246.p
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CARDOSO, Sônia Letícia de Mello. A servidão ambiental segundo a Lei n.


11.284/2006. In: CRIADO, Francisco de Asís Palacios; JACOMINO, Sérgio; MELO,
Marcelo Augusto Santana de (Coords.). Registro de imóveis e meio ambiente.
São Paulo: Saraiva, 2010a. p. 381-96.

_________. Servidão ambiental no Brasil: aspectos jurídicos e socioambientais.


Curitiba: Juruá, 2010b.
60

GOMES, Orlando. Direitos reais. 19.ed. Atualizada por Luiz Edson Fachin. Rio de
Janeiro: Forense, 2006.

LOPES, Miguel Maria de Serpa. Tratado dos registros públicos: em comentário ao


decreto nº 4.857, de 9 de novembro de 1939... 4. ed. rev. e aum. Rio de Janeiro:
Freitas Bastos, 1960. V.3.

MÉNDEZ GONZÁLES, Fernando. Registro público de imóveis eletrônico: riscos


e desafios. São Paulo: Quinta Editorial, 2012.

RIZZARDO, Arnaldo. Servidões. 2.ed. Rio de Janeiro: Forense, 2014.

SÃO PAULO. Lei 13.579, de 13 de julho de 2009. APRM-Billings. Disponível em:


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SÃO PAULO. Normas de Serviço da Corregedoria Geral de Justiça. Tomo II.


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<http://www.tjsp.jus.br/Download/Corregedoria/NormasExtrajudiciais/NSCGJTomoII.
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SOUZA, Paulo Roberto Pereira de. O direito ambiental e a atividade notarial e


registral. Fé Pública. Rio de Janeiro: Enoreg-RJ. Ano III, n.6, 2008.

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______. Servidão Ambiental, pp. 127 a 149. Disponível em:


<http://periodicos.unicesumar.edu.br/index.php/revjuridica/article/download/447/221>
. Acesso em 09.08.2014b.
61

ANEXO A – MODELO DE CONTRATO – ANOREG-BR47

CONTRATO DE COMPROMISSO DE INSTITUIÇÃO DE


SERVIDÃO AMBIENTAL

ACORDO PARTICULAR DE COMPROMISSO DE


INSTITUIÇÃO DE SERVIDÃO AMBIENTA QUE CELEBRAM
ENTRE SI, DE UM LADO, COMO COMPROMISSÁRIO(A)
OUTORGANTE, O SR.(A) FULANO (A) DE TAL., E DE
OUTRO, COMO PROMITENTE OUTORGADO(A), O SR.(A)
SICRANO (A) DE QUAL.

Por este instrumento particular de compromisso de instituição de servidão ambiental


que celebram entre si, de um lado como COMPROMISSÁRIO(A) OUTORGANTE, o
Sr.(a) FULANO(A) DE TAL, brasileiro(a), casado(a), engenheiro(a), portador(a) do
CPF sob nº 000.111.222-33 e Carteira de Identidade R.G. sob nº 111.222-3 SSP-
PR, residente e domiciliado na Rua Tal, 72 –Apartamento nº 0001 – Bairro Jardim
dos Jardins, e como PROMITENTE OUTORGADO(a) o(a) Sr.(a). SICRANO(A) DE
QUAL, brasileiro(a), casado(a), engenheiro(a), portador(a) do CPF sob nº
000.111.222-33 e Carteira de Identidade R.G. sob nº 111.222-3 SSP-PR, residente e
domiciliado na Rua Tal, 72 –Apartamento nº 0001 – Bairro Jardim dos Jardins.

CLÁUSULA PRIMEIRA - O objeto do presente compromisso de instituição de


servidão ambiental é a instituição de um ônus real sobre o imóvel de propriedade do
compromissário(a) OUTORGANTE, descrito na cláusula segunda, consistente na
instituição da servidão ambiental para fins de cumprimento da obrigação de manter
20% do imóvel de propriedade do promitente OUTORGADO(A), descrito na cláusula
terceira, a título de reserva legal, pelo prazo de 20 (vinte) anos.

CLÁUSULA SEGUNDA – O(a) compromissário(a) OUTORGANTE declara ser


proprietário(a) do imóvel rural, que é constituído pelo lote de terras sob nº____, da
Gleba _________localizado no município, comarca e ..ª Circunscrição Imobiliária de
_____, Estado de _____, com a área de __ ha, com as seguintes confrontações:
“_______”. Dito imóvel encontra-se cadastrado no INCRA, sob nº ____ , com o valor
venal de R$ ____, para o corrente exercício; e foi havido pelos outorgantes por força
do R.0.. (registro ...), da Matrícula nº ..... (...), do ..º Registro de Imóveis de _____,
nos termos da escritura lavrada nas fls. ___ do livro nº ___, do ..º Tabelião de ____,
em __ de ___ de 19__.

47 Texto atualizado pelo autor. Original disponível em:


<http://www.anoreg.org.br/anoregbr_file/apostilas_curso/minutas_de_contrato_e_escritura_publica_p
ara_instituicao_de_servidao_ambiental.doc>. Acesso em: 02.12.2014.
62

Parágrafo Primeiro - O(a) compromissário(a) OUTORGANTE declara que o referido


imóvel possui área de .... hectares de mata nativa excedente ao percentual exigido
para reserva legal e área de preservação permanente, de acordo com o previsto na
Lei Federal nº 12.651/12, com a seguinte localização:....

Parágrafo Segundo - O(a) compromissário(a) OUTORGANTE declara ainda que o


referido imóvel possui as áreas de preservação permanente e reserva legal
existentes protegidas de acordo com o previsto na Lei Federal nº 12.651/12, ou em
fase de regeneração aprovada pelo órgão ambiental competente.

CLÁUSULA TERCEIRA – O(a) promitente OUTORGADO(A) declara ser


proprietário(a) do imóvel rural, que é constituído pelo lote de terras sob nº____, da
Gleba _________localizado no município, comarca e ..ª Circunscrição Imobiliária de
_____, Estado de _____, com a área de __ ha, com as seguintes confrontações:
“_______”. Dito imóvel encontra-se cadastrado no INCRA, sob nº ____ , com o valor
venal de R$ ____, para o corrente exercício; e foi havido pelos outorgados por força
do R.0.. (registro ...), da Matrícula nº ..... (...), do ..º Registro de Imóveis de _____,
nos termos da escritura lavrada nas fls. ___ do livro nº ___, do ..º Tabelião de ____,
em __ de ___ de 19__.

CLÁUSULA QUARTA – O(a) promitente OUTORGADO(A) pagará a(o)


compromissário VENDEDOR(A), pela instituição da servidão ambiental descrita na
cláusula primeira, a importância de ...........(..........), no endereço já indicado, a ser
paga da seguinte maneira:

a) Um sinal ou arras no valor de R$ .........(.........), pago no ato da assinatura deste


contrato.
b) A quantia de R$ .......(..........), a ser paga quinze dias após a aprovação da
compensação da reserva legal através da servidão ambiental compromissada
pelo órgão ambiental competente, comprovada através de certidão emitida pelo
mesmo ou outro documento hábil.

Parágrafo Primeiro – Pactuam as partes que em caso de não ocorrer a aceitação da


compensação da reserva legal através da servidão ambiental compromissada pelo
órgão ambiental competente, revoga-se o presente compromisso,
independentemente de notificação e dos motivos que levaram a recusa pelo órgão
ambiental, sendo restituído imediatamente o sinal ou arras pago na assinatura deste
contrato.

Parágrafo Segundo – Em caso de aprovação do órgão ambiental competente da


compensação da reserva legal através da servidão ambiental compromissada, o(a)
promitente OUTORGADO(A) não poderá desistir do negócio, perdendo o valor dado
como sinal ou arras caso assim proceda.

Parágrafo Terceiro - O pagamento em cheque, somente quitará a dívida após a


efetiva compensação bancária do valor e, em caso de não pagamento do cheque,
serão cominadas todas as penalidades de inadimplemento, mais a aplicação de
multa convencional, juros moratórios e reajuste monetário, a incidirem sobre o valor
da obrigação não paga.
63

CLÁUSULA QUINTA - Pactuam as partes contratantes que o atraso no pagamento,


independentemente de notificação, interpelação judicial ou extrajudicial, sujeitará
o(a) promitente OUTORGADO(A) a pagar a(o) compromissário(a) OUTORGANTE, o
valor devido acrescido pela variação do INCC, ou, na proibição de seu uso, do CUB,
e, por último pelo IGPM, ou qualquer outro índice que venha a substituí-los,
acrescido de juros de mora de 0,33 % (zero virgula trinta e três por cento) ao dia,
contados dia-a-dia, penalidade de 2,0 %(dois) por cento ao mês sobre o valor da
dívida já reajustado e honorários advocatícios à base de 20%(vinte por cento).

CLÁUSULA SEXTA - Ficará obrigado o(a) compromissário(a) OUTORGANTE a


instituir a servidão ambiental da área de vegetação nativa remanescente
discriminada no parágrafo primeiro da cláusula segunda, a partir da aprovação da
compensação da área de reserva legal pelo órgão ambiental competente, com prazo
de duração não inferior ao previsto na cláusula primeira, através da lavratura e
averbação da escritura pública.

Parágrafo Primeiro- Os custos decorrentes da lavratura e averbação da escritura


pública de instituição da servidão ambiental correrão por conta do promitente
OUTORGADO(A).

Parágrafo Segundo – O compromissário OUTORGANTE , na hipótese de atraso de


mais de três dias em qualquer dos atos necessários a instituição da servidão
ambiental, pagará ao promitente OUTORGADO(A) a importância correspondente a
___% (___ por cento) do preço do imóvel serviente por dia de atraso.

CLÁUSULA SÉTIMA – O(a) promitente OUTORGADO(A) só poderá ceder, prometer


ou transferir, de forma gratuita ou onerosa, ou a qualquer outro título, os direitos
derivados deste negócio, com anuência escrita do(a) compromissário(a)
OUTORGANTE, sob pena de incorrer na multa prevista pela cláusula seguinte.

CLÁUSULA OITAVA - Em caso de descumprimento de qualquer de suas cláusulas,


exceto por motivo de desistência do(a) promitente OUTORGADO(A), restará o
presente compromisso rescindido, independentemente de notificação prévia, sendo
pactuada a multa no valor de R$ ____,00 aquele que der causa a rescisão.

CLÁUSULA NONA - A presente promessa de compra e venda é celebrada de forma


irrevogável e irretratável, renunciando as partes à faculdade do artigo 420 do Código
Civil Brasileiro.

CLÁUSULA DÉCIMA - O presente compromisso obriga as partes que o celebram,


herdeiros e sucessores.

CLÁUSULA DÉCIMA PRIMEIRA - Fica eleito o foro da Comarca de ___________,


para dirimir qualquer dúvida ou interpretar cláusulas e omissões advindas deste
64

contrato, com expressa renúncia de qualquer outro foro por mais privilegiado que
seja.

E, por acharem justo o que pactuam, firmam o presente instrumento, em 3(três) vias
de igual teor e forma, sem rasuras, para que produzam seus efeitos, perante duas
testemunhas que adiante subscrevem, prometendo cumpri-lo e fazê-lo cumprir.

Cidade, ____de ____________de 20__.

....... .........................................................
COMPROMISSÁRIO(A) OUTORGANTE

.....................................................
PROMITENTE OUTORGADO(A)
65

ANEXO B – MODELO DE ESCRITURA PÚBLICA – ANOREG-BR48

ESCRITURA DE INSTITUIÇÃO DE "SERVIDÃO


AMBIENTAL"

S A I B A M quantos esta pública escritura virem que aos .. (__) dias do mês ___
do ano 2004 (dois mil e quatro), nesta Cidade de ___, Estado de ___, neste
Tabelionato de Notas, situado na Rua ______, perante mim Tabelião,
compareceram como outorgantes instituidores: ____, prof. . . . portador da cédula
de identidade RG nº . . . . SSP/PR, inscrito no CPF/MF sob nº ...., e sua mulher
______, ___, portadora da cédula de identidade RG nº ... SSP/PR, inscrita no
CPF/MF sob nº ....., brasileiros, domiciliados nesta cidade, onde residem na Rua . . .
. . nº ___, CEP ___; e como outorgados ____, prof, . . portador da cédula de
identidade RG nº . . . . SSP/PR, inscrito no CPF/MF sob nº ...., e sua mulher
______, ___, portadora da cédula de identidade RG nº ... SSP/PR, inscrita no
CPF/MF sob nº ....., brasileiros, domiciliados nesta cidade, onde residem na Rua . . .
. . nº ___, CEP ___; os presentes identificados por mim Tabelião, consoante os
documentos de identidade apresentados, dou fé. E pelos outorgantes me foi dito
que: I- São titulares do domínio e possuidores do imóvel rural, que é constituído pelo
lote de terras sob nº____, da Gleba _________localizado no município, comarca e
..ª Circunscrição Imobiliária de _____, Estado de _____, com a área de __ ha, com
as seguintes confrontações: “_______”. Dito imóvel encontra-se cadastrado no
INCRA, sob nº ____ , com o valor venal de R$ ____, para o corrente exercício; e foi
havido pelos outorgantes por força do R.0.. (registro ...), da Matrícula nº ..... (. . ), do
..º Registro de Imóveis de _____, nos termos da escritura lavrada nas fls. ___ do
livro nº ___, do ..º Tabelião de ____, em __ de ___ de 19__. II- Possuem o imóvel
anteriormente descrito, desde o ano 19__ (um mil novecentos e ____) e que não
têm dívidas ativas ou passivas, de qualquer espécie, anteriores ao ato desta
instituição, para ser saldada. Para os fins desta escritura este imóvel será
denominado de Imóvel Serviente. III – Declaram que este imóvel possui área de
preservação permanente devidamente preservada nos termos da Lei nº 12.651/12,

48 Texto atualizado pelo autor. Original disponível em:


<http://www.anoreg.org.br/anoregbr_file/apostilas_curso/minutas_de_contrato_e_escritura_publica_p
ara_instituicao_de_servidao_ambiental.doc>. Acesso em: 02.12.2014.
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assim como mantém área conservada (ou em fase de restauração) de ____ ha como
reserva legal, devidamente averbada na matrícula do imóvel (IDENFITICAR
AVERBAÇÃO), de acordo com a Lei nº 12.651/12. IV- Declaram também que este
imóvel possui área florestal de ____ ha excedente às obrigações florestais do imóvel
referentes a reserva legal e área de preservação permanente, possuindo a seguinte
caracterização de linha de base: “____”. Para garantir a efetividade do
monitoramento da área, constituem anexos desta as fotos do imóvel serviente em
seu estado atual. V - Pela presente escritura, na melhor forma de direito, querem os
outorgantes INSTITUIR nesse imóvel, a SERVIDÃO AMBIENTAL, como
efetivamente instituindo estão, de acordo com o Artigo 1.378 e seguintes que
couberem do CC - Código Civil e demais regras estabelecidas no art. 9º-C e
seguintes da Lei 6938/81, a fim de ficar esse imóvel destinado a conservação do
patrimônio florestal, mediante a qual voluntariamente renunciam, em caráter
permanente (ou pelo período de ____ anos), a direitos de supressão ou exploração
da vegetação nativa existente ou a ser restaurada, para fins de utilização da área
serviente pelo imóvel de propriedade dos outorgados, constituído pelo lote de terras
sob nº____, da Gleba _________localizado no município, comarca e ..ª
Circunscrição Imobiliária de _____, Estado de _____, com a área de __ há, com
Matrícula nº ..... (. . ), do ..º Registro de Imóveis de _____, nos termos da escritura
lavrada nas fls. ___ do livro nº ___, do ..º Tabelião de ____, em __ de ___ de 19__,
que para os fins desta escritura se denominará Imóvel Dominante, visando atender a
exigência da Lei nº 12.651/12 de 20% (vinte por cento) de área de reserva legal,
consistente em ____ ha, estando esta compensação aprovada pelo órgão ambiental
do Estado do Paraná, de acordo com o Decreto Estadual nº 3320 de 12/07/2004,
pela inexistência de vedação pelo artigo 6º e pelo atendimento dos critérios previstos
pelo artigo 3º, quais sejam: reserva legal composta de vegetação nativa, áreas
pertencentes ao mesmo bioma e mesma bacia hidrográfica, áreas de preservação
permanente de ambos os imóveis preservadas ou em processo de restauração e a
área cedida deve estar inserida dentro do mesmo agrupamento de municípios que a
área recebida. A limitação ao uso da vegetação da área sob regime de servidão
ambiental será, no mínimo, a mesma estabelecida para a Reserva legal, de acordo
com estabelecido em lei especial. VI - Não há motivos que possam prejudicar a
presente instituição, obrigando-se, os outorgantes, desde já, a fazer a competente
publicação pela Imprensa Oficial do Estado, para conhecimento de terceiros,
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considerando a presente escritura boa, firme e valiosa, na forma da lei. VII- Têm
pleno conhecimento que: a-) esta instituição é para a proteção dos recursos
florestais e naturais do imóvel de acordo com as funções legais da reserva legal
constituída, abrangendo também suas pertenças e acessórios; e o bem não poderá
ter destino diferente, ou ser cedido, sem o consentimento expresso dos interessados
e dos seus representantes legais; b-) a instituição da presente servidão é feita de
forma permanente, impossibilitado o seu cancelamento ou revogação (ou pelo prazo
de ___ anos), obrigando a todos os sucessores ao seu fiel cumprimento; c-) os
outorgantes conferem aos outorgados, ou seus sucessores na propriedade do
imóvel, poderes para fiscalizar o cumprimento das obrigações garantidoras da
servidão ambiental, inclusive através de vistorias in loco, mediante acompanhamento
de técnicos. VIII- A presente servidão ambiental é instituída a título oneroso (ou
gratuito) pelo valor de R$ _____ (_______ MIL REAIS), quitado de acordo com
cláusulas do relativo instrumento particular. IX- Os outorgantes, assumindo a
responsabilidade civil e penal, declaram mais: a- que estão obrigados à
apresentação da Certidão Negativa de Débitos, do Instituto Nacional do Seguro
Social, por serem empregadores, ou produtores rurais que contem com empregados
ou que contratem serviço de mão-de-obra ou que comercializem sua produção, e
serem responsáveis por recolhimento de contribuições à Previdência Social; b- que
o __ imóvel __ objeto desta encontra-se livre e desembaraçado de quaisquer
dúvidas, dívidas, impostos, taxas ou ônus de quaisquer natureza, mesmo por
hipotecas legais, convencionais, ou outros encargos; C- para os fins da Lei Federal
nº 7.433, de 18/12/1985, regulamentada pelo Decreto nº 93.240, de 09/09/1986,
publicado no Diário Oficial da União, em 10/09/1986, que não tramitam, em todo o
território nacional e até a presente data, ações reais e pessoais reipersecutórias
relativas a esse (s) bem (ns) ou outros ônus reais incidentes sobre o (s) mesmo (s);
apresentando a (s) certidão (ões) de propriedade expedida (s) pelo Registro de
Imóveis competente, em __ de _____ do corrente, que ficará (ão) arquivada (s)
nestas notas, na pasta nº CP-__/04, fls. ___; d - que não __ têm participações em
nenhuma sociedade, seja mercantil, civil, religiosa, pia, moral, científica ou literária; e
- sendo vedada, durante o prazo de sua vigência, a alteração da destinação da área,
nos casos de transmissão a qualquer título, de desmembramento ou de retificação
dos limites da propriedade." X- Finalmente e desde já, nos termos do Artigo 246 da
Lei nº 6.015/1973, requerem e autorizam o Senhor Oficial do Registro de Imóveis
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competente a tomar todas as providências necessárias ao registro desta,


comprometendo-se, também, a apresentar, juntamente com o traslado desta, todas
as certidões pessoais e fiscais relativas ao imóvel em tela. Assim o disseram, dou fé,
pediram-me e lhes lavrei este instrumento que, feito e lido em voz alta, foi achado
conforme, aceitaram, outorgam e assinam.
Local. Data.
Assinaturas.
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ANEXO C – MINUTA DE PROPOSTA DE PROCEDIMENTO - CETESB

De: Para: Data:

Assessor CT/CTAN 26/05/2014


Referências:

Processo PA/00075/13
Assunto:

Consulta pela Prefeitura de Rio Grande da Serra – Servidão Ambiental

Senhor Gerente

A pedido do Oficial de Registro de Imóveis de Ribeirão Pires, Dr. Luc da Costa


Ribeiro, nos reunimos nesta Diretoria, para dirimir algumas dúvidas quanto ao
procedimento sugerido pelo Despacho de 14/04/2014, encaminhado pela Agência
Ambiental ABC I, e que anteriormente, foi objeto de tratativas com a Prefeitura e o
respectivo Cartório, para implementar a Servidão Ambiental como instrumento de
compensação no município de Rio Grande da Serra.

Assim, com base no referido Despacho, e nas observações do Cartório de Registro


de Imóveis, estamos propondo como procedimento para aplicação deste
instrumento, nas Áreas de Proteção e Recuperação dos Mananciais, o rito abaixo
descrito:

1. Aplicar-se–á o instrumento de Servidão Ambiental nas áreas onde incidem as


APRM – da Guarapiranga e Billings, ou seja, nas bacias hidrográficas dos
mananciais que possuem Leis Específicas.

2. A Servidão Ambiental possibilitará instituir Módulos de Compensação


Ambiental – MCAs, definidos topograficamente com dados
georreferenciados, em área de interesse para preservação ambiental, com
ênfase para as grandes propriedades localizadas nas Subáreas de baixa
densidade demográfica como as SBD e SCA, respectivamente, Subárea de
Ocupação de Baixa Densidade e Subárea de Conservação Ambiental .

3. A área ou gleba disponível para implantação da Servidão Ambiental deve,


preliminarmente, ser objeto de licenciamento junto à CETESB, de modo que
se protocole uma “Solicitação de implantação de Servidão Ambiental” da área
mãe, com objetivo de registrar na matrícula deste imóvel a finalidade
pretendida. O registro decorrente da averbação desta finalidade, será uma
certificação de regularidade da matrícula para a Instituição de Servidão
Ambiental, para regularização de empreendimentos ou atividades em APRM.

4. O requerimento na CETESB do projeto com finalidade de Instituição de


Servidão Ambiental, deverá ser instruído, no mínimo, com duas vias de:
o Planta e memorial descritivo da área, nos
quais constem suas medidas perimetrais, área total, confrontantes,
coordenadas preferencialmente georreferenciadas dos vértices definidores
de seus limites, número(s) da(s) matrícula(s) envolvidas, nome(s) do(s)
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proprietário(s), demarcação das áreas de preservação permanente - APPs


existentes, pois sobre elas não será possível instituir a Servidão
Ambiental, demarcar os Módulos de Compensação Ambiental (MCAs), e
articulação dos MCAs com quadro de áreas geral;
o Cada MCA deverá ser projetado com área
mínima de 100 m² (cem metros quadrados), excluídas as APPs, além de
possuir descrição cartográfica, georreferenciada, permitindo ser
identificado, individualmente, na planta geral da área, e objetivando sua
escrituração precisa quando da utilização;
o Cópia da matrícula ou transcrição da área
ou gleba, emitida pelo registro de imóveis;
o Cópia da Planta do Sistema Cartográfico
Metropolitano – SCM, escala 1:10.000m com a gleba delimitada;
o Relatório de Caracterização Florestal;
o Projeto de Recomposição Vegetal, quando
se tratar de área com trechos sem vegetação; e
o Observação em Planta, com letras
Maiúsculas e em Negrito, de que: – O PRESENTE FRACIONAMENTO
EM MÓDULOS DE COMPENSAÇÃO AMBIENTAL - MCA, ESTÁ SENDO
CERTIFICADO, ÚNICA E EXCLUSIVAMENTE PARA FINS DE
INSTITUIÇÃO DE SERVIDÃO AMBIENTAL, CONFORME LEI FEDERAL
12.651/2012, NÃO SIGNIFICANDO UM PARCELAMENTO OU
DESMEMBRAMENTO.

4.1. A Área Mãe, destinada à Servidão


Ambiental, deverá ser cercada e preservada pelo seu administrador, que
deverá providenciar sua manutenção, caso ocorra, por qualquer motivo, perda
de espécies, incêndios, etc. Note-se que o proprietário da Área Mãe poderá
arrendar, vender ou fazer doação de cotas de reserva ambiental, e não uma
área de terra em si, não configurando dessa forma um parcelamento
tradicional. Dessa forma, permanecerá o vínculo de responsável pela Área
Mãe e sua manutenção.

4.2. A CETESB analisará o projeto


apresentado, emitindo Declaração para Vinculação para o empreendimento
Área de Servidão Ambiental, que deverá ser averbada na Matrícula do imóvel,
registrando-se ser esse, seu uso exclusivo.

4.3. Após a averbação da Declaração para


Vinculação será emitido o respectivo Alvará Metropolitano com Exigências
Técnicas.

5. O proprietário de uma área irregular, ou seja, que não atenda um ou mais de


um índice urbanístico (Lote Mínimo, Coeficiente de Aproveitamento, Área
Permeável ou Área Vegetada), deverá ingressar com Processo Administrativo
de Regularização, junto à Agência Ambiental do ABC I, apresentando:
o proposta de aquisição de um ou mais
módulos (MCA), cuja área, compondo com a área original do lote a ser
regularizado, seja suficiente para atendimento dos índices exigidos para a
Subárea onde se localiza o lote;
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o após análise dos índices urbanísticos, será


emitida pela Agência Ambiental uma correspondência ao interessado,
informando a necessidade de se apresentar Contrato de Instituição de
Servidão Ambiental de MCAs necessário, acompanhado de cópia da
Matrícula da Área Mãe correspondente, cuja finalidade de servidão
ambiental já está averbada;
o após a apresentação desse documento,
prosseguirá a análise técnica, como fosse um caso normal de
regularização mediante acréscimo de área por compensação;
o portanto, além da documentação normal,
exigida para licenciamento do empreendimento, deverá também ser
apresentado o Contrato de Instituição de Servidão Ambiental do(s) MCA(s)
respectivo(s);
o a Agência Ambiental emitirá Declaração
para Vinculação, onde constará o número de ambas matrículas, ou seja,
do empreendimento a regularizar e da Área Mãe que contém o(s) MCA(s)
requerido(s) para regularização;
o após averbação, que deverá constar em
ambas matrículas, será emitido o Alvará Metropolitano com Exigências
Técnicas.

6. O Contrato de Venda e Compra de cada MCA, será denominado


CONTRATO DE INSTITUIÇÃO DE SERVIDÃO AMBIENTAL, do qual deverá
constar que o mesmo destina-se, exclusivamente, à compensação Ambiental
para regularização de empreendimento ou atividade, não podendo ser objeto
de qualquer outra utilização e devendo permanecer intocado, quanto a sua
cobertura florestal;

7. Por sugestão do C.R.I. o instrumento particular de instituição de servidão


ambiental denominado CONTRATO DE INSTITUIÇÃO DE SERVIDÃO
AMBIENTAL, deverá ser pactuado e firmado entre as partes interessadas,
perante duas testemunhas, e conter as seguintes Cláusulas:

o 1ª Cláusula – Do Objeto e Prazo;


o 2ª Cláusula – Do Imóvel Serviente ( área
da compensação);
o 3ª Cláusula – Do imóvel Dominante
(detentor da Servidão Ambiental);
o 4ª Cláusula – Da Remuneração;
o 5ª Cláusula - Deveres e Direitos do
Proprietário e do Detentor da Servidão (art.9º C - § 2º e 3º Lei
12.651/2012);
o 6ª Cláusula – Cessão de Direitos;
o 7ª Cláusula - Foro – Resolução dos
Conflitos.

8. O controle da utilização dos Módulos de Compensação Ambiental será


acompanhado tanto pela Agência Ambiental, quanto pelo Cartório de
Registro de Imóveis, que deverão manter em arquivo a Planta do Projeto de
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fracionamento da Área Mãe nos diversos MCAs, devidamente identificados,


como exposto acima, para controle e aferição a qualquer momento. A cada
projeto regularizado, o(s) Módulo(s) correspondente(s) utilizado(s) deverá(ão)
ser assinalado(s) nessa Planta, obtendo-se dessa forma o controle da
eventual disponibilidade de Módulos em cada empreendimento. No
fechamento da cada Área Mãe, o Cartório deverá notificar a Agência, por
carta, para conferência e encerramento da mesma.

9. Fica implícito que a venda de uma propriedade que tenha sido regularizada
mediante esse mecanismo, implica na venda do(s) MCA(s) que
propiciou(aram) a regularização, uma vez que há compartilhamento de
propriedades escrituradas, ou seja, a área regularizada e o Módulo são
inseparáveis.

10. A reutilização dos Módulos poderá ocorrer, condicionada à regularidade do


lote, empreendimento ou atividade por outro instrumento, ou seja, poderá
haver casos em que o Módulo pode ser dissociado do lote a que deu
regularidade, desde que esta possa ser obtida por outro meio. Por exemplo:
se um MCA foi vinculado a um lote qualquer, devido ao excesso de área
construída, em desobediência ao Coeficiente de Aproveitamento (CA), e
ocorre a demolição de parte da construção, de modo que haja adequação ao
índice, o MCA correspondente poderá ser desafetado da matrícula, mediante
reanálise do caso, através de abertura de novo Processo junto à CETESB e
consequente averbação junto ao Cartório de Registro de Imóveis. Poderão
ser analisados outros casos em que se pretenda esse tipo de desafetação e
comercialização dos Módulos.

Não havendo mais o que descrever, e tendo o procedimento validação dos


envolvidos, solicito em nome do Senhor Diretor de Controle e Licenciamento
Ambiental que o presente Despacho seja incorporado aos Procedimentos para as
Análises de Processos da Companhia, e a presente pasta devolvida à origem.

Atenciosamente

Vivian Marrani de Azevedo Marques


Assessora

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