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Construção em Betão Pré-Fabricado

Um desafio para o “futuro”

A Flexão e o Corte no Eurocódigo 2


Alguns resultados de investigação no IST

José Noronha da Camara

Ordem dos Engenheiros

10 de Fevereiro de 2006

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1. Apresentação Geral
No projecto das construções há que seguir três princípios essenciais definidos desde os
tempos dos romanos: segurança/resistência, funcionalidade/condições de serviço e
elegância/beleza, para além da eficiência económica, que tem vindo a ganhar maior
relevância nos tempos modernos.

As obras pré-fabricadas têm, em geral, como importante motivação a economia, em


especial, pela racionalização de meios de construção que permitem. O grande desafio à pré-
fabricação é manter essa mais valia sem descurar a eficiência estrutural e, em certos casos,
como nas pontes, a estética das obras.

A Pré-fabricação para além da vertente económica, traz vantagens evidentes em termos de


qualidade de execução, de materiais e de tolerâncias pois trata-se da produção em fábrica
ou em condições especiais de estaleiro.

As juntas de betonagem surgem, nas estruturas betonadas in situ, como uma consequência
natural do faseamento e do processo construtivo e, nas estruturas pré-fabricadas, sempre
que existe necessidade de dar continuidade aos diversos elementos estruturais pré-
moldados. Ora, sem excluir outras alternativas, a concepção de alternativas com pré-
fabricação e continuidade de betão estrutural é, em nosso entender, a melhor forma de
assegurar robustez, hipersticidade e fiabilidade.

A análise dos efeitos destas ligações, com juntas de betonagem, no comportamento global e
na durabilidade das estruturas, é, ao nível da investigação, um tema relativamente recente,
associado ao incremento da pré-fabricação e da industrialização do sector da construção.
Também por esta razão, os códigos e manuais mais actuais só agora apresentam
recomendações mais específicas para o seu dimensionamento e pormenorização.

A continuidade estrutural entre os diversos elementos pré-moldados passa pela necessidade


de executar pequenas betonagens in situ localizadas nos nós de ligação pelo que há que
compreender o seu efeito no comportamento global das obras e das próprias juntas.

Apresentam-se seguidamente algumas situações de casos práticos em que a questão das


ligações e do processo construtivo, associado à utilização da pré-fabricação, tem implicações
ao nível da análise estrutural e das verificações de segurança.

1.1 Situações de aplicação da pré-fabricação em viadutos

Ilustra-se seguidamente na figura 1 o tipo de soluções utilizadas nas passagens superiores


da Scut da Beira Interior com recurso à pré-fabricação. Refira-se que para os elementos
verticais, betonados in situ, foram utilizadas duas soluções (pórticos de betão (a) sem
continuidade para o tabuleiro e pilares lâmina (b) com ligação estrutural). Nos alçados/corte

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e nos cortes transversais é possível identificar no tabuleiro as vigas e as pré-lajes pré-
fabricadas.
Km=0+219.043
Z=484.200 (**)

2
3
2
3
Km=1+075.000
Z=477.742 (**)

a)
476.00

475.30

473.20
473.00
472.80

9.00 15.20 15.20 9.00

7.00
1.00 5.00 1.00
0.50 2.00 2.00 0.50

i=2.5% i=2.5%

Km=0+188.640
Z=489.763 (**)

Terreno
Natural

486.50 W5

2
5.19

b)
Km=13+270.933
Z=483.451 (**) 2

481.50 481.50 481.50

481.00

4.50 7.60 7.60 4.50

Figura 1 – Passagens Superiores com apoio central e tabuleiro executado com pré-fabricação

a) Pórticos com pilares e topos da travessa curvos, com 60 cm de largura


b) Pórticos com elementos de parede de espessura de 30 cm, contínuos com o tabuleiro

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Nas fotografias das figuras 2 e 3 ilustra-se, em fase de execução, a solução referida
anteriormente com ligação contínua do tabuleiro aos elementos verticais. Na figura 2 é
apresentada uma vista geral da obra sendo de realçar na figura 3 a continuidade de
armaduras do pilar lamina ao tabuleiro e os apoios metálicos provisórios (figura 3a) para as
vigas pré-fabricadas.

Na figura 4 é ilustrado o pormenor da ligação das vigas sobre o apoio notando-se a carlinga
ligeiramente mais baixa que as vigas, para permitir um melhor pormenor de entrega das
armaduras na carlinga, e o ferro de empalme em U para assegurar a continuidade de
armadura longitudinal inferior. É, também de notar neste pormenor que a viga pré-fabricada
não transmite directamente a carga ao apoio definitivo.

Figura 2 – Passagem Superior na A23 executada com pré-fabricação

(a) (b)

Figura 3 – Passagem Superior na A23. (a) Apoios provisórios das vigas pré-fabricadas; (b) Vista
inferior após betonagem da zona de ligação

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Figura 4 – SCUT da Beira Interior – pormenor de ligação na secção dos apoios

Na figura 5 apresenta-se uma disposição de uma secção transversal tipo de vigas I pré-
fabricadas pré-tensionadas de um tabuleiro executado com pré-lajes. A armadura treliçada
da laje tipo 1 assegura, para além da ligação entre os betões de idades diferentes (função
exlusiva da armadura no caso da laje tipo 2), o equilíbrio da consola na fase de betonagem
do tabuleiro.

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Figura 5 – Solução tipo de pré-lajes num tabuleiro com vigas I

Na figura 6 é ilustrado um caso prático de um faseamento construtivo em que, após a


colocação das vigas, é executado a carlinga e o tabuleiro na zona dos apoios de
continuidade e é aplicado um pré-esforço com cabos rectos na laje, antes da execução do
restante tabuleiro. Com esta solução diminuem-se os esforços no vão e a necessidade de
pré-esforço nas vigas pré-fabricadas mas torna-se o processo construtivo um pouco menos
directo.

Realce-se também que um faseamento deste tipo, com variação da secção transversal e do
sistema estrutural longitudinal, durante a construção, provoca, devido à fluência de betão,
uma redistribuição inevitável de tensões e/ou esforços ao longo do tempo que devem ser
analisadas.

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Figura 6 – Exemplo de um faseamento construtivo de um viaduto com vigas de secção em I e pré-
esforço de continuidade na laje

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Nas figures 7 e 8 ilustra-se mais um caso típico de recurso à pré-fabricação de tabuleiros de
pontes, com junção das vigas entre si por uma ligação pré-esforçada com barras curtas e
betonagem local da zona de união das vigas com os aparelhos de apoio definitivos.

Figura 7 – Viaduto com vigas U pré-fabricadas e laje do tabuleiro betonado in situ

Corte longitudinal Corte transversal

Figura 8 – Pormenor da ligação na secção dos apoios na obra indicada na figura anterior

Na figura 9 está representada uma solução mais tradicional com recurso a vigas pré-
fabricadas com pré-esforço de pós-tensão, parte a aplicar com a viga isostática, e outra
parte com o estabelecimento de continuidade.

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Figura 9 – Pormenor de ligação com pré-esforço contínuo

Na figura 10 apresenta-se uma ligação com continuidades em betão armado de vigas pré-
fabricadas do projecto do SATUOeiras com uma variação local de altura e com betonagem
in situ da ligação e da parte superior da viga em todo o comprimento da armadura
longitudinal principal. Neste caso a questão de ligação de betão de idades diferentes coloca-
se longitudinal e transversalmente.

Na figura 11 ilustra-se uma ligação pré-esforçada entre vigas pré-fabricadas a quartos de


vão, numa zona curva do viaduto, com pré-esforço local aplicado com cabos curtos e
dimensionada para a descompressão para as combinações raras de acções.

Finalmente na figura 12 apresenta-se o aspecto final daquela obra com uma carnagem
lateral que assegura uma inserção estética, com a geometria dos pilares e no seu conjunto,
muito favorável.

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Figura 10 – Ligação com continuidade em betão armado entre vigas pré-fabricadas no SATUOeiras

POST-TENSION CABLES

PLAN VIEW GROUT

Figura 11 – Colocação de vigas pré-fabricadas sobre o apoio e aplicação de pré-esforço a quartos de


vão com cabos curtos de pré-esforço

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Figura 12 – Aspecto final de um troço do Viaduto do SATUO com a carnagem bem inserida com a
geometria dos pilares

2. Referências ao Eurocódigo 2 Associadas aos Temas da


Apresentação
Fazem-se seguidamente referência a algumas disposições do Eurocódigo 2 que são de
alguma forma relevantes para o desenvolvimento dos temas tratados nesta apresentação
sobre as verificações de segurança em estruturas, com elementos de betão pré-moldados,
ao corte e à flexão.

2.1 Retracção e fluência (§2.3.2.2 do EC2)

A retracção e a fluência são propriedades reológicas do betão. Em geral, os seus efeitos


devem ser considerados na verificação dos estados limites de utilização.

Os efeitos da retracção e da fluência devem ser considerados na verificação dos estados


limites últimos apenas quando são significativos, por exemplo, na verificação dos estados
limites últimos de estabilidade quando são importantes os efeitos de segunda ordem.
Noutros casos, não é necessário considerá-los desde que sejam suficientes a ductilidade e
a capacidade de rotação dos elementos.

2.2 Recobrimento das armaduras (§4.4.1 do EC2)

O recobrimento nominal deve ser o valor especificado nos desenhos. É definido como um
recobrimento mínimo, cmin (ver 4.4.1.2), mais uma margem de cálculo para as tolerâncias de
execução, ∆cdev (ver 4.4.1.3):

cnom = cmin + ∆cdev

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2.2.1 Recobrimento mínimo Cmin (§4.4.2 do EC2)

Para assegurar simultaneamente a transmissão correcta das forças de aderência e a


adequada compactação do betão, o recobrimento das armaduras não deve ser inferior a
cmin,b dado no quadro seguinte.

Recobrimento mínimo, cmin,b, requisitos relativos à aderência

Requisito de aderência

Disposição dos varões Recobrimento mínimo cmin,b*

Isolados Diâmetro do varão

Agrupados Diâmetro equivalente (φn) (ver 8.9.1)

*: Se a máxima dimensão do agregado for superior a 32 mm, cmin,b deve ser aumentado de 5 mm.

No caso de uma betonagem contra outros elementos de betão (pré-fabricado ou


betonado no local), o recobrimento mínimo das armaduras medido em relação à interface
pode ser reduzido para um valor correspondente ao requerido para a aderência, cmin,b, desde
que:
- a classe de resistência do betão seja pelo menos C25/30,
- o tempo de exposição da superfície de betão ao ambiente exterior seja de curta duração
(< 28 dias),
- a interface tenha sido tornada rugosa.

2.2.2 Margem de cálculo para tolerâncias de execução (§4.4.1.3 do EC2)

Para o cálculo do recobrimento nominal, cnom, deverá majorar-se, ao nível do projecto, o


recobrimento mínimo para ter em conta as tolerâncias de execução (∆cdev). Em
determinadas situações, a tolerância de execução admissível e, por conseguinte, a margem,
∆cdev, podem ser reduzidas.

Assim quando o fabrico está sujeito a um sistema de garantia de qualidade, no qual a


monitorização inclui medições do recobrimento das armaduras, pode reduzir-se a margem
de cálculo para desvios das tolerâncias de execução ∆cdev:

10 mm ≥ ∆cdev ≥ 5 mm

2.3 Esforço longitudinal nas juntas de betonagem (§6.2.5 do EC2)

A tensão tangencial nas juntas de betonagens em diferentes datas deve, além dos requisitos
de verificação ao esforço transverso, satisfazer também o seguinte:

vEdi ≤ vRdi

vEdi é o valor de cálculo da tensão tangencial na junta dada por:

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vEdi = β VEd / (z bi)

em que:

β relação entre o esforço longitudinal na secção de betão novo e o esforço longitudinal


total na zona de compressão ou na zona de tracção, ambos calculados na secção
considerada

VEd esforço transverso

z braço do binário da secção composta

bi largura da junta (ver Figura 6.8)

vRdi valor de cálculo da tensão tangencial resistente na junta dada por:

vRdi = c fctd + µ σn + ρ fyd (µ sin α + cos α) ≤ 0,5 ν fcd

em que:

c e µ são coeficientes que dependem da rugosidade da junta

fctd é a resistência de dimensionamento do betão à tracção

σn tensão devida ao esforço normal exterior mínimo na junta, que pode actuar
simultaneamente com o esforço transverso, positivo se de compressão, com σn < 0,6
fcd, e negativo se de tracção. Quando σn é de tracção, c fctd deve ser considerado igual
a 0.

ρ = As / Ai

bi

bi

bi

Figura 13 - Exemplos de juntas de betonagem

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As área da secção de armaduras que atravessa a junta incluindo a das armaduras de
esforço transverso (caso existam), com amarração adequada de ambos os lados da junta.

Ai área da junta

α definido na Figura 6.9 e deve ser limitado de modo que 45° ≤ α ≤ 90°

ν é um coeficiente de redução da resistência

45 ≤ α ≤ 90
h2 ≤ 10 d N Ed
C
A
α
V Ed
d 5 mm
h1 ≤ 10 d V Ed
B C
≤ 30

A - betão novo, B - betão antigo, C - amarração

Figura 14 – Esquema das tensões de compressão geradas ao longo da junta

NOTA: É de referir que a expressão de VRdi se fundamenta num mecanismo de atrito com
coeficientes, µ, entre os agregados por efeito de uma compressão perpendicular à
superfície devido a uma eventual componente exterior, σN, e à componente de
equilíbrio da força de tracção mobilizada nas armaduras, ρ fyd sen α (ver figura 14).

Às componentes deste mecanismo é somado um termo de adesão c fctd e a


contribuição directa da componente de armadura na direcção do corte, ρ fyd cos α.

Na falta de informações mais pormenorizadas, as superfícies são classificadas como muito


lisas, lisas, rugosas ou indentadas, conforme os seguintes exemplos:
- Muito lisa: uma superfície moldada por aço, plástico ou por moldes de madeira
especialmente preparados: c = 0,25 e µ = 0,5
- Lisa: uma superfície extrudida ou executada com moldes deslizantes ou executada sem
cofragem e não tratada após a vibração: c = 0,35 e µ = 0,6
- Rugosa: uma superfície com rugosidades de pelo menos 3 mm de altura e espaçadas
cerca de 40 mm, obtidas por meio de raspagem, de jacto de água, ar ou areia ou por
meio de quaisquer outros métodos de que resulte um comportamento equivalente:
c = 0,45 e µ = 0,7
- Indentada: uma superfície com recortes em conformidade com a Figura 14: c = 0,50 e
µ = 0,9

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No caso em que a junta possa ficar significativamente fissurada, c deve ser considerado
igual a 0 para juntas lisas e rugosas e igual a 0,5 para juntas indentadas. Por outro lado, sob
acções dinâmicas ou que envolvam fadiga, os valores de c devem ser reduzidos de metade.

As armaduras transversais podem distribuir-se por zonas com espaçamento constante,


como indicado na Figura 15.

v Edi ρ f yd (µ sin α + cos α)

c fctd + µ σ n

Figura 15 – Diagrama de esforço transverso representando a armadura necessária na junta

NOTA: São de referir em relação a este diagrama dois aspectos:


• A possibilidade de admitir uma redistribuição plástica da resistência ao corte por
patamares.
• O facto, de em nosso entender, se poder considerar para As, quer as armaduras
colocadas especificamente para esse efeito (número 2 na figura 15a), quer as de
esforço transverso (número 1 da mesma figura).

a) b)
Figura 16 – Armadura de resistência ao corte da ligação tipo de uma viga pré-fabricada com a laje
superior (a) e tensões do modelo global de esforço transverso vendo-se que a componente vertical
das compressões contribui para a compressão ao longo da junta (b)

A consideração da armadura de esforço transverso na resistência ao corte da junta


horizontal deve-se, como é indicado na figura 16a, ao facto do próprio mecanismo de treliça,

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do comportamento global da viga, impor uma componente de compressão axial à superfície
da junta.

2.4 Regras adicionais relativas a elementos e estruturas pré-fabricadas de betão


(secção 10 do EC2)

As regras indicadas nesta secção do EC2 aplicam-se a edifícios total ou parcialmente


constituídos por elementos pré-fabricados de betão e constituem um complemento às regras
indicadas noutras secções. Outros assuntos, relacionados com disposições construtivas,
produção e montagem, são abrangidos pelas normas específicas dos produtos.

2.4.1 Bases do cálculo, requisitos fundamentais (§10.2 do EC2)

Os elementos a ter em conta de modo específico no projecto e na definição das disposições


construtivas de elementos e estruturas pré-fabricados de betão, são os seguintes:
- situações transitórias
- aparelhos de apoio; temporários e permanentes
- ligações e juntas entre elementos

A análise deve ter em conta:


- o comportamento dos elementos estruturais em todas as fases da construção, utilizando
as características geométricas e as propriedades válidas para a fase considerada e a
sua interacção com outros elementos (por exemplo, com betão betonado in situ, com
outros elementos pré-fabricados);
- o comportamento do sistema estrutural sob a influência do comportamento das
ligações entre elementos, nomeadamente as deformações e a resistência reais das
ligações;
- as incertezas com influência nas deformações impedidas e na transmissão dos esforços
entre elementos, devidas às imperfeições geométricas e às tolerâncias do
posicionamento dos elementos e dos aparelhos de apoio.

2.5 Ligações e apoios de elementos pré-fabricados (§10.9.4 do EC2)

Os materiais utilizados para as ligações devem ser:


- estáveis e duradouros para o tempo de vida útil de projecto da estrutura
- química e fisicamente compatíveis
- protegidos das influências químicas e físicas adversas
- com uma resistência ao fogo compatível com a resistência ao fogo da estrutura.

2.5.1 Ligações que transmitem esforços transversos (§10.9.4.4 do EC2)

Para a transferência de esforços transversos na interface entre dois betões, por exemplo,
entre um elemento pré-fabricado e betão colocado in situ, ver ponto 2.3.

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2.5.2 Ligações que transmitem esforços de flexão ou de tracção (§10.9.4.5 do EC2)

A armadura deve ser contínua através da ligação e ser amarrada nos elementos adjacentes.

Pode obter-se continuidade, por exemplo, através de


- sobreposição de varões
- injecção dos furos de alojamento das armaduras
- sobreposição de laços de armadura
- soldadura de varões ou de chapas de aço
- pré-esforço
- dispositivos mecânicos (uniões roscadas ou injectadas)
- conectores de engaste (uniões engastadas)

3. Verificação da Segurança ao Corte na Interface entre Betões de


Idades Diferentes
A verificação da segurança ao corte, por deslizamento relativo das superfícies em contacto,
na interface entre betões de idades diferentes não é normalmente considerada em
estruturas moldadas in situ, contrariamente ao que sucede em estruturas pré-fabricadas ou
situações de reparação ou reforço. Isto deve-se, por um lado, à prática corrente e, por outro
lado, ao facto das juntas serem, naqueles casos, adoptadas em zonas de menores tensões.

A verificação da segurança ao corte em juntas de betonagem está pois, em geral, associada


à utilização de estruturas com elementos pré-fabricados.

Refere-se que o regulamento de estruturas de betão armado e pré-esforçado, o REBAP, só


contempla esta matéria numa nota do artº 74 propondo a regra das costuras (expressão
equivalente à ligação banzo-alma) que não se baseia nos mecanismos em geral
considerados para este efeito. Assim, para além do mecanismo de interbloqueamento de
inertes (ver figura 17), no qual se baseia a expressão regulamentar do EC2, e cujo sentido
físico foi justificado anteriormente no ponto 2.3, há o conhecido efeito de ferrolho (ver figura
18).

É interessante verificar que a expressão da resistência por efeito de ferrolho, Du, dada pela
expressão seguinte, é equivalente à da resistencia de uma estaca num solo coesico (ver
figura 19):

( )
Du = 1.35 ⋅ 1 + 9 ⋅ ε 2 − 3 ⋅ ε ⋅ d b2 ⋅ fsy ⋅ fcc ⋅ 1 −
σs
fsy
com ε=
e
db
f
⋅ cc
fsy

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Figura 17 – Acção do mecanismo de interbloqueamento de inertes

Figura 18 – Rotura por esmagamento do betão na vizinhança da armadura e cedência do aço por
flexão

Figura 19 – Diagrama de pressões e distribuição de momentos no caso de uma estaca carregada


lateralmente num solo coesivo

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σs
Na expressão anterior é de salientar que o termo 1 - f tem em consideração que se a
sy

armadura está a ser mobilizada por um outro efeito, por exemplo uma tracção aplicada à
secção, é reduzida a sua participação como componente de resistência ao corte.

É reconhecido que o mecanismo de interbloqueamento de inertes, no qual se baseia a


expressão do EC2, e o do efeito de ferrolho se mobilizam em conjunto e que é difícil a
análise conjunta. No entanto, é claro que a expressão do EC2 não pode ser utilizada em
sobreposição com a da resistência de ferrolho, pois aquela foi calibrada na base do
mecanismo isolado de interbloqueamento de inertes.

3.1 Ensaios experimentais

As expressões regulamentares propostas pelo EC2 para verificação da resistência ao corte


por deslizamento relativo tornam-se ambíguas para situações em que para além de corte e
esforço axial existe também momento flector.

Surgem, assim, dúvidas quanto à sua aplicação prática, tais como:

1. A armadura ou percentagem de armadura a considerar no cálculo, deverá ser a


totalidade existente na secção, ou deverá retirar-se a parcela de armadura
necessária para verificação da segurança à flexão?

2. Qual a influência das tensões normais de compressão no betão devidas à flexão, na


resistência ao corte da secção?

Se a armadura traccionada estiver em cedência devido à flexão, a sua contribuição por


efeito de ferrolho puro não pode ser considerada como referido anteriormente. No entanto,
por equilíbrio, as compressões no banzo comprimido e da componente horizontal do campo
de tensões na alma é igual à força de tracção gerando, eventualmente, um efeito favorável
em termos da resistência ao corte. Por outro lado, a armadura superior de flexão, ao
controlar a abertura de fendas, contribui certamente para a resistência na alma, por efeito de
interbloqueamento de inertes. Julga-se assim possível considerar que, pelo menos destas
formas menos directas, a armadura necessária por flexão tem influência na resistência ao
corte.

Para poder avaliar melhor as características da influência da flexão no corte das juntas e
tentar dar uma resposta mais fundamentada e quantificada a estas questões, foi
desenvolvido um trabalho experimental que é apresentado e justificadado no ponto seguinte.

3.2 Campanha de ensaios

Os modelos preparados para serem ensaiados consistiram em duas vigas com 3.00m de
vão, de secção em I, com um apoio simples e outro simulando uma situação de

19/41
continuidade, sujeitas a uma carga concentrada P aplicada a uma distância tal, que os
esforços transversos fossem aproximadamente iguais nos dois apoios. O troço central da
viga foi pré-fabricado e ligado aos apoios por intermédio de troços betonados em segunda
fase (Figura 20 e 21).

Figura 20 – Esquema dos ensaios experimentais. Faseamento Construtivo.

Figura 21 – 1ª Fase de betonagem do troço central da viga mostrando as características do topo da


junta

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O dispositivo experimental utilizado é apresentado nas figuras 22 e 23.

Figura 22 – Dispositivo Experimental

Figura 23 – Vista lateral do dispositivo experimental.

Foram ensaiadas quatro vigas, com secção em I, e com a pormenorização esquematizada


nas figuras 24 e 25 e indicada no quadro 1. Refira-se que a pormenorização foi tal que só as
armaduras estritamente necessárias à flexão, ou flexão com consideração da translacção,
atravessam a junta.

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Figura 24 – Alçado das armaduras longitudinais de todas as vigas e dos estribos das vigas V1P e V1REF

(a) Secção 1-1 (b) Secção 2-2

Figura 25 – Secções Transversais de todas as vigas e edos estribos das vigas V1P e V1REF

Armaduras de Flexão

Armadura Negativa Asl- Armadura Positiva Asl+


Secção
Pormenorização Área (cm2) Pormenorização Área (cm2)

- )
Apoio de Continuidade (Mmáx 4φ12+6φ8+2φ6 8,1 4φ6 1,1

Junta A 4φ12+6φ8+2φ6 8,1 4φ6 1,1

+
Aplicação da Carga (Mmáx.) 4φ6 1,1 4φ16+4φ12+4φ10 15,7

Junta B 4φ6 1,1 2φ16+2φ12+2φ10 7,9

Quadro 1 – Armaduras de flexão adoptadas

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As vigas diferenciam-se pela quantidade de armadura transversal e pelo facto de terem ou
não juntas de betonagem (ver quadro 2).

Juntas Estribos

V1P Sim φ6/0.15

V1REF Não φ6/0.15

V2P Sim φ8/0.075

V2REF Não φ8/0.075

Quadro 2 – Características das vigas ensaiadas

Na figura 26 apresenta-se a relação carga-deslocamento para as duas vigas com menor


quantidade de estribos (V1P e V1REF) verificando-se um comportamento em tudo semelhante.

Nas figuras 27 e 28 comparam-se as leituras dos extensómetros colocados nas armaduras


longitudinais próximos das juntas verificando-se que no apoio de continuidade abriu
“precocemente” uma fenda de flexão na zona da junta, mas que em termos do
comportamento em serviço não apresentou qualquer inconveniente.

500

■ D1 (V1P)
400 ■ D1 (V1REF)
Força C1 (kN)

300

200

100

0
0 2 4 6 8 10
Deslocamentos (mm)

Figura 26 – Deslocamento medido no deflectómetro D1 nas Vigas V1P e V1REF

23/41
500

■ L8 (V1P)
■ L8 (V1REF)
400
… εy
Força C1 (kN)

300

200

100

0
0 0.5 1 1.5 2 2.5 3
Extensões (1/1000)

Figura 27– Extensões medidas no extensómetro L8 nas vigas V1P e V1REF

500
■ L3 (V1P)
■ L3 (V1REF)

400 … εy
Força C1 (kN)

300

200

100

0
0 0.5 1 1.5 2 2.5 3
Extensões (1/1000)

Figura 28 – Extensões medidas no extensómetro L3 nas vigas V1P e V1REF

O tipo de rotura verificado nestes dois ensaios foi por esforço transverso com rotura dos
estribos (ver figura 29), sem qualquer influência de qualquer das juntas.

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Figura 29 – Colapso da viga V1REF no tramo do lado esquerdo em tudo semelhante à da viga V1P

Verificou-se, então, nestes dois ensaios, que o comportamento foi em tudo semelhante, em
termos de capacidade resistente, modo de rotura e até do comportamento em serviço. Por
outro lado, a resistência ao corte, dada pela expressão regulamentar ao longo da superfície
da junta, só é justificável considerando a participação da armadura traccionada ou pela
compressão (de igual valor àquela) devido à flexão.

Na figura 30 apresentam-se as curvas da resposta carga-deslocamento para as vigas com


maior percentagem de armadura transversal V2P e V2REF verificando-se, em termos de
capacidade resistente, comportamentos equivalentes mas com menor ductilidade da viga
com junta de betonagem (V2P).

25/41
800

700

600
Força C1 (kN)

500
■ D1 (V2P)
■ D1 (V2REF)
400

300

200

100

0
0 10 20 30 40 50 60 70
Extensões (1/1000)

Figura 30 – Deslocamento medido no deflectómetro D1 nas Vigas V2P e V2REF

O aspecto da fendilhação na viga V2P, é apresentado nas figuras 31 e 32 na zona das juntas
junto ao apoio de continuidade e no apoio simples, respectivamente. É interessante notar a
fenda vertical ao longo da junta na figura 31 que mostra que o aspecto geral da fendilhação
foi afectado pela menor resistencia do betão ao longo da junta.

Figura 31 – V2P - Fendilhação na Junta A para uma carga aplicada de 420kN

26/41
Junta B

48º

33º

Figura 32 – V2P - Fendilhação na Junta B para 420kN de carga aplicada

Finalmente nas figuras 33 e 34 representa-se a figura de rotura verificada junto ao apoio de


continuidade depois de esgotada a capacidade de carga à flexão e um pouco depois de se
ter verificado a cedência da armadura longitudinal. Como indicado na figura 35 as
componentes de resistência ao corte por ferrolho e interbloqueamento de inertes baixa
significativamente a partir da cedência da armadura longitudinal, acabando por prejudicar,
nestes ensaios as características de ductilidde daquena zona e, naturalmente, da viga no
seu conjunto.

f1 17º

f2

Figura 33 – Viga V2P - figura de rotura.

27/41
Figura 34 – Modelo de superfície de rotura verificada na viga V2P

600

480
VRm (kN)

360

240 VF+I (kN)

120
VZC (kN)

0
0 5 10 15 20 25
εy εs (‰)
Figura 35 – Simulação teórica de evolução de resistência de corte da zona comprimida VZC, do efeito
de ferrolho e interbloqueamento de inertes VF+I e total VRm, em particular a partir da cedência da
armadura longitudinal

Estes ensaios mostraram no essencial que a existência de juntas não prejudicou as


capacidades resistentes das vigas, nem mesmo no caso da viga V2P apesar do elevado
corte aplicado, mostrando claramente que a aplicação do EC2, considerando só as
armaduras da alma, não é realista para estas situações de corte global na secção. Apesar
de se justificar mais investigação, considera-se que a aplicação da expressão actual,
considerando também a armadura de flexão, é apropropriado. Refere-se, finalmente, que a
perda de ductilidade verificada não teria possivelmente se verificado se a resistência à
tracção na junta fosse superior, por exemplo com a adopção de uma “cola” devidamente
aplicada.

28/41
4. Comportamento à Flexão
O dimensionamento das estruturas à flexão com elementos pré-fabricados deve seguir os
critérios gerais de obras totalmente betonadas in situ. No entanto, deve ter-se em atenção
que o método construtivo influencia o comportamento da obra e, consequentemente, os
modelos de cálculo que o projectista deve adoptar.

Para determinação da envolvente de esforços, considerando o faseamento construtivo, é

definida com frequência a expressão seguinte, onde S1 representa os esforços logo após

entrada em serviço, S2 representa os esforços determinados no sistema contínuo final e S∞

corresponde aos esforços a tempo infinito após redistribuição por acção da fluência:

ϕ
S∞ = S1 +
1 + χϕ (S 2 - S1 ) ; χ ≅ 0.7 a 0.9

Na expressão figura o quociente ϕ/(1+χϕ) que quantifica a alteração da distribuição de


esforços no tempo. No caso do quociente ser nulo, os esforços a tempo infinito são
coincidentes com os esforços após entrada em serviço; se o quociente for unitário, são
coincidentes com os esforços determinados no sistema estrutural final.

As mesma questões colocam-se quando se adapta a expressão ao cálculo de tensões em


serviço. A expressão é dada, à semelhança do efectuado para os esforços, por:

ϕ
σ∞ = σ1 +
1 + χϕ (σ
2 - σ1 )
Em relação a esta formulação havia algumas questões que se colocavam tais como:

• Será que a formulação é válida quando, para além da variação do sistema


estrutural longitudinal, também há modificação das características da secção?

• Qual o valor de ϕ mais realista a utilizar?

• Será que é possível obter uma expressão para avaliar simplificadamente as


deformações nestes casos?

O estudo desenvolvido deu resposta a estas questões e serviu para comparar critérios de
dimensionamento conforme se resume seguidamente.

4.1. Método Proposto

No trabalho realizado foi desenvolvida uma metodologia que propõe uma reformulação do
coeficiente acima referido e que torna a avaliação mais rigorosa, válida para situações de
alteração da secção transversal (Figura 36a), das condições de continuidade estrutural
(Figura 36b) ou ambas.

29/41
Secção Inicial
p
Estrutura Inicial

Secção final p
Estrutura Final
a)
b)

Figura 36 – Alteração da secção estrutural (a) e das condições do sistema continuidade estrutural (b)

Assim, o sistema estrutural evolui sendo composto no início por uma viga pré-esforçada pré-
moldada (elemento primário), colocada em obra de forma simplesmente apoiada, a qual
constitui o sistema estrutural a tempo zero (figura 37).

Elemento primário p

secção 1

Figura 37– Sistema Estrutural inicial (instante t0)

Entre a aplicação do carregamento e a betonagem do elemento complementar o elemento


primário é sujeito ao efeito da fluência ϕ1,0 = ϕ1 (t1 , t0).

A colocação do betão complementar conduz a que, após realizada a presa deste elemento,
a secção transversal do sistema estrutural evolutivo seja alterada, passando o elemento
primário e complementar a trabalhar em conjunto.

Também as condições de apoio do sistema estrutural podem, nesta fase, ir sendo alteradas
quer por sistemas de ligação das vigas (ver figura 8), quer pela betonagem de elementos
complementares sobre os apoios que restrinjam a liberdade de rotação destes.

O sistema estrutural 1 pode ser diferente para cada acção sendo definido como aquele
existente a quando da aplicação dessa mesma carga. Por exemplo na fase de colocação de
pré-lajes sobre as vigas pré-fabricadas o sistema 1 é coincidente com o sistema estrutural
inicial (figura 37).

Ao sistema estrutural que caracteriza a estrutura após presa de todo o betão do tabuleiro
designa-se por sistema estrutural 2 e é esquematicamente apresentado na Figura 38.

30/41
Elemento
complementar

Elemento primário p

secção 2

Figura 38 – Sistema Estrutural 2

O carregamento aplicado em t0 mantém-se constante, sendo a estrutura sujeita ao efeito de


fluência remanescente ∆ϕ1 = ϕ1 (∞ , t0) - ϕ1 (t1 , t0), referente à viga pré-fabricada.

Pelo princípio da sobreposição de efeitos, a análise das várias acções pode ser efectuada
de forma independente sendo os seus resultados adicionados para obtenção do resultado
final.

Dado o elemento primário ser de uma forma genérica pré-esforçado, os efeitos desse pré-
esforço terão de ser tidos em conta ao longo de toda a vida do sistema estrutural evolutivo,
devendo ser considerados nos sistemas estruturais 1 e 2.

Os efeitos resultantes da perda diferida de pré-esforço, após presa do elemento


complementar, não precisam de ser tidos em conta nesta formulação dado os mesmos
produzirem efeito apenas no sistema estrutural 2 podendo desse modo ser analisados num
sistema estrutural não evolutivo.

Esta formulação desenvolvida num trabalho de investigação mostrou que, com a


quantificação correcta dos diferentes termos, o cálculo simplificado proposto é tão correcto
como um procedimento global faseado que é muito complexo. Assim é possível obter a
resposta estrutural a tempo infinito recorrendo às expressões do tipo das referidas
anteriormente mas mais generalizadas e correctas para esforços, tensões, curvaturas e
deformações, tais que:

∆ϕ1
M∞,j = Mj,1 +
[1+(χϕ)1]ef (M j,2 - Mj,1 )
∆ϕ1
σ∞,j = σ1,j +
[1+(χϕ)1]ef (σ2,j - σ1,j )
 1  = (1 + ϕ )  1  + ∆ϕ  1 
R∞ 1,0
R1 j1
R2

δ∞ = (1 + ϕ1,0) δ1 + ∆ϕ1 δ2

31/41
Refira-se que o índice j, corresponde a cada acção devendo os seus efeitos ser calculadas
nos sistemas 1 e 2, depois ponderadas pelas expressões indicadas e finalmente somados.

Nas expressões anteriores, ∆φ1 representa a parcela de fluência que se manifesta no


elemento primário após alteração do sistema estrutural e [1+(χϕ)1]ef tem em conta o
facto da distribuição de esforços e tensões ocorrer de forma progressiva ao longo do
tempo, sendo dado pela expressão seguinte, onde E1,t1 representa o módulo de elasticidade
do elemento primário no instante, t1, da alteração estrutural e ϕ1 (∞, t1) o coeficiente de
fluência para tensões aplicadas nesse instante.

E1,t0
[1+(χϕ)1]ef = [1+χ1(∞, t1) . ϕ1(∞, t1)] . E
1,t1

5. Estudo Analítico
A metodologia desenvolvida foi aplicada a um caso de uma ponte já projectada e executada
e representada em alçado e corte na figura 7.

O processo e faseamento construtivo adoptado está representado na figura 39 onde é de


realçar que após a ligação pré-esforçada local das vigas pré-fabricadas, indicada na figura
8, foi executada uma faixa do tabuleiro para cada lados dos apoios.

Sistema estrutural longitudinal Secção no vão Secção no apoio

Fase 1: Colocação das vigas pré-fabricadas de forma simplesmente apoiada


e fase 2: Betonagem das carlingas e tensionamento das barras de continuidade

Fase 3: Betonagem da laje numa faixa de 6.00 m para cada lado dos apoios

Fase 4: Betonagem da restante laje

Fase 5: Colocação do betuminoso e restantes cargas permanentes

Figura 39 – Faseamento construtivo

32/41
Como é conhecido a dispensa dos cordões de pré-esforço por pré-tensão pode ser regulado
pela introdução de baínhas de PVC com comprimentos maiores ou menores a partir das
extremidades (ver figura 40)
yi

Figura 40 – Posicionamento dos cordões de pré-tensão

Na figura 41 representam-se a soma das tensões calculadas nos sistemas 1 e 2 para todas
as acções que actuam antes de finalizada a estrutura, relembrando-se que o sistema
estrutural 1 pode ser diferente para cada acção. Assim, neste caso na fase de construção de
parte do tabuleiro sobre os apoios a estrutura inicial é a das vigas isoladas contínuas ao
passo que para o peso próprio das vigas e do pré-esforço é um modelo simplesmente
apoiado.

É de notar naquela figura que o valor das tensões a tempo infinito se encontra entre a soma
dos efeitos das acções nos sistemas estruturais 1 e no sistema final (sistema 2).

Na figura 42 apresentam-se para as combinações quase permanentes das acções a


envolvente de tensões na fibra inferior das vigas pré-fabricadas sendo de notar um excesso
de compressões nas zonas intermédias dos vãos.

33/41
Tensões Vi (kPa)
(cargas permanentes e pré-esforço inicial)
5000 fctm = 3800

0,00 26,00 61,00 96,00 122,00


0
0,00 20,00 40,00 60,00 80,00 100,00 120,00

-5000
tensão Vi (kPa)

-10000

-15000

-20000
x [m]
Apoios SE1 SE2 tinf fctm

Figura 41 – Tensões em Vi devidas às cargas permanentes e pré-esforço inicial, determinadas nos


sistemas estruturais auxiliares de cálculo e a tempo infinito

Tensões Vi (kPa)

5000 fctm = 3800

0,00 26,00 61,00 96,00 122,00


0
0,00 20,00 40,00 60,00 80,00 100,00 120,00

-5000
tensão Vi (kPa)

-10000

-15000

-20000
x [m]
Apoios t1 - min t1 - max Tinf - min Tinf - max fctm

Figura 42 – Tensões em Vi, obtidas durante a fase de serviço da obra

A envolvente de momentos para as combinações de acções quase permanentes é


apresentada na figura 43, notando-se uma variação significativa entre os instantes t1 e t∞.

34/41
Momentos (kNm)
x [m]
-15000

-10000

-5000

0.00 20.00 40.00 60.00 80.00 100.00 120.00


0
M (kNm)

0.00 26.00 61.00 96.00 122.00

5000

10000

15000

20000

Apoios t1 - min t1 - max tinf - min tinf - max

Figura 43 – Momentos obtidos durante a fase de serviço da obra

Com o objectivo de analisar a influência, por um lado, das características do betão e, por
outro lado, avaliar da possibilidade de optimização do traçado de cabos procedeu-se a duas
análises complementares:

• Betão das vigas com cimento de endurecimento rápido

• Optimização do valor de pré-esforço e do traçado (com mais dispensas de


cordões) (Análise A).

Na figura 44 apresentam-se os andamentos das forças de pré-esforço para os casos base


(endurecimento normal e rápido) e com optimização do traçado (mais dispensas diminuem,
favoravelmente, o valor do momento hiperstático que é positivo).

35/41
Nº de cordões de pré-esforço efectivo

70

60

50

40
N

30

20

10

0,00 26,00 61,00


0
0,0 10,0 20,0 30,0 40,0 50,0 60,0 70,0
x [m]

Apoios Projecto original Análise Base com Endurecimento Rápido Análise A

Figura 44 – Análises Base e A – comparação do traçado de pré-esforço efectivo inferior

No quadro 3 indicam-se as características das soluções adoptadas para os vãos de 26m e


35m sendo notória a economia de pré-esforço conseguida na Análise A. Refira-se que o
P0,eff,med
coeficiente P avalia o maior ou menor comprimento de embainhamentos dos cordões.
0max

Quadro 3 – Análises Base e A – análise do traçado de pré-esforço inferior

P0,eff,med
N
P0max

Projecto original 42 92%


Vão de 26m

Análise Base,
39 92%
endurecimento rápido

Análise A 36 70%

Projecto original 62 91%


Vão de 35m

Análise Base,
58 91%
endurecimento rápido

Análise A 52 67%

A figura 45 representa a comparação das distribuições de tensões obtidas entre a Análise A


e a solução base sendo de realçar que se consegue o mesmo objectivo de dimensionamento
(σ < - 1 MPa) apesar do menor pré-esforço utilizado no caso da Análise A.

36/41
Tensões Vi (kPa)

5000 fctm = 3800

0,00 26,00 61,00 96,00 122,00


0
0,00 20,00 40,00 60,00 80,00 100,00 120,00

-5000
tensão Vi (kPa)

-10000

-15000

-20000
x [m]
Apoios Análise A - min Análise Base (endur. rápido) - min Análise A - max Análise Base (endur. rápido) - max fctm

Figura 45 – Análise A – comparação da envolvente de tensões em Vi com a envolvente obtida no


cenário 2 da análise base (endurecimento rápido)

Na Figura 46 são apresentados os diagramas de tensão na fibra inferior durante a fase de


serviço da obra. À semelhança do verificado para a análise base, observa-se um alívio da
compressão ao longo do tempo, resultante da parcela de momentos hiperstáticos positivos
originada pelo pré-esforço.

Verifica-se que, com uma análise cuidada dos comprimentos de embainhamento, se


consegue melhorar as características de comportamento e, a economia da obra.

Tensões Vi (kPa)

6000

fctm = 3800
4000

2000

0,00 26,00 61,00 96,00 122,00


0
0,00 20,00 40,00 60,00 80,00 100,00 120,00
tensão Vi (kPa)

-2000

-4000

-6000

-8000

-10000
x [m]
Apoios t1 - min t1 - max tinf - min tinf - max fctm

Figura 46 – Análise A - tensões em Vi, obtidas durante a fase de serviço da obra

37/41
5.2 Influência do processo construtivo

Para analisar a influência do processo admitem-se duas variantes ao processo construtivo


(figura 47), a saber:

• Variante C – Todas as pré-lajes colocadas na primeira fase com o sistema


isostático das vigas

• Variante D – Betonagem de toda a laje do tabuleiro antes da continuidade


estrutural.

Sistema estrutural longitudinal Secção no vão Secção no apoio

Fase 1: Colocação das vigas pré-fabricadas de forma simplesmente apoiada

Fase 2: Colocação das pré-lajes

Fase 3: Betonagem das carlingas e tensionamento das barras de continuidade

Fase 4: Betonagem da laje numa faixa de 6.00 m para cada lado dos apoios

Fase 5: Betonagem da restante laje

Fase 6: Colocação do betuminoso e restantes cargas permanentes

Análise C

38/41
Sistema estrutural longitudinal Secção no vão Secção no apoio

Fase 1: Colocação das vigas pré-fabricadas de forma simplesmente apoiada

Fase 2: Betonagem da laje complementar

Fase 3: Colocação do betuminoso e restantes cargas permanentes

Análise D

Figura 47 – Faseamentos construtivos alternativos, C e D

Na figura 48 apresentam-se os diagramas de distribuição das forças de pré-esforço ao longo


das vigas, constatando-se que nas análises C e D o pré-esforço necessário teve que ser
aumentado para garantir o mesmo critério de dimensionamento (σc < - 1 MPa).

Nº de cordões de pré-esforço efectivo

80

70

60

50

40
N

30

20

10

0,00 26,00 61,00


0
0,0 10,0 20,0 30,0 40,0 50,0 60,0 70,0
x [m]

Apoios Projecto original Análise Base com Endurecimento Rápido Análise A Análise C Análise D

Figura 48 – Análises Base, A, C e D – comparação do traçado de pré-esforço efectivo inferior

39/41
A distribuição de tensões obtidos, após o processo de optimização, para os casos de
adopção dos processo de construção C e D são apresentadas, respectivamente, nas figuras
49 e 50. De referir que se asseguram critérios de dimensionamento equivalentes.

Tensões Vi (kPa)

6000

fctm = 3800
4000

2000

0,00 26,00 61,00 96,00 122,00


tensão Vi (kPa)

0
0,00 20,00 40,00 60,00 80,00 100,00 120,00

-2000

-4000

-6000

-8000
x [m]
Apoios t1 - min t1 - max tinf - min tinf - max fctm

Figura 49 – Análise C – tensões em Vi, obtidas durante a fase de serviço da obra

Tensões Vi (kPa)

6000

fctm = 3800
4000

2000

0,00 26,00 61,00 96,00 122,00


tensão Vi (kPa)

0
0,00 20,00 40,00 60,00 80,00 100,00 120,00

-2000

-4000

-6000

-8000
x [m]
Apoios t1 - min t1 - max tinf - min tinf - max fctm

Figura 50 – Análise D – tensões em Vi, obtidas durante a fase de serviço da obra

40/41
Finalmente no quadro 4 apresentam-se o número de cordões necessários para cada solução
e as características do diagrama de dispensas adoptado para os cordões de pré-tensão.

Quadro 4 – Análises Base, A, C e D - análise do traçado de pré-esforço inferior

P0,eff,med
N
P0max

Projecto original 42 92%

Análise A 36 70%
Vão de 26,0m

Análise C 38 69%

Análise D 42 77%

Projecto original 62 91%

Análise A 52 67%
Vão de 35,0m

Análise C 58 67%

Análise D 70 76%

Desta análise constatou-se a maior eficiência do processo construtivo proposto no


projecto inicial, depois da optimização implementada em relação aos embainhamentos dos
cordões (Análise A). Verifica-se assim a importância da avaliação cuidada destes dois
aspectos na qualidade do projecto e economia deste tipo de obras.

Referências:

Eurocode 2: Design of Concrete Structures – Part 1: General Rules and Rules for Buildings;
Comité Européen de Normalisation; prEN 1992-1-1; 2002

José Camara – “Pré-Fabricação de Pontes e Viadutos”, Comunicação sobre Estruturas Pré-


Fabricadas organizado pela Empresa Prefabricados Castelo, 18 de Janeiro 2001

António Hipólito – “Comportamento em Serviço de Viadutos Construídos com Vigas Pré-


Fabricadas”, Dissertação de Mestrado, IST, Maio 2005

Eduardo Cavaco – “Juntas de Construção em Elementos Pré-Fabricados“, Dissertação de


Mestrado, IST, Dezembro 2005

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