=
>
A grandeza
essencial
ES sua obra, Erich Fromm observou que a auto-aliena¢do é prin-
cipalmente fruto do quanto estivermos voltados para o mercado da perso-
nalidade humana, para nos vendermos aos outros.
Ele observa: “Atualmente encontramos pessoas que se comportam
como autématos, que nao conhecem ou compreendem a si mesmas, € a
winica pessoa que conhecem éa pessoa que se espera que ela seja, cujo pa-
lavreado sem sentido substituiu a palavra que comunica, cujo sorriso arti-
ficial substituiu o riso genuino, e cujo sentimento de mondtono desespe-
ro tomou o lugar da verdadeira dor.”
Tracos de personalidade positivos, embora muitas vezes essenciais
para o sucesso, constituem uma grandeza secundaria. Valorizar a perso-
nalidade acima do carater é tentar fazer brotarem as folhas sem que exis-
tam raizes.
Se utilizarmos constantemente técnicas e habilidades de personali-
dade para aperfeicoar nossas interagdes pessoais, poderemos truncar a
base vital do carater. Simplesmente nao podemos colher os frutos onde
nao existem raizes. A vitoria particular precede a vitoria publica. O au-A grandeza essencial 35
tocontrole e a autodisciplina sao as raizes de um bom relacionamento
com 0s outros.
Se utilizarmos estratégias e taticas de influéncia humana para fazer
com que as outras pessoas facam o que quisermos, poderemos ser bem-
sucedidos a curto prazo, mas, ao longo do tempo, nossa duplicidade ¢ fal-
ta de sinceridade gerara desconfianca. Tudo que fizermos sera visto como
atos de manipulacdo. Poderemos ter retorica, estilo e até mesmo uma in-
tencdo “correta”, mas sem a confianca nao alcancaremos a verdadeira
grandeza nem sucesso duradouro. Ter as técnicas como foco principal €
como estudar para passar. Algumas vezes vocé consegue, talvez até consi-
ga boas notas, mas se vocé nao se dedicar realmente, todos os dias, nunca
egard a dominar verdadeiramente as matérias. Seria possivel uma atitu-
de semelhante na fazenda — esquecer de plantar na primavera, folgar
todo 0 verao e correr loucamente no outono para obter uma colheita?
Nao, porque a fazenda é um sistema natural. Vocé se dedica e segue um
determinado processo, colhe o que plantou; nao existem caminhos mais
faceis.
A lei da colheita opera também nos relacionamentos humanos de lon-
go prazo. Em um sistema social ou académico, vocé podera se dar bem se
aprender “as regras do jogo”, podera causar boas primeiras impressées
através do encanto pessoal; podera vencer pela intimidacao. Mas tragos
de personalidade secundarios apenas nao possuem um valor permanente
nos relacionamentos de longo prazo. Se nao houver uma integridade pro-
funda e forca de carater fundamental, os verdadeiros motivos um belo dia
virdo a tona e os relacionamentos humanos fracassarao.
Muitas pessoas possuem grandeza secundaria, isto é, status social,
posicao, fama, riqueza ou talento, mas falta-lhes a grandeza elementar ou
retidao de cardter. Esse vazio torna-se evidente nos relacionamentos de
longo prazo, seja com um sécio em negécios, conjuge, amigo ou filho
adolescente. E 0 carater que se comunica com maior eloqiiéncia, como
disse Emmerson uma vez: “Aquilo que vocé ¢ fala tao alto aos meus ouvi-
dos que nem consigo escutar 0 que diz.”
Naturalmente, as pessoas possuem forca de carater mas lhes faltam
habilidades de comunicacao essenciais, e isso indubitavelmente afeta a
qualidade de seus relacionamentos. Mas, em ultima anilise, aquilo que36 LIDERANCA BASEADA EM PRINCIPIOS
somos na verdade se comunica com muito mais eloqiiéncia do que qual-
quer coisa que possamos dizer.
COMO NOS VEMOS
A visdo que temos de nés mesmos afeta nao apenas nossas atitudes e com-
portamentos, mas também nossa visdo dos outros. Na verdade, até que le-
vemos em consideracao a forma como nos vemos e vemos os outros —
nao seremos capazes de compreender como os outros véem e sentem a
respeito de si mesmos e de seu mundo. Sem querer, projetaremos nossas
intencdes sobre seus comportamentos e nos consideraremos objetivos.
Se a visaéo que temos de nds mesmos vier do espelho social, das opi-
nides, percepcGes e paradigmas das pessoas a nossa volta, a visao de nos
mesmos parecer um reflexo num espelho maluco num parque de diver-
ses. Dados especificos estarao desmembrados e¢ fora de propor¢ao:
— Vocé nunca chega na hora.
— Por que sera que vocé nunca arruma as coisas?
— Isto é tao simples, como é que vocé nao consegue entender?
Esses dados freqitentemente sao mais projecdes do que reflexées.
Projetam mais as preocupacoes e fraquezas de carater das pessoas que
emitem o julgamento do que um reflexo preciso do que somos.
Quando a fonte basica da definicdo que uma pessoa da a si mesma é 0
espelho social, ela podera confundir o reflexo no espelho com seu eu real.
Na verdade, podera comecar a acreditar e a aceitar a imagem no espelho,
até mesmo rejeitando outras percepcoes mais positivas de si mesma a nao
ser que mostrem a ela as distorcdes que se acostumou a aceitar.
Periodicamente eu faco uma experiéncia: peco as pessoas que relacio-
nem as formas como so vistas pelos outros e as comparem com sua pré-
pria auto-imagem. Tipicamente, mais da metade fica chocada ao perceber
que, em grande parte, sua auto-imagem se origina no espelho social, uma
imagem que se formou lenta, gradual e imperceptivelmente. A nao ser
que ela mude, esta imagem a prejudicara seriamente a vida toda.
O antidoto para uma auto-imagem envenenada € a afirmacao de seu
valor e potencial por uma outra pessoa. No musical O Homem de La Man-
cha, Don Quixote vagarosamente transforma a auto-imagem da prostitu-