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Superior Tribunal de Justiça

RECURSO ESPECIAL Nº 1.802.171 - SC (2018/0329527-4)

RELATOR :
MINISTRO RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA
RECORRENTE :
FAN INDÚSTRIA E COMÉRCIO DE CONFECÇÕES LTDA. EPP.
RECORRENTE :
FABIANA NUNES JUVÊNCIO DE CARVALHO
RECORRENTE :
ALEXIA JUVÊNCIO DE CARVALHO
RECORRENTE :
MATEUS JUVÊNCIO DE CARVALHO
ADVOGADOS :
RUD GONÇALVES DOS SANTOS E SILVA - SC007307
MURILO ANTUNES PEREIRA E OUTRO(S) - SC032768
RECORRIDO : ALIANÇA FACTORING FOMENTO COMERCIAL LTDA
ADVOGADO : CARLOS ALBERTO DE ASSIS GOES E OUTRO(S) - SC005624
EMENTA
RECURSO ESPECIAL. PROCESSO CIVIL. TUTELA PROVISÓRIA. TUTELA
CAUTELAR ANTECEDENTE. DEFERIMENTO. CITAÇÃO. CONTESTAÇÃO.
TEORIA DA CIÊNCIA INEQUÍVOCA. INAPLICABILIDADE. PEDIDO PRINCIPAL.
ADITAMENTO. AUDIÊNCIA DE CONCILIAÇÃO OU DE MEDIAÇÃO. INTIMAÇÃO.
INEXISTÊNCIA. JULGAMENTO ANTECIPADO DO MÉRITO. NULIDADE.
1. Recurso especial interposto contra acórdão publicado na vigência do Código
de Processo Civil de 2015 (Enunciados Administrativos nºs 2 e 3/STJ).
2. Diante das alterações promovidas pelo Código de Processo Civil de 2015, não
existe mais a figura do processo cautelar autônomo. Agora, tanto a tutela cautelar
quanto a tutela principal são requeridas e desenvolvidas numa mesma relação
processual.
3. Deferida tutela cautelar antecedente cujo pedido foi contestado, apesar de
desnecessária nova citação, é indispensável que passe a ser observado o
procedimento comum. Devem as partes ser intimadas para a audiência e, uma
vez não alcançada a autocomposição, tem início o prazo de 15 (quinze) dias para
contestação do pedido principal, contado na forma do art. 335. Inaplicabilidade da
teoria da ciência inequívoca na hipótese.
4. No caso, deve ser reconhecida a nulidade do feito, a partir da sentença, pois a
tutela de urgência deferida na forma antecedente (arresto) foi sucedida pela
própria condenação ao pagamento de quantia certa, em julgamento antecipado,
porém sem que tenha havido manifestação dos recorrentes sobre o mérito do
pedido principal, em contrariedade ao disposto no parágrafo único do art. 307 do
CPC/2015.
5. Recurso especial provido.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas, decide a
Terceira Turma, por unanimidade, dar provimento ao recurso especial, nos termos do voto do
Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Marco Aurélio Bellizze, Moura Ribeiro (Presidente), Nancy
Andrighi e Paulo de Tarso Sanseverino votaram com o Sr. Ministro Relator.
Brasília (DF), 21 de maio de 2019(Data do Julgamento)

Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA


Relator

Documento: 1828968 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 29/05/2019 Página 1 de 4
Superior Tribunal de Justiça
RECURSO ESPECIAL Nº 1.802.171 - SC (2018/0329527-4)
RELATOR : MINISTRO RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA
RECORRENTE : FAN INDÚSTRIA E COMÉRCIO DE CONFECÇÕES LTDA. EPP.
RECORRENTE : FABIANA NUNES JUVÊNCIO DE CARVALHO
RECORRENTE : ALEXIA JUVÊNCIO DE CARVALHO
RECORRENTE : MATEUS JUVÊNCIO DE CARVALHO
ADVOGADOS : RUD GONÇALVES DOS SANTOS E SILVA - SC007307
MURILO ANTUNES PEREIRA E OUTRO(S) - SC032768
RECORRIDO : ALIANÇA FACTORING FOMENTO COMERCIAL LTDA
ADVOGADO : CARLOS ALBERTO DE ASSIS GOES E OUTRO(S) - SC005624

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA (Relator):

Trata-se de recurso especial interposto por FAN INDÚSTRIA E COMÉRCIO DE


CONFECÇÕES LTDA. EPP e OUTROS, fundamentado no art. 105, inciso III, alínea "a", da
Constituição Federal, contra acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina assim
ementado:

" APELAÇÃO CÍVEL. TUTELA CAUTELAR REQUERIDA EM CARÁTER


ANTECEDENTE. CONTRATO DE FOMENTO MERCANTIL FIRMADO ENTRE AS
PARTES. DUPLICATAS MERCANTIS ACOMPANHADAS DAS NOTAS FISCAIS E
DOS COMPROVANTES DE ENTREGA DAS MERCADORIAS. ALEGAÇÃO DE
QUE OS DOCUMENTOS FORAM FALSIFICADOS, TENDO SIDO EMITIDOS
TÍTULOS SEM ORIGEM. PEDIDO DE ARRESTO DE 50% (CINQUENTA POR
CENTO) DOS IMÓVEIS DESCRITOS NA PETIÇÃO INICIAL. ARRESTO
DEFERIDO E EFETIVADO. ADITAMENTO DA INICIAL PARA FORMULAR O
PEDIDO PRINCIPAL DE RESSARCIMENTO DO DANO CAUSADO EM VIRTUDE
DA EMISSÃO DE DUPLICATAS MERCANTIS SEM ORIGEM. REQUERIDOS QUE
APRESENTARAM CONTESTAÇÃO AO PEDIDO CAUTELAR APÓS O
ADITAMENTO DA PETIÇÃO INICIAL, TENDO CIÊNCIA INEQUÍVOCA DOS ATOS
PROCESSUAIS ATÉ ALI PRATICADOS. NULIDADE DA SENTENÇA QUE É
AFASTADA. AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO AO ARTIGO 308, §§ 3° e 4°, DO
CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015. JULGAMENTO ANTECIPADO DA
LIDE. CERCEAMENTO DE DEFESA INEXISTENTE. MATÉRIA DEBATIDA QUE
NÃO RECLAMA A PRODUÇÃO DE OUTRAS PROVAS. DUPLICATAS
MERCANTIS QUE VIERAM ACOMPANHADAS DAS NOTAS FISCAIS E DOS
COMPROVANTES DE ENTREGA DAS MERCADORIAS.
RELAÇÃO NEGOCIAL BEM EVIDENCIADA. DOCUMENTOS QUE SE MOSTRAM
SUFICIENTES PARA INSTRUIR O PEDIDO INICIAL. ALEGAÇÃO DE QUE
HOUVE A COBRANÇA DE JUROS EXTORSIVOS. ARGUMENTO DESTITUÍDO
DE CREDIBILIDADE E DE UM MÍNIMO DE PROVA. ALEGAÇÃO DE
PAGAMENTO PARCIAL DA DÍVIDA. PROVA DA QUITAÇÃO INEXISTENTE.
ÔNUS PROBATÓRIO. ARTIGO 373, INCISO II, DO CÓDIGO DE PROCESSO
CIVIL DE 2015. AUSÊNCIA DE QUALQUER ELEMENTO APTO A
DESCONSTITUIR OS TÍTULOS FORMALMENTE PERFEITOS. MANUTENÇÃO
DA TUTELA DE URGÊNCIA DE CARÁTER ANTECEDENTE. REQUISITOS
PREVISTOS NO ARTIGO 300 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015 QUE
FORAM DEMONSTRADOS. ÔNUS DA SUCUMBÊNCIA QUE NÃO SOFRE
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ALTERAÇÃO. MAJORAÇÃO DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS EM RAZÃO
DO TRABALHO REALIZADO EM GRAU DE RECURSO PELO ADVOGADO DA
APELADA. ARTIGO 85, § 11, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015.
RECURSO DESPROVIDO" (fls. 457-458 e-STJ).

Nas razões recursais, os recorrentes alegam violação dos arts. 307, parágrafo
único, 308, § 4º, e 335 do Código de Processo Civil de 2015.
Sustentam, em síntese, que, em se tratando de tutela cautelar requerida em
caráter antecedente, o processo acaba dividido em duas etapas. Desse modo, afirmam que
houve cerceamento de defesa por julgamento antecipado da lide, especialmente em relação à
necessidade de concessão do prazo de 15 (quinze) dias para a apresentação de contestação
ao pedido principal, prevista no art. 308, § 4º, do CPC/2015, o que não ocorreu no presente
caso.
Asseveram, ainda, que
"(...) igualmente inobservada a disposição do artigo 307, parágrafo
único, que prevê seja adotado o procedimento comum após contestação ao
pedido cautelar, não deixando dúvidas acerca da divisão do processo em duas
etapas.
3.32. Ou seja, ainda que se entendesse pela ausência de
necessidade de designação de audiência de conciliação, imprescindível seria a
concessão do prazo de 15 dias para apresentação de defesa ao pedido principal,
a ser contado na forma do artigo 335, do Código de Processo Civil" (fl. 480
e-STJ).

Com as contrarrazões e inadmitido o recurso na origem, sobreveio agravo em


recurso especial, buscando-se o processamento do apelo nobre.
Os recorrentes postularam tutela provisória (fls. 532-620 e-STJ), a qual foi
deferida para conferir efeito suspensivo ao recurso especial, suspendendo-se o processamento
das ações/cumprimento de sentença propostas pela parte recorrida, até o final julgamento
deste recurso (fls. 623-630 e-STJ). Na oportunidade foi determinada a conversão do agravo em
recurso especial para melhor exame da matéria controvertida pelo colegiado da Terceira Turma.
O Ministério Público Federal opinou pelo conhecimento e provimento do recurso
especial (parecer de fls. 639-645 e-STJ).
É o relatório.

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EMENTA

RECURSO ESPECIAL. PROCESSO CIVIL. TUTELA PROVISÓRIA. TUTELA


CAUTELAR ANTECEDENTE. DEFERIMENTO. CITAÇÃO. CONTESTAÇÃO.
TEORIA DA CIÊNCIA INEQUÍVOCA. INAPLICABILIDADE. PEDIDO PRINCIPAL.
ADITAMENTO. AUDIÊNCIA DE CONCILIAÇÃO OU DE MEDIAÇÃO. INTIMAÇÃO.
INEXISTÊNCIA. JULGAMENTO ANTECIPADO DO MÉRITO. NULIDADE.
1. Recurso especial interposto contra acórdão publicado na vigência do Código
de Processo Civil de 2015 (Enunciados Administrativos nºs 2 e 3/STJ).
2. Diante das alterações promovidas pelo Código de Processo Civil de 2015, não
existe mais a figura do processo cautelar autônomo. Agora, tanto a tutela cautelar
quanto a tutela principal são requeridas e desenvolvidas numa mesma relação
processual.
3. Deferida tutela cautelar antecedente cujo pedido foi contestado, apesar de
desnecessária nova citação, é indispensável que passe a ser observado o
procedimento comum. Devem as partes ser intimadas para a audiência e, uma
vez não alcançada a autocomposição, tem início o prazo de 15 (quinze) dias para
contestação do pedido principal, contado na forma do art. 335. Inaplicabilidade da
teoria da ciência inequívoca na hipótese.
4. No caso, deve ser reconhecida a nulidade do feito, a partir da sentença, pois a
tutela de urgência deferida na forma antecedente (arresto) foi sucedida pela
própria condenação ao pagamento de quantia certa, em julgamento antecipado,
porém sem que tenha havido manifestação dos recorrentes sobre o mérito do
pedido principal, em contrariedade ao disposto no parágrafo único do art. 307 do
CPC/2015.
5. Recurso especial provido.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA (Relator):

O acórdão impugnado pelo recurso especial foi publicado na vigência do Código


de Processo Civil de 2015 (Enunciados Administrativos nºs 2 e 3/STJ).

A irresignação merece prosperar.

1. Do contexto recursal

Os recorrentes sustentam, em síntese, que, em se tratando de tutela cautelar

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requerida em caráter antecedente, o processo acaba dividido em duas etapas, de modo que
teria havido cerceamento de defesa por julgamento antecipado da lide, especialmente em
relação à falta de concessão do prazo de 15 (quinze) dias para contestação do pedido principal,
prevista no art. 308, § 4º, do CPC/2015.

O Tribunal de origem negou provimento à apelação, adotando os seguintes


fundamentos:

"(...) A tutela cautelar de natureza antecedente foi deferida (fls.


257/259) e efetivada (fls. 261/263 e 327/340). Na sequência, a apelada formulou
o aditamento da inicial para pleitear o ressarcimento do valor atualizado de
R$819.335,86 (oitocentos e dezenove mil, trezentos e trinta e cinco reais e
oitenta e seis centavos), em razão dos danos causados com a emissão das
duplicatas mercantis sem origem (fls. 311/320). Os apelantes ofereceram
contestação (fls. 365/376) e, após a impugnação (fls. 378/381), o digno
magistrado Manoel Donisete de Souza proferiu sentença, o que fez para julgar
procedente o pedido inicial, nos termos do artigo 487, inciso I, do Código de
Processo Civil de 2015, condenando os apelantes ao pagamento do valor de
R$819.335,86 (oitocentos e dezenove mil, trezentos e trinta e cinco reais e
oitenta e seis centavos), acrescido dos encargos contratuais referentes à mora,
bem ainda das custas processuais e dos honorários advocatícios, que foram
arbitrados em 15% (quinze por cento) sobre o valor da condenação (fls. 386/387).
Nas razões do recurso, os apelantes sustentam a nulidade da
sentença, até porque não teria sido oportunizada a apresentação de contestação
do pedido principal, nos termos do artigo 308, § 4°, do Código de Processo Civil
de 2015.
Contudo, verifica-se que o aditamento da petição inicial
ocorreu na data de 20.10.2016 (fls. 311/320), quando ainda não havia sido
efetivada a citação dos apelantes (fls. 323/326 e 346/347). A empresa
apelante e a sua representante legal Fabiane Nunes Juvencio de Carvalho
foram citados na data de 16.12.2016 (fls. 355 e 358), tendo os apelantes
oferecido contestação na data de 23.12.2016 (fls. 365/376). Lembre-se que,
'tendo havido a citação no requerimento cautelar, não há necessidade de se
proceder a nova citação quando da apresentação do pedido principal' (NERY
JÚNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Comentários ao código de
processo civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015, p. 868).
Portanto, em se tratando de processo eletrônico, é certo que os
apelantes tiveram ciência inequívoca dos atos processuais até ali praticados,
não havendo qualquer prejuízo ao contraditório e à ampla defesa. Ademais, a
realização da audiência de conciliação fica submetida ao prudente arbítrio
do juiz, que a designará se julgar conveniente à solução do conflito,
inexistindo violação ao artigo 308, §§ 3° e 4°, do Código de Processo Civil de
2015.
O julgamento antecipado do feito, percebe-se, não cerceou o
direito de defesa dos apelantes, sendo suficientes os documentos apresentados
para o exame do pedido inicial, que dependia apenas de um pronunciamento de
direito.
Então, a providência eleita pelo magistrado era mesmo necessária
e indispensável, consoante o disposto no artigo 355, inciso I, do Código de
Processo Civil de 2015.
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O julgador, ademais, tem o poder discricionário de valorar a prova e
dizer da necessidade dela para a formação do seu convencimento motivado, nos
termos dos artigos 370 e 371 do Código de Processo Civil de 2015.
[...]
Ultimando, registra-se que a tutela cautelar de natureza
antecedente foi deferida (fls. 257/259) e, depois, confirmada na sentença (fl.
387).
Sabe-se que a concessão da tutela de urgência em caráter
antecedente reclama a demonstração da presença dos requisitos bem
especificados no artigo 300 do Código de Processo Civil de 2015, sem o que se
deve aguardar o desfecho normal de todo e qualquer procedimento judicial.
Trata-se de medida que se reveste de caráter excepcional e que exige prudência
em sua análise, atendendo ao comando inserto no artigo 5°, inciso LIV, da
Constituição Federal, que cuida do devido processo legal, imperativo da ordem
jurídica vigente.
Além da presença dos 'elementos que evidenciam a probabilidade
do direito' invocado pela parte, a concessão da tutela de urgência em caráter
antecedente exige a demonstração do 'perigo de dano' ou do 'risco ao resultado
útil do processo' (artigo 300, 'caput', do Código de Processo Civil de 2015) e da
ausência do 'perigo de irreversibilidade dos efeitos da decisão' (§ 3° do artigo
300 do Código de Processo Civil de 2015).
No caso concreto, o pedido inicial foi julgado procedente para
condenar os apelantes ao pagamento do valor expressivo de R$819.335,86
(oitocentos e dezenove mil, trezentos e trinta e cinco reais e oitenta e seis
centavos), justificando a manutenção da tutela cautelar de arresto de 50%
(cinquenta por cento) dos imóveis descritos na inicial, o que se faz para
salvaguardar o cumprimento da sentença.' (fls. 461-466 e-STJ; grifou-se).

2. Da mudança substancial no procedimento da tutela provisória operada


pelo Código de Processo Civil de 2015: tutelas cautelar e principal desenvolvidas na
mesma relação processual (arts. 294 e ss. do CPC/2015). Da inaplicabilidade da teoria
da ciência inequívoca ao caso dos autos

Inicialmente, cabe destacar que o procedimento da tutela provisória foi


substancialmente alterado pelo Código de Processo Civil de 2015, especialmente pelo disposto
nos arts. 294 e ss. do CPC/2015. Deixou de existir a figura do processo cautelar autônomo.
Agora, tanto a tutela cautelar quanto a tutela principal são requeridas e desenvolvidas numa
mesma relação processual.

Por conseguinte, no caso específico dos autos, não tem aplicação a teoria da
ciência inequívoca. Isso porque, na hipótese em exame: (i) a citação dos recorrentes foi
determinada especificamente para contestar o pedido de tutela antecedente (fls. 280-283,
350-360 e-STJ), visto que a própria decisão que deferiu o pleito cautelar (fl. 258 e-STJ), em
23/9/2016, estipula o prazo 5 (cinco) dias para contestação, previsto no art. 306 do CPC/2015,

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o qual se refere inequivocamente ao pedido cautelar, até porque inferior ao prazo quinzenal de
contestação do pedido principal, disposto no art. 335 do CPC/2015; (ii) os respectivos
mandados citatórios foram expedidos em 29/9/2016, antes mesmo da apresentação/aditamento
do pedido principal, ocorrida em 20/10/2016 (fls. 311-320 e-STJ); (iii) a contestação
apresentada, atendendo ao mandado citatório de prazo de resposta reduzido ao quinquídio,
tratou apenas do pedido cautelar (fls. 365-368 e-STJ); (iv) houve impugnação à contestação,
na qual a parte recorrida expressamente requereu a intimação dos réus, na pessoa de seu
advogado, para apresentar defesa à emenda à inicial (fls. 378-381 e-STJ); (v) ato contínuo, foi
proferida sentença de mérito, em julgamento antecipado, sem observância do procedimento
comum, sem intimação dos demandados para responder ao pedido principal e sem designação
de audiência de conciliação ou de mediação.

No entanto, deferida tutela cautelar antecedente cujo pedido foi contestado,


apesar de desnecessária nova citação, é indispensável que passe a ser observado o
procedimento comum (art. 307, parágrafo único, do CPC/2015). Devem as partes, portanto,
ser intimadas para a audiência do art. 334 (conforme previsão do art. 308, § 4º, do CPC/2015)
e, uma vez não alcançada a autocomposição (seja porque frustradas as tentativas de
conciliação ou de mediação ou porque o réu tenha peticionado pelo cancelamento da
audiência), tem início o prazo de 15 (quinze) dias para contestação do pedido principal, contado
na forma do art. 335 (e não cinco dias como constou dos mandados de citação destes autos).

3. Da nulidade do processo diante do julgamento antecipado do mérito


sem intimação da parte demandada para manifestar-se sobre o pedido principal. Da
ausência de intimação para audiência de conciliação ou de mediação

Na leitura dos trechos do acórdão recorrido supramencionados, percebe-se que o


aditamento à inicial a que se refere o acórdão recorrido tratou-se, na realidade, da
apresentação do pedido principal, disposto no art. 308, caput, do CPC/2015, e a
contestação também aludida naquele julgado disse respeito tão somente à tutela cautelar
antecedente (arresto), concedida pelo magistrado de primeiro grau no exercício de um juízo
de convicção de probabilidade, próprio das tutelas provisórias, e que não se confunde com o
juízo exauriente e de certeza típico das decisões de mérito.

Assim, apesar de correta a constatação do acórdão recorrido acerca da


desnecessidade de nova citação (conf. art. 308, § 3º, parte final, do CPC/2015), isso não

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significa que esteja dispensada a abertura de novo prazo para a contestação do pedido
principal, consoante se infere a partir da leitura dos arts. 307, parágrafo único, e 308, § 4º, do
CPC/2015, segundo os quais:

"Art. 307. Não sendo contestado o pedido, os fatos alegados pelo


autor presumir-se-ão aceitos pelo réu como ocorridos, caso em que o juiz decidirá
dentro de 5 (cinco) dias.
Parágrafo único. Contestado o pedido no prazo legal,
observar-se-á o procedimento comum.
Art. 308. Efetivada a tutela cautelar, o pedido principal terá de
ser formulado pelo autor no prazo de 30 (trinta) dias, caso em que será
apresentado nos mesmos autos em que deduzido o pedido de tutela cautelar,
não dependendo do adiantamento de novas custas processuais.
(...)
§ 4º Não havendo autocomposição, o prazo para contestação
será contado na forma do art. 335" (grifou-se).

A propósito, colhem-se da doutrina comentários a esse último dispositivo:

"4. Procedimento após o ajuizamento da ação principal


Depois do ajuizamento da ação principal no processo
instaurado pela ação cautelar, as partes devem ser intimadas para a
audiência de conciliação ou de mediação (art. 334, CPC), pessoalmente ou
na pessoa dos seus advogados. Não ocorrendo autocomposição, o prazo para
contestar deve ser contado na forma do art. 335 do Código de Processo Civil.
Lembre-se, contudo, que quando a ação principal é proposta –
em virtude de a tutela ter sido concedida inaudita altera parte e efetivada –
antes do julgamento do pedido cautelar, passa a existir um único
procedimento para regular a preparação dos juízos sobre os pedidos de tutela
cautelar e de tutela principal." (in MARINONI, Luiz Guilherme. ARENHART,
Sérgio. Comentários ao Código de Processo Civil [livro eletrônico]. v. IV (artigos
294 ao 333). 1. ed. em ebook baseada na 1. edição impressa. São Paulo: Editora
Revista dos Tribunais, 2015, não paginado - grifou-se).

"O pedido de tutela satisfativa será apresentado nos mesmos


autos em que deduzido o pedido de tutela cautelar, não dependendo do
adiantamento de novas custas processuais (art. 308). Refere o legislador que a
causa de pedir poderá ser aditada no momento da formulação do pedido principal
(art. 308, § 2.º). É preciso perceber, porém, que rigorosamente a parte tem o
ônus de aditar a causa de pedir, na medida em que as razões que autorizam a
concessão da tutela cautelar como regra não autorizam igualmente a concessão
da tutela satisfativa. A lide cautelar não se confunde com a lide satisfativa.
Apresentado o pedido principal, as partes serão intimadas para a audiência
de conciliação ou de mediação (art. 334), por seus advogados ou
pessoalmente, sem necessidade de nova citação do réu. Não havendo
autocomposição, fluirá o prazo para contestação (art. 335)." (in ALVIM,
Teresa Arruda Alvim et al - Coordenadores. Breves comentários ao novo Código
de Processo Civil. Parte geral. Livro V, Título II, Capítulo III. 2. ed. em ebook
baseada na 2. edição impressa. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2016,
não paginado - grifou-se).
Documento: 1828968 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 29/05/2019 Página 8 de 4
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Em descompasso com essas balizas, logo após a apresentação da contestação


do pedido de tutela cautelar, o juiz de primeiro grau proferiu sentença de mérito (fls. 386-387
e-STJ), condenando os ora recorrentes a pagar quantia certa, olvidando-se, contudo, de deferir
prazo para que eles pudessem contestar o pedido principal, tal qual adequadamente requerido
na manifestação da ora recorrida sobre a contestação do pedido cautelar.

Nesse contexto, a tutela de urgência antecedente deferida (arresto) foi


sucedida pela própria condenação ao pagamento de quantia certa, em julgamento
antecipado, porém sem que tenha havido manifestação dos recorrentes sobre o
mérito do pedido principal, apesar de haver manifestação específica da parte
requerida nesse sentido (fl. 381 e-STJ) e em contrariedade ao disposto no parágrafo
único do art. 307 do CPC/2015, que determina a observância do procedimento comum,
após a contestação do pedido de cautelar antecedente.

4. Do dispositivo

Ante o exposto, dou provimento ao recurso especial para declarar a nulidade dos
atos processuais posteriores à impugnação à contestação (fls. 378-381 e-STJ), momento em
que deveria ter sido designada a audiência prevista no art. 308, § 3º, do CPC/2015.

É o voto.

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CERTIDÃO DE JULGAMENTO
TERCEIRA TURMA

Número Registro: 2018/0329527-4 PROCESSO ELETRÔNICO REsp 1.802.171 / SC

Números Origem: 03094148420168240020 0309414842016824002050001 3094148420168240020


309414842016824002050001

PAUTA: 21/05/2019 JULGADO: 21/05/2019

Relator
Exmo. Sr. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA
Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro MOURA RIBEIRO
Subprocurador-Geral da República
Exmo. Sr. Dr. DURVAL TADEU GUIMARÃES
Secretário
Bel. WALFLAN TAVARES DE ARAUJO

AUTUAÇÃO
RECORRENTE : FAN INDÚSTRIA E COMÉRCIO DE CONFECÇÕES LTDA. EPP.
RECORRENTE : FABIANA NUNES JUVÊNCIO DE CARVALHO
RECORRENTE : ALEXIA JUVÊNCIO DE CARVALHO
RECORRENTE : MATEUS JUVÊNCIO DE CARVALHO
ADVOGADOS : RUD GONÇALVES DOS SANTOS E SILVA - SC007307
MURILO ANTUNES PEREIRA E OUTRO(S) - SC032768
RECORRIDO : ALIANÇA FACTORING FOMENTO COMERCIAL LTDA
ADVOGADO : CARLOS ALBERTO DE ASSIS GOES E OUTRO(S) - SC005624

ASSUNTO: DIREITO CIVIL - Obrigações - Espécies de Títulos de Crédito - Duplicata

SUSTENTAÇÃO ORAL
Dr(a). PAULO HENRIQUE DE ASSIS GOES, pela parte RECORRIDA: ALIANÇA FACTORING
FOMENTO COMERCIAL LTDA

CERTIDÃO
Certifico que a egrégia TERCEIRA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na
sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A Terceira Turma, por unanimidade, deu provimento ao recurso especial, nos termos do
voto do Sr. Ministro Relator.
Os Srs. Ministros Marco Aurélio Bellizze, Moura Ribeiro (Presidente), Nancy Andrighi e
Paulo de Tarso Sanseverino votaram com o Sr. Ministro Relator.

Documento: 1828968 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 29/05/2019 Página 10 de 4

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