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Departamento de História
Recife
2015
ALEXSANDRO ANDRÉ PEREIRA DE LIMA
Recife
2015
ALEXSANDRO ANDRÉ PEREIRA DE LIMA
_______________________________________________________
Professora Orientadora
____________________________________________________
Professor (a) Examinador (a)
______________________________________________________
Professor (a) Examinador (a)
Recife
2015
A Deus, por suprir todas as minhas
necessidades. Sou grato a Ele por tudo.
A minha orientadora Profª. Drª. Ana Maria Barros dos Santos, pelo constante apoio,
pela grande paciência, pela confiança, pela amizade, pelo constante incentivo, por
contribuir de forma valorosa em minha formação acadêmica, para mim é uma honra.
A minha mãe, Estelita, que tanto lutou para eu tivesse uma boa base educacional, a
ela, que me ensinou a escrever as primeiras letras, a ela, que me ensinou a ser uma
pessoa de bem. Aos meus demais familiares, que se orgulharam de mim, por este
momento que vivo.
A minha sogra, Iracema, e a minha cunhada, Edineia, por acreditarem que eu era
capaz de chegar até aqui.
INTRODUÇÃO...........................................................................................................12
1.Anos de Chumbo...................................................................................................19
CONSIDERAÇÕES FINAIS.......................................................................................60
REFERÊNCIAS..........................................................................................................63
ANEXOS....................................................................................................................66
12
INTRODUÇÃO
1
A CNV foi instituída mediante a Lei Federal 12.528/2011, sancionada pela presidente Dilma Rousseff em 18
de novembro de 2011. Enquanto realizávamos as atividades pertinentes ao desenvolvimento deste trabalho, o
relatório final da Comissão Nacional da Verdade foi entregue à presidente Dilma Rousseff no dia 10 de
dezembro de 2014, no entanto, resolvemos manter o texto original do trabalho não incluindo as novas
informações advindas do resultado final do relatório elaborado pela CNV. Nosso objetivo foi evitar a ocorrência
de um longo discurso sobre a CNV e seu relatório final que não são o objeto de estudo da pesquisa apresentada
aqui neste trabalho, a CNV foi apenas mencionada como forma de introduzir a atualidade do tema proposto por
este trabalho. O relatório final da CNV está disponível em <http:// http://www.cnv.gov.br/>.
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2
“Opinião foi um semanário que circulou entre 23 de outubro de 1972 e 8 de abril de 1977. Chegou a atingir a
tiragem de 38 mil exemplares semanais em seu primeiro ano, aproximando-se à tiragem da revista Veja, tamanha
sua repercussão no cenário nacional. Destacou-se, ao lado dos jornais O Pasquim e Movimento, como um jornal
ligado à imprensa alternativa concentrando-se na veiculação de artigos escritos por jornalistas e intelectuais de
oposição ao Regime Militar. Opinião resistiu a quatro anos e meio de pressões: 221 edições foram feitas sob
censura prévia. Contam os envolvidos que em alguns casos, mais da metade do jornal era censurada, obrigando-
os a escreverem sempre mais matérias do que o necessário. Em sua penúltima edição, o jornal anunciava que o
próximo número só seria lançado se estivesse livre de censura. Desta forma, a edição 231 foi lançada sem ter
sido submetida à avaliação prévia pela censura federal, em Brasília, como ocorria normalmente. Na sequência,
os exemplares foram apreendidos nas bancas, e o jornal encerrou suas atividades.” (Texto adaptado. Original em
https://pt.wikipedia.org/wiki/Opinião_(jornal), acesso em 09/08/2015.)
16
3
Propomos que fazer imprensa seria a forma de gestão das redações dos jornais, a maneira de organização do
conteúdo deles, a relação entre os colaboradores, a linguagem jornalística, entre outras questões.
4
Sobre isso Buzalaf também expõe que “além de conseguir sobreviver muito mais do que qualquer periódico da
imprensa alternativa, e de ter ido além do seu ambiente de origem, o Pasquim mudou alguns preceitos de
produção jornalística. Ignorou as técnicas tradicionais, tirou o formalismo do texto jornalístico utilizando o
humor como linha editorial. E não poderia ser diferente, já que grande parte dos jornalistas que se juntaram para
produzir o semanário já vinha de experiências com o jornalismo humorístico” (BUZALAF, 2009, p. 16).
5
Em nota de rodapé exposta em sua dissertação, a autora expõe que “as primeiras aparições dos tropicalistas
Caetano Veloso e Gilberto Gil com a inserção de instrumentos elétricos e uma linguagem musical que mesclava
ousadia e inovação, foram tratadas como antinacionalistas e descoladas da realidade social, daí o próprio termo
‘desbunde’ [grifo do autora], que, segundo parte da mídia, retratava um deboche cru, sem intenções políticas”
(OLIVEIRA, Natali. 2007, p. 73)
17
nosso estudo. Dessa pesquisa, nos utilizamos de artigos e imagens trazidas pelo
Jornal na construção da nossa análise.
Neste trabalho, em seu primeiro capítulo, detivemo-nos em fazer um
panorama do período ditatorial no Brasil, que teve como característica o
autoritarismo do Estado e a Censura imposta aos órgãos de Imprensa, incluindo aí,
o surgimento da Imprensa Alternativa. No segundo capítulo, fizemos um breve
histórico de O Pasquim, órgão da Imprensa Alternativa, procurando identificar a linha
e corpo editorial, a sua estrutura; seus cartunistas; os colaboradores, a relação do
jornal com a censura. No terceiro capítulo, fizemos a análise dos temas abordados e
sua forma satírica de apresentação, em artigos, entrevistas, charges e cartuns,
contidos nas seções do jornal – inclusive a seção cartas ao leitor – material deveras
importante para o historiador da nossa história recente.
Com este trabalho, procuramos dar uma contribuição, para um melhor
conhecimento do período autoritário, vivido pela sociedade brasileira, nos anos que
vão de 1964 a 1985. Foi nossa intenção, salientar no mesmo que é possível,
utilizando as armas do humor e da sátira, como fez O Pasquim, registrar os fatos da
história do Brasil.
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1. ANOS DE CHUMBO
6
João Belchior Marques Goulart nasceu em São Borja (RS), no dia 1º. de março de 1919, filho de Vicente
Rodrigues Goulart e de Vicentina Marques Goulart. Desde criança recebeu o apelido de Jango, comum no sul do
país. Formado em direito em 1939, não quis exercer a advocacia, regressando logo a São Borja para dedicar-se a
atividades agropecuárias. Em 1943, com a morte do pai, assumiu definitivamente a responsabilidade de gerir os
negócios da família. [...] Em 5 de julho (1961), a Câmara dos Deputados aprovou o projeto que autorizava a
viagem de Goulart na delegação econômica que seria enviada ao Leste Europeu e ao Oriente. Em Paris, ele se
juntou aos demais integrantes da missão. Em 25 de agosto, chegaram a Cingapura, onde receberam um telegrama
informando sobre a renúncia do presidente Jânio Quadros na manhã daquele dia e solicitando a volta do vice-
presidente ao Brasil. Entretanto, a perspectiva da volta de Goulart abriu uma profunda crise no país, pois os
ministros militares formaram uma junta e, contando com o apoio de importante parcela das forças armadas e de
um grupo de civis visceralmente antigetulistas, vetaram a posse do vice-presidente sob a alegação de que ela
significaria grande ameaça à ordem e às instituições, colocando o país no rumo de uma guerra civil. No dia 29 de
agosto (1961), o Congresso Nacional rejeitou o pedido de impedimento apresentado contra a posse do vice-
presidente e começou a discutir uma solução conciliatória. Em 1º. de setembro Jango desembarcou em Porto
Alegre, sendo recebido com enorme manifestação popular. No dia seguinte, o Congresso aprovou a Emenda
Constitucional que instalou o parlamentarismo, limitando os poderes presidenciais. Nesse mesmo dia Goulart
embarcou para a capital federal, cercado de um rigoroso esquema de segurança. Finalmente, no dia 7 de
setembro de 1961 foi empossado na presidência da República [...] No dia 6 de janeiro de 1963, cerca de
11.500.000 dos 18 milhões de brasileiros aptos a votar compareceram às urnas para decidir sobre o tipo de
regime político que o país deveria adotar. O resultado favoreceu o presidencialismo por larga margem. Investido
dos poderes atribuídos ao presidente pela Constituição de 1946, Goulart nomeou um novo ministério [...] No dia
20 de março (1964) Castelo Branco lançou uma circular reservada aos oficiais do estado-maior e das suas
organizações dependentes, alertando a oficialidade para as ameaças que as recentes medidas de Goulart traziam.
Na madrugada de 31 de março (1964) o general Olímpio Mourão Filho, comandante da 4ª Região Militar,
sediada em Juiz de Fora (MG), iniciou a movimentação de tropas em direção ao Rio de Janeiro. Assim, na noite
do dia 1º de abril (1964) – grifos nossos –, Jango viajou para o Rio Grande do Sul com o objetivo de organizar a
resistência e defender o poder legal. Contudo, em Porto Alegre, decidiu-se por deixar o país, ao reconhecer que
lutar para manter o governo significaria desencadear uma guerra civil. No dia 4 de março de 1964 desembarcou
no Uruguai em busca de asilo político. Estas são algumas informações sobre João Belchior Marques Goulart.
Disponível em: <http:// cpdoc.fgv.br/producao/dossies/Jango/biografias/joao_goulart>. Acesso em: 06 de
setembro de 2015.
7
Termo utilizado por Dreifuss referindo-se à elite politicamente instruída e capaz de mobilizar uma ação política
frente ao governo por meio de organizações detentoras de uma ideologia liberal e de direita. Essas organizações
eram a própria elite orgânica em ação.
20
(IPES)8 foi decisiva para a divulgação da ideologia da dita elite e, por conseguinte,
da doutrinação de parcela significativa da sociedade brasileira naquele momento.
Essa elite orgânica representava os interesses multinacionais e associados, tendo
como objetivo comum modelar as forças sociais burguesas em uma classe, ou seja,
unir a burguesia em um único grupo, o mais homogêneo possível, com idéias
formuladas, que justificassem uma ideologia própria do grupo e, como objetivo final
desse processo, transpor o poder privado dos interesses multinacionais e
associados para o Brasil. Esses objetivos, se efetivariam com a implantação do
Estado autoritário que se deu concretamente com o Golpe de 649. Para tanto foi com
a mobilização das classes médias, que o IPES conseguiu a sua mais significativa
conquista, pois, a mobilização das classes médias era sobre tudo uma campanha
ofensiva, projetada para acentuar o clima de inquietação e insegurança e dar a
aparência de um apelo popular às Forças Armadas (DREIFUSS, 1981, p.291). Com
esse fato, seguiu-se um período de instabilidade, nas relações políticas.
O modelo golpista brasileiro teve suas peculiaridades históricas. Diferente de
um golpe de Estado clássico, onde o ditador assume o poder totalmente, no Brasil,
ao contrário, com a ditadura, ocorreu uma “partilha” de poder, como veremos mais
adiante. O Golpe de 1964 foi dado com a justificativa de “estabilização política”,
diante da possibilidade da realização de um golpe da esquerda. Efetivado o Golpe,
veio a grande surpresa para a sociedade: os militares, com o argumento de manter a
segurança nacional, se recusaram a sair do poder de imediato. Castelo Branco, que
assumira o poder como Presidente, quis apenas terminar o mandato do presidente
deposto. Em seu governo foi instituído o AI-2 (Ato Institucional 2), que daria as
características básicas do modelo golpista brasileiro. Segundo SKIDMORE, o
principal propósito do AI-2, com duração prevista até 15 de março de 1967 (fim do
mandato de Castelo), era tornar difícil qualquer vitória eleitoral da oposição
8
O IPES foi criado por um grupo contrário às propostas governistas; esse grupo precisou criar uma estrutura
capaz de minar a base em que se consolidava o Governo Goulart. Com esse intuito o IPES tinha como objetivo o
estudo das chamadas reformas de base propostas pelo Presidente da República e pela Esquerda, segundo
Dreifuss, a partir do ponto de vista de um tecnoempresário liberal. Para o público em geral, o IPES professava
promover a educação cultural, moral e cívica dos indivíduos, desenvolver e coordenar estudos com o objetivo de
promover o bem estar social e progresso econômico por meio de pesquisa objetiva, “o lado encoberto”, segundo
Dreifuss, coordenava uma campanha política, ideológica e militar. O IPES reunia associações de classe,
sindicatos comerciais e industriais, grupos de pressão, escritórios de consultoria, ativistas militares e facções
políticas de centrodireita.
9
Ver: DREIFUSS, René Armand. A Conquista do Estado: ação política, poder e golpe de classe. 3ª ed.
Petrópolis: Editora Vozes, 1981.
21
10
Uma vez sacramentado o Golpe, era necessário legitimar o regime; para tanto se estabeleceu um modelo
golpista com “cara de democrático” e popular, mas em sua essência, se não fascista, seria no mínimo autoritário,
nunca, jamais, democrático.
22
11
Neste período artistas, políticos, professores e outras personalidades de destaque foram “convidadas” a saírem
do Brasil. Era a política do “Brasil, ame-o ou deixe-o”, instituída com rigor logo após o AI-5 e utilizada com
intensidade, principalmente, durante o governo Médici. Artistas como Caetano Veloso, Gilberto Gil, Chico
Buarque foram exilados, juntamente com intelectuais como Fernando Henrique Cardoso, Paulo Freire e
políticos, como o então governador de Pernambuco Miguel Arraes.
23
12
Os censores poderiam ser militares, ou civis a serviço do Governo. Em sua pesquisa, Beatriz Kushnir, diz que
“alguns dos censores, por outro lado, haviam sido jornalistas ou o jornalismo era a única atividade permitida de
ser exercida concomitantemente ao de Técnico da Censura. Além desse traço, ao concorrerem nos concursos do
DPF (Departamento de Polícia Federal) – grifo nosso – tornavam-se policiais exercendo uma atividade vista
como de cunho intelectual [grifo da autora]” (KUSHNIR, 2001, p. 35). Kushnir diz em sua pesquisa, que buscou
mapear os jornalistas de formação e atuação, que trocaram as redações pela burocracia e fizeram parte do DCDP
(Divisão de Censura de Diversões Públicas), órgão vinculado ao DPF e subordinado ao Ministério da Justiça,
como Técnicos de Censura; e os policiais de carreira que atuaram como jornalistas, colaborando com o sistema
repressivo e censor do pós-1964 (KUSHNIR, 2001, p. 26).
26
para que pudessem difundir seu trabalho, numa resistência admirável à opressão
que, não somente lhes era imposta, mas também à sociedade. Era preciso resistir,
era necessário buscar uma alternativa13.
Foi na busca dessa alternativa que esses jornalistas, “exilados da
imprensa”14, propuseram à sociedade outra possibilidade de ver o cotidiano: uma
imprensa alternativa, disposta a fazer oposição ao autoritarismo do regime. Mas,
seria um tanto enganoso achar que a imprensa alternativa foi fruto do autoritarismo
do regime, sobre isso Márcia Neme Buzalaf argumenta que,
13
Sobre isso Skidmore afirma que “a censura ad hoc – do latim: como e quando necessário [grifo nosso]– que
sugira mal coordenada em dezembro de 1968, foi regularizada em março de 1969 por um decreto que tornava
ilegal qualquer crítica aos atos institucionais, às autoridades governamentais ou às forças armadas. Como se
quisessem indicar de onde achavam que se originava a oposição, os arquitetos da censura também proibiram a
publicação de noticias sobre movimentos de trabalhadores ou de estudantes. Toda a mídia foi colocada sob a
supervisão dos tribunais militares” (SKIDMORE, 1988, Brasil: de Castelo a Tancredo, p. 167).
14
Utilizamos este termo, exilados da imprensa, pois, assim como, mais tarde muitos oposicionistas do regime
seriam expulsos do Brasil exilando-se em outros países, os jornalistas que fizeram a imprensa alternativa nela
encontraram a opção do “exilio” quando muitos foram expulsos da chamada grande imprensa. Segundo Buzalaf
“a grande imprensa tinha uma particularidade em relação aos jornais ‘nanicos’ [grifo do autor]: o relacionamento
com a censura passava, necessariamente, pela postura do jornal e/ou do dono do jornal. Alguns empresários
delataram funcionários potencialmente subversivos ou ligados aos grupos de orientação comunista. Outros
antecipavam-se e demitiam jornalistas que pudessem ter problemas com a ditadura, alegando que não poderiam
correr o risco de mantê-los. ” (BUZALAF, 2009, p. 125). Ainda nesta temática, Kucinsk afirma que “surgiu uma
espécie de exílio profissional da geração engajada da SENHOR, PANFLETO, BRASIL URGENTE e outros
veículos extintos, de onde viriam muitos dos principais protagonistas das primeiras fases da imprensa alternativa
dos anos 70” (KUCINSKI, 1991, p. 10)
15
Movimento teve seu primeiro exemplar lançado no dia 7 de julho de 1975, época que coincide com a
presidência do general Ernesto Geisel. Juntamente com os jornais Opinião e O Pasquim, foi uma das mais
importantes publicações da imprensa alternativa durante a ditadura militar, reunindo colaborações de importantes
intelectuais brasileiros de oposição ao regime. Apoiado em movimentos populares, Movimento seguiu sendo
publicado até 1981. Com suas reportagens, frequentemente tinha seu material censurado e enviado para
o Ministério da Justiça e Serviço Nacional de Informações (SNI). O jornal circulou regularmente até 1980,
quando começaram a ocorrer ameaças e atentados, por parte de setores da extrema direita, contra bancas de
jornal [...] Movimento deixou de circular em 1981. (Texto adaptado. Original em
https://pt.wikipedia.org/wiki/Movimento_(jornal), acesso em 27/08/2015).
27
16
Sobre o conceito de Existencialismo proposto pelo filósofo francês Jean Paul Sartre se diz que “sua filosofia
dizia que no caso humano (e só no caso humano) a existência precede a essência, pois o homem primeiro existe
depois se define, enquanto todas as outras coisas são o que são, sem se definir, e por isso sem ter uma "essência"
que suceda à existência” e “o existencialismo sartriano procura explicar todos os aspectos da experiência
humana”. (Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/JeanPaul_Sartre, acesso em: 23/01/2015).
17
Essas prisões dos jornalistas de “O Pasquim” serviriam como um “estopim” para provocar a politização do
jornal, foi uma provocação ao ímpeto daqueles jornalistas pois “do mesmo modo como foi presa, a turma do
Pasquim foi solta: sem nenhuma explicação. A partir daí, que o jornal começou a ficar político” (CHINEM,
1995, p.48).
18
“[...] foi o AI-5 que permitiu uma atividade censória mais sistemática por parte da ditadura militar. O Ato foi
usado, imediatamente, para a censura da imprensa [...] alguns jornais e revistas sofreram, inclusive, com a
presença cotidiana de um censor in loco” (Fico, Carlos. Espionagem, polícia política, censura e propaganda: os
pilares básicos da repressão in Ferreira, Jorge; Delgado, Lucilia de Almeida Neves (org.), 2007, O Brasil
Republicano: o tempo da ditadura – regime militar e movimentos sociais em fins do século XX, p. 189).
28
‘O que era comum a todos que faziam a imprensa alternativa era a resistência
ao Regime. Segundo KUCINSKI,
Nesse período, de 1970 até o colapso do milagre econômico e o surgimento
da política de distensão no interior do aparelho militar 19, em 1975, os jornais
alternativos se constituíram não em meros símbolos de resistência da
sociedade civil ao autoritarismo, ou expressão de um movimento ou uma
articulação de resistência: eles eram a própria resistência. (KUCINSKI,
1991, p. 54)
19
Essa política de distensão consistia em liberalizar o regime autoritário, tendo seu inicio com a ascensão de
Geisel ao poder e culminando no Governo de Figueiredo. O objetivo era a contensão da chamada “linha dura”
dos militares e a transição “lenta, gradual e segura” para o poder público civil.
20
A palavra underground do inglês significa “subterrâneo”; quando se fala em “movimento underground”,
“cultura underground”, se tem a ideia de uma maneira de viver cuja proposta cultural é o oposto do modo de vida
da cultura ocidental baseada em princípios conservadores judaico-cristãos. Com relação aos periódicos
alternativos brasileiros, João Henrique de Castro de Oliveira, propõe que “a imprensa underground era feita de
uma forma espontânea, sem a lógica quantitativista dos grandes empreendimentos de comunicação que visam ao
lucro” (OLIVEIRA, 2007, p. 6).
29
O projeto d’O Pasquim era não ter ideologia; ser definindo como um jornal de
humor, que por si só, não deve e nem pode ter posição política, ou seja, podia ter
uma posição política contrária às ideologias, ou contrária à determinadas posturas
reacionárias. A função do humor, primeira era denunciar as injustiças. O jornal fez
isso muito bem, ao não aceitar a política do regime. Basta folhear as páginas do
jornal para notar-se que o seu conteúdo expressa uma pura resistência ao regime,
que não deixa de ser política, sendo possível verificar em cada página, um pedaço
da história política do Brasil, registrado com muito humor, apesar da censura
imposta pelo sistema
A história do periódico começa com a necessidade da criação de um projeto
substituto para a revista Carapuça21, encabeçada por Sérgio Porto (Stanislaw Ponte
Preta), que, com a morte deste, em 1968, ficou impedida de continuar a ser editada.
Daí deu--se a necessidade de se fazer um jornal, mas, que tivesse um projeto
inovador, diferente. Assim,
Sobrevivendo entre as brechas do sistema, procurando a liberdade de
expressão que o regime negava, da necessidade por um espaço onde
pudessem manifestar sua indignação com a ditadura e todo um modus
vivendi que legitimava o autoritarismo na cultura brasileira, o grupo formado
por Jaguar, Fortuna, Claudius, Millôr Fernandes, Ziraldo, Prósperi, Sérgio
Cabral, Luís Carlos Maciel e Tarso de Castro decide fundar o Pasquim. Daí
em diante, a irreverência daria o tom da crítica ácida que o jornal assumiria
em suas páginas. (OLIVEIRA, Natali. 2007 p. 12).
21
Semanário humorístico criando no ano de 1968, dirigido por Sérgio Porto, após a morte deste, Jaguar e Tarso
de Castro foram convidados para dar continuidade ao jornal, mas recusaram a proposta.
22
Pasquim: do italiano paschino. Jornal ou panfleto difamador.
30
tempo, segundo relato de Sérgio de Souza, enquanto o censor foi o Gal.Juarez Paz
Pinto que, todas as quartas-feiras “jogava biriba com os coroas de lá; a gente
contratou uma secretária boazuda que ia lá de biquíni [...] os outros coroas ficavam
morrendo de inveja, porque ela se esfregava, acariciava o General. Ele ficava todo
prosa. Era uma coisa sórdida”. (KUCINSKI, 1991: 163)
Esse tipo de relação flexível com os censores do governo acabou em 1º de
novembro de 1970. Os policiais do DOI-CODI26 invadiram a redação do Pasquim e
levaram presos os jornalistas que lá estavam, com exceção de Tarso de Castro, que
conseguiu escapulir pelo muro dos fundos (KUCINSKI, 1991, p. 163) 27. Antes
dessas prisões, o jornal havia sofrido dois atentados à bomba, quando, uma chegou
a explodir causando enorme prejuízo, não só às instalações do hebdomadário,
quanto nas vidraças da vizinhança, no bairro do Botafogo. O segundo artefato, não
detonou devido ao rompimento do pavio.
O motivo da prisão do grupo teria sido uma charge de Ziraldo, tendo por base
o quadro de Pedro Américo - O Grito do Ipiranga – no qual, D. Pedro gritava: “eu
quero é mocotó”28 (CHINEM, 1995, p. 47). O aparelho repressor do governo
entendeu que se tratava de uma ameaça à segurança nacional. A irreverência
trouxe como resultado, a prisão dos redatores do jornal por 61 dias. Enquanto os
editores do jornal estavam presos, houve uma verdadeira comoção, surgiram
26
DOI-CODI (Destacamento de Operações de Informações – Centro de Operações de Defesa Interna) era a base
da estrutura da repressão política no Brasil, tendo no Conselho de Segurança Nacional, ligado ao Estado Maior
das Forças Armadas, o órgão centralizador das ações repressivas. Cada ministério militar tinha o seu CODI, que
coordenava a repressão nos CODIs regionais. Cada um poderia ter quantos DOIs julgasse necessário
(KUSHNIR, 2001, p. 371).
27
Os principais editores do jornal que foram presos naquela ocasião foram Ziraldo, Jaguar, Luiz Carlos
Maciel, Tarso de Castro, Paulo Francis, Sérgio Cabral e Fortuna. Segundo Buzalaf: “Para justificar, de
alguma maneira, os motivos dos jornalistas do Pasquim não estarem na redação, na edição de número 72, a capa
anunciava um ‘surto de gripe na redação do Pasquim’ [grifos da autora], em evidente ironia à não-presença de
Ziraldo, Jaguar, Luiz Carlos Maciel, Tarso de Castro, Paulo Francis, Sérgio Cabral e Fortuna. Mesmo assim,
Paiva foi responsável por imitar o traço dos ilustradores presos. Além de Miguel Paiva, Millô e Henfil, que não
haviam sido presos, incumbiram-se de produzir material suficiente para conseguir publicar o jornal
semanalmente” (BUZALAF, 2009, p. 152).
28
Enquanto a minissaia escandalizava em seu sucesso, descobrindo a perna feminina, o joelho feminino ganhava
um apelido: mocotó. Surgiu o Trio Mocotó, composto por Fritz "Escovão", João "Parahyba" e Nereu Gargalo. O
trio estava sempre brincando com a gíria nova e comentando as belas moças de "mocotós" expostos que
frequentavam a boate paulistana Jogral, ponto de encontro da música brasileira. O mocotó, para eles, podia
designar tanto o joelho, quanto partes íntimas femininas. A partir daí, Jorge Ben compôs “Eu também quero
mocotó” com título de duplo sentido. No mesmo ano o nome do grupo teve de ser oficializado por causa da
participação no V Festival Internacional da Canção. "Eu Também Quero Mocotó", foi defendida no mesmo
festival por Erlon Chaves e a Banda Veneno com Jorge e o Trio Mocotó como convidados. (Texto adaptado.
Original em: < https://pt.wikipedia.org/wiki/Trio_Mocot%C3%B3>, acesso em 23/09/2015.
32
29
Alguns dos principais nomes que fizeram O Pasquim, como Ziraldo, Millôr, Henrique Filho (Henfil), no
princípio da organização não quiseram apoiar a patota, – embora depois tornaram-se leais colaboradores – pois
não concordaram com a repartição inicial das cotas, onde 50%, ficava com o empresário, que era dono da
distribuidora, e cinco humoristas ficavam com 10% cada (Jaguar, Tarso de Castro, Sérgio Cabral, Carlos
Prosperi e Cláudio Ceccon). Henfil rebelou-se acusando os cinco de “velhos reacionários” (KUCINSKI, 2001, p.
106)
30
O Pasquim era um periódico de circulação nacional e com tiragem de exemples superior a chegando marca
superior de 200.000 exemplares. Isso fez com que anunciantes se interessassem em efetuar propagandas nas
páginas do jornal afim de atingir uma grande quantidade do público leitor e a este apresentarem suas marcas.
33
suas ideias nas páginas do jornal. Mais tarde essa negligência administrativa foi o
motivo para a crise financeira que se estabeleceu no jornal.
Na fase áurea, do lançamento, em junho de 1969, até outubro do ano
seguinte, sob a direção de Tarso de Castro, a receita era gasta de maneira caótica e
perdulária (KUCINSKI, 1991, p. 167). Ajuda de investidores externos31 e cortes nas
despesas não foram suficientes para evitar o declínio do jornal. O espaço alternativo
já não era mais “monopólio” do Pasquim. O surgimento de outros alternativos como
Opinião, Ex e Política, proporcionaram uma atmosfera de concorrência no mercado
da imprensa alternativa e, como resultado, a venda do Pasquim caiu. O periódico, no
entanto, seguiu sua épica jornada que começara em 1969, chegando em 1992, com
uma história impressionante de resistência.32
31
Fernando Gasparian que foi proprietário da Editora Paz e Terra, investiu no Pasquim para tentar sanar as
dívidas do periódico. Era uma oportunidade de obter conhecimento sobre o jornal alternativo, mas acima disso,
prevalecia o desejo de ajudar o único jornal de resistência ao regime, que circulava em todo o Brasil naquele
momento.
32
Como observado no início do nosso estudo, nos propomos em estudar do Pasquim o período que compreende
os anos de 1969 a 1975, período em que a censura prévia foi atuante no semanário; por esse motivo fizemos uma
referência suscita do período posteriori ao que propomos neste trabalho.
34
33
Segundo Natali Gisele “o ratinho Sig, criado por Jaguar (que será verde quando o jornal passa a ter impressão
em cores) cujo nome completo era Sigmund, numa referência a Freud e ao ‘psicanalisar’ da intelectualidade
brasileira depois de 1968” (OLIVEIRA, Natali Giseli de. 2007, p 41)
34
Chico Anísio in O Pasquim, Nº 07, AGO/1969
35
Figura 1
Sigmund: pasquinize-se35
35
O Pasquim, Nº 07, AGO/1969
36
Essa era a proposta do Pasquim, não está alienado, e não deixar que seus
leitores fossem vítimas da alienação resultante da censura prévia dos meios
culturais pelo governo ditatorial. O ultimato do humorista não se restringia somente
aos seus colegas, mas era uma forma de conclamar a sociedade à resistência, não
se submetendo a metodologia alienante, presente nos meios ditos oficiais. Havia
certa mágoa por parte de redatores do Pasquim com relação a grande imprensa,
visto que alguns deles – Ziraldo, Millôr, por exemplo – participaram de grandes
redações, mas foi no Pasquim que encontraram o espaço que lhes foi negado na
grande imprensa quando ocorreu a censura e as grandes empresas de comunicação
recusaram se opor ao que fora instituído pelo governo. Os ataques à grande
imprensa estão nas páginas do jornal nas mais variadas formas, afinal estamos
falando de um grupo de jornalistas, que foi expurgado das grandes redações
jornalísticas por acreditar num ideal contrário a ideologia proposta pelo sistema;
debochar dessa grande imprensa seria mais que uma simples brincadeira para os
editores de O Pasquim: tinha sabor de vingança.
Havia um mal-estar entre aqueles que faziam a imprensa “nanica” – onde se
incluía O Pasquim – e os representes da grande imprensa. Segundo Buzalaf
A grande imprensa tinha uma particularidade em relação aos jornais
“nanicos”: o relacionamento com a censura passava, necessariamente, pela
postura do jornal e/ou do dono do jornal. Alguns empresários delataram
funcionários potencialmente subversivos ou ligados aos grupos de
orientação comunista. Outros, antecipavam-se e demitiam jornalistas que
pudessem ter problemas com a ditadura, alegando que não poderiam correr
o risco de mantê-los. (BUZALAF, 2009, p. 125)
Esse tipo de atitude por parte dos “donos da imprensa” não ficaria sem uma
“represália” expressada no humor sarcástico presente nas páginas do nosso jornal
em estudo.
Evidente que na Figura 2 (página 37), o aviso não é para o Topo Gigio36,
quando lemos o texto disponível nela, observa-se os nomes das grandes empresas
detentoras dos direitos autorais da referida personagem. Para O Pasquim, não se
tratava de brigar para ter o direito de utilizar o Topo Gigio, até porque, diante da
criatividade dos cartunistas do jornal, esse não fazia a menor falta.
36
A informação contida na Figura 2 retrata um pouco da história da televisão brasileira no período em estudo.
Topo Gigio era uma personagem, um ratinho, de programa infantil criada na Itália e que fez muito sucesso na
televisão brasileira nos anos 1970 e 1980, foi exibido por Globo e Bandeirantes. (fonte:
<http://pt.wikipedia.org/wiki/Topo_Gigio> acesso em 29/01/2015; <http://omelete.uol.com.br/series-
tv/noticia/topo-gigio-vai-retornar-tv/> acesso em 29/01/2015).
37
Figura 2
37
O Pasquim, Nº 09, AGO/1969
38
Figura 3
“Aqui Não!”39
38
A autocensura consiste em alguém aplicar censura a si próprio, em comportamento, em sua produção
intelectual, etc. Referente à imprensa no período em estudo, a maioria dos veículos de comunicação cedeu a
pratica da autocensura de suas produções, “censurando” essas ainda nas redações em conformidade com os
desígnios do governo. O censor oficial quando executava a censura prévia do material que lhe era entregue, na
verdade censurava um produto que já havia sido previamente autocensurado.
39
O Pasquim, Nº 37, MAR/1970
39
Figura 4
40
O Pasquim, Nº 40, MAR-ABR/1970
40
Figura 5
41
O Pasquim, Nº 41, ABR/1970.
41
Mas a censura não era a própria repressão, era apenas uma parte dela. A
tortura, a perseguição política, a restrição dos direitos civis, também consolidavam o
42
Essa política de segurança nacional tinha com base ideológica a Doutrina de Segurança Nacional que “é a
manifestação de uma ideologia que repousa sobre uma concepção de guerra permanente e total entre o
comunismo e os países ocidentais” (BORGES, Nilson, in FERREIRA, Jorge; DELGADO, Lucília de Almeida
Neves. 2007, p. 24). Baseava-se na ameaça constante do inimigo interno, daí a “necessidade” de reprimir
quaisquer possibilidades de sucesso por parte dos supostos inimigos da pátria. Tinha como marco legal a
Decreto-Lei 314/67 – Lei de Segurança Nacional.
43
A censura exógena refere-se a praticada pelo Estado repressor.
44
Sobre a caricatura a autora expõe que “[...] a caricatura é uma forma grotesca de representação de alguém, e
considerando o enraizamento no humor dos ilustradores do Pasquim, é possível ver que a saída encontrada para
os traços de humor foi investir na caricatura de artistas [...]” (BUZALAF, 2009, págs. 128-129). Dessa forma,
para os editores do jornal, não era convenente utilizar caricaturas dos militares, que podiam considerar tal atitude
como um ato contra a segurança nacional; verificamos assim que embora audacioso, O Pasquim não deixou a
ponderação de lado.
42
45
Sobre essa organização do aparelho repressor do Estado, Borges afirma que “dentre os diversos papéis
exercidos pelo aparelho militar, o que mais sobressaiu foi o aparelho repressivo, organizado e implementado
pelo Serviço Nacional de Informações (SNI), com base no escopo teórico da Doutrina de Segurança Nacional.”
(BORGES, Nilson, in FERREIRA, Jorge; DELGADO, Lucília de Almeida Neves. 2007, p. 23)
46
A história expressa na Figura 6 é uma sátira da fábula “O lobo e o cordeiro”, de Esopo, contador de histórias
que viveu na Grécia Antiga, mais tarde selecionada por Jean de La Fontaine. Na história original o cordeiro é
ferozmente devorado pelo lobo.
47
Claudius Sylvius Petrus Ceccon (Garibaldi, RS, 1937). Arquiteto, designer, jornalista, desenhista, ilustrador e
cartunista. Trabalha no jornal O Cruzeiro como auxiliar de paginador, em 1954. Três anos mais tarde, faz
caricaturas para o Jornal do Brasil. No início década de 1960, cursa desenho industrial na Escola Superior de
Desenho Industrial (Esdi), no Rio de Janeiro. Na mesma cidade, trabalha na revista Pif Paf. Passa a integrar, em
1969, a equipe do jornal O Pasquim, no qual também trabalham os desenhistas e humoristas Millôr Fernandes
(1923-2012), Jaguar (1932), Ziraldo (1932) e Fortuna (1931-1994). Após ser preso pelo regime militar brasileiro,
em 1971, exila-se em Genebra [...] Ao voltar para o Brasil, em 1978, trabalha com alfabetização em bairros
carentes de São Paulo, também pelo Idac, junto ao arcebispo dom Paulo Evaristo Arns (1921) [...] Atualmente,
realiza charges, faz ilustrações para livros infantis e é diretor do Cecip, que realiza campanhas de interesse
público e desenvolve projetos de inclusão digital com alunos de escolas pública. (Mais informações sobre
Claudius Sylvius Petrus Ceccon disponível em:
<http://enciclopedia.itaucultural.org.br/pessoa14876/claudius>, acesso em 07/09/2015). Segundo Márcio
Ananias Ferreira Vilela, Claudius foi o responsável por fazer um cartaz para a Conferência do Nordeste, Cristo e
o Processo Revolucionário Brasileiro, realizada no Salão Nobre do Colégio Agnes Erskine, no Recife, em julho
de 1962, esse cartaz provocou uma série de questionamentos por parte da Confederação Evangélica do Brasil
(CEB), pois o desenho continha uma cruz, ferramentas agrícolas – uma foice inclusa – e o vermelho
predominava (Ver: VILELA, Márcio Ananias Ferreira. Discursos e práticas da Igreja Presbiteriana do Brasil
durante as décadas de 1960 e 1960: diálogos entre religião e política. Recife: UFPE, págs. 90 e 91 – Tese).
43
Figura 6
O lobo e o cordeiro48
48
O Pasquim, Nº 08, AGO/1969.
44
Figura 7
Deu no jornal49
49
O Pasquim, Nº 16, OUT/1969
45
50
Em nossa pesquisa, encontramos o Decreto Lei Nº112 de 10 de agosto de 1969, Lei vigente no extinto Estado
da Guanabara, e que foi estendida para todo o Estado do Rio de Janeiro pela Lei 126 de 10 de maio de 1977, que
dispõe sobre a proteção contra a poluição sonora. Não podemos deixar de levar em consideração que o desenho
contido na Figura 7 possa estar fazendo referência a essa Lei, e não a censura propriamente dita.
46
51
O Pasquim, N° 40, MAR-ABR/1970
47
52
Os idealizadores do Regime golpista brasileiro usurparam o tema da “Revolução” – empregado por
comunistas e esquerdistas que pregavam a Revolução mundial para se estabelecer o socialismo-comunismo –
não querendo admitir que o que houve de fato foi um golpe de Estado. Para tanto, tentaram manter em
funcionamento algumas instituições tidas como democráticas, para tentar se diferenciar dos Estados fascistas
europeus, que implementaram regimes absolutamente autoritários. Os militares brasileiros eram muito arraigados
ao legalismo. Tinham interesse em legitimar o Regime por vias democráticas, por isso, mesmo em um primeiro
momento tendo fechado o Congresso Nacional e cassado os direitos políticos de vários parlamentares e outros
cidadãos tidos como subversivos, sentiram a necessidade de reabri-lo, para legislar – ainda que sobre
monitoramento do governo – e, o principal, legitimar a escolha dos militares para o cargo de Presidente da
República.
48
Figura 8
53
O Pasquim, Nº 36, FER-MAR/1970
49
Figura 9
54
O Pasquim, Nº 47, MAI/1970
50
55
No período da Ditadura, a oposição armada foi praticada por grupos que agiam em guerrilhas urbanas, na
Guerrilha do Araguaia, na prática de sequestros de autoridades estrangeiras que tinham como objetivo trocar o
sequestrado por colegas presos políticos, – como foi o caso do sequestro do embaixador norteamericano Charles
Burke Elbrick pelo grupo de extrema esquerda MR-8 encabeçado por Carlos Lamarca, Iara Iavelberg, Fernando
Gabeira, entre outros – além da realização de roubos à bancos e assaltos a supermercados.
51
Figura 1056
56
Na Figura 10, na charge, o desenho do homem que está em traje militar a rigor, é, possivelmente o ditador
anfitrião numa alusão ousada ao então ditador, o general Emílio Garrastazu Médici, que ocupava o cargo de
Presidente da República. Não deixamos de levar em consideração que o fato de que o intérprete possa
representar O Pasquim, na sua atitude de “traduzir” a veracidade dos fatos aos seus leitores de uma forma muitas
vezes incompreensível ao sistema repressivo da Ditadura.
57
O Pasquim, Nº 42, ABR/1970
52
Figura 10A
58
O Pasquim, Nº 42, ABR/1970
53
Outro tema presente nas páginas do Pasquim era a liberdade sexual (Ver
Figura 11, página 54). O tema esteve presente na maioria das edições do periódico,
porém, logo após o fim da censura prévia, o jornal tomou um rumo mais político;
suas páginas, antes repletas de desenhos, charges e outros meios ilustrativos na
transmissão das informações, passaram a apresentar textos, em artigos mais
elaborados, na transmissão da visão de mundo dos seus editores e colaboradores.59
Longe de vulgarizar a sensualidade feminina, O Pasquim tinha como objetivo
fundamental, ao divulgar fotos de mulheres expondo sua sensualidade, constranger
setores da sociedade que primavam por um comportamento moralista – a classe
média, em especial que, se arraigava a um conservadorismo hipócrita, quando se
fazia cúmplice do Regime imposto. Condenavam muitas vezes, as arbitrariedades
praticadas pelos agentes da repressão, mas não recusavam as benesses que
usufruíam junto ao sistema. Era evidente, de certo modo, que os leitores mais jovens
do periódico se sentissem atraídos em comprar edições, que traziam o atrativo
sensual de uma mulher seminua, todavia, isso era a propaganda da liberdade sexual
e, quem sabe, do nascente feminismo, explícito em O Pasquim.
Na atualidade, existem certos jornais que exploram a sensualidade feminina
em fotos, mas aquele objetivo de fazer a propaganda da liberdade sexual já passou,
e também não há o interesse em constranger a sociedade atual com esse tipo
edição. A situação é voltada para o mercado consumidor, onde o objetivo é executar
uma forma de atrair leitores – heterossexuais, homens – que comprem os seus
jornais, ás vezes apenas por causa da foto de uma mulher seminua, conforme
exposto na Figura 12 (página 55)
59
Em nossa pesquisa observamos que os exemplares do Pasquim pós censura prévia tinham como novo objetivo
a campanha pela Lei Anistia (Lei 6.683 de 28 de agosto de 1979), que consiste basicamente, no perdão de todos
acusados de praticarem crimes políticos ou relacionados a política no período da Ditadura Militar. Nem mesmo
essa Lei escapou de ser alvo do humor satírico nas páginas do hebdomadário.
54
Figura 11
Dica de Mulher60
60
A sessão dica de mulher vinha geralmente com fotos de mulheres expondo sua sensualidade, na foto da Figura
11 está Mariluce Carvalhaes.
55
Figura 12
61
Disponível em: < https://soteroblog.wordpress.com/2010/04/05/aqui-pe>, acesso em 10/08/2015.
56
Numa época em que, a mídia cedia seu espaço para as produções norte-
americanas, O Pasquim procurou valorizar o que era do Brasil, satirizando de forma
bem humorada personagens que seriam os “heróis” que a indústria cultural
estadunidense propunha para o mundo (Ver Figuras 13 e 14, páginas 57 e 58,
respectivamente).
Os próprios Estados Unidos não escaparam de serem satirizados nas páginas
do Pasquim. Na edição Nº 05, por exemplo, satiriza a ida do homem à lua. No
Jogo dos 11 erros do Apolo 11 (Ver Figura 15, página 59), o que chama mais a
atenção é o desenho daquilo que aparenta ser um foguete norte americano. A parte
do foguete que aponta para cima está escrita a sigla “USA”62; ao seu lado, o
desenho daquilo que poderia ser outro foguete, apontando para baixo, com as
iniciais “URSS”, sigla da extinta União das Republicas Socialistas Soviéticas. Vê-se
que o foguete está mais para um míssil – uma bomba atômica. Em destaque, na
figura do míssil soviético, está desenhada a bandeira brasileira, como uma afronta
aos militares brasileiros e aos Estados Unidos que apoiaram o Golpe .
Era a forma que o jornal tinham de alertar aos seus leitores da “invasão”
cultural norte americana e seus efeitos danosos â cultura nacional, onde o produto
nacional era menos valorizado do que os produtos culturais que vinham de fora. De
sorte que, embora houvesse essa “ameaça”, o público brasileiro, não desprezou a
produção artística nacional63, todavia, sem que deixasse de valorizar a produção
cultural que vinha de fora.
Em uma época de restrição à liberdade de expressão, os leitores do
Pasquim tinham um espaço onde podiam comunicar suas opiniões e participar do
jornal. Era um espaço que dava a característica de interatividade ao periódico. A
comunicação não partia apenas de um lado, interagir com o público leitor também
era interesse de O Pasquim. A importância da seção Cartas, e que, em alguns
casos chamava-se Cartas ao leitor, além de ser um espaço de interação com o
público, servia para instigar o leitor a expressar uma opinião crítica, que o Regime
queria a todo custo castrar sem muitas delongas.
62
A sigla em inglês para United States of America, em português, Estados Unidos da América (EUA).
63
O período em estudo era a época dos grandes festivais musicais, produzidos pela grande mídia que foram
registrados nas páginas de O Pasquim.
57
Figura 13
64
O Pasquim, Nº 05, JUL/1969.
58
Figura 14
65
O Pasquim, Nº 07, AGO/1969.
59
Figura 15
66
O Pasquim, Nº 05, JUL/1969.
60
CONSIDERAÇÕES FINAIS
67
Termo utilizado por alguns autores.
61
prévia, praticada pelos agentes do aparelho repressor, e que tinha por objetivo
mutilar e restringir o direito à liberdade de expressão68.
68
A censura previa foi rígida também no meio da produção cultural. Consideradas como subversivas ao Regime
obras cinematográficas como Iracema – uma Transa Amazônica de Jorge Bodanzky e Orlando Senna, foi
proibida por cinco anos, sendo liberada apenas em 1980, por fazer críticas ao projeto da rodovia
Transamazônica (Fonte: http://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/cultura/noticias/?p=14699, acesso
em 17/09/2015); a música Pra não dizer que não falei de flores, foi censurada e teve sua execução proibida, por
conter conteúdo considerado como subversivo pelo Regime. Seu autor, Geraldo Vandré, foi exilado (Fonte:
http://mundoestranho.abril.com.br/materia/quais-obras-foram-censuradas-na-ditadura, acesso em
17/09/2015). De certo, O Pasquim, não deixou de registrar de forma irreverente a censura imposta às produções
culturais e não deixou de fazer a propaganda de eventos produzidos pela grande mídia, como os grandes festivais
de música, tendo o objetivo de não deixar que seus leitores se tornassem em pessoas aculturadas. Era uma forma
de resistir a um regime que tinha como finalidade castrar os cidadãos culturalmente e aliena-los da realidade da
situação.
62
REFERÊNCIAS
SKIDMORE, Thomas E. Uma história do Brasil. 4.ed. São Paulo: Paz e Terra, 2003.
AUDIOVISUAL
SITES
ANEXOS
67
Fonte: SANTOS, Ana Maria Barros dos. O Pasquim. Acervo Pessoal. O Pasquim, Nº 40, MAR-
ABR/1970.
71
Fonte: SANTOS, Ana Maria Barros dos. O Pasquim. Acervo Pessoal. O Pasquim, Nº 17, OUT/1969.
72
Fonte: SANTOS, Ana Maria Barros dos. O Pasquim. Acervo Pessoal. O Pasquim, Nº 05, JUL/1969.
73
Leila Diniz
Fonte: SANTOS, Ana Maria Barros dos. O Pasquim. Acervo Pessoal. O Pasquim, Nº 37, MAR/1970.
74
Fonte: SANTOS, Ana Maria Barros dos. O Pasquim. Acervo Pessoal. O Pasquim, Nº 40, MAR-
ABR/1970.
75
Fonte: SANTOS, Ana Maria Barros dos. O Pasquim. Acervo Pessoal. O Pasquim, Nº 07, AGO/1969
76
.
Fonte: SANTOS, Ana Maria Barros dos. O Pasquim. Acervo Pessoal. O Pasquim, Nº 20, NOV/1969
77
Fonte: SANTOS, Ana Maria Barros dos. O Pasquim. Acervo Pessoal. O Pasquim, Nº 15, OUT/1969
78
Fonte: <http://discotecapublica.blogspot.com.br/2012/01/topo-gigio-no-brasil-1987.html>,
acesso em 29/01/2015.
80
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172