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1. Introdução
O suicídio envolvendo adolescentes, retratado artisticamente desde a Antiguidade
– com “A Eneida” (Virgílio, séc. I a.C.) e “Píramo & Tisbe” (Ovídio, 8 d.C.), por exemplo
– e passando por “Romeu & Julieta” (William Shakespeare, 1591/1595), tornou-se um
tema de destaque nas discussões contemporâneas, após a influência midiática a respeito
do assunto. Por um lado, a obra de ficção contribuiu para quebrar o tabu sobre o assunto
com o lançamento da série “13 Reasons Why” (Netflix, 2017); por outro, as preocupações
sociais se enfatizaram com a disseminação de jogos como o “Desafio da Baleia Azul” e
o “Jogo da Fada”, em que anônimos se utilizam da internet para motivar jovens a tirarem
a própria vida.
1
Trabalho apresentado ao Grupo de Trabalho Processos e Produtos Midiáticos do XI Encontro de
Pesquisadores em Comunicação e Cultura, realizado pelo PPG em Comunicação e Cultura da Universidade
de Sorocaba, na Universidade de Sorocaba – Uniso – Sorocaba, SP, nos dias 25 e 26 de setembro de 2017.
2
Doutorando em Comunicação pela Universidade Anhembi Morumbi (UAM). Bolsista Prosup/Capes.
Membro dos grupos de pesquisa “Inovações e Rupturas na Ficção Televisiva Brasileira” (UAM/CNPq) e
“Narrativas Midiáticas” (Uniso/CNPq). E-mail: jp_hergesel@hotmail.com.
3
Projeto de pesquisa apresentado à Faculdade UnYLeYa como parte integrante do conjunto de tarefas
avaliativas da disciplina Metodologia da Pesquisa e da Produção Científica, do curso de pós-graduação em
Saúde do Adolescente. Tutora: Prof.ª Egle Pires Santos.
O fenômeno serviu para trazer à tona questões que ficaram abafadas em situações
anteriores, sobretudo em território brasileiro – cujo público já havia assistido a uma
abordagem suicida em uma série juvenil com “Tudo o que é sólido pode derreter” (TV
Cultura, 2009). Também se mostrou útil ao mostrar que distúrbios psiquiátricos cada vez
mais comuns em jovens, como depressão e ansiedade, merecem uma atenção maior, tanto
da família como dos profissionais da Saúde.
Portanto, como as séries de ficção audiovisuais contemporâneas vêm representando
a questão do suicídio no universo adolescente e de que forma isso pode impactar o jovem
brasileiro? Essa foi a pergunta que motivou o início de uma pesquisa sobre o suicídio no
contexto juvenil e sua abordagem nas mídias, numa abordagem interdisciplinar entre
Comunicação Audiovisual e Saúde do Adolescente. Tal projeto, desenvolvido sob
orientação da Prof.ª Egle Pires Santos, foi apresentado à Faculdade UnYLeYa como parte
integrante do conjunto de tarefas avaliativas da disciplina Metodologia da Pesquisa e da
Produção Científica, do curso de pós-graduação em Saúde do Adolescente.
O referido curso, enquadrado como lato sensu, tem como objetivos principais:
“capacitar profissionais graduados em enfermagem a atuar em Postos e Centros de Saúde,
Hospitais públicos e privados, clínicas de oncologia; capacitar profissionais para
atuação como consultores em Saúde do Adolescente [...]” (UNYLEYA, 2017, [e], grifo
nosso). No objetivo destacado, encaixa-se a possibilidade de profissionais da
Comunicação desenvolverem seu olhar sensível quanto às mídias que convergem com a
saúde juvenil, sobretudo em caráter mental. Além disso, o texto de apresentação do curso
esclarece-se:
2. Revisão de Literatura
O suicídio pode ser traduzido como “a morte de si mesmo” (CASSORLA, 1984, p.
9). Oferecendo uma visão mais aprofundada, Durkheim (2000, p. 14) diz que se chama
suicídio “toda morte que resulta mediata ou imediatamente de um ato positivo ou
negativo, realizado pela própria vítima e que ela saiba que produziria esse resultado”.
Considera-se, portanto, que o suicídio é toda forma proposital de interrupção da própria
vida.
Cassorla (1984) diverge um pouco de Durkheim (2000) ao acreditar que o suicídio
pode também pode ocorrer de forma inconsciente. Nesse aspecto, é possível mencionar:
esportistas radicais, que se aventuram para cumprir suas atividades profissionais;
soldados voluntários, que se arriscam na guerra em prol do altruísmo; enfermos
negligentes, que evitam a ajuda médica necessária ou que, ainda, percebem a chegada da
doença e não se movimentam para impedi-la.
Para ilustrar que os suicidas, ao mesmo tempo em que querer morrer, querem viver,
entrando num estado paradoxal de conflito na mente, Cassorla (1984) propõe a seguinte
historieta:
Uma anedota nos mostra uma pessoa que jogou num rio querendo matar-se.
Enquanto se debate na água, recusa cordas e boias que as pessoas lhe jogam da
margem. Finalmente, um policial a ameaça com um revólver: “Ou você sai daí
ou te dou um tiro”. O suicida em potencial, que quer matar-se, não quer ser
morto, e sai da água (CASSORLA, 1984, p. 29).
Expandindo esse assunto, Durkheim (2000) determina três tipos de causa para o
suicídio: extrassociais, sociais e de condições individuais. O autor considera extrassociais
os distúrbios mentais, a hereditariedade, a imitação e as alterações climáticas. Como
fatores sociais, estão a doutrinação religiosa, a interferência familiar, a política, o
altruísmo e o controle. Nas condições individuais, podem-se listar os desgostos
familiares, a ausência de amor-próprio, as enfermidades terminais e a autocondenação.
De todas as formas, o que se nota é que existe uma tendência ao sofrimento e é a
possibilidade de livrar-se dela que leva o indivíduo a suicidar-se, quer dizer, “o suicida
não está necessariamente escolhendo a morte, mas sim uma outra maneira de viver”
(CASSORLA, 1984, p. 45). Ao restringir a temática do suicídio ao contexto juvenil, as
estatísticas indicam que:
Uma caixa de sapatos é enviada para Clay (Dylan Minnette) por Hannah
(Katheriine Langford), sua amiga e paixão platônica secreta de escola. O jovem
se surpreende ao ver o remetente, pois Hannah acabara de se suicidar. Dentro
da caixa, há várias fitas cassete, onde a jovem lista os 13 motivos que a levaram
a interromper sua vida - além de instruções para elas serem passadas entre os
demais envolvidos (ADOROCINEMA, 2017, [e]).
Trata-se de um jogo viral, onde alguém por trás da tela manipula e dá as ordens
para serem cumpridas pelo jogador. Só é possível jogar o jogo Baleia Azul se
receber o convite. Após cada missão cumprida, os jogadores precisam publicar
de forma subliminar nas redes sociais, cada missão executada com sucesso
(FLAGROU, 2017a, [e]).
À meia-noite, quando todo mundo está dormindo, levante-se de sua cama (...)
vá para a cozinha em silêncio, para que ninguém perceba você ou a magia
desaparecerá. Ligue o fogão a gás, os quatro queimadores. Mas não acenda
isso. Você não quer se queimar, não é? Então vá dormir. O gás mágico virá até
você, você vai respirar enquanto dorme e de manhã, quando você acordar, diga:
“Obrigado Alfeya, eu me tornei uma fada”. E você se tornará uma verdadeira
fada de fogo (R7, 2017, [e]).
Hoje entendo por que o meu tio queria fazer a Ofélia. Ela é como a Ismália: as
duas se iludem e se afogam na confusão da cabeça delas, confundindo o real
com o imaginário. Eu sofri muito com essa decisão dele de ir embora da vida
e acho que vou ter saudade para sempre. Mas todos os dias vivo com as coisas
maravilhosas que ele me deixou. E eu não estou falando de nenhuma herança,
não. Nada que estivesse em caixas, a não ser por essa linda carta de adeus
chamada Ismália (GOMES, 2010, p. 302).
Por fim, acredita-se que falar sobre o suicídio é uma tarefa que não pode ser
silenciada. Diferentemente do que o senso comum considera, o suicídio não é uma
problemática que se restringe ao indivíduo que o comete; o ato envolve a sociedade em
questão – ainda mais em casos que ocorrem no universo adolescente. Oliveira, Amâncio
& Sampaio (2001, p. 520) se posicionam: “O jovem que, desesperado, pensa seriamente
em suicídio e chega a realizar alguma(s) tentativa(s), encontra-se oprimido no limiar da
dor e da tensão insustentáveis”.
Ao ganhar representação na ficção seriada, o suicídio juvenil não passa a pertencer
unicamente como obra artístico-cultural, mas preenche uma lacuna que transcende a
narrativa e passa a refletir a cultura do jovem contemporâneo. As causas sociais, o modo
como elas se produzem e os efeitos que elas provocam são, segundo Durkheim (2000),
elementos necessários para investigação quando se quer compreender o fenômeno de
forma aprofundada.
3. Metodologia
A pesquisa proposta neste projeto tem um objetivo inicial exploratório, propondo
um levantamento dos assuntos apresentados, recorrendo a fontes bibliográficas e
documentais, de natureza qualitativa. Sustentando o método indutivo, pretende-se
avançar com uma aplicação de análise estilística aos produtos midiáticos envolvidos, a
fim de entender sua relação com o público e desvendar aspectos acerca do suicídio
juvenil.
Segundo Querino et al (s.a., p. 52), o objetivo exploratório tende a “oferecer uma
visão panorâmica, uma primeira aproximação a um determinado fenômeno pouco
explorado”. No caso desta pesquisa, o fenômeno é o suicídio cometido por adolescentes,
e a utilização da pesquisa exploratória, já realizada para a delimitação do tema, auxiliou
na observação sobre o que já foi estudado e quais são as lacunas que ainda carecem de
preenchimento. Para realização dessa etapa, foram utilizadas as bases de dados do Google
Acadêmico4 e do EBSCO5, via Universidade Anhembi Morumbi.
O levantamento de dados, registrado sobretudo na fundamentação teórica deste
projeto, consiste em “um apanhado geral sobre os principais trabalhos já realizados,
revestidos de importância, por serem capazes de fornecer dados atuais e relevantes
relacionados com o tema” (LAKATOS, MARCONI, 2003, p. 158). Esse procedimento
serviu, a princípio, para aprofundar o conhecimento acerca dos assuntos a serem
discutidos ao longo do trabalho.
Uma vez que abordagens sobre o suicídio juvenil estejam registradas tanto em
livros como demais trabalhos acadêmicos, mas ao mesmo tempo estudos sobre as séries
e fenômenos contemporâneos sejam carente de conteúdo científico devido à sua
atualidade, adota-se uma mescla de pesquisa bibliográfica e consulta a fontes
documentais (ou secundárias). A respeito dessa combinação:
4
Google Acadêmico. Disponível em: <https://scholar.google.com.br>. Acesso em: 13 maio 2017.
5
EBSCO. Disponível em: <http://portal.anhembi.br/biblioteca>. Acesso em: 13 maio 2017.
gráficas, com cautela para verificar as características pertinentes no que tange ao público-
alvo da obra.
Ainda sobre o método de análise, Rocha (2016, p. 24), ao discursar sobre sua
aplicação nos produtos televisivos, afirma: “A televisão apoia-se no estilo – cenário,
iluminação, videografia, edição e assim por diante – para definir o tom/atmosfera, para
atrair os telespectadores, para construir significados e narrativas”. Além disso, por mais
que estudos dedicados a entender o estilo no audiovisual sejam potencialmente
relevadores e levam ao aprimoramento das pesquisas em Comunicação, Pucci Jr. (2014,
p. 676) mostra que este é um “aspecto que, em geral, não é dos mais enfatizados na
pesquisa sobre televisão”.
Bordwell (2008) mostra que a afetividade do espectador é despertada por meio de
duas camadas que compõem o estilo no audiovisual. A primeira delas está relacionada à
função denotativa, isto é, “a descrição de cenários e personagens, a narração de suas
motivações, a apresentação dos diálogos e do movimento” (BORDWELL, 2008, p. 59).
A segunda diz respeito diretamente às qualidades expressivas, as quais “podem ser
transmitidas pela iluminação, pela cor, pela interpretação, pela trilha musical e por certos
movimentos de câmera” (BORDWELL, 2008, p. 59).
O trabalho final, que avançará nesse sentido, com base nas explanações realizadas,
abordará sequencialmente: a conceituação de suicídio e sua implicação no contexto
juvenil; a série “13 Reasons Why” e seu impacto sociocultural; o “Desafio da Baleia
Azul” e o “Jogo da Fada” como problemáticas sociais; o filme “Nerve” enquanto
representação da realidade contemporânea; e a série “Tudo que é sólido pode derreter” e
o estilo brasileiro de apresentar o suicídio.
3. Cronograma
O cronograma de um projeto de pesquisa consiste em datar as etapas para
desenvolvimento da pesquisa, mesmo que seja necessário realizar ajustes e flexionar
datas, conforme o trabalho vai avançando. Segundo Prodanov & Freitas (2013, p. 139),
“a pesquisa deve ser dividida em partes, e devemos fazer a previsão do tempo necessário
para passar de uma fase a outra”. Dessa forma, cria-se o seguinte quadro de datas,
demarcando o prazo para cada uma das fases.
Quadro 1: Cronograma de trabalho.
MAR/18
AGO/17
NOV/17
OUT/17
ABR/18
DEZ/17
MAI/17
FEV/18
JUN/17
JAN/18
JUL/17
SET/17
FASES DO ESTUDO
Escolha do tema de
X
pesquisa
Revisão de literatura
X
(bibliográfica)
Definição dos capítulos
X
(sumário preliminar)
Justificativa, objetivos,
problematização, X
metodologia
Fundamentação
teórica: redação dos X X X
capítulos
Coleta de dados
X X X
(descrição dos vídeos)
Tabulação, análise dos
dados e elaboração da X X
síntese
Elaboração da síntese e
conclusão da análise X X
dos resultados
Ajustes metodológicos,
X X
conceituais e analíticos
Redação final, revisão
linguística; formatação
X X X X
conforme normas
ABNT
Entrega do trabalho
X
final
Preparação para
X
apresentação
Fonte: Elaboração própria.
Referências
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