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Educação Musical e emancipação

Mesa temática: 13. Artes, cuerpos, creación y educación

Patrícia Lima Martins Pederiva


Universidade de Brasília
pat.pederiva@gmail.com

RESUMEN

Educação musical deve ser entendida como a atividade em que música e educação
formam uma unidade em processos intencionalmente organizados para o desenvolvimento
humano. Esse desenvolvimento não abrange somente o domínio de técnicas por si mesmas.
Envolve a consciência de si, do mundo, e de si no mundo. Das relações sociais, históricas e
culturalmente constituídas ao longo do tempo. Essa consciência engendra a possibilidade de
auto regulação da conduta musical para a compreensão, expressão e criação musicais. A
música enquanto atividade educativa, guiada com esse propósito, cria condições de
possibilidades para a existência de seres livres, em relação, eticamente comprometidos com
a vida. Uma educação musical voltada para a liberdade pressupõe processos educativos em
que as possibilidades humanas sejam reconhecidas como princípio educativo. Que a ação
colaborativa de experiências musicais diversas possa ser compartilhada de modo respeitoso,
sem preconceitos de qualquer espécie. Requer, ainda, o reconhecimento que somos seres
indivíduo sociais, afeto intelectivos. A arte de música é ferramenta das emoções, a técnica
social dos sentimentos, de seres humanos cujas emoções são constituídas culturalmente.
Somos uma relação social conosco mesmo. Isso nos convida a pensar uma educação
musical mais humana mais ética, em que todas as expressões e criações possam ser
respeitadas como expressões de humanidades. Emancipar, nesse processo educativo, é
reconhecer o humano que há em si, reconhecendo o humano que há no outro pro meio de
suas expressões e criações musicais. A escola pública é o melhor lugar para o
desenvolvimento de livres musicalidades. É o lugar de todos.

IV ENCUENTRO HACIA UNA PEDAGOGÍA EMANCIPATORIA EN NUESTRA AMÉRICA


17, 18 y 19 de septiembre 2018 – Centro Cultural de la Cooperación Floreal Gorini. Av Corrientes 1543, Ciudad de Buenos Aires.
ARTE E VIDA

As artes são atividades humanas que carregam em si os diversos modos de ser e estar no
mundo. Expressam diferentes culturas e relações singulares entre pessoas, sociedades,
espaços, tradições e costumes. Estão marcadas por tempos históricos específicos e por
questões sociais que estruturam suas formas e conteúdos. Elas traduzem nossa
humanidade, principal e essencialmente no que tange às nossas emoções.

Para Vigotski (1999), a arte é a técnica social dos sentimentos, a ferramenta das
emoções. Ela condensa todo o campo dos sentimentos em épocas diversas. Tais
sentimentos dizem a respeito às nossas vivências humanas. Alegrias, dores, sofrimentos,
tristezas, raivas, etc. São emoções culturais, dialeticamente transformadas a partir de nossa
base biológica, animal, filogenética. Sentimos porque somos seres humanos culturais, nos
relacionando, uns com os outros, com as coisas, com a natureza, em diferentes tempos e
lugares. E, por sermos seres humanos que sentem, é que artistas tratam esses sentimentos
como materiais, conteúdos e formas, organizando-os no que chamamos de arte. Gonçalves
(2017, p.227) citando Vigotski, afirma:

A arte é o social em nós, e, se o seu efeito se processa em um


indivíduo isolado, isto não significa, de maneira nenhuma, que as suas
raízes e essência sejam individuais. É muito ingênuo interpretar o
social apenas como coletivo, como existência de uma multiplicidade
de pessoas [...] a refundição das emoções fora de nós realiza-se por
força de um sentimento social que foi objetivado, levado para fora de
nós, materializado e fixado nos objetos externos a arte, que se
tornaram instrumento da sociedade [...] a arte é um técnica social do
sentimento, um instrumento da sociedade através do qual incorpora
ao ciclo da vida social os aspectos mais íntimos e pessoais do nosso
ser. Seria mais correto dizer que o sentimento não se torna social
mas, ao contrário, torna-se pessoal quando cada um de nós vivencia
uma obra de arte, converte-se em pessoal sem com isso deixar de
continuar social.

A dimensão das emoções existe para os seres humanos em suas vivências na cultura, na
própria vida. Somos uma unidade intelecto- afetiva (VIGOTSKI, 1999). Quando as emoções
são organizadas como arte por seus criadores e, vivenciadas de diferentes formas por
receptores ativos, traduzem o campo emocional humano que são “reconhecidos”, enquanto
vivência artística, pela dimensão dos sentimentos. O reconhecimento da dimensão afetiva na
vivência com a arte funciona de modo singular para cada pessoa, como uma catarse. A arte

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atua como um instrumento equilibrador diante da vida, de emoções, que, apesar de serem
vivenciadas no cotidiano, em inúmeras situações que nos chegam a toda hora, são
arquivadas em nosso inconsciente. Na vivência por meio da arte, temos a oportunidade de
trazer as impressões e marcas deixadas pelas situações ao plano do consciente e, assim,
realizar uma equilibração. Isso significa uma consciência de si, do mundo, e de si no mundo.
Por isso, a arte cria condições de vidas em liberdade.

Assim, a vivência da arte é necessária à vida, à existência e ao desenvolvimento humano.


Somente por meio dela é que acessamos, de forma consciente, a dimensão emocional, que é
também social. A arte é a principal atividade humana para a vivência dos sentimentos, da
existência plena na unidade afeto-intelecto. Sem ela, sob o império das vivências
prioritariamente intelectivas (que também fazem parte da vivência artística, mas de outras
formas), somos incompletos. Assim, vivenciar as artes torna-se mais que uma necessidade:
é um direito humano.

A ARTE DA MÚSICA

A música é uma atividade humana que envolve o trabalho criador, expressivo,


compreensivo, emocional em relação ao mundo sonoro, que é composto pelos diversos
materiais sonoros existente nas mais diferentes culturas e seus modos de organizá-los.
Músicas diversas expressam formas singulares de existir, de sentir e de estar em meio às
culturas e relações humanas.

A música faz parte da vida. Independente do com que nos


relacionemos com ela, seja cantando, tocando algum instrumento,
criando, ouvindo, ela existe em nossas vidas, quase que de modo
onipresente. Estilos diversos convivem em uma sociedade
multifacetada, em meio à pluralidade de gostos, de maneiras de
organizar o material sonoro e em meio às peculiaridades culturais
existentes em cada lugar do planeta (PEDERIVA, 2009, p. 69).

Pederiva (2009), afirma que, por ser a mais abstrata das artes, a música dialoga
diretamente com nossa dimensão emocional. Para Gonçalves (2017, p.246):

Sendo a arte da música uma “emoção pura”, ela se torna, juntamente


com a educação, entendida como a própria vida, uma unidade de
suma importância para a criação de condições de possibilidades para

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o desenvolvimento do sentimento do ser humano e da compreensão
psicológica e consciente de suas próprias emoções. Isto nos
possibilita dizer que pensar a unidade dialética educação-música é
também conceber uma educação musical dos afetos — uma vez que
no desenvolvimento histórico da educação musical enquanto campo
do conhecimento, as emoções ainda não ocuparam uma parte de
profundo destaque ou, ao menos, não tiveram ainda uma discussão
séria e aprofundada a esse respeito.

Como atividade humana que é, e, por sua importância no desenvolvimento humano frente
à dimensão emocional, artística, na relação com o mundo sonoro, com as músicas nas
culturas, deve ser vivenciada como atividade educativa desde a infância, por meio de uma
educação musical que possibilite a vivência plena da musicalidade. Como afirma Martinez
(2017, p.128), “As crianças, nesse processo, apropriam-se dessa atividade humana, o que as
capacitam a compreender e interpretar seu mundo circundante e a desenvolver sua
musicalidade em meio às experiências engendradas na vida”.

EDUCAÇÃO MUSICAL

De acordo com Gonçalves (2017), educação musical é “a área que se traduz pela
educação do desenvolvimento da musicalidade humana, ou seja, a arte da música enquanto
atividade educativa”. Compreendemos educação musical como a unidade dialética
educação-música (GONÇALVES, 2017). Dessa forma, educar musicalmente significa
organizar intencionalmente, espaços educativos para o desenvolvimento da musicalidade por
meio de processos educativos relacionais, afeto-intelectivos, criadores, expressivos,
compreensivos e sensíveis e conscientes.

A unidade dialética educação-música, enquanto educação do


desenvolvimento da musicalidade humana, cristalizada na atividade
musical educativa que pode se dar em qualquer ambiente social, na
teoria histórico-cultural de Vigotski, engloba as problemáticas que
estão imbuídas na arte da música: experiência musical, vivência
musical, criação musical, imaginação musical, combinação
musical, reprodução musical, emoção musical e sentimento
estético-musical, catarse musical, etc. (GONÇALVES, 2017,
p.250. Grifos do autor).

Para isso, é preciso vivenciar atividades educativas estético-musicais em que a vida se


faça presente de modo autêntico. Dessa forma, experiências musicais individuais, sociais,
históricas e culturais, assumem um lugar de grande importância. Não se pode educar

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musicalmente somente na dimensão intelectiva. Cada experiência vivida na cultura e suas
produções musicais estão impregnadas de sentidos e de significados, que devem ser
compartilhados de modos relacionais entre os participantes de cada processo educativo.
Assim, aprender e desenvolver-se musicalmente compreende trocar experiências musicais
de modo colaborativo.

Para Rezende (2018, p.16),

Todos são capazes de desenvolver sua musicalidade através de


suas experiências com, e no mundo sonoro durante a vida.
Experienciar, entender, organizar e manusear os sons faz parte da
trajetória de vida de cada indivíduo. E cabe a nós, (...) tentar
compreender essas possibilidades considerando os contextos e
cotidianos de nossos alunos, de nossas pesquisas e de nossas vidas
em seus processos naturais, nas suas diferentes experiências
musicais, contemplando a vida, e nos contextos educativos. O modo
escolarizado (fragmentação, hierarquização, seriação, quantificação,
etc.) de lidar com a experiência, às vezes negando-a, acontece, de
modo fragmentado e superficial. Acredita-se que as experiências
cotidianas são a essência do desenvolvimento humano nas diversas
atividades educativas. É importante pensar no desenvolvimento
como um processo que se dá através das relações sociais que
promovem mudanças qualitativas no sujeito

Educação musical, dessa forma, abrange:

1. Entender que todos somos seres musicais, seres de possibilidades, e que temos
experiências musicais, todas elas significativas. Assim, todas as experiências são
válidas e inquantificáveis;

2. Compartilhar experiências musicais individuais, sociais, históricas e culturais para


o aprendizado e desenvolvimento da musicalidade de todos (canções, ritmos,
diferentes fontes sonoras, instrumentos, etc). Esse desenvolvimento não
pressupõe, previamente, a chegada em um lugar comum. Pelo contrário, tem
como princípio a diversidade, ou seja, a caminhada (e não a chegada) por
diferentes pontos, que podem representar saltos qualitativos para tantos outros;

3. Organizar o espaço educativo por meio de trocas colaborativas entre todos, de


forma relacional, sem centralidades (seja do professor ou dos estudantes, de
currículos pré-estabelecidos). O professor, nesse processo, assume a importante
função de organizar o ambiente em sua intencionalidade. Mas, deve abrir mão de

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sua suposto “poder”, ou “centralidade” ou “hierarquia superior”. Todos aprendem
com todos, assim como na vida;

4. Organizar o processo educativo para a expressão, criação, compreensão e


vivência emocional por meio da atividade musical;

5. Estabelecer, como princípio educativo, o respeito todas as formas de expressões


musicais, sem julgamentos ou preconceitos, sem hierarquias culturais ou sociais;

6. Não há receitas. Cada grupo, por suas diferentes experiências musicais, irá trocar
diferentes processos educativos em música. Assim, cada processo é único,
singular, intransferível. Por isso mesmo, rico em sua singular diferença;

CONCLUSÕES

Uma educação musical organizada nessas bases, cria condições de possibilidade para
viver espaços educativos de forma mais humana, respeitosa, dialogada, compartilhada,
colaborativa e, assim, em liberdade de ser e de existir. Isso, porque, ao compartilhar as
próprias e diversas experiências musicais, respeitosamente, já estamos autenticando-as
como válidas, como importantes.

Nesse modo de educar, não há hierarquias, não há mais nem menos, nem melhor nem
pior. Há de outra forma, pessoas, todas importantes, todas capazes de compreender os
diferentes modos de expressão, criação, compreensão e vivências emocionais em música.
Todas como seres humanos culturais que são, com a possibilidade de desenvolver-se
musicalmente.

O desenvolvimento musical passa a ser, por meio dessa perspectiva, uma ação política no
mundo, um ato de emancipação. Ação de pessoas que se reconhecem como seres humanos
musicais na cultura. Todas elas importantes para a constituição da musicalidade de todos.

Esse é o caminho na, da e para a emancipação. É viver em liberdade dialogada. É ter


consciência de quem se é no mundo, mas com os outros. É saber que nos constituirmos por
meio das relações com todos os seres humanos. Que estes, e todas as suas criações
merecem o devido respeito, que já possuem seu lugar no mundo, principalmente na escola
pública, que é o lugar de todos.

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REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS

GONÇALVES, Augusto Charan Alves Barbosa. Educação musical na perspectiva


histórico-cultural de Vigotski: a unidade educação-música. Tese de Doutorado.
Universidade de Brasília, Faculdade de Educação. Brasília 2017. 277 pp. Acesso em
3/8/2018. Disponível em:

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MARTINEZ, Andréia Pereira de Araújo. Infâncias musicais: O desenvolvimento da


musicalidade dos bebês. Tese de Doutorado. Universidade de Brasília, Faculdade de
Educação. Brasília 2017. 307 pp. Acesso em 3/8/2018. Disponível em:

http://repositorio.unb.br/bitstream/10482/31631/1/2017_Andr%C3%A9iaPereiradeAra%C3%B
Ajo.pdf

PEDERIVA, Patrícia Lima Martins. A atividade musical e a consciência da


particularidade. Tese de Doutorado. Universidade de Brasília, Faculdade de Educação.
Brasília 2009. 207 pp. Acesso em 3/8/2018. Disponível em:<
http://repositorio.unb.br/bitstream/10482/4430/1/2009_PatriciaLimaMartinsPederiva.pdf>.

REZENDE, Murilo Silva. A folia do palmital: experiências que tecem musicalidades. Tese
de Doutorado. Universidade de Brasília, Faculdade de Educação. Brasília 2018. 150 pp. No
Prelo

VIGOTSKI, Lev Semionovich. Psicologia da Arte. Tradução de Paulo Bezerra. São


Paulo. Martins Fontes. 1999.

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