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Luci Kikuchi

Vogais Altas e Glides no Português Brasileiro e no


Inglês Britânico

Belo Horizonte

2001

Universidade Federal de Minas Gerais

Luci Kikuchi
Vogais Altas e Glides no Português Brasileiro e no
Inglês Britânico

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-


Graduação em Letras: Estudos Lingüísticos
como requisito parcial para obtenção do título
de Mestre em Lingüística, na linha de pesquisa
Estrutura Sonora da Linguagem.

Área de concentração: Lingüística

Orientadora: Profa. Dra. Thaïs Cristófaro Silva

UFMG

Belo Horizonte
Faculdade de Letras da UFMG
2001
Kikuchi, Luci
K62v Vogais altas e glides no português brasileiro e no inglês britânico
[manuscrito] / Luci Kikuchi. - 2001.
Xiii, 156 f. , enc. : il., color, graf. Tab.
Orientadora : Thaïs Cristófaro Silva
Dissertação (mestrado) – Universidade Federal de Minas Gerais,
Faculdade de Letras.
Bibliografia : f. 147-156

1. Gramática comparada e geral – Fonologia – Teses. 2. Língua


portuguesa – Fonética – Teses. 3. Língua inglesa – Fonética –
Teses. 4. Língua portuguesa – Vogais – Teses. 5. Língua inglesa –
Vogais – Teses. 6. Língua portuguesa – Gramática comparada –
Inglês – Grã-Bretanha – Teses. 7. Língua inglesa – Gramática
comparada – Português – Brasil – Teses. 8. Aquisição da
segunda linguagem – Teses. 9. Nasalidade (Fonética) – Teses.
I. Silva, Thaïs Cristófaro. II. Universidade Federal de Minas Gerais.
Faculdade de Letras. III. Título.

CDD : 414
Dissertação defendida e aprovada em 3/12/2001, pela banca examinadora constituída pelos
professores:

Profa. Dra. Thaïs Cristófaro Silva (orientadora)


Universidade Federal de Minas Gerais

Prof. Dr. César Reis


Universidade Federal de Minas Gerais

Prof. Dra. Carmen Lúcia Matzenauer Hernandorena


Universidade Católica de Pelotas
À Renata e ao Ubiratan
AGRADECIMENTOS

Este trabalho é fruto de muito esforço meu e de minha orientadora, Thaïs. Sem ela, este

fruto não teria brotado, crescido e amadurecido. Com ela, além de realizar este sonho que é esta

dissertação, cresci como profissional, pessoa, lingüista. Foi ela que me ensinou que “aluno aprende

melhor com carinho”, “quando aluno procura o professor, é porque precisa de ajuda”, mudando

minha postura como profissional. Não tenho palavras para agradecê-la.

Aos meus pais por terem me proporcionado esta educação e este incentivo. Sou o que sou

graças a eles. O alto investimento e o exemplo impecável do papai. Tenho certeza que ele está em

algum lugar desta eternidade feliz e orgulhoso. Mamãe, que me criou guerreira através de seu

exemplo e educação. Ao Boya e ao Eidi, meus discretos e equilibrados irmãos.

Ao Ubiratan que compartilhou todos os meus problemas, ou nossos. Obrigada por seu

apoio e por me ter dado esta criatura linda chamada Renata, que me deu o título de mãe durante o

mestrado.

Um agradecimento especial aos meus alunos e colegas da Unimontes por todo o apoio que

me foi dado em todos os sentidos. E principalmente aos meus alunos do 4o. e 6o. período que se

preocuparam comigo e meu estado de saúde. Agradeço a FAPEMIG e à UNIMONTES pelo apoio

financeiro e moral.

Agradeço meus chefes, colegas e os alunos do CCAA. Aos meus amigos, Ju, Andréia,

Andrey, Carmen, Aloísio, Edu, Marina, Beth, Helena, enfim todos que me escutaram, apoiaram

durante estes anos de luta. Aprender é uma luta árdua.


À Cida, por ter cuidado da minha Renatinha enquanto tentava recuperar uma noite de sono

perdida. E claro, à guerreira número 2 da casa, Helena, que vem lutando comigo há sete anos. E

que durante este mestrado, ficou com Rê dia e noite para eu finalizar esta obra. Helena é um

exemplo de amizade, fidelidade e dignidade.

Aos professores da UFMG que me apoiaram e me ensinaram muito.


“When he aims straight, he shoots higher
than man can see - past the stars –
to the place where all dreams are really born.”

Linda Goodman
SUMÁRIO

LISTA DE FIGURAS.....................................................................................................
LISTA DE TABELAS..................................................................................................... 10
RESUMO.......................................................................................................................... 11
12

1 INTRODUÇÃO.................................................................................................
1.1 Objeto de estudo................................................................................................ 13
1.2 Justificativa........................................................................................................ 13
1.3 Organização do trabalho.................................................................................... 14

1.4 Objetivos e Hipótese.......................................................................................... 18


20

2 FONÉTICA........................................................................................................
2.1 Introdução............................................................................................................ 21

2.2 A Produção dos sons da fala............................................................................... 21

2.3 As Vogais........................................................................................................... 22

2.4 Propriedades articulatórias................................................................................. 25


2.4.1 Altura do corpo da língua.................................................................................... 26
2.4.2 Grau de anterioridade/posterioridade da língua................................................ 27

2.4.3 Arredondamento dos lábios............................................................................... 28


29

2.5 Propriedades articulatórias das vogais.............................................................. 30


2.5.1 Vozeamento....................................................................................................... 30

2.5.2 Qualidade vocálica.......................................................................................... 32

2.5.3 Nasalização........................................................................................................ 33

2.5.4 Duração.............................................................................................................. 34
2.5.5 Tensão................................................................................................................ 35
2.5.5 Notação dos segmentos vocálicos...................................................................... 36

2.6 O Método das vogais cardeais............................................................................ 37

2.7 As Propriedades acústicas.................................................................................. 42

2.8 Os Correlatos acústicos das propriedades articulatórias.................................... 50


2.9 A 52

Sílaba............................................................................................................... 54

2.10 Acento................................................................................................................. 57

2.11.1 Vogais altas e glides no português brasileiro.................................................... 57


2.11.2 As Vogais altas no português brasileiro............................................................ 57
2.12 Os Ditongos no português brasileiro.................................................................... 61
2.12.1 Vogais altas e glides no inglês britânico........................................................... 65
2.12.2 As Vogais altas no inglês britânico................................................................... 65
2.12.3 Os Ditongos do inglês britânico........................................................................ 69
2.12.3 Os Glides /j, w/ no inglês britânico.................................................................. 72

2.13 Conclusão.......................................................................................................... 73

3 FONOLOGIA.................................................................................................. 76
3.1 Introdução.......................................................................................................... 76
3.2 O Modelo fonêmico........................................................................................... 77
3.2.1 Introdução.......................................................................................................... 77
3.2.2 Fonemas............................................................................................................. 78
3.2.3 Distribuição complementar................................................................................ 79
3.2.4 Variação livre.................................................................................................... 80
3.2.5 Princípio de pressão estrutural........................................................................... 80
3.2.6 A Análise fonêmica das vogais altas e dos glides no português brasileiro....... 82
3.2.6.1 A Alofonia de /i/ no português brasileiro.......................................................... 83

3.2.6.2 A Alofonia de /u/ no português brasileiro......................................................... 88

3.2.6.3 Conclusão.......................................................................................................... 91
3.2.7 A Análise fonêmica das vogais altas e dos glides no inglês britânico.............. 92
3.2.7.1 Os Fonemas /i, u, , /................................................................................... 92

3.2.7.2 Os Ditongos no inglês britânico........................................................................ 95


3.2.7.3 Os Glides [j, w] no inglês britânico.................................................................. 97

3.2.7.4 Conclusão........................................................................................................... 99
3.2.7.5 Conclusão geral de fonêmica............................................................................. 99
3.3 O Modelo gerativo padrão................................................................................. 102
3.3.1 Introdução.......................................................................................................... 102
3.3.2 Os Traços distintivos......................................................................................... 103
3.3.3 Traços de classes principais.............................................................................. 104
3.3.4 Traços de corpo da língua................................................................................. 105
3.3.5 Traços relacionados com o formato dos lábios................................................. 105
3.3.6 Traços prosódicos.............................................................................................. 106
3.3.7 As Vogais altas e os glides no português brasileiro.......................................... 107
3.3.7.1 Introdução......................................................................................................... 107
3.3.7.2 Processos fonológicos no português brasileiro................................................. 109
3.3.7.3 Conclusão.......................................................................................................... 112
3.3.8 As Vogais altas e glides no inglês britânico..................................................... 113
3.3.8.1 Introdução......................................................................................................... 113
3.3.8.2 Processos fonológicos no inglês britânico......................................................... 114
3.3.83 Conclusão.......................................................................................................... 116
3.3.8.4 Conclusão geral do modelo gerativo padrão..................................................... 116
3.4 O Modelo da fonologia autossegmental........................................................... 117
3.4.1 As Vogais altas e os glides no português brasileiro.......................................... 121
3.4.1.1 Os Glides pré-vocálicos..................................................................................... 123
3.4.1.2 Os Glides pós-vocálicos..................................................................................... 128
3.4.1.3 A Vogal alta longa............................................................................................. 130
3.4.1.4 Conclusão.......................................................................................................... 131
3.4.2 As Vogais altas e os glides no inglês britânico .............................................. 131
3.4.2.1 Conclusão.......................................................................................................... 136
3.4.2.2 Conclusão do modelo autossegmental............................................................... 136
3.5 O Modelo teórico da otimalidade....................................................................... 137
3.5.1 Introdução.......................................................................................................... 137
3.5.2 Formalismo da teoria da otimalidade................................................................ 140
3.5.3 Análise das vogais altas e glides no português brasileiro pela teoria da
otimalidade........................................................................................................ 142
3.5.4 Análise das vogais altas e glides no inglês britânico pela teoria da
otimalidade........................................................................................................ 145
3.5.5 Conclusão geral................................................................................................. 147

4 CONCLUSÃO.................................................................................................. 148

5 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.......................................................... 151


LISTA DE FIGURAS

1 O Sistema respiratório e fonatório..................................................................... 23


2 O Trato vocal..................................................................................................... 24
3 O Limite vocálico.............................................................................................. 25
4 Posição da língua na produção das vogais cardeais.......................................... 28
5 Tipos de arredondamento dos lábios................................................................. 30
6 As Oito vogais cardeais..................................................................................... 38
7 Vogal alta falada por um homem a uma freqüência fundamental
de 120 hz............................................................................................................ 44
8 Gráfico de freqüência de formantes vogais........................................................ 50
9 Esquema do esforço muscular e da curva da força silábica .............................. 52
10 As Vogais altas do português de Belo Horizonte............................................... 59
11 F1 e F2 no português europeu, português brasileiro e as vogais cardeais.......... 60
12 Os Ditongos[ai] e [aυ] no português brasileiro.................................................. 61
13 As Vogais altas do inglês RP............................................................................. 65
14 Espectrogramas das vogais altas do inglês....................................................... 67
15 Os Ditongos do RP............................................................................................ 69
16 Diagrama da teoria da otimalidade................................................................... 136
LISTA DE TABELAS

1 As VC1 a VC8................................................................................................... 39
2 As VC9 a VC16................................................................................................. 40
3 As VC17 a VC22............................................................................................... 40
4 Resultados de J.C. Wells obtidos em 1962........................................................ 46
5 Alofones das vogais altas no português brasileiro............................................. 58
6 Valores das F1 e F2 das vogais altas, medidos em Hz...................................... 60
7 Ocorrência de vogais altas, ditongos e glides do português brasileiro e no
inglês britânico.................................................................................................. 75
8 Os Alofones do fonema /i/ no português brasileiro. Sendo que V=vogal,
C=consoante....................................................................................................... 87
9 Os Alofones do fonema /u/ no português brasileiro .......................................... 91
8 Tabela comparativa de vogais altas e glides no português brasileiro e no
inglês britânico.................................................................................................. 99
9 Traços distintivos para as vogais altas no português brasileiro......................... 107
10 Traços utilizados na caracterização de /i,u,j,w/ no português brasileiro........... 108
11 Traços distintivos dos alofones das vogais altas e glides no português
brasileiro........................................................................................................... 108
12 Traços distintivos das vogais altas e glides no inglês britânico........................ 113
13 Tableau da língua hipotética............................................................................. 141
14 Tableau da representação de "lua".................................................................... 143
15 Tableau da representação de "pai".................................................................... 144
16 Tableau da representação de "see".................................................................... 146
17 Inventários fonéticos e fonológicos das vogais altas no português brasileiro e
no inglês britânico............................................................................................. 149
RESUMO

Este trabalho faz uma análise fonética e fonológica das vogais altas /i, u/ e glides

/j, w/ no português brasileiro e no inglês britânico RP (Received Pronunciation). O RP

foi escolhido por considerado modelo de pronúncia no ensino do inglês britânico aos

aprendizes de inglês como segunda língua (MCARTHUR, 1992). Esta pesquisa apontará

semelhanças e diferenças nas vogais altas /i, u/ e os glides /j, w/ nos dois sistemas

sonoros. Estes sons foram escolhidos pela alta ocorrência nas línguas naturais. Este

trabalho também pretende descrever os traços articulatórios e acústicos desses sons e

pretende contribuir para o estudo fonético e fonológico das vogais altas e glides.Também

pretende mostrar e entender melhor a distribuição complementar destes sons para

pesquisas futuras em lingüística e em lingüística aplicada.


ABSTRACT

The present work analyses the high vowels /i, u/ and the glides /j, w/ in Brazilian

Portuguese and British English (RP). This particular English dialect was chosen for being

considered a model of pronunciation for the teaching of English as a second language.

(MACARTHUR, 1992). This study will show similarities and differences among the high

vowels /i, u/ and the glides /j, w/ in the sound systems of the two languages. These

sounds have been chosen due to its high occurrence in the natural languages. This research

also describes articulatory and acoustic features of these sounds and intends to contribute

for the phonetic and phonological study of the high vowels and glides of the natural

languages. It also shows the complementary distribution of these sounds in order to

contribute to future researches in linguistics and applied linguistics.


13

1. INTRODUÇÃO

1.1 O Objeto de estudo

As línguas do mundo alternam segmentos vocálicos e consonantais na constituição

de enunciados. Foneticamente, os segmentos consonantais são produzidos com algum tipo

de obstrução no fluxo de ar nas cavidades acima da glote, no trato oral, podendo haver

fricção ou não. Na produção dos segmentos vocálicos, em oposição, não ocorre obstrução

ou fricção no trato oral. A categorização dicotômica de consoantes e vogais é explícita

foneticamente a partir da obstrução ou não da passagem da corrente de ar pelo trato vocal.

No entanto, alguns segmentos podem não ter interpretação fonológica tão explícita quanto

ao seu estatuto como vogal ou como consoante. Estes segmentos serão denominados glides

neste trabalho1.

Os glides são segmentos que podem ser fonologicamente interpretados em algumas

línguas como vogais e em outras línguas como consoantes (Trask, 1996). Foneticamente,

tanto os glides quanto as vogais, são sons produzidos continuamente e sem fricção. Neste

trabalho, trataremos dos glides palatais e velares.2 Glides palatais podem ser transcritos

como /j, y, , /. Glides velares podem ser transcritos como /w, j, /.

Alguns sons da fala são ditos universais devido a sua ocorrência em todas ou em

quase todas as línguas naturais. As vogais altas [i,u] e a vogal baixa [a] fazem parte

1
“A palavra glide, de que também nos valemos, já se encontra documentada da Literatura Lingüística
Portuguesa” (BISOL ,1989). A classificação fonética tradicional denomina os glides, semivogais.
14

deste inventário universal. De acordo com Picket (1999), há três vogais correspondentes

aos três extremos de constrição no trato oral. Picket denomina estas vogais como “vogais

de ponta” que em princípio ocorrem em todas as línguas naturais e podem ser classificadas

como:

Vogais de ponta

. [i] – posição anterior e alta da língua, lábios estendidos


. [u] – posição posterior e alta da língua, lábios arredondados
. [a] – posição baixa e central da língua, lábios estendidos

Estas três vogais fazem parte de um sistema vocálico triangular e simétrico

considerado básico nas línguas naturais (Roca/Johnson, 1999). Elas são tão comuns que

são referidas como o padrão das três vogais básicas. Jakobson afirmou que [i,a,u] são

universalmente os três primeiros fonemas vocálicos que se manifestam na fala da criança

(Schane, 1973).

As vogais altas e os glides foram escolhidos como tema de pesquisa devido a sua

alta ocorrência nas línguas naturais, pela alternância possível entre os glides e as vogais

altas e pelo estatuto fonológico variável destes sons, ora como vogais, ora como

consoantes.

1.2 Justificativa

2
Alguns autores consideram [r] como glide na análise do inglês (O'CONNOR, 1980). Os argumentos para
esta opção seguem da interpretação fonológica assumida.
15

Pretendemos demonstrar nesta seção, que as vogais altas /i, u/ podem ser

agrupadas como pertencendo a uma classe natural. Dizemos que dois segmentos pertencem

a uma classe natural quando um ou mais dos requisitos relacionados a seguir, são

preenchidos (Hyman, 1975):

• Os dois segmentos submetem-se a mesma regra fonológica;


• Os dois segmentos juntos mudam em ambientes específicos;
• Um segmento é transformado em outro segmento através de uma regra fonológica;
• Um segmento é derivado no ambiente de outro segmento.

Essencialmente, todos os elementos pertencentes a uma certa classe natural

apresentam comportamento semelhante. Os segmentos da classe natural condicionam ou

são submetidos a um processo fonológico devido a alguma característica fonética que é

compartilhada por estes segmentos.

Por exemplo, é comum o fato de ocorrer a palatalização de consoantes no contexto

de vogais altas. Dizemos que ocorre um processo de palatalização. Este processo é

motivado pelo fato da vogal alta anterior [i] ser produzida pela aproximação da língua ao

palato duro. Este fenômeno de palatalização ocorre em várias línguas, dentre elas o

papago, o kongo do sul e o português do Brasil. Vamos discutir cada um destes casos a

seguir. Considere em (1) os dados do papago (Halle & Clements, 1994).3

(1) a. [bidZim] virar-se


b. [tapan] repartir
c. [hidod] cozinheiro
d. [tkid] vacinar

3
Língua da família Uto-Asteca, falada no estado do Arizona (USA) e no México.
16

e. [atwid] atirar
f. [tuku] tornar-se preto
g. [dasp] pressionar com a mão
h. [toha] tornar-se branco
i. [duki] chuva
j. [hwid] cheiro
k. [tiha] contratar
l. [toi] esquentar
m. [widut] ritmo
n. [tatad] pés
o. [kitud] construir uma casa para
p. [dodom] copular
q. [tatam] tocar

No papago, as oclusivas [t, d] estão em distribuição complementar com as

africadas [t, d]. Estes grupos de segmentos ocorrem em ambientes exclusivos.

Precedendo a vogal alta e suas variantes ocorrem as africadas alveopalatais [t, d]. Nos

demais ambientes, ou seja, antes de outras vogais ocorrem as oclusivas alveolares [t, d].

Examine os dados abaixo, que são do congo do sul (Halle & Clements, 1994).4

(2) a.[tobola] ter um buraco


b.[tina] cortar
c.[kesoka] ser cortado
d. [nkoi] leão
e. [zena] cortar
f. [ima] esticar
g. [kasu] emagrecer
h. [tiba] banana
i. [nselele] cupim
j. [loloni] lavar
k. [zevo] então
l. [aimola] esmola

4
Língua da família Bantu, falada em Angola.
17

m. [nzwetu] nossa casa


n. [kunezulu] para o céu
o. [tanu] cinco
No kongo do sul, os segmentos consonantais alveolares [t, s, z] encontram-se em

distribuição complementar com as consoantes palatais [t, , ]. Podemos perceber que as

consoantes alveolares tornam-se palatais quando precedem as vogais altas anteriores.

Precedendo as outras vogais, as consoantes alveolares ocorrem.

Em alguns dialetos do português brasileiro, como por exemplo o de Belo Horizonte,

as oclusivas alveolares [t, d] são palatalizadas quando seguidas da vogal alta anterior.

Considere os dados abaixo:

(3) a. [tatu] “tatu”


b. [tu] “tua”
c. [ti] “tia”
d. [tt] “teto”
e. [dat] “data”
f. [di] “dia”
g. [dus] “duas”
h. [atls] “atlas”
i. [tres] “três”

Os exemplos acima demonstram que as consoantes africadas [t, d] ocorrem

seguidas da vogal alta anterior [i]. Nos demais ambientes, ou seja, antes das demais vogais

e seguidas de consoante na mesma sílaba, ocorrem as consoantes [t, d].


18

Podemos concluir pelos exemplos apresentados em (1-3) que as vogais altas

anteriores podem desencadear o fenômeno fonológico conhecido como palatalização. Ou

seja, quando uma consoante oclusiva alveolar precede uma vogal alta anterior é

transformada em consoante africada através do fenômeno fonológico da palatalização.

As vogais altas numa mesma classe natural, em várias línguas naturais, apresentam

a alternância entre vogais altas e os glides correspondentes. Por exemplo, no francês há três

semivogais correspondentes às vogais altas, havendo alternância entre as três vogais altas e

seus respectivos glides, (Schane,1973). A alternância (e/ou variação) entre vogais altas e

glides é atestada também em espanhol e em italiano.

Considerando-se que as vogais altas são segmentos tidos como universais e

considerando-se também que estes segmentos podem ser agrupados numa mesma classe

natural, optamos em investigar o comportamento das vogais altas e dos glides no português

brasileiro e no inglês britânico. Na próxima seção, apresentamos a organização geral desta

dissertação.

1.3 Organização do trabalho

Este trabalho está dividido em duas partes principais: “Fonética” (capítulo 2) e

“Fonologia” (capítulo 3). Os dados desta pesquisa são oriundos de fontes secundárias que

descrevem e analisam vogais altas e glides no português brasileiro e no inglês britânico. Os

dados do português brasileiro são do dialeto padrão de Belo Horizonte. Os dados do inglês
19

são do inglês britânico, o R.P. (Received Pronunciation).5 Quando pertinente, avaliamos

dados adicionais para corroborar ou refutar uma proposta de análise.

O capítulo 2, ''Fonética'', discute inicialmente a relação entre a fonética e a

fonologia. Procede-se então a descrição fonética articulatória e a caracterização acústica

das vogais altas e glides. As descrições fonéticas baseiam-se nos estudos de Pike (1943);

Abercrombie (1967); Jones (1969); Câmara Júnior (1970); Bisol (1989); Callou & Leite

(1990); Ladefoged (1996); Cagliari (1998) e Cristófaro Silva (1999a). Além da descrição

articulatória, as vogais são descritas pelo método das vogais cardeais e este método

considera parâmetros articulatórios e auditivos na descrição dos segmentos vocálicos.

Discute-se ainda, a noção de sílaba e de acento, pois tais noções são importantes para a

descrição e análise apresentadas para as vogais altas e glides no português brasileiro e no

inglês britânico.

O capítulo de ''Fonologia'' discute análises fonológicas potenciais das vogais altas e

glides no português brasileiro e no inglês britânico em quatro modelos fonológicos: O

Modelo Fonêmico, o Modelo da Fonologia Gerativa Padrão, o Modelo Autossegmental e o

Modelo da Otimalidade. Cada uma destas análises pretende indicar os pontos positivos de

cada modelo e indicar aspetos a serem aprimorados nas propostas teóricas subseqüentes. O

Modelo Estrutural ou a Fonêmica foi escolhido por ser um modelo fonológico pioneiro. O

Modelo da Fonologia Gerativa Padrão proposto por Chomsky & Halle (1968), influenciou

todas as teorias fonológicas que o seguiram. O Modelo da Fonologia Autossegmental de

Goldsmith (1990), salienta-se por dar um estatuto teórico à sílaba (que passa a operar como

5
Received Pronunciation (RP) é a forma de pronúncia mais descrita em livros de fonética de inglês britânico
e tradicionalmente ensinado a aprendizes de inglês como segunda língua ou língua estrangeira.
20

constituinte). O último modelo a ser discutido, o da Otimalidade, é o modelo dos anos 90,

o modelo corrente.

1.4 Objetivos e Hipótese

O objetivo deste trabalho é apresentar um estudo fonético e fonológico das vogais

altas e glides no português brasileiro e no inglês britânico. Tal estudo é relevante pelo fato

de não contarmos com trabalhos anteriores, cujo objetivo específico seja o de analisar as

vogais altas e glides em profundidade nestas duas línguas. Os objetivos específicos deste

trabalho são:

• Descrever foneticamente as vogais altas e glides no português brasileiro e inglês

britânico em termos articulatórios e acústicos, explicitando seus ambientes de

ocorrência e identificando o comportamento destes segmentos na estrutura silábica.

• Descrever e avaliar o comportamento fonológico das vogais altas e glides no

português brasileiro e no inglês britânico.

• Analisar a pertinência e adequação de quatro modelos fonológicos para a análise

das vogais altas e glides no português brasileiro e no inglês britânico.

Tomamos como hipótese básica que as vogais altas e os glides operam de maneira

diferente na estrutura sonora do português brasileiro e no inglês britânico. Portanto, esta é a

hipótese a ser investigada nesta pesquisa. Acreditamos que se compreendermos o

comportamento destes sons nas duas línguas, contribuiremos também para a discussão

teórica do ensino e aprendizado de inglês ou português como segunda língua. Portanto,


21

como objetivo final, este trabalho pretende servir como orientação para pesquisas futuras

tanto na área de concentração da lingüística como na área da lingüística aplicada.

2. FONÉTICA

2.1 Introdução

A lingüística é a ciência que estuda os fenômenos ligados à linguagem humana, que

procura explicar os princípios e características que regulam as estruturas da língua. É

dividida em áreas, entre as quais, a fonética e a fonologia, (Cagliari, 1997). Ambas as

ciências estudam os sons usados na fala ou o sistema sonoro de uma língua, sendo a

fonética a base para a fonologia.

A fonética é a ciência que apresenta métodos de descrição fisiológica, física e

classificação dos sons das línguas naturais (Cristófaro Silva, 1999a). A fonética permite-

nos descrever os mecanismos e os processos que estão envolvidos na produção da fala. O

papel principal do foneticista é descrever o que acontece tanto com o falante durante sua

fala, quanto com o ouvinte quando a capta (Ladefoged, 1982). Numa perspectiva mais

ampla, podemos dizer que a fonética baseia-se na produção, percepção e transmissão dos

sons da fala. A fonética pode ser dividida em áreas de interesse que são:

• Fonética articulatória: É a área de investigação mais antiga, conseqüentemente a

mais sólida dentro da fonética lingüística (Cagliari & Massini-Cagliari, 2001). A

fonética articulatória consiste no estudo da produção da fala do ponto de vista

fisiológico e articulatório. Os sons da fala são descritos a partir dos movimentos

atestados no aparelho fonador que estão envolvidos na articulação.


22

• Fonética auditiva: Estudo da percepção da fala. Ou seja, como as ondas sonoras da

fala são analisadas e identificadas pelo ouvido e o cérebro humano (Crystal, 1997).

• Fonética acústica: Estudo das propriedades físicas dos sons da fala a partir de sua

transmissão do falante ao ouvinte. Descreve como estes sons são transmitidos a

partir das propriedades físicas ou acústicas. (Cagliari & Massini-Cagliari, 2001).

• Fonética instrumental: Estudo das propriedades físicas da fala, com o suporte de

instrumentos laboratoriais. Existem muitos instrumentos disponíveis atualmente

para o estudo da produção da fala, como equipamento para gravar a fala, ou para

analisar as propriedades acústicas da fala ou para investigar a fisiologia das cordas

vocais.

A fonética investiga também os sons em relação uns aos outros, analisa a

organização dos segmentos em unidades maiores (como sílabas, por exemplo) e avalia a

organização do acento e de estruturas supra-segmentais (como o ritmo e a entoação). Neste

trabalho, limitaremos à avaliação segmental das vogais altas e glides. A descrição fonética

apresentada é baseada em propriedades articulatórios, auditivos e acústicos.

2.2 A Produção dos sons da fala

Os sons da fala são produzidos com algum tipo de interferência em uma corrente de

ar em movimento no trato vocal. A corrente de ar é a fonte de energia dos sons da fala. A

interferência na corrente de ar usada para a produção dos sons da fala é denominada


23

mecanismo de corrente de ar. A FIG.1 a seguir representa o sistema respiratório e o

fonatório.

FIGURA 1 O Sistema respiratório e fonatório.


FONTE - CRYSTAL, 1997. p. 124.

O sistema respiratório compreende os pulmões que são órgãos esponjosos contidos

dentro de uma cavidade formada pela caixa torácica e o diafragma. No sistema respiratório

tem-se ainda os músculos pulmonares, os tubos brônquios e a traquéia. Quando o

diafragma, que é um músculo, move-se para cima, há compressão da caixa torácica,

fazendo a corrente de ar fluir em direção oposta aos pulmões. Este é o mecanismo de

corrente de ar mais comum nas línguas do mundo - o mecanismo de corrente de ar

pulmonar egressivo. Neste mecanismo, o ar expelido dos pulmões em direção à boca e/ou

ao nariz. No português e no inglês, as línguas em estudo, todos os segmentos são

produzidos com o mecanismo de corrente de ar pulmonar egressiva.


24

Há também o sistema fonatório que se localiza na laringe. Neste sistema ocorre o

vozeamento (ou sua ausência) na produção dos sons. As cordas vocais são responsáveis

pelo vozeamento.

O sistema articulatório compreende a faringe, a língua, o nariz, os dentes e os

lábios. O sistema articulatório é responsável pela modificação na estrutura da cavidade oral

através do movimento dos articuladores indicados acima. Considere a FIG. 2 abaixo, que

representa o trato vocal com os articuladores passivos e ativos envolvidos na produção dos

sons da fala.

FIGURA 2 O Trato vocal


FONTE - SMALL, 1999, p. 42.

Os sons da fala são articulados com a modificação do trato vocal, a ação dos

articuladores ativos e passivos, e com a passagem da corrente de ar. Assim são produzidos

os segmentos vocálicos e consonantais. No caso das vogais, ocorre primordialmente a

modificação da posição da língua. Uma pequena alteração na configuração da língua causa

efeitos articulatórios, auditivos e acústicos significativos. Na próxima seção, definimos o


25

conceito de segmento vocálico e procedemos à descrição dos segmentos a serem

investigados nessa dissertação.

2.3 As Vogais

Segmentos ou fones são os sons da fala que compõem um enunciado. Estes

segmentos podem ser arranjados em padrões diferentes para formar sílabas, que por sua

vez formam palavras, que finalmente formam um enunciado. Os segmentos podem ser

divididos em duas categorias: vogais e consoantes. As vogais são produzidas sem

obstrução no trato vocal e na articulação das consoantes há obstrução no trato vocal. Estas

categorias – vogais e consoantes - são definidas por este critério fonético básico que se

relaciona à obstrução (ou não) do trato vocal.

Jones (1969), estabeleceu uma linha vocálica na altura do palato na boca,

simbolizada pela linha pontilhada que aparece na FIG. 3 abaixo.

FIGURA 3 O Limite vocálico


FONTE - JONES, 1969. p. 13
26

Durante a articulação de um som, se a língua ultrapassar a linha vocálica ocorre um

som friccional que caracteriza um segmento consonantal. Por outro lado, se a língua não

ultrapassar a linha vocálica (e, portanto, se não ocorrer fricção audível), teremos a

produção de um segmento vocálico.

Contudo, durante a produção da fala, há uma constrição ou estreitamento em

alguma parte do trato vocal tanto na produção dos segmentos vocálicos, quanto nos

consonantais (Picket, 1999). Os segmentos vocálicos, em termos fisiológicos, são sons

tipicamente produzidos com a aproximação ou constrição dos articuladores, mas com

ausência de obstrução ou fricção no trato vocal. Os segmentos consonantais, por outro

lado, são produzidos com estritura6. A produção dos segmentos consonantais envolve um

contato ou aproximação de áreas dos articuladores ativo e passivo relativamente maior,

ultrapassando a linha vocálica proposta por Daniel Jones. (cf. FIG. 3).

Entendemos como segmento vocálico qualquer som que seja produzido com a

língua abaixo da linha que define o limite vocálico. Ao ingressar na linha do limite

vocálico ocorre a fricção, que caracteriza um segmento consonantal.

2.4 Propriedades articulatórias

As propriedades articulatórias descritas nesta seção, que são utilizadas para a

classificação dos segmentos vocálicos são baseados em Cagliari (1981); Ladefoged (1982);

Cristófaro Silva (1999a) e Cagliari & Massini-Cagliari (2001). Os segmentos vocálicos

6
Estritura é a posição assumida pelo articulador ativo em relação ao passivo, indicando como e em que grau
a passagem da corrente de ar através do aparelho fonador (ou trato vocal) é limitada neste ponto
(ABERCROMBIE, 1967. p. 44). A partir da natureza da estritura, classificamos os segmentos consonantais
quanto à maneira ou modo de articulação (CRISTÓFARO SILVA, 1999a).
27

podem ser classificados ou descritos por três traços articulatórios básicos mencionados

abaixo.

1. Altura do corpo da língua;


2. Grau de anterioridade/posterioridade da língua;
3. Arredondamento ou não dos lábios.
A seguir cada um destes traços articulatórios será considerado separadamente.

2.4.1 Altura do corpo da língua

Os segmentos vocálicos podem ser classificados como altos, médios ou baixos,

quanto a altura da língua na cavidade oral no eixo vertical. Quando, na produção de um

segmento vocálico, a língua encontra-se na parte superior da cavidade oral em um ponto

alto, estes segmentos vocálicos produzidos são chamados vogais altas.

Os segmentos /i/ e o /u/, objetos desta pesquisa, são classificados como vogais

altas, pois durante sua produção, a língua encontra-se elevada dentro da cavidade oral. Os

segmentos vocálicos produzidos quando o corpo da língua encontra-se em um ponto baixo

em oposição ao ponto alto, são denominados vogais baixas, por exemplo, o /a/. Quando a

posição da língua é intermediária, temos vogais médias.

Dependendo da língua, pode haver alturas intermediárias, quanto à caracterização

das vogais médias. Na descrição do português, há quatro níveis de altura: alta, média-alta,

média-baixa e baixa (Cristófaro Silva, 1999a). Na descrição do inglês, Ladefoged (1982)

considera três níveis de altura: alta, média e baixa.


28

FIGURA 4 Posição da língua na produção das vogais cardeais.


FONTE – JONES, 1969. p. 19 - 20.

A FIG. 4 acima, indica a posição da altura da língua durante a articulação dos

segmentos vocálicos. No diagrama da esquerda, o segmento /i/ é classificado como alto.

Os segmentos /e, / são classificados como médios e o segmento /a/ é classificado como

baixo. Já no diagrama da direita, o segmento /u/ é classificado como alto, os segmentos

/o, / classificados como médios. E o segmento // é classificado como baixo. A

diferença entre o diagrama da esquerda é da direita está no grau de anterioridade e

posterioridade da língua, que será discutido a seguir.

2.4.2 Grau de anterioridade/posterioridade da língua

Os segmentos vocálicos podem ser classificados também pelo grau de anterioridade

e posterioridade da língua. Neste caso, é considerada a posição da língua no eixo horizontal

da cavidade bucal, dividindo-a em três partes. Se, na produção da vogal, o corpo da língua

estiver na parte da frente da cavidade bucal, a vogal é classificada como anterior. Se o

corpo da língua estiver na parte média da cavidade bucal, a vogal é classificada como
29

central e, finalmente, se o corpo da língua estiver na parte de trás da cavidade bucal, a

vogal é classificada como posterior.

Na FIG. 4, as vogais do diagrama da esquerda são classificadas como vogais

anteriores /i, e, , a/. As vogais do diagrama da direita são classificadas como vogais

posteriores: /u, o, , /. Dos segmentos a serem analisados neste trabalho, podemos,

portanto, classificar a vogal /i/ como anterior e a vogal /u/ como posterior.

2.4.3 Arredondamento dos lábios

O terceiro parâmetro articulatório envolvendo os segmentos vocálicos é a posição

assumida pelos lábios. Durante a produção de um segmento vocálico os lábios podem estar

arredondados ou estendidos. O arredondamento nos lábios resulta no alongamento da caixa

de ressonância.

Na maioria das línguas do mundo, há uma relação previsível entre as dimensões

fonéticas de grau de posterioridade da língua e arredondamento dos lábios. As vogais

anteriores são, em geral, produzidas com os lábios estendidos e as vogais posteriores são

produzidas com os lábios arredondados. No entanto, podem ser encontradas vogais

posteriores estendidas e vogais anteriores arredondadas, (Ladefoged, 1996). No francês, a

vogal simbolizada por [y], é alta, anterior e arredondada. No japonês, a vogal alta

posterior, [], é produzida com os lábios estendidos.


30

No português, o segmento [u] é produzido com os lábios arredondados e o

segmento [i] é produzido com os lábios estendidos. Este padrão que é apresentado no

português ocorre na maioria das línguas naturais. A Fig. 5 abaixo apresenta as posições dos

lábios quanto ao arredondamento, sugerida por Jones (1969).

FIGURA 5 Tipos de arredondamento dos lábios


FONTE - JONES, 1969. P. 17

(a) Lábios estendidos (b) Posição neutra (c) Arredondamento aberto (d) Arredondamento fechado

Na Fig. 5 acima, os lábios encontram-se estendidos em (a), na posição neutra em

(b), em posição de arredondamento aberto em (c) e finalmente em posição de

arredondamento fechado em (d) (Jones, 1969).

2.5 Propriedades articulatórias das vogais

Nesta seção, trataremos da noção de vozeamento e de qualidade vocálica. Estas

duas noções são muito importantes para a compreensão dos segmentos vocálicos.

2.5.1 Vozeamento

O ar que sai dos pulmões para a produção dos sons da fala, sobe pela traquéia,

laringe e neste ponto, passa entre dois pequenos músculos denominados cordas vocais. Se

as cordas vocais estiverem separadas, como geralmente estão quando respiramos


31

normalmente, a corrente de ar que sai dos pulmões passará livremente em direção à boca.

Porém, se as cordas vocais estiverem se aproximando, deixando apenas uma abertura

estreita para a passagem da corrente de ar, esta corrente de ar causará vibração das cordas

vocais.

Os sons produzidos com a vibração das cordas vocais são chamados de sons

vozeados. Por sua vez, os sons produzidos com as cordas vocais abertas, (quando não

ocorre vibração das cordas vocais) são denominados sons desvozeados. O grau de

vozeamento dos segmentos é, em geral, importante para a distinção dos sons nas línguas

naturais. Por exemplo, em português, temos as palavras “faca” /faka/ e “vaca” /vaka/

sendo que o que basicamente distingue estas palavras é o som inicial. O som /f/ é

desvozeado e o som /v/ é vozeado.

As vogais produzidas isoladamente são tipicamente vozeadas, ou seja, produzidas

com a vibração das cordas vocais. No entanto, dependendo do contexto, os segmentos

vocálicos podem ser desvozeados. Ou seja, se pode ter segmentos vocálicos produzidos

com ausência de vozeamento. Em certos contextos, quando os segmentos adquirem uma

característica fonética de sons vizinhos, uma vogal tende a se tornar desvozeada. Por

exemplo, no português brasileiro, o som // final que antecede o /t/ em ‘pato’ /pat/, pode

ser classificado como desvozeado. Isso se deve ao fato da vogal final // assimilar a

propriedade de desvozeamento do som anterior /t/, que é um segmento desvozeado.

Utiliza-se o símbolo de um círculo colocado abaixo da vogal para indicar o

desvozeamento. A ausência deste diacrítico expressa que a vogal é vozeada.


32

2.5.2 Qualidade vocálica

Todos os sons ou segmentos vocálicos e consonantais de uma língua possuem uma

qualidade de som distintiva e única associada a um único formato do trato vocal e um

padrão vibratório correspondente ou ressonância. Cada som da fala tem uma única

característica de ressonância que não o deixa ser confundido com outro som. A qualidade

transforma cada som em uma entidade única (Small, 1999).

Durante a articulação dos sons da fala, a língua e outros articuladores modificam a

sua posição no trato vocal. Esta mudança de posição dos articuladores modifica, portanto,

o espaço de ressonância ou freqüências naturais de vibração da corrente de ar no trato

vocal, para produzir os sons vocálicos e consonantais diferentes. Os três traços

articulatórios das vogais expostos acima – ou seja, altura do corpo da língua, grau de

anterioridade/posterioridade da língua e arredondamento dos lábios - contribuem para a

determinação da qualidade vocálica ou timbre de um segmento vocálico.

A qualidade de um som vocálico depende do formato da caixa de ressonância (a

cavidade pulmonar, a cavidade bucal e a cavidade nasal) no trato vocal. Portanto, a posição

assumida pela língua no eixo da cavidade bucal (no sentido vertical e horizontal)

associados ao formato dos lábios, caracteriza a qualidade de uma vogal (Abercrombie,

1967). Por exemplo, a vogal [i] representa a vogal alta anterior não-arredondada oral, com

qualidade diferente da vogal [] que também é vogal alta anterior não-arredondada oral.
33

2.5.3 Nasalização

Qualquer segmento – consoante ou vogal - pode ser oral ou nasal. Um segmento é

nasal quando o mesmo é produzido com o abaixamento do véu palatino, permitindo que a

corrente de ar ou parte desta escape pelo nariz. Este abaixamento do véu palatino altera a

área de circulação da corrente de ar no trato vocal (nas cavidades oral e nasal) e altera a

qualidade vocálica. No entanto, a nasalização altera muito pouco a qualidade vocálica, por

isso, ao transcrever os segmentos vocálicos nasais, a maioria dos autores usa os mesmos

símbolos vocálicos, com o acréscimo de um “til” (~) colocado acima da vogal oral. Por

exemplo, [a] oral e [a], sua correspondente nasal.

Em algumas línguas há o contraste entre vogais orais e nasais (Ladefoged, 1982).

Por exemplo, em português, “vi” [vi] e “vim [vi]. Contudo, as vogais nasais são segmentos

marcados que ocorrem em poucas línguas naturais. Os segmentos orais são não-marcados e

ocorrem em todas as línguas naturais.

A nasalização é a articulação secundária vocálica mais comum, sendo as vogais

nasais [i,a,u] as mais freqüentes nas línguas naturais (Maddieson, 1984a apud Ladefoged,

1996). Isso é decorrente do fato de suas correspondentes orais [i,a,u] serem as vogais mais

freqüentes nas línguas do mundo (Ladefoged, 1996).

A nasalidade e a altura da língua na articulação das vogais estão intimamente

relacionadas. Para que uma vogal alta [i] ou [u] seja nasalizada, é necessário apenas um
34

pequeno abaixamento do véu palatino, permitindo então, o acesso do fluxo de ar à

cavidade nasal. Por outro lado, uma vogal baixa como [a] necessita de um abaixamento

relativamente bem maior em relação às vogais altas, para que seja percebida como uma

vogal nasal, pois a configuração do trato vocal é bem diferente durante a produção da

vogal nasal [a] e a vogal oral [a].

Apesar de ser uma articulação vocálica muito comum, não analisaremos os

segmentos vocálicos nasais neste trabalho. Nosso objetivo é descrever e analisar os

segmentos orais vogais altas e glides no português brasileiro e no inglês britânico. Como

vogais nasais ocorrem no português brasileiro, mas não no inglês britânico, restringimos ao

estudo das vogais orais.

2.5.4 Duração

A duração ou quantidade vocálica de um segmento é um traço de descrição

importante e relevante, em particular, para este estudo. Muitas línguas do mundo têm a

distinção contrastiva de vogais breves e longas. (Ladefoged, 1996). Por exemplo, no

japonês, as palavras [odi:san] “avô” e [odisan] “tio” diferem quanto à duração da

vogal alta [i]. No primeiro exemplo, a vogal [i] é longa e no segundo exemplo a vogal [i] é

breve. Observe que a vogal longa é indicada pelo uso do diacrítico []. A ausência deste

diacrítico indica que a vogal é breve.

A quantidade é uma medida comparativa: sempre em relação a uma vogal longa,

necessariamente há uma vogal breve. Observe o contraste entre vogais longas e breves em
35

inglês: [li:v] ''leave'' viver e [lv] ''live'' morar. Nesta língua, além do parâmetro vogal

longa-breve ser relevante se observa que ocorre concomitantemente a mudança de

qualidade vocálica: [i:] e [].

2.5.5 Tensão

Os segmentos vocálicos podem também ser classificados como tensos e frouxos. Os

segmentos frouxos são aqueles segmentos produzidos com menor esforço muscular em

relação a um segmento tenso. Por exemplo, no português brasileiro, os segmentos

vocálicos frouxos tendem a ocorrer em posição átona final, como em “sapo” [sap],

“táxi” [taks]. Já os segmentos tensos, em português, ocorrem em posição tônica e

pretônica como em “jacu” [aku] e “Paris” [paris]. Podemos concluir que no português

do Brasil a relação entre segmentos vocálicos tensos e frouxos é intimamente associada à

proeminência acentual ou tonicidade.

No inglês, a relação entre os segmentos vocálicos tensos e frouxos está relacionada

à estrutura silábica. As vogais tensas podem ocorrer no final de palavras e sílabas, como

em “he” [hi:] ou “too” [tu:]. Por outro lado, os segmentos vocálicos frouxos não ocorrem

em final de palavra e de sílabas, e devem obrigatoriamente ser seguidos de uma consoante

como em “had” [hæd], “look” [lk].

Tipicamente, a oposição entre vogais tensas e frouxas é expressa pela adoção de

símbolos diferentes. Em inglês, temos uma série de pares de vogais com qualidades
36

diferentes (que também se distinguem por serem longas e breves) e muitos autores adotam

símbolos diferentes para identificá-las: i,  , u, , , æ, etc.

2.5.6 Classificação dos segmentos vocálicos

A notação dos segmentos vocálicos diz respeito à maneira ou à ordem de

apresentação das propriedades articulatórias. Deve-se apresentar as informações na

seguinte ordem:

• Altura da língua na cavidade oral

• Anterioridade ou posterioridade da língua na cavidade oral

• Posição de arredondamento dos lábios

A vogal [i] é classificada como ''vogal alta anterior não-arredondada''. A vogal

[u] é classificada como ''vogal alta posterior arredondada''. Informações referentes às

propriedades articulatórias secundárias devem seguir na parte final das informações

classificatórias. A vogal [i] classificada como ''vogal alta anterior não-arredondada nasal'' e

a vogal [] é classificada como ''vogal alta posterior arredondada frouxa''.

Tipicamente, não se indica o grau de vozeamento. Contudo, caso este fator seja

relevante para a classificação do segmento, a informação classificatória deve vir ao final.

Tem-se para []: ''vogal alta posterior arredondada nasal desvozeada''.


37

Na próxima seção, descreveremos o Método das Vogais Cardeais. Tal Método tem

um caráter complementar à descrição articulatória apresentada nas páginas precedentes.

2.6 O Método das vogais cardeais

O método das Vogais Cardeais oferece um instrumental que permite a descrição e

interpretação dos segmentos vocálicos que ocorrem nas línguas naturais cujas qualidades

vocálicas são variadas (Jones, 1969). Este método é até hoje muito utilizado, pois relaciona

os correlatos articulatórios, auditivos e acústicos (Cristófaro Silva, 1999a). O método das

Vogais Cardeais será utilizado neste trabalho para descrever e interpretar os segmentos

vocálicos do inglês e do português. Tal método permite descrever e representar as vogais

simples, ditongos e tritongos.

A idéia de adotar um sistema de pontos de referência para a classificação de vogais

foi proposta por A. J. Ellis em 1844. A nomenclatura “cardeal” foi usada pela primeira vez

por A.M. Bell em 1867, inspirando-se nos pontos cardeais. Daniel Jones reapresentou o

método em 1917, em número de oito vogais cardeais, classificando as vogais do inglês a

partir deste, tornando-o amplamente usado desde então. Abercrombie (1967) desenvolveu

a proposta de Jones até o ponto que se encontra hoje (Cristófaro Silva, 1999b).

Oito vogais cardeais, distribuídas de forma eqüidistante numa figura em forma de

um trapézio, formam a base do sistema de Daniel Jones, (FIG. 6 a seguir). As vogais

cardeais de 1 a 8 são articuladas com o ponto mais alto da língua no limite da linha

periférica da área vocálica. A área vocálica é parte da área da cavidade bucal onde a língua

assume posições diferentes para a articulação de vogais sem causar contato, fricção ou
38

obstrução. Isto caracterizaria a produção de um segmento consonantal. A área vocálica é

delimitada pela linha periférica que, se ultrapassada, há fricção ou obstrução, produzindo

um segmento consonantal (Cristófaro-Silva, 1999b).

FIGURA 6 As Oito vogais cardeais


FONTE: LADEFOGED & MADDIESON, 1996. p. 285.

As vogais cardeais de 1 à 8 são chamadas vogais periféricas por Jones (1969) e

estas vogais são pontos de referência para todas as vogais das línguas naturais. É

importante salientar que estas oito vogais foram selecionadas de forma arbitrária, ou seja,

não correspondem ao sistema vocálico de nenhuma língua natural. Por coincidência, pode

acontecer de alguma língua conter uma ou mais vogais das oito vogais cardeais.

O método propõe um recurso de descrição de vogais a partir de propriedades auditivas que

caracterizam uma vogal dentro da área vocálica, que é representada por uma figura em

forma de trapézio, muitas vezes chamado de quadrilátero. O ponto da linha periférica para

a posição mais avançada e mais alta da língua na cavidade bucal, é a vogal cardeal no. 1, ou

VC1. A VC1 é representada pelo símbolo i.


39

O mesmo procedimento pode ser adotado para definir os outros pontos na linha

periférica, ou seja, a articulação do ponto mais baixo e mais posterior possível antes de

haver contato entre a língua e a úvula, corresponde à vogal [a], a VC5. As três vogais logo

abaixo da VC1 no trapézio, correspondem aos pontos das vogais cardeais VC2 = e, VC3 =

 VC4 = a. As vogais cardeais restantes, que ficam no trapézio em direção ascendente em

relação à VC5, são a VC6 = , VC7 = o e VC8 = u. Estas vogais podem ser descritas em

termos de categorias de classificação vocálica, como:

TABELA 1

As VC1 a VC8
As vogais de 1 a 5 não são arredondadas e de 6 a 8 são arredondadas.

Anterior Posterior
Alta VC1 i VC8 u

Média-alta VC2 e VC7 o

Média-baixa VC3  VC6 

Baixa VC4 a VC5 

FONTE - ABERCROMBIE, 1967. p. 154

A aplicação deste método consiste em primeiramente, aprender a pronunciar as oito

vogais cardeais, e para classificar uma vogal de uma língua natural, deve-se pedir a um

nativo desta que a pronuncie. A partir daí, comparar a postura da língua durante a produção

desta, com a da vogal ou vogais cardeais mais próximas, até que se possa determinar a

posição específica da língua durante a articulação do segmento em questão. A identificação

de uma vogal baseia-se em critérios articulatórios e auditivos.


40

A princípio, as oito vogais cardeais são suficientes para a descrição de qualquer

segmento vocálico de qualquer língua natural. Porém, foram estabelecidas catorze vogais

cardeais secundárias, relacionadas com as vogais cardeais primárias. O quadro abaixo

ilustra os segmentos correspondentes aos pontos VC9 a VC16. As VC9 a VC16 que

também são pontos fixos, de qualidade invariável.

TABELA 2

As VC 9 a VC16

VC9 y VC11 œ VC13  VC15 

VC10 ø VC12  VC14  VC16 

FONTE - ABERCROMBIE, 1967. p. 161

A TAB. 3 abaixo ilustra os símbolos correspondentes aos segmentos vocálicos

correspondentes aos pontos VC17 a VC22.

TABELA 3

As VC17 a VC22

VC17  VC19  VC21 

VC18  VC20  VC22 

FONTE - ABERCROMBIE, 1967. P. 161.

As vogais cardeais de secundárias de 9 à 18 estão localizadas na linha periférica do

trapézio e as vogais cardeais de 19 a 22 são centrais. Das VC9 a VC16 têm-se a mesma

posição de língua que nas vogais primárias VC1 a VC8. A diferença está na posição dos

lábios, as VC9 a VC13 são arredondadas e as VC14 a VC16 não são arredondadas. As

vogais cardeais secundárias restantes, VC17 a VC22 localizam-se na parte central da área

vocálica. Sendo as vogais cardeais VC18, VC20 e VC22, produzidas com labialização e as

VC17, VC19 e VC21 sem labialização.


41

Tomando como referência as 22 vogais cardeais mencionadas anteriormente, pode-

se identificar qualquer segmento vocálico de qualquer língua natural. O procedimento de

descrição é o mencionado na página 39 e se baseia em critérios articulatórios e auditivos.

Para indicar alteração na qualidade vocálica do segmento analisado em relação a uma

vogal cardeal, podemos usar os seguintes diacríticos:

levantado – qualidade mais alta

abaixado – qualidade mais baixa

retraída – qualidade mais posterior

avançada – qualidade mais anterior

Os ditongos também podem ser identificados no diagrama das vogais cardeais.

Estes sons, os ditongos, são sons que consistem de um movimento articulatório ou deslize

da língua de uma vogal a outra (Clark & Yallop, 1990). Os ditongos são também tratados

como uma seqüência de segmentos, sendo um dos segmentos interpretados como uma

vogal e o outro interpretado como um glide. O glide refere-se aos segmentos vocálicos sem

proeminência acentual nos ditongos (Cristófaro Silva, 1999b). Glides são segmentos

assilábicos que co-ocorrem com um segmento vocálico. Um ditongo pode ser composto de

(vogal e glide) ou (glide e vogal). A seqüência (vogal e glide) é denominada ditongo

decrescente. A seqüência (glide e vogal) é denominada ditongo crescente.

Os glides em um ditongo podem ser representados por vários símbolos fonéticos.

Glides palatais podem ser transcritos como /j, y, , /. Glides velares podem ser transcritos
42

como /w, , /. A transcrição diferente dos glides depende da interpretação fonológica

dada ao segmento no sistema sonoro.

Tipicamente, quando o glide é simbolizado por [j, y], ele é interpretado

fonologicamente como consoante e quando o glide é simbolizado por [, ], ele é

tipicamente interpretado como vogal. Este trabalho adota o símbolo [j] para o glide

interpretado fonologicamente como consoante e o símbolo [] para o glide interpretado

como vogal. Em ambos os casos, o símbolo adotado para o glide será adjacente a uma

vogal. Argumentos que sustentem a interpretação do segmento em questão como vogal ou

consoante, serão apresentados na segunda parte, a de fonologia.

No diagrama das vogais cardeais, os ditongos são indicados por uma flecha que

marca o ponto inicial e o ponto final do ditongo. Um destes pontos não terá proeminência

acentual e indicará o glide. Diagramas expressando a representação dos ditongos serão

apresentados quando da descrição das vogais altas e glides em cada uma das línguas em

questão. Na próxima seção, avaliamos as propriedades acústicas relacionadas aos

segmentos vocálicos.

2.7 As Propriedades acústicas

Ao utilizar os órgãos da fala, movimentamos as moléculas de ar próximas de nossa

boca e as deslocamos. Quando uma molécula de ar colide em outra e oscila para frente e

para trás em relação ao seu ponto de repouso, produz o som, no caso, o som da fala. Estas

moléculas no trato vocal são postas em movimento pela ação das cordas vocais. Toda vez
43

que as cordas vocais abrem e fecham, produz-se um pulso de ar e estes pulsos vibram o ar

no trato vocal, produzindo um número de freqüências distintas.

O movimento máximo das moléculas de ar para longe do ponto de repouso é

chamada de amplitude de vibração. Um ciclo completo a partir deste ponto à amplitude

máxima em uma direção e novamente de volta é denominado um ciclo. O período de

tempo que a molécula leva para fazer o ciclo é denominado período do ciclo e freqüência

de vibração é o número de ciclos – movimento das moléculas de ar para frente e para trás –

a cada segundo. É também o número de aberturas e fechamentos das cordas vocais em um

segundo. Sua unidade de medida é o Hertz (Hz). Por exemplo, se as cordas vocais fazem

100 movimentos em um segundo, dizemos que a freqüência deste som é de 100 Hz.

A altura melódica (“pitch”) está relacionada à freqüência de vibração, ou seja,

quanto mais alta a freqüência, mais alto o tom, (O’Connor, 1973). As vogais são

acusticamente definidas por dois ou três tons característicos ou formantes, podendo ser

visualizados no padrão de espectro de um som da fala. (Ladefoged, 1982). Entendemos

como formante, a concentração de energia acústica, ou a ressonância do trato vocal na

produção de um som da fala, (Picket, 1999). Os formantes que caracterizam as vogais são

resultantes dos formatos diferentes da língua no trato vocal.

Usamos o espectrógrafo para ter a representação visual dos traços acústicos dos

sons da fala, na forma do espectrograma. Este é uma representação visual dos traços

acústicos dos sons da fala e mostra o espectro de um som. Por sua vez, espectro é a gama

de freqüências que compõem uma onda sonora. Ao analisar uma vogal no espectrograma, a

intensidade de cada freqüência é mostrada pelos traços mais escuros da marca. As barras
44

horizontais escuras são os formantes (O’Connor, 1973). Em uma análise espectrográfica, o

eixo horizontal representa a freqüência e o vertical representa a amplitude. Por exemplo, os

componentes acústicos da vogal alta longa [i:] representando as ressonâncias no trato vocal

durante sua produção, podem ser mostrados no espectro de freqüência abaixo:

FIGURA 7 Vogal alta falada por um homem a uma freqüência fundamental7


de 120 Hz.
FONTE - CRYSTAL,1997. P. 135.

Cada pico ou amplitude de algumas freqüências demonstrados na ilustração acima,

representa um formante. O primeiro formante é representado por F1, o segundo por F2 e o

terceiro por F3, todos caracterizam a vogal alta anterior longa [i].

Todas as vogais e algumas consoantes têm formantes e a disposição dos formantes,

principalmente os dois primeiros é que possibilita diferenciar vogais, ou reconhecê-las na

fala de dois ou mais falantes distintos (Crystal, 1997).

Trataremos aqui, da caracterização acústica de vogais e glides. Vimos que glides

correspondem a segmentos vocálicos sem proeminência acentual (cf. seção 5.7). Sendo

7
Freqüência fundamental é a freqüência básica na qual um som vibra, geralmente abreviado como F0
(CRYSTAL, 1997).
45

assim, a discussão que se segue menciona a categoria vogal, porém na prática, engloba

tanto as vogais quanto os glides.

Os segmentos vocálicos são caracterizados, em geral, por três formantes e os

demais formantes (F4, F5, etc.) não são necessários para a especificação lingüística de um

segmento vocálico, (O’Connor, 1973). Os formantes são numerados de acordo com a

ordem de suas freqüências, do mais baixo ao mais alto. São chamados de primeiro

formante (F1), segundo formante (F2), terceiro formante (F3) e assim por diante. O

primeiro e o segundo formantes estão intimamente ligados ao formato do trato vocal, ou

seja, ao movimento dos lábios, língua, faringe e mandíbula, na articulação das vogais e

consoantes. É importante primeiramente, concentrar-se nos dois primeiros formantes na

produção de segmentos vocálicos. A freqüência dos formantes é determinada por três

fatores, (Picket, 1999): o comprimento do trato orofaríngeo, o local de constrição no trato e

o grau de estreitamento das constrições. E de acordo com estes fatores, Picket delineou

regras a seguir.

O comprimento do trato orofaríngeo depende do tamanho físico do falante. Este

afeta os locais de freqüência de todos os formantes do segmento vocálico, permitindo

prever onde estará o pico do formante no caso de crianças, mulheres ou homens. As

freqüências médias dos formantes da vogal estão inversamente proporcionais ao

comprimento do trato orofaríngeo.

As formas articulatórias diferentes do trato orofaríngeo afetam os locais dos

formantes. Para tal, devemos considerar os pontos de constrição na articulação das vogais,

ou seja, a primeira regra é que a freqüência de F1 diminui por qualquer constrição na


46

metade frontal da parte oral do trato vocal. Quanto maior a constrição, menor o F1.

Portanto, se a parte mais alta da língua estiver próxima ao meio do palato ou à frente deste,

o F1 é mais baixo em freqüência que 500 Hz, que é a medida neutra. (Picket, 1999).

A vogal alta anterior [i] é um exemplo disso. Na TAB. 4 abaixo, as vogais [i] e []

têm a freqüência do F1 mais baixa que 500 Hz, que são 300 Hz e 360 Hz respectivamente.

Como a constrição desta vogal é grande e é feita na parte frontal do trato vocal, a

freqüência de F1 diminui. Quanto maior a constrição, menor a freqüência do F1.

TABELA 4

Resultados de J.C. Wells, obtidos em 1962

F1 F2
i: heed 300 Hz 2300 Hz
 hid 360 Hz 2100 Hz
 hood 380 Hz 950 Hz
u: who 300 Hz 940 Hz
FONTE: GIMSON, 1970. p.98

A segunda regra de Picket (1999), relaciona o F2 com a constrição da parte traseira

da língua. A freqüência de F2 tende a abaixar devido a uma constrição na parte traseira da

língua e quanto maior a constrição, menor o F2. A vogal alta [u], por exemplo, é articulada

com a língua elevada na parte traseira do palato. O efeito é abaixar a freqüência de F2. De

fato, esta vogal é formada por um estreitamento grande, a parte traseira da língua fica

muito próxima ao palato mole, portanto freqüência de F2 é baixa por causa desta

constrição pequena. Nos dados abaixo, em relação às F2 das vogais altas anteriores, as
47

posteriores [] e [u], têm as freqüências de F2 mais baixas, ou seja, 950 Hz e 940 Hz em

relação a 2300 Hz e 2100 Hz.

A terceira regra apresentada em Picket (1999), relaciona a constrição anterior da

língua com o F2. Ou seja, a freqüência de F2 aumenta em uma constrição anterior da

língua. E quanto maior a constrição na parte anterior da língua, maior a freqüência do F2.

(Picket, 1999). A constrição da vogal alta [i] é a maior, portanto, sua freqüência no F2 é

mais alta. Podemos observar este fato nos dados de Wells (1962), apud Gimson (1970),

que são apresentados na TAB. 4, na página anterior. Também podemos observar nesta

tabela, que o F1 da vogal alta anterior [i] é mais afastado que o F2 em comparação à vogal

alta posterior [u], (Cagliari, 1997).

A regra final proposta por Picket (1999), relaciona os efeitos do arredondamento

dos lábios nos formantes. As freqüências de todos os formantes abaixam com o

arredondamento dos lábios. Portanto, quanto mais arredondada a vogal, maior a constrição

e mais baixos são os formantes. Nos dados de Wells da TAB. 4, a vogal [u] é a mais

arredondada e suas freqüências de formantes são as mais baixas.

Os glides [w] e [j] possuem os traços acústicos das vogais altas [u] e [i]

respectivamente, por isso são chamados com freqüência de semi-vogais. (Crystal, 1997).

Ou seja, a estrutura dos dois ou três primeiros formantes do [i] é semelhante ao do [j]. E

de maneira análoga a estrutura dos dois ou três primeiros formantes do [u] é semelhante ao

do [w]. O primeiro formante, F1, pode ser aproximadamente 240 Hz para os dois glides e
48

o F2 pode variar de 2.280 a 3.600 Hz para [j]. Já para o [w], o segundo formante pode

variar de 360 a 840 Hz (Gimson,1970, p. 213). Os formantes dos glides podem também

variar de acordo com as vogais adjacentes, por exemplo em [aja], o primeiro formante

desce e o segundo sobe à medida que a língua movimenta de [a] para [j]. Então, o

primeiro formante sobe e o segundo desce novamente, à medida que a língua volta à sua

posição original da vogal [a].

Contudo, o glide [w] difere da vogal [u] em três aspectos. Primeiramente, há uma

constrição maior nos lábios no [w] em relação à vogal, isto abaixa a intensidade dos

formantes F1 e F2 e causa uma maior redução no F3 e nos formantes mais altos. O

segundo aspecto que difere o glide [w] da vogal [u], é que a posição da língua na

produção do glide pode variar de acordo com as vogais adjacentes. Uma constrição

levemente posterior da língua pode acompanhar a constrição do [w] nos lábios. Por outro

lado, o segmento vocálico [u] precisa ter uma constrição na parte posterior da língua junto

com a constrição nos lábios.

O terceiro aspecto que diferencia o glide [w] da vogal [u] está na velocidade do

movimento do trato oral na produção de cada segmento. Esta é maior na produção do [w]
49

nos movimentos entre duas vogais. Por exemplo, a transição de F1 na abertura de [w] para

[a] é mais rápida que na transição de [w] para [i]8.

Podemos perceber através de análise espectrográfica, que um ditongo é realmente

um movimento, um deslize entre dois elementos vocálicos, (além de envolver um

movimento articulatório perceptível), pois o espectrograma mostra a transição de

formantes a partir de posições típicas de uma vogal para posições características de outra

vogal, (Gimson, 1970). Os ditongos são semelhantes às vogais longas, ou seja, sua duração

é maior.

Nesta seção, apresentamos a descrição das propriedades acústicas das vogais altas e

os glides. Vimos que as vogais podem ser especificadas pela freqüência dos dois primeiros

formantes, F1 e F2. Quanto maior a constrição da língua em relação ao palato na

articulação das vogais, menor o valor de F1. E quanto maior a constrição na parte traseira

da língua, menor o valor de F2. Portanto, na articulação da vogal alta anterior [i], o valor

de F1 é baixo e o valor de F2 é alto.

Na vogal alta posterior [u], o valor de F1 e o de F2 são baixos (TAB. 4), os

ditongos têm a duração de uma vogal longa, visível no espectrograma. É também possível

visualizar a mudança de posição da freqüência do primeiro para o segundo formante,

durante a modificação do formato do trato vocal na configuração de uma vogal para a

outra. Os glides [j,w] quando combinados com vogais têm as freqüências semelhantes aos

8
Não encontramos como correlato articulatório a comparação entre [i] e [j]. Contudo, evidências
demonstram características semelhantes.
50

ditongos. A diferença é que a constrição no trato oral na articulação dos glides é maior em

relação às suas vogais altas correspondentes [i, u].

2.8 Os Correlatos acústicos das propriedades articulatórias

As freqüências dos formantes são inversamente relacionadas às propriedades

articulatórias tradicionais e quando analisamos um gráfico de freqüência de formantes de

vogais, constatamos que o arranjo no gráfico é o mesmo que o que estamos acostumados a

ver nas descrições articulatórias tradicionais. Atualmente, os gráficos de formantes são

geralmente usados para representar as qualidades vocálicas, pois a qualidade vocálica

depende das freqüências dos formantes (Ladefoged, 1982). Considere a FIG. 8 abaixo:

FIGURA 8. Gráfico de freqüência de formantes de vogais


FONTE - CRYSTAL, 1997. p. 135.

O gráfico de freqüência de formantes ilustrado na FIG. 8 mostra que o padrão

resultante é muito semelhante à descrição articulatória das vogais através do método das

vogais cardeais. Se compararmos a posição dos segmentos vocálicos no diagrama das

vogais cardeais com as mesmas vogais no gráfico da FIG. 5, constatamos uma semelhança
51

bastante grande. No entanto, a relação entre a informação articulatória e a informação

acústica não é maior porque as propriedades articulatórias baseiam-se apenas no ponto de

constrição maior da língua, enquanto que as propriedades acústicas derivam das

ressonâncias do trato vocal integral (Crystal, 1997).

Os espectrogramas são indicadores confiáveis da qualidade relativa de um

segmento vocálico. E também, é clara a relação dos formantes no espectrograma e a sua

relação com a articulação dos segmentos vocálicos, ou seja, a freqüência do primeiro

formante mostra a altura vocálica com precisão. A distância entre o primeiro e o segundo

formantes reflete o grau de posterioridade da língua. No entanto, o grau de arredondamento

dos lábios não é demonstrado claramente, podendo haver confusão em sua interpretação,

(Ladefoged, 1982).

Podemos concluir que as duas propriedades acústicas e articulatórias

complementam-se, não devemos afirmar que os métodos da fonética acústica sejam

superiores em relação aos da fonética articulatória. Pode haver maior precisão visual no

caso da análise acústica. Porém, um método não elimina a importância do outro, na

verdade, um complementa o outro. Uma outra evidência a favor da fonética articulatória é

citada por Ladefoged, onde os espectrogramas não medem graus de nasalização. Para

identificá-la com maior precisão, técnicas como a palatografia é muito mais eficiente. Isto

justifica a interação entre abordagens distintas para descrever os segmentos.

Antes de procedermos à descrição fonética das vogais altas e glides no português

brasileiro e no inglês britânico vamos apresentar duas noções muito importantes para este

trabalho. Estas noções são de ''sílaba'' e de ''acento''.


52

2.9 A Sílaba

A maioria das pessoas, sendo de preferência falantes nativos da língua em questão,

consegue dizer sem dificuldade quantas sílabas contém em uma palavra ou em um

enunciado. Porém, com freqüência os falantes têm dificuldade em dizer exatamente onde

uma sílaba começa e onde termina. A sílaba pode ser considerada uma unidade

reconhecida por todo e qualquer falante (Abercrombie, 1967).

Uma definição importante para este trabalho é a de sílaba. Adotamos a teoria da

sílaba apresentada em Stetson (1951), que define a sílaba em termos do mecanismo de

corrente de ar pulmonar. Esta teoria fundamenta que os músculos respiratórios contraem e

relaxam a uma taxa de aproximadamente cinco vezes por segundo, para que o ar seja

expelido em uma sucessão de pequenos golpes. Cada contração, junto com o golpe de ar

resulta na produção de uma sílaba. Uma sílaba, portanto, é o produto do modo que o

mecanismo de corrente de ar pulmonar funciona. Sua base é o pulso torácico.

Em vista disso, a sílaba é essencialmente um movimento dos órgãos da fala e não

uma característica do som da fala. Portanto, a base de uma sílaba é uma breve contração

dos músculos respiratórios e esta expele uma pequena quantidade de ar dos pulmões. Este

ar expelido necessita de uma passagem no trato vocal em um momento de sua produção, e

assim, formam-se os segmentos.

A sílaba pode ser compreendida como um movimento muscular que se intensifica,

atingindo um pico ou núcleo e depois uma redução progressiva, conforme demonstrado por

Cagliari (1981) no diagrama representado na FIG. 9 a seguir.


53

FIGURA 9 Esquema do esforço muscular e da curva da força silábica


FONTE - CAGLIARI, 1981. p. 101.

De acordo com a FIG. 9, podemos afirmar que a sílaba é composta de três partes:

um pico ou núcleo que é obrigatório. O núcleo é geralmente preenchido por um segmento

vocálico. As outras duas partes são periféricas e opcionais e são preenchidas por segmentos

consonantais. As partes periféricas podem ser denominadas margens da sílaba.

No português, o núcleo da sílaba é sempre um segmento vocálico. No inglês, o

núcleo da sílaba pode ser preenchido por uma consoante que é tipicamente uma lateral ou

uma nasal. Um exemplo de sílaba cujo núcleo é preenchido por uma consoante em inglês é

a palavra “little” [lt.l] em que a consoante [l] ocupa o núcleo ou pico de uma sílaba.

Utilizamos um ponto final [.] para indicar o limite silábico.

Considere no português, a palavra “pai” [pa]. O núcleo da sílaba da palavra [pa]

é uma vogal: [a]. Os segmentos periféricos [p] e [] ocupam posições não nucleares. É

importante salientar que os glides nunca ocupam uma posição de pico nuclear e não podem

ser picos silábicos. As vogais tipicamente ocupam o núcleo de uma sílaba.

A sílaba pode ser composta por combinações diferentes de consoantes e vogais. No

entanto, certas seqüências não são permitidas. Existem regras que governam a ordem em
54

que os sons ocorrem na sílaba e estas regras são denominadas regras fonotáticas. Por

exemplo, a vogal [] não ocorre na posição final de sílaba no inglês, caso contrário, há

violação das regras fonotáticas nesta língua. Isto porque somente vogais longas ocorrem

em final de palavras no inglês.

Finalizando, apresentamos a distinção entre sílabas leves e pesadas. Em várias

línguas esta distinção é muito importante, pois o estatuto da sílaba – como pesada ou leve -

pode refletir nas regras de atribuição de acento.

A constituição da sílaba determina o peso silábico. Denominamos sílaba leve a

sílaba cujo pico silábico é constituído por apenas uma vogal ou de um monotongo. A sílaba

pesada contém um pico silábico constituído por (vogal+consoante) ou (vogal+glide) ou

(vogal+vogal). Este último podendo ser ditongo ou vogal longa.

A noção de sílaba é muito importante para a discussão do acento. Isto porque o pico

ou núcleo da sílaba é que recebe o acento. Discutiremos a seguir esta noção.

2.10 O Acento

Os sistemas vocálicos do português e do inglês são analisados neste trabalho, em

relação ao acento, daí a importância de defini-lo. O acento incide sobre a sílaba tônica ou

acentuada e este é produzido com um pulso torácico reforçado, ou seja, há um jato de ar

mais forte na produção de uma sílaba tônica em relação às sílabas átonas ou não

acentuadas. Tomemos a palavra “livro” [li.vr], onde a primeira sílaba [li] é tônica e a

segunda sílaba [vr] é uma sílaba átona. A vogal acentuada na sílaba tônica é percebida
55

auditivamente como tendo uma duração mais longa e é também produzida com um volume

mais alto. Esta pronúncia mais alta permite-nos diferenciar as vogais acentuadas das não

acentuadas.

Podemos dizer que uma sílaba mais longa e mais alta, seja em seu tom ou em seu

volume, é uma sílaba acentuada (Callou & Leite, 1990). O português utiliza o acento de

intensidade, que tem papel distintivo em palavras como ‘sábia’ [sab] e ‘sabia’ [sabi]

e sabiá [sabia].

As vogais tônicas ou acentuadas carregam o acento mais forte da palavra ou o

acento primário. A vogal tônica é a vogal que, em relação às outras vogais das outras

sílabas da palavra, tem a proeminência acentual, ou aquela a que é atribuído o acento

primário. A vogal tônica de um enunciado é marcada por um apóstrofo anterior à vogal ou

sílaba acentuada: “pá” [pa].

As vogais não acentuadas ou átonas podem ser pretônicas ou postônicas. Ao

contrário das sílabas tônicas, as sílabas átonas podem receber um acento secundário ou

totalmente isentas de acento. As vogais pretônicas antecedem o acento tônico, como por

exemplo, a primeira sílaba de “sapé” [sap]. As vogais postônicas sucedem o acento

tônico, como a segunda sílaba da palavra “pera” [per]. A vogal átona também pode ter o

acento secundário representado pelo apóstrofo colocado na parte inferior antes da vogal ou

sílaba com este acento, como em “cajá” [kaa].


56

A duração de uma vogal pode ser afetada pelo fato da vogal ocorrer em sílaba

tônica ou átona no inglês. Nas sílabas do inglês, a mesma vogal pode ser percebida como

mais longa se ocorrer na sílaba tônica, em relação à mesma vogal em sílaba átona, (Laver,

1994). Exemplos são as palavras “credit” [kred.t] crédito e “sit” [st] sentar. Apesar das

duas palavras apresentarem o mesmo segmento [], este terá duração maior na sílaba tônica

em “sit” em relação à mesma vogal de “credit”, que ocorre na sílaba átona. Isto acontece

devido ao fato da variação em proeminência da sílaba, pois quanto mais proeminente a

sílaba, no caso, a sílaba tônica, maior o esforço muscular em sua produção. A sílaba tônica

também dispõe de tom mais alto, maior volume e maior duração ou esforço articulatório,

refletindo na performance dos segmentos que a constituem. Por isso, o segmento vocálico

é percebido com maior duração na sílaba tônica em relação ao seu correspondente em

sílaba átona.

A relação entre o acento primário, secundário e sua ausência, compõe o ritmo de

línguas denominadas acentuais. O ritmo tem a função lingüística de organizar a cadeia

segmental a uma estrutura acentual. No entanto, nem todas as línguas naturais utilizam este

sistema. Em oposição a este sistema de ritmo, estão as línguas tonais cujos núcleos ou

picos silábicos carregam tons. Um tom é definido por alturas melódicas. O tom pode ser

alto, médio, baixo ou tons intermediários como ‘médio-alto’. O dialeto chinês mandarinês

é um exemplo de língua tonal.

Fornecemos até aqui, um instrumental teórico que teve por objetivo contribuir para

a análise das vogais altas e glides no português brasileiro e no inglês britânico a ser

apresentada nessa dissertação. Esta análise é apresentada nas seções que se seguem.
57

2.11 Vogais altas e glides no português brasileiro

No português brasileiro há três tipos de vogais: os monotongos ou vogais simples,

os ditongos e os tritongos. Quando a articulação é percebida durante um tempo como

constante essa vogal é chamada de monotongo ou vogal simples. O ditongo é articulado

quando o movimento da língua começa em um ponto qualquer da área vocálica e acaba em

um outro ponto nesta área. Nos tritongos, há três pontos audíveis, permitindo o

reconhecimento mais fácil do início, do ponto de desvio e do fim da trajetória da língua na

cavidade bucal (Cagliari, 1981). Exemplos envolvendo as vogais altas e glides no

português brasileiro estão apresentados abaixo:

(4) Monotongo: si [si]


Ditongo: pau [pa]
Tritongo: qual [kwa]

Relembramos que neste trabalho, usaremos os símbolos [, u] para os casos em que

o glide comporta-se fonologicamente como uma vogal. Utilizaremos os símbolos

[j, w] para os casos em que o glide se comporta como consoante. Trataremos inicialmente

dos monotongos no português.

2.11.1 As Vogais altas no Português Brasileiro

A TAB. 5 a seguir, mostra os alofones do fonema /i/ e /u/ no português brasileiro.


58

TABELA 5

Alofones das vogais altas no Português Brasileiro

Vogais Altas Anterior Posterior


Não arrredondada Arredondada
i u
Tônicas Orais ex.: vida [vida] ex.: mula [mula]
i u ()
Pretônicas Orais ex.: mulata [mulat]
ex.: pirata [pirat]
  (u) 
Postônicas Mediais
ex.: ótica [tk] ex.: pílula [pill]
 
Postônicas Finais
ex.: mole [ml] ex.: mato [mat]
i u
Posição tônica + Vogal epentética
ex.: digno [diin] ex.: rugby [huibi]

Existem seis vogais altas com qualidade e duração diferentes no português

brasileiro: [i, , i, u, , u]. O segmento [i] é classificado articulatoriamente como vogal

alta anterior e o [u], vogal alta posterior. Ambas as vogais são tensas e podem ocorrer em

posição tônica. Estes segmentos vocálicos podem ocorrer também em posição pretônica e

em posição postônica medial em alternância com suas correspondentes tensas (TAB. 5). Os

segmentos vocálicos frouxos [, ] ocorrem tipicamente em posição postônica medial ou

final. Estes segmentos podem ocorrer ainda em posição pretônica e neste caso, alternam

com a vogal tensa correspondente.

A vogal alta longa também pode ocorrer no português brasileiro, em posição tônica,

seguida de uma consoante e uma vogal alta epentética. Como em “digno”, [diin], a

vogal alta anterior longa ocorre sempre em posição tônica. A inserção da vogal epentética
59

após a consoante que se segue ao segmento vocálico tônico alonga a vogal. Já no caso em

que ocorre o encontro consonantal (ou seja não ocorre a vogal epentética), a vogal tônica

não é longa: [din] (Cristófaro Silva, 2001).

O diagrama das vogais cardeais que se segue (FIG. 10) ilustra as vogais altas

[i, , u, ] do português de Belo Horizonte (cf. Cristófaro Silva, 1999b).

FIGURA 10 As Vogais altas do português de Belo Horizonte


FONTE – CRISTÓFARO SILVA, 1999b. p. 146.

Pode-se observar na FIG. 10 que as vogais altas [i, u] em português localizam-se

mais próximas da linha limítrofe da área vocálica do que as vogais [, ]. Além de se

localizarem numa posição centralizada, as vogais [, ] são mais baixas que as suas

correspondentes tensas (ou seja [i, u]).

Passemos à caraterização acústica das vogais do português brasileiro. Infelizmente,

não conseguimos obter análises das vogais altas para o português de Belo Horizonte.

Sendo assim, lançamos mão do trabalho de Callou; Leite & Moraes (1996). Estes
60

pesquisadores analisaram dados das seguintes capitais: Recife, Salvador, Rio de Janeiro,

São Paulo e Porto Alegre. Considere a FIG. 11 abaixo:

FIGURA 11 F1 e F2 no português europeu, português brasileiro e as vogais cardeais


FONTE - CALLOU; LEITE; MORAES, 1996. p. 153.

A FIG. 11 ilustra a caracterização acústica das vogais tônicas do português europeu

e do Brasil em relação às vogais cardeais (Callou; Leite & Moraes, 1996). Os autores

compararam as médias gerais do primeiro (F1) e segundo formantes (F2) obtidas através

de cálculo de valores médios das cinco capitais brasileiras especificadas anteriormente. Os

dados do português europeu são de Delgado-Martins (1973) e a FIG. 11 indica ainda as

médias das vogais cardeais estabelecidas por Catford (1988). Os dados numéricos das

freqüências estão demonstradas na TAB. 6 abaixo.

TABELA 6
Valores das F1 e F2 das Vogais Altas, medidos em Hz
Vogais Cardeais Português Europeu Português Brasileiro
F1 F2 F1 F2 F1 F2
i 240 2400 294 2343 353 2161
u 250 595 315 678 358 928
FONTE – CALLOU; LEITE; MORAES, 1996. p. 45.
61

Com relação à dimensão vertical F1, as vogais altas /i, u/ no português brasileiro

são significativamente mais baixas que as mesmas vogais no português europeu. Em

relação às vogais cardeais as vogais altas no português brasileiro são mais baixas,

chegando a apresentar alturas similares às vogais cardeais /e/ e /o/.

Com relação ao F2, verifica-se que as vogais altas do português brasileiro são mais

centralizadas e as vogais altas do português de Portugal são mais próximas às vogais altas

das Vogais Cardeais. Os glides em ditongos serão discutidos na próxima seção.

2.11.2 Os Ditongos no português brasileiro

Definimos um ditongo como uma seqüência de segmentos vocálicos, sendo um

interpretado como vogal e o outro como um glide. O segmento vocálico é aquele que tem

proeminência acentual. O glide é um segmento que não recebe acento. No ditongo, os dois

segmentos são pronunciados numa mesma sílaba, sendo o segmento vocálico núcleo ou

pico da sílaba. Por exemplo, na palavra “pau” [pa], o segmento [a] é o segmento

vocálico, portanto ocupa o pico silábico e o segmento [] corresponde ao glide. O

diagrama das Vogais Cardeais apresentado na FIG. 12 abaixo, ilustra os ditongos [a] e

[a] no português brasileiro.


62

FIGURA 12 Os Ditongos [a] e [a] no português brasileiro


FONTE – CRISTÓFARO SILVA, 1999. p. 143

Podemos observar na FIG. 12, que os ditongos [a] e [a] no português brasileiro

têm início na área vocálica delimitada para a vogal [a]. O ditongo [a] direciona-se no

diagrama das vogais cardeais para a área vocálica da vogal []. No caso do ditongo [a]

ocorre o movimento em direção da área vocálica da vogal []. Observamos que nos dois

casos o ditongo termina na área vocálica referente ao segmento vocálico frouxo [, ]. Em

(5), são apresentados os ditongos crescentes do português brasileiro.

(5) Ditongos crescentes do português brasileiro

a. [jo] “acionista” ac[jo]nista


b. [i] ou[e] ou [] “série” sér[i]
c. [a] ou [] “séria” sér[a]
d. [] ou [o] “sério” sér[]
e. [] ou [e] “tênue” tên[]
f. [a] ou [] “árdua” árd[a]
g. [o] ou [u] ou [] “vácuo” vác[o]

Em (5 a), é ilustrado um exemplo que contém o ditongo [jo]. Neste caso, a

ocorrência do ditongo é obrigatória. Em (5 b-g), o ditongo pode apresentar uma pronúncia


63

alternativa que é ilustrada para cada caso. Em (5 b-d), o ditongo inicia-se na área vocálica

de [] e em (5 e-g), o ditongo inicia-se na área vocálica de []. Nos exemplos abaixo, são

ilustrados os ditongos decrescentes do português brasileiro9.

(6) Ditongos decrescentes do português brasileiro

a. [a] “pai” p[a]


b. [e] “lei” l[e]
c. [] “réis” r[]s
d. [o] “boi” b[o]
e. [] “mói” m[]
f. [] “flui” fl[u]
g. [a] “pau” p[a]
h. [e] “meu” m[e]
i. [] “céu” c[]
j. [o] “sou” s[o]
k. [i] “viu” v[i]
l. [ai] ou [a] “vaidade” v[ai]dade ou v[a]dade
m. [eu] ou [e] “reunião” r[eu]nião ou r[e]nião

Nos exemplos de (6 a-f), o ditongo termina na área vocálica de []. Nos exemplos

de (6 g-k), o ditongo termina na área vocálica de []. Nos casos ilustrados em (6 a-k), a

ocorrência de um ditongo é obrigatória.

Nos casos ilustrados em (6 l-m), o ditongo decrescente pode alternar com uma seqüência

de vogais. Em português, ocorrem também glides intervocálicos. Exemplos são

apresentados em (7).

9
Ditongos decorrentes da vocalização do /l/ não são considerados nessa dissertação. Ex.: “sol” [s].
64

(7) Glides intervocálicos

a. [a] “saia” s[a]a


b. [e] “teia” t[e]a
c. [o] “goiaba'' g[o]aba

Há controvérsia quanto à interpretação de glides intervocálicos. (cf. Cristófaro

Silva, 1992, Collischon, 1996). Isto porque glides intervocálicos podem ser interpretados

como vogais ou consoantes. Para os propósitos da descrição aqui apresentada, sugerimos

que o glide comporta-se como um segmento vocálico que será transcrito por [].10

Argumentos que apóiam esta proposta são apresentados posteriormente.

As seqüências denominadas tradicionalmente como tritongos no português

brasileiro são constituídas de (oclusiva velar+glide posterior+vogal). Alguns exemplos

deste caso são “quais”, “Uruguai”. Neste tipo de seqüência, há controvérsia quanto à

interpretação fonológica da oclusiva velar e glides. (cf. Cristófaro Silva, 1995, Couto,

1996).

Contudo, há consenso quanto ao fato do glide [w] co-ocorrer com a consoante oclusiva e

não apresentar alternância com a vogal alta correspondente. Sendo assim, nessa

dissertação, esse glide sistematicamente será transcrito por [w] como em [kw]ais ou

Uru[w]ai.

10
Glides intervocálicos com [] são raros no português brasileiro: ''Cauê''.
65

Esta seção apresentou a descrição fonética das vogais altas orais, dos ditongos e dos

glides no português brasileiro. A seguir, descreveremos as vogais altas e os glides no

inglês britânico.

2.12 Vogais altas e glides no inglês britânico

O inglês britânico RP é geralmente descrito como tendo vogais breves, vogais

longas e ditongos (Jones, 1997). A duração vocálica pode ser distintiva em várias línguas,

como no inglês. No inglês americano, a diferença entre vogais longas e breves é por vezes

analisada como uma diferença entre vogais tensas e frouxas. As vogais tensas são em geral,

mais longas em duração e requer maior esforço muscular em relação à produção de uma

vogal tensa.

Assume-se ainda, que os glides comportam-se como segmentos consonantais em

alguns casos no inglês. Estes contextos de ocorrência serão discutidos neste trabalho.

Nestes casos os glides são representados pelos símbolos /j, w/.

2.12.1 As Vogais altas no inglês britânico

Os exemplos em (1) ilustram palavras que contém vogais altas longas e breves.

(8) Vogais longas: [i] “beat” bater


[u] “boot” porta-malas
Vogais breves: [] “ship” navio
[] “put” colocar
66

O diagrama das vogais cardeais apresentado na FIG. 13 representa as vogais altas

ilustradas em (1).

FIGURA 13 As Vogais altas do inglês RP


FONTE – JONES, 1997. p. viii.

Ladefoged (1982) sugere que as vogais breves e longas do inglês sejam descritas de

acordo com suas ocorrências nas sílabas. Mais especificamente, em sílabas fechadas e

abertas. As sílabas fechadas terminam em um som consonantal e as sílabas abertas

terminam em um som vocálico. As vogais breves sempre ocorrem em sílabas fechadas (e

são, portanto, excluídas da posição final de palavra). As vogais longas ocorrem em sílabas

abertas e também em sílabas fechadas por uma ou mais consoantes. Considere os exemplos

em (9) que ilustram a restrição descrita acima, para as vogais altas longas e breves:

(9) Vogal alta breve []

a. [ft] “fit” ajustar


b. [fst] “fist” pulso
c. [bk] “book” livro
d. [plz] “pulls” puxa (verbo)
67

Vogal alta longa [i]

e. [fi] “fee” honorários


f. [fit] “feet” pés
g. [fist] “feast” festa
h. [lu] “glue” cola
i. [lus] “loose” solto
j. [fulz] “fools” tolos

Os exemplos de (9 a-d) ilustram vogais altas breves ocorrendo em sílabas fechadas.

Os exemplos em (9 e-j) ilustram as vogais altas longas ocorrendo em sílabas abertas ou

fechadas. Os exemplos em (9) ilustram casos em que as vogais ocorrem em monossílabos e

a vogal alta é a última (e única) sílaba na palavra. Contudo, a restrição referente à

ocorrência de vogais breves em sílabas fechadas opera também em meio de palavra.

Exemplos são (o ponto final indica o limite silábico): [st.i] ''city'' cidade e

[bl.k] “bullock” bovino.

As vogais altas longas [i, u] podem ocorrer também, antes de outra vogal alta,

que se encontra em sílaba tônica. Geralmente, nestes casos ocorre o sufixo –ing. Exemplos

são: “skiing” [ski], “canoeing” [knu]. A seguir apresentamos espectrogramas das

vogais altas no inglês britânico.


68

FIGURA 14 Espectrogramas das vogais altas do inglês.


FONTE - LADEFOGED, 1982. p. 194.

A FIG. 14 mostra os espectrogramas das vogais altas anteriores e posteriores

longas-tensas [i, u] e breves-frouxas [, ] (Ladefoged, 1982). As vogais foram

produzidas por um falante nativo do inglês britânico. A freqüência do primeiro formante

F1 é inversamente proporcional à altura da vogal. Por outro lado, a freqüência do segundo

formante diminui com a posterioridade da vogal. Quanto mais anterior a vogal, mais alta a

freqüência (Ladefoged, 1982). Podemos observar também que as vogais longas [i, u]

ocupam temporalmente (em ms) mais tempo do que as vogais breves [, ] corroborando

assim, a relevância da oposição vogal longa-breve em inglês.

As vogais altas tensas e breves [i, u] podem ocorrer em posição final de sílaba em

duas situações especiais, pois dissemos anteriormente que em posição de final de sílaba

espera-se apenas ocorrer vogais altas longas. Contudo, os casos em que a vogal alta tensa
69

curta ocorre são bem específicos e expressam a neutralização de vogais longas e breves.11

Esses dois casos são:

1) quando uma vogal alta é seguida de uma outra vogal “radio” [re.di.o] rádio,

“actual” [æk.tu.l] real;

2) quando em posição átona final (neste caso só ocorre [i]): “happy” [hæp.i] feliz,

“pretty” [prt.i] bonito.

A seguir consideramos os ditongos no inglês britânico.

2.12.2 Os Ditongos do inglês britânico

O inglês tem ditongos decrescentes e ditongos centralizados. Trataremos

inicialmente, dos ditongos decrescentes. Estes ditongos são formados por dois segmentos

(a vogal e o glide) e funcionam como vogais longas. Sendo assim, espera-se encontrar

ditongos decrescentes em final de sílaba (ou seja, em sílaba aberta) e em sílabas fechadas.

Os exemplos de (10) ilustram este caso:

(10) a. [pa] pie torta


b. [pras] price preço
c. [krast] Christ Cristo

A FIG. 15 a seguir ilustra os ditongos decrescentes no inglês britânico. Estes

ditongos podem terminar na área vocálica de [] ou [].

11
“Neutralização” é um conceito fonológico que será discutido na segunda parte deste trabalho.
70

FIGURA 15 Os Ditongos no RP.


FONTE - JONES, 1997. p. viii.

Exemplos de cada um dos ditongos apresentados em na FIG. 15 aparecem a seguir.

(11) a. [e] [fek] “fake” farsa


b. [o] [so] “so” então
c. [] [b] “boy” garoto
d. [a] [ka] “cow” vaca

O inglês britânico apresenta três ditongos decrescentes que terminam na área

vocálica de [] e dois ditongos decrescentes que terminam na área vocálica de []. Isto

totaliza cinco ditongos decrescentes. Consideremos os ditongos centralizados. Ditongos

centralizados apresentam um movimento articulatório da vogal em direção ao centro do

espaço vocálico. Os ditongos centralizados são três:

(12) Ditongos centralizados

a. [] [p] “poor” pobre


b. [] [t] “tear” lágrima
c. [] [b] “bear” urso
71

Podemos observar que o segundo elemento do ditongo centralizado é o “schwa''

[]. Esta vogal é central, frouxa e não-arredondada. Os ditongos centralizados ocorrem

tipicamente no inglês britânico (mas não no inglês americano). Os ditongos centralizados

são decorrentes da perda do “r” em final de sílaba que ocorreu no inglês britânico e que

ocasionou a ditongalização da vogal precedente. E claramente, depois da perda do “r”, o

schwa [] permaneceu (Roca & Johnson, 1999). Nos exemplos de (13), apresentamos a

pronúncia típica no inglês americano para as palavras com ditongos centralizados,

ilustradas em (12).

(13) a. [pr] “poor” pobre


b. [tr] “tear” lágrima
c. [br] ''bear'' urso

A perda do “r” em posição final de sílaba resultou também no desenvolvimento dos

tritongos no inglês britânico. Os tritongos em inglês podem ser considerados como uma

seqüência de (ditongo+vogal). Os ditongos nesta seqüência podem ser: /a,a,e,o,/

precedendo um “shwa” []. Exemplos de tritongos em inglês são:

(14) a. [tad] “tired” cansado


b. [a] “hour” hora
c. [le] “layer” camada
d. [lo] “lower” mais baixo
e. [k] “coyer” mais modesto
72

Os tritongos em (14), ocorrem somente no inglês britânico onde houve a perda do “r” em

posição final de sílaba. Na próxima seção, consideramos os glides /j, w/ no inglês

britânico.

2.12.3 Os Glides /j, w/ no inglês britânico

Conforme dito anteriormente, adotamos os símbolos /j, w/ para representar os

casos em que os glides se comportam como consoantes. Este fato será demonstrado

posteriormente. Os casos que /j, w/ ocorrem no inglês britânico consistem de uma

seqüência de glide+vogal. Trataremos dos glides /j/ e /w/ separadamente. O glide /j/

ocorre em:

1. Em posição inicial de palavra:

(15) a.“yes” [jes] sim


b.“union” [ju:nin] união.

2. Seguido às consoantes [p, b, t, d, k, m, n, h] quando a vogal seguinte é [u]:

(16) a. “pew” [pju] banco de igreja


b. “beauty” [bjuti] beleza
c. “attune” [tjun] afinar
d. “duke” [djuk] duque
e.“queue” [kju] fila
f. “music” [mjuzk] música
g. “new” [nju] novo
h. “hue” [hju] gritaria
73

O glide /w/ ocorre em:

1. Posição inicial de palavra:

(17) a. “we” [wi] nós


b. “one” [wn] um

2. Seguindo /t, d/:

(18) a. “twelve” [twlv] doze


b. “dwell” [dwl] morar

3. Posição intervocálica:

(19) a. “away” [we] longe

4. Em consoante complexa (oclusiva velar+glide):

(20) a. “queen” [kw] rainha


b.“Gwen” [w] Gwen (nome próprio)

Esta seção apresentou a descrição fonética das vogais altas orais, dos ditongos e dos

glides no inglês britânico. A seguir, concluímos a parte de fonética sumarizando a

discussão apresentada nas páginas precedentes.

2.13 Conclusão

Este capítulo, intitulado ''Fonética'', apresentou inicialmente, os conceitos

necessários para se proceder a análise fonética das vogais altas e glides em estudo. Estes

conceitos compreendem a classificação articulatória e acústica dos segmentos vocálicos.

Noções complementares como a da sílaba e do acento, foram tratadas.


74

Na página seguinte, é apresentada a TAB. 7 que sumariza todos os casos de

ocorrência de vogais altas, ditongos e glides no português brasileiro e no inglês britânico.

Generalizando, podemos afirmar que a distribuição das vogais altas e glides no português

brasileiro está relacionada à tonicidade. No inglês britânico, podemos dizer que a

distribuição das vogais altas e glides está relacionada à estrutura silábica. Após o resumo

das vogais altas e glides a ser apresentado na página seguinte, procederemos à análise

fonológica dos segmentos descritos nesta parte de Fonética.


75

TABELA 7 Ocorrência de vogais, ditongos e glides no português brasileiro e no inglês britânico.

Português brasileiro Inglês britânico


i digno din i fee fi
i vida vida i city sti
V ogais

 mole ml  fit ft


u rugby huibi u boot but
u mula mula u actual æktl
 mato mat  book bk

o estaciona estasona  poor p

Cresc
o sério sro  beer b
Crescentes

e série sre  bear b


a séria sra
e tênue tene
a árdua ahda
o vácuo vako

a pai pa Decrescentes a pie pa


e lei le e fake fek
 réis hs  boy b
o boi bo a cow ka
Ditongos

Decrescentes

 mói m o so so


u flui flu
a pau pa
e meu me
 céu s
o sou so
i viu vi

aa saia saa a hour a


Intervocálicos

o goiaba oaba o lower lo


Intervocálicos

 gibóia iba e layer le


 Medéia meda  coyer k
e teia tea a tired tad
ua cuia kua

Oclusiva + kw quase kwaz Oclusiva+glide kw queen kwin


glide
w guarda wahda w Gwen wn

Glides em início jV yes js


palavra wV will wl

pju pew pju


Seguindo
tju attune tjun
/ptkhnb
kju queue kju
m/ e antes
de /u/ hju hue hju
nju new nju
bju beauty bjuti
mju music mjuzk
76

3. FONOLOGIA

3.1 Introdução

A fonologia é o ramo da lingüística que investiga como os sons da fala são

distribuídos nas estruturas das línguas naturais, formando seus sistemas sonoros (Katamba,

1989). A fonologia interpreta os resultados fonéticos em função dos sistemas sonoros das

línguas e dos modelos teóricos lingüísticos existentes. Seu principal objetivo é investigar

os princípios que governam o modo de organização dos sons nas línguas naturais e explicar

suas variações.

Um procedimento comum visando caracterizar a estrutura sonora de uma língua é

primeiramente, determinar quais sons são lingüisticamente significativos e como estes sons

se combinam para formar enunciados. O próximo passo empreendido na pesquisa

fonológica é comparar sistemas sonoros diferentes, levantar hipóteses sobre o

comportamento de tais sistemas e por fim, tentar generalizar como os sistemas sonoros

operam-se nas línguas naturais (Crystal, 1997).

O sistema sonoro de uma língua pode ser analisado fonologicamente em nível

segmental, ou seja, procede-se à análise dos segmentos consonantais e vocálicos. No

entanto, várias outras características fonológicas afetam os segmentos, tais como a sílaba,

as palavras, as frases e as sentenças. A análise de traços fonológicos de unidades maiores

que o segmento, é uma preocupação de vários modelos fonológicos. Padrões de ritmo,

tempo, volume, tom de voz, são geralmente estudados pela fonologia supra-segmental na

escola americana e na prosódia na escola européia (Crystal, 1997).


77

Este terceiro capítulo, intitulado ''Fonologia'', pretende discutir algumas análises

fonológicas para as vogais altas e glides no português brasileiro e no inglês britânico. Os

sons em estudo serão discutidos em diferentes modelos teóricos. Primeiro, serão expostos

os passos de uma análise fonológica estrutural, indicando o estatuto fonológico destes sons

nas línguas em estudo. Esta análise é baseada no modelo fonêmico de Pike (1947).

Posteriormente, trataremos das vogais altas e glides no português brasileiro e no inglês

britânico na perspectiva de modelos gerativo, na fonologia autossegmental e na teoria da

otimalidade.

3.2 O Modelo fonêmico

3.2.1 Introdução

Um dos objetivos da fonologia é descrever o sistema sonoro de uma língua, ou seja,

o conjunto de elementos abstratos relacionados entre si que o falante utiliza para

discriminar e delimitar as unidades significativas de sua língua (Mori, 2001). Esta

descrição do sistema de uma língua pode ser feita através da identificação dos fonemas

desta língua e através de testes com critérios de oposição, distribuição complementar,

semelhança fonética, variação livre e pressão estrutural.

A fonêmica propõe-se a analisar a cadeia sonora das línguas a partir de

pressupostos teóricos de tendência estruturalista. Um dos objetivos da fonêmica é

converter a linguagem oral para a linguagem escrita, base do livro de Kenneth Lee Pike,

“Phonemics: a technique to reduce languages to writing” publicado em 1947.


78

3.2.2 Fonemas

Os fonemas são determinados de acordo com sua função para diferenciar palavras,

ou seja, a diferença fonêmica é distintiva ou contrastiva. O fonema é uma unidade de som

capaz de contrastar o significado da palavra. O critério para identificar fonemas em uma

língua é encontrar duas palavras com cadeia de sons idêntica, mas com a diferença em

apenas um som, em um mesmo ambiente. Este grupo de duas palavras é denominado par

mínimo.

Consideremos alguns pares mínimos do português: “mar” [mah]12, “bar” [bah],

“dar” [dah], “lar” [lah]. Estes exemplos são itens lexicais com diferença somente no som

do ambiente inicial. Podemos interpretar a primeira consoante de cada palavra acima como

fonemas consonantais do português, pois sua substituição acarreta em mudança de

significado. O mesmo procedimento pode ser seguido para a identificação de fonemas

vocálicos. Como nos exemplos “pira” (do verbo pirar) [pi] e “pura” [pu], em que a

substituição dos fonemas vocálicos /i/ e /u/ da primeira sílaba de cada palavra altera o

significado. A partir do teste do par mínimo pode-se concluir se os sons ou fones em

estudo tratam-se de fonemas ou não. Dois sons são considerados fonemas distintos quando

no teste do par mínimo demonstramos a oposição entre estes sons.

12
O fone ou som é representado por colchetes [ ].
79

3.2.3 Distribuição complementar

A distribuição complementar estabelece que, se dois fones ocorrem em ambientes

mutuamente exclusivos, podem ser considerados alofones de um mesmo fonema. Esta

noção fundamenta-se no princípio de Pike (1947), no qual os sons tendem a ser afetados

por contextos lingüísticos específicos. Estes contextos podem ser os sons vizinhos, a

posição de ocorrência em unidades maiores (sílaba, palavra, etc.), os elementos supra-

segmentais, ou as informações lexicais e gramaticais (palavras simples ou compostas, por

exemplo).

O primeiro passo na busca em classificar fones como alofones de um mesmo

fonema é que estes devem ter semelhança fonética. Pois, por partilharem alguma

propriedade fonética os sons são considerados pares suspeitos. Por outro lado, dois fones

com pontos de articulação distantes, dificilmente seriam alofones de um mesmo fonema.

Por exemplo, os fones [t] e [] possivelmente não serão alofones de um mesmo fonema em

nenhuma língua. O motivo que exclui [t] e [] como alofones é a distância dos pontos de

articulação (alveolar e velar respectivamente) e a diferença de vozeamento também. Sendo

o [t] desvozeado e [] vozeado.

Dois fones são tipicamente alofones de um mesmo fonema se tiverem semelhanças

articulatórias (Mori, 2001). Contudo, a semelhança articulatória não implica

categoricamente em alofonia. No português, os sons [t] e [t] são alofones de um mesmo

fonema: o fonema /t/. Os segmentos [t] e [t] têm semelhança fonética. No português, [t]

e [t] ocorrem em ambientes exclusivos e por isto são classificados como alofones de um
80

mesmo fonema. O som [t] ocorre antes de /i/ e o som [t] ocorre nos demais ambientes.

Dizemos que o fonema /t/ tem os alofones [t] e [t].

3.2.4 Variação livre

Quando alguns sons foneticamente semelhantes encontram-se em ambiente comum

sem modificar o significado da palavra, dizemos que estes sons ou alofones estão em

variação livre (Cagliari, 1997). Como por exemplo, na palavra “dia” em que temos as

pronúncias [di] ou [di]. Dizemos que os alofones [d] e [d] dos exemplos acima, estão

em variação livre. O falante pode usar tanto uma forma quanto a outra, pois não altera o

significado da palavra “dia”.

A variação livre não é condicionada por nenhum contexto estrutural que defina a

ocorrência ou não de sons em distribuição complementar. Em geral, as variantes livres são

condicionadas por fatores externos, não estruturais. Dentre estes, podemos mencionar a

velocidade da fala, a formalidade ou não da situação da fala, a classe social dos

informantes, o sexo, a idade, etc. Estes fatores são chamados de variantes sociolingüísticas.

A sociolingüística estuda os aspectos sociais da língua (McArthur, 1992).

3.2.5 Princípio de pressão estrutural

O Princípio de Pressão Estrutural analisa segmentos que podem ter mais de uma

interpretação fonêmica. Esta definição toma como base a organização estrutural de uma
81

língua na interpretação dos fonemas. Este conceito é muito importante para a análise

fonológica deste trabalho por envolver os glides [j, w].

O Princípio de Pressão Estrutural assume que seqüências características de sons

exercem pressão estrutural na interpretação fonêmica de segmentos suspeitos ou

seqüências de segmentos suspeitos. A interpretação de segmentos suspeitos ou de

seqüências de segmentos suspeitos depende da interpretação silábica de cada seqüência de

segmentos em uma determinada língua. Interpretação silábica é a análise de um segmento

como consonantal ou vocálico em relação à estrutura silábica ou em relação às regras

fonotáticas da língua em estudo. Pike (1947) apud Cristófaro Silva (1999a), demonstra o

Princípio de Pressão Estrutural através de uma língua hipotética. Considere os dados em

(21).

(21) a. [ma] gato


b. [bo] correr
c. [su] céu
d. [sa] folha
e. [ia] lua
f. [tsa] dez

A lista de palavras acima consiste em seis monossílabos. Todos os exemplos

apresentados em (21 a-d) têm a estrutura silábica CV (consoante+vogal). Em (21 e),

temos a palavra [ia] que apresenta uma seqüência de vogais. Em (21 f), temos a palavra

[tsa] que apresenta uma seqüência de duas consoantes e uma vogal. Os casos de (21 e-f)

impedem de assumirmos que esta língua apresenta como único padrão silábico a estrutura

CV (consoante+vogal). Contudo, se em (21 e) – no exemplo [ia] - a vogal alta não tem


82

proeminência acentual, podemos assumir que temos uma seqüência de (glide+vogal).

Como glides podem ser associados a consoantes, dizemos que em [ia], nesta língua,

temos uma sílaba CV que será fonologicamente transcrita como /ja/. No caso de (21e),

podemos assumir que [ts] de fato representa um único segmento africado e temos

também uma sílaba CV que será transcrita como /tsa/.

O Princípio de pressão estrutural é utilizado na análise de segmentos que

foneticamente são ambivalentes. Este é o caso, por exemplo, dos glides, que dependendo

da língua, podem ter uma interpretação fonológica como vogal ou como consoante (Mori,

2001). Tendo em vista a organização do modelo fonêmico apresentado nessa seção,

apresentamos, a seguir, a análise fonêmica das vogais altas e dos glides no português

brasileiro e no inglês britânico separadamente.

3.2.6 A Análise fonêmica das vogais altas e dos glides no português brasileiro

No português brasileiro, as vogais altas tensas /i/ e /u/ são fonemas vocálicos. São

considerados fonemas, pois sua substituição pode acarretar em uma mudança no

significado. Isso é demonstrado nos exemplos abaixo:

Contraste fonêmico entre /i/ e /u/

(22) a. /lia/ “lia” /lua/ “lua”


b. /pira/ “pira” /pura/ “pura”
83

Nos exemplos em (22), observamos pares de palavras cujas cadeias sonoras são

idênticas. Cada par constitui um par mínimo. Nas cadeias sonoras de (22), a diferença está

apenas em um fonema, no caso, o fonema vocálico tônico. As palavras da primeira coluna

acima contêm o fonema /i/ e as palavras da segunda coluna contêm o fonema /u/. A cada

palavra em (22), é atribuído um significado distinto. Isto determina /i, u/ como dois

fonemas distintos. A seguir, analisaremos a alofonia de cada um dos dois fonemas /i/ e /u/

separadamente.

3.2.6.1 A Alofonia de /i/ no português brasileiro

Na análise apresentada aqui, sugerimos que o fonema /i/ possui quatro alofones no

português: [i, , i, j]. Em posição tônica, a ocorrência do alofone [i] é obrigatória, seguido

tanto de consoante quanto de vogal. Os exemplos abaixo demonstram este fato (2):

(23) a. Olimp[i]ada
b. s[i]laba
c. sac[i]

O alofone [i] pode ocorrer opcionalmente, quando em posição átona pretônica

seguido de consoante.13 Neste caso, há variação livre entre os alofones [i] e []. Considere

os dados em (24):

(24) a. p[i]rata p[]rata


b. s[i]r[i]gaita s[]r[]gaita

13
Os casos em que a vogal alta é seguida de vogal serão abordados posteriormente.
84

O alofone [i] também ocorre em posição postônica final em variação livre com o

alofone []. Considere os dados em (25)14:

(25) a. val[i] val[]


b. sobr[i] sobr[]
c. fom[i] fom[]

O alofone [i] ocorre também em posição postônica medial em variação livre com o

alofone [] . Considere os dados em (26):

(26) a. pál[i]do pál[]do


b. pérf[i]do pérf[]do
c. ót[i]mo ót[]mo

O alofone [i] pode alternar com o glide [] em variação livre quando em posição

pretônica precedida por vogal (27 a-c) ou em posição pretônica seguida de vogal (27 d-f).

(27) a. v[ai]dade v[a]dade


b. m[oi]cano m[o]cano
c. j[ui]zado j[u]zado

d. p[ia]da p[a]da
e. p[io]neiro p[o]neiro
f. cr[ia]dagem cr[a]dagem

14
Em algumas variedades do português brasileiro, diferente de Belo Horizonte, ocorre uma vogal tensa [e]
neste contexto: val[e], sobr[e], fom[e].
85

O alofone glide [] pode alternar com a vogal [i] em posição postônica átona,

seguida de vogal. Contudo, prevalece a preferência no português brasileiro pelo alofone

glide [] neste contexto.

(28) a. sáb[]a sáb[i]a


b. vár[]as vár[i]as
c. gêm[]os gêm[i]os

O alofone glide [] também tem ocorrência obrigatória em posição postônica

precedida de vogal, em ditongos decrescentes, como em (29):

(29) a. s[e]va
b. b[e]jo
c. b[a]xo

Há casos em que sempre ocorre um glide em posição posvocálica pretônica, como

em [a]morés. Em outros casos, há alternância entre uma seqüência de vogais e uma

seqüência de (vogal+glide). Um exemplos desse último caso é v[ai]dade (com uma

seqüência de vogais) e v[a]dade (com uma seqüência de (vogal+glide)).

Este trabalho assume que em casos como [a]morés, o ditongo é parte da

representação lexical da palavra. Em casos em que uma seqüência de vogais alterna com

seqüência de (vogal+glide) como em v[a]dade e v[ai]dade, o ditongo é decorrente de

alofonia. Assumimos, portanto, que ditongos decrescentes podem ser formados a partir de
86

duas vogais em seqüência – como em “vaidade” – ou podem ser parte da informação

proveniente do componente sonoro – como em “Aimorés”.

Se os ditongos decrescentes são derivados ou lexicalmente presentes é um tópico

polêmico no português (cf. Cristófaro Silva, 1999a). A proposta aqui assumida tem por

objetivo diferenciar casos em que há alternância entre seqüência de (vogal+vogal) e

(vogal+glide) em posição pretônica – como em “vaidade” – e casos em que

obrigatoriamente ocorre uma seqüência de (vogal+glide) pretônico – como em “Aimorés”.

O alofone glide [] também tem ocorrência obrigatória em posição intervocálica

postônica (30 a-c) ou pretônica (30 d-f):

(30) a. sa[]a
b. idé[]a
c. cu[]a

d. go[]aba
e. ma[]ô
f. ba[]uca

O alofone [i] ocorre quando seguido de uma consoante que por sua vez é seguida

de uma vogal [i] epentética15 e outra consoante. A vogal epentética separa o encontro

consonantal. Quando a vogal epentética não ocorre o alofone na posição tônica é a vogal

alta tensa [i]. Os exemplos abaixo demonstram as duas possibilidades:

15
Epêntese é um processo fonológico onde há a adição de um segmento ou som em uma palavra. No caso em
questão, a vogal [i] é epentética.
87

(31) a. s[i]g[i]no s[i]gno


b. V[i]c[i]tor V[i]ctor

Há finalmente, os casos em que formas contendo o infixo –sion- que

obrigatoriamente apresentam uma seqüência de glide e vogal. Observe que na palavra

“estaciona”, temos obrigatoriamente um glide prevocálico. Nestes casos, o alofone

/j/ ocorre por estar vinculado à consoante procedente e à vogal seguinte, tem

comportamento consonantal. Neste caso, representamos fonemicamente o ditongo por /jo/.

O quadro seguinte resume a discussão de alofonia do fonema /i/.exposta nesta seção.

TABELA 8

Os alofones do fonema /i/ no português brasileiro. Sendo V=vogal, C=consoante.

posição tônica seguida de C ou V (obrigatório) p[i]a v[i]da


[i] posição átona seguida de C (opcional) Pretônica v[i]tal v[]tal
/i/
Postônica final val[i] val[]
medial ar[i]do ár[]do
posição pretônica precedida de V (opcional) v[ai]dade v[a]dade
posição pretônica seguida de V (opcional) p[ia]da p[a]da
Posição postônica seguida de V (opcional) sáb[i]a sáb[]a
[] posição átona seguida de C (opcional) Pretônica v[]tal v[i]tal
Postônica final val[i] val[]
medial ar[i]do ar[]do
postônica seguida de V sáb[]a sáb[]a
[] posição pretônica seguida de V (opcional) p[ia]da p[a]da
glide posição postônica seguida V (opcional) sáb[i]a sáb[]a
Posi- posição pretônica precedida de V (opcional) v[a]dade v[ai]dade
ção
átona posição postônica precedida de V (opcional) s[e]va
adj. a
vogal
posição postônica intervocálica s[a]a
[i] posição tônica seguida de C1$C2[V epentética] s[i]g[i]no
[j] Formas com o infixo –sion- Na[sjon]al
88

A TAB. 8 da página anterior, resume os alofones do fonema /i/ no português brasileiro.

Observamos que o acento é muito relevante na análise fonêmica. Os alofones do fonema

/i/ são [i, , i, j].

3.2.6.2 A Alofonia de /u/ no português brasileiro

Neste trabalho, sugerimos que o fonema /u/ no português brasileiro possui quatro

alofones, [u, , u, w]. Primeiramente, o alofone [u] ocorre obrigatoriamente em posição

tônica seguido de consoante ou vogal. Como em:

(32) a. tat[u]
b. l[u]a
c. t[u]mulo

O alofone [u] pode ocorrer opcionalmente, quando em posição átona pretônica

seguido de consoante.16 Neste caso, há variação livre entre os alofones [u] e [].

Considere os dados em (33):

(33) a. c[u]rral c[]rral


b. l[u]gar l[]gar

16
Os casos em que a vogal alta é seguida de vogal serão abordados posteriormente.
89

O alofone [u] também ocorre em posição postônica final em variação livre com o

alofone []. Considere os dados em (34)17:

(34) a. vas[u] vas[]


b. cal[u] cal[]

O alofone [i] ocorre também em posição postônica medial em variação livre com o

alofone [] . Considere os dados em (35):

(35) a. acúm[u]lo acúm[]lo


b. túm[u]lo túm[]lo

O alofone [u] ocorre em alternância com o glide [] em posição pretônica

precedida de vogal (36 a-c) ou seguida de vogal (36 d-f).

(36) a. re[u]nião re[]nião


b. pre[u]cupação pre[]cupação
c. c[u]elho c[]elho

d. m[u]ambeiro m[]ambeiro
e. emp[u]eirado emp[]eirado
f. menstr[u]ação menstr[a]ção

O alofone glide [] pode alternar com a vogal [u] em posição postônica átona

seguida de vogal. Contudo, prevalece a preferência no português brasileiro pelo alofone

glide [] neste contexto.

17
Em algumas variedades do português brasileiro, diferente de Belo Horizonte, ocorre uma vogal tensa [o]
neste contexto: vas[o], cal[o]
.
90

(37) a. árd[]a árd[u]a


b. inóc[]a inóc[u]a
c. ingên[]a ingên[u]a

O alofone glide [] ocorre obrigatoriamente, em posição postônica precedida de

vogal, em ditongos decrescentes18

(38) a. pa[]sa
b. ca[]sa

O alofone [u] ocorre no português brasileiro quando seguido de uma consoantes,

uma vogal epentética [i] e outra consoante. Considere o exemplo em (39)19.

(39) a. r[u]g[i]by

Há casos em que o glide /w/ ocorre conjuntamente com uma consoante oclusiva

velar. Exemplos deste caso são: “guarda”, “quase”. Neste caso, o glide /w/é parte da

consoante. Por ter este estatuto consonantal, este glide será transcrito fonemicamente por

/w/.

A TAB. 9 que se segue resume a discussão de alofonia do fonema /u/ apresentada

nas páginas precedentes.

18
O processo de vocalização do /l/ como em “tal” não é considerado neste trabalho.
19
Este foi o único exemplo encontrado.
91

TABELA 9

Os Alofones do fonema /u/ no português brasileiro.

posição tônica seguida de C ou V (obrigatório) r[u]a m[u]la


/u/ [u] posição átona seguida de C (opcional) Pretônica c[u]rral c[]rral
Postônica Final Cal[u] cal[]
Medial cúm[u]lo cúm[]lo
posição pretônica precedida de V (opcional) r[eu]nião r[e]nião
posição pretônica seguida de V (opcional) c[u]ca c[]ca
posição postônica Árd[]a árd[]a
[] posição átona seguida de C (opcional) Pretônica c[]rral c[u]rral
Postônica Final Cal[] cal[u]
Medial cúm[u]lo cúm[]lo
[] posição pretônica seguida de V (opcional) c[u]ca c[]ca
glide posição postônica seguida V (opcional) Árd[]a árd[]a
posi-
ção posição pretônica precedida de V (opcional) r[eu]nião r[e]nião
átona
posição postônica precedida de V c[a]as
adj. a
vogal
[u] posição tônica seguida de C1$C2 [V epentética] r[u]g[i]by
[w] Seqüenciais de (oclusiva velar+glide) g[wa]rda

3.2.6.3 Conclusão

No português brasileiro, os segmentos /i/ e /u/ são fonemas, pois representam

unidades fonológicas distintas. As vogais frouxas [, ], as longas [i, u], os glides [, ]

são alofones ou variantes contextuais ou livres. As vogais [, ] ocorrem somente em

posição átona. As vogais longas [i, u] só ocorrem na posição tônica seguida por uma

consoante e uma vogal epentética. Os glides [, ] correm somente em ditongos crescentes

ou decrescentes, muitas vezes apresentando alternância entre a vogal alta e o glide

correspondente. No caso que os glides /j, w/ ocorrem em português, estes segmentos se

comportam como segmentos consonantais.


92

Concluindo, podemos afirmar que /i, u/ são fonemas no português e que a alofonia

referente a estes segmentos opera em sintonia com a estrutura acentual. Os segmentos

/j, w/ também são fonemas em português, mas apresentam ocorrência restrita. O glide /j/

ocorre somente em formas com o infixo –sion-, como em “estaciona”. O glide /w/ ocorre

como consoante em um grupo restrito de palavras que apresenta seqüências de (oclusiva

velar+glide) como “guarda”, “quase”. Na próxima seção, apresentamos a análise das

vogais altas e dos glides no inglês britânico.

3.2.7 A Análise fonêmica das vogais altas e glides no inglês britânico

3.2.7.1 Os Fonemas /i, u, , /

No inglês britânico, os segmentos /i, u, , , j, w/ são considerados fonemas. Ou

seja, a substituição de qualquer um destes segmentos vocálicos implica em mudança no

significado como demonstrado nos pares mínimos em (1):

(40) a. “sheep” [ip] ovelha “ship” [p] navio


b. “feet” [fit] pés “fit” [ft] ajustar
c. “leap” [lip] pular “lip” [lp] lábio

d. “Luke” [luk] Luke “look” [lk] olhar


e. “shoed” [ud] calçou “should” [d] deveria
f. “fool” [ful] tolo “full” [fl] cheio

g. “year” [j] ano “ear” [] orelha

h. “woozy” [wuzi] alcoolizado “oozy” [uzi] lodoso


93

Os pares mínimos dos exemplos de (1 a-f) demonstram que há oposição entre vogal

longa e breve no inglês britânico. Podemos dizer que a duração vocálica é fonologicamente

distintiva no inglês (cf. Jones, 1969). A análise de Jones leva em consideração a qualidade

vocálica e também as duas categorias de duração: longa e breve.

Quanto aos glides /j, w/, estes operam como fonemas distintos (em contraste com

sua ausência). Isto é demonstrado em (40 g-h). A seguir, apresentamos separadamente a

análise das vogais altas, ditongos dos glides no inglês britânico.

Vimos que a duração vocálica constitui um traço fonológico distintivo no inglês.

Há uma especificidade de comportamento das vogais longas e breves em inglês que está

relacionado ao fato da sílaba ser fechada ou aberta. Sílabas fechadas terminam em

consoantes e sílabas abertas terminam em vogais. Podemos fazer a seguinte generalização

em termos distribucionais para as vogais longas e breves do inglês: 20

• As vogais breves /, / ocorrem somente em sílabas fechadas.

• As vogais longas /i, u/ podem ocorrer em sílabas abertas ou fechadas.

Os exemplos abaixo ilustram o que foi afirmado acima:

(41) a. “fit” [ft] ajustar


b. “fist” [fst] pulso
c. “put” [pt] colocar
d. “fee” [fi] honorários
e. “feet” [fit] pés
f. “feast” [fist] festa

20
As afirmações que se seguem são válidas para quaisquer vogais longas e breves. Contudo, ilustramos
abaixo apenas os casos que envolvem vogais altas.
94

Seguindo o que foi previsto acima, não se deve esperar encontrar vogais breves no

final de sílabas ou palavras em inglês. Isto é porque em final de sílaba e palavra, espera-se

sempre que ocorra uma vogal longa. Contudo, há casos em que vogais tensas breves

ocorrem em final de sílaba e palavra. Considere os exemplos que a seguem:

(42) Final de palavra em sílaba átona

a. “happy” [hæpi] feliz


b. “easy” [izi] fácil

c. “argue” [ju] discutir


d. “value” [vælju] valor

(43) Antes de outra vogal

a. “react” [riækt] reagir


b. “hilarious” [hlearis] hilário

c. “actual” [æktjul] real


d. “voluptuous” [vlptus] voluptuoso

Os casos de (42) e (43) podem ser explicados com a noção de neutralização. A

neutralização expressa o fato de que há a perda de contraste fonêmico em contexto

específico. No inglês, os fonemas // e /i/ perdem o contraste fonêmico em sílaba átona

final ou quando seguidos de outra vogal. Dizemos que os fonemas

/i, / e /u, / neutralizam-se neste contexto. Jones (1969) sugere os símbolos /i, u/ para

expressar a neutralização nestes casos.21

21
Há casos no inglês em que ocorre uma vogal curta tensa /i, u/ sem envolver a neutralização. Isto decorre
do fato de no inglês as palavras poderem ser pronunciadas de duas maneiras diferentes: forma fraca e forma
forte. Este fenômeno está intimamente relacionado à prosódia e abordá-lo aqui, nos desviaria do propósito
central deste trabalho.
95

3.2.7.2 Os Ditongos no inglês britânico

Passamos agora a considerar os ditongos. Há cinco ditongos decrescentes no inglês

RP, que são constituídos por seqüência de vogal e glide. Sendo que o primeiro segmento é

proeminente (e, portanto uma vogal) e, o segundo segmento é um glide. Ao contrário do

português – que pode ter alternância entre ditongos e seqüência de vogais como em

va[i]dade ou va[]dade ou em c[u]ca e c[]ca – os ditongos no inglês são unidades

estáveis. Ditongos em inglês não alternam com seqüências de vogais.

Este fato nos leva a considerar que os ditongos são lexicalmente definidos. Para

corroborar esta perspectiva, devemos considerar o padrão acentual do inglês. Os ditongos

decrescentes (junto com as vogais longas e sílabas travadas) tendem a atrair o acento. Este

fenômeno é conhecido como um caso em que a língua é sensível à quantidade do peso

silábico. Os ditongos, as vogais longas e as sílabas travadas constituem sílabas pesadas.

São justamente as sílabas pesadas que atraem o acento em línguas sensíveis à

quantidade do peso silábico. Sendo assim, podemos assumir que os ditongos no inglês são

parte da informação lexical da língua. Exemplo de ditongos decrescentes em inglês são:

(44) a. [e] [fek] “fake” farsa


b. [a] [pa] “pie” torta
c. [o] [so] “so” então
d. [] [b] “boy” garoto
e. [a] [ka] “cow vaca
96

No inglês britânico, temos ditongos centralizados que são decorrentes do

cancelamento do ''r'' em final de sílaba.

(45) inglês britânico inglês americano

a. [p] [p] “poor'' pobre


b. [t] [t] ”tear” lágrima
c. [b] [b] ''bear'' urso

O segundo elemento do ditongo centralizado é o “schwa” [] que ocorre no mesmo

lugar em que ocorre o ''r'' no final de sílaba no inglês americano. A perda do ''r'' em posição

final de sílaba resultou também no desenvolvimento dos tritongos no inglês britânico. Os

tritongos em inglês podem ser considerados como uma seqüência de (ditongo+schwa). Os

ditongos nesta seqüência podem ser: /a, a, e, o, /. Exemplos de tritongos em inglês

são:

(46) a. [a] [tad] “tired” cansado


b. [a] [a] “hour” hora
c. [e] [le] “layer” camada
d. [o] [lo] “lower” mais baixo
e. [] [k] “coyer” mais modesto

Estes tritongos ocorrem somente no inglês britânico, onde houve a perda do “r” em posição

final de sílaba. Estes ditongos centralizados são decorrentes da perda do ''r'' em final de

sílaba no inglês britânico e não estão relacionados à alternância com as vogais altas

correspondentes. Na próxima seção, consideramos os glides /j, w/ no inglês britânico.


97

3.2.7.3 Os Glides [j, w] no inglês britânico

Os exemplos que seguem (47) demonstram o contraste fonêmico entre os glides

/j, w/ e a ausência de qualquer segmento.

(47) a. “year” [j] ano “ear” [] orelha


b. “woozy” [wuzi] alcoolizado “oozy” [uzi] lodoso

Nesta seção, pretendemos demonstrar que os glides /j, w/, em inglês, comportam-

se como segmentos consonantais. Do ponto de vista fonético, os glides

/j, w/ correspondem aos segmentos vocálicos. Isto porque há passagem livre da corrente

de ar durante a produção destes segmentos. Durante a produção de /j, w/, o corpo da

língua encontra-se na mesma posição da produção das vogais altas /i, u/. A diferença entre

a articulação das vogais altas e glides correspondentes, está no estreitamento maior entre os

articuladores, ou seja, a língua está mais próxima ao palato na produção dos glides. A

maior proximidade entre a língua e o palato pode dar aos glides o estatuto de consoante

(Schane, 1973).

A interpretação fonológica dos glides no inglês britânico como consoante, pode ser

demonstrada pela regra gramatical que especifica a forma do artigo definido. O artigo

definido ''the'' é pronunciado [], quando a palavra que o segue se inicia por vogal. Por

sua vez, quando precede palavras iniciadas em consoante o artigo definido é pronunciado

[]. Considere os dados em (48):


98

(48) a. “the apple” [ æpl] a maçã


b. “the pear” [ p] a pera
. c. “the year” [ j] o ano
d. “the one-hour limit” [ wn a lmt] o limite de uma hora

Podemos perceber pelos exemplos de (48), que os glides em questão devem ser

interpretados como consoante, pois a forma [] ocorre. A forma [] é aquela que é

prevista para os casos que o artigo é seguido de consoante (cf. 48 b). Observamos que em

“the year” [ j], o ano e, em “the one-hour limit” [ wn a lmt], o limite de uma

hora, a forma do artigo definido “the” no inglês, é realizado como []. A discussão

acima, referente a forma assumida pelo artigo definido quando a palavra seguinte se inicia

por um glide, corrobora a análise de que os glides /j, w/ comportam-se como consoantes

no inglês.

O glide /j/ também ocorre em inglês quando precedido de consoantes e seguido da

vogal /u/. Exemplos são: “new” [nju] novo, “attune” [tjun] afinar,“beauty” [bjuti]

beleza, “music” [mjuzk] música. Nestes casos, assumimos que o glide comporta-se

como consoante pelo fato deste co-ocorrer com uma consoante (que precede o glide),

formando uma unidade. Nestes casos, o glide preserva a sua estrutura, não alternando com

a vogal alta correspondente.

Finalmente, há casos em que o glide /w/ ocorre conjuntamente com uma consoante

oclusiva. Exemplos deste caso são: “twelve” [twlv] doze, “dwell” [dwl] morar. Neste
99

caso, o glide /w/ é parte da consoante. Por ter este estatuto consonantal, tal glide será

transcrito fonemicamente por /w/.

3.2.7.4 Conclusão

No inglês britânico, os segmentos vocálicos /i, , u, / são fonemas. As vogais

tensas curtas [i, u] ocorrem como uma decorrência da neutralização entre vogais longas e

breves em contextos específicos (posição átona final e quando seguidos de uma vogal). As

vogais altas breves /, / ocorrem somente em sílabas fechadas. As vogais longas

/i, u/ podem ocorrer em sílabas abertas ou fechadas. Os ditongos decrescentes são

estáveis no inglês, ou seja, não há a alternância entre o glide e a vogal alta. Os glides

/j, w/ são interpretados como consoantes.

3.2.7.5 Conclusão geral de fonêmica

Apresentamos a análise das vogais altas e glides no português brasileiro e no inglês

britânico, sob a perspectiva do modelo fonêmico. É apresentada a seguir uma tabela

comparativa das vogais altas e glides no português brasileiro e no inglês britânico.

TABELA 8

Tabela comparativa de vogais altas e glides no português brasileiro e no inglês britânico.

Português brasileiro Inglês britânico


fonemas Vocálico i, u i, , u, 
consonantal j,w j, w
alofones e neutralização i, , u,  i, u
100

A TAB. 8 mostra que os fonemas vocálicos do português, ou seja /i, u/,

correspondem aos casos de neutralização no inglês. Por outro lado, os fonemas vocálicos

do inglês, ou seja, /i, , u, /, correspondem aos alofones em português. Os fonemas

consonantais /j, w/ ocorrem nas duas línguas. Vale, entretanto ressaltar, que os contextos

de ocorrência dos fonemas /j, w/ são completamente diferentes nas duas línguas. Em

português, /j/ com o estatuto de consoante, ocorre em formas com o infixo –sion-

(“estaciona” [estasjon]) e em inglês, /j/ ocorre em início de palavra seguido de vogal

(“year” [j] ano) com o estatuto de consoante. E, após certas consoantes e seguido da

vogal /u/ (“music” [mjuzk] música). Em português, /w/ ocorre em seqüências de

(oclusiva velar + glide) (“quase” [kwaz]) e em inglês, /w/ ocorre em início de palavra

seguido de vogal (“water” [wt] água) e em seqüências de (oclusiva+glide) (“twice”

[twas] duas vezes). Em ambas as línguas, o glide /w/ tem o estatuto fonológico de

consoante.

O modelo fonêmico nos permite organizar os segmentos em categorias específicas.

Pode-se organizar as unidades funcionalmente relevantes (os fonemas) e as unidades que

variam em contextos estruturais específicos ou devido a fatores não estruturais (alofones).

Contudo, o modelo fonêmico apresenta problemas em formular generalizações sobre a

estrutura sonora.
101

Observe, por exemplo, que no português brasileiro, a alofonia de /i/ e /u/ é

operacionalmente semelhante. Por exemplo, as vogais frouxas [, ] ocorrem em sílabas

átonas. Contudo, a relação entre os alofones [] e [] não pode ser expressa no modelo

fonêmico. O modelo fonêmico permite expressar apenas a relação entre /i/ e o alofone []

e entre /u/ e o alofone []. Mas, de fato, o alofone [] e o alofone [] estão relacionados

ao mesmo fenômeno: que determina que vogais tensas podem se manifestar como frouxas

quando em sílaba átona.

Podemos dizer que o modelo fonêmico não permite expressar as generalizações

encontradas nas línguas naturais. Este foi um argumento forte para apoiar a proposta do

modelo fonológico gerativo padrão. A fonologia gerativa padrão introduz a noção de

processo que relaciona alofones entre si e expressa as generalizações na estrutura sonora

das línguas naturais.

Outro problema do modelo fonêmico é quanto a considerar o fonema como unidade

mínima de análise. A fonologia gerativa padrão assume que os fonemas (que de fato são

determinados segmentos na fonologia gerativa) são compostos de traços distintivos.

Relações estabelecem-se entre segmentos que compartilham propriedades expressas por

traços distintivos. Processos fonológicos regulam a organização da estrutura sonora.


102

3.3 O Modelo gerativo padrão

3.3.1 Introdução

O Modelo Gerativo Padrão em fonologia é parte da Gramática Gerativa

Transformacional proposta por Chomsky, 1968 apud Cagliari, 1997. Chomsky demonstrou

que as análises estruturais anteriores eram inadequadas em muitos aspectos. Na sua

proposta, Chomsky considerou o conhecimento lingüístico interno do indivíduo como

sendo a ''competência'' do falante e o uso real desta língua em situações reais foi

denominado ''desempenho''. Chomsky argumenta que a lingüística deve se preocupar com

o estudo da competência e não se restringir ao estudo do desempenho. Ao estudarmos

dados de desempenho poderemos explicitar o comportamento da competência. Portanto,

uma descrição das regras que governam a estrutura da competência, seria o objetivo mais

importante do modelo gerativo (Crystal, 1997).

Na fonologia, a forma de superfície (relacionada ao desempenho) é representado

entre [ ] e a forma subjacente (relacionada à competência) é representada por / /. As

representações fonológicas são sujeitas aos processos fonológicos de uma língua. Os

processos fonológicos expressam as alternâncias segmentais e são formalizados por regras

fonológicas. As regras fonológicas são elaboradas na forma A B / C_D (Sendo A, B, C,

D categorias opcionais). O símbolo A corresponde à descrição estrutural, o símbolo B

corresponde à mudança estrutural e C e D correspondem aos ambientes que contextualizam

as regras. As regras fonológicas geram novas estruturas por meio de transformações.


103

Schane (1973) propõe as seguintes categorias para classificar os processos

fonológicos:

1) Assimilação;

2) Processo fonológico na estrutura silábica;

3) Enfraquecimento e fortalecimento;

4) Neutralização.

O modelo gerativo introduz a noção de processos fonológicos que são formalizados

por regras cuja formalização envolve os traços distintivos.

3.3.2 Os Traços distintivos

Vimos que no modelo fonêmico, o fonema é considerado a unidade básica da

fonologia. No entanto, há uma série de evidências mostrando que várias propriedades

específicas dos sons seriam as unidades básicas da fonologia, não o fonema. O fonema de

fato seria constituído por um conjunto de propriedades, denominadas traços distintivos,

que se realizam simultaneamente.

A teoria dos traços foi introduzida por Jakobson, Fant e Halle em 1952, apud

Katamba (1989), no livro “Preliminaries to speech analysis” e posteriormente em

“Fundamentals of language” em 1956, por Jakobson e Halle. Estes autores postularam

traços definidos em termos acústicos, privilegiando as propriedades físicas dos sons.

Consideraram estes traços universais, ou seja, poderiam definir as propriedades dos


104

fonemas de qualquer língua natural. Este sistema foi criticado por não levar em conta os

traços articulatórios dos sons.

De todos os trabalhos que adotaram a noção de traços distintivos, o mais difundido

foi o SPE (“The Sound Pattern of English”) de Chomsky & Halle (1968) apud Katamba

(1989). Chomsky & Halle propuseram uma revisão na teoria dos traços distintivos

apresentados em Jackobson, Fant & Halle (1952) e Jackobson & Halle (1956) apud

Katamba (1989). No livro “The Sound Pattern of English”, os autores substituíram os

traços definidos acusticamente por traços com correlatos articulatórios. O número de traços

distintivos foi aumentado substancialmente, porém continuaram com a propriedade binária.

São assumidos dois coeficientes ou valores, o sinal (+) indicando a presença do traço e o

sinal (-) indicando a ausência do traço (Katamba, 1989). Apresentamos a seguir, a lista dos

traços distintivos relevantes para esta pesquisa.

3.3.3 Traços de classes principais

Os traços de classes principais definem as principais classes de sons relevantes em

uma análise fonológica. São traços distintos que dividem os segmentos fonológicos de uma

língua em classes lingüisticamente significativas. As definições a seguir estão baseadas nos

trabalhos de Katamba (1989) e Mori (2001).

Silábico [silábico]: Sons silábicos são sons que funcionam como núcleo silábico e os não-
silábicos ocorrem como margens na sílaba. Normalmente, os sons silábicos são mais
proeminentes auditivamente que os sons adjacentes não-silábicos. As vogais são silábicas e
no inglês, por exemplo, consoantes como [l] em “bottle” ou [n] em “cotton” são silábicas.

Consonantal [consonantal]: Sons consonânticos são sons produzidos com uma constrição
ao longo da linha central do trato vocal. Esta constrição pode ser total ou parcial. Os sons
não consonânticos não apresentam essa constrição. Assim, as vogais e os glides [w, j] em
105

estudo são [-cons]. As consoantes plosivas, nasais, líquidas, fricativas, africadas são
[+cons].

3.3.4 Traços do corpo da língua

Os traços do corpo da língua caracterizam as movimentações da língua em relação à

posição neutra. No SPE, a posição neutra do corpo da língua refere-se à posição assumida

na produção de uma vogal média anterior.

Alto [alto]: Sons altos são produzidos com uma elevação do corpo da língua acima da
posição neutra e os não-altos são produzidos sem esta elevação. As vogais altas, glides [j,
w], são sons [-alto].

Baixo [baixo]: Sons baixos são produzidos com o corpo da língua abaixado em relação à
posição neutra e os não-baixos não apresentam esta característica. As vogais altas, sons em
estudo, são [-baixo].

Recuado [recuado] ou [posterior]: São sons produzidos com uma retração do corpo da
língua de sua posição neutra. Os sons produzidos com o corpo da língua em posição neutra
ou sem esta retração são chamados não-recuados. O glide [w] é [+recuado]. A vogal alta
[i] é [-recuado] e a [u] é [+recuado].

Raiz da língua avançada [ATR] (Advanced Tongue Root): A raiz da língua é puxada em
direção à parte anterior do trato vocal, o que faz com que a cavidade faríngea aumente e
produza uma elevação do corpo da língua. Os sons [-ATR] são produzidos numa posição
neutra. Também pode diferenciar as vogais tensas [+ATR] das frouxas [-ATR].

3.3.5 Traços relacionados com o formato dos lábios

Estes traços caracterizam o estreitamento da passagem da corrente de ar tanto pelo

arredondamento dos lábios, quanto pela constrição das vogais ou consoantes labiais.

Somente um traço desta categoria será utilizado neste trabalho:

Arredondado [arredondado] Os sons arredondados são produzidos com o arredondamento


dos lábios, como na vogal alta posterior do português [u]. Os não-arredondados são
produzidos com a distensão dos lábios ou sua posição neutra como em [i].
106

3.3.6 Traços prosódicos

Os traços prosódicos ou supra-segmentais que são geralmente associados com a

sílaba ou palavra, são difíceis de serem descritos em termos fonéticos. O sistema proposto

por Chomsky & Halle (1968) inclui três traços e somente dois são relevantes para esta

análise22:

Longo [longo]: Este traço refere-se à duração de um segmento. Uma vogal pode ser
[+longa] ou [-longa]. Neste último caso, temos uma vogal curta.

Acento [acento]: Todas as sílabas tônicas em uma palavra são mais proeminentes que as
átonas, mas a manifestação de tonicidade varia. A sílaba tônica é percebida como mais
forte devido a uma associação de tom mais alto, maior duração e maior intensidade do
sinal, que é percebido como volume. Essa maior intensidade da sílaba tônica era
considerada característica da vogal, não propriamente da sílaba.

Nas páginas precedentes, caracterizamos os traços distintivos propostos pela

Fonologia Gerativa Padrão que serão utilizados nesse trabalho. Um outro aspecto

importante deste modelo envolve a formalização de processos fonológicos que expressam

as generalizações em regras. A explicitação de todo o mecanismo que rege a formalização

de regras fonológicas nos desviaria do propósito deste trabalho. Optamos, portanto, em

discutir os processos fonológicos relacionados às vogais altas e glides no português

brasileiro e no inglês britânico. Pretendemos avaliar as contribuições da Fonologia

Gerativa Padrão e ao mesmo tempo, apontar as falhas que contribuíram para o surgimento

de novas propostas teóricas. Nas páginas que se seguem apresentamos uma proposta de

análise de vogais altas e glides no português brasileiro e no inglês britânico.

22
O terceiro traço (que não utilizaremos) é “tom”. Este traço é utilizado na descrição de línguas tonais, onde
a mudança de tom é utilizada para diferenciar o significado das palavras ou demonstrar distinções
gramaticais.
107

3.3.7 As Vogais altas e os glides no português brasileiro

3.3.7.1 Introdução

Nesta seção, apresentaremos uma análise através do modelo gerativo das Vogais

Altas e Glides no português brasileiro. Esta análise está baseada em trabalhos de Azevedo

(1981) e Katamba (1989). Consideremos inicialmente os traços distintivos utilizados na

caracterização dos segmentos vocálicos altos do português brasileiro /i, u/.

TAB. 9

Traços distintivos para as vogais altas no português brasileiro

/i/ /u/
[alta] + +
[baixa] − −
[anterior] + −
[posterior] − +
FONTE: AZEVEDO, 1981. p. 11.

As vogais /i, u/ são [+alta, -baixa]. Estas vogais se diferenciam quanto aos traços

[anterior, posterior]. A vogal /i/ tem os valores [+anterior, - posterior] e a vogal /u/ tem os

valores [-anterior, +posterior]. Estes traços são aqueles relevantes para a caracterização dos

segmentos /i, u/. Contudo, se considerarmos os segmentos /j, w/, vamos necessitar de

outros traços distintivos. As vogais altas são [-consonantal], [+silábico] e /j, w/ são

[+consonantal], [-silábico]. O traço [arredondado] também é relevante para caracterizar as

vogais altas e glides. A TAB. 10 a seguir mostra a especificação dos traços para

/i, u, j, w/.
108

TABELA 10

Traços utilizados na caracterização de /i, u, j, w/ no português brasileiro.

/j/ /w/ /i/ /u/


[consonantal] − − − −
[silábico] − − + +
[alta] + + + +
[baixa] − − − −
[anterior] + − + −
[posterior] − + − +
[arredondado] − + − +

FONTE - AZEVEDO, 1981. p. 12

A matriz fonológica de /i, u, j, w/ foi apresentada acima. A TAB. 11 abaixo,

específica os traços para a matriz fonética das vogais altas e glides no português brasileiro

que compreende os segmentos [i, , j, i, u, , w, u].

TABELA 11

Traços distintivos dos alofones das vogais altas e glides no português brasileiro.

i  j i u  w u

[consonantal] − − − − − − − −

[silábico] + + − + + + − +

[alta] + + + + + + + +

[baixa] − − − − − − − −

[anterior] − − − − − − − −

[posterior] − − − − + + + +

[arredondado] − − − − + + + +

[tenso] + − − + + − − +
109

Um dos problemas do sistema de traços é que a especificação de valor para um

traço implica na especificação de valor para outro traço. Por exemplo, os segmentos

[+altos] são [-baixos]. Um outro problema do modelo seria a relação entre as matrizes

fonética e fonológica. Contudo, a formalização das regras fonológicas possibilitaram

expressar generalizações e este aspecto encobriu (parcialmente) os problemas inerentes ao

modelo. A seguir, apresentamos alguns processos fonológicos relevantes na caracterização

da estrutura sonora do português brasileiro.

3.3.7.2 Processos fonológicos no português brasileiro

Os processos fonológicos são formulados de maneira simples, econômica e

objetivam refletir generalizações. As regras fonológicas formalizam os processos

fonológicos. Consideremos alguns processos expressos pelas RF (regras fonológicas) que

são apresentados a seguir.

RF1: Redução da tensão em posição átona.

+alto
+silábico [-ATR] / _______
-longo [-acento]

A RF1 prevê que os segmentos /i, u/ transformam-se em seus correspondentes

frouxos [] e [], quando em posição átona ou não acentuada. Esta regra permite

generalizar que ''vogais altas tornam-se frouxas em sílaba átona'' incluindo aqui, as duas
110

vogais altas [i, u]. A RF1 é uma regra opcional que explica a alternância entre vogais altas

e glides em exemplos como:

(49) val[i] val[]


áv[i]do áv[]do
v[i]tal v[]tal

cal[u] cal[]
cúm[u]lo cúm[]lo
c[u]rral c[]rral

RF2: Perda de silabicidade (formação de glides).

[+alta] [-silábico] / ([+silábico]) __________ ([+silábico])


[-acento]

A RF2 expressa que uma vogal alta realiza-se como o glide correspondente, quando

seguido ou precedido de vogal, e também, quando entre vogais. Esta regra permite

generalizar que “vogais altas tornam-se glides quando adjacentes a uma outra vogal”.

Novamente, a regra inclui as duas vogais altas [i, u]. A RF2 é uma regra opcional que

explica a alternância entre vogais altas e glides em exemplos como:

(50) a. sáb[i]a sáb[]a


b. p[ia]da p[a]da
c. v[ai]dade v[a]dade
d. árd[]a árd[u]a
e. c[u]ca c[u]ca
f. r[eu]nião r[e]nião
111

Um problema com RF2 é que devido a seu caráter opcional deveríamos ter formas

alternantes para os seguintes exemplos:23

(51) a. s[e]va
b. d[e]tada
c. s[a]a
d. c[a]sa

Contudo, nos exemplos acima um glide ocorre obrigatoriamente. Nestes casos,

temos que assumir que os segmentos /j, w/ estão presentes na representação subjacente.

Outra alternativa seria marcar lexicalmente as palavras com glide obrigatório. A

opcionalidade ou obrigatoriedade da RF2 é um problema na descrição. Outro problema

está no formalismo em RF2. A presença dos parênteses pode indicar também, a ausência

total dos glides. Por outro lado, se os dois parênteses fossem excluídos, a regra seria

invalidada.

Vejamos a RF3 que caracteriza o alongamento de vogal decorrente de epêntese.

RF3: Alongamento de vogal decorrente de epêntese24

+alta +longa ____ +consonantal $ i* +consonantal


+acento -contínuo -contínuo

A RF3 determina que uma vogal alta passa a ser longa quando seguida de uma

oclusiva (oral) em posição final de sílaba que por sua vez, é seguida de um i* (i-epentético)

23
Casos em que ditongos decrescentes ocorrem em exemplos como [mes] “mês” não serão tratados neste
estudo por não serem típicos do português de Belo Horizonte.
24
$ simboliza o limite silábico.
112

e de outra oclusiva (oral ou nasal), mais uma vez, a regra inclui as duas vogais altas [i, u].

A RF3 explica exemplos como:

(52) a. d[i]g[i]no
b. abr[u]p[i]to

Nos exemplos de (52), quando não ocorre a epêntese temos uma vogal curta:

d[i]gno e abr[u]pto (ou seja, a RF3 não se aplica). Finalmente, temos os casos de palavras

com o infixo –sion- (como “estaciona”) e os casos de seqüências de (oclusiva velar+glide

posterior) em que o glide é especificado na representação subjacente (ver TAB. 12).

3.3.7.3 Conclusão

Apresentamos as regras que caracterizam os processos fonológicos envolvendo as

vogais altas e glides no português brasileiro. Este modelo tem a vantagem de relacionar as

duas vogais altas do português nos processos de redução da tensão em sílaba átona, perda

de silabicidade e alongamento da vogal decorrente da epêntese. Vimos que no modelo

fonêmico, as variações envolvendo as vogais altas /i, u/ são tratadas como casos não

relacionados. Um dos méritos do modelo gerativo é justamente vincular segmentos sonoros

em termos de seu comportamento na estrutura sonora.

Porém, este modelo apresenta problemas. Um deles está relacionado aos casos em

que o glide alterna com a vogal alta correspondente (cf. (50)) e os casos em que o glide não

alterna com a vogal alta correspondente (cf. (51)). Um outro fator importante a ser

observado, é que a sílaba e o acento estão presentes na formulação das regras. Note,

contudo, que nem a sílaba, nem o acento têm qualquer tipo de estatuto teórico no modelo
113

gerativo. Além destas questões, há o fato do modelo gerativo possuir um poder excessivo

de abstração propiciando a postulação de formas subjacentes muito abstratas. A seguir,

apresentamos uma proposta de análise das vogais altas e glides no inglês britânico sob a

ótica do modelo gerativo.

3.3.8 As Vogais altas e os glides no inglês britânico

3.3.8.1 Introdução

Nesta seção, analisaremos as vogais altas e glides no inglês britânico sob a ótica do

modelo gerativo. A tabela que se segue apresenta os traços distintivos dos segmentos:

TABELA 12

Traços distintivos das vogais altas e glides no inglês britânico.

i  j u  w

[consonantal] − − − − − −

[silábico] + + − + + −

[alta] + + + + + +

[baixa] − − − − − −

[anterior] − − − − − −

[posterior] − − − + + +

[arredondado] − − − + + +

[tenso] + − − + − −

[longo] + − − + − −
114

A TAB. 12 da página anterior ilustra a matriz fonológica das vogais altas e glides

no inglês britânico. Os únicos segmentos adicionais a ocorrerem na matriz fonética são

/i, u/. Passamos então, a avaliar os processos fonológicos.

3.3.8.2 Processos fonológicos no inglês britânico

Considere a RF4 que descreve a ocorrência de vogal breve em final átono de

palavra e quando adjacente a outra vogal.

RF4: Perda da propriedade [+longo]

+silábico [-longo] / _______ ##


+alto [-acento] [+silábico]

O processo descrito em RF4 determina que uma vogal alta torna-se breve em duas

situações (as chaves demonstram contextos exclusivos): 1) quando em final de palavra em

sílaba átona ou 2) quando seguido de uma vogal em sílaba não acentuada. A RF4 permite-

nos agrupar os casos ilustrados em (53):

(53) a. “happy” [hæpi] feliz


 b. “value” [vælju] valor
c. “react” [riækt] reagir
d. “actual” [æktjul] real

O processo expresso pela RF4 agrupa as vogais altas /i, u/ e também relaciona

dois contextos que propiciam a redução da vogal. Este, de fato, é um grande mérito do

modelo. contudo, novamente verificamos que o acento e a sílaba (simbolizada por # por
115

coincidir com o final de palavra) ocorrem na notação de RF4, mas não têm um estatuto

teórico no modelo gerativo. Podemos ainda, expressar no modelo gerativo o caso de

inserção de glides:

RF5: Inserção de glides

Ø -consonantal / [+consonantal] ____ +silábico


-silábico +alto
+anterior +posterior
+longo

A RF5 descreve que há inserção de um glide /j/ quando ocorre um segmento

consonantal que é seguido da vogal /u/.25 A RF5 explica casos como:

(54) a. “beauty” [bjuti] beleza


b. “attune” [tjun] afinar
c. “music” [mjuzk] música
d. “new” [nju] novo

25
De fato há restrições quanto às consoantes que podem preceder o glide. Contudo, por propósitos
descritivos indicamos apenas a característica do segmento como [+consonantal].
116

3.3.8.3 Conclusão

No caso do inglês britânico, podemos explicitar que as vogais tornam-se curtas em

posição átona ou em final de palavra ou quando adjacente a outra vogal. Podemos afirmar

também, que ocorre a inserção de um glide em contexto específico (entre uma consoante e

a vogal /u/). Contudo, uma vez que a sílaba não tem estatuto teórico no modelo gerativo,

torna-se inadequado generalizar que vogais breves ocorrem em sílabas fechadas e vogais

longas podem ocorrer em sílabas fechadas ou abertas. Novamente, o acento e a sílaba são

indicados na formalização das regras fonológicas, mas, ao mesmo tempo, estas unidades

não possuem estatuto teórico a ser levado em consideração.

3.3.8.4 Conclusão geral do modelo gerativo padrão

O modelo gerativo oferece um instrumental de formalização bastante rico. Há

também o mérito de ser possível agrupar unidades sonoras que compartilham

comportamento semelhante (em nosso caso as vogais altas). Por outro lado, o modelo

gerativo padrão oferece uma possibilidade muito ampla de abstração. Veja por exemplo,

que não há nenhuma motivação para se inserir o glide /j/ na RF5. Esta falta de motivação é

uma das falhas do mecanismo de formalização do modelo gerativo padrão.

Há também, o problema de que o modelo gerativo padrão utiliza a sílaba e o acento

no formalismo de representação. Contudo, tais elementos não são incorporados à teoria e

nem mesmo explicita-se como tais unidades operam. Este último ponto, quanto à falta de

estatuto teórico do acento e da sílaba, foi mola propulsora para a formulação de propostas

teóricas subseqüentes.
117

A seguir, discutiremos o modelo da Fonologia Autossegmental, que é um os

modelos de fonologia ''não-linear''. Os modelos não lineares incorporam a sílaba e o acento

à descrição fonológica. Isto oferece um avanço teórico que será demonstrado na próxima

seção.

3.4 O Modelo da fonologia autossegmental

A noção de sílaba como unidade fonológica foi gradativamente sendo aceita a partir

de trabalhos como de Kahn (1976) e Hooper (1976) apud Biondo (1983). No entanto, sua

incorporação à fonologia gerativa, somente aconteceu na década de 80 (Clements &

Keyser 1983; Harris, 1983). Desde então, as pesquisas que giram em torno da natureza e a

importância da sílaba na fonologia têm aumentado (Collischonn, 1996). Há vários modelos

que analisam a sílaba, porém este trabalho restringir-se-á ao modelo autossegmental.

O modelo autossegmental propõe que a análise fonológica é melhor explicitada ao

se incorporar a sílaba como constituinte. A análise da sílaba proposta por Goldsmith (1990)

teve inicialmente, como base, fenômenos fonológicos que ocorrem nas línguas tonais.

Limitar-nos-emos apenas aos aspectos da silabificação, pois é o que é pertinente a este

trabalho. Tomamos como base os trabalhos de Biondo (1993) e Bisol (1989). A fonologia

autossegmental postula que:

• Há uma representação subjacente ou representação lexical para cada forma a ser

analisada, que espelha o conhecimento lingüístico internalizado que o falante

nativo tem de sua própria língua. O processo que uma forma subjacente sofre até

atingir sua forma de superfície é denominado processo de derivação;


118

• Há níveis organizados hierarquicamente;

• Há princípios gerais que atuam autonomamente em cada nível e regras particulares,

selecionadas e ativadas diferentemente em cada língua.

Segundo a teoria, para que uma estrutura seja bem formada, deve obedecer todo o

princípio de um nível, que é organizado hierarquicamente. Caso contrário, ocorre a má

formação desta estrutura. O nível que interessa diretamente ao estudo da estrutura silábica

é o nível da palavra, o nível “P”, onde a silabificação é uma condição de boa formação

sobre as representações. A principal motivação que existe nesta teoria, para propor uma

estrutura interna básica para a sílaba, é o fato da sílaba ser descrita tradicionalmente como

um agrupamento de consoantes e vogais (cf. Malmberg, 1955 apud Biondo, 1993). Este

agrupamento determina um constituinte fonológico composto de três partes:

• uma cadeia de 0 ou mais consoantes denominada onset ou ataque;

• um segmento vocálico, ou núcleo;

• uma cadeia mais curta de zero ou mais consoantes denominada coda ou cauda;

• O símbolo σ representa o nó silábico, ou simplesmente uma sílaba.

O R

N C

t r e s
Figura 7. Estrutura da sílaba
119

A teoria autossegmental prevê também, que a estrutura silábica é organizada

somente sobre a camada CV (consoante e vogal). Cada posição disponível na árvore

silábica associa-se a uma ou mais posições da camada CV. A quantidade e ordem de

segmentos que podem se associar aos elementos da sílaba, se deve principalmente, as

restrições refletidas pelo princípio de sonoridade, em conjunção com as condições de

licenciamento silábico em cada língua.

Bloomfield (1933) apud Biondo (1993), postula que a sonoridade inerente a cada

um dos segmentos podia prever a ordem destes dentro do onset e da coda. Isso fez surgir

um princípio que estipula que as sílabas tendem a ser construídas a partir de um crescendo

de sonoridade até alcançarem o pico sonoro e então, diminuírem a sonoridade.

Entendendo como sonoridade, uma escala que reflete o grau de abertura do aparelho vocal

durante a produção de um som, podemos estabelecer a hierarquia demonstrada abaixo. Ou

seja, os elementos mais sonoros poderão ocupar a posição de núcleo silábico e os menos

sonoros, as posições periféricas.

+
- baixas
vogais - médias
sonoridade - altas

glides [j, w]

líquidas [r, l]

nasais

- fricativas
obstruintes - africadas
_ - oclusivas

(Biondo, 1993).

Outro princípio que se relaciona com a estrutura interna da sílaba é o princípio de

licenciamento silábico. Este princípio postula que todo auto-segmento ou conjuntos de


120

traços fonológicos de uma língua deve receber uma autorização dos licenciadores silábicos

ao nível “P” para que possam ser realizados foneticamente, caso contrário, serão apagados,

(Biondo, 1993, p. 41). O nó silábico σ é o principal licenciador da sílaba.

Os outros dois princípios da teoria são o da direcionalidade da criação de estrutura

silábica e o princípio do onset máximo. O princípio da direcionalidade da sílaba estabelece

que as línguas optam por organizar a silabificação da (esquerda direita) ou da

(direita esquerda). Biondo (1993), argumenta que na silabação do português brasileiro é

um onset mais importante do que uma coda, ou seja, uma sílaba é construída com o menor

número possível de licenciadores.

Em português, o centro da sílaba é sempre uma vogal. Em outras línguas, algumas

consoantes podem ser o centro da sílaba. Contudo, o núcleo de uma sílaba é tipicamente

preenchido por vogais. Sílabas que terminam em vogais são ditas sílabas abertas ou livres.

Em oposição temos sílabas fechadas ou travadas, que são aquelas que terminam em

consoantes pós-vocálicas. Só algumas consoantes podem ocorrer em posição pós-vocálica,

fato que varia de língua para língua. No português brasileiro, as sílabas livres predominam

sobre as travadas.

Goldsmith (1990), chamou a atenção para o fato de que a sílaba não pode ser

desprezada em nenhuma teoria fonológica, pois este elemento está intimamente ligado aos

processos fonológicos das línguas. As regras segmentais podem ser alteradas de acordo

com a estrutura silábica. Em adição, as regras prosódicas envolvendo tom e acento também

estão ligadas à estrutura silábica das palavras. Estes motivos levam a fonologia
121

autossegmental a estudar a sílaba e os fenômenos a ela vinculados. Portanto, a partir da

sílaba, faremos uma análise dos segmentos em estudo na Fonologia Autossegmental.

3.4.1 As Vogais altas e os glides no português brasileiro

Iniciaremos a análise dos segmentos do português brasileiro pelas vogais altas em

posição tônica. O acento pode ser considerado lexical26 ou não lexical. Portanto, em

posição tônica ou acentuada, temos vogais altas tensas /i, u/, que serão picos silábicos,

como mostra o diagrama abaixo:

(55)

s w
σ σ

O R O R

x x x x

N N

p i ∅ a
r u ∅ a

26
Consideramos que no português brasileiro o acento é lexical. Ou seja, esta informação é determinada no
léxico, (CRISTÓFARO SILVA, 1992). Há controvérsia quanto a este tópico (cf. BISOL,1992; LEE, 1994).
Contudo, explorar este tópico transcende o propósito do presente trabalho.
122

Como demonstrado em (55), não há dúvidas quanto a análise das vogais altas

/i, u/ em posição tônica. Explica-se também o caso de epêntese do glide intervocálico em

“pia” [pia] e “rua” [hua]. O modelo autossegmental permite postular e visualizar a

ocorrência de segmentos como decorrente da propagação de um segmento. O espraiamento

ou propagação de um segmento permite que uma posição silábica seja preenchida.

Considere (56).

(56) O R O R

x x x x

p i  a
r u  a

A análise dos glides intervocálicos apresentada em (56), não aparece em outras

propostas de: fonêmica e gerativa. Na fonologia gerativa, deveríamos postular a inserção

de um segmento (o glide), mas sem ter nenhuma motivação para tal proposta. A análise

apresentada em (56), decorre do fato de segmentos poderem se propagar para posições

adjacentes e é fruto do modelo autossegmental.

Quando a vogal alta ocorre em posição átona pretônica seguida de consoante ou

vogal, há alternância entre /i, u/ e /, /. Ou seja, há alternância entre as vogais altas

tensas e frouxas na sílaba fraca no padrão wsw, conforme (57) a seguir.


123

(57)

w s w

O R O R O R

N N N

p i r a t 
p  r a t 

Quando as vogais altas frouxas estão em posição átona – seguida ou precedida de

vogal - podem alternar com seus correspondentes glides. Como em p[i]ada ~ p[]ada,

va[i]dade ~ va[]dade, c[u]eca ~ c[]eca, re[u]nião ~ re[]nião. A alternância entre

vogal-glides pré e pós-vocálicos pode ser compreendida como perda de uma posição

nuclear. Consideremos os glides pré-vocálicos.

3.4.1.1 Os Glides pré-vocálicos

De acordo com o modelo autossegmental, os glides pré-vocálicos podem ter três

representações: em onset ramificado (58 a), em consoante complexa (58 b) e em ditongo

leve (58 c).

(58) (a) O R (b) O R (c) O R

N N N

x x x x x x x x

p  a d a p  a d a p  a d a
a r d  a a r d  a a r d  a
124

O diagrama (58 a) demonstra os glides em onset27 ramificado. Se esta análise tiver

validade, a seqüência consoante-glide em onset ramificado terá o mesmo comportamento

que outra palavra com o onset ramificado. Tomemos como exemplo “prato”, que tem

como onset ramificado, uma consoante oclusiva e uma líquida. Se a palavra “piada”

também possui um onset ramificado (composto de uma oclusiva e um glide), esta estrutura

(onset ramificado) deve se comportar da mesma maneira que a palavra “prato”. Se

omitirmos o segundo segmento do onset de “prato”, subentende-se que “pato” seja “prato”.

Pois em linguagem corrente falada, esta palavra pode ser realizada com a omissão da

líquida “r”. Tomemos outra palavra com o onset também ramificado, “precisa”. Na

linguagem falada, esta palavra pode ser produzida com a mesma líquida omitida sem haver

quebra na comunicação. Ou seja, o onset pode perder a segunda ramificação, sem alterar o

significado.

Cristófaro Silva (1992), discute que encontros consonantais no português brasileiro

podem ocorrer com a omissão da líquida “r, l”. Por exemplo, na palavra “precisa”, pode-se

ter [pi]cisa como pronúncia alternativa. Considere exemplos com onset ramificado sendo

que a líquida pode ser omitida.28

(59) a. [ezepl] [ezep] “exemplo”


b. [otr] [ot] “outro”
c. [flame] [fame] “Flamengo”
d. [braziler] [baziler] “brasileiro”

27
Simbolizaremos os glides em posição de onset por [j, w].
28
Existem alguns casos onde pode haver uma palavra diferente com a omissão da líquida no onset
ramificado. Como em cobre – Kobe.
125

e. [koprimid] [koprimid] “comprimido”

Os exemplos acima mostram que o segundo segmento do onset, uma consoante

líquida, pode ser omitida sem alterar o significado da palavra. No entanto, o

comportamento de (consoante-glide) não é o mesmo, pois o glide, não pode ser omitido.

Exemplos são apresentados em (60).

(60) a. [pad] * [pad] “piada”


b. [d] * [d] “ódio”
c. [kka] * [kka] “cueca”
d. [ahda] * [ahda] “árdua”

Podemos considerar que o diferente comportamento de (consoante+líquida) e de

(consoante+glide) é uma evidência contra a hipótese de silabificação de glides pré-

vocálicos como um onset ramificado.

A segunda possibilidade de análise para glides pré-vocálicos é demonstrada pelo

diagrama em (58 b). Neste caso, temos os glides representados como consoantes

complexas, seguidas por uma vogal em posição nuclear. As consoantes complexas

apresentam certas restrições quanto aos segmentos que possam ocorrer em posição

consonantal. Se as seqüências de glide e vogal correspondem à representação de uma

consoante complexa, deveriam apresentar as mesmas restrições. No português, a

seqüências de (consoante+w) apresentam restrições quanto a consoante – que deve ser

uma consoante velar: “quase” [kwazi] e “lingüiça” [liwisa]. Tipicamente, em

seqüências de consoante e glide como em “piada, “cueca” e “sábia”, “árdua”, não há

restrição consonantal. Qualquer consoante do português pode preceder uma seqüência de

glide-vogal, onde o glide pode alternar com sua vogal alta correspondente. Portanto, esta
126

segunda possibilidade de análise não é a mais apropriada para os glides pré-vocálicos, pois

o comportamento fonológico deveria ser o mesmo das consoantes complexas.

A terceira possibilidade de análise para glides pré-vocálicos, é a demonstrada em

(58 c), ou seja, o glide silabificado em um ditongo leve. Cristófaro Silva (1992), assume

que um ditongo leve “consiste de dois segmentos associados a uma única posição

esqueletal” e cita que “este ditongo, na literatura fonológica é denominado de ditongo

crescente29.

A primeira evidência a favor da análise de glides pré-vocálicos como ditongo leve,

vem do comportamento do acento em português. No português, o acento pode cair na

última, penúltima ou antepenúltima sílaba. Se o glide pré-vocálico corresponde a um

ditongo leve, temos que ele é equivalente a uma única posição nuclear. Sendo assim, numa

palavra como ''família'' com uma seqüência de (glide+vogal) na última sílaba, podemos

esperar um padrão acentual como ''fámilia''. Isto corresponderia ao acento na antepenúltima

sílaba (sendo a penúltima sílaba ''mi'' e a última sílaba ''lia''). Contudo, sempre que temos

um glide pré-vocálico, o acento recai na sílaba que precede esta seqüência. Isto quer dizer

que a os glides pré-vocálicos devem seguir da junção de duas vogais em um ditongo leve.

29
Para BISOL, (1989) “o ditongo leve tem alternância do glide com uma vogal simples, sem causar mudança
de sentido”. Para KAYE, (1985), um ditongo leve é um núcleo não ramificado associado a dois segmentos.
Para o caso em discussão assumimos que no ditongo leve, duas vogais são associadas a uma única posição
esqueletal.
127

Outra evidência para analisar o glide pré-vocálico como parte de um ditongo leve, é

o comportamento fonológico do glide em posição inicial de palavra. O glide pode

comportar-se como vogal, ou como ditongo ou como consoante. Consideremos o dialeto

do português brasileiro carioca.

(61) a. “as armas” [az axma]


b. “os ossos” [z s]
c. “os elefantes” [z elefat]

d. “os bois” [ bo]


e. “as vacas” [a vak]
f. “os jatos” [ at]
g. “os iates” [z at]
h. “os iogurtes” [z ouxt]
i. “os Uerequemas” [z erekemas]

Vemos em (61 a-c), que antes de palavra iniciada em vogal o artigo definido plural

tem [z] como segmento final. Em (61 d-f), vemos que o segmento final do artigo definido

plural é [, ] antes de palavras que se iniciam por consoantes. Em (61 g-i), vemos que

quando ocorre uma seqüência de (glide+vogal) o segmento final do artigo definido plural é

[z], que é o mesmo segmento que ocorre quando a palavra se inicia em vogal. Concluímos

que glides pré-vocálicos comportam-se como vogais.

A última evidência para a silabificação dos glides pré-vocálicos, é o fato de que não

há restrição quanto a consoante que precede a seqüência glide e vogal. Qualquer consoante

pode preceder o glide. Concluímos que a melhor interpretação para o glide pré-vocálico é

como ditongo leve. Neste caso, o glide pré-vocálico é derivado de uma seqüência de

vogais. Pode ocorrer a alternância entre o glide e a vogal alta correspondente.


128

Resta-nos avaliar o glide pré-vocálico quando este não alterna com a vogal alta

correspondente. Estes são o caso de “estaciona” e “quase”, “guarda”. Assumimos que estes

dois casos representam um glide ocorrendo na representação lexical. Em formas com o

infixo –sion-, como em “estaciona” o glide pré-vocálico é parte da representação de um

ditongo leve que é definido lexicalmente (nos casos de “piada”, “cueca”, o glide é

derivado). Nos casos de “quase”, “guarda”, assumimos que o glide é parte da representação

de consoantes complexas que tipicamente apresentam restrições segmentais (que neste

caso se restringe às oclusivas velares). Consideramos a seguir os glides pós-vocálicos.

3.4.1.2 Os Glides pós-vocálicos

Os glides pós-vocálicos quando em posição pretônica podem ou não apresentar

alternância com a vogal alta correspondente. Considere (1).

(62) a.“gaitista” [atst] *[aitist]


b.“Aimorés” [amors] *[aimors]
c. “saudade” [sadad] *[saudad]
d. “aurora” [arr] *[aurr]

e.“moicano” [mokan] ~ [moikanu]


f. “vaidade” [vadad] ~ [vaidad]
g. “reunião” [hena] ~ [heunia]
h. “preocupação” [prekpasa] ~ [prekpasa]

Observamos em (62 a-d), que o glide pós-vocálico não alterna com a vogal alta

correspondente. Nos (62 e-h), o glide pode alternar com a vogal alta correspondente.

Nestes casos, o glide encontra-se em posição pretônica. Neste trabalho, assumimos que as

palavras do grupo (62 a-d) apresentam ditongos lexicalmente definidos. Neste caso, os
129

glides pós-vocálicos estão presentes nas representações lexicais. O argumento para esta

abordagem é que não é permitida a alternância do glide com a vogal alta correspondente.

Assumimos nas palavras de (62 e-h), que o glide pós-vocálico é derivado de uma

seqüência de vogais. A alternância entre o glide e a vogal alta correspondente apóiam esta

abordagem.

Consideremos a seguir, os glides intervocálicos. Em posição postônica, os glides

intervocálicos podem ser silabificados como (63 a) onset, (63 b) ditongo leve, (63 c) coda

e (63 d), forma ambissilábica, como demonstram os diagramas a seguir. Sendo que quando

a vogal alta ocupa uma posição de onset ou outra que não seja a posição nuclear, é

foneticamente manifestada como um glide palatal (como em 15 a, c).

(63) a. O R O R b. O R O R

N N N N

x x x x x x x

s a  a s a  a

c. O R O R d. O R R

N C N N C N

x x x x x x x x

s a  a s a  a

A primeira proposta, de assumir que o glide intervocálico encontra-se em onset,

permitiria que o acento caísse na penúltima posição nuclear antes do glide. Uma forma
130

como ''lácaio'' seria possível, o que de fato não ocorre. Quando o glide intervocálico

ocorre precedendo a vogal correspondente ao sufixo de gênero, o acento cai na vogal

imediatamente anterior ao glide: ''lacáio'' (Cristófaro Silva, 1992). Refutamos assim, a

hipótese de glide intervocálico em onset.

A segunda possibilidade, (63 b), é de que o glide intervocálico encontra-se em

ditongo leve. De maneira análoga ao caso da silabificação do glide intervocálico em

posição de onset, esperar-se-ia um padrão acentual como ''lácaio'' que, como já vimos, não

ocorre. Isso exclui a silabificação do glide intervocálico em ditongo leve.

A segunda possibilidade (63 b), é de glide em ditongo leve. Esta opção elimina a

possibilidade de interpretação de glide em posição marginal. Elimina também, a terceira

proposta (63 c), que pode ocorrer, de glide em coda. Tanto a possibilidade de glide em

coda quanto glide em ditongo leve, podem ocorrer. Portanto, a proposta que assumimos é a

proposta 68 d, como o glide ambissilábico, ou seja, o glide pode terminar uma sílaba ou

iniciar a próxima. Esta proposta engloba a proposta b e c ao mesmo tempo, portanto, sendo

a mais apropriada.

3.4.1.3 A Vogal alta longa

No português brasileiro, a vogal alta anterior longa [i] pode ocorrer em posição

tônica quando precede uma consoante oclusiva no final de sílaba e quando o primeiro

segmento da próxima sílaba também for uma consoante oclusiva (oral ou nasal) que, por

sua vez, é seguido de uma vogal epentética: [diin ], [abrupit].


131

As vogais longas são associadas a duas posições esqueletais (como os ditongos

pesados). Sugerimos que o alongamento da vogal no português brasileiro é decorrente de

um processo de alongamento compensatório. Ou seja, ao ocorrer a epêntese da vogal [i],

uma posição adicional ocorre na posição tônica. Este aspecto necessita de maior

exploração que no momento não pudemos investigar.

3.4.1.4 Conclusão

Vimos na análise das vogais altas e glides no português brasileiro, que muitas

generalizações podem ser feitas ao adotar o modelo da fonologia autossegmental. Dentre

estas generalizações, temos as motivações por um glide intervocálico em palavras como

“pia”, “rua”; evidências da estrutura silábica e do padrão acentual para a representação de

(glide+vogal) como ditongo leve como em ''família''; o estatuto de vogal de seqüências

(glide+vogal) no início de palavras como ''os iates''; interpretação como consoantes

complexas das seqüências de (oclusiva velar+glide) como em ''quase, guarda'' e a

interpretação de glides intervocálicos como segmentos ambissilábicos. Consideramos a

seguir, a análise das vogais altas e glides no inglês britânico.

3.4.2 As Vogais altas e os glides no inglês britânico

No inglês britânico, os segmentos vocálicos /i, u, , / ocupam sempre a posição

nuclear. As vogais longas constituem um núcleo pesado com duas posições esqueletais (cf.

(64 a)) e as vogais breves constituem um núcleo leve (cf. (64 b)). Sendo a duração ou

quantidade um fator importante na estrutura sonora do inglês, este modelo permite que este
132

fato seja fonologicamente representado. A representação das vogais longas e breves é

apresentada a seguir.

(64) a. R b. R

N N

x x x

i 
u 

Podemos generalizar e afirmar que em inglês, somente as sílabas pesadas ocorrem

em final de sílaba. Explicamos porque as vogais longas (ditongos e sílabas com consoantes

pós-vocálicas) ocorrem em final de sílaba. Explicamos também, porque as vogais breves

não ocorrem em final de sílabas. Resumindo, podemos dizer que em inglês a sílaba deve

terminar com duas posições esqueletais (e excluímos assim as vogais breves dessa

posição). Se duas vogais ocorrem juntas no inglês, sempre temos um hiato ou seqüência de

duas vogais em sílabas distintas. Quando numa seqüência de vogais a primeira das duas

vogais é longa, há a redução da quantidade vocálica (Kreidler, 1989).

(65) a. “neon" [ni.n] ⇒ [ni.n] néon


b. “cruelty” [kru.l.ti] ⇒ [kru.l.ti] crueldade

Considere a representação de “neon".

(66) σ σ

O R R

N N C

x x x x x

n i  n
133

Podemos perceber em (66), que há três posições nucleares seguidas ou

consecutivas. Quando isso ocorre, a seqüência de elementos tende a ser reduzida em inglês.

Neste caso, ocorre a perda de uma posição esqueletal nuclear que pertence ao núcleo

pesado. Esta tendência de constituintes semelhantes não ocorrerem em posições adjacentes

nas representações fonológicas, que segue do o Princípio de Contorno Obrigatório (OCP)

(Roca & Johnson, 1999). Sugerimos que a redução da vogal longa no inglês é decorrente

da aplicação de OCP.

Posições nucleares em inglês podem ocorrer em seqüência em duas condições. A

primeira condição é quando as duas posições nucleares pertencem ao mesmo núcleo e

incluímos aqui, as vogais longas e os ditongos decrescentes. A segunda condição é quando

cada uma das posições nucleares pertence a sílabas distintas. As duas condições aplicam-se

com exclusividade: ou preserva-se a vogal longa ou restringe-se ao máximo que ocorra

somente duas posições nucleares consecutivas em sílabas distintas.

Em inglês, somente as vogais longas ocorrem em final de sílaba:

(67) a. “sea” [si] mar


b. “spa” [spa] spa
c. “loo” [lu] jogo de cartas
d. “saw” [s] viu

Entretanto, em duas condições específicas vogais breves ocorrem no final de sílaba

ou palavra em inglês. O primeiro caso é quando em posição átona final (68).

(68) a. “happy” [hæpi] feliz


b. “city” [sti] cidade

c. “argue” [ju] discutir


d.. “value” [vælju] valor
134

O segundo caso, é quando ocorre uma vogal alta seguida de outra vogal (69).

(69) a. “react” [riækt] reagir


c. “actual” [æktjul] real

Para entendermos o primeiro caso, devemos levar em conta que o inglês é uma

língua sensível ao acento (Kreidler, 1989). Se ocorrer uma sílaba pesada (com vogal longa,

ditongo ou consoante pós-vocálica) o acento recai sobre ela. Quando consideramos as

palavras que têm uma vogal breve em final de palavra, verificamos que a grande maioria

destas palavras é formada com o sufixo –y: “happy”, “easy”, etc.30 Uma possibilidade, é

assumir que estas formas são lexicalmente marcadas e são formas que permitem vogais

breves em final de palavra.

Quanto aos ditongos decrescentes em inglês, estes são lexicalmente dados.

Considerando-se que o acento é sensível ao peso silábico, observamos que junto com

vogais longas e sílabas travadas os ditongos atraem o acento. Sendo assim, os ditongos

decrescentes são unidades lexicalmente estáveis e não derivados.

Os ditongos crescentes (“poor” [p] pobre, “tear” [t] lágrima “bear" [b] urso) e os

tritongos ([a] “tired” [tad] cansado, [a] “hour” hora , [e] “layer” [le]

camada, [o] “lower” [lo] mais baixo, [] “coyer” [k] mais modesto) do inglês

britânico, ocorrem como decorrência do cancelamento do “r” em final de sílaba. No

30
Em poucos casos não há evidências para um sufixo – como em “city” [sti] cidade – e nos poucos casos
em que uma [u] breve ocorre em final de palavra obviamente não temos o sufixo: “value” [vælju] valor,
“argue” [ju] discutir.
135

Modelo Autossegmental, o contexto consonantal de final de sílaba é denominado coda. As

codas são constituintes instáveis e o cancelamento do “r” neste contexto, pode ser

explicado como conseqüência da instabilidade dos segmentos na posição de coda.

Existem casos de (oclusiva+w) como em “queen” [kwin] rainha, “twelve”

[twlv] doze, “dwell” [dwl] morar. Neste caso, o glide /w/ é parte da consoante e são

interpretados como consoantes complexas pois há restrições segmentais. Nos casos em que

[j, w] ocorrem no início de palavra o glide é interpretado como ocupando uma posição

(consonantal) de onset. Pode-se explicar porque a forma do artigo indefinido será “a” para

palavras que se iniciam com consoantes e com os glides [j, w] e a forma do artigo

indefinido será “an” para palavras que se iniciam com vogal.

(70) a. “a pear” [ p] uma pera


b. “a year” [ j] um ano
c. “a one-hour limit” [ wn a lmt] um limite de uma hora
d. “an apple” [n æpl] uma maçã

A forma do artigo indefinido em inglês demonstra que nos casos de (7 a-c), o onset

é preenchido ou com uma consoante ou um glide. Em (7 d), o onset é preenchido por

“n”que separa a vogal do artigo e a vogal do substantivo. Explicamos a ocorrência das duas

formas do artigo indefinido em inglês.


136

3.4.2.1 - Conclusão

Na análise do inglês britânico, pelo modelo de fonologia autossegmental, podemos

observar que assumindo a sílaba como constituinte e a relacionando com o padrão acentual

explicaremos que as sílabas pesadas atraem o acento, podemos expressar porque as sílabas

com vogais breves não ocorrem em final de palavra, os ditongos crescentes e os tritongos

se originam do cancelamento do “r” na posição de coda, explicamos o comportamento

análogo das consoantes e dos glides [j, w] em início de palavra. Um caso que não foi

tratado nesta discussão do inglês, é o da inserção do glide [j] entre algumas consoantes e a

vogal longa [u] como em “music” [mjuzk] música. Embora seja possível formalizar

este processo no modelo da fonologia autossegmental, não há motivação que o justifique.

3.4.2.2 Conclusão do modelo autossegmental

Nas páginas precedentes, foram apresentadas análises das vogais altas e glides no

português brasileiro e no inglês britânico pelo modelo da fonologia autossegmental. Neste

modelo, a sílaba é considerada uma unidade importante na análise fonológica. A atribuição

do acento está relacionada à estrutura acentual. Por incorporar a sílaba à análise, tivemos

ganhos em expressar as generalizações (sobretudo quanto a relação entre estrutura silábica

e padrão acentual no inglês) e oferecemos motivações para processos fonológicos (como

da alternância entre vogal+glide no português brasileiro). Apresentamos a seguir a análise

das vogais altas e glides no português brasileiro e no inglês britânico, no modelo da

Otimalidade.
137

3.5 O Modelo teórico da otimalidade

3.5.1 Introdução

A discussão sobre as vogais altas e glides no português brasileiro e no inglês

britânico a ser apresentada baseia-se nos trabalhos de Barlow & Gierut (1999); Cagliari

(1999); Lee (2001); Giangola (1998) e Monahan (2001). Proposta por Prince & Smolensky

em 1993 apud Barlow & Gierut (1999), a Teoria da Otimalidade, que daqui para frente

denominaremos TO, é a proposta teórica mais recente para explicar como a gramática

interna emerge da representação mental à representação de superfície. As representações

mentais, nesta teoria, são denominadas input e as representações de superfície output.

Os modelos anteriores à TO (modelos pós-Fonologia Gerativa) eram de natureza

derivacional, operados por regras que geravam as representações de superfície. Diferente

dos modelos anteriores, a Teoria da Otimalidade não formula regras, mas estabelece

restrições. Estas restrições são escalonadas em uma certa ordem determinando o output

mais ótimo31 em relação à gramática de cada língua em estudo, como resultado final do

input inicial (Cagliari, 1999).

A TO propõe restrições que entram em conflito, deixando apenas a melhor opção

de output. A relação entre input e output32 são mediadas por duas entidades em TO: o GEN

e o EVAL. O GEN gera para cada forma de input, uma gama de candidatos possíveis para

output. O avaliador (EVAL) escolhe o output mais ótimo ao considerar um grupo de

31
Usaremos o recurso de fonte itálico para indicar a forma selecionada como ótima pela TO.
32
Utilizaremos os termos input e output e não suas respectivas traduções (entrada e saída) por serem estes
termos técnicos.
138

restrições universais (CON). O output ótimo é aquele que viola menos restrições

(Karttunem, 1998).

Abaixo, um esquema da gramática segundo a Teoria da Otimalidade, onde o input é

a palavra inglesa “cat”. O GEN gera outputs como [kæt], [kæt], [kæ], [tæ], [æt],

assim como [bb] e [mu]. É função do EVAL determinar que candidato é mais ótimo de

acordo com a gramática inglesa. A representação mais harmônica é [kæt], que é

representado abaixo como o output, por violar menos restrições.

/kæt/ Representação do input

GEN

kæt kæt kæ tæ æt bb mu etc. candidatos

EVAL
(restrições)

[kæt] Representação do output

FIGURA 16 - Diagrama da teoria da otimalidade


FONTE - ARCHANGELLI, 1997. p. 1484
139

As restrições podem ser de dois tipos, de marcação e de fidelidade. As restrições de

fidelidade asseguram que as representações de output sejam semelhantes às de input.

Portanto, as restrições de fidelidade impedem que palavras como [bb] e [mu] sejam

escolhidas como as mais ótimas para o input /kæt/. As restrições de marcação requerem

que as formas de output não sejam marcadas em estrutura. As propriedades não marcadas

das línguas são aquelas que são consideradas as mais básicas nas línguas naturais, por

estarem presentes em todas, ou quase todas as gramáticas. No entanto, todas as formas de

input devem ser processadas (parsing). “Parse” significa que um segmento da

representação do input emerge na representação de output. Abaixo, alguns exemplos de

restrições de fidelidade e marcação (MacCarthy & Prince, 1995 apud Barlow & Gierut,

1999):

MAX: Os segmentos no input devem corresponder aos segmentos no output.


(Sem apagamento). Dado o input /kæt/ e se seu output for [kæ], esta forma
viola a restrição MAX, pois o segmento /t/ não foi processado.

DEP: Os segmentos no output devem corresponder aos segmentos no input. (Sem


inserção). O output [kæt] viola esta restrição, pois o [] do output não faz parte da
representação do input.

IDENT [TRAÇOS]: Os traços de ponto e modo de articulação e vozeamento dos


segmentos do input devem chegar à superfície nos segmentos correspondentes no output.
A forma [bb] viola esta restrição de fidelidade aos traços. Pois, a oclusiva velar
desvozeada /k/ no input ocorre como uma oclusiva bilabial vozeada /b/ no output. A
vogal baixa anterior não arredondada [æ] no input é uma vogal média posterior
arredondada [] no output. Estas “infidelidades” nos pontos de articulação dos segmentos
constituem violações de restrições como IDENT-PONTO e IDENT-VOZEAMENTO.
Estas restrições exigem que os traços manifestem-se no output.

*COMPLEX: Evite encontros consonantais.

É importante salientar que MAX e DEP são restrições de fidelidade segmental e a

IDENT é de fidelidade de traços. As restrições de marcação requerem que os outputs sejam


140

estruturalmente não marcados. A restrição *COMPLEX proíbe outputs estruturalmente

marcados. A marcação refere-se à complexidade de uma estrutura com relação a uma outra

estrutura. Há uma relação de marcação entre encontros consonantais e consoantes isoladas.

Todas as línguas permitem a forma de consoante isolada, mas nem todas as línguas

permitem a ocorrência de encontros consonantais.

A relação entre as restrições de fidelidade e de marcação depende da sua

violabilidade. Nem todas as restrições são plenamente satisfeitas. Porém, as restrições de

fidelidade podem ser violadas para satisfazer restrições de marcação altas no

escalonamento. Pode também, ser que as restrições de marcação sejam violadas para

satisfazer restrições de fidelidade altas no escalonamento. As restrições são consideradas

parte da Gramática Universal. Porém, uma restrição pode ter um ranqueamento alto em

uma língua, mas baixo, em outra língua.

A TO é uma teoria lingüística aplicável a todos os níveis da gramática não só ao

nível fonológico. Embora tenha sido muito aplicada aos estudos fonológicos, atualmente

está sendo aplicada em outras áreas, sobretudo na sintaxe. Podemos observar que a TO é

um modelo simples, porém, as possibilidades de aplicação são tão grandes que a tornam

um modelo complexo.

3.5.2 Formalismo da teoria da otimalidade

Analisaremos a seguir, uma língua hipotética. Nesta língua, a restrição hipotética

*D tem ranqueamento mais alto em relação a outra restrição de fidelidade. A restrição de

marcação proíbe a ocorrência do segmento [D], enquanto a restrição de fidelidade exige


141

que [D] ocorra no output, uma vez que ocorre no input. O ranqueamento destas duas

restrições pode ser formalizado como em (71):

(71) Língua Hipotética 1: *D>>Faith-D

O tableau33 (TAB. 13) a seguir, mostra o input /ABCD/ da língua hipotética na

primeira célula superior à esquerda. Os possíveis candidatos fornecidos pelo GEN estão

nas células abaixo do input. O GEN fornece um número infinito de candidatos, porém

apenas dois são indicados no tableau para ilustrar o caso em questão. As restrições estão

ranqueadas nas células da coluna do meio, de cima para baixo. O asterisco indica violações

nas restrições pelos candidatos. Algumas são fatais, a ponto dos candidatos serem

excluídos. Esta violação fatal é simbolizada por (*!). O símbolo ☺ que será utilizado para

indicar o candidato ótimo.

Língua Hipotética 1: /ABCD/ [ABC]

TABELA 13

Tableau da língua hipotética

/ABCD/ *D FAITH-D

a. ABCD *!

b. ☺ ABC *

FONTE - BARLOW & GIERUT, 1999. p. 1485

Sendo o ranqueamento *D>>Faith-D, podemos afirmar que a restrição de [D] no

output é ranqueada mais alta do que a fidelidade de [D]. Sendo assim, a violação de *D é

fatal. A violação de Faith-D ocorre, mas como esta restrição é ranqueada abaixo de *D a

33
O termo “tableau” será utilizado neste trabalho.
142

forma ABC é escolhida como ótima. A próxima seção fará uma análise das vogais altas e

glides no português brasileiro, utilizando a TO.

3.5.3 Análise das vogais e glides no português brasileiro pela teoria da otimalidade

Esta análise está baseada em dados discutidos nos artigos de Giangola (1997),

“Constraint interaction and Brazilian Portuguese glide distribution” e na monografia de

Monahan (2001), “Evidence of transference and emergence in the interlanguage”.

Faremos uma análise crítica comparativa destes trabalhos, por este motivo nem todos os

casos analisados anteriormente, estão presentes. Devido à complexidade e profundidade da

TO, escolhemos fazer apenas a revisão dos trabalhos de Giangola e Monahan . Caso

contrário, este trabalho iria muito além dos seus objetivos.

Giangola (1997), em seu trabalho, primeiramente divide os dados em três grupos:

alternância vogal-glide, consoante-glide, e epêntese de glide. Os dados são do dialeto

baiano falado em Salvador, Bahia. Este autor assume que a sílaba no português é

constituída por onset (Consoante+Consoante), núcleo (Vogal ou glide) e na coda somente

as consoantes /L, R, N, S/ são permitidas. Sendo o onset e a coda opcionais e o núcleo

sempre presente e obrigatoriamente constituído por uma vogal.

Giangola (1997), afirma que onsets são opcionais em termos de distribuição, como

em “lua”. Fato que resulta o ranqueamento superior de DEP34 sobre a exigência de que

34
DEP: Todo elemento do output é um elemento do input, ou seja, é proibida a epêntese, (Cagliari, 1999).
143

todas as sílabas devam ter onsets, como demonstra a distribuição abaixo. Os exemplos

“pia” e “rua” também se encaixam nesta análise de duas vogais VV, em hiato.

No tableau abaixo, (TAB. 14) apresentamos a análise da palavra “lua”. O input

/lua/ para não violar DEP, deve surgir no output com todos os seus elementos. O primeiro

candidato, [lu.a] viola a restrição ONSET, pois a segunda sílaba não contém um onset. O

segundo candidato, [lu.wa], viola DEP pois existe a inserção de um segmento na segunda

sílaba. A primeira opção é a ótima, pois a violação da restrição onset é menos grave que a

violação de restrição DEP.

TABELA 14

Tabela da representação de “lua”

/lua/ DEP ONSET

☺ a) lu.a *

b)lu. a *!

FONTE - GIANGOLA, 1997. p. 148

O table au seguinte, (TAB. 15), há a análise da seqüência VG. Demonstra-se a

preferência de silabificação VG sobre VV. O ranqueamento é o mesmo do caso acima, em

que resulta em sílabas sem onsets. DEP>>ONSET. A epêntese é também proibida. Os

exemplos “aimorés” e “seiva”, também podem seguir a mesma análise apresentada para

“pai” em (5).
144

TABELA 15

Tableau da representação de “pai”

/pa/ DEP ONSET

☺ a) pai

b) pa.i *!

c) pa. i *!

FONTE - GIANGOLA, 1997. p. 149

A análise para seqüências de vogal+glide ilustrada acima, explica casos como

“pai”, “Aimorés”, “seiva”, “pau”, “saudade”, “causa”. Contudo, há problemas em explicar

quando ocorre a alternância entre vogal+glide e seqüência de vogais em posição pretônica,

como em “vaidade”, “reunião”.

O output com uma seqüência de vogais é o selecionado como ótimo. Giangola

(1997), não explica a alternância entre a seqüência de vogais altas e glides e apenas indica

que a forma com o hiato é a selecionada. Glides intervocálicos, como em “saia”, não são

abordados por Giangola (1997). Contudo, podemos supor que este autor os interpreta como

uma seqüência de vogal+glide seguido de vogal. Casos com as consoantes complexas,

como em “quase”, “guarda”, também não são discutidos por este autor. Casos com

ditongos pré-vocálicos, como em “estaciona”, devem ser assumidos como estando

presentes no input, embora este caso também não seja abordado.

Como podemos observar nos casos discutidos anteriormente, a Teoria da

Otimalidade explica a ocorrência de hiatos (“pia, lua, piada, cueca”) e os casos dos

ditongos decrescentes (“pai, causa”). Estes casos são analisados com um mecanismo
145

simples de ranqueamento de restrições. Um dos problemas da análise de Giangola (1997) é

não considerar a alternância entre glides e vogais altas correspondentes em posição

pretônica (“piada”, “cueca”, “Maisena”, “reunião”). De fato, a análise da variação ou de

formas alternantes é um problema para a TO. Contudo, têm sido desenvolvidas muitas

pesquisas nesta área. A seguir, consideramos a análise das vogais altas e glides no inglês

britânico.

3.5.4 Análise das vogais e glides no inglês britânico pela teoria da otimalidade

A análise do inglês pela TO neste trabalho, faz uma revisão dos trabalhos de Monahan

(2001) e Green (2001). Monahan (2001), analisa a estrutura silábica no inglês e Green

(2001) discute as vogais do inglês.35 Detemo-nos ao trabalho de Green (2001), que está

relacionado com o tema deste trabalho.

Green (2001), descreve as vogais do inglês como tendo a distinção entre vogais tensas

e frouxas (tense e lax). Tensão e duração geralmente co-ocorrem no inglês, ou seja, as

vogais frouxas são breves e as vogais tensas são longas. As vogais tensas-longas podem

ocorrer em sílabas finais e as vogais frouxas-breves não.

A proposta de Green é de que o pé binário (FTBIN), exige que os pés tenham no

mínimo duas moras. A restrição, TNS< - >μ determina que as vogais sejam tensas quando

bimoraicas.

35
Apesar do fato deste trabalho pesquisar o RP, utilizaremos os trabalhos destes autores que se baseiam no
GA (“General American”). Contudo, nos casos analisados não é relevante a distinção dialetal.
146

Green (2001), propõe que sílabas abertas, FTBIN e TNS< - >μ permitem apenas

vogais tensas em seu output. As vogais altas [,] e [i, u] não contrastam neste

ambiente, pois as vogais frouxas [,] não ocorrem em final de sílaba ou em sílabas

abertas no inglês. Portanto, não importa qual dos dois segmentos aparece no input, pois

apenas a vogal tensa [i] vai aparecer na forma de output. A tableau abaixo (TAB. 16)

analisa a palavra “see”.

TABELA 16

Tableau da representação de “see”

(α) /s/

FTBIN TNS<->μ IDENT (tenso)


(β) /s/

s *! α

β*
s *! α

β*
si *! * α*

β
☺ si α*

β
FONTE - GREEN, 2001. p. 13.

As vogais longas e ditongos são associados a duas moras. Esta restrição é violada

quando as vogais tensas são átonas. As vogais tensas átonas podem ocorre em posição

postônica como em “pretty” /prti/ bonito, ou podem ocorrer em hiato (“radio”

[redio] rádio, “actual” [æktjul] real).


147

A análise de Green (2001), não discute os casos em que o glide [j] ocorre entre uma

consoante e a vogal [u], como em “music” [mjuzk] música. Estes casos são problemas

para as análises pelos modelos fonêmico, gerativo e autossegmental. Este é um caso que

envolve variação e os ambientes estruturais não estão bem delimitados (cf. Harris (1994)).

3.5.5 Conclusão geral

A TO permite análise do componente sonoro através do ranqueamento de restrições

que expressam o comportamento das estruturas sonoras das línguas naturais. Além de

expressar as marcações encontradas nas línguas a TO oferece um mecanismo de

formalização bastante simples e de fácil visualização. Um dos problemas da TO é a

interpretação da variação.
148

4. CONCLUSÃO

Esta dissertação teve por objetivos específicos:

• Descrever foneticamente as vogais altas e glides no português brasileiro e inglês

britânico em termos articulatórios e acústicos, explicitando seus ambientes de

ocorrência e identificando o comportamento destes segmentos na estrutura silábica.

• Descrever e avaliar o comportamento fonológico das vogais altas e glides no

português brasileiro e no inglês britânico.

• Analisar a pertinência e adequação de quatro modelos fonológicos para a análise

das vogais altas e glides no português brasileiro e no inglês britânico.

O Capítulo 2 deste trabalho apresentou a descrição fonética proposta. Podemos

concluir que o inventário sonoro referente às vogais altas e glides do inglês britânico e do

português brasileiro é idêntico, apresentando os segmentos: [i, i, , u, u, , j, w]. Há

particularidades articulatórias que foram apontadas para cada língua. Há também

particularidades da distribuição dos segmentos nas duas línguas.

O Capítulo 3 deste trabalho apresentou a descrição fonológica proposta. Discutimos as

vogais altas e glides do inglês britânico e do português brasileiro. Dentre as vogais altas e

glides no português brasileiro, temos como segmentos fonológicos /i, u, j, w/. Os sons

[i, , u, ] ocorrem como variantes (ou alofones em termos fonêmicos) em condições
149

específicas. Dentre as vogais altas e glides no inglês britânico, temos como segmentos

fonológicos /i, , u, , j, w/. Os sons [i, u] ocorrem como variantes (ou alofones em

termos fonêmicos) em condições específicas.

Concluindo, podemos dizer que os glides /j, w/ têm estatuto fonológico de consoante

nas duas línguas. Exemplos do português são: “estaciona”, “quase”, “guarda”. Exemplos

do inglês são: “year” ano, “water” água, “music” música, “queen” rainha, “twice” duas

vezes. Quanto às vogais altas, temos uma troca entre os inventários fonéticos e fonológicos

nas duas línguas, como mostra a TAB. 18.

TABELA 17

Inventários fonéticos e fonológicos das vogais altas no português brasileiro e no inglês britânico.

Fonético fonológico

Português brasileiro /i, , u, / /i, u/

Inglês britânico /i, u/ /i, , u, /

As vogais tensas breves /i, u/ têm estatuto fonológico no português (ou fonemas) e

operam como variantes (ou alofones) em inglês. Já as vogais /i, , u, /, têm estatuto

fonológico no inglês e operam como variantes (ou alofones) em português.

Quanto à adequação dos modelos fonológicos, podemos dizer que cada proposta

teórica contribui para a melhor compreensão do comportamento das vogais altas e glides

nas línguas em estudo. Espera-se que as discussões apresentadas nesta dissertação, possam
150

contribuir para que profissionais que trabalham com o ensino e aprendizagem de segunda

língua compreendam melhor os sistemas sonoros do inglês britânico e do português

brasileiro, sobretudo quanto ao comportamento das vogais altas e glides.


151

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87 TRASK, R. L. A dictionary of phonetics and phonology. London: Routledge,


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88 WELLS, J. C. A Study of the formants of the pure vowels of British English. 1962.
Dissertação (Mestrado) – University of London, London.

89 WETZELS, W. Leo. Consoantes palatais como geminadas fonológicas no


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p. 5-15, jul.-dez. 2000.

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