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Silvio Almeida
Nos debates sobre a questão racial podemos encontrar as mais variadas definições de
racismo. A fim de apresentar os contornos fundamentais do debate de modo didático,
classificamos em três concepções de racismo: individualista, institucional e estrutural. A
classificação aqui apresentada parte dos seguintes critérios:
Racismo Individualista
O racismo, segundo essa visão, é concebido como uma espécie de “patologia”. Seria um
fenômeno ético ou psicológico de caráter individual ou coletivo, atribuído a grupos
isolados, ou ainda, a uma irracionalidade, a ser combatida no campo jurídico por meio
de aplicação a sanções civis – indenizações, por exemplo – ou penais. Por isso a
concepção individualista pode não admitir a existência do racismo, mas somente de
“preconceito”, a fim de ressaltar a natureza psicológica do fenômeno em detrimento de
sua natureza política.
O racismo é uma imoralidade e também um crime, que exige que aqueles que o
praticam sejam devidamente responsabilizados, disso estamos convictos. Porém, não
podemos deixar de apontar o fato de que a concepção individualista, por ser frágil e
limitada, tem sido a base de análises sobre o racismo absolutamente carentes de história
e de reflexão sobre seus efeitos concretos. É uma concepção que insiste em flutuar
sobre uma fraseologia moralista inconsequente – “racismo é errado”, “somos todos
humanos”, “como se pode ser racista em pleno século XXI?”, tenho amigos negros, etc,
- e uma obsessão pela legalidade. No fim das contas, quando se limita o olhar sobre o
racismo a aspectos meramente comportamentais, deixa-se de considerar o fato de que
as maiores desgraças produzidas pelo racismo foram feitas sob o abrigo da legalidade e
com o apoio moral de líderes políticos, líderes religiosos e dos considerados “homens
de bem”.
Racismo Institucional
Racismo Estrutural
Para entender o racismo estrutural, é necessário que entendamos que toda sociedade
necessariamente só existe por meio de suas instituições e que o racismo institucional é
a imposição de regras e padrões racistas por parte da instituição que está de alguma
maneira vinculada à ordem social que ela visa resguardar, ou seja, as instituições são
apenas a materialização de uma estrutura social ou de um modo de socialização que
tem o racismo como um de seus componentes orgânicos. Dito de modo mais direto: as
instituições são racistas porque a sociedade é racista. [...] se há instituições cujos
padrões de funcionamento redundem em regras que privilegiem determinados grupos
racistas, é porque o racismo é parte da ordem social. Não é algo criado pela instituição,
mas é por ela reproduzido.
Em uma sociedade em que o racismo está presente na vida cotidiana, as instituições que
não tratarem de maneira ativa e como um problema a desigualdade racial irão
facilmente reproduzir as práticas racistas já tidas como “normais” em toda a sociedade.
É o que geralmente acontece nos governos, empresas e escolas em que não há espaços
ou mecanismos institucionais para tratar de conflitos raciais e de gênero. Nesse caso, as
relações do cotidiano no interior das instituições vão reproduzir as práticas sociais
corriqueiras, dentre às quais o racismo, na forma de violência explícita ou de micro
agressões – piadas, silenciamentos, isolamento, etc.
O racismo é uma decorrência da própria estrutura social, ou seja, do modo “normal”
com que se constituem as relações políticas, econômicas, jurídicas e até familiares, não
sendo uma patologia social e nem um desarranjo institucional. O racismo é estrutural.
Comportamentos individuais e processos institucionais são derivados de uma sociedade
cujo racismo é regra e não exceção. O racismo é parte de um processo social que “ocorre
pelas costas dos indivíduos e lhes parece legado pela tradição.
Assim sendo, raça é um conceito cujo significado só pode ser recolhido em perspectiva
relacional. Ou seja, raça não é uma fantasmagoria, um delírio ou uma criação da cabeça
de pessoas mal intencionadas. É uma relação social, o que significa dizer que raça se
manifesta em atos concretos ocorridos no interior de uma estrutura social marcada por
conflitos e antagonismos.
Enfim, sem nada fazer, toda instituição irá tornar-se uma correia de transmissão de
privilégios e violências racistas e sexistas. De tal modo que se o racismo é inerente à
ordem social, a única forma de uma instituição combater o racismo é por meio da
implementação de práticas antirracistas efetivas.
REFERÊNCIA
ALMEIDA, Silvio Luiz de. O que é racismo estrutural?. Belo Horizonte (MG): Letramento,
2018.