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contabilidade

O ENSINO DA CONTABILIDADE: UMA


PROPOSTA SOB A PERSPECTIVA DO
PLANEJAMENTO
Waggnoor Macieira Kettle, professor dos Cursos de Administração
e Ciências Contábeis do Centro Universitário Adventista de São Paulo Campus
Engenheiro Coelho (SP), especialista em Contabilidade e mestre em Educação pela
PUC (Campinas), waggnoor.kettle@unasp.edu.br

Resumo: O presente artigo chama a atenção para a importância e necessidade


do planejamento docente no processo ensino-aprendizagem, bem como trata, de
forma concisa, alguns aspectos relacionados ao ensino da ciência contábil sob a pers-
pectiva do seu planejamento. Nesse contexto são sugeridas algumas propostas de
ação planejadora no que tange às instituições, aos diretores e/ou coordenadores de
curso, aos docentes e aos alunos envolvidos com o curso de Ciências Contábeis.
P alavras - chave: Ensino Superior, Docência, Ensino de Contabilidade
e Planejamento

The education of the accounting: a proposal


under perspective of the planning

Abstract: The present article calls the attention for the importance and
necessity of the teaching planning in the teaching-learning process, as well as
treating, in a concise form, some aspects related to the accounting science edu-
cation under the perspective of its planning. In this context some proposals
of planning action are suggested in what it refers to the institutions, directors
and/or course coordinators, professors and all students involved in the course
of Accounting Science.
K eywords : Higher Education, Professors, Accounting Education and
Planning

Introdução
Para que o processo chamado “ensino” ocorra de a saber: o planejamento de disciplina.
fato, faz-se necessário que os sujeitos diretamente en- Em seu livro Os Sete Saberes Necessários à Educação do
volvidos (educador e educando) estejam devidamente Futuro, Morin (2002, p. 13 e 14) apresenta, em seu pri-
comprometidos. Este artigo dá ênfase à ação docente, meiro capítulo, o quão impressionante é o fato de que
devido à sua proposta de abordar um de seus aspectos, “a educação que busca transmitir conhecimentos, seja

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cega quanto ao que é o conhecimento humano, seus Brasil no período de 1980 a 2001, pelo menos 40
dispositivos, enfermidades, dificuldades, tendências ao dessas produções versavam, especificamente, sobre a
erro e à ilusão, e não se preocupe em fazer conhecer questão do ensino.
o que é conhecer”. Além das teses e dissertações, há um número con-
Morin (2002, p. 17) mostra, ainda, que no processo siderável de artigos que são publicados em periódicos
educacional há a necessidade de se estudar as característi- da área contábil, os quais também vêm ratificar todo
cas mentais e culturais dos conhecimentos humanos, que o questionamento e a preocupação com o ensino da
o levam ao erro e à ilusão. Para isso, ele traz a necessidade: contabilidade. A título de exemplificação pode-se
de se ensinar a condição humana; ensinar a identidade mencionar os seguintes autores: Marion, Iudícibus,
terrena; enfrentar as incertezas; ensinar a compreensão; e, Martins, Franco, Rollo, Pereira e Strassburg, os quais
por fim, apresenta a ética do gênero humano, salientando têm contribuído grandemente para o processo reflexivo
que “deve formar-se nas mentes com base na consciência sobre a educação contábil.
de que o humano é, ao mesmo tempo, indivíduo, parte Em trabalho apresentado no III Fórum Nacional
da sociedade, parte da espécie. ” de Professores de Contabilidade, realizado na Fundação
Em suas abordagens Morin atribui grandes e Escola de Comércio Álvares Penteado (Fecap), Rollo
urgentes responsabilidades ao educador do século e Pereira (2002, p.13), demonstraram algumas variáveis
XXI, e, sem dúvida, isso é premente. No entanto, inerentes aos elementos de maior relevância no pro-
há de se questionar: como se pode adentrar a esse cesso ensino-aprendizagem na área contábil no Brasil.
campo, o de se transmitir os saberes necessários, sem Segundo os autores, essas variáveis exercem influência
o devido planejamento? no processo ensino-aprendizagem. São elas:
É por isso que a formação de professores é fator
deveras importante no sentido de que a educação – o Quanto ao professor de contabilidade
ensinar de fato – comece a apresentar frutos. Mesmo que 1) Formação didático-pedagógica
haja dificuldades na inserção dos saberes apregoados por Os autores assinalam que grande parte dos pro-
Morin aos planejamentos educacionais, a prática docente fessores que ingressam no magistério são “ex-alunos
precisa ser pensada e repensada na medida em que o e profissionais liberais que possuem escassos co-
ensino de cada disciplina vai sendo ministrado ao longo nhecimentos de métodos de ensino, não tendo base
do tempo. Freire (2003, p. 39) declara que “é pensando pedagógica suficiente para cumprir com eficácia os
criticamente a prática de hoje ou de ontem que se pode objetivos educacionais”.
melhorar a próxima prática”. Portanto, a prática docente E, sobre o processo de planificação do ensino,
deve prescindir dos discursos vagos, os quais, na prática, Rollo e Pereira (2002, p. 14) acrescentam que
não passam de preenchimento de formulários, muitas
vezes mal preenchidos, e se acomodar num simples para exercer com eficiência a função de docência, os
cumprimento burocrático. professores devem refletir a respeito da melhor maneira de
O autor acrescenta, ainda, que “o próprio discurso lecionar a disciplina pela qual são responsáveis. Eles devem estar
teórico, necessário à reflexão crítica, tem de ser de tal em constante reflexão sobre sua ação educativa, sobre seus meca-
modo concreto que quase se confunda com a prática. nismos e fundamentos que os levam a agir de uma determinada
O seu ‘distanciamento’ epistemológico da prática en- forma e não de outra. Os professores não podem se limitar
quanto objeto de sua análise, deve dela ‘aproximá-lo’ a serem meros reprodutores do conhecimento alheio na
ao máximo”. O planejamento, portanto, deve ser um transmissão para os alunos. No processo educacional, o
instrumento para viabilizar essa aproximação entre simples conhecimento do assunto não é o suficiente, é
teoria e prática. É, portanto, sob essa perspectiva que necessário que a forma de transmissão atinja os objetivos
o conceito de planejamento do ensino deve ser revisto do processo ensino-aprendizagem [grifo do autor].
e reconsiderado. Sobre esse mesmo assunto, Marion afirma que
O ensino de contabilidade destacam-se no Magistério da Contabilidade o pro-
O ensino de contabilidade no Brasil tem sido, ao fessor profissional e o profissional contábil. Nenhum
longo dos anos, bastante questionado. Basta verificar a dos extremos é adequado; pode-se, todavia, optar pelo
quantidade de trabalhos desenvolvidos sob esta temá- primeiro que, embora não tenha contato permanente
tica. Para se ter uma idéia, das 58 produções científicas com a prática contábil, possui conhecimentos didáti-
analisadas por Quagliato (2003) em sua dissertação cos. O profissional contábil que exerce o magistério
de mestrado, que trataram da educação contábil no como atividade acessória para ampliar seus rendimen-

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tos (ensinar, no caso, é um ‘bico’), torna-se um ato O bom professor não se define apenas pela aula, pela
mecânico-prático no desenvolvimento da matéria e comunicação. Para fazer somente isto não precisamos de
deixa de lado o raciocínio lógico teórico, imprescin- universidade, porque o uso inteligente dos meios moder-
dível na formação do estudante(1985, p. 31). nos de comunicação o substitui com grande vantagem.
Outra questão levantada por Rollo e Pereira Portanto, é de suma importância que o docente,
(2002, p. 14) quanto ao aspecto didático-pedagógi- além de dominar o conteúdo da disciplina que ministra,
co, é o exagerado tecnicismo de muitos professores dê especial atenção aos objetivos e conteúdos, relacio-
de contabilidade que os impede de terem uma visão nado-os às necessidades e interesses dos educandos.
mais ampla do processo de ensino-aprendizagem. Além disso, é imprescindível que o docente atribua a
Segundo os autores, isto é fato, uma vez que “na devida importância à disciplina que ministra, a fim de
preparação do professor universitário da área que o aluno perceba essa importância, e seja co-parti-
contábil para o exercício de sua função de ensino, cipante de um processo de ensino-aprendizagem eficaz
valoriza-se muito mais a sua formação acadêmica, (Rollo e Pereira, 2002).
enquanto especialista, do que a sua formação edu-
cacional e pedagógica, ocasionando deficiências do 3) Interação com os alunos
conhecimento didático do corpo docente”. Este aspecto refere-se à boa convivência que o pro-
Fazan e Costa (2003, p. 15), ao tratarem do en- fessor deve manter com os alunos, sendo esta conside-
sino de ciências contábeis sob a perspectiva de uma rada um elemento que facilita o processo educacional. A
discussão sobre o processo de ensino-aprendizagem empatia é fator sumamente importante entre as partes,
e a avaliação discente, afirmam que “as grades cur- uma vez que gera um ambiente motivador que estimula
riculares atuais enfatizam as habilidades técnicas em os alunos e o próprio professor, ao desempenharem
detrimento das humanas, fato que leva o indivíduo suas funções no processo educacional.
discente ao perfil tecnicista e que compromete o Segundo Rollo e Pereira (2002, p. 15), um am-
próprio processo de ensino aprendizagem, uma vez biente em que há entrosamento entre professor e aluno
que os alunos estão ‘treinando’ situações práticas e “gera um clima participativo, estimulando os alunos
não percebendo a realidade universal do contexto a apresentarem reações, fazendo perguntas, pedindo
no qual se inserem”. opiniões e aceitando novos desafios”.
2) Conhecimento da disciplina 4) Regime de trabalho dos professores
O domínio do conteúdo é requisito indispensável Este é um aspecto que aponta para um dos grandes
para que o docente exerça, com eficácia, o seu trabalho problemas relativos aos professores de contabilidade.
junto aos educandos. Especificamente, quanto ao en- Rollo e Pereira (2002, p. 16). afirmam que “o número
sino de disciplinas da área contábil, onde as mudanças de instituições que mantém docentes em regime de tem-
são constantes, e, às vezes inevitável, face a legislação e po integral é reduzido”. E enfatizam que “a atividade de
as decisões de ordem governamental, é mister que haja ensino requer tempo do profissional para preparar aulas,
constantemente uma atualização por parte dos docen- realizar pesquisas, atualizar conhecimentos etc (...) Este
tes. Isto é defendido por Rollo e Pereira (2002, p. 14) fator compromete a qualidade do ensino ministrado,
quando afirmam que “a participação em congressos, visto que, além da disponibilidade necessária para pre-
simpósios, cursos e palestras são algumas das maneiras parar e ministrar suas aulas, o professor deve ter tempo
para o profissional manter-se atualizado”. suficiente para estudos, aperfeiçoamento, planejamentos e
Os autores salientam outros pontos vitais para pesquisas” (grifo do autor).
que haja maior eficácia no processo educacional. São
eles: “a satisfação, a vitalidade e a energia do docente 5) Importância da contabilidade básica
Rollo e Pereira (2002, p. 16) argumentam sobre
ao ministrar a disciplina”. Essas qualidades são impor-
a importância da Contabilidade Básica/Introdutória
tantes na motivação dos alunos, e fatores que podem
ao afirmarem que é “o alicerce indispensável para a
estimulá-los na busca do conhecimento.
aprendizagem das demais disciplinas contábeis, como
Ao tratar das qualidades docentes, Marion (2001,
Pública, de Custos, Gerencial, Análise das Demons-
p. 20) afirma que
trações Contábeis, Auditoria e outras”. E acrescentam:
é difícil pensar num bom professor de contabilidade que “Se não houver um bom nível de aprendizagem dessa
não pesquise, que seja apenas um copiador de conheci- disciplina, dificilmente o aluno obterá um bom apro-
mento alheio, ou um bom decifrador dos livros-texto. veitamento do curso”.

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Sobre este aspecto, Iudícibus e Marion (1985, p. licitados (fundamentalmente livros). Enquanto alguns
37) comentam que não têm essa dificuldade, há outros que não usufruem
a mesma condição.
é sabido que a Contabilidade Geral ou Contabili-
Ademais, segundo Rollo e Pereira (2002), existe
dade Introdutória é a espinha dorsal de um curso
uma boa parcela de alunos que está inserida no mercado
de Ciências Contábeis. O aprendizado inadequado
de trabalho, porém, em atividades não relacionadas à
desta disciplina pode comprometer todo o curso,
Contabilidade.
bem como desmotivar o estudante de Contabilidade.
A compreensão das disciplinas que sucedem a Conta- 2) Fatores que facilitam a aprendizagem
bilidade Introdutória, dado o seu encadeamento com Moreira (1997, p. 10-35) destaca alguns desses
os fundamentos contábeis, será satisfatória a partir do fatores:
pressuposto de que o aluno domine suficientemente Interação professor-aluno – Este aspecto dá ênfase
a Contabilidade Introdutória. ao processo de comunicação entre professor/aluno,
Desta forma é que Rollo e Pereira (2002, p. especialmente no que diz respeito ao comportamento
17) defendem que, devido à relevância da disciplina, de ambos. Quando há interação entre eles, há também
ela “deveria ser sempre ministrada por professo- uma tendência de aumento da motivação e comprome-
res com titulação de pós-graduação e possuidores timento por parte dos alunos. Mas, para que isso ocorra,
de uma sólida base didática. Isto traria grandes Moreira salienta que “é necessário que os professores
contribuições no sentido de um maior incentivo e estejam entusiasmados com o seu trabalho, que estejam
motivação dos alunos”. realmente interessados e preocupados com o progresso
dos alunos e que haja um clima de diálogo produtivo
Quanto ao aluno de contabilidade: entre as partes”.
1) Perfil do aluno Reconhecimento das diferenças individuais – Moreira
Algumas pesquisas demonstram que a maioria do (1997) pontua o equilíbrio que o professor deve ter
alunado de Ciências Contábeis estuda no período no- quanto às suas ações. Uma vez reconhecendo que
turno. Exemplo disto é a pesquisa de Nossa (1999, p. cada aluno tem seu ritmo de aprendizagem, o pro-
52) que cita: “atualmente 81% dos Cursos de Ciências fessor deverá cuidar em perceber os distintos estilos
Contábeis são ministrados exclusivamente à noite, 4% de aprendizagem e ser sensível quanto às diferenças e
são diurnos e 15% funcionam de dia e à noite”. Essa experiências pessoais de cada aluno. O autor acrescenta
realidade nos leva a inferir que essa maioria exerce sua que “tarefas muito difíceis, confusas ou, por outro lado,
atividade profissional diuturnamente, o que a leva a ter muito fáceis, não despertam o aluno para a ação. Os
pouco tempo para a pesquisa. educadores devem refletir se os alunos têm capacidade
A heterogeneidade é outra característica do es- para entender o que o professor está informando ou
tudante de ensino superior, e, particularmente, o de pretende informar”.
Ciências Contábeis. Fazan e Costa (2003, p. 11) con- Este assunto é crucial em boa parte das institui-
sideram essa característica ao afirmarem que ções de ensino superior. Tanto é que Fazan e Costa
(2003, p. 14) afirmam que “a percepção das diferenças
o crescimento do ensino superior no Brasil, a partir individuais pelos professores passa pela questão do
da década de 70, contribuiu para melhorar as estatís- como ensinar e de como os alunos compreendem os
ticas de jovens com acesso ao ensino superior. Assim, conteúdos, fato que é tratado como assunto periférico
com um número cada vez mais crescente de jovens na maior parte das instituições de ensino superior”.
cursando universidades, centros universitários e facul- Ao tratar sobre a obsessão inovadora do conhe-
dades, a procura por vagas nessas instituições guarda
cimento moderno, Demo (1997, p. 28) vem apoiar
paridade com o número de ofertas, que também tem
o pensamento de Moreira, Fazan e Costa quanto ao
sido crescente. Esse indicador reduz o contingente de
ritmo individual de aprendizagem, ao afirmar que “o
jovens que são rejeitados e ocasiona uma população
ser humano tem um ritmo orgânico e cultural de ser,
de alunos cada vez mais heterogênea, provenientes de
não eletrônico ou apenas técnico. A própria aprendi-
várias camadas sociais e com formação básica também
zagem, como processo, tem seu tempo, pois passa pela
bastante heterogênea.
elaboração, interpretação, reconstrução, e não apenas
Essa heterogeneidade provoca, quase que inevi- por um procedimento de gravação mecânica”.
tavelmente, outras dificuldades, como por exemplo, Possibilidade de aplicação do novo conhecimento – Este é
as condições de se adquirir os materiais didáticos so- um aspecto muito importante, porque para que haja

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aprendizado, o aluno deve ser oportunizado no senti- É nessa perspectiva que Marion afirma:
do de relacionar as informações recebidas com idéias
Na Profissão Contábil, diante das inúmeras pers-
já disponíveis. Isto significa que o estudante deve ter a
pectivas, não precisamos sonhar com o impossível.
oportunidade de ser inserido num contexto que possa
Sonhar, sim, com realidades possíveis, com projetos
fazer um intercâmbio entre as novas informações e
exeqüíveis. Sonhar, neste caso, é estabelecer uma visão
a realidade, através de exercícios, estudos de caso e
para identificar claramente aonde queremos chegar.
outras atividades que o levem à aplicação do novo
Não basta apenas ter um diploma. É preciso conhe-
conhecimento (Moreira, 1997).
cer informática, dominar outra língua, ser criativo,
Reconhecimento da importância da informação – A pre-
saber trabalhar em equipe, ter equilíbrio emocional,
missa aqui é: “para uma informação ser bem assimilada,
aprender a liderar, motivar, navegar na Internet, ter
ela deve ser reconhecida como importante”. A disponi-
boa comunicação, pensar em pós-graduação, ler muito
bilidade e disposição do aluno para estudar são fatores
e sempre etc (1999, p. 7-10).
essenciais, bem como o interesse pelo tema exposto.
No entanto, cabe ao professor o desafio de comunicar Assim é que os estudantes, uma vez cônscios de sua
de tal forma o assunto, que desperte o interesse e a responsabilidade, devem buscar constantemente seu apri-
curiosidade do educando. moramento, na tentativa de suprir eventuais deficiências
Utilização de uma seqüência lógica – O conteúdo de- de aprendizagem que não foram supridas na Graduação.
vidamente organizado traz grandes vantagens para o A participação em cursos de pós-graduação, congressos,
aprendizado do aluno, na medida em que este pode palestras e seminários, entre outros eventos, são grandes
armazenar as informações numa ordem que lhe trará oportunidades de crescimento profissional e acadêmico.
mais clareza e entendimento. O autor considera ser Nesse contexto está a importância da Educação
“muito útil também apresentar aos alunos um sumário Continuada (conhecida internacionalmente como life-
da aula, auxiliando-os a construírem esquemas, mapas longing learning – educação por toda a vida), a qual deve
e fichamentos a partir de suas leituras e anotações de ser um processo permanente, pelo menos enquanto o
aula. O estabelecimento de uma seqüência permite que profissional estiver em atividade.
o aluno avance progressivamente até a aquisição da 3) Participação do estudante no processo de
informação, partindo do mais simples para o complexo, aprendizagem
do concreto para o abstrato” (Moreira, 1997). Quanto a este elemento do processo educacional,
Vale, contudo, acrescentar que essa seqüência ló-
pode-se dividi-lo em duas modalidades. A primeira con-
gica depende da metodologia adotada pelo docente,
siste no conceito de Aprendizagem Ativa, e, a segunda,
uma vez que na Contabilidade Básica/Introdutória
no conceito de Aprendizagem Passiva (Reprodutora).
existem duas metodologias predominantes quanto
Conceito de aprendizagem ativa – compreende um alto
ao “caminho” a ser percorrido, a saber: a metodo-
grau de envolvimento e participação dos estudantes nas
logia da Escola Americana, que parte dos relatórios
atividades concernentes ao processo de ensino-aprendi-
montados, até os registros dos fatos; e a metodologia
zagem, tais como: congressos, seminários, simulações,
da Escola Européia (ou Italiana), a qual parte dos
pesquisas e estudos de caso. (Rollo e Pereira, 2002)
registros dos fatos, até a montagem dos relatórios.
A depender da metodologia adotada, o docente es- O professor Marion (2001, p. 35), ao opinar sobre
tabelecerá uma seqüência lógica dentro daquilo que esse conceito, afirma que “a idéia central deste método
se propõe a ensinar. é de que os estudantes deverão tornar-se ‘pensadores
Responsabilidade dos alunos no processo educacional – É – críticos’ e, assim, o processo de aprendizagem tor-
difícil pensar num processo de ensino – aprendizagem nar-se-á mais dinâmico. Eles deverão desenvolver a
de “mão – única”. Não apenas os professores têm sua capacidade de auto-iniciativa de descobrimento que
responsabilidade no que se refere à qualidade das suas permita um processo de aprendizagem contínuo e de
aulas, mas também as Instituições de Ensino Superior, crescimento em sua vida profissional”. E completa seu
no fornecimento dos recursos e adequação dos currícu- pensamento, mencionando o exemplo da Universidade
los às necessidades do mercado de trabalho. Os alunos de Illinois, considerada a melhor em Contabilidade
também devem assumir sua parcela de responsabilidade nos Estados Unidos, afirmando que aquela instituição
no processo educacional. Isto demanda todo um pro- “preparou recentemente um currículo para o curso de
cesso de conscientização por parte dos docentes, pois, Ciências Contábeis que enfatiza muito mais os métodos
devido à formação e experiência de vida, muitos alunos e as habilidades que permitem ao aluno questionar,
não percebem essa responsabilidade. analisar, julgar e tomar decisões”.

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Além do ambiente da sala de aula e das mútuas prioridade a questões relativas do porquê se faz
responsabilidades que envolvem a relação professor assim”. Segundo ele, esses professores deixam de
– aluno, a aprendizagem ativa é, segundo Rollo e lado questões essenciais como “a reflexão sobre o
Pereira (2002, p. 20 e 21), “facilitada pela utilização objetivo da disciplina que, muitas vezes, é dar condi-
da tecnologia. Os aplicativos utilizados nos progra- ções para que o aluno possa formar um senso crítico
mas de informática auxiliam o usuário a solucionar os relacionado ao assunto estudado”.
problemas”. Todas essas variáveis que, certamente, influenciam
Segundo os autores, algumas características da o ensino da Contabilidade, constituem-se em verda-
aprendizagem ativa podem ser enumeradas: deiros desafios ao processo educacional. Diante das
· Forma estudantes ‘pensadores-críticos’; mudanças advindas do processo de globalização, das
· Possui maior dinamismo no processo de apren- transformações sócio-culturais da sociedade e de uma
dizagem; concorrência desenfreada, não resta alternativa a não
· Estimula o questionamento, a iniciativa, a toma- ser de enfrentar tais desafios.
da de decisão; O processo de educação contábil é deveras com-
· Focaliza suas atenções no aluno. plexo, devido principalmente, aos pré-conceitos e pa-
radigmas trazidos pelos alunos (concepções de débito
Conceito de aprendizagem passiva receptiva (reprodutora) e crédito, por exemplo), bem como pela dificuldade
– a Aprendizagem Passiva tem sua ênfase no método na valorização do profissional contábil em nosso país;
tradicional de ensino, o qual se caracteriza pela trans- ele demanda uma profunda reflexão sobre as questões
missão do conhecimento dos professores para os do ensino, o que deve principiar pelo seu planejamen-
alunos, de maneira unidirecional, ou seja, do emissor to. Os professores devem, nesse contexto, possuir
para o receptor. conhecimentos humanos suficientes para perceber o
Em suma, a Aprendizagem Passiva, segundo Rollo discente no potencial humano e técnico e, para isso,
e Pereira (2002, p. 21), pode ser resumida com as seu planejamento (objetivos, métodos e avaliação) deve
seguintes características: ser melhorado.
· Método tradicional de ensino; O professor Hilário Franco (1999, p. 18) pondera
· Transferência de conhecimento (do professor sobre o assunto dizendo:
para o aluno); Temos um longo caminho a ser percorrido para que
· Foco no professor – responsável pela aprendi- alcancemos o estágio de desenvolvimento profissional
zagem do aluno; de outros países – e isso somente será conquistado
· Predominância de aulas expositivas; com a conscientização dessa realidade. Somente
· Pouco envolvimento por parte dos alunos nas elevando o nível técnico e cultural de nossos profis-
atividades ensino-aprendizagem. sionais, conseguiremos superar o subdesenvolvimento
Ao escrever para a Revista Brasileira de Contabilidade, de nosso País, o qual não é apenas econômico, mas,
Strassburg faz referência a alguns tipos de professores principalmente, cultural e educacional.
de contabilidade como
Tal citação de Franco remete à possibilidade de
professores em começo de carreira, professores uma terceira variável influenciadora do processo
com razoável conhecimento da matéria em âmbito ensino-aprendizagem, não contemplada por Rollo e
nacional, professores que evidenciam um verdadeiro Pereira: a variável “quanto às instituições de ensino”.
domínio da matéria em âmbito nacional, e, professores Considerando que são muitas as responsabilidades
que evidenciam um verdadeiro domínio da matéria em atribuídas aos docentes e discentes, é mister que,
âmbito nacional e de certa forma internacional através também, não sejam esquecidas as responsabilidades
de participação do foro científico mundial e reuniões das instituições de ensino. Esta terceira variável viria
internacionais (2003). formar um tripé que, juntamente às responsabilidades
Em sua pesquisa Strassburg (2003, p. 93) notou do professor e do aluno, poderia influenciar e deter-
que “no sistema educacional brasileiro, a tipologia minar maior êxito no ensino e formação do educando.
e a característica do professor universitário predo- Para tanto, as instituições deveriam cuidar em prover
minantes são aqueles do professor que prioriza a melhor ambiente e condições favoráveis, motivando
transmissão do conhecimento para a formação de assim os docentes, a exercerem seu planejamento de
profissionais, ensinando como fazer e não dando forma mais prazerosa, produtiva e eficaz.

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Propostas sugeridas · Criar momentos de interação pedagógica, no
Espera-se que aqueles que se interessarem pelo que se refere ao plano de ensino da disciplina
tema e abordagem deste artigo, possam refletir e dis- de contabilidade, especialmente a básica/intro-
cutir sobre as propostas sugeridas. dutória (no caso da existência de dois ou mais
Às instituições de ensino superior que ofertam o professores da disciplina), com o propósito de
curso de ciências contábeis se sugere: trocar informações e refletirem sobre suas ações
sobre a disciplina;
· Promover eventos que tragam aperfeiçoamento
· Fomentar encontros com os outros professores
para seus docentes na área pedagógica, enfocan-
das demais disciplinas do curso, no intuito de ve-
do principalmente o planejamento da disciplina;
rificarem o andamento do conteúdo, bem como
incentivar, através de maior volume de recursos, a
as necessidades existentes em decorrências de
qualificação de professores, no que diz respeito à
eventuais falhas no ensino da contabilidade;
educação continuada;
· Prever no planejamento da disciplina atividades
· Fomentar a integração com institutos de educação
complementares à formação que transcendam
a fim de que haja um debate permanente sobre as
os conteúdos específicos e alarguem a visão do
questões que envolvem o ensino, entre docentes
profissional (vida universitária);
de contabilidade e os da área pedagógica;
· Manter atitude de planejamento ao longo da
· Criar condições de trabalho que favoreçam
disciplina/curso.
o encontro coletivo para pensar e repensar o
projeto pedagógico. Sugere-se, ainda, aos alunos de contabilidade que:
· Exijam da instituição um ensino de boa qualidade,
Aos diretores e coordenadores dos cursos de ciên-
no que tange à contabilidade, bem como profes-
cias contábeis se sugere:
sores didaticamente preparados e atualizados;
· Incentivar a criação de encontros entre professo- · Compreendam as possibilidades de sua profissão
res de contabilidade com os demais professores, e assumam com respeito o compromisso de
das demais disciplinas do curso, a fim de que desenvolver sua competência técnico-científica
possam trocar informações e discutir suas for- e ética para o exercício futuro;
mas de ação didático-pedagógica, considerando · Não limitem sua vida acadêmica ao momento da
a interdisciplinaridade e importância vital que a aula, mas envolvam-se nos eventos científicos,
contabilidade – especialmente a básica/introdu- participando e produzindo trabalhos.
tória – requer;
· Possibilitar a adequação da carga horária da Conclusão
disciplina de contabilidade básica/introdutó- É mister que o ato de planejar o ensino da conta-
ria para, no mínimo, quatro horas/aula por bilidade seja considerado relevante e imprescindível no
semana (para aqueles que trabalham com um decorrer de todo o processo de ensino-aprendizagem.
número de horas inferior ao sugerido); Portanto, se faz necessário que todos estejam não apenas
· Organizar momentos de retomada do “planeja- envolvidos, mas, sobretudo, comprometidos no sentido
mento” para manter sua atualidade e seu movi- de que os planos de curso se integrem, e para que o
mento, rompendo com sua natureza pontual. planejamento seja um direcionamento para se atingir os
objetivos especificados nos projetos pedagógicos. Para
Sugere-se aos professores de contabilidade:
tanto, é necessário disponibilizar tempo, local adequado e
· Participar intensamente de eventos que pro- materiais didático-pedagógicos, com o propósito de que
movam a obtenção de novos conhecimentos, e o planejamento não seja meramente uma tarefa burocrá-
atualização em sua área específica, bem como tica, mas que cumpra de fato o seu propósito.
na área de educação; Foi com sabedoria que Salomão pronunciou:
· Formar duplas (ou pequenos grupos) de pes- “Quem planeja com cuidado tem fartura, mas o apres-
quisa, que vise à produção científica; sado acaba passando necessidade” (Pv 21:5, BJA).

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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