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Entendendo o “novo poder”

Jeremy Heimans, Henry Timms

DEZEMBRO 2014

Todos nós sentimos que o eixo do poder está se deslocando. Vemos


crescentes protestos políticos, uma crise de representação e
governança, empresas iniciantes derrubando indústrias tradicionais.
Mas a natureza dessa mudança tende a ser extremamente romantizada
ou perigosamente subestimada.

Existem aqueles que nutrem visões vertiginosas de uma nova utopia


tecnológica na qual a crescente conectividade produz
instantaneamente democratização e prosperidade. Os gigantes
corporativos e burocráticos serão abatidos e as multidões, coroadas,
com cada um de nós usando nossa própria coroa impressa em 3D. Há
os que já viram tudo. Para esses, as coisas não estão mudando tanto
assim, dizem. Supostamente, o Twitter derrubou um ditador no Egito,
mas outro logo apareceu em seu lugar. Nós nos derramamos em
elogios à mais recente startup de economia colaborativa, mas as
empresas e pessoas mais poderosas parecem ficar cada vez mais
poderosas.

As duas visões estão erradas. Elas nos confinam a um debate estreito


sobre tecnologia no qual ou tudo ou nada está mudando. Na verdade,
uma transformação muito mais complexa e interessante está apenas
começando, movida por uma crescente tensão entre duas forças
distintas: o velho poder e o novo poder.

O velho poder funciona como uma moeda. É detido por poucos. Uma
vez obtido, é zelosamente guardado — e os poderosos têm uma
reserva substancial dele para utilizar. É fechado, inacessível e baseado
no líder.

O novo poder funciona de forma diferente, como uma corrente. É feito


por muitos. É aberto, participativo e baseado nas comunidades de
pares, de pessoas com características em comum. Como a água ou a
eletricidade, é mais forte quando tem surtos. O novo poder não é para
ser guardado, e sim canalizado.

A batalha e o equilíbrio entre o velho e o novo poder serão uma


característica definidora da sociedade e dos negócios nos próximos
anos. Neste artigo, apresentamos um quadro simples para entender as
dinâmicas fundamentais em funcionamento e como o poder está
realmente mudando: quem o detém, como ele é distribuído e para
onde está indo.
Modelos do novo poder

O poder, como o filósofo britânico Bertrand Russell o definiu, é


simplesmente “a capacidade de produzir os efeitos pretendidos”. O
velho poder e o novo poder produzem esses efeitos de forma diferente.
Os modelos do novo poder são ativados pela coordenação entre pares
e pela ação da multidão — sem participação, são apenas embarcações
vazias. O velho poder é ativado pelo que as pessoas ou organizações
possuem, sabem ou controlam como ninguém mais — se os modelos
do velho poder perderem isso, perderão sua vantagem.

Os velhos modelos tendem a exigir pouco mais do que o consumo.


Uma revista pede aos leitores que renovem suas assinaturas, um
fabricantepede aos clientes que comprem seus sapatos. Mas o novo
poder aproveita a capacidade — e o desejo — crescente das pessoas
de participar de formas que vão além do consumo. Esses
comportamentos, apresentados no quadro “A escala de
participação”, incluem o compartilhamento (pegar o conteúdo de outra
pessoa e compartilhá-lo com o público), a modelagem (remixar ou
adaptar conteúdos ou recursos existentes com uma nova mensagem ou
gosto), o financiamento (endossar com dinheiro), a produção (criar
conteúdo ou fornecer produtos e serviços dentro de uma comunidade
de pares, como YouTube, Etsy ou Airbnb) e a copropriedade (como se
vê em modelos como a Wikipédia e os softwares de código aberto).
Compartilhamento e modelagem. O Facebook é o exemplo clássico
de um novo modelo de poder baseado no compartilhamento e na
modelagem. Hoje, cerca de 500 milhões de pessoas compartilham e
dão forma a 30 bilhões de itens de conteúdo a cada mês nessa
plataforma, um nível realmente impressionante de participação, da
qual depende a sobrevivência do Facebook. Muitas organizações, até
mesmo atores do velho poder, estão contando com esses
comportamentos para aumentar a força de suas marcas. Por exemplo,
a NikeID, uma iniciativa na qual os consumidores se tornam designers
de seus próprios calçados, responde hoje por uma parte significativa
das receitas online da Nike.

Clique na imagem

Financiamento. Comportamentos de financiamento representam


geralmente um nível mais elevado de compromisso do que o
compartilhamento e a modelagem. Milhões de pessoas usam
atualmente modelos do novo poder para colocar seu dinheiro naquilo
em que acreditam. A Kiva, uma organização-símbolo do
financiamento colaborativo, ou crowdfunding, relata, por exemplo,
que cerca de 1,3 milhão de pessoas espalhadas por 76 países
receberam coletivamente mais de meio bilhão de dólares em
empréstimos.
Os modelos de doação, empréstimo ou investimento entre pares
reduzem efetivamente a dependência de instituições tradicionais. Em
vez de fazer uma doação por meio de uma grande instituição como a
United Way, que distribui o dinheiro em nome dos doadores, as
pessoas podem ajudar uma família específica numa localidade
específica afetada por um problema específico. Plataformas como a
Wefunder permitem que startups tenham acesso a fundos de milhares
de pequenos investidores, em vez de depender de um pequeno número
de grandes investidores. Um inventor bateu recentemente um novo
recorde na plataforma Kickstarter, levantando mais de US$ 13
milhões de 62 mil investidores. É verdade que os modelos de
financiamento do novo poder não deixam de ter um lado negativo: os
projetos, campanhas ou startups com maior apoio da multidão

podem não ser os investimentos mais inteligentes ou os que


beneficiam mais pessoas. Na verdade, o

crowdfunding radicaliza a tendência humana de favorecer o imediato,


visceral e emocional, em vez do estratégico, impactante ou duradouro.

Produção. No nível seguinte de comportamento, os participantes vão


além de apoiar ou compartilhar os esforços de outras pessoas e
contribuem com seus próprios esforços. Criadores de conteúdo do
YouTube, artesãos do Etsy e executores de incumbências do
TaskRabbit são exemplos de pessoas que participam por meio da
produção. Quando muitas pessoas produzem, essas plataformas
exercem grande poder. Veja o serviço online Airbnb, que conecta
viajantes que precisam de um lugar para ficar e moradores que têm um
quarto sobrando. Em 2014, cerca de 350 mil anfitriões acolheram 15
milhões de pessoas em suas casas. É o suficiente para pressionar a
indústria hoteleira estabelecida.

Copropriedade. A Wikipédia e o sistema operacional de código aberto


Linux se baseiam em comportamentos de copropriedade e tiveram
grande impacto em seus setores. Muitos dos sistemas descentralizados
dirigidos por pares que o professor de direito de Harvard Yochai
Benkler chama de “mutualismo de pares” pertencem a esta categoria.
Considere também uma iniciativa que não nasceu no Vale do Silício, e
sim em uma igreja em Londres: Alpha Course, ou Curso Alfa, é um
modelo para apresentar as pessoas à fé cristã. Qualquer pessoa que
deseje oferecer esse curso pode usar gratuitamente seu material e seu
for
mato básico — dez reuniões dedicadas às questões centrais da vida —
sem a necessidade de que esses encontros ocorram numa igreja.
Catalisado por um modelo que fortalece líderes locais, o curso já
alcançou 24 milhões de pessoas em salas de estar e cafés em quase
todos os países do mundo.

O que distingue esses comportamentos participativos é que eles


efetivamente enviam poder de uma fonte difusa, mas enorme — as
paixões e energias de muitos. A tecnologia está na base desses
modelos, mas o que os impulsiona é um senso elevado de capacidade
de ação humana.

Valores do novo poder

À medida que os modelos do novo poder se integram ao cotidiano das


pessoas e aos sistemas operacionais das comunidades e sociedades,
um novo conjunto de crenças e valores vai sendo forjado. O poder não
está apenas fluindo de forma diferente; as pessoas o estão sentindo —
e pensando sobre ele — de forma diferente. Uma adolescente com seu
canal no YouTube gera maior participação como criadora de conteúdo
do que como recipiente passiva das ideias de outras pessoas. Um
tomador de empréstimo na plataforma de financiamento entre pares
Lending Club pode evitar a intermediação da mais velha das velhas
instituições de poder, o banco. Um usuário da Lyft experimenta o
consumo como uma espécie de partilha e muda sutilmente sua visão
da propriedade de bens.
Esses círculos de realimentação tornam visíveis as recompensas da
ação coletiva baseada em pares e dotam as pessoas de um senso de
poder. Ao fazer isso, eles fortalecem as normas em torno da
colaboração e provam que podemos nos sair muito bem sem os
intermediários do velho poder que dominaram o século 20. Pesquisas
de opinião pública refletem a mudança de atitude em relação às
instituições estabelecidas. Por exemplo, a sondagem Edelman Trust
Barometer de 2014 mostra o maior déficit de confiança nas empresas
e no governo dos EUA desde que a pesquisa começou a ser feita, em
2001.

Entre aqueles que estão profundamente envolvidos com o novo poder


— principalmente pessoas com menos de 30 anos (mais de metade da
população mundial) —, está surgindo uma noção comum: todos nós
temos o direito inalienável de participar. Para as gerações anteriores, a
participação pode ter significado apenas o direito de votar em eleições
a cada poucos anos ou talvez a adesão a um sindicato ou uma
comunidade religiosa. Hoje, as pessoas esperam cada vez mais moldar
ou criar ativamente muitos aspectos de suas vidas. Essas expectativas
estão dando origem a um novo conjunto de valores em uma série de
campos:
Governança. O novo poder favorece abordagens informais e em rede
para a governança e tomada de decisão. A multidão do novo poder
não teria criado a Organização das Nações Unidas, por exemplo. Em
vez disso, ela é atraída pela visão de que os grandes problemas sociais
podem ser resolvidos sem a ação ou a burocracia do Estado.
Encontrado com fre-

quência no Vale do Silício, esse éthos tem em seu cerne uma fé


profunda e às vezes ingênua no poder da inovação e das redes para
fornecer serviços públicos tradicionalmente providos pelo governo ou
por grandes instituições. A representação formal perde prioridade — o
novo poder tem mais a ver com flash mobs, ou aglomerações
instantâneas, do que com a Assembleia Geral da ONU.

Colaboração. As normas do novo poder dão ênfase especial à


colaboração — e não só como uma forma de realizar algo ou como
parte de um processo obrigatório de “consulta”. Os modelos do novo
poder, em sua melhor forma, reforçam o instinto hu-

mano de cooperação (em vez de competição) ao recompensar aqueles


que compartilham as próprias ideias, difundem as dos outros ou
trabalham para melhorar ideias existentes. Modelos de economia
colaborativa, por exemplo, são impulsionados pelo veredicto
acumulado da comunidade. Eles contam com sistemas de reputação
que garantem, por exemplo, que hóspedes grosseiros ou bagunceiros
que usam o Airbnb tenham dificuldade para encontrar seus próximos
lugares para ficar.

“Façamos nós mesmos”. O novo poder também está gerando uma


ética de “façamos nós mesmos”, como coloca Scott Heiferman, CEO
da Meetup, e uma crença na cultura amadora em áreas que
costumavam ser caracterizadas pela especialização e
profissionalização. Os heróis do novo poder são os criadores que
produzem o próprio conteúdo, cultivam o próprio alimento ou
constroem os próprios dispositivos.

Transparência. Os defensores do novo poder acreditam que quanto


mais brilharmos, melhor. As noções tradicionais de privacidade estão
sendo substituídas por uma espécie de transparência permanente agora
que os jovens vivem suas vidas nas mídias sociais. Claramente, os
muros entre o discurso público e o privado estão desmoronando, com
consequências mistas. E embora os perfis do Facebook, feeds do
Instagram e afins muitas vezes não passem de uma forma
cuidadosamente trabalhada de autoexposição, a mudança em direção à
crescente transparência está exigindo uma resposta do mesmo tipo por
parte de nossas instituições e nossos líderes, que são desafiados a
repensar a forma como se relacionam com seus eleitores. O papa
Francisco — líder de uma organização conhecida por seu secretismo
— está surpreendentemente sintonizado com a necessidade de
dialogar com o novo poder. Sua promessa de aumentar a transparência
financeira do Banco do Vaticano e reformar as práticas de mídia do
Vaticano é um movimento inesperado nessa direção.
Filiação. O novo poder adora se filiar, mas neste novo mundo a
filiação é muito menos duradoura. As pessoas estão menos inclinadas
a ser membros de carteirinha de organizações (basta perguntar a
grupos como a American Civil Liberties Union, que estão vendo essa
forma de filiação ameaçada) ou a forjar relacionamentos de décadas
com instituições. Assim, embora as pessoas com a mentalidade do
novo poder sejam rápidas para se unir ou compartilhar (e graças aos
modelos do novo poder, “unir-se” é mais fácil do que nunca), elas
relutam em jurar fidelidade. Isso torna vulneráveis os modelos do
novo poder. O novo poder é rápido — mas também inconstante.

O novo poder também está mudando fundamentalmente a forma como


as pessoas comuns se veem em relação às instituições, à autoridade e
umas às outras. Essas novas normas não são necessariamente
melhores. Por exemplo, o novo poder oferece oportunidades reais de
emancipação e empoderamento, mas há uma linha tênue entre a
democratização da participação e uma mentalidade de turba. Este é o
caso, principalmente, de redes auto-organizadas que não têm
proteções formais. O novo poder pode se desviar facilmente na
direção de movimentos como o Tea Party ou o Occupy Wall Street.
(Presumimos que a maioria das pessoas considera pelo menos um
desses como algo ruim.)

Um quadro para entender os atores

Colocar as duas dimensões de modelos e valores juntas produz um


quadro que ajuda as organizações a refletir sobre onde elas estão neste
momento e a mapear seu progresso rumo a uma posição mais
estratégica (veja o quadro “A bússola do novo poder”).

Castelos. No quadrante inferior esquerdo estão organizações que usam


modelos do velho poder e têm valores do velho poder. Em nossa
avaliação, esta categoria inclui a empresa mais valiosa do mundo — a
Apple —, assim como alguns dinossauros óbvios. O sucesso da Apple
nos úl
timos 15 anos pode ser atribuído à estratégia extraordinariamente bem
executada de cultivar a exclusividade e empurrar produtos de cima
para baixo. Diferentemente da Google, a Apple evita em grande
medida abordagens de código aberto. E, apesar de sua base de fãs
contrária ao establishment e da cuidadosamente gerida “cultura do
criador” de sua loja de aplicativos, ela é conhecida pelo secretismo e
pela proteção agressiva da propriedade intelectual.

Conectores. No quadrante superior esquerdo estão organizações com


um modelo do novo poder — por exemplo, uma rede conectando
muitos usuários ou criadores —, mas sensibilidades do velho poder.
Esta categoria inclui empresas nativas da tecnologia, como a
Facebook (cujo modelo depende da participação, mas cujas decisões
às vezes parecem ignorar os desejos de sua comunidade), assim como
organizações como a Tea Party, que tem uma rede popular forte e
descentralizada, mas exerce sua influência nos corredores altamente
tradicionais de poder. Os atores neste quadrante têm uma inclinação
por valores relacionados ao sigilo, por reuniões a portas fechadas, mas
dependem de um modelo “feito por muitos” (e muitos correm um
risco crescente com isso).

Animadores de torcida. No quadrante inferior direito estão


organizações que usam modelos do velho poder, mas adotam valores
do novo poder. A Patagonia, por exemplo, tem um modelo de
negócios tradicional do velho poder, mas ainda assim se destaca por
abraçar valores do novo poder, como a transparência. Algumas dessas
organizações “animadoras de torcida”, como o jornal The Guardian,
estão trabalhando para a evolução de suas posições, de modo que elas
não só abracem valores do novo poder, como também incorporem
efetivamente modelos do novo poder.

Multidões. No quadrante superior direito estão os atores mais


genuínos do novo poder. Seus modelos operacionais são centrados nos
pares. E seus valores celebram o poder da multidão. Aqui
encontramos atores estabelecidos baseados nos pares, como
Wikipédia, Etsy e Bitcoin, e startups de economia colaborativa mais
recentes, como Lyft e Sidecar.

O quadrante também inclui grupos descentralizados de ativistas e


modelos educacionais radicalmente abertos.

Algumas organizações passaram de um quadrante para outro com o


tempo. É o caso da TED, a organização dedicada às “ideias que
merecem ser disseminadas”. Dez anos atrás, a organização falava em
colaboração e redes, mas na verdade não tinha nenhum tipo de modelo
do novo poder — era apenas uma conferência anual cara, exclusiva e
cuidadosamente organizada. Desde então, a TED foi ampliando seu
modelo — permitindo a auto-organização e a participação por meio da
franquia TEDx e abrindo a todos o seu conteúdo anteriormente
restrito. As duas decisões tiveram um grande impacto na escala e no
alcance da marca TED, mesmo com a organização tendo de lidar com
os riscos associados ao afrouxamento do controle. Hoje a TED está
impulsionando efetivamente um modelo de negócios com
características complementares do velho poder e do novo poder.

Cultivando o novo poder

A maioria das organizações reconhece que a natureza do poder está


mudando. Mas relativamente poucas entendem o que é necessário para
ter influência e impacto nesta nova era. As empresas veem entidades
recém-poderosas usando as mídias sociais, por isso adicionam um
pouco de tecnologia sem mudar seus modelos ou valores
fundamentais. Elas contratam diretores de inovação que servem como
“máscaras digitais” para líderes do velho poder. Elas “se aproximam”
do público via Twitter. Elas organizam desajeitadamente sessões de
bate-papo online ocasionais e solitárias com o CEO por meio da
plataforma Google Hangouts.

Mas ter uma página no Facebook não é o mesmo que ter uma
estratégia do novo poder. Se você é de um setor que está sendo
radicalmente transformado pelo novo poder, não basta acrescentar
alguma decoração de vitrine. Uma empresa jornalística, por exemplo,
não pode simplesmente inserir uma seção de comentários ao pé de
cada artigo online e chamar isso de novo poder — ela tem de fomentar
ativamente a participação do leitor e a formação de uma comunidade
vibrante, o que quase certamente exigirá mudanças tanto em seu
modelo como em seus valores. O jornal The New York Times está
lutando exatamente com esse dilema, como mostrou seu relatório de
inovação que vazou neste ano.

As organizações tradicionais que querem desenvolver capacidades


baseadas no novo poder devem realizar três tarefas essenciais: (1)
avaliar sua posição num ambiente de mudança de poder, (2) colocar-
se no lugar de seus críticos mais duros e (3) desenvolver uma
capacidade de mobilização.

Examine seu poder. Um exercício eficaz é marcar a posição de sua


organização com base na bússola do novo poder — assinalando tanto
onde ela está hoje como onde você quer que ela esteja daqui a cinco
anos. Marque também a posição de seus concorrentes. Pergunte a si
mesmo: como os modelos do novo poder estão sendo utilizados por
nós/eles? De que forma os valores do novo poder estão sendo
abraçados por nós/eles? Para saber como sua organização está
sintonizada com o novo poder, considere quais comportamentos
participativos você está possibilitando. Esse processo inicia uma
conversa sobre as novas realidades e como sua organização precisa
responder a elas. Ele nem sempre leva a uma determinação firme de
abraçar o novo poder — na verdade, pode ajudar as organizações a
identificar os aspectos de seus modelos e valores fundamentais que
elas não querem mudar.

“Ocupe” você mesmo sua empresa. E se houvesse um movimento


como o Occupy Wall Street (literalmente, “Ocupe Wall Street”)
dirigido contra você? Imagine um grande grupo de pessoas revoltadas,
acampadas no coração de sua organização, capazes de observar tudo
que você faz. O que elas pensariam da distribuição de poder em sua
organização e de sua legitimidade? O que é que as revoltaria e elas
tentariam subverter? Descubra — e então “ocupe” você mesmo sua
empresa. Esse nível de introspecção deve preceder qualquer
investimento em mecanismos do novo poder. (As empresas devem ser
especialmente cuidadosas quanto a criar plataformas de participação
sem criar culturas de participação, uma receita para o fracasso.)
Há uma boa probabilidade de que sua organização já esteja sendo
ocupada, quer você saiba ou não. Estão sempre aparecendo websites
que fornecem fóruns para declarações anônimas de funcionários sobre
o que está realmente ocorrendo dentro das empresas e como os líderes
são vistos. Em nosso mundo do novo poder, o comportamento privado
— e os desafios fundamentais — de cada organização está a apenas
um vazamento ou um tweet de distância. Isso representa uma ameaça
às organizações do velho poder felizes com sua opacidade, que
enfrentam novos níveis de fiscalização de desempenho. Você está
realmente proporcionando o alcance anunciado para o meu produto?
Você está realmente melhorando a capacidade de leitura do meu filho?
Hoje em dia, as organizações mais sábias são aquelas que têm
conversas — internas e externas — dolorosamente sinceras sobre seu
impacto.
Crie uma mentalidade de movimento. As organizações do velho
poder precisam fazer mais do que apenas olhar para dentro delas. Elas
também precisam pensar de forma diferente sobre como se relacionam
com o público. As organizações que basearam seus modelos de
negócios no consumo ou em outros comportamentos de p
articipação mínima verão que isso é difícil, mas é cada vez mais
importante.

A capacidade de mobilizar uma comunidade muito mais ampla de


pessoas pode ser uma vantagem crucial para os negócios, como vimos
na derrota do projeto de lei sobre pirataria online nos EUA em 2012.
Naquele conflito entre empresas de tecnologia e detentores de direitos
autorais, os dois lados recrutaram exércitos de lobistas, mas só um
lado foi capaz de mobilizar um exército de cidadãos. A Google, a
Wikipédia e outras organizações inspiraram ações significativas —
dez milhões de signatários de petições de rejeição do projeto, mais de
cem mil telefonemas para o Congresso e um “apagão” da internet —,
criando um surto cultural quando isso era importante. O recente
impasse entre a Amazon e a Hachette também mostra os dois lados
tentando flexionar seus músculos de mobilização, com a Amazon
reunindo os “Readers United” (“Leitores Unidos”) contra os “Authors
United” (“Autores Unidos”).

Para ter sucesso, um movimento precisa de muito mais do que


campanhas publicitárias ou “astroturfing”, como é chamado o
mascaramento do patrocinador de uma causa para fazer com que ela
pareça ter origem popular e espontânea. Os líderes precisam ser
capazes de mobilizar efetivamente aqueles que realmente acreditam,
não só de dirigir-se a eles. Uma questão-chave do novo poder para
todas as organizações é: “Quem vai realmente comparecer para apoiar
você?”.

O desafio para o novo poder

As organizações baseadas no novo poder podem ser facilmente


embriagadas pela energia de suas multidões e não conseguir
reconhecer que para realizar uma mudança real elas também precisam
se adaptar. Elas devem ter três princípios essenciais em mente.

Respeite suas comunidades (não se torne “o chefão”). Se as


organizações do velho poder devem temer ser ocupadas, as do novo
poder devem temer ser abandonadas. Aquelas que usam modelos do
novo poder, mas retornam por padrão para valores do velho poder, são
as que mais correm o risco de alienar as comunidades que as
sustentam. Não se trata apenas de um problema de mentalidade, em
que as organizações perdem o contato com as multidões que as
fizeram prosperar. É também um desafio prático: as expectativas de
partes interessadas cruciais — investidores, reguladores, anunciantes,
etc. — muitas vezes contradizem as demandas das comunidades do
novo poder, e equilibrar essas agendas não é fácil.

A Facebook, como muitas organizações com um modelo do novo


poder, está lidando com essa tensão entre duas culturas. Sua ambição
corporativa do velho poder (maior posse de dados, maiores valores de
ações) se choca com as demandas de sua própria multidão. Surtos
iniciais de interesse em redes sociais alternativas que prometem
honrar os valores do novo poder podem ser um sinal do que está por
vir. Quando os conceitos do novo poder sobre direitos digitais
evoluírem, esses conflitos provavelmente aumentarão.

Seja “bilíngue”. Apesar de todo o progresso do novo poder, ele ainda


não está causando muito impacto na superestrutura do velho poder da
sociedade. A Khan Academy é a queridinha dos especialistas em
tecnologia, mas nossos sistemas de educação continuam em grande
parte inalterados, com calendários escolares ainda definidos com base
nos estilos de vida das famílias dos anos 1800. Lawrence Lessig, um
destacado pensador do novo poder, quer reformular as leis de
financiamento de campanha nos EUA, mas percebeu que a melhor
forma de “acabar com todos os super-PACs”, os comitês de ação
política que podem arrecadar quantias ilimitadas para promover suas
causas, é com um super-PAC.

Nesse contexto, em muitos casos a estratégia certa para o momento


atual é se tornar “bilíngue”, desenvolvendo capacidades tanto do velho
como do novo poder. Arianna Huffington, por exemplo, criou uma
plataforma que abrange uma rede de 50 mil blogueiros, mas ainda
maneja habilmente um Rolodex do velho poder. Atores bilíngues
como Huffington usam conexões do velho poder para conseguir o que
precisam — capital, legitimidade, acesso a parcerias, publicidade —
sem ser cooptados ou desacelerados. Eles usam o poder institucional
sem ser institucionalizados.

Chegue à estrutura. Os modelos do novo poder sempre terão


influência e impacto limitados, a não ser que estejam operando dentro
de uma superestrutura projetada para aproveitar suas qualidades. Veja
o movimento popular global Avaaz. Embora tenha 40 milhões de
membros, ele não chegará muito longe em seus esforços para
promover mudanças se o mecanismo de tomada de decisão que ele
estiver procurando influenciar for uma estrutura arraigada no velho
poder, como o processo de negociação climática da ONU.

A batalha pela frente, quer você apoie valores do velho ou do novo


poder, será em torno de quem pode controlar e moldar os sistemas e as
estruturas essenciais da sociedade. Será que as forças do novo poder
serão capazes de reformar fundamentalmente as estruturas existentes?
Será que terão habilidade para deixá-las para trás de uma vez e criar
outras? Ou acabarão não fazendo nem uma coisa nem outra,
permitindo que os modelos tradicionais de governança, legislação e
mercados de capital basicamente se mantenham firmes?

ENQUANTO CELEBRAMOS momentos de esperança e vemos cada


vez mais pessoas moldando seus destinos e suas vidas, a grande
dúvida é se o novo poder pode genuinamente servir ao bem comum e
enfrentar os problemas mais intratáveis da sociedade. Estratégia e
táticas são importantes, mas as questões fundamentais são éticas.
“Apesar de todo seu poder democratizante, a internet, em sua forma
atual, simplesmente substituiu o velho chefe por um novo chefe”,
alerta Fred Wilson, um sócio da Union Square Ventures. “E esses
novos chefes têm um poder de mercado que, com o tempo, será muito
maior do que o do velho chefe.”

Muitas vezes, os chefes do novo poder sonham apenas com uma boa
“saída” de um ótimo negócio, mas precisamos de líderes do novo
poder que façam uma grande entrada na sociedade civil. Aqueles que
são capazes de canalizar o poder da multidão devem voltar suas
energias para algo mais fundamental: redesenhar os sistemas e as
estruturas da sociedade para incluir e empoderar, de forma
significativa, mais pessoas. O maior teste para os condutores do novo
poder será sua disposição de se envolver com os desafios dos menos
poderosos.

Jeremy Heimans é cofundador e CEO da Purpose, uma empresa social que cria
movimentos. Ele também é cofundador das comunidades políticas online GetUp e
Avaaz.

Henry Timms é diretor-executivo do 92nd Street Y, um centro


cultural e comunitário em Nova York. Ele também fundou o
#GivingTuesday, um movimento filantrópico global.

http://hbrbr.uol.com.br/entendendo-o-novo-poder/

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