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CARACTERÍSTICAS GERAIS DOS DEPÓSITOS DAS BAIXADAS

ALUVIONARES DA REGIÃO OCEÂNICA:


OS RIOS JOÃO MENDES E JACARÉ

ARTIGO 7

Pelo Geólogo Josué Barroso

As serras:Grande, do Cantagalo, do Malheiro e da Tiririca constituem


divisores de água dos rios Jacaré e João Mendes, os maiores rios que drenam a
Região Oceânica, cujas águas são despejadas, respectivamente, nas lagunas de
Piratininga e Itaipu. Essas mesmas serras constituem divisores das águas que
se dirigem para as lagunas da Região Oceânica daquelas que deságuam na
Baia da Guanabara. Portanto, esse conjunto fisiográfico com os cursos d’água
que nele nascem exercem uma indiscutível importância física, social e
econômica para Região Oceânica e para o município vizinho de São Gonçalo,
importância essa que é reforçada pela cobertura de remanescentes da Mata
Atlântica.

Em artigos anteriores procurou-se apresentar os aspectos físicos que


caracterizam as serras e morros da Região Oceânica,juntamente com os
processos geológicos modeladores do relevo atual. Neste artigo procura-se
apresentar uma caracterização geral dos depósitos das baixadas aluvionares,
associando-os à geometria e a dinâmica dos rios que lhes dão origem e, a
partir daí, corresponder tais características aos rios Jacaré e João Mendes. É
importante frisar que os dados numéricos ora apresentados não são fruto de
investigações sistemáticas de campo e, portanto, carecem de precisão. São o
resultado de consultas expeditas de mapas e imagens aéreas, aliadas à
experiência do autor e aos fundamentos teóricos, preservando o caráter
qualitativo objetivado.

Os rios são os principais agentes continentais na associação da erosão,


transporte e deposição dos sedimentos que formam as denominadas aluviões.-
depósitos de sedimentos acumulados ao longo dos rios e de suas planícies de
inundação.

EROSÃO

A erosão começa a processar-se pelo impacto das gotas de chuva e pelo fluxo
laminar difuso (ravinamento), antes que um curso dágua seja individualizado,
em razão do controle topográfico (coalescência do fluxo laminar), quando
então assume ação erosiva, pelo aprofundamento e alargamento de seu leito.

Uma área com cobertura de solo estará mais ou menos protegida pela
densidade e tipo da cobertura vegetal. Situações críticas podem configurar
proporções semelhantes às que abaixo se descreve:
- 60% da precipitação retorna à atmosfera por evaporação e transpiração
(evapotranspiração)
- 1 a 2% infiltra-se, contribuindo com o lençol freático
- 39 a 40% forma escoamento superficial; inicialmente em fluxo laminar, em
pequenas distâncias e produzindo a chamada erosão laminar, para,
posteriormente, formar correntes através canais bem definidos e exercer os
três processos geológicos: erosão, transporte e deposição.

Essa é uma situação possível para terrenos mal protegidos diante de fortes
chuvas, maiores do que a capacidade de absorção do terreno. A efetividade
das gotas de chuva e da erosão laminar na promoção do processo erosivo é
fortemente diminuída pela vegetação, mesmo nas áreas com cobertura de solo.
Na Região Oceânica, as serras que abrigam os rios Jacaré e João Mendes
ainda exibem partes consideráveis da Mata Atlântica, cujos efeitos positivos,
inibidores do processo erosivos, estão presentes com os seguintes benefícios,
justamente nos setores em que a erosão é mais acentuada:
• impede o impacto direto das gotas de chuva sobre a superfície do solo,
inibindo o fator iniciador do processo de desagregação. Essa proteção é
devida à copa das árvores, imbricadas e contíguas e à cobertura do solo
pelos restos vegetais. Também resulta dessa proteção um fluxo difuso
das águas, até que as calhas naturais sejam alcançadas, formando então
uma drenagem de águas transparentes, sem materiais em suspensão;
• o adensamento das árvores fazem com que o molhamento de suas copas
retardem a chegada ao solo da água das chuvas;
• retira por absorção e devolve à atmosfera, por evapo-transpriração,
parte da água infiltrada no solo, portanto, agindo contrariamente a sua
saturação;
• a camada superficial de solo é protegida pelo estabelecimento de um
estado coesivo, formado pela trama de raízes superficiais e
subsuperficiais. Esse aspecto é de relevante importância, na medida em
que a camada superficial de solo exerce papel fundamental na proteção
das camadas inferiores, de características de erodibilidade bem mais
acentuadas;
• nas situações vizinhas às encostas rochosas a mata funciona como
escudo protetor, barrando as quedas comuns de lascas e blocos de
rochas.

Estudos realizados em diversas florestas tropicais úmidas da Terra


revelaram que a cobertura vegetal impede o acesso ao solo de até 20% do
total pluviométrico precipitado, além do que proporciona um retardo
considerável da chegada das águas nas partes baixas do relevo,
contribuindo assim com a redução da frequência de enchentes, atuando
como uma esponja que retém a água por algum tempo, deixando-a percolar
lentamente para o interior do solo.

TRANSPORTE E DEPOSIÇÃO

As características dos sedimentos aluvionares variam ao longo do curso do


rio principal e do aporte dos seus afluentes, função da energia de transporte
e da natureza da carga de sedimentos presente, por sua vez dependente do
contexto geológico da correspondente bacia de drenagem.

No artigo 6 foram apresentadas as formas de deslocamento de um


fragmento no leito de um rio: transportes por arrasto, por saltitação, por
suspensão e por solução. Para um melhor entendimento dos materiais que
são depositados nas baixadas aluvionares, há que se acrescentar dois
conceitos importantes: competência e capacidade.

A competência refere-se ao tamanho da partícula que uma corrente pode


transportar, sob um dado conjunto de condições hidrológicas e é medida
como o diâmetro do maior fragmento que uma carga de fundo pode
deslocar. A competência é dependente da velocidade de fluxo, numa
relação exponencial. Assim, se a velocidade é dobrada, o diâmetro do
maior fragmento transportado aumentará na sexta potência de dois, ou seja,
64 vezes. A competência muda ao longo do curso do rio, na medida que a
velocidade muda e a rugosidade do fundo também muda.

A capacidade é a carga potencial que um rio pode transportar e é medida


como o volume de sedimentos que passa numa dada seção do canal, por
unidade de tempo. É também variável com as condições hidrológicas, bem
como com as características da carga e da rugosidade do fundo (altera o
transporte em suspensão).
AS BACIAS DOS RIOS JACARÉ E JOÃO MENDES

Faz-se uma breve análise dos dados constantes das duas tabelas abaixo,
procurando caracterizar os materiais aluvionares depositados ao longo dos
cursos dos rios Jacaré e João Mendes, através dos gradientes médios de
seus cursos e dos correspondentes afluentes maiores, além de mostrar os
potenciais de inundação existentes.

Bacia Hidrográfica do Rio Jacaré

Geo Calha Central, por Trechos Afluentes Maiores, por Trechos


me Margem Direita Margem Esquerda
tria Integral T1 T2 T3 T1 T2 T3 T1 T2 T3
Lt(m) 6000 2100 3200 700 1300 - - 1450 -
NAf 2 0 2 0 0 1 0 0 1 0
AM(m) 250 250 30 4 - 150 - - 150 -
Am(m) 2 30 4 2(aterro) - 30 - - 31 -
Im(%) 4.0 10.5 0.8 0,3 - 9.2 - - 8.2 -

Lt – comprimento total – NAf – número de afluentes – AM –altitude média máxima


Am – altitude média mínima – Im – declividade média – (m) – metros

Tabela 1 – Dados geométricos aproximados do Rio Jacaré e seus afluentes.

Bacia Hidrográfica do Rio João Mendes

Geo Calha Central, por Trechos Afluentes Maiores, por Trechos


me Margem Direita Margem Esquerda
tria Integral T1 T2 T3 T1 T2 T3 T1 T2 T3
Lt(m) 6200 1500 1700 3000 - 3200 - - 4200 4150-
NAf 7 0 5 2 0 2 - 0 3 2
AM(m) 125 125 30 14 - 150 - - 190 150-
Am(m) 1 30 14 1(mangue) - 14 - - 14 - 1
Im(%) 2.3 6.3 0.9 0.5 - 4.3 - - 4.2 3.6-

Lt – comprimento total – NAf – número de afluentes – AM –altitude média máxima


Am – altitude média mínima – Im – declividade média – (m) – metros

Tabela 2 – Dados geométricos aproximados do Rio João Mendes e seus


afluentes.

As condições geométricas naturais de ambos os rios foram fortemente


alteradas pelo processo de urbanização, como, por exemplos, canalizações,
mudanças de curso, aterros , avanços sobre as margens e outros, de modo que,
pelo menos parcialmente, as conclusões aqui apontadas podem não refletir as
condições pretéritas formadoras dos depósitos aluvionares atuais.

As calhas centrais dos rios Jacaré e João Mendes exibem declividades médias
moderadas de seus cursos totais (4.0 e 2,3), ambas compondo um primeiro
trecho (alto curso) com declividades muito altas (10.5 e 6.3) e quebras
acentuadas para o segundo trecho (médio curso – 0.8 e 0.9). Prosseguindo,
ambos os rios exibem um terceiro trecho (baixo curso) com declividades
muito baixas (0,3 e 0.5). Isoladamente, estes dados configuram rios
caracteristicamente erodíveis em seus trechos iniciais competentes, passando,
bruscamente, para rios de deposição e capacidades crescentes no sentido de
jusante.

É evidente que as bacias hidrográficas devem ser analisadas levando em conta


a contribuição importante dos afluentes e, neste aspecto, os rios Jacaré e João
Mendes apresentam diferenças significativas na formação de suas baixadas
aluvionares e, em virtude disto, devem ser considerados separadamente.

No caso do Rio Jacaré, a contribuição de seus afluentes é menos significativa.


São apenas dois, um pela margem direita e o outro pela margem esquerda. São
afluentes curtos e de alta declividade média, caracterizando uma ação
eminentemente erosiva cujas cargas de sedimentos arenosos são levadas para
deposição na calha do curso médio do Rio Jacaré, que é bem encaixado e
menos propício a grandes inundações pelo espraiamento das águas
transbordadas. A análise do baixo curso do Rio Jacaré é prejudicada pela
existência de aterros no entorno da Laguna de Piratininga, onde deságua. É um
trecho curto (700 m), sem a contribuição de um afluente significativo, mas,
mesmo assim, propício a inundações.

Em conclusão, o Rio Jacaré não se caracteriza por amplos depósitos


aluvionares em seus dois trechos iniciais, pelo encaixe de seu curso, e o seu
baixo curso, embora tipicamente inundável, tem a análise dificultada pelos
aterros realizados, além de vasto segmento canalizado, que se estende pelos
cursos baixo e médio.

A contribuição dos afluentes do Rio João Mendes é bastante significativa. São


7 afluentes maiores, dos quais, 5 encontram-se no curso médio e 2 no baixo
curso ou 2 pela margem direita e 5 pela margem esquerda. Têm extensões
médias bem maiores que aquelas dos afluentes do Rio Jacaré (mais que o
dobro) e são divididas, praticamente meio a meio, entre as encostas das serras
onde nascem (Grande e Tiririca) e as baixadas aluvionares, daí mostrarem
declividades médias não tão altas quanto os afluentes do Rio Jacaré.. São
portanto cursos d´água de características erosivas e de deposição, à
semelhança do próprio Rio João Mendes, disto resultando a ampla baixada
aluvionar que o caracteriza.

Concluindo, o Rio João Mendes forma uma bacia hidrográfica bastante


propensa aos processos de inundação, crescente no sentido de jusante do curso
principal e mais intensos pela margem esquerda. Quanto á granulometria dos
sedimentos os depósitos tendem a silto-argilosos, principalmente no trecho de
baixo curso, com variações arenosas a seixosas nas quebras bruscas de
declividade de seus diversos afluentes, ou seja, próximo ás encostas das serras
de suas nascentes.

Quanto às lagunas de Piratininga, receptora das águas e sedimentos do Rio


Jacaré , e de Itaipu, receptora das águas e sedimentos do Rio João Mendes,
cabem algumas considerações finais, com respeito às influências que esses
dois rios, e somente eles, exercem sobre o assoreamento de cada uma delas. A
Laguna de Piratininga é mais sujeita ao processo degradativo de
assoreamento, tanto pelas características do perfil longitudinal do Rio Jacaré
(baixo curso reduzido), como pelo aterro realizado, que suprimiu grande parte
do mangue anteriormente existente. Quanto à Laguna de Itaipu, é melhor
protegida pelo mangue de sua orla norte, embora parcialmente suprimido, e o
Rio João Mendes exibe um perfil longitudinal sujeito a inundações mais
severas, quando sedimentos em suspensão são depositados. Os históricos de
evolução dos perímetros e das lâminas d’àgua dessas lagunas demonstram
essa afirmativa.

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