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de Paul Schilder.
Contribuições para trabalhos
corporais nas áreas de
educação física, dança e
pedagogia
Rita de Fátima da Silva*
*Mestranda do programa de pós-graduação da
rita_fatima@hotmail.com
FEF/ UNICAMP
** Mestrando do programa de pós-graduação da Rubens Venditti Júnior**
FEF/UNICAMP rubensjrv@yahoo.com
***Mestranda em Artes Corporais pelo
Jussara Miller***
IA/UNICAMP
jussaramiller@ig.com.br
(Brasil)
Resumo
O objetivo deste estudo consiste em destacar alguns pontos das idéias de Paul Schilder e
discuti-las, estabelecendo ligações entre sua perspectiva de corpo existencial e as diversas
possibilidades de trabalhos corporais nas áreas da Pedagogia, Dança e Educação Física. Para
isto, outros pesquisadores que abordam o tema imagem corporal aparecerão neste estudo. Os
textos de Schilder utilizados são: 'A Estrutura Libidinal da Imagem Corporal' e 'Sociologia da
Imagem Corporal''. Os mesmos fazem parte de seu livro 'A Imagem do Corpo ', datado de 1935.
O autor entende a imagem corporal como sendo multidimensional, lábil e ligada à identidade do
indivíduo. A importância desta visão integral do corpo e do reconhecimento da íntima relação
dos aspectos fisiológicos, emocionais e sociais na construção da imagem corporal provoca uma
inquietação epistemológica em relação às práticas corporais dentro daquelas áreas de atuação e
intervenção.
Unitermos: Imagem Corporal. Identidade. Trabalhos corporais.
Abstract
The aim of this research consists at pointing some Paul Schilder's ideas and discuss them,
finding conections between his existencial body perspective and some possibilities of body
interventions at Pedagogy, Dance and Physical Education areas. For this, some others
researchers of body image will appear in the study. The texts of Paul Schilder used here are: 'The
libidinal structure of Body Image' and 'Sociology of Body Image'. Both of them belong to his book
titled 'The Body Image', dated from 1935. The autor understands 'body image' as being
multidimensional, ephemeral(dinamic/changeable) and associated to individual personality. The
importance of this entirelly vision of body and relation of the physiological, emotional and social
aspects at body image building brings an epistemologycal unrest about body practices inside the
educational areas.
Keywords: Body Image. Identity. Body practices.
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Introdução
"A arte de conviver não está na aceitação total das
coisas um do outro e sim nos compartilhamentos, pois isso
nos dá o verdadeiro sentido do grau de envolvimento."
(Araújo, 2003)
Por meio de discussões e contato com o tema em uma disciplina cursada na Pós-
Graduação da Universidade Estadual de Campinas(Unicamp)1 e por nossas
experiências profissionais, nos deparamos com a necessidade de compreensão de
nosso objeto(ou melhor, sujeito de estudo)- o Corpo- e suas manifestações através
do movimento.
De acordo com Turtelli, Tavares & Duarte (2002), que em seus trabalhos
investigativos - nos quais consultaram diversas bases de dados disponíveis via
internet a respeito das perspectivas de abordagem sobre o tema imagem corporal e
suas relações com o movimento- o início das pesquisas em imagem corporal datam
da virada do século XX.
Este termo passa a ser compreendido como "um modelo postural padrão que
cada pessoa constrói de si mesma e que serviria de referência para que ela
pudesse contrapor a esse modelo suas diferentes posturas e movimentos" (Turtelli
et al., 2002, p.152).
Uma grande inovação na temática surge com Paul Schilder, em 1935, que trata
da imagem corporal de uma forma até hoje atualizada e aplicável em nossas áreas
de atuação, daí nosso interesse em aprofundar-nos na perspectiva deste autor e
assim contribuir para os diversos campos de atuação profissional, que envolvam o
movimento, a atividade física e trabalhos corporais.
A obra de Paul Schilder- 'A Imagem do Corpo' (1994)- traz uma abordagem
sistêmica do tema "imagem corporal", fruto de seus conhecimentos como
neurologista, aliados aos de psicanálise e filosofia, que fortemente influenciaram
sua obra.
Schilder conceitua imagem (esquema) corporal afirmando que "... entende-se por
imagem do corpo humano a figuração de nossos corpos formada em nossa mente,
ou seja, o modo pelo qual o corpo se apresenta para nós" (Schilder: 1994, p. 11). E
ainda:
Isto pode ser observado quando o autor descreve a alteração do valor relativo ou
então a clareza perceptiva de diferentes partes da imagem corporal, na qual uma
parte do corpo é enfatizada ou abstraída em certos momentos.
Conversão e Difusão
Alguns processos mentais estão intimamente ligados à construção da imagem
corporal, dentre eles a atividade cortical; que interfere no processo perceptivo,
transformando-o num todo com partes distintas.
Vale ressaltar que o interesse e atenção das pessoas que nos cercam exercem
muita influência na elaboração de nossa imagem corporal, o que nos leva a concluir
que no processo de estruturação da imagem corporal as experiências e sensações
obtidas por ações e reações dos outros em nossas relações sociais são parte
integrante do processo e da construção da imagem corporal.
Esta afirmação deixa claro que a imagem corporal não está presa aos limites do
próprio corpo, mas, pelo contrário, vai além dele: "é um fenômeno social" (Schilder,
1994, p.189) porque justifica-se na existência deste ser no mundo, sendo que "o
espaço interno e externo do modelo postural não é o mesmo da física" (Schilder,
1994, p.185).
Dor e libido4
A pele e o toque
Desde Descartes, estamos lutando para nos livrarmos do reducionismo que nos
submetemos durante toda a nossa educação - seja corporal, escolar, familiar;
enfim, toda uma grande vivência mecanicista, de fora para dentro, que quando nos
deparamos com uma busca diferente, através de questionamentos, para
transformar esta realidade, vem uma impotência muito grande, e tudo não passa
de teoria.
Enquanto o corpo for tratado como algo fora de nós, encontraremos somente
valores mercadológicos, de vendas e compras de corpos, tendo como referências a
mídia, ou melhor, o capitalismo selvagem, que atinge o corpo com desrespeito.
"Um corpo é necessariamente um corpo entre corpos. [...] A palavra 'ego' não tem
sentido quando não existe um 'tu' [...]. Interessamo-nos tanto por nossa integridade
quanto pela dos outros [...]. Não há imagem corporal sem personalidade. Mas o
desenvolvimento pleno da personalidade do outro e de seus valores só é possível
através da imagem corporal. Assim, a preservação, a construção e a estruturação
da imagem corporal deste outro se torna signo, sinal e símbolo do valor de sua
personalidade integrada. A este respeito, o estudo da psicologia da imagem
corporal pode levar a um sistema ético e a um sistema moral. Portanto, dor, alegria,
destruição, mutilação, morte são a preocupação daqueles que estão próximos de
nós, mas um reflexo mágico conecta os mais próximos com os mais afastados, e
passa até o animal, à planta e ao mundo inanimado. Há profundas conexões entre
nossas ações e interesses pessoais e nossos interesses e ações relativos aos outros.
A preservação da imagem corporal de outra pessoa é em si, um valor ético. (...) há
uma tendência a destruir tanto nossa imagem corporal quanto a alheia. Mas a
destruição não é meramente um modo de renovar a construção que, afinal, é o
significado da vida ?". (Schilder, 1994, p.243-4)
O texto "Corpo, a próxima fronteira do capital "(Folha SP, 1997), diz: "a vida está
na moda". Esta afirmação é uma reação à falta de qualidade de vida em que
vivemos. A atenção dada ao corpo teve um grande alarde na década de 80, com o
surgimento de academias de ginástica, aulas que combinavam dança e exercício
físico, práticas de "jogging" nos parques (Johnson, 1990), parte também do mesmo
princípio: o corpo como mais um filão comercial, resultando na ausência do corpo
"vivo" e autêntico, para aquele corpo-objeto e mercadoria de consumo.
O grande conflito que vivemos hoje é: corpo indivíduo versus corpo massificado.
O corpo indivíduo busca ser, o corpo massificado busca poder, parecer... ter.
O corpo é o primeiro e mais natural instrumento do homem (Mauss, 1974).
Desta forma, compreender que cada gesto, cada movimento, está envolto num
universo de representações composto pela história de cada um. Portanto, quando
o(a) professor(a) pede para que a criança pegue uma parte de seu corpo e em
seguida repita o movimento este passa a ser único e envolto em aspectos que
englobam questões de pulsões, tendências, desejos e percepções. Pois o imitar tem
um sentido diferente e profundo para cada criança; está repleto de representações
que escapam a um olhar superficial. É preciso sensibilidade para captar o sentido
dessas representações para a criança.
Método
Caracterização do Estudo
Procedimentos
Este trabalho é resultado dos estudos com o grupo que compunha a disciplina
Imagem Corporal, da Faculdade de Educação Física, da Universidade Estadual de
Campinas;
a. Relatos de experiências do Grupo autoral (cada qual
enfocando sua área);
b. Apontamentos sobre as questões comumente levantados pelo
grupo de estudo envolvendo o tema;
c. Aporte nas produções teóricas dos autores citados no corpo do
trabalho.
Proposições finais
A importância e necessidade de aprofundamentos e estudos da Imagem Corporal
para a Educação Física e para os trabalhos corporais na Dança e na Pedagogia, têm
seu valor e justificativa ao entendermos que todos os nossos sentidos participam
deste processo de construção, complexo, dinâmico, plástico e volátil. Além desta
justificativa, TURTELLI, TAVARES & DUARTE (2002) apontam em suas investigações
sobre os enfoques dados aos trabalhos e pesquisas em imagem corporal as grandes
divergências conceituais dos termos utilizados no assunto. Assim como estes,
também acreditamos na importância de desenvolvimento da perspectiva de
maneira ampliada e integradora refletida em nossas abordagens práticas,
justamente por meio de aprofundamentos e estudos acadêmicos de modo a
disseminar todo o conhecimento acerca do tema.
Isto nos leva a compreender o que o autor defende ao afirmar que a "...imagem
corporal não é um fenômeno estático" (Schilder, 1994, p. 152), do ponto de vista
fisiológico. Ela é um fenômeno complexo que é adquirido, construído e estruturado
num contato contínuo com o mundo e com nós mesmos.
Fator muito interessante também é que estes mesmos aspectos destacados por
Schilder, por sua vez, são a base da Educação Somática, que pode ser definida
como ciência de um processo relacional entre a consciência, o biológico e o meio
ambiente, fatores que agem em uníssono, em sinergia ou ainda segundo (Fortin,
1999) um campo de estudo que engloba uma variedade de conhecimentos onde os
domínios sensorial, cognitivo, motor, afetivo e espiritual se misturam
diferentemente.
Podemos observar que esta conceituação pode ser facilmente aplicada não
apenas no ambiente da Dança e das Artes Corporais, como também permite ser
agregada à áreas educacionais da Pedagogia, da Educação Especial e da Educação
Física.
Mais uma vez busca-se um contra-ponto entre Schilder e Tavares, onde esta
pesquisadora afirma que:
"(...) a minha vivência corporal na infância quando brincava com bolas de sabão,
pulava corda, andava de bicicleta, subia em árvores, faz parte de um passado que
está muito presente no meu corpo. Na adolescência quando buscava modelos de
mulher através de adornos que transformavam a minha imagem corporal, com o
uso de batons, esmalte, chapéu, salto alto, lenços, penteados, etc. Tudo isto fez e
faz parte de mim, criando um intercâmbio contínuo entre a minha imagem corporal
e a dos outros"(Miller, 2003).
Fica claro que a Educação Física precisa ser inclusiva, compreendendo o corpo
para além do físico e o movimento não como efeito de reprodução ou deslocamento
do corpo e dos membros produzidos com uma seqüência do padrão espaço-
temporal da construção muscular, mas resultado da integração de um corpo
existencial. Um corpo que "... è, necessariamente, um corpo entre corpos" (Schilder,
1994, p. 58).
A Educação Física pode contribuir para que este (re)conhecimento ocorra para a
criança através de variantes de experimentação e vivências de seu corpo (suas
partes, a relação entre estas partes, as percepções), no entanto, o fazer pedagógico
em geral deve contemplar esta forma de enxergar o outro.
Com certeza não é fácil romper com uma Educação Física que estruturou-se a
partir de idéias de um "aluno padrão", "corpo perfeito", "rendimento" e "aptidão
física" (Freitas, 2003, p. 03).
Uma Educação Física que esteve sobre a influência da área médica com ênfase
na higiene, saúde e eugenia, interesses militares e do nacionalismo.
Para crianças com necessidades educativas especiais o contato com este tipo de
profissionais pode representar a diferença entre buscar alternativas para superar
suas dificuldades (físicas, sensoriais, mentais e outras) através da possibilidade de
reconhecer não apenas os seus limites, mas as suas potencialidades, pois "... a
experiência do próprio corpo é uma unidade em construção" (Tavares, 2003, p. 77).
Todavia, para que essas crianças com necessidades educativas especiais tenham
a oportunidade de vivenciar estes conteúdos é fundamental que os professores de
Educação Física e os educadores em geral tenham uma forte crença de que são
capazes de educar com êxito todo e qualquer aluno, seja ele obeso, lento,
extremamente ágil, cadeirante, surdo, desinteressado, desmotivado, cego, entre
outros.
Isto tudo é também válido para os profissionais que atuam na área da dança,
diretamente ligada á expressão corporal, integrando arte, educação e auto-
conhecimento.
Assim, a ligação dança/vida aponta para a atividade fora da sala de aula como
um permanente campo de testes das experiências que se realizam dentro destas
"aulas-laboratório". Encarar a aula como um 'locus' de pesquisas é uma
característica explicitamente colocada no trabalho de Vianna (Navas, 1992),
referencial significativo para a área da Dança.
Entrar em contato com as idéias de Paul Schilder clareou muito nosso campo de
pesquisa, porque na área do movimento, os termos vão surgindo
desordenadamente.
Esta é a base da Técnica Klauss Vianna, que enfoca o bailarino enquanto ser
humano. Klauss enfatiza que sem o ser humano não existe dança: primeiro tem que
haver o ser humano, para depois haver a dança.8
Um caminho "de dentro para fora, de fora para dentro... A toda hora, a todo
momento... de dentro para fora, de fora para dentro..."
Não estou no espaço e no tempo, não penso o espaço e o tempo; meu corpo aplica-
se a ele e o abarca. A amplitude dessa apreensão mede a amplitude de minha
existência; mais de qualquer maneira ela nunca pode ser total. O espaço que habita
de todos os lados tem horizontes indeterminados que encerram outros pontos de
vista. A síntese do tempo como o espaço são sempre para se recomeçar.
Notas
Referências bibliográficas
Fontes complementares