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Arrisque-se.

Seja diferente
Tirar o máximo de uma particularidade é o atributo mais importante para um
líder entre os quatro aqui mencionados. Saber usar a diferença para manter uma
certa distância social é uma grande arma. É um processo no qual o líder atrai
para si a equipe, embora deixe claro seu isolamento.
Para deixar nítida essa diferença, muitos líderes adotam um vestuário ou um
visual totalmente distintos. O mais comum, contudo, é que essa distinção acabe
se manifestando em atributos como criatividade, lealdade, tarimba ou até
mesmo no aperto de mão. Qualquer coisa pode ser uma peculiaridade. O
importante é demonstrá-la.
Há líderes que sabem exatamente como tirar proveito de suas idiossincrasias. Um
deles é John Harvey-Jones, antigo cabeça daquela que, no passado, foi a maior
indústria do Reino Unido, a ICI - Imperial Chemical Industries. Na ocasião do
lançamento de sua autobiografia, anos atrás, um jornal britânico publicou um
desenho de Harvey-Jones que nada mais era do que uma silhueta com bigode,
cabelos compridos e uma gravata espalhafatosa. Era em preto-e-branco, mas
todo mundo sabia quem estava sendo retratado. É lógico que John Harvey-Jones
não chegou ao topo da ICI por causa da gravata chamativa e das longas madeixas.
Foi, porém, astuto em nutrir singularidades para mostrar que era aventureiro,
empreendedor e único.
Há pessoas que não têm consciência de suas peculiaridades, mas mesmo assim
conseguem tirar o máximo delas. É o caso de Richard Surface, que já foi diretor-
gerente da britânica Pearl Insurance. Ao andar pelos corredores, Surface sempre
ultrapassava os outros. Pelo seu caminhar, transmitia uma noção de urgência.
Ficou claro em nossas entrevistas que a maioria dos líderes não sabe a princípio o
que os torna diferentes. Mas um dia eles descobrem tais peculiaridades e, com o
tempo, passam a usá-las de forma mais eficaz. Um exemplo é Franz Humer, o
executivo da Roche que, hoje, admite usar a emoção para provocar reações em
outras pessoas.
Há também diferenças sutis, que nem por isso deixam de surtir efeito. David
Prosser, o presidente da Legal and General, uma das maiores seguradoras da
Europa, não tem o traquejo do sujeito cosmopolita. Embora de uma maneira
geral seja receptivo, possui um lado duro, que emprega de um jeito sutil mas
eficaz. Num evento social recente, um gerente de vendas empolgado não parava
de falar como a empresa era boa na venda casada de produtos. Em voz baixa,
Prosser o interrompeu: "Podemos até ser bons, mas não o bastante". Em volta, foi
aquele mal-estar. O que Prosser quis provar? Que ninguém deveria se soltar a
ponto de esquecer quem é o chefe.
O líder inspirador usa o distanciamento para tirar dos subordinados um melhor
desempenho. Isso não é ser maquiavélico. É, antes de mais nada, saber
instintivamente que seu time caminhará mais depressa se o líder estiver
ligeiramente à frente.
LIDERANÇA EM AÇÃO
Os quatro atributos aqui detalhados são indispensáveis para um líder ser capaz de
motivar. Mas seu uso não pode ser de forma mecânica. Eles devem se tornar
parte da personalidade do executivo. É por isso que a receita dos velhos manuais
de administração costuma desandar. Não dá para simplesmente copiar um líder.
Logo, o desafio diante dos aspirantes ao título é ser autêntico, mas com um
domínio maior da situação. Para isso, a sugestão é aprofundar a compreensão dos
quatro atributos de liderança aqui detalhados e manipular tais características até
chegar à fórmula que seja particularmente adequada a você.
Em geral, o resultado disso tudo é bastante sutil, como bem mostra o exemplo
envolvendo Richard Sykes, o aclamado comandante da Glaxo Wellcome, um dos
maiores laboratórios farmacêuticos do mundo. Na posição de diretor do braço de
pesquisa e desenvolvimento da empresa, Sykes foi dar à elite científica da
empresa um resumão de fim de ano. No final da apresentação, um cientista fez
uma pergunta sobre uma substância nova da empresa. Sykes e o funcionário
travaram uma discussão breve, acalorada. O pingue-pongue com o chefe
prosseguiu por outros 20 minutos, no fim dos quais o tal cientista voltou a tocar
no assunto. Num tom elevado de voz, insistiu: "Doutor Sykes, o senhor ainda não
entendeu a estrutura desse novo composto". Dava para sentir o sangue do
executivo fervendo. Sykes marchou até o fundo da sala e soltou o verbo diante
da fina flor intelectual da farmacêutica: "Tudo bem, rapaz, vamos ver o que você
tem aí", esbravejou.
Para alguns, a irritação de Sykes pode soar como uma demonstração indesejada
de fraqueza. Naquele contexto, porém, a perda da paciência foi prova da
profunda crença de Sykes no debate de questões puramente científicas. A
capacidade de se abalar só consolidou sua credibilidade como líder. Se tivesse
explodido logo de cara, teria acabado com a discussão. Sua ira foi compreendida
como uma defesa da causa científica. O caso revela, ainda, a capacidade de
Sykes de se identificar com seus colegas e seu trabalho. Ao dialogar com o
cientista como se fosse só mais um deles, Sykes gerou empatia com a platéia. Ele
é uma pessoa que irradia ardor. A exemplo de outros líderes, age e se comunica
com naturalidade. Se fosse preciso sintetizar o episódio do apanhado de fim de
ano na Glaxo Wellcome, diríamos que Sykes estava sendo o que ele é - e com
uma destreza espetacular.

FIM DO MISTÉRIO
Os quatro atributos da liderança destacados aqui são indispensáveis como um
primeiro passo na formação de um líder. No todo, ensinam a um executivo que é
preciso ser autêntico. É o conselho que damos àqueles que nos procuram: saibam
usar o que há de melhor em vocês. Não pode haver conselho mais difícil de seguir
do que esse.
OS GRANDES MITOS SOBRE LIDERANÇA

Muitas teorias sobre formação de líderes acabam se transformando em verdades


absolutas. Desconfie delas. Nem tudo o que existe por aí faz realmente sentido
na prática. Confira:

1- Qualquer um pode se tornar um líder


Muitos executivos não têm autoconhecimento ou autenticidade necessários para
exercer a liderança. Esses requisitos são apenas parte da equação. Para ser um
líder, a pessoa precisa querer. Há quem prefira dedicar mais tempo à vida
particular do que ao trabalho. Afinal, trabalho não é tudo na vida e ser chefe não
é tudo no trabalho.

2- Quem chega ao topo é um líder


Outra ilusão é acreditar que toda pessoa que ocupa um cargo de liderança seja
um líder. Existem pessoas que chegam ao topo por causa de traquejo político, e
não pela verdadeira qualificação como líder.

3- Um líder gera bons resultados financeiros


Se um balancete saudável fosse questão de boa liderança, seria fácil escolher um
líder. A estratégia mais usada tem sido roubar o pessoal de empresas com
excelente desempenho. A realidade não é tão simples.

4- Todo líder é um grande mestre


Há uma espécie de indústria informal em torno do conceito de que todo bom
líder deve ser um bom mestre - o tal do coach. A tese, no entanto, parte do
princípio de que uma única pessoa teria o poder de motivar as tropas e transmitir
know-how técnico. Naturalmente, é possível que um grande líder seja um ótimo
coach. Mas é algo que raramente se vê.

VImage Bank* Robert Goffe e Gareth Jones são, respectivamente, professor de


comportamento organizacional da London Business School e executivo sênior da
BBC
© 2000 Harvard Business School Publishing - Distributed by New York Times
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