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ANÁLISE SOCIO-HISTÓRICA DO PRINCIPIALISMO ÉTICO A PARTIR DA CRÍTICA DOS

ESTUDOS PÓS-COLONIAIS.

Este estudo apresenta uma análise sócio-histórica da aplicabilidade do


principialismo no contexto pós-colonial. O principialismo utilizado pelos comitês de ética
em pesquisa no Brasil advém da herança das práticas clínicas européias e
estadosunidenses1(Kottow 2008). Todavia a análise aqui proposta reflete a respeito da
atualização de mecanismos sociais do colonialismo que velam a vulnerabilidade das
populações brasileiras. Nesse sentido, investigamos de que forma a modernidade
constituiu agenciamentos que predicam sobre o sofrimento de outrem como algo próximo
e de fácil compreensão, cujo efeito discursivo tem se efetivado por meio do conceito de
alteridade. A indagação proposta pelos estudos pós-coloniais revela a influência do
extermínio e da exploração de populações colonizadas, durante 510 anos, que
necessitam sobrepor às estruturas semânticas e cognitivas da exclusão social. Revela-se
como paradoxo da prática e análise ética a preocupação com a relevância social dos
projetos de pesquisas e do desconhecimento sobre os efeitos do colonialismo sobre a
estruturação perceptual semântica e de memória afetiva que determinaria a condição de
justiça e à equidade.
Esta pesquisa se investiga a historicidade do principialismo aplicada pelos CEPs a
partir da crítica do discurso pós-colonial, tendo em vista os mecanismos sociais de
exclusão atualizados em países que foram colonizados, como o Brasil.
A diferença cultural nos aproxima da fragmentação de recursividades no estudo de
situações históricas2 (Bhabha 2003) 3 (Canclini 2006), mediante a tensão provocada pela
manutenção arbitrária dos processos identitários da dominação colonial atualizada.
Considerar que o sujeito da pesquisa possa escolher participar não significa,
efetivamente, que ele se reconheça, ou seja, reconhecido socialmente no direito de fazer,
como se bastasse uma racionalidade com legitimidade arbitrária4. A condição histórica da
exclusão condiciona os indivíduos a temerem a visibilidade de atributos que os
caracterizam como “outros” -diferentes -; por isso, tornaram-se comum agenciamentos em
busca de uma identidade comum, “nós”. A narrativa do reconhecimento pela luta de
direitos em Honeth5 (2003) baseia-se em Winnicott6 (2005), Bowlby7 (2003) e Hegel8
(2008) e generaliza, em sua gramática normativa, a condição de racionalidade sobre o
abandono e exclusão individual, sem considerar a história social desses grupos ou
situações sociais de grupos colonizados. Em contrapartida, pesquisas como a de Amodio
e Devine9 (2006) apontam que o preconceito e a criação de esteriótipos implícitos no
imaginário social aparentam ser um processo comum em comportamento social, mas que,
ao contrário, a neuroanotomia funcional sugere que eles surgem de substratos
fundamentalmente distintos associados à semântica e sistemas de memória afetiva
relativas à exclusão.
O entendimento de alteridade presente no princípio de justiça e equidade, advém
da recursividade eurocêntrica, pois “mais do que equacionar alteridade com
reciprocidade, ele fundamenta o reconhecimento mútuo no momento da alteridade, e
chama por reconhecimento do outro enquanto o exige que não seja reconhecimento que
se reduz a identidade”10 (Fanon 2008: 104). Destarte, nossa pesquisa tem demonstrado
que as diferenças culturais engendram anseios, pretensões e agenciamentos não
universais. Mais do que uma simples tradução da diferença entre as culturas humanas, a
questão aponta para os aconteceres distintos que se contrapõe a uma ética fundacionista,
cuja referência legitimadora tem no processo colonizador europeu, e nos quais as
populações locais e/ou escravos, durante 510 anos, não tiveram desvelados os
mecanismos cotidianos de manutenção da exclusão de seus descendentes. Portanto, não
basta a racionalidade argumentativa para que os indivíduos possam criar repentinamente
caminhos e condições para que sua recursividade, memória afetiva e sistemas cognitivos,
desconstrua a vivência da exclusão social e ascenda a um estado de autonomia, mas o
pesquisador deve considerar que a desconfiança do indivíduo em participar da pesquisa
seja mais do que simples receio.

Palavras-chave: Estudos pós-coloniais, diferença cultural, principialismo, modernidade,


historicidade

Bibliografia
1
KOTTOW M. História da ética em pesquisa com seres humanos. In: DINIZ D, SUGAI A, GUILHEM D,
SQUINCA F (org.) Ética em pesquisa: temas globais. Brasília: EDUnB; 2008: 53 – 86.
2
BHABHA H. O local da cultura. Belo Horizonte: EDUFMG; 2003.
3
CANCLINI NG. Culturas híbridas. São Paulo: EDUSP; 2006.
4
ROGERS W, BALLANTYNE A. Populações especiais: vulnerabilidade e proteção. In: DINIZ D, SUGAI A,
GUILHEM D, SQUINCA F (org.) Ética em pesquisa: temas globais. Brasília: EDUnB; 2008: 123 – 152.
5
HONETH A. A luta por reconhecimento. Campinas: Editora 34; 2003.
6
WINNICOTT DW. Privação e deliquência. São Paulo: WMF Martins Fontes; 2005.
7
BOWLBY J. Formação e rompimento dos laços afetivos. São Paulo: Martins Editora; 2006.
8
HEGEL GWF. Fenomenologia do espírito. Petrópolis: Vozes; 2008.
9
AMODIO D, DEVINE PG. Stereotyping and evaluation in implicit race bias: Evidence for independent
constructs and unique effects on behavior. Journal of Personality and Social Psychology. 2006 (91): 652-661
10
FANON F. Peles negras e máscaras brancas. Salvador: EDUFBA; 2008.

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