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Ministério da Educação

Secretaria de Educação Especial


ISSN - 1677-8073

Ano 14 - Edição Especial/2002


Edição Especial
Educação Física Adaptada

Comitê Editorial:
Marilene Ribeiro dos Santos
Ivana de Siqueira
Luzimar Camões Peixoto
Marlene de Oliveira Gotti
Maria Cristina Dümpel de Oliveira
Maria de Fátima Cardoso Telles
Samira Jorge

Coordenação Editorial:
Maria Cristina Dümpel de Oliveira

Edição de Texto:
Maria de Fátima Cardoso Telles

Revisão:
Maria de Fátima Cardoso Telles
Maria Cristina Dümpel de Oliveira
Marlene de Oliveira Gotti

Equipe de Apoio:
Eduardo Edmundo Souto
Irene Aparecida Braga
Lúcia Maria Gonçalves Sampaio
Silenir de Lima Aguiar
Equipe Técnica da SEESP

Colaboradores Especiais:
Fotos: Júlio César Paes de Oliveira
Wanderley Pessoa
Fotos cedidas pela Escola Parque Vivencial do
Paranoá / Brasília/ D.F./ GDF/Secretaria de Educação.

Revista INTEGRAÇÃO é uma publicação trimestral da Secretaria de Educação


Especial do Ministério da Educação.
Esplanada dos Ministérios, Bloco "L", 6° Andar, Sala 600.
CEP:70047-901 - Brasília/DF.
Fones: (61) 410-8651/8642; 410-9115/9116.
E-mail: publicacao@mec.gov.br

Tiragem desta edição: 35 mil exemplares.


As matérias publicadas pela revista Integração podem ser reproduzidas,
desde que citada a fonte. Quando assinadas, indicar o autor. Artigos
assinados expressam as opiniões de seus respectivos autores e, não
necessariamente, as da SEESP, que os edita por julgar que eles contêm
elementos de reflexão e debate.
Editorial
Esta edição especial da Integração tem como tema
a Educação Física voltada para os alunos com
necessidades educacionais especiais, no âmbito de sua
inclusão nas classes comuns do sistema regular de
ensino.

Nossa intenção é sinalizarmos para a necessidade


de, em consonância com as palavras do professor
Apolônio do Carmo, “situar, discutir e analisar, no
quadro social e educacional brasileiro, os desafios que
os profissionais da Educação Física estão tendo, em
face da inclusão”.

Ao definirmos esta temática, entendemos que


estaremos contribuindo para que os Programas de
Educação Física das Secretarias Estaduais e Municipais
de Educação incluam em suas propostas o atendimento
ao aluno com necessidades especiais, “construindo um
projeto pedagógico que respeite as diferenças
individuais e considere a diversidade de idéias,
sentimentos e ações”, conforme citado no artigo da
professora Verena Pedrinelli.

Marilene Ribeiro dos Santos


SUMÁRIO
04 Entrevista
Marilene Ribeiro dos Santos

06 Inclusão e Educação Física


Inclusão escolar e Educação Física: que movimentos são estes?
Apolônio Abadio do Carmo
14 O princípio da inclusão: um elemento da metodologia das aulas de Educação Física.
Elizabeth Ferretti Lemos

23 Inclusão e Assistência Social


A inclusão e a lei orgânica da Assistência Social.
Edison Duarte e Tereza P. Santos

26 Educação Física e Prática Pedagógica


Educação Física e inclusão: considerações sobre a prática pedagógica na escola.
Ruth Eugênia Cidade e Patrícia Silvestre Freitas

31 Educação Física e Diversidade


Possibilidades na diferença: o processo de inclusão de todos nós.
Verena J. Pedrinelli

35 Educação Física: Novos Caminhos


Educação Física inclusiva: um grande desafio para o século XXI.
Sônia Bertoni Sousa

39 Formação Docente e Educação Física


A formação profissional do professor de Educação Física diante das necessidades
educativas especiais de pessoas com paralisia cerebral.
Gilmar de Carvalho Cruz, Écliton Pimentel e Luciano Basso

42 Informe Especial
Teleconferência sobre o Programa de Educação Física Adaptada.

43 Depoimentos
• Bianor Domingues
• Amado de Paula da Silva
ENTREVISTA

MARILENE RIBEIRO
DOS SANTOS
*

“ TEMOS DE ASSEGURAR QUE, NO PROCESSO DE FORMAÇÃO DE


RECURSOS HUMANOS, CUJO PRINCIPAL VEÍCULO É A UNIVERSIDADE,
AS QUESTÕES RELACIONADAS À DEFICIÊNCIA E À INCLUSÃO SOCIAL
E EDUCACIONAL DA PESSOA COM NECESSIDADES ESPECIAIS SEJAM

”
CADA VEZ MAIS ABORDADAS E APRIMORADAS NO CURRÍCULO.

Professora Marilene, o que levou a Secretaria de cacionais especiais não é um fato novo, nem
Educação Especial do Ministério da Educação a tampouco desconhecido dos profissionais da área
criar o Programa de Educação Física Adaptada? de Educação Física. Entretanto, em que pesem os
relevantes trabalhos existentes e conhecidos a res-
O envolvimento da Secretaria de Educação Espe- peito da Educação Física e dos esportes dirigidos a
cial (SEESP) com as pessoas com necessidades edu- essas pessoas, as ações educacionais, historicamen-

*
Secretária de Educação Especial do Ministério da Educação.

4
te, têm-se dado de forma segregada. Isso ocorre, expressar e de mostrar seu potencial, muitas vezes
principalmente, pelo fato de alunos com necessida- tolhido.
des especiais receberem, da parte de professores
pouco preparados, dispensa das aulas de Educação
Física. Essa falta de preparo dos professores tem de- Existe algum Programa de financiamento voltado
corrido, em função de até pouco tempo, da para a área da Educação Física Adaptada?
inexistência, em sua formação, dos conteúdos ou
disciplinas destinados a prepará-los para atuar com Neste ano de 2002, a SEESP/MEC disponibilizou uma
esses alunos, e também de uma falta maior de infor- linha de financiamento especial para a realização dos
mações sobre a questão. Por todas essas razões a cursos de multiplicadores nos Estados. Estes nos envia-
SEESP/MEC criou o Programa de Educação Física ram seus projetos, os quais foram analisados e encami-
Adaptada. nhados ao Fundo Nacional de Desenvolvimento da
Educação (FNDE), com vistas a sua aprovação.
Para o próximo ano, as Secretarias Estaduais e
Qual o objetivo do Programa? Municipais de Educação, por meio de seus órgãos
da Educação Física e da Educação Especial, deverão
O objetivo geral do Programa é o atendimento à prever em seus Planos de Trabalho Anual (PTA), ações
criança, garantindo seu acesso e sua permanência que contemplem cursos de capacitação em Educa-
na escola regular, contemplando sua participação efe- ção Física Adaptada.
tiva nas aulas de Educação Física. Para tanto, faz-se
necessária a capacitação dos professores de Educa-
ção Física do sistema regular de ensino, em uma vi- Existe alguma ação da Secretaria de Educação Es-
são inclusivista, isto é, de inclusão do aluno com ne- pecial/SEESP em parceria com as Universidades,
cessidades especiais nas escolas do ensino regular. no que se refere aos cursos de Licenciatura, para
O Programa foi dividido em duas etapas, sendo a formação de competências para atuar com os
que a primeira foi realizada no mês de novembro e a alunos com necessidades especiais, no âmbito da
segunda no mês de dezembro de 2001, ambas em Educação Física?
Brasília, totalizando 189 (cento e oitenta e nove) pro-
fessores treinados. Esses professores, em seguida, No ano de 1994, foi expedida, pelo Ministério da
atuarão, em uma terceira etapa, como Educação, para todo o sistema de ensino superior, a
multiplicadores em seus Estados, com o apoio da Portaria número 1.793/94, contendo sugestões para
Secretaria de Educação Especial (SEESP/MEC), das a inclusão de conteúdos e disciplinas sobre Educa-
Secretarias Estaduais de Educação, bem como dos ção Especial nos cursos de graduação e licenciatura
órgãos locais de educação especial. Assim, será pos- das instituições de ensino superior (IES).
sibilitado a todos os professores o acesso à Após um levantamento feito junto às IES, especi-
capacitação e às informações necessárias e adequa- ficamente, junto àquelas que mantém cursos de li-
das para que os alunos com necessidades educacio- cenciatura em Educação Física, foi constatado que,
nais especiais sejam cada vez mais beneficiados, e em sua maioria, elas oferecem, em suas grades
não excluídos. curriculares, disciplinas sobre Educação Especial. Essa
é uma boa notícia, pois temos de assegurar que, no
processo de formação de recursos humanos, cujo
Como a senhora vê a questão da inclusão de cri- principal veículo é a universidade, as questões relaci-
anças com necessidades educacionais especiais onadas à deficiência e à inclusão social e educacio-
nas aulas de Educação Física do sistema regular nal da pessoa com necessidades especiais sejam cada
de ensino? vez mais abordadas e aprimoradas no currículo.

No Brasil, segundo dados do Instituto Nacional


de Estudos e Pesquisas Educacionais (INEP/MEC, Quais as perspectivas da SEESP para o futuro do
2001), existem 384 (trezentos e oitenta e quatro) Programa?
mil crianças com algum tipo de deficiência matricu-
ladas nas escolas públicas. Hoje, apenas uma peque- Ao final do ano de 2002, estaremos fazendo um
na parte dessas crianças tem a chance de praticar balanço dos cursos de multiplicadores, realizados nos
atividades físicas, oferecidas nas aulas de Educação Estados, para que possamos expandir ações que ve-
Física das escolas regulares. Isso precisa mudar, pois nham beneficiar os professores de Educação Física
o exercício físico é uma das atividades que mais be- do sistema regular de ensino, bem como os alunos
nefícios pode trazer aos alunos com necessidades com necessidades especiais incluídos nas classes co-
especiais, por possibilitar-lhes a oportunidade de se muns das escolas regulares.

5
INCLUSÃO E EDUCAÇÃO FÍSICA

INCLUSÃO ESCOLAR E A
EDUCAÇÃO FÍSICA: QUE
MOVIMENTOS SÃO ESTES?

Apolônio Abadio do Carmo *

O objetivo deste texto é situar, discutir e analisar ensino e a pesquisa voltados para as pessoas com
no quadro social e educacional brasileiro os desafios deficiência.
que os profissionais da Educação Física estão tendo, Afirmamos isto porque, ainda, são poucos os pro-
em face da política de inclusão1, aqui entendida como fessores de Educação Física que não têm dúvidas em
necessária tanto para o aluno com deficiência, quanto relação às possibilidades dessas pessoas praticarem al-
para o considerado normal. gum tipo de atividade esportiva, recreativa ou de lazer.
A história percorrida pela Educação Física ao lon- Felizmente os ideários perversos da aptidão físi-
go das últimas duas décadas, no Brasil, em que pese ca, e da máxima mens sana in corpore sano2 , com-
seu intenso envolvimento com as mais diversas for- batidos longamente por diferentes autores brasilei-
mas de esportes adaptados desde os anos setenta, ros,3 há algum tempo cederam lugar para uma ou-
apresenta, ainda, problemas das mais diferentes or- tra concepção de homem, corpo e movimento.
dens e formas, como qualquer outra área do conhe- Estamos falando da diversidade humana, das dife-
cimento, sobretudo no tocante ao atendimento ao renças, das desigualdades.

1
O termo inclusão é recente e teve sua origem na palavra inglesa “full inclusion”. Segundo STAINBACK e STAINBACK (1992) trata-se de um
novo paradigma que os autores definem da seguinte maneira: a noção de “full inclusion” prescreve a educação de todos os alunos nas
classes e escolas de bairro....reflete mais clara e precisamente o que é adequado: todas as crianças devem ser incluídas na vida social e
educacional da escola e classe de seu bairro, e não somente colocada no curso geral “mainstream” da escola e da vida comunitária, depois
de já ter sido excluída. In: MANTOAN, M. T. A integração da pessoa com deficiência. p. 176.
* Professor da Universidade Federal de Uberlândia/MG.

6
Com isso, o trabalho que a área da Educação Fí- diretrizes emanadas do Encontro Mundial de Educa-
sica vem desenvolvendo com as pessoas com defici- ção para Todos, realizado em 1990 na Tailândia e da
ência, nas duas últimas décadas, possibilitou a aber- Declaração de Salamanca de 19945 .
tura de novos campos de trabalho e pesquisas. A Essa nova tendência inclusivista no cenário políti-
fundação da Sociedade Brasileira de Atividade Motora co educacional brasileiro tem deixado os dirigentes
Adaptada, a criação de um Grupo de Trabalho nos educacionais confusos diante da obrigação de ter
Congressos do CBCE, a inclusão de várias linhas de que trabalhar no mesmo espaço e tempo, com cri-
pesquisas nos Programas de Mestrado e Doutorado anças que apresentam as mais diferentes formas de
no Brasil, tanto em Educação quanto em Educação habilidades, capacidades, comportamentos e histó-
Física, o fortalecimento do Comitê Paraolímpico Bra- rias de vida. O velho e desgastado ideário da igual-
sileiro e as grandes conquistas dos atletas nas últi- dade universal entre os homens começa a dar sinais
mas Paraolimpíadas, em Atlanta nos Estados Unidos de exaustão e um novo discurso começa a se tornar
e em Sidney na Austrália, exemplificam e corrobo- hegemônico. Estamos falando das diferenças con-
ram com nossas afirmações. cretas existentes entre os homens, que sempre exis-
Acreditamos que tudo isso seja fruto de uma lon- tiram, porém foram negadas ou desconsideradas pela
ga luta social envolvendo diferentes segmentos de e grande maioria dos educadores .
para deficientes4 , brasileiros e de outras nações. Atualmente, diante da tendência inclusivista a es-
Por essas razões, atualmente as pessoas com de- cola está “nua” e não tem como camuflar suas limi-
ficiência que tiveram acesso aos esportes atingiram tações e lacunas. O impacto da inclusão escolar é
um razoável estágio em termos de acesso, participa- tão forte que existe até quem diga, como forma de
ção e desenvolvimento físico desportivo. Basta olhar apelo ao absurdo ou tentativa de relativizar o pro-
a quantidade de atletas existentes, o número de dis- blema, que “todos somos deficientes e diferentes”.
ciplinas voltadas para este fim nos cursos de gradu- Os defensores desse ideário, mecanicamente,
ação em Educação Física e o contingente de profes- acreditam que, por sermos todos limitados em algu-
sores atuando na área, que teremos as mais claras ma coisa, logicamente, por esta razão, somos, to-
respostas. dos deficientes.
Entretanto, em que pese todas essas realizações, Com isso, tentam de forma simplista reduzir os
muito ainda necessita ser feito, principalmente na problemas decorrentes da violência simbólica6 , à ve-
tentativa de minimizar setores resistentes que conti- lha máxima, “quem não tiver uma limitação que atire
nuam, na maioria dos Estados brasileiros, desenvol- a primeira pedra”. Esquecem de todas as implicações
vendo ações no interior das escolas visando que os estigmas e a violência simbólica possuem, prin-
prioritariamente às crianças consideradas “normais” cipalmente enquanto elementos distintivos de clas-
ou aptas para a prática das atividades físicas con- se, raça, crença e valores sociais.
vencionais. Contra essas idéias afirmamos que todos somos
Esta situação, entretanto, tende a sofrer profun- diferentes e desiguais7 e não deficientes. Primeiro por-
das modificações em face da política de inclusão es- que somos sujeitos concretos; segundo porque so-
colar desencadeada pelo governo federal, fruto das mos de natureza biológica diferentes e socialmente

2
Esta máxima valoriza e confirma a idéia de superioridade do espírito sobre o corpo. “... significa que a Educação Física rigorosa põe o
corpo na posse de saúde perfeita, permitindo que a alma se desprenda do mundo do corpo e dos sentidos para melhor se concentrar na
contemplação das idéias. Caso contrário a fraqueza física torna-se empecilho maior à vida superior do espírito. MARTINS & ARANHA.
Filosofando, 1996. p. 311.
3
Ver a respeito em CASTELLANI FILHO, L. Educação Física no Brasil. A história que não se conta. Campinas: Papirus, 1998. COLETIVO DE
AUTORES: Metodologia do ensino de Educação Física. São Paulo: Cortez, 1992. SOARES, Carmem L. Educação Física: raízes européias
e Brasil. São Paulo: Cortez, 1994.
4
Instituições de deficientes são aquelas fundadas e dirigidas somente por pessoas com deficiência, enquanto que instituições para
deficientes são aquelas fundadas e dirigidas por pessoas não-deficientes.
5
Em março de 1990, realizou-se em Jomtien, na Tailândia, a Conferência Mundial de Educação Para Todos, convocada pela Organização
das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO), Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), Programa das
Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) e Banco Mundial, com o propósito de gerar um compromisso mundial de buscar uma
solução conjunta dos países para a crise na área educacional..
6
Violência Simbólica segundo BORDIEU & PASSERON (1975) “... é todo o poder que chega a impor significações e a impô-las como
legítimas, dissimulando as relações de força que estão na base de sua força, acrescentando sua própria força, isto é, propriamente
simbólica, a essas relações de força...”p.19.
7
Entendemos como sendo diferença a natureza biológica do indivíduo e, desigualdade a natureza social. Entretanto, dialeticamente
essas duas naturezas se interpenetram e não são excludentes, pelo contrário são complementares, podendo, portanto existir desigualdade
na diferença e diferença na diferença.

7
INCLUSÃO E EDUCAÇÃO FÍSICA
desiguais; terceiro porque os atributos excepcional, dentre outras – têm conseguido ao longo dos últi-
pessoa com deficiência, pessoa com necessidades mos trinta anos, com pequenos arranjos
educacionais especiais, homossexual, prostituta, ne- metodológicos, trabalhar no mesmo espaço e tem-
gro, índio, menor infrator, dentre outros, têm que po alguns casos isolados envolvendo a diversidade
existir para que os não-portadores de deficiência, humana.
não-homossexuais, não-prostitutas, os não–negros No caso específico da Educação Física apesar des-
e não infratores também, possam existir. Além disso, sa área já estar trabalhando há vários anos com pes-
todos nós conhecemos por quem, a quem se apli- soas com deficiência, na grande maioria dos cursos
cam e a quem não se aplicam estes atributos. de graduação, nas escolas e nos clubes, as diferen-
No nosso modo de entender, em face das publi- tes atividades realizadas têm sido desenvolvidas em
cações, pesquisas e conhecimentos acumulados na espaços e tempos diferentes.
área, utilizar discursos de que todos somos deficien- Acreditamos que isto esteja ocorrendo porque o
tes na tentativa de relativizar os estigmas e precon- conhecimento veiculado por essa área, historicamen-
ceitos, é, no mínimo, uma posição ingênua, insen- te, foi edificado visando atender concepções unas
sata e que precisa ser superada pelos educadores. de saúde, de homem e corpo, deixando de levar em
Retomando a discussão acerca dos impactos da conta que a realidade em que vivemos é diversa e
inclusão podemos afirmar que as tão sonhadas tur- formada concretamente por homens diferentes em
mas ou classes “homogêneas”, nas quais todas as raça, cor, sexo, habilidades, capacidades, limites e
crianças deveriam ser “iguais” em idade, peso, altu- possibilidades.
ra, e habilidades, estão prestes a se transformarem Esta visão a-histórica, simplista e parcial da reali-
em classes da diversidade humana, onde todas são dade, utilizada pelos professores de Educação Física,
diferentes e desiguais. E nos perguntamos: será que tem tido reflexos diretos no trabalho que vem sendo
os professores de Educação Física que tanto sucesso desenvolvido com as pessoas com deficiência.
têm conseguido com os atletas portadores de defici- Esses profissionais têm preferido muito mais fa-
ência, no campo segregado e diferenciado dos jo- zer arranjos, adaptações e improvisações nos conhe-
gos e competições, terão condições de desenvolver cimentos existentes, do que gerar novos conhecimen-
suas atividades escolares em grupos envolvendo de- tos e atividades motoras adequadas e dirigidas aos
ficientes e não-deficientes? Os conhecimentos que alunos com deficiência.
os professores de Educação Física dominam possibi- Os técnicos e os professores fazem as adapta-
litam-lhes, pedagógica, metodológica e tecnicamen- ções quando transferem, como se fosse a única pos-
te, trabalhar a diversidade humana no mesmo espa- sibilidade, os conhecimentos das diferentes modali-
ço e tempo da Escola Regular? As atividades motoras dades esportivas conhecidas e universalmente disse-
e os esportes para os alunos com deficiência têm minadas ( basquete, futebol, voleibol, natação, tênis

“
...o conhecimento veiculado pela Educação Física, historicamente, foi

”
edificado visando atender concepções unas de saúde, de homem e corpo,
deixando de levar em conta que a realidade em que vivemos é diversa...

que ser necessariamente adaptados e ministrados se- dentre outras) para a prática junto aos alunos que
paradamente das demais crianças? apresentam deficiências. Adaptam os fundamentos
Diante de todos estes questionamentos o profes- às regras e à medida que os problemas vão surgindo
sor de Educação Física deve estar se perguntando: o no interior das práticas, novas mudanças vão sendo
que fazer para conciliar a política de inclusão com o realizadas na tentativa de adequar o inadequado.
trabalho em uma classe de quarenta alunos “consi- Essa forma de pensar possui grande similitude
derados normais” juntamente com alunos que apre- com o famoso ideário da equalização social presen-
sentam uma deficiência física, mental, visual ou au- te na escola nova, que acreditava poder corrigir a
ditiva, diferentes e desiguais? marginalidade fruto das desigualdades sociais, pe-
Temos consciência da complexidade desta respos- las vias do ajustamento e da adaptação dos indiví-
ta, por isso, esperamos até o final deste texto apon- duos à sociedade, incutindo-lhes o sentimento de
tarmos algumas pistas para auxiliar os professores a aceitação passiva e alienada.
encontrarem saídas para essa questão. Tal concepção tem profundas implicações
Especificando um pouco mais nossas análises va- sociopolíticas e econômicas, principalmente quan-
mos perceber que no cotidiano de uma escola regu- do a adaptação é situada como sinônimo de
lar brasileira as várias áreas do conhecimento – Edu- equalização, ou como forma de concretizar a eqüi-
cação Física, Matemática, Física, Ciências, História dade de oportunidades.

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Uma das implicações diz respeito aos mecanis- a inclusão escolar, vista em outra perspectiva, venha
mos utilizados pela sociedade, por meio das escolas, a ser o móvel que vai possibilitar profundas modifi-
partidos políticos, igrejas e outras instituições sociais, cações nesse sentido.
que busca, a todo custo, a hegemonia de valores, leis, Afirmamos isto porque, com o advento da inclu-
crenças e conhecimentos. Para que isso ocorra, ou- são, mesmo no plano do discurso, o princípio explí-
tros valores, leis e conhecimentos necessitam ser su- cito e defendido é o da diferença, da desigualdade.
focados. Desse modo, a relação entre o ideário dominante
No caso específico da Educação Física, para que (todos somos iguais) e o ideário emergente (todos
os conhecimentos produzidos e disseminados nos somos diferentes) se torna mutuamente excludente,
esportes possam prevalecer é necessário que a adap- pois concretamente fica difícil conciliar uma concep-
tação tenha que ocorrer. Portanto, advogar a adap- ção abstrata com uma concepção concreta de ho-
tação significa, em última análise, defender a mem.
hegemonia de um corpo de conhecimento sobre E é justamente aí que reside o grande desafio para
outro, mesmo que este outro ainda nem tenha es- a comunidade científica da área, isto é, conciliar os
boçado nascer. princípios da Educação Física adaptada com os prin-
Muitos profissionais da Educação Física acredi- cípios da inclusão escolar, que em tese são contradi-
tam que ao adaptarem os conhecimentos existentes tórios.
aos portadores de deficiência estão realizando um O mais interessante de tudo é que tanto os prin-
grande feito, ou sendo extremamente criativos. No cípios da primeira linha de pensamento quanto os
nosso modo de entender, todo esse sucesso e da segunda, em última análise, defendem os mes-
criatividade, existe, porém, está servindo muito mais mos valores, porém às avessas. À guisa de
para manter o princípio da igualdade universal entre exemplificação poderíamos dizer que os defensores
os homens e as mazelas daí decorrentes, do que para da Educação Física adaptada, ao mesmo tempo que
explicitar o princípio da diferença e da desigualda- realizam práticas segregadoras, defendem e apóiam
de, na tentativa de superação deste quadro social. as políticas inclusivistas.
É muito interessante como esta questão contra- Com isto, as políticas segregadoras e inclusivistas,
ditória se apresenta na realidade objetiva em que vi- mesmo sendo contraditórias, se identificam, fazen-
vemos. Senão vejamos: os professores que trabalham do com que os princípios inclusivistas da Educação
com alunos portadores de deficiência, em sua gran- Física adaptada tornem-se princípios segregadores.
de maioria, se apresentam contra a discriminação, o Isso tem ocorrido porque a grande maioria dos
preconceito e a segregação social. Entretanto, o cor- profissionais da área não tem tido a preocupação,
po de conhecimentos que utilizam, na prática, na nem percebe que a concepção de homem presente
tentativa de vencer esses comportamentos indesejá- em seus discursos e práticas é contraditória.
veis os conduz diretamente à manutenção desses Falam e lutam por um homem e uma sociedade
mesmos comportamentos. Em outras palavras os onde todos sejam iguais, tenham as mesmas condi-
professores precisam, no discurso, ser o que não são, ções, os mesmos direitos e deveres. Porém, traba-
para, na prática, conseguirem ser o que realmente lham com um homem concreto, diferente, discrimi-
são. nado, desigual, e utilizam como instrumental os co-
E nos perguntamos: será que esses profissionais nhecimentos gerados historicamente para atender
não percebem os componentes de poder e interesse as características e valores deste primeiro tipo de
presentes em todos os conhecimentos, e que são homem.
justamente esses interesses e poderes que determi- Diante desta contradição, os profissionais, ao
nam o que tem e o que não tem valor social ? invés de enfrentá-la na busca de sua superação,
Vale aqui relembrar Habermas (1982) quando optam por práticas e discursos adaptativos,
afirma a esse respeito que “....o saber não pode, en- reorganizadores, maquiadores do real, dando
quanto tal, ser isolado de suas conseqüências. Não é uma “nova“ feição, uma “nova” aparência a esta
pela contemplação de algo, na suposta apropriação realidade.
conceitual daquilo que as coisas são num determina- Acontece, porém que a questão principal, homem
do instante, que os homens aprendem, mas pela concreto, desigual e diferente tratado como homem
transformação desta coisa, pelas conseqüências que abstrato e igual, continua presente e sem solução.
seu saber opera no real...” A persistir esta ação, não temos dúvidas de que,
Nesta linha de raciocínio, esperamos ter deixado por mais que tentem, pela via da adaptação pura e
claro o quanto os profissionais envolvidos com a simples, solucionar este problema, a história, por estar
Educação Física adaptada necessitam produzir co- em movimento e ser condicionada, conduzirá o pro-
nhecimentos que tragam conseqüências e contribu- cesso sempre para o eixo central do pensamento
am para modificar o atual contexto social em que dominante e hegemônico que é o da pseudo-igual-
vivem as pessoas com deficiência. Acreditamos que dade universal entre os homens.

9
INCLUSÃO E EDUCAÇÃO FÍSICA
Esta tendência fará com que todas as ações políti- Com isto, os conhecimentos vão sendo transmi-
cas centradas nas adaptações conduzam os parâmetros tidos, os alunos com deficiência vão tendo acesso às
avaliativos dos resultados esperados para bem próxi- atividades esportivas e as pesquisas sendo desenvol-
mo dos valores preconizados pela base igualitária. vidas muito mais com a preocupação em adaptar do
A busca incondicional de resultados e medalhas, que em criar atividades compatíveis com as condi-
fraudes e manipulações nas classificações funcionais, ções e habilidades dessas pessoas.
atletas que apresentam cada vez menos comprome- A continuar essa tendência, podemos afirmar que,
timento físico, mental e ou sensorial, e muitas ou- brevemente, cada vez menos pessoas estarão sendo
tras peculiaridades que cercam o mundo da Educa- envolvidas nas atividades físicas, isto é, restarão ape-
ção Física Adaptada e dos Esportes Paraolímpicos, nas os mais aptos, os melhores, os mais próximos
são exemplos do que estamos falando. do mundo dos iguais.
Nesta linha de pensamento percebemos ainda que Temos claro que o conhecimento se dá no tempo
o direcionamento das pesquisas nessa área têm bus- e não está preso ao tempo. Sua dinamicidade lhe
cado aproximar ao máximo os resultados dos atletas impõe movimento, criação e não apenas repetição
com deficiência com os resultados dos atletas nor- ou adaptações. Se os que fazem adaptações as
mais. Alguém poderia questionar sobre o que há de constróem na tentativa de demonstrar as capacida-
errado nisso. Por que as pessoas com deficiência não des e habilidades dos considerados deficientes em
podem realizar ou praticar os mesmos esportes que comparação com os normais, visando assegurar-lhes
as demais pessoas praticam, ou atingirem seus limi- reconhecimento social, estão redondamente equivo-
tes máximos de rendimento esportivo? cados com este caminho.
Pode parecer, para muitos, que não existe nada de Pois se assim fosse, nossos atletas com deficiên-
errado em pesquisar nesta direção, ou que as pessoas cia que receberam medalhas de ouro paraolímpicas
com deficiência pratiquem os esportes universalmen- seriam ídolos nacionais ou garotos-propaganda de
te disseminados e consigam resultados tão surpreen- inúmeras empresas. Não me recordo de ter visto, ao
dentes quanto os dos atletas não-deficientes. longo dos últimos trinta anos, algum medalhista com
Acontece, porém, que esta questão não é tão sim- deficiência fazendo propaganda de tênis, camiseta
ples assim, pois tanto a escolha do que pesquisar, ou bebidas energéticas, como ocorre com os atletas
como a do que ensinar é uma decisão política normais.
alicerçada em uma concepção de homem, mundo e Não estamos defendendo a segregação de co-
sociedade. nhecimentos a essas pessoas, ou que não devam
Todas as vezes que escolhemos o que ensinar, praticar os esportes adaptados que aí estão. Pelo
escolhemos, também o que deve ser ignorado. O contrário, temos clareza que essa é uma fase impor-
mesmo princípio se aplica à pesquisa, porque acre- tante e transitória do percurso histórico que estamos
ditamos que poucos são os pesquisadores que ain- vivendo. Não podemos é permanecer presos neste
da defendem a neutralidade científica. tempo e com esses conhecimentos.
Portanto, o problema que estamos vivenciando, Como afirmamos anteriormente, o conhecimen-
atualmente, na relação inclusão versus atividade físi- to se dá no tempo e não está preso ao tempo, e, por
ca adaptada reside precisamente na indefinição do ser produto da humanidade não deve ser proprieda-
marco referencial norteador da relação. de nem de classe nem de segmentos sociais isola-
Esta indefinição por mais paradoxal que possa dos. Por isso, deve ser socializado ao máximo à to-
parecer está presente também nos textos que preco- dos os indivíduos, até mesmo para que percebam
nizam a própria proposta inclusiva.8 Em que pese o seus limites e contradições.
fato de o texto não se referir diretamente à igualda- Nossa preocupação fundamental neste texto é
de universal entre os homens, o faz mesmo assim, fazer com que os profissionais envolvidos com a área
de forma indireta, quando defende a promoção da reflitam sobre o descaso que tem sido dado às pes-
eqüidade do acesso à educação sem levar em consi- quisas visando novos conhecimentos (jogos, brinca-
deração as finalidades da escola, os conhecimentos deiras, atividades físicas) compatíveis com as possi-
veiculados, as avaliações realizadas, enfim, sua bilidades e realidades das diferentes formas com que
organicidade. se apresenta a diversidade humana.

8
Os países participantes do Encontro Mundial de Educação Para Todos assinaram uma declaração Mundial em que se comprometeram a
lutar pela universalização do acesso à educação e promover sua eqüidade, a ampliar os meios e a abrangência da ação educativa,
fortalecer as alianças em todos os níveis e setores e fortalecer a solidariedade internacional. (grifo nosso). Em relação à Educação
Especial, diz o texto da Declaração: “As necessidades básicas de aprendizagem das pessoas portadoras de deficiência requerem atenção
especial. É preciso tomar as medidas que garantam a igualdade de acesso à educação aos portadores de todo e qualquer tipo de
deficiência, como parte integrante do sistema educativo”. (grifo nosso).In: Revista Integração, ano5, nº 14, 1994, p.01.

10
Apesar de termos afirmado no início deste texto 3 sob o ponto de vista individual e imediato; e
que a Educação Física conseguiu superar a visão par- 3 sob o ponto de vista coletivo e mediato.
cial e limitada de corpo, temos clareza que ela ainda No plano coletivo, precisamos levar em conside-
não está preparada para tratar o uno e o diverso ração que tanto o sucesso quanto a discriminação
simultaneamente, conforme sugere a política da in- são construções mediatas, históricas e objetivadas, e
clusão. Seus conteúdos estão parados no tempo, o os mesmos mecanismos sociais que edificam um ído-
que lhe obriga a recorrer às adaptações. lo, também, o destroem.
À guisa de exemplificação destacamos o golball e No plano individual, a prática desportiva é tão
o futebol de salão com bola de guizo, duas formas importante para as pessoas com deficiência quanto
que os profissionais e os “deficientes” conseguiram, para quaisquer outras pessoas. As pesquisas desen-
com a melhor das intenções, adaptar para permitir volvidas em nossos cursos de Pós-Graduação têm
aos cegos condições de participação em jogos cole- demonstrado isso há vários anos.
tivos. Acontece, entretanto, que tanto um quanto o Entretanto, atribuir aos esportes adaptados a ca-
outro exigem dos participantes e assistentes com- pacidade de minimizar as discriminações e preconcei-
portamentos completamente incompatíveis com a tos, mostrando ao mundo que os portadores de defi-

“ ”
...a prática desportiva é tão importante para as pessoas
com deficiência quanto para quaisquer outras pessoas.

natureza dos jogos de quadra. Ambos exigem silên- ciência são capazes, é, no nosso modo de entender,
cio da torcida. Vejam bem, silêncio da torcida! uma pretensão ingênua e a-histórica, pois essas ma-
Ora, deveriam, então proibir a torcida de assistir, zelas sociais não são frutos da ignorância humana,
pois torcer silenciosamente é tarefa muito mais ade- nem do desconhecimento das capacidades das pes-
quada para quem está aguardando a saída de um soas com deficiência. Pelo contrário, a sociedade em
doente na porta da UTI de um hospital do que para suas mais distintas épocas sempre negou a essas pes-
quem está numa quadra assistindo uma partida de soas o direito de cidadania. Em alguns países e em
futebol, handebol ou basquete. alguma época lhes foi negado até o direito à vida.9
E nos perguntamos: será que a partir da inteli- Dito isto, esperamos que os professores de Edu-
gência cinestésica, da capacidade de orientação es- cação Física, em face da proposta de inclusão esco-
pacial, percepção e discriminação tátil e auditiva não lar, tomem partido nessa luta social, não se distanci-
poderíamos pesquisar e desenvolver jogos e compe- ando da realidade, nem se deixando petrificar pelas
tições entre os cegos, bem como entre eles e as pes- adaptações motivadas por sentimentos passionais e
soas que não possuem essas limitações sensoriais? pieguistas tão comuns entre as pessoas que traba-
Seguramente, poderíamos. Porém, existem meca- lham com alunos que apresentam necessidades edu-
nismos, já referidos anteriormente, gerados pela pró- cacionais especiais.
pria sociedade, que têm nos impedido de fazê- lo. Por isso, a proposta da inclusão, enquanto tese
Dentre eles, destacaríamos a crença tanto dos atle- que pretende possibilitar, indistintamente, acesso e
tas com deficiência como de seus treinadores de que permanência de todos na escola, é altamente louvá-
o sucesso nos esportes minimiza o processo histórico vel e oportuna, porém enquanto prática real e possí-
de discriminação e leva ao reconhecimento social. vel é totalmente frágil e até enganosa pelas razões já
No nosso entendimento, pensam assim apenas os discutidas anteriormente.
que não conseguem perceber que a grande maioria Não podemos nos esquecer que acima das ques-
das pessoas com deficiência não pratica esporte por- tões superficiais que têm orientado o debate tais
que as relações sociais usurparam destas pessoas es- como, se devemos ou não incluir todos na escola, se
ses direitos, e não porque elas são incapazes. Que elas a escola precisa primeiro preparar os professores ou
são capazes não temos nenhuma dúvida, até porque adaptar-se arquitetonicamente, está a necessidade
se não fossem, não estariam, há vários anos pratican- urgente de garantirmos o acesso e a permanência
do atividades esportivas. Por essas razões, esta ques- de todos os brasileiros aos diferentes níveis de
tão precisa ser analisada sob dois aspectos: escolarização, bem como o domínio do conhecimen-

9
A obra de SILVA, Otto, M. A Epopéia Ignorada, trata com muita propriedade acerca da história dos deficientes nas diferentes épocas da
história.

11
INCLUSÃO E EDUCAÇÃO FÍSICA
to gerado historicamente por toda a humanidade. Quanto à Educação Física acreditamos que seus
Para que isso ocorra não podemos ignorar o lo- pesquisadores precisam avançar no sentido de dar
cal e o tipo de conhecimento que estamos reivindi- respostas à nova relação social que deve ser
cando, pois o tipo de conhecimento e local onde é estabelecida a partir da inclusão escolar.
transmitido, nesta sociedade hodierna, faz muita Temos consciência de que conhecimentos acerca
diferença na vida do indivíduo. de atividades físicas segregadas existem demais, po-
Uma coisa é estudar e ser egresso de uma escola rém, pesquisas que apontem soluções para as ques-
pública ou particular. Outra é estudar em uma esco- tões aqui levantadas, existem poucas.
la especial, cuja carga estigmatizante é altamente Finalmente, como o leitor pode perceber, escre-
excludente nas relações sociais vigentes. vemos este texto com o objetivo muito mais de
Sem nenhuma pretensão de comparar os fatos, conclamar os pesquisadores da área para solucionar
mas apenas utilizando o recurso da exemplificação, o desafio da inclusão, do que para apresentar algo
diríamos que o mesmo ocorre com os ex-presidiári- propositivo. Temos atualmente mais dúvidas do que
os. Eles, pelo fato de terem o estigma de ex-detentos, respostas. Porém, temos feito dessas dúvidas o mo-
mesmo depois de terem cumprido toda pena imposta tor de nossas reflexões e a busca de alternativas
pela justiça, dificilmente têm acesso ao trabalho e superadoras.
ao convívio social pleno.
As relações sociais estabelecidas lhes impuseram
uma pena que mesmo depois de cumprida, conti- BIBLIOGRAFIA
nua presente em suas vidas. É o que Goffman (1982)
denominou de estigma moral. No caso específico dos BOURDIEU & PASSERON . A reprodução: elementos
alunos com deficiência, eles carregam o que este para uma teoria do sistema de ensino. Rio de
autor denominou de estigma físico. Janeiro: Francisco Alves, 1975.
Neste sentido, o entendimento das questões afe-
tas aos estigmas exige que tenhamos clareza de que, BRASIL. Ministério da Educação. Plano Decenal de
independente do indivíduo ser paraplégico, Educação para Todos. Brasília: 2000.
hemiplégico, deficiente mental ou visual, não pode-
mos negar-lhe a possibilidade de ter acesso ao conhe- _______ .Ministério da Educação, SEESP. Política
cimento e às riquezas da humanidade que ele, de al- Nacional de Educação Especial. Brasília, 1994.
guma forma, também, ajudou a produzir, e que por
_______.MEC,SEF,SEESP. Parâmetros Curriculares
questões de poder e dominação não tem tido acesso.
Nacionais : Adaptações Curriculares. Brasília:
Entretanto, não precisamos, para conseguir isto, ne-
1999.
gar seu estado de diferença, de desigualdade, porque
_______.MEC,SEF,SEESP. Parâmetros Curriculares
Nacionais da Educação Especial. Brasília: 2000.

“
...os pesquisadores
CARMO, Apolônio Abadio. Deficiência física: a socie-
precisam avançar no dade cria, recupera e discrimina. 2ª ed. Brasília:
sentido de dar respostas Escopo, 1991.
à nova relação social
que deve ser estabelecida CARVALHO, Rosita Edler. O papel da UNESCO e do
MEC frente a integração. Educação Especial:

”
a partir da política Perspectiva e reflexões. In: Seminário Nacional
de inclusão escolar. de Integração da Pessoa Portadora de Defici-
ência no Contexto Educacional. Florianópolis:
1994. Anais, p 20.
é na diferença e na desigualdade que devem repousar
___________. A Nova LDB e a Educação Especial. Rio
as bases de nossas ações, e, seguramente, a primeira
de Janeiro: WVA, 1997. 2ª Ed.
delas é não querer igualar o desigual.
Precisamos levar em conta que existem diferen- ___________. Integração, inclusão e modalidade da
tes tipos de conhecimentos e distintas capacidades Educação Especial: mitos e fatos. Brasília:
para apreendê-los. Reiteramos que a decisão do que Revista Integração.n.7, p: 19-25, 1997.
ensinar e a quem ensinar é política e exige de quem
a toma, sensatez e compromisso para com esta de- CASTELLANI FILHO, L. Educação física no Brasil: a
cisão, pois todas as vezes que selecionamos conhe- história que não se conta. Campinas: Papirus,
cimento selecionamos, também, ignorância. 1998.

12
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13
INCLUSÃO E EDUCAÇÃO FÍSICA

O PRINCÍPIO DA
INCLUSÃO: UM
ELEMENTO DA
METODOLOGIA
DAS AULAS DE
“ Os aros olímpicos, ao envolverem
os portadores de necessidades EDUCAÇÃO FÍSICA
especiais, representam elos
pela inclusão, por direito, entre
o compromisso socioeducacional
e o bem-estar dos povos
de todas as Nações.

”
A autora.

Elisabeth Ferretti Lemos *

INTRODUÇÃO
A Educação Física referendada, em dezembro de l997, nos Parâmetros Curriculares Nacionais / MEC, como disciplina
curricular na grade de ensino das escolas regulares, vem resgatar a proposta da Educação para Todos, principalmente, no que
se refere aos alunos que apresentam necessidades especiais, permanentes ou não.
Seguindo uma tendência mundial, um dos verdadeiros objetivos da Educação Física, como ciência, manifesta-se pelo trato
humano. No âmbito escolar, apresenta-se, também, como vetor interdisciplinar, permitindo direcionar sua projeção, desde a
escolha do foco de estudo, até o ponto de convergência das demais disciplinas a serem vivificadas pelo ser humano.
Estratificando o contexto ótico decorrido da aplicação deste Projeto Pedagógico de Ensino: O Princípio da Inclusão..., foi
possível revelar os resultados do processo metodológico aplicado, contribuindo para o significativo reconhecimento da
pluralidade atitudinal, da diversidade de conteúdos e, até mesmo, se preciso for, do programa individualizado de ensino para
os alunos com necessidades educacionais especiais.
Todas as atividades programadas para a mesma aula podem gerar novas oportunidades de sucesso, não só na Educação
Física, como também, nas demais disciplinas que congraçam o direito de todos à educação.
Respeitados os diferentes modos de aprender, sobressaiu-se, de forma natural, a solidariedade entre todos os alunos, sob
a primazia do diálogo e da convivência, propiciando o êxito, sempre que possível, dos alunos com necessidades especiais.
O domínio e aplicabilidade do conceito de Inclusão, proposto por Mosston, (1986)1 , sob o enfoque da dinâmica operacional
e organizacional, permitiu à autora identificar a questão que norteou a concretização da pesquisa: Como promover a inclusão
de todos os alunos nas aulas práticas de Educação Física?

* Professora Licenciada em Educação Física pela Universidade Federal de Minas Gerais/UFMG.


Auxiliar de Fisioterapia/FUNED-ESMIG.
Pós-Graduada em Processo Ensino-Aprendizagem: Uma Fundamentação Filosófico-Antropológica e Técnico-Pedagógica. F. C./São Paulo.
Pós- Graduada em Teoria e Prática Pedagógica no Ensino Técnico – CEFET/ MG.
Mestre em Educação pela Universidade São Marcos/S. P. - UNI - B.H. – Centro Universitário de Belo Horizonte/M.G.
E-Mail: ferrettilemos @ hotmail.com
1
Mosston, Muska (1986) – Pesquisador que, com a ajuda do governo americano, criou uma Escola Pública Modelo, no estado de Nova
Jersey, onde vem desenvolvendo estudos sobre as metodologias de ensino, não só da Educação Física, mas de todas as disciplinas escolares.

14
OBJETIVO GERAL: postas, ao observar a preferência pelo Voleibol, o
seu desempenho e efeito ilustrativo, dentro da reali-
Verificar os efeitos da ampliação do tempo real, de dade desses educandos.
uma para duas aulas consecutivas, de Educação Físi- A formação de turmas para as aulas de Educação
ca, no processo de inclusão de todos os alunos, res- Física se fez por duas turmas mistas que foram divi-
peitando-se as diferenças individuais, especialmente didas por sexo na praça de esportes, sendo as tur-
daqueles com menor performance psicomotora. mas femininas o alvo de abrangência deste projeto.
Escolhemos seis turmas do ensino médio e três tur-
mas do ensino fundamental, no turno da manhã.
OBJETIVOS ESPECÍFICOS: Ao considerar a evolução histórica da Educação
Física, observa–se, atualmente, no âmbito escolar, uma
3 Dar oportunidade ao aluno de conhecer suas tendência a desconsiderar as diferenças individuais de
possibilidades e vencer seus limites, por meio cada aluno durante as aulas práticas, sem atividades
da ação docente, durante as aulas práticas; físicas não-desportivas, o que faz com que os alunos
3 facilitar ao aluno com necessidades especiais busquem melhorar sua performance psicomotora em
sua presença à praça de esportes, observadas academias, clínicas estéticas de musculação e
suas limitações, permitindo-lhe a participação, escolinhas de esportes do sistema particular.
sempre que possível, nas aulas de Educação A Educação Física envolve momentos de
Física; e descontração, desinibição, aproximações da convi-
3 promover a confraternização desportiva entre vência humana, um comportamento sui generis que
os alunos da escola regular, abrangendo, in- entende-se concebível inserir nessas reflexões a ci-
clusive, os alunos com necessidades educacio- tação do Prof. Dr. Moura (1995)2 textualizada em
nais especiais. “O impulso lúdico na educação” ao destacar Schiller.
Este autor admite identificar a expressão impulso
As referidas propostas de estudo estiveram em lúdico com o termo jogo, como se faz na lingua-
contínuas análises, desde 1980, quando houve a in- gem corrente, porém imprimindo-lhe uma amplia-
tenção de descrevê-las, incorporando-as à disciplina ção.
Metodologia de Elaboração de Projetos em Educa- Schiller entende o impulso lúdico como jogo en-
ção, a partir de julho de 1995, início do VI PCDET/ tre as capacidades racionais e sensíveis do homem e
CEFET/MG. a ausência de regras ou conceitos como a “liberdade
Em março do ano passado, converteu–se em con- humana”. Para ele, “de todos os estados do homem
teúdo capitular da dissertação de Mestrado em Edu- é o jogo e somente ele que o torna completo(...) (...)o
cação, aprovada pela Universidade de São Marcos/SP. homem joga somente quando é homem no pleno
O campo de ação das propostas aqui descritas sentido da palavra, e somente é homem pleno quan-
foi desenvolvido, e implantado após sua conclusão, do joga.”
em uma das escolas públicas da rede estadual, em A postura didática do professor de Educação Fí-
Belo Horizonte/MG. Visou-se um projeto pedagógi- sica, em sala de aula - entendida como espaço em
co, para área de habilitação, a ser aplicado em sala que esta aula é ministrada, seja pátio, quadra, pisci-
de aula, durante um bimestre letivo, apresentando na ou sala convencional – deverá ser a de buscar
soluções práticas a problemas educacionais específi- enriquecer seu trabalho, por meio de seu currículo
cos. Imediatamente, as pesquisas literárias funda- oculto (Giroux 1986)3 , servindo-se de seu ethos po-
mentaram as metas de atuação sob o título: “Princí- sitivo, (Mortimore, Peter, in: Entrevista, 1995)4 , ao
pio da inclusão – um elemento da metodologia das acompanhar seus alunos durante as tarefas práticas
aulas de Educação Física.” propostas. Muitas vezes, sem que o professor perce-
Para se pensar nos problemas pedagógicos da ba, as atividades de sua performance didático – pe-
Educação Física, foi de primordial importância co- dagógica, ficam retidas na memória de seus alunos,
nhecer as condições reais dessa escola. para o resto da vida.
Houve anuência da direção escolar e adesão da Segundo Gadotti, (1993), um dos grandes desa-
maioria dos alunos ao integrarem-se às metas pro- fios dos educadores brasileiros, nos dias atuais, é a

2
Moura, Dácio Guimarães de. – Prof. Doutor em Educação, Professor de Metodologia de Elaboração de Projetos em Educação do VI PCDET
- CEFET/MG – Impulso Lúdico, 1996, p 4.
3
Giroux 1986,“Currículo oculto” é uma outra faceta do currículo escolar, que, na grande maioria das vezes, fica relegada a um segundo
plano. É o currículo implícito no cotidiano das relações sociais da sala de aula, da escola e da sociedade. Apresenta-se no trato com a
divergência de posicionamentos, nas diferenças de enfoques, na pluralidade, no encontro com o inusitado e nas possibilidades de um
devir*. Dalben, Angela I. L.,1992, p.31-33.
4
Mortimore, Peter - Diretor do Institute of Education, professor da Universidade de Londres.

15
INCLUSÃO E EDUCAÇÃO FÍSICA
busca de uma educação para todos que respeite a dores, está no reduzido tempo de aula disponível
diversidade, as minorias, os direitos humanos, elimi- para que todos os alunos exercitem as atividades
nando estereótipos e substituindo o conceito de propostas.
igualdade das pessoas pelo de eqüidade, ou seja, Bento, J. O. (1987), mostra em seus estudos que
pelo exercício da igualdade de direitos e o respeito “numa aula de cinqüenta minutos o tempo disponí-
às diferenças. vel para cada aluno se movimentar é extremamente
Neste sentido, a autora deste projeto prossegue escasso, não só pelo tempo em si, como também,
a breve investigação sinóptica sobre a aprendizagem, pela limitação da participação efetiva das turmas de
expõe a necessidade de sedimentá-la por variáveis elevado número de alunos para uma quadra de es-
angulares, considerando o nexo da questão do apren- portes que, na escola, comporta, no máximo,
diz frente ao inusitado da representação do apren- quatorze jogadores em ação desportiva.”
dido e conclui enfatizando que, a princípio, para al- Desde 1979, o pronunciamento do Conselho Es-
guns o conhecimento vem de fora para dentro e para tadual de Educação6 , esclarece o seguinte:
outros vem de dentro para fora. “Todavia dependendo da condução das ativida-
A Educação Física, como disciplina curricular, de- des de Educação Física pelo professor e de sua capa-
verá ter como princípio norteador aceitar as diferen- cidade de diversificação das mesmas, as aulas
ças na aprendizagem e abandonar as idéias de geminadas deixarão de ser problema para a escola
homogeneidade e de exclusão dos menos aptos. que disso necessitar valer-se.”
Ao voltar para o aluno o reflexo da luz emitida Entretanto, a publicação número 256/79/CEE, do
pelo movimento do seu self, procura-se a interação mesmo decreto, estabelece, como padrão de refe-
de sua aspiração com sua realidade ao descobrir, pela rência, um total de três sessões semanais para o en-
ação, o que “ele próprio é capaz de fazer.” sino fundamental e médio, (item I, art. 5º).
Tendo em vista os grandes problemas que coman-
dam a cultura e a civilização, focaliza-se, neste pro-
JUSTIFICATIVA jeto, uma trajetória metodológica que se identifica
com o “estilo de inclusão” , criado por Mosston,
Com freqüência, observa-se que a Educação Físi- (1986) cujo termo “estilo de ensino” ele conceitua
ca costuma considerar as preferências da maioria das como “múltiplos níveis de performance na mesma
pessoas familiarizadas com as habilidades esporti- tarefa”.
vas, ao selecionar os melhores atletas representan- Consideramos oportuno ilustrar o conceito de in-
tes do “esporte na escola”, em vez de tentar defen- clusão, apresentado por Mosston, (1986), p.32,
der o “esporte da escola”. (Bracht,1992 )5 Reforça- quando, por meio do salto em altura, enfatiza que:
se, assim, a apatia e o desânimo dos menos expres-
sivos, sempre discriminados e, muitas vezes, levados
a ceder seu lugar na quadra, pela falta de domínio
das habilidades vivenciais desportivas.
Este quadro gera desafios a serem solucionados.
O projeto em estudo propõe-se a acrescentar suges-
tões para amenizá-los, com o objetivo de contribuir Figura 01 Figura 02
para o avanço qualitativo do ensino, fornecendo sub-
sídios para uma reflexão entre os professores de Edu-
cação Física escolar, uma vez que, na literatura dis- a figura 1, demonstra claramente que à medida
ponível, são poucos os estudos voltados à solução que se eleva o sarrafo, ou corda, aumentando-se a
de problemas tais como: altura, afastamos dessa atividade o aluno que apre-
3 falta de motivação (problema pessoal); senta maior dificuldade, desestimulando-o de inves-
3 exclusão (problema social); tir em novas tentativas, fazendo com que ele sinta-
3 má utilização do tempo útil (problema didáti- se excluído;
co - pedagógico). a figura 2, demonstra que se o sarrafo, ou corda,
for inclinado à altura de 0,80 cm de um lado e 0,20
Uma das causas mais freqüentes da exclusão nas cm do outro, irá possibilitar que todos os alunos se-
aulas de Educação Física, apontadas pelos pesquisa- jam incluídos, isto é, que todos participem da ativi-

5
Citado por Marques, Jonh Harley Madureira - Trabalho e Educação: a Lógica da Educação Física no ensino profissionalizante - Curso
Mestrado CEFET - PCDET, Projeto coletivo publicado na Revista Projetos e Trabalhos Práticos no Processo de Educação em Ciência e Tecnologia,
1995:26.
6
Informativo MAI de ensino - set/out - nº 202, Dec. nº 69.450/71, item I, art. 5º - 1992:29-30.

16
dade proposta. Os alunos decidirão a que altura Ao sintetizarmos os estudos de Mosston, (1986),
poderão ultrapassar com sucesso e sentir-se-ão esti- aplicáveis ao que ora se propõe, observamos que um
mulados a tentar o próximo nível. dos problemas da Educação Física é a aprendizagem
Este estilo identifica a importância de gerar op- eficiente, a qual depende de uma proporção ade-
ções puramente positivas nos pontos de entrada, onde quada entre a quantidade de uma atividade e a uni-
todos terão um resultado feliz. O exemplo do arranjo dade de tempo.
da corda inclinada consuma o objetivo explícito de Segundo este autor, “para aprender qualquer ta-
começar a criar condições para a inclusão. refa física e atingir um nível razoável de performance,
“ O papel do estudante é selecionar o nível apro- o aluno precisa repetir a tarefa. Executá-la ainda
priado para ele sem a preocupação de agradar ao mais... O único estilo que permite atingir esta meta é
professor. ” Assim, o aluno faz a opção de onde o estilo da “ inclusão de todos”. Este estilo propõe a
interagir com a tarefa. participação de todos os alunos da escola nas com-
O bom êxito da primeira tentativa, certamente, petições esportivas.”
impulsionará o aluno a: A aplicação dos exercícios desportivos, sob o in-
3 tomar uma decisão futura de acordo com sua centivo da “ludicidade”, mostra que a competição é
capacidade (a marca acima ou abaixo); desejável à medida que os competidores encaram
3 experimentar novas tentativas numa amplitu- seus opositores como companheiros de jogo.”
de de possibilidades; e (Bracht, V. 1988:38).
3 requerer uma área reservada, ou horário ex- Em termos de cultura corporal, torna-se óbvio que
tra, para treinamento da tarefa, quando em a Educação Física precisa conhecer e considerar as
disputa interclasse ou lazer, o que demonstra múltiplas diferenças entre as pessoas: variação de
exercitar o aspecto lúdico da vivência altura, habilidades, atributos físicos, níveis de ener-
desportiva entre colegas. gia, enfim, possibilidades e limites entre as necessi-
dades físicas especiais. A questão é organizar os alu-
De acordo com Mosston (1986), essa proposta nos, os equipamentos, o espaço e o tempo num re-
permite que “o aluno tenha a oportunidade de apren- lacionamento distinto capaz de criar diversas condi-
der e aceitar a distância entre aspiração e realidade, ções à aprendizagem eficaz.
como também, de reduzir o espaço entre ambos.” As opções de organização, citadas por Mosston,
O olhar docente “... verificará o papel desempe- (1986), referentes ao estilo inclusão, são interações
nhado pelo aprendiz frente à sua atuação e não de entre tarefas e estações ( lugares, locais ) da seguin-
acordo com sua performance...” Desta forma, o pro- te forma:
fessor poderá indicar ao aluno o fator que determina Figura 3) ÚNICA ESTAÇÃO -
o grau de dificuldade da tarefa executada. (idem,ib.) ÚNICA TAREFA
O Programa de Atendimento Individual, adotado Figura 4) ÚNICA ESTAÇÃO -
por Kirk (1904) & Gallagher (1987:203) e segundo MÚLTIPLAS TAREFAS
Rafaele Tortora (1995), afirma que o professor, ao Figura 5) MÚLTIPLAS ESTAÇÕES -
apresentar o conteúdo, pode entender que “...alguns TAREFA ÚNICA
alunos, de uma mesma sala, precisam da elaboração Figura 6) MÚLTIPLAS ESTAÇÕES -
de um programa individualizado de ensino para ni- MÚLTIPLAS TAREFAS
velarem suas habilidades. Este programa permitirá que
o professor promova o desenvolvimento do potencial Os quatro arranjos de organização, conforme
desses alunos, enfatizando na descrição da tarefa a explicitado acima, conciliam cada aprendiz com o
sua ação positiva, ao selecionar as atividades que o tempo, os equipamentos e o espaço para praticar o
aluno consegue fazer ... ”. exercício. Enquanto os alunos estão envolvidos com
Para esses autores, é necessário que uma ampla a tarefa, o professor tem o tempo necessário para
variedade de atividades (alternativas) sejam ofereci- mover-se de estação a estação e oferecer o incentivo
das aos alunos para que se efetive a inclusão, no verbal apropriado a cada um.
que se refere à Educação Física escolar. Se conside-
rarmos que esta é uma das propostas deste projeto,
acreditamos que será possível promovermos a inclu-
são de todos os alunos, a partir da criação
diversificada de conteúdos e atividades.
O professor deverá estar atento às mudanças, ou
adaptações, que deverão ser feitas, para atender aos
alunos que apresentam necessidades especiais, evi-
tando, assim, que eles permaneçam isolados de seus Figura 03
colegas e das atividades escolares.

17
INCLUSÃO E EDUCAÇÃO FÍSICA
séries do ensino Fundamental, também do turno da
manhã.
Observado o paradigma da inclusão, de acordo
com Mosston, (1986), qual seja o da “inclusão de
todos”, cada série será dividida em equipes, forma-
das pelas próprias alunas - “considerando-se o nível
de performance de cada equipe” (Mosston,1986) e,
Figura 04 todas participarão entre si durante as aulas conse-
cutivas do segundo bimestre, na modalidade Volei-
bol, de dezoito aulas. Destas, 8 (oito) aulas serão
para coletivos a classificarem uma vencedora. É sem-
pre lembrado aos alunos que a presença à chamada
da aula se efetiva, fazendo-se mister praticá-la.
A seguir, apresentamos sugestões de como
operacionalizar as aulas:
A) - DIVISÃO DA TURMA POR EQUIPES: a título
Figura 05
de exemplo cita-se uma turma com 36 (trinta e seis)
alunas que é composta pela união de duas séries
(SÉRIE “X” e SÉRIE “Y”). Cada série será dividida em
grupos de 6 (seis) para o 2° bimestre - voleibol, con-
forme quadro abaixo.

SÉRIE “X” SÉRIE “Y”


EQUIPE 1 EQUIPE 1
EQUIPE 2 EQUIPE 2
Figura 06 EQUIPE 3 EQUIPE 3
18 alunos 18 alunos
TOTAL: 36 alunos
Esses quadros ilustram uma organização deno-
minada de pluralidade de atividades inclusivas,
favorecidas pela diversidade de conteúdos, conheci- Observações:
da por alguns docentes e que podem ser aplicadas, a) Caso haja maior número de alunas serão
com sucesso, às demais disciplinas curriculares. convocadas como suplentes das três equipes de sua
Mosston, (1986), aponta a organização da aula série ou formarão a equipe quatro.
em múltiplas estações como uma das estratégias de b) Caso haja menor número de alunas, poder-se-
ensino que permite a inclusão de todos. As múltiplas á completá-la repetindo a participação de alguma
estações podem ser organizadas com tarefa única aluna já inserida.
ou com múltiplas tarefas. Entretanto, a metodologia c) As próprias alunas formarão as equipes, e, em
a ser aplicada neste projeto estabelecerá a identifi- rodízio treinarão durante 10 (dez) aulas do bimestre.
cação da atitude organizacional em “Múltiplas esta- A décima aula será escolhida como o dia da inscri-
ções e Múltiplas tarefas (Fig. 06). ção oficial de todos os times da sala.
Portanto, este trabalho fundamentar-se-á na
metodologia da trajetória de atuação a seguir, con- A partir da décima-primeira à décima-oitava aula
siderando a questão: serão realizados os jogos inter-equipes das duas tur-
- Como promover a inclusão de todos os alunos mas, durante sua aula consecutiva, quando será clas-
em uma aula de Educação Física ? sificada uma equipe que participará da “Semana de
Ouro”.
Nesses dias, as equipes que aguardam sua vez, con-
METODOLOGIA tinuam praticando os exercícios desportivos nas áre-
as livres da praça de esportes.
As ações propostas neste projeto têm o objetivo B) - DIVISÃO DAS ATIVIDADES - ADEQUAÇÃO DO
de minimizar as diferenças individuais, o tempo de TEMPO (100 min) PROGRAMA INDIVIDUAL DE ENSI-
aula, a falta de motivação dos alunos e a exclusão. NO (PIE – específico).
Para este estudo, selecionamos cento e cinco alu- Tomando-se como referência uma turma de 36
nas do ensino fundamental e médio, sendo seis tur- (trinta e seis) alunas, teremos:
mas do turno da manhã e três de sétima e oitava 1° - Traslado ao local, troca de roupa; (10 min.)

18
2° - Chamada e explanação dos objetivos do dia; ma. Os alunos deverão ser rigorosamente seleciona-
(10 min.) dos quanto ao domínio pessoal da bola e mobilida-
3° - Tarefas individuais e em conjunto: alonga- de do corpo, devido ao jogo paralelo, durante as
mentos, flexionamentos e jogos recreativos; (10 min.) aulas consecutivas.
4°- Expressão esportiva (voleibol); toque de bola Os grupos formados pelas seis integrantes tro-
por cima, passe (levantamento), manchete, saque, cam de estação a um intervalo de tempo (quinze mi-
cortada, bloqueio, defesa, recuperação de bola jun- nutos), aumentando-se a participação por aluna.
to à rede; (10 min.) Reiteramos que a organização das aulas em Múlti-
5° - Prática esportiva para as duas equipes; (15 plas Estações e Múltiplas Tarefas, citado por Mosston,
min.) 1( *) (1986), conforme foi executada neste projeto, con-
6° - Prática esportiva para as duas equipes; (15 cilia cada uma das alunas com o tempo, os equipa-
min.) 2( *) mentos e o espaço para praticarem as atividades.
7° - (Prática esportiva para as duas equipes; 15 Destaca-se, no entanto, ainda de acordo com o refe-
min.) 3 ( *) rido autor, que “o papel do professor é estar sempre
8º - Breve avaliação geral, incentivo verbal e volta pronto a converter-se em criador, planejador, obser-
à calma; (5 min.), e vador e conselheiro que, de maneira franca, estimula
9º - Banho, troca de roupa e retorno à sala. (10 min.) o aluno a avançar e a tentar superar-se a si mesmo.”
Assim, durante as aulas, o professor terá tempo dis-
Durante as aulas, propõe-se a seguinte organiza- ponível para percorrer as estações e oferecer aos alu-
ção: nos o estímulo necessário.
Paralelamente à operacionalização dos três
tempos de 15 min.(*) , os quatro espaços li-
vres da quadra serão ocupados pelas quatro
equipes restantes. (“Múltiplas Estações”) (·).
Para as quatro estações será organizado
um programa de adequação pessoal dos fun-
damentos básicos do esporte/ voleibol. (“Múl-
tiplas Tarefas”) (·)
A título de exemplo:
1- Postura pessoal no toque de bola e de-
sempenho;
2- Controle de bola, alternando-se man-
chete, toque por cima e deslocar-se para trás;
3- Passe, levantamento e deslocar-se late-
ralmente;
4- Manchete, afundo e amortecer a bola
no ataque em defesa.

O conteúdo proposto para essas tarefas é


flexível. Neste estudo, as variáveis resultaram
do atendimento dado às classes, que apre-
sentaram alunos com necessidades educacio-
nais especiais, respeitadas as habilidades, os
limites e as competências de cada aluno.
Na figura 07, mostramos como as plurali-
dades atitudinais e a diversidade de conteúdos
podem ser aplicáveis à esta proposta.

Observação:
Esse programa educativo das quatro esta-
ções deverá atender às necessidades da tur-

Figura 07

(*)
- Durante os quinze minutos de prática esportiva para doze alunas das equipes 1,2, e 3 de cada turma, haverá rodízio durante as aulas
e treinamento em campo das táticas de conjunto a saber: os sistemas de ataque e de defesa, as trocas de posição, regras de jogo e
arbitragem, apontar súmulas, placar e juiz de linha. Expressão esportiva, na diversidade de conteúdos, esses espaços permitem, também, a
utilização de jogos recreativos adaptados para atenderem a uma abordagem especial, se necessária.

19
INCLUSÃO E EDUCAÇÃO FÍSICA

RESULTADOS

ESCOLA ESTADUAL
TURMA FEMININA - MANHà –
PROJETO: O PRINCÍPIO DA INCLUSÃO

TOTAL DE ALUNAS POR TURMA


111 17
112 15
113 21
211 18
212 19
311 15
TOTAL 105

Questonário das alunas


Conclusão

Resultado
Análise
Percentual
Nome da aluna: Série:

1. No início das aulas de Educação Física você participou de ginástica para todos, no sentido de SIM % NÃO %
aliviar as tensões da sala de aula?
sim não 81 19

2. No aquecimento esportivo você executou os fundamentos do esporte, coletivamente?


sim não 78 22

3. Você participou dos treinos coletivos durante as aulas de Educação Física?


sim não 78 22

4. Enquanto duas equipes treinavam, você esperava sua vez exercitando os fundamentos do espor-
te, nos espaços livres da quadra?
sim não 83 17

5. Você descobriu que pode participar de um jogo coletivo através das aulas de Educação Física?
sim não 88 12

6. No início do torneio coletivo, você participou de alguma equipe de sua sala?


sim não 76 24

7. Ao participar de uma equipe, você sentiu a importância da responsabilidade coletiva, isto é, ser
integrante e estar presente ao compromisso assumido?
não sim 86 14

8. Despertou em você a aspiração de sua equipe ser a melhor?


sim não 63 37

9 Como você avalia a sua participação ao longo da execução do “Projeto da Inclusão” em Educação
Física? Ótimo 28
Ótimo Bom Regular Bom 45
Regular 27

20
6. Você considera que, por meio da participação das
PRINCÍPIO DA INCLUSÃO UM ELEMENTO alunas no Projeto “Princípio da Inclusão” em Educa-
DA METODOLOGIA DAS AULAS DE ção Física, houve contribuição para aumentar-lhes a
EDUCAÇÃO FÍSICA QUESTIONÁRIO auto-estima na comunidade escolar?
DE AVALIAÇÃO DOS PROFESSORES

1. Na sua opinião, através do Projeto “Princípio da


Inclusão” foi possível verificar se a operação das ati-
vidades físicas e esportivas envolveu as múltiplas di-
ferenças individuais dos alunos, especialmente os
de menor performance psicomotora? 7. Através das aulas geminadas de Educação Física,
pela adequação da metodologia do processo ensi-
no-aprendizagem é possível promover no aluno mais
participação durante maior tempo efetivo, resultan-
do-lhe melhor desempenho escolar?

2. Você observou se os alunos deixaram transparecer


satisfação, estímulo e que sentiram –se valorizados
pela presença dos professores durante a realização
dos jogos coletivos do Projeto na “Semana de Ouro”?
8. Pela repercussão alcançada em nosso segmento
escolar, por meio da realização do projeto “Princípio
da Inclusão...” qual a avaliação conclusiva que você
faria das atividades?

3. Você acredita que, pelo fato do corpo discente


estar incluído na ação pedagógica da Educação Físi-
ca, esta possa ter contribuído para evitar a evasão
escolar? ÓTIMO 80 % REGULAR 00 %
BOM 20 % INEXPRESSIVO 00 %

CONCLUSÃO

Os resultados demonstraram que a grande maioria


4. Você concorda que, através da repetição de exer- dos envolvidos revelaram satisfação e conscien-
cícios positivos, as alunas poderão conhecer suas tização ao participarem dos momentos de ginástica
possibilidades, vencer seus limites e descobrir a co- coletiva, no sentido de aliviarem as tensões da sala
ordenação de movimentos necessários para condu- de aula.
zirem-se a um maior número de acertos na As alunas declararam que o aquecimento espor-
prática esportiva? tivo geral fez nascer-lhes mais disposição para exe-
cutarem os fundamentos do esporte nos espaços li-
vres da quadra, reforçando-os na prática, não só en-
quanto duas equipes treinavam, mas também, du-
rante as aulas nos dias dos jogos oficiais. Motivadas,
demonstraram, também, alto grau de responsabili-
dade coletiva por sentirem-se incluídas, valorizadas
5. Foi possível observar nas alunas alguma manifes- e compromissadas com a proposta deste trabalho.
tação de entusiasmo fortalecida pela interação Pela repercussão alcançada no segmento escolar,
participativa nos torneios coletivos? com a realização do projeto “Princípio da Inclusão”, a
diretoria e os professores da escola se manifestaram
por uma avaliação altamente positiva, conforme a aná-
lise percentual do questionário e depoimentos, ane-
xos. Foi exposto que devido as aulas consecutivas e a
concentração de todos os alunos no local da Educação

21
INCLUSÃO E EDUCAÇÃO FÍSICA
Física, o trânsito pelas dependências da casa foi reduzi- curso à prática. Belo Horizonte: Dissertação de
do. Com isto, as outras disciplinas curriculares foram mestrado da FAE/UFMG, Dez. 1993, p.88.
contempladas com a maior absorção e assimilação dos
conteúdos pelos alunos. Ficou demonstrado que, para DALBEN, Angela I. L.. Currículo escolar. Belo Hori-
se atender a turmas com mais de quatorze alunos, fre- zonte: Educação em Revista, nº 15, pp. 30-
qüentes na prática dos esportes escolares, foi preciso 33. Jun, 1992.
ampliar o tempo real da aula para que a metodologia
aplicada pudesse ser satisfatória aos participantes. DREW, Valter F. Como motivar os alunos de hoje. São
Pela análise final dos questionários obtidos, veri- Paulo: Saraiva, 1977.
ficou-se que o projeto alcançou as metas desejadas
pela pesquisadora. FARIA, Eliene Lopes. O esporte na aula de educação
Deduz-se que o efeito da ampliação do tempo física: um fator de inclusão ou exclusão? Belo
real e a organização do espaço, de acordo com a Horizonte: EEF-UFMG, pesquisa de graduação,
metodologia de ensino adotada, possibilitaram a 1996, p 8, 01-22.
inclusão de todos os alunos da escola regular, em
consonância com os dispositivos legais. GADOTTI, Moacir. História das idéias pedagógicas.
É utópico pretendermos que uma aula, com trinta São Paulo: Ática Editora, 1993.
- quarenta minutos de tempo real em Educação Física
escolar, reverta em significat ivos benefícios físicos para GIROUX, Henry. Teoria crítica e resistência em edu-
o exercício do número de alunos de menor cação. Petrópolis: Vozes, 1986.
performance, uma vez que as diferenças individuais
demandam atenção, espaço e maior tempo efetivo. KIRK, Samuel A. & GALLAGHER, James J.. Educação
Acreditamos que a Educação Física escolar, além da criança excepcional. São Paulo: Martins
de despertar sua prática para toda a vida, deve apre- Fontes, 1987:203.
sentar-se no ensino fundamental e médio por exce-
lência, também, como disciplina pedagógica MORTIMORE, Peter. Democracia e eficácia no ensi-
direcionada à condição física e à cultura do corpo. no, Entrevista publicada na Revista Presença
Almejando a ampliação de ofertas no mercado Pedagógica, Belo Horizonte: set/out - 1995.
de trabalho, é preciso reverter muita atenção à cria-
ção de mais Universidades de Educação Física, no MOSSTON, Muska & Ashworth, Sara. Teaching
estado de Minas Gerais, atualmente em número de physical education, Merril Publishing Company,
quatorze, em busca da conscientização profissional thirdy edition, Columbus, Ohio, 1986. Tradu-
e formação especializada em questões biopsicofísicas. ção Dírcema Franceschetto Krug, M.E.F. -
Em decorrência da evolução do homem através Aprocur - Faculdade de Educação Física de
dos tempos, evidenciou-se o ser social em rede – fruto Cruz Alta. RS, 1988. (Mimeogr.)
do desenvolvimento da informática - considerando,
entre outros aspectos, a prevenção da saúde, a aten- __________. La enseñanza de la educação física del
ção aos cuidados e recomendações médicas e a ob- comando al descobrimiento. Buenos Aires:
servância aos exageros, que têm vitimado grande Paidos, l978, p 9-21.
parte da sociedade, principalmente pela incidência
das lesões por esforço repetitivo, (L.E.R.). MOURA, Dácio Guimarães de - O impulso lúdico na
A autora defende a idéia de que a expressão da vida educação, in: A dimensão lúdica no ensino de
humana é um dos elementos da cultura do corpo que ciências: atividades práticas como elemento
não poderá ser substituída pelo avanço da tecnologia. de realização lúdica. Tese de doutorado, Fac.
Educação da USP/ Paulo: SP, 1993.

BIBLIOGRAFIA OLIVEIRA, Vítor Marinho de. Educação física humanista.


Rio de Janeiro: Ao Livro Técnico, 1984.
BENTO, J. Oliveira. Planejamento e avaliação em
educação física. Lisboa: Ed. Disul, 1987. PARRA, Nélio. Ensino individualizado: programas e
matérias. São Paulo: Saraiva, 1978.
BORSARI, José Roberto e outros. Manual de educa-
ção física. SP: EPU, 1975. SASSAKI, Romeu Kazumi. Inclusão - Construindo uma
sociedade para todos. Rio de Janeiro: WVA, 1997.
BRACHT, Valter. A educação física e aprendizagem In: BERRIGAN, Carol. Americans Study How Italy
social. Porto Alegre: Magister,1992. Supports Inclusion in schools – International
Rehabilitation Review. p.28, 1995. In: TORTORA,
________ . A educação física como campo de vivência Rafaele. Diretor de estudos e desenvolvimento de
social. São Paulo: Revista Brasileira de Ciênci- inovações em educação. Itália.
as do Esporte. 9(3), p 38, 23-39. Maio, 1988.
SOUSA, Eustáquia Salvadora. Os estilos de ensino
CARVALHO, Mauro Giffoni. Os maus e os bons. da educação física. Belo Horizonte: FAE -
Interação verbal e rendimento escolar: do dis- UFMG, 1995, (Mimeog.).

22
A INCLUSÃO E A
LEI ORGÂNICA DA
ASSISTÊNCIA SOCIAL

Edison Duarte 1, Tereza P. Santos 2

RESUMO nica de Assistência Social (LOAS) e a implicação da


mesma nas questões relativas à inclusão das pessoas
Este estudo aborda a Lei Orgânica de Assistência com deficiência, particularmente a inclusão escolar.
Social (Lei número 8.742, de 1992) e as novas con-
cepções de proteção social às pessoas com deficiên-
cia, analisando a importância do suporte da Assis- A LEI ORGÂNICA DE ASSISTÊNCIA SOCIAL
tência Social no processo de inclusão do segmento
populacional considerado. Concebida sob a óptica redistributiva, a política
de assistência social, proposta na Lei número 8.742,
constitui-se um mecanismo para elevar o patamar
INTRODUÇÃO de vida dos segmentos menos favorecidos da popu-
lação e consolidar conquistas sociais mais amplas
A questão da inclusão da pessoa com deficiência (MPAS, 1998).
passa, obrigatoriamente, por ações de vários setores Aprovada em 1993 a LOAS inaugura uma nova
públicos envolvidos na proteção social desta pessoa. era para a assistência social brasileira, consignando-
Entre outras políticas públicas, há que se destacar a se enquanto política pública. A assistência deixa de
da Assistência Social, que historicamente financia ser benesse ou favor dos poderes públicos para con-
ações nas áreas de Educação, Saúde e Trabalho. verter-se em direito do cidadão e dever do Estado.
Considerando a Lei Orgânica de Assistência So- Esta lei pauta-se pelo princípio de universalidade
cial (Lei número 8.742 de 1993) e o reordenamento do direito e garantia de mínimos sociais. Suas dire-
proposto pela mesma, várias esferas de governo (fe- trizes propõem:
deral, estadual e municipal) e a sociedade civil atu- 3 a descentralização político-administrativa dos
arão de forma conjunta. Esses setores determinarão órgãos executores;
como as redes de serviços irão atuar, no sentido de 3 a garantia de participação e representação po-
garantir mínimos de qualidade de vida para a pes- pular;
soa com deficiência. No Brasil, este segmento da 3 comando único em cada esfera de governo; e
população tem conquistado seus direitos, por meio 3 a parceria entre Estado e sociedade civil.
das associações e movimentos da sociedade civil, o
que tem contribuído para a sua progressiva inser- Em seu Capítulo I, artigo 2o, ítem IV, a LOAS asse-
ção social. gura: “a habilitação e reabilitação das pessoas porta-
Para que a pessoa com deficiência possa partici- doras de deficiência e a promoção de sua integração
par efetivamente na sociedade, faz-se necessário que à vida comunitária”. Neste ítem, já observamos uma
a Assistência Social, além de garantir a proteção so- diretriz para a inclusão, expressa nos termos:
cial desta pessoa, faça a interface com as demais “integração à vida comunitária”.
políticas públicas, a fim de facilitar sua inclusão na A LOAS propõe ainda a criação do Plano Munici-
sociedade. pal de Assistência Social, que deverá conter as ações
No presente trabalho, consideramos a Lei Orgâ- do município, durante o ano, na área de Assistência

1
Professor-adjunto do Departamento de Estudos de Atividade Física Adaptada da Faculdade de Educação
Física/UNICAMP/SP. Presidente do Conselho Estadual de Assistência Social do Estado de São Paulo/1995-1996.
2
Professora de Educação Física.

23
INCLUSÃO E ASSISTÊNCIA SOCIAL
Social. Esse plano será aprovado e acompanhado em cia Social é, sem dúvida, a descentralização e a atu-
sua execução por um Conselho Municipal de ação dos Conselhos. Assim, os recursos serão repas-
Assistência Social (com representantes do poder sados para as Instituições somente após análise e
público e da sociedade civil). Para a execução do aprovação dos Conselhos.
Plano os recursos serão provenientes de um Fundo As Instituições, por sua vez, deverão apresentar
Municipal de Assistência Social, gerenciado pelo po- um plano de aplicação e uma avaliação do trabalho
der executivo e fiscalizado pelo Conselho. No Conse- desenvolvido. Neste contexto encontram-se as Insti-
lho está prevista a representação dos Portadores de tuições de atenção à pessoas com deficiência, que ain-
Deficiência. da atuam fortemente na área educacional, mesmo
A principal tônica na nova estrutura da Assistên- com a implementação do movimento pela inclusão.

AÇÕES DE ATENDIMENTO INTEGRAL


À PESSOA COM DEFICIÊNCIA
POR ÁREA DE COMPETÊNCIA

AÇÕES DE ATENÇÃO COMPETÊNCIA DAS INTERFACE E


À PESSOA COM POLÍTICAS SETORIAIS COMPLEMENTARIDADE
DEFICIÊNCIA DAS AÇÕES

Prevenção Saúde/Educação Assistência Social


Estimulação precoce Educação/Saúde Assistência Social
Habilitação Educação/Saúde/
Trabalho Assistência Social
Reabilitação Saúde/Educação/
Trabalho Assistência Social
Formação Profissional Educação/Trabalho Assistência Social
Acesso ao mercado de
trabalho e a programas de Trabalho/Assistência Social Assistência Social
geração de renda
Residências-Lares Assistência Social/Saúde Educação/Trabalho
Abrigos de proteção Assistência Social/Saúde Educação/Trabalho
Atendimento à pessoa com Assistência Social/Saúde Educação/Saúde/
deficiência no próprio domicílio Saúde/Educação Assistência Social
Serviços de informação e
Assistência Social Educação/Saúde/Trabalho
aconselhamento
(segundo Carvalho – 1998 (pag. 17)

Um estudo do Instituto de Estudos Especiais da cia”, propõe diferentes ações, competências e


PUC – São Paulo, em conjunto com a Secretaria de interfaces para o atendimento integral deste
Assistência Social do Ministério da Previdência e As- segmento, conforme explicitado no quadro acima.
sistência Social, intitulado “Uma nova concepção de Ao analisarmos a Lei Orgânica de Assistência So-
proteção social às pessoas portadoras de deficiên- cial e o quadro exposto acima, observamos que cabe

24
ao conjunto de políticas públicas, incluindo a Assis- serviço “multiply advocacy”, que é feito, no Brasil,
tência Social, esclarecer as redes de serviços que de- pela Assistência Social.
vem garantir as múltiplas atenções exigidas pelas pes-
soas com deficiência. Percebemos, também, que os
demais segmentos do governo devem atuar de for- CONCLUSÃO
ma conjunta, como as Secretarias de Saúde, Traba-
lho e Educação. Em um país como o nosso, com um grande nú-
mero de pessoas com deficiência carentes, faz-se
necessário uma política que garanta mínimos sociais
A INCLUSÃO E O PAPEL DA “NOVA” de qualidade de vida, e que articule as várias formas
ASSISTÊNCIA SOCIAL de atenção a este segmento.
Certamente a Lei Orgânica de Assistência Social
A Assistência Social, enquanto política no âmbi- que está sendo implementada em todo o País, terá
to de seguridade social, deve ofertar proteção inte- papel fundamental para viabilizar a inclusão social
gral a todas as pessoas. A melhor proteção é aquela do segmento populacional em questão.
que assegura aos cidadãos sua inclusão nas oportu- Ao considerarmos o processo de inclusão na rede
nidades de integração social, oferecidas pelas políti- regular de ensino, nos parece ingênuo pensar que
cas públicas, pelo mercado de trabalho e pelas diver- só as diretrizes da nova Lei de Diretrizes e Bases da
sas expressões do convívio familiar, comunitário e Educação, número 9394/96, e a sua implementação
societário (Carvalho, 1998). pelas Secretarias estaduais e municipais de Educa-
Ao considerarmos o conceito de inclusão social ção, darão conta da inclusão plena de todos os alu-
como “o processo pelo qual pessoas com qualquer nos. Se não houver articulação das várias políticas
tipo de necessidade especial se preparam para assu- públicas nas áreas consideradas acima, do nosso
mir papéis na sociedade e, simultaneamente, a socie- ponto de vista, não ocorrerá a inclusão efetiva do
dade se adapta para atender as necessidades de to- portador de deficiência na sociedade.
das as pessoas” (Block, 1992), há que se ter claro A Educação é, sem dúvida, o grande propulsor
que ações isoladas não conseguirão atingir os obje- desse processo, mas não deve atuar isolada. Há que
tivos a que se propõe a inclusão. se destacar ainda o papel fundamental dos Conse-
Com a LOAS surge uma nova concepção de pro- lhos de Assistência Social, nas três esferas de gover-
teção social e inclusão para as pessoas com deficiên- no, que se constituem importantes fóruns de discus-
cia, visto que ações que tinham caráter eminente- sões e acompanhamento das ações de governo. Este
mente assistencialistas, com o poder público, pas- espaço conta com representantes dos portadores de
sam a ser discutidas em Conselhos Municipais e deficiência que têm importante papel nesse proces-
viabilizadas por meio dos Planos Municipais. so.
Neste sentido, a Assistência Social passa a ser a
área de interface e de articulação com as demais
áreas. BIBLIOGRAFIA
Enfatizamos a Assistência, visto que um grande
contingente de pessoas com deficiência é pobre e BRASIL, Secretaria da Criança, Família e Bem Estar
tem na Assistência Social seu único apoio. Social. Lei Orgânica de Assistência Social. Go-
Desta forma, a infra-estrutura necessária ao pro- verno do Estado de São Paulo, São Paulo:
cesso de educação, material escolar, transporte, equi- 1996.
pamentos, entre outros, na rede pública de ensino,
assim como as demandas de atendimento em abri- BLOCK, M.E. Why all student with disabilities should
gos de proteção e no próprio domicílio, devem ser be included in regular physical education.
providas pela Assistência Social e o ensino pela Edu- Adapted Physical Activity Quarterly 9, 197-
cação. 213, 1992.
Sem os apoios financeiros e psicossociais, que são
viabilizados pela Assistência Social, a educação pode CARVALHO, M.C.B. et al. Uma nova concepção de
se tornar de impossível acesso, embora a rede públi- proteção social às pessoas portadoras de de-
ca possa até estar preparada para a inclusão. ficiência. MPAS/SAS/IE e PUC/SP, Série Progra-
Destacamos, ainda, as ações de apoio, informa- mas e Serviços de Assistência Social, Brasília:
ção, orientação e encaminhamento, que compõe um 1998.

25
EDUCAÇÃO FÍSICA E PRÁTICA PEDAGÓGICA

EDUCAÇÃO
FÍSICA E
INCLUSÃO:
CONSIDERAÇÕES
PARA A PRÁTICA
PEDAGÓGICA NA
ESCOLA

Ruth Eugênia Cidade e Patrícia Silvestre Freitas 1

A inclusão, como processo social amplo, vem acadêmica, em escolas ditas comuns e nas classes
acontecendo, e se efetivando, em diversos países, ditas regulares onde deve ser desenvolvido um tra-
desde a década de 70. balho pedagógico que sirva a todos os alunos,
A inclusão é a modificação da sociedade como indiscriminadamente” (Carvalho, 1998, p.170).
pré-requisito para que a pessoa com necessidades A escola como espaço inclusivo têm sido alvo de
especiais possa buscar seu desenvolvimento e exer- inúmeras reflexões e debates. A idéia da escola como
cer a cidadania (Sassaki, 1997). Segundo o autor, a espaço inclusivo nos remete às dimensões físicas e
inclusão é um processo que exige transformações, atitudinais que permeiam a área escolar, onde diver-
pequenas e grandes, nos ambientes físicos e na men- sos elementos como a arquitetura, engenharia, o
talidade de todas as pessoas, inclusive da própria transporte, o acesso, experiências, conhecimentos,
pessoa com necessidades especiais, com o objetivo sentimentos, comportamentos e valores, dentre ou-
de se alcançar uma sociedade que não só aceite e tros, coexistem, formando este locus extremamente
valorize as diferenças individuais, mas que aprenda complexo. A discussão de uma escola para todos tem
a conviver com a diversidade humana, por meio da suscitado inúmeros debates sobre programas e polí-
compreensão e da cooperação (Cidade e Freitas, ticas de inclusão escolar de alunos com necessida-
1997). des educacionais especiais. A grande polêmica está
Na escola, inclusão “pressupõe, conceitualmente, centrada na questão de como promover a inclusão
que todos, sem exceção, devem participar da vida na escola de forma responsável e competente.

1
Ruth Eugênia Cidade é professora da Universidade Federal do Paraná . Doutoranda na UNICAMP/SP.
Patrícia Silvestre Freitas é professora da Universidade Federal de Uberlândia/MG. Doutoranda na UNIMEP/SP.

26
No que concerne à área da Educação Física, a des também prevê o esporte como um auxílio no
Educação Física Adaptada surgiu oficialmente nos aprimoramento da personalidade de pessoas com
cursos de graduação, por meio da Resolução núme- deficiência (Bueno e Resa, 1995).
ro 03/87, do Conselho Federal de Educação, que pre-
vê a atuação do professor de Educação Física com o
portador de deficiência e outras necessidades espe- IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA
ciais. A nosso ver, esta é uma das razões pelas quais PEDAGÓGICA NA ESCOLA
muitos professores de Educação Física, hoje atuan-
tes nas escolas, não receberam em sua formação É importante que o professor tenha os conheci-
conteúdos e/ou assuntos pertinentes à Educação Fí- mentos básicos relativos ao seu aluno como: tipo de
sica Adaptada ou à inclusão. deficiência, idade em que apareceu a deficiência, se
Sabemos que nem todas as escolas estão em con- foi repentina ou gradativa, se é transitória ou perma-
dições de receber os alunos com deficiência e, um nente, as funções e estruturas que estão prejudica-
dos motivos, é justamente porque os professores não das. É necessário, também, que esse educador conheça
se sentem preparados para atender adequadamente os diferentes aspectos do desenvolvimento humano:
as necessidades daqueles alunos, e os escolares que 3 o aspecto biológico ( características físicas,
não têm deficiência não receberam informações acer- sensoriais, neurológicas);
ca de seus colegas com deficiência. 3 o aspecto cognitivo;
A Educação Física Adaptada “é uma área da Edu- 3 o aspecto motor;
cação Física que tem como objeto de estudo a 3 a interação social e afetivo-emocional (Cida-
motricidade humana para as pessoas com necessida- de e Freitas, 1997).
des educacionais especiais, adequando metodologias
de ensino para o atendimento às características de
cada aluno com deficiência, respeitando suas dife- CONHECER PARA PREVENIR...
renças individuais” (Duarte e Werner, 1995: 9).
Segundo Bueno e Resa (1995), a Educação Física No caso da deficiência física/motora, quando o alu-
Adaptada para alunos com deficiência não se diferen- no for portador de disreflexia ou hiper-reflexia
cia da Educação Física em seus conteúdos, mas com- autonômica, uma lesão medular alta (T4 -6 ou acima).
preende técnicas, métodos e formas de organização Um episódio de disreflexia autonômica pode aconte-
que podem ser aplicados ao aluno com deficiência. É cer súbita e dramaticamente. Uma dor de cabeça em
um processo de atuação docente com planejamento, marteladas, sudorese, manchas cutâneas acompanham
visando atender às necessidades de seus educandos. hipertensão e queda na freqüência cardíaca. A hipertensão
A Educação Física na escola se constitui uma gran- pode ser maligna, se não tratada, pode resultar em per-
de área de adaptação ao permitir a participação de da da consciência total, crises convulsivas, distúrbios
crianças e jovens em atividades físicas, adequadas às visuais, apnéia e acidentes vasculares cerebrais por he-
suas possibilidades, proporcionando-lhes que sejam morragia. Pode ocorrer óbito (Okamoto, 1990).
valorizados e se integrem num mesmo mundo. O Pro- As causas mais comuns da disreflexia são: proble-
grama de Educação Física, quando adaptado ao alu- mas urinários, especialmente bexiga cheia demais, in-
no com deficiência, possibilita-lhe a compreensão de feccionada ou com pedras; dilatação do intestino cau-
suas limitações e capacidades, auxiliando-o na busca sada por prisão de ventre; escaras ou áreas sob pres-
de uma melhor performance (Cidade e Freitas, 1997). são exagerada, e até mesmo a irritação causada por
Segundo Pedrinelli (1994: 69), “todo programa de deitar-se sobre um objeto pequeno sem perceber; quei-
Educação Física deve conter desafios direcionados a to- maduras e espamos uterinos, principalmente antes e
dos os alunos, permitir a participação de todos, respei- nos primeiros dias da menstruação ou durante o par-
tar suas limitações, promover a autonomia e enfatizar o to (Werner, 1994). A disreflexia é uma emergência
potencial de cada um no domínio motor”. Para esta médica. Como medida preventiva, em suas aulas, o pro-
autora, o educador deverá selecionar a atividade em fessor que tiver um aluno com lesão medular, usuário de
função do comprometimento motor, da idade crono- cadeira de rodas, deve pedir que o aluno faça o esva-
lógica e do desenvolvimento intelectual do aluno. ziamento da bexiga e intestino antes da aula de Edu-
Na escola, os educandos com necessidades espe- cação Física. Observar os locais de maior contato com
ciais devem participar da maioria das atividades de a cadeira de rodas (glúteos e as costas) para ver se
Educação Física, propostas pelo professor, com al- não há a formação de escaras. E ainda observar que
gumas adaptações e cuidados. A realização de ativi- as aulas de Educação Física não sejam na hora mais
dades físicas com crianças, principalmente aquelas quente do dia, para que não haja complicações, do
que envolvem jogos, devem ter um caráter lúdico e tipo febre e insolação, para o aluno.
favorecer situações onde a criança aprende a lidar No caso da deficiência mental, os professores de
com seus fracassos e êxitos. A variedade de ativida- Educação Física precisam saber que os portadores de

27
EDUCAÇÃO FÍSICA E PRÁTICA PEDAGÓGICA
síndrome de Down apresentam
problemas associados, dos quais
destacamos: cardiopatia - 50%;
problemas respiratórios - 40%;
hipotonia generalizada - quase
100%; variação térmica - 100%;
obesidade - acima de 50%; pro-
blemas de linguagem - quase
100%; retardo mental - 100%; ins-
tabilidade atlantoaxial - 12 a 20%;
problemas de visão - 60%; proble-
mas de audição - 50%; má forma-
ção da tireóide - 4%; problemas
odontológicos - quase 100%; hér-
nia umbilical - quase 50%; distúr-
bios digestivos - 12%; leucemia -
10%; hepatite (A ou B) - 70%.
(Tezza, 1995).
A instabilidade atlantoaxial,
destacada aqui, é descrita como
instabilidade, subluxação ou des-
locamento da primeira e segun-
da vértebras cervicais (C1 e C2),
onde se situa a articulação
atlantoaxial. A instabilidade atlantoaxial é um fator No caso da epilepsia é preciso que o professor
predisponente a complicações neurológicas. Aos alu- saiba que esta é uma situação que se caracteriza pela
nos com síndrome de Down recomenda-se a investi- existência de crises anômalas, que tendem a repetir-
gação com Raio X lateral da coluna cervical em posi- se e que partem de descargas cerebrais patológicas,
ção neutra, flexão e extensão dentro da máxima não estando, necessariamente, associada à deficiên-
amplitude de movimento possível, antes de entrar cia mental ou outra deficiência (CORDE, 1992).
na prática da atividade motora. Algumas das ativi- Os sintomas mais comuns são as convulsões e as
dades de risco para esta parcela de portadores da ausências. Nas convulsões existem vários tipos, sen-
síndrome de Down são: ginástica olímpica, salto em do que, uma delas, apresenta-se como uma crise
altura, nado golfinho, mergulho, alguns exercícios convulsiva mais severa, com movimentos violentos e
de aquecimento que causem o stress da região descontrolados e perda da consciência. Neste caso,
cervical e esportes de contato direto. Observem que o professor não deverá tentar mover a pessoa, a não
estas recomendações só são válidas para os acome- ser que ela esteja em um lugar perigoso. O professor
tidos de instabilidade atlantoaxial. deverá estar atento para que não haja ferimentos,
No caso de deficiência visual, o professor deverá porém deverá evitar controlar os movimentos do alu-
assegurar-se de que o aluno esteja familiarizado com no. Retirar de perto qualquer objeto cortante ou duro.
o espaço físico, percursos, inclinações do terreno e Não colocar nada na boca da pessoa enquanto ela
diferenças de piso. Estas informações são úteis pois estiver tendo uma convulsão, e nem qualquer obje-
previnem acidentes, lesões e quedas. É importante que to para impedi-la de morder a língua. No intervalo
toda a instrução seja verbalizada, dando possibilida- entre os espasmos, virar gentilmente a cabeça do
de para o que o aluno com deficiência visual entenda aluno para um lado, para que a saliva caia da boca e
a atividade proposta. No banheiro ou vestiário mos- não seja levada para os pulmões quando ele respira.
tre-lhe onde está o vaso sanitário, o papel, a pia, etc. Quando a crise acabar, a pessoa poderá ficar sono-
Recomendamos cuidados especiais com os alu- lenta e confusa. Sugerimos que o professor deixe-a
nos com baixa visão ou com patologia de desloca- dormir. (Werner, 1994). Nos casos de ausência há
mento de retina. Esses alunos não deverão fazer ati- uma parada das atividades. O olhar do aluno fica
vidade física onde haja a possibilidade de ocorrer vago e ele não responde quando lhe falamos.
traumatismo na cabeça. Poderá pestanejar e, poucos minutos depois,
No caso da deficiência auditiva, o professor deve- retomar a atividade sem se dar conta do que aconte-
rá observar se a prótese está bem adaptada, para ceu.
evitar ruídos, se está suja ou entupida e, verificar tam- Conhecendo o aluno com necessidades educacio-
bém, as condições das pilhas e se o aparelho auditi- nais especiais, o professor poderá adequar a
vo do aluno está bem regulado. metodologia a ser adotada, levando em consideração:

28
3 em que grupo de educandos haverá maior fa- Nesta abordagem o homem é visto como um
cilidade para a aprendizagem e o desenvolvi- processador de informações, um sistema que rece-
mento de todos; be, processa, transmite, armazena e utiliza informa-
3 por quanto tempo o aluno pode permanecer ções. Neste caso, o professor de Educação Física po-
atento às tarefas solicitadas, para que se pos- derá ser capaz de analisar em que parte do modelo
sa adequar as atividades às possibilidades do proposto o aluno pode estar prejudicado, segundo
mesmo; o tipo de deficiência presente, e, assim, utilizar es-
3 os interesses e necessidades do aluno em re- tratégias necessárias para adequar o movimento ou
lação às atividades propostas; a tarefa motora.
3 a avaliação constante do programa de ativi- Para uma melhor compreensão do assunto, adap-
dades, permitindo, assim, efetivar as adequa- tamos de Bueno e Resa (1995), o modelo de execu-
ções necessárias, e ção motriz que ilustra a relação entre os possíveis
3 as possibilidades e capacidades dos alunos, problemas decorrentes do tipo de deficiência e a pro-
em conformidade com os conteúdos dução do movimento:
curriculares e os objetivos da Educação Física. 3 captação da informação/entrada da informa-
ção/Input,
Segundo Bueno e Resa (1995), tais adequações en- Problemas: visual, auditivo, cinestésico ou
volvem: cognitivo.
3 adaptação de material e sua organização na Ex.: se o problema é visual, o professor, como
aula: tempo, espaço e recursos materiais dis- uma das alternativas, poderá verbalizar, expli-
poníveis; car o movimento/tarefa;
3 adaptação no programa: planejamento das 3 processamento central ou tomada de decisão/
atividades e avaliação; Mecanismo de decisão,
3 aplicação de uma metodologia adequada à Problemas: cognitivo ou alterações neuroló-
compreensão dos educandos, usando estra- gicas. Ex.: se o aluno é portador de deficiên-
tégias e recursos que despertem nos alunos o cia mental, ele levará mais tempo que os ou-
interesse e a motivação, por meio de exem- tros alunos para processar a informação e to-
plos concretos, incentivando-lhes a expressão mar a decisão;
e criatividade; e 3 resposta ou mecanismo efetor/output,
3 adaptações de objetivos e conteúdos: adequar Problemas : falta/dificuldade de coordenação
os objetivos e conteúdos quando forem ne- motora (paralisia cerebral), problemas orgâ-
cessários, em função das necessidades edu- nicos, cognitivos, ortopédicos e falta de apti-
cacionais especiais, dando prioridade a con- dão física. Ex.: no caso da paralisia cerebral,
teúdos e objetivos próprios, definindo conteú- no momento da resposta motora, à tarefa/
dos mínimos e introduzindo novos, quando movimento solicitado, o aluno terá dificulda-
for preciso. des no controle dos movimentos; e
3 feedback – retroalimentação,
As considerações acima levam em conta a remo- Problemas – visual, auditivo, neurológicos (ex.:
ção das barreiras para a aprendizagem (Carvalho, incoordenação motora na paralisia cerebral)
1998), colocando o educando como o centro das e cognitivos.
preocupações e interesses do professor.
Ao analisarmos a aprendizagem motora de alunos Além disso, convém que o professor de Educa-
com deficiência não podemos desconsiderar a atua- ção Física considere alguns aspectos fundamentais,
ção de suas habilidades cognitivas, sua capacidade de para uma melhor adequação das tarefas às necessi-
atenção, memória, resolução de problemas e generali- dades educacionais especiais que o aluno apresen-
zação da aprendizagem, durante todo o processo. As tar, como forma de minimizar as barreiras para a
dificuldades para a aprendizagem de um determinado aprendizagem. Dentre eles destacamos:
movimento ou tarefa estão relacionadas à deficiência e 3 aprendizagem global versus aprendizagem por
ao nível de comprometimento que o aluno apresenta. partes – a aprendizagem por partes é conve-
No âmbito do processo de aprendizagem motora, niente à medida que a complexidade da tare-
Marteniuk, em 1976, com o objetivo de analisar os fa for aumentando. A demonstração do mo-
mecanismos internos básicos, responsáveis pela pro- delo total pode ser o mais adequado quando
dução do movimento, propôs um modelo em que o movimento não pode ser decomposto ou
se destacam os seguintes elementos: órgãos dos sen- quando a tarefa se apresenta de fácil execu-
tidos, mecanismo perceptivo, mecanismo de deci- ção. O objetivo é conseguir que o aluno per-
são, mecanismo efetor, sistema muscular e circuitos ceba a globalidade do ato motor e seja capaz
de feedback. de executá-lo.

29
EDUCAÇÃO FÍSICA E PRÁTICA PEDAGÓGICA
3 importância da propriocepção na aprendiza- Existem inúmeros fatores que influem na apren-
gem de uma habilidade motora – a aprendi- dizagem de alunos com deficiência, entre eles desta-
zagem do movimento é influenciada e facili- camos:
tada pela percepção cinestésica. Assim o alu- 3 as características das tarefas motoras;
no pode vivenciar o movimento, visualizar, 3 as características do sujeito que aprende;
apontar no outro, observar e comparar os seus 3 a aprendizagem prévia;
movimentos com o do colega; 3 o contexto da aprendizagem;
3 capacidade lingüística – é de suma importân- 3 o tipo de informação, etc.
cia que o professor conheça a capacidade lin-
güística de seus alunos, já que a comunica- Para concluir, salientamos que não existe nenhum
ção verbal é um dos meios mais utilizados no método ideal ou perfeito da Educação Física que se
processo de aprendizagem motora; aplique no processo de inclusão, porque o professor
3 tipo de ajuda prestada – o professor de Edu- sabe que pode combinar numerosos procedimentos
cação Física deverá prestar ajuda, ao aluno para remover barreiras e promover a aprendizagem
que dela necessite, quando este for executar dos seus alunos.
o movimento, procurando escolher qual aju-
da será mais adequada à situação, seja esta
ajuda verbal ou por demonstração. Em al- BIBLIOGRAFIA
guns casos a ajuda manual ou mecânica po-
derá ser necessária aos alunos que apresen- BRASIL, MINISTÉRIO DA JUSTIÇA / CORDE. Escola
tam uma deficiência mais severa ou à medi- para todos. Brasília: Coordenadoria Nacional
da que aumenta a complexidade da respos- para Integração da Pessoa Portadora de Defi-
ta motora. No caso do aluno com deficiên- ciência - CORDE, 1992.
cia visual, a ajuda verbal se configura como
elemento básico a ser utilizado pelo profes- BUENO, S. T.; RESA, J.A.Z. Educación Física para niños
sor, constituindo-se, em muitas ocasiões, no y ninãs com necessidades educativas
elemento que desencadeia o movimento. No especiales. Málaga : Ediciones Aljibe, 1995.
caso dos alunos com deficiência mental, o
tipo de ajuda verbal poderá ser descartado CARVALHO, R.E. Temas em Educação Especial. Rio
em numerosas ocasiões devido às dificulda- de Janeiro: WVA Ed., 1998.
des de compreensão da mensagem (quando
estas são muito longas); CIDADE, R. E.; FREITAS, P. S. Noções sobre Educa-
3 conhecimento dos resultados – o conhecimen- ção Física e Esporte para pessoas portadoras
to dos resultados por parte dos alunos se cons- de deficiência. Uberlândia, 1997.
titui em fator motivacional para a execução
do movimento ou tarefa por ele realizada, DUARTE, E.; WERNER, T. Conhecendo um pouco mais
possibilitando um feedback válido de sua sobre as deficiências. In: Curso de atividade
performance. O professor deve assegurar-se física e desportiva para pessoas portadoras de
de que o aluno compreendeu a tarefa. Se não deficiência: educação à distância. Rio de Ja-
houver esta compreensão o professor poderá neiro: ABT: UGF, 1995, v. 3.
recorrer a diferentes estratégias que permitam
o entendimento da mensagem emitida. Qua- PEDRINELLI, V. J . Educação Física Adaptada:
se sempre, é no trabalho junto ao aluno com conceituação e terminologia. In: Educação Fí-
deficiência mental que irão surgir os proble- sica e Desporto para Pessoas Portadoras de
mas de compreensão acerca da tarefa solici- Deficiência. Brasília: MEC-SEDES, SESI-DN,
tada (Bueno e Resa, 1995). 1994, p. 7-10.

SASSAKI, R. K. Inclusão. Construindo uma sociedade


CONSIDERAÇÕES FINAIS para todos. Rio de Janeiro: Editora WVA , 1997.

Frente a esta nova situação, qual seja a inclusão TEZZA, E. M. A . O que é Sindrome de Down. Texto
escolar, é preciso, inicialmente, considerar as peculi- Didático, UFPR:Curitiba, 1995.
aridades dos alunos associadas às estratégias que
serão utilizadas. Neste sentido, reiteramos que o pro- WERNER, D. Guia de Deficiências e Reabilitação
fessor de Educação Física deverá conhecer as neces- Simplificada. Brasília: Coordenadoria Nacional
sidades, os interesses e as possibilidades de cada alu- para Integração da Pessoa Portadora de Defi-
no e de cada grupo com quem trabalha. ciência - CORDE, 1994.

30
EDUCAÇÃO FÍSICA E DIVERSIDADE

POSSIBILIDADES NA DIFERENÇA:
O PROCESSO DE “INCLUSÃO”
DE TODOS NÓS

Verena Junghähnel Pedrinelli 1

Participar de um processo inclusivo é estar pre- projeto pedagógico envolve necessariamente as idéias
disposto, sobretudo, a considerar e respeitar as dife- provenientes da comunidade escolar, buscando um
renças individuais, criando a possibilidade de apren- equilíbrio entre expectativas e possibilidades para o
der sobre si mesmo e sobre o outro, em uma situa- desenvolvimento do aluno.
ção de diversidade de idéias, sentimentos e ações. Atualmente, encontramos duas situações ocor-
Com este pressuposto, sugere-se que a inclusão de rendo no contexto escolar:
crianças e adolescentes com deficiência seja um pro- 3 a participação de fato (inclusão) do aluno com
cesso de ensino-aprendizagem onde tanto o profes- deficiência em aulas de educação física; e
sor como o aluno aprendem e ensinam. Embutida 3 a não-participação (presença sem participa-
nesta questão, considera-se que a construção de um ção).

1
Graduada em Educação Física(EEF-USP). Mestre em Educação Física(EEF-USP).
Docente no curso de Educação Física da Universidade São Judas Tadeu/SP, responsável pela disciplina de Educação Física Adaptada e Esporte
Especial. Secretária-geral da Sociedade Brasileira de Atividade Motora Adaptada/SOBAMA, na gestão 2000/01. Representante regional da
Federação Internacional de Atividade Física Adaptada/ IFAPA.
E-mail: pedrinel@uol.com.br

31
EDUCAÇÃO FÍSICA E DIVERSIDADE
Segundo Carvalho, (1999) a atuação do profissi- 3 adaptar as atividades por intermédio da utili-
onal na situação de inclusão reflete: zação de estratégias de ensino, regras, estru-
3 uma atitude de não-rejeição, com trocas tura do ambiente, equipamentos;
interativas entre colegas, valorização da auto- 3 utilizar sistemas de apoio, tais como colegas
imagem e auto-estima; e de classe, atuando como tutores, equipe múl-
3 uma atitude de não-segregação, onde predo- tipla de ensino, auxiliares voluntários ou es-
mina a dificuldade para promover trocas pecialistas;
interativas. 3 alocar alunos com deficiência de forma pro-
porcional (10 a 15%);
Nessa perspectiva, observamos que aquele pro- 3 adequar as atividades à idade dos alunos;
fissional que não promove a inclusão apresenta: 3 desenvolver as habilidades funcionais;
3 uma atitude de dessegregação, por entender 3 desenvolver elos com a comunidade; e
que devido a dificuldade/ou diferença de 3 adaptar apenas quando necessário.
aprendizagem este aluno deveria estar em
contextos segregados; ou Algumas orientações gerais aos professores, para
3 considera-se desprovido de conhecimento que se efetive a inclusão de alunos com necessida-
para atuar com a diversidade, não sabe como des educacionais especiais em aulas de Educação Fí-
e o que fazer. sica , incluem:
3 agir naturalmente com os alunos;
Diferentes perfis profissionais evidenciam diferen- 3 acolher e receber todos com o mesmo nível
tes características em relação à convivência com a de atenção e consideração;
diferença, com a diversidade. O profissional não- 3 responder naturalmente as perguntas dos alu-
inclusivista teria que ressignificar a prática pedagógi- nos;
ca e a concepção que atribui à diversidade. Carva- 3 oferecer atenção e prestígio aos alunos; (TO-
lho, (1999) afirma que esta mudança de atitude DOS gostam. Não superproteja, nem dê ex-
quanto à diferença envolve toda a comunidade es- cesso de atenção para alguns, pois estes tal-
colar. De acordo com Loparic, (2000) a deficiência vez não irão gostar e os demais irão reclamar!)
não é propriamente o problema, o problema são os 3 garantir a participação de todos (individual ou
outros. O profissional inclusivista aceita a idéia do em grupo), desafiando cada um a realizar o
caleidoscópio, ou seja, todos são importantes e sig- melhor, considerando as suas potencialidades,
nificativos: quanto maior a diversidade, mais com- (“teoria da corda inclinada” );
plexa e mais rica será a aprendizagem. Para ele, o 3 realizar adaptações compartilhando opiniões.
aluno é um ser em processo de crescimento e desen- Regras sempre podem ser combinadas e
volvimento, que vivencia o processo de ensino-apren- recombinadas, inventadas e reinventadas;
dizagem de maneiras diversas, seja por suas diferen- 3 organizar jogos cooperativos (Broto, 1997),
ças individuais, seja por seus interesses e motivações. os quais são uma excelente opção para viver
Este profissional, em geral, consegue identificar a si em comunidade;
mesmo como um profissional de aprendizagem e não 3 promover e adequar desafios, incentivando e
como um profissional de ensino, (Demo, 1997, cita- ajudando os alunos a superar dificuldades;
do por Carvalho, 1997), procurando transformar suas 3 não subestimar o desempenho dos alunos.
aulas em espaços prazerosos, onde tanto ele, como Aceitar formas diferentes de execução de mo-
os alunos, são cúmplices de uma aventura que é o vimentos;
aprender, o aprender a aprender e o aprender a pen- 3 promover o sucesso dos alunos para desen-
sar. Ele procura utilizar estratégias mais participativas, volver a auto-estima; e
incluindo trabalhos em grupo, os quais favorecem 3 oferecer aos alunos a oportunidade de pen-
trocas de experiências e a cooperação. O professor sar, de decidir e agir por seus próprios meios.
que adota a proposta da educação inclusiva consi- Garantir a autonomia de todos.
dera o aluno um recurso importante em sala de aula
e aproveita as propostas temáticas que emergem do Ainda, numa perspectiva procedimental, em re-
grupo, valorizando as diferenças individuais e o po- lação a situações em que alunos com deficiência
tencial dos alunos. mental estejam presentes, sugere-se que o professor
O livro Give it a go (2001) traz, em sua edição deverá:
revisada, algumas orientações aos professores, no 3 dar orientações claras sobre a tarefa a ser rea-
que concerne ao planejamento das aulas para aten- lizada, utilizando uma pequena quantidade
der as necessidades individuais, destacando que deve- de informações por vez. (lembre-se do teste
se levar em consideração que é possível e recomen- de memória);
dável: 3 usar exemplos concretos;

32
3 utilizar formas, cores e ângulos para aumentar onal por meio do manuseio e da explicação verbal.
a atenção (seletiva) à informação relevante; Situações de perigo devem ser evitadas para preve-
3 utilizar demonstrações; nir lesões oculares adicionais.
3 garantir estrutura e rotina na aula; No que se refere aos alunos com deficiência físi-
3 elogiar as tentativas, criando e estimulando ca, várias são as crianças com esta deficiência que
desafios. hoje freqüentam a escola. É necessário que o profis-
sional procure sempre informar-se sobre a condição
Para os alunos com síndrome de Down o profes- de saúde do aluno participante, obtendo aprovação
sor deverá solicitar aprovação médica para partici- médica para participação, se for o caso. O aluno com
pação irrestrita, apresentando laudo sobre a instabi- deficiência física precisa de mais espaço individual
lidade atlanto-axial (Barros Filho et al; 1998). para a atividade, considerando o uso de cadeiras de

“ ...quanto maior a diversidade, mais complexa


e mais rica será a aprendizagem.

”
Na presença de alunos surdos, ou com deficiên- rodas ou muletas, por exemplo. O tempo de execu-
cia auditiva, o professor deverá posicionar-se de for- ção de movimentos pode ser bem mais demorado
ma que o rosto esteja visível para o aluno, facilitan- do que os demais. Qualidade e quantidade reque-
do a compreensão por meio da leitura labial ou da rem ajustes. Vários implementos, modificações de
Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS). Os aparelhos au- regras e adaptações, invariavelmente, poderão ser
ditivos deverão ser removidos quando houver ativi- sugeridas pelo aluno com deficiência. Orientações e
dades que possam danificá-los. Utilizar demonstra- novidades podem ser introduzidas pelos profissio-
ções e/ou recursos visuais sempre, sempre, sempre nais.
que possível. O professor deverá planejar as atividades de for-
Nos casos de surdez decorrente de alterações no ma que o aluno possa participar o máximo possível.
aparelho vestibular, responsável pela sensação de Deverá, ainda, oferecer aos alunos informações so-
desequilíbrio/equilíbrio, podem ocorrer dificuldades bre as habilidades, as mais diversas possíveis, e so-
de equilíbrio. O professor deverá encorajar o aluno a bre as modalidades existentes no âmbito do espor-
seguir demonstrações dos colegas. te, de sorte que eles possam um dia participar, se
Utilizar e incentivar o uso da língua de sinais por quiserem, das modalidades oficiais, tais como: arco
parte de todos os colegas. Para garantir a atenção, e flecha (em pé e sentado); atletismo; basquetebol
criar um código de atenção. sobre rodas, bocha, ciclismo, equitação, esgrima, fu-
O professor deverá estar atento ao fato que os tebol, halterofilismo, iatismo, natação, raquetebol ,
surdos não escutam as palmas. Por isso, os “aplau- tênis em cadeira de rodas, tênis de mesa, tiro ao alvo
sos” são feitos com as mãos erguidas. (sentado e em pé), kart, canoagem e voleibol (em pé
Com relação aos alunos cegos, ou com baixa vi- e sentado). (In:Educação física e desporto para pes-
são, o professor irá considerar o nível de orientação soas portadoras de deficiência, 1994; Freitas & Cida-
e mobilidade do aluno. Se precisar guiá-lo, o profes- de, 1997; Lazer, atividade física e esporte para por-
sor deverá oferecer o seu cotovelo para que o aluno tadores de deficiência, 2001).
cego se apóie nele. É fundamental informar ao cego O profissional terá de estar atento a fim de evitar
sobre obstáculos/materiais presentes no espaço, e que aconteçam quedas, entorses e outros traumas
remover aqueles desnecessários. com seus alunos. Evitar acidentes. Na dúvida, deverá
Nos casos de alunos com baixa visão, aumentar encaminhar o aluno para o departamento médico.
dimensões dos objetos e utilizar cores contrastantes. Propiciar sempre, sempre, sempre o máximo de
Sempre que possível introduzir materiais sonoros. autonomia. O melhor depoimento do seu aluno será:
Sempre que se dirigir ao aluno, mencione o nome. “eu consegui!; eu consigo fazer sozinho”; “eu pos-
As informações sobre a atividade devem incluir ex- so, vocês duvidam?” (Rosadas, 1989).
plicações verbais detalhadas. O professor deixará que No cenário escolar, é preciso considerar que, além
o aluno “perceba,” por meio do tato, como é o mo- de alunos com deficiência mental ou com deficiência
vimento, (ele é que deve tocar o profissional). Pe- visual, auditiva ou deficiência física (amputações,
quenos acertos podem ser conduzidos pelo profissi- distrofia muscular, espinha bífida, lesão medular,

33
EDUCAÇÃO FÍSICA E DIVERSIDADE
paralisia cerebral), há ainda aqueles com distúrbios FREITAS, P. S. & CIDADE, R. E. A. Noções sobre Edu-
emocionais, com síndrome do autismo ou com dis- cação Física e Esporte para pessoas portado-
túrbios de saúde (artrite reumatóide juvenil, asma, ras de deficiência: uma abordagem para pro-
câncer, diabetes, fibrose cística, HIV / AIDS, obesida- fessores de 1º e 2º graus. Uberlândia, MG: Grá-
de, transplantes). Distúrbios de atenção, ou fica Breda, 1997.
hiperatividade , e epilepsia são também exemplos de
assuntos pertinentes a todo este cenário, entre tan- GIVE IT A GO. Including people with disabilities
tos outros. in sport and physical activity. Edição revi-
As recomendações (cuidados e possibilidades) sada. Australian Sports Commission
para a prática da educação física são várias, e têm Services United. Camberra, Austrália:
sido publicadas desde a década de 80 (Seaman & Printers, 2001.
DePauw, 1982; Mizen & Linton, 1983; Adams, 1985;
Sherrill, 1986; entre outros). LOPARIC, Z. Ética e deficiências. Palestra realizada
Mais recentemente, inúmeras publicações , tais durante a 1ª Jornada de Pesquisadores, Éti-
como, ACM’s exercise management for persons with ca e Deficiência, promovida pelo Laborató-
chronic disabilities (1997) e Give it a go (2001), tra- rio de Estudos sobre Deficiências do Institu-
zem excelentes contribuições para orientar e promo- to de Psicologia da USP, em 30 de setembro
ver a oportunidade de participação de todos os alu- de 2000.
nos em programas regulares de Educação Física.
MINISTÉRIO DO ESPORTE E TURISMO. Lazer, ativi-
dade física e esporte para portadores de defi-
BIBLIOGRAFIA ciência Brasília: SESI-DN:, 2001.

ADAMS, R .C.; DANIEL, A. N.; MC CUBBIN, J. A. & MIZEN, D.W. & LINTON, N. Guess who’s coming
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34
EDUCAÇÃO FÍSICA: NOVOS CAMINHOS

EDUCAÇÃO
FÍSICA
INCLUSIVA:
UM GRANDE
DESAFIO
PARA O
SÉCULO XXI.

Sônia Bertoni Sousa 1

A história da Educação Física voltada para o alu- possibilidades da Educação Física inclusiva como uma
no com deficiência tem, no nosso modo de enten- perspectiva para o século XXI.
der, percorrido um caminho de sucesso, uma vez que Sabemos que o direito de toda pessoa à educação
conseguiu, em diferentes modalidades e competições foi preconizado, legalmente, há mais de cinqüenta
de nível internacional, levar seus praticantes ao pódio. anos, pela Declaração Mundial dos Direitos Huma-
Pretendemos levantar alguns pontos referentes ao nos. Recentemente, a Conferência Mundial de Educa-
paradigma da inclusão e refletir quais os limites e ção para Todos veio reforçar esses direitos, cujo prin-

1
Graduada em Educação Física, mestranda em Educação pela Universidade Federal de Uberlândia(UFU)/MG. Professora da Secretaria
Municipal de Educação de Uberlândia, atua no CEMEPE - Centro Municipal de Estudos e Projetos Educacionais Julieta Diniz/Programa de
Ensino Alternativo.

35
EDUCAÇÃO FÍSICA: NOVOS CAMINHOS
cipal objetivo dos membros participantes foi refletir e Neste sentido, poderíamos indagar: Como a Edu-
enfrentar o desafio da exclusão escolar de milhões de cação Física enfrentaria esse novo desafio da Educa-
alunos, entre eles os portadores de deficiência, além ção inclusiva?
da redução das taxas de analfabetismo. A Educação Física voltada para o aluno com defi-
A Conferência Mundial de Educação Para Todos ciência, mais conhecida como Educação Física Adap-
(1990) e a Declaração de Salamanca (1994), inspira- tada (EFA), conseguiu perceber os limites e possibili-
das nos princípios de integração e no reconhecimento dades dessas pessoas e tem como diretriz trabalhar
da necessidade de ação para conseguir “escolas para com as potencialidades dos alunos. Ainda assim, é
todos”, buscaram um consenso mundial sobre os uma prática segregacionista, pois acontece entre os
futuros rumos dos serviços educacionais especiais: o portadores de deficiência, e, no paradigma da inclu-
princípio da inclusão. são, estamos falando de lidar com a diversidade em
Esse princípio demarcou a chamada escola inclu- um mesmo contexto.
siva, que teve início nos Estados Unidos em 1975, Segundo Heikinaro-Johansson, apud Lopes
com a Lei Pública 94.142 ( Mrech, 1998). Tomou (1996), é fator primordial que o professor conheça
impulso nos anos 90, no Brasil, e, provavelmente, as necessidades individuais dos alunos, pois, se não
estará fortemente presente nos primeiros dez anos houver uma compreensão das deficiências e das
do século XXI, em todos os países. maneiras de adaptá-las, a qualidade de ensino esta-
Mas afinal o que é inclusão? Podemos dizer que rá comprometida e poderá dificultar o processo de
o termo inclusão é recente e teve sua origem na pa- integração desses alunos.
lavra inglesa “full inclusion”. Segundo Stainback & Neste contexto, entendemos que a Educação Fí-
Stainback, apud Doré et al. (1997, p. 176), sica, enquanto modalidade de ensino, encontra-se
“...trata-se de um novo paradigma (...) a no- em vantagem em relação a outras disciplinas, uma
ção de “full inclusion” prescreve a educação vez que a Educação Física Adaptada procurou com-
de todos os alunos nas classes e escolas de preender as deficiências e a maneira de adaptá-las,
bairro (...) reflete mais clara e precisamente o o que levou a um grande desenvolvimento dessa
que é adequado: todas as crianças devem ser área.
incluídas na vida social e educacional da esco- Sabemos que apenas colocar o conteúdo da ati-
la e classe de seu bairro, e não somente colo- vidade física e o desporto adaptado como partes
cada no curso geral (“mainstream”) da escola constituintes do conhecimento, a ser trabalhado
e da vida comunitária, depois de já ter sido pelos professores de Educação Física com seus alu-
excluída.” nos, não asseguraria a inclusão e participação do
aluno com deficiência nas aulas de Educação Física
A Educação inclusiva implica em discussões sociais escolar.
mais ampliadas, pois envolve, além dos alunos com Porém, essas ações poderiam suscitar uma refle-
deficiência, questões referentes aos negros, índios, xão sobre a temática deficiência, e, principalmente,
pobres, enfim todos os excluídos da sociedade. Tem levar os professores a um repensar acerca da articu-
como eixo norteador o princípio da diversidade e lação tempo, espaço e conhecimento na Educação
diferença, entendendo que, segundo Carmo (2001, Física escolar, analisando e compreendendo os limi-
p. 45), não podemos desconsiderar que existe dina- tes e possibilidades de inclusão desses alunos na es-
micamente, cola.
“...diferença na diferença e desigualdades nas Inserir conhecimentos que abarcassem temáticas
diferenças”, ou seja, dois alunos cegos, sur- da Educação Física Adaptada, (EFA), poderia ser um
dos ou paraplégicos, mesmo tendo as limita-

“
ções físicas aparentando uma certa igualda-
de, são completamente diferentes e desiguais ...levar os professores a
socialmente. Cada um tem a sua história, suas
um repensar acerca da
necessidades e seus interesses.”
articulação tempo, espaço
Por mais que apresentássemos pontos em comum e conhecimento na Educação
e de aproximação, jamais seríamos totalmente iguais, Física escolar, analisando e
principalmente ao levarmos em consideração o fato compreendendo os limites e

”
de estarmos inseridos em um contexto social enfati- possibilidades de inclusão...
camente dividido em classes e com oportunidades
extremamente desiguais para cada indivíduo.

36
caminho, dentre outros. Mas, é preciso compreen- Muitas vezes, esses princípios vêm contribuir for-
são e clareza sobre qual Educação Física estamos temente para o processo de exclusão escolar desses
falando e o que queremos para os nossos alunos. alunos, como dissemos, anteriormente. E, excluin-
A Educação Física pode ser vista de diferentes do, perdemos a oportunidade de aprender e convi-
maneiras. Por um lado, pode lidar com ideologias ver com o diferente.
“biologicistas”, que se preocupam com a estética ou Aranha, apud Cruz (1996, p. 12), afirma que:
o rendimento físico e técnico do indivíduo e, por “alijando-se o aluno com deficiência da
outro, pode se propor a trabalhar enfatizando os integração social, este perde em desenvolvi-
aspectos histórico-sociais do indivíduo. Dependen- mento, enquanto a sociedade perde por não
do da forma de conceber a Educação Física, não é ter a oportunidade e a possibilidade de apren-
difícil legitimar a exclusão de alunos de determina- der com uma significativa parcela de seus ele-
das atividades, sejam eles portadores de deficiência mentos constitutivos, representados pelos “di-
ou não. Já vivenciamos muitas vezes a exclusão ferentes” segregados. Com isso, todos perde-
disfarçada dos menos hábeis, dos mais gordinhos, mos em consciência, em comportamento e,
dos mais lentos, enfim, daqueles que não se enqua- conseqüentemente, em possibilidade de trans-
dram em um padrão pré-estabelecido. formação.”
De acordo com Santin (1988, p. 67),
... “ É interessante observar que a Educação Ressaltamos as contribuições do aluno com defi-
Física é a única que conseguiu criar leis para ciência para a sua própria inserção social, no que se
que certos alunos fossem dispensados, alegan- refere à transformação que poderá trazer à Educa-
do razões que, olhadas com atenção, mostram ção Física, se estiver presente, integrado, incluso nesse
exatamente que esses dispensados são os que contexto.
mais necessitam da atenção do educador. Mas, Reconhecemos que existe, ainda, na educação e,
como, para alguns, Educação Física é sinôni- conseqüentemente, nas aulas de Educação Física,
mo de determinado perfil físico, de desempe- perspectivas tradicionais de ensino. Desta forma, te-
nhos atléticos, parece ser norma a dispensa... mos consciência de que ao defendermos a possibi-
Note-se, ainda, que em nenhum curso alguém lidade de inclusão do aluno com necessidades edu-
é dispensado de história, de gramática ou de cacionais especiais na Educação Física escolar, esta-
línguas, porque tem problemas de aprendiza- remos avançando à perspectivas mais progressistas
gem. Não há dispensa. A educação física deve de ensino, tais como: crítico-social, crítico-
ser indispensável”. superadora, emancipatória, dinâmica-dialógica, en-

“ ...ao defendermos a possibilidade de inclusão de alunos com


necessidades educacionais especiais na Educação Física escolar,

”
estamos avançando à perspectivas mais progressistas de ensino...

Concordamos com este autor, e reiteramos que tre outras. E os professores de Educação Física, prin-
a Educação Física deve ser indispensável, principal- cipalmente aqueles que trabalham com essas pers-
mente, para os excluídos. E por acreditar nesta área pectivas consideradas avançadas de ensino, devem,
do conhecimento como possibilidade de contribuir pelo menos, suscitar um repensar nos objetivos,
para a formação dos alunos, com deficiência ou não, métodos, funções sociais, tempo, espaço e conheci-
faz-se necessário procurar caminhos para solidificar mento para incluir o aluno com deficiência na Edu-
uma Educação Física de especial qualidade, ou seja, cação Física escolar.
uma Educação Física inclusiva. A inclusão proporciona uma visão arrojada de
Não podemos negar que ainda é realidade, em escola, ensino, educação, e de Educação Física.
algumas escolas, aulas de Educação Física separa- Com isto, torna-se indispensável a valorização do
das por turmas, tendo como parâmetros o sexo e o magistério, o investimento na formação dos pro-
nível de habilidade motora, demonstrando, nitida- fessores, assim como melhores condições de tra-
mente, a bagagem histórica, cultural, social e balho e salários dignos, em face do papel político
educativa que nos acompanha, e, historicamente, e social que representam esses profissionais (Car-
deve ter acompanhado nossos antecessores. valho, 1999).

37
EDUCAÇÃO FÍSICA: NOVOS CAMINHOS
Precisamos enfrentar desafios, mas não pode- CARVALHO, A. M. de. Exclusão social: o Brasil
mos abraçar a inclusão sem considerar as idéias li- continua o mesmo. Revista Presença Peda-
berais contidas nos discursos, as restrições, os pon- gógica, v. 5, n. 30, p. 94 – 96, nov./dez.
tos fundamentais e determinantes levantados nos 1999.
estudos e pesquisas, tanto em nível nacional quan-
to internacional, as especificidades de cada defici- CIDADE, R. E. A. e FREITAS, P. S. de. Noções sobre
ência e do alunado da Educação Especial. E, tam- Educação Física e Esporte para pessoas porta-
bém, não podemos deixar de pensar em como ar- doras de deficiência: Uma abordagem para
ticular o tempo, o espaço e o conhecimento na professores de 1º e 2º graus. Uberlândia: Grá-
Educação Física escolar que contemple não só o fica Breda, 1997. 86 p.
aluno com deficiência, mas o princípio da diversi-
dade e diferença. CUNHA, da C. O Plano Decenal e a Conferência
Abranches (2000,p.38), defende a idéia que: de Educação para Todos. Revista Integração,
“o convívio social só é possível pela aceitação ano 5, nº 14, Brasília: 1994.
e pelo respeito à diferença. E a diferença é a
marca constitutiva de cada sujeito; é o que CRUZ, G. de C. Classe especial e regular no contexto
nos define e nos torna únicos.” da Educação Física: segregar ou integrar?
1996. 80 p. Dissertação (Mestrado Em Edu-
É importante mencionar que não se pode es- cação). UERJ, Rio de Janeiro: 1996.
quecer que a Educação Física escolar é parte cons-
tituinte da Educação Geral. Segundo Soares et al. DORÉ et al. A integração escolar: os principais con-
(1993), ceitos, os desafios e os fatores de sucesso no
“a Educação Física, enquanto disciplina do secundário. In: MANTOAN, M. T. E. et al. A
currículo escolar, possui as mesmas tarefas Integração de pessoas com deficiência: con-
que a escola em geral, não podendo ser isen- tribuições para uma reflexão sobre o tema.
tada da responsabilidade que se exige da São Paulo: Memnom: SENAC, p. 174 – 183,
escola.” 1997.

Assim, entende-se que na Educação Física inclu- LOPES, K. A. T. O deficiente físico nas aulas de
siva precisamos estar envolvidos numa prática Educação Física na rede pública de
sociopolítico-pedagógica capaz de materializar uma Manaus. 1996. 137 p. Dissertação de Mes-
nova Educação Física escolar e novos caminhos a trado em Educação. UNIMEP, Piracicaba/
serem percorridos. SP: 1996.

MRECH, L. M. O que é Educação inclusiva? Revista


Integração, ano 8, n. 20, Brasília: 1998. p. 37
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38
FORMAÇÃO DOCENTE E EDUCAÇÃO FÍSICA

A FORMAÇÃO PROFISSIONAL DO
PROFESSOR DE EDUCAÇÃO FÍSICA
DIANTE DAS NECESSIDADES
EDUCATIVAS ESPECIAIS DE PESSOAS
PORTADORAS DE PARALISIA CEREBRAL.
Gilmar de Carvalho Cruz 1, Écliton dos Santos Pimentel 2 , Luciano Basso 3

Ao refletirmos sobre a intervenção da Educação to pelo meio social próximo à pessoa com deficiên-
Física em ambiente escolar, nos deparamos com gru- cia, isto é a “audiência” (Omote, 1994) à qual ela é
pos heterogêneos, constituídos por crianças com di- submetida contribui na sua caracterização. Altera-
ferentes níveis de habilidade motora. Essa situação ções terminológicas utilizadas para se referir à defi-
torna-se ainda mais evidente se levarmos em conta a ciência não são suficientes para que sejam supera-
possibilidade de termos em nossas aulas pessoas com das concretamente as dificuldades cotidianas vividas
necessidades educacionais especiais. No entanto, du- por indivíduos com deficiência, haja vista que a pes-
rante nosso processo de formação profissional é co- soa que não se enquadra em um determinado mo-
mum nos posicionarmos de modo reticente a esse delo social e seus valores subjacentes, tem suas pos-
respeito. É neste contexto que se pretende refletir so- sibilidades de participação social comprometidas.
bre o fato de apresentarmos, ou não, enquanto área A título de ilustração pode-se mencionar a restri-
de atuação profissional, elementos para a elaboração/ ta participação de indivíduos com paralisia cerebral
orientação de programas de Educação Física destina- em nosso sistema de ensino. Apoiando-se na obser-
dos ao atendimento de pessoas com necessidades vação e atuação junto a essa população, é possível
especiais caracterizadas por algum tipo de deficiên- notar que poucas são as situações em que tais crian-
cia, seja ela física, mental, sensorial ou múltipla. ças estão efetivamente inseridas em programas de
Autores como Bobath & Bobath (1989) e Holle educação escolar. Não se pode negar a existência de
(1992) enfatizam em seus trabalhos mais os aspectos diferentes graus de comprometimento em uma de-
relacionados às especificidades de determinadas defi- ficiência e diferentes condições ambientais interfe-
ciências do que às possibilidades de intervenção, prin- rindo no relacionamento da pessoa com deficiência
cipalmente no que diz respeito ao processo de educa- com seu entorno social. Pode-se ter uma pessoa com
ção escolar. Esse tipo de ênfase quando da aborda- potencial afetivo, cognitivo e motor compatíveis com
gem do assunto deficiência, marcadamente os padrões de normalidade, mas vivendo em uma
“reabilitadora”, colabora para que se proceda a uma situação ambiental restritiva quanto às suas condi-
busca incessante por uma formação profissional “es- ções de desenvolvimento. Em contrapartida, uma
pecializada”, que tem como um de seus efeitos pessoa pode ser extremamente comprometida, do
colaterais o distanciamento de futuros profissionais ponto de vista motor, por exemplo, mas vivendo em
da possibilidade de promoverem intervenções um ambiente que lhe forneça as condições necessá-
direcionadas a pessoas com deficiência. Esse compor- rias para uma efetiva participação social.
tamento acaba por aumentar as diferenças existentes Ao pensarmos em pessoas que apresentam defi-
entre as pessoas portadoras e não-portadoras de de- ciência, inseridas no contexto escolar, temos, inicial-
ficiência, mitificando o entendimento profissional do mente, que refletir sobre quem é de fato “deficien-
que sejam de fato necessidades educacionais especiais te”: o aluno ou o professor? O processo de aquisi-
manifestas na forma de algum tipo de deficiência. ção de um determinado conhecimento sistematiza-
As implicações sociais do contexto no qual o alu- do envolve, entre outros aspectos, uma interação
no com deficiência está inserido são de suma impor- direta entre estes dois sujeitos mais o ambiente em
tância na ampliação do entendimento acerca da de- que estão inseridos. Assim, no momento em que um
ficiência. Não se pode ignorar que o julgamento fei- aluno com deficiência apresenta determinadas ca-

1
Professor Assistente da Universidade Estadual de Londrina / Laboratório de Pesquisa em Educação Física -LaPEF-CEFD/UEL.
2
Licenciados em Educação Física pela Universidade Estadual de Londrina/Paraná.

39
FORMAÇÃO DOCENTE E EDUCAÇÃO FÍSICA
racterísticas que demandam ações específicas, se o de pessoas com necessidades especiais/deficiência
professor não for capaz de organizar um ambiente (Brasil, 1994a, 1994b, 1996, 1997).
de aprendizagem que favoreça o seu desenvolvimen- Deve-se atentar às considerações de Goffman
to, pode-se deslocar o foco de atenção das “defici- (1988), Carmo (1991) e Omote (1994), ao sugerirem
ências” do aluno para o professor. Para se criar um que fatores constitutivos do sujeito e aqueles relacio-
ambiente no qual as necessidades dos alunos venham nados ao ambiente físico e social no qual ele se en-
a ser atendidas, é de suma importância que a partir contra inserido atuam de modo interdependente no
das características peculiares dos alunos - inclusive processo de construção da “deficiência”. É importan-
os que apresentam deficiência - o professor esteja te percebermos que o relacionamento entre a pessoa
devidamente preparado para garantir a consecução com deficiência, o seu ambiente físico-social e as res-
dos objetivos relacionados ao programa de Educa- trições impostas pelas tarefas que lhe são propostas,
ção Física por ele implementado. não podem ser ignoradas na avaliação das possibili-
Estar devidamente preparado, do ponto de vista dades de intervenção junto a esses indivíduos. Do
da formação/preparação profissional, implica em con- ponto de vista do comportamento motor, os alunos
siderarmos inicialmente que a formação profissional com deficiência apresentam um desenvolvimento di-
é um processo longe de se esgotar no ensino superi- ferente, podendo inclusive implicar em um alto nível
or. A despeito das limitações existentes neste pro- de competência motora (Manoel, 1994; 1996).
cesso, não podemos abrir mão de que professores A reflexão aqui proposta decorre da implementação
recém-formados possuam ferramentas básicas para de um programa de Educação Física para portadores
suas incursões profissionais futuras. Todavia, duran- de paralisia cerebral - profundamente comprometidos
te a graduação uma das frases mais comuns é: “Eu - de sexo feminino e masculino, com idade oscilando
não me sinto preparado para trabalhar com pessoas entre seis e oito anos, integrantes de uma escola espe-
portadoras de deficiência”. Esta assertiva é equivo- cial da cidade de Londrina/Paraná. O programa foi de-
cada, ou no mínimo precipitada, à medida que ignora senvolvido em quarenta sessões, conforme exigência
um aspecto primordial à formação/atuação profissi- do estágio curricular do curso de Educação Física da
onal do professor de Educação Física. É a partir da Universidade Estadual de Londrina.
assunção de que o processo de ensino em aulas de Guardou-se como objetivo principal, a partir do
Educação Física diz respeito à construção de um nível de desenvolvimento dos sujeitos em questão, de-
ambiente que proporcione ao aluno vivências

“
motoras significativas ao seu processo de desenvol-
vimento e capazes de corroborar o projeto pedagó- Estar devidamente preparado...
gico da escola, que devemos considerar a possibili- implica em considerarmos
dade, enquanto professores de Educação Física, de
intervirmos na realidade de alunos com necessida- que a formação profissional

”
des educacionais especiais. é um processo longe de se
O processo de aquisição de habilidades motoras esgotar no ensino superior.
refere-se ao aprimoramento e refinamento das con-
dições de controlar-se dentro de um mundo dinâmi-
co e variável. Desta feita, é possível repensar a equi- senvolver um programa de Educação Física focalizan-
vocada certeza da ausência de elementos básicos em do os padrões fundamentais de movimento. Foram
nossa formação profissional para atuarmos junto a realizadas dez aulas exploratórias com os padrões fun-
pessoas com algum tipo de deficiência. (Re)Conhecer damentais de movimento (Tani, Manoel, Kokubun e
as (de)limitações de uma área de atuação profissio- Proença, 1988; Gallahue, 1989; Manoel, 1994). Na
nal é um passo importantíssimo para que ela possa seqüência, foi efetuado o programa de Educação Físi-
se aprimorar e estabelecer uma efetiva relação com ca com trinta aulas de quarenta e cinco minutos apoi-
outras áreas. A preparação decorrente de uma habi- adas nos padrões fundamentais, com a seguinte dis-
litação profissional obtida em um curso de nível su- tribuição arbitrária dos movimentos utilizados: 40%
perior será aprimorada tanto em função das vivências (quarenta por cento) de locomoção, 35% (trinta e cin-
profissionais quanto dos investimentos acadêmicos co por cento) de manipulação e 25% (vinte e cinco
futuros. No entanto, não podemos negar as infor- por cento) de equilíbrio. Após o termino do estágio
mações obtidas ao longo de um curso de gradua- verificou-se a possibilidade de resposta por parte dos
ção. A esse respeito vale a pena aproximarmo-nos sujeitos em questão às tarefas propostas. Há que se
dos apontamentos feitos por Bueno (1999) sobre a considerar, porém, o nível de desenvolvimento motor
formação profissional em educação especial. Para ele, dos alunos a serem submetidos ao programa de Edu-
trata-se de uma falsa dicotomia o embate entre es- cação Física, o que, diga-se de passagem, é procedi-
pecialistas e generalistas, em face da necessidade de mento comum a ser adotado quando da elaboração
que tanto os que atuam no ensino regular quanto de programas de Educação Física orientada para to-
os que atuam no ensino especial devem agir com o dos e quaisquer alunos. De mais a mais, merece des-
intuito de prover o devido atendimento educacional taque a afirmação de que “a Educação Física trabalha

40
todo o tempo com a diferença apresentada pelos que BIBLIOGRAFIA
dela tomam parte”, (Cruz, 1997, p.24), sejam ou não
portadores de algum tipo de deficiência. BOBATH, B., BOBATH, K. Desenvolvimento motor nos
É possível o trabalho da Educação Física com su- diferentes tipos de paralisia cerebral. São Pau-
jeitos que apresentam características morfo-funcio- lo: Editora Manole, 1989.
nais fora dos padrões de normalidade? Se a nossa
visão de Educação Física assentar-se no movimento BRASIL. Política Nacional de Educação Especial. Bra-
corporal humano enquanto gesto esportivo ultra-es- sília: Secretaria de Educação Especial, 1994a.
pecializado (uma “bicicleta” no futebol; um saque
“viagem ao fundo do mar” no voleibol; uma “enter- _______. Declaração de Salamanca e linha de ação
rada” no basquetebol, para dar alguns exemplos), sobre necessidades educativas especiais. Bra-
certamente que um sonoro não ecoará em nossas sília: CORDE, 1994b.
mentes. Por outro lado, se na base do nosso enten-
_______. Lei 9.394 de Diretrizes e Bases da Educa-
dimento de Educação Física estiver uma idéia ampla
ção Nacional. Brasília: Diário Oficial, 1996.
do que seja movimento – capaz de nos permitir va-
lorizar desde equilibrar-se numa determinada pos-
_______. Constituição da República Federativa do Bra-
tura, até locomover-se e manipular objetos (como
sil. 9ª ed. São Paulo: Atlas, 1997.
segurar uma bola de tênis, por exemplo) – assumi-
mos a possibilidade de que pessoas com necessida- BUENO. J.G.S. Crianças com necessidades educativas
des educacionais especiais – deficiência física, no caso especiais, política educacional e a formação de
– possam ser incluídas em nossas listas de alunos. professores: generalistas ou especialistas? Re-
Observamos, ao longo da reflexão realizada sobre vista Brasileira de Educação Especial. V.3, N.5,
o que poderia sugerir, em princípio, uma ação despro- 1999, pp. 7-25.
vida de qualquer perspectiva de êxito, que a compe-
tência necessária para atuar junto a esses alunos passa CAPRA, F. A teia da vida. São Paulo: Editora Cultrix, 1996.
pela organização de ambientes que permitam a execu-
ção de tarefas motoras adequadas ao nível de desen- CARMO, A.A. Deficiência física: a sociedade brasilei-
volvimento motor desses sujeitos. Além dos conheci- ra cria, “recupera” e discrimina. Brasília: Se-
mentos relativos especificamente ao assunto “deficiên- cretaria dos Desportos/PR, 1991
cia”, também aqueles relacionados à aprendizagem
motora, ao desenvolvimento motor e à metodologia CRUZ, G.C. Classe especial e regular no contexto da
do ensino da Educação Física, para citar alguns, são Educação Física: segregar ou integrar? Lon-
importantes neste processo de formação profissional. drina: Editora da UEL, 1997.
Focalizar o movimento e não a “deficiência” da pessoa
é a posição que deve ser assumida desde a graduação. GALLAHUE, D.L. Understanding motor development:
Não nos compete reverter alterações morfo-funcionais infants, children, adolescents. 2 ed. Indianapolis,
constitutivas de uma pessoa. Todavia, proporcionar a Indiana: Benchmark Press, Inc., 1989.
essa pessoa condições de emitir respostas motoras que
lhe permitam interagir com o ambiente de forma cada GOFFMAN, E. Estigma. 4 ed. Rio de Janeiro: Editora
vez mais eficiente é nossa competência. Guanabara - Koogan, 1988.
Todas os seres vivos - inclusive os humanos, por mais
HOLLE, B. Desenvolvimento motor na criança normal
ecologicamente analfabetos que sejam - (Capra, 1996),
e retardada. São Paulo: Editora Manole, 1990.
possuem características que os diferenciam uns dos
outros. A pessoa com deficiência é uma pessoa cujas MANOEL, E.J. Desenvolvimento motor: implicações
diferenças são, em alguns casos, mais evidentes e a para a Educação Física escolar. Revista Paulista
identificação de suas necessidades educacionais espe- de Educação Física. V.8, N.1, pp.82-97, 1994.
ciais é crucial para incrementar seu processo de
escolarização, desde que estas necessidades não sejam _______. Atividade motora adaptada: desafios para
mitificadas qual Quimera. A identificação de suas de- o século XXI. Anais do VI Simpósio Paulista
mandas educacionais específicas não significa que não de Educação Física Adaptada. São Paulo,
possam utilizar o potencial que possuem, ainda que 1996, pp. 183-185.
tenham limitações e/ou dificuldades concretas, que, a
propósito, não devem ser entendidas como sinônimo OMOTE, S. Perspectivas para conceituação de defici-
de incapacidade e muito menos devem implicar em ências, 1994, mimeo.
desvantagens sociais. As diferenças são de extrema re-
levância para o incremento da dinâmica social. Respei- TANI, G., MANOEL; E.J., KOKUBUN; E. PROENÇA,
tar as diferenças é fundamental para que este “Titanic”, J.E. Educação Física escolar : fundamentos de
que é o planeta Terra, possa navegar, e aprender / saber uma abordagem desenvolvimentista. São Pau-
lidar com elas é imprescindível para evitar o naufrágio. lo: EPU: EDUSP, 1988.

41
INFORME ESPECIAL

TELECONFERÊNCIA
DEBATE EDUCAÇÃO FÍSICA ADAPTADA
O Ministério da Educação, por meio da Secretaria de riências inovadoras, na área de Educação Física es-
Educação Especial (SEESP), promoveu, no dia 19 de setem- colar, que estão acontecendo em alguns Estados
bro do ano passado, uma teleconferência sobre Educação brasileiros; e
Física Adaptada. 3 expansão da filosofia de inclusão na área da Edu-
Este evento, que contou com a participação da SEESP e cação Física.
de especialistas da área, como os professores Apolônio A .
do Carmo, Alberto Martins Costa, Edison Duarte e a pro- Quanto ao curso de capacitação, este foi realizado em
fessora Ruth Eugênia Cidade, teve o objetivo de discutir a duas etapas, em Brasília, nos meses de outubro e novem-
importância da prática das atividades físicas e/ou esporti- bro de 2001, e contou com a participação de cento e oi-
vas para os alunos com necessidades educacionais especi- tenta e nove professores das vinte e sete unidades da Fede-
ais, no âmbito da política de inclusão desses alunos, nas ração, sendo sete professores de cada estado brasileiro.
classes comuns das escolas da rede pública de ensino, que Atualmente, o Programa encontra–se em sua segunda
vem sendo operacionalizada pelo Ministério da Educação/ versão, onde os professores–multiplicadores estão ofere-
SEESP. cendo cursos de capacitação em seus estados para os pro-
Cada um dos especialistas destacou que, ainda hoje, fessores de Educação Física do sistema regular de ensino,
muitas crianças são dispensadas das aulas de Educação Fí- visando a preparação dos docentes para atuar com alunos
sica devido a fatores tais como: com deficiência nas aulas de Educação Física, em uma pers-
3 falta de professores capacitados para atuar com pectiva inclusiva.
esses alunos; e Este trabalho gerou a elaboração de um kit, constituí-
3 falta de equipamentos e de espaços físicos adequa- do de material impresso e de sete fitas de vídeo, que foi
dos para a prática da atividade física escolar. distribuído aos professores participantes e às Secretarias
Estaduais de Educação.
Eles ressaltaram também que a Educação Física, em Para os leitores que desejarem obter maiores informa-
uma perspectiva inclusiva, deverá ter como princípio fun- ções, sugerimos que entrem em contato com a Secretaria
damental “o estímulo e o trabalho de todos os envolvidos de Educação Especial/SEESP, por meio do telefone: (0xx)
no processo: o aluno com necessidades especiais e a co- (61) 410-8552, pelo e-mail: josemiranda@mec.gov.br ou
munidade escolar ( alunos, professores, diretores, pais, acessando a página da SEESP na Internet: www.mec.gov.br/
etc).” seesp
Para o professor Alberto
Martins Costa, “o projeto de
inclusão, em uma aula de
Educação Física, é uma ação
coletiva de convivência, na
perspectiva do atendimen-
to e do respeito aos direi-
tos de todos os envolvidos
neste processo.”
A teleconferência teve ain-
da a finalidade de divulgar,
em nosso país, as ações do
Programa Nacional de Edu-
cação Física Adaptada, den-
tre elas:
3 a capacitação de
professores em Edu-
cação Física Adapta-
da, que atuarão
como multiplicado-
res das ações do
Programa em seus
Estados e Muni-
cipios;
3 divulgação de expe-

42
DEPOIMENTOS

Bianor Domingues 1
Amado de Paula da Silva 2

1. Enquanto aluno do ensino fundamental e médio, paradesporto, ou desporto adaptado, desde 1982, como
quais foram suas vivências na educação física esco- atleta.
lar? Em 1984, tentei fazer vestibular para Educação Física,
isto porque senti-me motivado devido ao fato de ter con-
Bianor: seguido índice para participar das Paraolimpíadas daquele
No primeiro grau, ( ensino fundamental ) não houve ano, mas fui barrado por causa do teste de aptidão física.
nenhum tipo de contato com quaisquer atividades espor- Em 1991, com a extinção do teste de aptidão física, os
tivas, pois tudo era feito na base de atestado médico, ou professores Alberto Martins Costa e Apolônio A. do Carmo
seja, eu era dispensado das aulas de Educação Física. me procuraram e me perguntaram se eu gostaria de fazer
No segundo grau, ( ensino médio) comecei a participar o curso de Educação Física, na Universidade Federal de
das aulas de Educação Física, por intermédio de um pro- Uberlândia. Então, eu lhes disse que se fosse para enfren-
fessor dessa área, que me perguntou se eu gostaria de pra- tar a maratona do vestibular, novamente, eu não queria.
ticar atletismo, com a finalidade de desenvolver a minha Assim, como já tinha concluído o curso superior de Biolo-
marcha. Foi assim que começou meu interesse pela Educa- gia, entrei para a faculdade de Educação Física como por-
ção Física Especial. Para isto, bastou alguém oferecer uma tador de diploma de área afim.
oportunidade, o que é fundamental para todo aluno, seja
ele portador de deficiência ou não. 3. Destaque em seu processo de formação os pontos
positivos e negativos, até chegar a sua atuação pro-
Amado: fissional atual na área?
A minha vivência na Educação Física escolar foi prati-
camente nula. Só no ensino Médio é que algum professor Bianor:
me colocava para fazer observações e anotações ou arbi- Não tenho muito o que destacar; só a dizer que hoje
tragem enquanto acontecia a aula. Era de se esperar que em dia, infelizmente, em pleno século XXI, o processo de
isto acontecesse, pois a Educação Física escolar seguia a formação dos nossos alunos, nos cursos de graduação, ainda
corrente militarista e os professores não sabiam como agir está muito longe do ideal de propiciar informações acerca
diante de um aluno com deficiência física. das pessoas com necessidades educacionais especiais, tais
como:
2. O que o levou / motivou a optar pelo curso de Edu- 3 a postura ou atuação do professor diante do aluno com
cação Física? deficiência;
3 o conhecimento de quais os fatores fundamentais para
Bianor: a promoção do desenvolvimento social desses alunos,
Esta pergunta é o carro-chefe das minhas apresenta- considerando a realidade desse grupo, que até então
ções, e, todas as vezes que eu respondo acho algo de novo era tido como diferente.
nela! Eu, particularmente, acho que a UnB perdeu uma gran-
Costumo ouvir das pessoas: “Como!” “ E porque não? de chance de desenvolver um projeto pioneiro, na área de
Pelo fato de eu ser uma pessoa com deficiência?” Pergun- Educação Física Especial, pois fui o primeiro caso de aluno
to, em seguida. Acho esse motivo muito fraco para deixar com Lesão Cerebral, na América Latina, a ingressar em um
de fazer o que eu quero ou deixar de fazer o que tenho curso superior na área de Educação Física.
absoluta certeza de que posso fazer. Cursar a habilitação Os pontos negativos e positivos dessa relação foram
de Educação Física, além de ser um desafio pessoal venci- de acordo com todo o contexto no qual eu estava inserido,
do, foi a quebra de mais um dos paradigmas errôneos, mas, com certeza, tanto eu como a Faculdade de Educa-
sobre questões relacionadas às pessoas com deficiência, ção Física da UNB perdemos muitas oportunidades de cres-
em nossa sociedade. cermos juntos dentro desse contexto bem diferenciado, e
Atualmente, o binômio curso de Educação Física X alu- uma das causas foi a falta de preparo da instituição.
no com deficiência não é mais Incompatível. A meu ver,
este falso paradigma caiu. Amado:
No meu processo de formação existem algumas passa-
Amado: gens que, se pudesse, eu riscaria da minha vida porque
É interessante este processo, pois sempre quis fazer me- deixaram cicatrizes profundas, as quais não gosto nem de
dicina, mas como não consegui passar nos quatros vesti- lembrar. Citarei algumas, porém, sem muitos detalhes: no
bulares que fiz para medicina, então no quinto vestibular primeiro período da Faculdade um grupo de alunos foi até
fiz para Ciências Biológicas, que concluí em 1988. o Laboratório de Anatomia e falou que o curso de Educa-
Antes de ingressar na faculdade eu já praticava o ção Física já não era o mesmo, uma vez que um aluno

43
DEPOIMENTOS
como eu “deficiente” estava matriculado no curso e este Adaptada, sendo que ela ainda é optativa, e não obrigató-
não era destinado para aleijado. O dia que isso aconteceu, ria.
foi como se o mundo tivesse caído sobre minha cabeça. Tive que fazer meu estágio fora da UnB, isto é, no Cen-
Cheguei em casa fui para o meu quarto, e chorei, falei para tro de Treinamento em Educação Física Especial (CETEFE),
mim mesmo que nunca mais voltaria à Faculdade, no en- uma Instituição filantrópica, voltada para o atendimento
tanto, no dia seguinte, quando acordei, pensei “eu não ao aluno com deficiência e à capacitação de professores
posso abandonar o curso, porque é isso o que eles que- em Educação Física Especial.
rem, e eu teria que mostrar exatamente o contrário , isto é,
tinha que mostrar-lhes que eu era capaz”. Amado:
Outro acontecimento marcante foi quando fiz a disci- Sim, porque passei por todas as disciplinas como to-
plina rítmica e os meus colegas não me aceitaram no gru- dos os alunos, talvez até com mais competência, devido
po. Ao final do semestre, como avaliação final, teríamos eu ter que estudar mais que os outros, uma vez que mui-
de apresentar uma coreografia e eles achavam que eu não tas vezes eles ficavam envolvidos só com a prática.
seria capaz de interagir com o grupo e, muito menos, du- As dificuldades encontradas foram, e ainda são:
rante a execução da coreografia. Então, o professor pro- 3 barreiras arquitetônicas; e
pôs-me que eu montasse um exercício solo. Não aceitei. 3 preconceitos por parte das pessoas não esclarecidas.
Disse-lhe que se fosse para fazer uma atividade física dife- Não creio que tenha tido mais facilidades pelo fato de
rente dos demais alunos, eu não poderia continuar fre- ser uma pessoa com deficiência, sempre fui tratado como
qüentando o curso, ou seja, o curso estaria sendo uma os demais alunos.
farsa.
Ainda hoje, a dificuldade de alguns professores para 5. Qual tem sido sua receptividade no mercado de tra-
adaptar as aulas de Educação Física, para uma pessoa com balho?
deficiência, é muito grande.
Outro ponto muito frustrante era quando as pessoas Bianor:
me perguntavam qual curso eu fazia. Quando eu lhes res- Apesar de estar um pouco afastado da Educação Físi-
pondia que estava cursando Educação Física, elas se mos- ca, uma vez que estou atuando na área de Educação Espe-
travam bastante surpresas, e exclamavam: ” Mas como?” cial, sempre que eu tenho a oportunidade de entrar em
Vocês sabem o que isso significa, não preciso explicar. uma sala de aula, para falar sobre a minha história, é uma
Se dentro da universidade tive problemas com preconcei- experiência muito importante, pois consigo “desestabilizar”
tos, imagine no mercado de trabalho. Estes foram alguns cada um dos alunos, que, na maioria das vezes, está den-
pontos negativos, entre muitos outros, os quais não vale a tro do seu “mundinho”, com respostas prontas, e com seus
pena serem relatados. “preconceitos” já estabelecidos.
Gostaria de destacar os inúmeros pontos positivos. O Percebo que a nossa fala provoca um grande impacto,
mais relevante foi o fato de ter mostrado que a pessoa em relação ao modo de vida cada um, mudando a ótica que
com deficiência é capaz de se realizar como pessoa e como essas pessoas têm a respeito de várias questões relacionadas
profissional e, também, a oportunidade de ter contribuído com os portadores de deficiência.
para a quebra de preconceitos e estigmas em relação à
pessoa com deficiência. Amado:
Tive muito apoio de colegas e professores que acredi- Tem sido como todo profissional no início de carreira,
taram no meu potencial e que eu era capaz, mesmo sa- apesar de, muitas vezes, encontrar alguém que duvide da
bendo das minhas limitações. Muito importante, também, minha capacidade profissional. Podemos destacar, também,
foi o apoio da minha família, e dos amigos, que sempre a falta de oportunidades no mercado de trabalho.
me incentivaram nas minhas decisões. Quanto aos alunos, minha relação com eles é normal.
Todos esses fatores colaboraram para que eu tivesse Um fato interessante é que com os alunos não tenho tido
força e coragem para continuar até o fim do curso e para o problemas de preconceitos e estigmas.
meu crescimento pessoal e profissional.

4. O curso de formação em Educação Física propor-


cionou-lhe competência para atuar no exercício
profissional ?

Bianor:
Não como eu esperava, já que o curso é voltado para
os alunos considerados normais, deixando de oferecer mais
oportunidades para os alunos com deficiência.
1
Adquiri os conhecimentos teóricos e práticos do curso Professor da Universidade de Brasília/DF e da Secretaria
de Educação Física sem problemas, porém todas as vezes de Educação do Distrito Federal.
em que eu precisei de conteúdos mais específicos, princi- E-mail:bianor@fe.unb.br
palmente sobre Educação Física Especial ou, como é co-
2
nhecida em nossa área, Educação Física Adaptada, tinha Biólogo e professor de Educação Física da Secretaria Esta-
que pesquisar por conta própria. dual de Educação/Uberlândia /MG. Presidente da Associa-
O curso de Educação Física da Universidade de Brasília ção dos Paraplégicos de Uberlândia/APARO.
oferece somente uma disciplina na área de Educação Física E-mail:amadslv@aol.com

44
Governo do

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