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3a PARTE

DO
ADIMPLEMENTO
E
EXTINÇÃO
DAS
OBRIGAÇÕES
12
DO PAGAMENTO

12.1 – CONSIDERAÇÕES INTRODUTÓRIAS

Todas as relações jurídicas de natureza obrigacional, em


sua trajetória pelo mundo jurídico, nascem, desenvolvem-se e se
extinguem. E nessa evolução, duas fases se destacam: 1) a fase do
dever, da obrigação propriamente dita. É o momento em que o
devedor assume o dever de realizar a prestação; 2) a fase da
liberação da obrigação assumida. É o momento do adimplemento,
do cumprimento da obrigação.
A obrigação se extingue quando há o cumprimento da
prestação com o fim de liberar o devedor. E se extingue de
diversos modos, consoante explica Clóvis Beviláqua: “a)
pagamento direto ou execução voluntária da obrigação; b)
pagamento indireto pela dação em pagamento, novação,
compensação, transação, confusão, remissão; c) extinção sem
pagamento: pela prescrição; pela impossibilidade de execução sem
culpa do devedor; pelo advento da condição ou do termo extintivo;
d) execução forçada, em virtude de sentença”23.
O pagamento não é o cumprimento coativo da obrigação,
mas sim, um meio normal de extinção das obrigações. Paga-se, por
exemplo, quando se entrega a coisa prometida ou quando há o

23
Ob. cit., p. 66.

77
término de uma obra, ou ainda, quando há a entrega de uma
importância em dinheiro.

12.2 – QUADRO SINÓTICO DOS MODOS DE


EXTINÇÃO DAS OBRIGAÇÕES, SEGUNDO
CLÓVIS BEVILÁQUA

12.3 – CONCEITO DE PAGAMENTO

Representam formas de pagamento a entrega ou a


restituição de certo bem imóvel ou móvel (obrigação de dar); a
realização de certa tarefa (obrigação de fazer); ou ainda, a
abstenção de um fato (obrigação de não fazer). Um comerciante
que, alienando um estabelecimento, se compromete a não abrir
outro congênere na mesma cidade, estará cumprindo
voluntariamente sua obrigação (pagamento) enquanto não negociar
com o ramo de negócio em questão. Também estará efetuando
pagamento, o vendedor que entregar um trator a uma fazenda, de
acordo com o prometido.
A expressão “pagamento” é empregada como sinônimo de

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cumprimento, de adimplemento, de execução ou de solução da
obrigação.

12.4 – PESSOA QUE EFETUA O PAGAMENTO

A obrigação só se extingue quando há o cumprimento da


prestação pelo devedor É ele quem deve pagar.

12.4.1 – Pagamento efetuado por qualquer interessado na


extinção da dívida

“Qualquer interessado na extinção da dívida pode pagá-


la, usando, se o credor se opuser, dos meios conducentes à
exoneração do devedor” (CC, art. 304). Portanto, um terceiro que
tenha interesse na solução da obrigação pode efetuar o pagamento,
mas a dívida não se extingue. Ou seja, a dívida se extingue apenas
em relação ao credor, pois ela continua existindo por força da sub-
rogação entre o devedor principal e o terceiro interessado que
efetuou o pagamento.

12.4.2 – Pagamento efetuado por terceiro não-interessado

O terceiro não-interessado é completamente alheio à


relação obrigacional existente entre o devedor e o credor e quando
paga a dívida em nome e por conta do devedor, é tido como gestor
de negócio ou representante do devedor, no entendimento do
saudoso Prof. Orlando Gomes24.
A lei autoriza o “terceiro não-interessado” a pagar a dívida
em nome do devedor, porém tem direito a reembolsar-se do que
pagar; mas não se sub-roga nos direitos do credor (CC, art. 305).

12.4.3 – Pagamento efetuado por terceiro não interessado


com oposição do devedor

24
Ob. cit., p. 119.

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Na hipótese do pagamento ser realizado por terceiro,
sendo que tal pagamento não é do interesse do devedor, por lhe
assistir justo motivo para que não seja feito, insurgindo-se até
contra tal pagamento, e mesmo assim o terceiro a efetua, não terá
ele direito a reembolso algum senão da quantia que possa ter
ocasionado proveito ao devedor. Por exemplo: Fernando Rafael é
credor de Paulo Sérgio da importância de R$ 100.000,00, dívida
vencida. Patrícia, ciente da dívida, comunica a Paulo Sérgio que
vai resgatar a dívida, para poupar-lhe dissabores com uma ação
judicial. Este, porém, se opõe a que o pagamento seja feito, porque
Fernando Rafael também lhe é devedor de certo número de
cabeças de gado, cujo acerto de contas está por ser feito. Mesmo
assim, Patrícia, efetua o pagamento. Levado a efeito,
posteriormente, o acerto de contas com a avaliação do gado
vendido, constatou-se que o preço dos animais era de R$
80.000,00. Paulo Sérgio, portanto, só estará obrigado a reembolsar
Patrícia da importância de R$ 20.000,0025.

12.5 – AQUELE A QUEM SE DEVE PAGAR

É importante saber a quem o solvens deve efetuar o


pagamento, pois há o velho ditado: quem paga mal, paga duas
vezes.
O pagamento deve ser feito, como regra, diretamente ao
credor ou ao seu representante legal: “O pagamento deve ser feito
ao credor ou a quem de direito o representa, sob pena de só valer
depois de por ele ratificado, ou tanto quanto reverter em seu
proveito” (CC, art. 308).
a) No caso especial de o pagamento não ter sido feito
diretamente ao credor, é preciso que haja a ratificação posterior
por parte deste. Ratificação significa confirmação, comprovação
do recebimento. Se o devedor, por exemplo, provar que entregou o

25
Exemplo baseado em Levenhagem, Direito das Obrigações Comentado, Atlas,
S. Paulo, vol. 4, p. 94

80
produto do pagamento ao credor, equivale a uma ratificação tácita.
b) A lei condiciona a validade do pagamento realizado ao
não credor à verificação de que o produto do pagamento reverteu
em benefício do próprio credor. Analise o exemplo fornecido por
Silvio Rodrigues: “Se a prestação devida pelo marido à mulher
desquitada foi paga ao filho menor e se este, com referidos
recursos, liquidou a anuidade de seu colégio (despesa que de outro
modo deveria ser efetuada por sua mãe), esta beneficiou-se com o
pagamento”26.

12.5.1 – Pagamento feito de boa-fé ao credor putativo

O credor putativo, leciona Clóvis Beviláqua, “é aquele


que, aos olhos de todos passa pelo verdadeiro credor”27. É o caso,
por exemplo, do pagamento realizado pelo locatário ao antigo
locador, depois da venda do prédio locado.
Provando o inquilino que ignorava a transferência da
propriedade, tem-se que este agiu de boa-fé. Tudo dependerá dessa
prova e da aparência fundada do credor. “O pagamento feito de
boa-fé ao credor putativo é válido, ainda provado depois que não
era credor” (CC, art. 309).

12.5.2 – Pagamento feito ao credor incapaz

Se o pagamento for feito ao absolutamente incapaz, o ato


de quitar é nulo de pleno direito.
Se o pagamento é realizado à pessoa relativamente incapaz
sem estar acompanhado de seu representante legal, o ato é
anulável. “Não vale o pagamento cientemente feito ao credor
incapaz de quitar, se o devedor não provar que em benefício dele
efetivamente reverteu” (CC, art. 310).

26
Ob. e vol. cits., p. 136.
27
Ob. cit., p. 72.

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12.5.3 – Pagamento efetuado ao credor cujo crédito foi
penhorado

“Se o devedor pagar ao credor, apesar de intimado da


penhora feita sobre o crédito, ou da impugnação a ele oposta por
terceiros, - diz o art. 312 do CC - o pagamento não valerá contra
estes, que poderão constranger o devedor a pagar de novo,
ficando-lhe ressalvado o regresso contra o credor”.
Por exemplo, se “A” deve a “B” e o crédito deste foi
penhorado por “C”, este intima “A” da penhora. Vencida a dívida,
“A” paga a “B”, “C” poderá exigir de “A” que pague de novo,
ficando, porém, ao “A” garantido o direito de regresso contra “B”,
que recebeu indevidamente o seu crédito.

12.6 – OBJETO DO PAGAMENTO

Toda obrigação tem em mira uma prestação, seja ela de


dar, fazer ou não fazer alguma coisa. Tudo aquilo que foi avençado
entre o devedor e o credor é o objeto da prestação. Nada mais,
nada menos. O credor não está obrigado a receber outra coisa a
não ser aquilo que foi acordado, ainda que a coisa seja de maior
valor. “O credor não é obrigado a receber prestação diversa da
que lhe é devida, ainda que mais valiosa”, diz o art. 313 do CC. O
pagamento deve, pois, coincidir com a coisa devida e o devedor só
se libera da obrigação quando pagar integralmente o débito.

12.7 – PROVA DO PAGAMENTO

“O devedor que paga, tem direito a quitação regular, e


pode reter o pagamento, enquanto não lhe seja dada”(CC, art.
319). Significa que, sem a quitação regular, não há prova de
pagamento.
Chama-se quitação todo ato pelo qual o credor ou seu

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representante atesta o pagamento. Se o pagamento foi feito em
dinheiro, deve a quitação ser por instrumento particular, o qual
designará o valor e a espécie da dívida quitada, o nome do devedor,
ou quem por este pagou, o tempo e o lugar do pagamento, com a
assinatura do credor, ou do seu representante (CC, art. 320).
“Quando o pagamento for em quotas periódicas, a
quitação da última estabelece, até prova em contrário, a presunção
de estarem solvidas as anteriores” (CC, art. 322).
“A entrega do título ao devedor firma a presunção do
pagamento” (CC, art. 324).

12.8 – DO LUGAR DO PAGAMENTO

A Revista dos Tribunais, volume 458, pág. 84, publicou a


seguinte situação: um fazendeiro vende a outro, residente e
domiciliado em município distante, um trator usado, fornecendo-
lhe simples recibo, sem promessa de entrega.
Dias depois, o comprador notifica, por escrito, o vendedor,
para que este entregue o veículo dentro de certo prazo; não sendo
atendido, propõe ação pleiteando a entrega ou a restituição do
dinheiro dado em pagamento, acrescido de perdas e danos.
O vendedor, então, contesta, argumentando que o
comprador é quem não efetuara a retirada do trator.
O Tribunal, finalmente, decidiu pela improcedência da
ação por entender que a retirada do objeto competia ao comprador,
por sua conta, na localidade onde se efetuara a venda, sendo
indiscutível a sua incursão em mora. Eis a ementa: “Se não se
ajustou que o vendedor deve entregar a coisa no domicílio do
comprador, a este cabe retirá-la”.
Se o recibo indicasse o lugar da entrega, como sendo o
lugar do domicílio do comprador, aí dever-se-ia respeitar a vontade
das partes, considerada lei entre elas. Como nada foi pactuado,
nem explícita ou implicitamente existiu qualquer convenção entre
as partes no sentido de que a entrega fosse no domicílio do
comprador, este deveria ir buscar o bem que comprara, como

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determina o art. 327 do Código Civil, in verbis: “Efetuar-se-á o
pagamento no domicílio do devedor, salvo se as partes
convencionarem diversamente, ou se o contrário resultar da lei,
da natureza da obrigação ou das circunstâncias”.

12.8.1 – As partes podem convencionar o lugar do


pagamento

No domicílio do devedor é a regra, podendo as partes


convencionarem outro lugar para o pagamento.

12.8.2 – O lugar do pagamento de acordo com as


circunstâncias do negócio

Elucidativo o exemplo fornecido por Levenhagen: “Pedro


contrata com Evaristo realizar determinado serviço específico e
que só pode ser executado num determinado maquinário assentado
na fábrica de Pedro, e impossível de ser removido. Está evidente -
explica o saudoso autor - embora seja omisso o contrato - que o
serviço a ser prestado por Evaristo só o poderá ser na fábrica de
Pedro”28. Portanto, as circunstâncias do negócio indicam que o
pagamento será onde a prestação deverá ser realizada.

12.8.3 – O lugar do pagamento de acordo com a natureza


da obrigação

Muitas vezes, a própria natureza do negócio, por si só,


indica o lugar do pagamento. Como exemplo, servimo-nos do
oferecido por Levenhagen: uma companhia construtora contrata
com uma prefeitura a construção de uma estrada em determinado
lugar. E finaliza: “Claro está que essa obrigação assumida pela
companhia - embora não explícita no contrato - só poderá ser
cumprida no local onde a estrada deve ser construída”29.
28
Ob. e vol. cits., p. 108.
29
Ob. e vol. cits., p. 108.

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12.8.4 – Quando a própria lei indica o lugar do
pagamento

Examinemos esta decisão: “segundo expressa


determinação da lei cambiária, o título será pago no lugar nele
previsto, não podendo a ação de cobrança ser proposta em lugar
diverso” (in RT 470/153). Esta decisão originou-se de uma ação
executiva contra o avalista que residia em lugar diferente daquele
indicado no título, para seu pagamento. Apesar do credor propor
ação no domicílio do avalista, este argüiu exceção de
incompetência, baseado no artigo 54, § 2.º, da Lei Cambiária que
diz: “Será pagável no domicílio do emitente a nota promissória
que não indicar o lugar do pagamento”.

12.9 – DO TEMPO DO PAGAMENTO

Fixada a data do pagamento, somente no dia seguinte ao


vencimento é que a dívida se torna exigível, visto que o dia do
vencimento pertence ao devedor até à meia noite. Somente este
pode antecipar o pagamento. Mas, no mundo dos negócios, essa
regra sofre exceção nos contratos. Por exemplo, se o lugar do
pagamento for em um banco, o marco final do dia do vencimento é
a hora do encerramento do expediente para o público.

12.10 – MODOS PELOS QUAIS SE DETERMINA O


VENCIMENTO DA DÍVIDA

12.10.1 – Havendo ajuste certo da época para o


vencimento

Havendo época certa para o vencimento, somente nesse


momento é que a obrigação deve ser cumprida. Entretanto, esta
regra sofre duas exceções: 1) antecipação do vencimento por
conveniência do devedor; 2) antecipação do vencimento por força
de lei.

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12.10.1.1 – Antecipação do vencimento por conveniência do
devedor

Considerando que o prazo é estabelecido em favor do


devedor este pode renunciá-lo, podendo efetuar antecipadamente o
pagamento.

12.10.1.2 – A antecipação do vencimento por determinação de lei

“Ao credor assistirá o direito de cobrar a dívida antes de


vencido o prazo estipulado no contrato ou marcado neste
Código: I – no caso de falência do devedor, ou de concurso de
credores; II – se os bens, hipotecados ou empenhados, forem
penhorados em execução por outro credor; III - se cessarem, ou
se se tornarem insuficientes as garantias do débito, fidejussórias
ou reais, e se o devedor, intimado, se negar a reforçá-las” (CC,
art. 333).

12.10.2 – Não havendo ajuste certo da época para o


vencimento

Se as partes não ajustaram data para pagamento, ao credor


assiste o direito de exigi-lo imediatamente.

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