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INTRODUÇÃO
Desde a década de 1970 a China vem demonstrando crescimento em seu Produto Interno
Bruto a níveis exorbitantes exibindo incrível capacidade e dinâmica econômica. Como um ator
de crescente relevância para as relações econômicas, a China tornou-se paulatinamente um
imprescindível elemento para as negociações nas demais relações englobadas pelo jogo político
internacional. Num mundo pós-crise de 2008 quando os Estados Unidos foram duramente
apunhalados pela Bolha do Mercado Financeiro, a China tornou-se iminente protagonista no
cenário internacional. A Hegemonia Americana, que prolongou seus anos dourados por
praticamente todo o século XX, parece evanescer-se deles cedendo o mais alto posto à emergente
milenar potência oriental.
Numa Ciência Social, portanto, incapaz de provar suas teorias em laboratórios, não é em
todos os dias que se encontra uma oportunidade como esta para as Relações Internacionais: o
cetro está para ser passado.
Como afirmar? Se a História se encarregou de provar que grandes certezas são tão voláteis
que podem ser frustradas pela alteração de uma única variável?
Mas como negar? Se os fatos comprovam a cada dia a aproximação econômica chinesa aos
Estados Unidos¹, a perda de Soft Power (influência) americano e a emergência de blocos
formados por países muitas vezes desprezados no jogo internacional, agora não mais vassalos
das grandes potências, antes, grandes exportadores, investidores e até credores?
Proponho por meio deste ensaio, discutir a respeito da possibilidade de ascensão chinesa ao
topo da Economia Mundial, e, com isso, sua assunção da liderança política no Sistema
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Internacional fundamentando-me nos argumentos de teóricos Institucionalistas Liberais,
Neorrealistas e Construtivistas Sociais.
Segundo Josef Nye, o poder global deve ser analisado como um jogo de xadrez
tridimensional² sendo o tabuleiro “de cima” o que retrata o poder militar; o do meio, aquele que
se refere às relações econômicas; e o mais baixo, mais complexo, o que “retrata as Relações
Internacionais legais e ilegais entre pessoas e instituições, estas fora do controle dos governos”³.
A partir das análises destes dois grandes teóricos do campo de estudo, podem-se inferir duas
conclusões no que se refere ao poder militar: Primeiro: ele se encontra somente na superfície do
poder, detê-lo não significa, numa perspectiva não-realista, a hegemonia do sistema
internacional. Segundo: uma vez que as relações entre os estados têm sido realizadas de uma
maneira cada vez menos belicosa, o poderio militar deixa de ter a utilidade que teria em um
estado de guerra, como no caso das Grandes Guerras Mundiais.
O poder econômico, por outro lado, engendra tendências que não podem ser desprezadas no
jogo político internacional. A nação mais proeminente economicamente pode, segundo Keohane
e Nye, ser menos dependente das demais, pois chega a possuir mais controle sobre resultados,
uma vez que detém recursos políticos relevantes; pode alterar a estrutura sistêmica afetando a
distribuição das capacidades, segundo Keneth Waltz; e é capaz de produzir ideias que, segundo
os autores do Construtivismo Social, exercem um papel crucial na formulação dos interesses dos
Estados.
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A PERSPECTIVA DO INSTITUCIONALISMO LIBERAL
Segundo Keohane e Nye5, o ator que possuir maior número de recursos políticos numa
relação entre estados, será menos dependente, uma vez que quaisquer mudanças na relação
interestatal terão um custo menor para ele. Este país é, portanto, menos vulnerável às
alternâncias do jogo político internacional.
A ascensão econômica chinesa, assim, acaba por proporcionar visibilidade política, uma vez
que fatores políticos e econômicos estão presentes nas Agendas dos países e podem ser
interligados. Nas palavras dos autores, “governos crescendo em força podem politizar assuntos
(issues), ligando-os a outros”8. Destarte, o poder econômico Chinês pode propiciar-lhe a
capacidade de determinar assuntos a serem discutidos na agenda internacional.
Uma vez no papel de protagonista econômico, o poder chinês poderia determinar os assuntos
a serem discutidos, sendo estes aqueles os quais detém maior poder de barganhar com outros
países. Nestas circunstâncias, a China conquistaria o chamado poder de controlar resultados, fato
teorizado pelos autores, conquistando cada vez mais, menor dependência e vulnerabilidade.
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A PERSPECTIVA DO NEORREALISMO
Poder, em uma perspectiva realista, necessariamente engendra capacidade militar, uma vez
que o Sistema Internacional é formado por países em constante estado de guerra e que todos
devem estar preparados para utilizar seus arsenais ou “viver à misericórdia de vizinhos mais
vigorosos”12.
A História por si só provou que a ascensão econômica de uma nação é acompanhada por sua
estruturação e desenvolvimento militar. A China, já em Março de 2008 anunciou aumento de
investimento em sua capacidade militar13 e desde 2006 o Pentágono, a sede do Departamento de
Defesa estadunidense, admite que a China é “o primeiro grande rival militar, capaz de desafiar
Washington com as mesmas armas, com maior poderio do que a Rússia e a Índia”14.
A China ainda permanece muito distante do poder militar dos Estados Unidos da América,
contudo, como afirmado na parte introdutória deste ensaio, discuto a respeito da possibilidade de
ascensão chinesa; considero, portanto, a tendência que nos são implícitas pelos dados
disponíveis. Em 1974, a China ocupava a oitava posição do Produto Interno Bruto entre os
países, com um pouco mais do que 40 milhões de dólares a mais do que o Brasil e o PIB
estadunidense era mais do que dez vezes superior ao da China15, hoje, os Estados Unidos, país
que mais investiu em armamentos militares nas últimas décadas, determinante nos resultados da
Primeira e Segunda Guerra Mundial admite o perigo do crescimento chinês nos investimentos
armamentistas como possível futuro rival militar.
Pode-se afirmar que existe uma grande possibilidade de a Potência Oriental tornar-se tão
econômica quanto militarmente superior aos Estados Unidos se considerada a tendência que os
dados perscrutam.
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A assunção da China do posto de potência militar, segundo a lente neorrealista, provocaria
alterações na distribuição das capacidades das unidades e consequente mudança no sistema
internacional com o nascimento de um novo país hegemônico.
As ideias difundidas assumem papel relevante na formação dos interesses dos Estados
segundo esta perspectiva analítica. As interações domésticas somadas às internacionais moldam
as identidades nacionais, que são determinantes para a formação dos interesses de cada Estado.
Esses interesses dependem, segundo Alexander Wendt, do Processo de interação dos atores
mais do que da estrutura anárquica do sistema16. O Processo referido se estabelece por conta das
ações, interpretações (dependentes das identidades nacionais) e reações dos envolvidos. À
medida que os Estados interagem, constrói-se constantemente um “aglomerado” de ideias
divididas, chamado de “cultura” pelo autor17.
A estrutura capitalista se consolidou no mundo pós Guerra Fria como o sistema econômico
dominante entre os países do globo. Pode-se dizer que, para a maioria dos países, as negociações
econômicas ocorrem via trocas comerciais, fluxos monetários e não instituição ditatorial e
restritiva dos governos devido à legitimação desta estrutura como inerente à cultura global.
Ora, se a cultura global é formada a partir das interações entre os estados, um país que
interage mais com os outros tende a deter maior poder influente no número de ideias difundidas
que compõem a cultura em questão. Destarte, a China como proeminente ator nas Relações
Internacionais, tenderá a crescentemente possuir maior peso na construção das ideias divididas e
difundidas.
Este quadro, na verdade, não representa nada original em uma perspectiva internacional.
Como exemplo, “os impérios sempre têm ou se atribuem uma missão em favor da
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humanidade”18, os Espanhois tentaram cristianizar o mundo; os ingleses, civilizá-lo pelo “fardo
do homem branco”; os estadunidenses guerrearam o século XX em nome da Democracia e dos
Direitos Humanos. O que essas nações têm em comum é o alto nível de influência em relação
aos demais países graças à relevância econômica que cada um possuiu na época em que
constituíram os “grandes impérios” do mundo.
Não infiro que a China desenvolverá um novo jargão político para instituir o que pensa
como regra geral a ser admitida caso alcance o poder máximo internacional. Ela ainda passa por
um processo de mudanças institucionais no que se refere aos parâmetros políticos e sociais
adotados em seu país. Suas ideias, contudo, tendem a crescer em relevância e a tomar grande
parte construtora da cultura global, como mais relevante, mais influente, mais hegemônica.
CONCLUSÃO
O cientista político Mixin Pei argumenta que a China não regulará o mundo19 e que
permanece discreta na liderança internacional.
A China permanece discreta na liderança internacional, mas nada indica perpetuidade dessa
postura. Como ocorreu com os Estados Unidos, o interesse chinês poderá ser alterado em direção
a mais atividade nas negociações. Outro fator a ser considerado, é que hoje há uma tendência à
assunção chinesa do papel de potência, o que não significa que a China já o tenha. Os Estados
Unidos ainda possuem o maior poder de influência nas negociações internacionais, mas, como
afirmaria Durrosele: “Tout Empire Périra”20.
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
1. PETTY, A. O Eclipse do Poder Imperial. Revista Veja, São Paulo, p. 187, 1 de Dezembro de 2010
2. IDEM, p. 194
3. IDEM
4. ZAKARIA, F. The Roots of Stability. Newsweek. Nova Iorque, p. 8, Dezembro de 2009 – Fevereiro de
2010
5. KEOHANE,R. e NYE, j.. Power and Interdependence. 2 ed. Nova Iorque: HarperCollinsPublishers.
6. IDEM, p.8
7. CHADE, Jamil. China é a maior exportadora do mundo, diz OMC. 25 de Agosto de 2009,
<http://www.estadao.com.br/noticias/economia,china-e-a-maior-exportadora-do-mundo--diz-
omc,424220,0.htm>, acesso em 28/01/2011.
8. KEOHANE, R. e NYE, J. Power and Interdependence. 2 ed. Nova Iorque: HarperCollinsPublishers, p. 8.
Tradução Própria.
9. WALTZ, Kenneth. Theory of International Politics. Primeira edição. Nova Iorque: McGraw-Hill, 1979,
p. 93.
10. IDEM, p.97, tradução própria.
11. IBIDEM, p. 98, tradução própria.
12. IBIDEM, p. 102, tradução própria.
13. WENTZEL, Marina. China anuncia aumento de 17,6% nos gastos militares. 4 de Março de 2008.
<http://www1.folha.uol.com.br/folha/bbc/ult272u378373.shtml>. Acesso em 27/01/2011.
14. EUA temem poder militar da China. Jornal de Notícias, 02 de Maio de 2006.
<http://www.jn.pt/paginainicial/interior.aspx?content_id=535263> Acesso em 27/01/2011
15. Dados Públicos.< http://www.google.com/publicdata?ds=wb-
wdi&met=ny_gdp_mktp_cd&idim=country:BRA&dl=pt-BR&hl=pt-
BR&q=pib+brasil#met=ny_gdp_mktp_cd&idim=country:BRA:CHN:USA> Acesso em 27/01/2011.
16. WENDT, A. Anarchy is What States Make of It..In: International Organization. vol. 46, no. 2. Londres:
Cambridge University Press, 1992.
17. WENDT, A. Social Theory of International Politics. Londres: Cambridge University Press, 1999, p. 249.
18. PETTY, A. O Eclipse do Poder Imperial. Revista Veja, São Paulo, p. 191, 1 de Dezembro de 2010
19. PEI, M. Why China Won’t Rule the World. Newsweek. Nova Iorque, p. 16, Dezembro de 2009 –
Fevereiro de 2010
20. Duroselle, Jean-Baptiste. Tout empire périra. Théorie des relations internationales, Paris, Publications de
la Sorbonne, 1981.