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Agravo de Instrumento n. 2010.

066048-1, de Seara
Agravante : Brasil Telecom S/A
Advogados : Drs. Wilson Sales Belchior (29708/SC) e outro
Agravado : Ministério Público do Estado de Santa Catarina
Promotor : Dr. Eduardo Sens dos Santos (Promotor)

DESPACHO

Trata-se de Agravo de Instrumento interposto por BRASIL TELECOM


S/A contra a decisão proferida pelo MM. Juiz de Direito da Vara Única da Comarca de
Seara que, nos autos da Ação Civil Pública n. 068.10.000669-5, movida pelo
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO, ora agravado, concedeu a antecipação dos
efeitos da tutela para determinar que a requerida/agravante, no prazo de 30 (trinta)
dias, restabeleça o sinal de telefonia para todos os consumidores rurais da comarca
de Seara, bem como migre todos os sistemas de telefonia TDMA para GSM, ou para
telefonia fixa, garantindo o adequado, eficiente, seguro e contínuo fornecimento do
respectivo serviço essencial, sob pena de multa no valor de R$ 50.000,00 (cinquenta
mil reais) por dia de atraso no cumprimento do provimento judicial.
Pugna pela concessão de efeito suspensivo e, ao final, o provimento do
recurso, com a reforma da decisão recorrida.
É o relatório.
O art. 525, inc. I, do CPC estabelece que a petição de agravo será
instruída, obrigatoriamente, com as cópias da decisão agravada, da certidão da
respectiva intimação e das procurações outorgadas aos advogados do agravante e do
agravado. Além disso, deverá a parte recorrente comprovar, no ato da interposição, o
pagamento do respectivo preparo, bem como do protocolo unificado, quando devido.
O recurso é tempestivo e foi instruído com os documentos
indispensáveis, relacionados no art. 525, inc. I, do CPC, e recolhido o respectivo
preparo, preenchendo, assim, os requisitos de admissibilidade.
A Lei n. 11.187/2005 alterou o art. 522 do CPC que regulamenta a figura
do agravo, trazendo como requisito obrigatório para o processamento do recurso na
sua forma de instrumento que a parte agravante comprove a possibilidade de vir a
sofrer lesão grave e de difícil reparação.
Desta forma, para que se possa conceder o almejado efeito suspensivo,
devem estar devidamente presentes no reclamo, os requisitos autorizadores
elencados no art. 558 do CPC, visto ser medida de extrema exceção.
No caso em tela, a possibilidade de a agravante vir a sofrer dano
irreparável ou de difícil reparação está configurado no fato de que a decisão
objurgada impôs obrigação extremamente onerosa à recorrente, sendo que, segunda
alega, a migração dos sistemas de telefonia não é de responsabilidade das
concessionárias, mas sim das delegatárias do serviço de telefonia celular.
Essa circunstância justifica o processamento do agravo na forma de
instrumento (CPC, art. 522, caput), bem como o periculum in mora, necessário para
tornar possível a concessão do almejado efeito suspensivo, nos termos do art. 558 do
mencionado diploma legal.
Resta averiguar se a fundamentação da agravante é relevante, plausível
e verossímil, acarretando não um juízo de certeza, mas de probabilidade acerca do
objeto da discussão. Assim, o fato narrado deve assegurar à recorrente, em tese, um
provimento de mérito favorável.
No caso em tela, por se tratar o presente recurso, de agravo de
instrumento, analisar-se-á, apenas, a legalidade da decisão guerreada, sem adentrar
no mérito da lide, que deverá ser decidido na ação principal em trâmite no Juízo a
quo, conforme elucidado com propriedade pelo eminente Des. Lucas Sávio Gomes, in
verbis:

Pelo sistema recursal adotado em nosso diploma processual civil, o agravo de


instrumento é o recurso próprio para combater as decisões interlocutórias, a teor do
seu artigo 522, por isso, as razões da parte terão, necessariamente, de cingir-se aos
fundamentos do decisório recorrido ou a seus aspectos formais, estando vedado
trazer à instância revisora toda a sua matéria de defesa, atinente ao direito material
debatido na lide principal, sob pena de conduzir ao não acolhimento do aludido
recurso. Agravo desprovido. (TJMG - Agravo de Instrumento n. 177.393-6.00, j. em
23/11/2000).

Na hipótese em análise, o Ministério Público do Estado ajuizou ação civil


pública em desfavor da requerida/agravante, objetivando seja esta compelida a
proceder a migração dos sistemas de telefonia da comarca de origem de TDMA para
GSM ou telefonia fixa.
Postulou a concessão de liminar, para o fim de determinar-se à
requerida/agravante que, no prazo de 30 (trinta) dias, restabeleça o sinal de telefonia
para todos os consumidores rurais da Comarca de Seara, notadamente aqueles
indicados, bem como migre todos os sistemas de telefonia TDMA da comarca para
GSM ou para telefonia fixa, garantindo qualidade e continuidade nos serviços, sem
qualquer custo para os consumidores, tudo sob pena de multa no valor de R$
10.000,00 (dez mil reais) por mês, para cada consumidor.
Após apresentação de defesa pela parte requerida/agravante, o
eminente Togado Singular deferiu o pleito antecipatório formulado pelo
autor/agravado.
Insurge-se a agravante contra tal decisum, suscitando, preliminarmente,
a ausência de legitimidade do Ministério Público e a inadequação da ação civil pública
para proteção de interesse que entende individual. Aduz, ainda, ser indevida a
concessão da liminar, vez que não preenchidos os requisitos legais.
Por fim, argumenta que a responsabilidade pela migração dos sistemas
de telefonia TDMA para GSM não é da concessionária do serviço telefônico fixo
comutado (STFC), mas sim das operadoras de telefonia móvel.
Inicialmente, cumpre destacar que a agravante é pessoa jurídica de
direito privado, concessionária de serviço público de telefonia.
Pela concessão, o Poder Público se desonera da prestação de serviços
públicos de sua titularidade, em relação aos quais não tem condições financeiras ou
não entende ser conveniente prestar diretamente. A sua prestação é transferida a um
agente privado que será remunerado, via de regra, pelas tarifas que os usuários lhe
pagarão em razão da fruição do serviço, mantendo o Estado a titularidade e os
controles públicos sobre ele.
Os serviços públicos concedidos à iniciativa privada não perdem a sua
natureza pública: à iniciativa privada é delegado o seu mero exercício, permanecendo
o serviço sob a titularidade estatal exclusiva, nos termos do artigo 175 da Constituição
Federal, in verbis:

Art. 175. Incumbe ao Poder Público, na forma da lei, diretamente ou sob


regime de concessão ou permissão, sempre através de licitação, a prestação de
serviços públicos.

Constata-se que a Brasil Telecom, ora agravante, firmou contrato de


concessão de serviços de telefonia com a União, por meio da Agência Nacional de
Telecomunicações - ANATEL, o qual está encartado às fls. 372/427 deste caderno
recursal.
Decorre, portanto, que a agravante está sujeita à observância das
normas e princípios que são inerentes ao regime jurídico dos serviços públicos,
merecendo destaque a Lei n. 8.987/95, que dispõe sobre o regime de concessão e
permissão da prestação de serviços públicos previsto no art. 175 da Constituição
Federal, e dá outras providências.
Dispõe o artigo 1º da Lei n. 8.987/95, que "as concessões de serviços
públicos e de obras públicas e as permissões de serviços públicos reger-se-ão pelos
termos do art. 175 da Constituição Federal, por esta Lei, pelas normas legais
pertinentes e pelas cláusulas dos indispensáveis contratos".
Dentre as regras aplicáveis aos contratos de concessão, destaca-se a
imposição da prestação do serviço de forma adequada, consoante estabelece o inciso
IV, do parágrafo único do artigo 175 da Constituição Federal:

Art. 175. [...]


Parágrafo único. A lei disporá sobre:
[...]
IV - a obrigação de manter serviço adequado.

Da mesma forma, prescreve o artigo 6º da Lei n. 8.987/95:


Art. 6o Toda concessão ou permissão pressupõe a prestação de serviço
adequado ao pleno atendimento dos usuários, conforme estabelecido nesta Lei, nas
normas pertinentes e no respectivo contrato.
§ 1o Serviço adequado é o que satisfaz as condições de regularidade,
continuidade, eficiência, segurança, atualidade, generalidade, cortesia na sua
prestação e modicidade das tarifas.

Outrossim, não há dúvidas que, hodiernamente, o serviço de telefonia é


considerado como serviço público essencial e, portanto, deve ser prestado de forma
contínua e adequada, em atenção ao preceito estabelecido no artigo 22 do Código de
Defesa do Consumidor, in verbis:

Art. 22. Os órgãos públicos, por si ou suas empresas, concessionárias,


permissionárias ou sob qualquer outra forma de empreendimento, são obrigados a
fornecer serviços adequados, eficientes, seguros e, quanto aos essenciais,
contínuos.
Parágrafo único. Nos casos de descumprimento, total ou parcial, das
obrigações referidas neste artigo, serão as pessoas jurídicas compelidas a
cumpri-las e a reparar os danos causados, na forma prevista neste código.

No caso sub judice, resta clara a violação aos preceitos constitucionais e


legais, em razão da inadequação do serviço prestado pela concessionária,
demonstrando-se escorreita a decisão proferida pelo MM. Togado Singular, que
deferiu a liminar pleiteada visando resguardar a prestação do serviço concedido de
forma adequada.
Outrossim, não se vislumbra verossimilhança nas alegações da
agravante quando afirma não ser responsável pela migração do sistema de telefonia.
O fato de a empresa concessionária do serviço telefônico fixo comutado
se utilizar de plataforma de rede de empresa de telefonia móvel, não é por si só,
argumento suficiente à concessão do almejado efeito suspensivo, vez que cabe à
recorrente buscar pelo meio cabível, se assim entender, que a operadora de telefone
móvel proceda às adequações necessárias.
Outrossim, a decisão objurgada determinou a migração do sistema de
telefonia ou, alternativamente, a instalação de telefonia fixa aos prejudicados.
Destarte, não havendo como a agravante proceder à migração do
sistema de telefonia TDMA para GSM, segundo afirma, deverá a mesma proceder a
instalação de linhas de telefonia fixa.
Logo, a recorrente não obteve êxito em demonstrar a alegada
impossibilidade do cumprimento da decisão judicial.
Neste ponto, vale transcrever parte de decisão proferida pelo Togado
Singular, posteriormente à decisão ora agravada, onde apreciou pedido de revogação
da liminar, obtida por meio do Sistema SAJ (Sistema de Automação do Judiciário):

É fato incontroverso nos autos que a empresa ré presta e cobra pelos serviços
de telefonia rural. Tal sistema consiste na utilização conjunta de redes de telefonia
fixa e móvel, ou seja, a telefonia rural é uma alternativa para quem trabalha ou mora
em local em que a operadora não possui linha telefônica convencional (área rural),
uma vez que, embora o aparelho seja fixo, a transmissão se dá pelo sistema móvel.
Tanto é que o objeto principal da presente demanda é resguardar a
manutenção do serviço de telefonia rural diante da extinção do sistema analógico de
telefonia móvel (tecnologia AMPS), alterando-o para o sistema GSM, pois, conforme
narra a exordial, estaria a ré deliberadamente prestando serviço ineficaz com o
propósito dos usuários requererem a extinção do serviço, o que afastaria a obrigação
da operadora de proceder à migração de tecnologia sem ônus aos usuários.
Portanto, a alegada impossibilidade de se dar cumprimento ao provimento
jurisdicional que concedeu a liminar requerida na inicial não procede, pois a ré, por
ser concessionária do serviço público de telefonia tem a obrigação legal de prestá-lo
de forma eficiente, segura e contínua, independentemente de qualquer contrato que
a ré tenha firmado com a empresa Vivo S.A, como bem ressaltou o representante do
Ministério Público (f. 507/518). [...]

Mister ressaltar, ainda, que o contrato de concessão estabelece que é


obrigação da concessionária "assegurar a todos os solicitantes e usuários do
serviço concedido a realização das instalações necessárias à prestação do
serviço, nos termos da regulamentação" (Cláusula 1.7. - fls. 372/427).
Outrossim observa-se que o capítulo VI, que trata dos critérios de
qualidade do serviço, reproduzindo texto de lei, traz a necessidade de adequada
prestação do serviço, a saber:

Cláusula 6.1. Constitui pressuposto da presente concessão a adequada


qualidade do serviço prestado pela Concessionária, considerando-se como tal o
serviço que satisfizer às condições de regularidade, eficiência, segurança,
atualidade, generalidade, cortesia e modicidade das tarifas.

Da mesma forma, a cláusula 7.1., do capítulo VII, estabelece a


continuidade do serviço como elemento essencial ao regime de sua prestação:

Cláusula 7.1. A continuidade do serviço ora concedido, elemento essencial ao


regime de sua prestação, será caracterizada pela não interrupção do serviço,
observada a suspensão por inadimplência do usuário nos termos do disposto na
cláusula 9.3 e no art. 3º, inciso VII, da Lei n.º 9.472, de 1997.

O contrato de concessão em comento fixa, ainda, metas de


universalização do serviço concedido, dentre as quais, destaca-se:

Cláusula 8.1. A universalização constitui traço essencial do regime de


prestação do serviço ora concedido e será caracteriza pelo atendimento uniforme e
não discriminatório de todos os usuários e pelo cumprimento das metas constantes
do Plano Geral de Metas de Universalização, anexo a este Contrato, aprovado pelo
Poder Executivo, nos termos dos art. 18, inciso III, e 80 da Lei n. 8.472, de 1997.
8.2. Os custos de implementação das metas de universalização constantes do
Plano Geral de Metas de Universalização, anexo a este Contrato, serão suportado
com recursos da Concessionária.

Além disso, como muito bem esclareceu o Magistrado Singular na


decisão agravada, "a ré, por ser uma concessionária desse serviço público de
telefonia, tem o dever de prestá-lo observando as normas cogentes da lei
consumerista, independentemente da situação individual de cada consumidor/usuário,
devendo sempre ser assegurado a este a adequação, eficiência, segurança e
continuidade necessárias às suas relações interpessoais.
Ainda que na mais longínqua localidade deve ser garantido ao
consumidor um serviço de telefonia eficaz e contínuo, sendo que questões de ordem
técnica não têm o condão de justificar vício no fornecimento.
A ré, ao aceitar a concessão desse tão importante serviço público,
assumiu a responsabilidade de cumpri-lo de acordo com a legislação vigente, não
podendo se eximir desse dever amparando-se em normas regulamentares e
administrativas, tampouco em relações contratuais com terceiros. [...]". (fls. 568/571).
Por fim, destaca-se que não cabe a apreciação das preliminares
suscitadas, neste momento de apreciação perfunctória do reclamo. Ademais,
observa-se que as questões mencionadas confundem-se com o mérito do recurso,
uma vez que influenciam diretamente no cerne da decisão vergastada, logo, deixa-se
a cargo do colegiado competente desta Corte para que decida, com maior amplitude,
o mérito recursal, já que "consoante o § 1º, do art. 12, do Ato Regimental n. 41/00
desta Corte, a Câmara Civil Especial possui atribuição para o julgamento dos pedidos
de efeito suspensivo e admissibilidade do agravo de instrumento. As questões
prejudiciais de mérito da ação principal somente poderão ser verificadas num
segundo momento, quando o recurso for redistribuído para as câmaras
especializadas [...]". (TJSC - Conflito de Competência n. 2004.002705-2, de São
Francisco do Sul, Rela. Desa. Salete Silva Sommariva, j. em 30/11/2005).
A propósito, extrai-se o seguinte trecho do corpo do v. aresto:

Com efeito, na admissibilidade do agravo de instrumento também deverão ser


observados os pressupostos processuais para o seu conhecimento. Todavia, não se
pode confundir tais pressupostos com os da ação principal. O que se dessume do
mencionado ato regimental é que a Câmara Civil Especial terá como atribuição o
julgamento dos pedidos de efeitos suspensivo e a admissibilidade do agravo de
instrumento, compreendido nela os pressupostos processuais do próprio agravo
(adequação, tempestividade, regularidade formal, preparo, capacidade, legitimidade
e interesse recursal). As prejudiciais de mérito da ação principal somente poderão
ser verificadas num segundo momento, quando o recurso for redistribuído para uma
das câmaras especializadas.

À vista desses argumentos, em exame de cognição sumária, apesar do


esforço da agravante, não há como se vislumbrar, claramente, relevância na
argumentação exposta, a ponto de se conceder o almejado efeito suspensivo, até
porque, convém lembrar, o interesse público se sobrepõe aos interesses individuais
da recorrente.
De qualquer forma, consigna-se ainda que a análise da matéria, para o
fim de concessão de efeito suspensivo, pela celeridade que lhe é peculiar, dispensa
digressão acerca de toda a temática que envolve os fatos, a qual merecerá o devido
exame por ocasião do julgamento do mérito.
Por fim, cabe salientar ainda que, nesta fase do recurso de agravo de
instrumento, a questão é apreciada apenas de forma superficial, a fim de verificar a
existência ou não dos requisitos necessários à concessão do efeito liminar pleiteado.
O entendimento deste Sodalício é o seguinte:

[...] Em sede de agravo de instrumento só se discute o acerto ou desacerto do


ato judicial hostilizado, não sendo viável o exame aprofundado de temas relativos ao
meritum causae (AI n. 99.017438-7, Des. Eder Graf), sob pena de supressão de um
grau de jurisdição. (TJSC - AI n. 2006.006683-1, de Lages, Rel. Des. Luiz Cézar
Medeiros, j. em 13/06/2006).

Ex positis, admite-se o processamento do agravo na sua forma de


instrumento e, nos termos do artigo 527, inciso III, do Código de Processo Civil,
indefere-se o efeito suspensivo postulado, mantendo-se, por ora, a decisão
agravada, até o pronunciamento definitivo da Câmara competente.
Comunique-se ao MM. Juízo a quo.
Cumpra-se o disposto no artigo 527, incisos V e VI , do Código de
Processo Civil.
Após, à redistribuição, nos termos do Ato Regimental n. 41/2000.
Publique-se.
Intime-se.
Florianópolis, 24 de fevereiro de 2011.

PAULO ROBERTO SARTORATO


RELATOR

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