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O BRASIL E A COPA DO MUNDO

Modelo, perspectivas, desafios e oportunidades


da Copa do Mundo FIFA 2014 para o Brasil.
RICARDO AZEVEDO

O BRASIL E A COPA DO
MUNDO
Para minhas filhas,
como tudo que faço nesta vida.
Sumário

Prefácio

Aquecimento

Capítulo 1 – A FIFA, o Brasil e a Copa

Para começar o jogo; Sediar um grande


evento; FIFA; João Havelange; A europeização e
a globalização do futebol; Joseph Blatter.

Capítulo 2 – A Copa do Mundo FIFA

Modelo do negócio; Mídia e patrocinadores;


Jérôme Valcke; Comércio e informalidade; Além
da legitimidade; Modelo operacional; Custos
operacionais; Exigências para o Brasil; Tripé
operacional; Matchday; Outros eventos
relacionados.

Capítulo 3 – Desafios brasileiros: um


difícil dever de casa

Os gargalos do desenvolvimento; Aportes


para as cidades; Mobilidade; Aeroportos;
Hotelaria.
Capítulo 4 – Perspectivas: a
necessidade de se prever o futuro

Dificuldades esperadas; Projeções


econômicas; Impacto na economia; O legado
material; Efeitos negativos; Forças brasileiras;
Medição do impacto; O Brasil e o case africano;
Legado imaterial; O Brasil e a brasilidade; O que
o mundo espera de nós; Grandes eventos.

Capítulo 5 – Novas arenas e as arenas


da Copa

As novas arenas; Os projetos nacionais;


Perfil das arenas modernas; Especificidades
para a Copa; Alemanha 2006; A experiência sul-
africana; Brasil 2014; O modelo americano; Os
impactos no marketing e no futebol brasileiro;
Diferenças entre números de Copa e
Olimpíadas.

Prorrogação
Prefácio do autor

A noite do dia 3 de julho de 2010 foi em clima


de fim de festa no salão de eventos do King Edward
Hotel, em Port Elizabeth, QG da TV Globo na cidade.
Repórteres, cinegrafistas e editores aguardavam na
já madrugada africana a hora do Jornal Nacional, que
traria, em muitas matérias, a derrota do Brasil na
Copa de 2010, horas atrás, para os Países Baixos,
mais conhecido como Holanda.

Apesar do clima de quase indiferença, como a


profissão requer, muitos ali, já se preparando para
voltar ao Brasil, sabiam que aquele país tinha
cumprido sua missão. A sede do maior torneio de
futebol do mundo tinha recebido muito bem equipes,
organização e turistas, grupo em que eu me
encaixava, apesar de ter viajado na intenção de
observar o que era a Copa fora do primeiro mundo.
Minha experiência na Alemanha em 2006 havia
servido para saber o outro lado.

No voo de volta para Johanesburg, o clima já


era melhor e o sol forte trouxe novos olhares para a
derrota brasileira. Mostrei para Alex Escobar,
personagem de um dos episódios de conflito do
técnico Dunga com a imprensa, que o imbróglio
estava estampado no jornal local daquele dia.
Fátima Bernardes, um dos rostos mais comuns nas
Copas para os brasileiros, estava sorridente e
distribuía simpatia para os colegas da equipe. Me
indicou um motorista na capital que ganhou sua
confiança durante sua estadia por lá. Pouco depois
de me despedir dela no desembarque, segui para o
Brasil levando duas vuvuzelas para minhas filhas e
algumas certezas sobre a Copa. Uma delas era que
estávamos com uma grande oportunidade nas mãos
em 2014.

Boa parte deste livro-reportagem foi escrito em


cima do oceano Atlântico durante as 10 horas do voo
de retorno ao Brasil. Memórias recentes e a
incontrolável animação por ter vivido uma
experiência interessante, sendo surpreendido
positivamente por um povo que tem muito a nos
ensinar com sua história, fizeram as palavras surgir
pouco a pouco na tela em branco de meu
computador.

O resultado disso está registrado nas páginas a


seguir. Assim, fica aqui um convite para explorarmos
juntos os modernos e desenvolvidos conceitos da
Copa do Mundo ao mesmo tempo que fazemos um
verdadeiro safari pelas perspectivas que temos
sobre nosso futuro. Futuro que faremos juntos, todos
nós, brasileiros, e que já começou, muito antes do
apito inicial para a maior competição do planeta em
2014. Vencer este jogo do desenvolvimento será
mais importante do que vencer a Copa, mesmo que
alguns não concordem. Este será, aliás, nosso
grande desafio.

Ainda sobre este livro

Edvaldo Pereira Lima, estudioso do gênero que


já me aventurei em outras duas publicações (“Axé
Music”, 2007, e “Eu sou um nome na história”,
2008), o livro-reportagem, diria que este trabalho
segue a linha “atualidade” em sua classificação. Isto
quer dizer que estamos tratando de um “tema atual
em que se percebe uma maior perenidade temporal
e cujos desdobramentos finais ainda não são
conhecidos”. Complementaria dizendo que, “dessa
maneira, permite ao leitor resgatar as raízes do fato
ocorrido, ver seu contorno no presente e refletir
sobre as tendências de seus desdobramentos
futuros. Facilita a identificação das forças em
conflito que poderão determinar o desfecho do tema
enfocado, sem, entretanto, demarcar tacitamente
sua conclusão e repercussão”. Aviso final: como
todo produto jornalístico, este trabalho possui a
única função de informar ou, ao menos, orientar.
Espero ter conseguido.

Aquecimento

Perguntas e reflexões

Para início deste trabalho será importante


uma síntese, em três pontos distintos, sobre o
que está por detrás de todas as análises e se
mostra como relevante no processo de
descoberta sobre como podemos avaliar o
projeto Copa do Mundo no Brasil.

O primeiro deles é uma pergunta direta:


como transformar este mega evento, baseado
em 12 cidades sede, em algo de “interesse
nacional”? A importância disso se revela quando
pensamos em como compartilhar os benefícios
e ganhos diretos com infra-estrutura entre todos
os aproximados cinco mil municípios brasileiros,
se é que isto será possível. Algo difícil de se
imaginar, isto será necessário, pois os custos
serão, em boa parte, divididos por todos via
governo federal. Como legado certo, este
aumento de déficit e impostos pode
comprometer cidades que pagam sem direito a
nenhum benefício. Assim, para ser de “interesse
nacional” o governo deve explorar muito bem
como dividir corretamente o legado tanto
positivo quanto negativo. Possibilidades há para
isto, mas a hora de se pensar estrategicamente
sobre o assunto está passando rápido e pode
levar junto uma oportunidade grandiosa para se
evitar distorções que prejudiquem o
desenvolvimento nacional, uma vez que as
desigualdades geram um clima de
descontentamento e insegurança em todos os
cantos do país.

Esta reflexão é pertinente pelo fato dos


dois principais custos do projeto, e com
números bem expressivos, serem
extremamente direcionados aos locais do
evento: arenas e infra-estrutura das sedes.
Mesmo que todos os brasileiros possam utilizar
estes equipamentos e obras, sabemos que a
maior parte não o fará, o que não deve
desestimular as ações, mas transforma sua
engenharia financeira em algo mais complexo
do que se possa imaginar.

Um segundo ponto, este mais diretamente


ainda relacionado com a Copa (considerando
que infra-estrutura é algo necessário para o país
e está nas premissas básicas dos projetos de
governo), diz respeito `as arenas. Quase todas
financiadas com recursos públicos, elas terão o
desafio de sua sustentabilidade financeira pela
frente. Apresentamos neste trabalho um
capítulo sobre esta questão, mas vale aqui um
ponto fundamental: será que este arranjo de
implantação, com muito comprometimento
estatal e pouco aporte privado, este último
grupo, responsável pela gestão do legado, terá
estímulo para buscar a sustentabilidade do
negócio. O modelo americano do esporte,
também explorado num dos capítulos deste
texto, traz uma experiência de pouco
comprometimento dos gestores neste sentido,
mas com uma colaboração consciente por parte
do governo sobre este cenário. A pergunta
ficará no ar até o futuro chegar, mas as
intenções poderiam ficar claras desde já para
que possamos refletir sobre responsabilidades
de cada um e expectativas de todos, uma vez
que os custos serão, em sua maior parte e
querendo ou não, compartilhados pelos
cidadãos brasileiros.

Como último ponto fica uma reflexão sobre


o esporte. Sim, o grande tema deste trabalho e
conteúdo dos dois grandes eventos desta
década do Brasil ainda é algo sem sentido por
aqui. Digo isso porque, como instrumento social,
a prática esportiva, até este momento, se
mantem com o propósito de ser instrumento
apenas de lazer e entretenimento. Para a Copa
e para Olimpíada esta faceta permanece como a
maior atratividade para nosso país desde que se
propôs a sediar estas competições, mas,
somente isso. Somente? Sim.

Em muitos países desenvolvidos,


referenciais necessários para o nosso, os
governos atenuaram o caráter competitivo do
esporte e focaram esta ferramenta em sua
vocação de integração e suporte social. Assim,
passaram a adotá-lo como instrumento de
educação e saúde, mesmo que possuam
programas voltados para os esportes de alto
rendimento. Isto tem se mostrado algo mais que
possível, ou seja, necessário. Apesar de não
ousarmos apontar modelos ideais, posso
garantir que podemos adotar formas próprias de
utilizar o esporte como estrada para a civilidade.
Assim, teríamos ganhos qualitativos e
quantitativos em nosso padrão de
desenvolvimento e uma melhora perceptível na
auto-estima, o que pode se mostrar até mesmo
como principal legado destes eventos. De nada
adiantará ganharmos a taça da Copa e muitas
medalhas nos Jogos Olímpicos se isso apenas
servir para ficar nos registros oficiais. Criar
suporte para o ganho do esporte com estes
projetos é mais que um desafio, podendo até
mesmo ser a maior prova de que sabemos onde
queremos chegar: um país mais justo e
civilizado.
Capítulo 1
A FIFA, o Brasil e a Copa
Para começar o jogo

A importância de um tema pode ser


comprovada de diferentes formas, desde seu
nível de repercussão até a abrangência de sua
discussão. Mas, seguramente, quanto mais
impactante na vida de um grupo for este tema,
mais relevante e importante ele se transforma,
independente dos graus de repercussão e
abrangência. Dessa forma, há assuntos pouco
ou muito repercutidos e discutidos, mas que, ao
largo dessa análise, carregam um potencial
enriquecedor.

Um destes casos é a Copa do Mundo de


2014 no Brasil. Tema comum durante a Copa de
2010, a maior competição esportiva do planeta
em audiência terá nosso país como sede em sua
próxima edição, o que já despertou interesse
suficiente para dar abrangência e repercussão
para o assunto, mas que ainda não encontrou
um bom embasamento para garantir uma
produtividade necessária `as discussões dos
grandes projetos contemporâneos. Isso ocorre
pelo fato desta discussão ser feita por extremos
de uma cadeia intelectualizada, mas ainda
pouco focada no que representa os assuntos
relativos a uma Copa do Mundo FIFA.

De um lado, especialistas em infra-


estrutura apresentam os gargalos do país sob a
ótica técnica. De outro, os experts em grandes
eventos apontam os defeitos de um país que
ainda está na fase do projeto para tudo. No
meio disso, uma sociedade que não está
acostumada a ser o centro do mundo com
holofotes mirando seus passos e ainda tentando
compreender seu lugar na história. Este cenário
é o que existe no Brasil de 2010 e que se
apresenta como um risco para as pretensões
nacionais de se desenvolver a ponto de deixar
de ser “o país do futuro”. Esse futuro, ao que
parece, já começou.

A delicadeza do momento está no fato dele


chegar justamente na chamada Era da
Informação. Assim, o debate, a discussão e a
participação popular são uma realidade que
num país tão grande e diversificado em termos
de cultura podem se transformar numa
interminável plataforma de idéias.

Por tudo isso resolvi passear pelo tema não


para explicá-lo, mas para explorá-lo. Assim, a
origem deste trabalho está pautada não na
busca de respostas, mas na busca pela
formulação das perguntas certas para este
grande projeto que se tornou a Copa do Mundo
de 2014 no Brasil. Se fizermos as “perguntas
certas”, certamente estaremos no caminho de
encontrar não somente as respostas para elas,
mas aos anseios do que o Brasil espera ser no
futuro.

Quanto a pergunta sobre se a Copa é uma


grande oportunidade de crescimento para o
país, ela não me parece desafiadora. Todos os
estudos, inclusive de pré-impacto, apontam que
o evento tem enorme potencial de repercussões
positivas em diversas áreas. Mas, se seremos
capazes de aproveitar esta chance, isto é outra
coisa. A paralisia da dúvida ou o medo da
tentativa não estão mais em nosso poder, pois
seremos sim os responsáveis pela próxima sede
da Copa. E aqui vale um ponto crucial deste
estudo: não seremos os responsáveis pela Copa,
somente pela sua sede. Isso faz e fará toda
diferença.

Sediar um grande evento

Discutir uma Copa do Mundo é algo


desnecessário em se tratando de organização.
Formato de disputa, modelo de negócio, modelo
operacional, preparação e tudo o mais são
responsabilidades da “dona” do evento, uma
vez que ele é “privado”, a FIFA. O que nos resta
então é discutir o que será necessário para dar
estrutura para a competição, incluindo jogos e
torcida. No primeiro caso, as arenas respondem
pelo ponto chave, como qualquer competição
esportiva. No segundo, há um encontro de
interesses interessantes, pois tudo que for feito
para dar qualidade aos serviços oferecidos aos
torcedores visitantes também poderá ser
oferecido aos demais, incluindo moradores e
demais turistas. Dessa forma, discutir a “infra-
estrutura da Copa” deve ser discutir o que
queremos para o país. O torneio, por si só, não
nos exigirá uma mutação, somente ajustes para
os 30 dias de jogos. O que faremos para estes
ajustes poderá ser definitivo ou apenas pontual
e, por isso, o tema tem importância nacional,
pois todos queremos que seja o primeiro caso.

Esta idéia estará presente ao longo deste


trabalho onde procurei abordar os principais
pontos deste assunto, além dos modelos
operacional e de negócios da competição,
oferecendo uma pequena luz sobre algumas
idéias e possibilidades para nossos projetos e
saídas para os desafios que estão pela frente.
Esta contribuição foi pensada por acreditar que
a questão, a partir de agora, é preparar o país
primeiramente para discutir suas possibilidades,
construindo seu futuro a partir desse fruto
gerado com idéias, coragem, criatividade e
visão. O presente e o futuro, ao que parece,
ainda nos esperam.
Fédération Internationale de Football
Association

Certa vez foi perguntado a um presidente


da FIFA se ele se considerava uma pessoa
poderosa. A resposta foi emblemática: “Estive
com reis e rainhas, presidentes, primeiros-
ministros e sultões. Se isso representa ter algum
poder, o que possuo é o poder do futebol”.

Tamanho trânsito entre as lideranças


políticas mundiais, e a mesma licença há na
esfera empresarial, mostra o que realmente é o
futebol: um instrumento de poder, tanto
politicamente como gerador de negócios. O
balanço da entidade máxima do esporte, a FIFA,
mostra isso. Crescente ano a ano, ainda não
sabemos o limite dessa curva sempre
ascendente. Segundo os dados da própria
entidade, em 2003 a receita foi de U$ 575
milhões, em 2004 de U$ 647 milhões, em 2005
chegou a U$ 663 milhões, em 2006 bateu U$
749 milhões, em 2007 alcançou U$ 882 milhões,
em 2008 foi de U$ 957 milhões e em 2009
chegou a uma marca histórica: U$ 1.059 bilhão.

De fato o futebol, maior esporte em


popularidade no planeta, tem seu poder. Com
seguidores fanáticos, regras simples e poucos
equipamentos necessários para sua prática, ele,
dizem, transformou o mundo em uma bola.
Negócios grandes, jogos de multidão e
praticamente sem fronteiras. Os EUA, por
exemplo, uma das resistências clássicas ao
esporte, já possuem, em 2010, mais crianças
abaixo de 12 anos praticando futebol do que
beisebol, futebol americano e basquete juntos.
Além disso, segundo a FIFA, o país da “bola
oval” (referência ao futebol americano) já conta
em 2010 com 18 milhões de jogadores
registrados. Não que as ligas dos EUA estejam
fracassando, pois seus ganhos também estão
crescendo por conta de suas afinadas operações
e consequentes altas taxas de retorno, mas as
perspectivas para o futebol são significativas
neste mercado rico e ainda inexplorado.

Muito desse poder, contudo, somente foi


possível pelo grande profissionalismo e poder de
organização que sua entidade máxima, a FIFA,
conseguiu. Fundada em 1904, este grupo de
gestores conseguem, a cada quatro anos,
refinar ainda mais seus modelos de negócio e
operacional, alcançando, sem nenhuma
exceção, lucros maiores a cada temporada,
como já exposto. E se no campo os jogadores
alimentam paixão por clubes e seleções e
fomentam o interesse pelos torneios, fora dele
outro grupo de jogadores, estes dos negócios,
trabalham para transformar toda essa mágica
atmosfera do esporte em um negócio rentável e
próspero.

Voltando a declaração do início deste


trecho, ela foi dada pelo atual presidente de
honra da entidade e uma das grandes figuras
deste esporte, o brasileiro João Havelange.
Jean-Marie Faustin Goedefroid
Havelange

Apesar do nome francês, herdado do pai


belga, ele nasceu no Brasil e sempre usou o
clássico “João” como primeiro nome.
Representou seu país nos Jogos Panamericanos
de 1955, quando ganhou uma medalha de
bronze no pólo aquático. Mas sua trajetória no
esporte começou muito antes, no Fluminense do
Rio, onde praticou vários esportes, incluindo o
futebol. Levantou até uma taça com o time
juvenil do Flu, o Campeonato Carioca da
categoria em 1931.

Na água, onde mais se destacou, defendeu


o Brasil nadando nas Olimpíadas de Berlim, em
1936, e como jogador de pólo aquático na
Olimpíada de 1952, em Helsinque. Quatro anos
depois chefiava a delegação brasileira nos Jogos
Olímpicos de Melbourne. Pelo amor ao esporte
passou por diversas federações e clubes como
Fluminense e Botafogo, do Rio, Federação
Paulista de Natação, Federação Metropolitana
de Natação, no Rio de Janeiro, Comitê Olímpico
Internacional, onde ainda permanece como
membro desde 1963, e Confederação Brasileira
de Desportos, antecessora da atual CBF, como
seu presidente entre 1956 e 1974. Na época a
CBD congregava outros 23 esportes, além do
futebol, mas foi este que resplandeceu para o
mundo, pois sob seu comando três títulos
mundiais foram conquistados (1958, 1962 e
1970).
Na FIFA chegou em 1974 como presidente
eleito, permanecendo até 1998. Organizou seis
Copas do Mundo e criou os campeonatos
mundiais das categorias de base e feminino.
Deixou a entidade em 1998 como Presidente de
Honra e entregou, além de um caixa reforçado,
uma imagem consolidada para o futebol e a
base para ele se tornar um grande produto para
o mundo dos negócios.

A europeização e a globalização do
futebol

O fato da FIFA nascer na Europa e ter


somente presidentes europeus em seus mais de
cem anos de história, com exceção de
Havelange, tornou a entidade muito
europeizada, mas a caminho de uma
transformação. Mesmo sendo um continente
rico e ainda respondendo pela maior fatia do
lucro global da FIFA, o continente atravessa, em
2010, problemas financeiros sérios enquanto o
mundo, em especial os países emergentes,
começam a ditar novas fronteiras no jogo dos
negócios globais. Isto aponta para uma
necessidade em distribuir mais o mercado e,
com isso, atrair ainda mais o interesse das
empresas.

Para esta expansão o futebol tem sido útil e


isso vai ao encontro da nova realidade mundial,
pois, além de beneficiar tais projetos, também
beneficia os locais que recebem os eventos.
Assim, cria-se uma corrente positiva e abrem-se
cortinas para cada vez mais novos espetáculos
em terras “desconhecidas” para muitas
empresas de primeiro mundo.

Esta transformação tem ocorrido em


especial na gestão de um simpático e esperto
dirigente da entidade que teve a difícil missão
de substituir Havelange. Ao que parece, ele tem
conseguido manter o status de sua corporação.

Joseph Blatter

Economista nascido, criado e formado na


Suíça, “Sepp” Blatter começou sua carreira
executiva na área de relações públicas de uma
instituição de turismo oficial da Suíça. Sua
primeira experiência no esporte foi como
secretário geral da Federação Suíça de Hockey
no Gelo. Participou da organização dos Jogos
Olímpicos de 1972 e 1976 como Diretor de
Esportes da empresa Longines, fabricante
também suíça de relógios e patrocinadora de
diversas confederações esportivas.

Sua chegada na FIFA aconteceu em 1975


como Diretor Técnico, cargo que exerceu até
1981 quando assumiu a secretaria geral. Em
1998 foi eleito presidente e em 2010 começou
seu terceiro mandato consecutivo. Talvez seu
início de carreira como relações públicas o
tenha ajudado a se transformar num dos mais
carismáticos dirigentes esportivos do mundo,
característica que concilia muito bem com um
estilo firme de liderança. O equilíbrio entre estas
duas facetas foi muito bem exposto na África do
Sul quando, sob grande desconfiança mundial, o
país recebeu afáveis palavras do maior
representante do futebol mundial. Mais que
confortar os anfitriões da Copa de 2010, Blatter
deu a lição de que é necessário valorizar ações
a partir de seu contexto. Além disso, mostrou
extrema inteligência comercial na valorização
de seu grande produto e sensibilidade
verdadeira pelas inequívocas demonstrações de
envolvimento com o sofrido, mas alegre povo
africano.

Sua gestão deve prosseguir com a


eficiência de um relógio suíço, o que poderá
elevar o futebol a um patamar nunca antes
conquistado.
Capítulo 2

Copa do Mundo FIFA:


Modelo e operação
Modelo do negócio

A Copa do Mundo é, sem dúvida, o principal


produto da FIFA. Responsável pela maior parte
de suas receitas, a competição pode ser
definida como a “mina de ouro” que a entidade
possui. E este cenário não é de hoje, segundo os
balanços publicados. Em 2003, 90% de seus
recursos foram obtidos por conta da Copa do
Mundo e, nos anos seguintes, o cenário se
consolidou:
Ano Percent
ual
2004 78.00%
2005 81.00%
2006 77.00%
2007 85.00%
2008 89.00%
2009 88.00%
Fonte: FIFA

Tal força se reflete nos gigantescos


números da competição. O valor oferecido às
seleções participantes, por exemplo, mostra
uma evolução proporcional ao aumento das
receitas com o torneio:
Torneio Prêmios Crescimento
Coréia/Japão U$ 140 milhões Ano base
2002
Alemanha 2006 U$ 200 milhões 69.00%
África do Sul U$ 420 milhões 61.00%
2010
Fonte: FIFA

A premiação aos vencedores também


cresce vertiginosamente. Na África foram
oferecidos US$ 30 milhões ao campeão, a
Espanha, quando, em 2006, US$ 19,3 milhões
era o valor referente a isto. Até mesmo o
segundo colocado na Copa 2010 recebeu um
valor superior a este, outros US$ 24 milhões. O
terceiro colocado também superou o valor
ganho pelo campeão na Alemanha e assegurou
outros US$ 20 milhões. Um detalhe é que todas
as seleções participantes do torneio recebem
verba para sua preparação. Sendo assim, até a
última colocada na África do Sul, a Coréia do
Norte, chegou a receber U$ 1 milhão.

Este incremento de receita se explica pela


conjunção de alguns fatores macro-econômicos
que inclui o crescimento mundial de grandes
grupos empresariais com a globalização, mas
principalmente uma evolução no modelo do
negócio da Copa do Mundo. Isto é percebido
pelo aumento da quantidade e qualidade da
audiência do torneio, que pode ser expressa
tanto na forma direta como na indireta.

Média de público nas Copas recentes

Na primeira, vale observar os números de


média de público das quatro edições recentes,
que possuíram o mesmo formato de disputa
com 64 jogos, além de uma maior proximidade
com o cenário econômico atual:
Resumo das vendas e audiência direta

Edição da Tickets Média por


Copa vendidos jogo
França 1998 2,79 milhões 43 mil
Coréia/Japão 2,71 milhões 42,34 mil
2002
Alemanha 3,36 milhões 52,5 mil
2006
África 2010 3,18 milhões 49,67 mil
Fonte: FIFA

Em termos de audiência em TV's, número


bastante representativo para as negociações
comerciais do torneio, os dados também são
expressivos:

Torneio Audiência TV
Alemanha 2006 26,3 bilhões
África do Sul 30 bilhões
2010

Isto tudo representa números quantitativos,


mas, como dito antes, há ainda o crescimento e
fortalecimento qualitativo da audiência indireta.
Em termos de TV's, o torneio está cada vez mais
global, alcançando, inclusive, incremento
significativo naquela que é, talvez, sua última
grande fronteira, os EUA, que está entre os 214
países que prestigiam o torneio pela TV. Isso se
deve, provavelmente, não somente ao apelo
deste esporte mundial, mas também a
globalização da cultura (neste caso em via
inversa, uma vez que os americanos são os
principais exportadores dessa vertente) e o fato
indubitável do processo conhecido como
“latinização” dos EUA, com grandes camadas
latinas ascendendo na classe de consumo
interno. O mesmo processo pode ser observado
com relação a um dos mais tradicionais esportes
no país, a NASCAR, espécie de Fórmula 1 local
que, agora em declínio, procura nova
engrenagem para seus negócios muito além do
limitado público branco americano, encontrando
caminho nos latinos para tal.

Além desse crescimento em frente às TV's,


nas arenas novos espaços tem surgido para
segmentar os públicos de diferentes perfis e,
cada vez mais, o evento adota uma postura
conhecida no marketing esportivo como “full
menu”, algo como uma coisa para cada tipo de
consumidor. Para o público corporativo, por
exemplo, segmento bem prestigiado nas
moderníssimas arenas americanas, os
chamados hospitality centers crescem e
valorizam cada vez mais os limitados espaços
dentro dos estádios de uma Copa do Mundo. E
são exatamente ações como estas que
exemplificam o ajustamento cada vez mais
preciso do modelo deste torneio, pois o
aumento do ticket médio gera também aumento
de faturamento o que, por sua vez, gera
aumento do valor da cota de patrocínio ou
direito de exploração destes espaços. E assim,
cada vez mais a Copa se transforma num
modelo bem ajustado de investimento,
oferecendo rentabilidade e segurança ao
mesmo tempo que permitindo ao esporte seu
bom desenvolvimento.

Mídia e patrocinadores: os maiores


parceiros

Como todo evento esportivo profissional a


Copa do Mundo traz, em seu modelo, um
privilégio grande aos que sustentam
financeiramente esta operação. Isto é natural,
uma vez que tais investidores também
necessitam e almejam retorno quanto aos
recursos financeiros depositados em tais
projetos. E assim como em outros grandes
eventos esportivos, mídia e patrocinadores são
os maiores parceiros também da Copa do
Mundo.

Para se ter uma idéia da importância destes


dois segmentos, juntos eles representam mais
de 90% das receitas da FIFA, ou seja, quase U$
900 milhões dos U$ 1,06 bilhões que a entidade
faturou em 2009. Sendo assim, não se pode
esperar posição diferente do extremo cuidado e
pesada vigilância quanto aos direitos destes
parceiros que no plano de marketing do evento
são chamados de “broadcast rights” e
“sponsorship income”.

As pesadas regras de proteção aos


patrocinadores e parceiros não são
exclusividade da FIFA. Antes dela, aliás, o IOC
(International Olympic Commitee), que assina os
Jogos Olímpicos, já havia implantado o modelo
feroz que promete também fazer barulho no
Brasil. Isso já começou com sessões no
Congresso para saber sobre a isenção fiscal
oferecida tanto a FIFA quanto aos
patrocinadores do torneio, medida
anteriormente negociada e já sancionada pela
presidência do país. Segundo Ricardo Teixeira,
presidente da CBF, sem estas isenções não há
como se realizar uma Copa.

Além das isenções fiscais, regras severas


de proteção quanto ao direito de uso das
marcas oficiais também prometem incomodar
pela força com que são executados. O corpo
jurídico da FIFA, e nele deverão estar inclusos
grandes cabeças do direito brasileiro, atua como
um batalhão para proteger suas propriedades, o
que na África do Sul, por exemplo, gerou,
somente até o meio do torneio, mais de 500
processos na justiça do país, incluindo desde
grandes grupos empresariais até micro-
empresas.

Outra frente desta batalha é contra o que


especialistas chamam de “ambush-marketing”.
A guerrilha neste setor tem sido grande e este
cenário não deve mudar, pois a competitividade
necessária aos negócios sempre estimula idéias
de intervenção no modelo de comunicação
tradicional. Ações como a das torcedoras
holandesas de vestido laranja que divulgavam,
secretamente, uma marca de cerveja daquele
país devem ser solidificadas, o que não inibe os
estrategistas de campanhas de marketing a
pensarem em novas formas de burlar o
patrocínio tradicional.

O fato é que a estratégia comercial da Copa


do Mundo restringe cada vez mais a exibição de
marcas. Esta medida, conhecida como “less is
better” (algo como “menos é melhor”),
compensa a diminuição de propriedades
patrocinadas com um aumento no valor destas
propriedades. Natural, assim, que as muitas
marcas que ficam de fora da competição
queiram se apropriar dela em suas estratégias
de marketing, o que pode ser feito de forma
legal, mas deve-se saber bem como fazer isso.

Como dito anteriormente, além dos


patrocinadores, a vigilância extrema com os
direitos de transmissão e uso do torneio
oferecido aos meios de comunicação oficiais é
outra grande muralha jurídica da Copa do
Mundo, assim como de outros grandes eventos
esportivos internacionais. Faz parte do modelo
do negócio um privilégio `as receitas indiretas e,
assim, ele é cada vez mais concebido para a
mídia. Dessa forma, explica-se o porque de aqui
repousarem as principais atenções dos
organizadores, afinal, enquanto em média 50
mil torcedores acompanham os jogos de dentro
das arenas, outros bilhões estão de olho através
das TV's, o que garante as grandes verbas de
investimento nesta competição. Por isso o
acompanhamento ocorre de forma bastante
próxima e sempre estará preparada para o
combate, quando necessário.

Como a receita com direitos de TV é a


principal fonte de recursos da FIFA, vale aqui um
olhar mais apurado sobre isto. O fato é que mais
da metade do arrecadado nesta área vem do
mercado europeu, que responde por 54% do
total arrecadado pela entidade. Isto justifica
uma maior atenção com as emissoras
européias, desde a manipulação de horários de
jogos para atender aos “prime times” deste
mercado até o privilégio de espaços ocupados
por parceiros desta região.

Origem das receitas FIFA

Região Percentual
Europa 54.00%
Ásia e Norte da África 22.00%
Américas do Sul e 13.00%
Central
América do Norte e 8.00%
Caribe
Resto do mundo 3.00%
Fonte: FIFA

Para a Copa de 2014 ainda não sabemos


que horários serão oferecidos para os jogos,
mas certamente pesará na decisão o mais
adequado para se respeitar o fuso horário do
“velho continente”. A decisão estará nas mãos
habilidosas de quem sabe há tempos unir o
esporte e a mídia em prol do desenvolvimento
de ambos.

Jérôme Valcke

O Secretário Geral da FIFA é um parisiense


que chegou na Copa de 2010 com 50 anos,
morou parte da adolescência no Togo e que
possui formação em jornalismo. Construiu sua
carreira no meio deste setor começando aos 22
anos na Radio Monte Carlo (RMC) e, depois,
fazendo parte do grupo que criou um ambicioso
projeto de estação de TV, a Canal+, na França,
em 1984. Nesta fase estudou a fundo a indústria
da mídia e também esportes, tanto que chegou
a assistente de direção do serviço esportivo do
canal, em 1991. Seis anos depois assumiu o
departamento de marketing do Sport+, uma
segmentação do canal original. Em sua
trajetória, a Copa de 2010 foi um regresso a
este tempo, pois, em 1995, participou de uma
grande cobertura internacional de um evento
esportivo, a Copa do Mundo de Rugby, na
mesma África do Sul.
Neste período participou da fusão que criou
a Sportfive, uma das maiores empresas de
negócios esportivos do mundo, onde atuou
como Chief Operating Officer. Em 2003 chegou
na entidade máxima do futebol como Diretor de
Marketing e TV até ser levado para a posição
atual de Secretário Geral, o que mostra a
importância deste segmento dentro da
instituição ao mesmo tempo que explica a
grande desenvoltura da FIFA nesta área. Por sua
função chave, Jérôme Valcke será figura
constante no Brasil nos próximos anos e estará
a frente de todas as ações referentes a
organização do torneio de 2014.

Comércio e informalidade

Por fim, o segmento comércio, inserido


necessariamente na mesma abordagem dos
patrocinadores da FIFA, por sua formalidade e
grande carga operacional tanto fora quanto
dentro dos “matchdays”, oferece grande
empecilho e praticamente impede algo que no
Brasil é extremamente comum: a informalidade.
Não que se almeje terminar com este tipo de
negócio, mas o modelo de organização do
torneio prevê uma reserva de espaço,
oficialmente chamada de “Zona de exclusão”,
que impõe grandes dificuldades aos conhecidos
ambulantes e barraqueiros tanto de produtos da
Copa quanto de alimentos e bebidas. Mas esta
vigilância não ocorre somente com os informais,
pois até mesmo o comércio legal fica impedido
de atuar dentro desta zona prevista no modelo
de negócio do torneio. Em média se prevê um
distanciamento físico deste tipo de ação em
torno de 500 metros, no mínimo, do local de
acesso das arenas. Assim, é normal, com tal
distância, ver torcedores apenas passarem por
barracas e deixarem para trás o sonho destes
comerciantes em fazer dinheiro fácil com o
evento. Eles também sucumbem ao grande
poder de reserva de direitos que a FIFA guarda,
e de forma justa, aos seus parceiros comerciais.

O fato é que estarão no Brasil os maiores


especialistas do mundo em questões jurídicas
de proteção aos direitos que o modelo da
competição garante aos patrocinadores e
parceiros, uma vez que são eles quem pagam
boa parte do evento.

Para os que ocupam as arenas para a


venda de produtos, mediante acordo com a
FIFA, há o mercado direto com estimados 3,3
milhões de torcedores que deverão assistir aos
jogos nos estádios, mas com uma projeção de
até 10 vezes este número nos locais externos
oficiais da competição, as chamadas Fan Fest.
Isso representa um consumo significativo e uma
grande possibilidade para empresas em busca
de receita imediata.

Além da legitimidade
Por tudo já exposto, não há o que se
questionar sobre a legitimidade de tais direitos
adquiridos e negociados antecipadamente pela
FIFA com o país sede e, posteriormente, com
seus parceiros comerciais. Porém, isso não
invalida nem bloqueia ações que a organização
do torneio pode tomar no sentido de negociar
com os diferentes agentes deste negócio,
incluindo representantes do ainda poderoso e
importante mercado informal, para que
problemas maiores sejam evitados quando a
operação Copa do Mundo entrar em
funcionamento. Este ponto deve ser de
interesse não somente dos agentes locais
preocupados com as duras regras do negócio,
mas também dos governos, uma vez que tais
situações sempre alcançam a esfera social, e da
própria FIFA, que deve manter seu foco na
perfeita execução de sua máquina de negócios.

Modelo operacional

Inicialmente vale trazer os números


estimados e básicos desta operação: 36 times
com 50 pessoas em cada delegação, 10.500
jornalistas, 5 mil representantes estrangeiros e
500 oficiais da FIFA. Este é o número básico que
faz o espetáculo Copa do Mundo e que garante
a execução de todo o negócio.

Quanto ao modelo de operação, verifica-se


que ele é similar a um outro modelo já
ultrapassado no mundo dos negócios, a
“glocalização” (pense globalmente e haja
localmente), mas que, para a competição, tem
se mostrado muito eficiente, afinal, seu
crescimento tem sido notório em todas as
frentes de análise.

Assim, foi criada uma base de operação


num documento com o título original de
Organising Association Agreement (OAA), que
representa o reconhecimento das obrigações
pelo país sede através de uma entidade, a Local
Organising Committee (LOC), ligada a
confederação do esporte local, no caso do Brasil
a CBF. Este LOC é o grande responsável pelo
cumprimento de todas as obrigações que a FIFA
apresenta para que o evento tenha uma
unidade e atenda especialmente aos seus
objetivos comerciais e promocionais. No Brasil,
o LOC é composto por Ricardo Teixeira
(presidente), Joana Havelange (gerente-geral),
Francisco Mussnich (consultor jurídico), Carlos
Langoni (consultor financeiro), Carlos de La
Corte (consultor de estádios) e Rodrigo Paiva
(assessor de comunicação).

O maior objetivo da criação do LOC é


contar com um grupo de trabalho que tenha
perfil executivo e representatividade perante
todos os agentes que se inter-relacionam no
projeto, além de desvincular suas atividades das
mais gerais executadas pelas confederações.
Assim, garante-se um esforço coordenado nas
atividades preparatórias da Copa e também na
execução da competição. Para a montagem do
LOC há uma orientação de que cada integrante
tenha habilidades específicas e expertise em
determinadas áreas importantes tanto na
execução como na articulação que garante o
sucesso do evento.

Custos operacionais

Para gerir a organização do torneio,


incluindo despesas de transporte e divulgação,
o LOC estima uma verba de R$ 854 milhões,
sendo este recurso oferecido pela FIFA para tal.
Já os custos com a segurança dos eventos, a
organização solicita um efetivo total de 78 mil
policiais, todos atuando fora dos estádios, que
geram uma despesa de R$ 327 milhões ao
governo. Por fim, há um custo, também público,
ainda não estimado para o que a FIFA chama de
redundância elétrica, que garante ao torneio
toda sua operação sem os riscos de quedas de
energia ou qualquer outro problema desta
natureza.

Exigências para o Brasil

O documento que precisou ser bem


estudado pelo Brasil chama-se “Caderno de
encargos”. As regras foram criadas pela FIFA
como orientação aos países que pretendem
sediar o evento. Os principais pontos são os
seguintes:

Garantias governamentais: estas


garantias estão previstas num contrato
denominado Host City Agreement e inclui vistos
de trabalho a todo o pessoal estrangeiro
envolvido com a Copa do Mundo, isenção de
taxas alfandegárias para todo o material
relacionado ao evento, segurança pública para
todas as áreas do evento, transferência das
receitas livre de impostos ou taxas, infra-
estrutura para o transporte de torcedores e
delegações e sistema adequado de
telecomunicações.

Infra-estrutura esportiva: oito a doze


estádios com capacidade mínima de 40 mil
pessoas (até as quartas-de-final) e 60 mil
pessoas (partida de abertura, semifinais e final).
Os campos de jogo devem ter 105 por 68
metros, grama natural e espaço em volta de
pelo menos 6 metros (7,50 metros atrás do gol)
para proteger e acomodar reservas, fotógrafos e
câmeras de televisão. Os estádios também
devem ter iluminação de padrão internacional e
salas adequadas para imprensa, funcionários da
FIFA e antidoping. Todas estas obrigações estão
detalhadas no documento “football stadiums
technical recommendations and requirements”, que faz parte
do contrato com o país sede.

Comercialização do evento: o país sede


deve reconhecer o direito exclusivo da FIFA para
a exploração comercial da Copa - publicidade,
marketing, licenciamento e direitos de
transmissão. A FIFA cede parte desses direitos
ao comitê organizador.

Contrato de candidatura: o país


organizador se compromete com a FIFA a
vender uma quantidade mínima de ingressos,
além de contratar um seguro que cubra
"responsabilidades relacionadas com a
organização e a realização da competição".

Alojamentos: é preciso hospedar 32


delegações de até 50 pessoas, staff da FIFA
(cerca de 250 pessoas) e arbitragem (80
pessoas). A organização local deve também
prestar assistência aos jornalistas com
orientação sobre hospedagem.

Transporte: o comitê organizador deve


fornecer um ônibus, um micro-ônibus e dois
carros para cada seleção, mais dois ônibus e
cerca de 200 carros de passeio para a
delegação da FIFA, além de um ônibus, dois
micro-ônibus e um carro para os árbitros e um
ônibus para a imprensa.

Além destes pontos, há um quesito


subjetivo, que é adequar os sistemas de
transporte com a demanda do torneio, sem
maiores detalhes sobre o que deve ser feito ou
parâmetros tangíveis para tal.

Segurança: item também subjetivo que


prevê apenas o fornecimento de medidas e
normas que garantam proteção durante o
torneio.

Venda de ingressos: o comitê


organizador irá determinar os valores de
ingressos, mas estes devem ser aprovados pela
FIFA. Todos os assentos devem ser numerados e
parte dos assentos deve ser reservada para a
FIFA que os oferece aos dirigentes de cada
seleção.

Finanças: a FIFA não se compromete com


nenhum investimento em infra-estrutura, mas o
comitê organizador local tem direito a uma
porcentagem sobre o eventual lucro obtido com
a realização do torneio.

Tripé operacional do torneio

A MATCH Services AG é a empresa de


serviços escolhida pela FIFA para fornecer os
serviços de bilheteria, hospedagem e tecnologia
da informação (TI) para a Copa das
Confederações em 2013 e a Copa do Mundo em
2014. Por isso ela possui importância
estratégica e seu trabalho deve ser bem
entendido por todas as cidades, sejam sedes ou
não.

Baseada em Zurique, na Suíça, a MATCH é


uma joint venture entre as empresas Byrom
(com sede em Manchester, no Reino Unido) e a
Eurotech Global Sports (com sede em Appenzell,
na Suíça) formada com a única finalidade de
fornecer esse tipo de serviço para a FIFA. Ambas
as empresas possuem suporte estratégico para
os eventos realizados pela entidade nas áreas
citadas.

Na África, onde a empresa também atuou,


ela criou uma subsidiária, a MATCH Event
Services PTY, para gerenciar as atividades locais
relacionadas à Copa de 2010. Outra subsidiária
da MATCH será criada no Brasil para gerenciar
as operações locais. Esta é a empresa que todas
as cidades devem visitar e obter um bom
relacionamento para, ao menos, entenderem as
regras do jogo comercial para o setor de
turismo, um dos principais afetados pela Copa.
As três áreas de atuação da empresa são:

1 - Hospedagem

O principal objetivo da FIFA neste setor


consiste em implantar um programa exclusivo
de hospedagem em termos de qualidade,
criatividade e flexibilidade, com grande
capacidade de satisfazer as demandas do
mercado. Em relação ao projeto de hospedagem
para os eventos citados, a MATCH será
responsável por garantir e administrar um
inventário dos quartos de hotel e acomodações
não-hoteleiras para satisfazer as exigências de
cada um dos eventos. Além disso, a empresa
será responsável por negociar termos e
condições com a comunidade hoteleira do
Brasil. A MATCH atuará como gerente na
comercialização de todos os quartos de hotel e
acomodações não-hoteleiras contratadas.
Neste item vale ressaltar o modelo adotado
pela FIFA para as delegações dos países
participantes. As edições recentes da Copa não
adotam cidades como sedes de grupos do
torneio, promovendo um rodízio entre as arenas
para receber jogos de diferentes grupos. Assim,
não há obrigatoriedade alguma para a escolha
da cidade e do local que cada seleção irá
escolher para ficar hospedada. A única regra é
que os alojamentos sejam avaliados e
aprovados pela MATCH, que cobra do local pelo
menos 50 quartos de alto padrão, proximidade
de aeroporto e hospital e, no máximo, 20
minutos do Centro de Treinamento utilizado
pela equipe. No Brasil, estima-se que cerca de
90 cidades sejam incluídas neste portfólio
oferecido para as delegações.

Outro detalhe desta operação coloca no


jogo todas as cidades do país, bastando cada
uma levar sua proposta aos dirigentes de
confederações em associação com seus hotéis e
operadores do turismo no local: o período pré-
Copa. Antes da bola rolar, as delegações podem
escolher qualquer cidade do mundo para sua
preparação, mas, normalmente, ela é feita no
país sede ou em algum lugar com clima muito
semelhante para que se possa promover uma
adaptação dos atletas ao jogo nestas condições.
Na África do Sul, por exemplo, tivemos como
exemplo deste “jogo” a atuação de Tshwane.
Para receber a seleção italiana, então campeã
do mundo, a prefeitura pagou cerca de U$ 1
milhão para federação da Squadra Azurra para a
cidade ser escolhida como sede durante a Copa
das Confederações. O resultado não foi muito
satisfatório do ponto de vista operacional, uma
vez que se mobilizou um batalhão de gente
para atender as exigências da equipe. A
divulgação da cidade, como contrapartida, foi
muito boa, mas sem grandes repercussões em
termos de turismo. Para a Copa, no ano
seguinte, a estratégia foi refeita e a cidade
recebeu apenas a seleção americana, que,
como registro, pagou todas as suas despesas.

Por fim, vale lembrar que cada seleção,


além da delegação, carrega também toda a
imprensa do país e, muitas vezes, seus
torcedores. Todas, porém, devem seguir a regra
da organização de estar presente na cidade em
que o jogo se realizará no dia anterior da
partida, mas apenas caso ela esteja hospedada
a mais de 120 km de distância da sede. Assim, a
rota entre a sede e suas cidades de jogos deve
ser fácil para delegação e torcedores, estando
aqui um grande diferencial para se promover
por todos que almejam receber alguma
delegação. O que deve ser entendido aqui como
fundamental é que esta escolha será de cada
delegação, que sempre observa, além do local,
sua infra-estrutura geral e particular em itens
como centro de treinamento e centros médicos
de alta especialização.

Os lista dos hotéis e centros de


treinamentos oficiais da Copa de 2014
escolhidos pela FIFA através de seu setor
responsável, o FIFA Accommodation Office
(FAO), ligado a MATCH, sairá até julho de 2011.

2 – Bilheteria

O principal objetivo da MATCH em matéria


de bilheteria consiste em colocar em prática
uma estrutura de venda eficiente, oferecendo
um serviço de qualidade “para garantir que o
processo de venda de ingressos seja
transparente, justo e correto”, segundo ela
mesma. Assim, a MATCH é a responsável por
fornecer à FIFA um sistema de tickets simples e
prático para os eventos, cobrindo todos os
serviços de bilheteria, incluindo pedido, venda,
impressão, distribuição e administração de
ingressos, as operações nos pontos de venda e
a execução dos termos e condições estipulados
pela organização. Pelo modelo, a FIFA fica no
comando das vendas de todos os ingressos para
a Copa das Confederações e para a Copa do
Mundo, com a MATCH atuando como agente da
entidade na venda de ingressos para todos os
compradores.

A FIFA possui um programa para


operadoras de turismo que queiram vender
pacotes com ingressos e disponibiliza tickets
mediante um cadastramento no site da
entidade. Assim, estes tickets são comprados e
garantidos até os jogos finais, sendo que, caso a
seleção não se classifique, os valores pagos são
reembolsados aos clientes.
Há também tickets corporativos para áreas
de hospitalidade que devem ser adquiridos
diretamente com a MATCH, estando estas áreas
tanto dentro das arenas, os camarotes, quanto
fora delas, os HC's.

3 - Tecnologia da Informação

O grande objetivo da MATCH no campo da


tecnologia da informação consiste em fornecer
sistemas e serviços de TI que possibilitem o
sucesso operacional de cada evento e satisfaça
as expectativas dos principais grupos de
usuários da FIFA. A empresa fornece soluções
de TI exigidas pela FIFA para a realização de
cada um dos torneios, o que engloba sistemas
cruciais de apoio como o processo de
credenciamento, a gestão de voluntários e do
transporte. A MATCH também é responsável
pela implantação de uma rede privada que
conectará centenas de locais de eventos e ficará
à disposição de importantes grupos de usuários,
incluindo a delegação e o staff da FIFA, o comitê
organizador do evento e milhares de jornalistas
que trabalharão na cobertura de cada um dos
jogos.

Outra responsabilidade da MATCH é


supervisionar uma tarefa complexa: a
implantação de um número considerável de
equipamentos de comunicação e rede,
computadores, impressoras, servidores e
cabeamento necessários à conexão destes
dispositivos nos locais dos eventos. Durante a
realização da Copa, a MATCH também fará o
monitoramento e as operações de apoio que
reúnem recursos de todas as organizações
envolvidas nas soluções de TI, incluindo a FIFA,
o comitê organizador e os principais
patrocinadores e prestadores de serviços.

Por tudo isso o endereço “Aurorastrasse


100 - 8032, Zurique - Suíça” deve ser bastante
visitado para quem quiser fazer bons negócios
em 2014.

Matchday: o grande momento

Toda operação de uma Copa do Mundo traz


um período de preparação extenso para
garantir, ao seu fim, um único dia: o dia do jogo.
Conhecido como matchday no jargão
mercadológico, o evento em si concentra
inúmeras operações simultâneas que se
entrelaçam para formar um momento mágico.
Assim, transporte, segurança, saúde, acesso ao
estádio, suporte aos jornalistas, recepção aos
turistas, logística de equipamentos, catering,
telecomunicações, comércio e fiscalização geral
devem estar em plena sintonia com o ambiente
altamente positivo que a competição sugere.

Como momento crítico, possui execução


altamente profissional e é supervisionada
diretamente pela FIFA após treinar todas as
equipes para que tudo ocorra dentro do
esperado. Este legado aos profissionais que
trabalham durante o evento será um dos
grandes benefícios do torneio e devemos
esperar muito desta nova classe de
profissionais.

Outros eventos relacionados

A Copa traz também eventos e projetos


paralelos que ocorrem simultaneamente ao
torneio e servem como apoio ou apenas suporte
institucional para aproveitar a grande
visibilidade da Copa. Os três principais são:

1 - FIFA Fan Fest

Criar áreas com o mesmo clima dos


estádios para receber torcedores nas cidades
que sediam os jogos foi uma das práticas mais
bem sucedidas da FIFA nos últimos dois
mundiais. Estas zonas se transformaram no
centro da torcida nas cidades e, claro, recebem
o mesmo tratamento visual das arenas com
seus patrocinadores e fornecedores
estratégicos. Além das cidades sedes, outros
pontos no mundo recebem o evento, sempre
com o intuito de forjar a atmosfera da Copa em
cada cidade em que é realizada.

2 - Festival Football For Hope

O tema é um festival de educação, cultura


e futebol. São times mistos, com garotos e
garotas, todos membros de organizações que
enfrentam as dificuldades sociais através do
futebol — desde falta de moradia no Reino
Unido e problemas com minas terrestres no
Camboja até educação sobre HIV/AIDS na África
do Sul e integração de refugiados na Austrália. É
um evento oficial da Copa do Mundo e também
é organizado pela FIFA com apoio da ONG
streetfootballworld, que tem sede em Berlim.

Os jogos, realizados em mini campos, não


contam com árbitros, pois as discordâncias em
campo deverão ser resolvida por meio do
diálogo — um método que incentiva o
desenvolvimento pessoal e o entendimento
mútuo. Outros programas estão incluídos no
festival, como atividades de intercâmbio de
idéias e experiências, discussões sobre tópicos
sociais, oficinas para aprender a ser técnico de
futebol e apresentações culturais.

Participei deste evento na Alemanha e vi


que os objetivos parecem ser alcançados. Para a
sorte da humanidade, o esporte pode provar
que homem tem solução.

3 – Green Goal

Seguindo a mega tendência da


sustentabilidade ecológica de projetos, a FIFA
estipulou neste programa uma série de direções
para que as competições de futebol sejam cada
vez mais “zeradas” em termos de emissões de
poluentes. Assim ela incentiva a projeção de
estádios e eventos sempre com a opção mais
“ecologicamente correta” e baseada em quatro
pontos: água, resíduos, energia e transporte.

Água: recomenda a armazenagem de água potável para fins


de irrigação e uso nas instalações sanitárias.

Resíduos: para limitar a quantidade de lixo gerada durante


os eventos, a FIFA recomenda o reuso de copos, a coleta
seletiva de lixo e a venda de comidas e produtos sem
embalagem.

Energia: para a economia de energia, a entidade recomenda


a instalação de painéis fotovoltaicos, a instalação de vidros
especiais que reduzem o calor no interior do edifício e, em
consequência, o uso do ar-condicionado, além da existência
de centrais de controle de energia para administrar o
consumo em horários de pico.

Transporte: a FIFA recomenda o uso de sistemas públicos


de transporte, como ônibus e trens, que podem ser projetados
para um consumo eficiente de combustível.

Para seguir estas recomendações, os responsáveis pelos


projetos de estádios da Copa no Brasil precisam contratar
consultorias especializadas neste quesito, o que deve ocorrer
o mais rápido possível, pois, enquanto mais inicial este ponto
se incluir nos projetos, melhor e com menos custo deverão
ser as adaptações necessárias para atender não só as
recomendações FIFA, mas também aos cuidados que toda
grande obra moderna deve ter.
Capítulo 3

Um olhar mais apurado sobre os


desafios brasileiros atuais:
um difícil dever de casa
Os desafios brasileiros

Já sabemos as áreas que sofrerão maior


impacto positivo, mas devemos também
reconhecer e identificar os desafios de cada
uma delas, além das particularidades que se
mostram como um obstáculo para o país no
cenário atual:

Empregabilidade: dificilmente
responderemos bem ao problema da falta de
preparação ocupacional para as oportunidades
mais próximas. Enquanto algumas funções
podem ser mais rapidamente desenvolvidas,
outras precisam de alguns anos para se
preparar, como engenheiros civis e piloto de
aviões, mas, não há mais tempo para a Copa. A
saída será importar mão de obra para o que não
conseguirmos produzir ao mesmo tempo que
incentivar urgentemente os cursos nas
principais áreas que terão forte demanda, como
turismo e serviços, além da construção civil, já
descrita anteriormente. Neste ponto as
universidades tem especial responsabilidade,
mesmo considerando seu caráter fortemente
econômico e voltado para a lucratividade, pois
devemos democratizar cada vez mais o acesso
nestas instituições. De pouco adianta gerar
legado físico se não construirmos um suporte
para a sustentação disso. Neste caso, o suporte
será uma sociedade educada funcionalmente
para a geração de riquezas e a conseqüente e
saudável repercussão do aumento de demandas
na economia. Neste ponto vale também um
importante registro, que é a necessidade de um
ajuste das políticas trabalhistas do país.

Contas públicas: será um grande desafio,


mas possível. Com o cenário macroeconômico
favorável, o governo terá uma grande chance
de estabelecer números razoáveis para suas
metas e, diferente do que tem feito, cumprir seu
orçamento. O risco de se perder neste ponto
pode ser o de transferir para a sociedade uma
carga pesada demais devido ao forte custo das
reformas em infra-estrutura concentradas em
apenas quatro anos. Isso passará,
necessariamente, por uma melhora significativa
na capacidade de planejamento dos governos e
na transparência de suas ações, que podemos
perceber como a melhor forma de inibir desvios
consideráveis nos orçamentos e execuções de
projetos.

Industrialização: fomentar uma


capacidade produtiva adequada ao consumo
interno é o primeiro passo aqui. O grande
objetivo será o de substituir as importações e,
assim, melhorar os números da balança
comercial e incrementar receitas tanto nas
empresas como na previdência social. Neste
ponto entra também a capacidade de
planejamento, mas neste caso a esfera privada
terá especial importância. É a visão do
empreendedor e a sua saga pela viabilidade dos
projetos que dará energia ao processo, ficando
os governos com a responsabilidade de
destravar os caminhos burocráticos para estas
ações.

Turismo: criar uma plataforma adequada


para o turismo é oferecer estrutura hoteleira, de
transporte e, principalmente, de serviço para
esta atividade. Aqui vale a lembrança de que a
cadeia turística não funciona bem sem
melhorias em outras áreas, como a de
segurança. O primeiro passo positivo será
vencer o desafio já apresentado aqui
anteriormente da empregabilidade no setor.
Vagas teremos, mas precisamos de bons
profissionais para ocupá-las. Esse cenário não
parece muito promissor pelo fato dos cursos de
turismo em quase todas as universidades
brasileiras terem chegado ao seu fim. Além
disso, para que possamos garantir uma
expansão continuada do turismo no país, deve-
se garantir com soluções definitivas a
acessibilidade, logística e a regulamentação do
setor, além de se manter uma boa gestão da
promoção comercial do país no exterior. Caso o
desafio do bom atendimento não seja
alcançado, o Brasil poderá comprometer sua
qualidade de serviço e, assim, gerar uma
imagem negativa no exterior. Neste ponto, vale
ressaltar que o número de turistas não parece
ser o maior desafio, uma vez que já possuímos
grandes eventos de receptivo, como o carnaval,
que, somente em Salvador, gera praticamente o
mesmo número dos 30 dias da Copa. A questão,
então, fica no lado qualitativo do atendimento.
Comunicação: queremos chegar na era da
banda larga democratizada, mas os custos
nesta área ainda são muito altos. Porém, não há
como desenvolver sem diminuir custos e parece
que estamos, como os cães, "correndo atrás do
próprio rabo": não diminuímos custos pois ainda
não desenvolvemos a área. Esta equação tem
que se ser "zerada" urgentemente para que
possamos começar a introduzir, com urgência, o
Brasil na “Era da Informação”.

Segurança: educação de qualidade: esta


pode ser a resposta para este desafio. Polícia na
rua será importante, mas dificilmente nos livrará
do mal maior de nos sentir inseguros e expostos
ao pior a cada momento. Mesmo que pareça
longo, este caminho não apresenta alternativas.
Também nesta área vale um alerta sobre
contingências que podem afetar o planejamento
de operação e de investimento no setor: em
Atenas, durante os Jogos Olímpicos de 2004, o
orçamento previsto era de U$ 100 milhões, mas,
com os atentados de 11 de setembro nos EUA,
este número se elevou para U$ 1,100 bilhões.
Deste risco também estamos expostos.

Mobilidade urbana e transporte: a


urbanização tem seus desafios, mas talvez estes
sejam os mais fáceis para se vencer. Apesar de
serem custosos do ponto de vista financeiro, se
bem pensados podem facilmente “se pagar”,
pois a mobilidade caminha no mesmo trilho da
viabilidade das cidades. Sem isso, uma trava
será criada para se pensar no desenvolvimento.
E fatalmente o que não se desenvolve se atrofia
ou apodrece, ou seja, será uma questão de
tempo para tudo ruir. A questão do transporte
complementa isto e aponta para um único
caminho: o transporte público. Isso porque não
há como frear a urbanização das cidades e,
assim, o transporte deve ser compartilhado para
que se tenha fluidez e equilíbrio. Apesar de
pensarmos mais freqüentemente em veículos
coletivos, calçadas bem planejadas também
ajudam a melhorar o que podemos chamar de
"conquista do direito de ir e vir". Já a locomoção
entre cidades é algo mais desafiador, uma vez
que não há como contar com rodovias e os
aeroportos recebem toda pressão por isto. O
fato é que, apesar de percebida, a melhoria na
infra-estrutura brasileira como um todo caminha
a passos lentos e não sabemos ainda se este
cenário mudará até a Copa, o que aumenta
significativamente o custo de fazer negócios por
aqui.

Modelo fiscal e tributário: num país


onde regras fiscais podem mudar diariamente,
não há como se pensar em estabilidade sequer
emocional para empresários e investidores.
Muito do sucesso dos períodos de grande
expansão das sociedades modernas foi devido
aos modelos simples e estáveis do regime fiscal
aplicado pelos respectivos governos. Apesar
desta solução encontrar consenso como algo de
grande importância entre quase todas as
instituições empresariais do Brasil, ele resiste
em acontecer, mas poderá ser vencida com
uma boa dose de vontade e coragem política.
Aqui contará a expertise de tributaristas para
alcançar um modelo que se aproxime do ideal
em responder tanto ao interesses privados
como as necessidades governamentais.

Estrutura jurídica: pensar em altos


investimentos no Brasil ainda é algo que
amedronta a todos que decidem correr este
risco. O principal motivo não é a instabilidade
política nem a financeira, que parecem estar
sob controle. A fraca e degradada estrutura
judiciária brasileira assusta investidores, pois é
difícil colocar milhões onde apenas uma caneta
pode tirar. A moralização de todas as instâncias
se faz necessário urgentemente, além de uma
melhor preparação dos servidores do judiciário,
sabidamente com baixa qualificação e nível de
atendimento insatisfatório.

Desenvolvimento do esporte: diferente


do que se pensa o esporte não é somente
instrumento de turismo e entretenimento. Mais
do que isso, o desenvolvimento dessa área se
faz útil para duas das mais importantes
ferramentas de uma sociedade desenvolvida:
saúde e educação. Boa estrutura física e bons
profissionais devem ser preparados para
transformar o país do futebol sem chuteiras
num país desenvolvido. Vale lembrar que esta
ideia foi apresentada no início deste trabalho
como uma das questões chaves deste grande
projeto que é a Copa do Mundo.
Planejamento público: pela tradição de
decisões centralizadas e pouca capacidade de
avaliação de feedbacks, tudo que é gerado
pelos governos para a “construção” da Copa do
Mundo, que é a maioria das ações, pode ser
severamente comprometido por esta
ineficiência institucional. Crises podem surgir
por conta deste processo e, por isso, faz-se
necessário a criação de um modelo de gestão
diferenciado para estas ações. Aqui entra
também o desafio de se planejar e cumprir
orçamentos eficientes, sob o risco evidente de
custos altos e desnecessários que podem gerar
dificuldades de viabilidade das obras. Este
desafio se mostra especial também pelo fato de
termos eleições em 2010 e 2012, anos cruciais
no planejamento deste ciclo. Isso pode afetar
projetos tanto pelo jogo político das liberações
de verbas públicas como pela possibilidade da
pouca integração entre os governos municipal,
estadual e federal, o que pode gerar diferenças
significativas e perigosas entre os projetos
originais e os efetivamente executados.

Energia: eventos recentes como os


apagões nas grandes cidades mostram que a
segurança energética do país está sob suspeita.
Não há como receber um evento de grande
porte sem garantias neste sentido, mas o
problema pode fugir ao controle caso não haja
projetos e alternativas para o torneio e para o
futuro, o que já se tem discutido. Posso estar
sendo otimista, mas entendo que a efetividade
nesta área é algo relativamente simples para
um país tão cheio de possibilidades como o
nosso.

Serviços: apesar do foco estar em serviços


essenciais, outros estarão à prova durante a
Copa, como os táxis, a alimentação fora de
casa, a saúde e o comércio em geral. Atender
bem, se comunicar ao mínimo possível e
mostrar qualidade ainda é algo que estamos
aprendendo a fazer. Serviços é uma área difícil
de se controlar e carece muito das iniciativa
privada para apoiar o quadro geral. Neste
quesito precisamos melhorar por certo, pois
simpatia somente não garantirá satisfação dos
visitantes.

Cada um deve cumprir seu papel

Se vale uma extensão desta análise dos


desafios, esta deve ser no sentido de estar
atento para que cada agente deste modelo de
negócio cumpra seu papel. Do governo se
espera austeridade e boa capacidade de
planejamento. Dos empresários se espera
coragem para investir e profissionalismo na
administração. Da sociedade se espera uma
postura crítica, atenta aos movimentos para que
possa acompanhar e permitir as mudanças no
país.

Os gargalos do desenvolvimento
Muito se tem falado sobre as exigências da
FIFA para a realização da Copa do Mundo no
Brasil. Neste ponto, a Alemanha já havia sido
prova da flexibilidade da organização e a África
do Sul mostrou que os encargos realmente não
são tão radicais quanto parecem, o que não nos
impede de querer cumprir a risca os detalhes do
documento. No caso africano, o país não
apresentou a mesma infra-estrutura da
Alemanha, claro, mas fez um belo papel mesmo
assim, oferecendo uma atmosfera mágica aos
jogos e encantando os turistas que por lá
compareceram e que estavam ali no intuito de
se divertir e conhecer realmente aquele país,
além de torcer, é claro. Isso prova que é mais
interessante adaptar a competição ao torneio do
que vice versa. A FIFA, se seguir a mesma regra
aqui, pressionará pela excelência, mas
valorizará o que for feito em termos de infra-
estrutura e, por razões óbvias, concentrará seus
esforços na preparação dos estádios que
sediarão os jogos. Deste último falaremos no
capítulo a seguir, ficando aqui neste algumas
reflexões sobre o que podemos chamar de
suporte para a Copa. Mesmo que importante,
não serão estes motivos que farão a
organização tremer frente ao desafio de realizar
o evento. Como já dito, a África do Sul provou
isto.

Inicialmente podemos afirmar que os


gargalos para o Brasil sediar a maior
competição esportiva do mundo são, na
verdade, muito poucos, mas que não deixam de
ser problemas sérios para a nação, uma vez que
são os mesmos entraves para o
desenvolvimento do país. Assim, aproveitar a
Copa e a boa posição que o Brasil possui em
termos de macroeconomia, este sim um grande
desafio nacional, para ajustar cada item que
ainda não oferece condições para nossas
cidades, seja para o turismo seja para as demais
áreas, pode ser uma conveniente oportunidade.

Aportes para as cidades

Pelo projeto desenvolvido pelo governo


federal as 12 cidades-sedes receberão aportes
diretos, além de ter sua capacidade de
endividamento ampliada. Na escala decrescente
dos investimentos as cidades receberão os
seguintes valores, segundo dados do próprio
governo federal:
Rio de Janeiro R$ 1.973,2 bilhão
Natal R$ 1.499,6 bilhão
São Paulo R$ 1.455 bilhão
Belo Horizonte R$ 1.435,1 bilhão
Manaus R$ 1.357,5 bilhão
Salvador R$ 1.263,9 bilhão
Brasília R$ 1.219,0 bilhão
Cuiabá R$ 1.212,9 bilhão
Fortaleza R$ 890,6 milhões
Recife R$ 779,8 milhões
Porto Alegre R$ 724,6 milhões
Curitiba R$ 720,2 milhões
Desses aportes, a maior parte será para
áreas que servem de apoio à Copa, mas que são
importantes para o Brasil do futuro, como:
Parque hoteleiro R$ 3.163,93
bilhão
Reurbanização R$ 2.847,3 bilhão
Segurança R$ 1.697,4 bilhão
Aeroportos R$ 1.213,7 bilhão

Parte dos aportes será destinado a despesas


operacionais do evento, sendo o principal deles
relativo as arenas:

Arenas R$ 4.624,50
bilhões
Segurança R$ 327 milhões
Garantias R$ 280,52 milhões
energéticas
Fan Fests R$ 204 milhões
Centro de Imprensa R$ 184 milhões
(IBC)

Entre as garantias energéticas, pesa nesta


conta o funcionamento de termoelétricas
durante a Copa. O detalhe entre estes
investimentos é que apenas as arenas e a infra-
estrutura tecnológica para o IBC poderão ser
incorporados como legado para o país.
Mobilidade: custos altos x soluções
provisórias

Existem no projeto do governo e do LOC


ações efetivas em diversas áreas para
estruturar as cidades-sedes. São obras grandes
e caras e, por isso, com execução duvidosa,
apesar de possível e muito bem vinda,
especialmente para os moradores dessas
cidades. Porém, apesar de importantes, muitas
delas possuem alternativas pontuais, caso
necessário.

Podemos citar a mobilidade urbana como


emblemática nesta reflexão. O fato é que as
arenas brasileiras praticamente não possuem
problema de acessibilidade e, sim, de
mobilidade. Aqui entra em cena o trânsito
caótico das grandes cidades. Neste caso, para
que tenhamos uma operação adequada e
positiva em dias de jogos de Copa do Mundo e
viabilizemos uma experiência satisfatória de
matchday aos torcedores, demais turistas e
moradores, poderíamos utilizar como estratégia
decretar feriado nos dias dos jogos. A medida
seria apenas nas cidades-sedes e para reduzir o
trânsito. Em alguns casos mais radicais o feriado
poderia ser para todas as esferas e em outros
somente para escolas e universidades, além dos
órgãos públicos. Mesmo que isso ofereça
impacto econômico seria uma alternativa
necessária para problemas maiores durante o
torneio. Claro que alternativas como esta não
resolverão o problema do tráfego nas cidades
em definitivo, mas, se for necessário, poderão
oferecer tempo para uma reflexão maior sobre
que pontos deverão ser prioritários na busca de
alternativas para soluções definitivas e que
mereçam a execução de um projeto
independente de seu valor. Sem querer entrar
nesta discussão, o que quero mostrar aqui é
apenas que a Copa não “exige” infraestrutura
de primeiro mundo para sua realização, ou seja,
sua flexibilidade não nos coloca em posição de
obrigação com estes investimentos. Assim, se o
fizermos, será pela necessidade que teremos
para isso e por vontade política própria, tirando,
dessa forma, um peso grande das temidas
exigências da FIFA. Elas existem, por certo, mas
não para colocar nosso plano de
desenvolvimento “na parede”.

Aeroportos: uma área difícil de decolar

Numa primeira análise, percebo que o tema


“aeroporto” deve ser a grande prioridade para
os governos. Mais que um legado da
competição, um país com dimensões
continentais como o Brasil não pode se furtar de
possuir estrutura viária satisfatória para que
todas as regiões possam desfrutar das chances
de se desenvolver e pessoas e cargas possam
fluir por esta importantíssima alternativa. Para a
Copa dificilmente teremos isso resolvido, mas
iniciar este caminho agora nos fará chegar lá o
mais cedo quanto possível.
Sabendo do tamanho deste desafio, o
Sindicato Nacional das Empresas Aeroviárias
(SNEA), fez um estudo para saber a situação
real dos aeroportos brasileiros. O resultado foi
um pesadelo para o país, mas nada diferente do
que todos que utilizam este sistema de
transporte já não saibam ou tenham percebido e
sentido “na própria pele”. Dos 20 aeroportos
pesquisados, todos os que servirão como ponto
de trânsito para o torneio, sete já operam hoje
no limite ou, pior, acima de sua capacidade:
Confins (MG), Brasília, Cuiabá, Fortaleza, Porto
Alegre, Congonhas e Cumbica (ambos em SP).
Para estes, mesmo com as melhorias já
previstas pela Infraero (Empresa Brasileira de
Infraestrutura Aeroportuária), estatal que
administra os aeroportos, a projeção da
pesquisa do SNEA é que continuem saturados
em 2014. Para Salvador, que ainda não chegou
no limite de sua operação, a projeção também é
de saturação para o ano da Copa.

Os números deste estudo são realmente


assustadores. Para se ter uma idéia do tamanho
do problema, se a projeção se confirmar
teremos, em 2014, 50 milhões de passageiros a
mais que em 2009. Para quem vivencia o
tumulto atual nestes locais será sofrível
imaginar o quanto poderá ser desagradável a
experiência de ter que pegar um avião para se
locomover dentro do Brasil, algo que, numa
Copa do Mundo, é tarefa obrigatória, já que
todas as seleções jogam em diferentes sedes
durante o torneio. Assim, transportar seleções,
jornalistas e torcedores de 32 diferentes países
ao mesmo tempo, além de todos que não
pararão suas vidas por este motivo, pode ser
considerada a maior interrogação para nosso
desafio de sediar o evento.

Guarulhos, em São Paulo, é um símbolo


deste cenário. Em 2010 sua capacidade de
operação de 17 milhões de passageiros deverá,
segundo expectativas, ser superada em muito,
chegando a quase 24 milhões. Resultado, o
principal aeroporto do país, porta de entrada de
dois terços do total de entradas de turistas e
executivos estrangeiros no Brasil, se
transformou no cartão de visitas do que é um
país em crise de identidade: oitava maior
economia do mundo, o Brasil tem seu principal
aeroporto muito longe de qualquer índice
razoável de qualidade em serviços, com
números somente comparáveis a locais sem
nenhuma expressão em termos de demanda.

A revista Exame, da Editora Abril, fez um


diagnóstico do terminal e comparou alguns
números com outros aeroportos de grandes
centros ainda em desenvolvimento, como nosso
caso. A matéria, publicada no site da revista em
25 de maio de 2010 trouxe o sugestivo nome de
“Guarulhos virou Bagulhos”:

Nos horários de pico, o saguão principal parece


uma saída de estádio de futebol, com longas filas se
entrecruzando. Não há opções de lazer nem acesso
à internet. Nos terminais de Kuala Lumpur, capital
da Malásia, a internet sem fio é grátis desde 2007. A
sala de embarque de Guarulhos é acanhada, com pé
direito baixo. Em caso de problemas meteorológicos
e voos cancelados, o ambiente fica sufocante. No
aeroporto da Cidade do México, as paredes têm 6
metros de altura e o clima é arejado. No
desembarque, o primeiro problema enfrentado por
quem chega a Guarulhos é a retirada da bagagem.
Há apenas 12 esteiras nos dois terminais, todas
coladas, deixando pouco espaço para os carrinhos.
Na Cidade do México, com movimento de 24,7
milhões de passageiros no ano passado, são 37 as
esteiras e o espaço é amplo - é só se aproximar,
pegar a mala e sair com tranquilidade. Nos
bastidores, o sistema de gerenciamento de
Guarulhos também é obsoleto. Manejamos 7 200
malas por hora, enquanto só o terminal 3 do
aeroporto de Pequim, construído para a Olimpíada
de 2008, entrega 19 200 volumes. Lá, as malas
saem diretamente do avião para as esteiras e
chegam à área de passageiros a um ritmo de 2 000
itens por hora. Aqui, funcionários transferem
manualmente as malas do porão dos aviões para um
trator levá-las às esteiras, que operam à velocidade
de apenas 600 itens por hora. Ao final, em 4 minutos
e meio os usuários do aeroporto chinês estão com
as malas nas mãos. São 40 minutos de demora em
Guarulhos”.

Pelo levantamento inicial da Infraero, R$


4,47 bilhões serão investidos nos aeroportos
internacionais das cidades-sedes e em
Viracopos (Campinas). A ampliação dos
terminais de passageiros é a principal obra dos
projetos e deverá ser o legado mais útil neste
sentido. Pelo fato de não termos mais tempo
para concluir outras melhorias, soluções
provisórias, como a instalação de módulos
operacionais (estruturas-padrão que ampliam
provisoriamente a área útil do aeroporto),
consumirão boa parte dos recursos sem deixar
legado para os brasileiros. Isso se deve,
principalmente, pelo fato de o país não possuir
ainda uma política definitiva sobre o modelo de
operação doesses terminais. A privatização seria
uma saída, mas até mesmo uma discussão
sobre isso é difícil de imaginar, o que projeta
uma impossibilidade de encontrarmos soluções
no prazo. Para o que já está programado, o
cronograma de obras apresenta quase tudo
para ser feito em 2012 e 2013, mesmo sabendo
do já caótico momento do setor.

Seguindo no assunto, sem a privatização a


saída poderia ser um complexo arranjamento
entre a Infraero, que opera os aeroportos, mas
não é dona dos terrenos dos mesmos, e o
governo, que é dono dos terrenos e, por isso,
não recebe IPTU por eles. Uma entrega destes
terrenos para Infraero capitalizaria a empresa e
permitiria uma abertura de capital na bolsa, o
que seria vantajoso, apesar da operação ser
encarecida com este novo custo para a
empresa. Esta alternativa será tão difícil quanto
a privatização, uma vez que também envolve
discussões em vários níveis, mas pode ser
considerada para não corrermos o risco de
falhar por falta de opções.

Sob o risco de viver um apagão aéreo em


2014, o governo já deve pensar em mais que
uma ou duas alternativas, entre elas a divisão
do país em quatro regiões para evitar grandes
deslocamentos, medida já anunciada pela FIFA
como preventiva, além da construção de novas
pistas e a criação de saídas rápidas, um dos
pontos apontados como crítico pelo estudo do
SNEA. Assim, o que se desenha na mais otimista
análise é, infelizmente, algo que vai atender ao
momento do torneio, mas que não terá
qualidade alguma e ainda estará longe dos
padrões internacionais, isto algo nunca visto no
Brasil. Depois da Copa, então, isso ainda
demandará paciência e boa vontade dos que
utilizam este sistema até que as saídas
definitivas entrem em operação.

Hotelaria

Para evitar subaproveitamento do torneio


na hotelaria um levantamento cruzado
minucioso sobre a demanda do evento e a
demanda futura das cidades-sedes precisa ser
bem feito, deixando o cenário bem claro para
investidores e operadores de hotéis. Por
enquanto já temos um estudo feito pelo Fórum
de Operadores Hoteleiros do Brasil (FOHB) que
quantificou uma recomendação para a oferta de
leitos com base em informações de países que
receberam o mundial anteriormente. Esta
informação aponta para o número equivalente
de leitos em 30% da capacidade do estádio da
cidade que sediará o jogo. Considerando a
oferta atual e futura de leitos prevista em
projetos já divulgados e numa área de até 150
km de distância das cidades-sede ou mais, no
caso de locais que possuem fácil acesso e boa
estrutura turística, o estudo identificou que 10
das 12 cidades estão com números aceitáveis.
As duas que estão fora dessa zona são Manaus
e Cuiabá, com incríveis 3,7 mil e 4 mil leitos em
demanda, respectivamente. Nestes casos,
buscar alternativas para o evento é tão
desafiador quanto encontrar a viabilidade futura
para os projetos.

Realmente será necessário muito esforço


para oferecermos soluções adequadas para
estas cidades em especial, pois atrás desse
baixo número de leitos há uma demanda
pequena e, com isso, uma fraca infra-estrutura
em toda a cadeia turística, a começar pela
qualificação dos recursos humanos, sempre
difícil e que, possivelmente, somente deverá ser
testada no momento do torneio, o que não
deixa de ser um risco grande para a imagem
imediatista de quem passará alguns dias na
cidade.

Nas demais cidades, uma melhoria nos


portos, o que já foi planejado pela Secretaria
Especial de Portos da Presidência da República,
pode suprir uma demanda pontual por leitos de
alto padrão, pois navios já foram utilizados com
sucesso em outros grandes eventos em cidades
que podiam contar com este recurso. O volume
investido neste setor está orçado em R$ 740,7
milhões e contempla os portos de Manaus,
Natal, Salvador, Recife, Mucuripe (Ceará),
Santos e Rio de Janeiro. Belo Horizonte, que não
conta com tal opção, ainda busca saída nas
negociações com redes hoteleiras que operam
estabelecimentos de alto padrão.

Para a hotelaria a cautela será necessária,


pois a experiência sul-africana aponta para
possibilidades concretas de um cenário
diferente das otimistas previsões para o setor.
Até mesmo os famosos parques nacionais, como
o Kruger e o Santa Lúcia, cenário já sonhado por
muitos para safáris pelas savanas africanas,
tiveram ocupação mais baixa do que em anos
sem Copa, apesar do registro de entradas no
pais ser superior ao ano anterior à competição.
O motivo provável foi o alto preço das
passagens aéreas e hotéis do país e um
esperado provável congestionamento nos
serviços em geral, o que afastou os interessados
nos pacotes para o destino. Apesar disso, os
agentes locais se mostraram satisfeitos com a
repercussão positiva do evento e a grande
divulgação que a África do Sul teve durante a
competição em todo o mundo.

Uma observação pessoal quanto ao baixo


rendimento do setor turístico sul-africano é que
foram realizados poucos eventos ligados
diretamente com a Copa. Neste ponto, ao meu
ver, todas as cidades que se propuserem a
realizar festas e outras ações bem organizadas
para fomentar o turismo dos que já estão na
cidade terão retorno imediato sobre isto, tanto
pelo lado financeiro quanto de imagem.

Quanto às projeções sul-africanas, elas


decaíram de 450 mil turistas, previstas
inicialmente para o evento, para 375 mil num
segundo momento e, por fim, em 250 mil.
Apesar da distância entre os números inicial e
final, o fato demonstra que provavelmente
houve uma distorção nas expectativas pelo
evento, o que fica como lição para o setor
brasileiro. Quanto ao preço de hospedagem,
uma das possíveis causas da demanda menor
que o esperado, o sucesso da mobilização feita
na Alemanha em 2006 pelos órgãos reguladores
para que a rede praticasse preços justos não foi
alcançada pelos africanos, ou seja, muitos
hotéis explodiram seus preços, o que dificultou
as vendas quando as expectativas reais foram
efetivadas. Mais uma vez fica a lição para o
mercado brasileiro, pois bloqueios de
apartamentos feito por operadoras irão ocorrer,
assim como na África do Sul, mas o
cancelamento dentro das regras pode ser uma
realidade sombria, assim como foi para o
mercado do país sede em 2010.
Capítulo 4

Perspectivas:
a necessidade de se prever o
futuro

Dificuldades esperadas
Inicialmente vale registrar que há
dificuldade de se realizar qualquer projeto, seja
público ou privado, grande ou pequeno, e em
qualquer continente. Esta afirmação está no
estudo Boosting Business Performance through
Programme and Project Management, da
empresa de consultoria PriceWaterhouse
Coopers, que já apoiou diversos projetos
esportivos. Os dados apontam para uma grande
dificuldade dos chamados Projetos de Capital
(CAPEX), pois apenas 2,5% das companhias
entregam seus projetos dentro dos prazos, do
custo, do escopo e com os benefícios esperados
para o negócio.

Ainda segundo este estudo, 8% destes


projetos equivocados se explicam por motivos
relacionados diretamente a aspectos
financeiros, enquanto 92% estão relacionados a
aspectos gerenciais, como planejamento e
monitoramento inadequados e falta de gestão
organizacional. Se isto é uma realidade em
empresas globais, muitas com projetos de
eficiência e produtividade já ativados
internamente, podemos deduzir que o desafio
do Brasil e de todos os agentes envolvidos com
a Copa do Mundo e as Olimpíadas podem ser de
previsível desvio de rumo de suas metas
originais.

Não vale como consolo para problemas


futuros, mas fica claro que não podemos
superestimar nossa capacidade de gestão e,
mesmo com números iniciais e finais
divergentes, devemos fazer uma avaliação
sincera e referenciada sobre os parâmetros
alcançados por nossa “epopéia” na realização
dos mega eventos esportivos que estão por vir.

Projeções econômicas

É tempo de festa para os responsáveis por


números. O que eles dizem sobre nossa
economia com a Copa? Os mais otimistas
apontam que seremos capazes de multiplicar
por cinco o total de aportes aplicados
diretamente na concretização do evento. Estes
números podem ser encontrados em análises de
experts, como a publicada pela consultoria
Ernest & Young em parceria com a Fundação
Getúlio Vargas, “Impactos socioeconômicos da
Copa do Mundo de 2014”, parte integrante da
série de estudos “Brasil Sustentável” e que
utilizarei como referência para os dados
apresentados a seguir. O estudo na íntegra
pode ser baixado livremente na internet,
inclusive no blog que criei para este livro:
obrasileacopadomundo.wordpress.com/.

Projeta-se que, em contrapartida aos


gastos de R$ 22,46 bilhões relacionados com a
competição, incluindo infra-estrutura, maior
custo da planilha, a Copa deverá injetar R$
112,79 bilhões na economia brasileira. No total,
o país movimentará R$ 142,39 bilhões
adicionais no período 2010-2014, gerando 3,63
milhões de empregos-ano e R$ 63,48 bilhões de
renda para a população, impactando, dessa
forma, no consumo interno.

Esta produção também deverá ocasionar


uma arrecadação tributária adicional de R$
18,13 bilhões aos cofres públicos. Com tudo isso
o impacto direto da Copa no Produto Interno
Bruto (PIB) brasileiro é estimado em R$ 64,5
bilhões para o período 2010-2014, que
corresponde a 2,17% do valor estimado do PIB
para 2010, de R$ 2,9 trilhões. Vale ressaltar que
parte dessa receita não será permanente, uma
vez que ocorrerá no torneio e com ele cessará,
mas isso representa a menor fatia. Visando
garantir a manutenção dos impactos positivos,
sabemos que sua continuidade dependerá de
nossa capacidade em aproveitar os legados do
evento, sejam quais forem.

Quanto a geração de emprego, sabe-se


também que boa parte dela será para
ocupações temporárias. Como referência, os
3,63 milhões de empregos-ano estimados para
o período pré-Copa correspondem, em termos
salariais, ao mesmo número de ocupações com
duração de um ano.

Impacto na economia

PIB – Quanto ao impacto no PIB de 2014,


as previsões são otimistas, uma vez que, em
estudos globais, tal impacto se projeta entre
0,3% e 0,7% do PIB em países que sediam
grandes eventos. No Brasil a projeção, ainda
segundo o mesmo estudo da Ernest & Young, é
de 0,7%, mas com números que superam este
em várias cidades, em especial em Natal, com
R$ 758,6 milhões em impacto no PIB local, que
em 2010 terá o valor de R$ 32.490,3 bilhões,
representando 7,1% de impacto direto
(comparando com o PIB de 2010) e Cuiabá,
com R$ 597,3 milhões em 2014 que, comparado
ao de 2010 que somou R$ 10.489,1 bilhões,
representará 5,7%. Outras apresentam índices
mais modestos, mas mesmo assim acima do
teto da expectativa global:

• Salvador (1,8%, com R$ 625,7 milhões


gerados ao PIB de R$ 35.481,4 bilhões em
2010);

•Manaus (1,5%, com R$ 664,5 milhões em


R$ 45.672,3 bilhões em 2010);

• Belo Horizonte (1,4%, R$ 717,4 milhões


em R$ 50.724,6 bilhões em 2010);

• Fortaleza (1,4%, R$ 439 milhões em R$


32.490,3 bilhões em 2010);

• Recife (1,4%, com R$ 378,7 milhões em


R$ 27.504,1 bilhões em 2010);

•Porto Alegre (0,8%, com R$ 339,3


milhões em R$ 44.385 bilhões em 2010).
No teto ficou a projeção para uma sede:

• Curitiba (0,7%, com R$ R$ 343,2 milhões


em R$ 50.169,3 bilhões em 2010).

Dentro da zona dos estudos globais


ficaram:

•Brasília (0,5% com R$ 606,9 milhões em


R$ 132.681,9 bilhões em 2010); e

•Rio de Janeiro (0,5% com R$ 987,4


milhões em R$ 185.270,8 bilhões de 2010).

Abaixo da média ficou apenas uma sede:

•São Paulo (0,2% com R$ 723,3 milhões


em R$ 424.806 bilhões em 2010).

PIB por setor

Além da avaliação geral também estima-se


o impacto por cada setor produtivo para o
período entre 2010 e 2014. Nos 24 setores
estudados se projetou um total de R$ 57.217
bilhões, sendo R$ 41.900 bilhões de impacto
direto e R$ 15.317 bilhões indireto. Os que
sofrerão impacto direto considerável são (em
números aproximados): construção (R$ 8
bilhões) e serviços prestados à empresas (R$ 5
bilhões), além de hotelaria e alimentação para o
turismo (R$ 1 bilhão). Comércio, administração
pública e seguridade social, serviços de
informação, transporte, armazenagem e correio,
assim como serviços públicos, também são
áreas que terão impacto direto. Outras áreas
sofrerão apenas impactos indiretos, apesar de
consideráveis, como os serviços imobiliários,
intermediação financeira e seguros, alimentos e
bebidas, agricultura, educação e serviços de
manutenção e reparação.

Gastos dos visitantes

Pelas projeções, os gastos dos visitantes


serão de R$ 5.940 bilhões, sendo este valor
assim dividido:
Hotelaria R$ 2,126,52 bilhões
Alimentação R$ 902,88 milhões
Compras R$ 831,60 milhões
Transporte R$ 528,66 milhões
Cultura e lazer R$ 516,78 milhões
Comunicações R$ 273,24 milhões
Serviços diretos R$ 760,32 milhões
(saúde, etc)
Fonte: E&Y/FGV

Setores beneficiados

O fato do evento beneficiar diretamente e


com privilégio alguns setores e locais não
diminui sua importância nem tampouco sua
possibilidade de ser de “interesse nacional”.
Dessa forma, a Copa afetará mais diretamente a
construção civil, alimentos e bebidas, serviços
prestados às empresas, serviços públicos
(eletricidade, gás, água, esgoto e limpeza
urbana) e serviços de informação. Para estas
áreas a produção deverá ser aumentada em R$
50,18 bilhões.

A construção civil, maior beneficiada,


gerará R$ 8,14 bilhões a mais no período 2010-
2014. Para 2010 a produção total do setor foi
estimada em R$ 144,6 bilhões. Já os de serviços
prestados às empresas e serviços imobiliários e
de aluguel produzirão R$ 6,5 bilhões adicionais
no período e R$ 4,4 bilhões respectivamente.

Do total de R$ 29,6 bilhões que


correspondem aos gastos estimados
relacionados à Copa (incluindo despesas de
visitantes), R$ 12,5 bilhões terão como origem o
setor público (42%) e R$ 17,16 bilhões serão
provenientes do setor privado (58%).

Para o setor turístico projeta-se um


incremento de 79% no fluxo internacional em
2014, permitindo, inclusive, aumentos maiores
ainda nos anos subsequentes, imputando
divisas consideráveis no país, especialmente no
setor de hotelaria.

Apesar de identificarmos claramente


setores privilegiados, o caráter sistêmico da
economia deve garantir uma extensão dos
benefícios para diversos outros setores,
fortalecendo fornecedores e toda sua cadeia de
negócios num nível que se conhece como
consumo intermediário.
Outro efeito natural dessa injeção
financeira será o de bens e serviços, uma vez
que a renda dos trabalhadores se converte,
naturalmente, no incremento deste setor. É o
que na economia se conhece como efeito-renda
ou impacto induzido.

O legado material

Será um grande desafio até mesmo para


qualquer especialista neste tipo de análise
comprovar o verdadeiro impacto da Copa na
economia brasileira. A dificuldade de provar por
“A + B” tudo aquilo que seus estudos mostram
é algo normal para qualquer país que sedia
grandes eventos e não deve ser motivo de
vergonha para nossos estudiosos do tema. Esta
dificuldade ocorre porque os benefícios podem e
devem se mostrar em dois diferentes tipos de
fatores, sendo parte quantitativo e parte
qualitativo. Além disso, caso a meta de
horizontalização do evento seja alcançada,
repartindo benefícios gerais também com
cidades que não sediam jogos, os números
esconderão outra parte importante deste
processo.

Mas, há parte importante do legado que


pode ser mais facilmente constatada, como os
novos estádios sedes de jogos, por exemplo,
tema que ocupa um capítulo específico neste
trabalho, e os sistemas de transporte, que
devem sofrer grande transformação. Neste
caso, o objetivo é promover a mobilidade
urbana, um desafio atual para os grandes
centros, mas que pode ser dissociado do projeto
da Copa, como mostraremos no capítulo 4.
Juntos, estes dois fatores respondem pelo maior
número de recursos que serão destinados para
ao torneio de 2014.

Outro ponto de destaque, e este não há


como relevar como impacto direto da
competição, são os sistemas de informação e as
tecnologias de comunicação. A Copa no Brasil,
inclusive, deve apresentar uma grande
novidade para o mundo: a transmissão em 3D. E
o que foi feito como experimental na África
projeta-se que será altamente comercial em
2014. Sendo assim, deveremos ter uma infra-
estrutura completa para este tipo de
transmissão e isso poderá ser um grande legado
do torneio, uma vez que seria razoável pensar
que esta tecnologia chegaria atrasada por aqui.
Na própria exigência das novas arenas já há
especificações neste sentido quanto a
iluminação. Há pouco tempo os estádios
possuíam equipamentos com 800 a 1500 lux,
que é a unidade para medir a quantidade de luz.
Atualmente, para atender aos padrões de
transmissão televisiva, a maioria das arenas já
passou a adotar equipamentos com 1800 lux.
Para se antecipar ao padrão 3D, a FIFA já exige
para os modernos estádios serviço com 3500
lux para iluminação horizontal e 4.200 lux para
vertical, além do sistema conhecido como ride-
trough, que garante energia estável até o funcionamento dos
geradores, em caso de queda de energia.

Outra área identificada como beneficiada


por uma competição deste porte é o turismo,
com ganhos concretos na área de hoteleira. Já
no meio de mídia e publicidade, normalmente
há altos investimentos com o torneio. Na
tecnologia da informação os números são bem
animadores. Na Copa da Alemanha, por
exemplo, se gerou um volume de 15 terabytes
de dados, equivalente a 100 milhões de livros.
Muito disso é gerado nos centros de mídia, que
pesam as transmissões de dados e que serão
montados para a Copa com um custo estimado
em R$ 184 milhões. Outra área beneficiada é a
do transporte, que ganha com os investimentos
em infra-estrutura nas cidades sedes e o
processo de reurbanização destas, além da
segurança pública, que receberá investimentos
de mais de R$ 1 bilhão.

Além do impacto direto nestas áreas, há


também impactos indiretos e induzidos que, ao
final podem gerar R$ 112,79 bilhões, ainda
segundo dados do estudo “Brasil Sustentável”.
Exemplo destes ganhos adicionais ocorre na
previdência social, com maior número de
empregos e mais dinheiro circulando para atrair
a formalização do mercado, assim como a
empregabilidade de parte dos trabalhadores
que receberão treinamento específico para o
evento, incluindo aqui todas as áreas, desde a
de construção civil até a de turismo. Este setor,
aliás, será fortalecido em quase todas as partes
da cadeia, podendo transformar profundamente
o cluster em termos de estrutura e divulgação.
Por fim, os negócios locais das cidades-sedes
também sofrerão, por certo, impactos
econômicos com a realização do evento.

Como dito antes, esta medição é algo


difícil, uma vez que as análises devem ocorrer
tanto por fatores quantitativos como
qualitativos, mas este desafio precisa ser
vencido. Por certo teremos uma série de
estudos feito por universidades e outras
instituições de pesquisa para que possamos ter,
no tempo certo, uma luz sobre este assunto que
iluminará não somente os próximos quatro
anos, mas também todas as gerações do Brasil
pós-Copa.

Efeitos negativos

A história prova que projetos como este


trazem também efeitos ruins garantidos, como o
aumento de tarifas e do déficit público,
ramificações claramente negativas para a
economia, mas que entram na balança como
em qualquer outro projeto, pois sempre há estes
custos para grandes investimentos. Podemos
contar com isso como certo, mas também como
necessário para que se promova o custeio do
que foi investido em infra-estrutura e também
na construção dos estádios.
Forças brasileiras

Diferente do que muitos podem pensar, o


Brasil tem boas “armas” para esta “batalha”.
São elas:

Política econômica: estabelecida no


governo Fernando Henrique, a base da estrutura
econômica foi mantida pelo governo Lula, com
doutrinas como a meta inflacionária e taxa de
câmbio flutuante.

Diversificação nas exportações:


extremamente acertada a visão do governo em
reforçar relações comerciais com Ásia e África.
Isto reflete uma saudável política ativa de
comércio internacional.

Mercado doméstico: crescente e


sustentável por um bom período de alívio
monetário, o Brasil já conta com exportações
representando menos de 15% do seu PIB, menor
que grande parte de outros países emergentes.

Papéis dos setores: o público e o privado


aqui já encontram consenso, algo difícil em
qualquer parte do mundo, em questões
complexas como macroeconomia.
Setor bancário forte: os ativos tóxicos,
como os derivativos, que exterminaram grandes
bancos pelo mundo, não contaminaram os
brasileiros. Além disso, o BNDES, bem
capitalizado, orquestra a economia e permite
menos conservadorismo de instituições
importantes como Banco do Brasil e Caixa.

Mercado de capitais: fruto da


estabilidade da economia, tem oferecido cada
vez mais crédito ao setor privado, alcançando o
número expressivo de 45% do PIB nacional. Isto
indica a boa leitura que os investidores,
inclusive estrangeiros, fazem do momento do
país. Neste ponto projeta-se, em 2010,
investimentos externos na ordem de US$ 34,3
bilhões, número inferior ao do ano da crise
mundial em 2008 (US$ 45,1 bilhões), mas
crescente (projeta-se US$ 40 bilhões para
2011).

Cenário político: mesmo com a eleição


presidencial de 2010, houve uma crença
internacional de que mudanças radicais não
ocorrerão no Brasil, ou seja, a estabilidade
política nacional é algo percebido em todo
mundo.

Muitas outras vantagens poderiam ser


trazidas aqui, mas estas apontam para pilares
sólidos e que certamente farão grande diferença
em nossas respostas ao que teremos no futuro.
Medição do impacto – difícil, mas
necessário

Já havíamos alertado que este será o maior


desafio para o Brasil. Medir o impacto de um
grande evento internacional é e sempre foi
tarefa difícil e complexa. Mas, no centro destes
estudos sempre deverá estar uma regra
econômica básica: o investimento vem na
frente. É este investimento que irá criar a renda
que gera a poupança que paga o investimento.
Apesar de parecer simples, a equação e a
complexidade dos números garantem a
dificuldade desta ferramenta de análise.

Na revisão de literatura que fiz para a


concepção deste livro percebi que, geralmente,
o impacto de um grande evento como este deve
ter duas abordagens: uma quantitativa e outra
qualitativa. Para a qualitativa normalmente
utiliza-se os métodos DELPHI e Scenario
Modelling, dentre outros.

Já o método quantitativo se sub-divide em


duas abordagens diferentes: estocástica e não-
estocástica. A segunda inclui o conhecido
modelo input–output (I–O) com uma abordagem
conhecida como Social Accounting Matrix (SAM)
e o sistema CGE (Computable General
Equilibrium). O modelo I-O/SAM para análise de
eventos deste porte sempre comprovou que a
resposta na saída (output) é um múltiplo da
entrada original, ou seja, há benefícios
comprovados em sediar grandes eventos. O
mesmo resultado foi alcançado utilizando o
sistema CGE, que são representações
desagregadas da economia e que leva em
consideração interações entre demanda e
produção do país. Por parte da produção
observa-se a flexibilidade e os custos para tal. Já
por parte da demanda se observa a capacidade
de consumo, o volume das importações e os
investimentos. Como informação, o sistema CGE
também incorpora tabelas do modelo SAM.
Apesar de importantes, vale ressaltar que em
nenhuma análise econométrica de grandes
eventos se encontrou, até hoje, estimativas
definitivas e conclusivas dos impactos
potenciais de meta eventos como a Copa do
Mundo.

Alguns exemplos de estudos de impacto


econômico são a Eurocopa de 1996, na
Inglaterra, que registrou o número de 280 mil
turistas estrangeiros que produziram um
resultado de £ 120 milhões na economia
britânica. Os fãs ingleses do futebol adicionaram
mais £ 75 milhões neste cálculo.

Já na Olimpíada de Seul estima-se que


houve com o evento um impacto de U$ 1,6 bi,
além de 336 mil novos empregos. Em outra
ponta, muitos estudiosos consideram que a
Copa de 2002 na mesma Coréia foi
insatisfatória, apesar dos benefícios com as
trocas culturais, recursos naturais e o
desenvolvimento cultural, que devem ser
considerados na abordagem qualitativa.
O Brasil e o case sul-africano

Para nós, as referências serão importantes


para que posamos construir projetos e cenários
baseados em casos reais. Assim, devemos nos
debruçar na recente experiência sulafricana.
Quanto aos números, se analisarmos os
resultados de lá veremos que o PIB do país vem
sofrendo um incremento desde 2004 em torno
de 0,15%. Este aumento mais a ascensão da
base fiscal, somados a uma austeridade nas
contas públicas, podem significar, e esta é a
base do projeto governamental sul-africano, um
rápido retorno das taxas e impostos
governamentais a um patamar menor. Já o
déficit público, segundo informações reveladas
por representantes oficiais do governo, espera-
se ser reduzido com a diminuição das
importações.

Mas a África do Sul sabe que este


incremento no PIB não foi e nem será a única
meta a ser alcançada, mais também sua
sustentação, como no caso que ocorreu na
Alemanha, que teve incremento de 0,3% com a
Copa de 2006 e conseguiu manter
posteriormente este número.

Sabendo disso, fica claro que o dever de


casa do Brasil será conseguir reduzir e manter
as contas públicas sob controle além de
promover, junto a iniciativa privada, uma base
produtiva que substitua produtos importados
por nacionais, incluindo desde agronegócios até
informática.
Pelos estudos de impacto, como referência,
o retorno de capital do governo sul-africano,
economia muito menor e com potencial
reduzido em comparação ao brasileiro, é
esperado em 0,96% e o retorno de trabalho em
0,62%. Esta previsão foi mantida mesmo com os
custos maiores que o esperado pelo país e ainda
precisam ser confirmados, mas a lição
econômica de que custos altos comprometem a
rentabilidade é algo que se mostra útil para o
caso brasileiro.

Na questão emprego, o caso sul-africano


aponta para dados que precisam ser pensados.
Para o evento foram gerados 280 mil novos
postos de trabalho, mas apenas 50 mil foram
posições fixas, principalmente no setor de
turismo. Na construção, outro grande setor de
contratação, obviamente os postos foram
desativados com o fim das grandes obras de
infra-estrutura. Mas, mesmo estes que deixaram
suas funções, receberam um legado pessoal,
que se trata do treinamento recebido para
trabalhar em grandes projetos. Assim, passaram
a ter melhor índice de empregabilidade. Isso
deve ser previsto no caso brasileiro, pois as
expectativas frustradas sempre incomodam.
Antes mesmo da Copa terminar na África, os
empregos, naturalmente, foram extintos, no que
um porta-voz do Ministério da Indústria e
Comércio sul-africano declarou: “eles sempre
souberam que seus contratos teriam duração
determinada”.
Legado imaterial: uma grande chance

Se no ponto anterior muito se falou sobre


números, cabe agora uma reflexão do que está
além deles. E isso deve ser feito com muita
atenção, afinal, talvez seja o mais importante
para agora, pois será a resposta do que
queremos projetar com a gigantesca exposição
que a Copa oferece ao local de sua sede. Tem a
ver, assim, com o legado imaterial que o evento
irá necessariamente produzir, pois, como todo
processo de comunicação, haverá uma
mensagem sendo passada, direta e
indiretamente.

Os exemplos recentes disso são das doces


vitórias que os projetos da Alemanha e África do
Sul conquistaram com seus respectivos eventos.
No primeiro caso, mostrou-se ao mundo um país
receptivo e aberto, diferente do que muitos
imaginavam do que era o alemão, além de
interessante e totalmente preparado para o
turismo. Foi o que mostrou a pesquisa feita pelo
governo de lá com os visitantes da Copa de
2006. Um número quase absoluto deste público,
cerca de 90%, afirmou que gostou da
experiência, que pretende voltar ao país e que
recomendaria a Alemanha para o turismo. Eu
estou entre os que reforçam este quadro de
satisfação plena com tudo. Até hoje guardo tal
sentimento em meu coração. Foi também uma
oportunidade para se resgatar o orgulho pelos
símbolos nacionais, tão amargamente apagado
pelo nazismo que chocou o mundo e destruiu a
estima daquele povo. Talvez sejamos incapazes
de compreender a profundidade de tal fato, mas
posso garantir que vi um grande entusiasmo em
todas as análises feitas na mídia local durante
os meus aproximados 30 dias de experiência
vivencial. Se o simples levantar de uma
bandeira do país era algo subjetivamente aberto
a interpretações negativas, depois da Copa isso
não aconteceu mais. E este orgulho será
certamente um passo importante para que
aquele povo se reconheça no espelho:
trabalhador, civilizado, rico e feliz.

No caso africano, o depoimento de Nelson


Mandela ao músico (e ativista) Bono Vox foi uma
dica do que se projetou para o torneio. Bono
avisou que não compareceria ao evento, no que
foi alertado: “Você está ficando velho e vai
perder o grande baile da maioridade africana”.
Mais que um aviso, o recado foi um desabafo
que pretendia mostrar o status atual ainda não
reconhecido da África do Sul pelo resto do
mundo, mas que, a partir dali, poderá
acontecer, afinal o ganho de imagem do país foi
considerável, e este benefício ainda será
usufruído por um longo tempo. A Copa mostrou
a todos um povo alegre e cidades que, apesar
de muitos problemas, estão construindo a cada
dia um espaço ideal para se morar e trabalhar,
além de um belo destino para turistas de
qualquer idade. A África do Sul com certeza
entrou na maioridade e está pronta para os
desafios que o futuro lhe apresenta. Esta é a
minha conclusão.

O Brasil global

Muitos experts ainda apontam a


desvantagem cultural do brasileiro de apenas
“olhar para dentro”. O fato é que podemos, e
devemos, ser mais globais. As trocas permitidas
pela Copa e, logo depois, pelos Jogos Olímpicos
pode nos oferecer um ganho substancial neste
sentido, fazendo com que o brasileiro olhe mais
para fora e, assim, estabelecendo mudanças e
atualizações em nossos códigos culturais,
transformando o “dar um jeitinho”, que denota
improvisação, em “flexibilidade”, mais ligado ao
conceito de sabedoria.

O Brasil e a brasilidade

Palavras do presidente Lula: "Nós


queremos fazer da Copa do Mundo um cartão-
postal". Ao seu estilo, informal, a declaração não
veio em tom de discurso, mas ao sabor das boas
vindas ao evento no dia em que foi apresentada
sua logomarca oficial para 2014. Sob as lentes
da imprensa e da FIFA, Lula deixou claro que,
assim como a África do Sul, o Brasil ainda
precisa se mostrar.
A Copa dará ao Brasil os holofotes da
imprensa mundial não somente mostrando
jogos e seleções, mas também sua história, seu
momento e suas perspectivas. Mostrará
também o brasileiro, falará do seu jeito e sua
cultura. Enfim, a brasilidade estará em voga. Daí
a correta interpretação de nosso presidente
quanto ao potencial intangível deste torneio.
Porém, diferente de uma propaganda oficial, tal
intensidade de cobertura acabará por mostrar o
Brasil “de verdade”, com nossa base material
(as cidades) servindo apenas como moldura
para o imaterial (a brasilidade). Assim,
aeroportos e avenidas serão apenas registros
passageiros para o que realmente o mundo
pode descobrir aqui: “um povo que canta e é
feliz”, como diria Caetano. Signo dessa
brasilidade, a música deverá ser o tema da
alegria que poderá contagiar a todos e mostrar
que estamos prontos para os desafios que
qualquer povo tem. Lula completou seu discurso
afirmando que “faremos a melhor Copa de todos
os tempos”. Ele pode ter razão.

O que o mundo espera de nós

Buscando rápidas respostas conversei com


alguns colegas jornalistas das mais diferentes
nacionalidades para saber o que eles esperam
do torneio de 2014. Falta de segurança foi o
único tema negativo trazido por um deles, um
japonês. Os demais, profissionais dos EUA,
Itália, Espanha, Argentina e Inglaterra,
trouxeram apenas expectativas positivas, como
“grande participação popular”, “muita festa nas
ruas” e “um clima maravilhoso de um país que
adora futebol”. Neste último item, a África do
Sul foi um contraponto benéfico para o Brasil,
pois todos sentiram que a população local não
tinha grande identificação com o esporte. Para
quem trabalha com multidões apaixonadas é
natural que isso pareça estranho. Por isso, todos
esperam um reencontro caloroso e
entusiasmado do futebol com quem gosta dele a
fundo. Posso dizer que, pelas expectativas
colhidas, podemos sim fazer uma grande
competição, até porque não há nada para ser
construído com relação aos pontos positivos
aguardados por estes profissionais habituados
com as rotinas de competições. Pelo visto, o Tio
Sam e o resto do mundo estão querendo
“conhecer a nossa batucada” em 2014. Não
poderia deixar de completar: “chegou a hora
dessa gente bronzeada mostrar seu valor”.

Grandes eventos: por que todos


querem?

Ao final deste capítulo quero trazer uma


questão relevante para a discussão sobre
impacto e legado. Em todo o mundo e em
países com todos os graus de desenvolvimento
há um consenso sobre a questão “sediar
grandes eventos esportivos”. Sem dúvida, cada
evento em cada país tem seu desafio e seu
custo, mas é inquestionável a visão geral sobre
os benefícios disto, seja como ferramenta de
divulgação, seja como indutor de crescimento
por melhorias em infra-estrutura ou qualquer
outro motivo.

Para sediar a Eurocopa 2012, por exemplo,


a Polônia, que divide a sede com a Ucrânia,
brigou com candidaturas da Itália, Croácia-
Hungria, Grécia e Turquia. Segundo palavras no
Ministro dos Esportes polonês, Adam Giersz, a
injeção de recursos na economia do país, que
terá quatro sedes e sediará a abertura da
competição em Varsóvia (a final será em Kiev,
uma das quatro sedes da Ucrânia), será de US$
9,1 bilhões num período de 8 anos
exclusivamente por sediar a competição. Outra
expectativa é a presença de cerca de um milhão
de turistas tão somente por conta do torneio,
além de um acréscimos de 500 mil turistas até
2020, isso como resultado da exposição do país.
Quanto aos investimentos em infra-estrutura,
projeta-se um impacto de 2,1% em comparação
ao PIB de 2009.

Estes números podem ser questionados,


assim como usualmente fazem todos os críticos
destas ações, mas, ao que parece, os gestores
públicos mundiais, e de diferentes regiões e
índices de riqueza, continuam interessados em
“ter este problema”. Para as Copas de 2018 e
2022, por exemplo, escolhas que a FIFA fará no
fim de 2010, Inglaterra, Rússia, Itália, Portugal-Espanha,
Estados Unidos, Austrália, Japão, Coréia do Sul e Qatar
brigam pelo privilégio. Ou seria pelo problema? Por certo,
há de se discutir caso a caso, mas acredito que ninguém está
duvidando do potencial do evento e seus benefícios para o
país. Por enquanto, sabemos apenas que este direito que
todos estão brigando por ele é nosso. “É do Brasil!”, diriam
os narradores, assim como fazem ao narrar um gol.
Capítulo 5

As novas arenas e as arenas da Copa:


exigências e considerações

As novas arenas: viabilidade e


perspectivas

Conforto em jogo de futebol não é uma


realidade para o consumidor brasileiro. Isso
porque ainda temos no Brasil, por questões
econômicas, um conceito de estádio que foi
superado há tempos, desde que o esporte se
profissionalizou em alguns cantos do mundo.
Sendo assim, essa “escalada rumo ao topo” que
demandou um upgrade nas chamadas praças
esportivas começou e começará sempre pelo
mesmo passo: profissionalizar os gestores
esportivos.

Isto serve para introduzir o capítulo sobre


as novas arenas da Copa porque eles possuem
uma relação muito próxima, afinal, arenas
modernas são feitas para grandes eventos e
grandes eventos são feitos por profissionais.
Seguindo esta lógica, além dos gestores,
encontramos também mais um desafio pela
frente: temos um grande negócio que é o
futebol, com forte apelo e grande circulação de
dinheiro, mas sem um modelo de negócio
ajustado.

Parte da confirmação disso está no balanço


dos clubes. Segundo dados levantados pela
Casual Auditores Independentes, apenas a
dívida dos 14 clubes brasileiros que mais devem
no mercado ultrapassam R$ 2,4 bilhões. Neste
ranking possuem destaque os clubes do Rio de
Janeiro, com o Fluminense na liderança dos
devedores (R$ 319,7 milhões), o Botafogo em
segundo (R$ 301,6 milhões), o Vasco em quarto
(R$ 291 milhões) e o Flamengo em quinto (R$
277,8 milhões). Apenas o Atlético Mineiro se
insere nesta lista “maldita” entre os líderes
cariocas com uma dívida de R$ 293,3 milhões).
Saídas para encontrar este novo modelo
que vai permitir não somente a sustentação de
clubes e agentes esportivos, mas também dos
novos agentes que irão operar estas novas
arenas existem e não são difíceis de se criar.
Mas o desafio, neste caso, é institucional.

Fazendo uma análise do corpo gerencial


das 20 equipes brasileiras na primeira divisão,
encontraremos, entre outros, empresários de
sucesso e profissionais liberais disciplinados,
mas poucos gestores profissionais e preparados
para a nova configuração dos negócios do
esporte. Um dos motivos para isso é que não
temos como preparar profissionais com este
perfil. As universidades estão longe deste
processo, as entidades esportivas não possuem
referências para criar demanda e os gestores
do futebol possuem demasiados desafios de
curto e curtíssimo prazo para terem tempo e
energia para pensar no futuro do esporte. Estes
três níveis isolados e com poucas conexões
dificilmente terão articulação para forjar um
novo cenário, mas ele é possível mesmo assim.

As novas arenas da Copa podem ser o


ponto de partida para esta escalada. Isso
porque oferecem ao futebol uma coisa que é
fundamental para qualquer produto: uma
embalagem altamente atraente. Mais que isso,
dentro desta embalagem há um conceito de
serviço que satisfaz os mais exigentes clientes
e, principalmente, oferece um suporte
adequado para se desenvolver o negócio futebol
criando uma robusta plataforma de negócios,
como a Copa do Mundo exige, mas que, depois
disso, entregará o mesmo equipamento pronto
para clubes e federações.

Por tudo isso, o grande desafio para o


projeto dessas novas arenas é pensá-las num
cenário que ainda não existe. Essa projeção de
futuro sempre foi algo difícil no Brasil, mas com
certeza todos os envolvidos estão desde já
concentrando esforços para buscar a equação
ideal para iniciar a referida “escalada rumo ao
topo”.

Há pelo mundo exemplos reais de modelos


de negócio que surgiram com desafios similares
e que podem ser usados como referência para
qualquer um que queira pensar em soluções
para isto. No entanto, entre as premissas de
qualquer projeto, que devem sempre buscar um
modelo de desenvolvimento para este negócio,
existe a regra básica do marketing de qualquer
produto: para se vender, antes, é preciso
ajustar, algo que qualquer profissional sabe.

Dessa forma, seria razoável pensar em


projetos que se dividem em duas partes, mas
que podem ocorrer concomitantemente.
Primeiramente, deve-se envolver clubes,
federações e universidades no projeto de
criação dos novos profissionais para o esporte.
Isso não será custoso nem difícil, pois pode-se
aproveitar o board atual dos que operam o
futebol, além de incentivar novos profissionais
para esta atualização sobre o esporte
profissional contemporâneo. Confederações das
mais diversas modalidades podem fazer parte
desse projeto, pois os Jogos Olímpicos também
deixarão legados semelhantes. Neste projeto,
pelo menos uma escola de excelência deve ser
criada no país e com apoio institucional de todos
que fazem o esporte, entre eles governos,
confederações, federações e clubes. Eventos
internacionais, grandes competições e toda a
cadeia produtiva do negócio podem ser
explorados nesta “academia”, onde serão
forjados modelos ideais para o desenvolvimento
de projetos desse tipo no Brasil. A FIFA,
particularmente, oferece um curso de gestão
que, no Brasil, será operado pela FGV a partir de
2011. A CBF, por sua vez, também estuda a
implantação de cursos junto com algumas
universidades, entre elas a Universidade Federal
da Bahia, por meio de sua Escola de
Administração, projeto do qual faço parte.

Além de se pensar neste futuro próximo, ou


seja, no esporte sob uma nova plataforma de
negócios, que é um exercício próprio das
academias, esta nova classe terá a missão de
fazer a transformação que o esporte precisa
para também poder contribuir com uma de suas
maiores aptidões sociais, que é se transformar
em instrumento de dois dos mais importantes
elementos na base de uma sociedade
desenvolvida: saúde e educação. Pode parecer
utopia a socialização dos bens gerados pelo
esporte profissional, mas isto, mesmo que
dificilmente possamos comprovar, ocorrerá de
forma natural, pois o simples incentivo para a
prática esportiva e o reconhecimento de atletas
e gestores do esporte como elementos de
destaque no mercado será gancho suficiente
para criar demanda por projetos, equipamentos
e, assim, toda uma corrente positiva em prol
desta ferramenta.

Tomando o ponto anterior como


consequência natural, nosso foco deve se voltar
para a criação da mão de obra que irá construir
este cenário. Mais que uma teoria, o
conhecimento adquirido numa sala de aula
poderá e deverá ser testado na prática em
eventos ou situações especiais, mesmo que
criadas unicamente neste sentido, para que
possamos todos “ver, sentir, pegar e cheirar” o
futuro e, mais que isso, apontemos e criemos,
todos juntos, o futuro que queremos para nós. O
Brasil é um país único, como todos são, e por
isso devemos sempre fazer tudo “ao nosso
jeito”. Como incentivo para esta idéia fica a
constatação clara de que sabemos que é a
procura que cria a demanda, mas devemos
saber não somente o que o brasileiro quer, mas
também o que ele quer mas ainda não sabe
disso, seja por não conhecer, seja por não
entender a pergunta.

O segundo ponto destes projetos deve ser o


oferecimento de alternativas para a criação de
um plano de negócios multinível para o futebol
brasileiro, pois, como dissemos antes, é preciso
ajustar para, somente depois, se realizar a
venda.

Fazendo um exercício para exemplificar


estes passos, o projeto poderia se dividir em
dois momentos distintos, sendo um para a fase
inicial de operação das arenas, com pelo menos
dois anos de execução, e outro para o momento
seguinte. No primeiro momento, o custo do que
podemos chamar de “inserção”, ou seja, o input
deste modelo, seria revertido especialmente
para oferecer aos clubes, maiores fornecedores
de conteúdo das arenas, um fôlego financeiro
em seus caixas. Este input poderia ser oferecido
tanto pelas operadoras das arenas, com taxas
subsidiadas de administração, quanto pelos
governos, que são grandes credores dos clubes,
em troca de contrapartidas, como a exigência
de possuir um board executivo preparado para
relações institucionais e, obviamente, a
permanência de balanços dentro uma margem
aceitável, o que pode ser garantido até mesmo
pelas federações em seus regulamentos de
competição como forma de proteção ao
negócio. No nível seguinte os benefícios aos
clubes seriam reduzidos e assim continuaria
gradativamente ao longo do processo, com
números pré-determinados que, se bem
estudados, permitirão o equilíbrio de todos os
operadores do negócio. A dificuldade desta
etapa do desafio, ao meu ver, será muito
pequena frente ao que temos no cenário atual.
Se o input é algo “fácil” de apontar, mesmo
que pareça difícil de se conseguir isso, o desafio
de medir o output é mais complicado, menos
pelo potencial que existe no futebol de gerar
receita e mais pela dificuldade de se medir o
impacto exato dele na economia deste novo
cenário. O retorno para as arenas é mais
tangível, mas devem ser pensados para longo
prazo, o que ainda é uma mentalidade de
negócios pouco usual no Brasil. Já para os
governos, a complexidade de trabalhar com
recursos públicos pode ser embaraçosa para um
apoio ao futebol, mas o ganho com um arrocho
fiscal no segmento certamente justificaria tal
medida ao mesmo tempo que oxigena
indiretamente toda a cadeia de fornecimento do
esporte, ou seja, o ganho se estende além da
relação primária.

Para os clubes, um modelo como esse,


pouco flexível e muito fiscalizado, pode parecer
um problema, mas o aumento das receitas e
dos orçamentos globais são garantias de novas
perspectivas. Mas para que este cenário ocorra,
as regras para os gastos devem ser
regulamentadas, desde salários de jogadores
até limites de endividamento, pois, caso
contrário, os ganhos financeiros poderão ser
compensados com aumento proporcional de
custos ou comprometimento da sustentabilidade
do modelo e, desta forma, sem impacto positivo
real. Novamente, aqui, deve-se exercitar uma
visão sobre um novo cenário, pois seria
impossível executar tais mudanças no atual.
Ao fim destas idéias ainda inacabadas e,
como todo modelo utilizado como exemplo,
passível de adaptações, por certo, vale a
reflexão sobre o quanto realmente queremos
fazer algo diferente. Isso porque todo processo
de mudança sempre encontra resistência,
mesmo que seja para melhor. Mexer em
estruturas já existentes e fixas é sempre
complicado e não há como pensar isso sem
afetar certas pessoas e grupos que, certamente,
farão pressão negativa para as mudanças,
mesmo que elas privilegiem a maioria. Para
utilizar uma expressão popular, diria que “não
há como fazer uma canja sem matar a galinha”.
Assim, fica a dúvida sobre o quanto queremos
mudar, pois caminhos, sem dúvida, há. Basta
escolhermos.

Para finalizar, insisto no fato de que não há


como fugir desta complexa teia de relações para
poder chegar na questão da sustentabilidade
econômico-financeira das arenas. O modelo de
gestão de tais equipamentos está consagrado,
apesar de ser desafiador em qualquer lugar do
mundo, e os gestores brasileiros são e serão
capazes de executar planos de negócios
adequados a cada realidade mesmo sabendo
que a rentabilidade está comprometida por
conta dos altos custos das arenas, mas que
podem ser ajustadas posteriormente. O passeio
pelas questões anteriores, dessa forma, ocorreu
para mostrar que o desafio, ao meu ver, é
garantir que elas terão ativos confiáveis para
inserir em suas “long run schedules”, ou seja, as
planilhas que apontarão a viabilidade do
negócio e que somente mudam da cor vermelha
no longo prazo. O esporte ensina que se
queremos correr uma maratona não devemos
querer ser rápidos, precisamos é ser resistentes.
Quem pensar diferente deverá sucumbir ao
óbvio e poderá levar junto uma chance única de
se transformar junto com o futebol brasileiro. E
como toda mudança profunda, ela já começou.
Resta percebermos isso.

Os projetos nacionais

Apesar deste ponto ser mais direcionado


aos responsáveis pela execução das obras das
arenas, vale a pena cultivar o interesse de todos
pelo andamento e execução dos projetos de
estádios para a Copa de 2014. Estes projetos se
resumem no quadro abaixo:

Reformados:

Mineirão, em Belo Horizonte:

Capacidade prevista para 70 mil pessoas.


Responsabilidade dos recursos: Governos
Federal e Estadual. Responsável pela execução:
Governo estadual. Custo previsto da obra: R$
426,1 milhões. Forma de financiamento: R$ 300
milhões do BNDES e R$ 126,1 milhões do
Governo Estadual. Previsão de entrega:
Dezembro de 2012.
Mané Garrincha, Brasília:

Capacidade prevista para 71 mil pessoas.


Responsabilidade dos recursos: Governos
Distrital e Federal. Responsável pela execução:
Governo Distrital. Custo previsto da obra: R$
745,3 milhões. Forma de financiamento: R$ 400
milhões do BNDES e R$ 345,3 do Governo
Distrital. Previsão de entrega: dezembro de
2012.

Verdão, Cuiabá:

Capacidade prevista para 42,5 mil pessoas.


Responsabilidade dos recursos: Governos
Estadual e Federal. Responsável pela execução:
Governo Estadual. Custo previsto da obra: R$
454,2 milhões. Forma de financiamento: R$ 330
milhões do BNDES e R$ 124,2 do Governo
Estadual. Previsão de entrega: dezembro de
2012.

Arena da Baixada, Curitiba:

Capacidade prevista para 41,7 mil pessoas.


Responsabilidade dos recursos: Governos
Municipal e Federal e Atlético Paranaense.
Responsável pela execução: Governo Municipal
e clube. Custo previsto da obra: R$ 138 milhões.
Forma de financiamento: R$ 25 milhões do
BNDES e R$ 113 milhões do Atlético. Previsão
de entrega: dezembro de 2012.

Castelão, Fortaleza:
Capacidade prevista para 66,7 mil pessoas.
Responsabilidade dos recursos: Governos
Estadual e Federal. Responsável pela execução:
Governo Estadual. Custo previsto da obra: R$
623 milhões. Forma de financiamento: R$ 400
milhões do BNDES e R$ 223 milhões do Governo
Estadual. Previsão de entrega: dezembro de
2012.

Vivaldão, Manaus:

Capacidade prevista para 48 mil pessoas.


Responsabilidade dos recursos: Governos
Estadual e Federal. Responsável pela execução:
Governo Estadual. Custo previsto da obra: R$
515 milhões. Forma de financiamento: R$ 375
milhões do BNDES e R$ 140 milhões do Governo
Estadual. Previsão de entrega: dezembro de
2012.

Beira Rio, Porto Alegre:

Capacidade prevista para 62 mil pessoas.


Responsabilidade dos recursos: Sport Club
Internacional. Responsável pela execução:
clube. Custo previsto da obra: R$ 130 milhões.
Forma de financiamento: R$ 130 milhões do
clube. Previsão de entrega: agosto de 2012.

Maracanã, Rio de Janeiro:

Capacidade prevista para 76,5 mil pessoas.


Responsabilidade dos recursos: Governos
Estadual e Federal. Responsável pela execução:
Governo Estadual. Custo previsto da obra: R$
600 milhões. Forma de financiamento: R$ 400
milhões do BNDES e R$ 200 milhões do Governo
Estadual. Previsão de entrega: dezembro de
2012.

Construídos

Fonte Nova, Salvador:

Capacidade prevista para 55 mil pessoas.


Responsabilidade dos recursos: Governos
Estadual e Federal. Responsável pela execução:
Governo Estadual. Custo previsto da obra: R$
591,7 milhões. Forma de financiamento: R$ 400
milhões do BNDES e R$ 191,7 milhões do
Governo Estadual. Previsão de entrega:
dezembro de 2012.

Arena das Dunas, Natal:

Capacidade prevista para 45 mil pessoas.


Responsabilidade dos recursos: Governos
Estadual e Federal. Responsável pela execução:
Governo Estadual. Custo previsto da obra: R$
350 milhões. Forma de financiamento: R$ 250,5
milhões do BNDES e R$ 99,5 milhões do
Governo Estadual. Previsão de entrega:
dezembro de 2012.

Cidade da Copa, Recife:

Capacidade prevista para 46 mil pessoas.


Responsabilidade dos recursos: Governos
Estadual e Federal. Responsável pela execução:
Governo Estadual. Custo previsto da obra: R$
529,5 milhões. Forma de financiamento: R$
397,1 milhões do BNDES e R$ 132,4 milhões do
Governo Estadual. Previsão de entrega:
dezembro de 2012.

Até a finalização deste trabalho ainda não


estava definido qual estádio seria projetado
para a cidade de São Paulo, apesar da grande
tendência de um novo estádio, o do Corinthians,
ser o responsável por isso. Porém, independente
dos números da capital financeira do país, o
cenário do referencial de custo dessas arenas
não deve se alterar, pois já apresenta um perfil
claro de ousadia para os gestores destes
equipamentos. A referência apontada, neste
caso, é o custo por assento, que no caso
brasileiro tem apontado para um índice de
superação dos mesmos custos para as Copas de
2006 e 2010. No primeiro caso, na Alemanha,
este número apresentou um valor médio de R$
7.145 por assento. No segundo, na África do Sul,
o número superou as previsões, mas ficou
abaixo da edição anterior, chegando a R$ 5.632
por assento.

No Brasil este número já alcançou o valor


de R$ 8 mil por assento na média, sendo que
alguns estádios alcançam números ousados
para o país, como as arenas de Salvador (R$
11.820 por assento), Recife (R$ 10.380) e
Brasília (R$ 10.493), esta última agravada pelo
fato da pouca tradição do futebol na esfera
local.
Se pensarmos nas possibilidades de retorno
destes equipamentos chegaremos ao cenário da
necessidade de adequação de suas projeções `a
realidade da demanda do mercado, além de
uma nova demanda possível de ser criada pelo
novo equipamento.

Perfil das arenas modernas

Apesar da Copa ser um capítulo a parte


para as arenas, há uma ideia consensual sobre
o que se espera destes equipamentos tendo em
vista o surgimento de um cenário adequado
para a criação e fortalecimento da cadeia de
negócios do esporte, um dos maiores clusters
da economia mundial. Assim, receber a Copa
deve ser encarado apenas como o primeiro
capítulo da história destes investimentos que
muito podem contribuir com todos os agentes
do segmento.

A FIFA mesmo já havia criado o manual de


construção para novas arenas com a
divulgação, em 2004, do relatório
“Recomendações e requisitos para estádios de
futebol”, que também pode ser acessado no
blog deste livro
(obrasileacopadomundo.wordpress.com). O
documento não é uma obrigação, como o título
mesmo explica, mas é algo que deveria ser
usado como referência para qualquer novo
projeto. Em seu escopo, por exemplo, há a
recomendação de “ser atrativo”, ou seja, de
acordo com uma livre interpretação, deve-se
criar algum símbolo para que ele seja motivo de
visitações e turismo, pois sua marca, assim,
acrescentaria forte apelo em sua imagem
institucional assim como a do esporte. Dessa
forma, além da atratividade, toda uma operação
deverá ser montada para responder a demanda
criada por isso, como loja, licenciamento de
produtos e equipe para visitas guiadas. O
relatório apresenta também questões relativas
ao entorno, como “proximidade de grandes
redes hoteleiras e aeroportos”.

Quanto a sustentabilidade, outra


recomendação do relatório, ainda podemos
esperar que o assunto cresça a medida que o
tema também evolui nas cabeças de toda a
sociedade. Seja por iniciativa dos gestores seja
por resposta a crescente demanda dos
consumidores, esta medida vai, tenho certeza,
se enquadrar no que o relatório apresenta como
“adequado”.

Especificidades para a Copa

Antes de tratarmos do assunto aqui no


Brasil vamos observar os dois casos mais
recentes de sedes do torneio, no caso a
Alemanha, país com um povo fanático por
futebol, como o brasileiro, e a África do Sul, país
em desenvolvimento, como o Brasil. Assim, esta
análise terá viés diferenciado para cada caso.
Alemanha 2006

Na Alemanha, apenas um estádio foi


totalmente construído para a competição, no
caso a arena de Munique. Ele apenas foi
possível ser levantado após plebiscito feito pela
prefeitura, que, além do estádio, deveria
investir em seu entorno. A vitória da arena
ocorreu por 68% contra 32% que foram contra o
investimento. Em outras cidades, Dortmund foi
pressionada por uma nova arena, mas os
moradores da cidade, apaixonada por futebol e
que lotam o Signal Iduna Park nos fins de
semana para os jogos do Borussia, fizeram coro
para manutenção do equipamento. A FIFA cedeu
e ele foi apenas adequado para receber os jogos
do torneio, assim como em Hamburgo. Já em
Gelsenkirchen, a Veltins Arena, do Schalke 04,
construída em 2001, foi um grande projeto, mas
não para a Copa, que apenas se beneficiou dele.
Em Berlim, noutro exemplo de adequação e
negociação, a FIFA solicitou intervenções
profundas, mas o comitê local soube negociar e
o estádio Olímpico da cidade foi mantido com
sua estrutura e design original, apenas
realizando adaptações, todas satisfatórias.

Com este modelo realizado, a Copa em


2006 foi excelente e o futebol alemão vai muito
bem, com arenas eficientes e um modelo de
negócio que vai permitindo o crescimento e
fortalecimento de seus clubes.
A experiência sul-africana: inovação
inversa

O conceito de inovação inversa, última


moda no mundo dos negócios, não é algo
formalmente aceito pela FIFA, mas que foi, no
caso africano, comprovado como prática de
apoio. Assim, mesmo que não oficial, a
competição deve sim se adequar a sua sede.
Isso nos aponta para uma perspectiva favorável,
ao mesmo tempo que não nos garante um
contentamento com pouca coisa, pois nós,
brasileiros, ainda precisamos, por certo, fazer
muito pelo nosso país, antes mesmo de querer
mostrar algo aos outros.

Voltando ao caso sul-africano, ele foi


considerado bem sucedido no cumprimento das
rígidas exigências da FIFA quanto aos estádios
que sediaram os jogos da Copa de 2010. Este
resultado foi obtido, principalmente, como fruto
de uma idéia vitoriosa do comitê organizador
local, que foi formar um consórcio de
especialistas para avaliar e acompanhar alguns
projetos de arenas, quase todos com 100% de
recursos públicos, segundo uma análise apurada
de todas as exigências da organização. O “On
the Ball Consortium” foi formado por dois
escritórios de arquitetura, o Luyanda Mpahlwa
Design Space Africa e o Ruben Reddy
Architects, uma empresa de engenharia de
estruturas, a TechnoburoTechnical Services, e
uma gerenciadora especializada em engenharia
de custos, a tmtj Consulting Gauteng.

O objetivo deste grupo foi analisar e,


principalmente, interpretar a lista de exigências
técnicas da FIFA, selecionar especialistas
estrangeiros nas áreas de elétrica e eletrônica,
fazer links com as indústrias locais e
internacionais para o fornecimento de insumos
e acompanhar a execução tanto física quanto
financeira das obras. O consórcio atuou
diretamente em quatro projetos, Ellis Park e
Soccer City, em Johanesburgo, Loftus Versfeld,
em Pretória, e Free State, em Bloemfontein.
Além destes, todos os outros projetos seguiam
os pareceres do consórcio, que traziam sempre
análises e recomendações.

Esta análise apurada é complexa e


importante pois, além das obras gerais para
qualquer arena, há especificidades para as
fundamentais e estratégicas áreas denominadas
VIP e de imprensa. São nestes pontos que
residem, inclusive, boa parte dos custos
adicionais dos projetos para uma arena de Copa
do Mundo e que, quase sempre, representam
custos exagerados nos planos de negócio das
administradoras, uma vez que não se consegue
aplicar valores similares para estas áreas nos
demais eventos que a arena sedia.

Mesmo com apoio técnico especializado, os


sul-africanos não escaparam de um jogo
profissional de manipulação de massa de
trabalhadores, em especial na área da
construção civil. Sem acordos preliminares, os
sindicatos foram assessorados para forçar
mudanças nos contratos de trabalho
promovendo greves que paralisaram as obras e
deram ao projeto, após as notícias ganharem a
mídia, um sentimento de desconfiança da
comunidade internacional, além do aumento
dos custos. Sendo assim, os gestores brasileiros
devem estar preparados e atentos aos acordos
preliminares, de preferência um para cada obra
isoladamente, para que novas ações como esta
não prejudiquem tanto as obras quanto a nossa
imagem neste negócio.

Quanto ao resultado, especialistas


enalteceram a maioria dos projetos quanto ao
quesito conforto, funcionalidade e comunicação
visual, mas também perceberam pontos
negativos nestes quesitos, em especial na arena
Loftus Versfeld, em Pretória, que foi a mais
antiga entre as utilizadas pela FIFA. Talvez pelo
fato de ser construída em 1906, as adaptações,
pela repercussão técnica expressa em veículos
especializados, se mostraram de difícil
execução. Já em projetos de destaque, como o
Green Point Stadium, na Cidade do Cabo, o
problema foi o desvio apresentado pelo controle
do custo, pois o projeto que tinha previsão para
consumir R$ 307 milhões teve como custo final
R$ 1,15 bilhão. O principal fator aqui foi o atraso
na obra, em especial por conta das greves dos
trabalhadores, que encareceu sua execução em
demasia. Neste ponto fica a lição para que seja
evitado tal situação no Brasil, pois o custo final
pode comprometer não a Copa, mas o projeto
de viabilidade das arenas no futuro, algo que se
mostra como o grande desafio de todas as
sedes de grandes competições pelo mundo.
Afirmo aqui que os atrasos não comprometem a
competição porque, se necessário for, mais
dinheiro será injetado para que tudo fique
pronto em tempo, o que fará que a competição
aconteça, mas deixe um “legado maldito” sob o
aspecto financeiro.

Alguns projetos mostraram fragilidade


quanto a temas considerados importantes pela
FIFA, como a visibilidade do campo de jogo. O
estádio Moses Mabhida, em Durban, um dos
mais belos da Copa africana, é um exemplo
neste ponto. A primeira linha de assentos, mais
próximas ao campo, teoricamente mais
valorizada por isto, não permitia que os
torcedores enxergassem a linha de fundo por
conta da colocação das placas de publicidade.

Conheci de perto apenas o Nelson Mandela


Stadium, em Port Elizabeth, durante a partida
do Brasil contra os Países Baixos pelas quartas-
de-final da Copa 2010. Além da beleza, a
estrutura interna oferece excelente padrão
tanto para torcedores como imprensa, segundo
pude constatar ao conversar com profissionais
da área. Já em termos de construção, sua
cobertura metálica e as soluções estruturais
mistas, utilizadas também em outras arenas do
torneio, servirão, ao certo, como referência para
as obras brasileiras.
Brasil 2014

Inicialmente vale o registro, e pelo estudo


dos casos recentes na Alemanha e África do Sul,
de que as obrigações na verdade são, em sua
maior parte, recomendações que a FIFA oferece
para as arenas sedes dos jogos. Diferente do
que muitos pensam, há, sim, espaço para
negociação, pois o documento é subjetivo em
muitos pontos.

Observando estes casos, acredito que a


dificuldade no Brasil da equação financeira
entre projeto e viabilidade de arenas parece
residir em poucos pilares, mas que deverão ter
especial atenção, como o que baseia o standart
para cobertura pela imprensa das grandes
competições internacionais. Os estúdios de TV,
por exemplo, com grande capacidade de
operação, são 10 por arena, geralmente
destinados a três redes nacionais e sete
internacionais, assim como os postos de
transmissão, que variam entre 50 e 90, sendo
que cada um ocupa o equivalente a seis
assentos de torcida ou 2,5 m2 por profissional.
Estes ambientes são caros, pois devem ser
isolados acusticamente, além de possuir
extensão para a área interna, onde são
realizadas as coletivas e zonas mistas de
atuação dos jornalistas, espaço que, entre o
campo e o vestiário é conhecido como Flash
Interview positions. Além de tudo isso, um perfeito
sistema de telecomunicações deve estar a
serviço dos profissionais, pois, caso contrário,
tudo, desde os mínimos detalhes positivos, vem
abaixo. Não está no relatório, mas posso
garantir, como jornalista que já cobriu Copa do
Mundo, que não é recomendável tirar dos
veículos de comunicação sua capacidade de
comunicar.

Algumas outras especificidades do torneio


serão onerosas, mas perfeitamente absorvíveis
pelos projetos, como um banco de reserva com
encosto para 22 jogadores com cobertura
específica de material transparente. Os bancos
que sobrarem após a competição podem ser
reaproveitados facilmente em outro lugar. Os
vestiários, com recomendação de possuir 150
m2 e, para arenas multiuso, em número de
quatro, todos similares, é outro item que pesa
na planilha, mas que também pode ser
absorvido financeiramente.

Além disso, a arena que sediará a abertura


da Copa deve ter pelo menos 60 mil lugares.
Esta cidade possui importância estratégica para
o evento, pois é a mesma que recebe o Centro
Internacional de Imprensa ou IBC, sigla de
International Broadcast Center, cérebro da
divulgação de todo o torneio e moradia de todos
os profissionais que atuarão neste local. Para
2014 a cidade de São Paulo, centro financeiro
do Brasil, espera quebrar esta tradição e, assim,
ficar com o IBC, além do Congresso da FIFA,
mesmo se não realizar a abertura do torneio, já
que não aprontou seu projeto de estádio nos
prazos exigidos. Na África do Sul, para se ter
uma idéia da importância desta decisão, foram
credenciados 13 mil jornalistas para trabalhar
no IBC, além de 2 mil dirigentes que
participaram do Congresso.

Outro ponto das recomendações da FIFA,


este com pouca margem de negociação, se
refere aos caminhões de transmissão, o TV
Compound. Além de estacionamento aberto e
interno, para o local da final do torneio este
espaço deve ter no mínimo 3 mil m2 e, assim
como os demais, possuir segurança e geração
de energia própria e independente.

Por fim, vale salientar que estes projetos


possuem um símbolo visível que são as enormes
telas de vídeo presentes em seu interior. Por si
só estes equipamentos já comunicam sobre a
modernidade destas praças, ao mesmo tempo
que pesam no custo individual de cada evento
realizado ali. De tão expressivas, já viraram até
tema de projeto de arena, como a dos Emirados
Árabes, que pretende, para apoiar uma
candidatura para sediar uma Copa futura,
construir, e já divulgou imagens de seu ousado
projeto, uma arena totalmente revestida de
telas de plasma. Pela variação de custo, muitas
vezes para baixo, não sabemos o que isso pode
representar, nem para 2014 nem para depois
disso. Assim, o sonho árabe pode ser possível,
mas devemos considerar que a realidade em
nosso futuro e no deles, por certo, ainda não
sabemos qual é.

Assim, pensando que a Copa pode aceitar,


assim como na África, soluções moduladas a
partir da interpretação das recomendações, é
hora de se abrir a cabeça para as mais
diferentes saídas em busca da adequação dos
projetos para atender interesses gerais, o que
garante o resultado por meio de uma
abordagem sistêmica. As soluções, mesmo que
muitas já não possuam tempo para se buscar,
podem vir de concursos técnicos, algo comum
na Europa e nos Estados Unidos, mas que ainda
não tem grande histórico no Brasil. Além de ser
fonte aberta de idéias, a experiência sempre
aproxima o projeto da comunidade em que ele
está inserido, o que se mostra como um grande
desafio para qualquer obra deste porte.

O que se espera, por tudo isto, é um novo


mercado para gestores profissionais de arenas,
incluindo players internacionais, pelo fato de,
em breve, estas novas arenas terem a
necessidade de pensar sua operação. Assim,
contratos serão discutidos para a implantação
de modelos de gestão o que, depois da Copa,
migrarão para contratos de operação. Espera-se
para esta fase modelos que garantam valores
fixos pequenos e prêmios por performance,
além de percentuais para eventos realizados.

Pela sua importância, todos os projetos


deverão receber especial atenção não somente
da FIFA, mas de toda a sociedade, pois o legado
da competição poderá ter muitas faces, mas a
financeira, certamente, será uma delas. Para o
bem ou para o mal.

O modelo americano para o esporte

O maior palco do marketing esportivo no


mundo é, como algumas outras áreas, os EUA.
Assim, por se encontrar mais uma vez na
fronteira do negócio, vale aqui uma reflexão
sobre este modelo que, apesar de possuir
grandes números, é questionável.

Inicialmente teremos que registrar o


cenário da transformação que ocorreu em
termos de arenas esportivas no país. Iniciado na
década de 1970, estes novos equipamentos
foram surgindo, sempre com pesados
investimentos públicos por trás, para apoiar o
esporte como plataforma de divulgação e
negócios para cada cidade que faz parte de uma
das principais ligas norte-americanas, todas
privadas e, por isso, com forte controle sobre
cada passo de cada um dos seus clubes.

Assim, contribuintes de Santa Clara, na


California, concordaram em oferecer, num
referendo realizado em junho de 2010, subsídio
de aproximadamente US$ 200 milhões para a
construção do novo estádio do 49ers, time que
disputa a liga profissional de futebol americano,
a NFL. Estudar estes modelos é tarefa
obrigatória para os agentes brasileiros que
estão envolvidos com as novas arenas. Será
necessário também uma refinada análise sobre
outros subsídios, como o do governo americano,
nesta primeira época das novas super arenas.
Os estudos feitos nos EUA, como os publicados
pela Metropolitan Statistical Areas, publicação
da U.S. Census Bureau, não reconhecem um
benefício real na economia local com estas
novas praças esportivas, mas percebe que,
além de benefícios para alguns negócios mais
diretamente envolvidos com o esporte, o custo
por contribuinte acaba sendo muito pouco para
gerar insatisfação. Assim, ao invés de
investimento para gerar novas receitas ou
trabalhos no mercado local, estas arenas
passam a ser consideradas como despesas de
consumo, o que é, segundo avaliação de muitos
analistas econômicos, aceitável e encontra boa
repercussão na sociedade americana. Apesar de
gerar distorções como contribuintes que nunca
foram ao estádio também pagarem pelo
mesmo, será muito difícil mexer na estrutura do
esporte americano, com isenções para as
grandes ligas e subvenções para as arenas, pela
grande popularidade que o esporte tem para os
americanos.

Dessa forma, em todas as ligas


profissionais, boa parte das arenas são de
propriedade pública, muitas erguidas inclusive
com dinheiro liberado pelos contribuintes em
referendos. Porém, mesmo com isenções e
baixa carga de juros a sustentabilidade dessas
arenas é um desafio. Parte disso ocorre pelo
fato de, motivados com os investimentos
públicos, o setor privado pouco se interessar
pelo negócio, algo que, no caso brasileiro, é
também um risco. Além disso, os acordos
espelham um forte interesse do governo
americano em promover o esporte. Em Seattle,
por exemplo, os Mariners (beisebol) receberam
da nova arena, quando de sua inauguração,
durante três anos, além da isenção de aluguel,
todas as despesas com a operação de jogos
pagas pela administração do estádio e mais
40% da receita obtida com os camarotes.

Um melhor estudo sobre este modelo seria


extremamente útil para o desenvolvimento
deste setor no Brasil, mas, obviamente, muito
há para se adaptar. Por fim, numa visão mais
ampla sobre este “espelho” podemos jogar uma
luz dirigida sobre dois fatores que compõe esta
experiência americana: primeiramente que o
esporte está implantado na cultura americana e,
por isso, o governo atua com extremo interesse
para que as ligas e times mantenham-se fortes
e num alto nível. Assim, mesmo em Estados que
realizaram referendos para saber do
contribuinte se o apoio financeiro aos clubes e
arenas é de interesse público ou não, em muitos
casos, não todos, se obteve aprovação pela
maioria. Por isso, se é aceitável por lá a idéia de
que uma arena é parte da despesa pública, mais
até que um investimento, não seria absurdo
considerarmos isto aqui também. Este fato nem
diminui a responsabilidade dos gestores destes
complexos com os resultados nem transforma
este gasto como fundo perdido, mas passa a
valorizar com extrema importância o lado
intangível das análises sobre o impacto dessas
obras.

Um segundo ponto é que as novas arenas


são necessárias e, mais que isso, fundamentais
para se praticar o esporte sob a batuta do
profissionalismo. Como agentes catalisadores de
uma nova era, elas ofereceram suporte aos
novos negócios e forjaram grupos de executivos
capazes de elevar o esporte americano a uma
renovação necessária e, em alguns casos,
salvadora. A NBA, poderosa liga de basquete
profissional, por exemplo, estava a caminho da
falência na década de 1980, com descrédito,
dívidas cada vez maiores e públicos cada vez
menores, quando novas regras rígidas para
jogadores e equipes, além das arenas,
impulsionaram o jogo dos americanos pelo
mundo afora. Ajudado pelo fenômeno Michael
Jordan, o esporte se transformou num exemplo
de globalização quando não se usava este
termo com a mesma facilidade de hoje. O
responsável por isso não foi um mágico nem um
cartola qualquer, e sim um grupo de executivos
hábeis, liderados pelo lendário David Stern, que
acreditaram no esporte como uma excelente
ferramenta de negócio.
Para nós vale a lição, pois mesmo que não
estejamos perto de um precipício no futebol (o
que muitos acreditam ser verdade e razões há
para isso), precisamos ainda encontrar uma
solução para a viabilidade deste negócio por
aqui. As arenas podem ser a chave que,
somadas aos novos profissionais do mercado,
respondam a esta questão.

Por fim, uma coisa que vale salientar em


termos de esportes profissionais nos EUA é a
qualidade dos serviços oferecidos nas arenas.
Tal situação, facilmente percebida por quem já
presenciou algum jogo das grandes ligas
americanas, oferece um resultado simplesmente
fantástico aos clubes: até 40% das receitas
ocorrem no dia do jogo. O número é mais
impressionante do que parece, afinal as cotas
de TV são expressivas, especialmente se
compararmos ao Brasil. Para se ter uma ideia,
somente na NFL, liga de futebol americano,
cada equipe recebe cerca de U$ 100 milhões
para a disputa de uma única temporada. Se
podemos projetar um aumento natural nas
receitas de “matchday”, mesmo que sem a
importância americana, isto deve entrar com
bastante cuidado nas planilhas dos clubes e
administradores de arenas, pois, além do
cenário ainda inexistente na atualidade, o fato
de poucas serem das próprias agremiações
obriga todos a fazerem com que esta linha seja
muito bem dividida e pensada nos planos de
negócio para permitir uma justa e sustentável
participação dos players deste mercado.
Os impactos no marketing e no futebol
brasileiro

Um dos maiores beneficiados com a Copa


do Mundo e suas arenas será, sem dúvida, o
futebol brasileiro, incluindo aqui todo seu
mercado. O motivo não será uma maior
qualidade dos jogadores, pois isso já temos de
sobra, mas, sim, uma maior qualidade do
suporte oferecido ao negócio futebol, o que, por
consequência, fortalece toda a estrutura do
segmento, desde clubes, agentes, fornecedores
e federações.

A projeção inicial é um incremento de R$


142 bilhões nos próximos quatro anos na área
de marketing por conta do torneio e o futebol
terá privilégios nesta verba. Uma parte
considerável do valor total, previsto em torno de
R$ 6,5 bilhões, será investido em comunicação,
o que reforça a idéia de que as marcas deverão,
cada vez mais, buscar o futebol como fonte de
informação de seus produtos. Os clubes, neste
caso, tornam-se parceiros estratégicos para
todos os segmentos da economia. As cotas de
patrocínio estão numa escalada ascendente e
tudo indica que esta curva permanecerá nesta
direção. Claro que, quanto melhor as estratégias
de marketing dos clubes e das empresas, maior
o retorno e o potencial de negócio. Para isso
será preciso inovar, pois o velho formato “marca
na camisa” não deverá atender estas novas
demandas da comunicação que buscam cada
vez mais diferenciação e conceitos de branding
com estes investimentos.

Para isso, o futebol deverá se apoiar nos


planos de marketing das cidades sede e no do
Brasil de uma maneira geral, pois certamente o
“clima da Copa” deverá ser ponto central nestas
estratégias a partir já de 2011. Estas
campanhas, que visam forjar a imagem de cada
sede e do próprio país tanto no mercado
doméstico como no internacional será o grande
tema dos próximos quatro anos, mas o legado
dos clubes com a Copa é algo comunicável e
altamente rentável já neste momento, além de
apresentar projeção também ascendente em
termos de curva de valorização.

Como toda estratégia de marketing


profissional, um período de pesquisa (o
conhecido Sistema de Inteligência em
Marketing) deve ser iniciado imediatamente
para que se busque as melhores oportunidades
de investimento e de posicionamento para os
próximos quatro anos, considerando que 2014
será apenas onde estes projetos irão culminar.
Isso porque, como apresentado no capítulo
sobre o modelo comercial da Copa,
pouquíssimas marcas poderão aparecer nos
jogos e na comunicação oficial, o que oferece a
quase totalidade das empresas um grande
desafio, que é não ficar de fora do evento ao
mesmo tempo que se respeita os direitos dele.
Quem tiver sucesso poderá se beneficiar com o
aumento da demanda por consumo, além de
ocupar um posto destacado na batalha pelo
posicionamento, pois a exposição adequada no
quadriênio do “clima da Copa” oferecerá
grandes vantagens junto aos fanáticos
torcedores brasileiros.

Além dos benefícios obtidos no marketing,


as novas arenas podem ajudar, e é o que todos
esperam, na revolução do futebol. Na
Alemanha, o novo estádio do Bayern de
Munique, o único construído totalmente para
Copa de 2006, foi o legado mais importante do
clube: nas três temporadas seguintes ao
Mundial o time bávaro vendeu todos os
ingressos para seus jogos, oferecendo ao caixa
do clube um valor de 60,600 milhões de Euros
somente em 2009, cerca de 22% do total de sua
receita neste ano. Fenômeno parecido pode
acontecer no Brasil, afinal teremos arenas tão
belas quanto e torcedores tão ou mais
apaixonados que os alemães. Vale acreditar
nisso.

Diferenças entre números de Copa e


Olimpíadas

Este trabalho muito se referiu `a Copa do


Mundo, mas boa parte dele pode ser utilizada
como referência para o projeto olímpico
brasileiro, apesar de ser óbvia a necessidade de
se explorar mais a fundo este grande evento de
2016 em outros estudos mais específicos. Dessa
forma, para finalizar esta apresentação, vale
aqui fazermos um comparativo sobre estas duas
competições em recentes edições para termos
uma ideia do tamanho de cada uma.

Tabela comparativa entre as duas competições

Olimpíadas 2008 Copa 2006


Países 204 32
Atletas 11526 736
Modalidades 32 1
Eventos 302 64
Horas filmadas 400 96
Tickets vendidos 6,8 milhões 3,1 milhões
Jornalistas 20 mil 19 mil
Sedes 31 12
Cidades 7 12
Duração 30 16
Audiência 26 bilhões 4,9 bilhões
Despesa (R$) 71,3 bilhões 21,2 bilhões
Receita/quadriênio (R$) 6,3 bilhões* 8,6 bilhões**
* COI ** FIFA
Prorrogação

Certa vez, em uma entrevista, o professor


Hélio Rocha, um dos grandes educadores de
Salvador, ouviu a seguinte pergunta: “do que o
senhor mais tem saudades em sua vida?”. Sua
resposta me marcou e me acompanha até hoje:
“Tenho mais sentimento pelo futuro. Sinto muito
por tudo que vem por aí e não deverei ver”. Ele
sabia que o mundo caminhava e ainda caminha
para um período fantástico, com uma quebra
total de paradigmas tanto na área cultural como
na tecnológica, dentre outras. Este futuro, para
todos nós, deve ser observado pelo prisma não
da adivinhação ou da futurologia, mas do estado
permanente de reflexão sobre o que somos, o
que temos e o que queremos ser e queremos
ter.

Tal dualidade comprova que o high touch


está cada vez mais próximo do high tech, pois
as fronteiras do pensamento estão se
expandindo, se universalizando e se inserindo
na base da civilização. Com essas fronteiras
sumindo, estamos criando um mundo moderno
de ideias e invenções, que facilitam a vida, que
transformam as realidades e que unem pessoas
de todos os lugares. Por isso os elos de ligação
são tão importantes e a Copa do Mundo de
futebol é um dos principais neste sentido.
Reunir bilhões de pessoas e transformar a
bola no centro das atenções é uma possibilidade
que se repete a cada quatro anos e que foi
conquistada e construída com muita dedicação
e profissionalismo. É este incrível produto,
carregado de expressões materiais e simbólicas,
que chegou ao Brasil. Este ciclo já começou e se
estenderá em duas fases, sendo uma até 2014,
quando sediaremos os jogos, e outra a partir
disso, quando poderemos desfrutar de tudo que
este mega evento pode nos oferecer.

Para isto acontecer devemos,


primeiramente, querer que aconteça. Este
querer vai além do simples “ter vontade” e
chega ao nível do sacrifício necessário para
qualquer jornada em sua fase inicial. A Torre
Eiffel, construída em 1889 para a Exposição
Mundial que seria sediada em Paris naquele
ano, foi alvo de muita controvérsia, tanto sobre
sua utilidade como sua arquitetura. Como fruto
de uma visão futurista, o projeto foi erguido e,
ao invés de ser temporário, como muitos até
queriam, foi mantido, se transformando, ao
longo do tempo, num dos símbolos mais
importantes da civilização humana.

São visões como esta que parecemos estar


precisando. A Copa do Mundo FIFA 2014 pode
ser a ferramenta para quebrar o marasmo
intelectual e de conjectura social que vivemos
no Brasil, com melhorias adquiridas não
somente pelos resultados finais, mas por conta
de todo o processo que viveremos. Os legados,
maior benefício do evento, serão inegáveis se
acertarmos na preparação e execução dos
projetos. Resta-nos, então, discutir e planejar
este futuro.

Quanto ao legado físico, as arenas e outras


instalações esportivas e de lazer poderão
transformar nossa sociedade, oferecendo a base
política para uma plataforma única de saúde e
educação para todo o povo, além de uma nova
economia forte e ativa no esporte. Já as obras
de infra-estrutura, se bem pensadas, deixarão o
país pronto para suportar o crescimento do
padrão e da qualidade de vida do brasileiro.

O legado funcional também será


expressivo, com a preparação de novos
profissionais e mais capacitados em diversas
áreas. Esta mão de obra diferenciada pode
iniciar um ciclo de produtividade único e uma
permanente expansão de nossas capacidades,
quem sabe até revolucionando a pesquisa e o
ensino profissional no país, seja nas
universidades seja nas empresas, pois uma
nova geração poderá surgir deste processo.

O legado tecnológico, outra realidade


inquestionável, irá trazer equipamentos
modernos nas áreas de segurança e
telecomunicações, o que servirá para dar
suporte ao desenvolvimento de uma cidadania
necessária a qualquer processo de
desenvolvimento.
Por fim, o legado imaterial, conquistado
pela exposição maciça da marca Brasil pelo
mundo, irá trazer todas as culturas para dentro
da nossa, permitindo-nos uma troca
imensurável e potencializadora. Neste ponto,
aliás, o mundo também tem muito o que
aprender com o brasileiro, pois a
“carnavalização” das nações poderá nos
oferecer um futuro global de mais tolerância,
sensibilidade e paz.

São todos estes fatores que, somados, nos


oferecem uma fortuna em oportunidades,
menos pela Copa do Mundo e mais pelo
momento em que o Brasil atravessa. A
confiança no país é tamanha tanto no exterior
quanto aqui dentro e esta auto-estima faz
diferença na hora de somarmos as capacidades
de todos nós para construirmos o nosso futuro.
Mais que o futuro inevitável, o que certamente
é, será o futuro de nossas vidas, de nossos
filhos e netos, de nossas crianças que sempre
nos lembram que o ser humano é bom em sua
essência e que podemos optar por carregar em
nós o melhor que a vida oferece.

Se o Brasil continuar acreditando em si e se


conseguirmos nos livrar das amarras dos jogos
sociais e políticos, faremos não somente uma
grande Copa, mas um grande país. O Brasil
pode e merece isto.

Fim de jogo!
Sobre o autor

Ricardo S Azevedo é jornalista e professor universitário de


disciplinas nas áreas de comunicação e marketing. Já cobriu Copa
do Mundo, Jogos Olímpicos e Jogos Panamericanos, além de
outras competições internacionais.

No esporte, além de ministrar cursos na área de marketing e gestão


esportiva nas universidades Unifacs/Laureate, Universidade
Federal da Bahia, Sartre/COC e Universidade do Estado da Bahia,
atua como Diretor de Marketing e Sustentabilidade do Esporte
Clube Vitória na gestão 2008-2010.

Além deste livro, Azevedo fundou, em 2010, a Academia Masdar,


um projeto sem fins lucrativos e gratuito para distribuir, via web,
conteúdo de aulas para estudantes e profissionais em busca de
apoio.

Na internet:

Blog do livro: obrasileacopadomundo.wordpress.com

Academia Masdar: academiamasdar.wordpress.com

Contatos via e-mail: academiamasdar@aol.com

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