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A.ONU aos 60 - Artigo do Embaixador Celso Amorim, Ministro das Rela... http://www-itamaraty.gov.br/sala-de-imprensa/discursos-artigos-entrevist. lde7 AONU aos 60 - Artigo do Embaixador Celso Amorim, Ministro das Relacées Exteriores, publicado na "Revista Politica Externa", vol. 14 In 2005, the United Nations is commemorating its sixtieth anniversary. Representatives from its 191 ‘Member-States, including close to 170 Chiefs of State and of Government, will meet in New York in September next, to participate in the High Level Session convened by the Organization"s Secretary-General, Kofi Annan. The occasion will afford an exceptional opportunity to reflect on how the international community may take joint action in order to promote peace and development with social justice. The present scenario, characterized by new or persistent threats to global stability * from poverty and hunger to terrorism; from environmental degradation to the continuing presence of weapons of mass destruction demands a sense of urgency in strengthening the multilateral system. Em 2005, as NagGes Unidas comemoram sessenta anos, Representantes dos 191 membros da Organiz entre os quais cerca de 170 chefes de Estado e de governo, deverao estar em Nova York, no proximo més de setembro, para participar da Sessao de Alto Nivel convoeada pelo secretério-geral da Organizacao, Kofi Annan, Seri uma excepcional oportunidade para reflexio sobre como a comunidade internacional pode agir conjuntamente para promover a paz.¢ 0 desenvolvimento com justiga social. 0 cenério atual, earacterizado por novas ou persistentes ameacas A estabilidade global - da pobreza c da fome ao terrorismo; da degradagio ambiental 3 continuada existéncia de armas de destruigo em massa - exige um sentido de urgéncia para o fortalecimento do sistema multilateral. Criada em 1945, para evitar a repeticao da experiéncia traumatica de duas guerras mundiais, a ONU continua sendo a organizagio internacional por exceléncia. Reunindo a maioria absoluta dos paises em torno do objetivo comum de promover a paz, a Organizacao contribuin de maneira significativa, durante sessenta anos, para uma ordem internacional fundamentada no direito. Profundas mudangas, contudo, alteraram o cendrio internacional ao longo das tiltimas seis décadas. A ONU foi criada por 51 Estados (entre os quais o Brasil), que representavam a quase totalidade dos paises independentes na época. O acelerado processo de descolonizagao dos anos 1960 € 1970 ea mais recente onda de fragmentacao de certs Estados (entre os quais a antiga Unitio Soviética e a Iugoslivia) elevaram 0. miimero de Estados soberanos. Hoje, a ONU possui 191 membros, a grande maioria paises em desenvolvimento. Ao mesmo tempo, a agenda internacional evoluin e amplion-se. Diseutem-se, hoje, em foros internacionais, assuntos tio diversos como meio ambiente, teenologias da informacao, direitos humanos ou 0 combate a fome e A pobreza. Questdes como a manutencio da paz e da seguranga internacionais adqui contornos, seja pela natureza interna de alguns dos conflitos, seja pelo envolvimento de atores nio estatais. Osentimento de que a ONU precisa se adaptara novos tempos € novas realidades geopoliticas ganhou impulso depois da intervengao militar contra o Iraque, em marco de 2003. Antes disso, durante os doze anos que separaram a primeira da segunda Guerra do Golfo, 0 Conselho de Seguranca tinha utilizado grande parte de seus instrumentos na contencio do regime iraquiano, entre os quais a autorizacio para o uso da forga e as mais abrangentes sangdes jd impostas a um pais. Havia também explorado novas modalidades de ago, como a verificagio do desarmamento, para que 0 Iraque de Saddam Hussein nao constitufsse uma ameaga para a seguranga regional e global. Nao é este o local para uma andlise mais aprofundada dos resultados da acio do Conselho no Iraque, de 1990 a 2003. Mas parece correto afirmar que o Conselho de 3/15/2010 10:11 AM A.ONU aos 60 - Artigo do Embaixador Celso Amorim, Ministro das Rela... http://www-itamaraty.gov.br/sala-de-imprensa/discursos-artigos-entrevist. dde7 ‘Seguranca conseguiu impedir que o regime de Saddam mantivesse e/ou desenvolvesse seus programas de armas de destruicao em massa. Ao contrério da primeira Guerra do Golfo (1991), a intervengao do infeio de 20033 nao foi avalizada pelo Conselho de Seguranca. A incapacidade do Conselho de manifestar-se e sua marginalizacao do processo de tomada das decisoes que conduziram a acao militar contra o Iraque tornaram mais nitida a percepcao de um desequilibrio entre a estrutura do Conselho e as fungdes que deve desempenhar, expondo assim suas limitacdes em responder aos desafios do mundo atual. O secretério-geral da ONU, Kofi Annan, interpretou osentimento cada vez mais generalizado entre os membros da ONU de que a Organizagio precisava atualizar-se, convocando um Painel de Alto Nivel sobre Ameacas, Desafios e Mudangas, enearregado de apresentar propostas para o fortalecimento do sistema de seguranca coletiva das Nagdes Unidas. Em marco de 2005, Annan publicou seu relatério "Um conceito mais amplo de liberdade", no qual defende uma ampla revisio na estrutura da Organizacao. Além do relatério do Painel de Alto Nivel, ele aproveitou elementos do relat6rio do Projeto “Millennium”, que desenvolveu um programa de agio para a implementagio do conjunto de objetivos de desenvolvimento estabelecidos na Céipula de 2000, as chamadas Metas de Desenvolvimento do Milénio. Areuniio de Cfipula dos Estados membros de setembro adquire, nessas condigdes, ressondincia historica. Nas palavras de Kofi Annan, “cabe a nds decidir se esse momento de incerteza pressagia o aumento dos conffitos, o aprofundamento da desigualdade e a erosio do Estado de Direito, ou se sera usado para renovar nossas instituigSes comuns para promover a paz, a prosperidade e os direitos humanos". Na Sessito Pleniria de Alto Nivel da Assembléia Geral da ONU, de 14 a 16 de setembro de 2005, 0s lideres mundiais terao diante de si uma agenda ampla e complexa. Trata-se, em grandes linhas, de repensar a relagio entre trés pilares: seguranca, desenvolvimento e direitos humanos. Na area de seguranca, é necessario atualizar o sistema de seguranca coletiva; a questao do desenvolvimento inclui 0 combate a pobreza e a consecucio das Metas do Milénio até 2015; e o tema dos direitos humanos ganharé relevo especial com a proposta de criagio de um Conselho de Direitos Humanos. As decisées a serem tomadas nos proximos meses determinarao a capacidade de as Nagdes Unidas continuarem a cumprir os objetivos € prinefpios da Carta sob um enfoque contemporineo. Um novo conceito de seguranga coletiva Anogio de seguranga coletiva tende a evoluir ao longo do tempo. Articulada juridieamente pela primeira vez no Pacto da Liga das Nagdes (Artigos 10 ¢ 16), a idéia de que a integridade e a independéncia de cada Estado devem ser asseguradas por todos 0s outros conheceu momentos de maior ou menor relevancia ao longo do século XX. Sua formulagio mais elaborada encontra-se na Carta das Nagdes Unidas, que, em seu Capitulo VIL, estabelece as condigées para a autorizagao do uso da forga para preservar a paz. © reconhecimento da interconexdo entre diferentes ameagas a paz em um mundo globalizado levou o secretario-geral da ONU a defender um conceito mais abrangente de ameacas 4 seguranga, que inelua nao apenas conflitos internacionais de formato classico, mas também a "violencia civil, o crime organizado, 0 terrorismo eas armas de destruigio em massa, a pobreza, as doencas contagiosas, entre outras”. Ao mesmo tempo, Kofi Annan enfatiza a necessidade de se estimular uma cultura de prevengio, a qual deve incluir 0 combate a fome e a pobreza e a promogio do desenvolvimento sustentivel. © Brasil privilegia um sistema de seguranca coletiva verdadeiramente multilateral, em que a forga milita seja contemplada como tiltimo recurso, uma vez. esgotados todos os esforcos diplomaticos. Sabemos, por experiéncia, que a paz mundial é posta em xeque por atores dotados de vultosos armamentos ¢ meios econdmicos, o que obriga a comunidade internacional a trabalhar seriamente pelo desarmamento ¢ -proliferagio. Por outro lado, a maioria dos conflitos, hoje, ocorre em paises fragilizados econdmica e socialmente, e seria um erro ignorar a inter-relagao entre elementos econdmicos e sociais, ¢ situagoes de inseguranca. A acio do Brasil, portanto, tem-se pautado pela defesa de uma abordagem mais ampla para as, 3/15/2010 10:11 AM A.ONU aos 60 - Artigo do Embaixador Celso Amorim, Ministro das Rela... http://www-itamaraty.gov.br/sala-de-imprensa/discursos-artigos-entrevist. 3de7 questdes de seguranga, que envolva, além do Conselho de Seguranga, outras instdncias da ONU, particularmente 0 Conselho Econdmieo e Social (Ecosoc). © caso do Haiti éilustrativo. Entre as consideragdes que levaram o governo brasileiro a decidir assumir 0 comando da Missio das Nagies Unidas para a Estabilizacio do Haiti (Minustah), esti a conviecio de que se trata de uma operacao de paz diferente. Em nosso entendimento, a agao da ONU no Haiti deve assentar-se em um tripé: a estabilizagio do pais; a promogio do dilogo entre as diversas faccdes politicas e a capacitagio institucional, social e econémica. Nao haverd paz duradoura no Haiti se nao adotarmos essa perspectiva integrada, Assugestio do secretério-geral de criacao de uma Comissio de Construcio da Paz visa apoiar o proceso de transicio de conflito para uma paz duradoura em cenArios de fragilidade socioeconmica e institucional Preocupado com a inexisténcia de uma instancia para auxiliar paises reeém-saidos de coniflito, Annan sugere maior atengio a setores, como a recuperacao institucional ¢ o financiamento da reconstrugao. O Brasil apdia oestabelecimento da Comissio. Acreditamos, contudo, que esta deva se ocupar também da prevengao de conflitos, desde que solicitada pelo pais afetado. Um exemplo claro da necessidade de apoio preventivo da Comissao é o da Guiné-Bissau, onde a recorréncia de situagées de instabilidade agrega um componente dramatico a situagio de extrema pobreza da maioria da populagao, Uma agenda mais ampla de desenvolvimento © objetivo de colocar o tema do desenvolvimento no topo da agenda internacional é um dos elementos que orientam a atuacao externa do Brasil. No governo do presidente Lula, o tema ganhou relevancia ainda maior, em consonancia com a prioridade atribuida ao combate a fome e A pobreza em ambito nacional. Depois de reunir mais de cingiienta lideres mundiais, na sede da ONU, em 20 de setembro de 2004, 0 Brasil yem chamando a atengio para a necessidade de solugées inovadoras para o financiamento do desenvolvimento e, em particular, para o combate a pobreza extrema. As estimativas mais conservadoras indicam ser necessario 0 aporte adicional de, pelo menos, USS 50 bilhdes ao ano para que as Metas de Desenvolvimento do Milenio possam ser cumpridas dentro do prazo previsto, em 2015. Para além do compromisso - ainda nao cumprido - dos paises desenvolvidos de destinarem 0,7% de seu PIB para a Ajuda Oficial ao Desenvolvimento, so necessrios recursos financeiros adicionais. Mais do que isso, recursos dle melhor qualidade, que sejam canalizados de forma estvel e previsivel para investimentos de longo prazo nos paises que mais necessitam. O Grupo de Trabalho sobre Mecanismos Inovadores de Financiamento, criado no ambito da Agio Internacional contra a Pobreza e a Fome, e que retine Brasil, Franga, Chile, Espanha, Alemanha e Argélia, vem estudando uma série de opgées. Trabalha-se com alternativas que envolvem desde esquemas relativamente simples de contribuigio voluntaria, com a participagio do setor privado, até esquemas mais complexos de taxas aplicadas nacionalmente e coordenadas internacionalmente sobre operagdes financeiras e bilhetes aéreos internacionais. Apesar de diferentes no formato, escopo e tempo de maturacao politica, todos os mecanismos tém em comum o fato de estarem baseados na racionalidade econdmica, além de procurarem interferir o minimo possivel no fimcionamento dos mercados. Ao mesmo tempo, 0 Brasil promove a idéia de agdes de cooperagio entre paises do Sul, que compartilham realidades e desafios de natureza similar. Durante a XT Unetad, realizada em Sao Paulo, em junho de 2004, promovemos uma nova rodada de negociagSes no ambito do Sistema Geral de Preferéncias Comerciais entre paises em desenvolvimento. Juntamente com a Africa do Sul e a {ndia, langamos o Fundo “Ibas” de combate A pobreza ea fome, destinado a financiar projetos de eooperacio em pafses de menor desenvolvimento relativo. A coordenagio entre paises em desenvolvimento reunidos no G-20, no ambito da Organizagio Mundial do Coméreio, vem demonstrando que a articulacao entre pafses do Sul, com especial interesse em agricultura, é fundamental para que suas reivindicacSes legitimas sejam consideradas em negociagdes A.ONU aos 60 - Artigo do Embaixador Celso Amorim, Ministro das Rela... http://www-itamaraty.gov.br/sala-de-imprensa/discursos-artigos-entrevist. 4de7 multilaterais de coméreio como as da Rodada de Doha. Também estamos engajados na promogio de acordos comerciais entre paises em desenvolvimento, que podem servir de instrumento para a ampliagio das correntes de comércio entre os pafses do Sul. A consecucio das ito Metas do Milénio, o conjunto de metas definidas pelos Estados-membros no ano 2000, nao esgota a questao do desenvolvimento. Os resultados da série de grandes conferéncias patrocinadas pela ONU ao longo dos anos 1990 também contribuiram para a consolidacao de uma visio mais ampla de desenvolvimento. Conceder maior destaque ao tema na agenda e na estrutura da ONU é, finalmente, uma decorréncia natural do conceito de seguranga coletiva expandido defendido pelo seeretario-geral. Maior destaque para os direitos humanos © Brasil tem renovado seu compromisso com os direitos humanos, a democracia e o Estado de Direito. Somos signatérios dos principais tratados e temos trabalhado conjuntamente com todos os organismos internacionais de promocao ¢ protegao de direitos humanos. A participacao do Brasil na Comissao de Direitos Humanos das Nagdes Unidas, quase ininterrupta desde 1978, pauta-se pelo mesmo objetivo de construir consensos em favor do aprimoramento do sistema internacional de direitos humanos. O Brasil, nesse sentido, tem manifestado preocupagio com a seletividade e a politizagao que tem comprometido a credibilidade e a eficiéncia da Comisso, quuestdes que espera ver superadas na reforma. ‘Na busca de avangos na promocao e protegio dos direitos humanos no mundo, o Brasil tem tomado iniciativas visando a evolugao do arcabougo conceitual e dos instrumentos a disposigio da comunidade internacional. {Um exemplo 6 0 projeto de resolucio que afirma a incompatibilidade entre a demoeracia ¢ 0 racismo, apresentado na Comissao de Direitos Humanos, desde 2000, e, mais recentemente, na Terceira Comissio da Assembléia Geral da ONU. A resolugio brasileira condena a existéncia de partidos politicos com plataformas racistas, ¢ alerta a comunidade internacional contra a possibilidade de que tais partidos venham a ser conduzidos para o poder numa democracia. Na esfera regional, o Brasil tem impulsionado, na Organizagio dos Estados Americanos, a discussao sobre a elaboragao de uma Convencao Interamericana contra 0 Racismo ¢ toda Forma de Discriminagio e Intolerancia, com o objetivo de ampliar ¢ aprofundar, nas Américas, 0 combate ao racismo e a promogio da igualdade racial. © Brasil também tem sido defensor ativo do prinefpio de que a luta contra o terrorismo no pode ser travada is expensas dos direitos ¢ das liberdades que fundamentam o Estado de Direito. As situagdes de graves violagbes de direitos humanos, sejam eivis ¢ politicos, sejam econdmicos, sociais e culturais, muitas vezes estao entre as causas profundas do terrorismo. A "relativizagao” de direitos ¢ liberdades fundamentais em prol da Ita antiterrorista, portanto, além de violat6ria das obrigacoes internacionais de direitos humanos dos Estados, seria contraproducente, Reconhecemos a inter-relagio entre o respeito aos direitos humanos, ¢ a promogiio do desenvolvimento ¢ da seguranga internacional, o que nos leva a defender o aperfeigoamento do sistema de direitos humanos das Nagdes Unidas. Uma maneira de lograr esse objetivo é atribuir & Alta Comisséria para Direitos Humanos mandato para elaborar um relatorio global sobre a situagio dos direitos humanos no mundo. A independéncia e legitimidade inerentes a um relat6rio dessa natureza, além de reforgarem 0 multilateralismo e o prinefpio da universalidade no acompanhamento dos direitos humanos em todo 0 mundo, contribuiriam para garantir a efetividade e credibilidade do sistema, reduzindo o isco de seletividade e politizagao indevida A cao de um Conselho de Direitos Humanos estd em sintonia com a politica externa brasileira de prevaléncia dos direitos humanos. A prioridade a ser concedida ao tema no ambito das Nagoes Unidas deve ser equivalente a que se coneede a paz e seguranca e ao desenvolvimento, Parece prematuro, entretanto, estabelecer o Conselho de Direitos Humanos como 6rgio principal da Organizacio jé nesse primeiro momento. Poder-se-ia contemplar sua vinculagao direta a Assembléia-Geral e proceder a um processo de revisiio em quinze anos. A.ONU aos 60 - Artigo do Embaixador Celso Amorim, Ministro das Rela... http://www-itamaraty.gov.br/sala-de-imprensa/discursos-artigos-entrevist. Sde7 Estrutura das Nagdes Unidas O objetivo de atingir progressos nas trés 4reas citadas requer uma atualizagio da estrutura das Nagdes Unidas. Na visio do secretario-geral, trés cursos de acao seriam necessarios: (I) a revitalizagao da Assembléia Geral; (II) a reforma dos dois Conselhos existentes - 0 Conselho de Seguranga e 0 Conselho Econdmiico e Social (Eeosoc) -¢ a criagio de um Conselho de Direitos Humanos; e (III) a reforma do Secretariado. Cabe a Assembléia Geral, 6rgio que retine a totalidade dos Estados-membros, um papel central na orientagio politica das Nagdes Unidas. A Assembléia foi, por exemplo, responsavel pela criagao do Estado de Israel, em 1947. Foram também ali consolidados conceitos importantes como o direito inaliendvel 4 autodeterminagao dos povos ¢ a universalidade dos direitos humanos. A crescente abrangéncia de sua agenda ea estrutura de suas comissdes, contudo, levaram a que, paulatinamente, as deliberagdes da Assembléia se fossem burocratizando. Hé amplo consenso quanto a necessidade de dotar a Assembléia Geral de maior eficdcia. O secretério-geral propde que o érgio se concentre em grandes temas substantivos da conjuntura atual, como a migracao internacional ¢ a discussao de uma convencao abrangente sobre terrorismo. Assuntos como desarmamento poderiam ser incluidos nessa agenda. Nao se pode ignorar, além disso, o papel que a Assembléia Geral desempenhou historicamente, atuando no lugar do Conselho de Seguranca quando este se via paralisado pelo veto de um dos membros permanentes. A Resolugdo 377, também conhecida como "Uniting for Peace", permite que a Assembléia Geral realize sessdes de emergéncia quando 0 Conselho de Seguranca mostrar-se incapaz de agir diante de atos de agressiio ou de ameaca a paz e a seguranca internacional. Ainda que a condenagao, por parte da Assembléia, nio seja juridicamente vinculante, ela oferece cobertura politi posigdes defendidas por uma maioria dos Estados-membros. Arenovacio do Conselho Econémico e Social, érgio com mandato para a revisao de politicas e estratégias. de promocio do desenvolvimento e para a coordenacio das atividades das agéncias especializadas, deve equipé-lo para desempenhar um papel mais estratégico na formulacio ¢ implementacio de politicas coerentes de desenvolvimento. Para tanto, o Eeosoc necessitard de agenda e estrutura mais flextveis, além de atuar em coordenagio mais estreita com 0 Conselho de Seguranga, em particular no exame das raizes sociais e econdmicas dos conflitos atuais. O Ecosoc, contudo, nao deve estar limitado 4 coordenagao de atividades do sistema das Nacdes Unidas. £ importante buscar recuperar seu papel de inspirador de outras organizagdes no aprimoramento da relacdo economia /desenvolvimento. Areforma do Secretariado e a promogio de maior coordenagao do sistema das Nagdes Unidas sto também necessirias, na medida em que delas depende a adequada implementagio dos mandatos determinados pela Assembléia Geral e outras instancias deliberativas da ONU, Grande parte das atengdes volta-se para a reforma do Conselho de Seguranca, érgio encarregado de assegurar a paz. € a seguranca internacionais. Na verdade, como ressalta 0 secretario-geral Kofi Annan, nenhuma reforma da ONU estar completa sem a expansdo do Conselho ¢ a atualizacao de seus métodos de trabalho. Ao ser estabelecido, em 1945, 0 Conselho de Seguranca reunia o grupo de paises vencedores da Segunda Guerra Mundial (Estados Unidos, Franca, Reino Unido, Ruissia ¢ China) e mais seis paises eleitos pela Assembléia Geral. Em 1963, 0 Conselho de Seguranca foi ampliado para quinze membros, com a incluso de quatro novos assentos nao-permanentes, formato que permanece até hoje. No atual debate, est em pauta a questao da ampliacio eqiiitativa do Conselho. Também se discute uma ampliagao das atribuigées do rgio, para ocupar-se de temas como nao-proliferacao ¢ combate ao terrorismo. Por tras dessas questées esta o problema de como dotar o érgio de maior eficdcia ¢ legitimidade, de modo que suas decisdes sejam respeitadas pela comunidade internacional. A percepgiio de que a presente composigio do érgio nao mais representa adequadamente a realidade atual 3/15/2010 10:11 AM A.ONU aos 60 - Artigo do Embaixador Celso Amorim, Ministro das Rela... http://www-itamaraty.gov.br/sala-de-imprensa/discursos-artigos-entrevist. éde7 vem ganhando corpo ha mais de uma década. Anos de debates no Grupo de Trabalho criado para analisar 0 tema no conduziram a um consenso sobre como proceder & atualizagio da composicio e dos métodos do 6rgio, ainda que esses objetivos sejam declaradamente compartilhados por todos. segunda Guerra do Golfo (2003), decidida A margem do Conselho de Seguranga, parece ter reavivado, na comunidade internacional, o temor de que o paulatino enfraquecimento da autoridade do Conselho pudesse conduzir a um unilateralismo exacerbado. A idéia de atualizar o Conselho de Seguranga recebeu, a partir de entZo, um impulso politico sem precedentes. As primeiras sugestdes coneretas emergiram dos debates do Painel de Alto Nivel sobre Ameacas, Desafios € ‘Mudangas, que reunin dezesseis personalidades internacionais ao longo de 2004. Seu relat6rio final apresenta dois modelos de reforma do Conselho: o primeiro, conhecido como modelo A, propde a criagio de seis novos assentos permanentes (dois para a Africa, dois para a Asia, um para a Europa ¢ outros ¢ um para a América Latina e 0 Caribe) ¢ trés nio-permanentes; o segundo, ou modelo B, limita a expansio a assentos -permanentes ow elegiveis (oito assentos com direito a reeleigio e um assento nos moldes atuais). Ambas as propostas prevéem um Conselho composto por 24 patses Em seu relat6rio sobre a reforma das Nagdes Unidas, 0 secretrio-geral Kofi Annan limita-se a apresentar as propostas delineadas pelo Painel, sem optar por qualquer dos dois modelos. Faz, contudo, dias observagdes importantes. Em primeiro lugar, sugere que uma decisao sobre o assunto deve ser tomada antes da Caipula de setembro de 2005. Mais importante do que isso, afirma que a incapacidade de se lograr consenso sobre o tema nao deve servir de "desculpa para adiar a decisio”, Kirrealista pensar que uma questo de tamanha transcendéneia possa ser resolvida por consenso. J4.em sua criacio, dispositivos importantes das Nagdes Unidas, como o direito de veto dos membros permanentes do Conselho, nao foram adotados por consenso. A ampliagao do Conselho de onze para quinze membros em. 1963 tampoueo logrou apoio universal. Apesar de folgada maioria a favor, a Resolucao 1991 (XVIII) recebeu ‘onze votos contrarios, entre os quais os de dois membros permanentes, a Franca e a entio Unido Soviética. Os Estados Unidos ¢ 0 Reino Unido abstiveram-se. Isto nio impedin que fosse posteriormente ratificada pelos Parlamentos dos cinco membros permanentes. © Brasil, cuja candidatura a membro permanente foi seriamente considerada em 1945 - com 0 apoio do presidente Roosevelt - tem defendido a necessidade de um Conselho de Seguranga renovado, que reflita a emergéncia de paises em desenvolvimento como atores globais. Nossa percepgio é de que, tal como hoje composto, o Conselho é ineapaz de articular uma visio equilibrada e inclusiva da ordem internacional que reflita de forma satisfatoria as pereepgdes do mundo em desenvolvimento. Em 2004, 0 Brasil uniu-se ao Japao, Alemanha e a India - um grupo conhecido como G-4- para desenvolver conjuntamente uma proposta capaz de aumentar a representatividade do Conselho, tornando-o mais democritico. Partiu-se da premissa de que o estabelecimento de um equilibrio de forgas que melhor reflita o conjunto dos Estados-membros aprimorar4 a capacidade de resposta do 6rgio. Para tanto, é necessério incorporar grandes paises em desenvolvimento, com credenciais territoriais e demogrificas, capacidade de articulagao diplomatica e contribuicao consistente e significativa para a paz ea seguranga internacionai 0 projeto de resolugio apresentado pelo Grupo a Assembléia Geral da ONU no iiltimo dia 11 de julho prope a expansio do Conselho de Seguranga de quinze para 25 membros, com a inclusao de seis novos membros permanentes (dois da Africa, dois da Asia, um da América Latina e do Caribe e outro da Europa Ocidental e outros) e quatro nao-permanentes (um para a Africa, um para a Asia, um para a América Latina ¢ Caribe e um para a Europa Oriental). Os entendimentos mantidos no final de julho com pafses africanos indicaram que a incluso de um assento nao-permanente adicional, a ser ocupado alternadamente pelas regides do mundo em desenvolvimento, permitiria alcancar a maioria necessaria. A visao basica dos africanos, que fizeram grandes esforcos para busear uma posi¢io regional, apresentava muitos pontos em comum coma 3/15/2010 10:11 AM A.ONU aos 60 - Artigo do Embaixador Celso Amorim, Ministro das Rela... http://www-itamaraty.gov.br/sala-de-imprensa/discursos-artigos-entrevist. Ide? proposta do G-4, tornando possivel a busca de tal convergéncia. projeto do G-4 também determina que a delicada questo do direito de veto seja discutida em um momento futuro, e sugere uma revisio da reforma em quinze anos. A idéia de uma revisio é importante, pois permite que o formato e as priticas do Conselho evoluam de acordo com a realidade internacional, que 0 drgao deve refletir. A geopolitica do mundo pode mudar muito em poucas décadas e até mesmo formas diferentes de representacao no Conselho poderio vir a ser consideradas, inclusive as de natureza regional. Esse momento ainda nao chegou. No momento em que escrevo, 0 debate em torno da reforma encontra-se em uma etapa decisiva. A apresentacdo do projeto de resolugio do G-4 sobre a reforma do Conselho de Seguranca abriu o debate sobre o tema na Assembléia Geral. Aproxima-se a Capula de setembro, quando os Estados-membros estardo reunidos para tomar uma série de decisdes que determinarao a estrutura e os meios com que contardo as Nages Unidas para cumprirem seus objetivos. Como bem alertou o secretirio-geral Kofi Annan, a janela de oportunidade oferecida por este momento pode nao permanecer aberta durante muito tempo. Independentemente dos resultados desse proceso, porém, a questo de tornar o Conselho de Seguranga mais democritico e legitimo continuars presente e vai requerer constante atencao da comunidade internacional. Nao & pequeno o desafio que tém pela frente os integrantes das Nagdes Unidas. Existe uma erescente conscincia de que a ONU corre o risco de ver sua influéneia erodida na auséncia de uma reforma. Ao permanecer como est4, a Organizacio est sujeita a perder dinamismo ou, pior, a se tornar irrelevante. Aescolha que a comunidade internacional tem diante de si, portanto, nao é simplesmente uma escolha entre fazer ou no a reforma. Trata-se de decidir se é do interesse da maioria dos Estados que uma organizagio como as Nacdes Unidas siga funcionando como garantia de uma ordem internacional estavel e capaz de promover o desenvolvimento de todos os seus membros, em condigdes de Tiberdade. 3/15/2010 10:11 AM

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